Projeto de relatório sobre o papel das autoridades

Transcrição

Projeto de relatório sobre o papel das autoridades
Projeto de relatório sobre o papel das autoridades locais e regionais na gestão das migrações no
Mediterrâneo
COR-2014-01464-00-02-TCD-TRA (PT) 1/13
PT
O presente projeto de relatório foi elaborado por António Costa, presidente da Câmara Municipal de
Lisboa (PT), e foi debatido na 7.ª reunião da Comissão ECOTER, que teve lugar em Málaga, em
20 de outubro de 2014, com vista à sua adoção na 6.ª reunião plenária da ARLEM.
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1.
Introdução / Contexto:
A região euro-mediterrânica sempre foi um espaço de contacto entre povos e um palco de
movimentos migratórios significativos, que moldaram a sua atual paisagem demográfica, social,
económica e cultural. As migrações, internas e internacionais, voluntárias e forçadas, na bacia do
Mediterrâneo devem-se a fatores de natureza económica, social, política, demográfica e pessoal e são
um fenómeno complexo com profundas implicações sociais, económicas, políticas e culturais.
Existe uma mudança de paradigma da migração nos países do sul e leste do Mediterrâneo. Além de
importantes países de origem de imigrantes a residir legalmente na UE1, são países de trânsito e de
destino de fluxos do Médio Oriente e da África subsariana, acolhendo importantes contingentes de
imigrantes do Sudão, Eritreia e Somália, entre outros 2 . Os conflitos e a situação de instabilidade
política e de insegurança no Médio Oriente e na África subsariana continuarão a originar fluxos
migratórios que afetarão toda a região do Mediterrâneo.
Mais recentemente, no rescaldo da «Primavera Árabe», os fluxos migratórios intensificaram-se,
afetando não apenas a Europa, mas toda a região euro-mediterrânica, resultando em crises
humanitárias e criando pressão contínua sobre os governos e as autoridades locais dos países de
acolhimento, em especial os países mais próximos das zonas de conflito. O conflito na Líbia provocou
uma deslocação maciça de pessoas (800.000) para os países vizinhos, em especial a Tunísia e o
3
Egito . Desde 2011, o conflito na Síria originou uma vaga de refugiados na região (2,9 milhões),
sobretudo na Jordânia (604.000), Líbano (1,1 milhão), Turquia (795.000), Egito (138.000) e Iraque
(220.000)4. Apenas um reduzido número de refugiados sírios chegou à UE (desde 2011, cerca de
5
83.000 pedidos de asilo) . Este fluxo tem uma particular repercussão ao nível local, já que são os
municípios desses países que, muitas vezes, estão na linha da frente do acolhimento dos refugiados
sírios, enfrentando enormes dificuldades para assegurar serviços básicos, como a gestão do lixo, o
6
saneamento, fornecimento de água potável, serviços de saúde, de educação, etc . Por isso, a ARLEM
reitera o seu pedido à UE e à comunidade internacional para assegurar às coletividades territoriais os
meios suficientes para dar assistência aos refugiados sírios7.
1
Em 2013, residiam legalmente 20,4 milhões de nacionais de países terceiros na EU (4% da sua população), constituindo os
imigrantes de nacionalidade turca e marroquina as duas primeiras comunidades. Comunicação – Quinto relatório anual sobre a
imigração e o asilo, COM (2014) 288, 22.5.2014.
2
Cfr. Manuel Manrique Gil e outros, «Mediterranean flows into Europe: Migration and the EU’s foreign policy, Policy
Department»
–
Directorate-General
for
External
Policies,
European
Parliament,
March
2014,
in:
http://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/briefing_note/join/2014/522330/EXPO-JOIN_SP(2014)522330_EN.pdf.
3
Comunicação – Um diálogo sobre migração, mobilidade e segurança com os países do Sul do Mediterrâneo, COM (2011) 292
final, 24.5.2011.
4
ACNUR, http://data.unhcr.org/syrianrefugees/regional.php.
5
Comunicação – Quinto relatório anual sobre a imigração e o asilo, COM (2014) 288, 22.5.2014.
6
Les municipalités en première ligne – les effets de la crise syrienne sur les collectivités locales frontalières à la Syrie (Turquie,
Jordanie, Liban) - Rapport de mission et recommandations (2013) – une initiative de CGLU.
7
Projet de Rapport annuel de l'ARLEM sur la dimension territoriale de l'Union pour la Méditerranée 2013.
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Por outro lado, na «era da mobilidade», a Europa vai continuar a acolher imigrantes, requerentes de
asilo e refugiados da região do Mediterrâneo ou em trânsito pela região. Tendo em consideração o
aumento da sua dependência da mão de obra imigrante devido à baixa natalidade e uma população em
envelhecimento, a imigração terá um papel importante na realização da sua Estratégia 2020 8 de
crescimento e emprego, pelo que é espectável que os fluxos migratórios se intensifiquem. Por outro
lado, as diferentes evoluções demográficas sentidas na Europa (em declínio demográfico) e no Sul,
em especial no continente africano (com aumento contínuo da sua população), conduzirão a que os
fluxos migratórios se intensifiquem em direção aos Estados-Membros da União Europeia.
Os fluxos migratórios no Mediterrâneo são, assim, um processo complexo que coloca importantes
desafios, mas também oportunidades para a Europa e para todos os países do leste e sul do
Mediterrâneo, que devem ser aproveitadas em benefício da integração socioeconómica de toda a
região euro-mediterrânica.
Ao nível da UE, o desenvolvimento de uma política de migração, asilo e integração iniciou-se com o
Conselho Europeu de Tampere (1999) e teve um impulso com o Pacto Europeu sobre imigração e
asilo (2008)9 e o Programa de Estocolmo (2009). No quadro das orientações estratégicas para os
10
próximos anos, o Conselho Europeu de 26 e 27 de junho de 2014 reiterou a necessidade de a Europa
promover a imigração legal e a proteção das pessoas que dela necessitam, reforçar a luta contra a
migração irregular, agindo sobre as suas causas profundas, e intensificar a cooperação com os países
de trânsito e de origem, de acordo com o princípio «mais por mais».
As migrações e a mobilidade são também um aspeto essencial das relações da UE com os países do
Mediterrâneo no quadro da Política Europeia de Vizinhança (PEV), revista em 2011 11 , e da sua
12
renovada Abordagem Global para a Migração e Mobilidade (AGMM) , que estabelece o quadro
estratégico para a política externa da UE em matéria de imigração e asilo, assente em quatro pilares13.
O respeito pelo direito de sair de qualquer país e de regressar ao país de origem, o respeito dos
direitos humanos dos migrantes, incluindo nas ações contra a migração irregular, a promoção da
migração legal, a garantia do direito a obter proteção internacional na UE são aspetos centrais da
8
9
10
De acordo com a Comissão Europeia, prevê-se que em 2060 existam menos 50 milhões de trabalhadores ativos se os níveis de
imigração se mantiverem estáveis e, se eles se reduzissem, seriam necessários 110 milhões de trabalhadores para garantir a
sustentabilidade dos sistemas de segurança social. http://ec.europa.eu/news/justice/110526_pt.htm.
O Pacto estabeleceu cinco compromissos em matéria de política de imigração e asilo da UE: organização da imigração legal, luta
contra a imigração irregular, reforço das fronteiras externas da UE, construção do sistema europeu comum de asilo e criação de
uma parceria global para a migração e desenvolvimento.
JO C 240, 24.7.2014, p. 13.
11
Comunicação conjunta “Uma nova estratégia para uma vizinhança em mutação”, COM(2011) 303 final, 25.5.2011;
Comunicação conjunta “Política Europeia de Vizinhança: rumo a uma Parceria reforçada”, JOINT (2013) 4 final, de 20.3.2013.
12
Comunicação “Abordagem Global para a migração e a mobilidade”, COM(2011) 743 final, 18.11.2011.
13
Reforço da migração legal e facilitação da mobilidade; prevenção e luta contra a migração o irregular e o tráfico de seres
humanos; maximização do impacto das migrações no desenvolvimento; promoção da proteção internacional.
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política externa da UE em matéria de migrações aos quais o Comité das Regiões dá especial
importância14.
Na sequência das mudanças ocorridas no norte de África, a UE propôs aos países do sul do
Mediterrâneo um diálogo estruturado sobre migração, mobilidade e segurança15. Neste quadro, foram
assinadas parcerias para a mobilidade com Marrocos (2013), Tunísia (2014) e Jordânia (2014),
estando a UE a envidar esforços para avançar com novos diálogos em matéria de migração,
mobilidade e segurança com o Egito, a Líbia, a Argélia e o Líbano. As parcerias para a mobilidade
poderão ser uma oportunidade para uma melhor gestão das migrações, desde que sejam devidamente
implementadas e permitam assegurar de forma proativa a mobilidade e os interesses dos países do sul
do Mediterrâneo.
Para além destas plataformas bilaterais de diálogo e cooperação entre a UE e os parceiros do
Mediterrâneo, são também relevantes os diversos processos de diálogo sobre migrações ao nível
global (Diálogo de Alto Nível das NU sobre migração e mobilidade internacional, Fórum Global
sobre Migrações e Desenvolvimento), regional (Parceria Estratégica UE-África para a migração
mobilidade e emprego, Parceria do Sul do Mediterrâneo) e sub-regional (Processo de Rabat; 1.ª
16
reunião ministerial euro-mediterrânica sobre migração , Diálogo do Mediterrâneo Ocidental 5+5).
Tendo em consideração as diferentes estruturas de diálogo e cooperação, a União para o Mediterrâneo
(UM) pode ser uma plataforma de diálogo para a definição de soluções comuns para uma gestão
global, integrada e sustentável dos fluxos migratórios na região euro-mediterrânica17.
É ao nível local que o impacto das migrações sobre tecido socioeconómico se faz sentir com maior
intensidade e que se colocam os problemas diários de integração e acolhimento dos imigrantes.
Muitas autoridades locais e regionais (ARL), especialmente as que se localizam nas fronteiras
externas dos Estados-Membros da ARLEM e nos grandes centros urbanos, estão a ser especialmente
afetadas por fluxos crescentes de migrantes, requerentes de asilo e refugiados, sendo responsáveis
pelo seu acolhimento e integração.
14
Parecer do CR CIVEX-V-027 sobre «Migração e Mobilidade – Uma Abordagem Global», adotado na reunião plenária de 18 e
19 de julho de 2012 (relator: Nichi Vendola).
15
COM(2011) 292 final, Comunicação da Comissão – Um diálogo sobre migração, mobilidade e segurança com os países do sul
do Mediterrâneo.
16
17
A primeira reunião ministerial euro-mediterrânica sobre migrações, realizada em 18 e 19 de novembro de 2007, lançou uma
agenda de cooperação e diálogo entre os países da região baseada em três eixos estratégicos: migração legal, migração e
desenvolvimento; combate à migração irregular.
http://www.sef.pt/documentos/56/AGREEDCONCLUSIONS18NOVEMBER.pdf.
Na declaração de 1 de abril de 2014, a Mesa da Assembleia Parlamentar da UM, reunida em Lisboa, sublinhou a necessidade de
uma abordagem equilibrada e coerente entre as políticas de migração e asilo e as políticas económicas, demográficas, de
emprego, de integração e de desenvolvimento. Também apelou à necessidade de promover canais de migração legal para
maximizar os impactos positivos da mobilidade humana e a uma melhor repartição de responsabilidades, baseada no princípio da
solidariedade, para fazer face à pressão migratória sobre os países do Mediterrâneo;
http://www.paufm.org/bureau/Docs/1April2014_Lisbon/Declaration_FR.pdf.
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Como vem sido reiterado pelo Comité das Regiões, a abordagem global das migrações requer uma
governação a vários níveis, que garanta o envolvimento das ARL e reconheça o seu papel-chave na
promoção e execução de políticas sociais, de emprego, de acolhimento e integração, na gestão da
migração irregular e no estabelecimento de diálogo e cooperação com as suas contrapartes nos países
de origem e de trânsito18.
Neste contexto, deve ser reconhecido à ARLEM, enquanto parte integrante da estrutura de governação
da UM que representa a sua dimensão territorial, o seu papel de fórum privilegiado para o diálogo
político com as ARL da região euro-mediterrânica no domínio da gestão das migrações na região,
bem como na implementação da AGMM19.
2.
A gestão das migrações no Mediterrâneo
2.1
Resposta eficaz às situações de crise humanitária no Mediterrâneo: papel das
cidades/regiões
Nos últimos anos, o Mediterrâneo tem sido palco de tragédias nas quais milhares de pessoas
(imigrantes económicos, refugiados, requerentes de asilo, vítimas de tráfico de seres humanos,
menores não acompanhados) perderam a vida a tentar entrar irregularmente na UE20. Em 2013, a
Comissão Europeia estima que tenham chegado à Europa 40 000 pessoas por via marítima, das quais
pelo menos 600 perderam a vida na travessia21. Este fenómeno da migração irregular no Mediterrâneo
alcançou particular visibilidade política com o incidente de 3 de outubro de 2013, quando o naufrágio
de um barco ao largo de Lampedusa, que transportava mais de 500 imigrantes, causou a morte a 360
imigrantes. O incidente de 6 de fevereiro de 2014, quando 15 imigrantes africanos perderam a vida a
tentar entrar em Ceuta, também ilustra o drama humanitário que se está a viver na Rota do
Mediterrâneo Ocidental. Desde 2011, a pressão migratória em Ceuta e Melilla (mas também noutras
regiões de Espanha, como por exemplo em Valência, para onde os migrantes são transferidos) está
constantemente a aumentar, com milhares de imigrantes de países subsarianos, mas também sírios e
argelinos, a entrar irregularmente no espaço europeu através destas cidades 22 . Estes e outros
incidentes são marcos trágicos, que colocaram a necessidade de prevenção da migração irregular no
Mediterrâneo no topo da agenda política.
18
Parecer do CR CIVEX-V-027 sobre «Migração e Mobilidade – Uma Abordagem Global», adotado na reunião plenária de 18 e
19 de julho de 2012 (relator: Nichi Vendola).
19
Parecer do CR CIVEX-V-027 sobre «Migração e Mobilidade – Uma Abordagem Global», adotado na reunião plenária de 18 e
19 de julho de 2012 (relator: Nichi Vendola).
20
Em 2013, o número de imigrantes detetados a entrar irregularmente na UE subiu 48% em relação a 2012, tendo-se verificado um
aumento muito significativo de imigrantes que partem do Norte de África (Líbia e Egito) e tentam atravessar o mar
Mediterrâneo, colocando a sua vida em risco. Também aumentou o número de pessoas detetadas a atravessar ilegalmente o
Mediterrâneo, oriundas da Eritreia, Somália, Nigéria, Mali e Senegal, percorrendo uma rota longa e perigosa. Frontex – Annual
Risk Analysis 2014, in http://frontex.europa.eu/assets/Publications/Risk_Analysis/Annual_Risk_Analysis_2014.pdf.
21
Comunicação da Comissão – Quinto relatório anual sobre a imigração e o asilo , COM (2014) 288, 22.5.2014.
22
Irregular Immigration on the European Union’s Southern Border, Report by the President of the Commitee of Regions on the
situation in the cities of Ceuta and Melilla (Spain), 15.4.2014.
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Na sequência do trágico incidente ao Largo de Lampedusa, foi criada a Task Force para o
Mediterrâneo, presidida pala Comissão Europeia, para tomar medidas que previnam a perda de vidas
humanas no mar23, cuja implementação foi considerada prioritária pelo Conselho Europeu de 26 e 27
de junho de 2014. Também foi lançada a operação italiana de patrulhamento e salvamento «Mare
Nostrum», que já permitiu salvar muitas vidas.
A migração irregular e os fluxos de refugiados são um fenómeno complexo e preocupante, que tem
colocado enorme pressão sobre as autoridades nacionais, regionais e locais em todos os países da
região euro-mediterrânica. São as ARL, em especial as que se situam na fronteira sul (Jordânia,
Turquia, Líbano, Egito), mas também as dos Estados-Membros da orla norte (Chipre, Malta, Itália,
Grécia e Espanha) que estão na linha da frente do acolhimento e proteção de imigrantes e refugiados,
fornecendo-lhes alojamento, alimentação, cuidados de saúde, etc. Por isso, é essencial o
desenvolvimento de planos estratégicos de contingência e coordenação de todos os atores envolvidos
na gestão de crises humanitárias (governos, organizações internacionais, ONG, ARL) que definam
melhor as suas responsabilidades e assegurem às ARL financiamento adequado. Por outro lado, uma
real partilha de responsabilidades num espírito de solidariedade, exige medidas de apoio mais ativo e
tangível às ARL e aos países mais direta e intensamente afetados, em especial por parte da UE e dos
seus Estados-Membros do centro e norte da Europa. Neste contexto, também a ARLEM pode
desempenhar um papel relevante na procura de uma resposta estruturada, estável, prática e útil às
catástrofes humanitárias que se vivem na região euro-mediterrânica.
As ARL também podem desempenhar um papel relevante no esforço conjunto para lutar e prevenir a
migração irregular, promovendo campanhas de sensibilização junto de potenciais migrantes para as
vias legais de imigração e os riscos da imigração irregular, identificando vítimas de tráfico e
promovendo a reintegração dos migrantes irregulares que regressam, voluntária ou coercivamente.
A complexidade da situação exige uma resposta comum e coordenada, que deve respeitar os direitos
humanos e o direito de procurar asilo, e basear-se na solidariedade com os Estados e as regiões mais
afetadas e na partilha equitativa de responsabilidades entre todos os níveis de governação.
O reforço de controlos de fronteiras e as medidas de luta contra a migração irregular são essenciais,
mas não podem ter precedência sobre as obrigações internacionais (UNCLOS, SOLAS e SAR) de
salvamento e de respeito pelos direitos humanos, nem sobre o direito de procurar asilo na UE, que tem
de permanecer um local de refúgio para as pessoas com necessidade de proteção internacional 24. Por
outro lado, estas medidas têm-se revelado insuficientes para evitar a perda de vidas humanas e
percursos migratórios desumanos. Como reconhece a OIM, a falta de canais legais de acesso à UE
23
24
Estas medidas incidem em 5 domínios de ação: (1) cooperação com os países de origem e de trânsito; (2) proteção regional,
reinstalação e reforço das vias legais para entrar na Europa; (3) luta contra o tráfico e introdução clandestina de seres humanos,
(4) reforço da vigilância das fronteiras, contribuindo para salvar vidas no mar; (5) assistência aos Estados-Membros que se
defrontam com uma forte pressão migratória. Comunicação sobre o trabalho da Task Force Mediterrâneo, COM (2013) 869,
4.12.2013.
Parecer do CR CIVEX-V-027 sobre «Migração e Mobilidade – Uma Abordagem Global», de 18 e 19 de julho de 2012 (relator:
Nichi Vendola); parecer do CR CIVEX-V-047 sobre «A futura política da UE em matéria de justiça e assuntos internos»,
adotado na reunião plenária de 25 e 26 de junho de 2014 (relatora: Lotta Håkansson Harju).
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tem conduzido a que os imigrantes, refugiados e solicitantes de asilo procurem redes de tráfico que os
canalizam através de rotas cada vez mais perigosas25. Assim, são necessárias medidas que garantam
uma efetiva proteção aos refugiados, evitem a perda de vidas humanas e sejam expressão de
solidariedade com as regiões mais afetadas e de uma real partilha de responsabilidades.
Neste contexto, a extensão do Programa Regional de Proteção no Norte de África e a criação de um
novo Programa Regional de Desenvolvimento e Proteção na região vizinha da Síria para melhorar a
situação de proteção dos refugiados sírios, são um contributo para reforçar a capacidade de proteção
na região. O aumento da reinstalação de refugiados na UE também deve fazer parte integrante dos
esforços da UE para apoiar os Estados do sul e leste do Mediterrâneo confrontados com grandes
afluxos de refugiados26. Este é um domínio onde as cidades e regiões europeias têm desempenhado
um importante papel, promovendo a integração dos refugiados nas comunidades locais e tomando
medidas de promoção da coesão social.
No entanto, deveriam ser exploradas medidas preventivas da migração irregular, que criem rotas
legais e seguras para a Europa para evitar mais perdas de vidas humanas em viagens perigosas, como
o estabelecimento de um «corredor humanitário» através de uma utilização mais ampla de vistos
humanitários e a criação de centros de acolhimento nos países de trânsito para processar pedidos de
asilo ou determinar a elegibilidade para entrada legal nos países da UE 27. Também aqui as ARL
poderiam prestar apoio.
A mais longo prazo, um modelo eficaz de gestão dos fluxos migratórios no Mediterrâneo deve basearse numa estratégia de migração legal, na relação positiva entre migração e desenvolvimento28 e na
cooperação mais efetiva com os países de trânsito e de origem em todos os domínios das migrações,
incluindo medidas destinadas a remediar as causas profundas da migração irregular (pobreza, violação
de direitos humanos, má governação, conflitos, falta de perspetivas económicas, desemprego, más
condições de trabalho, etc.). Nesta linha, a estratégia para 2014-2017 estabelecida na Declaração UEÁfrica sobre Migração e Mobilidade, adotada na 4.ª cimeira UE-África, de 2 e 3 de abril de 2014, é
um passo importante para uma abordagem global das migrações.
25
26
27
28
Recomendações da OIM para a Presidência italiana do Conselho da UE (julho-dezembro de 2014),
http://eea.iom.int/index.php/news-events/214-iom-recommendations-to-the-italian-presidency-of-the-council-of-the-europeanunion; OIM Discussion Paper: Adressing Complex Migration Flows und Upholding the rights of Migrants along the Central
Mediterranean Route (21 October 2013).
Em 2007, acolhiam 39% do total de refugiados no mundo. Philippe Fargues (ed.) CARIM Mediterranean Migration 2008-2009
Report, Robert
Schuman Centre For
Advanced
Studies, European
University Institute,
2009, in
http://cadmus.eui.eu/bitstream/handle/1814/11861/CARIM%20Migration_Report%2020082009%20revised%20Oct09.pdf?sequence=3
OIM Discussion Paper: Adressing Complex Migration Flows und Upholding the rights of Migrants along the Central
Mediterranean Route (21 October 2013); Comunicação – Como conseguir uma Europa aberta e segura, COM (2014) 154 final,
11.3.2014.
Ricard Zapata-Barrero, «The external dimension of Migration Policy in the Mediterranean Region: Premises for normative
debate», Revista del Instituto Español de Estudios Estratégicos, n.º 2/2013.
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2.2
Gestão das migrações ao nível local e regional: desafios globais, respostas locais
As migrações na região euro-mediterrânica são um desafio e, sobretudo, uma oportunidade, pois são
um fator de desenvolvimento económico, social e cultural das regiões e cidades de destino (por
exemplo, satisfação de necessidades de mão de obra, sustentabilidade dos sistemas de segurança
social, empreendedorismo, consumo, comércio étnico, etc.) e de origem (por exemplo, remessas,
transferência de know how, investimentos da diáspora, etc.) em ambos os lados do Mediterrâneo.
É necessário ter em consideração que vários países do sul do Mediterrâneo são países de acolhimento
de fluxos migratórios, mas continuam a ser países de origem. Uma migração legal bem gerida do sul
do Mediterrâneo para a Europa deve beneficiar não apenas os países de acolhimento, mas também os
países de origem, através de medidas que garantam a mobilidade, a transferência de know how, de
investimento produtivo ou do empreendedorismo («brain gain»). Também neste domínio deve ser
reconhecido às ARL um papel ativo, no âmbito de uma abordagem global da gestão das migrações.
Sem prejuízo das especificidades constitucionais de cada Estado e das partilhas internas de
competências entre os níveis nacional, regional e local, o impacto local das migrações internacionais
faz com que as cidades e regiões desempenhem um papel crucial no sistema de governação das
29
migrações, pois são em regra responsáveis pelo acolhimento e integração de imigrantes , devendo,
por isso, ter uma voz mais ativa no desenvolvimento das políticas de imigração.
No quadro dos processos locais de integração, as ARL adotam planos, criam estruturas 30 ,
implementam medidas de acolhimento, prestam serviços essenciais à integração dos imigrantes e à
proteção dos seus direitos (educação, alojamento, apoio social, apoio jurídico, apoio à procura de
emprego, formação, mediação intercultural, cursos de línguas, financiamento de microprojetos,
campanhas de informação, etc.), adotam ações contra a discriminação e a segregação, promovem o
diálogo intercultural e a coesão social. Também são elas que promovem projetos de cooperação entre
vários stakeholders31 . Estas e outras boas práticas das ARL em ambos os lados do Mediterrâneo
devem ser mais conhecidas e partilhadas.
As tendências mostram que as migrações não têm apenas lugar entre países, mas entre cidades e
regiões, já que os migrantes de uma determinada cidade ou região tendem a concentrar-se em
32
determinadas cidades ou regiões do país de acolhimento . Tendo em consideração esta dimensão
29
30
31
32
Comunicação – Agenda Europeia para a integração dos nacionais de países terceiros, COM (2011) 455 final, 20.7.2011; parecer
CONST-IV-017 sobre «Uma política comum de imigração para a Europa», adotado na reunião plenária de 26 e 27 de novembro
de 2008 (relator: Werner Jostmeier) e parecer CIVEX-V-027 sobre «Migração e Mobilidade – Uma Abordagem Global»,
adotado na reunião plenária de 18 e 19 de julho de 2012 (relator: Nichi Vendola); Declaração do Mayoral Forum sobre
Mobilidade, Migração e Desenvolvimento, realizado no dia 20 de junho de 2014.
Por exemplo, Direção Geral de Integração, Inclusão Social e Cooperação da Generalitat de Valencia; Comité Interdepartamental
de Imigração e Comité de Cidadania e Imigração da Catalunha; Observatório Valenciano de Migração da fundação CeiMigra.
Por exemplo, o KIM – Key Competences for Migrants e a AMICS – Network Mediation Agency for Integration and Social
Interaction, na região de Valência.
Cécile Riallant, Joanne Irvine, Luigi Fabbri, IOM, «Local authorities: The missing link harnessing the potential of migration for
development»,
in
http://www.iom.int/cms/en/sites/iom/home/what-we-do/migration-policy-and-research/migration-policy1/migration-policy-practice/issues/december-2012january-2013/local-authorities-the-missing-li.html
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translocal das migrações, deveria ser promovida a criação de «parcerias para a integração» entre
cidades e regiões dos países de origem e de destino, para aumentar a cooperação e a confiança mútua
e, assim, garantir uma gestão mais descentralizada das migrações numa perspetiva de triple win (para
o imigrante, para o seu local de origem e para o local de destino). Estas parcerias poderiam incluir
medidas preparatórias - cursos de línguas, formação cultural e cívica, etc. - dos projetos individuais de
imigração (como, por exemplo, o programa de formação de trabalhadores tunisinos recrutados para
trabalhar em Itália) e a execução de programas de retorno voluntário e reintegração de imigrantes.
Com base em experiências, como o Mediterranean Migration Network, deveriam ser estabelecidas
redes de cooperação e intercâmbio de boas práticas entre as ARL da região euro-mediterrânica.
Também é a nível local que se podem definir melhor as necessidades de capital humano, pelo que as
cidades/regiões podem tomar medidas que permitam atrair os trabalhadores e empreendedores
imigrantes de que necessitam para revitalizar a economia local (por exemplo, ao nível do acesso à
habitação, cursos de línguas, apoio na navegação pela regulamentação nacional, acesso ao crédito,
redes de contactos etc.).
Muitas cidades e regiões são afetadas por um fenómeno de «supermobilidade», o que implica uma
adaptação das suas políticas de integração aos movimentos migratórios temporários (por exemplo,
estudantes internacionais, trabalhadores sazonais) e aos projetos de migração circular.
Na era da globalização e da competição por talento à escala mundial, a emigração de pessoas
altamente qualificadas também é um desafio para as ARL, que procuram adotar medidas de limitação
do «brain drain» e de potenciação dos efeitos positivos deste tipo de migração no desenvolvimento
(«brain gain»): promoção de emprego; medidas que promovam e facilitem o envolvimento da
diáspora em projetos de investimento local; projetos de ligação à diáspora (por exemplo, «tunisiens
des deux rives»); projetos de promoção do retorno e da reintegração da diáspora (por exemplo, o
projeto «Brain Back Umbria»); apoio no reconhecimento de competências profissionais, para evitar o
«brain waste»; promoção de programas de migração circular, etc.
Um outro aspeto crucial das políticas de integração prende-se com participação ativa dos imigrantes
na comunidade de acolhimento, podendo aqui as ARL desempenhar um papel importante na
promoção de associações de imigrantes, na sua participação em sindicatos, no seu acesso a trabalhos
na administração pública, etc. Embora a atribuição de direitos de voto (ativo e passivo) aos imigrantes
no país de destino e a sua participação nos processos eleitorais dos países de origem dependam da
legislação nacional, a ARLEM considera que a promoção do direito de voto dos imigrantes nos
processos eleitorais dos países de destino e origem favorece a sua integração, a sua ligação ao país de
origem e, em geral, fortalece a democracia na região mediterrânica.
Todos estes aspetos da atuação das ARL devem ser devidamente enquadrados por uma abordagem
global e integrada das migrações no Mediterrâneo, que contribua para uma real integração
socioeconómica da região euro-mediterrânica e reconheça o papel crucial das ARL na gestão das
políticas de imigração, proteção de refugiados, integração e desenvolvimento.
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3.
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Recomendações
Reconhecendo a importância do Mediterrâneo como um espaço de confluência de valores
comuns, de liberdade e de diálogo;
Reconhecendo a complexidade da gestão das migrações e as vantagens da migração e mobilidade,
como veículos dinamizadores de desenvolvimento económico e social;
Reconhecendo que a gestão das migrações no Mediterrâneo, incluindo a prevenção da migração
irregular, exige uma abordagem global e holística que desenvolva políticas conjuntas baseadas
nos princípios do respeito pelos direitos humanos, solidariedade, confiança mútua e partilha de
responsabilidades;
Reconhecendo que esta abordagem deve promover soluções duráveis e adaptadas à diversidade
das situações e associar todas as partes interessadas de forma mais sistemática, nomeadamente as
coletividades territoriais;
A ARLEM exorta as Instituições da UE, os Estados-Membros da UE e os Estados Parceiros da
região EUROMED a:
 Desenvolverem uma abordagem global, coerente e comum das migrações para a região
EUROMED, que permita uma gestão mais descentralizada e eficaz dos fluxos migratórios,
adaptada às especificidades socioeconómicas de cada região, envolva as ARL, no quadro de
uma governação multinível, respeite os direitos humanos, assegure a partilha equitativa de
responsabilidades e seja solidária em relação às regiões mais afetadas.
 Aprofundarem o diálogo sobre migrações e mobilidade no quadro da União para o
Mediterrâneo, reconhecendo-lhe um papel mais proeminente e efetivo na gestão das migrações
no Mediterrâneo, como plataforma de diálogo e instância de soluções comuns, que permitam o
desenvolvimento de uma política euro-mediterrânica em matéria de migrações, que garanta uma
melhor coordenação entre todos os atores envolvidos, otimize os benefícios da migração legal,
garanta proteção aos que dela necessitam e permita lutar com eficácia contra a migração
irregular.
 Reconhecerem o papel crucial que as ARL desempenham no processo de acolhimento e
integração de imigrantes, na promoção dos direitos dos imigrantes e no combate ao racismo e à
xenofobia, que são aspetos essenciais na gestão dos fluxos migratórios, dando-lhes uma voz
mais ativa na definição de políticas de imigração, asilo e integração.
 Envolverem de forma sistemática as ARL como stakeholders na definição e implementação das
políticas migratórias ao nível internacional e nacional, bem como nas ações de cooperação e
diálogos com países terceiros, nos domínios das migrações, da paz e do desenvolvimento.
 Desenvolver, com o envolvimento ARL, políticas que contribuam para reduzir as causas
remotas da imigração irregular e promovam vias legais de imigração.
 Dotar as ARL dos meios financeiros de que necessitam para cumprirem plenamente as suas
responsabilidades em matéria de migrações e integração, assegurando-lhes o acesso a fundos
nacionais e a fundos da UE (Fundo para o Asilo e a Migração; Instrumento da Política de
Vizinhança; Fundo Social Europeu).
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 Reconhecer que a mobilidade de pessoas, os movimentos migratórios de empreendedores e os
projetos de migração circular são essenciais para o aprofundamento da integração económica do
Mediterrâneo.
 Reconhecer que as ARL e a ARLEM podem desempenhar um papel relevante na procura de
uma resposta estruturada, estável, prática e útil às catástrofes humanitárias que se vivem na
região euro-mediterrânica.
No contexto de uma abordagem global, integrada e descentralizada das migrações no Mediterrâneo, a
ARLEM considera, ainda, importante:
 Assegurar uma melhor coordenação entre os diferentes níveis de governação, internacionais,
nacionais e locais (Estados, UE, ACNUR, ICMPD, OIM, ALR, UM, etc.), bem como com os
demais stakeholders públicos ou privados (associações da sociedade civil, associações de
imigrantes, ONG) envolvidas na gestão do fenómeno migratório na região euromediterrânica, de forma a permitir uma gestão sólida e consistente das migrações.
 Envolver as ARL nas parcerias para a mobilidade e outros instrumentos internacionais de
cooperação com os países do Mediterrâneo, reconhecendo o seu papel em ações nos países de
origem (por exemplo, campanhas de sensibilização, medidas preparatórias da integração,
formação, assistência em matéria de reagrupamento familiar, cursos de língua, medidas de
reforço do diálogo intercultural) e de destino (por exemplo, criação de sistemas locais de
seleção de acordo com as necessidades locais; medidas de acolhimento e apoio, etc.).
 Assegurar que as parcerias para a mobilidade e outros instrumentos de cooperação bilateral
tenham em consideração os interesses dos países do Sul do Mediterrâneo e sejam
corretamente implementados, de forma a produzir resultados tangíveis quanto à mobilidade,
que devem ser periodicamente divulgados, de forma a permitir uma melhor perceção dos seus
benefícios mútuos.
 Realizar nos países de destino campanhas de informação e sensibilização que combatam
estereótipos negativos relativos à imigração, como forma de reduzir manifestações de racismo
e xenofobia.
 Criar estruturas descentralizadas para a execução de medidas de desenvolvimento que
beneficiem os imigrantes e os seus locais de origem, como serviços locais de canalização de
remessas para investimentos produtivos da diáspora, de acompanhamento social e cultural da
diáspora, de apoio ao reconhecimento de competências e habilitações profissionais, de
promoção do empreendedorismo, etc.
 Desenvolver redes e instrumentos de cooperação e partilha de boas práticas ou de «parcerias
para a integração» entre as ARL da região Euromed relativas a vários aspetos da gestão das
migrações (integração, inclusão social, emprego, proteção de refugiados, prevenção da
migração regular, programas de retorno voluntário, etc.).
 Criar instrumentos que permitam um intercâmbio de boas práticas e dos modelos de
integração (por exemplo, documentos redigidos em várias línguas), que permitam a
divulgação dos resultados das políticas migratórias e melhorar a comunicação e a
compreensão mútua entre os atores principais na União Europeia e nos países do
Mediterrâneo (a nível nacional, regional e local).
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 Promover o direito de voto dos imigrantes nos processos eleitorais dos países de destino e
origem, de forma a favorecer a sua integração, a sua ligação ao país de origem e, em geral,
fortalecer a democracia na região mediterrânica.
Lista dos contribuintes:
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Governo da Jordânia
Governo da Tunísia
Governo da Catalunha (Espanha)
Governo de Valência (Espanha)
Governo da Úmbria (Itália)
Município de Nicósia (Chipre)
Município de Amã (Jordânia)
Município de Uszka (Hungria)
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