Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual

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Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual
NeuroAtual
Volume 2, número 3, 2006
NEUROLOGIA GERAL
Dr. Osvaldo M. Takayanagui
Idiopathic intracranial hypertension. Ball AK et al. Lancet Neurol, 5: 433, 2006.
A hipertensão intracraniana idiopática ocorre mais comumente em mulheres obesas e pode
levar a um grave comprometimento visual. Por definição, é uma síndrome caracterizada
por hipertensão intracraniana, na ausência de lesões tumorais ou vasculares, sem
hidrocefalia, cujo fator causal não pôde ser identificado. O termo hipertensão intracraniana
benigna não é adequado pelo risco de grave comprometimento visual. Com o advento de
técnicas de neuroimagem mais sofisticadas, as lesões intracranianas e doenças vasculares
têm sido identificadas em condições previamente rotuladas como sendo hipertensão
intracraniana idiopática. Da mesma forma, os critérios diagnósticos sofreram várias
modificações e, atualmente, são os seguintes:
1- na presença de sintomas e/ou sinais, eles podem indicar apenas aqueles relacionados à
hipertensão intracraniana difusa ou papiledema
2- a pressão intracraniana, quando medida em decúbito lateral, está elevada
3- a composição do LCR é normal
4- não há qualquer evidência de hidrocefalia, lesão com efeito de massa ou estrutural ou
anormalidade vascular
5- ausência de evidência de qualquer causa de hipertensão intracraniana
Na situação de hipertensão intracraniana ser resultante de uma determinada doença
de base ou associada a drogas, o termo idiopático é incorreto. Se houver evidências
convincentes da associação causal com drogas ou alguma doença, a denominação mais
apropriada seria hipertensão intracraniana secundária.
Epidemiologia
A incidência anual nos EUA é em torno de 1 caso/100.000 habitantes, similar à da
síndrome de Guillain Barre, tumores hipofisários e cefaléia em salva. Se restringirmos à
população feminina, entre 20 a 44 anos, a incidência sobe para 15-19 casos/100.000
habitantes, aproximando-se da de doenças mais freqüentes como a esclerose múltipla e
doença do neurônio motor.
A hipertensão intracraniana idiopática é mais freqüente nas mulheres (numa
proporção entre os gêneros de 4:1 a 15:1) e indivíduos obesos (a freqüência de obesidade
varia de 71% a 94%). A média da idade do início dos sintomas é de 28 a 35 anos. É rara
em jovens antes da puberdade e tem características distintas dos adultos, sem predomínio
em meninas obesas. Nos adolescentes, no entanto, a taxa de obesos espelha a dos adultos.
Condições associadas
Vitamina A
Têm sido relatados casos de hipertensão intracraniana em crianças tanto por deficiência
como por excesso de vitamina A.
Medicamentos
Vários medicamentos têm sido implicados com hipertensão intracraniana, tais como
danazol, tamoxifeno, hormônio de crescimento, tetraciclina, ácido nalidíxico,
nitrofurantoina, indometacina, rofecoxib, litium e cimetidina. A pílula anticoncepcional
tem sido historicamente associada com a moléstia, mas os estudos mais recentes não têm
mostrado um aumento significativo da freqüência de hipertensão intracraniana idiopática
quando comparada com a população em geral. É possível que os estudos iniciais tenham
incluído casos não diagnosticados de trombose de seios venosos cerebrais.
Doenças
A hipertensão arterial sistêmica é constatada em 14% a 32% dos pacientes e um estudo
mostrou que a pressão arterial era significantemente maior nos indivíduos com hipertensão
intracraniana idiopática que nos controles. A síndrome do ovário policístico parece ocorrer
numa freqüência maior na hipertensão intracraniana idiopática. Outras comorbidades
descritas incluem diabete mellitus, doença tireoidiana, hipoparatireoidismo, AVC,
enxaqueca, anemia ferropriva, colite ulcerativa, lupus eritematoso sistêmico, entre outras,
embora não possa ser excluída a possibilidade de trombose de seios venosos cerebrais não
diagnosticada ou, simplesmente, uma mera coincidência.
Gravidez
A gravidez tem sido tradicionalmente vinculada com um risco aumentado de hipertensão
intracraniana idiopática. Recentemente, esta relação tem sido investigada mais
criteriosamente e não tem se mostrado ser significante.
Disfunção menstrual
A queixa de disfunção menstrual é mais freqüente na hipertensão intracraniana idiopática.
Entretanto, não há evidências de qualquer disfunção hormonal específica para explicar esse
achado; por outro lado, a própria obesidade é sabidamente associada a irregularidade
menstrual.
Patogênese – Mecanismos de elevação da pressão intracraniana
O LCR é produzido numa taxa de 500 mL nas 24 horas, sendo todo o volume renovado a
cada 6-8 horas.
A idéia inicial de que a hipertensão intracraniana idiopática fosse resultante da
hiperprodução de LCR tem sido descartada pelos estudos não relevando qualquer diferença
na taxa de produção do LCR entre os pacientes e seus controles. Adicionalmente, a única
condição em que ocorre hipersecreção do LCR (papiloma de plexo coróide na infância)
não acarreta quadro clínico similar ao de hipertensão intracraniana idiopática.
A hipótese mais aceita é de que a hipertensão intracraniana idiopática seja conseqüente à
redução da reabsorção do LCR, confirmada por evidências de retardo na circulação do
LCR por cisternografia com isótopos radioativos.
Características Clínicas
A cefaléia é a queixa mais freqüente, ocorrendo em 68% a 98% dos casos, com
características semelhantes à enxaqueca ou à cefaléia tensional ou, então, com indícios de
hipertensão intracraniana, isto é, exacerbação com tosse, esforço ou manobra de Valsalva.
A alteração visual é a segunda manifestação mais freqüente; 57% a 72% dos pacientes
referem escurecimento transitório por segundos a minutos. Outros quadros menos comuns
são diplopia, fotopsia ou sensação de flashes.
A queixa de barulhos na cabeça é freqüente, muitas vezes de caráter pulsátil.
Papiledema é quase sempre presente na hipertensão intracraniana idiopática e sua ausência
coloca em dúvida o diagnóstico.
A avaliação dos campos visuais por mera confrontação pode não ser suficientemente
acurada e a realização da campimetria formal é mandatória para detecção de déficit de
campo visual ou alargamento da mancha cega. O grau de comprometimento de campo não
tem sido correlacionado com a gravidade do papiledema.
Embora seja menos freqüente que o déficit de campo, pode também ocorrer redução da
acuidade visual.
Os critérios mais recentes do diagnóstico de hipertensão intracraniana idiopática exigem
que o exame neurológico seja inteiramente normal, exceto pela presença de sinais de
hipertensão intracraniana generalizada e de papiledema.
Investigação
A hipertensão intracraniana idiopática é um diagnóstico de exclusão. Embora inexistam
sinais radiológicos patognomônicos, a sela túrcica vazia e a diminuição da dimensão
ventricular podem ser presentes. A trombose de seio venoso cerebral deve ser descartada,
pois pode ter a mesma manifestação clínica da hipertensão intracraniana idiopática e, para
isso, é recomendável a avaliação da fase venosa da tomografia computadorizada ou da
ressonância magnética.
A medida da pressão do LCR é imprescindível nos casos suspeitos de hipertensão
intracraniana idiopática e a punção lombar é procedimento seguro nos pacientes
conscientes, sem sinais localizatórios e com exames de neuroimagem normais, mesmo na
presença de papiledema. O critério diagnóstico exige que a composição do LCR seja
inteiramente normal. A pressão deve ser medida em decúbito lateral, sendo anormais
valores superiores a 25 cm de H20. O registro contínuo revela que na hipertensão
intracraniana idiopática a pressão do LCR oscila durante o dia, podendo ocasionalmente
cair para níveis normais. Portanto, teoricamente, uma mensuração isolada pode não revelar
um valor elevado de pressão.
Tratamento
O objetivo do tratamento é evitar a perda visual. Uma revisão sistemática de Cochrane, de
2005, não identificou qualquer ensaio randomizado e controlado de tratamento. A prática
atual consiste na combinação de medicamentos, recomendação de redução do peso, caso
indicado, e intervenção cirúrgica nos casos mais graves. As punções repetidas do LCR
tinham como base a redução da pressão intracraniana. Um estudo mostrou, no entanto, que
embora a remoção de 15-25 ml de LCR tenha reduzido a pressão abaixo de 10 cm de H20,
seu efeito era efêmero, perdurando por apenas 82 minutos, em média. Apesar disso, as
punções repetidas poderiam desempenhar um papel no tratamento imediato de
comprometimento agudo da visão até que se possa programar um esquema terapêutico
adequado.
Tratamento medicamentoso
A acetazolamida, inibidor da anidrase carbônica, é o medicamento mais comumente
utilizado no tratamento. Pacientes tomando acetazolamida referem com freqüência náusea,
fadiga, distúrbios da gustação e parestesias. Outros diuréticos, tais como furosemida,
podem sem prescritos se a acetazolamida não for bem tolerada.
Os costicosteróides melhoram os sintomas e sinais de hipertensão intracraniana, mas os
relatos são apenas de séries pequenas de casos. As reações adversas, especialmente o
ganho de peso, limitam enormemente seu uso.
Outros medicamentos podem ser necessários para combater a dor da hipertensão
intracraniana idiopática, como analgésicos e drogas antimigranosas.
Redução de peso
Acredita-se que a redução de peso possa melhorar a evolução da hipertensão intracraniana
idiopática em indivíduos com sobrepeso. Vários autores têm descrito resolução do
papiledema com a redução de peso por modificação da dieta. A redução de peso por meio
cirúrgico também é considerada útil para melhora da hipertensão intracraniana idiopática.
Entretanto, as evidências são limitadas e são necessários estudos futuros para avaliação dos
métodos, quantificação e a velocidade da perda de peso.
Conduta cirúrgica
Alguns pacientes requerem intervenção cirúrgica no controle dos sintomas e na prevenção
do comprometimento visual. No passado, indicava-se a descompressão subtemporal, mas
este procedimento foi substituído por intervenções menos agressivas. Atualmente, as duas
principais cirurgias são derivação do LCR e fenestração da bainha do nervo óptico. Não há
qualquer estudo prospectivo comparando os dois procedimentos e a decisão é
freqüentemente baseada na disponibilidade local. A indicação do tratamento cirúrgico deve
ser considerada se o paciente apresentar perda visual ou se houver deterioração da função
visual. A intervenção cirúrgica está também indicada nos casos de insucesso do tratamento
medicamentoso e na cefaléia refratária.
Derivação do LCR
Atualmente, o procedimento padrão na prática clínica é a interposição de derivação
ventrículo-peritoneal ou lombo-peritoneal. Contudo, a taxa de obstrução necessitando de
revisão de válvula é elevada, assim como de complicações (cefaléia por
hiperfuncionamento, infecções, complicações cirúrgicas gerais). Apesar disso, a derivação
realizada por um neurocirugião experiente é efetiva para todas as manifestações da
hipertensão intracraniana idiopática.
Fenestração da bainha do nervo óptico
O nervo óptico é descomprimido através desse procedimento. O mecanismo de ação é
incerto, mas deve estar relacionado à formação de uma fístula crônica evitando a
transmissão da elevada pressão do LCR ao nervo óptico. Para um cirurgião oftalmológico
experiente, é uma intervenção relativamente simples e, diferentemente da derivação, não
envolve qualquer corpo estranho. As complicações são habitualmente benignas e
transitórias, embora possam ocorrer problemas oculares graves e nem sempre a cirurgia é
exitosa. A visão pode deteriorar muitos anos após e, mesmo com melhora inicial, pode ser
necessária a realização da derivação do LCR para o tratamento de cefaléia refratária e da
perda progressiva da visão.
Acompanhamento evolutivo
Não há um consenso sobre como monitorizar pacientes com hipertensão intracraniana
idiopática ou sobre quais parâmetros clínicos são mais confiáveis para a identificação do
risco da perda visual. A mensuração repetida da pressão do LCR é raramente indicada pela
inconveniência aos pacientes e pela ampla variação pressórica. A prática atual inclui a
avaliação dos sintomas e da acuidade visual, exame do disco óptico e campimetria
instrumental. Esta última é o método mais preciso para a identificação da perda visual e
tem mostrado maior sensibilidade estatística que os demais meios.
Prognóstico
Para a maioria dos casos, a denominação anterior como sendo uma condição benigna é
perfeitamente cabível, sem comprometimento visual a longo prazo. Entretanto, para uma
pequena, mas significante parcela de pacientes com hipertensão intracraniana idiopática, a
evolução é mais agressiva. A amaurose ocorre em 8% a 10% em pelo menos um dos olhos
e algum grau de comprometimento visual é observado em quase 50% dos pacientes. Não
foi constatada qualquer correlação consistente entre a perda visual e faixa etária, sexo, peso
corporal, uso de anticoncepcionais, tratamento com corticosteróides, pressão inaugural do
LCR, duração e tipo dos sintomas e cronicidade do papiledema.
Pode haver recorrência da hipertensão intracraniana idiopática meses ou anos após
resolução do quadro inicial, inexistindo qualquer fator preditivo identificável. Essa
possibilidade faz com que seja recomendável o acompanhamento cuidadoso dos pacientes
mesmo daqueles assintomáticos.
São necessários no futuro estudos randomizados, controlados e metodologicamente bem
desenhados para determinação dos meios mais eficazes de tratamento e seguimento dos
pacientes com hipertensão intracraniana idiopática.
Seizure versus syncope. McKeon A et a. Lancet Neurol, 5: 171, 2006.
Um dos problemas mais freqüentes e desafiadores na medicina é o atendimento de
pacientes com perda súbita e transitória da consciência. Os possíveis diagnósticos são:
crise e síncope. Esta última é definida como perda da consciência e do tonus postural por
hipoperfusão cerebral com recuperação espontânea.
No atendimento, os detalhes do episódio são escassos, pois o paciente pode ter amnésia e o
acompanhante não ter testemunhado pessoalmente e o diagnóstico pode ser de difícil
estabelecimento mesmo após investigação através de múltiplos exames complementares.
Pode também haver fatores geradores de confusão diagnóstica nos episódios de síncope
convulsiva, que é uma reação semelhante à crise, resultado da hipoperfusão cerebral
global; isto ocorre em torno de 12% dos casos de síncope. Um estudo de monitoramento
por vídeo mostrou que a mioclonia ocorre freqüentemente na síncope, assim como outros
movimentos vistos classicamente na epilepsia, tais como automatismos e desvio cefálico.
Os episódios de perda da consciência são muito freqüentes nas unidades de emergência; a
síncope é responsável por 3% dos atendimentos e 6% das internações. A incidência da
epilepsia é de 30/100.000 habitantes, atingindo a cifra de 62/100.000 habitantes nos
indivíduos acima de 65 anos de idade. A síncope é mais freqüente na população idosa:
23% das pessoas acima de 70 anos têm esses episódios, num período de 10 anos,
comparados com 15% nos jovens abaixo de 18 anos. Num estudo prospectivo com 650
pacientes com síncope, a taxa de letalidade foi de 9% dentro de um período de 18 meses.
Embora a síncope tenha um bom prognóstico, os pacientes com doença cardiovascular
subjacente apresentam uma taxa de mortalidade de até 30% em um ano. Muitos indivíduos
têm recorrência de síncopes, sem identificação da causa. Nos estudos de desfecho
diagnóstico, 25% a 42% dos pacientes com síncope ficaram, ao final, sem elucidação
etiológica, com altos níveis de disfunção física, psicológica e social. Adicionalmente, a
aderência às recomendações sobre condução de veículos entre os que apresentam síncope é
muito baixa, cerca de 7%. A investigação de perdas súbitas e recorrentes da consciência é
onerosa e é ineficaz, a menos que seja direcionada por uma boa história clínica e exame
físico. Num estudo austríaco, o custo mediano da avaliação desses indivíduos foi de
€7.756, com 38% deles sem um diagnóstico estabelecido.
História clínica e exame físico
A obtenção de uma boa história clínica com o paciente e com as testemunhas desempenha
um papel primordial. Os detalhes são úteis na distinção entre crise e síncope e Sheldon et
al. (J Am Coll Cardiol, 46: 142, 2002) propuseram um protocolo de pontuação, baseado
apenas nos sintomas, com sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de crises de
94%. Inclui informações como mordedura da língua, déjà vu ou jamais vu, stress
emocional associada com a perda da consciência, desvio cefálico, ausência de resposta,
postura estranha, movimentos dos membros, amnésia, confusão pós-ictal, tontura, sudorese
antes do evento, associação com permanência prolongada de pé, etc. A informação de
sensação epigástrica ascendente, distúrbio do olfato ou da gustação, sensação de déjà vu
precedendo o episódio correspondem provavelmente a uma crise do lobo temporal.
Palpitações ou dor pré-cordial apontam para uma doença cardíaca subjacente. A perda da
consciência precedida por tonturas, sudorese profusa, náusea, distúrbios da visão ou da
audição e sensação de desfalecimento, particularmente após permanência prolongada de
pé, é provavelmente uma síncope neurocardiogênica. Se o episódio for precipitado por
micção, defecação ou dor, o diagnóstico provável é de síncope situacional. A síncope
causada por estenose aórtica ou cardiomiopatia obstrutiva hipertrófica pode estar
relacionada ao exercício. Na síncope convulsiva, podem surgir sintomas do tipo náusea,
tontura e sensação de desfalecimento, sudorese profusa e palidez, antes da perda postural,
seguida por convulsão.
O exame cardiovascular pode revelar uma anormalidade do ritmo cardíaco ou valvular e o
registro da pressão ortostática uma hipotensão postural. O exame neurológico pode revelar
uma anormalidade localizada, suspeita de um possível foco epileptogênico.
É apresentada uma tabela, apontando as principais causas de síncope e de crises. A síncope
neurocardiogênica é muito freqüente; num estudo com 641 pacientes com síncope, 43%
tinham essa causa.
Crises não-epilépticas psicogênicas e pseudo-síncopes psicogênicas
Os distúrbios psicológicos podem se manifestar como uma crise ou episódio sincopal. Esta
origem é constatada em um terço dos casos em clínicas de síncope e em até 30% dos
pacientes com “crises refratárias” em serviços de monitoramento por vídeo-EEG. Embora
a suspeita do diagnóstico de crises não-epilépticas psicogênicas surja pela combinação de
fatores tais como a semiologia das crises, traços de personalidade, antecedentes
psiquiátricos ou de trauma ou abusos, a confirmação depende de EEG ou de vídeo-EEG.
Ocasionalmente, esses eventos são observados durante o tilt-table teste na ausência de
alterações nos parâmetros cardiovasculares.
Investigação com Exames Complementares
O artigo apresenta um algorritmo de investigação através de exames complementares. The
European Society of Management of Syncope recomenda a internação para investigação de
qualquer paciente atendido por síncope que tenha doença cardíaca, alguma anormalidade
no ECG, síncope causando traumatismo grave, síncope durante exercício, ou história
familiar de morte súbita. Pacientes com síncope secundária a arritmia, isquemia cardíaca,
ou com síncope neurocardiogênica que necessite de marcapasso devem também ser
hospitalizados para o tratamento.
Os exames laboratoriais básicos devem ser realizados para exclusão de anemias, infecção,
distúrbio eletrolítico, disfunção renal e hepática, embora os dados bioquímicos rotineiros
no sangue tendam a ser de pouca valia. A prolactina sérica não é confiável na distinção
entre crise epiléptica e síncope, mas é útil para diferenciar crises epilépticas de crises nãoepilépticas psicogênicas.
O ECG de 12 canais é absolutamente mandatório, pois pode revelar a causa específica de
síncope como bloqueio de ramo, bloqueio A-V, hipertrofia ventricular esquerda e síndrome
de QT longo. Entretanto, num estudo recente avaliando as unidades de emergência dos
Estados Unidos, apenas 59% dos pacientes com síncope tinham sido submetidos ao ECG.
O EEG de 30 minutos é útil quando há uma suspeita de epilepsia. O momento adequado
para o exame é importante; 50% dos pacientes com presumível crise convulsiva
generalizada apresentam EEG anormal nas primeiras 24 horas. No entanto, se o exame for
realizado em 48 horas, apenas 21% a 34% apresentam atividades epileptiformes. Nos casos
em que esteja havendo dificuldades na distinção entre síncope convulsiva e epilepsia, o
EEG realizado durante o tilt-table test pode ser elucidativo.
Na ausência de trauma, a tomografia computadorizada ou a ressonância magnética deve ser
reservada aos pacientes com suspeita de primeira crise não provocada ou com algum
déficit neurológico.
O Tilt-table testing, que induz stress ortostático causando diminuição do retorno venoso, é
amplamente utilizado na avaliação de sincope neurocardiogênica.
O teste eletrofisiológico baseado em cateter cardíaco, a monitorização cardíaca pelo
Holter, preferencialmente por um período de 48h ou 72 h. e o vídeo-EEG podem ser
também úteis.
Tratamento
Na síncope neurocardiogênica, algumas medidas conservadoras tais como ingerir líquidos,
evitar fatores predisponentes e deitar aos primeiros sintomas prodrômicos são importantes.
A contração isométrica da musculatura dos membros aos primeiros sintomas pode
interromper o episódio por reforçar o retorno venoso. Os beta-bloqueadores são as drogas
mais comumente utilizadas. Apesar da esperança inicial de que atenolol e metoprolol
pudessem reduzir a freqüência de síncopes, a recorrência de síncopes neurocardiogênicas
em pacientes tratados com atenolol foi similar ao do grupo placebo. Várias outras drogas
(medodrine, fludrocortisona, etilefrina, parxetina) têm sido testadas, mas com resultados
duvidosos. Os trabalhos com o uso de marcapasso permanente produziram resultados
conflitantes. De qualquer modo, a síncope neurocardiogênica é habitualmente um quadro
benigno, não havendo necessidade de colocação de marcapasso, a menos que os episódios
sejam muito freqüentes.
Os antiepilépticos estão indicados nos indivíduos com diagnóstico de epilepsia. Cerca de
50% do pacientes têm as crises controladas com o primeiro medicamento. Outros 20%
tornam-se livres de crises com um segundo ou terceiro medicamento e os 30% restantes
desenvolvem epilepsia refratária. A escolha do medicamento é fundamentada no tipo de
crises ou de epilepsia, sexo, idade reprodutiva, medicação concomitante e presença de comorbidades relevantes.
Ictal eye closure is a reliable indicator for psychogenic seizures. Chung SS et al.
Neurology, 66: 1730, 2006.
As crises não epilépticas psicogênicas são freqüentes entre os pacientes com possível
epilepsia, com uma taxa de prevalência de 5% a 20% da população epiléptica ambulatorial
e de 10% a 40% daqueles internados em centros de epilepsia. Essas crises são rotuladas
como “pseudocrises”ou “crises psicogênicas”, implicando uma etiologia de natureza
psicológica. Representam um desafio para o diagnóstico pela dificuldade na distinção entre
eventos epilépticos e não epilépticos, pela possível ocorrência de ambos num mesmo
indivíduo e pela elevada freqüência de distúrbios da personalidade ou de doenças
psiquiátricas. O retardo na distinção pode acarretar conseqüências ao indivíduo como o uso
desnecessário de medicamentos antiepilépticos e seus efeitos adversos, demora no
tratamento adequado, limitações profissionais e restrição para a condução de veículos.
Estudos prévios identificaram alguns movimentos estereotipados nas crises psicogênicas,
tais como impuxo pélvico e arqueamento para trás, mas estes achados são baseados no
monitoramento prolongado, com persistência da dificuldade diagnóstica nos pacientes
ambulatoriais.
O objetivo deste trabalho é determinar se a permanência com olhos abertos ou fechados
durante a crise pode ser um sinal confiável para diferenciar entre ambos os eventos.
Os dados de 234 pacientes consecutivos submetidos ao monitoramento prolongado de
vídeo-EEG no Instituto Neurológico Barrow, em Phoenix, Arizona, foram analisados
retrospectivamente. As drogas antiepilépticas foram reduzidas ou suspensas para o
desencadeamento de crises para fins diagnósticos. Foram analisadas 939 crises de 221
pacientes. Cinqüenta e dois pacientes (23,5%) tinham crises não epilépticas psicogênicas e
156 (70,6%) eventos epilépticos. Houve franco predomínio do sexo feminino entre os que
apresentaram crises psicogênicas, numa proporção de 3:1. Em contraposição, não houve
diferenças no gênero nos que apresentaram crises epilépticas.
Entre aqueles com crises psicogênicas, 50 dos 52 pacientes ocluíram as pálpebras durante o
evento. A maioria deles permaneceu dessa forma durante toda a duração da crise e alguns
fecharam os olhos de forma forçada franzindo a face. Em contraste, 152 dos 156 pacientes
com epilepsia tinham seus olhos amplamente abertos ou desviados para um dos lados no
início das crises. Durante a fase de contrações tônico-clônicas, o piscamento dos olhos foi
seguido por confusão pós-ictal e fechamento das pálpebras, mesmo embora seus olhos
estivessem abertos no início. Mesmo quando as crises surgissem durante o sono, muitos
pacientes abriam seus olhos no início no quadro.
No total, o fechamento das pálpebras indicou uma alta probabilidade de crises não
epilépticas psicogênicas, com um valor preditivo positivo de 0,943 (sensibilidade de 96,2%
e especificidade de 98,1%). Adicionalmente, a abertura ocular ictal teve também um
elevado valor preditivo positivo, de 0,987 para crises epilépticas verídicas (sensibilidade de
98,1% e especificidade de 96,2%).
Os achados indicam que a presença da abertura ocular ou o seu fechamento durante a crise
é uma característica clínica altamente confiável na diferenciação das crises não epilépticas
psicogênicas das genuinamente epilépticas.
Portanto, a obtenção de uma história clínica cuidadosa sobre as características
semiológicas da crise de pacientes ambulatoriais, questionando sobre a abertura ou
fechamento dos olhos, pode permitir o correto esclarecimento da natureza do evento.
Lunar phases and seizure occurrence: just an ancient legend? Polychronopoulos P. et
al. Neurology, 66: 1442, 2006.
Através dos séculos, as fases lunares foram consideradas como capazes de afetar o
comportamento humano, particularmente no desencadeamento de distúrbios psiquiátricos e
crises epilépticas. Os estudos prévios dos ciclos lunares e os fenômenos biológicos são
conflitantes. Os pacientes acreditam que as crises epilépticas são precipitadas ou agravadas
na lua cheia e 80% das enfermeiras e 64% dos médicos das unidades de emergência crêem
que a lua interfira efetivamente na saúde mental dos pacientes.
Os autores realizaram um estudo retrospectivo objetivando a avaliação da eventual
associação entre as fases lunares e a indução de crises.
No período de 1999 a 2003, foram atendidos 12.156 casos neurológicos na Unidade de
Emergência do Hospital Universitário de Patras, Grécia, sendo 859 por crises epilépticas.
Do total, 34,2% ocorreram nos dias de lua cheia, numa freqüência significativamente
maior que nas outras fases lunares, variando de 21,4% a 22,5%; não houve predomínio da
ocorrência diurna ou noturna. Quanto a outras modalidades de eventos neurológicos não
epilépticos (cefaléia, enxaqueca, AVC, vertigem e síndrome de Guillain-Barré) não houve
predomínio nos dias de lua cheia.
Concluem os autores que houve uma elevada freqüência de crises nos dias de lua cheia,
durante todos os anos do estudo e em ambos os sexos, confirmando uma antiga crença
popular.
Tension-type headache: the most common, but also the most neglected headache
disorder. Bendtsen L et al. Curr Opin Neurol, 19: 305, 2006.
A cefaléia tensional é a forma mais comum de cefaléia. Muitas pessoas consideram-na uma
cefaléia “normal”, em contraste com a enxaqueca. Os custos diretos devidos aos serviços
médicos e medicamentos são maiores com a cefaléia tensional que com a enxaqueca,
decorrentes da maior prevalência. São relatados prejuízos na produtividade do trabalho e
nas atividades sociais em até 60% das pessoas com cefaléia tensional. Um recente estudo
apontou uma elevação da freqüência de absenteísmo por cefaléia tensional, mas não por
enxaqueca. Assim, embora não seja o tipo mais destacado de doença, é uma das mais
onerosas para a sociedade. Mas, ao mesmo tempo, é o tipo menos estudado de cefaléia.
A cefaléia tensional é caracterizada por uma dor bilateral, do tipo aperto, de intensidade
moderada ou acentuada. Não apresenta as características típicas da enxaqueca tais como
vômitos, piora com a atividade física, ou fotofobia ou fonofobia. Durante décadas, a falta
de critérios adequados de diagnóstico e de um marcador biológico constituiu sério
obstáculo para a pesquisa da cefaléia tensional. Em 1988, a noção de cefaléia tensional foi
introduzida na Classificação Internacional das Cefaléias, podendo ser separada nas formas
esporádica e crônica. Uma segunda versão da Classificação Internacional subdividiu a
forma episódica em infrequente (menos de 12 dias com dor/ano) e freqüente (entre 12 e
180 dias/ano). A forma episódica infrequente tem pouco impacto individualmente; seria
um fenômeno normal e não propriamente uma doença, e pode estar relacionada como
trivial, sem a necessidade de atendimento médico. Entretanto, os pacientes com episódios
freqüentes podem apresentar considerável incapacidade e necessitar uma intervenção
específica. A forma crônica difere da episódica na fisiopatologia, insucesso com a maioria
dos esquemas terapêuticos, maior abuso de medicamentos, maior incapacidade e custos
individuais e sócio-econômicos mais expressivos. Na classificação revisada, podem ser
caracterizados dois subgrupos: abuso de medicamentos e a cefaléia persistente diária, que
tem um início agudo e é refratária ao tratamento. Assim, classificação revisada permite um
diagnóstico mais preciso com relação à freqüência e impacto, abuso de medicamentos e
evolução temporal da cefaléia.
Epidemiologia
A prevalência da cefaléia tensional pode atingir valores de até 89% ao longo da vida, mas a
grande maioria das pessoas teria por um dia por mês, e pode ser agora classificada como
tendo a forma episódica infrequente. Num estudo recente, a avaliação da cefaléia tensional
em dois momentos distintos, separados por um intervalo de 12 anos, revelou um aumento
da freqüência de 79% para 87%, com elevação mais pronunciada da sub-forma episódica
freqüente de 29% para 37%. Os fatores de risco para este incremento foram pior condição
de saúde, incapacidade de relaxar após o trabalho e distúrbios do sono. Tais achados são
importantes, pois indicam novos meios de prevenção e tratamento da cefaléia tensional. O
mesmo estudo permitiu avaliar, pela primeira vez, a taxa de incidência num estudo
longitudinal. A incidência anual da cefaléia tensional freqüente foi de 14,2 por 1.000
indivíduos, com uma proporção de 2,6 mulheres para 1 homem. A incidência declinou de
forma consistente com a idade, cuja importância está na necessidade de um paciente idoso
referindo uma cefaléia freqüente e de instalação recente ser submetido a uma investigação
através de exames complementares.
Fisiopatologia
A cefaléia tensional é geralmente relacionada a conflitos emocionais e ao stress psicosocial, mas, como na enxaqueca, a relação causa-efeito não está clara. O perfil de
personalidade é predominantemente normal nos indivíduos com a forma episódica, mas os
estudos com a forma crônica revelam maior freqüência de depressão e de ansiedade.
Tratamento
O tratamento não farmacológico é amplamente utilizado no tratamento da cefaléia
tensional, principalmente a fisioterapia.
Os analgésicos comuns são eficazes na cefaléia tensional episódica (cautela pela evitar seu
uso abusivo), mas ineficazes na forma crônica. Há evidências a favor da eficácia da
profilaxia com amitriptilina na cefaléia crônica, mas não dos inibidores seletivos da
recaptação de serotonina, na ausência de depressão. Mirtazapina, um antidepressivo
noradrenérgico e serotoninérgico, parece ser igualmente eficaz e melhor tolerado que a
amitriptilina. De qualquer modo, nenhum deles é bem tolerado por todos os pacientes,
havendo necessidade de novos medicamentos ou modalidades terapêuticas.
Health effects of ionising radiation from diagnostic CT. Martin DR et al. Lancet, 367:
1712, 2006.
Antigamente, os grupos ocupacionais expostos à radiação ionizante eram radiologistas e
técnicos em radiologia. Esses profissionais empregados antes de 1950, quando a exposição
à radiação da fluoroscopia era elevada, apresentavam alta taxa de mortalidade por câncer.
Desde o advento dos primeiros equipamentos comerciais de tomografia computadorizada
(TC), em 1972, este exame passou a ser a principal fonte de radiação médica. Estimativas
conservadoras indicam que mais de 60 milhões de exames de TC foram realizadas em
2002 nos Estados Unidos, representando um total de 70% de todos os exames com
exposição ao raio X. A exposição à radiação ionizante de uma simples TC de abdômen ou
do tórax pode ser associada com elevado risco de dano no DNA e formação de câncer. O
VII Relatório da Academia Nacional de Ciências sobre os Efeitos Biológicos da Radiação
Ionizante, documento mais recente de uma organização altamente respeitada, afirmou que
uma dose única de 10 mSv é associada a um risco de desenvolvimento de um câncer sólido
ou de leucemia de 1 em 1.000, ao longo da vida. O risco total de desenvolvimento de um
câncer sólido ou leucemia de todas as causas seria de 42 em 100. Os tecidos mais sensíveis
são predominantemente aqueles dentro do campo de visão de TC de tórax, do abdômen e
da pelve. A dose de um exame convencional de TC de abdômen é de 10 a 20 mSv,
enquanto a da mama, durante a angiografia por TC da artéria pulmonar, de 20 mSv.
Infelizmente, muitos pacientes são submetidos a múltiplos exames o que aumenta a dose
cumulativa. Um estudo recente mostrou que um grupo de pacientes com litíase renal tem
uma taxa de exposição total entre 19,5 e 153,7 mSv.
Muitos médicos nas unidades de emergência desconhecem os efeitos potencialmente
deletérios da exposição por radiação de TC; apenas 9% deles eram cônscios do risco
aumentado de câncer. Os radiologistas realizando exames de TC não estão preocupados
com a exposição à radiação; apenas 47% estavam familiarizados com o risco elevado de
câncer e muitos deles desconheciam a dose de radiação emitida aos pacientes durante o
exame.
Se os próprios médicos desconhecem os riscos da radiação associada a TC, não é nada
surpreendente que os perigos não sejam adequadamente explicados aos pacientes antes da
obtenção do consentimento para a realização do exame. Para fins de comparação, o risco
de complicações e de óbito do contraste endovenoso da TC é estimado em cerca de 1 em
400.000, o que é muito inferior ao risco atribuído de uma carga única de 10 mSv. Essa
inversão de valores pode ser imputada à relação causal, pois os sintomas do contraste
surgem imediatamente após sua administração. Os efeitos da radiação, em contrapartida,
ocorrem de 5 a 20 anos após a TC e o elo causal pode passar desapercebido.
Tendo em vista os riscos da TC, há algumas sugestões. Primeiro, o ultra-som e a
ressonância magnética são mais seguros na investigação por imagem do abdômen e da
pelve. Segundo, a dose de TC deveria ser reduzida de forma significativa, focando a
atenção em detalhes como uma maior restrição do campo de visão à área de interesse,
ajuste da dose de acordo com a idade e dimensão corporal, utilização de TC de único ao
invés de múltiplos cortes (multiple passes). Terceiro, os fabricantes deveriam desenvolver
equipamentos automatizados com mecanismos de redução de dose. Quarto, os órgãos
governamentais deveriam ter uma atuação mais rigorosa, determinando normas específicas
sobre as doses máximas aceitáveis e indicações precisas de TC. Por exemplo, é
absolutamente inaceitável a realização de screening de TC de todo o corpo, expondo
indivíduos normais a riscos conhecidos com benefícios questionáveis.
Comentário Embora este artigo explicite TC de tórax, da pelve e do abdômen, é de
extrema importância para os neurologistas, pois todo o raciocínio é igualmente válido para
o de crânio. E, na nossa prática diária, certamente estamos solicitando este exame de forma
excessiva, a julgar pelos resultados normais. É também incontestável que indicamos com
enorme freqüência o que denominamos “TC de controle”.
Scale for the assessment and rating of ataxia. Development of a new clinical scale.
Schitz-Hübsch T et al. Neurology, 66: 1717, 2006.
Com o enorme progresso na compreensão da patogênese molecular de muitas doenças
atáxicas, a perspectiva de novas modalidades terapêuticas exige meios adequados de
avaliação dos ensaios clínicos. E um pré-requisito é a disponibilidade de métodos
validados de avaliação neurológica para mensurar o grau de ataxia. A escala ICARS –
International Cooperative Ataxia Rating Scale, a mais amplamente utilizada no momento,
apresenta problemas de aplicabilidade e de estrutura na sub-escala para a avaliação mais
detalhada, pondo em dúvida a conveniência de seu uso nos futuros ensaios
intervencionistas. A recentemente proposta escala – Friedreich’s Ataxia Rating Scale é
específica para a avaliação da doença de Friedreich e não é aplicável às ataxias cerebelares.
Um grupo de neurologistas europeus criou uma nova escala de avaliação semiquantitativa
de ataxia cerebelar, SARA – Scale for the Assessment and Rating of Ataxia, composta de 8
itens (os detalhes estão no Web site de Neurology: www.neurology.org).
Esta escala foi testada em dois ensaios com 167 e 119 pacientes com ataxia
espinocerebelar. O tempo médio para efetuar SARA foi de 14,2 minutos. Os níveis de
concordância inter-avaliador e intra-avaliador (no re-teste), foram elevados, configurando
SARA como uma escala confiável e válida para mensuração do grau de ataxia nos futuros
estudos clínicos.
Neoplastic meningitis. Gleissner B et al. Lancet Neurol, 5: 443, 2006.
A meningite neoplásica é uma complicação do SNC que ocorre em 3% a 5% dos pacientes
com câncer e é caracterizada por sinais e sintomas neurológicos multifocais. O diagnóstico
é problemático porque apresenta manifestações pleomórficas e concomitância de
envolvimento de outros locais. Os exames úteis para o diagnóstico e tratamento incluem a
ressonância magnética do encéfalo e da medula espinhal, análise citológica do LCR e
estudos do fluxo do LCR com radioisótopos. É fundamental a avaliação da extensão da
doença no SNC pela repercussão no prognóstico. A radioterapia é benéfica na meningite
neoplásica com tumor de grande volume, incluindo metástase cerebral intraparenquimatosa
ou obstrução do trânsito do LCR. Pelo fato da meningite neoplásica afetar todo o
neuroeixo, o tratamento quimioterápico pode incluir a administração intratecal (por
intraventricular ou lombar) ou terapia sistêmica. A maioria dos pacientes (>70%) com
meningite neoplásica apresenta comprometimento sistêmico progressivo e,
conseqüentemente, o tratamento é paliativo e a resposta do tumor transitória. Pela ausência
de evidências consistentes a respeito benefício do tratamento agressivo multimodal na
sobrevida, há necessidade de estudos futuros sobre o efeito terapêutico no controle dos
sintomas neurológicos e na qualidade de vida dos pacientes.
Management of paraneoplastic neurological syndromes: report of an EFNS Task
Force. Vedeler CA et al. Eur J Neurol, 13: 682, 2006.
As síndromes paraneoplásicas foram inicialmente definidas como síndromes neurológicas
de causa desconhecida que freqüentemente antecipam o diagnóstico de um câncer
subjacente, habitualmente inaparente do ponto de vista clínico. Nas últimas duas décadas, a
descoberta da associação de muitas síndromes paraneoplásicas com anticorpos contra
antígenos neurais expressos pelo tumor (anticorpos onconeurais) sugere um processo
imunomediado. As síndromes paraneoplásicas são raras, ocorrendo em cerca de 1% dos
pacientes com câncer.
Este é um excelente artigo de revisão consensual preparado por um grupo de pesquisadores
da European Federation of Neurological Societies. Discute, em detalhes, os aspectos
diagnósticos e terapêuticos das seguintes síndromes paraneoplásicas: encefalite límbica,
neuronopatia sensitiva subaguda, degeneração cerebelar, opsoclônus-mioclônus, síndrome
miastênica de Lambert-Eaton e hiperexcitabilidade de nervos periféricos. A instituição
precoce do tratamento pode prevenir a progressiva morte neuronal e a irreversibilidade da
invalidez. Os anticorpos oncogênicos são de grande importância na investigação das
síndromes paraneoplásicas e podem ser úteis na localização do tumor. A imunoterapia é
habitualmente decepcionante nas síndromes do sistema nervoso central, mas pode ser
benéfica no envolvimento da junção neuromuscular.
Managing paraneoplastic neurological disorders. Beukelaar JW et al. The Oncologist,
11: 292, 2006.
As síndromes neurológicas paraneoplásicas representam efeitos remotos do câncer que não
são causadas pela invasão do tumor ou de metástases. Os fatores imunológicos parecem
desempenhar importante papel na patogênese pois têm sido identificados autoanticorpos
antineuronais e resposta de células-T contra antígenos do sistema nervoso. A resposta
imunológica é promovida pela expressão ectópica de antígenos neuronais pelo tumor. A
expressão dos assim denominados antígenos “onconeurais” é limitada ao tipo tumoral e o
sistema nervoso e, por vezes, ao testículo. Por ocasião do surgimento dos sintomas
neurológicos, a maioria dos pacientes não tem ainda um diagnóstico de câncer
estabelecido. A detecção de anticorpos antineoplásicos é extremamente útil para o
diagnóstico correto de uma síndrome neurológica inexplicável e de caráter rapidamente
progressivo. Adicionalmente, os anticorpos paraneoplásicos podem auxiliar no
direcionamento da busca de uma neoplasia subjacente. Por outro lado, nos pacientes
sabidamente portadores de câncer, a apresentação da síndrome paraneoplásica pode ser um
prenúncio de recorrência do tumor ou de uma segunda neoplasia. É cada vez maior o
número de anticorpos antineoplásicos, e pelo menos sete deles podem ser considerados
bem característicos. De acordo com o quadro clínico, o tipo de anticorpos e a presença ou
ausência de câncer, os pacientes podem ser classificados como tendo um diagnóstico de
síndrome paraneoplásica “definitivo” ou “possível”. Apesar da presumível etiologia
autoimune, os resultados das várias modalidades de imunoterapia são mormente
desapontadores, com algumas exceções. A rápida detecção e o imediato tratamento da
neoplasia parecem oferecer melhor condição para a estabilização do quadro e prevenção de
futura deterioração neurológica.
Guidelines on routine cerebrospinal fluid analysis. Report from an EFNS task force.
Deisenhammer F et al. Eur J Neurol, in press, 2006.
Este guia apresenta as recomendações da European Federation of Neurological Societies
sobre a análise de rotina do LCR, incluindo contagem celular, coloração de células,
proteínas totais, albumina, imunoglobulinas, glicose, lactato e a investigação de infecções.
A metodologia empregada foi a busca no Medline para essas variáveis, revisão dos artigos
publicados, catalogando os graus de evidência e recomendações, em busca de consenso
entre os membros da Força Tarefa. É recomendado que o LCR seja analisado
imediatamente após a coleta. Se pretender armazenar, um volume de 12 ml deve ser
dividido em 3 ou 4 tubos estéreis. O quociente de albumina (albumina LCR/soro) é
preferível à quantificação de proteínas totais e o limite superior de normalidade deve ser
ajustado de acordo com a faixa etária. Valores elevados do quociente de albumina é um
achado inespecífico, mas ocorre predominantemente nas meningites bacteriana,
criptocócica e tuberculosa, metástases leptomeníngeas, assim como nas polineuropatias
desmielinizantes aguda e crônica. A diminuição patológica da relação glicose LCR/soro ou
a elevação da concentração de lactato indicam meningite bacteriana ou fúngica, ou
metástases leptomeníngeas. A síntese intratecal de IgG é melhor demonstrada pelo método
de focalização isoelétrica seguida de coloração específica. A morfologia celular (coloração
citológica) deve ser avaliada na presença de pleocitose, metástases leptomeníngeas ou
suspeita de sangramento patológico. O sangramento intratecal com tomografia negativa
deve ser investigado pela detecção de bilirrubina.
Pneumococcal meningitis in adults: new approaches to management and prevention.
Weisfelt M et al. Lancet Neurol, 5: 332, 2006.
Desde a virtual erradicação da meningite por Haemophilus influenzae do tipo B através da
vacinação nos países desenvolvidos, a meningite pneumocócica passou a ser a principal
causa de meningites bacterianas fora do período neonatal. Nas últimas décadas, as
pesquisas clínicas e experimentais têm contribuído para melhorar nosso conhecimento
sobre a fisiopatologia e patogênese da doença. Apesar da disponibilidade de antibióticos
eficazes, dos cuidados gerais e os recentes avanços do emprego associado de
dexametasona, as taxas de morbidade e de letalidade da meningite pneumocócica
permanecem inaceitavelmente elevadas. Embora os resultados preliminares da vacina
conjugada pneumocócica sejam promissores, a incidência de cepas de pneumococo multiresistente tem apresentado elevação mundial. Os autores discutem os aspectos clínicos da
meningite pneumocócica no adulto, focalizando a fisiopatologia, e clamam por adoção
urgente de medidas preventivas adequadas e por novos tratamentos eficazes.
Meta-analysis: cysticidal drugs for neurocysticercosis: albendazole and praziquantel.
Del Brutto OH et al. Ann Intern Med, 145: 43, 2006.
Os trabalhos sobre o tratamento etiológico da neurocisticercose são controversos, com
questionamentos se as drogas cisticidas modificam a história natural da doença. O objetivo
do trabalho foi a realização de meta-análise dos ensaios randomizados avaliando o efeito
das drogas parasiticidas tendo como desfechos a neuroimagem e os aspectos clínicos dos
pacientes. Os trabalhos foram procurados no MEDLINE, no Cochrane Database e no
LILACS entre 1979 e 2005, sem restrição de língua. Foram identificados 11 estudos que
preencheram os critérios de seleção: 6 ensaios avaliaram 464 pacientes com lesões císticas
(cisticercos vesiculares) e outros 5 analisaram 478 casos com lesões com reforço (forma
coloidal). As lesões eram localizadas no parênquima cerebral ou no espaço subaracnóideo,
na convexidade dos hemisférios cerebrais. O tratamento medicamentoso esteve associado
com completa resolução das lesões císticas (44% vs 19%; p=0,025). Os ensaios com lesões
com reforço mostraram uma tendência de resolução, favorável ao uso de drogas cisticidas
(72% vs 63%; p=0,38), que se tornou estatisticamente significante quando foi excluído da
análise um trabalho considerado heterogêneo (69% vs 55%; p=0,006). O risco de
recorrência de crises foi menor após tratamento parasiticida nos pacientes com lesões com
reforço (14% vs 37%; p<0,001). O único trabalho avaliando a freqüência de crises em
pacientes com lesões císticas mostrou uma redução de 67% na taxa de crises generalizadas
(p=0,006). Concluem os autores que o tratamento medicamentoso parasiticida resulta em
melhor resolução de cisticercos vesiculares e coloidais e uma redução na taxa de crises
generalizadas nos pacientes com cisticercos vesiculares.
Fighting HIV. Lessons from Brazil. Okie S. N Engl J Med, 354: 1977, 2006.
Em 1996, numa decisão pioneira de combate ao HIV, o país decidiu distribuir
gratuitamente tratamento retroviral a todos o pacientes com aids. O programa
governamental, criticado por alguns como desencadeador de resistência medicamentosa do
HIV, tem sido aclamado internacionalmente como importante passo na luta contra a aids,
pois melhorou a saúde e prolongou a sobrevida de dezenas de milhares de brasileiros e
propiciou uma economia de $2,2 bilhões em gastos hospitalares, estimados entre 1996 e
2004. Adicionalmente, essa iniciativa inspirou outros países no esforço global de combate
à aids. Os Estados Unidos da América passaram a fornecer medicamentos contra HIV aos
países da África e do Caribe, e a Organização Mundial da Saúde criou a iniciativa 3 por 5,
que consiste na distribuição adicional de medicamentos antiretrovirais a 3 milhões de
pessoas até o final de 2005. Ainda, os esforços persistentes e agressivos na prevenção de
novas infecções pelo HIV desempenham papel até maior no controle da disseminação do
vírus. No início da década de 1990, o Brasil e a África do Sul estavam num estádio similar,
com uma prevalência da infecção pelo HIV de 1,5% entre adultos em idade reprodutiva.
Mas, em 1995, ano anterior ao início do programa brasileiro, a epidemia na África do Sul
tinha começado a explodir, com uma prevalência já superior a 10%, enquanto a taxa de
infecção no Brasil havia declinado à metade. Isto é, no momento da implantação do
programa de distribuição de medicamentos, o Brasil já tinha controlado a disseminação
epidêmica e apresentava uma prevalência relativamente baixa e estável. O êxito inicial dos
esforços de prevenção permitiu que o programa nacional de tratamento fosse
verdadeiramente confiável, limitando o número de pessoas infectadas. Por sua vez, a
disponibilidade de acesso gratuito à medicação antiretroviral sensibilizou o brasileiro a
efetuar o teste de HIV e a atentar para os tipos de comportamento associados com a
transmissão. Embora o Banco Mundial tivesse previsto no início da década de 1990 que o
Brasil teria 1,2 milhões de pessoas infectadas pelo HIV até 2000, as cifras atuais apontam a
existência de apenas 600.000 infectados. Os esforços preventivos dirigidos a populações de
alto risco atingiram sucesso impressionante, particularmente entre os usuários de drogas
injetáveis e profissionais do sexo, através de campanhas educativas. Outro aspecto positivo
foi a produção de medicamentos genéricos de antiretrovirais. Das 16 drogas atualmente
adquiridas pelo governo, o país manufatura 8. A produção local de genéricos e a
negociação de descontos das drogas importadas propiciaram uma redução de custos anuais
de $6.240/paciente em 1997 para $1.336/paciente em 2004. Entretanto, em 2005, o custo
médio aumentou para $2.500, como reflexo do crescimento de resistência do HIV, o que
motivou a discussão sobre a produção nacional de medicamentos protegidos por patente,
com obtenção de descontos expressivos ou de concessão de licenças voluntárias da
indústria farmacêutica.
DOENÇAS CEREBROVASCULARES
Dr. Jorge Noujain
Carotid artery calcification on CT may independently predict stroke risk. Kiran R et
al. Am J Roentgenol, 186: 547, 2006.
Introdução: o depósito de cálcio nas paredes dos vasos arteriais tem sido objeto de grande
interesse de pesquisa devido a evidência de seu efeito deletério com sua participação na
arteriosclerose e resultado clínico desfavorável. Exemplo de prevalência de aumento de
risco para morbidade e mortalidade ocorre com aumento de depósito cálcico medidos por
TC associados a estenose luninal coronária e sobrecarga de arteriosclerose coronariana.
Além disso, depósitos de cálcio na aorta abdominal detectados no Raio X lombar indicam
um aumento de risco de doença coronariana- cardiovascular com tb. maior mortalidade, o
mesmo acontecendo com depósitos de cálcio na aorta torácica que significam maior risco
de AVC isquêmico e doença coronariana. Devido à abrangência sistêmica da
arteriosclerose, os depósitos de cálcio nas artérias carótidas cervicais podem ter
importância similar no grau de estenose luminar e sintomas isquêmicos. Entretanto, poucos
estudos têm sido realizados para determinar o grau de depósitos de cálcio nas artérias
carótidas medidos por TC. Isto é explicado em parte pelo uso mais freqüente de
Ultrasonografia e Angioressonância dos vasos cervicais sendo limitada a identificação de
calcificação e do grau de espessura da parede cálcica através desses aparelhos.
Material e Métodos: o objetivo do estudo foi de avaliar quantitativamente o dano da
calcificação e arteriosclerose das artérias carótidas cervicais utilizando angiotomografia
computadorizada (MDCT) para determinar a relação do grau de estenose luminar e
sintomatologia.
O volume das placas de cálcio foi medido em 106 artérias carótidas cervicais (53)
pacientes em Angiografia MDCT. Dos 53 pacientes, 32 eram assintomáticos (idade média
de 70,2 com SD de 8,7 anos; 15 mulheres, 17 homens) e 21 pacientes sintomáticos com
sintomas isquêmicos (69,6 com SD de 12,9 anos; 8 mulheres, 13 homens). Por vaso,
constatou-se 43 estenoses de alto grau (≥ 60% pelo critério NASCET), 15 vasos de
estenose moderada (30 a 50%) e 44 vasos de estenose leve ou normal (0 – 29%). Quatro
vasos foram excluídos devido a endoarterectomia prévia.
Resultados: com identificação de fatores de risco cardiovascular e estenose luminal os
autores encontraram índices altos de sintomas isquêmicos (p=0.003). Mesmo considerando
idade como covariante, pacientes com alto grau de estenose apresentaram índices mais
altos do que comparado àqueles sem alto grau de estenose (p=0.004). O valor de predição
quanto à especificidade e positividade para estenose luminal de alto grau foi notadamente
inferior na análise individual dos vasos quando comparado à análise global dos mesmos,
provavelmente representando variabilidade no remodelamento dos vasos.
Conclusão: os índices de cálcio nas artérias carótidas cervicais podem representar um
marcador independente para estenose luminal e sintomas isquêmicos. Um estudo
longitudinal prospectivo dos níveis de concentração de cálcio e sua relação com morbidade
podem ser de valia a fim de examinar-se qual o papel da sobrecarga de depósito de cálcio
na estratificação de risco.
Small vessel abnormalities in alternating hemiplegia of childhood. Pathophysiologic
implications. Auvin S et al. Neurology, 66: 499, 2006.
Introdução: A patofisiologia da hemiplegia alternante da infância (AHC) é obscura. Os
autores avaliaram através de biópsias da pele e de músculo de pacientes com AHC a
presença de anormalidades vasculares.
Métodos: biópsia de pele de 4 pacientes nas idades de 18 meses, 8 anos, 9 anos e 18 anos e
de músculo e de músculo em 2 dos pacientes foram examinadas com microscopia
eletrônica e comparadas com estudo controle em pessoas normais.
Resultados: anormalidades vasculares foram encontradas em ambos especimens em todas
biópsias. Vacúolos foram identificados no endotélio. A anormalidade mais marcante foi a
presença de vacúolos intracitoplasmáticos nas células musculares lisas da túnica média dos
vasos e ocasionalmente núcleos apoptóticos com variações de acordo com a idade do
paciente. Além disso, estas células haviam perdido suas junções com as células vizinhas e
algumas estavam completamente isoladas. Nos vasos das biópsias musculares as células da
musculatura lisa revelaram vacúolos, depósitos de resíduos osmofílicos e perda dos
miofilamentos substituídos por vacúolos.
Conclusões: as anormalidades vasculares desses pacientes sugerem uma patofisiologia
vascular primária ou secundária para hemiplegia alternante da infância. As células
musculares lisas das paredes dos pequenos vasos podem ser o alvo inicial do
desenvolvimento da doença.
Discussão: Hemiplegia Alternante da Infância é uma doença rara de patofisiologia
desconhecida caracterizada por déficits episódicos da função neurológica. Apresenta-se em
três fases clínicas distintas: movimentos oculares anormais, acompanhados de episódios
distônicos; instalam-se depois ataques de hemiplegia com regressão da atividade
psicomotora e finalmente atraso no desenvolvimento neurológico com déficits
neurológicos definitivos completa a terceira fase.
As características clínicas típicas de AHC foram estabelecidas no Simpósio Internacional
sobre AHC em Roma em 1991: início antes dos 18 meses de idade; ataques repetitivos de
hemiplegia alternante; outros distúrbios paroxísticos incluindo ataques tônico-distônicos,
nistagmos, estrabismos e fenômenos autonômicos ocorrendo durante ataques de
hemiplegia ou isolados; resolução imediata de todos os sintomas durante o sono e
evidência de retardo do desenvolvimento.
Inicialmente pensou-se que esta doença fosse relacionada a enxaqueca com seu
equivalente, numa forma incomum de epilepsia ou a uma forma diferente de doença com
distúrbio dos movimentos. Outras etiologias foram sugeridas como disfunção mitocondrial,
canalopatias e disfunção cerebrovascular.
Estudos ultraestruturais dos vasos da pele e músculo revelam alterações das paredes dos
vasos, vacúolos no endotélio e anormalidades na túnica média sugerindo uma doença
sistêmica vascular.
Canalopatia tem sido levantada como hipótese pelo fato da apresentação paroxística
dominante nessa patologia e por ter flunarizina , antagonista dos canais de cálcio, como o
único agente benéfico capaz de reduzir a severidade e a duração dos ataques de hemiplegia
alternante.
Devido às similaridades clínicas de AHC com enxaqueca hemiplégica e ataxia episódica
tipo 2 condições estas com mutações na subunidade do gene CACNA1A do canal de cálcio
a1A o mesmo foi pesquisado nos 4 pacientes e foi negativo para sua presença.
Os autores salientam a importância da relação entre cálcio, mitocôndria e apoptose, pois
estudos indicam o papel central do íon de cálcio orquestrando o processo de morte celular
por ativação específica de partes do programa de morte celular.
Cerebral microbleeds on MRI. Prevalence, associations, and potential clinical
implications. Koennecke H. Neurology, 66: 165, 2006.
Objetivo: avaliar o valor potencial de microsangramentos cerebrais (CMB) na hemorragia
intra-cerebral (ICH) como indicadores de doença dos pequenos vasos cerebrais e possíveis
implicações para o tratamento antitrombótico.
Método: o autor reviu a literatura publicada até julho de 2005 em MEDLINE , PubMed e
em pesquisa manual.
Resultados: foram analisados os dados prevalentes de 5200 pessoas. Em idosos sem
doença cerebrovascular, a prevalência de microsangramentos está entre 5% a 6%,
associada à idade avançada enquanto os dados não são consistentes em relação a
microsangramentos cerebrais e hipertensão crônica. Microsangramentos são prevalentes
em 68% dos pacientes com hemorragia intracerebral espontânea e em 40% dos pacientes
com doença cerebrovascular isquêmica.
Microangiopatia cerebral (lacunas e leukoareiose) está associada com maior prevalência
(57%) de microsangramentos em pacientes com AVC isquêmico.
Em pacientes com suspeita de angiopatia cerebral amilóide (CAA) ou doença de
Alzheimer, os microsangramentos localizam-se principalmente na área córtico-subcortical.
Dados atuais não favorecem a nenhuma evidência de que CMB aumentem o risco de
hemorragia intracerebral entre pacientes com tratamento antitrombótico ou naqueles
tratados com trombolise para AVC isquêmico.
Conclusões: microsangramentos cerebrais podem indicar maior risco futuro de hemorragia
intracerebral e podem ser um marcador para doença vascular dos pequenos e angiopatia
cerebral amilóide. O autor salienta, entretanto, que mais dados prospectivos são
necessários de modo a confirmar suas afirmativas e que recomendações para orientar o
tratamento antitrombótico baseando-se na detecção de microsangramento não se justificam
no presente momento.
Mechanical thrombolysis in ischemic stroke attributable to basilar artery occlusion as
first-line treatment. Bergui M et al. Stroke, 37: 145, 2006.
Propósito: relatar os resultados da dissolução e resgate mecânicos de trombos como
primeira opção de tratamento em pacientes com AVC atribuído a oclusão da artéria basilar,
em particular no que se refere a segurança e eficácia.
Resultados: Em 12 consecutivos pacientes com AVC agudo por oclusão da artéria basilar
submetidos a trombólise mecânica intraarterial, 6 apresentaram recanalização completa.
Ocorreu um único infarto cerebral, possivelmente atribuído a embolização distal. Três
pacientes obtiveram um bom resultado.
Em 5 dos 6 remanescentes a artéria foi recanalizada utilizando r-tPA. Nesses ocorreu uma
hemorragia assintomática. Três pacientes apresentaram um bom resultado. A duração do
procedimento e dose de r-tPA foram significativamente reduzidos com a trombólise mecânica
bem sucedida (43.33 minutos e 13.33mg x 112.33 minutos e 55.83mg, respectivamente).
Limitações do Estudo: os autores observam várias limitações nos seus trabalhos
principalmente do ponto de vista científico, pois o procedimento não foi padronizado e
dependeu diretamente do operador, o r-tPA foi administrado conjuntamente com a trombólise
mecânica e algumas manobras mecânicas com cateteres e guias foram usadas durante a
trombólise intraarterial local. Além do mais, o número de pacientes foi pequeno e sem estudo
controle. Comparação direta dos resultados no desfecho, de pacientes com recanalização
mecânica com sucesso ou fracasso e o impacto do tratamento devem ser considerados com
precaução. A trombólise mecânica permitiu redução no tempo do procedimento e na dose de
r-tPA. Isto pode significar menos hemorragias e melhor resultado, mas o impacto global no
resultado final não pode ser avaliado definitivamente.A experiência dos autores limitou-se a
artéria basilar que é uma artéria de grande diâmetro com ramos arteriais distais que podem ser
eventualmente “embolizados”, sem maiores conseqüências clínicas. O contrário pode
acontecer com outros diferentes sítios anatômicos, primariamente na circulação anterior ou
em ramos periféricos.
Finalmente, suas séries têm as mesmas limitações e restrições que as séries sem estudos
controle de outros centros. Ressaltam, os autores, que estão lidando com uma técnica que
pode ser usada só nos poucos casos entre um pequeno número de pacientes referidos para
tratamento experimental como trombólise local intraarterial. As pequenas séries são um
obstáculo e Smith e col. formaram 25 centros durante 2 anos e meio recrutando 125 pacientes
com só 10 pacientes apresentando oclusão vertebrobasilar.
Conclusão: apesar das dificuldades acima os autores sugerem que a técnica de trombólise
mecânica permite uma recanalização rápida e segura com poucas complicações e que a
mesma deva ser considerada como primeira opção nos casos de isquemia cerebral aguda
devido à oclusão da artéria basilar.
NEUROLOGIA INFANTIL
Dra. Umbertina Conti Reed
Therapeutic approaches and advances in pediatric stroke. Kirton A et al. NeuroRX, 3:
133, 2006.
Os autores consideram que os acidentes vasculares isquêmicos em crianças, por isquemia
arterial ou por trombose venosa, estão entre as 10 afecções mais encontradas na prática da
neurologia infantil. Referem uma incidência de 2-8/100000 crianças por ano e, em recémnascidos, de 1/4000 nascidos vivos, bem como morbidade quanto a seqüelas motoras,
sensitivo-sensoriais, cognitivas e de linguagem de aproximadamente 50%. Embora os
autores apresentem rapidamente a etiopatogenia e os principais fatores de risco para o
acidente vascular isquêmico em crianças, o enfoque principal desta revisão é terapêutico,
sendo discutida a abordagem na fase “hiper-aguda” (primeiras horas de instalação), aguda
(primeiros dias), subaguda (de semanas a meses) e crônica (anos). É salientado que estudos
colaborativos multicêntricos devem ser incentivados com a finalidade de uniformizar
condutas de consenso para o tratamento do AVC da criança, que é ainda pouco estudado
em relação ao AVC do adulto, cujo tratamento já inclui protocolos bem definidos. Os
autores baseiam-se em grande parte no resultado de dois estudos randomizados recentes,
Chest (2004) e UK Guidelines (2005), que congregaram as opiniões de neurologistas
infantis e hematologistas de diversos centros.
Relativamente ao enfoque na fase hiper-aguda, os autores concluem que, embora se
reconheça o emprego de tratamentos trombolíticos intra-arteriais ou intravenosos em casos
isolados, a grande maioria das crianças não é atendida nas primeiras horas após a
instalação do quadro, não existindo consenso quanto à eficácia e aos riscos do emprego de
agentes trombolíticos ou procedimentos de angioplastia, adotados rotineiramente em
adultos, na faixa etária pediátrica.
No caso de acidente isquêmico arterial, relativamente ao tratamento na fase aguda e
subaguda com anti-agregante plaquetário ou anticoagulante, os autores apontam diferenças
de conduta entre os dois protocolos acima citados. O Chest recomenda iniciar a terapia
anticoagulante com heparina não fracionada ou de baixo peso molecular, mantê-la durante
uma semana, então substituindo-a por aspirina (3 a 5 mg/Kg) nos pacientes em que se
exclua embolia cardiogênica ou dissecção arterial. Nestes últimos, a terapia anti-coagulante
deve ser mantida por no mínimo três meses. Já, o UK Guidelines indica terapia
anticoagulante em primeira instância apenas em pacientes com dissecção arterial
comprovada e em alguns casos de embolia cardiogênica, limitando-se ao uso de aspirina
nos demais.
Quanto à trombose venosa, em linhas gerais, a terapia anticoagulante é consenso
nos casos não hemorrágicos, devendo ser mantida por 3 a 6 meses, dependendo do grau de
recanalização mostrado pela neuroimagem de controle. Os autores discutem ainda as
medidas de suporte e de prevenção de lesões cerebrais secundárias e a importância do
tratamento de manutenção com aspirina na fase crônica, a fim de reduzir o risco de
recorrência.
Na parte final deste trabalho de revisão de extensa bibliografia, os autores
apresentam as particularidades da indicação e do risco do tratamento em recém-nascidos,
em pacientes com acidentes vasculares de etiopatogenia definida, tais como a anemia
falciforme, a doença de Moya-Moya e vasculites inflamatórias progressivas, bem como as
medidas preventivas a serem adotadas quanto à dieta, exercícios de reabilitação,
medicamentos contra-indicados, e outros aspectos da vida do paciente após a recuperação.
Therapeutics development for spinal muscular atrophy. Summer CJ. NeuroRX, 3: 235,
2006.
A autora apresenta uma revisão completa sobre os aspectos clínicos e genéticos da
forma clássica de amiotrofia espinal progressiva (AEP), bem como os seus modelos
animais, como introdução para uma ampla discussão sobre as promissoras tentativas
terapêuticas que, a partir de 2003, estão sendo consideradas para esta grave doença
neuromuscular da infância, que mostra uma incidência de 1:10000 nascidos vivos e uma
freqüência de portadores de 1:50. Relata em detalhes o mecanismo molecular da AEP,
conhecido desde a década de 90: o gene SMN1 (survival motor neuron) é coadjuvado em
5q pelo gene SMN2 que possui diversas cópias; as mutações afetam o número de cópias e
pelo mecanismo da dosagem gênica originam diferentes fenótipos. Somente uma cópia
confere um grau de apoptose neuronal incompatível com a vida; pelo menos duas cópias
do gene associam-se ao fenótipo Werdnig-Hoffmann; três cópias originam a forma
intermediária e pelo menos quatro cópias relacionam-se à AEI tipo III. Não se conhece
perfeitamente a função da proteína do gene SMN1, acreditando-se que esteja envolvida no
processo de amadurecimento tanto do motoneurônio como do músculo: trata-se de um
complexo macromolecular que além da proteína SMN inclui pelo menos outras 6 proteínas
chamadas geminas ou gemas. Acredita-se que o complexo SMN seja regulado pelas
geminas 2 e 6 e tenha papel essencial na formação e agrupamento de várias pequenas
proteínas ribonucleares localizadas no núcleo, implicadas não só na integridade do
motoneurônio como de outras células. Em condições normais, a proteína SMN2 é
produzida em quantidade reduzida e a observação de que existindo pelo menos 60% da
proteína SMN1, que é o que ocorre nos pais e nos irmãos heterozigotos da criança afetada,
o quadro não se manifesta, gerou uma linha de pesquisa terapêutica que visa aumentar o
nível da proteína SMN2, agindo sobre o gene SMN2, e assim melhorando o quadro clínico.
As informações quanto à natureza e a função da proteína SMN e a viabilidade do
emprego de agentes farmacológicos já conhecidos que agem sobre o gene SMN2, fazendo
com que este passe a produzir mais proteína e proteína mais eficiente, abriu um vasto
campo para testes clínico-terapêuticos que a autora expõe e analisa com precisão.
Inicialmente, verificou-se que aclarubicin e butirato de sódio aumentam o nível de SMN na
célula em cultura e, posteriormente demonstrou-se que o tratamento de cultura de
fibroblastos de pacientes com ácido valpróico em doses terapêuticas aumenta o nível da
SMN2 de 2 a 4 vezes. Finalmente, a administração de fenilbutirato de sódio a pacientes em
doses de 500 mg/kg/dia em 5 doses por via oral, alternando 7 dias de tratamento e 7 sem,
resultava em melhora da habilidade funcional Também foi demonstrado que 4-fenilbutirato
de sódio aumenta a expressão do gene SMN in vitro e nos leucócitos de pacientes que
recebem o sal por via oral e que o tratamento de cultura de fibroblastos de pacientes com
tobramicina e amikacina resulta em aumento do número de gemas com a proteína SMN. O
butirato de sódio pertence à classe de compostos que podem alterar a expressão do gene
por regular a acessibilidade do mecanismo de transcripção do DNA. O ácido valpróico,
anti-epiléptico de largo emprego, mostrou ter esta mesma propriedade, em cultura de
fibroblastos de pacientes com AEP, por ativar o promotor da proteína SMN e por evitar a
deleção do exon 7 no produto gênico. A autora descreve os diferentes tipos de protocolos
que estão em andamento com estas drogas em diferentes países e também discute outras
opções terapêuticas, tais como: o uso de protetores neuronais, dos quais o mais conhecido é
o riluzole, que conseguiria impedir ou retardar a morte neuronal, de acordo com pesquisas
ainda em andamento; drogas que estabilizam a proteína SMN, entre as quais
aminoglicosídeos e indoprofeno, ambos, porém, com baixa penetração no sistema nervoso
central; terapia gênica e o uso de células-tronco, tratamentos estes que esbarram na
dificuldade de se definir com certeza em qual momento do desenvolvimento devem ser
aplicados e como alcançar os motoneurônios periféricos.
Finalmente, enfatiza a necessidade de estudos multicêntricos para melhor avaliação
da eficácia do tratamento, bem como a importância de se uniformizar parâmetros clínicos
de força muscular e de habilidade funcional, que permitam quantificar os resultados do
tratamento.
MOLÉSTIAS INFECCIOSAS
Dr. Hélio R. Gomes
CSF findings in 250 patients with serologically confirmed West Nile virus meningitis
and encephalitis. Tyler KL et al. Neurology, 66: 361, 2006.
Este estudo traz uma ampla análise dos achados liquóricos em pacientes com envolvimento
neurológico pelo vírus West Nile (VWN). Em 2003, o VWN foi o responsável pela maior
epidemia já vista de encefalite por arbovírus nos EUA. Além de encefalite pode ocorrer
meningite e paralisia flácida. Durante essa epidemia, 622 casos de infecção neurológica
pelo VWN foram observados (388 de meningites e 234 de encefalites), sendo que destes,
407 tiveram amostras de líquido cefalorraquidiano (LCR) analisadas e este artigo descreve
as características em 250. Desses 250, 174 (70%) eram meningites e 76 (30%), encefalites.
Com relação à celularidade, não houve diferença significativa entre o número de células
(por mm3) encontrado no LCR de pacientes com meningite ou encefalite (226 ± 50 e 227 ±
47). Aproximadamente 8% de cada grupo tinham mais de 500 células/mm3 e não houve
correlação entre o número de células e o momento em que a amostra foi colhida. O padrão
celular foi predominantemente neutrofílico, sem diferenças significativas entre os
percentuais de neutrófilos nos 2 grupos.
Aproximadamente 24% dos pacientes de ambos os grupos tinham mais que 50
eritrócitos/mm3 e 5 a 6% mais de 500, sendo o número médio de eritrócitos maior nos
indivíduos com encefalite.
Foi observada diferença de concentração proteica entre os pacientes com encefalite e
aqueles com meningite. A proteinorraquia (em mg/dL) estava mais elevada nos casos com
encefalite (101 ± 6 contra 76 ± 2,5). 47% dos pacientes com encefalite tinham
proteinorraquia maior que 100, enquanto que esse fato ocorria em apenas 16% dos
pacientes com meningite.
Não houve diferença estatística entre os teores de glicose no LCR dos 2 grupos.
A mortalidade entre os pacientes com encefalite foi maior que naqueles com meningite
(13,2% x 1,1%), mas os parâmetros liquóricos não se mostraram marcadores de
prognóstico. Apenas 18 pacientes foram puncionados uma segunda vez, sendo que em 17
(94%) houve diminuição do número de células e em 14 (88%), diminuição do percentual
de neutrófilos. Com relação à proteinorraquia, 67% (10/15) houve diminuição dos níveis
proteicos enquanto que em 33% (5/15) houve aumento.
Chama atenção, portanto a maior hiperproteinorraquia nas encefalites quando comparada à
meningite e a semelhança entre o perfil liquórico das meningites por VWN e outros vírus.
Outra informação que o artigo traz é que no envolvimento neurológico pelo VWN, os
níveis de proteínas e eritrócitos são significativamente maiores que na encefalite por herpes
simples.
Incidence and pathogenesis of clinical relapse after herpes simplex encephalitis in
adults. Skoldenberg B et al. J Neurol, 253: 163, 2006.
Neste trabalho, os autores estudaram a fisiopatologia da recidiva da encefalite herpética
através análise de marcadores no líquido cefalorraqueano.
Para determinar a incidência de recidiva, foram seguidos 32 pacientes que tiveram
encefalite herpética. Desses 32, 4 tiveram deterioração neurológica interpretada como
recidiva da encefalite herpética e foram utilizados outros 4 pacientes, que não tiveram
alterações durante o seguimento, como controles. Amostras pareadas de LCR e soro foram
colhidas, e analisados marcadores de destruição glial e neuronal, citoquinas, mediadores
inflamatórios e quantidade de HSVDNA. As reincidências ocorreram entre 1 e 4 meses
após o quadro inicial em 3 pacientes e em 1 paciente, após 3,3 anos. As alterações
tomográficas na reincidência foram menos intensas que nos quadros agudos e os pacientes
foram tratados com acyclovir e corticóides endovenosos por 7 a 21 dias. HSV DNA foi
detectado em todas as amostras durante a fase aguda, mas em nenhum na reincidência. Os
níveis de sCD8 no LCR estavam aumentados na fase aguda da encefalite herpética e nas
fases iniciais da reincidência, enquanto que os níveis liquóricos de enolase neurônio
específica, S-100 e proteína glio fibrilar estavam significativamente mais diminuídos na
reincidência que na fase aguda. A ausência de carga viral, de sinais de destruição neuro
glial e a relativa ausência de atividade antiinflamatória, associadas à atividade inflamatória
indicam que a fisiopatologia da reincidência da encefalite herpética está associada a um
mecanismo imuno-mediado e não a reativação viral.
CEFALÉIA
Dra. Célia Roesler
Ocular motor measures in migraine with and without aura. Wilkinson F et al.
Cephalalgia, 26: 660, 2006.
O objetivo do estudo foi avaliar a função oculomotora em indivíduos portadores de
migrânea. Foi utilizado para estimulação um sistema de acompanhamento pelo olhar de
uma luz infravermelha realizando movimentos sinusoidais (rastreio), movimentos
sacádicos de 5 a 20%, e fixação ocular em 03 grupos: o primeiro formado por 19
indivíduos portadores de migrânea com aura (MA); o segundo formado também por 19
portadores de migrânea sem aura (MoA), e um terceiro grupo controle, também de 19
indivíduos, perfazendo um total de 57 indivíduos examinados.
Os movimentos foram medidos duas vezes: uma em relação apenas ao deslocamento e
outra em relação ao deslocamento frente a três tipos de painéis (fundos) apresentados,
sendo um painel totalmente cinza, outro com listas verticais – preto e branco -, e outro de
fundo estampado em cinza.
Estatisticamente não foram encontradas diferenças significativas entre os indivíduos
portadores de migrânea com e sem aura e os do grupo controle em qualquer um dos
parâmetros de movimentação ocular analisado, porém, foram encontradas diferenças
significativas em relação a velocidade de apresentação do estímulo e o tipo de painéis em
todos os grupos. Esses resultados não oferecem subsídios quanto a alterações cerebelares,
ainda em fase sub-clínica, em portadores de migrânea. Comprovam, no entanto, que as
alterações visuais descritas na migrânea não são consequências de dificuldades de
movimentação ou de fixação ocular.
Os resultados encontrados neste estudo comprovam as observações na nossa prática clínica
diária quando realizamos a avaliação otoneurológica. Ao aplicarmos o teste do rastreio
pendular, os pacientes, na maioria dos casos, referem tontura quando o estímulo é
apresentado em freqüência maior, sem que isso implique em nenhum comprometimento
quanto a movimentação ocular para acompanhamento do estímulo apresentado.
Sneddon’s syndrome: another migraine-stroke association? Tietjen GE et al.
Cephalalgia, 26: 225, 2006.
Champion e Rook descreveram pela primeira vez em 1960 a associação de doença cérebrovascular isquêmica e dermatopatia isquêmica. Em 1965, I. B. Sneddon, dermatologista
inglês, descreveu uma série de casos que apresentavam acidentes cérebro-vasculares
associados ao levedo reticular, ficando esse quadro conhecido como síndrome de Sneddon.
Os autores revisaram a literatura dessa síndrome ao examinar a associação desta condição
com dores de cabeça incluindo migrânea. Relatos de casos e de séries são estratificados em
dois grupos baseados nas referências de dores de cabeça. No grupo sem referência à dor de
cabeça, há 208 pessoas com uma proporção de 3 mulheres para 1 homem. No grupo com
referência à dor de cabeça, há 175 pessoas numa proporção de 3,5 mulheres para 1 homem.
A proporção com dor de cabeça nesse segundo grupo é 58% (102 indivíduos), com dor de
cabeça descrita como migrânea 27,5% (28 indivíduos), incluindo 6 com migrânea com
aura. A freqüência da dor de cabeça não é significantemente mais alta em pessoas com
anticorpos anti-fosfolipídeos comparado com coorte negativo (43% vs. 32%, P=0,07). Uma
revisão dos dados histológicos, radiológicos e sorológicos da síndrome de Sneddon e
migrânea salienta a plausibilidade da associação.
Embora os dados epidemiológicos ainda sejam inconclusivos os autores pretendem com
este trabalho chamar a atenção para que novos estudos sejam feitos sobre a associação:
migrânea – levedo reticular – ataque isquêmico.
DOENÇAS DO NEURÔNIO MOTOR/ELA
Dr. Francisco Tellechea Rotta
Ao acompanharmos pacientes com esclerose lateral amiotrófica (ELA) devemos sempre
lembrar que o fato desta ser uma doença incurável, não deve significar que seja também
intratável. Dentre os sintomas da ELA, um que freqüentemente apresenta má resposta ao
tratamento e um impacto negativo na qualidade de vida dos pacientes, é a salivação
excessiva. Revisamos dois estudos recentes que avaliam o uso injeções de toxina
botulínica nas glândulas salivares de pacientes com ELA. Embora sejam estudos abertos,
não controlados, sugerem o benefício desta técnica em pacientes com sialorréia resistente
ao tratamento convencional. Indicam ainda ser seguro utilizar esta técnica em pacientes
com doença do neurônio motor.
Application of botulinum toxin to reduce the saliva in patients with amyotrophic
lateral sclerosis. Manrique D. Rev Bras Otorrinolaringol, 71: 566, 2005.
Cinco pacientes com ELA (média de 2,8 anos de duração), com sialorréia resistente ao
tratamento anticolinérgico sistêmico foram incluídos neste estudo aberto. Foi aplicado um
total de 20 U de Botox em cada parótida e 30 U de Botox em cada glândula submandibular (com uso de guia ecográfica em tempo real). Quatro pacientes apresentaram
melhora significativa em um questionário que mede de qualidade de vida relacionada a
sialorréia. A duração do efeito foi de 3 a 4 meses. Não foram observados efeitos adversos.
Botulinum toxin improves sialorrhea and quality of living in bulbar amyotrophic
lateral sclerosis. Verma A et al. Muscle & Nerve, in press, 2006.
Dez pacientes com ELA (média de 22,8 ± 14,6 meses de duração), com sialorréia
socialmente incapacitante e sem resposta a tratamento farmacológico prévio foram
incluídos. Foram injetadas as glândulas parótidas com uma dose de 7,5 U de Botox, apenas
com referências anatômicas. Uma dose extra de 15 U de Botox em cada parótida foi
aplicada quatro semanas depois nos pacientes que não haviam apresentado melhora
significativa. Dos oito pacientes que completaram o estudo, três necessitaram reaplicação
da dose extra em quatro semanas. Foi observada redução na quantidade de lenços de papel
usados pelos pacientes, melhora na escala analógica visal de salivação e em um
questionário de qualidade de vida relacionado à sialorréia. A duração do efeito foi entre 2 e
5 meses, não se observando efeitos adversos.
MOLÉSTIAS NEUROMUSCULARES
Dra. Márcia Cruz
Neurologic complications after surgery for obesity. Boyd M et al. Muscle & Nerve, 33:
166, 2006.
Neste artigo de revisão os autores chamam a atenção para o número crescente de cirurgias
bariátricas, ou seja, cirurgias para obesidade, levando-se em consideração que o número de
obesos (IMC > 30 Kg/m2) pelo menos nos EUA é alarmante e chega aos 26 % dos adultos
e crianças.
Em nosso meio o numero destas cirurgias também vem crescendo, sendo candidato aquele
sujeito que estiver com seu peso no dobro do ideal, e que demonstrar falha em perder peso
seguindo dieta, não tiver contra indicações cardiopulmonares ou psiquiátricas e for mais
jovem do que 50 anos.
Neste contexto o clínico, além do neurologista deve estar atento à prevenção e tratamento
das complicações decorrentes, e são elas:
Mononeuropatias decorrentes de compressão a medida que se perde peso ou durante o
tempo de cirurgia, e disfunção ou lesão em vários pontos do neuroaxis causadas por má
absorção de vitaminas e outros elementos.
As técnicas cirúrgicas empregadas no passado causavam maiores complicações do tipo
desabsortivas. A técnica atual mais utilizada, restrição gástrica com bypass (Roux-en-Y
gastric bypass), minimiza esta complicação mas ainda assim ela é freqüente.
A técnica ideal visa: limitar a ingesta de alimento, causar saciedade, manter absorção
normal de nutrientes, causando perda de 50 a 50 % do excesso de peso.
De 8 estudos que avaliaram os níveis de micronutrientes após a cirurgia (957 pacientes),
25% demonstraram deficiência de vitamina B 12, 20 % deficiência de folato, e 1 %
deficiência em tiamina.
A deficiência de vitamina B 12 causa normalmente degeneração combinada da medula,
porém apenas casos de neuropatias periféricas tem sido relatados.
Nos casos de má absorção de folatos estão relatados neuropatia periférica, mielopatia e
síndrome de pernas inquietas.
Na falta de piridoxina estão relatados casos de neuropatia periférica e degeneração
combinada da medula.
A deficiência de tiamina é responsável pelos casos de encefalopatia de Wernicke e
neuropatia periférica.
A carência de vitamina E causa miopatia e neuronopatia sensitiva atáxica.
Pode ocorrer ainda neurite ótica.
Durante a cirurgia, várias são as neuropatias compressivas descritas assim como
rabdomiólise.
Para avaliar o paciente estão preconizados: eletroneuromiografia, biópsia neuromuscular
em alguns casos e monitorização dos níveis séricos de vitaminas B 12, B 6, D, E, folato,
cálcio, magnésio, fósforo, selênio e cobre, e tratamento empírico com tiamina, vitamina B
12 ou complexo multivitamínico.
A prevenção deve ser feita com dosagens destes elementos a cada 6 meses e
suplementação com complexo multivitamínico e sais minerais, contendo vitamina B 12,
ácido fólico, ferro, suplemento adicional de ferro e vitamina C e B 12, e cálcio.
NEUROLOGIA COGNITIVA E DO ENVELHECIMENTO
Dra. Sonia M. D. Brucki
Diagnosis and management of dementia with Lewy bodies. Third report of the DLB
consortium. McKeith IG et al. Neurology, 65: 1863, 2005.
Dois consensos anteriores foram publicados citando os critérios diagnósticos para
Demência com corpos de Lewy. Este foi o terceiro com modificações propostas pertinentes
para melhor acurácia diagnóstica deste quadro neurológico.
Mc Keith et al, 1996; McKeith et al, 1999
- Critérios diagnósticos:
- duas das seguintes características centrais são essenciais para o diagnóstico de DCL
provável e uma é essencial para o diagnóstico de possível:
a) flutuação da cognição com variações acentuadas de alerta e atenção
b) alucinações visuais recorrentes que tipicamente são bem formadas e detalhadas
c) características motoras espontâneas de parkinsonismo
Características de suporte para o diagnóstico:
quedas repetidas
síncope
perda transitória de consciência
sensibilidade à neurolépticos
delírios sistematizados
alucinações em outras modalidades
desordem comportamental do sono REM*
depressão*
* estas duas últimas características foram incorporadas em 1999 (McKeith et al).
Consensos anteriores: especificidade OK, porém baixa sensibilidade
Dificuldades no reconhecimento das flutuações
As características centrais: flutuação, alucinações visuais e parkinsonismo – baixa
freqüência na presença de NFT neocorticais.
Mudança nos critérios para incorporar itens adicionais indicativos de patologia por Lewy
Body.
Distinção entre características sugestivas de DLB (mais freqüentes do que em outras
demências) e de suporte (ocorrência comum, porém com baixa especificidade)
CRITÉRIOS:
1- MANDATÓRIO “central feature”– essencial para o diagnóstico de possível ou
provável
DEMÊNCIA
Perfil cognitivo: comprometimentos corticais e subcorticais
Déficit atenção, executivo, visuoespacial
Diferenças entre DLB e DA: preservação relativa da nomeação por confrontação, evocação
curto e médio prazo e reconhecimento, e >> diminuição: fluência verbal, percepção visual,
tarefas executivas
Pacientes com DLB com NFT neocorticais podem ter déficits de memória proeminentes,
característicos de DA
Diferenças entre DLB x Demência na D. de Parkinson: sem muita diferença qto ao curso
temporal, cognitivo, idade
Em pesquisa: considerar um ano entre início da demência e parkinsonismo para
diagnóstico de DLB
2- CORE FEATURES: sem muitas diferenças em relação aos critérios anteriores.
Recomendações para sua abordagem e uso no diagnóstico e medida de gravidade
FLUTUAÇÃO
- perguntas como: sujeito parece ter pensamento muito claro e depois se torna ruim – 75%
de cuidadores tanto de Ad e DLB respondem positivamente.
- necessários: questionários qualitativos e quantitativos
- Clinician Assessment of Fluctuation Scale – mês prévio
- One Day Fluctuation Assessment Scale – cut off para distinção entre DLB e AD ou DV.
- Mayo Fluctuations Composite Scale – 3 ou mais “sim” . Questões sobre sonolência e
letargia diurnas, sono diurno> 2 horas, ficar fitando o nada por longos períodos, ou
episódios de fala desorganizada.
ALUCINAÇÕES VISUAIS (AV)
Recorrentes e complexas. Presentes no início.
- uso do NPI com cuidador
- pacientes com AV: > comprometimento visuoespacial
- associação com:
- maior número de LB no lobo temporal anterior e inferior, amígdala (necrópsia)
- perfusão cerebral diminuída em regiões occipitais
- > maior déficit de ACh cortical
- pode predizer melhor resposta à terapia colinérgica
PARKINSONISMO
- > instabilidade postural, dificuldade à marcha, hipomimia. Tremor – menos comum.
3- SUGGESTIVE FEATURES: se 1 ou + está presente junto a 1 ou + das centrais : DLB
provável. Possível – demência + 1 ou mais das sugestivas, mesmo sem características
centrais.
DESORDEM COMPORTAMENTAL DO SONO REM
- sonhos vívidos durante sono REM, mas sem atonia muscular. Movimentam-se, brigam,
vocalizam durante o período. Pode preceder por anos o início da demência e
parkinsonismo.
-pode ser confirmado por polissonografia
SENSIBILIDADE A NEUROLÉPTICOS
- início agudo ou exacerbação do parkinsonismo e perda de consciência
- aproximadamente 50% dos sujeitos com DLB têm tolerância a neurolépticos – não usar
como exclusão
- história positiva de sensibilidade – altamente sugestiva de DLB.
IMAGEM FUNCIONAL COM TRANSPORTADOR DE DOPAMINA
- atividade diminuída em transportadores de dopamina estriatais em DLB e normal em
AD- útil na distinção entre as duas entidades.
4- SUPPORTIVE FEATURES: comumente presentes, porém sem especificidade.
5- CARACTERÍSTICAS DE EXCLUSÃO: ver tabela
INVESTIGAÇÕES ESPECIAIS
- imagem funcional com transportador de dopamina
- preservação do volume do hipocampo e lobo temporal medial no RM
- hipoperfusão occipital (SPECT), hipometabolismo occipital (PET) sem atrofia na RM.
- cintigrafia com I-123 (MIBG) – quantificação de inervação simpática pós-ganglionar
cardíaca – reduzida na DLB – alta sensibilidade e especificidade na distinção com DA.
ABORDAGEM PATOLÓGICA
- diagnóstico: era a presença de LB em qualquer local do cérebro na presença de demência
(1996).
- imunohistoquímica para alfa-sinucleína e graduação semi-quantitativa de gravidade da
patologia relacionada aos LB: leve, moderada, grave e muito grave.
VER FIGURA E TABELAS ARTIGO
MANEJO CLÍNICO
PARKINSONISMO
L-DOPA: baixas doses e aumento lento, deixar em dose mínima para controle
sintomas
SINTOMAS NEUROPSIQUIÁTRICOS
Inibidores da acetilcolinesterase ou neurolépticos atípicos
Depressão: inibidores recaptação de serotonina e/ou noradrenalina
Apatia: Inibidores da acetilcolinesterase
Desordens do sono: clonazepam 0,25 mg ao deitar, ou quetiapina 12,5 mg; melatonina 3
mg ao deitar; anticolinesterásicos.

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