Leite Baboso ou Leite Babão : Por que ocorre?

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Leite Baboso ou Leite Babão : Por que ocorre?
Leite Baboso ou Leite Babão : Por que ocorre?
Introdução
O leite por suas propriedades nutritivas está freqüentemente sujeito à
contaminação ambiental por microrganismos saprófítas que, apesar de não afetarem
a saúde dos animais, podem alterar as características microbiológicas e físicoquímicas, o aspecto e a consistência do leite e derivados.
O leite obtido em circunstâncias naturais é uma emulsão de cor branca,
ligeiramente amarelada, de odor suave e gosto adocicado (a lactose – açúcar do
leite – é responsável por este sabor).
Sendo o leite um produto muito sensível, absorve os odores do meio em que
se encontra. Exposto ao sol, adquire gosto estranho e desagradável, o que deve ser
evitado. Por outro lado, por ser um produto geralmente nutritivo, torna-se excelente
meio para o desenvolvimento de germes.
Em média, os componentes principais do leite, são os seguintes: lactose
(4,8%); gorduras (3,6%); proteínas (3,3%) sólidos totais (12,5%).
O leite conserva-se melhor em baixa temperatura porque, nesta, paralisa o
desenvolvimento da maioria dos germes, principalmente daqueles causadores de
sua fermentação (acidificação).
Quando fervido, conserva-se melhor do que cru, porque a fervura destrói a
maioria dos germes neles existentes, se bem que altere algumas de suas
propriedades. O tratamento indicado (obrigatório) é o de aquecimento entre 72º a
75º C em camadas delgadas durante 15-20 segundos, através do método de placas,
ou ainda, de 63º a 65º C, por 30 minutos, na pasteurização lenta, tipo americano.
O leite coagula-se, quer pela influência de germes (fermentação) quer de sais
minerais, coalho ou dos sucos de certas plantas.
O leite para o consumo humano deve ser, por sua natureza, um produto
normal e integral, obtido em ordenha higiênica e produzido a partir de vacas sadias,
submetidas a regime higiênico apropriado. A questão da sua qualidade será
diretamente subordinada ao tempo decorrido a partir da ordenha e em qual
temperatura o leite foi mantido.
O melhor leite é o obtido higienicamente de animal sadio, resfriado a 4°C em
até 3 horas após a ordenha e entregue na indústria no mais curto prazo possível, ou
em até 48 horas. Algumas dessas bactérias saprófitas metabolizam os componentes
através de produtos liberados pelas próprias bactérias e, conseqüentemente,
alteram o leite sob vários aspectos, porém, uma das anormalidades fácil de ser
reconhecida é aquela relacionada com a consistência ou viscosidade do leite.
A mudança na consistência é uma anormalidade provocada pelo crescimento
de bactérias num leite originalmente normal, anormalidade essa que para ser
detectada demora algumas horas após a ordenha.
“Ropy Bactéria”
Esse grupo de bactérias pode causar um problema chamado de “leite babão”
ou “leite baboso”. Este problema é típico de leite produzido sob más condições de
higiene e pode surgir inclusive em leite refrigerado por um certo período, mas não
deve ser confundido com o aumento eventual da viscosidade no leite mamítico. O
problema é comumente denominado de “ropiness”, pela literatura especializada,
sendo
causado
principalmente
pela
bactéria
Alcaligenes
viscolactis,
um
microorganismo psicrotrófico (cresce à temperatura abaixo de 7º), embora outras
bactérias sejam associadas à esse problema (HOHENDORFF; SANTOS, 2006).
Substâncias como gomas e mucinas (polissacarídios e substâncias
nitrogenadas parecidas com mucos) são associadas a esta alteração. Elas são
produzidas em forma de material capsular por microorganismos, como as bactérias
Alcaligenes viscosus (viscolactis), Aerobacter aerogenes, Staphylococus cremosis–
viscosi, Streptococcus lactis hollandicus, Mícrococcus freudenreichii entre outros. O
material capsular produzido individualmente por cada um desses microrganismos
une-se, mutuamente, formando fios ou filamentos, formando o leite baboso, puxento.
A tendência desses filamentos é de se localizar na parte superficial do leite, dando
um aspecto de baba, daí este leite ser vulgarmente denominado “leite babão” ou
“leite baboso”.
De acordo com Cosulati (2004) a partir de 400 mil células somáticas/ml, já
poderá haver uma alteração na viscosidade do leite, no ponto de congelamento, na
capacidade tamponante e certo grau de lipólise (degradação de gordura) devido à
liberação de enzimas lipolíticas. Neste caso, são afetados a produção de vários
produtos lácteos, como leite em pó, iogurte, leite condensado, manteiga e queijo.
Porém, este tipo de viscosidade, não deve ser confundido com a alteração (Leite
Baboso) descrita acima.
Muitas vezes, os microrganismos (germes) que provocam o leite baboso se
originam dos seguintes locais:
1) da pele das tetas e úbere, do canal da teta, da glândula mamária e dos
canais lactíferos (podem ser saprófitas ou patogênicos);
2) das mãos e roupas do ordenhador;
3) do solo, das fezes e locais de lixos;
4) da sala ou local de ordenha sujos, úmidos e mal ventilados;
5) dos equipamentos da ordenhadeira mecânica, sujos e contaminados;
6) dos equipamentos de ordenha manual (baldes, latőes, canecas para teste,
entre outros), sujos e contaminados;
7) dos equipamentos utilizados para armazenar o leite;
8) de águas contaminadas.
Esses microrganismos indesejáveis, que provocam outros problemas no leite
além da viscosidade, estão presentes nas mãos dos ordenhadores, sala de ordenha,
equipamentos de ordenha mecânica, vasilhames de ordenha em geral (baldes,
latőes, coadores) e estábulos quando sujos e mal-higienizados, como também na
pele dos animais, principalmente do úbere, nas águas estagnadas ou empoçadas
nos estábulos e nas pastagens, etc.
Esses microrganismos contaminam o leite durante ou após a ordenha,
modificando suas características normais, como aspecto, sabor, odor, consistência,
acidez.
Outras alteraçőes na qualidade
Um dos problemas de qualidade mais freqüentes no leite é o da acidez,
Porém, viscosidade e acidez nem sempre estão interelacionadas, já que os
microrganismos
responsáveis
pelo
aumento
da
viscosidade
não
são
necessariamente produtores de ácido.
Muitos dos microrganismos que produzem viscosidade crescem também em
baixas temperaturas, porém, ambos (tanto os que provocam acidez, quanto os que
tornam o leite baboso) se originam inicialmente de ambientes e vasilhames sujos e
mal-higienizados.
Este leite viscoso também não deve ser confundido com o leite filamentoso
proveniente de quartos de úbere com mastite aguda. O leite não se torna
rapidamente viscoso e pode demorar até muitas horas após a ordenha para adquirir
esta característica; já o leite com mastite aguda pode sair viscoso a partir do úbere
da vaca.
A menos que bactérias tenham causado fermentaçăo láctica, o sabor do leite
viscoso é normal. Apesar do sabor ser o primeiro parâmetro adotado pelos
consumidores para avaliar a qualidade do leite, obviamente eles também não
gostarão de sua textura pegajosa.
Os problemas com a qualidade do leite não estão apenas relacionados com a
viscosidade, acidez ou mastite. Isto porque a maioria dos microrganismos que se
desenvolvem em locais sujos e mal-higienizados e cujo crescimento é favorecido por
altas temperaturas (acima de 20 °C), podem causar alteraçőes no leite. Por esta
razão, nas épocas mais quentes do ano săo freqüentes as reclamaçőes em relação
a má-qualidade do leite. Inicialmente, antes de ordenhar vacas com as tetas já
limpas e secas é necessário uma higienizaçăo efetiva dos utensílios, vasilhames,
latőes, desinfecção de estábulos etc., para reduzir o problema.
As medidas a seguir indicadas poderão reduzir, e muito, a contaminação
bacteriana do leite.
E, tão logo detecado o problema o importante é identificar a espécie de
microrganismo que está provocando o problema. No caso da viscosidade, se esta
for atribuída à espécie Staphylococcus cremoris viscosi, por exemplo, o leite não
deve ser consumido ou processado sob nenhuma forma; porém, se for devido a
Streptococcus lactis hoilandicus, năo existe perigo para o homem.
Em torno de 100 ml de leite das amostras a serem processadas devem ser
colhidos em frascos estéreis e bem fechados e em seguida enviados sobre
refrigeração a um laboratório especializado em análises microbiológicas de leite. No
laboratório, parte do material será submetida à contagem bacteriana total (C.B.T.)
que, apesar de não ser um teste específico para bactérias que causam viscosidade,
são indicados para quantificar bactérias que contaminam o leite. Outra parte será
incubada na tentativa de posterior isolamento e identificação das bactérias
presentes.
Junto às amostras deverá acompanhar um histórico informativo sobre as
alteraçőes que estão ocorrendo com o leite. No caso do leite viscoso, onde parte das
bactérias que ocasionam o problema cresce em baixas temperaturas, o leite também
deverá ser incubado a 5 a 7 °C durante cinco dias.
Uma vez identificado o problema no laboratório, medidas gerais de melhoria
da qualidade do leite deverão ser implementadas.
Evitando um leite com a qualidade fora do padrăo aceitável
Vários fatores auxiliam na obtenção de um leite próprio para consumo, sem
alteração em sua consistência (como o leite viscoso) e sem outras interferências na
qualidade:
1) Motivando a educaçăo dos ordenhadores. O êxito ou falha de um
programa para obtenção de um leite de qualidade dependerá, muitas vezes, do
entendimento entre técnicos e do pessoal que lida diretamente com os animais:
(ordenhadores, vaqueiros, responsáveis pela limpeza dos animais, equipamentos e
instalaçőes, etc). Os técnicos devem estar conscientes de que esses funcionários,
na maioria das vezes, não foram preparados para executar adequadamente tais
atividades, e que para que sejam convencidos de sua importância, precisam receber
treinamento adequado. Conhecer o manejo correto, tanto das instalaçőes quanto
dos animais, antes e após a ordenha; reduzir a possibilidade de contaminação,
tomando cuidados durante a ordenha, pelo uso meticuloso dos métodos
recomendados para limpeza, são pontos indispensáveis para garantir a qualidade
inicial do leite.
2) Propiciando um ambiente adequado para as vacas leiteiras, que năo
favoreça o crescimento de germes contaminantes do leite. O piso deve ser limpo
e sem umidade, e quando for cimentado, deve ser desinfetado semanalmente ou
quinzenalmente, com cal, creolina ou outros desinfetantes apropriados. Quando
estes locais recebem ação direta da luz solar, reduz a contaminação local.
3) Conservando tetas e úberes limpos e secos durante a ordenha, que
deve ser realizada em local apropriado. A presença de fezes dos animais ou barro
nas região das tetas pode gerar um aumento das bactérias que proliferam em baixas
temperaturas. Também, durante esse período ocorre o relaxamento do canal da
teta, tornando-se a principal porta de entrada para muitos germes, que alteram a
qualidade do leite ou que provocam mastites. Muitos desses germes, são removidos
pelo fluxo de leite, mas outros permanecem e invadem o úbere.
4) Manter latőes, baldes e coadores lavados, secos e sem resíduos de
leite. Estes devem ser expostos ao sol, com boca para baixo após a lavagem. Água
morna, sabão e escova são as melhores ferramentas de limpeza. Não usar coador
feito de pano, e sim o que é feito de nylon ou metal. No caso do leite viscoso, devese eliminar todas as crostas (resíduos de proteínas, minerais, células bacterianas,
etc.) depositadas na superfície dos vasilhames. Uma limpeza diária nos vasilhames,
utilizando ácido nítrico a 0,5%, ajuda a combater este problema.
5) Armazenamento em tanques limpos e adequados. Manter o leite em
resfriadores ou tanques de expansão que estejam em perfeitas condiçőes de
funcionamento e que permitam a manutenção da temperatura entre 4 e 5 °C.
6) Transportar o leite sob refrigeraçăo. No caso da coleta de leite em
latőes, quando estes ficam à espera dos caminhőes, devem ser mantidos em
abrigos próprios ou protegidos do sol. Também os caminhőes devem ter, no mínimo,
cobertura protetora dos raios solares.
Porém, a situação em relação ao transporte e refrigeração tem mudado, e
cada vez mais os produtores passam a fazer parte do grupo que segue as normas
propostas pela Legislação vigente. É um trabalho muito aceito pelos produtores, que
com o apoio das associações, cooperativas, indústrias, entre outros, realizam
trabalhos conjuntos e com grande retorno para a produção leiteira.
7) Não misturar o leite da ordenha anterior com o leite fresco.
8) Não misturar o leite de tetas não sadias. O leite obtido de tetas
contaminadas (mastite ou outras doenças) NUNCA deve ser misturado ao leite
normal de vacas tratadas.
9) Usar água de boa qualidade na ordenha. Tratando a água
periodicamente, com cloro, por exemplo, elimina-se a possibilidade de contaminação
e proliferação de doenças.
Seja qual for a anormalidade do leite, em grande parte ela será controlada, se
as medidas acima forem rigorosamente seguidas, não importando o sistema de
produção. Isto torna-se fundamental porque as características próprias ao leite
anormal não permitem sua utilização direta para consumo humano e a sua
transformação em subprodutos é, na maioria das vezes, dificultada, quando não
inviabilizada. Com isto, concluímos que o leite anormal representa para o produtor
um sério problema econômico por diminuir seus ganhos e para a indústria, por
problemas no processamento, menores rendimentos e produtos com baixa
estabilidade e qualidade final.
Literatura Consultada:
COSULATI.
Mamite
e
Redutase:
tire
suas
dúvidas.
Disponível
em
<:http://www.cosulati.com.br/int_noticias1.php?Idnews=147> . Acesso em 25 de abril
de 2007.
HOHENDORFF, C.G.; SANTOS, D. Florianópolis, UFSC. Produçăo de Queijos.
Disponível em:
<http://209.85.165.104/search?q=cache:dvwbYNXTndwJ:www.enq.ufsc.br/labs/probi
o/disc_eng_bioq/trabalhos_grad/trabalhos_grad_20061/queijos.doc+leite+Alcaligenes+viscosus&hl=ptBR&ct=clnk&cd=1&gl=br&lr=lang_pt>. Acesso em 25 de abril de 2007.
VEIGA, V. M. de O. Leite Babão: Um problema de qualidade pouco conhecido.
Glória Rural. v. 2, n.19, p.12-16, 1999.

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