Interação lúdica do
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Interação lúdica do
ISSN 1806-0145 2013 - Ano 7, nº 34 - R$ 9,90 Interação lúdica do teatro Saiba como é possível utilizar a arte de representar para desenvolver e ampliar habilidades e competências nos alunos. p. 26 ENTREVISTA Odorico Monteiro analisa a parceria da Educação com a Saúde. p. 36 Gestão Educacional Arte-Educação Thiago Chaer delineia fatores essenciais para que o educador e as instituições possam acompanhar as mudanças educacionais. p. 22 Ângela Escudeiro da Comissão Nacional de Incentivo à Cultura do MinC, analisa o teatro e a literatura no universo da criança como agente transformador e educador. p.32 Reflexão AVALIAÇÃO Sandra Bozza discute o papel da escola na formação dos seres humanos em um mundo possível, a partir da simulação VIDApousando E EDUCAÇÃO | 1 de extraterrestres numa escola. p. 44 Lançamentos Poesia P o em Cena Poesia P oe em Cena é uma seleção de grandes ndes popoe ta brasileiros e estrangeiros, das diversas diversas etas e sc oetas escolas literárias e épocas distintas. P Poetas d e diferentes culturas, classes sociais e e tnias, de etnias, g ê mor, a gênios que, com enlevo, cantaram o a amor, n at ram um um natureza, a paz, a liberdade, e sonharam m u mundo melhor e mais fraterno. O Nordeste nas canções de Luiz Gonzaga Análise das letras de músicas do Rei do Baião que falam do Nordeste, sua história e seus costumes. O livro é rico em imagens, curiosidades e cordéis que, juntamente com as músicas, enaltecem a identidade de nosso povo. Traz reflexões e sugestões de atividades em sala de aula e acompanha um CD do músico Adelson Viana interpretando Luiz Gonzaga. Tem ainda um anexo com todas as partituras das músicas do CD. Organização Lucinda Azevedo Organização O Or rg rg Ilustrações Adelson Viana Ana Ana Thais Feitosa An Kazane Ana Thais Feitosa Sete fábulas em cordel s Este livro é a reunião de sete dos mais expressivos m autores do cordel contemporâneo. Os recontos em nversos tornam estas narrativas atemporais atraens tes para os pequenos leitores, que, em diferentes imodalidades do cordel, revisitarão as fábulas atrim buídas a Esopo, o lendário fabulista grego. Além m do reconto em cordel o livro traz as fábulas em aprosa para ampliar as possibilidades de exploração do gênero. Organização Ilustrações Rouxinol do Rinaré Eduardo Azevedo ev eved ved do Formando novos olhares res para um novo mundo.. www.imeph.com.br | [email protected] | (85) 3261.1002 NESTA EDIÇÃO 08 GINGA DA CAPOEIRA NA ESCOLA Lúcia Vanda Rodrigues, doutoranda da Universidade Federal do Ceará, iniciou suas primeiras pesquisas com a capoeira e percebeu a importância desse instrumento mediador no processo de educação para a cidadania. 11 POSSIBILIDADES DE APROXIMAR TEORIA E PRÁTICA EDITORIAL Arte no educar Pesquisadores da Universidade Federal do Ceará analisam a ementa da disciplina Avaliação Educacional, descrita no projeto políticopedagógico do curso de licenciatura em Pedagogia, e constatam o distanciamento entre teoria e prática. No entanto, o diálogo entre Evolução da proficiência em Matemáca dos pesquisadores permite novas estratégias para reverter a situação. alunos do EM no SPAECE - Período 2009-2011 264,6 254,5 N° 34 SOLUÇÕES Na linha de Avaliação Educacional, pesquisadores mapeiam a disciplina de Matemática no Ensino Médio contribuindo para que educadores, a partir das médias de proficiências de seus alunos, identifiquem os obstáculos e determinem os conteúdos a serem estudados. 239,8 1ª SÉRIE - ANO 2009 2ª SÉRIE - ANO 2010 24 16 MATEMÁTICA: PROBLEMAS E 3ª SÉRIE - ANO 2011 O CÉU NA EDUCAÇÃO Proficiência Matemáca Carol de Holanda Pavão, pós-graduada em Arte-Educação nos instiga a refletir sobre a educação, colocando quem educa na condição de lagarta e borboleta. Segundo Carol, precisamos assumir nossas falhas, na condição de lagarta, para entrarmos no casulo e nos transformarmos em borboletas para podermos educar. 39 DESAFIOS DA FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA Milena Cristina Barros Barreto Aires, psicóloga que trabalha com família e orientação profissional nos faz refletir sobre os desafios que as famílias enfrentam para educar os filhos em um mundo marcado por avanços tecnológicos e científicos e como a escola pode contribuir para equilibrar as relações entre pais e filhos. 46 INTERPRETAR PARA REINVENTAR A ESCOLA Mestre, Gestor e Consultor em Educação, Casemiro de Medeiros Campos interpreta as reformas do sistema educativo e identifica como as inovações captadas através dos resultados do IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, e de outros instrumentos podem contribuir para reinventar a escola. 49 GESTOS DE FLEXIBILIDADE NA EaD No Eixo da Educação Comparada, as pesquisadoras Ana Cláudia Uchôa Araújo e Patrícia Helena Carvalho Holanda, avaliam a mulher e a docência na EaD, fundamentado num diálogo com autores, entre eles, João Mattar (2012). E AINDA... 5 Editorial 7 Publicações 21 Empreendedorismo 35 Undime em notícias 41Capacitação O envolvimento da arte nas práticas educativas interfere e modifica o ambiente escolar e a formação da personalidade de alunos e educadores, mesmo que a intenção não seja de formar artistas. O ensino e a aprendizagem pensados a partir da arte, como conhecimento do mundo, refletem na melhoria da qualidade escolar, na apreciação, valorização da história da arte e da diversidade cultural. Desenvolve o discurso falado e escrito, a percepção, a imaginação, a observação, o raciocínio e amplia a capacidade de ver e ouvir na interação com o colega. Além do que, as expressões artísticas exploram o universo das emoções. A reportagem, desta edição, nos mostra o poder do teatro em encantar e interagir com o público, como parte dos Parâmetros Curriculares Nacionais, proposto pelo Ministério da Educação. A arte dramaturga, não somente exige disciplina, compromisso, cidadania, mas prepara o aluno para a vida. No contexto, teatrólogos e educadores avaliam o modo de aprendizagem dos alunos e como a escola pode desenvolver a reflexão com projetos educativos em arte. Também encaramos o desafio de analisar o fato de a educação de qualidade interferir na saúde pública. Em entrevista concedida à Revista Vida e Educação, Odorico Monteiro, secretário de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde (SGEP), revela como políticas públicas voltadas para a educação podem transformar o sistema de saúde. Como exemplo, a queda da mortalidade materna obtida a partir da maior taxa de alfabetização das mulheres. Enquanto isso, os artigos se propõem a fazer algumas reflexões acerca da capoeira como instrumento viabilizador da educação cidadã, o distanciamento entre a teoria e a prática, a dificuldade do aluno de interpretar o que lê interferindo nas aulas de Matemática, o valor do pensamento crítico do educador para a transformação social, a reforma interior que cada um pode fazer para tornar-se apto a educar. Em meio a tantos assuntos, destacamos o ato de brincar em todas as idades, os desafios da família contemporânea, a atuação da mulher em diversas funções além da docência, o papel da escola no mundo novo, como reinventar a escola e as oportunidades de capacitação profissional. Vale ressaltar que temos muito a discutir e refletir, em 2013, sobre a importância do profissional da educação, as estratégias de gestão educacional, a interação escola-aluno-comunidade, as barreiras políticas na pasta da Educação, os desafios da prática e da formação, entre outros, além das alternativas para vivenciarmos mudanças no Sistema Nacional de Educação. Assuntos fundamentais que estarão presentes nos Fóruns Estaduais de Educação (FEEs), encontros, reuniões, conferências livres, municipais e/ou intermunicipais, estaduais e do Distrito Federal, como etapa preparatória para o II CONAE – Conferência Nacional de Educação que será realizada no próximo ano, em Brasília. Espaço democrático para pontuar e acordar propostas de organização da educação, implementação e consolidação do novo Plano Nacional de Educação (PNE). Enfim, dentro de uma proposta de comunicação responsável voltada à divulgação científica, a Vida e Educação estreita, mais uma vez, os laços com o leitor. Boa leitura! Sandra Lima Röhl INSTITUTO CALUMBI Publicações Ecologia, educação, cultura e cidadania Consultorias nas áreas: Formação de gestores Ensino de Libras Pós graduação à distância Projetos culturais Projeto Livro Didático de História do município ® Diretora: Sandra Lima Röhl Jornalista responsável: Ticiana Rodrigues Aragão - MTB 2874 Reportagem e estrevista: Aécio Santiago Revisão: Raimundo Jaguaribe e Rouxinol do Rinaré Projeto gráfico: Norton Falcão Editoração eletrônica: Harry Carvalho Foto capa: Harry Carvalho CONSELHO EDITORIAL Ana Maria Iorio Dias (UFC) Ariana Cosme (Universidade do Porto - Portugal), Betânia Leite Ramalho (UFRN) Casemiro de Medeiros Campos (UFC), Clermont Gauthier (Université Laval, Canadá), Elicio Abreu (Undime-CE) Júlio César Araújo (UFC), Luís Távora Furtado Ribeiro (UFC) Marco Aurélio de Patrício Ribeiro (Iesc), Maria de Jesus Araújo Ribeiro (Mieib) Messias Dieb (UFC) Rui Trindade (Universidade do Porto - Portugal) COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Ana Cláudia Uchôa Araújo, Ângela Escudeiro, Augusto Boal, Carol de Holanda Pavão, Casemiro de Medeiros Campos, César Nunes, Cláudia Maria da Cruz, Cilene Conda, Cristovam Buarque, Fernanda de Façanha e Campos, Francesca Danielle Gurgel dos Santos, Kélia Jácome, Lídia Azevedo de Menezes, Lorena Sampaio, Lúcia Vanda Rodrigues, Luli Radfaher, Maria Isabel Filgueiras Lima Ciasca, Marcos Meier, Marcos Melo, Mário Sérgio Cortella, Milena Cristina Barros Barreto Aires, Nicolino Trompieri Filho, Odorico Monteiro, Ozires Silva, Patrícia Helena Carvalho Holanda, Patrícia Melo, Sandra Bozza e Thiago Chaer, Wellington Teófilo. A galinha dos ovos de rapadura Autor: Erilson Santiago Editora: SEDUC Ilustração: Nathália Forte Publicação: 2010 Essa é a história de Candoca, a galinha dos ovos de rapadura. Sempre que Candoca estava no canavial esperando seu marido Teleco, ela tomava caldo de cana. Um certo dia, seus ovos começaram a sumir e toda a bicharada da fazenda entrou em pânico. Descubra quem anda pegando os ovos da Candoca e o motivo do desaparecimento. Erilson é professor de Língua Portuguesa, formado pela UFC e que este livro rendeu o prêmio de literatura infantil cearense 2010 - SEDUC- PAIC Ensino de lutas na escola ASSINATURA E DISTRIBUIÇÃO Preço de assinatura anual no Brasil: R$ 59,90, para seis edições (bimestrais). Venda em banca no estado do Ceará, Piauí e Maranhão. Distribuição nacional para: assinantes, colaboradores, pesquisadores, gestores educacionais, Instituições do terceiro setor, ministérios da educação, cultura e meio ambiente. Autor: Heraldo Simões Ferreira Editora: Peter Röhl Educação Especial - 2ª Edição Publicação: 2012 220 Páginas Tiragem: 5.000 exemplares PUBLICIDADE Fone: +55 (85) 3214.6971 [email protected] ATENDIMENTO AO ASSINANTE Telefone: +55 (85) 3214.6971/8895.9997 [email protected] SUGESTÕES OU CRÍTICAS Telefone: +55 (85) 3214.6971/8895.9997 [email protected] ABC da Meninada 2ª edição A obra faz parte do Projeto Esporte Educacional na Escola e integra o volume 4 da Coleção Esporte. Apresenta ao leitor uma nova prática pedagógica que contempla os aspectos cognitivos, físico-motores e socioafetivos, além das dimensões de conteúdo conceituais, procedimentais e atitudinais desenvolvendo integralmente o educando. Autor: Crispiniano Neto Editora: IMEPH Publicação: 2012 56 páginas É livro que, furtivamente, a mãe ou o pai tiram da mochila da criança adormecida, para reler, recordar e sorrir, e depois devolvê-la ao lugar de origem. O á. bê. cê de Crispiniano é coisa para criança, para moços e para velhos é leitura obrigatória para alunos e para professores. Igual e diferente A Revista Vida e Educação é uma publicação bimestral da Editora Peter Röhl Edição e Comunicação, que mantém todos os direitos reservados. Rua Xavier de Oliveira, 36 60.455-660 – Fortaleza – CE Telefone/fax : +55 85 3214.6971 [email protected] As matérias divulgadas neste veículo não expressam necessariamente a opinião da revista. A publicação se reserva o direito de adequar os artigos. Impressão: Expressão Gráfica e Editora Contatos: (85) 9164 8506 e-mail [email protected] Autor/ Ilustração: Arlene Holanda Editora: IMEPH Publicação: 2012 24 Páginas Poesia para crianças. Texto leve e bem construído abordando as semelhanças e diferenças entre as pessoas – etnias, gostos, sonhos, sentimentos, opiniões – características que as completam enquanto seres humanos. Desperta no pequeno leitor a importância de conviver em sociedade com as diferenças. Assine Nunca tanta educação custou tão pouco. Tel: +55 85 3214.6971 [email protected] Cultura Afro-brasileira Ginga da capoeira na escola Lúcia Vanda Rodrigues Arquivo digital Atividade física que reúne diversas artes, a capoeira, torna-se objeto de pesquisa e vem se alinhando num processo educativo para a construção e o exercício da cidadania. Atualmente, as atividades esportivas evidenciam-se com grande relevância, atraindo a atenção dos indivíduos, como um meio de compensar as tribulações cotidianas que enfrentam, sobretudo por conta da complexidade da vida moderna. O fato de estar presente hoje em instituições variadas demonstra que o esporte não se limita às competições, sendo por isso considerado o maior fenômeno social da atualidade. 8 | MARÇO/ABRIL 2013 Entre os esportes mais em evidência atualmente está a capoeira, surgida no Brasil através da combinação de três elementos: a resistência do povo africano buscando manter sua identificação cultural frente ao sistema da escravidão em que vivia imerso; seu desejo de liberdade e o anseio de uma população composta por brancos, negros e índios que viviam explorados, oprimidos e excluídos da sociedade, de serem reco- nhecidos como cidadãos (AREIAS, 1983). Por ter surgido pela força da resistência cultural e ânsia de liberdade de africanos em solo brasileiro a capoeira é reconhecida mundialmente como um desporto de origem afro-brasileira, que incorpora movimentos de luta, acrobacias, dança, percussão e músicas num diálogo rítmico de corpo e mente. Proibida sua prática pelo Código Penal brasileiro de 1890, por ser considerada perigosa à sociedade vigente, foi liberada por Getúlio Vargas em 1934, passando a partir daí a fazer parte do contexto desportivo nacional. Reconhecida pelos órgãos competentes como arte marcial genuinamente brasileira desde 1972, praticada hoje em mais de 160 países, vem despertando muito interesse da pesquisa educacional, sendo mencionada sua importância como instrumento de educação, chamando a atenção para a sua contribuição no desenvolvimento do indivíduo. Esse fato me conduziu a eleger a capoeira como objeto de minha pesquisa de graduação no curso de Serviço Social, colocando em foco a discussão da função social dessa atividade humana como instrumento mediador do processo de educação de adolescentes da periferia de Fortaleza, no estado do Ceará, à cidadania. Ciente de que o processo educativo existe por toda parte, aparecendo sempre que há relações de pessoas e intenções de ensinar e aprender (BRANDÃO, 1991), de que o processo de conscientização e conquista da cidadania pode ocorrer em quaisquer lugares (RESENDE, 1996) e, sobretudo, que educar para a cidadania supera a postulação de direitos humanos, mais visa formar cidadãos que combatam os preconceitos, as discriminações, as disparidades e privilégios no plano social, levando o indivíduo a acreditar no seu próprio potencial, como agente de transformação qualitativa da própria vida e do mundo (BALESTRERI, 2002). “Essa prática pedagógica ajuda o aluno a se desenvolver melhor socialmente ...” Passei a pesquisar o núcleo de ensino da Associação Zumbi Capoeira, localizado no bairro de Canindezinho, inserido na comunidade do Grande Bom Jardim, no qual estava a frente ministrando aulas há seis anos, já que sou formada Mestre em Capoeira. Trinta alunos, com idade variando entre 12 e 24 anos, de ambos os sexos, compunham o público alvo do estudo. Dessa vez, meu olhar de pesquisadora ampliou-se, visando encontrar resposta para a pergunta central de minhas inquietações: a Capoeira pode ser utilizada como instrumento viabilizador da educação cidadã? O resultado do estudo apontou afirmativamente a capoeira com grandes probabilidades de colaborar na construção da educação para a cidadania de seus adeptos. Isso porque, ao contrário do que se imagina, o aprendizado da Capoeira não se constitui somente do ensino metódico de golpes e contragolpes, mas também inclui a soma de todos os conhecimentos dispersos entre seus praticantes, desde épocas mais remotas, até a atualidade, repassados de mestre para discípulo, de aprendiz para aprendiz, constituindo o que se pode chamar de tradição oral. Existe também, como parte da tradição na capoeira, o que se chama hierarquia, onde o praticante é respeitado pelo “seu tempo de Capoeira” e pela bagagem de conhecimento que acumula ao longo dos anos. Essa hierarquia natural pode ser sintetizada com os versos da cantiga de domínio público: “Sou discípulo que aprende, sou mestre que dou lição”, que expressa a filosofia de seu aprendizado: Quem sabe mais, mesmo que um pouco, ensina quem sabe menos (COSTA, 1993:87). Essa prática pedagógica ajuda o aluno a se desenvolver melhor socialmente, desde que ajuda o praticante a estabelecer laços de solidariedade, possibilitando sua maior integração ao grupo. Naturalmente, o aluno almeja conquistar a posição de mestre dentro do grupo de capoeira, fato que o conduzirá à persistência em sua prática, baseada, sobretudo, em disciplina pessoal, o que proporciona a ampliação de sua consciência e responsabilidade tanto na escola de capoeira da qual é representante, como fora dela, na condição de cidadão inserido numa determinada sociedade (COSTA, 1993). A capoeira fundamenta-se também nos seguintes princípios filosóficos que devem ser incorporados à sua prática: humildade, bom humor e malícia (CAPOEIRA, 1985). A humildade é de suprema importância, pois todos, apesar da hierarquia, são iguais como seres humanos. Ninguém sabe tudo, até mesmo quando atinge o grau máximo de mestre. É como diz Mestre Pastinha, maior expoente da Capoeira Angola no Brasil e no mundo: “A Capoeira teve início, mas seu fim é inconcebível ao mais sábio dos mestres” (CAPOEIRA, 1985:183). O bom humor constante é fundamental dentro e fora das rodas de capoeira. Ao ser atingido por um golpe, se o praticante não mantiver o bom humor, perde o controle emocional, o autodomínio tão necessário tanto na roda, como fora dela, no cotidiano. E o mais utilizado quando não se conserva o bom humor é a violência, e o capoeirista passa então agir dentro da roda como um “capitão-do-mato”, esquecendo que a capoeira foi criada para defesa e que a violência não faz parte de seus princípios. A malícia na Capoeira não deve ser entendida no seu sentido usual, de ser maldoso, mas no sentido do praticante perceber o mal, as reais intenções do seu VIDA E EDUCAÇÃO | 9 Cultura Afro-brasileira “oponente” e por ele não ser atingido, perceber o que não é bom para si e procurar um caminho melhor para trilhar. (CAPOEIRA, 1992). “...se faz necessário aproveitá-la e empregá-la de maneira eficiente e benéfica...” Aí estão os fundamentos básicos da capoeira com os quais posso concluir que representam alguns dos benefícios que ela pode trazer ao praticante como indivíduo, constituindo-se numa das possibilidades que, somadas a outras, vai conduzindo o aprendiz a modificar sua maneira de ser e agir com os outros indivíduos, transformando seu relacionamento com o mundo e a sociedade (CAPOEIRA, 1992). Mas os benefícios da capoeira não se resumem apenas em sua filosofia, pois se constitui como um conjunto de rara utilidade, formado pela reunião de vários fatores para a educação, já que em um só tema se tem reunidas atividades físicas com os movimentos, o ritmo dos instrumentos que acompanham as rodas, a dança como arte integrada, cultura e história. Por isso mesmo a capoeira encanta a todas as faixas etárias e é praticada por ambos os sexos, como retrata os versos da canção de domínio popular: “Capoeira é pra homem, menino e mulher, só não joga quem não quer”, configurando-se como um de seus maiores proveitos o interesse que ela desperta em seus praticantes. E quando existe motivação no sistema de ensino e aprendizagem tudo se torna mais fácil. Sendo a capoeira arte genuinamente brasileira altamente difundida e aceita por vários segmentos da 10 | MARÇO/ABRIL 2013 sociedade, se faz necessário aproveitá-la e empregá-la de maneira eficiente e benéfica, satisfazendo tanto o educador por realizar um trabalho eficaz com efetividade, quanto ao aluno por estar em contato com algo que tanto o cativa. Ressalto que, ao apresentar a capoeira como instrumento mediador do processo de educação cidadã de quantos venha a praticá-la, desejo tão somente ampliar a visão de quantos se interessem pelo tema quanto à necessidade de se utilizar métodos de acordo com o povo brasileiro e seu ambiente, buscando novos caminhos que possam capacitar o homem a desenvolver suas potencialidades, de forma que venham a contribuir com mais eficiência para o desenvolvimento e bem estar da sociedade na qual está inserido. Saída de um contexto de marginalidade e malandragem, por ser uma luta oriunda de negros escravos, é perceptível na sua história, da escravidão até os dias atuais, em que foi perseguida e marginalizada, quase extinta, seus adeptos em luta constante contra a estrutura que lhes negava o direito de ser cidadão e em todos os momentos estiveram, de uma forma ou de outra, lutando para serem reconhecidos como tais. Hoje, a capoeira é cidadã do mundo, sendo ensinada em escolas, academias de ginástica, universidades e mais recentemente nos presídios, começando a ser percebida e utilizada em toda sua riqueza, especialmente como importante instrumento pedagógico, demonstrando que “educar não é uma tarefa difícil. Basta um pouco de ousadia, alguma criatividade, fé em nosso próprio potencial, vocação real para educar e muita consciência de cidadania” (BALESTRERI,2002: s/p). Formação Docente E foi essa a minha intenção ao elegê-la como objeto de pesquisa: ousar, criar, acreditar nas possibilidades de cada um, assim como no potencial da capoeira, nascida do desejo da liberdade, do sofrimento, das lutas e aspirações, não só da raça negra, mas do povo brasileiro. Um povo humilde, que necessita de muita ginga, malícia, e bom humor para vencer na grande roda chamada vida! Lúcia Vanda Rodrigues Assistente Social pela Universidade Estadual do Ceará – UECE. Mestra em capoeira pela Associação Zumbi Capoeira – AZC. Mestra em Educação Brasileira pela Universidade Federal do Ceará – UFC. Doutoranda em Educação Brasileira pela Universidade Federal do Ceará – UFC. luciavandarodrigues@ hotmail.com Referências bibliográficas AREIAS, A. O que é capoeira. Coleção Primeiros Passos. 2. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1983. BALESTRERI, R.B. O que é educar para cidadania (s/d – s/e). BRANDÃO, C.R. O que é educação. 3. Ed. São Paulo: Brasiliense, 1995. COSTA, R.S. Capoeira: o caminho do berimbau. Brasília. Brasília: Thesaurus, 1993. CAPOEIRA, N. Capoeira. Os fundamentos da malícia. Rio de Janeiro: Record, 1992. _________Galo já cantou. Rio de Janeiro: Arte, 1985. RESENDE, E.J. Cidadania: o remédio para doenças culturais brasileiras. São Paulo: Summus, 1992. Possibilidades de aproximar teoria e prática Lídia Azevedo de Menezes Nicolino Trompieri Filho Maria Isabel Filgueiras Lima Ciasca Através de pesquisas científicas saiba como é fundamental o educador continuar pesquisando, saber ensinar e avaliar. Esta quarta edição tem como objetivo triangular resultados constatados na visão dos licenciandos em Pedagogia, perfil para formação profissional docente, e a ementa da disciplina Avaliação Educacional, descrita no projeto político-pedagógico do referido curso, pois considera-se que a formação de professores para avaliar na educação básica demanda competências e habilidades previstas no perfil profissional e em disciplinas no projeto político-pedagógico das licenciaturas, porém o que se tem evidenciado é que em virtude de uma formação fragmentada, disciplinar, diversificada, que não se relaciona teoria e prática, os licenciandos não desenvolvem competências e habilidades previstas para avaliar na educação básica. Nas três edições anteriores, abordou-se a problemática da formação de professores, primeiramente no que se refere à identidade docente, objeto de estudo da pesquisa de mestrado. Por conseguinte, ampliou-se as reflexões com foco na formação de professores para avaliar na educação básica, assunto investigado na pesquisa de doutorado. Assim, VIDA E EDUCAÇÃO | 11 FORMAÇÃO DOCENTE durante pesquisa exploratória, na mesma Universidade Pública, Ceará, constatou-se a fragmentação na formação inicial, o que nos remeteu ao debate sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais para Formação de Professores na Educação Básica e outros documentos. Realizou-se comparativo com pesquisas acerca da formação de professores para avaliar na educação básica, com os resultados encontrados até então. Conforme ressaltou-se na última edição, durante pesquisa exploratória, os licenciandos apresentaram aspectos positivos. Quanto ao professor A: “a aula do professor A não é cansativa, pois ela é extrovertida e anima a sala” (licenciando A); aulas comentadas e bem explanadas” (licenciando B). Já o professor B: “textos ótimos e bem trabalhados” (licenciando C); “gostei muito dos métodos aplicados na sala de aula, como o uso de textos atuais, trabalhos em grupos e individuais, e recursos, como data-show” (licenciando F). Pelos aspectos positivos apontados constatou-se que houve satisfação dos licenciandos, porém destacaram-se aspectos negativos. Para o professor A: “apesar das aulas terem sido dinamizadas, houve uma falha por parte da professora nas apostilas, que mandava tirar xerox e não utilizava o conteúdo da apostila que trata sobre a avaliação. Por mais que estudamos, não é a mesma coisa quando se tem a explicação vinda da professora, onde podemos tirar dúvidas sobre avaliação” (licenciando A); “faltou aula de campo e conhecimento mais aprofundado” (licenciando B). Em relação ao professor B, afirmaram: “Faltou uma atividade de pesquisa de campo, onde poderíamos ter tido oportunidade de aprofundar o conhecimento” (licenciando C); “o que atrapalhou o andamento 12 | MARÇO/ABRIL 2013 da disciplina foram os feriados” (licenciando D). Por sua vez, constatou-se divergências nas práticas pedagógicas no ensino superior dos referidos professores, pois o professor A, não utilizou material selecionado de forma adequada, e o professor B, teve o prosseguimento da disciplina comprometido, devido aos feriados. Ambos os professores, conforme os licenciandos, poderiam realizar atividades de campo, como estratégia de aprofundamento do conhecimento, demonstrando-se a importância de se relacionar teoria e prática. Foram realizadas as seguintes sugestões para o professor A: “seria muito bom se houvesse seminários, debates em equipes, palestras de avaliadores externos ou internos” (licenciando A); “analisar avaliações em escolas e realizar relatórios em grupo” (licenciando B). Quanto ao professor B: “nos próximos períodos, as aulas se tornassem menos cansativas, pois vimos muita teoria. Poderia ser trabalhada mais a prática, com pesquisas de campo, para comparar nossa própria rotina, para levar aos nossos colegas e professor a realidade do nosso trabalho” (licenciando C); “realização de seminários a partir de pesquisas ou experiências dos próprios alunos” (licenciando D). Veiga (2009) enfatiza a importância de se discutir as dimensões e conexões do processo didático na ação docente, pois significa compreender as concepções de ensinar, pesquisar, aprender e avaliar. Ou seja, uma ação refletida permeada pela intencionalidade, um componente central do processo didático, pois ela se exerce como uma referência que pretende guiar a ação didática, dar direção e sentido ao ensino, à pesquisa, à aprendizagem e à avaliação. As sugestões apontadas pelos licenciandos denotam uma relação intrínseca as dimensões e conexões do processo didático na ação docente, emergindo um olhar da docência, na relação entre currículo e ensino superior, na formação de professores para avaliar na educação básica. Ao analisar a ementa da disciplina Avaliação Educacional, descrita no projeto político-pedagógico do curso de licenciatura em Pedagogia, localizou-se um quesito, sobre avaliação, no perfil profissional docente: “avalie permanentemente os processos educativos, incorporando a concepção de formação contínua, a unidade da ação docente e a relação docente-discente”. A disciplina possui carga horária de 60h, situa-se, como já ressaltado, no 4º período, eixo: pesquisa e gestão do conhecimento educacional, com a finalidade de proporcionar aos licenciandos: “conhecer e realizar atividades na gestão dos processos educativos escolares e não escolar como planejar, implementar, coordenar, acompanhar e avaliar”. E a ementa sugere: “Estudo da avaliação como instrumento indispensável para o planejamento e acompanhamento das ações educativas. As diferentes concepções da avaliação e suas manifestações na prática. Procedimentos e instrumentos da avaliação da aprendizagem. Avaliação Institucional. Instrumento de Avaliação”. Pacheco (2005) enfoca que o currículo não é meramente um plano, um programa, um cursus, uma pista de corrida para os aprendentes. Currículo também é um projeto, uma práxis sobre um conhecimento controlado, por um lado, no contexto social em que o conhecimento é concebido e produzido e, por outro, no modo como esse conhecimento é traduzido para ser utilizado no meio educativo. Assim, a teoria curricular crítica tornar-se-á ferramenta concei- tual se ajudar professores e alunos a entender que o currículo é uma construção que também lhes pertence, não pelas políticas de descentralização que lhes reconhecem autonomia, mas porque as políticas culturais permitem afirmar que o currículo é uma construção enredada nas lutas e relações sócio-políticas. Triangulando-se os resultados constatados na visão dos licenciandos, compreende-se que o currículo, descrito no perfil profissional docente e na disciplina Avaliação Educacional, previsto no projeto político-pedagógico do curso de licenciatura em Pedagogia, em Universidade Pública, no Ceará, foi implementado a nível teórico, constatando-se um distanciamento entre teoria e prática, tornando-se a formação de professores para avaliar na educação básica fragmentada. Nesse sentido, acredita-se que a reforma curricular, ocorrera somente no currículo, pois as competências e habilidades a serem desenvolvidas, conforme descrito nas Diretrizes Curriculares, representa um desafio constante para a docência, no ensino superior. Assim, concorda-se com Lopes e Dias (2003), ao argumentarem que o currículo por competências apresenta-se como recontextualizado com o fim de atender às novas finalidades de formação docente: flexível e sujeita à avaliação permanente. O modelo que está sendo questionado para o currículo da formação de professores no Brasil é o que se baseia nas experiências acadêmicas, desenvolvido especialmente nas universidades. Desse modo, a recontextualização do currículo da formação de professores baseada nas competências modifica o foco da aprendizagem escolar, na qual os conteúdos e as disciplinas passam a ter valor apenas como meios para constituição de competências. Corroborando-se, Valente (2002) afirma que, se os professores não se apropriarem do significado da noção de competência, poderão torná-las meros exercícios redacionais, partícipes sem maior expressão em planejamentos elaborados apenas para atender exigências burocráticas. Por sua vez, Mendes (s.d) assevera que os estudos sobre avaliação reafirmam a necessidade de se encarar, sem deixar de considerar as implicações políticas e sociais que esta temática envolve. Está então colocado o desafio, especialmente no sentido de formar professores conscientes de sua responsabilidade como ator principal para desencadear novos processos avaliativos para a educação básica. Vale salientar que os desafios não são somente no âmbito da formação inicial nas licenciaturas, mas na formação continuada dos professores, em virtude de não terem desenvolvido na sua formação inicial competências e habilidades para avaliar na educação básica. Dessa forma, dar-se-á continuidade na próxima edição, reflexão acerca das competências e habilidades para avaliar e a importância da concepção da avaliação formativa como possibilidade de melhoria na qualidade da aprendizagem dos alunos na educação básica. Lídia Azevedo de Menezes - Doutoranda em Educação Brasileira, pela Universidade Federal do Ceará-UFC, na Linha Avaliação Educacional, Eixo Ensino-Aprendizagem. Bolsista FUNCAP. Pesquisadora em Avaliação e Formação de Professores. Publicou em 2011 pela Editora Caminhar “Avaliação Curricular e Identidade Docente”. lidia_educacao@yahoo. com.br Linha de Avaliação Educacional, Eixos Avaliação do Ensino-Aprendizagem e Avaliação Curricular. Orientador de Mestrado e Doutorado, da Faculdade de Educação-FACED/UFC. [email protected] Maria Isabel Filgueiras Lima Ciasca - Doutora em Educação Brasileira, pela Universidade Federal do Ceará-UFC, na Linha Avaliação Educacional, Eixo Ensino-Aprendizagem. Professora Adjunta IV. Atua na Linha de Avaliação Educacional, Eixo Avaliação do Ensino-Aprendizagem. Orientadora de Mestrado e Doutorado, da Faculdade de Educação-FACED/UFC. [email protected] Referências bibliográficas LOPES, A. C.; DIAS, R. E. Competências na Formação de Professores no Brasil: O que (não) há de novo. Educ. Soc., Campinas, vol. 24, n. 85, p. 1155-1177, dezembro 2003. Disponível em http://www.cedes.unicamp.br. Acesso em 21/03/2011. MENDES, O. M. As Políticas de Formação de Professores e de Avaliação: caminhos que se cruzam. FACED/UFU. s.d. PACHECO, J. A. Escritos Curriculares. São Paulo: Cortez, 2005. VALENTE, S. M. P. Competências e Habilidades: Pilares do Paradigma Avaliativo Emergente. Ensino e Avaliação em uma proposta para a formação de competências. Este texto é parte integrante da Tese de Doutorado: Parâmetros Curriculares e Avaliação nas Perspectivas do Estado e da Escola, defendida na UNESP/Marília em 20 de junho de 2002. VEIGA, I. P. A. A aventura de formar professores. Campinas, SP: Papirus, 2009. Nicolino Trompieri Filho - Doutor em Educação Brasileira, pela Universidade Federal do Ceará- UFC. Professor Adjunto IV. Atua na VIDA E EDUCAÇÃO | 13 étempo de avançar AMAISNOVATECNOLOGIAHEIDELBERG GERAÇÃOSPEEDMASTERSX74 ImpressãoOff-setnas4cores(comreversão), maisagilidadeequalidade. Busquenovosespaços! Velocidadedeproduçãodeaté15.000folhasporhora Invistanomarketingdesua empresa,dêvisibilidadeaos seusserviçoseprodutos! 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Nesta edição da revista Vida e Educação analisaremos a evolução longitudinal da proficiência de dois grupos de alunos na disciplina de Matemática, que cursaram o EM nos períodos 2008-2010 e 20092011, identificando o quanto agregaram cognitivamente durante os três anos; as competências e habilidades que dominavam e/ou deixaram de dominar no término do EM; e quantos alunos concluíram o EM com o nível de desempenho considerado adequado. Durante todo o percurso escolar escutamos as queixas dos professores em relação à aprendizagem dos alunos na disciplina de Matemática, em muitas destas as dificuldades de aprendizagem diagnosticadas são justificadas pelos educadores como falta de embasamento necessário 16 | MARÇO/ABRIL 2013 em conteúdos universais da disciplina, cujo domínio possibilitaria o desenvolvimento de novas aprendizagens e/ou o aprofundamento de conhecimentos mais complexos. É importante lembrarmos que os resultados do SPAECE na disciplina de Língua Portuguesa, divulgados na edição anterior, nos revelaram problemas relacionados à leitura e interpretação textual, o que provoca consequências não só na aprendizagem desta disciplina, como também nas demais disciplinas da série cursada pelo aluno. Assim, teremos efeitos similares na avaliação do SPAECE de Matemática, considerando que se o aluno tem dificuldades de interpretar o que lê, como terá condições plenas de resolver as situações problemas propostas na avaliação? A gravidade é acentuada na disciplina de Matemática devido os conteúdos serem sequenciais e, à medida que os anos escolares vão passando, o nível de complexidade dos conhecimentos matemáticos também vai aumentando, provocando um distanciamento cada vez maior da possibilidade de aprendizagem do aluno que já tenha dificuldades em desenvolver competências e habilidades nesta disciplina, justificado pela falta de maturidade cognitiva adequada para o grau de complexidade trabalhada na série/ano que estuda, provocando dificuldades de aprendizagens cada vez maiores, (FELICETTI, 2010). O desempenho dos alunos é avaliado tendo como referência uma escala de proficiência de 0 a 500 pontos, a partir desta, é possível identificarmos o que os alunos sabem para a série/ano avaliado(a) e o que deveriam saber. Em relação à escala de proficiência da disciplina de Matemática, o ponto de corte para análise tem uma diferença de vinte e cinco pontos a mais em relação à escala de proficiência em Língua Portuguesa, discriminadas da seguinte forma (CEARÁ, 2009): muito crítico, médias abaixo de 250 (< 250); crítico, médias no intervalo 250 |-- 300; intermediário, médias no intervalo 300 |-- 350; e nível adequado, maior ou igual que 350 (≥ 350). O aluno do Ensino Médio tem três anos (1ª, 2ª e 3ª série) para chegar ao ponto considerado mínimo adequado, ou seja, 350 da escala de proficiência de Matemática, porém podemos encontrar evidências de alunos da 1ª série com média de proficiência adequada nesta disciplina, estes certamente terão mais chances de desenvolver as competências e habilidades esperadas para o EM. Daí, a importância da equipe pedagógica de cada unidade escolar, com seus respectivos professores de Matemática, se apropriarem dos resultados do SPAECE e mapear a média de proficiência dos seus alunos, identificando: quais descritores acertaram e quais erraram; e quais habilidades já foram desenvolvidas e quais ainda precisam ser alcançadas. A apropriação destes dados pela equipe pedagógica e professores norteará a definição de estratégias metodológicas de modo a promoverem um planejamento pedagógico interventivo, com foco na superação das dificuldades de aprendizagens reveladas numa perspectiva de avaliação formativa reguladora, cujos pressupostos pedagógicos, segundo Silva (2010), devem primar pela educabilidade; o entendimento é que todos os alunos são capazes de aprender, cada um no seu tempo e forma; pedagogia diferenciada, onde o professor mediador antecipe os obstáculos didáticos similares entre a maior parte dos alunos e proporcione ações pedagógicas diversificadas; pesquisa como fundamento do trabalho pedagógico, primando pela investigação pedagógica para favorecer a contextualização curricular à realidade dos alunos do EM, onde a escola está inserida; centralidade nas aprendizagens significativas em Matemática, superando aprendizagens mecânicas, onde os alunos são treinados na resolução de exercícios matemáticos; escola como lugar de aprendizagens, aberta a transformações com respeito à multiplicidade cultural, em que a prática docente seja constantemente analisada no intuito de sua melhoria; projeto político-pedagógico construído coletivamente e que oriente o cotidiano pedagógico da prática docente; e, além de tudo, que todos os educadores envolvidos com a educação formal assumam o compromisso social de promoção de uma escola pública de qualidade. Analisemos a evolução das médias de proficiência dos dois grupos de alunos, apresentados nos Gráficos 1 e 2, abaixo. Evolução da proficiência em Matemáca dos alunos do EM no SPAECE - Período 2008-2010 253,2 234,9 1ª SÉRIE - ANO 2008 2ª SÉRIE - ANO 2009 3ª SÉRIE - ANO 2010 Proficiência Matemáca Gráfico 1 - Demonstrativo da evolução da proficiência dos alunos em Matemática durante os três anos de Ensino Médio no SPAECE 2008-2010, 1º Ciclo. Fonte: Elaboração própria com base nos dados divulgados em Ceará (2012). Evolução da proficiência em Matemáca dos alunos do EM no SPAECE - Período 2009-2011 264,6 254,5 239,8 1ª SÉRIE - ANO 2009 2ª SÉRIE - ANO 2010 3ª SÉRIE - ANO 2011 Proficiência Matemáca Gráfico 2 - Demonstrativo da evolução da proficiência em Matemática dos alunos durante os três anos de Ensino Médio no SPAECE 2009-2011, 2º Ciclo. Fonte: Elaboração própria com base nos dados divulgados em Ceará (2012). Os alunos que estudaram nos dois períodos analisados, concluíram o EM com padrão de desempenho na proficiência em Matemática considerado crítico, cujo crescimento em percentual ao longo dos três anos foi respectivamente 10,7 e 10,3, ou seja, o valor agregado em conhecimento cognitivo durante o EM fica aquém do desejado para atingir o padrão de desempenho considerado adequado. Se considerarmos na análise a escala de proficiência em Matemática utilizada para a 3ª série do EM, ao longo dos três anos, perceberemos que estes alunos avançaram em conhecimentos matemáticos da 1ª para a 2ª série, saindo do padrão muito crítico para o crítico, porém a evolução cai consideravelmente da 2ª para 3ª série. Diante deste crescimento irrisório surgem muitos questionamentos envolvendo: a formação do professor licenciado em Matemática está atendendo a necessidade dos alunos do Ensino Médio da escola pública? A dinâmica de acompanhamento pedagógico destes alunos tem mapeado as dificuldades de aprendizagem reveladas pelo SPAECE como foco na superação das mesmas? O currículo adotado pelas escolas públicas cearenses tem possibilitado a flexibilidade no planejamento das aulas de Matemática? O planejamento das aulas tem como prioridade a aprendizagem dos alunos com superação das dificuldades apresentadas ou o foco é somente o conteúdo? Poderíamos acrescentar muitos outros questionamentos, mas o fato é que os nossos alunos pouco têm aprendido em relação aos conteúdos tangíveis pela avaliação em larga escala adotada no Ceará. Isto remete aos educadores a responsabilidade de promover uma discussão reflexiva no âmbito escolar sobre a prática pedagógica adotada, que pouco tem favorecido a melhoria da aprendizagem dos alunos. Analisemos os Gráficos 3 e 4 a seguir. Estes apresentam o demonstrativo de crescimento em pontos da proficiência em Matemática de uma série para outra, ficando evidente quanto os alunos agregam de conhecimento cognitivo em Matemática durante os três anos do EM. VIDA E EDUCAÇÃO | 17 pesquisa Crescimento da proficiência em Matemáca Período 2008-2010 30 25,1 25 20 15 18,3 10 6,8 5 0 1ª /2ª SÉRIE 2ª /3ª SÉRIE 1ª /3ª SÉRIE Crescimento na proficiência de Mat/ Pontos Gráfico 3 - Demonstrativo do crescimento da proficiência em Matemática dos alunos concludentes do EM, período 2008-2010. Fonte: Elaboração própria com base nos dados divulgados em Ceará (2012). Crescimento da proficiência em Matemáca Período 2008-2010 30 25,1 25 20 15 18,3 10 6,8 5 0 1ª /2ª SÉRIE 2ª /3ª SÉRIE 1ª /3ª SÉRIE Crescimento na proficiência de Mat/ Pontos Gráfico 4 - Demonstrativo do crescimento da proficiência em Matemática dos alunos concludentes do EM, período 2009-2011. Fonte: Elaboração própria com base nos dados divulgados em Ceará (2012). É possível evidenciarmos similaridade no crescimento na proficiência de Matemática nos dois grupos de alunos através dos Gráficos 3 e 4, a saber: aprendizagem maior da 1ª para 2ª série em relação ao crescimento da proficiência da 2ª para 3ª série. Esta similaridade nos faz lembrar que os conteúdos de Matemática trabalhados da 2ª para a 3ª série são mais complexos, exigindo que os alunos tenham o domínio de alguns conhecimentos básicos em Matemática trabalhados em fases escolares anteriores, o que possibilitará a aprendizagem 18 | MARÇO/ABRIL 2013 de novos conteúdos previstos para estas séries. O professor conhecedor das médias de proficiências de seus alunos saberá se a turma está preparada ou não para estudar determinados conteúdos, antecipando-se em relação a possíveis obstáculos de aprendizagem, cujo currículo deverá ser flexível a esta realidade. Assim, planejará estratégias pedagógicas condizentes com a diversidade de padrão de desempenho que o grupo de alunos apresentou nos resultados do SPAECE, assumindo a preocupação de uma prática docente que favoreça a transposição didática do conteúdo matemático, adequando-o ao nível de proficiência que os alunos se encontram na perspectiva de superar as dificuldades e ocorra avanço cognitivo. De acordo com o detalhamento dos padrões de desempenhos apresentados em Ceará (2009), ambas as turmas concluíram o EM sem terem desenvolvido as competências e habilidades mínimas esperadas, apesar de terem demonstrado, a partir do resultado do SPAECE da 2ª série, o domínio de habilidades consideradas básicas, além de necessárias, para aprenderem os conteúdos. Porém, considerando o tempo que restava para conclusão do EM pelos alunos, precisaria ter ocorrido uma ação articulada bem planejada entre gestores, coordenadores pedagógicos, professores coordenadores de áreas e seus respectivos professores de Matemática para definir coletivamente estratégias pedagógicas que estimulassem seus alunos a desenvolverem habilidades de resolver situações-problemas com grau de complexidade um pouco maior (CEARÁ, 2009), condizente com a série/ ano avaliada. Oportunamente, lembramos-nos de Vianna (2005), quando elenca alguns dos comportamentos que o alu- no deveria ser capaz como resultado do processo ensino e aprendizagem da disciplina de Matemática, dentre eles: solucionar problemas de diferentes formas e níveis de formulação com reconhecida importância para a vida em sociedade, cujos problemas envolvam a necessidade de conhecimento matemático. Embora a busca seja constante por esta emancipação na aprendizagem dos alunos, a realidade escolar ainda está permeada de tradicionalismo no ensino de Matemática, cujos conteúdos, em sua maioria, não são contextualizados à realidade dos alunos, além de não transparecerem a estes por que é importante estudá-los e qual a sua utilidade na vida cotidiana. Através dos resultados do SPAECE, apresentados anteriormente nos gráficos, é possível diagnosticar que os alunos dos dois períodos analisados concluíram a 3ª série do EM com habilidades na resolução de situações problemas envolvendo operação de subtração de números racionais representados na forma decimal contendo o mesmo número de casas decimais; encontrar informações em gráficos, cuja estrutura contenha até duas colunas; localizar dados em tabelas de múltiplas entradas; converter de kg para g ou relacionar diferentes unidades de medida de tempo; localizar números inteiros e números racionais na reta numérica; aplicar o conceito de porcentagem, progressão aritmética e probabilidade em situações problemas consideradas simples; identificar fração como parte de um todo, sem necessitar de apoio ilustrativo; e calcular o valor numérico de uma expressão algébrica, incluindo potenciação, dentre outras habilidades. (CEARÁ, 2009). Apesar da média de proficiência em Matemática dos dois grupos de alunos cearenses, concludentes do EM, indicar padrão de desempenho considerado crítico, alguns alunos concluíram esta fase da vida escolar com padrão adequado (CEARÁ, 2012). Dentre as habilidades que estes alunos desenvolveram, podemos destacar: resolvem situações problemas que exigem raciocínio algébrico e geométrico; calculam volume de paralelepípedo; sabem dividir com números racionais, tanto na forma fracionária quanto na forma decimal; são capazes de resolver problemas envolvendo sistemas de equações de 1º e 2º grau; conseguem utilizar o princípio multiplicativo para eventos, independentes no cálculo da probabilidade de um evento; resolvem problemas envolvendo equações e funções exponenciais simples; e relações métricas no triângulo retângulo. (CEARÁ, 2009) Entretanto, os resultados de ambos os períodos analisados precisam ser discutidos entre os gestores e professores no âmbito da Secretaria da Educação, Coordenadorias Regionais de Desenvolvimento da Educação (CREDE’s) e, principalmente, nas escolas públicas do Estado do Ceará, considerando o quantitativo inexpressivo de alunos que concluem o EM com o padrão de desempenho adequado no universo de alunos avaliados pelo SPAECE. Vejamos o Gráfico 5. É perceptível através do Gráfico 5 que mais de 90% dos alunos que concluíram o EM nas escolas públicas do Ceará, nos dois períodos analisados, estavam com a média de proficiência abaixo do nível adequado. No intuito de entendermos a gravidade desta realidade na 3ª série do período 2008-2010 e 2009-2011, foram avaliados respectivamente 82.475 e 82.549 alunos, destes somente 5,4 e 6,7%, nesta ordem, obtiveram média de proficiência no nível adequado, ou seja, apenas 4.417 e 5.507 alunos conseguiram desenvolver as competências e habilidades esperadas para o Ensino Médio. Diante de todo investimento no âmbito da educação cearense, menos de 10% dos alunos concluem o EM tendo desenvolvido as competências e habilidades previstas; fato que precisa ser urgentemente debatido e investigado, fazendo-se uma reflexão coletiva sobre como podemos aproveitar o tempo escolar dos alunos proporcionando-lhes aprendizagens significativas. Para tanto, a compreensão e apropriação dos resultados do SPAECE na perspectiva longitudinal no âmbito escolar, oferece a possibilidade de uso da avaliação em uma perspectiva formativa pelo professor, acreditando que o erro do aluno na Matemática é fonte de informação sobre a maturidade cognitiva que se encontra e o planejamento de estratégias pedagógicas partindo desta informação, certamente terá efeitos positivos na aprendizagem da disciplina de Matemática. Demonstravos do percentual dos alunos concludentes da 3ª série do EM em nível adequado em Matemáca 2011 6,7 93,3 2010 5,4 94,6 0 20 40 % de alunos abaixo do nível adequado 60 80 100 % de alunos com nível adequado Francesca Danielle Gurgel dos Santos - Doutoranda em Educação Brasileira pela Universidade Federal do Ceará (UFC), linha de pesquisa Avaliação Educacional no Eixo Avaliação Ensino-Aprendizagem. [email protected] Maria Isabel Filgueiras Lima Ciasca - Professora Associada do Departamento de Fundamentos da Educação da Faculdade de Educação (FACED) da UFC. Diretora da FACED. Doutora em Educação Brasileira pela UFC. Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Orientadora de Mestrado e Doutorado, da FACED UFC. [email protected] Nicolino Trompieri Filho - Doutor em Educação Brasileira pela UFC. Atua na Linha de Avaliação Educacional, Eixos Avaliação do Ensino-Aprendizagem e Avaliação Curricular. Orientador de Mestrado e Doutorado, da FACED/UFC. [email protected] Referências bibliográficas CEARÁ. Secretaria da Educação. SPAECE – 2008 a 2011 – Resultados de desempenho e participação – Projeto Matemática. ______. Secretaria da Educação. Boletim Pedagógico da Escola. SPAECE – 2009, Ensino Médio – Matemática/Universidade Federal de Juiz de Fora, Faculdade de Educação, CAEd. v. 3 (jan/ dez. 2009), Juiz de Fora, 2009 – Anual. FELICETTI, Vera Lucia. Linguagem na Construção Matemática. Revista Educação por Escrito – PUCRS, v. 1, n. 1, p. 31-43, 2010. SANTOS, Francesca Danielle Gurgel dos; CIASCA, Maria Isabel Filgueiras Lima. A perspectiva do acompanhamento longitudinal da aprendizagem dos alunos do ensino médio através dos resultados do SPAECE. Estudos em avaliação educacional, São Paulo, v. 23, n. 51, p. 116-134, jan./abr. 2012. SILVA, Jassen Felipe da. Avaliação na perspectiva formativa-reguladora: pressupostos teóricos e práticos. Porto Alegre: Mediação, 2010. VIANNA, Heraldo Marelim. Fundamentos de um Programa de Avaliação Educacional. Brasília: Liber Livro Editora, 2005. Gráfico 5 - Situação do desempenho dos alunos em Matemática na conclusão do EM, em 2010 e 2011. Fonte: Elaboração própria com base nos dados divulgados em Ceará (2012). VIDA E EDUCAÇÃO | 19 empreendedorismo Educação Empreendedora Fernanda de Façanha e Campos Através de pesquisas científicas saiba como é fundamental o educador continuar pesquisando, saber ensinar e avaliar. Escolas parceiras O êxito da Metodologia Orientação Profissional, Empregabilidade e Empreendedorismo - OPEE consiste por oferecer oportunidades para crianças e jovens na construção dos seus projetos de vida e para provocá-los, por meio do empreendedorismo, dando sentido no que eles fazem na escola, ou seja, aproximar a vida da escola e a escola da vida. Segundo o consultor de negócios da Editora Caminhar e representante da Metodologia OPEE no Nordeste, José Farias dos Santos Filho, a escola precisa fazer as crianças sonharem que outro mundo é possível e a Metodologia OPEE vai ser um instrumento que contribui para o fortalecimento da autonomia e autoestima dos alunos. Atualmente a Metodologia OPEE está presente nos estados do Ceará, do Maranhão e da Bahia. No quadro ao lado apresentamos as escolas parceiras na Metodologia OPEE: EDITORA CAMINHAR LTDA Av. Dom Manuel, 709 - Centro - Fortaleza /CE - CEP: 60060-090 www.opee.com.br | [email protected] CEARÁ Fortaleza: Colégio Moranguinho Colégio Cora Coralina Colégio Daulia Bringel Colégio Maria Ester I Colégio Maria Ester II Colégio Irmã Maria Montenegro I Colégio Irmã Maria Montenegro II Sobral: Colégio Luciano Feijão Tianguá: Colégio Santa Maria Bela Cruz: Centro de Educação e Apoio Interdisciplinar Alegria do Saber - CEIAM MARANHÃO São Luís: Colégio Santa Teresa (Irmãs Dorotéias) Colégio O Bom Pastor Colégio O Bom Pastor Junior Colégio Dom Pedro II Colégio Educator Imperatriz: Colégio Santa Luzia BAHIA Salvador: Colégio Mundial Diferencial na formação A psicóloga Milena Aires, que trabalha com orientação profissional e a formação de professores com a Metodologia OPEE, afirma que os princípios do autoconhecimento, definição de valores e a perspectiva de futuro formam as diretrizes intrínsecas a OPEE. Esses princípios atingem o professor nas dimensões pessoal e profissional. À medida que ele vai vivenciando, também vai se modificando e construindo um estilo de vida mais humano, voltado para a necessidade do outro, em que se respeita o ser humano, isso facilita a sua relação na sala de aula com os alunos, e consequentemente a educação e a escola ganham, pois, nesta relação humanizada o aluno, a escola e a família são diretamente beneficiados. Somente seremos pessoas valiosas se construirmos nos seres humanos, pela educação, esses valores que afirmam de forma crítica a nossa humanização. Com esta nova forma de ensinar e aprender, pautada no diálogo, na escuta e no olhar, temos o compromisso de formar as novas gerações com integridade e caráter. Fones: 85 9601.1520 85 3261.0501 85 9769.8282 VIDA E EDUCAÇÃO | 21 Gestão Educacional Como acompanhar as mudanças educacionais? Foto: Arquivo Digital Thiago Chaer Saiba de que maneira o papel do educador na gestão pode transformar tanto as práticas como as instituições educacionais. Cada educando, cada grupo de educandos, cada situação de ensino possui características únicas e singulares. Desta forma as ações empreendidas num processo de ensino dependem das intenções e significações atribuídas por seus protagonistas. Neste contexto, a incerteza, novos saberes a descobrir e construir e a reflexão sobre e na ação são aspectos que permeiam a prática educativa. Os educadores jamais evoluirão em sua formação e prática se não 22 | MARÇO/ABRIL 2013 conviverem com a mudança, com novos desafios promovidos pela diversidade nas formas de aprendizado, pelo contexto singular de vida de cada aluno, do seu próprio contexto e do contexto local. Na configuração atual do ensino, o educador limita-se a dar aula num mesmo formato, seguindo regras pré-definidas e métodos restritivos, impelindo-o numa espiral de desmotivação e descrença sobre sua real capacidade de transformação social através de sua prática. Para que o educador possa se emancipar das tutelas externas e mostrar a totalidade de sua inteligência e de seu pensamento crítico para a compreensão e a transformação social, é necessário que ele participe das decisões sobre sua atuação, na definição de seus referenciais, na reformulação de saberes conceituais e práticos, na construção de métodos e políticas a respeito de sua atuação. A educação é um aprendizado no contexto na busca pelo bem-estar social! Não se limitando somente a racionalidade técnica, assumindo valores e conceitos construídos por outros, o educador deve considerar o desenvolvimento de sua autonomia pela racionalidade prática, comprometendo-se com a realização dos seus próprios sonhos e ideais, ressignificando seus conceitos e conhecimentos, como encorajando e apoiando a realização dos projetos e ideais de seus educandos, fortalecendo o exercício da experimentação e da aprendizagem contínua. Relacionando teoria e prática, em uma aprendizagem transformadora. Uma dimensão muito importante que deve ser considerada quando tratamos da autonomia e da formação continuada do educador, é a dimensão emocional, pouco desenvolvida na formação inicial e continuada, e algumas vezes mal interpretada dentro das instituições, o resultado disso é o distanciamento afetivo das situações e das pessoas. Mesmo que para alguns o vínculo emocional e afetivo gera certo inconveniente, atrapalhando o diagnóstico ou a aplicação de métodos de ensino, por exemplo, é preciso rever as dimensões do trabalho educacional, pois assim como bem coloca Frei Betto, estamos numa mudança de época e não numa época de mudanças, complementando com Domenico De Masi que diz que há uma mudança de época quando três inovações coincidem e são concomitantes: novas fontes energéticas, novas divisões do trabalho e novas divisões do poder. Neste sentido, novos valores emergem e habilidades humanas e relacionais são mais do que necessárias ao educador que é mediador na relação entre o sujeito e os mundos, e que na inversão de papéis, construindo e desconstruindo seus aprendizados, aprimorando continuamente sua prática gerando mudanças coerentes de forma sistêmica. “...política de incentivo, de remuneração e um plano de carreira são fatores preponderantes...” Como costumo enfatizar, para aprendizagem ter sentido para o educando, precisa essencialmente ter sentido para o educador. Por isso a abordagem até aqui foi em torno do papel do educador, já que não se pode desenvolver valores educacionais sem a participação ativa do educador. Sim, uma política de incentivo, de remuneração e um plano de carreira são fatores preponderantes quando tratamos da valorização do educador, mas somente são efetivos se combinados com o alinhamento de valores e aspectos formativos como os citados anteriormente. Para concluir, toda mudança exige compreensão (o significado de compreender é apreender em conjunto, abraçar junto), é preciso que as inter-relações governo-escola, escola-família, família-escola, escola-educando, educando-sociedade passe por uma ressignificação de papéis, métodos e processos, para que se torne um organismo sistêmico de apoio e cooperação, conduzindo mudanças coerentes, relevantes e pertinentes. Essas inter-relações existem mesmo se falarmos de educação aberta, ensino domiciliar, autoaprendizagem e todas as demais práticas e conceitos que envolvem o processo de ensino-aprendizagem fora dos limites das Instituições. Por isso o papel do educador é central em todo o processo, seja o educador profissional que possui experiência, habilidades e competências para isso, como o educador informal (pais, familiares, trabalho, sociedade em geral). Se a mudança é a principal exigência do nosso século, as insti- tuições precisam saber como lidar com ela, quando lhes for exigido. Assim, listo algumas etapas importantes da gestão de mudanças aplicadas à educação. • Contratação de um líder externo, com perfil para realizar o diagnóstico e apoio a gestão da mudança. • Diagnóstico junto à instituição para identificar a necessária mudança. • Definição dos objetivos estratégicos, após acordo com principais interessados (coordenação, educadores, pais e, em casos específicos, os alunos). • Sensibilização e envolvimento de todos interessados. • Definição da nova missão. • Sensibilização e envolvimento de todos interessados. • Definição de métodos participativos e colaborativos para a condução das atividades necessárias à realização da mudança. • Definição dos caminhos críticos. • Transparência e diálogo na condução. • Avaliação do impacto da mudança. • Acompanhamento por tempo determinado. O engajamento das pessoas para uma mudança só acontecerá quando o propósito da mudança for compartilhada e alinhada aos valores pessoais, por isso uma mudança não deve ser imposta, mas co-criada. Thiago Chaer Idealizador e Presidente do Instituto Inovar para Educar, organização orientada para a melhoria da educação, por meio do apoio a formação continuada de educadores. Especialista em Gestão da Inovação pela UTFPR. Palestrante, consultor e pesquisador em inovação e tecnologia aplicadas à educação. Soma mais de 13 anos em gestão de projetos de tecnologia da informação e inovação. VIDA E EDUCAÇÃO | 23 Educador nota 10 Carol de Holanda Pavão Veja como o despertar para reformas interiores pode contribuir no momento de educar. Coisa boa é recomeçar. E sempre é tempo. Não precisamos esperar por um novo ano para fazer listas enormes com promessas muitas vezes não cumpridas. Como escreveu o grande poeta Carlos Drummond: “é dentro de você que o ano novo cochila e espera desde sempre.” “Para ganhar um ano novo, meu caro, você tem de merecê-lo, tem de fazê-lo novo.” Portanto, não é preciso esperar, pode ser a qualquer tempo. Isso me lembra um casamento ao qual assisti certa vez, quando a juíza de paz falou: “Aquilo que você deseja para seu lar, corra atrás. Se quer paz e amor, não espere conseguir com atitudes de grosseria e desafeto. Porque só se tem no lar aquilo que se coloca.” Sei que parece clichê todo esse discurso, bem típico mesmo das viradas de ano eternas, mas há quem perceba no comum da vida algum ensinamento realmente fundamentado na razão. E é este olhar que quero trazer para a educação. Uma das mais belas frases que já li, retirada de um dos maiores clássicos infantis, O Pequeno Príncipe, diz assim: “É preciso suportar duas ou três lagartas se quiser conhecer as borboletas”. Ora! O que isso tem a ver com ter novas atitudes num ano que já se faz velho? Tudo, claro! Talvez se só soubermos olhar com novos olhos quando o ano começa a frase não fará sentido. Mas se buscarmos as sábias palavras de Drummond, entendendo que este novo cochila em nós a qualquer tempo, certamente compreenderemos que depende de nós acordá-lo, quando bem desejarmos. Porque a novidade está o tempo todo do lado de dentro, mesmo quando insistimos em procurar fora. “Aquele que não se experimenta, não se testa, não para pra se refletir num casulo, jamais vai voar.” O que parece é que temos medo de nos confrontar conosco mesmos. Então, é mais ameno esperar no ano que nasce. Como se, num milagre, tudo pudesse mudar, sem qualquer esforço humano. Tolice pensar assim. É preciso (é urgente cada vez mais) que tenhamos coragem de olhar para nós, reconhecendo a lagarta que somos. Isso! Somos exata- mente assim: seres que estão embaixo, rastejando e olhando para o chão. Somos lagartas sempre. E, consequentemente, borboletas também. É a condição de lagarta, e somente ela, que nos permite a ousadia de voar depois. Aquele que não se experimenta, não se testa, não para pra se refletir num casulo, jamais vai voar. Permanecerá para sempre rastejando como quem voa, arrotando arrogância e sabedoria que não possui. Trago a reflexão para a educação, a fim de que todos possam se enxergar assim: lagartas e borboletas. A porção lagarta é aquela que está no dia a dia, construindo entre a sala de aula e a sala dos professores um melhor meio de atuar. É aquela que diariamente enfrenta dificuldades à primeira vista intransponíveis: da mãe que mima o filho, do aluno que odeia matemática, da aluna que sofre bullying. É aquela que chega em casa cansada, com vontade de jogar tudo pro ar. É aquela que sofre o salário mínimo. Aquela que chora a criança agredida pelo adulto. Aquela que tem tantos sonhos colhidos em sorrisos esperançosos e que, às vezes, pergunta-se: “Será que dou mesmo conta disso?” Mas, aí, vem a porção borbo- Foto: Arquivo Digital 24 | MARÇO/ABRIL 2013 ninguém aquilo que não sabemos dar. Tampouco podemos dar só esperando receber. Nosso trabalho é uma obra que precisa passar pela vida das pessoas. Talvez seja uma das obras mais sérias, especialmente neste tempo em que os valores estão tão corrompidos. É preciso devolver aos jovens o ímpeto de lutar por seu país, de acreditar que vai dar mesmo certo. Porque no lar só entra aquilo que nós colocamos. Um país reflete apenas seu povo. E parte desse povo passa por um professor. Sabemos o quanto podemos ser influentes na vida de um aluno. Então, sejamos! Vamos acreditar de verdade na importância do que fazemos! Como diria Drummond, “eu sei que não é fácil. Mas tente. Experimente consciente.” Talvez não vejamos grandes resultados globais em nossa geração. Talvez a felicidade consista só em ver pequenos avanços de nossos alunos. Mas esses alunos formarão filhos, que formarão filhos, que formarão filhos... A prova disso está na atitude das crianças de hoje com relação ao meio ambiente. Observem que dificilmente encontramos uma criança jogando papel no chão. Porque uma geração que começou há cerca de dez, quinze anos ouviu muito acerca disso na escola. Consequentemente, os nascidos neste tempo já vieram com o amor à natureza enraizado. E o futuro disso pode realmente ser um país de primeiro mundo, onde não haja desigualdade social, corrupção, violência, miséria. A França da revolução francesa não era a beleza de país que hoje tantos visitam. Hoje andamos nas ruas de Paris na madrugada sem medo. Mas nem sempre foi assim. Toda nação tem sua história, constrói-se a partir de seu povo. Tenham a certeza de que a pior miséria começa do lado de dentro. Um professor que não se empenha para cumprir com grandeza seu ofício é tão desonesto quanto um político corrupto. Não importa se alguém mata dez ou cem, é assassino do mesmo jeito. Então, meu desejo é que não se espere por um novo ano para caminhar com novos olhos, é que realmente todos os que fazem a educação possam reconhecer suas lagartas e lutar com garra para vê-las lindas borboletas. Que possamos alçar grandes voos, sem jamais esquecer que depende de nosso esforço. Trabalho bem feito não cai do céu. E ano novo pode ser diariamente. Em pleno mês de abril, maio, junho... “Com ele se come, se passeia, se ama, se compreende, se trabalha...” Sempre é tempo de novidade. Não precisamos esperar a virada do ano para isso. Vamos lá, colegas! O céu (lindo e azul) é o limite. Carol de Holanda Pavão - Pedagoga. Pós-graduação em Arte-Educação. Professora do fundamental I e de Arte do Colégio Ágape. Coordenadora pedagógica na rede municipal de Fortaleza. Professora de teatro na Associação Revarte. Dramaturga e poetisa. Autora do livro “Um grilinho feliz”. Foto: Arquivo Digital O céu na educação leta. A porção que caminha ali, lado a lado com a lagarta; como se quisesse mostrar que vale a pena todo o esforço cada vez que uma criança aprende a ler. Cada vez que uma rosa é trazida do canteiro de casa. Cada vez que os meninos sonham com o que vão ser quando crescer. Porque o que forem terá sempre um pouquinho do que fomos. A lagarta é a parte de nós que erra, que enxerga desafios, que sofre, que tem defeitos, que se desespera, que se descabela. E é bom ser lagarta, é bom ter desafios, é bom saber-se falho. Só quem erra pode buscar acertar. Só lagarta pode virar borboleta! E aí, nessa hora, é a hora de entrar no casulo. De refletir sobre as razões que nos fizeram escolher a educação. De pensar sobre que tipo de pessoas queremos ser e, mais importante, que tipo de gente queremos ajudar a formar. É aqui, no casulo, que os educadores se reciclam. Este é o tempo de ler, de estudar, ouvir boa música, passear, conversar com as crianças, repensar suas ações pedagógicas, observar as próprias falhas, ver onde pode melhorar e, aí sim, voltar para a sala de aula. Só que, dessa vez, como uma linda borboleta, pronta para ensinar voo livre aos alunos. Precisamos ter esse olhar para a educação. Precisamos entender que, somente quando assumimos nossas falhas, nossa condição de lagarta, é que podemos repensar nossa prática educacional, entrando no casulo. E, depois, somente como borboletas podemos de fato educar. Por isso reafirmo que temos as duas condições em nós diariamente. Mas, por não se repensarem, os professores por vezes caem no comodismo. Deixam de acreditar em si, no país, na educação e, o que é pior, no outro. Quando, na verdade, não podemos esperar de VIDA E EDUCAÇÃO | 25 Escola: novo palco para o teatro Aécio Santiago Inspirado num teatro provocador, histórico ou apenas lúdico e envolvente, profissionais das mais diversas áreas – educadores, terapeutas, consultores empresariais – vêm recorrendo, cada vez mais, à linguagem teatral como forma de fortalecer a comunicação, o aprendizado, a interdisciplinaridade. Nesta reportagem, a revista Vida & Educação foi conferir o que vem sendo desenvolvido nessa área do conhecimento e qual a contribuição do teatro como processo educativo. 26 | MARÇO/ABRIL 2013 Da Enciclopédia Britannica, a palavra teatro deriva do grego ‘theaomai’ - olhar com atenção, perceber, contemplar (1990, vol. 28:515). ‘Theaomai’, segundo Carol de Holanda Pavão, dramaturga da Cia de Teatro Atos e Retratos de Fortaleza, com formação em Pedagogia e especialização em arte educação, teatro tem o significado de “ver, enxergar”, portanto é lugar de ver o mundo, de se ver no mundo, de perceber o outro e de se perceber na relação com o outro. Assim, segundo a especialista, todo teatro é educativo, porque mostra um comportamento social e moral. “Faz-nos refletir sempre. E pode ser aplicado para disciplinas específicas também. O teatro passeia pelo tempo, e pode falar de qualquer tempo, como as demais artes o fazem”, esclarece Carol que diz vivenciar essa experiência rica em sala de aula quando ‘provoca’ os alunos trazendo fatos da história da arte ligados a fatos da história. “É aula de arte ou de história?, questionam os alunos. “Mas como falar de arte sem falar de história?”, responde a arte-educadora. Para Carol de Holanda, toda produção artística acontece em um tempo e recebe influência desse tempo. É preciso, afirma a educadora, conhecê-lo para entender o que influenciou a determinada arte. “O conceito de beleza mudou com o tempo. Até o conceito de amor mudou, e tudo isso está exposto nas diversas artes existentes. Portanto, o teatro faz parte disso”, explica. Essa influência histórica com representação singular cultural na educação e na arte pode ser observada no próprio teatro grego com as apresentações das tragédias e epopeias nos anos 300 a.C. Aristóteles já aponta em ‘Poética’, escrita entre 335 e 323 a.C, que a tragédia pode- rá manter sua força mesmo apenas lida, sem a representação de cena, igualando-se a Epopeia. Mas o filósofo indica na obra que a música e o espetáculo acrescentam um poder a essa tragédia tornando a epopeia mais rica e envolvente. Para especialistas é possível ter com os alunos sobre qualquer assunto através de teatro. É possível até falar sobre as atuais relações familiares. E é preciso que a família esteja sempre presente, conhecendo os objetivos das atividades realizadas por seus filhos. Somente quando a família é explicada sobre o que se deseja alcançar com determinada atividade, ela pode fazer parte do aprendizado de seu filho. O teatro é, talvez, uma das formas mais divertidas de se ver o mundo e no mundo, define Carol de Holanda, que diz o teatro não se tratar apenas de ouvir falar, mas de ver de perto (ainda que na ficção) as possíveis realidades humanas. O teatro na aprendizagem Tanto quando se faz teatro ou quando se assiste é possível aprender. Nas duas formas, confirma Carol de Holanda, é o mundo em que vivemos que está sendo trabalhado, são situações humanas sendo dramatizadas. Ainda que os personagens sejam animais, são sempre com caráter de fábulas, onde é possível retirar lições ao final da história. Para os alunos é bom ver ou vivenciar a experiência de fazer teatro. Fazer é divertido e assim o processo de aprendizagem vai sendo desenvolvido, trazendo a possibilidade de se trabalhar a língua, a oralidade, a expressão, o momento certo de falar e, com isso, a espera. Crianças costumam ser ansiosas, querem todas se colocar ao VIDA E EDUCAÇÃO | 27 Foto: Harry Carvalho reportagem reportagem Jácome, as aulas de inglês ganham um reforço fundamental com o uso da encenação. “Acabamos absorvendo o idioma com mais naturalidade e eficácia. Claro, nem todos são desinibidos o suficiente para entrar no processo, mas acredito que uma adaptação facilita o acesso às técnicas”, diz a jornalista. Para os especialistas, o teatro pode, sim, ser confundido em qualquer tempo como atividade recreativa, pois é impossível fazer teatro e não se divertir. Alguns afirmam ser até terapêutico fazer ou assistir. Em todas as situações seria possível ser feliz, divertir-se, e não haveria mal nisso. A questão é como a atividade será retomada pelo professor. Ou pela família. A mediação que se faz Encenação por alunos de escola pública em Viçosa do Ceará 28 | MARÇO/ABRIL 2013 depois, levantando questionamentos acerca de como se deu a produção, quais os problemas enfrentados, ou até sobre o próprio texto trabalhado é o que vai diferenciar o teatro da hora do recreio. Foto: Harry Carvalho mesmo tempo, e, no teatro, elas perceberão claramente que esperar sua vez faz toda a diferença. “Enfim, as possibilidades são infinitas! Faz bem para a mente, para o corpo e, com certeza, todas as oficinas trabalhadas numa aula de teatro, melhoram o comportamento social. Sou um exemplo disso, porque sempre fui extremamente tímida. Fazer teatro me deu voz e jeito de falar com os outros”, finaliza Carol. Além de escolas, o teatro passou a ser utilizado como ferramenta pedagógica e de socialização até em empresas. A iniciativa acabou por confundir o teatro nos espaços das escolas apenas como atividade recreativa e de ocupação extraclasse. Mas vai além. Para a jornalista Kélia Revolução pela educação Tratando-se do teatro educativo, que previamente já tem objetivos traçados, a questão é encontrar a melhor forma de alcançar tais metas. Tudo depende de como o mediador vai conduzir a proposta. Certamente um dos trabalhos mais importantes nesse processo do teatro educativo na perspectiva da aprendizagem seja o ‘Teatro do Oprimido’, método desenvolvido pelo dramaturgo Augusto Boal e inspirado no projeto de Educação Libertadora criada pelo educador Paulo Freire. Em artigo de Cilene Canda, a autora explica que Paulo Freire contribuiu significativamente para a compreensão da educação como processo imprescindível à superação da dicotomia entre opressores e oprimidos. Augusto Boal, esclarece Cilene em artigo, construiu uma trajetória artístico-educativa de fortalecimento das potencialidades dos sujeitos em seus atos de criação estética, reflexão e conscientização política. “Ao compreender o teatro como ferramenta de transformação social para/com/pelos oprimidos, Boal difundiu seu método de teatro, baseado em jogos de percepção, expressão e criação, em diversos países, batizando-o como Teatro do Oprimido, em homenagem à obra de Paulo Freire”, escreve a autora. Alunos de escolas públicas no palco da X Bienal Cearense do Livro encenando a peça “O preço da liberdade” baseada no livro homônimo do poeta Rouxinol do Rinaré Saiba mais sobre o fundador do Teatro do Oprimido Augusto Pinto Boal - (Rio de Janeiro, 16 de março de 1931 - Rio de Janeiro, 2 de maio de 2009) foi diretor de teatro, dramaturgo e ensaísta brasileiro, uma das grandes figuras do teatro contemporâneo internacional. Fundador do Teatro do Oprimido, que alia o teatro à ação social, suas técnicas e práticas difundiram-se pelo mundo, notadamente nas três últimas décadas do século XX, sendo largamente empregadas não só por aqueles que entendem o teatro como instrumento de emancipação política, mas, também, nas áreas de educação, saúde mental e no sistema prisional. Alguns livros publicados de Augusto Boal Em português • Arena conta Tiradentes. São Paulo: Sagarana,1967. • Crônicas de Nuestra América. São Paulo: Codecri, 1973. • Técnicas Latino-Americanas de teatro popular: uma revolução copernicana ao contrário. São Paulo: Hucitec, 1975. • Teatro do oprimido e outras poéticas políticas. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira. 1975. • Jane Spitfire. Rio de Janeiro: Codecri,1977. • Murro em Ponta de Faca. São Paulo: Hucitec, 1978. • Milagre no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1979. • Stop: ces’t magique. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980. • Teatro de Augusto Boal. vol.1. São Paulo: Hucitec,1986. • Teatro de Augusto Boal. vol.2. São Paulo: Hucitec,1986. • O Corsário do Rei. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1986. VIDA E EDUCAÇÃO | 29 reportagem Auxiliar na oratória, na desinibição e na postura. Apoiar o desenvolvimento dos alunos em disciplinas do currículo obrigatório, como português, história, geografia, entre outras. Esses são dois dos principais benefícios para os estudantes que participam de aulas de teatro em suas escolas, segundo Wellington Teófilo, professor e coordenador de Projetos Extracurriculares da Escola Estadual de Ensino Profissionalizante Júlia Giffoni. A escola tem, desde junho de 2011, um grupo de coral cênico. Os espetáculos produzidos pelo grupo Phylos, segundo o coordenador, trabalham com os alunos desde a escrita do texto, bem como a contextualização histórica e social do tema das peças e das músicas cantadas. “A melhoria na desenvoltura e na desinibição dos alunos mediante as situações de estresse, bem como essa 30 | MARÇO/ABRIL 2013 possibilidade de interrelacionar os temas curriculares por meio do teatro, são alguns dos objetivos alcançados com a prática”, frisa o professor. Para ele, o teatro na escola pública Júlia Giffoni tem sido não apenas agente de integração, mas de inclusão cultural. “Muitos de nossos alunos não tinham o costume de frequentar ou simplesmente visitar centros culturais em nosso Estado. No entanto, compreende-se que para ser gerador de arte e produzir espetáculos, faz-se necessário esta visitação. A ação de incentivo a visitas a teatros iniciou-se de forma bem tímida, com a participação de apenas poucos alunos. Com o tempo, começaram a vir as famílias e, atualmente, parte da comunidade discente de nossa escola, bem como comunidade vizinha, que já participam desta ação. Eles não apenas assistem os espetáculos produzidos pelo grupo, mas também visitam os teatros, que culminam na visualização de peças promovidas nesses locais”, conta. Entretanto, para Teófilo, o desenvolvimento de atividades teatrais no ambiente escolar ainda está longe do ideal. “Nas escolas não existem pessoas qualificadas para esta atividade. Contrata-se um professor de artes e querem que este saiba cortar papel, cantar, dançar, interpretar e muito mais. O ideal é que seja realizada a contratação de professores qualificados em cada uma destas áreas, o que, infelizmente, ainda não ocorre”, constata. Foto: Arquivo Grupo Phylos Aperfeiçoar o aprendizado tem sido o mote para um grupo de alunos da rede pública de ensino. O teatro, o instrumento para a troca de experiências com textos, contextos e uma nova perspectiva de grupo. Foto: Arquivo Grupo Phylos O teatro como ferramenta de interdisciplinaridade se destaca no ambiente profissionalizante Apesar do sucesso alcançado pelo grupo Phylos, o coordenador afirma que a principal dificuldade que enfrentam é a falta de apoio financeiro. “Não temos conhecimento de ações de apoio desse tipo de atividade”, diz. Para a aluna Lorena Sampaio, 16 anos, houve uma mudança na sua postura, na fala, aprendeu a se expressar melhor, a lidar com o público. “Nunca frequentei o teatro, por falta de oportunidade, mas sei da importância dessa melhora na minha bagagem cultural”, conta Lorena. Na sua avaliação, a experiência com o teatro também melhorou o desempenho nas outras disciplinas. “Depois da escola pretendo continuar me aperfeiçoando no teatro”, diz a estudante que há um ano participa das aulas de teatro. Sobre o Grupo Phylos O grupo Phylos nasceu com três alunos, atualmente é composto por 23 integrantes, neles estão incluídos os instrumentistas, o coral e os atores, entretanto todos participam das aulas de teatro. Criado em junho de 2011, o grupo teve início com a montagem do espetáculo Amoratêmpora, em fevereiro de 2012, por meio de leituras dramáticas de poesias de autores consagrados como Fernando Pessoas e Camões, bem como poesias autorais, que eram embaladas por 11 músicas, uma também de autoria própria do grupo. Com este espetáculo, foram realizadas apresentações em grandes teatros de Fortaleza e do interior do Estado, entre eles o SESC Iracema, o SESC Emiliano Queiroz, o Teatro José de Alen- car, o Centro Cultural Bom Jardim, o CUCA Che Guevara, o Teatro Tom Cavalcante (em Guaiúba) e a Escola de Artes e Ofícios Tomaz Pompeu Sobrinho. A partir da repercussão e da aceitação do grupo, produziu-se no ano de 2013 o segundo espetáculo, ‘Recomeçar’. A peça retrata a história de duas irmãs, que pelas situações da vida acabaram se distanciando e buscam a essência perdida da amizade. Recomeçar é composto por cinco personagens, dez pessoas no coral e três instrumentistas. Este espetáculo já foi apresentado no Teatro José de Alencar, no Centro Cultural Bom Jardim e no Teatro Antonieta Noronha. VIDA E EDUCAÇÃO | 31 Arte-Educação Ângela Escudeiro Entenda de que maneira o teatro e a literatura, além de educar, transforma crianças e adultos. Teatro para a criança é o elo entre o real e a fantasia. A ponte de acesso que transporta a criança para os dois polos mágicos de ser. Que a faz ser qualquer ser, sem o compromisso de ser uma “criança grande” como nós, adultos, algumas vezes, almejamos que ela seja. Literatura infantil para a criança, antes de ser literatura, é apenas o elo entre a fantasia e o real. A ponte de acesso que a transporta para os dois polos mágicos do saber. Faz a criança sentir, ver, ouvir, sonhar, conhecer, chorar, sorrir e, antes de tudo, e de qualquer coisa: brincar, brincar, simplesmente brincar... O brincar para a criança é o fio condutor que faz a “liga” entre a literatura e o teatro. Ao ver com o olhar da criança, não há como, ao atravessar essa ponte, desligar uma linguagem da outra, nem como fazê-lo, sem a ação do brincar. “A leitura que a criança faz do universo lúdico não passa por uma leitura de análise estrutural, didática.” Se nós podemos considerar o papel do teatro e da literatura como um agente transformador e educador, por que então não podemos exerci- 32 | MARÇO/ABRIL 2013 tar essa criança cidadão-consciente, essa criança cidadão-leitor, sem a irritante educação padronizada que faz do educador um ser punitivo e puramente disciplinador? Um educador de criança deveria também saber ler e fazer teatro para criança... “Fazer teatro infantil é o mesmo que fazer teatro para adultos: só que é mais difícil” (PIRANDELLO, citado no artigo “A Semântica e o Teatro Infantil” por Carlos Augusto Nazareth - CEPETIN – Centro de Pesquisa e Estudo do Teatro Infanto-Juvenil, ano 2010). É através da brincadeira que a criança inicia seu percurso de evolução da vida... É na brincadeira das palavras que se inicia a brincadeira do teatro... É na brincadeira do teatro, que se aprende a dança das palavras... Brincadeira para uma criança é a verdade de sua real necessidade de aprender através do lúdico, da arte. A forma de construção das linguagens artísticas não interessa à personagem criança. A leitura que a criança faz do universo lúdico não passa por uma leitura de análise estrutural, didática. A ela, interessa a descoberta do fazer, do sentir, das nuances do despertar para o pensar artístico, naturalmente. A arte do faz-de-conta provoca na criança a descoberta de aspectos singulares que fogem à compreensão de alguns adultos. Não é baseado no empirismo, mas Foto: Arquivo Autora Ler, brincar, bonecos Vamos fazer-de-conta? é dito pelo boneco, isso Interfere no aprendizado da criança de forma direta. Sua figura evidencia o lúdico presente no espírito da criança, permitindo-lhe participar diretamente em suas ações teatrais. O seu aspecto lúdico extrapola qualquer razão. Muitas vezes, a concretização do que parece irreal aos adultos atropela essa razão dentro do universo infantil. no aspecto onírico. Sua brincadeira de faz-de-conta redesenha no jogo dramático o modo de aprender a lidar com seus sentimentos de medos e desejos. Ao brincar de teatro, comete ações que substituem o que é real, sem perder o referencial libertário de criar e recriar o que de fato existe, o que denominamos de concreto no mundo real. Na brincadeira com o boneco, a criança também acredita nas possibilidades de animação do inanimado. O que é um simples objeto em nossas mãos, para a criança está sempre suscetível de ser animado. Uma espiga de milho plástica pode, num passe de mágica, correr para o milharal, contracenar com as outras espigas e causar uma verdadeira revolução! Corpo e fala da espiga como elementos relevantes no convívio social do milharal. Nesse momento, ocorre uma transmutação dos seus valores como personagem ativo, que interfere no real através do imaginário, do seu imaginário. “Um niño que no sabe jugar es un pequeno viejo y será un adulto que no sabrá pensar”, afirma Jean chateau. (O boneco é o faz de tudo em um mundo imaginário que ultrapassa a barreira do real e, aos olhos da criança, torna-se mágico). Durante as apresentações com o teatro de bonecos, pode-se observar a reação da criança diante das ações e do que VIDA E EDUCAÇÃO | 33 Arte-Educação Tanto ao boneco como à criança, no mundo da fantasia, tudo é permitido. Criança que sonha de olhos abertos é como o boneco que dorme de olhos abertos... Acreditar que é na simples costura de um pedaço de pano colorido que se veste a ilusão daquilo que poderia ser, é a verdadeira mágica do saber ser criança. Para ela, ao boneco tudo é permitido: Deslizar sem patins, enxergar mesmo sendo deficiente visual, pular sem ter pernas, falar, embora esteja com a boca hermeticamente fechada, voar sem possuir sequer uma asa e mergulhar em um rio onde não correm águas... Essa força é tão evidente que leva até mesmo o adulto a se permitir ter a ilusão de que o boneco possui vida. Percebe-se que, para a criança, diante de um boneco no seu fazer teatral, não existe impossibilidades. Sua imaginação e a intimidade que ela conquista em relação ao boneco permite que ela desenvolva toda a sua capacidade de criação. De recriação. “A maioria dos adultos está se esquecendo do elo entre o real e a fantasia...” O teatro de boneco em sua arte milenar, como entretenimento e instrumento educativo, possui sua história universal registrada. Pode-se constatar isto em estudos de pesquisa realizados por profissionais competentes da área artística e educacional do Brasil e do mundo. Através dessas pesquisas – mesmo que não se tenha dado concreto comprovando com exatidão a sua origem – foi possível traçar um panorama histórico da sua existência vindo desde a Idade Média, com suas influências religiosas até ser trazido ao Brasil pelos colonizadores europeus. 34 | MARÇO/ABRIL 2013 UNDIME EM NOTÍCIA Poderíamos – baseados nessas pesquisas onde se afirma ter sido usado provavelmente pelos jesuítas em sua catequese com os índios – dizer então, que, pelo menos no Brasil, desde o século XVI, o boneco vem cumprindo muito bem seu papel como instrumento artístico-educador. De acordo com Ana Maria Amaral (1991), Helena Antipoff, ao criar a Sociedade Pestalozzi do Brasil, recorreu a esse recurso indispensável para o aprendizado prazeroso, possibilitando uma maior evolução do teatro de bonecos no meio artístico-educacional. A maioria dos adultos está se esquecendo do elo entre o real e a fantasia, apagando do cérebro a fantástica luz do brincar teatro, contribuindo diretamente para que crianças perambulem pelas ruas perdendo o direito de ser criança. Mendigando o direito de poder brincar. Praticar uma atividade cultural que irá formá-la como cidadão. “El teatro para niños debe estar hecho como el de los adultos, solo que mejor” (CONSTANTÍN STANISLAWSK, 1984,p.54). É nessa perspectiva de despertar na criança – a partir dos seus primeiros passos em direção à vida – o exercício de experimentação dos sentidos para a busca do conhecimento em todos os seus aspectos quiméricos, tomando como base o teatro, a literatura e o boneco, que pretendo sempre redescobrir o olhar de observação da criança por meio da sua fantástica via de acesso: o seu próprio universo. O universo da brincadeira. É preciso reaprender a arte do brincar. A arte de se fazer teatro. Portanto, aplausos ao prazer que sente uma criança de ser, no corpo e na alma, outrem. Personagens humanos, assim como a mãe, o pai, o maquinista, o lutador, o pipoqueiro, a médica. Personagens fantásticos que nem a bruxa, o fantasma, o monstro. Personagens simbólicos a exemplo do leão, do gato, do pato. Aplausos ao prazer de uma criança que ao ler, ver e ouvir histórias consegue consolidar laços afetivos com as personagens, com o contador. Com o personagem livro com quem ela tão bem contracena, dialogando com ele através das suas indagações de aprendiz. Aplausos ao prazer de uma criança que dá vida ao boneco, que se permite envolver na brincadeira da manipulação, da confecção numa verdadeira dança de tintas. Fios. Braços. Laços. Cabeças e mãos. Boneco capitão, Simão, Assombração, Lampião, Quitéria, Benedito brigão, bonecos do Teatro de Bonecos... Texto Publicado no Editorial NENL / CAPC – Núcleo Espírita Nosso Lar – Centro de Apoio ao Paciente com Câncer. Página VARIEDADES – Março / 2013 – Edição 13 - ANO 03. Florianópolis / Santa Catarina Ângela Escudeiro – Escritora. Artista. Arte-Educadora. Membro da Academia Feminina de Letras do Ceará. Vice-Presidente da ABTB - Associação Brasileira de Teatro de Bonecos. Membro da CNIC – Comissão Nacional de Incentivo à Cultura – MinC - Ministério da Cultura. Estados e municípios precisam regularizar conselhos do Fundeb Unesco sugere novo plano de financiamento para a educação Quase 3 mil conselhos de acompanhamento e controle social do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) estão em situação irregular no país. Estados e municípios que possuem qualquer pendência com relação aos conselhos precisam regularizar a situação no portal eletrônico do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para que não sejam prejudicados. A Lei nº 11.494/2007, que regulamenta o Fundeb, determina a instituição dos conselhos, que são responsáveis por acompanhar a distribuição e a aplicação dos recursos do fundo. Também cabe a eles monitorar a execução do Programa Nacional de Apoio ao Transporte Escolar (PNATE) e emitir parecer sobre as prestações de contas de estados e municípios que recebem recursos do programa. Caso os conselhos não estejam regularmente estabelecidos, os entes podem ficar sem os repasses financeiros do PNATE. Entre os conselhos municipais, 2.959 estão em situação irregular. No caso dos estaduais, são 22 conselhos com pendências. Municípios, estados e o Distrito Federal têm até 30 de abril para enviar as prestações de contas de 2011 e 2012 do PNATE por meio do Sistema de Gestão de Prestação de Contas (SiGPC), disponível no portal eletrônico do FNDE. O mesmo prazo vale para o envio das prestações de contas do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE). Quem não cumprir a determinação pode ficar sem os recursos dos três programas enquanto não regularizar a situação. A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) lançou em março dados parciais do “Relatório de Monitoramento Global de Educação para Todos”, que revelam que um quarto dos fundos destinados à educação nunca deixa os países de origem. Isso porque os recursos são revertidos em bolsas para que alunos de regiões pobres estudem nos países doares. Segundo o levantamento, 3 bilhões de dólares por ano poderiam ser usados para promover os estudos de 132 milhões de crianças e adolescentes em países menos favorecidos. Além disso, o documento aponta que, desde 2010, aumenta a lacuna no financiamento da educação básica, totalizando a necessidade de 26 bilhões de dólares por ano. Se considerados os nove anos de ensino fundamental, esse déficit sobe para 38 bilhões de dólares. A Unesco afirma que, com o redirecionamento dessa verba, os fundos já existentes poderiam cobrir quase um oitavo dessa lacuna. “Recomendamos que 50% das contribuições de países mais desenvolvidos sejam destinados ao ensino básico. Só assim conseguiremos avançar”, avalia a coordenadora de educação da UNESCO no Brasil, Rebeca Otero. No Fórum Social Mundial em Dakar (Senegal), em 2000, 164 países se comprometeram a alcançar seis metas relacionadas à educação até 2015. Rebeca ressalta que, durante esse período, o Brasil avançou em suas políticas, mas não conseguiu cumprir os objetivos. “Caminhamos muito na questão da equidade, por exemplo, mas na qualidade, precisamos melhorar. E o problema é o déficit no financiamento.” Pelo menos 20% da ajuda dos quatro maiores doadores para a educação – Japão, Canadá, Alemanha e França – são utilizados para custear estudantes estrangeiros. Para cada aluno de uma universidade em um país desenvolvido, Fonte: FNDE centenas de estudantes poderiam receber educação básica em países pobres. Uma única bolsa de estudos para um jovem nepalês estudar no Japão, por exemplo, poderia custear 229 alunos do ensino secundário no Nepal. Entre os signatários do documento de Dakar, 23 países se comprometeram a destinar 0,7% de seu Produto Interno Bruto (PIB) para a educação, mas nem todos estão cumprindo. Além dos compromissos já firmados, a pesquisa sugere a ampliação das fontes de financiamento, com mais colaboração do setor privado e investimentos do grupo de colaboração Brics (Brasil, Rússia, Índia e China e África do Sul). Os governos reconheceram que, para acompanhar a execução das metas, seria necessário um monitoramento regular e o “Relatório de Monitoramento Global de Educação para Todos” cumpre esse papel. De acordo com Rebeca Otero, o relatório completo deverá ser lançado ainda no primeiro semestre de 2013. Os informes disponíveis estão no site da Unesco (www.unesco.org). Fonte: Portal Aprendiz Nova lei obriga pais a matricular crianças em escola a partir dos 4 anos A Presidente Dilma Roussef alterou trechos da Lei de Diretrizes e Bases da Educação. Governos estaduais e municipais têm até 2016 para garantir ensino gratuito à população de 4 a 17 anos. A nova lei ainda torna “dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos 4 anos de idade”. Pela norma anterior, a matrícula na pré-escola era obrigatória apenas a partir dos 6 anos de idade. O novo texto também estabelece que as crianças de 4 e 5 anos terão “avaliação mediante acompanhamento e registro do desenvolvimento, sem o objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental”. Fonte: Agência Estado entrevista Saúde e Educação Desde 2010, o cearense Luiz Odorico Monteiro de Andrade ocupa o cargo de secretário de Gestão Estratégica e Participativa do Ministério da Saúde (SGEP). Nesta entrevista exclusiva para a revista Vida e Educação, o ex-secretário de Saúde de Quixadá e Fortaleza fala sobre a importância da educação no processo da melhora da qualidade do sistema de saúde em todos os níveis. Odorico cita casos bem sucedidos como a queda da mortalidade materna obtida a partir da maior taxa de alfabetização das mulheres. Odorico tem sido responsável por importantes ações na área, e compartilhou com a revista sua experiência e desafios no setor durante a realização do Encontro Aprece Novos Gestores, dias 23 e 24 de janeiro último, no Centro de Eventos do Ceará. No encontro, o secretário realizou palestra sobre o SUS, a municipalização e o Desafio da Saúde. Vida e Educação - Que desafios os novos prefeitos estão assumindo na área da saúde em 2013? Odorico Monteiro – A primeira questão é a complexidade do sistema de municipalização de saúde no Brasil. O Brasil é o único país do mundo com mais de 100 milhões de habitantes que tem esse sistema universal e o único com um desenho federativo em três esferas de poder: a federal, estadual e municipal. Na saúde, nós fizemos a descentralização financeira, administrativa e política e no caso da educação, nós tivemos a universalização do ensino 36 | MARÇO/ABRIL 2013 fundamental. Quando voltamos pra saúde, entendemos que a maior parte dos municípios brasileiros não devem resolver todos os problemas de saúde no espaço do seu município, o que coloca um grande desafio nas relações interfederativa, porque a maior parte dos problemas que é dos prefeitos, da sua população, está fora do seu município e ele está ainda resolvendo problemas de municípios vizinhos. Isso é um grande desafio. Ou seja, como os novos prefeitos vão administrar a saúde do município sem perder de vista a abrangência regional dos problemas da saúde. Foto: Luís Oliveira (ASCOM/MS) Aécio Santiago VE - Antes da entrevista, o senhor abordou a questão do Sistema de Saúde e Escola, onde a filosofia é todo espaço é espaço de ensino, pesquisa e assistência. Como funciona esse sistema? OM – A relação da saúde com a educação é intrínseca. A ideia é transformar os espaços de saúde em espaço de escola para os profissionais e estudantes da área de saúde. Pra se ter uma ideia, quando fazemos estudos sobre a mortalidade infantil, a variável que mais influencia a redução da mortalidade infantil é a variável ano de estudo da mãe. Ou seja, a mãe que estuda mais, a possibilidade do filho dela não morrer no primeiro ano de vida é muito maior do que a mãe que não estudou. Essa variável é muito forte e está bastante demonstrado. Por outro lado, o grande desafio para o sistema de saúde universal é a questão da relação do sistema de educação com o sistema de saúde no que diz respeito às necessidades de saúde da população e os profissionais que são formados, do ponto de vista da qualidade do currículo, mas, também, da quantidade de profissionais. VE – E como encarar esse desafio? OM - Hoje nós temos no Brasil uma grande deficiência de profissionais médicos e não é apenas no setor público da saúde primária, secundária e terciária, mas, também, no setor privado. Para se ter uma ideia, a relação no Brasil é de um médico para cada 1,8 mil habitantes. Na Inglaterra, essa relação é 2,7 médicos para mil habitantes. Para chegarmos a essa proporção aqui no Brasil, precisávamos ter mais 32 mil médicos. Na proporção que estamos formando médicos atualmente, só atingiremos essa marca em 2032. Na área primária da saúde nós temos uma deficiência de mais de seis mil médicos. Precisamos fazer uma verdadeira integração entre o sistema de saúde e educação. VE – Onde a experiência desse sistema foi bem sucedida? OM – Tem em vários municípios no Brasil. No Ceará, temos a experiência em Sobral e Fortaleza. Em Sobral, isso já está bem maduro. Temos várias turmas de graduação que vivenciaram isso. O princípio do VE – O senhor também abordou sobre uma proposta inovadora chamada Tenda Invertida. Do que se trata? OM – Também inspirada em Paulo Freire, a Tenda Invertida é uma visão diferente do modelo profissional que existe atualmente nas universidades, inclusive as mais modernas. Esse modelo é inspirado na cultura no aprendiz de ofício e do mestre de ofício na relação medieval. Então, na formação da especialidade médica, você tem essa realidade. Se for querer fazer cirurgia, você faz residência especializada e lá se forma cirurgião. No Programa Saúde da Família (PSF) invertemos essa lógica. A residência tem que ser no espaço onde o profissional trabalha, onde tem a demanda. E os mestres desse profissional precisam estar nesse território. A Tenda Invertida é isso. Ao invés VE – É possível unir espaço de do aprendiz ir até a tenda do mestre, ensino, pesquisa e assistência com é o mestre que vai para a tenda do eficácia? aprendiz. Com isso, podemos dar esOM – Eu diria que buscamos ins- cala na formação. piração em pedagogos, em profissionais da linha de educação como o VE - Esse é um grande desafio Paulo Freire. Ele coloca o aprendiza- para o PSF? do de forma interacionista, interação OM – Sim. A formação do especom a realidade do profissional em cialista com escala, inclusive para contato com ela e aprender essa re- compormos mais aqueles números alidade para essa realidade. Ele diz, e aquela proporção de médicos para ainda, que o processo pedagógico, a população, que temos em pouco de ensino aprendizagem envolve tempo dar essa resposta a pelo meuma perspectiva participativa, dialó- nos chegar em parâmetros dos sisgica e problematizadora. E no espa- temas universais. ço da saúde você dever ter a particiVE – As campanhas na área da pação da relação do professor com o aluno; ele vai ter a problematiza- saúde não deveriam estar mais em ção, seja um problema no território, sintonia, integradas com uma aborassistencial, seja o diagnóstico de dagem mais voltada para a educauma doença, e produzir o aprendiza- ção como forma de melhorar os índido em cima dessa problematização. ces de qualidade na saúde? OM – Eu diria que há um esforço Portanto, a participação, a interatividade do aluno no processo com o do governo federal e aí há uma inteprofessor e o objeto do aprendizado, gração importante ocorrendo entre o produz a construção desse conheci- Ministério da Educação e o Ministério da Saúde, e tem sido construída uma mento agregado. sistema é ter um espaço onde você atende as pessoas, mas num espaço onde você possa ter um profissional sendo formado e pode produzir pesquisa no próprio espaço, melhorando e aperfeiçoando esse serviço. Com isso, a gente pode criar a educação permanente, onde podemos ter não apenas a integração do aluno de graduação à residência dos profissionais de saúde, tanto residência médica como residência com profissionais, como também ter todos os trabalhadores se tornando alunos no processo de educação permanente. Então como você aprende na saúde? Aprende fazendo. Como se aprende a fazer um diagnóstico de pneumonia? À medida que você atende uma pessoa com pneumonia e o professor que está ali apresenta pra você um quadro de pneumonia. VIDA E EDUCAÇÃO | 37 entrevista VE – O que mais pode ser estimulado na escola enquanto uma perspectiva da saúde de qualidade? OM – A questão das drogas, do álcool, do tabagismo, do trabalho infantil. A outra questão nesse aspecto diz respeito a trabalhos comunitários. Então você pode fazer várias reflexões no espaço da escola, onde a escola discuta a questão da saúde no seu território. Outra questão importante é a questão da integração intergeracional. Nós temos a questão do envelhecimento muito rápido da população; portanto, a tolerância intergeracional é importante de ser debatida na escola. Temos algumas iniciativas importantes como a questão da escovação, aumentando a escovação coletiva nas escolas como atividade preventiva. A questão da Oftalmologia, através do programa Olhar Brasil, dando um diagnóstico precoce de crianças que têm dificuldade da visão e gera dificuldade no aprendizado. 38 | MARÇO/ABRIL 2013 VE – O que tem sido prioridade no governo Dilma? OM – Tem uma questão importante que eu chamo de paradoxo de saúde da mulher. Isso é uma grande preocupação da presidenta Dilma, que é a redução da mortalidade materna no Brasil, a redução de mortalidade por câncer de mama e a redução da mortalidade por câncer de cólon. Principalmente o de cólon e a mortalidade materna tem relação forte com mulheres negras, pobres e sem escolaridade, e isso é um grande desafio pra o que o espaço da escola seja um espaço pedagógico e promoção da saúde, a importância da mãe saber que até os 65 anos faça a mamografia a cada dois anos. Então essas informações sendo discutidas na sala de aula repercutem muito positivamente em casa. E eu queria chamar a atenção para a dengue. Em vários momentos eu enfrentei surtos de dengue, foi na escola, foi na educação que nós fizemos uma grande aliança pra resolver desde as informações na sala até os mutirões, mobilizações na escola, operação contra o lixo fundo de quintal. VE – A que novos projetos o senhor se referia na sua palestra? OM – A presidenta Dilma recebeu todos os prefeitos agora em janeiro para um acolhimento, porque ela entende que precisamos compartilhar governança, além do ministro da Saúde Alexandre Padilha que recebeu secretários de saúde do País pra esse momento em Brasília. Outro momento é discutir o Plano de Melhoria da Qualidade da Atenção Básica. Nós precisamos ter o maior número de unidades brasileiras dentro desse programa. A questão do Requalifica, que é ampliar as unidades básicas no País, reforma e ampliação para que possamos ter o maior número de municípios ampliando suas unidades. O cartão nacional de saú- de é outra novidade. Nossa meta é universalizar o cartão até 2014, além de disponibilizar através de uma parceria Ministério da Saúde e Ministério das Comunicações a conectividade desse cartão para todas as unidades básicas de saúde. Desafios da família contemporânea Milena Cristina Barros Barreto Aires VE – Pensando na complexidade do sistema de saúde, sempre acompanhamos problemas de desmonte das prefeituras no final de cada gestão. Além da fiscalização para prevenir o problema, falta também mais competência na gestão nas prefeituras? OM – O mais importante disso tudo é que nós cada vez mais no Brasil estamos aprimorando nossos mecanismos de transparência, de controle do sistema. No Sistema Único de Saúde (SUS) nós temos o controle interno que é DENASUS, temos os tribunais de contas dos municípios, além da CGU (Controladoria Geral da União). O importante é não ter a sensação da impunidade; por isso temos a Lei da Ficha Limpa, além dos conselhos municipais, estaduais de saúde. Agora, eu entendo que essa instabilidade que nós temos no sistema municipal de saúde em função da transição, a cada quatro anos, é extremamente prejudicial para a população. Não tenho dúvidas de que nós precisamos construir instrumentos de governança mais estruturados, menos instáveis para que a população não fique à mercê dessas transições. VE – A sua mensagem final para os nossos leitores OM – Eu quero parabenizar essa iniciativa. Fico feliz que aqui no Nordeste a gente tenha uma revista que aborde essa questão da educação como uma política pública, e quero agradecer ao convite que foi feito para contribuir. Foto: Arquivo Digital agenda de articulação importante intersetorial entre educação e saúde, principalmente pra resolver esse problema da formação médica, da residência médica. Por outro lado, nós temos um conjunto de iniciativas que devem ocorrer entre esses setores. No espaço do município, essa integração é de extrema importância. Você tem um conjunto de questões que começa nessa integração. Por exemplo, a questão da obesidade infantil que é um grande problema atualmente. O espaço da escola é extremamente importante para a educação alimentar, a própria discussão em sala de aula sobre a questão do consumo correto de alimentos, de frutas e verduras, a redução do açúcar, mais atividade física e tudo isso começa na escola. PAIS NA EDUCAÇÃO Entenda como as atitudes dos pais podem influenciar as mudanças no comportamento dos filhos. O mundo atual é marcado pelo grande avanço tecnológico e científico, que acarreta fortes e rápidas mudanças na vida e em toda a sociedade. Neste contexto, podemos afirmar que a família contemporânea vem sendo diretamente influenciada por estas transformações, seja no âmbito estrutural, seja no âmbito relacional ou afetivo. Percebemos que a família contemporânea vem enfrentando desafios que precisam ser cada vez mais discutidos. Constantemente lemos artigos em jornais, revistas e livros abordando sobre os diversos aspectos da vida familiar, assuntos como a educação dos filhos, as novas relações parentais, conflitos entre pais e filhos, dificuldade de relacionamento entre os entes familiares, dentre outros desajustes em relação a valores e princípios de educação doméstica. Frente a este cenário, em nossa sociedade, os relacionamentos sociais vêm sendo permeados por comportamentos individualistas, relativistas e consumistas. Contudo, percebemos uma forte turbulência dos valores intra-familiares, nos VIDA E EDUCAÇÃO | 39 Pais na educação “Mas lembro que estabelecimento de limites e disciplina é fundamental, desde que sem exageros...” Visualizamos ao nosso redor famílias frágeis em seus laços afetivos, em que a desoneração da mesma é resultado de conflitos de interesses internos, sejam por parte dos pais ou por parte dos próprios filhos. Neste sentido, percebemos uma relação difícil de ser resolvida: por um lado temos genitores que precisam trabalhar e querem acumular bens e riquezas para viver melhor e para proporcionar “melhores condições para seus filhos”, portanto se ausentam cada vez mais do lar e de casa. Por outro lado, temos os filhos carentes, que reclamam a ausência dos pais 40 | MARÇO/ABRIL 2013 que não possuem mais tempo para ouvi-los, ajudá-los e amá-los. Diante destes impasses sociais, percebemos outro grande desafio, o qual vem imperando nos relacionamentos de pais e filhos: a falta de comunição. Muitas vezes, as justificativas, as expectativas dos pais e reclamações das necessidades reais dos filhos não estão sendo dialogadas em família, ou seja, não está havendo na unidade familiar tempo dedicado entre pais e filhos para conversar, falar, discutir e, principalmente, para se ouvir uns aos outros. Assim, sem um diálogo franco e aberto, os desejos e sentimentos não são explicitados, ficam ocultos nas relações, o que não é bom para o fortalecimento das relações familiares. Outro grande desafio entre pais e filhos é o estabelecimento das regras, pois se observa que muitas famílias têm atitudes permissivas e não criam e nem exigem o cumprimento de normas, ficando os filhos sem referência de limites sociais. Em contrapartida há o outro extremo, famílias que muitas vezes impõe muitas regras, cobram o cumprimento destas em demasia, sem levar em consideração as realidades dos filhos, o que também acaba prejudicando as convivências familiares e sociais. Mas lembro que estabelecimento de limites e disciplina é fundamental, desde que sem exageros, e até sugiro que podem ser combinadas entre os pais e até com a participação dos filhos na medida que vão amadurecendo. Em todo este cenário de impasses, constata-se que há um descontentamento familiar, uma perda de referencial e de amor entre pais e filhos, que se manifestam nas relações cotidianas, por meio de atitudes, muitas vezes, silenciosas, indiferentes, desrespeitosas, chegando, em muitos casos, a serem até mesmo agressivas. Nestas circunstâncias, deve-se levar em consideração que cada família tem seu papel e função social de educar e formar indivíduos, contudo, cabe aos pais à responsabilidade de, impulsionados pelo amor e o cuidado com os filhos, tentar pelo diálogo superar os desafios atuais. Pais e filhos não devem esquecer que, para a harmonia familiar, é importante prevalecer sempre a abertura para o diálogo e o respeito mútuo, que se reveste em atenção às necessidades e o estabelecimento de limites, procurando juntos, em família, tomar as decisões, tendo sempre como objetivo a unidade familiar e a harmonia equilibrada das relações entre pais e filhos e entre os filhos. Neste caminho, a escola pode contribuir, pela ação docente do professor, com um papel de grande relevância na formação de pais. A família e a escola devem ser grandes parceiras neste processo de educação dos pais e dos filhos, encontrando meios e estratégias de suprir, com o processo de formação destes indivíduos, as fragilidades do mundo hoje. Caso contrário, encontramos famílias, pais e filhos vulneráveis às situações mais imprevisíveis, inclusive a própria destruição da nossa humanidade. Portanto, como educadores – pais, professores e responsáveis – a vida nos exige compromisso, dedicação e doação, o que representa uma busca incessante de bem viver. Milena Cristina Barros Barreto Aires - Psicóloga clínica, palestrante. Trabalha com família e orientação profissional. milenaaires@ bol.com.br Facebook: Milenabarreto Educação 3.0 Patrícia Melo Paulo Freire (1921-1997), o mais célebre pensador da educação brasileira e reconhecido internacionalmente por suas teorias, propôs uma nova escola, como espaço de transformação do aluno. No entanto, a sociedade atual está vivendo um novo debate sobre a educação do presente e do futuro. Com o objetivo de estender esse debate aos leitores da Vida e Educação, conversamos com alguns educadores, que apontaram uma nova conscientização deste espaço de transformação. Nesses novos tempos, onde a tecnologia invade toda a sociedade e cada vez mais a sala de aula, a percepção de alguns estudiosos em educação é de que a escola passa por uma metamorfose, justamente para reaprender seus modelos, cumprindo sua função em prol da sociedade. Marcos Meier, psicólogo, professor e escritor, acredita que, mesmo cheia de defeitos e manias, “a gente nem imagina ficar sem a escola”. Para Meier, a boa notícia é que ela está se transformando: “vai ficar mais atraente, mais sábia, coerente e atualizada”. Luli Radfaher, Ph.D. em comunicação digital pela ECA-USP e consultor em inovação digital, acredita que a “Escola 3.0” precisa rever suas competências, estar preparada para as atitudes dos alunos e criar um ambiente de interação para buscar várias descobertas, pois não existem mais soluções prontas. “É incoerente o modelo de escola que se tem hoje em dia. Avançamos e vamos evoluir muito mais, mas para isto a escola precisará entender melhor o aluno e Foto: Andreia Naomi quais o mundo capitalista torna-se o referencial de educação. Desta forma, perdem-se de vista os caminhos, até então, tradicionais na educação dos filhos, sendo adotadas práticas baseadas no imediatismo, no prazer, no ter, no possuir. Isso tem provocado uma inversão no comportamento dos indivíduos e não se tem claro o que é e o que não é válido. Uma postura relativista invadiu os relacionamentos e os pais perderam os referenciais para a educação e a boa convivência em sociedade. Assim, entendemos que a família está mudando. Daí vale perguntar: afinal, qual seria o melhor entendimento sobre o que é a família? Muitas são suas definições, mas podemos entender aqui, de forma geral, como uma instituição social, unidade básica da sociedade, sendo uma organização de pessoas, com identidade e grau de parentesco entre si, permeada de laços afetivos e sentimento de segurança e harmonia. CAPACITAÇÃO Palestrante Mário Sérgio Cortella buscar seus princípios fundamentais, só que agora através de novas ferramentas que tem à disposição”. Já o especialista em gestão da inovação pela UTFPR (Universidade Tecnológica Federal do Paraná), Thiago Chaer, aponta que estamos em uma época de mudança, em que todas as áreas da sociedade são exigidas a repensarem seus modelos e a reaprenderem. A escola, como ambiente e espaço de facilitação da aprendizagem e da construção do conhecimento, também está nesse processo de reaprendizagem de seus modelos, motivada pela massiva inclusão da tecnologia digital e da informação no cotidiano. “Qualquer mudança só é sustentável quando todos os agentes envolvidos participam igualmente na construção do algo novo”. O educador paranaense avalia ainda que o conceito de Educação 3.0 vem somar e apoiar mudanças inexoráveis, prevendo a participação ativa da família, dos educadores e da sociedade na melhoria contínua da escola. “Essas mudanças possuem componentes do empreendedorismo e da inovação, com aspectos de aprendizado emocional, social, da tecnologia digital, da sociedade e da formação do educador. É, sem dúvida, um momento de grande entusiasmo, pois a escola passa por um período singular em toda a sua história”, completa Chaer, idealizador e Presidente do Instituto Inovar para Educar e coordenador pedagógico do projeto Aprender & Crescer, cujo objetivo é a formação complementar em empreendedorismo e tecnologia digital para estudantes do ensino médio de escolas públicas do Paraná. “Educação 3.0: A Escola do Futuro chegou?” será o tema central da 20ª EDUCAR EDUCADOR, que será realizada de 22 a 25 de maio, em São Paulo. Durante quatro dias, mais de 150 palestrantes nacionais VIDA E EDUCAÇÃO | 41 e internacionais debaterão diversos assuntos que envolvem a educação brasileira e mundial. No mesmo espaço estará a Feira EDUCAR (Feira Internacional de Produtos e Serviços para a Educação) que, por sua vez, trará a exposição de produtos e serviços inovadores, através de centenas de empresas nacionais e internacionais do segmento. “Para nós, a Educação 3.0 é sinônimo de uma escola aberta, dinâmica, participativa, onde todos possam ter a consciência e a humildade de aprenderem juntos. Alunos, escolas, famílias, professores e a sociedade terão a oportunidade de se conectar no presente com a forma de educação que se tornará, inexoravelmente, sua prática no futuro”, explica Marcos Melo, diretor da Futuro Eventos, organizadora e promotora do evento. Diariamente, a EDUCAR 2013 realizará 10 atividades pedagógicas simultâneas, em 10 diferentes auditórios, com palestras, talk shows e mesas de debates. A cada 1h30, participará das programações pedagógicas uma média de 4.200 inscritos. Com o intuito de disseminar conhecimento e aprimorar a formação continuada de professores e gestores, a 20ª Educar debaterá os mais diferentes assuntos intrínsecos à educação e os modelos de escola do passado, do presente e do futuro. “A necessidade de se evoluir cognitivamente é premente, justamente em função do avanço dos recursos e estratégias tecnológicas, porém descobrindo novas formas de adaptação para o ensino”, lembra o diretor do evento. Apesar de ter a Educação 3.0 como tema central, Marcos Melo esclarece ainda que os congressos da EDUCAR EDUCADOR tratarão de outros fatores dentro e fora do tema, permeando a gestão na educação brasileira, a valorização do docente, os investimentos em educação, os projetos político-pedagógicos aplicados 42 | MARÇO/ABRIL 2013 e, sobretudo, a formação continuada dos professores e gestores. O evento reunirá educadores, gestores, secretários estaduais e municipais de educação, sindicatos, órgãos públicos, organizações não governamentais, chefes de Estado e autoridades educacionais do Brasil e de diversos países da América Latina, Europa e Ásia. Cláudia Maria da Cruz, membro do Conselho Estadual de Educação do Paraná e palestrante da EDUCAR 2013, esteve presente na edição passada como visitante e hoje volta participando de uma das mesas de debate. Ela conta que em 2012 teve acesso a inúmeras ferramentas tecnológicas, pesquisas e conhecimentos na área educacional, disponíveis tanto no mercado brasileiro, quanto no internacional. “Tudo isso contribuiu para que eu tivesse uma análise mais criteriosa de como a educação pública pode melhorar seus processos utilizando esses meios para atingir um fim imprescindível: garantir o direito à educação de todas as crianças, jovens e adultos”, diz Claudia. Já a Secretária Municipal de Educação de Bom Princípio (RS), Claudia Raquel Muller, também faz questão de participar novamente do evento, por isso já garantiu sua inscrição. A secretária destaca a feira internacional, onde pode conhecer e levar inúmeras novidades para o seu município, inclusive algumas já implantadas, como o Projeto Jovens Empreendedores. “Minha expectativa é de que o evento ofereça, mais uma vez, referências para que eu possa instrumentalizar as escolas municipais com recursos tecnológicos, tornando-as cada vez mais atrativas aos alunos, uma vez que o objetivo principal da escola é de que os estudantes dominem os conceitos fundamentais de forma prática e prazerosa, com incentivo à pesquisa, preparando-os para a vida”. “É sem dúvida o maior ponto de encontro da educação brasileira e da América Latina, que a cada ano ganha mais consistência, seja em conteúdo dos seus congressos, seja em exposições de produtos e serviços, e que atende do educador ao gestor, ao empreendedor e às instâncias governamentais, em todas as suas necessidades de atualização”, enfatiza o diretor da Futuro Eventos. Feira EDUCAR Diferente do formato de realização em todo mundo, a EDUCAR EDUCADOR proporciona, junto com os congressos pedagógicos, uma feira de produtos e serviços voltados para o segmento educacional. Professores, educadores, gestores e demais profissionais da área encontrarão na EDUCAR a inovação necessária para complementar o aprendizado adquirido nas palestras e talk show de mesas de debates. “É a área prática junto com a teórica, que é desenvolvida dentro dos dez auditórios”, resume Melo. A área total da 20ª EDUCAR abriga 27.000 m² e tem a expectativa de público superior ao registrado em 2012, quando trouxe para o pavilhão do Centro de Exposições Imigrantes (SP) mais de 12,5 mil pessoas. Em 2013, a Feira EDUCAR está alocando 1.500m² somente para empresas estrangeiras, reunindo novidades de todos os continentes. Palestrantes de Destaque Entre os mais de 100 especialistas presentes, a EDUCAR EDUCADOR destaca nomes como Mário Sérgio Cortella, Charles Hadji (França), Cesar Nunes, James Hunter (EUA), Leonardo Boff, José Weinstein (Chile), Cristóvam Buarque, Philippe Perrenoud (Suíça), Washington Foto: Andreia Naomi CAPACITAÇÃO Olivetto, Win Veen (Holanda), Rosely Saião, Marcos Meier, Miguel Arroio, Dado Schneider, Carlinhos de Jesus, Dudu Braga, Emília Ferreiro, Giomar Namo de Mello, Gustavo Cerbasi, Júlio Groppa e Ozires Silva. Confira alguns depoimentos dos palestrantes sobre o tema central do evento: Senador Cristovam Buarque: “Educação 3.0 significa um sistema escolar bom, ao qual todos tenham acesso, cujas escolas tenham a mesma qualidade, que tenham em seus quadros professores muito bem remunerados, com excelente formação, preparados para o desafio de transmitir uma educação completa, interdisciplinar e que sejam regularmente avaliados. Além disso, cujas escolas funcionem em prédios bonitos, agradáveis, contendo os mais modernos equipamentos pedagógicos. E cujos alunos tenham aulas em período integral.” Palestra “Educação Brasileira e Infraestrutura Intelectual. Sistema Reprovado e Falido para as Exigências dos Tempos Atuais. O que Fazer?” Cesar Nunes: “Um evento grandioso como esse deve voltar às origens para ser “original” em sua atualidade. Saber, conhecer, são valores socialmente muito importantes, mas tem que ter parâmetros éticos e políticos voltados para a promoção da vida, para a prática da liberdade, para o respeito às diferenças… Não posso ter uma presunção de que o saber esteja acima da vida, da igualdade humana. Não pode a erudição superar a sabedoria! É preciso formar as pessoas para aprender que a vida é nossa única riqueza, que a recebemos como dádiva, como graça, voltada para a busca da felicidade.” Palestra “Educação e Sociedade: Matrizes Históricas e Possibilidades Emancipatórias Atuais” Feira Educar Ozires Silva “As rupturas do conhecimento, que levam às quebras de paradigmas, são cada vez mais frequentes e é possível antecipar que, pela frente, vamos ver coisas novas, muito novas, superar as tradicionais, não somente transformando o mundo, mas substituindo empresas líderes por outras que trazem produtos diferentes que vençam a preferência dos consumidores.” Palestra “Uma Educação de Qualidade Produz Resultados Extraordinários e Multiplicadores para um Líder da Inovação” Mario Sergio Cortella: “É preciso uma nova postura coletiva. Ambiente de aprendizagem não é apenas um lugar; é, sobretudo, uma disposição para conviver em uma esfera de permuta de conhecimentos recíprocos, no qual o desconhecimento e as dificuldades não podem ser encarados como ameaças e sim como oportunidade de crescimento pessoal e coletivo. Nesse ambiente deve imperar um clima de respeito sincero e de incorporação dos saberes individuais e, ainda, das competências originadas externamente ao espaço pedagógico.” Palestra “Da Oportunidade ao Êxito – Mudar é Complicado? Acomodar-se é Perecer” Os congressos pedagógicos serão divididos em: 20º EDUCADOR (Congresso Internacional de Educação), 10º AVALIAR (Congresso Internacional sobre Avaliação na Educação), 9º EDUCADOR MANAGEMENT (Seminário Internacional de Gestão em Educação), 8º INFÂNCIA&CIA (Congresso Internacional de Educação Infantil e Séries Iniciais), 3º EDUCATEC (Fórum Virtual Educa de Tecnologia e Inovação em Educação) e 2º PROFITEC (Congresso Internacional sobre Educação Profissional e Tecnológica). Mais informações no site www.futuroeventos.com.br/ educar. Patrícia Melo - jornalista e empreendedora, com a Presença – Comunicação Educacional (facebook.com/presencaeducacional), que contribui para um diálogo mais consistente e criativo entre a Escola e a Família. O texto contou com a colaboração da Assessoria de Imprensa da Educar/Educador. VIDA E EDUCAÇÃO | 43 reflexão Qual o papel da escola no novo mundo? Sandra Bozza A escola está apta a formar os seres humanos educando para além de conteúdos e competência? Uma excelente forma de se refletir sobre o papel e a importância da escola na pós-modernidade seria a simulação da seguinte situação: desviados de seu destino em direção a distante galáxia, seres extraterrestres se veem obrigados a pousar em uma escola, onde está ocorrendo uma Reunião de Pais, e perguntam aos que ali se encontram: – O que é isto? Para que serve este local? – O que os alunos responderiam? (...) O que os pais responderiam? E nós, os professores, como caracterizaríamos a instituição que é nosso campo diário de batalha? (...) Parece tão simples, e, talvez, por isso mesmo, seja tão complexo de ser explicitado. – Ora, em uma escola se ensina, se aprende, se transmite ou se constrói conhecimentos, diríamos aos nossos vizinhos cósmicos. – Mas que tipo de conhecimentos? - perguntariam eles. – Conhecimentos científicos. Aqueles historicamente produzidos e acumulados ao longo dos tempos pelos homens. – Por que é necessário ensinar esses conhecimentos? – Para que os humanos mais novos possam aprender e compreender como a vida neste planeta é 44 | MARÇO/ABRIL 2013 organizada... - responderíamos prontamente. – Por que neste espaço e não com seus familiares ou com os que já viveram muito tempo e aprenderam bastante? - insistiriam nossos interlocutores galácticos. – Talvez porque estes não soubessem transmitir todos os conhecimentos produzidos, que são muitos e complexos. – E por que eles precisam aprender muitos e complexos conhecimentos? – Para que os humanos que nascem não precisem “reinventar a roda”... Para que produzam novos conhecimentos a partir daqueles já existentes... Para que supram cada vez mais as necessidades criadas a partir da satisfação de antigas necessidades... Para que evoluam... Enfim, a escola existe para que apreendam e compreendam como e para que se vive!!! E a escola consegue?! - surpreender-se-iam os visitantes. (...) O título deste breve artigo poderia ser apenas COMO FORMAR SERES HUMANOS, pois na minha opinião, quando a escola foi parida teria sido para prover com maior competência do que as famílias, e, obviamente, de maneira mais sistematizada, também essa necessidade. Destarte, no parágrafo acima já anuncio minha perspectiva sobre o papel e a importância social que a escola deveria ter nas relações societárias. Todavia, tal como ocorreu com o significado de certas palavras, nos distanciamos tanto deste remoto objetivo que, mesmo trabalhando no interior de uma escola, fica difícil explicarmos para um alienígena, por exemplo, o motivo pelo qual estamos trabalhando com determinados conteúdos ou desenvolvendo determinadas competências. Hoje quando chamamos alguns de nossos pares de companheiros já não empregamos a palavra com o sentido original: aquele que compartilha o pão. Ao utilizarmos o termo comunidade não temos mais em mente a comunhão igualitária dos bens produzidos naquele local. Ou ainda, quando recebemos em nossa casa alguns camaradas não estamos esperando repartir nossa câmara, nosso quarto mais íntimo. Acredito que o mesmo ocorreu com a função da instituição chamada escola. Talvez por isso fica tão intrigante explicarmos para os Ets a existência de algo que perdeu totalmente sua função original e se organizou para ensinar fragmentos de conhecimentos, tidos como científicos e como verdades absolutas, para uma sociedade que muito pouco guarda de suas peculiaridades remotas. Como apropriadamente reflete Maurice Tardif, os saberes transmitidos pela escola não parecem mais corresponder, senão de forma muito inadequada, aos saberes socialmente úteis no mercado de trabalho, e o professor cuida da sua transmissão, pois a formação integral da personalidade dos aprendentes já não parece ser mais de sua responsabilidade. Enquanto isso, a essência que daria conta do mundo continuar sendo formado por seres verdadeiramente humanos está sendo relegada ao enésimo plano. Apesar de, às vezes, os projetos pedagógicos até contemplarem a ensinagem e a aprendizagem dos direitos humanos, o que menos se constata na prática cotidiana de uma escola é esse exercício. VOO PARA UM MUNDO POSSÍVEL Eduardo Galeano As pessoas não serão dirigidas pelos automóveis, Nem programadas pelo computador, nem olhadas pelo televisor. O televisor deixará de ser o membro mais importante da família e será tratado como o ferro de passar e a máquina de lavar roupa. A comida não será uma mercadoria e nem a comunicação um negócio, porque comida e comunicação são direitos humanos. Ninguém morrerá de fome, porque ninguém morrerá de indigestão. Os meninos de rua não serão tratados como lixo, porque não haverá meninos de rua. Uma mulher, negra, será presidente do Brasil, e outra mulher, negra, será presidente dos Estados Unidos da América; e uma mulher, índia, governará a Guatemala e outra o Peru. Seremos compatriotas e contemporâneos de todos os que tenham aspiração de justiça e aspiração de beleza, tenham nascido onde tenham nascido e tenham vivido onde tenham vivido, sem que importem nem um pouco as fronteiras do mapa ou do tempo. A perfeição continuará sendo um aborrecido privilégio dos deuses; mas neste mundo confuso e fastidioso, cada noite será vivida como se fosse a última e cada dia como se fosse o primeiro. E é justamente na reflexão destes e na luta pela sua garantia que eu concebo a existência dessa parafernália a qual hoje chamamos de escola. Ela só terá sentido se for para desenvolver a promoção e a interiorização de todas as gerações dos direitos humanos. Não basta consagrar esses direitos através do discurso. É necessário praticar e garantir, pelo menos no âmbito escolar, que esses direitos sejam assegurados. Se a escola tem o poder de reproduzir a sociedade como está ou de emancipar para que possamos construir o mundo que precisamos, será sempre via defesa e exercício das quatro gerações de Direitos Humanos, a saber: os cívicos e políticos, os sociais (conseguidos através do trabalho), a preservação do meio ambiente (o bem estar de quem ainda está por nascer) e os direitos aos conhecimentos relacionados à comunicação e à informação. Como afirma Marcuse, hoje temos a capacidade de transformar o mundo num inferno e estamos a caminho de fazê-lo. Todavia, temos também a capacidade de fazer exatamente o contrário. Por que não fazê-lo se a construção de um novo mundo pode ser determinada também pelo poder de nossas ações como educadores? Quem sabe a resposta adequada aos alienígenas do início de nosso diálogo fosse o poema com o qual Eduardo Galeano presenteou-nos quando do Primeiro Fórum Social Mundial: a escola existe para que possamos tornar esse mundo mais HUMANO. Sandra Bozza - Mestre e Ciências da Educação. Linguista. Professora de Metodologia de Ensino da Língua Portuguesa. Autora de livros didáticos e técnicos sobre o ensino da língua escrita. [email protected] VIDA E EDUCAÇÃO | 45 Política Educacional Interpretar para reinventar a escola Casemiro de Medeiros Campos O objetivo do IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica é fomentar a melhoria da qualidade de ensino do País, mas é necessário discutir o assunto e interpretar os relatórios para transformar a escola. Na busca de estabelecer consensos, a política de educação dos últimos vinte anos no Brasil trouxe temas de grande importância para a reforma do sistema educativo. As redes de ensino foram obrigadas a definir uma adaptação às referências da discussão da pedagogia da competência. O Conselho Nacional de Educação e o Ministério da Educação instituíram ações com objetivo de modernizar a educação brasileira em que a avaliação passou a cumprir um papel estratégico no gerenciamento dos sistemas de educação. Tivemos uma definição inicial no plano da legislação da educação com a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9394/1996. Num segundo plano, tivemos a edição das novas orientações curriculares. Como exemplo, podemos destacar as alterações dos conteúdos de ensino, com a edição dos Referenciais da Educação Infantil, na Educação infantil; dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN´s no Ensino Fundamental e Médio e as definições das Diretrizes Curriculares para a Educação Básica e na Educação Superior. Posteriormente, diante dos compromissos do país assumidos internacionalmente, tivemos o aumento 46 | MARÇO/ABRIL 2013 do tempo pedagógico, passando a escolaridade básica de oito para nove anos, oportunidade em que a criança entra no ensino fundamental com seis anos de idade. É relevante salientar que dois mecanismos foram fundamentais para a estruturação da política de educação nos últimos anos: a criação em 1996 do FUNDEF, que foi renovado em 2007 pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação - FUNDEB. Mas, de forma muito exigente, as instituições escolares tiveram que se submeter ao sistema de avaliação da escola básica que avalia a escola em todos os níveis do ensino – dos anos iniciais do ensino fundamental ao término da escola básica no ensino médio. “A avaliação em si não trouxe a inovação, mas os seus resultados foram úteis como fontes de análise...” A avaliação gerou severas repercussões na escola, especialmente no âmbito da gestão escolar, fazendo com que os gestores tomassem decisões estratégicas a partir dos relatórios com os resul- tados da avaliação. Outra medida que vale ressaltar foi a definição do piso nacional para professores da escola básica, uma reivindicação dos professores que, por meio das suas entidades sindicais representativas, tiveram que pressionar o Congresso Nacional para fazer aprovar o referido piso salarial, que era uma referência histórica dos professores para o reconhecimento das lutas da categoria e da valorização do magistério. Relaciono os itens acima como principais pontos que nos levam necessariamente para uma releitura da escola no Brasil. Parte destas medidas veio tendo como foco a inovação da escola, dos sistemas escolares e da própria política de educação que os definiram. Mas a implantação e o paulatino aperfeiçoamento do sistema de avaliação vieram consolidar uma tendência: a necessidade de eficiência do sistema educacional público de ensino. Os resultados das avaliações podem ser utilizados para produzir mudanças na escola e, de forma particular, na realidade da vida dos alunos, dos professores e das famílias. A avaliação em si não trouxe a inovação, mas os seus resultados foram úteis como fontes de análise para se ter benefícios ou mesmo consequên- cias para a busca da contínua melhoria da qualidade da escola, do trabalho pedagógico e do processo ensino e aprendizagem e da própria gestão das instituições escolares. A inovação na educação não é algo fácil de ser definido, mas pelos resultados das avaliações se verifica a cada ano na busca pelo compromisso com a melhoria, na definição da escola e a sua verdadeira função numa sociedade democrática. As avaliações de âmbito nacional em curso na escola são: Sistema de Avaliação da Educação Básica - SAEB; Prova-Brasil; Provinha-Brasil e Novo Exame Nacional do Ensino Médio – Novo ENEM. Os resultados das avaliações na educação viabilizaram a conquista da melhoria da escola pública. Há muito que fazer e melhorar, a qualidade da escola que fazemos, mas as avaliações cumprem um papel que contribui para o enfrentamento adequado às questões nevrálgicas da escola pública. Como exemplo, pode ser citado as questões referentes ao fracasso escolar. As pesquisas revelam que nos últimos anos há um desafio para o avanço da melhoria da escola. “Os números indicam ser necessária uma mudança no sistema de ensino.” Elementos inovadores foram definidos na forma de instrumentos para o controle da frequência, o acompanhamento da evasão, da repetência, da reprovação e do abandono escolar que provocaram muitas divergências, mas foram incorporados como recursos para o avanço de práticas significativas na organização do trabalho docente na escola pública. A definição do sistema de avaliação contribuiu sobremaneira para a criação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB. Os resultados do IDEB provocaram uma reviravolta na definição das políticas públicas na educação. A função deste indicador denota o monitoramento dos sistemas públicos de ensinos apoiados nos índices dos fluxos escolares tendo por base a promoção, a repetência e a reprovação combinando com os resultados dos alunos nos exames padronizados no final do Ensino Fundamental I (5º. Ano) e na conclusão do Ensino Fundamental II (9º. Ano) e no término do Ensino Médio (3º. ano). A criação do IDEB permitiu a coleta das informações anualmente para o Censo Escolar das escolas públicas e particulares no país de informações básicas que passam a compor o banco de dados sob a responsabilidade do INEP/MEC. O Censo Escolar revela: matrícula, número de turmas, função docente, número de estabelecimentos, movimentação escolar, transporte escolar e rendimento dos alunos. Os dados do Censo Escolar produzem informações que, sistematizadas, colaboram para o funcionamento do sistema gerando outros indicadores, tais como: o tempo médio de permanência dos alunos no sistema de ensino. A consistência das informações produzidas ano a ano por meio dos indicadores permitirá uma leitura mais aguçada da realidade e suas nuanças, servindo para a tomada de decisão tendo em vista o êxito escolar. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB, somente tem sentido se apontar como instrumento de avaliação para a melhoria do ensino. Os resultados devem servir como alerta aos gestores para que medidas urgentes devam ser tomadas com o objetivo no desenvolvimento da educação. Se compararmos uma série histórica, os resultados dos anos de 2005 a 2009, é fácil verificar que o desempenho da escola no Brasil cresce de forma lenta, aliás, muito lenta. O sistema educacional brasileiro encontra-se numa profunda letargia, marcado por uma lentidão que afeta o crescimento, tanto na rede pública como na rede privada. Os números indicam ser necessária uma mudança no sistema de ensino. O resultado do último IDEB nos revela o baixo desempenho no crescimento da aprendizagem. Assim, urge o desafio em focar a atividade de organização da gestão da escola. É preciso interpretar as informações dos relatórios e transformá-los em políticas de ação. Ousar em reinventar a escola. O núcleo central das mudanças está no paradigma: da concepção do ensino para uma nova aprendizagem. Os professores foram formados numa lógica em que se tem a ação pedagógica centrada no ensino. O modelo de aulas exagera no instrucionismo e no uso das pedagogias tradicionais. Sabemos que o conhecimento está disseminado em rede, mas o centro da aula é o professor. São utilizados métodos que não estão centrados na aprendizagem. As experiências verdadeiramente construtivistas são raras e prolifera a mesmice no dia-a-dia da sala de aula. Portanto, é preciso que se desenvolva outra mentalidade diante dos desafios de fazer uma nova escola possível. É necessário investimento na formação continuada dos professores. Se a escola, sala de aulas e o professor não mudaram isso é lamentável para a aprendizagem dos alunos e demonstra a estagnação do sistema. Não se pode dissimular a importância do professor no processo de ensino-aprendizagem. O Relatório do IDEB nos mostra que 40% dos professores que atuam no ensi- VIDA E EDUCAÇÃO | 47 Política Educacional “Mas a inovação leva certo tempo para se consolidar na forma de uma cultura institucional.” Esses números revelam o descaso do Estado com a formação dos professores, mesmo que, desde 1996, a nova LDB – Lei nº. 9394/96, já traga definido no seu texto como lei a década da educação, determinando prioridade na formação em nível superior dos professores. Parece que esta realidade ainda precisa ser seriamente modificada. A realidade é que a formação do professor possui uma relação com a aprendizagem do aluno e na qualidade do ensino. É fundamental que a mudança da melhoria da escola necessariamente passe pelo professor. É necessário desenvolver uma política de formação de professores, inicial e contínua, para além das semanas pedagógicas, das jornadas pedagógicas promovidas pelas escolas e municípios. Estas atividades formativas não devem acabar, mas que a formação deve ser prioridade como projeto das escolas para a melhoria da qualidade do ensino. Neste sentido, é relevante que se proponha aos docentes a mudança no processo didático, no planejamento, no ensino, na aprendizagem e na avaliação. É fundamental 48 | MARÇO/ABRIL 2013 que se faça a superação desta situação com uma correta formação dos professores. Outro ponto que merece destacar foi a inovação no sistema de avaliação, foi a implantação do Exame Nacional do Ensino Médio. A renovação do ENEM em 2008, permitiu a implementação de mudanças que alteraram a sua composição, passando a ser denominado, a partir de 2009, como Novo Enem. Sob exigências da política para as Instituições Federais de Educação Superior - IFES, o Governo Federal requereu a adoção do Novo ENEM em substituição ao vestibular tradicional. É fácil verificar que ano após ano tem sido crescente a adoção do Novo ENEM pelas IFES. Essa medida faz parte da política do governo federal que ao contemplar com recursos as Instituições Federais de Educação Superior exige em contrapartida destas a filiação aos programas do MEC. As mudanças provocadas pelo Novo ENEM em substituição dos vestibulares tradicionais haverá de trazer outras necessidades nas escolas para o desenvolvimento e renovação da sua estrutura e organização. As medidas acima citadas, segundo o Estado avaliador, devem contribuir para a melhoria dos sistemas de ensino e das escolas. Mas a inovação leva certo tempo para se consolidar na forma de uma cultura institucional. Estes elementos podem vir a se constituírem em instrumentos de gestão dos sistemas de ensino e das escolas. A inovação deverá ser captada com a alteração dos resultados da avaliação. Entretanto, a educação é marcada como um campo contraditório. A contradição revela, de forma dialéti- ca, outras questões que estão colocadas para o desafio da melhoria da escola: porque a democratização e a universalização da escola não permitiram a elevação dos indicadores de qualidade do ensino? Portanto, falta muito no que diz respeito à responsabilidade do Estado, em ter como prioridade a educação e a escola. Como se pode querer priorizar a escola tendo como fim o desenvolvimento do país e não se valorizar o professor e o seu trabalho? A valorização não deve ser limitada à melhoria do salário com a instituição do piso salarial dos professores, mas investimentos no bem-estar docente e nas condições para o bom desempenho do seu trabalho são fundamentais. Logo, se verifica que muito nos falta para uma situação ideal. A reação negativa em priorizar a educação é algo que deverá ser superado, pois, há muito para ser alcançado na busca do ideal para o bem-estar do trabalho e desempenho dos professores. Ainda não há uma vontade política explicitada nos discursos políticos, ou seja, nos falta vontade política para de fato melhorarmos na educação. Casemiro de Medeiros Campos – doutorando no Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Ceará – UFC. Mestre em educação/UFC, pesquisador na área de formação de professores, gestor e consultor em educação. Escritor. www.casemiroonline.com.br [email protected] Gestos de flexibilidade na EaD Ana Cláudia Uchôa Araújo Patrícia Helena Carvalho Holanda Tese de Doutoramento investiga a participação da mulher no magistério na EaD no Brasil, na contemporaneidade. Esse texto consiste num relato da aproximação teórica entre o objeto de pesquisa – a mulher e a docência na EaD – contemplado em nossa proposta de tese de Doutoramento, e algumas leituras e estudos advindos da Disciplina de História da Educação Comparada III, cursada no Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira, na UFC, no segundo semestre do ano de 2012. De início, convém destacar que o objeto de pesquisa ainda se encontra em pleno processo de delineamento, com todas as dúvidas e angústias que invadem o pesquisador num momento como este. Neste período, envolto mais em incertezas do que certezas, tem-se a impressão que se tateia no escuro, que as palavras e ideias não exprimem exatamente aquilo que se quer falar, enfim, que a pesquisa não avança como se espera e o tempo urge sem piedade. Em meio a este caos (talvez, necessário), sinto-me como a deslizar numa superfície ora lisa, ora íngreme, das lembranças de uma história presente da qual também sou uma personagem: a da participação da mulher no magistério na EaD no Brasil, na contemporaneidade. É esta participação somada à vivência que tenho tido num núcleo de educação a distância desde o ano de 2008 que, ao se cruzarem com as leituras que venho fazendo, sobretudo no âmbito da disciplina acima citada, contribuem para aos poucos tornar mais vívido e preciso o foco do que pretendo pesquisar, colaborando para a construção do referencial teórico, a escolha da metodologia empregada e a definição das categorias de análise norteadoras da investigação. Contudo, convém destacar que esta pesquisa também se volta para o entendimento do passado, para a melhor compreensão do hoje, uma vez que começo o estudo pelo momento do ingresso maciço da mulher no magistério brasileiro, que se dá por volta da década de 1930, período de assentamento das bases da industrialização no país e da República. A EaD no Brasil, o ambiente em que se dá a investigação, por sua vez, já no final do século XIX começa a ter iniciativas tímidas no país, conforme Alves (2009), passando por diversas fases de desenvolvimento ao longo do século XX e tendo um período de explosão exponencial na primeira década do século XXI, por ocasião da utilização das TIC‘s (Tecnologias de Educação e Comunica- ção) no processo de ensino e aprendizagem. Quanto à mulher que atua nesta fase da EaD mais contemporânea, sabe-se de sua atuação em diversas funções de uma equipe multidisciplinar vinculada a esta modalidade, incluindo a docência, cuja figura mais proeminente é a do tutor a distância. Mattar (2012), a respeito da tutoria, pontua que esta atividade é vista por muitos de forma rebaixada, uma vez que em várias instituições de educação a distância, [...] O salário é indecente, e o tutor é quase sempre convidado a agir passivamente, como um monitor, não como um professor. Isso reforça um modelo de EaD fordista, industrial e instrucional, que acaba afastando muita gente da EaD, embora não seja o único modelo possível de se fazer educação a distância. Ao contrário, há um modelo oposto, que dá mais importância à interação do que à produção de conteúdo e que, por sua vez, exige processos de formação de professores, profissionais pagos decentemente etc (op. cit, 2012, p. 19). VIDA E EDUCAÇÃO | 49 Foto: Arquivo Digital no fundamental possuem somente o ensino médio, ou seja, são professores formados apenas com o curso pedagógico ou o normal. Na região Nordeste o quadro dos professores com nível médio é de 50%. Os Estados da Bahia, Roraima, Maranhão, Pará, Acre, Alagoas, Amapá, Piauí e Pernambuco possuem mais de 40% dos professores atuando no ensino fundamental com formação de nível médio. Essa realidade precisa ser modificada com urgência. carreira carreira Depreende-se, assim, que o tutor, como o profissional responsável pela mediação pedagógica dos processos de ensino e aprendizagem em EaD, é um docente por excelência e que a ele são delegados vários papéis que demandam conhecimento do conteúdo específico, da tecnologia e de didática adequados ao ensino virtual, sem no entanto ser reconhecido como professor, nem pelo nome, quanto menos pelo salário. Em que pese esta realidade, Mattar, nesta obra, defende o uso do termo professor para designar o tutor que atua em EaD tanto no aspecto pedagógico quanto no trabalhista, enquanto autores como Bruno e Lemgruber (2009) defendem o termo professor tutor, por entenderem que a ação deste profissional não está ligada ao fato de simplesmente receber pacotes de conteúdos prontos e irrefletidamente lançá-los aos alunos. É neste contexto de docência precarizada, que se busca investigar o papel feminino, tecendo-se as seguintes indagações: o que se sabe desta mulher professora no ensino a distância? Qual a sua formação e qual a relação disto com o trabalho que desempenha na EaD? Em quais cursos e modalidades atua? Por quais desafios e dilemas tem passado? Como esta mulher professora lida com as crescentes mecanização e desterritorialização da docência na EaD? Ainda não tenho respostas para tais indagações, mas passo a discorrer agora sobre o que o diálogo travado com um dos autores lidos nesta disciplina tem colaborado com a discussão que tenho iniciado na pesquisa. Em Del Priore (2011), tenho estudado a história feminina no país, desde os períodos coloniais, a situação de subordinação da mulher e suas tentativas de emancipação. Nos textos ainda se apresentam o corpo fe- 50 | MARÇO/ABRIL 2013 minino demonizado e “domado” e a sua sexualidade reprimida, com o fito de “proteger” a mulher de si mesma e resguardar a sociedade da degeneração e perdição, advindas de uma possível liberação sexual feminina. Há destaque também para a abordagem feita acerca da mulher “histérica”, sendo ela já um produto de uma sociedade repressora. Tal mulher recebe o tratamento psiquiátrico para a sua doença. É rotulada, dopada, confinada e mutilada através de práticas de enquadramento patologizantes. Já num período de nascente e crescente urbanização brasileira, no início do século XIX, a mulher burguesa também me é apresentada, como aquela que, embora livre para sair para o cinema, o teatro e o café, embora cuidadosamente vigiada pelo marido, o pai e a sociedade, é tão presa quanto a mulher de outrora, uma vez que deve assumir os papéis (antigos e novos), os quais mesclam o tradicional e o moderno, pois ao mesmo tempo em que deve ser a esposa fiel, agora precisa aprender a ser mãe responsável pelos cuidados da prole e da casa, bem como se comportar em público e granjear para o esposo e a família a manutenção ou a elevação do status familiar considerado qualificado para a época. A revisita a estas mulheres de, pelo menos, quatro séculos me faz voltar o olhar para a mulher do hoje, a mulher professora da EaD, o sujeito da pesquisa que estou desenvolvendo. Meu olhar é curioso, no sentido de investigar seus anseios e temores, as interfaces estabelecidas entre a sua vida familiar e profissional. Procuro imaginar em que medida, a mulher colonial, a mulher “histérica” e mulher burguesa se aproximam desta mulher conectada às redes sociais e à educação a distância, que sai agora sem a vigilância do marido e do pai, porque o dispositivo de Projeto Viva a Vida vigilância e autorregulação, como nos diria Foucault, já está introjetado nela. Suspeito, porém, que as mulheres do passado e do presente estão mais próximas do que imaginamos... Educação para a Cidadania Ana Cláudia Uchôa Araújo - Doutoranda em Educação Brasileira, pela Universidade Federal do Ceará-UFC, na Linha História da Educação Comparada, Eixo Educação Comparada. Pesquisadora em Educação a Distância, Educação Profissional e Educação Comparada. Pedagoga no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará, Campus Fortaleza. Emails:[email protected]; [email protected]. Acreditando que a melhor arma contra as drogas é, e continuará sendo, a prevenção, e entendendo que ações educativas e preventivas só serão eficazes se discutidas com a sociedade de forma aberta, é que a JF Projetos e Edições lança a Cartilha ”Conversando Sobre Drogas”, com uma proposta de pactuar caminhos intersetoriais que fortaleçam todas as iniciativas favoráveis à sua prevenção e consumo. Patrícia Helena Carvalho Holanda - Doutora em Educação Brasileira, pela Universidade Federal do Ceará-UFC. Professora do Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira da UFC, nas Linhas de Avaliação Educacional, Eixo Avaliação Curricular, e História da Educação Comparada, Eixo de Educação Comparada. Orientadora de Mestrado e Doutorado, da Faculdade de Educação-FACED/UFC. Email:[email protected] Referências bibliográficas ALVES, João Roberto Moreira. A História da EaD no Brasil. In: LITTO, Frederic Michael e FORMIGA, Manuel Marcos M. (orgs.). Educação a Distância: o Estado da Arte. São Paulo: Pearson Education do Brasil, 2009. BRUNO, Adriana Rocha; LEMGRUBER, Márcio Silveira. A dialética professor-tutor na Educação On-line: o curso de Pedagogia – UAB-UFJF em perspectiva. Disponível em: http://www.ufpe.br/nehte/ hipertexto2009/anais/a/a-dialetica-professor-tutor.pdf. Acesso em: 24 fev. 2013. DEL PRIORE, Maria. História das mulheres no Brasil. São Paulo: Editora Contexto, 2011. MATTAR, João. Tutoria e interação em Educação a Distância. São Paulo: Cengage Learning, 2012 (Série Educação e Tecnologia). Escolhemos, portanto, a Escola como palco principal das nossas ações, reconhecendo nela o lugar ideal para se trabalhar as prevenções primárias e secundárias do problema que tanto aflige às famílias e ameaça a estrutura socioeconômica do país. 85 3219.4260 projetos e edições Av. Mons. Tabosa, 663 – sala 14 Meireles - Fortaleza – Ceará 28 MUNICÍPIOS 28 MUNICÍPIOS CONVENIADOS JÁ ATINGIRAM A META DO MEC PARA 2021. E A SUA CIDADE? Aprende Brasil. Uma parceria que dá resultado. Os municípios que utilizam o Aprende Brasil já sentiram a diferença nos índices educacionais. Com o auxílio de um conjunto completo de soluções educacionais, diversas cidades já começaram a ver os resultados. Afinal, quando a educação melhora, a economia, a saúde, a segurança e a qualidade de vida também melhoram. Conheça os benefícios que o Aprende Brasil oferece: → Livro Didático Integrado → Portal Aprende Brasil → Assessoria Pedagógica → Sistema de Monitoramento Educacional do Brasil (SIMEB) → hábile – Sistema de Avaliação Positivo Seja um parceiro do Aprende Brasil. Ligue 0800 724 15 16 ou acesse editorapositivo.com.br/aprendebrasil Entre em contato conosco e conheça também nossa solução para educação em tempo integral. Piratuba é uma das 10 cidades com IDEB acima de 6.