Dedication: Gerald L. Ford La peculiar función “ciudadela” de la

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Dedication: Gerald L. Ford La peculiar función “ciudadela” de la
Dedication: Gerald L. Ford
La peculiar función “ciudadela” de la marca renombrada en contratos con
restricciones verticales. Estrategia competitiva, marca y distribución selectiva
en redes físicas y virtuales.
Luis Antonio Soler Pascual
The Peculiar “Citadel” Function of the Well-Known Trademark in Contracts
With Vertical Restrictions: Competitive Strategy, Trademarks, and Selective
Distribution in Physical and Virtual Networks
Luis Antonio Soler Pascual
Delay in Filing Preliminary Injunction Motions: 2015 Edition
Sandra Edelman and Fara S. Sunderji
Famous and Well-Known Marks in Mexico: Past, Present, and Future
John M. Murphy
Parody as Brand
Stacey L. Dogan and Mark A. Lemley
Questões Controversas Envolvendo Franquias no Brasil
Paula Mena Barreto
Disputes Involving Franchising in Brazil
Paula Mena Barreto
Commentary: Divert All Trademark Appeals to the Federal Circuit? We Think Not
J. Thomas McCarthy and Dina Roumiantseva
Commentary: 在中国OEM生产如何定性
冯浩雨 李佳
Commentary: The Nature of OEM Production in China
Haoyu Feng and Jia Li
September–October, 2015
Vol. 105 No. 5
Vol. 105 TMR
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EDITORS’ NOTE
With this issue of The Trademark Reporter (TMR), INTA is
pleased to introduce articles and commentaries in multiple
languages. In alignment with INTA’s 2014–2017 strategic goal to
bolster international expansion, the TMR will now publish multilanguage pieces throughout the year to expose a broader TMR
audience to important non-English writing on trademark law
issues. Each article and commentary will be offered with an
accompanying English translation. Inclusion of these pieces in the
TMR will, it is hoped, have the salutary effect of encouraging
authors whose native language is not English to share their
writing with INTA’s members. Given the TMR’s long history of
excellence and rigorous peer review, its editorial board is
committed to ensuring that non-English pieces undergo as
exacting an editorial process as that for English submissions but is
aware that each submission (and corollary translation) may need
to be handled differently from the norm. We have elected to
approach English translations in a manner that champions fidelity
to the author’s voice and favors substance over consistency with
TMR style. We believe this is more respectful to authors and more
useful for TMR readers. That said, we emphasize that only the
native-language version of a multi-language piece should be
considered authentic. TMR submission guidelines will be updated
soon to reflect this exciting new feature and will include details
about our translation process. We include three multi-language
pieces in this inaugural issue, all of which have helped INTA to
establish a framework for this practice going forward. In 2016, we
anticipate having four to five multi-language articles spread
throughout the year and expect this number to increase as more
authors from around the world submit articles in their native
languages. We would like to thank everyone who has helped to
achieve this milestone, and hope that TMR readers will learn from
and enjoy this new aspect of TMR scholarship.
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QUESTÕES CONTROVERSAS ENVOLVENDO
FRANQUIAS NO BRASIL
Autora: Paula Mena Barreto
I. INTRODUÇÃO
Nos últimos anos, o Brasil demonstrou um constante, apesar
de nada espetacular, crescimento da economia em razão da sua
estabilidade macroeconômica. O mercado de consumo também tem
demonstrado um forte crescimento como resultado da rápida
expansão da classe média. Esses fatores são favoráveis ao
desenvolvimento do sistema de franquia no país. Em 2012 1, o setor
faturou o valor de R$ 107 bilhões de reais 2 no Brasil, reunindo
cerca de 2.500 marcas. O setor que mais cresceu em faturamento
foi o de hotelaria e turismo, seguido pelo setor de informática e
eletrônicos. 3 Em 2013 e 2014, o setor faturou R$ 118 bilhões e R$
127 bilhões, respectivamente. 4 Os setores que devem apresentar
um bom crescimento nos próximos anos são os de alimentação,
turismo e hotelaria. 5 A maioria dos franqueadores globais mais
relevantes já possui uma base no mercado brasileiro e, a cada ano,
esse número cada vez aumenta mais.
O forte crescimento do sistema de franquia no Brasil tem sido
acompanhado por litígios envolvendo diferentes questões,
principalmente processos judiciais relacionados a obrigações
contratuais entre franqueador e franqueado, além de disputas que
se referem a obrigações ou responsabilidades do franqueador
perante terceiros. O presente artigo busca examinar os assuntos
principais que estão em discussão e como estão sendo tratados
pelos tribunais brasileiros. Apesar de ser difícil uniformizar casos
que apresentam inúmeras variáveis, tais como proteção de marca,
cláusulas de não competição, territorialidade e responsabilidade de
terceiros, verifica-se que muitas das decisões aparentemente estão
em favor dos franqueadores, confirmando o potencial atraente do
modelo de negócio para titulares de marcas que têm a intenção de
atuar no mercado brasileiro. Os franqueados, por outro lado,
br).
1. Segundo a Associação Brasileira de Franquia (http://www.portaldofranchising.com.
2. A moeda brasileira é o Real (R$). No period coberto por esse texto, a taxa de câmbio
com a flutuação do dólar variou entre aproximadamente R$ 1.65 to R$ 3.10/US$, com uma
média de R$ 2.20/US$. A taxa de câmbio em Euros é de aproximadamente R$3,41/EUR.
3. Jornal O Globo, de 28 de outubro de 2013.
br).
4. Segundo a Associação Brasileira de Franquia (http://www.portaldofranchising.com.
5. Jornal O Globo, de 3 de fevereiro de 2014.
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também são protegidos no caso de contratos incompletos e vagos,
ou no caso de infração dos seus direitos pelo franqueador.
II. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE
O SISTEMA DE FRANQUIA NO BRASIL
Para o professor Denis Borges Barbosa, 6 um dos mais
renomados autores em franquia, a franquia é definida como um
sistema de multiplicação de uma mesma organização empresarial
de produção, vendas ou serviços sob responsabilidade de vários
empresários autônomos. É o uso inventivo da licença de signos
distintivos
(marcas,
trade
dress),
complementada
pela
padronização administrativa, organizacional e, em certos casos,
tecnológica, das unidades técnicas de produção de empresas
independentes. Nessas estruturas, os franqueados arcarão com o
risco de seu próprio negócio, mas prestarão serviços idênticos ao do
titular da experiência adquirida inicialmente, de forma que, para o
consumidor, pareça ser a mesma empresa; esta impressão é
fortalecida pelo fato de todos os prestadores do mesmo serviço
usarem a mesma marca.
O sistema de franquia no Brasil é precipuamente regido pela
Lei nº 8.955 de 15 de dezembro de 1994 (“Lei de Franquia”), que
define a franquia empresarial da forma abaixo:
“Art. 2: Franquia empresarial é o sistema pelo qual um
franqueador cede ao franqueado o direito de uso de marca ou
patente, associado ao direito de distribuição exclusiva ou semiexclusiva de produtos ou serviços e, eventualmente, também
ao direito de uso de tecnologia de implantação e administração
de negócio ou sistema operacional desenvolvidos ou detidos
pelo franqueador, mediante remuneração direta ou indireta,
sem que, no entanto, fique caracterizado vínculo
empregatício.” 7
A Lei de Franquia se aplica a todos os sistemas de franquia
instalados e operados no território nacional, sejam estrangeiros ou
nacionais. O sistema de franquia também é regulado pelo Código
Civil (Lei 10.406/2002), que disciplina as obrigações contratuais em
geral. A Lei de Franquia permite às partes plena liberdade para
transacionar e regular sua relação de franquia e não delimita, em
geral, os seus direitos e obrigações, com exceção das obrigações do
franqueador quanto às informações que devem constar na circular
de oferta de franquia, que estará descrita a seguir. A franquia é
um contrato complexo e envolve uma série de deveres impostos a
ambas as partes, como transferência de tecnologia, licença de
6. BARBOSA, Denis Borges. Uma Introdução à Propriedade Intelectual. 2ª Ed.: Ed.
Lumen Juris. p. 1059.
7. Artigo 2 da Lei de Franquia.
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marca, assistência administrativa e de marketing, fornecimento de
produtos e outros aspectos típicos aos contratos de franquia.
Ambas as partes são usual e contratualmente obrigadas a realizar
e satisfazer inúmeros compromissos e obrigações.
III. QUESTÕES CONTROVERSAS ENVOLVENDO AS
RELAÇÕES DE FRANQUIA
As diversas questões englobadas por um contrato de franquia,
além da complexa relação entre franqueador e franqueador, dão
margem a inúmeros litígios entre as partes contratantes. Como em
qualquer relação jurídica, uma ou ambas as partes podem ficar
descontentes e interpor medidas judiciais ou arbitrais para a
proteção dos seus direitos. As controvérsias variam, desde
obrigações para registro de marcas a questões de assistência ao
negócio e pagamentos de determinados tributos, dentre outros
casos. As medidas típicas incluem um pleito para o término da
relação contratual, combinado com pedidos de indenização ou
outras obrigações de fazer ou não fazer. 8
Muitos casos de franquia são resolvidos em arbitragem e, como
a arbitragem é um procedimento privado, não há material
publicado relevante nesse sentido. Há, contudo, jurisprudência
farta e significativa dos nossos tribunais, que será objeto de
discussão neste capítulo, e que pretende apresentar decisões
relevantes com base nas mais variadas questões que podem surgir
de uma relação de franquia.
A. Disputas Evolvendo a Circular de Oferta
de Franquia
O documento primordial e introdutório que deve ser elaborado
pelo franqueador e cuidadosamente analisado pelo franqueado em
potencial é a circular de oferta de franquia. A Lei de Franquia, ao
regular os contratos de franquia, teve o cuidado em criar a referida
circular, que deve conter clara e precisa informação do negócio, a
fim de possibilitar que a parte interessada tenha uma visão geral
8. É importante notar que, em muitos dos casos analisados, as decisões finais ainda
não foram proferidas, uma vez que podem ser passíveis de recurso ao Superior Tribunal de
Justiça (STJ), que é um dos órgãos máximo do Poder Judiciário para questões nãoconstitucionais, com a responsabilidade de harmonizar a interpretação das leis federais,
e/ou ao Supremo Tribunal Federal (STF), que é o órgão máximo do Poder Judiciário para as
questões constitucionais. Além disso, o princípio geral adotado no Brasil (como característica
do sistema de Civil Law) é o da jurisprudence constante, segundo o qual uma série de
decisões anteriores que aplicam uma regra específica do direito é relevante e pode ser
determinante em casos posteriores, mas não é vinculativo para outros tribunais, em
contraste com o instituto do stare decisis, segundo o qual as decisões de um órgão judicial
criam um precedente e vinculam as que vão ser emitidas no futuro, sendo essa uma
característica do sistema de Common Law.
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do negócio e uma clara ideia dos direitos e obrigações de ambas as
partes.
Nesse sentido, a Lei de Franquia enumera todos os requisitos
necessários que devem constar na circular de oferta de franquia
para fins de proteção do potencial franqueado com relação a riscos
e armadilhas do negócio. Ao mesmo tempo, essas informações
protegem o franqueador, uma vez que o franqueado não pode
alegar, posteriormente, desconhecimento sobre as condições do
negócio. A circular é similar, em sua natureza, a documentos
requeridos em outros países, como o basic disclosure document
exigido nos Estados Unidos.
Todos os requisitos para a circular de oferta de franquia
encontram-se no artigo 3º da Lei de Franquia, 9 devendo o
9 Artigo 3º: Sempre que o franqueador tiver interesse na implantação de sistema de
franquia empresarial, deverá fornecer ao interessado em tornar-se franqueado uma circular
de oferta de franquia, por escrito e em linguagem clara e acessível, contendo
obrigatoriamente as seguintes informações:
I – histórico resumido, forma societária e nome completo ou razão social do
franqueador e de todas as empresas a que esteja diretamente ligado, bem como os
respectivos nomes de fantasia e endereços;
II – balanços e demonstrações financeiras da empresa franqueadora relativos aos dois
últimos exercícios;
III – indicação precisa de todas as pendências judiciais em que estejam envolvidos o
franqueador, as empresas controladoras e titulares de marcas, patentes e direitos autorais
relativos à operação, e seus subfranqueadores, questionando especificamente o sistema da
franquia ou que possam diretamente vir a impossibilitar o funcionamento da franquia;
IV – descrição detalhada da franquia, descrição geral do negócio e das atividades que
serão desempenhadas pelo franqueado;
V – perfil do franqueado ideal no que se refere a experiência anterior, nível de
escolaridade e outras características que deve ter, obrigatória ou preferencialmente;
VI – requisitos quanto ao envolvimento direto do franqueado na operação e na
administração do negócio;
VII – especificações quanto ao:
a) total estimado do investimento inicial necessário à aquisição, implantação e
entrada em operação da franquia;
b) valor da taxa inicial de filiação ou taxa de franquia e de caução; e
c) valor estimado das instalações, equipamentos e do estoque inicial e suas
condições de pagamento;
VIII – informações claras quanto a taxas periódicas e outros valores a serem pagos
pelo franqueado ao franqueador ou a terceiros por este indicados, detalhando as respectivas
bases de cálculo e o que as mesmas remuneram ou o fim a que se destinam, indicando,
especificamente, o seguinte:
a) remuneração periódica pelo uso do sistema, da marca ou em troca dos serviços
efetivamente prestados pelo franqueador ao franqueado (royalties);
b) aluguel de equipamentos ou ponto comercial;
c) taxa de publicidade ou semelhante;
d) seguro mínimo; e
e) outros valores devidos ao franqueador ou a terceiros que a ele sejam ligados;
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franqueador entregar a circular de oferta em, no mínimo, 10 (dez)
dias antes da assinatura do contrato ou pré-contrato de franquia
ou, ainda, do pagamento de qualquer tipo de taxa pelo franqueado
ao franqueador ou a empresa ou pessoa ligada a este, conforme
disposto no artigo 4º da referida Lei. 10
Na hipótese do não cumprimento do prazo acima, o parágrafo
único do artigo 4º da Lei de Franquia dispõe que o franqueado
poderá arguir a anulabilidade do contrato e exigir devolução de
todas as quantias que já houver pagado ao franqueador ou a
terceiros por ele indicados, a título de taxa de filiação e royalties,
IX – relação completa de todos os franqueados, subfranqueados e subfranqueadores da
rede, bem como dos que se desligaram nos últimos doze meses, com nome, endereço e
telefone;
X – em relação ao território, deve ser especificado o seguinte:
a) se é garantida ao franqueado exclusividade ou preferência sobre determinado
território de atuação e, caso positivo, em que condições o faz; e
b) possibilidade de o franqueado realizar vendas ou prestar serviços fora de seu
território ou realizar exportações;
XI – informações claras e detalhadas quanto à obrigação do franqueado de adquirir
quaisquer bens, serviços ou insumos necessários à implantação, operação ou administração
de sua franquia, apenas de fornecedores indicados e aprovados pelo franqueador, oferecendo
ao franqueado relação completa desses fornecedores;
XII – indicação do que é efetivamente oferecido ao franqueado pelo franqueador, no
que se refere a:
a) supervisão de rede;
b) serviços de orientação e outros prestados ao franqueado;
c) treinamento do franqueado, especificando duração, conteúdo e custos;
d) treinamento dos funcionários do franqueado;
e) manuais de franquia;
f)
auxílio na análise e escolha do ponto onde será instalada a franquia; e
g) layout e padrões arquitetônicos nas instalações do franqueado;
XIII – situação perante o Instituto Nacional de Propriedade Industrial - (INPI) das
marcas ou patentes cujo uso estará sendo autorizado pelo franqueador;
XIV – situação do franqueado, após a expiração do contrato de franquia, em relação a:
a) know how ou segredo de indústria a que venha a ter acesso em função da
franquia; e
b) implantação de atividade concorrente da atividade do franqueador;
XV – modelo do contrato-padrão e, se for o caso, também do pré-contrato-padrão de
franquia adotado pelo franqueador, com texto completo, inclusive dos respectivos anexos e
prazo de validade.
10. Artigo 4º: A circular oferta de franquia deverá ser entregue ao candidato a
franqueado no mínimo 10 (dez) dias antes da assinatura do contrato ou pré-contrato de
franquia ou ainda do pagamento de qualquer tipo de taxa pelo franqueado ao franqueador
ou a empresa ou pessoa ligada a este.
Parágrafo único. Na hipótese do não cumprimento do disposto no caput deste artigo, o
franqueado poderá arguir a anulabilidade do contrato e exigir devolução de todas as
quantias que já houver pago ao franqueador ou a terceiros por ele indicados, a título de taxa
de filiação e royalties, devidamente corrigidas, pela variação da remuneração básica dos
depósitos de poupança mais perdas e danos.
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devidamente corrigidas, pela variação da remuneração básica dos
depósitos de poupança mais perdas e danos. A sanção acima
mencionda aplica-se, também, ao franqueador que veicular
informações falsas na sua circular de oferta de franquia, sem
prejuízo das sanções penais cabíveis.
Há diversas decisões dos tribunais com relação à possibilidade
de anulação do contrato de franquia em razão do descumprimento
dos artigos 3º e 4º da Lei de Franquia. Em caso envolvendo
Farmacotécnica Seabra Nogueira Ltda (franqueadora) e Viva Life
Farmacia de Manipulacao Ltda. Me (franqueada), 11 o tribunal de
segunda instância 12 decidiu que as informações que devem constar
na circular de franquia são de suma importância para o negócio e
anulou o contrato em razão da não entrega da circular de oferta,
pleiteando a devolução dos valores já pagos pela franqueada.
Em outro caso envolvendo Dryclean Usa do Brasil Lavanderias
Ltda. e Next Challange Comércio, Serviços, Importação e
Exportação de Equipamentos para Lavanderia e Cozinha
Industrial
Ltda.
(franqueadoras)
e
Maurício
Lindolfo
(franqueado), 13 o juízo de segunda instância entendeu que foi
correta a sentença de primeira instância que decretou a
anulabilidade da franquia, embasado na não entrega da circular de
oferta de franquia. Sobre o assunto, o tribunal citou o seguinte
trecho do autor Claudio Vieira da Silveira:
“É evidente que o contrato de franquia empresarial é o
instrumento jurídico que vincula e disciplina de fato e de
direito
as
relações
entre
franqueador/franqueado,
estabelecendo os direitos, obrigações e encargos das partes
contratantes, mas, na constituição do contrato de franquia
empresarial, os elementos essenciais à formação das cláusulas
principais e acessórias do instrumento contratual não podem,
sob hipótese alguma, desvincularem-se da Circular de Oferta
de Franquia, na qual estão previamente estabelecidos, de forma
clara e objetiva, todos os direitos e as obrigações a serem
assumidos pelo franqueador e pelo franqueado na operação da
franquia.” 14
11. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 4ª Câmara Cível, Apelação Civil nº 001022487.2003.8.19.0001 (2007.001.59741), Rel. Des. Reinaldo P. Alberto Filho. j. 13.11.2007.
12. No Brasil, os tribunais de apelação (estaduais e federais) são divididos em painéis
ou câmaras de desembargadores, sendo um de seus membros atuando como relator, com a
atribuição de examinar o caso em detalhes e resumi-lo para os outros desembargadores, bem
como de escrever uma opinião sobre o caso, que pode ou não pode prevalecer na votação
final. O relator, agindo sozinho, também pode emitir várias decisões e remédios provisórios,
sujeitos a avaliação pela câmara/painel.
13. Tribunal de Justiça de São Paulo, 37ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível Nº
0209114-24.2010.8.26.0100.
14. SILVEIRA, Claudio Vieira da in Franchising Guia Prático, Ed. Juruá, 2ª edição,
pág. 275.
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Os litígios envolvendo a circular de oferta de franquia não se
referem tão somente à entrega da referida circular, mas também à
entrega correta de todas as suas informações. É o que demonstra o
caso envolvendo o Curso Mais Estudo Individualizado Ltda. Me
(franqueadora) e Rosenilda Magnavita Lyro (franqueada), 15 em
que decidiu-se, em sede de apelação, pela nulidade do contrato em
razão de demonstrar descumprimento da circular de oferta de
franquia no que se refere ao prazo de entrega do material
necessário às atividades da franquia (curso) e quanto à
metodologia. O tribunal entendeu que a franqueada teve razão em
sua pretensão de anulação do contrato e exigência da devolução
das quantias pagas, eis que restou incontroverso que a informação
contida na circular quanto à metodologia do curso não
correspondeu à metodologia efetivamente descrita na circular.
No caso envolvendo a empresa De Plá e Agauphoto
Ltd.(franqueadora) e Alvaro Dias Campelo Borges e outros
(franqueado) 16, o juízo de segunda instância entendeu que foi
correta a sentença de primeira instância que decretou a rescisão do
contrato de franquia por força da circular de oferta de franquia
omissa, ferindo frontalmente a boa-fé e o dever de lealdade.
Segundo acórdão, a circular estava omissa quanto aos gastos
imprescindíveis à instalação e operação do estabelecimento.
Verifica-se, contudo, que nem todas as decisões com relação à
circular são favoráveis ao franqueado. Em alguns casos analisados,
há o entendimento de que a ausência da apresentação de circular
de oferta de franquia não seria motivo para anular o respectivo
contrato, uma vez que outros fatos levaram ao entendimento de
que o franqueado estava ciente dos riscos inerentes do negócio. Em
apelação envolvendo Ivan Lascaleia Pinheiro e Suellen Borges
Pinheiro (franqueados) e Emagrecentro Franchising Ltda.
(franqueadora), 17 os franqueados alegaram que a franqueadora não
apresentou a circular de oferta de franquia, impedindo-os de
mensurar os riscos do negócio, principalmente por serem leigos no
ramo de estética, saúde e beleza. O juízo de segunda instância
entendeu que a ausência da circular de oferta não foi um obstáculo
para a implementação do negócio, que já estava em operação há
oito meses, sem nunca ter solicitado a circular e por já ter acesso à
informação relevante pelo manual de franquia. 18
15. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro 6ª Câmara Cível, Apelação Cível nº 002209141.2008.8.19.0021, Rel. Des. Pedro Freire Raguenet, j. 08.02.2012.
16. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 18ª Câmara Cível, Apelação Cível nº
2008.001.48433, Rel. Des. Célia Meliga Pessoa, j. 30.09.2008.
17. Tribunal de Justiça de São Paulo, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial,
Apelação Cível nº. 0037482-94.2008.8.26.0068, j. 09.12.2013.
18. Segundo o acórdão, “[n]ão resta dúvida que a circular de oferta é uma importante
garantia ao franqueado e, sem sombra de dúvida, deve ser observada pelo franqueador.
Todavia, a reclamação acerca da alegada falta de apresentação da ‘circular de oferta’ deveria
ter sido apresentada antes do início das atividades, principalmente porque, em contratos
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Decisão similar foi proferida pela Câmara Reservada de
Direito Empresarial de São Paulo. No caso envolvendo Unicelli
Comércio e Locação de Espaços Destinados a Serviços de Beleza
Ltda. (franqueado) e Fazane Espaço Destinado a Serviço de Beleza
S/S Ltda.(franqueador) 19, o juízo de segunda instância entendeu
que a anulação da franquia com fundamento no artigo 4º,
parágrafo único, da Lei de Franquia, depende do apontamento do
nexo de causalidade entre a omissão do franqueador e o prejuízo
alegado pelo franqueado. De acordo com o tribunal, a não entrega
da circular de oferta, sem qualquer evidência de prejuízo ao
franqueado, não pode autorizar a anulação do contrato,
especialmente após a sua execução. 20
B. Questões Marcárias nos Contratos de Franquia
O contrato de franquia inclui, dentre outros, o direito de uso
da marca do franqueador. Neste sentido, a marca obviamente
exerce um papel relevante no sistema de franquia, a partir do
momento que identifica o negócio do franqueado e uniformiza os
conceitos da marca, para assegurar harmonia da rede de
franquias. Em razão da importância da marca, é muito comum
litígios envolvendo direito marcário entre franqueador e
franqueado. Em ações comuns desse tipo - como as atividades de
(a) registro da marca; e (b) uso da marca após o término do
contrato – as decisões tendem a favorecer o seu titular frente aos
franqueados.
1. Depósito x Registro da Marca no INPI
Diante da eventual demora que pode ocorrer no processo de
concessão de registro de uma marca perante o Instituto Nacional
da Propriedade Industrial - INPI, muitas vezes o franqueador
dessa natureza, há presunção de que as partes estão em igualdades de condições para
celebrar o negócio, ainda considerando que os pactos sejam redigidos com cláusulas
padronizadas.” E, ainda, complementa: “Mesmo diante da ausência da apresentação da
‘circular de oferta’, forçoso reconhecer que tal fato não foi obstáculo ao implemento do
negócio, isto é, puderam os autores estabelecerem-se como franqueados e exercer
integralmente seu comércio (negócio), e o insucesso na empreita dos autores não pode ser
atribuído à omissão alegada. De outro lado, o contrato foi mantido por aproximadamente 08
meses, e em nenhum momento é possível verificar tenham os autores solicitado à ré ou
reclamado a ausência da circular mencionada. Os autores também não negam que tenham
tido acesso ao manual do franqueado, documento que traz as necessárias e devidas
orientação sobre a franquia.” Foi negado provimento ao recurso apresentado pelos
apelantes.
19. Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação Cível nº 0207083-65.2009.8.26.0100,
Rel. Des. Pereira Calças, j. 11.10.2011.
20. Vide caso envolvendo Luis Fernando Dos Reis (franqueado) e Vaz e Athena Gabriel
Vaz - ME. (franqueadora) - Tribunal de Justiça de São Paulo, 1ª Câmara Reservada de
Direito Empresarial de Franca, Apelação Cível nº 0030252-34.2010.8.26.0196 Rel: Teixeira
Leite,. j. 29.08.2013.
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licencia sua marca sem que esta esteja devidamente registrada
perante o INPI, mas tão somente em processo de registro. Os
franqueados, em alguns casos, alegam que o franqueador violou o
contrato por não obter o registro da marca, cuja demanda é, na
maioria das vezes, rejeitada pelos tribunais.
No julgado envolvendo Flavio Rezende Leite - Me, VRF
Comércio de Software, Treinamento e Capacitação de Recursos
Humanos (franqueado-apelante) e Compsul Brasil Livros e
Consultoria Ltda. (franqueadora), 21 por exemplo, o franqueado
pleiteava o término do contrato alegando, dentre outras questões,
que a franqueadora não detinha o registro da sua marca. O
tribunal negou a apelação, alegando que o depósito da marca era
suficiente para permitir o uso da marca pelo franqueado:
“(...) Assim é que, por exemplo, as inúmeras (e bem feitas)
laudas produzidas para diferenciar depósito e registro de
marca, bem como para procurar demonstrar a inviabilização
da averbação de transferência, não infirmam que, com o mero
depósito já é possível o uso da marca, que é o aspecto
fundamental a ser salientado. Quanto ao seu uso, os artigos
130 22 e 139 23 da lei 9279/96 (Lei de Propriedade Industrial)
tornam clara sua possibilidade legal.Assim, a alegada violação
do contrato não encontra-se presente.”
O registro de marca também foi discutido em acórdão
envolvendo Carinho do Pé Podólogos Ltda. (franqueada) e Spé o
Spa do Pé Comercial Franchising Internacional Ltda.
(franqueadora). A Franqueada pleiteava a nulidade do contrato de
franquia pelo fato de a franqueadora não ser detentora do registro
da marca. Na época da franquia, a marca encontrava-se depositada
perante o INPI. O juízo de segunda instância entendeu que o artigo
130, II da Lei de Propriedade Industrial permite a franqueadora
licenciar seu uso antes da concessão do registro de sua marca. 24
Outro caso levado a juízo relacionado à marca tratou dos
efeitos de uma subsequente decisão de indeferimento do pedido de
registro da marca pelo INPI. Essa questão foi tratada em caso
envolvendo G 40 Educação e Treinamento Ltda (franqueada) e
21. Tribunal de Justiça de São Paulo, 11ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº
9053158-07.2006.8.26.0000, Rel. Des. Soares Levada, j. 26.09.2010, v.u.
22. Artigo 130: Ao titular da marca ou ao depositante é ainda assegurado o direito de: I
- ceder seu registro ou pedido de registro; II - licenciar seu uso; III - zelar pela sua
integridade material ou reputação.
23. Artigo 139: O titular de registro ou o depositante de pedido de registro poderá
celebrar contrato de licença para uso da marca, sem prejuízo de seu direito de exercer
controle efetivo sobre as especificações, natureza e qualidade dos respectivos produtos ou
serviços.
24. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 15ª Câmara Cível, Apelação Cível nº
2005.001.21114, Rel. Des. Ricardo Rodrigues Cardozo.
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Projeta Cursos e Franquias Ltda. (franqueadora), 25 em que a
franqueada solicitava antecipação de tutela para o término dos
contratos de franquia firmados com a franqueadora alegando que a
franqueadora teve indeferido o seu pedido de registro da marca
PROJETA perante o INPI (fato não comunicado aos franqueados).
O juízo de segunda instância, seguindo a decisão do juízo de
primeira instância, entendeu que os fatos narrados e vícios
indicados pela franqueada dependem de prova idônea, a ser
produzida sob o crivo do contraditório. Segundo o acórdão, não
basta o simples extrato de situação do registro marcário perante o
INPI (ainda que indique o indeferimento do registro), para que o
contrato de franquia se torne inexequível. A despeito do referido
contrato ter regência de lei especial, a ele se aplicam no que for
compatível às regras gerais previstas no Código Civil, assim como o
princípio da continuidade dos contratos, podendo a vontade dos
contratantes externada no consenso obtido quando da assinatura
do contrato de franquia, se for o caso, encontrar caminho
alternativo que propicie continuidade. Em suma, não houve a
prova inequívoca que convença da verossimilhança das alegações
da autora, requisito sem o qual não é possível a antecipação de
tutela pretendida nesta demanda.
2. Abstenção do Uso de Marca Após o Fim do Contrato
Outro recorrente assunto relacionado à marca diz respeito ao
direito do franqueador de obrigar que o antigo franqueado cesse o
uso de sua marca. Mesmo com o término do contrato de franquia,
alguns franqueados permanecem praticando atividade no mesmo
ponto comercial com a marca do franqueador, mesmo sendo
proibidos contratualmente de tal uso. De forma não surpreendente,
os tribunais não são favoráveis ao uso da marca após o término do
contrato e geralmente deferem medidas no sentido de proibir tal
prática. A título exemplificativo, em caso envolvendo Mundo Verde
Franquia Ltda. (franqueador) e C&G Produtos Naturais Ltda.
(franqueado), 26 o juízo de segunda instância concluiu que houve
utilização indevida da marca, sendo requerida a paralisação das
atividades da ex-franqueada. No caso envolvendo Maxcenter
Distribuidora Comércio e Representações Ltda.(franqueadora) e
Farmácia PH Ltda. (franqueada), 27 o juízo de segunda instância
manteve medida liminar do juízo a quo proibindo a franqueada de
uso da marca PADRÃO até a decisão final de mérito, reconhecendo
25. Tribunal de Justiça de São Paulo, 2ª Câmara de Direito Empresarial, Agravo de
Instrumento nº 0016714-84.2013.8.26.0000, Rel. Des. José Reynaldo, j. 01.07.2013, v.u.
26. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 5ª Câmara Cível, Apelação Cível nº
2009.001.20666, Rel. Des. Cristina Tereza Gaulia, j. 16.06.2009.
27. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 5ª Câmara Cível, Apelação Cível nº 000943948.2005.8.19.0004, Rel. Des. Zelia Maria Machado, j. 07.12.2010.
Vol. 105 TMR
1223
que, além do uso indevido da marca, o antigo franqueado estava
induzindo os consumidores a erro.
De forma análoga, em agravo de instrumento interposto por
Original Brasil Comércio e Serviços de Telecomunicações Ltda.
(franqueada) envolvendo Telemar Norte Leste S.A e outro
(franqueadora), 28 foi mantida decisão do juízo a quo a fim de que a
franqueada se abstivesse do uso da marca comercial da
franqueadora em razão do término do contrato. Em uma disputa
envolvendo sistema de telefonia, TNL PCS S.A (franqueadora)
processou Longitude Comércio e Serviços de Telecomunicações
Ltda. (franqueada) 29 para compelir esta a cessar imediatamente o
uso das suas marcas e de outros sinais. Apesar da decisão de
primeiro grau desfavorável, foi dado provimento ao recurso da
franqueadora, pois se entendeu que, ainda que pairem
controvérsias de ambas as partes pendentes de apreciação judicial,
o contrato de franquia foi rescindido em razão de infração
contratual da franqueada, tendo a franqueadora direito prima
facie de impedir o uso de seu nome, marca e outros sinais.
Um último caso relevante sobre esse assunto envolve Mc
Donald’s Comércio de Alimentos Ltda. e outros (agravantefranqueadora) e Food Land Comércio de Alimentos Ltda.
(agravado-franqueada). 30 A franqueadora argumentou que a
infração da franqueada pelo não pagamento das taxas de serviço
constituiria infração grave e, assim, o contrato deveria ser
rescindido. O juízo de segunda instância manteve decisão visando
a impedir que o franqueado continuasse usando a marca MCDONALD'S.
C. Inexistência de Relação de Consumo entre
Franqueador e Franqueado
Outro assunto de franquia recorrente nos tribunais se refere à
aplicação do Código de Defesa do Consumidor (“CDC,” Lei nº 8.078
de 1990) nas transações entre franqueador e franqueado. O CDC é
aplicável sempre que o indivíduo – pessoa física ou jurídica – for
considerado um destinatário final dos serviços contratados ou
produtos adquiridos. 31 O CDC estabelece princípios legais e
exigências aplicáveis às relações de consumo no Brasil a respeito
da responsabilidade pelo produto ou serviço, as cláusulas
28. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 4ª Câmara Cível, Agravo de Instrumento nº
2009.002.30229, Rel. Des. Sidney Hartung, j. 09.03.2010.
29. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 18ª Câmara Cível, Agravo de Instrumento nº
2009.002.28363, Rel. Des. Leila Albuquerque, j. 19.01.2010, v.u.
30. Tribunal de Justiça de São Paulo, 23ª Câmara de Direito Privado, Agravo de
Instrumento nº 0023454-39.2005.8.26.0000, Rel. Des. José Marcos Marrone, j. 09.11.2005.
31. Artigo 2°: Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza
produto ou serviço como destinatário final.
1224
Vol. 105 TMR
contratuais,
práticas
comerciais,
publicidade
enganosa,
procedimentos civis para demandas individuais e coletivas,
incluindo ações de classe, bem como sanções administrativas e
penais. O principal objetivo do CDC é restabelecer o equilíbrio em
uma relação com o consumidor, que se presume ser naturalmente
desequilibrada. Assim, o código foi focado na proteção do
consumidor e fornece uma proteção muito mais ampla para o
destinatário dos serviços ou produtos do que o Código Civil.
A determinação se um contrato será regido ou não com base no
CDC é muito controvertida no Brasil. No entanto, com relação aos
contratos de franquia, há o entendimento jurisprudencial
majoritário de que esses contratos não estão sujeitos ao CDC. Esse
entendimento está refletido em decisão do STJ envolvendo Oebax
Vestuário Ltda. e outros (recorrente) e Colcci Indústria e Comércio
do Vestuário Ltda. (recorrida), tendo sido decidido que o “contrato
de franquia, por sua natureza, não está sujeito no âmbito de
incidência da Lei nº 8.078/1990, eis que o franqueado não é
consumidor de produtos ou serviços da franqueadora, mas aquele
que os comercializa junto a terceiros, estes sim, destinatários
finais.” 32 Na mesma linha, a decisão do STJ envolvendo Banco Alfa
De Investimentos S/A (recorrente) e Cuiabá Produtos Automotivos
Ltda. (recorrido) 33 entendeu que é inaplicável o CDC ao contrato de
franquia, não se acolhendo a alegação de abusividade da cláusula
de eleição de foro ao só argumento de tratar-se de contrato de
adesão. 34
Outra decisão emblemática do Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul, que discorre sobre contrato de franquia para a
comercialização de produtos derivados de petróleo, entendeu que
“não se caracteriza a autora como consumidora, por se utilizar dos
produtos disponibilizados da ré como meio para sua atividade
empresarial e lucrativa, e não como destinatária final.” O tribunal
alegou que, apesar de o contrato de franquia ser um contrato de
adesão por natureza, mitigando a autonomia da vontade, esse não
conduz à sua nulidade, justamente porque a delimitação vertical
das diretrizes contratuais tem como escopo único a garantia do
sucesso do empreendimento franqueado. 35
32. RESP 632958/AL, Rel Des. Min. Aldir Passarinho Junior, j. 04.03.2010.
33. RESP 930.875, rel. Sidnei Beneti. J. 14.06.2011.
34. Os contratos que regem a relação entre consumidor e fornecedor são geralmente
considerados como contratos de adesão. Segundo a lei, o contrato de adesão é aquele cujas
cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas
unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem possibilidade de negociação
(GOMES, Orlando, Contratos. Ed. Forense, 2002, pg. 109).
35. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul 18ª Câmara Cível, Apelação Cível nº
70031345077, Rel. Des. Pedro Celso Dal Pra, DJ 10.09.2009.
Vol. 105 TMR
1225
D. Possibilidade ou Não de Responsabilidade
Solidária em Processos de Direito do Consumidor
A possibilidade de responsabilidade solidária do franqueador
perante o consumidor final por atos imputáveis aos franqueados
também é um tema usual nas disputas envolvendo franquia. Em
caso envolvendo a Wizard Brasil Livros e Consultoria Ltda.
(franqueadora/agravante) e Vanessa Cristina Oliva (agravada), 36 o
tribunal de segunda instância entendeu pela manutenção da
decisão do juízo de primeira instância que deferiu liminar
determinando que a franqueadora não praticasse quaisquer atos
que levassem o nome da agravada ao banco de dados dos órgãos de
proteção ao crédito. A franqueadora alega que a pessoa jurídica
que, aparentemente, protestou de maneira indevida os títulos de
crédito foi a sua ex-franqueada, não estando a franqueada sujeita a
tal liminar. A franqueadora alegou, ainda, que não possui poderes
gerenciais sobre os seus franqueados e que, além de ter rescindido
o contrato com a empresa, desconhece o seu paradeiro.
Segundo o julgado, as medidas de padronização do
estabelecimento, típicas do franchinsing faz com que o consumidor
não distinga, com clareza, a divisa entre as duas empresas, em que
uma aparenta ser a outra. Portanto, a franqueadora tem a
aparência de fornecedora do serviço, pois coloca a sua marca e
sinais distintivos, bem como promove publicidade naquilo que é
oferecido ao consumidor, aplicando-se, assim, a teoria da
aparência. 37 Nesse sentido, foi entendido que a agravante é a
fornecedora aparente do serviço, de acordo com o disposto nos
artigos 3°, 38 12 39 e 14 40 do CDC. Acrescenta-se que essa
interpretação é razoável dada a vulnerabilidade do consumidor na
relação de consumo, conforme prescreve o princípio contido no
36. Tribunal de Justiça de São Paulo, 18ª CDPri, Agravo de Instrumento nº 031883092.2010.8.26.0000, Rel. Des. Rubens Cury, j. 13.10.2010, v.u.
37. Aplica-se a teoria da aparência e a doutrina do disregard na hipótese de duas
empresas apresentarem-se ao público e à clientela como uma única empresa, ainda que do
ponto de vista técnico-jurídico sejam pessoas jurídicas distintas, não se confundindo.
38. Artigo 3°: Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional
ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de
produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação,
distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
39. Artigo 12: O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o
importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos
danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção,
montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos,
bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
40. Artigo 14: O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de
culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à
prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua
fruição e riscos.
1226
Vol. 105 TMR
artigo 4°, I do referido Código. 41 Dessa forma, o franqueador foi
considerado solidariamente responsável em conjunto com a
franqueada pela conduta da franqueada.
Em outro caso envolvendo Wizard Brasil Livros e Consultoria
Ltda., Cwm Consultoria e Participações Ltda. (agravante) e
Vanessa Cristina Oliva (agravada), 42 também decidiu-se pela
incidência da teoria da aparência e a doutrina do disregard, 43
alegando que franqueador e franqueado aparentam ser uma única
empresa, mesmo que, sob o aspecto técnico-jurídico, tratem-se de
pessoas jurídicas distintas e que não se confundam entre si. Nesse
sentido, entendeu-se pela responsabilidade solidária entre
franqueador e franqueado quanto a danos por este causados ao
consumidor.
Por outro lado, quando uma relação entre franqueador e
franquia é divulgada à parte lesada, há decisão no sentido de
rejeitar a responsabilidade solidária. Em ação de indenização por
danos morais ajuizada por Vanildo Chuma (autor-apelante) contra
Hoken International Company Ltda. (franqueadora) e Paulo César
Rondon (vendedor vinculado à Hoken), em decorrência da inserção
indevida de seu nome nos cadastros dos órgãos de proteção ao
crédito, a sentença julgou improcedente o pedido com relação à
Hoken e parcialmente procedente com relação ao co-réu Paulo
César, condenando-o ao pagamento de indenização por danos
morais. O juízo de segunda instância entendeu que a empresa
Hoken não pode ser responsabilizada. Segundo o relator, a referida
empresa é a fabricante do produto (filtro de água) adquirido pelo
apelante e que no pedido de aquisição consta o número do seu
Serviço de Atendimento ao Consumidor. Contudo, no mesmo
documento, consta que a empresa vendedora (Água & Saúde, de
propriedade do co-réu Paulo César), ostenta a qualidade de
“franquia independente Hoken,” de forma que não há como
imputar à franqueadora a responsabilidade pelos prejuízos sofridos
pelo autor-apelante. 44
41. Artigo 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o
atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e
segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida,
bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes
princípios:
I- reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo.
42. Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Apelação Cível n° 2000.014832- 6, Rel. Des.
Trindade dos Santos, j . 08.04.2009
43. Aplica-se a teoria da aparência e a doutrina do disregard na hipótese de duas
empresas apresentarem-se ao público e à clientela como uma única empresa, ainda que do
ponto de vista técnico-jurídico sejam pessoas jurídicas distintas, não se confundindo.
44. Tribunal de Justiça de São Paulo, 16ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível n°
9152542-06.2007.8.26.0000, Rel. Des. Windor Santos, j. 03.08.2010, v.u.
Vol. 105 TMR
1227
E. Exequibilidade das Cláusulas de Eleição de Foro
Disputas em relação à eficácia da eleição de foro também
surgem com certa frequência em contratos de franquia, sendo que
o foro selecionado pelo franqueador é usualmente considerado
válido. Segundo artigo 111 do Código de Processo Civil e seus
parágrafos, a competência em razão da matéria e da hierarquia é
inderrogável por convenção das partes; mas essas podem modificar
a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde
serão propostas as ações oriundas de direitos e obrigações. A
eleição de foro deve estar claramente expressa no contrato. A Lei
de Franquia não traz qualquer regulamentação específica a
respeito da eleição de foro, não havendo, a princípio, qualquer
impeditivo para as partes convencionarem livremente o foro
competente para resolver as controvérsias surgidas com relação
aos seus direitos e obrigações. No entanto, é muito comum que os
franqueados aleguem que o negócio jurídico celebrado é do tipo de
um contrato de adesão e, diante da hipossuficiência dos
franqueados, haveria um cerceamento na defesa dos mesmos e
abusividade da outra parte em razão da eleição do foro.
É possível se deparar com vários julgados que discorrem sobre
a questão da eleição de foro e, na maioria das decisões
encontradas, prevalece o entendimento dos tribunais de que a
cláusula de eleição de foro é válida, sendo necessário privilegiar o
princípio pacta sunt servanda (incidência do artigo 111 do CPC), 45
sendo imprescindível que haja a constatação do cerceamento de
defesa e hipossuficiência do aderente para sua inaplicação. 46
O vulto econômico em torno do valor contratual e o
esclarecimento/conhecimento do franqueado também são fatores
citados em determinadas decisões para fins de análise da aplicação
ou não da cláusula de eleição de foro, como é o caso da decisão do
tribunal de São Paulo envolvendo Private Business Fashion Hair
Franchising S/c Ltda. (agravante) e Helio Ricardo Rodrigues
(agravado) 47, que constatou que a cláusula de eleição de foro não se
afigura abusiva porque não se presta a inviabilizar ou criar
especial dificuldade de acesso da parte ao Judiciário, inexistindo a
hipossuficiência do franqueado em virtude do vulto econômico do
negócio e do tamanho das partes. Em outro caso envolvendo Mister
S. Comércio Empreendimentos e Administração Ltda. (agravante)
e Cabana Comida Árabe Ltda. (agravado), também se entendeu
pela validade da cláusula de eleição de foro em razão do negócio
45. RESP 765171/SE, Rel. Min. Jorge Scartezzini, j. 11.10.2005.
46. RESP 545.575/RJ, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, j. 28.10.2013.
47. Tribunal de Justiça de São Paulo, 19ª Câmara de Direito Privado, Agravo de
Instrumento nº 0005437-81.2007.8.26.0000, Rel. Des. João Camillo de Almeira Prado Costa,
j. 27.03.2007.
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Vol. 105 TMR
jurídico de vulto, não sendo demonstrada a hipossuficiência da
cláusula contratual. 48
A decisão do STJ envolvendo Lubrifiltros Representações
Peças e Lubrificantes Ltda. e outros (recorrido) e Shell Brasil S/A e
outro (recorrente) 49 ilustra a necessidade de se verificar a
capacidade dos litigantes. Nesse caso, as partes foram
consideradas suficientemente capazes sob a ótica financeira, legal
e técnica para pleitearem na justiça em qualquer foro
voluntariamente acordado 50. Por outro lado, em decisão do STJ
envolvendo Carlos Henrique Lagemann e Kinder Informática Ltda.
(recorrente) e Futurekids do Brasil - Serviço e Comércio Ltda.
(recorrido), o STJ entendeu que, em contrato de adesão,
unilateralmente elaborado pela franqueadora, que impõe todas as
cláusulas que regem a relação com o franqueado, a cláusula de
eleição de foro foi considerada abusiva por força disso, pois
afirmada nos autos a impossibilidade do franqueado de efetuar
regular defesa no juízo contratualmente eleito, ressaltado o alto
poder econômico da franqueadora em comparação com a situação
do franqueado. 51
Diante da análise das decisões coletadas, pode-se dizer que a
questão da eleição de foro deve ser analisada com base no caso
concreto, prevalecendo o entendimento de que a cláusula de eleição
de foro é válida, desde que não tenha sido reconhecida a
hipossuficiência de uma das partes ou embaraço ao acesso da
justiça. 52
48. Tribunal de Justiça de São Paulo, 23ª Câmara de Direito Privado, Agravo de
Instrumento nº 0412359-68.2010.8.26.0000, Rel. Des. José Marcos Marrone, j. 01.12.2012.
49. RESP 813481/DF, Min. Massami Uyeda, j. 11.03.2008.
50. A decisão ressaltou o que se segue: “levando-se em conta os expressivos valores
pactuados no contrato de franquia sub judice e a não demonstração de inviabilização do
acesso ao Poder Judiciário, uma vez que o fato isolado da empresa-recorrida não se
encontrar em atividade, em virtude da rescisão ora discutida, não é suficiente para
considerar inviável a defesa de seus direitos no foro contratado, tem-se que as empresas ora
litigantes, são suficientemente capazes, sob o enfoque financeiro, jurídico e técnico, para
demanda em qualquer comarca que, voluntariamente, assim contrite.”
51. Conflito de Competência 32877/SP, REL. Min. Carlos Alberto Menezes direito, DJ
26.02.2003.
52. Com relação à eleição de foro em contratos celebrados com parte estrangeira e um
franqueado local, a Lei de Introdução ao Código Civil, em seu artigo 12, prevê que é
competente a autoridade judiciária brasileira quando for o réu domiciliado no Brasil ou aqui
tiver de ser cumprida a obrigação. Nesse caso, não há um caso absoluto de competência
como nos casos relativos a imóveis situados no Brasil, mas aqui é estabelecida uma
concorrência relativa para os tribunais locais que decidirão, a seu critério, se são
competentes para analisar o caso. O Código de Processo Civil ainda estabelece que:
Art. 88. É competente a autoridade judiciária brasileira quando:
I - o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;
II - no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;
III - a ação se originar de fato ocorrido ou de ato praticado no Brasil.
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1229
F. Inexistência de Garantia Quanto à Lucratividade
É comum pleito dos franqueados imputando aos franqueadores
a culpa pelo insucesso do negócio. Em muitos dos casos analisados,
entendeu-se que o contrato de franquia é um negócio de risco e, em
tese, não há caracterização da responsabilidade do franqueador
pelos prejuízos do franqueado, desde que o franqueador não tenha
afirmativamente contribuído para o insucesso do negócio. A
decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul ilustra o
exposto ao afirmar que, “[o] contrato de franquia é negócio de risco,
mediante o qual há um investimento pelo franqueado visando à
expectativa de lucro, com base nas projeções de mercado, cabendolhe gerir de forma responsável o empreendimento, para que não
resulte com prejuízo.” Neste caso, concluiu-se dos autos que a
demandante não teve sucesso em seu empreendimento comercial,
provavelmente por deficiência de sua administração, como sugere o
relatório de visita da empresa franqueadora. 53
Em outro caso envolvendo a franquia da loja com marca DOM
SABOR, o franqueado pleiteou a rescisão do contrato após 3 meses
de funcionamento, alegando que a franqueadora descumpriu as
obrigações assumidas no contrato por não prestar assistência ao
franqueado. O juízo de segunda instância entendeu que a
devolução da taxa de franquia seria indevida, pois não houve prova
nesse sentido e o período em que o estabelecimento permaneceu
aberto (3 meses) foi exíguo para formação de clientela e retorno de
investimento. 54
O mesmo entendimento foi demonstrado na apelação
envolvendo Marines Atolini de Oliveira (apelante) e Hai
Franchising Ltda. (apelado), em que foi decidido pela inexistência
de promessa de garantia quanto a resultados ou rentabilidades do
negócio. 55 Em caso envolvendo a franquia CURVES, foi entendido
que a J Assessoria Consultoria e Comércio de Artigos Desportivos
Ltda. (franqueadora) não prestou o assessoramento devido à
franqueada (Carla Walzertudes de Liama e outros), sendo este um
motivo relevante para o encerramento do empreendimento. No
entanto, o juízo de segunda instância decidiu que o insucesso do
empreendimento não pode ser imputado exclusivamente à
Alguns doutrinadores e jurisprudência entendem que, em razão das disposições do artigo 88
do Código de Processo Civil, a jurisdição brasileira não pode ser afastada pela vontade das
partes. Assim, caso as partes não tenham interesse em resolver eventual disputa nos
tribunais brasileiros, a arbitragem seria uma alternativa.
53. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 10ª Câmara Cível, Apelação Cível nº
70037569613, Rel. Des. Túlio de Oliveira Martins, j. 26.08.2010.
54. Tribunal de Justiça de São Paulo, 37ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº
0051430-12.2005.8.26.0100, Rel. Irineu Fava, j. 14.06.2012.
55. Tribunal de Justiça de São Paulo, 13ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº
9140805-69.2008.8.26.0000, Rel.: Heraldo de Oliveira, j. 11.02.2009.
1230
Vol. 105 TMR
franqueadora, uma vez que ambos os contratantes não cumpriram
algumas obrigações assumidas. 56
G. Exequibilidade das Cláusulas de Não Concorrência
Outra área de constante litígio entre franqueadores e
franqueados diz respeito à validade/exequibilidade das cláusulas
de não concorrência após o término contratual. O princípio da livre
concorrência é previsto na Constituição Federal, não podendo,
contudo, ser considerado absoluto e devendo ser analisado sob a
ótica dos demais princípios constitucionais, inclusive diante da
concorrência desleal e abuso de poder. Segundo o renomado autor
Fábio Ulhoa Coelho: 57
“Ao direito constitucional de explorar atividade econômica,
expresso no princípio da livre iniciativa como fundamento da
organização da economia, corresponde o dever, imposto a todos,
de o respeitar. Em relação ao estado, esse dever se traduz na
inconstitucionalidade de exigências administrativas não
fundadas na lei, para o estabelecimento e funcionamento de
uma empresa (art. 170, parágrafo único da CF). Em relação
aos particulares, se traduz pela ilicitude de determinadas
práticas concorrenciais. Por ilícita conceituou todas as formas
de concorrência sancionadas pela lei, independentemente da
natureza civil, penal ou administrativa da sanção.”
Sobre o assunto, o autor Sidnei Amendoeira Júnior, professor
especializado em franquias, ressalta que a questão muito
importante na franquia diz respeito à necessidade da existência de
cláusulas de não concorrência de proteção do próprio sistema de
franquia e que preservem a marca e a clientela da franqueadora de
eventuais casos de concorrência desleal por parte de algum
franqueado que decida retirar-se de determinado sistema de
franquia e passar a concorrer com a franqueadora e seus
franqueados. E acrescenta que é muito comum a previsão, nesses
contratos de cláusulas, de quarentena ou de não concorrência, ou
seja, diante do fato de que a franqueadora cedeu todo seu knowhow ao franqueado não seria justo que ele, franqueado, entendendo
por bem sair daquele sistema de franquia, pudesse competir com a
franqueadora e seus franqueados, valendo-se das técnicas e
informações que a própria franqueada lhe forneceu. 58
56. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 16ª Câmara Cível, Apelação Cível nº
0002890-53.2009.8.19.0207 Des. Mauro Dickstein – j. 24.07.2012.
57. COELHO, Fábio Ulhoa, Curso de Direito Comercial, Ed. Saraiva, 4ª ed., 2000, vol.
1, p. 183.
58. AMEDOEIRA JÚNIOR, Sidnei, Principais Características dos Contratos de
Franchising, in Direito Processual Empresarial, Org. Gilberto Gomes Bruschi e outros. Ed.
Campus Jurídico, 2012, pp. 948-949.
Vol. 105 TMR
1231
Professor Denis Borges Barbosa, um dos autores mais
renomados em assuntos de franquia, ao comentar sobre as
condições de licitude de cláusulas de direito privado, cita Rubens
Requião, especialista em direito comercial, o qual afirma que o
critério para precisar a licitude de tais acordos é, em primeiro
lugar, determinar em que proporção o exercício da concorrência
pode causar dano ao outorgado. Em outras palavras, em que
proporção tal disposição é necessária para proteger o interesse do
beneficiário, sem ferir o da outra parte (e, no plano do direito
antitruste, os interesses da defesa da concorrência como um todo).
É o balanço de interesses que determina a licitude. Todas estas
considerações possibilitam configurar os requisitos de validade e
uma cláusula ou pacto em restrição à concorrência, na perspectiva
do direito. As restrições devem ser limitadas no tempo, espaço e
objeto, para subsistirem tão somente na proporção em que forem
úteis, necessárias para proteger o interesse legítimo do
beneficiário. Assim sendo, tais cláusulas e pontos teria uma função
acessória, de garantir o ajuste principal, cujo propósito não é afetar
diretamente a concorrência. 59
A legitimidade de cláusulas de não concorrência normalmente
é reconhecida em nossos tribunais. No que tange ao prazo da
obrigação de não concorrência, não há qualquer limite definido em
lei. No entanto, costuma-se utilizar o disposto no artigo 1.147 do
Código Civil como parâmetro, o qual estabelece que, “na ausência
de autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode
fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subsequentes à
transferência.” Apesar disso, nas decisões encontradas, verifica-se
que os contratos, objetos da lide, estipulam cláusulas de não
concorrência pelo período de até aproximadamente 3 anos.
Em apelação envolvendo CWM Consultoria e Participações
Ltda. (Wizard Brasil Livros e Consultoria Ltda.) e Omni Ensino de
Idiomas e Representações Comerciais Ltda.(franqueado) 60, alega o
franqueado que a exigência de “quarentena” é abusiva, ofendendo o
direito ao livre exercício da profissão ou da livre iniciativa. O juízo
de segunda instância entendeu que a vedação contratual à atuação
da franqueada na mesma área durante 24 meses subsequentes ao
término do contrato não ofende o direito ao livre exercício da
profissão ou da livre iniciativa, mas protege a franqueadora da
concorrência desleal. 61
59. Ob. Cit. p. 1083.
60. Tribunal de Justiça de São Paulo, Apelação Cível nº 0021636-35.2004.8.26.0114,
Des. Rel. Ricardo Negrão. j. 19.08.2013.
61. Segundo o acórdão, “(...) ao contratarem a franquia, os codemandantes passaram a
ter conhecimento do ‘segredo do negócio’ da franqueadora, que fizeram investimento
financeiro na obtenção do know how. Esse conhecimento foi transmitido aos franqueados,
mediante treinamento e orientação disponibilizados para aplicação do método de ensino. O
conhecimento naturalmente é agregado no ser humano. Assim, é evidente que ao continuar
operando na área a franqueada não se desfará daquele conhecimento. Assim, o período de
1232
Vol. 105 TMR
Em caso envolvendo a franqueada Databarao Edições
Culturais Ltda. e o franqueador MC Edições Culturais, 62 a
franqueada foi condenada, em primeira instância, ao pagamento
dos royalties pendentes e multa pela infração da cláusula
contratual de não concorrência. O juízo de segunda instância
reverteu a decisão, alegando que, apesar de a franqueada
continuar a se dedicar ao ensino de informática após a rescisão do
contrato, essa o fez sem a utilização da marca, produtos e métodos
da franqueadora. Os desembargadores entenderam, ainda, que não
foi comprovado o prejuízo da franqueadora, não tendo sido
evidenciada hipótese de concorrência desleal.
Ainda sobre a questão da concorrência desleal, o referido
acórdão menciona que a cláusula de não concorrência, em
princípio, afigura-se válida, na medida em que visa a afastar a
concorrência desleal por parte de franqueados com a indevida
utilização do know-how que tenham adquirido do franqueador no
cumprimento do contrato. Por isso e por ser limitada a certo
período (três anos após a rescisão do contrato), não se poderia dizer
que implicaria em ofensa ao artigo 170 da Constituição Federal.
Entretanto, nesse caso específico, as provas constantes dos autos
indicam violação por ambas as partes, notadamente pela falha da
franqueada em controlar a invasão de território entre as demais
franqueadas, bem como por impor-lhe exigências descabidas para
adquirir licenças de uso de softwares e promover a cobrança de
valores relativos à propaganda e marketing em desacordo com o
previsto em contrato. Além disso, o simples fato de continuarem a
promover esta atividade não implica por si só em concorrência
desleal à demandante, mormente tendo-se em vista a proliferação
dos cursos de informática, além de considerar que os equipamentos
e conhecimentos necessários para o desempenho desta atividade
também podem ser adquiridos livremente por quem esteja
interessado em dedicar-se a este ramo de negócio, com ou sem
franquia.Portanto, não houve concorrência desleal que justificasse
a aplicação da multa.
Em caso envolvendo uma rede de fast food, o STJ manteve
decisão do tribunal paulista que condenou a sociedade Jack
Alimentos e Medicamentos Ltda. (franqueada) a indenizar, por
danos morais, a Bob’s Indústria e Comércio Ltda. (franqueadora) 63
pela infração ao contrato no que tange à obrigação de não atuar no
negócio explorado pelo período de 18 meses após o término do
interdição exclusivamente para a área afeta ao objeto da franquia é legalmente permitido,
tal como se dá no trespasse de estabelecimento empresarial. Trata-se de um período de
desvinculação do empreendedor da atividade empresarial, visando proteger aquele que
investiu na consolidação da marca e da franquia.”
62. Tribunal de Justiça de São Paulo, 14ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº
9107862-38.2004.8.26.0000, Rel. Des. Thiago de Siqueira, j. 09.12.2009.
63. RESP nº 818.799 - SP (2006/0010714-6), Rel. Ministro Castro Filho.
Vol. 105 TMR
1233
contrato. Neste caso, foi mantida a indenização por danos morais,
mas negado o pedido de indenização por danos materiais, uma vez
que a franqueada não continuou a operar 'como se Bob's fosse', ao
contrário, extraiu as insígnias respectivas e substituiu os cardápio
e outras indicações, sendo que os consumidores não seriam levados
a erro em eventual relação com o Bob’s pelo simples fato de operar
um restaurante vendendo produtos similares.
Em razão da demora na resolução dos litígios nos tribunais
brasileiros, normalmente os autores que pleiteiam a exequibilidade
da cláusula de não concorrência por meio de uma medida cautelar
geralmente sem ouvir a outra parte. A decisão de deferir ou não
essa medida também é objeto de agravo de instrumento por ambas
as partes. Na maioria dos casos, as decisões dos recursos têm sido
de rejeitar a medida cautelar pleiteada pelo franqueador com
relação à cláusula de não concorrência. Esse entendimento se
baseia na posição de que essa proibição requer o exame minucioso
dos fatos e a garantia ao princípio do contraditório diante do
prejuízo que pode ser causado ao franqueado por uma medida
injusta e diante do abuso do direito pelo franqueador.
Em agravo de instrumento contra a decisão de primeira
instância que ordenou que a agravante Incisivo Odontologia Ltda.
EPP se abstivesse de exercer atividade no ramo odontológico pelo
prazo de 2 anos em razão do término contratual, o juízo de segunda
instância entendeu que, embora haja a constitucionalidade da
cláusula contratual de não concorrência, há a necessidade de
examinar as circunstâncias do caso concreto para decidir sobre sua
eficácia e validade. O juízo de segunda instância preferiu aguardar
a instauração do contraditório antes de tomar qualquer medida de
urgência para cessar as atividades da franqueada, em vista do
prejuízo que isso poderia causar à franqueada 64.
Em agravo interno 65 interposto por Tim Celular S.A
(franqueadora) contra decisão favorável a Soares & Soares
Comércio de Telefonia Móvel Ltda. Me. (franqueado), 66 o juízo de
segunda instância decidiu contra a franqueadora por entender que
não há prova suficiente para justificar a necessidade da tutela
antecipada com relação à obrigação de não concorrência interposta
ao franqueado, sendo que eventual decisão neste sentido seria uma
medida extrema para o ex-franqueado. Segundo o acórdão, “a rigor,
o pacto da não concorrência é compatível com o ordenamento
jurídico. A validade da cláusula, contudo, deve ser averiguada
64. Tribunal de Justiça de São Paulo, Agravo de Instrumento nº 005451364.2013.8.26.0000, Rel. Des. Alexandre Marcondes, j. 21.05.2013.
65. O agravo interno, também conhecido como agravo regimental, é uma um recurso
judicial existente nos tribunais com o intuito de provocar a revisão de suas próprias
decisões.
66. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Agravo de Instrumento nº 7005501383,
Rel. Des. José Aquino Flores de Camargo. j. 18.07.2013.
1234
Vol. 105 TMR
tanto sob a ótica temporal, quanto sob a ótica da privação do
trabalho. Os efeitos da antecipação, no caso concreto, que poderiam
ser deletérios ao franqueado.” Finalmente, outra decisão abordou
questão interessante quanto à cláusula de não concorrência em
função do território. Nesse caso, o sócio do franqueado Alfredo
Capozzi Filho, em sede de recurso, sustenta nulidade da cláusula
de não concorrência estipulada em contrato firmado com 5 À Sec do
Brasil Franchising Ltda (franqueadora), 67 por inexistir limitação
territorial. O juízo de segunda instância não reconheceu qualquer
abusividade desta cláusula, mesmo sem qualquer delimitação
territorial.
H. Exclusividade e Territorialidade
A indicação com relação ao território, exclusividade ou
preferência de atuação é obrigação relacionada no artigo 3º, inciso
X(a) da Lei de Franquia, o qual estabelece que a Circular de Oferta
de Franquia deve incluir se é garantida ao franqueado
exclusividade ou preferência sobre determinado território de
atuação e, caso positivo, em que condições o faz. Os contratos de
franquia geralmente incluem um limite de atuação do franqueado,
que fica obrigado a garantir exclusividade na venda de produtos e
serviços apenas do franqueador. O franqueador, por sua vez, fica
impedido de conceder a terceiros o direito de abertura de franquias
no local combinado. Os litígios geralmente surgem com relação a
esse limite territorial.
Em acórdão envolvendo a rede de franquias de locação de
automóveis com a marca UNIDAS RENT A CAR, foi decidido que
comete infração contratual a franqueadora que, por si ou por meio
de terceiro, exerce atividade nas áreas de exclusividade da
franqueada e naquelas em que esta não exerceu o seu direito de
preferência. 68 Em caso envolvendo ação de rescisão de contrato
interposta por Maciel Braga Ltda. (franqueada), contra Sofcon
Sociedade Franchising e Consultoria Ltda. (franqueadora), a
franqueada alega possuir contratos de franquia com a
franqueadora para comercializar os produtos com a marca
L´ACQUA DI FIORI, tendo sido surpreendida com a instalação de
uma nova franquia na cidade, dentro da área restrita. O juízo de
primeiro grau julgou improcedente o pedido, ao entendimento de
que o local onde foi instalada a nova franquia situa-se fora do
67. Tribunal de Justiça de São Paulo, 14ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº
9108453-92.2007.8.26.0000, rel. Des. José Tarciso Beraldo, j. 26.03.2008.
68. Tribunal de Justiça de Santa Catarina, 3ª CDCom, Apelação Cível nº 2005.0181532, Rel. Des. Fernando Carioni, v.u., j. 15.09.2005.
Vol. 105 TMR
1235
âmbito de atuação da autora, decisão esta corroborada em segunda
instância. 69
Em ação judicial interposta por Concessionária San Marino
(franqueada) contra a San Marino (franqueadora), a franqueada
alega, dentre outros argumentos, que a franqueadora violou
cláusula de exclusividade e da lealdade na comercialização de
veículos dentro da área de atuação da requerente (Gravatái). 70 O
juízo de segunda instância confirmou a decisão de primeiro grau ao
entender que o ajuste celebrado entre as partes expressamente
previa a possibilidade de a requerida continuar vendendo veículos
para clientes residentes no território da franqueada, de sorte que a
franqueadora, ao vender veículos no referido território não violou
qualquer dever contratual, mas, tão somente, fez uso de
prerrogativa ali prevista. Em caso envolvendo Sonia Carlotti Comércio de Colchões Ltda. (autora / recorrente) e Centro de
Produção Rio Grandense de Espumas Industriais Ltda. (réu /
apelado) 71, o tribunal de segunda instância reverteu a decisão de
primeira instância, aceitando os argumentos da autora de que o
réu (franqueador de produtos de colchão) agiu de má-fé
autorizando outro franqueado a realizar a produção de feirão para
vender os produtos em uma pequena cidade em que o franqueado
possuía uma loja de franquia. Mesmo o contrato não estipulando a
exclusividade territorial naquela cidade, foi decidido pela
necessidade de proteger a expectativa legítima criada para a
autora, de uma exclusividade na pequena cidade constituindo
verdadeira afronta aos deveres de lealdade e boa fé.
Algumas decisões discorrem, ainda, sobre a própria definição
de territorialidade, como é o caso envolvendo Multi Treinamento
Ltda. (franqueadora) e Biel Treinamento Ltda. (franqueada). Nesta
hipótese, em sede de recurso, a maioria entendeu que o contrato
era vago quanto à cláusula de exclusividade, acolhendo os
argumentos da franqueada e negando provimento aos pedidos
iniciais da franqueadora. Para melhor entendimento do caso, a
cláusula contratual previa o que se segue: “o franqueado está
autorizado a estabelecer-se na cidade de Brasília em endereço que
deverá ser aprovado por escrito pela ALPS [franqueador], não
sendo permitido, em hipótese alguma, a mudança do referido
endereço sem autorização prévia da ALPS [franqueador].” Segundo
o acórdão, “não há, nessas disposições, expressa contratação
quanto aos limites territoriais da exclusividade. A verdade é que,
69. Tribunal de Justiça de Minas Gerais, 11ª Câmara Cível, Apelação Cível nº.
1.0024.09.510797-5/001 (5107975-72.2009.8.13.0024 (1)), Rel. Des. Duarte de Paula, v.u., j.
05.05.2010.
70. Tribunal de Justiça do Rio Grande do sul, 20ª Câmara Cível, Apelação Cível nº
70030664981, Rel. Des. José Aquino Flôres de Camargo, j. 14.10.2009.
71. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 9ª Câmara Cível, Apelação Cível nº.
70061266201. Rel. Des. Jurge Miguel Angelo da Silva, j. 24.09. 2014.
1236
Vol. 105 TMR
nesse ponto, o contrato é obscuro e deve ser interpretado segundo a
expressão da vontade das partes que estipularam a exclusividade
na área de atuação, incluindo nessa, especialmente os
estabelecimentos de ensino ali localizados.” Considerou-se o
perímetro urbano contado a partir do endereço aprovado para o
funcionamento da franquia. 72
I. Obrigações do Franqueador em Prestar
Assistência Ao Franqueado
A Lei de Franquia, em seu artigo 3º, determina as obrigações
que devem constar na Circular de Oferta de Franquia. Além destas
obrigações, o contrato pode livremente instituir diversas outras
para que sejam cumpridas entre as partes. Eventuais questões
envolvendo infração de obrigações contratuais do franqueador
somente podem ser avaliadas diante dos fatos e das provas
apresentadas por ambas as partes em cada situação. No entanto,
as decisões abaixo, que tratam de determinadas falhas em
obrigações em contratos de franquia, ilustram os tipos de questões
que podem surgir.
Em caso envolvendo Roberto Leonel Dubet da Silva Mouga,
Denise Monique Dubet da Silva Mouga e Quick Clean Lavanderia
Ltda. (franqueados) e 5 À Sec do Brasil Franchising Ltda.
(franqueadora), 73 foi reformada a decisão de primeira instância no
sentido de reconhecer o inadimplemento da franqueadora pela não
entrega dos equipamentos necessários para a franquia. Os
franqueados deveriam adquirir os equipamentos e demais
produtos, necessários para a instalação da unidade franqueada da
Dry Brasil Importação e Logística Ltda., uma sociedade
pertencente ao grupo da franqueadora. Os apelantes efetuaram o
pagamento antecipado. Assim, a falha na entrega dos
equipamentos constitui infração da franqueadora.
No julgado envolvendo Flavio Rezende Leite - ME, Vrf
Comércio de Software, Treinamento e Capacitação de Recursos
Humanos (franqueado-apelante) e Compsul Brasil Livros e
Consultoria Ltda (franqueadora), 74 o franqueado interpõe recurso
contra a sentença de primeiro grau que julgou improcedente a ação
alegando, dentre outras questões, que não recebeu o suporte
combinado para o desenvolvimento da atividade franqueada.
Segundo o juízo de segunda instância, não foi vislumbrado o
72. Tribunal de Justiça de São Paulo, 2ª CRDEmp, Apelação Cível nº 006917232.2010.8.26.0114, Rel. Des. Ricardo Negrão, j. 07.08.2012, v.u.
73. Tribunal de Justiça de São Paulo, 14ª Câmara de Dirito Privado, Apelação Cível nº
0016564-45.2009.8.26.0000, Rel. Des. Pedro Ablas, j. 15.09.2010, v.u.
74. Tribunal de Justiça de São Paulo, 11ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº
9053158-07.2006.8.26.0000, Rel. Des. Soares Levada, j. 26.09.2010, v.u.
Vol. 105 TMR
1237
descumprimento contratual alegado, sendo negado provimento ao
recurso. 75
Em um caso típico, o franqueador Sports Marketing Agency
S/c Ltda Sma (autor-franqueador) solicita que o franqueado Rav &
Valente s Agencia de Atividades Desportivas Ltda 76 devolva os
materiais entregues; deixe de fazer uso do sistema de franquia, das
marcas; além da alteração da fachada e layout, bem como
pagamento de multa contratual. O franqueado apelou da sentença
favorável ao franqueador insistindo na tese da exceptio non
adimpleti contractus, vez que o franqueador deixou de cumprir
suas obrigações contratuais. O juízo de segunda instância manteve
a decisão do juízo a quo por entender que há comprovação da
entrega da circular de oferta e quanto aos demais argumentos, as
alegadas obrigações descumpridas pelo franqueador (ex. ações de
marketing e publicidade da marca) apresentam caráter meramente
facultativo e não podem ser configuradas como condições
resolutivas do contrato. Segundo o julgado, não há que se falar na
aplicação da exceptio non adimpleti contractus, 77 na medida em que
o contrato objeto da lide não apresenta dependência recíproca de
prestações a serem exigíveis de forma simultânea. Ademais, não se
verificou a ocorrência de recusa por parte da autora no
cumprimento de qualquer obrigação estabelecida em contrato. Em
outro caso envolvendo Caipira Label Rouge Ltda. (franqueador apelante) e Devones de Carvalho (apelado- franqueado), foi
mantida a decisão de primeira instância condenando o franqueador
à indenização em razão dos prejuízos suportados pelo franqueado,
que deixou de prestar a devida fiscalização e assistência ao
franqueado. 78
Outra obrigação objeto de litígio diz respeito às atividades de
marketing. É muito comum que os contratos de franquia estipulem
um percentual da receita dos franqueados destinados a um fundo
de marketing gerenciado pelo franqueador. Em caso analisado,
houve questionamento do franqueado quanto à forma de uso dos
valores recebidos pela franqueadora com relação a tais verbas. De
acordo com o contrato celebrado, a franqueadora apresentava à
75. Segundo observado no julgado “o fato é que, e infelizmente, as circunstâncias todas
remetem a um mau negócio realizado pela apelante, sem que se possa concluir que o
prejuízo auferido por ela deva ser debitado à alegada má conduta da apelada - que mostra,
sim, certo amadorismo em sua assistência; novamente, porém, isto se mostra incidental e
não da essência da franquia contratada, insuficiente o fato para fixar o nexo causai entre
esta e os prejuízos alegados.”
76. Tribunal de Justiça de São Paulo, 19ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº
9089315-08.2008.8.26.0000, Rel. Des. Sebastião Junqueira, j. 03.11.2008, v.u.
77. Esse princípio está refletido no artigo 476 do Código Civil, que estabelece que “[n]os
contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode
exigir o implemento da do outro.”
78. Tribunal de Justiça de São Paulo, 11ª Câmara Cível, Apelação Cível nº 913997181.1999.8.26.0000, Rel. Des. Antonio Marson, j. 04.10.2001.
1238
Vol. 105 TMR
franqueada, quando solicitado, demonstrativo anual dos valores
por recolhidos. Segundo acórdão, “o contrato em testilha assegura
à ré, ora apelada, livre administração dos recursos recebidos pelos
pagamentos dos franqueados, bem como escolha livre dos
programas a serem realizados, sem qualquer ingerência da
franqueada, entretanto, há pedido expresso a respeito de prestação
de contas quanto aos royalties, bem como para o esclarecimento,
mediante prestação e contas, sobre possível favorecimento à loja
própria em detrimento da franqueada.” A pretensão do franqueado
foi aceita para fins de determinação da prestação de contas da
franqueadora na administração de tais recursos. 79
J. Obrigações do Franqueado de Pagamento
de Royalties
Quanto à questão do pagamento de royalties, há diversas
decisões judiciais a favor dos franqueadores no caso de
inadimplemento do franqueado no pagamento nas verbas devidas,
conforme a seguir. Em apelação interposta por Ademar Hiunes
Junior
(franqueado)
contra
Microlins
Brasil
Ltda.
(franqueadora), 80 foi confirmada a decisão da primeira instância no
que tange à rescisão do contrato e cobrança de multa, tendo sido
entendido que houve confissão de dívida firmada pelo franqueado
no que tange ao não pagamento de royalties e fundo de
propaganda. Alegação de falta de cumprimento da assessoria
técnica de marketing pelo franqueador não comprovada.
Em contrato de franquia firmado entre Silvia Mendes Moreira
(franqueado) e Kumon Instituto de Educação Ltda. 81, o franqueado
se insurgiu contra a decisão do juízo de primeiro grau com relação
à rescisão do contrato pela franqueadora. Segundo o franqueado, a
rescisão se deu de forma unilateral e desmotivada. Foi entendido,
contudo, que a rescisão contratual se operou pela inadimplência
reiterada da franqueada no pagamento de royalties, que faz parte
da própria natureza do contrato e representam a remuneração do
franqueador, autorizando o rompimento do contrato, sem qualquer
direito a indenização, pois a despeito da inadimplência, a
franqueada se beneficiou da marca e método de ensino difundidos
pela franqueadora, com a captação de cliente e recursos
necessários aos seus negócios. Por fim, em agravo de instrumento
interposto por ALESER – Participações e Negócios Ltda. contra
79. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, 13ª Câmara Cível, Apelação Cível nº
2007.001.42265, Rel. Des. Azevedo Pinto, j. 12.09.2007.
80. Tribunal de Justiça de São Paulo, 15ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº
0020890-03.2008.8.26.0576, Rel. Des. Adherbal Acquati, j. 21.09.2010.
81. Tribunal de Justiça de São Paulo, 20ª Câmara de Direito Privado, Apelação Cível nº
9199066-95.2006.8.26.0000, Rel. Des. Francisco Giaquinto, j. 23.08.2010.
Vol. 105 TMR
1239
Fast Caxias Comércio de Alimentos Ltda., 82 foi reformada a
decisão de primeiro grau e decidido pelo deferimento da
antecipação de tutela para que a ré (Fast Caxias Comércio de
Alimentos Ltda.), cessasse a utilização de qualquer elemento
identificado da marca em razão do não pagamento de royalties pela
franqueada à franqueadora.
K. Questões Fiscais – ISS (Imposto sobre Serviços)
nos Contratos de Franquia
O Brasil tem um sistema fiscal complexo, com uma vasta gama
de impostos e contribuições 83 em níveis federal, estadual e
municipal. A competência tributária dos três níveis de governo é
estabelecida principalmente pela Constituição Federal e também
pela legislação federal. A tributação no Brasil está sujeita ao
princípio da legalidade, segundo o qual nenhum imposto pode ser
estabelecido ou taxa aumentada sem um devido processo legal.
Devido à complexidade do sistema, as disputas podem surgir entre
as empresas e a administração tributária, em todos os três níveis
de governo. Disputas também pode ocorrer entre franqueadores e
franqueados com relação a quais das partes deverá ser responsável
pelo pagamento dos impostos.
A controvérsia sobre o pagamento do ISS sobre os contratos de
franquia é uma questão ainda não resolvida. A Lei Complementar
n.º 116/2003 84 contem uma lista dos serviços sujeitos ao ISS e
menciona os contratos de franquia. No Recurso Extraordinário RE
n.º 603.136/R, foi conferida repercussão geral do tema sinalizando
a relevância do assunto. 85
No entendimento do Ministro Gilmar Mendes, conforme
disposto em seu voto favorável à repercussão geral neste caso
específico, constata-se que “a lista anexa da Lei Complementar n.º
116, no item 10.04, prevê a incidência de ISS sobre contratos de
franquia. Desse modo, o afastamento da incidência do ISS sobre
82. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, 18ª Câmara Cível, Agravo de
Instrumento nº 70024534737, Rel. Des. Cláudio Augusto Rosa Lopes Nunes, j. 06.06.2008.
83. As contribuições, que só podem ser estabelecidas pelo Governo Federal, são os
impostos cujas receitas são alocadas para propósitos específicos ao invés de serem
desfinadas para o “fundo geral.” Isso porque a receita do fundo geral é constitucionalmente
sujeita a certas destinações (por exemplo: educação, saúde, divisão de receitas com os
governos estaduais e municipais), sendo que a criação de contribuições dá ao Governo
Federal maior poder discricionário de compra.
84. A lei complementar é uma lei que dispõe sobre disposições constitucionais.
85. A Repercussão Geral é um instrumento processual cujo objetivo é viabilizar que o
STF selecione os recursos extraordinários que irá analisar, de acordo com critérios de
relevância jurídica, política, social ou econômica. A utilização desse instrumento tem por
objetivo precípuo a redução do número de processos submetidos a análise do STF. Assim,
declarada a repercussão geral, o STF analisa o mérito da questão e a decisão proveniente
dessa análise será aplicada posteriormente pelas instâncias inferiores, em casos idênticos.
1240
Vol. 105 TMR
referidos
contratos
pressupõe
a
declaração
de
inconstitucionalidade dessa previsão.” 86
O principal argumento do Recurso Extraordinário é de que a
incidência do imposto sobre os contratos de franquia violam a
matriz constitucional, na qual está prevista a incidência do
imposto sobre contratos de prestação de serviço, envolvendo
somente uma obrigação do prestador fazer algo (obrigação de
fazer), em vez de envolver uma obrigação de dar.
De acordo com essa posição, os contratos de franquia são
contratos híbridos e complexos, englobando as obrigações de dar e
obrigações de fazer, sendo que o objetivo principal não é o de
prestar um serviço, conforme disposto no artigo 2º da Lei de
Franquia. O Ministro Marco Aurélio se manifesta no sentindo de
que a referida matéria deve ser julgada sobre o crivo da
repercussão geral, tendo em vista sua relevância econômica e
social, a ser verificado “se a incidência do ISS nestes contratos
atende, ou não, ao figurino constitucional do tributo, cabendo a
palavra final ao STF.” 87 Tendo em vista que esse é um assunto
controverso, que foi submetido ao instituto da repercussão geral,
apenas após a decisão do STF é que será possível confirmar a
incidência ou não do ISS nos contratos de franquia.
L. Relações Trabalhistas
Duas questões relevantes podem surgir com relação às
relações trabalhistas nos contratos de franquia: (i) existência de
responsabilidade do franqueador (responsabilidade solidária ou
residual) por não cumprimento das obrigações trabalhistas pelo
franqueado; e (ii) existência de uma relação de trabalho entre
franqueado e a o franqueador.
Segundo o artigo 2º da Lei de Franquia, a relação de franquia
não caracteriza vínculo empregatício. No entanto, a Lei
Consolidada do Trabalho (“CLT”) estabelece uma série de
características das relações de trabalho, entre eles, a subordinação,
que pode ser detectada quando um empregador tem o empregado
sob o seu comando e controle e quando o empregado estiver sujeito
às instruções do empregador. Em suma, a subordinação implica na
submissão do empregado às normas e instruções do empregador,
como o lugar, forma e tempo para realização de determinada
atividade. Os tribunais do trabalho tipicamente aplicam o princípio
de que a situação de fato prevalece sobre qualquer documento
formal, permitindo encontrar a existência de uma relação de
trabalho, mesmo se houver uma prestação de serviços ou outro
86. Voto favorável proferido pelo Ministro do STF, Gilmar Mendes, quando conferiu
repercussão geral ao Recurso Extraordinário nº 603.136/RJ, j. 09/02/2010.
87. Voto Favorável do Ministro do STF Marco Aurélio quando conferiu repercussão
geral ao Recurso Extraordinário 603.136/RJ j. 09.02.2010.
Vol. 105 TMR
1241
acordo entre pessoa física e jurídica que renuncia esse vínculo. A
relação entre o franqueador e o franqueado é, em regra,
meramente contratual, sem qualquer subordinação. No entanto, é
possível reconhecer o vínculo empregatício dependendo do caso
específico e os elementos que denotam a relação de subordinação
entre franqueador e franqueado. Outro princípio da jurisprudência
do direito do trabalho é a responsabilidade solidária pelas
obrigações trabalhistas de todas as empresas de um grupo
empresarial, bem como a responsabilidade residual do contratante
pelas obrigações trabalhistas de pessoal das empresas
terceirizadas. Como se vê, a relação de franquia permite que o
franqueado explore livremente a marca, a imagem e os produtos
e/ou serviços do franqueador, desde que com uma padronização de
procedimentos, para adaptar a identidade visual e outros aspectos
do negócio, para que, perante o público em geral, o franqueador e o
franqueado sejam basicamente a mesma pessoa. Embora o
franqueado seja pessoa distinta do franqueador e possua total
independência na gestão de seu negócio, ele explora a marca e os
produtos deste como se fossem seus. E, por outro lado, há um
controle rigoroso do franqueador na uniformização dos sistemas
para que o negócio de franquia seja único.
Esta realidade é amplamente reconhecida em sede
doutrinária, como se percebe da valiosa lição de Tiziane Machado,
advogada tributarista especializada em franquia, que reconhece
que “o franqueador exercerá um poder de gerência e controle
externo sobre o franqueado,” 88 sem que isto importe em
subordinação jurídica. A autora elucida, ainda, que:
“Diferentemente do conceito de subordinação existente entre
empresas de um mesmo grupo econômico, no contrato de
franchising há uma mera coligação cooperativa e um
controle externo para garantir a manutenção da
qualidade da marca ou patente que o franqueado
passou a ter direito a usar. Esse controle do
franqueador é feito sem interferência no poder de
gerência e administração interna do franqueado, que
continua com amplo poder para tomar decisões sobre
sua empresa, sendo, portanto, tal ingerência insuficiente para
caracterização do grupo econômico.” Negritou-se.
Nossos tribunais já se depararam com diversas questões
envolvendo o pleito de vínculo de emprego dos franqueados perante
o franqueador e foram detectadas diversas decisões não
reconhecendo tal vínculo, conforme extratos das decisões abaixo.
Em decisão do Tribunal Regional do Trabalho alegando a
responsabilidade do franqueador pelos débitos do franqueado,
88. MACHADO, Tiziane (org.), Manual Jurídico para Franqueadores e Franqueados.
São Paulo: Editora Aleph, 2006, p. 40.
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ratificou-se que “o fato de a empresa franqueadora estabelecer uma
série de exigências e de padronizar os produtos e forma de
comercialização são características naturais do franchising, pois
não pode a franqueadora deixar seu nome, seu maior patrimônio,
ser exposto de qualquer forma. Qualquer falha na comercialização
ou na qualidade do produto importa em prejuízos para a marca,
isto é, eventual insatisfação do cliente não será dirigida ao
estabelecimento comercial específico, mas sim à marca objeto do
contrato de franchising. Portanto, o rigoroso controle da
franqueadora sobre a franqueada, única forma de manter
valorizado seu nome (como já dito, seu maior patrimônio), não
torna aquela tomadora de serviços e esta prestadora de serviços, de
modo a reconhecer-se a responsabilidade subsidiária da primeira
por possíveis débitos trabalhistas da segunda.” Foi declarada,
assim, inexistente qualquer responsabilidade trabalhista da
franqueadora para satisfação dos eventuais créditos trabalhistas
dos empregados da franqueada. 89
Em outro caso, foi decidido que “[o] contrato de franquia,
regido pela Lei n. 8.955/94, não é figura jurídica capaz de atrair a
responsabilidade solidária/subsidiária da franqueadora, que não
tem qualquer responsabilidade pelos débitos trabalhistas da
franqueada. O contrato de franquia não é modalidade de trabalho
terceirizado, sendo inaplicável o critério de responsabilização
apreendido da ordem jurídica pelo inciso IV do Enunciado 90 n. 331
do TST.” 91 Em decisão do Recurso ordinário, também se constatou
que seja a relação comercial mantida entre as partes de
representação, sujeita à Lei 4.885/95, de compra e venda mercantil
com consignação, prevista no Código Civil brasileiro, ou de
franquia, objeto da Lei 8.955/94, não contêm em si os elementos da
relação de trabalho subordinado, objeto do art. 3º da CLT. 92
No entanto, independente do exposto, há casos em que se
verifica que a situação fática prevalece sobre os elementos formais.
A título exemplificativo, em Recurso de Revista, 93 do TST, foi
entendido que “nos termos postos no acórdão regional, a
reclamante não era, de fato, franqueada ou corretora de seguros
autônoma, porquanto presentes os elementos da relação de
89. TRT-RO-5059/00 - 5ª T. - Rel. Juiz Fernando Luiz Gonçalves Rios Neto - Publ. MG.
09.09.00.
90. Um enunciado é uma posição consolidada sobre determinado tema a partir um
tribunal superior.
91. TRT-RO-4148/01 - 5ª T. - Rel. Juiz Ricardo Antônio Mohallem - Publ. MG.
26.05.01.
92. TRT, 5ª Região, 3ª Turma, RO 0017200-53.2006.5.05.0193, Relatora Yara Trindade,
j. em 02.10.2007, DJ 15.10.2007.
93. Recurso de revista é um recurso apresentado ao Tribunal Superior de trabalho
(TST).
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emprego, especialmente a subordinação.” 94 Nesse caso, o vínculo
empregatício entre franqueada e franqueador foi reconhecido. Em
outro caso, envolvendo pagamento de quantias do franqueador ao
franqueado 95, foi decidido pela responsabilidade solidária do
franqueador, em virtude de pagamentos efetuados diretamente
pelo franqueador ao franqueado para auxiliá-los em suas
obrigações. 96
M. Validade dos Contratos de Franquia
A Lei de franquia, em seu artigo 6º, prevê que o contrato de
franquia deve ser sempre escrito e assinado na presença de 2
(duas) testemunhas e terá validade independentemente de ser
levado a registro perante cartório ou órgão público. 97 No entanto,
esta validade diz respeito aos efeitos entre as partes e não perante
terceiros. Apesar de a lei reconhecer a validade do contrato de
franquia na presença de duas testemunhas, em caso envolvendo
VF do Brasil Ltda. (franqueador) e Ipanema Rio Boutique Ltda., 98
o tribunal de segunda instância reconheceu a validade de um
contrato verbal de franquia e decidiu que a ausência de um
contrato escrito não evitou a formalização da relação entre as
partes.
IV. CONCLUSÃO
Com o aumento das franquias no Brasil, pode-se notar que
também surgiram diversos litígios sobre variados assuntos
relacionados ao tema. Algumas disputas não poderiam ser
evitadas, sendo que a jurisprudência, nesses casos, é uma
94. TST, 3ª Turma, RR - 2663000-80.2007.5.09.0029, Relatora Ministra: Rosa Maria
Weber, j. em 20.10.2010, DJ: 28.10.2010.
95. TRT/ 3ª região, 8ª Turma, RO 01499-2005-013-03-00-5, Relator Olívia Figueiredo
Pinto Coelho, j. em 26.07.2006, DJ 05.08.2006.
96. Segundo acórdão, “o contrato de franquia reúne a utilização de toda a estrutura
necessária aos aspectos comerciais da expansão da marca e dos nomes que individualizam e
identificam uma empresa, um produto ou uma linha de produtos, inexistindo subordinação
jurídica entre franqueador e franqueado, pagando este os royalties pelo uso das informações
e conhecimentos, detidos por aquele. Com efeito, as obrigações trabalhistas assumidas pelo
franqueado não são transferidas para o franqueador, no caso de, por qualquer motivo, ficar o
primeiro impossibilitado de quitá-las. Contudo, pagando o franqueador à franqueada,
mensalmente, uma receita destinada a cobrir as despesas do empreendimento desta,
inclusive quanto ao pagamento de pessoal e ‘pró-labore’ dos sócios, fica descaracterizado o
contato de franquia, já que o franqueador passa atuar como proprietário do negócio, arcando
com os seus custos operacionais e assim, assumido os riscos da atividade empresarial da
franqueada, sendo necessário reconhecer a existência de solidariedade entre as empresas
para efeito da relação de emprego, com fundamento no parágrafo 2º., do artigo 2º, da CLT.”
97. Art. 6º: O contrato de franquia deve ser sempre escrito e assinado na presença de 2
(duas) testemunhas e terá validade independentemente de ser levado a registro perante
cartório ou órgão público.
98. Tribunal de Justiça de Pernambuco, Apelação Cível 2196274 PE, 2ª Câmara Cível,
Rel. Des. Adalberto de Oliveira Melo, julgado em 05/02/2013.
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ferramenta útil para os litigantes entenderem os pontos e fatos
principais a serem levados em consideração quando da
reivindicação e defesa de seus pleitos. Muitas outras disputas, no
entanto, podem ser evitadas por meio de um cuidadoso
entendimento das típicas discussões em debate envolvendo os
contratos de franquia e parcerias no Brasil, bem como por meio da
elaboração de uma circular de oferta de franquia e um contrato de
franquia que contenham clara e completa definição dos mútuos
direitos e obrigações das partes. Particularmente com relação aos
diferentes tipos de disputas que franqueadores e franqueados se
deparam no Brasil, os franqueadores, titulares de marcas e
investidores, entre outros, poderiam ser beneficiados se pudessem
se adiantar e já prever, dentro do possível, todos os pontos
relevantes na circular de oferta e no contrato de franquia, no
sentido de evitar desnecessários litígios futuros.

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