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POLICIA MILITAR DO PIAUÍ DIRETORIA DE ENSINO, INSTRUÇÃO E PESQUISA CENTRO DE FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO PRAÇAS CURSO DE FORMAÇÃO DE CABOS/2014 LEGISLAÇÃO ESPECIAL E ATENÇÃO A GRUPOS EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIAL NOVEMBRO - 2014 1 APRESENTAÇÃO Prezado aluno, você está iniciando mais uma etapa em sua vida profissional. Com certeza vai aumentar e aprimorar ainda mais seu conhecimento para lidar no dia-a-dia com a nossa sociedade, e então prestar um serviço de qualidade, de excelência, gerando um sentimento de segurança que é a finalidade do profissional da segurança pública. Aqui, no caso específico, tratar-se-á da legislação especial e atenção a grupos em situação de vulnerabilidade social, pois existem grupos na nossa sociedade e no mundo, que para muitos são invisíveis. Alguns desses grupos, devido a questões ligadas a gênero, idade, condição social, deficiência e orientação sexual, tornam-se mais suscetíveis à violação de seus direitos, por isso são denominados grupos vulneráveis. Nesta disciplina, neste curso de formação de cabos PM/2014, você estudará sobre eles, também sobre a legislação especial (algumas leis especiais) e igualmente sobre a importância do profissional da área de segurança pública ter conhecimentos básicos sobre os dispositivos legais referentes a cada grupo. Espera-se que as informações aqui contidas possam servir de subsídios para a prestação de um atendimento de qualidade a esses grupos como também à sociedade. Ao final desta disciplina você será capaz de definir grupos vulneráveis correlacionando os conceitos com Direitos Humanos; identificar os principais grupos vulneráveis existentes em nossa sociedade; analisar a legislação especial e a relativa à proteção dos grupos vulneráveis tanto no Brasil como no mundo e seu enlace com a atividade policial; aopntar a atitude correta na atuação em ocorrências envolvendo integrantes dos grupos vulneráveis; realizar abordagens e buscas, em integrantes dos grupos vulneráveis, em conformidade com a filosofia de direitos humanos; e prestar o socorro às vítimas dos grupos vulneráveis, levando em consideração os cuidados que cada caso exige. Vamos aos estudos e boa sorte. 2 1 – INTRODUZINDO A QUESTÃO 1.1 - GRUPOS VULNERÁVEIS SOB A ÓTICA DA SEGURANÇA PÚBLICA O Brasil possui, atualmente, cerca de 200,4 milhões (2013) de brasileiros distribuídos em um território de dimensões continentais. A cultura brasileira é o resultado de um grande sincretismo que uniu costumes de diversos povos e os caracteres genéticos que compõem as nossas raízes são frutos de uma secular miscigenação de etnias, gerando uma diversidade que proporciona ao Brasil, uma imensurável riqueza cultural e social. As diferenças relacionadas à etnia, gênero, deficiência, idade, dentre outros, também constituem essa diversidade tornando-a ainda mais bela. Porém, quando as diferenças se convertem em desigualdade, criam um ambiente propício para a violação de direitos, tanto no espaço público quanto no privado, tornando vulneráveis as pessoas que estão na condição de diferentes. É possível citar como exemplo: as pessoas com necessidades especiais, os idosos, as mulheres, crianças e adolescentes e a população de rua. Esses grupos são chamados de grupos vulneráveis. A busca dessas pessoas pelo reconhecimento de seus direitos é hoje um fator democrático preponderante, pois, somente através da igualdade é que se percebe a plena democracia. Foram muitos os movimentos sociais e conquistas no século XX, dos setores mais vitimados pelo preconceito e a discriminação, mas, ainda hoje, a sociedade não está preparada para lidar com essas diferenças, o que gera o preconceito e a indiferença tornando a vida dessas pessoas, ainda mais difícil. A falta de políticas públicas direcionadas a esses grupos e a desinformação da sociedade são fatores que contribuem para a vitimação. Atualmente existe um grande esforço nacional para dar mais visibilidade a esses grupos e mais informação a sociedade, estimulando, assim, uma coresponsabilidade na formulação de leis e políticas garantidoras dos direitos dos grupos vulneráveis, como a criação de conselhos temáticos – o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, dentre outros. Os direitos humanos foram construídos através da história, na luta dos oprimidos pelo reconhecimento como cidadãos e pela liberdade. Com já se sabe, direitos humanos são todos os direitos que o ser humano possui (a vida, a família, filhos, trabalho, etc) e que estão listados nos 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 10 de dezembro de 1948, e garantidos em nossa Constituição Federal de 1988. A defesa dos direitos humanos proporciona a sociedade e, notadamente, a esses grupos vulneráveis, o reconhecimento e a abertura de espaço político, para além do meramente formal, ou seja, traz a realização concreta de seus anseios e faz cumprir efetivamente o que está escrito nas leis e nos estatutos. Dentro desse contexto, o policial na sua atividade cidadã e de proteção social deve conhecer a dinâmica dos grupos humanos, ou seja, descobrir seus anseios, dificuldades, necessidades e se engajar, no que for relativo à segurança pública, para a defesa e promoção dos direitos desses grupos. É como afirma Balestreri (2004, p.49): Dada a grave realidade nacional e internacional, onde o crime e a violência ameaçam, a cada dia mais, as liberdades individuais e coletivas e as instituições democráticas, é preciso que a segurança pública seja resolutamente percebida como inclusa no mais fundamental rol dos direitos humanos. É por isso que seus operadores diretos (policiais, bombeiros, agentes penitenciários e guardas municipais) devem considerar-se e ser considerados, cada vez mais, como promotores 3 de direitos. E, é claro, como tal se portarem. Por vezes, é necessário repensar as atitudes e valores que temos confrontando-as com a nova ordem social e política de nossa sociedade. No entanto, quando se depara com casos como os citados, surge a dúvida de como atuar nessas ocasiões. Por outro lado, essas pessoas esperam ser tratadas com respeito e dignidade, como cidadãos sujeitos de direito, como todos os demais. 1.2 - AS EXIGÊNCIAS AOS PROFISSIONAIS DE SEGURANÇA PÚBLICA FRENTE AOS GRUPOS VULNERÁVEIS A atividade de segurança pública exige profissionais que saibam lidar com as pessoas sem discriminá-las, garantindo seus direitos e resolvendo conflitos de forma serena e igualitária. É imprescindível que o profissional de segurança pública conheça melhor as dificuldades de cada grupo e como ele pode auxiliá-las, protegendo e promovendo seus direitos. Você, profissional da área de segurança pública, deve conhecer e se habituar aos procedimentos que fogem aos padrões, que contemplam questões sobre minorias e grupos vulneráveis, de forma a nortear a sua atuação no trato adequado com essas pessoas. A Constituição Federal de 1988 dá a todos a promoção dos direitos coletivos sem nenhuma discriminação. Em seu art. 3°, inciso IV diz: promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Já o Plano Nacional de Direitos Humanos II também é claro, com relação às políticas públicas para o enfrentamento relativo aos grupos vulneráveis e diz no ítem 13: apoiar programas e ações que tenham como objetivo prevenir a violência contra grupos vulneráveis e em situação de risco. Novamente a CF/85, no artigo 5º: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se a todos inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Além dos dispositivos já citados, no ordenamento jurídico há outros garantidores de direitos dos grupos vulneráveis mais específicos, como o Estatuto do Idoso, o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, a Lei nº 11.340, Maria da Penha, dentre outros. Entretanto, a efetividade desses dispositivos depende da participação da sociedade civil organizada e de políticas públicas de atendimento em diversas áreas, inclusive na segurança pública. Nesse contexto, o profissional de segurança pública não pode de forma alguma ser mais um a vitimar e desrespeitar os direitos dessas pessoas. Ele também não deve ser alguém somente disposto a ajudar, precisa ter conhecimentos básicos sobre cada um dos dispositivos legais referentes a cada segmento, para prestar um atendimento de qualidade e dar os devidos encaminhamentos a cada caso em específico. Outro procedimento necessário é a criação de redes, onde os vários órgãos ligados a proteção e promoção de direitos, como conselhos temáticos, polícias, Ministério Público e Judiciário estejam integrados e formulando estratégias de atendimento em conjunto. 1.3 - CONCEITUANDO O TEMA: GRUPOS VULNERÁVEIS E MINORIAS 1.3.1 - GRUPOS VULNERÁVEIS Grupo vulnerável é um conjunto de pessoas que por questões ligadas a gênero, idade, 4 condição social, deficiência e orientação sexual, tornam-se mais suscetíveis à violação de seus direitos. Para efeito didático esses grupos são classificados em seis categorias: Mulheres, Crianças e adolescentes, Idosos, População de rua, Pessoas com deficiência física ou sofrimento mental, e Comunidade LGBTT. Existem outros grupos na sociedade em situação de risco, porém, a vulnerabilidade neste caso é a sujeição constante ao preconceito e à discriminação, independente de outros fatores. É extremamente relevante que você saiba diferenciar um grupo vulnerável de uma minoria. 1.3.2 – MINORIAS Segundo Sabóia (2001, p. 19 e 20 apud DESCHÊNES, 1985, p. 31), minorias são: Um grupo de cidadãos de um Estado, constituindo minoria numérica e em posição não-dominante no Estado, dotada de características étnicas, religiosas ou lingüísticas que diferem daquelas da maioria da população, tendo um senso de solidariedade um para com o outro, motivado, senão apenas implicitamente, por vontade coletiva de sobreviver e cujo objetivo é conquistar igualdade com a maioria, nos fatos e na lei. A Organização das Nações Unidas não instituiu um conceito universal sobre minoria. O entendimento da Corte Internacional de Justiça é de que cada Estado tem discricionariedade para arbitrar se o grupo possui fatores característicos distintivos e se incide no conceito de minoria. Resumindo, a identificação de uma minoria envolve a apreciação de critérios objetivos e subjetivos. Em outras palavras, caberá ao Estado reconhecer determinados grupos como índios e demarcar terras para eles, ou remanescentes de quilombos, e reconhecer aquele sítio como histórico dando-lhes titularização coletiva das terras; ou como ciganos, etc. (id. 2001, p. 21). 1.3.2.1 - TIPOS DE MINORIAS Segundo o artigo 27 do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, as minorias protegidas são étnicas, religiosas e lingüísticas. Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos Art. 27 - Nos Estados em que existam minorias étnicas, religiosas ou lingüísticas não será negado o direito que assiste às pessoas que pertençam a essas minorias, em conjunto com os restantes membros do seu grupo, a ter a sua própria vida cultural, a professar e praticar a sua própria religião e a utilizar a sua própria língua. (http://www.cidadevirtual.pt/cpr/asilo2/2pidcp.html#a27) MINORIAS ÉTNICAS São grupos que apresentam fatores distinguíveis em termos de experiências históricas compartilhadas e sua adesão a certas tradições e significantes tratos culturais, que são diferentes dos apresentados pela maioria. (SABÓIA 2001, p. 23 apud POUTER, 1986, p. 2). Exemplos: índios, comunidades negras remanescentes de quilombos, ciganos, judeus, dentre outros. 5 MINORIAS LINGÜÍSTICAS São grupos que usam uma língua, quer entre os membros do grupo, quer em público, que claramente se diferencia daquela utilizada pela maioria, bem como da adotada oficialmente pelo Estado. Não há necessidade de ser uma língua escrita. Entretanto, meros dialetos que se desviam ligeiramente da língua da maioria não gozam do status de língua, de um grupo minoritário. (SABOIA 2001, p. 23 apud NOWAK, 1993, p. 491). MINORIAS RELIGIOSAS São grupos que professam e praticam uma religião (não simplesmente outra crença, como o ateísmo, e.g.) que se diferencia daquela praticada pela maioria da população. (SABOIA 2001, p.23 apud Dienstein,1992, p.156). No Brasil existem as seguintes minorias: budistas, muçulmanos, espíritas, praticantes de candomblé (religião jeje-nagô ou ioruba), dentre outras. 2.3 – DIFERENÇA ENTRE GRUPOS VULNERÁVEIS E MINORIAS Os grupos vulneráveis são pessoas que podem fazer parte de uma minoria étnica, mas, dentro dessa minoria, têm uma característica que as difere das demais e as torna parte de outro grupo. Exemplo: Uma pessoa que faz parte de um pequeno grupo islâmico, num país católico, pode também ser deficiente física. Ela pertence a uma minoria religiosa (islã) e integra outro grupo vulnerável por ter deficiência física. De igual forma pode haver superposição dos tipos de minorias: o muçulmano no Brasil será integrante tanto de minoria étnica como da religiosa e da lingüística. A diferença básica é que as minorias estão limitadas aos aspectos étnicos, lingüísticos e religiosos e os grupos vulneráveis, por sua vez, estão relacionados com as características especiais que as pessoas adquirem em razão da idade, gênero, orientação sexual, deficiência física ou sofrimento mental e condição social. 2 – PESSOAS IDOSA 2.1 – SITUAÇÃO DA TERCEIRA IDADE NO BRASIL O Estatuto do Idoso criado pela Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003, define como pessoa idosa, aquela com idade igual ou superior a 60 anos. (http://www010.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/2003/10741.htm) Você, com certeza, já conviveu ou convive com uma pessoa idosa em seu cotidiano, um parente ou vizinho, e já deve ter presenciado várias situações em que pode comprovar, que apesar de terem grande experiência de vida, são muitas vezes discriminadas e vitimadas no espaço doméstico e no público. SAIBA MAIS... Apesar dos vários episódios de violência, morte por doença ou acidentes, e abandono material e afetivo verifica-se um crescimento significativo dessa população no Brasil. Segundo o IBGE, a população de idosos representa um contingente de quase 15 milhões de pessoas com 60 anos ou mais de idade (8,6% da população brasileira). As mulheres são maioria. E 8,9 milhões (62,4%) dos idosos são responsáveis pelos domicílios e têm, em média, 69 anos de idade e 3,4 anos de estudo. Com um rendimento médio de R$ 657,00, o idoso ocupa, cada vez mais, um 6 papel de destaque na sociedade brasileira. Ainda segundo o IBGE, nos próximos 20 anos, a população idosa do Brasil poderá ultrapassar os 30 milhões de pessoas e deverá representar quase 13% da população ao final desse período. Em 2000, segundo o Censo, a população de 60 anos ou mais de idade era de 14.536.029 de pessoas, contra 10.722.705 em 1991. O peso relativo da população idosa no início da década representava 7,3%, enquanto, em 2000, essa proporção atingia 8,6%. Fonte: http://www.ibge.gov.br No mundo, em 2050, um quinto da população mundial será de idosos. Daí verifica-se a importância do estudo sobre as características dessa faixa etária, principalmente, para os profissionais de segurança pública, pois são elas que deverão ser servidas e protegidas. Deve-se levar também em consideração que, na melhor de nossas expectativas, todos um dia passarão pela experiência da terceira idade. 2.2 – VIOLÊNCIA CONTRA O IDOSO Você em sua rotina operacional já deve ter se deparado com inúmeros casos de violência praticados contra idosos, e que em muitos deles, os violadores e agressores são os próprios parentes da vítima. Segundo a Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violência do Ministério da Saúde (2001) os maus-tratos contra idosos dizem respeito às “ações únicas ou repetidas que causam sofrimento ou angústia, ou, ainda, a ausência de ações que são devidas, que ocorrem numa relação em que haja expectativa de confiança”. (http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S00349102000000400020&script=sci_arttext&tlng =pt) Com base nesse mesmo documento, a violência contra idosos se manifesta sobre vários aspectos: Abuso físico, psicológico, sexual, abandono e negligência. Some a essas formas de violência, o abuso financeiro e a autonegligência. Cabe ressaltar que a negligência, conceituada como a recusa, omissão ou fracasso por parte do responsável pelo idoso, é uma forma de violência presente tanto em nível doméstico quanto institucional, levando muitas vezes ao comprometimento físico, emocional e social, gerando, em decorrência, aumento dos índices de morbidade e mortalidade. Cada um dos tipos de violência citados na página anterior está classificada no documento de Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e violências do Ministério da Saúde (2001). (http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/politica_promocao.pdf) São classificados como: Abandono Ausência ou deserção, por parte do responsável, dos cuidados necessários às vítimas, ao qual caberia prover custódia física ou cuidado. Abuso financeiro aos idosos Exploração imprópria ou ilegal e/ou uso não consentido de recursos financeiros de um idoso. Abuso físico ou maus-tratos físicos Uso de força física que pode produzir uma injúria, ferida, dor ou incapacidade. 7 Abuso psicológico ou maus-tratos psicológicos Agressões verbais ou gestuais com o objetivo de aterrorizar, rejeitar, humilhar a vítima, restringir a liberdade ou ainda isolá-la do convívio social. Abuso sexual Ato ou jogo sexual que ocorre em relação hetero ou homossexual que visa estimular a vítima ou utilizá-la para obter excitação sexual e práticas eróticas e sexuais impostas por meio de aliciamento, violência física ou ameaças. Acidentes ampliados São acidentes relacionados a indústrias de processos contínuos; não se restringem ao ambiente de trabalho, afetando comunidades do entorno e produzindo efeitos adversos ao longo do tempo. Autonegligência Conduta de pessoa idosa que ameaça sua própria saúde ou segurança, com a recusa ou o fracasso de prover a si mesmo um cuidado adequado. Com frequência, os idosos mais vitimados são os que possuem alguma dependência, seja em decorrência de uma doença, deficiência física ou mental. A situação de idosos dependentes se agrava quando seu responsável ou cuidador é usuário de drogas, alcoólatra ou possui algum problema de saúde mental. Nesses casos, o idoso pode sofrer com a negligência e a violência praticada por aqueles que deveriam protegê-los e garantir sua integridade física e mental. No espaço público, principalmente em áreas urbanas, os idosos sofrem vários tipos de acidentes, como atropelamentos, quedas com fratura do colo do fêmur, queimaduras, vítima de bala perdida, dentre outras lesões, que na maioria das vezes levam a invalidez ou ao óbito. No ambiente doméstico, o descrédito dado as informações e relatos de maus-tratos, feito por idosos, gera impunidade aos agressores, e estimula o sigilo pelos próprios idosos que temem sofrer mais violência ou procuram, de alguma forma, devido ao vínculo afetivo, proteger o agressor. Diante de tantos fatos, é possível perceber a importância de se ter um mecanismo moderno e eficiente de proteção dos direitos dessas pessoas. O Estatuto do Idoso foi criado justamente para atender essa demanda e você irá estudá-lo na próxima aula a partir de situações práticas. 2. 3 – O ESTATUTO DO IDOSO O Estatuto do Idoso foi aprovado em setembro de 2003 e sancionado pelo presidente da República no mês seguinte, após sete anos tramitando no congresso. O Estatuto do Idoso amplia os direitos dos cidadãos com idade acima de 60 anos. (http://www010.dataprev.gov.br/sislex/paginas/42/2003/10741.htm) Mais abrangente que a Política Nacional do Idoso – lei de 1994 que dava garantias à terceira idade, o Estatuto institui penas severas para quem desrespeitar ou abandonar cidadãos da terceira idade. (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8842.htm) Você irá estudar os principais pontos do Estatuto do Idoso a partir de situações práticas relacionadas à área da saúde, transporte e família. 8 Saúde 1ª situação prática Imagine que você está de serviço próximo a um hospital e que de repente uma jovem lhe procura acompanhada do pai dela, de 79 anos de idade, e lhe diz que seu pai está muito doente, e lhe pede ajuda, pois a fila do posto de saúde está enorme e ninguém quer ceder lugar ao pai dela. Como você agiria? Como iria orientar a essa pessoa? O que diz o estatuto O artigo 15 do Estatuto do Idoso diz claramente que o idoso tem atendimento preferencial no Sistema Único de Saúde e o artigo 114 alterou a redação do artigo 1º, da Lei 10.048, de 08 de novembro de 2000, e passou a ter a seguinte redação: (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L10048.htm) Art. 1º - As pessoas portadoras de deficiência, os idosos com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, as gestantes, as lactantes e as pessoas acompanhadas por crianças de colo terão atendimento prioritário, nos termos desta Lei. Sugestão de atendimento Neste caso, o pai da jovem deve ser atendido com prioridade, desde que não haja um caso mais grave ou outra pessoa idosa na sua frente. 2ª situação prática Uma senhora de 65 anos lhe procura e diz estar necessitando de remédios controlados para diabetes e se você não tem uma orientação de como ela pode adquirir gratuitamente, pois não tem como comprar. Como você poderia ajudá-la? O que diz o estatuto: O § 2º, do artigo 15, diz que incumbe ao Poder Público, a distribuição de remédios, principalmente os de uso continuado, de forma gratuita aos idosos, assim como a de próteses e órtese. (http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende/pr%C3%B3tese.htm) Sugestão de atendimento No caso citado, você deve orientá-la a procurar um órgão de saúde da prefeitura local e fazer um cadastro para o recebimento dos remédios. Transporte Situação prática Você está trabalhando próximo à rodoviária e é solicitado por um senhor de 65 anos de idade que relata que não pode viajar em um coletivo interestadual, pois a empresa não autorizou a liberação de assento gratuito para ele. Como você agiria nesse caso? O que diz o estatuto O artigo 39, do Estatuto do Idoso, tem a seguinte redação: Art. 39 Aos maiores de 65 (sessenta e cinco) anos fica assegurada a gratuidade dos transportes coletivos públicos urbanos e semi-urbanos, exceto nos serviços seletivos e especiais, quando prestados paralelamente aos serviços regulares. § 1º Para ter acesso à gratuidade, basta que o idoso apresente qualquer documento pessoal que faça prova de sua idade. 9 § 2º Nos veículos de transporte coletivo de que trata esse artigo serão reservados 10% (dez por cento) dos assentos para os idosos, devidamente identificados com a placa de reservado preferencialmente para idosos. § 3º No caso das pessoas compreendidas na faixa etária entre 60 (sessenta) e 65 (sessenta e cinco) anos, ficará a critério de a legislação local dispor sobre as condições para exercício da gratuidade nos meios de transporte previstos no caput deste artigo. Art. 40 No sistema de transporte coletivo interestadual observar-se-á, nos termos da legislação específica: I – A reserva de 2 (duas) vagas gratuitas por veículo para idosos com renda igual ou inferior a 2 (dois) salários mínimos; e II – Desconto de 50% (cinqüenta por cento), no mínimo, no valor das passagens, para os idosos que excederem as vagas gratuitas, com renda igual ou inferior a 2 (dois) salários mínimos. Sugestão de atendimento No caso citado, se a pessoa está dentro dos requisitos exigidos por lei, a empresa de transporte é obrigada a emitir as passagens gratuitamente com base no inciso I, do artigo 40 e com desconto de 50% no caso do inciso II. Em caso de resistência por parte da empresa um boletim de ocorrência deve ser lavrado. Família Situação prática Uma pessoa lhe relata a seguinte situação: Uma senhora de 79 anos está sem nenhuma assistência em casa, passando por dificuldade financeira e doente, seus filhos recebem a pensão por ela, e gastam tudo com custos pessoais negligenciando os devidos cuidados com a mãe. Existe também uma informação, que a senhora está sofrendo maus-tratos e violência física. Como você, sendo um policial, agiria nessa situação? O que diz o estatuto No que se refere ao tratamento dispensado à senhora, seus filhos estão violando os artigos 4º e 99, do Estatuto do Idoso que prevê: Art. 4º Nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, crueldade ou opressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma da lei. Art. 99 Expor a perigo a integridade e a saúde, física ou psíquica, do idoso, submetendoo a condições desumanas ou degradantes ou privando-o de alimentos e cuidados indispensáveis, quando obrigado a fazê-lo, ou sujeitando-o a trabalho excessivo ou inadequado: Pena – Detenção de 2 (dois) meses a 1 (um) ano e multa. § 1º Se do fato resulta lesão corporal de natureza grave: Pena – Reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos. Com relação à pensão da senhora que está sendo usada pelos filhos, constitui crime previsto nos artigos 102 e 104, do Estatuto do Idoso: Art. 102 Apropriar-se de ou desviar bens, proventos, pensão ou qualquer outro rendimento do idoso, dando-lhes aplicação diversa de sua finalidade: 10 Pena – Reclusão de 1 (um) a 4 (quatro) anos e multa. Art. 104 Reter o cartão magnético de conta bancária relativa a benefícios, proventos ou pensão do idoso, bem como qualquer outro documento com objetivo de assegurar recebimento ou ressarcimento de dívida: Pena – Detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos e multa. Sugestão de atendimento No caso citado estão ocorrendo várias violações aos direitos da senhora, e todos são crimes previstos no Estatuto do Idoso, porém, na sua atuação, você deverá tomar alguns cuidados. Em primeiro lugar, procurar constatar a veracidade dos fatos e levantar o maior número de informações possíveis. Caso sejam constatadas as denúncias, uma ação conjunta se faz necessária, pois em muitos casos, própria vítima pode querer proteger os seus filhos, negando os fatos. O Conselho Municipal do Idoso que irá notificar o Ministério Público. Na ausência de conselho, o próprio Ministério Público é que adotará as medidas previstas no artigo 74, do Estatuto do Idoso, no que for pertinente. Um boletim de ocorrência deve ser lavrado e direcionado à Delegacia Especializada de Proteção ao Idoso, caso exista na localidade, do contrário, deve ser registrado em uma delegacia local. Importante! Os órgãos responsáveis pela fiscalização e proteção dos direitos do idoso são o Ministério Público e os Conselhos Municipal, Estadual e Nacional do Idoso. Os órgãos responsáveis pela fiscalização e proteção dos direitos do idoso são o Ministério Público e os Conselhos Municipal, Estadual e Nacional do Idoso. 2. 4 – ATUAÇÃO POLICIAL NO TRATO PESSOAS IDOSAS As orientações que estudará foram extraídas da Diretriz para Produção de Segurança Pública nº 08, da PMMG, do capítulo exclusivo sobre atendimento aos grupos vulneráveis. No desenvolvimento das suas ações, os profissionais da área de segurança pública poderão se deparar com situações que envolvam pessoas da terceira idade. Seja o idoso denunciante ou suspeito, deverá ter sempre tratamento diferenciado. Dentro de uma delegacia, será convidado a assentar-se. Também será ótimo oferecer-lhe um cafezinho e água. Com isso, o profissional promoverá um relacionamento de confiança e respeito. Se o idoso for suspeito, o policial deve respeitar sua idade e condições de saúde, manter com ele prévia conversa sobre o ato cometido, para que ele comece a refletir sobre as conseqüências e esteja preparado para assumi-las, resguardados os aspectos de segurança do policial. Deve ser esclarecida ao idoso a ajuda jurídica que ele receberá do Estado, com outras informações acerca do trâmite da investigação ou processo. O idoso, sempre que possível, será acompanhado por algum membro familiar. O policial deverá evitar agressão verbal ou física aos familiares do idoso, vítima de crime, para não causarlhe problemas sérios ou até complicações à saúde. Agora que você estudou sobre as pessoas idosas, procure pesquisar mais sobre o assunto acessando os links abaixo: Portal do envelhecimento 11 (http://www.portaldoenvelhecimento.net/principal/principal.htm) Idade Maior: a revista da terceira idade (http://www.idademaior.com.br/) Direito do Idoso (http://www.direitodoidoso.com.br/) Lembre-se de que no desenvolvimento das suas ações, o profissional da área de segurança pública poderá se deparar com situações que envolvam pessoas da terceira idade. Seja o idoso vítima ou suspeito, deverá ter sempre tratamento diferenciado. Um tratamento de qualidade fará toda a diferença. 3 - MULHERES 3.1 MULHERES A igualdade é a essência de toda a sociedade democrática comprometida com a justiça e os direitos humanos. Em praticamente todas as atividades e esferas sociais, a mulher é alvo de desigualdades, por lei e de fato. Essa situação é causada e agravada pela existência de discriminação na família, na comunidade e no local de trabalho. A discriminação contra a mulher mantém-se na sobrevivência de estereótipos (do homem e da mulher), de culturas tradicionais e crenças prejudiciais às mulheres. Entende-se por discriminação contra mulheres qualquer distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo que tenha como objetivo ou efeito comprometer ou destruir o gozo ou o exercício pelas mulheres, seja qual for seu estado civil, com base na igualdade garantida a homens e mulheres, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais no campo político, econômico, social, cultural, civil ou de qualquer outra natureza ou espécie. 3.2 - VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER O Comitê da Mulher (CEDM) definiu a violência contra a mulher como: “... violência que é dirigida à mulher pelo fato dela ser mulher ou que atinge a mulher desproporcionalmente. Inclui atos que infrinjam sofrimento ou dano físico, mental ou sexual, ameaças de tais atos e outras privações da liberdade...”(sic). A violência contra a mulher é um fenômeno antigo, ao longo da história, a qual não era notada nem contestada. Após pressão internacional muito recente, para que se considere a violência contra a mulher como questão internacional de direitos humanos, a CEDM respondeu com a declaração específica de que a proibição geral da discriminação contra a mulher que consta na Convenção sobre a Mulher inclui a violência contra a mulher. O Comitê afirma ainda que a violência contra a mulher constitui uma violação de seus direitos humanos reconhecidos internacionalmente e considera irrelevante haver sido cometida a violação por um policial ou cidadão comum. A responsabilidade do Estado pela violência contra a mulher pode ser invocada, quando um policial está envolvido em ato de violência contra a mulher ou quando o Estado deixa de agir com a devida diligência, para evitar a violação desses direitos cometida por particulares ou investigar e punir tais atos de violência, mediante compensação ética e sociojurídica. A violência doméstica é outra violação dos direitos humanos e crime (na maioria dos países) que os policiais podem ajudar a prevenir. Os homens que batem em suas mulheres ou companheiras estão normalmente confiantes em que o podem fazer com impunidade − de que não serão denunciados à polícia e, mesmo que o sejam, conseguirão escapar da punição. As 12 autoridades policiais, de uma forma geral, contribuíram para tal situação, ao se recusarem não só a tratar a violência doméstica como crime, mas a intervir para acabar com a violência, baseados supostamente na errônea noção de que isso fosse um problema de família. A violência doméstica não é um problema só de família − é um problema da comunidade, e esta, em sua quasetotalidade, é responsável pela continuação desse delito. São os amigos e vizinhos que ignoram ou encontram desculpas para as provas evidentes de violência. É o médico que apenas cuida dos ossos quebrados e machucados. São a polícia e o tribunal que se recusam a intervir em assunto particular. Os policiais podem ajudar a prevenir a violência doméstica, ao tratá-la como crime. Eles são responsáveis por assegurar e proteger o direito da mulher à vida, à segurança e à integridade corporal, e incorrem em evidente abdicação dessa responsabilidade, quando falham de preservar a mulher da violência no lar. Na maioria dos países do mundo, os crimes contra a mulher são quantitativamente insignificantes. É dever de toda instituição policial analisar esses crimes, para evitá-los o máximo possível, e tratar a respectivas vítimas com cuidado, sensibilidade e profissionalismo. Entende-se por discriminação contra mulheres qualquer distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo que tenha como objetivo ou efeito comprometer ou destruir o gozo ou o exercício pelas mulheres, seja qual for seu estado civil, com base na igualdade garantida a homens e mulheres, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais no campo político, econômico, social, cultural, civil ou de qualquer outra natureza ou espécie. 3.3 - MULHER CAPTURADA A não-discriminação rege que a mulher tem os mesmos direitos que o homem no ato da captura. Também existem outras formas adicionais de proteção e consideração a serem oferecidas à mulher durante a captura. Tais medidas incluem as garantias de que: a) a captura das mulheres seja feita por uma policiala ou pessoa do sexo feminino, devidamente orientada (sempre que possível); b) as mulheres e suas vestimentas sejam revistadas por uma policiala (em todas as circunstâncias); c) as mulheres capturadas sejam mantidas separadas dos homens capturados (quando, para isso, houver condições de segurança e logística). Deve-se observar que a proteção e consideração adicionais à mulher em situação de captura não devem ser tidas como discriminatórias, porque se visa à garantia plena de a mulher gozar seus direitos igualitariamente ao homem. 3.4 - MULHER DETIDA À mulher detida asseguram-se procedimentos destinados a proteger seus direitos e sua condição especial (particularmente os da grávida e da lactante). Entre tais medidas, incluem-se instalações médicas especializadas, pois a denegação de tratamento médico adequado a mulheres detidas constitui maus-tratos, proibidos por leis nacionais e internacionais, e alojamento separado para mulheres detidas, com disponibilidade de pessoal do sexo feminino na justiça penal. Outras medidas especiais podem ser oferecidas à mulher detida, para a melhor criação de seus filhos e tratamento de saúde durante a gravidez. 13 3.5 - MULHER VÍTIMA DA CRIMINALIDADE E DO ABUSO DE PODER Verifica-se que a Declaração das Vítimas e as outras disposições importantes de tratados sobre maus-tratos contra a mulher são neutras. Não chegam nem perto de reconhecer que as necessidades das mulheres vítimas da criminalidade e abuso de poder são, muitas vezes, muito diferentes das necessidades das vítimas do sexo masculino, não somente em termos físicos e psicológicos, mas também porque a vítima feminina provavelmente sofreu um tipo de violação que é peculiar a seu sexo. Em muitos casos, os policiais serão o primeiro contato que vítima do sexo feminino terá. O bem-estar dessa vítima deve ser da mais alta prioridade. Não se pode desfazer o crime cometido, mas o auxílio e a assistência adequados a tal vítima farão com que as conseqüências negativas desse mal sejam definitivamente limitadas. Se o incidente for de natureza doméstica ou a vítima conhecer seu agressor, ela poderá relutar em contra ele apresentar queixa, com medo de represálias. O cuidado e a assistência adequados para as mulheres vítimas de crime podem fazer com que sejam necessárias medidas especiais, inclusive a proteção contra vitimização posterior, o encaminhamento a abrigos e a prestação de serviços médicos especializados, o respeito pelo direito à privatividade e à dignidade pessoal da mulher vítima, e a disponibilidade de policialas para conduzir a investigação e providenciar instalações especiais dentro das delegacias, para conforto e bemestar da vítima. As mulheres vítimas de abuso de poder necessitarão também de proteção especial para assegurar que seus direitos não sejam ainda mais violados. Há uma preocupação particular com a situação das mulheres vítimas de violência nas mãos dos policiais e funcionários do Estado − vítimas que incluem as mulheres que sofrem agressões enquanto capturadas. É nítido o dever das organizações de aplicação da lei de se assegurarem de que qualquer alegação de violência desse tipo tenha sido imediatamente levada à presença da autoridade policial , a assistência médica, aconselhamento e outro serviço de apoio tenham sido oferecidos às vítimas, a quem a implementação do direito à compensação tem de ser facilitado. 4 - CRIANÇAS E ADOLESCENTES Crianças e adolescentes têm direitos próprios que estão previstos em diversos instrumentos internacionais e na legislação brasileira. A Constituição Federal relaciona em seu art. 227 direitos destinados a garantir às crianças e adolescentes absoluta prioridade no atendimento ao direito à vida, saúde, educação, convivência familiar e comunitária, lazer, profissionalização, liberdade e integridade. Além disso, é dever de todos (Estado, família e sociedade) livrar a criança e adolescente de toda a forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Crianças e adolescentes têm primazia em receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias, precedência no atendimento por serviços públicos ou de relevância pública, destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e juventude, programas de prevenção e atendimento especializado aos jovens dependentes de entorpecentes e drogas afins. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) estabelece um rol de direitos exclusivos dessas pessoas, bem como regras especiais para o adolescente infrator. Considera-se criança a pessoa de até doze anos de idade, e adolescente aquela de entre doze e dezoito anos. O ECA também regula casos excepcionais de jovens que receberam medidas que se esgotarão até depois dos dezoito anos, como no caso do prolongamento da medida de internação e no caso de assistência judicial. 14 4.1 - ATO INFRACIONAL Ato infracional é a ação tipificada como contrária à lei que tenha sido praticada pela criança ou adolescente. São inimputáveis todos os menores de dezoito anos e não poderão ser condenados a nenhuma pena. Recebem, portanto, tratamento legal diferente dos réus imputáveis (maiores de dezoito anos) a quem cabe a penalização. A criança acusada de crime deverá ser encaminhada à presença do Conselho Tutelar ou Juiz da Infância e da Juventude. Se efetivamente praticou ato infracional, serlhe-á aplicada medida especial de proteção como orientação, apoio e acompanhamento temporário, freqüência obrigatória a ensino fundamental, requisição de tratamento médico e psicológico, entre outras medidas. Adolescente em caso de flagrância de ato infracional será levado à autoridade policial especializada. Os adolescentes não são igualados a réus ou indiciados nem são condenados a nenhuma pena (reclusão e detenção), como ocorre com os maiores de dezoito anos. Recebem medidas socioeducativas, sem caráter de apenação. É ilegal a apreensão do adolescente para averiguação. Fica apreendido, e não preso. A apreensão somente ocorrerá, quando for em flagrância ou por ordem judicial, e, em qualquer das hipóteses, esta apreensão será comunicada, de imediato, ao juiz competente, bem como à família do adolescente. 4.2 Apreensão do adolescente infrator A autoridade policial deverá averiguar a possibilidade de liberar imediatamente o adolescente. Caso a detenção seja justificada como imprescindível a investigações e manutenção da ordem pública, a autoridade policial deverá comunicar aos responsáveis pelo adolescente, assim como informá-lo de seus direitos, como o de ficar calado se quiser, ter advogado, ser acompanhado pelos pais ou responsáveis. Após a apreensão, o adolescente será imediatamente conduzido à presença do promotor de justiça, que poderá promover o arquivamento da denúncia, conceder remissão-perdão ou representar ao juiz para aplicação de medida socioeducativa. 4.3 Medidas aplicadas aos adolescentes O adolescente que cometer ato infracional estará sujeito às seguintes medidas socioeducativas: advertência, liberdade assistida, obrigação de reparação do dano, prestação de serviços à comunidade, internação em estabelecimento especial, entre outras. 5 - COMUNIDADE LGBTT E HOMOSSEXUAIS Os registros arquelógicos mais antigos onde se interpreta uma conotação homoerótica apontam para 12.000 A.C. Civilizações antigas da Índia, Egito, Grécia, América têm registros históricos de períodos onde a homossexualidade era retratada em cerâmica, escultura e pinturas. Entende-se que em vários períodos da história a homossexualidade era admitida em várias civilizações. Acredita-se que o primeiro código penal que punia a homossexualidade foi editado no império de Gengis Khan ao proibir asodomia com a pena de morte. No ocidente, as primeiras edições de leis que puniam a sodomia datam de 1.533 através da edição do código "Buggery Act" de 1.533 pelo Rei Henrique VIII da Inglaterra e de alterações no Código Penal de Portugal, também em 1.533, realizadas por influência da Inquisição. As leis que proibiam a sodomia, sobretudo nas relações homossexuais, passaram a ser editadas em vários países ocidentais. Considerando que tanto a Inglaterra, Portugal e Espanha eram grandes potências colonizadoras na época, as leis que proibiam as relações homossexuais também foram impostas em suas colônias, tal como se verifica com a edição da Seção 377 do Código Penal Indiano, inspirada no código "Buggery Act" da Inglaterra. As civilizações pré-coloniais da América do 15 Sul, colonizadas principalmente por portugueses e espanhóis também foram introduzidas aos novos costumes. No mesmo sentido, a Alemanha, edita o Parágrafo 175 em 1.871. Apesar de sucessivas tentativas de reverter o Parágrafo 175 em 1.907 e1.929 ela acaba sendo mantida e posteriormente utilizada pelo nazismo para punir também os homossexuais. Após a queda do nazismo, os homossexuais condenados deixaram os campos de concentração mas continuaram a cumprir as penas previstas pelo Parágrafo 175. Num caminho semelhante de punir a homossexualidade, as teorias psicológicas vigentes na época passaram a privilegiar o entendimento de que a homossexualidade era uma doença mental. Vários métodos psiquiátricos de cura da "perversão" foram sugeridos, incluindo a castração, aterapia de choque e a lobotomia. Nenhuma dessas técnicas, no entanto, teve o efeito pretendido. Sigmund Freud contribuiu para que a idéia se transformasse, embora se considere fundamental os estudos de Alfred Kinsey (1948) para a revisão das teorias psicológicas vigentes na época. Os movimentos gays, por sua vez, começaram a desmascarar pressupostos errôneos sobre sua vida, seus sentimentos e ações. Um dos protestos pioneiros pelos direitos homossexuais foi realizado na cidade de Nova Iorque em 1976. Em 15 de dezembro de 1973, a American Psychiatric Association já havia retirado a homossexualidade da lista de distúrbios mentais. A partir daí, os entendimentos passaram a abordar a ótica do que se considerava patológico e provocado pelo homossexualismo era fruto do estigma social, que não permitia aos gays estabelecerem sua identidade pessoal e social, ou seja, a neurose podia acometê-los tanto quanto aos heterossexuais. A exclusão da homossexualidade como doença mental foi revista pelaOrganização Mundial de Saúde (OMS) apenas em no dia 17 de maio de 1990 e ratificada em1992. A reversão do entendimento da homossexualidade como uma doença mental para um comportamento sexual possível entre seres humanos foi fundamental para que vários países pudessem rever as leis que puniam a homossexualidade, garantindo em alguns casos os mesmos direitos auferidos aos heterossexuais. O movimento GLBT no Brasil O termo atual oficialmente usado para a diversidade no Brasil é LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e trangêneros). A alteração do termo GLBT em favor de LGBT foi aprovada na 1ª Conferência Nacional GLBT realizada em Brasília no período de 5 e 8 de junho de 2008. A mudança de nomenclatura foi realizada a fim de valorizar as lésbicas no contexto da diversidade sexual e também de aproximar o termo brasileiro com o termo predominante em várias outras culturas. Em suma, seria melhor defini-los como Movimento dos Não-Heterossexuais o que seria um meio de exclusão, que não tem nada a ver com a proposta que é justamente de inclusão de todos que se identificam com a causa, direta ou indiretamente. Inicialmente, o termo mais comum era GLS, sendo a representação para: gays, lésbicas. Com o crescimento do movimento contra a homofobia e da livre expressão sexual, a sigla GLS foi alterada para GLBS, ou seja Gays, Lésbicas, Bissexuais que logo foi mudado para GLBT e GLBTS com a inclusão da categoria dos transgêneros(travestis, transexuais, transformistas, crossdressers etc.). A sigla GLBT ou GLBTS perdurou por pouco tempo, pois o movimento lésbico ganhou mais sensibilidade dentro do movimento homossexual e a sigla foi alterada para LGBTS. Atualmente a sigla mais completa em uso pelos movimentos homossexuais é LGBTTIS, que significa: Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgéneros, Transexuais, Intersexuais, sendo que o “S” de pode ser substituído pela letra “A” de Asexuais ou ainda acrescido a Letra “Q” de Queer que não é muito comum, porém é utilizada em alguns países e por alguns grupos do movimento gay. A inclusão do “L” na frente da sigla do movimento gay deu-se pelo grande crescimento do movimento lésbico e pelo apoio da comunidade gay às mulheres homossexuais. 16 Enfim, a sigla LGBT, ou ainda LGBTT que significa Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Trans gêneros, embora se refira apenas seis, é utilizado para identificar todas as orientações sexuais minoritárias e manifestações de identidades de género divergentes do sexo designado no nascimento. Já LGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transgêneros e Intersexuais) é a sigla mais utilizada por Organimos internacionais e entidades governamentais como ONU, Mercosul e Europa. Ela foi criada para um padrão internacional para identificar pessoas desta comunidade. Entidades como a Anistia Internacional usam a sigla LGBTI em processos e pesquisas. Organizações Nacionais Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT) Articulação Brasileira de Lésbicas (ABL) Associcação Brasileira de Gays (Abragay) Articulação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) Assembleia Nacional de Estudantes - Livre (Anel) Grupo E-jovem de Adolescentes Gays, Lésbicas e Aliados (E-Jovem) Liga Brasileira de Lésbicas (LBL) União Nacional dos Estudantes (UNE) União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) Articulação Brasileira de Gays (Artgay) Articulação Brasileira de Jovens Gays (Artgay Jovem) Complexidade dos direitos homossexuais A questão dos direitos homossexuais no mundo é complexa: ela está amarrada à cultura e história de cada país que têm leis divergentes sobre o assunto. No Brasil as relações homossexuais foram proibidas entre 1.533 e 1.830. Contudo, a questão da transexualidade permaneceu obscura por muitos anos além, evoluindo significativamente apenas nos últimos 30 anos. Segundo COUTO (1999), a primeira cirurgia, que prefere chamar de adequação sexual, realizada no Brasil foi em 1.971 pelo Dr. Roberto Farina. O custo desse pioneirismo foram dois processos, um criminal e outro no Conselho Federal de Medicina. O médico foi considerado culpado nos dois processos. No Brasil, algumas transexuais como Roberta Close realizaram cirurgias no exterior, pois essas cirurgias eram proibidas no país na década de 1.970. Esses exemplos mostram o quanto é complexa a questão dos direitos homossexuais no mundo e o quanto as leis rígidas de um lado e permitidas de outro lado. O termo homossexual foi criado por um médico húngaro , Karoly Kertbeny, ao saber que, em 1869, o código penal da Prússia criou alguns artigos que criminalizavam o sexo praticado entre homens. O médico, insatisfeito com a nova lei , enviou uma carta ao Ministro da Justiça prussiano, argumentando que a homossexualidade era uma propensão inata, uma tendência com a qual uma parte dos seres nascia. Essa propensão era incapaz de seduzir a maioria dos homens, porque era considerada naturalmente estranha a eles, presumindo que a atração pelo sexo oposto era a sexualidade normal. A partir de então, passou-se a designar como homossexuais as pessoas do mesmo sexo que sentiam atração entre si. Em 1974, a Associação Americana de Psiquiatria (AAP) deixou de considerar a homossexualidade uma doença. Dezenove anos depois , em 1993, a Organização Mundial da Saúde (OMS) retira a homossexualidade da categoria das doenças mentais. Em 1985, o Conselho Federal de Medicina (CFM) reconhece que a homossexualidade não é um desvio nem transtorno 17 mental. Casamento entre pessoas do mesmo sexo No Brasil o Casamento entre pessoas do mesmo sexo até 2011 era juridicamente inexistente, mesmo se realizado num país que o reconheça. Atualmente, com a decisão do STF sobre a união estável entre homossexuais, o casamento tornou-se viável, porém sendo um direito variável de acordo com a região. Não há uma garantia pela Constituição de que ele ocorra em todo o país. Juridicamente é reconhecido, porém o congresso nacional não o conhece como um direito cívico da comunidade LGBTT. Em Portugal, desde 2010, o casamento entre pessoas do mesmo sexo é permitido, embora não seja autorizada a adoção por parte de homossexuais casados. A Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – ABGLT foi criada em 31 de janeiro de 1995, com 31 grupos fundadores. Hoje a ABGLT é uma rede nacional de 308 organizações afiliadas. É a maior rede LGBT na América Latina. A missão da ABGLT é promover ações que garantam a cidadania e os direitos humanos de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais, contribuindo para a construção de uma sociedade democrática, na qual nenhuma pessoa seja submetida a quaisquer formas de discriminação, coerção e violência, em razão de suas orientações sexuais e identidades de gênero. Atualmente as linhas prioritárias de atuação da ABGLT incluem: O monitoramento da implementação das decisões da I Conferência Nacional LGBT; O monitoramento do Programa Brasil Sem Homofobia; O combate à homofobia nas escolas; O combate à Aids e outras doenças sexualmente transmissíveis; O reconhecimento de Orientação Sexual e Identidade de Gênero como Direitos Humanos no âmbito do Mercosul; Advocacy no Legislativo, no Executivo e no Judiciário; A capacitação de lideranças lésbicas em direitos humanos e advocacy; A promoção de oportunidades de trabalho e previdência para travestis; A capacitação em projetos culturais LGBT. 5.1 - DEFINIÇÕES DOS HOMOSSEXUAIS a) Gay - Homossexual Masculino: Não- necessariamente afeminado. Barbie – Gay/homossexual masculino fisiculturista/malhador ou praticante de artes marciais. Ex.: Jiu-Jitsu Gay afeminado – usa artifícios femininos como peças do vestuário, brincos e anéis, e tem trejeitos ao andar e ao expressar-se. b) Lésbica - Homossexual Feminino: Não- necessariamente masculinizada. Quando profissional do sexo – trabalha em prostíbulos, boates de “strip-tease”, etc. 18 Quando masculinizada – usa artifícios masculinos, como peças do vestuário (pochete, camisa esporte ou social, camiseta regata) e tem trejeitos ao andar e ao expressar-se. c) Homossexual masculino que se traveste de mulher: “Travesti” Estão travestidos geralmente vinte e quatro horas por dia, transitam mais durante à noite e, em sua maioria, moram em casas de diárias e são “cafetinados” por outro travesti ou mulher. Noventa por cento vivem exclusivamente do mercado do sexo nas vias públicas ou negociam por telefone dessas “agências” de programa. d) Transexual – “clinicamente” é heterossexual e, só após análise por equipe multidisciplinar de psicólogos, psiquiatras, médicos de diferentes áreas, pode-se diagnosticá-lo. Mesmo identificado, existe a dificuldade de atrelá-lo à nova identificação (quando adequado sexualmente) no jurídico. Fica a critério do Jurista a análise e aprovação de nova identidade adequada ao sexo transmutado. Transexual masculino: adequação da genitália masculina ao sexo feminino Transexual feminino: adequação da genitália feminina ao sexo masculino. Obs.: A transexualidade é psíquica, e não genital. Existem transexuais que ainda não foram operados ou aguardam a possibilidade da cirurgia. e) Bissexuais – Pesquisas demonstram que parte da heterossexualidade tende à bissexualidade, em algum ou todo o tempo da vida. Exemplos são homens heterossexuais que procuram realizar “fantasias sexuais” com travestis, garotos de programa ou mulheres que atuam como homens (usando próteses artificiais para penetração). A diversidade sexual é uma realidade em nossa sociedade. O cidadão, muitas vezes, tem seus direitos desrespeitados pelo fato de ser homossexual. A falta de informação da sociedade, que em sua maioria é homofóbica (discrimina e não gosta do homossexual), o preconceito e o despreparo dos policiais que compõem o sistema de segurança e outros setores públicos e privados, tornam a vida do cidadão homossexual extremamente penosa. O policial, como promotor dos diretos humanos e pedagogo da cidadania, deve lidar com o cidadão, respeitando sua orientação sexual e dando-lhe a atenção devida, especialmente quando se fizer necessária a intervenção policial em seu cotidiano. O cidadão homossexual ordeiro deve ser tratado de forma respeitosa, sem gracejos nem críticas, pelos policiais que o abordam ou são acionados por ele, em situação de vítima da criminalidade e abuso de poder. Em abordagens a homossexuais do sexo masculino ou feminino, o policial deve conduzir-se de acordo com as seguintes orientações contidas na lei estadual número 14.170, de 15/01/02 (determina a imposição de sanções à pessoa jurídica por ato discriminatório praticado contra a pessoa, em virtude de sua orientação sexual): a) se o cidadão homossexual teve um direito seu desrespeitado como vítima de crimes diversos, o policial que por ele for procurado deve tratá-lo com respeito, sem constrangê-lo, ainda mais, com gracejos ou descrédito de seus apelos; b) ao suspeitar de homossexual masculino, o policial deverá, da maneira menos constrangedora possível, proceder à revista evitando apertar-lhe os “seios”, se este os tiver, podendo realizar uma vistoria entre os mamilos como é procedida em mulher; no restante do corpo a busca se procede normalmente; c) no caso de busca em homossexual feminino (lésbica), evitar apalpar seios e partes íntimas; 19 d) ao detectar homossexual feminino (lésbica), travesti ou transexual, evitar o constrangedor preconceito social, exemplo: ao ler o nome de registro na Carteira de Identidade, não o fazer em voz alta a outros policiais nem ao público presente, com zombaria; e) não cabe ao policial externar o que pensa, com posições pessoais, religiosas e morais sobre a homossexualidade, e sim advertir, orientar e cumprir aquilo que por lei lhe for exigido, aplicando assim os devidos procedimentos; f) o policial não deve coibir manifestações de afeto entre homossexuais (mãos dadas, beijo na boca, abraços, entre outros), em logradouro público, estabelecimento público ou estabelecimento aberto ao público (se solicitado a coibir, deve orientar o solicitante que a manifestação de afeto não é crime, mas sua coibição, sim; sexo explícito é diferente de manifestação de afeto; no primeiro caso, é necessária a providência policial). 6 - PESSOAS COM DEFICIÊNCIA FÍSICA E SOFRIMENTO MENTAL 6.1 - DEFICIÊNCIA É toda a perda ou anormalidade de estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica. Modalidades: a) lingüística: mudo; b) sensorial: auditiva, visual; c) mental: síndrome de down, oligofrenias, síndrome de autismo, algumas psicoses; d) física: hemiplegia (paralisia de um dos lados do corpo), paraplegia, amputações de membros ou partes do corpo; e) neurológica: paralisia cerebral; f) alterações do sistema nervoso central; g) psicológicas: distúrbios comportamentais do aprendizado e da sociabilidade; h) múltipla: tetraplegia+cegueira+surdez. 6.2 - DOENÇA É toda a perturbação da saúde, moléstia, mal, enfermidade, temporária ou definitiva. 6.3 - INCAPACIDADE Toda a restrição ou falta (por uma deficiência) da capacidade de realizar uma atividade, na forma ou na medida que se considera normal a um ser humano. 6.4 - IMPEDIMENTO Situação desvantajosa para determinado indivíduo, em conseqüência de deficiência ou de incapacidade que limita ou impede o desempenho de papel que é normal em seu caso ( em função de idade, sexo e fatores sociais e culturais). 20 6.5 - CUIDADOS NO TRATO COM PESSOA DEFICIENTE “Existe atualmente um grande número, que aumenta dia a dia, de pessoas com deficiência. Está confirmada, pelos resultados de pesquisas com segmentos da população e por investigações de respeitados pesquisadores, a estimativa de 500 milhões”. As causas das deficiências variam em todo o mundo: o mesmo acontece com predominância e as conseqüências das deficiências. Essas variações são conseqüências das diferentes circunstâncias socioeconômicas e das diferentes disposições que cada sociedade adota para alcançar o bem-estar de seus membros. Segundo estudo realizado por peritos, estima-se que pelo menos 350 milhões de pessoas com deficiência vivem em regiões onde não há disponibilidade de serviços necessários para ajudá-las a superar suas limitações. Grande parte dessas pessoas está sujeita a barreiras físicas, culturais e sociais que dificultam sua vida, mesmo quando há ajuda para sua reabilitação. Para alcançar os objetivos de “igualdade” e “plena participação”, não bastam medidas de reabilitação voltadas para o indivíduo com deficiência. A experiência tem demonstrado que é o meio que determina, em grande parte, o efeito de uma deficiência ou incapacidade na vida diária da pessoa. Uma pessoa torna-se vítima do impedimento, quando lhe são necessários aos aspectos fundamentais da vida, inclusive, a vida familiar, a educação, o emprego, a moradia, a segurança econômica e pessoal, a participação em grupos sociais e políticos, nas atividades religiosas, nas relações afetivas e sexuais, no acesso a instalações públicas, na liberdade de movimentos e no sistema geral da vida diária. O policial atua como agente da cidadania e, como tal, deve saber comportar-se adequadamente em ocorrência que envolva pessoas deficientes físicas e com sofrimento mental, dando-lhes tratamento digno, encaminhando-as corretamente e solucionando seus problemas. Cuidados que o policial deve ter ao abordar ou auxiliar uma pessoa deficiente: 6.5.1 PESSOA QUE USA CADEIRA DE RODAS a) não segure nem toque na cadeira de rodas. Ela é considerada como se fosse parte do corpo da pessoa. Apoiar-se ou encostar-se na cadeira é o mesmo que se apoiar-se ou encostar-se na pessoa; b) se desejar, ofereça ajuda, mas não insista. Se precisar de ajuda, ele(a) aceitará seu oferecimento e lhe dirá o que fazer. Se você forçar esta ajuda, isso pode, às vezes, até mesmo, causar insegurança; c) não tenha receio de usar palavras como "caminho" ou "correr". As pessoas com deficiência também as usam; d) se a conversa durar mais do que alguns minutos, sente-se, se possível, de modo que fique no mesmo nível do olhar do interlocutor. Para uma pessoa sentada, não é confortável ficar olhando para cima, durante um período relativamente longo; e) não estacione viatura em lugares reservados às pessoas com deficiência física. Tais lugares são reservados por necessidade, não por conveniência. O espaço reservado é mais largo do que o usual, a fim de permitir que a cadeira de rodas fique ao lado do automóvel e a pessoa com deficiência física possa sair e sentar-se na cadeira de rodas, e vice-versa. Além disso, o lugar reservado é próximo à entrada de prédios, para facilitar o acesso dessas pessoas; f) ao ajudar uma pessoa com deficiência física a descer uma rampa inclinada ou degraus altos, é preferível usar a marcha a ré para evitar que, pela excessiva inclinação, a pessoa perca o equilíbrio e caia para frente; 21 g) quando se tratar de pessoa suspeita, deverão ser seguidos todos os procedimentos acima, e efetuada a busca pessoal e na cadeira de rodas. 6.5.2 PESSOA QUE USA MULETAS a) acompanhe o ritmo de sua marcha; b) tome cuidados necessários para que ele(a) não tropece; c) deixe as muletas sempre ao alcance das suas mãos; d) quando se tratar de pessoa suspeita, deverão ser seguidos todos os procedimentos acima, e efetuada a busca pessoal , tomando-se cuidado com possíveis golpes de muleta do suspeito e com pontas ou lâminas que possam estar escondidas no interior da muleta. 6.5.3 PESSOA COM DEFICIÊNCIA VISUAL a) ofereça sua ajuda, sempre que um(a) cego(a) parecer necessitar; b) mas não ajude, sem que ele(a) concorde. Sempre pergunte, antes de agir. Se você não souber em que e como ajudar, peça explicações de como fazê-lo; c) para guiar uma pessoa cega, segure-a pelo braço, de preferência no cotovelo ou no ombro. Não a pegue pelo braço. Além de perigoso, isso pode assustá-la. À medida que encontrar degraus, meios-fios e outros obstáculos, vá orientando-a. Em lugares muito estreitos para duas pessoas caminharem lado a lado, ponha seu braço para trás, de modo que a pessoa cega possa segui-lo. Ao sair de uma sala, informe-o ao cego(a), pois é desagradável para qualquer pessoa falar para o vazio. Não se preocupe ao usar palavras como "cego", "olhar" ou "ver": os(as) cegos(as) também as usam; d) ao explicitar direções a uma pessoa cega, seja o mais claro e específico possível. Não se esqueça de indicar os obstáculos que existem no caminho que ela vai seguir. Como algumas pessoas cegas não têm memória visual, não se esqueça de indicar as distâncias em metros (p.ex.: "uns vinte metros para frente"). Mas, se você não sabe corretamente como direcionar uma pessoa cega, diga algo como "eu gostaria de ajudá-lo. Mas como é que devo descrever as coisas?" Ele (ela) lhe dirá; e) ao guiar um(a) cego(a) para uma cadeira, guie sua mão para o encosto da cadeira e verifique se a cadeira tem braços ou não. Num restaurante, é de boa educação que você leia o cardápio e os preços; f) uma pessoa cega é como outra qualquer, só que não enxerga. Trate-a com o mesmo respeito com que trata uma pessoa que enxerga; g) quando estiver em contato social ou trabalhando com pessoas com deficiência visual, não pense que a cegueira possa vir a ser problema. Por isso, nunca as exclua de participar plenamente nem procure minimizar tal participação. Deixe que decidam como participar. Proporcione à pessoa cega a chance de ter sucesso e de falhar, tal como qualquer outra pessoa; h) quando são pessoas com visão subnormal (alguém com sérias dificuldades visuais), proceda com o mesmo respeito, perguntando-lhes se precisam de ajuda, quando notar que elas estão em dificuldade; i) quando se tratar de pessoa suspeita, deverão ser seguidos todos os procedimentos acima, e efetuada a busca pessoal , tomando-se cuidado de avisar ao suspeito que será procedida uma busca por outro policial, e que ele fique calmo. 22 6.5.4 PESSOA COM DEFICIÊNCIA AUDITIVA a) fale claramente, distinguindo palavra por palavra, mas não exagere. Fale com velocidade normal, salvo quando lhe for pedido para falar mais devagar; b) cuide para que o (a) surdo(a) enxergue sua boca. A leitura dos lábios fica impossível, se você gesticula, segura alguma coisa na frente de seus próprios lábios, ou fica contra a luz; c) fale com tom normal de voz, a não ser que lhe peçam para levantar a voz; d) gritar nunca adianta; e) seja expressivo. Como os surdos não podem ouvir as mudanças sutis do tom de sua voz, indicando sarcasmo ou seriedade, a maioria deles(as) lerá suas expressões faciais, seus gestos ou os movimentos de corpo, para entender o que você quer comunicar; f) se você quer falar com uma pessoa surda, chame a atenção dela, sinalizando com a mão ou tocando em seu braço. Enquanto estiverem conversando, mantenha contato visual. Se você olhar para outro lado, enquanto está conversando, o(a) surdo(a) pode pensar que a conversa terminou; g) se você tiver dificuldades para entender o que uma pessoa surda está falando, sinta-se à vontade para pedir que ela repita o que falou. Se você ainda não entender, peçalhe para escrever. O que interessa é comunicar-se com a pessoa surda. O método não é o que importa; h) se o(a) surdo(a) está acompanhado(a) por um intérprete, fale diretamente à pessoa surda, não ao intérprete; i) ao planejar um encontro, lembre-se de que os avisos visuais são úteis aos participantes surdos. Se estiver previsto um filme, providencie uma narração por escrito, ou um resumo do conteúdo do filme, se não houver legenda; 6.5.5 PESSOA COM PARALISIA CEREBRAL a) a pessoa com paralisia cerebral anda com dificuldade ou não anda, podendo ter problemas de fala. Seus movimentos podem ser estranhos ou descontrolados. Ela pode, involuntariamente, apresentar gestos faciais incomuns, sob a forma de caretas. Geralmente, porém, trata-se de pessoa inteligente e sempre muito sensível – ela sabe e compreende que não é como os outros; b) para ajudá-la, não a trate bruscamente. Adapte-se a seu ritmo. Se não compreende o que ela diz, peça-lhe que repita: ELA O COMPREENDERÁ. Não se deixe impressionar por seu aspecto. Aja de forma natural... sorria...é uma pessoa igual a você. 6.5.6 PESSOA COM DEFICIÊNCIA MENTAL a) cumprimente a pessoa com deficiência mental de maneira normal e respeitosa, não se esquecendo de fazer a mesma coisa, ao despedir-se. A pessoa com deficiência mental é, no geral, bem disposta, carinhosa e gosta de comunicar-se; b) dê-lhe atenção, dirigindo-lhe palavras como: "que bom que você veio", "gostamos quando você vem nos visitar", tentando manter a conversa até quando for possível; c) seja natural. Evite a superproteção. A pessoa com deficiência mental deve fazer sozinha tudo o que puder. Ajude-a, quando realmente for necessário; d) deficiência mental pode ser conseqüência de uma doença, mas não é uma doença. É uma "condição de ser". Nunca use a expressão "doentinho(a)" ou "bobinho(a)" ,quando se 23 dirigir ou referir a uma pessoa com deficiência mental; e) deficiência mental não é doença mental; f) pessoa portadora de deficiência mental é, em primeiro lugar, uma pessoa; g) enquanto for criança, trate-a como criança. Quando for adolescente ou adulto, trate-a como tal. 6.5.7 DEFICIÊNCIA MENTAL SEVERA Existem deficiências mais graves; como o Autismo e outras , em que o indivíduo não interage com o mundo de forma adequada, apresenta sinais de agitação, não consegue comunicar-se, não tem noção de perigo e, apesar de ser dócil, é arredio e reage com agressividade em situações adversas. a) o policial não poderá subestimar tais indivíduos e deverá ter total atenção na condução deles , para evitar que se machuquem ou causem acidente; b) ao conduzir essas pessoas a pé, o policial deve ter cuidados, ao atravessar ruas, pois elas poderão lançar-se na frente de veículos em movimento; c) essas pessoas deverão ser conduzidas a um centro neuropsiquiátrico, até que seus parentes sejam encontrados. 7 – POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA 7.1 – POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA No processo de identificação do perfil da população em situação de rua, contingente significativo da população urbana, esbarra-se numa questão anterior, que é a definição de um conceito de população em situação de rua. Desde o final da década de oitenta, estudiosos do tema e entidades que desenvolvem ações com moradores de rua vêm desenvolvendo conceitos. Esse processo não é muito fácil devido as diversas especificidades relacionadas a esse grupo de indivíduos e os vários perfis existentes no interior dos grupos. Grupo populacional heterogêneo, que tem em comum a pobreza absoluta, os vínculos familiares fragilizados ou interrompidos e não possui moradia convencional regular e faz da rua espaço de moradia e sustento por contingência temporária ou de forma permanente, podendo utilizar albergues para pernoitar e abrigos, repúblicas, casas de acolhida temporária ou moradias provisórias, no processo de construção de saída das ruas. A conceituação de Silva (2006) é uma das mais abrangentes e vem balizando uma série de ações e estudos. Os moradores de rua se encontram num estágio de grande vulnerabilidade social e, muito comumente, possuem um histórico de consecutivas perdas e uma série de rompimentos com o trabalho, a família e, por fim, com a própria moradia. Normalmente sobrevivem com pouca ou nenhuma renda. É comum trabalharem como catadores de material reciclável nas ruas e lixões ou sobreviverem de pequenos trabalhos artesanais e outras atividades, como lavar e vigiar carros, por exemplo. Há os que, já decaídos, vivem de pedir esmolas. Existem também os trabalhadores sazonais e pessoas que não se fixam numa cidade. Esses últimos recebem o apelido de trecheiros. Dentre os moradores de rua existem várias realidades e situações diferenciadas, especificidades, o que torna esse contingente bastante heterogêneo. São vários os casos de pessoas portadoras de sofrimento mental, dependência química e situações de conflitos familiares que levam as pessoas a saírem de casa. Há também os que, por anos a fio, pernoitam em albergues públicos, sem perspectiva de mudança significativa da condição na qual se 24 encontram. São trabalhadores excluídos do mercado de trabalho; migrantes que vêm para os grandes centros em busca de melhor qualidade de vida; famílias que perderam o poder aquisitivo e as condições de subsistência. (PASTORAL DO POVO DA RUA, 2003) Assim como a conceituação da população em situação de rua não é tarefa fácil, o levantamento de dados para traçar o perfil também não é. Todas as pesquisas desenvolvidas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, incluindo o censo, são de caráter domiciliar. Conforme demonstra a tabela 01, em quatro capitais brasileiras foram desenvolvidas duas pesquisas censitárias sobre população em situação de rua. Ainda segundo a contagem, a maioria (88,5%) da população em situação de rua não é atingida por nenhum programa governamental. Dos que recebem algum benefício, 3,2% recebe aposentadoria e o Benefício de Prestação Continuada – BPC alcança 1,3% dessa população. 7.2 – CASOS – A REALIDADE DO POVO VIVENDO NA RUA Os casos que conhecerá são reais, porém, por questão de ética, nomes de pessoas e locais foram omitidos ou trocados. Esses casos não têm cunho depreciativo ou crítico, mas sim, didático, uma vez que irão remeter a questões, reflexões e sugestões de práticas para que você possa estar mais preparado diante das situações que por ventura vier a enfrentar. Anote as suas respostas, pois na próxima aula irá compará-las com o ordenamento jurídico sobre essas questões. Caso1: Policiais tentam abrigar duas moradoras de rua. Numa das noites mais frias do inverno de 2006, policiais que faziam plantão, ao passarem pelas imediações do Hospital das Clinicas, se sensibilizaram com a situação de Dona Marilda, de 72 anos, e de Dona Chica, de mais ou menos 50 anos, que encontrava-se com dificuldade de locomover-se por ter uma perna amputada. Segundo Dona Chica, fazia tanto frio naquela noite que dois PMs que faziam “batida” por ali na noite anterior, sentiram pena delas e, por volta das 22h, as colocaram na viatura e rodaram a cidade toda, procurando um abrigo para deixá- las. Primeiro foram em um abrigo conveniado com o município que não as acolheu com a justificativa de que não tinham documentos e pelo fato de não terem condição de acolher pessoas com dificuldade de locomoção. A segunda tentativa foi numa república feminina, que também não as acolheu pelo fato de não ser objetivo acolher pessoas para pernoite e ter metodologia própria para seleção e recebimento de mulheres, além das duas não terem perfil para a casa. Em terceira e última tentativa, foram numa instituição católica, onde também não foram acolhidas pelo fato da casa atender apenas homens. E assim, segundo Penha, depois de rodarem a cidade numa viatura, por quase 12 horas, foram deixadas no mesmo lugar onde estavam – marquise do Hospital das Clínicas. E aquela foi mais uma noite em que sentiram muito frio. Pergunta-se: 1. Nesse caso, o que você acha que faltou para que as senhoras fossem acolhidas? 2. Você faria o mesmo por elas? Reflita! Casos como esses são comuns em nossas cidades, mas será que não merecem atenção especial por parte da segurança pública? Pratique! Procure localizar em sua cidade abrigos e albergues que recepcionem pessoas com trajetória de rua, onde possa em uma situação como essa encaminhá-las. 25 Caso 2: PM é solicitada para retirar moradores de rua de um casarão ocupado. Um grupo de cerca de 20 pessoas, entre elas solteiros e famílias com crianças, morava a aproximadamente dois anos em um casarão abandonado. Durante esse período, os mesmos utilizam os serviços de saúde e escola da região. Os adultos trabalhavam como catadores ou flanelinhas nas proximidades. O imóvel é colocado á venda e a pessoa interessada em comprá-lo tentou negociar com as famílias sua saída, sem êxito. Então, o comprador buscou apoio no poder público que, com laudo da Defesa Civil, montou operação para retirar as pessoas. Ao invés de se ajuizar uma ação de reintegração de posse ou uma ação reivindicatória, o proprietário se utiliza de via de duvidosa legalidade. Aciona a Defesa Civil e esta mobiliza a Polícia Militar, com o fim de desalojar as famílias de sua posse, sem qualquer mandado judicial. Como estratégia, as famílias foram avisadas que seriam retiradas em um dia, quando na verdade seria feito no dia anterior. Embora não tivesse ordem judicial, a gerência da Regional solicitou apoio da PM para retirada. Nesse caso, a presença da polícia garantia a segurança dos funcionários da prefeitura, mas também intimidava as famílias, forçando-as a aceitarem a desocupação. Caso 3: Moradores de um condomínio residencial chamam a polícia para retirar casal de moradores de rua que dorme na marquise do prédio. Depois de acionar a paróquia, o serviço de abordagem da Secretaria Municipal de Assistência Social do Município e não obter o resultado esperado – a retirada do casal que há mais de mês estava dormindo sob a marquise de um prédio situado em região nobre da cidade – o síndico chamou a polícia, alegando que os mesmos estavam trazendo risco para os moradores. Ao chegar no local, a polícia encontrou o casal acordando e se preparando para sair para trabalhar. Ambos eram catadores de material reciclável, inclusive dormiam sob o carrinho e tinha com eles um cachorro. Ao serem abordados, Ana foi logo mostrando seus documentos, enquanto João, exaltado, dizia que os fiscais da prefeitura, em abordagem anterior, lhe haviam seqüestrado os documentos e o próprio carrinho cheio de papel. Revoltado perguntava ao policial: E o senhor quer o quê? Vão prender um trabalhador? Pergunta-se: 1. Como você agiria numa situação assim? 2. Qual resposta daria para João? Reflita! A situação de rua não retira de uma pessoa sua dignidade a ponto de ser tratada como um infrator em potencial. Por isso, é preciso entender a situação de rua como um problema social que requer diálogo, resolução pacífica de conflitos e encaminhamentos adequados. É necessária uma forma enérgica, mas cordial de falar, e é imprescindível que você jamais deixe de considerar a condição de cidadão dessas pessoas. Pratique! Procure saber se em sua cidade existe algum órgão que lida diretamente com a melhoria das condições das pessoas em situação de rua, como a Pastoral de Rua ou uma sede do Movimento Nacional da População de Rua. Faça contatos com eles e procure estar informado de como encaminhar adequadamente como as desse caso. 7.3 – POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA: MARCO LEGAL As pessoas que se encontram em situação de rua constituem um grupo marcado por uma 26 invisibilidade social. A realidade vivida por elas, conforme ilustrado anteriormente, representa grave violação a diversos dispositivos constitucionais, dos quais se destacam: 1 – Princípio da dignidade da pessoa humana e da vedação à discriminação – Constituição Federal, artigo 1º, nos seus incisos II e III: são fundamentos do nosso país a cidadania e a dignidade da pessoa humana. Portanto, todos podem buscar os seus direitos (especialmente, o direito de viver, de estar, permanecer em um lugar) e devem ser tratados (as) com respeito pela sua dignidade de pessoa, independentemente da aparência ou qualquer outra condição física, psicológica ou social. 2 – Princípio da Justiça Social – Constituição Federal – artigo 3º, incisos I, III, IV, que diz que são objetivos fundamentais do nosso país: construir uma sociedade livre, justa e solidária, erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais, e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Assim, quando uma pessoa estiver vivendo em condições sociais extremamente precárias, deve ser atendida e encaminhada aos órgãos competentes para que possa recuperar as condições de vida digna e, assim, o Estado possa cumprir um dos seus objetivos fundamentais, o da justiça social. 3 – Princípio da igualdade ou isonomia – Constituição Federal – O artigo 5º diz que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Isto significa que as pessoas em situação de rua são cidadãs como qualquer outra pessoa que mora nesse país, e assim devem ser tratadas pelas autoridades e por todas as pessoas, e não com menosprezo ou humilhações por parte de qualquer um, seja particular, seja servidor público. 4 – Princípio da legalidade – Constituição Federal, artigo 5º, inciso II, diz que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, ou seja, as pessoas na rua não podem ser obrigadas a fazer nada que não seja exigido por lei, e são livres para estar em qualquer local, sem que a sua presença signifique desrespeito à lei, exceto se estiverem praticando um crime. Ao mesmo tempo, o servidor público não pode aplicar nenhuma sanção ou penalidade que não esteja prevista em lei e não tenha sido definida por um juiz, em sentença fundamentada e transitada em julgado. 5 – Princípio da vedação à tortura e tratamentos desumanos ou degradantes – Constituição Federal, artigo 5º, inciso III, diz que ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante. Isto significa que, como qualquer cidadão do nosso país, a pessoa em situação de rua deve ser tratada com respeito, sem agressões de qualquer natureza. 6 – Princípio da inviolabilidade do direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem – Constituição Federal, artigo 5º, inciso X, diz que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, sendo assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Quer dizer que os pertences (por mais humildes e precários que sejam), quando for necessária e justificada uma revista, devem ser tratados como os pertences de qualquer cidadão, e devolvidos no mesmo estado em que se encontravam, sendo abusiva qualquer exigência de taxa ou comprovante de propriedade. 7 – Princípio da função social da propriedade – Constituição Federal, artigo 5º, incisos XXII e XXIII, diz que é assegurado o direito de propriedade, mas que essa propriedade deverá atender à sua função social. Assim, quando qualquer morador da cidade estiver próximo ou nas dependências de uma propriedade privada não ocupada ou não utilizada, sem praticar nenhum delito ou tumulto anormal, estará apenas dando a esse imóvel (ou bem) uma utilidade social, que é dar guarida (acolhida) a um de seus beneficiários, e poderá estar aguardando o reconhecimento desse direito pelo Poder Judiciário. 27 Conclusão Vale lembrar que os servidores públicos que atuam nas ruas e que, no seu trabalho, lidam com as pessoas em situação de rua, são operadores das normas legais. Nessa condição, em diversas situações, eles são intérpretes dessas normas, e podem encontrar saídas e soluções ditadas pelo bom senso para os problemas que lhes são trazidos pela população, em vez de aumentar o problema com uma nova violação de direitos. Ao mesmo tempo, devem buscar aplicá-las da maneira mais adequada e humana possível, conforme estabelecem os princípios, leis e diretrizes aplicáveis à sua missão. Desse modo, em vez de provocar um aumento da insegurança e da revolta na sociedade, estarão contribuindo para recuperar nas pessoas o sentimento de confiança na justiça e nas instituições. 28