UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL
PERSONALIDADE, VALORES E CONDUTAS ANTI-SOCIAIS DE JOVENS
Tatiana Cristina Vasconcelos
JOÃO PESSOA, FEVEREIRO DE 2004
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
MESTRADO EM PSICOLOGIA SOCIAL
PERSONALIDADE, VALORES E CONDUTAS ANTI-SOCIAIS DE JOVENS
Tatiana Cristina Vasconcelos
Prof. Dr. Valdiney Veloso Gouveia
ORIENTADOR
JOÃO PESSOA, FEVEREIRO DE 2004
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Tatiana Cristina Vasconcelos
PERSONALIDADE, VALORES E CONDUTAS ANTI-SOCIAIS DE JOVENS
Banca avaliadora:
_________________________________________________
Prof. Dr. Valdiney Veloso Gouveia (Orientador)
_________________________________________________
Prof. Dr. Francisco José Batista de Albuquerque (Membro)
_________________________________________________
Prof. Dr. Prof. Bartholomeu Torres Trócolli (Membro)
_________________________________________________
Prof. Dr. Nadia Ribeiro Salomão (Suplente)
4
DEDICATÓRIA
A você.
5
6
AGRADECIMENTOS
7
8
ÍNDICE
9
10
ÍNDICE DE QUADROS E FIGURAS
11
RESUMO – O objetivo principal desta dissertação foi verificar a contribuição dos valores
humanos, dos traços de personalidade neuroticismo, extroversão e busca de sensações na
explicação das condutas anti-sociais e delitivas. Observa-se um aumento epidêmico dos
fenômenos da violência na sociedade, em que muitos jovens e adolescentes têm
apresentado comportamentos anti-sociais e até delitivos, fato que vem exigindo uma nova
postura da sociedade frente a essa problemática (ver Formiga, 2002). Estudar os
antecedentes das condutas socialmente desviantes deveria ser visto como prioritário, pois
permitiria, por exemplo, desenvolver políticas, bem como delinear programas de
prevenção e controle de alguns problemas sérios que são correlatos durante a adolescência,
como o uso ou o envolvimento com drogas (Coelho Júnior, 2001; Molina & Gómez, 1997;
Romero, Luengo & Sobral, 2001). Destarte, a fim de lograr o objetivo aqui proposto,
contou-se com a participação de 755 adolescentes e jovens de ambos os sexos, com idades
variando entre 16 e 26 anos, provenientes de instituições de ensino médio e superior da
cidade de João Pessoa. Estes responderam ao Inventário de Pesonalidade Big Five
(Gouveia, Meira, Santos, Jesus & Formiga, 2001), a Escala de Busca de Sensações
(Zuckerman, Eysenck & Eysenck, 1978), ao Questionário dos Valores Humanos Básicos
(Gouveia, 1998), a Escala de Condutas Anti-sociais e Delitivas (Seisdedos, 1988) e a
Questões Sócio-Demográficas. Os dados foram analisados através do SPSSWIN (versão
11.5) e do AMOS. Através da testagem do modelo causal foi possível verificar que os
traços de personalidade neuroticismo e busca de sensações explicam diretamente as
condutas anti-sociais, e os valores normativos o fazem em sentido inverso. Ademais,
verificou-se que as condutas anti-sociais explicam diretamente as condutas delitivas.
Diante do exposto, considera-se que tanto a personalidade quanto os valores podem ser
úteis na explicação das condutas socialmente desviantes dos jovens. No entanto, ressalta-se
que mais estudos devem ser estruturados a fim de comprovar tais relações.
Palavras-chave: Condutas Anti-sociais e delitivas, valores, personalidade, adolescentes.
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ABSTRACT – The present research ,,,,,,,,,,,,
13
INTRODUÇÃO
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Na atualidade, muitos são os adolescentes e jovens que têm apresentado
comportamentos anti-sociais e/ou violentos, fato que vem exigindo uma nova postura da
sociedade frente a esta problemática. Pesquisas têm documentado a magnitude da violência
juvenil e o rumo que tem tomado este fenômeno nos anos últimos (Adalbjarnardotti &
Rafnsson, 2002; Ding, Nelsen & Lassonde, 2002; Engels & Bogt, 2001; Hawkins,
Catalano & Miller, 1992; Herrenkohl & cols., 2000; Patterson, DeBaryshe & Ramsey,
1989; Saner & Ellickson, 1996). Mas, quais os motivos que levam uma pessoa jovem a se
envolver em situações que rompem as normas sociais, bem como em situações violentas?
Nesta mesma temática, indaga-se porque alguns jovens se envolvem em tais situações
enquanto outros não o fazem. Enfim, constata-se que são muitas as questões a respeito, e
que não existem respostas simples para as mesmas. Contudo, mesmo considerando as
dificuldades, por ser este um fenômeno social de saúde pública, por exemplo, e de
relevância inquestionável, cientistas têm procurado identificar os fatores envolvidos nos
comportamentos socialmente indesejáveis dos adolescentes e jovens.
Pode-se dizer que os jovens e adolescentes parecem naturalmente transgredir
normas e regras sociais (Coelho Júnior, 2001). A propósito, Herrenkohl e cols. (2000)
assinalam que, nos Estados Unidos, as estatísticas de prisões revelam que pessoas nesta
fase de desenvolvimento são mais prováveis perpetrar ou serem vítimas de violência
interpessoal, em comparação a indivíduos adultos. Meneghel, Giugliani e Falceto (1998)
advogam que as mortes de maior peso social são causadas pela violência, principalmente,
porque atingem indivíduos em idades produtivas. No caso específico do Brasil, Minayo
(1993) aponta que, aproximadamente 70% dos óbitos desta sociedade são devidos a causas
violentas, em que, especialmente nos grandes centros, as vítimas são jovens do sexo
masculino. Waiselfisz (2002) também verificou o que o senso comum já pressupõe, isto é,
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houve um aumento no número de vítimas jovens nos últimos dez anos, correspondendo a
cerca de 77%.
Parece plausível falar em um aumento epidêmico dos fenômenos violentos e
delinqüentes na sociedade, e isso tem sido enfocado constantemente pela mídia, na qual
diferentes jornais e noticiários televisivos apresentam, quase diariamente, variadas formas
de expressão das condutas violentas e anti-sociais (ver Formiga, 2002; Gouveia, Coelho
Júnior, Gontiès, Andrade & Andrade, 2003). Estudar seus antecedentes deveria ser
prioritário, pois permitiria, por exemplo, desenvolver políticas e delinear programas de
prevenção e controle de alguns problemas sérios que são correlatos durante a adolescência,
a exemplo do uso / envolvimento com drogas (Coelho Júnior, 2001; Romero, Luengo &
Sobral, 2001). Embora não seja seu fim último (também não é o da presente dissertação), a
Psicologia Social tem oferecido explicações para a crescente onda de violência entre as
pessoas, considerando para tanto alguns dos mecanismos cognitivos formativos da
agressividade, além do contexto social e cultural que eliciam e estabilizam estes
comportamentos humanos socialmente desviantes.
Enfatizar tais comportamentos em adolescentes e jovens constitui-se num trabalho
de direcionamento aos estudos da delinqüência, mas esta questão deve ser abordada
independentemente da classe social, pois este não é um problema que se restringe a um
grupo social específico (Formiga, 2002). Cabe ressaltar, no entanto, que apesar de alguns
estudos já abordarem a delinqüência juvenil (por exemplo, Giancola, 2000; Hawkins,
Catalano & Miller, 1992; Herrenkohl & cols., 2000; Molina & Gómez, 1997; Petraits, Flay
& Miller, 1995; Romero, Sobral, Luengo & Marzoa, 2001; Saner & Elickson, 1996;
Sankey & Huon, 1999; Stueve, O`Donnell & Link, 2001), e embora esta seja bastante
explorada pela mídia, as pesquisas a respeito são ainda pouco freqüentes no Brasil.
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Outro aspecto que merece ser destacado é que as pesquisas comumente consideram
as condutas anti-sociais e/ou delinqüentes, comparando jovens institucionalizados com não
institucionalizados, assumindo que os primeiros apresentariam condutas desta natureza,
enquanto que os últimos estariam imunes a tais condutas. No entanto, este é um
procedimento que tem se mostrado limitado, pois o fato de nunca ter estado em uma
instituição de reeducação não quer dizer, necessariamente, que o jovem não poderá ser
uma pessoa em potencial para apresentar condutas deste porte. Assim, desde uma
perspectiva preventiva, poderia ser mais conveniente conhecer os fatores que protegem os
jovens não institucionalizados de condutas anti-sociais (Romero & cols., 2001).
Verifica-se também que existe um vasto número de estudos (por exemplo,
Hawkins, Catalano & Miller, 1992; Herrenkohl & cols., 2000) que enfatizam os fatores de
risco, e pouco destaque tem sido dado aos fatores que protegem os jovens,
institucionalizados ou não, de se engajarem em condutas anti-sociais e delitivas. No campo
específico da saúde pública, observa-se que os conceitos de proteção e risco são essenciais,
embora os cientistas sociais tenham dedicado mais atenção a este último (Gouveia & cols.,
2003). De forma geral, por fator de risco se entende qualquer situação ou coisa que
aumente a probabilidade de que uma pessoa sofra dano; por fator de proteção, por outro
lado, entende-se qualquer coisa ou situação que diminua um potencial efeito maléfico
proveniente de um fator de risco.
Na problemática que está sendo apresentada, os fatores de risco aumentam a
probabilidade de jovens apresentarem condutas anti-sociais, enquanto que os fatores de
proteção apresentam-se como freios contra tais condutas, por atuarem como moderadores
dos seus efeitos nocivos. As pesquisas, destarte, buscam identificar os fatores de risco e
proteção envolvidos na violência juvenil, determinando como estes achados podem ser
úteis em programas de prevenção e controle da delinqüência e da violência. Este aspecto
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da aplicabilidade é sem dúvida relevante, embora não corresponda aos propósitos do
presente estudo, mas interessado em conhecer os antecedentes de comportamentos
socialmente desviantes.
Apesar dos esforços para identificar tais fatores de risco, verifica-se que não é uma
tarefa fácil, pois estes não são estáticos, não podendo ser analisados independentemente da
fase do desenvolvimento em que a pessoa se encontra, do contexto social e, sobretudo, da
circunstância. Tem-se verificado que alguns fatores da vida do sujeito podem ser de risco
durante a infância, enquanto outros só no final da adolescência. Os fatores de risco podem
estar no seio da família, outros na vizinhança, na escola e outros no grupo de pares. Alguns
deixam de constituir risco com a maior idade (maturação), enquanto outros persistem
mesmo na fase adulta. Os fatores de risco podem ser encontrados no indivíduo, no
ambiente ou propriamente nas habilidades individuais para responder às demandas do
ambiente. Ademais, os fatores que são de risco para o aparecimento das condutas antisociais e delitivas não são, necessariamente, os mesmos que levam o adolescente a
continuar apresentando-as (U.S. Department of Health and Human Services, 2003).
A respeito do conhecimento até então produzido sobre esta temática, observa-se
que diversas são as áreas que têm se dedicado a estudar a violência e os comportamentos
anti-sociais entre os jovens. Algumas enfatizam variáveis mais societais (por exemplo,
falta de oportunidade de emprego, padrões de desigualdades sociais) e outras mais
individuais (por exemplo, renda, lugar de moradia) em suas considerações. Na ciência
psicológica, por exemplo, as pesquisas desenvolvidas se encontram principalmente no
ramo da Psicologia Social, Psicologia do Desenvolvimento e mesmo Psicologia Jurídica,
em cada uma sendo ressaltadas, na maioria das vezes, variáveis específicas. Isto sugere a
possibilidade de uma inter-relação entre explicadores na análise deste fenômeno social.
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Herrenkohl e cols. (2000), com base numa perspectiva desenvolvimentista,
realizaram um estudo longitudinal a fim de averiguar a influência de cinco categorias de
fatores de risco para a violência juvenil, a saber: individual, familiar, escolar, grupo de
pares e comunidade. Na categoria individual as variáveis que se mostraram importantes
foram o gênero (masculino), a iniciação recente à violência, as atitudes pró-violência, a
hiperatividade e a prática de venda de drogas. Na categoria familiar foram preditores fortes
a violência e criminalidade parental, os conflitos familiares, as atitudes parentais
favoráveis à violência e a administração familiar ineficaz. O baixo desempenho, a
aspiração e o comprometimento acadêmico e as mudanças de escola foram evidenciadas
como variáveis que também predizem a violência juvenil, estando incluídas na categoria
escolar. Na categoria que representa a relação com os grupos de pares foi apontado que o
fato de ter amigos delinqüentes e membros de gangs prediz significativamente a violência.
Por fim, na categoria que ressalta as características da comunidade, tais como a
disponibilidade de drogas, os vizinhos adultos envolvidos com crimes, a privação
econômica, a desorganização da comunidade, a baixa união da vizinhança e as sanções da
lei contra a violência, foram preponderantes na explicação deste fenômeno.
De fato, são muitos os aspectos que podem contribuir na compreensão e explicação
das condutas anti-sociais apresentadas pelos jovens, tendo cada fator seu papel
preponderante na sua explicação. O que deve se levar em conta é a interrelação destes
fatores, pois, como se sabe, a problemática em questão se constitui em um fenômeno
multideterminado, exigindo uma forma mais laboriosa de abordá-lo.
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Embora idealmente se deva realizar um esforço por considerar um grande conjunto
destes fatores, a escassez de tempo e recursos materiais demanda uma solução mais
parcimoniosa. Neste sentido, decidiu-se aqui considerar um conjunto de variáveis
específicas que potencialmente contribuem para a compreensão de tais condutas.
Concretamente, procura-se conhecer a influência de dois construtos-chave em Psicologia
Social para explicar as condutas socialmente desviantes, como podem ser os traços de
personalidade e os valores humanos. Embora pautados em práticas de socialização,
reconhece-se que o primeiro é mais personalístico, enquanto o último, inclusive se
referindo a orientações de indivíduos específicos, inserem-se como mais socialmente
determinados, compreendendo para alguns autores o referente mais claro de uma cultura
(Hofstede, 1984). O presente estudo representa, pois, um intento de contribuir teoricamente
para a compreensão desta temática no contexto brasileiro, apresentando dados empíricos a
respeito.
Frente ao posto, procurou-se organizar o marco teórico da presente dissertação em
três capítulos principais. No Capítulo I são tratadas as condutas anti-sociais e delitivas
procurando defini-las operacionalmente e apresentar alguns estudos que analisam
diferentes variáveis na sua explicação. Em seguida, no Capítulo II, expõe-se a temática
dos traços de personalidade, analisando historicamente sua evolução teórica. Neste capítulo
são abordados alguns modelos teóricos que consideram a personalidade enquanto traço,
com destaque para o modelo dos Big Five (Cinco Grandes Fatores de Personalidade),
procurando relacioná-los com as condutas anti-sociais e delitivas. Ademais, considera-se o
papel de um traço de personalidade específico, denominado de busca de sensações, para
explicar tais condutas. Finalmente, no Capítulo III os valores humanos são apresentados,
enfatizando primeiramente um breve histórico do tema, para, em seguida, destacar algumas
pesquisas que os relacionam com as condutas socialmente desviantes. Ainda neste capítulo
20
são discutidos os diferentes enfoques teóricos acerca dos valores e, de forma mais
detalhada, apresentada a tipologia dos valores humanos que servirá de marco de referência
sobre este tema.
Esta primeira parte da dissertação, eminentemente teórica, culminará com a
apresentação de um modelo causal que procura estabelecer em que sentido os valores
humanos e os traços de personalidade – incluído neste caso o fator de busca de sensações –
atuam como preditores das condutas anti-sociais e delitivas. Esta análise findará com a
apresentação dos objetivos específicos, que será seguido do método. Este será o Capítulo
IV, que englobará o delineamento e as hipóteses propostas para o estudo.
Esta primeira parte da dissertação, eminentemente teórica, culminará com a
apresentação de um modelo causal que procura estabelecer em que sentido os valores
humanos e os traços de personalidade – incluído neste caso o fator de busca de sensações –
atuam como preditores das condutas anti-sociais e delitivas. Esta análise findará com a
apresentação dos objetivos específicos, que será seguido do método. Este será o Capítulo
IV, que englobará o delineamento, as hipóteses propostas para o estudo, a amostra
considerada e uma breve explicação das análises realizadas.
No Capítulo V são apresentados os resultados. Primeiramente, são descritos os
resultados referentes à primeira fase da pesquisa, que diz respeito às validades de construto
dos instrumentos utilizados nos estudo 1 e 2. Este capítulo está em fase de elaboração, pois
as análises estatísticas finais estão sendo efetuadas e descritas. Ademais, tão logo sejam
concluídas as análises, os capítulos que abordam as discussões e conclusões são expostos.
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CAPÍTULO I – CONDUTAS ANTI-SOCIAIS E DELITIVAS
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1- CONDUTAS ANTI-SOCIAIS E DELITIVAS: ENFOQUES TEÓRICO E
EMPÍRICO
As condutas, apesar de serem geralmente consideradas como representando a
personalidade dos indivíduos, são vistas como dinâmicas, funcionais, ambivalentes e
apresentando um procedimento moral (bom ou mau), podendo ser compreendidas em
função do contexto em que ocorrem. Uma conduta ou comportamento, qualquer que seja, é
multideterminado; sua explicação pode se apresentar, por exemplo, em termos de traços de
personalidade (Paunonen & Ashton, 2001) ou considerando algo mais social ou
psicossocial, como no caso dos valores humanos (Coelho Júnior, 2001; Formiga, 2002).
As condutas dos adolescentes e jovens, por possuírem aspectos peculiares, são
fontes de muitas pesquisas, especialmente das que consideram aspectos anti-sociais e
desviantes. Por ser um tema socialmente relevante, muitas teorias e pesquisas têm sido
levadas a cabo, principalmente nos dias atuais em que os episódios de adolescentes e
jovens envolvidos com drogas, roubos e até homicídios têm sido amplamente salientados.
Assim, observa-se uma gama de estudos (ver Halkins, Catalano & Miller, 1992) abordando
a violência juvenil, a delinqüência, as condutas anti-sociais, bem como os sinônimos e as
facetas deste problema social. Mas, cabe especificar em que sentido estes termos são
comumente empregados. Primeiramente, o termo violência é mencionado para descrever
um amplo grupo de aspectos mais específicos, tais como a delinqüência, o vandalismo, a
criminalidade, os homicídios, o tráfico e uso de drogas, entre outros. O termo condutas
anti-sociais faz referência a todas as condutas consideradas socialmente indesejáveis, que
podem afetar o bem-estar social. A delinqüência é apresentada como agrupando um
conjunto de condutas que representam uma violação à lei (ver Pimentel, 2004).
Como exemplo desta complexidade no emprego destes termos, considere-se o caso
do comportamento agressivo. Este pode ser anti-social, mas nem sempre delitivo, pois isto
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dependerá da existência de infração legal. A respeito da relação entre condutas anti-sociais
e delitivas, cabe esclarecer que toda conduta delitiva é anti-social, contudo nem sempre o
contrário é verdadeiro. Uma conduta anti-social se refere ao não cumprimento das normas
sociais que devem ser respeitadas. Sabe-se da norma de limpeza das ruas ou do respeito
com os colegas no que se refere a certas brincadeiras, porém estas condutas não são
praticadas por alguns jovens. Neste sentido, uma das características das condutas antisociais é o fato de incomodarem, mas sem que causem necessariamente danos físicos a
outras pessoas; elas dizem respeito apenas às travessuras dos jovens ou simplesmente à
busca de romper com algumas regras sociais.
Em relação às condutas delitivas, estas podem ser concebidas como merecedoras de
punição, capazes de causar danos graves, morais e/ou físicos (Espinosa, 2000; Molina &
Gómez, 1997). Portanto, tais condutas podem ser consideradas mais severas que as
anteriores, representando uma ameaça eminente à ordem social vigente e às leis
legitimamente estabelecidas.
O que as condutas anti-sociais e delitivas têm em comum é que ambas interferem
nos direitos e deveres das pessoas, ameaçando o seu bem-estar (Formiga, 2002).
Possivelmente todo jovem pratica ou já praticou algum tipo de conduta anti-social;
provavelmente, faz parte do repertório do jovem o desafio dos padrões tradicionais da
sociedade, pondo em evidência as normas da geração dos seus pais. No caso das condutas
delitivas, porém, estas podem implicar algo mais que um desafio às normas vigentes; é
possível que reflitam aspectos mais enraizados em fatores biológicos e mesmo em
distúrbios psicológicos mais graves. Estes aspectos, não obstante, devem ser encarados
ainda como conjunturais. Pouco se sabe no Brasil sobre a correlação destes dois tipos de
conduta e sua relação com variáveis externas, como podem ser os valores humanos ou
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mesmo a identificação com pessoas que ocupam papéis tradicionais dentro da sociedade
(por exemplo, pai, mãe, professores etc.).
Considerar que um jovem apresenta condutas anti-sociais e delitivas é fazer
referência ao seu comportamento transgressor, salientando não somente os pobres, negros
etc., pois este é um fenômeno que não tem cara específica, mas condutas de risco bastante
evidentes. Segundo Pfromm Neto (1979), os adolescentes que apresentam condutas
delinqüentes compreendem um foco de grande preocupação na sociedade por se tornarem
indesejáveis. Tais jovens, violadores de normas e leis, caracterizam-se não pela
inexistência de valores, mas devido à superposição e relevância dada aos seus próprios
valores ou a sua má orientação ou clareza cultural (Formiga, 2002).
Mesmo considerando as conceituações acima explicitadas para o que vem a ser
comportamentos anti-sociais, cabe aqui expor ao leitor que esta discussão está vinculada a
três elementos indissociáveis, quais sejam: o comportamento em si, o indivíduo que o
adota e o ambiente sócio-cultural. Em outras palavras, expõe-se aqui a idéia de que nem
tudo que é anti-social em uma sociedade e contexto histórico será em outros. Analisando,
por exemplo, o comportamento de envolver-se com drogas, verifica-se que sua história é
tão antiga quanto a própria humanidade, contudo, em função de determinados padrões
culturais, estas servem a diferentes funções, ora positivas, ora negativas (Coelho Júnior,
2001).
A fim de verificar esta afirmação, pode-se analisar rapidamente o que ocorre com a
maconha e o álcool, duas das primeiras substâncias utilizadas para alterar a mente
humana1. Coelho Júnior (2001) aponta que é nas formas de adoração religiosa que se
encontra o núcleo do aparecimento destas substâncias, em que as drogas tinham
inicialmente a função principal de possibilitar ao homem viver melhor seu cotidiano
1
Chamadas de drogas psicotrópicas por atingirem o poder de raciocínio que o ser humano possui.
25
perante as forças divinas. A maconha ou cannabis sativa L, por volta de 4.000 a.C., na
Índia, já era usada para fins religiosos. De acordo com Fortes (1991), o uso de bebidas
alcoólicas também já é encontrado nas antigas civilizações do Egito, da Mesopotâmia e da
Índia, sendo consumidas nos rituais sagrados. De acordo com este autor, tanto na Bíblia
como na Torah – os livros sagrados das religiões cristã e judaica, respectivamente – há
indicações de que o vinho era usado de uma forma sagrada e também para formalizar paz e
harmonia entre os homens.
Ademais à função religiosa, estas drogas foram adicionadas ao plano médico.
Coelho Júnior (2001) abaliza que, embora tenham sido chineses e árabes os primeiros a
utilizarem o álcool de maneira medicamentosa, com Hipócrates que ficaram demonstrados
os bons efeitos do vinho contra muitos problemas de saúde, exceto aqueles articulares. Em
seguida, no Império Romano, o vinho, associado a uma raiz chamada mandrágora,
provocava anestesia, o que melhorou as intervenções cirúrgicas e limpeza de chagas. Na
Idade Média o álcool, associado a outras substâncias, produziu antídotos contras venenos
poderosos. Aproximadamente, em meados do século XIX, a etiloterapia (tratamento
medicamentoso pelo álcool) ganhou impulso com o desenvolvimento de pesquisas. No
entanto, no século XX, com o surgimento de novos medicamentos mais eficientes, ocorreu
a sua desvalorização.
Pelo menos em dois momentos históricos pode-se constatar o fato do envolvimento
com álcool ser considerado algo extremamente anti-social. No século II a.C., em Roma, as
festividades eram regadas a vinho, o que proporcionava embriagues, assim, estas festas,
que ocorriam várias vezes ao mês, prejudicavam os afazeres políticos-militares. Daí foram
desenvolvidas normas que, impostas ao povo pelo governo, propiciaram o consumo
controlado do álcool na sociedade romana. Outro momento que pode ser mencionado é o
período de 1919 a 1933, na chamada Lei Seca, em que nos Estados Unidos o consumo de
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álcool foi drasticamente limitado. Contrário a estes fatos históricos, nos dias atuais
observa-se que o álcool é a substância psicoativa lícita mais consumida pelos jovens no
Brasil (Zagury, 1996).
Um breve percurso do uso da maconha na humanidade pode ser apresentado
segundo Coelho Júnior (2001). Este autor fala que durante a história da humanidade o
consumo desta erva esteve relacionado com a estrutura religiosa dos povos que a usaram.
No Brasil, o consumo da maconha ficou associado aos escravos, talvez por este motivo
sempre foi mal visto pela sociedade e pelas autoridades constituídas. No entanto, por volta
de metade do século XIX, esta erva já era usada amplamente como remédio na Inglaterra e
nos Estados Unidos, tendo estudos sobre seus efeitos publicados em revistas médicas
especializadas.
A maconha era indicada a problemas mais diversos de saúde, como cólicas,
enxaquecas, glaucomas e ansiedade, sendo explorado principalmente seu efeito sedativo.
Não obstante, o não isolamento dos princípios ativos da erva e o seu uso para se obter
efeitos extra-sensoriais acabou por lhe dar um teor ainda mais pejorativo (Coelho Júnior,
2001). Apesar dos diversos posicionamentos contra o uso da maconha, esta foi se
difundindo entre a juventude dos anos 60 até se espalhar por todas as camadas sociais
brasileiras. Até o fim dos anos 70 a maconha estava definitivamente marcada como a droga
da juventude e da rebeldia, e mesmo considerando a proibição do seu consumo e o elevado
número de programas e propagandas anti-drogas, é atualmente a droga ilícita mais
utilizada pela juventude brasileira.
Uma das possíveis explicações para a maconha ser considerada anti-social e as
pessoas seguirem usando-a, encontra respaldo nas teorias do Grupo de Referência que
consideram as “sub-culturas delinqüentes” para a explicação do engajamento dos jovens
em atividades anti-sociais. Em outras palavras, muitos jovens podem manter um padrão de
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comportamento porque seu grupo de pertença possui um conjunto de crenças, valores e
normas grupais próprios, que não consideram determinados comportamentos como
socialmente desviantes. Neste caso, o uso da maconha pode ser considerado pelos jovens
como uma experiência diferente, um modo de experimentar sua independência, viver um
estilo diferente etc.
De acordo com Bergeret e Leblanc (1991) existe uma certa relatividade no que
concerne a normatização do uso de algumas drogas e apresentação de certos
comportamentos. Em algumas sociedades, em determinadas épocas, pode-se usar um droga
específica, e em outras não. Isto se dá porque cada geração vai se caracterizar por
determinados marcos sociais, o que também vai determinar o que seja ou não anti-social.
Óbvio que certos atos, pela sua gravidade, não possuem este caráter relativista, pois
independente da época ou cultura sempre serão anti-sociais (por exemplo, matar alguém
sem causa justificável).
A necessidade de dissertar um pouco acerca das drogas justifica-se pelo fato de que
os mais freqüentes comportamentos socialmente desviantes – sejam estes anti-sociais e/ou
delitivos – estão fortemente relacionados aos episódios de envolvimento com drogas, como
é o caso de roubos, acidentes automobilísticos e até homicídios. Bem como para se mostrar
que o que vem a ser anti-social está fortemente pautado pelos valores e pelas crenças
enfatizados em uma determinada cultura, além dos interesses sócio-econômicos que vão
sendo estabelecidos ao longo dos anos.
Chegado este ponto, faz-se necessário mencionar também que o consumo
exacerbado das drogas pode provocar um efeito psicossocial nocivo às pessoas. Isto não
ocorre apenas com o uso das drogas; outras condutas consideradas socialmente desviantes
(por exemplo, roubar, dirigir embriagado, praticar sexo com múltiplos parceiros sem
preservativo) também podem ter sérias conseqüências. Tais conseqüências podem ser
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vislumbradas tanto no domínio individual como no social, pois pode ser danoso para o
adolescente em termos de seu desenvolvimento cognitivo, de incremento de acidentes e
fracasso escolar, por um lado, e, por outro, por ocasionar um alto custo para a sociedade,
por exemplo, ao sistema de saúde no tratamento de drogaditos e mesmo de aidéticos
(Hawkins, Catalano & Miller, 1992).
Então, como lidar com esta questão se os adolescentes e jovens são apontados como
potenciais consumidores de drogas, especificamente, e têm alta probabilidade de apresentar
condutas anti-sociais por estarem numa época de descobertas e de contestar à sociedade e
às normas impostas? (Agüero, 1998; Bergeret & Leblanc, 1991; Coelho Júnior, 2001;
Formiga, 2002; Pfrom Neto, 1979; Zuckerman, 1994). As respostas a respeito vêm sendo
dadas por diversos pesquisadores que têm se dedicado a estudar os comportamentos dos
jovens, especialmente aqueles considerados socialmente desviantes. Destarte, como este é
o grupo amostral de relevância para a temática central desta dissertação, justifica-se a
necessidade de tê-lo em conta, contextualizando sua tendência de apresentar condutas antisociais.
1.1- Os Adolescentes e as Condutas Anti-sociais
Tradicionalmente, a adolescência tem sido considerada um período mais difícil que
a meninice. Foi Stanley Hall, fundador da American Psychologial Association e iniciador
do estudo científico da adolescência, quem introduziu o período da adolescência, como de
grande tensão e de potencial físico, mental e emocional. Em suma, não se pode negar que a
adolescência seja um período desafiador e, às vezes, difícil da vida a que sociólogos,
pedagogos, criminalistas, desenvolvimentistas e psicólogos têm dedicado bastante atenção
(Mussen, Conger, Kagan & Huston, 1995).
29
A adolescência, principalmente no início, é um período, acima de tudo, de
mudanças não só físicas, sexuais, psicológicas e cognitivas, mas também nas demandas
sociais feitas pelos pais, companheiros, professores e pela sociedade em si. Coelho Júnior
(2001) aponta que nas sociedades ocidentais, em geral, quando o indivíduo começa a ter
mudanças na sua estrutura organizacional, começam também a se modificar
comportamentos dos grupos sociais em relação a ele.
Enquanto etapa do desenvolvimento, a adolescência se caracteriza por uma série de
transformações, envolvendo fatores biológicos e culturais. Palácios (1995) considera este
um período biopsicossociológico, que se prolonga por vários anos, caracterizado pela
transição entre a infância e a fase adulta. Esta concepção permite pensar que, tratar a
adolescência partindo de variações fisiológicas e universais, está-se apenas considerando a
fase da puberdade. Hoje, todavia, se considera que a crise vivida pelos jovens não se deve
estritamente a fatores hormonais ou fisiológicos, mas também a necessidade de
preenchimento
de
algumas
condições,
especialmente
as
psicossociais,
como
desenvolvimento de um sistema e hierarquia de valores, identidade sexual e social,
independência econômica etc. (Formiga, 2002). Estando aí a necessidade da Psicologia
Social de estudar estes atores sociais.
Mesmo não sendo objetivo deste estudo apresentar um tratado acerca da
adolescência (para maiores detalhes ver Mussen & cols., 1995), não se pode deixar de
mencionar que em nenhum momento da vida ocorrem mudanças corporais tão súbitas e tão
intensas quanto na adolescência. Segundo Miranda (2002), tais mudanças progridem,
inexoravelmente, sem que o jovem possa ter nenhum controle sobre elas. Durante muito
tempo terá que conviver com esse “corpo mutante”, em que surgem dúvidas, inseguranças
e preocupações, que freqüentemente levam a uma grande ansiedade. No seu processo de
amadurecimento, o adolescente vive uma série de perdas, entre elas a perda do corpo de
30
criança; ele precisará se adaptar ao novo corpo e refazer o seu esquema corporal, o que
certamente levará tempo. Ademais, acompanhada das mudanças corporais, acrescentem-se
às novas sensações que o jovem não está acostumado, tais como ereções inoportunas,
ejaculações durante o sono e os sonhos eróticos.
Observa-se que os termos adolescência e puberdade são muitas vezes usados de
forma inadequada. É importante saber que dizem respeito a situações diferentes: puberdade
diz respeito às mudanças corporais, enquanto o termo adolescência está relacionado ao
conjunto de modificações: biológicas, psicológicas e sociais. As transformações corporais
são constituídas pelo enorme crescimento físico (o chamado estirão da puberdade) e pela
maturação sexual. Um fato importante a ser destacado é que essas mudanças não ocorrem
no mesmo ritmo e ao mesmo tempo em todos. A idade de início é também muito diferente
nos meninos e nas meninas, havendo uma diferença de mais ou menos dois anos.
Começam mais cedo nas meninas, o que pode ocorrer, para algumas, já a partir de oito
anos. Porém, cabe mencionar que nem sempre quem começa o desenvolvimento mais cedo
também o completa mais cedo, uma vez que a velocidade com que as mudanças progridem
é variável em ambos os sexos.
A seqüência das transformações corporais, que constituem a maturação sexual, é
geralmente a mesma em cada sexo, o que foi bem estudado por J. M. Tanner, cujo trabalho
é utilizado como referência pela maioria dos profissionais para acompanhar o
desenvolvimento puberal e para definir a etapa da puberdade em que o jovem se encontra
(ver Miranda, 2002). O adolescente não é somente um corpo em desenvolvimento físico,
compreende também um crescimento emocional e intelectual, e suas interações com o
meio sócio-cultural e histórico são fundamentais para compreendê-lo mais completamente.
Portanto, o período da adolescência vem sendo de tamanha importância quanto à
31
compreensão desenvolvimentista do indivíduo, principalmente do jovem, pois marca tanto
a aquisição de uma imagem corporal específica quanto à estrutura da personalidade.
Conforme Pfrom Neto (1979), todas estas modificações ocorrendo na vida do
jovem levam a repercussões psicológicas que vão influenciar sua conduta e sua vida social.
Estes reflexos psicológicos vão aparecer inicialmente no conflito com os pais. A grande
questão para o adolescente é ser “diferente”, o que o leva a assumir uma identidade
segundo seu grupo de pares. Isto, presumivelmente, provoca a sua entrada numa vida
sociocultural diferente daquela a que vinha tendo antes no círculo familiar.
No que tange às condutas apresentadas pelos jovens, sejam socialmente desviantes
ou não, abordar o processo de socialização é algo crucial. A propósito, Ortega (1997, p.
109) indica que este é “o processo de aquisição dos motivos, valores, normas,
conhecimentos e condutas que necessita o indivíduo para comportar-se como a sociedade
exige”. É neste processo que vai sendo moldada a identidade da pessoa mediante o que o
grupo determina. Segundo este autor, o processo de socialização é composto por três fases,
que acompanham o desenvolvimento psicofísico dos indivíduos. A primeira fase, chamada
de socialização primária, se dá exatamente na infância, onde a criança adquire a
‘personalidade básica’, que é proporcionada principalmente pela família, agente
socializador primário. A segunda fase, socialização secundária, se dá com o fim da
puberdade, sendo a mais importante para o presente estudo. A terceira e última fase,
socialização terciária, sucede quando o indivíduo está na velhice e geralmente encontra
dificuldade de adaptação ao ambiente que lhe circunda.
A socialização secundária possui como características a anunciação da fase adulta
e a presença de uma elevada freqüência de agentes socializadores por causa da grande
quantidade de grupos sociais com os quais os indivíduos vão tendo contato. Na juventude,
o grupo de amigos é o principal grupo de identificação, ocorrendo um certo afastamento
32
por parte dos adolescentes em relação aos seus pais; dentre outros motivos, tal afastamento
se deve ao fato dos adolescentes se mostrarem críticos aos valores dos pais (Coelho Júnior,
2001). Nos estudos sobre comportamentos socialmente desviantes a relação com pares
anti-sociais é comumente mencionada como fator de risco (Adalbjarnardottir & Raffinson,
2002; Donohew & cols., 1999; Martín & Martinez, 1997).
Outro fator relevante na temática supracitada é a mídia (massmedia). Este é um
agente socializador não muito sadio no sentido de que as pessoas mantêm contato com a
programação ofertada de maneira dita unidimensional, ou seja, o indivíduo não tem
condição de conversar e interrogar aquilo a que está sendo exposto (Coelho Júnior, 2001).
No caso das crianças, estas terminam passando a maior parte do tempo vendo televisão, de
forma que podem assimilar os costumes culturais e modelos de comportamentos através da
mesma (Westlake, 2001). Andrade (2003) indaga quais os modelos comportamentais que
estão sendo transmitidos para as crianças através da televisão. A respeito, afirma que a
resposta a esta questão não é positiva, visto que alguns programas não são saudáveis para o
comportamento infantil.
Krcmar e Valkenburg (1999) associaram a atividade de assistir a uma mídia
violenta com o aumento da justificativa dos atos agressivos. Estes autores afirmaram que
as crianças que passavam grande parte de seu tempo vendo desenhos animados violentos
apresentam uma forte tendência a justificar a violência. Um estudo similar foi
desenvolvido no Brasil por Andrade (2003), que analisou os desenhos violentos destinados
ao público infantil, considerando uma amostra de crianças paraibanas. Seus resultados
foram muito similares aos apresentados pelos autores antes citados.
Ainda sobre o efeito da mídia, Krcmar e Valkenburg (1999) alertam que exposições
a conteúdos agressivos trazem conseqüências para todo público, seja infantil, adolescente e
até mesmo adulto. Ortega (1997) acrescenta que muitas horas à frente da TV acabam
33
provocando a facilitação do consumo, o conformismo social, a conformação de atitudes de
passividade, entre outros fatores tidos como negativos na formação do adolescente.
Os estudos associados à fase da adolescência envolvem, principalmente, temáticas
como sexualidade, agressividade, condutas socialmente desviantes e transgressão de
normas, bem como as suas implicações na vida social. Leal (1996) entende que o
adolescente sempre tem uma lei simbólica a ser transgredida para se identificar enquanto
sujeito. Durante muito tempo se imaginou que os jovens transgressores eram apenas os
jovens das classes sociais mais baixas, posteriormente esta idéia foi refutada. De fato,
grande parte dos psicólogos desenvolvimentistas considera a adolescência um momento
especial na vida do jovem, independentemente de status socioeconômico. Para este autor,
não aceitar orientações de adultos é comum, testando assim a possibilidade de ser ele
mesmo o adulto, de ter poder e autocontrole sobre os seus atos (ver também Formiga,
2002). Em função disto, afirma Fraga (2000), os adolescentes são, em geral, possuidores de
comportamentos conturbados e atitudes inconseqüentes, estando muitas vezes entregues
aos impulsos próprios da juventude. Esta impulsividade que é espontânea naturalmente
passa ao ato, no sentido de que o jovem faz e depois pensa, tornando-se imperceptível para
ele as conseqüências de seus comportamentos.
A transgressão é uma forma dos adolescentes contestarem à sociedade, desta forma
é comum se mostre disposto a romper normas através da delinqüência, do jogo e do sexo.
Hurrelmann e Engel (1992) afirmam que a transgressão é um fator inerente ao
comportamento dos adolescentes, principalmente entre as idades de 15 a 17 anos, e
acrescentam que estes fazem uma leitura de sua realidade social diferente da que têm os
demais indivíduos de sua sociedade, acabando por se tornarem ‘diferentes’ dos demais,
provocando a formação de uma sub-cultura com seus próprios códigos, o que finda por
marginalizá-los.
34
Os jovens, na atualidade, são conceituados, por vezes enquanto problema social.
Como relata Pais (1996), citando alguns dos problemas socialmente mais reconhecidos
como específicos dos jovens, afirma que estes são vistos enquanto problemas de inserção
profissional, de falta de participação social, das drogas, da delinqüência, dos problemas
com a escola e com os pais.
Esta percepção, no entanto, está pautada nas diferenças sócio-históricas de cada
época, ou seja, a representação da adolescência se dá por determinação dos períodos
históricos. Antigamente, as preocupações dos jovens diziam respeito à constituição de uma
família, ao emprego; hoje, uma das maiores preocupações dos pais é se o filho irá se
envolver em episódios violentos. Assim sendo, os problemas sociais que cada fase de vida
determina são diferentes a cada período histórico, o que vale dizer que a adolescência da
forma como ela é encarada hoje não corresponde ao que era antes e, muito provavelmente,
ao que será no futuro (Coelho Júnior, 2001).
Enfim, a exposição do tópico ulterior é útil para que a complexidade que cerca as
condutas socialmente desviantes possam ser melhor analisadas levando-se em
consideração os fatores na vida do adolescente que podem contribuir ou prevenir o
aparecimento de tais condutas. Tal complexidade sugere que as condutas anti-sociais e
delitivas (objeto principal de estudo desta dissertação) devam ser minuciosamente
analisadas. Assim, ao buscar conhecer quais variáveis são mais importantes nestas análises,
observa-se que uma considerável quantidade de fatores é apontada na literatura, alguns
sendo identificados como de risco para que o adolescente ou jovem venha a apresentar
condutas socialmente desviantes (por exemplo, ter amigos que já tenham se envolvido com
drogas e furtos) e outros como de proteção, isto é, mediando ou moderando os efeitos dos
fatores de risco (por exemplo, a religião e a ênfase aos valores sociais; ver Gouveia, &
cols. 2003).
35
A respeito dos fatores antecedentes das condutas socialmente indesejáveis,
Hawkins, Catalano e Miller (1992) apresentam um artigo extenso em que indicam uma
série de fatores de risco e de proteção para o uso de álcool, drogas e problemas
comportamentais entre adolescentes. Estes autores centram suas análises em 17 fatores e os
diferenciam em contextuais (por exemplo, leis e normas favoráveis aos comportamentos de
risco) e individuais e interpessoais (por exemplo, aspectos genéticos e conflito familiar).
Citam que o fato de existirem na família adultos que usam álcool ou mesmo que tenham
atitudes favoráveis a respeito, representa um fator de risco de envolvimento com esta droga
entre os adolescentes.
É vasta a literatura sobre o tema das condutas anti-sociais, ao menos fora do Brasil
(ver Petraits, Flay & Miller, 1995). As explicações destas condutas estão inseridas em
diferentes marcos referenciais, desde modelos biologicistas, comportamentalistas,
psiquiátricos, até abordagens mais amplas, como a da violência estrutural, que aponta a
violência como sendo proporcionada pelo próprio sistema social com suas iniqüidades
(Meneghel, Giugliani & Falceto, 1998). Antes de adentrar na perspectiva assumida na
presente dissertação, que enfoca atributos pessoais e orientações sociais na explicação
deste fenômeno, faz-se necessário reconhecer os fatores potenciais que são apontados
como de risco ou de proteção para tais condutas.
1.2- Fatores de Risco e Proteção das Condutas Anti-sociais
Nos últimos trinta anos os pesquisadores têm demonstrado considerável progresso
no sentido de identificar os fatores de risco para os diversos tipos de comportamentos antisociais. Recentemente, a atenção tem se voltado de forma mais intensa para o
entendimento da violência, no sentido de buscar conhecer os antecedentes da criminalidade
entre os jovens. Estas pesquisas indicam certas características biológicas e psicológicas dos
36
indivíduos que comumente estão associadas aos comportamentos anti-sociais e delitivos,
como é o caso dos traços de personalidade. De igual relevância, alguns fatores contextuais
também são apontados, por exemplo, a estrutura e o funcionamento da família e as
características dos grupos de pertença.
A literatura a respeito expõe que os fatores de risco e de proteção podem ser
encontrados em diferentes áreas da vida da criança e do adolescente, e que estes exercem
diferentes efeitos nos diferentes estágios do desenvolvimento. As perspectivas em saúde
pública que abordam a questão dos comportamentos anti-sociais e delitivos procuram
identificar os fatores de risco e de proteção que determinam quando, no curso da vida, eles
ocorrem mais tipicamente e como eles operam, pois isso possibilita a criação de
delineamentos de programas de prevenção2. Como dito previamente, a maior parte dos
estudos centra-se nos fatores de risco. Estes fatores compreendem geralmente
características pessoais e condições ambientais que predizem o surgimento ou a
continuação das condutas socialmente indesejáveis. Não obstante, a tarefa de identificá-los
é mais complexa do que aparenta.
As teorias e pesquisas sobre a delinqüência podem ser classificadas segundo, ao
menos, duas abordagens principais: uma que focaliza o início do comportamento antisocial, sua freqüência, padrão e continuidade durante o curso da vida; e outra que focaliza
a emergência do grupo de fatores de risco em determinado estágio da vida. A primeira
abordagem identifica duas formas de estudar o início do comportamento anti-social, uma
que começa na infância e continua durante a adolescência, e a outra que tem início apenas
na adolescência. Já a segunda abordagem que objetiva vislumbrar o conjunto de fatores,
2
Embora se reconheça na presente dissertação a importância de pensar e executar intervenções, assume-se
igualmente que este não é o seu propósito. Esta pesquisa é de cunho básico, voltando-se para compreender os
fatores que contribuem para explicar as condutas anti-sociais e delitivas. Portanto, apenas em termos de um
esforço mais dedutivo se poderia indicar aqui algumas alternativas de aplicação dos resultados mais adiante
apresentados, ponderando-se as especificidades da amostra considerada.
37
identifica as características individuais, vivenciais e as condições ambientais na infância ou
adolescência que predizem o envolvimento com comportamentos anti-sociais na faixa
etária de 15 a 18 anos, fase considerada de maior risco (U.S. Department of Health and
Human Services, 2003).
No que diz respeito aos fatores de proteção, eles têm sido abordados de duas
maneiras, como ausência e oposição aos fatores de risco e como conceitualmente distintos
deles. A perspectiva mais tipicamente divulgada entende os fatores de proteção como
sendo o oposto do contínuo dos fatores de risco. Por exemplo, um bom relacionamento
familiar pode ser visto como fator de proteção por ser oposto a um conhecido fator de
risco, um relacionamento familiar conflituoso. A principal crítica a esta perspectiva é que,
em suma, os dois tipos de fatores se tornam essencialmente a mesma coisa. A segunda
perspectiva aponta fatores de proteção como mediadores ou moderadores que atuam
diretamente nos fatores de risco e não nos comportamentos socialmente indesejáveis. Por
exemplo, um baixo nível sócio-econômico é um dos clássicos fatores de risco; no entanto,
em um lar onde o adolescente tem um apoio social percebido, este fator de proteção
diminui os efeitos daquele fator de risco, podendo resultar no fato do adolescente não vir a
apresentar condutas anti-sociais.
Identificar e mensurar os fatores de proteção é uma área nova de pesquisa sobre a
delinqüência e os comportamentos anti-sociais, e as informações a respeito ainda são
bastante limitadas, mas dado ao fato de serem úteis na prevenção e controle destes
comportamentos, estão cada dia mais sendo estudados. Até o momento, já foram
identificados alguns fatores de proteção, e que, tal como os fatores de risco, podem diferir
e/ou interagir nos diferentes estágios do desenvolvimento, sendo classificados em cinco
domínios principais: comunidade, grupo de pares, escola, família e indivíduo (Catalano,
38
Maggerty, Gainy, Hoppe & Brewer, 1998). À seqüência, são apresentados os principais
fatores de risco de acordo com cada um destes cinco domínios:
Comunidade
Ao analisar a violência juvenil e, em específico, as condutas anti-sociais e delitivas,
a justificativa mais comumente apresentada se refere à desorganização social mais ampla,
que envolve a exclusão social ou falta de oportunidade dos jovens, que se encontra
diretamente ligada às condições e diferenciações sócio-econômicas. No entanto, como
sugerido anteriormente, são muitos os jovens que apresentam um padrão de vida
considerado bom, mas que estão apresentando tais condutas (Agüero, 1998; Bengoa,
1996).
O relacionamento do adolescente com a comunidade é um fator importante no seu
desenvolvimento social. Uma comunidade socialmente desorganizada se caracteriza, em
parte, pela presença de crime e drogas na vizinhança e pela falta de escolas que
possibilitem a realização de atividades esportivas e/ou a formação de grupos de jovens.
Nestas comunidades, quanto mais freqüente a presença de adultos violentos e jovens de
gangs, maior a probabilidade dos adolescentes apresentarem comportamentos anti-sociais.
Desde uma perspectiva ainda mais ampla, a cultura também é assinalada como fator
importante nestas análises. Um padrão específico de condutas pode ser parte do próprio
sistema moral de uma sociedade (Cohen, Nisbet, Browdle & Schwarz, 1996). Por exemplo,
uma pessoa pode apresentar uma conduta agressiva como honra ou autodefesa, e isto ser
aceitável socialmente, contrariamente, para pessoas com um outro padrão cultural, tais
condutas são rechaçadas. Segundo Formiga (2002), parece ser eminente nos dias atuais
uma orientação cultural nova que vem legitimando muitos dos comportamentos anti-
39
sociais e fatores que tendem a desencadeá-los (por exemplo, pode-se citar a busca por
novas experiências que propiciem prazer e emoção e/ou a saída da monotonia).
Grupos de Pares
O grupo de pares é algo deveras importante na adolescência, tanto para a formação
das atitudes como para a estruturação dos padrões de comportamentos. Considerando que a
relação com os pares ou a identificação com os amigos do bairro e da escola propiciam um
marco de referência para os adolescentes, assim, quando os pares se caracterizam como
socialmente desviantes, os adolescentes podem até transgredir regras como forma de se
ajustarem às normas do grupo (Martín & Martinez, 1997; Sankey & Huon, 1999). Segundo
Herrenkohl (2000), o envolvimento com aqueles que apresentam comportamentos
socialmente indesejáveis, ou que façam parte de gangs, aliado à falta de suporte familiar,
faz mais provável que o adolescente venha a apresentar condutas socialmente indesejáveis.
Donohew e cols. (1999), considerando a busca por novas experiências, afirmam que esta
mostra uma forte relação com a procura de drogas e álcool, principalmente para aqueles
que têm em seu endogrupo (grupo de pertença) pessoas que apresentam os mesmos
interesses. Algo similar é indicado com respeito ao fato de adolescentes virem a fumar ou
beber, pois fazer parte de grupos que fumam e bebem com freqüência tem sido apontado
como um provável preditor destes comportamentos (Adalbjarnardottir & Raffinson, 2002).
Escola
Neste domínio de fatores de risco a literatura aponta as experiências negativas na
escola e os baixos níveis de realização acadêmica como relevantes. Parece que crianças
que têm pouco interesse na escola, performance acadêmica deficiente e companheiros que
apresentem condutas anti-sociais, apresentam uma probabilidade elevada de manifestarem
40
comportamentos anti-sociais. A este respeito, Dukes e Stein (2001) encontraram que
crianças com performance baixa nos trabalhos escolares na idade de 11 anos tiveram altas
taxas de auto-relato de delinqüência quando adolescentes.
Família
Um dos aspectos que tem sido mais enfatizado nas pesquisas como relacionado às
condutas anti-sociais e até agressivas dos adolescentes e jovens tem sido a qualidade de
vida familiar. Especificamente, nestas pesquisas tem sido ressaltado o papel da família no
ajustamento emocional e social dos adolescentes. Com base nos primeiros estudos
longitudinais, muitas informações foram geradas sobre a importância da vida familiar na
etiologia da delinqüência (Heaven, 1994). Recentemente os estudos têm considerado com
ainda mais ênfase a dinâmica familiar para entender a violência, a delinqüência e as
condutas anti-sociais.
Os conflitos e as histórias familiares que envolvem comportamentos anti-sociais de
outros em casa são tomados como relevantes nestas análises (Giancola, 2000; Sankey &
Huon, 1999). Considerando esta fonte de influência, Torrente e Rodrigues (2000)
salientam a importância dos pais com histórico de uso de álcool para o aparecimento de
condutas socialmente desviantes em adolescentes. Estes autores assinalam ainda que
devido à exposição a estes comportamentos, os adolescentes podem, por exemplo, elaborar
uma percepção de aceitação e normalização do uso de drogas (ver também
Adalbjarnardottir & Rafnsson, 2002).
A relação entre estilos de disciplina parental e adolescentes delinqüentes e
agressivos também é considerada nas pesquisas (Sahaw & Scott, 1991; Sankey & Huon,
1999). Fisher e Fagot (1993) apontam a disciplina negativa (punição em termos de
agressão física) no ambiente familiar como fundamental para compreender a presença de
41
condutas socialmente desviantes dos adolescentes e jovens. Pieser e Heaven (1996)
encontraram que o estilo punitivo está diretamente relacionado aos mais altos níveis de
auto-relato de delinqüência entre os indivíduos do sexo masculino. De igual maneira, Frias
e cols. (2000) enfocam que a agressão que os adolescentes sofrem por parte dos seus pais
ou responsáveis poderá desencadear as condutas em questão. Na família, a disciplina
necessária na educação dos filhos se fundamenta na idéia, culturalmente aceita, da
dominação dos pais sobre os filhos, em que se perde muitas vezes o limite entre punição
física como norma educativa ou agressão.
Outro aspecto na vida familiar é o monitoramento parental percebido (Li,
Feigelman & Stanton, 2000), em que aqueles adolescentes que percebem seus pais como
fonte de apoio, são menos propensos a se envolverem em situações de risco, como o uso de
drogas. Considerando jovens delinqüentes, Peiser e Heaven (1996) descrevem que estes
percebem seus pais como participando em poucas atividades sociais e recreativas, além de
relatam menos elogios de suas mães e pais quando comparados com jovens não
delinqüentes.
Individual
Diversos fatores de risco no domínio individual têm sido examinados na busca de
entender as condutas socialmente indesejáveis. Estes incluem características biológicas e
psicológicas identificáveis em crianças e adolescentes que podem aumentar a
vulnerabilidade para as influências ambientais e sociais negativas no seu desenvolvimento
(Herrenkohl & cols., 2000). Assim, verifica-se que, se por um lado se enfatizam variáveis
macro-sociais, por outro também há quem destaque a influência genética como explicação
das condutas anti-sociais. Adotando esta perspectiva, Taylor, Iacono e McGue (2000)
realizaram um estudo longitudinal e apontaram que um início precoce na delinqüência se
42
encontra influenciado, principalmente, por um componente genético subjacente, ao passo
que um início considerado tardio se evidencia como mediado, predominantemente, por
fatores ambientais.
O uso de substâncias psicoativas, tais como o álcool e as drogas ilícitas, tem sido
considerado como forte preditor do fato de um jovem vir a apresentar comportamentos de
risco (Barnes, Welt & Hoffman, 2002; Friedman, 1998; Grunbaum, Basen-Enguist &
Pandey, 1998; La Rosa & cols., 1990; Sussman, Dent & Stacy, 1999; Wagner, 1996). Um
exemplo de comportamento violento ao qual o uso de substancias ilícitas está associada é o
de usar da força e/ou outros métodos inapropriados para se conseguir dinheiro de outras
pessoas, podendo o jovem, inclusive, causar dano físico ou ameaçar alguém da própria
família. Adalbjarnardottir e Rafnsson (2002) destacam que o tipo de comportamento antisocial apresentado pelos jovens é diferenciado em função dos vários tipos de drogas
utilizadas. Estes autores evidenciam que o consumo de álcool prediz significativamente,
por exemplo, o vandalismo e as brigas entre jovens.
No domínio de fatores de risco individual, as pesquisas também têm destacado as
atitudes dos jovens em relação à violência e às drogas, e a afinidade que os jovens
apresentam com a mídia violenta, principalmente aqueles do sexo masculino (Ding, Nelsen
& Lassonde, 2002). Em relação ao gênero, este aspecto aparece também como fator de
risco. Herrenkohl e cols. (2000) enfatiza que os garotos são mais prováveis de se
engajarem em comportamentos anti-sociais sérios quando comparados com as garotas,
possivelmente porque os primeiros são socializados em papéis que encorajam os altos
níveis de agressão física. Outro aspecto é que os adolescentes de ambos os sexos
expressam a agressividade de forma diferente, pois enquanto homens usam força física as
mulheres a expressam mais freqüentemente através de formas verbais.
43
A explicação das condutas de adolescentes e jovens no que diz respeito aos
comportamentos anti-sociais, pode ainda se apresentar em termos de traços de
personalidade. Em geral, a maioria das pesquisas se centra na análise terapêutica; as
exceções, por outro lado, limitam-se tipicamente a estudar apenas um tipo de
comportamento (por exemplo, o ato de fumar) e/ou somente uma característica individual
ou mesmo social, sendo destacado o traço de personalidade psicoticismo ou impulsividade
(Eysenck, 1981). No entanto, Gullone e Moore (2000) têm demonstrado que se faz mister
apresentar certo cuidado com esta relação, pois é extremamente complicado diferenciar a
conduta normal da anormal nestas pesquisas. Desde uma análise mais social, Romero,
Luengo e Sobral (2001) comprovaram que existe relação entre alguns traços de
personalidade (por exemplo, neuroticismo e impulsividade) e as condutas anti-sociais e
delitivas.
No mesmo sentido, Heaven (1994) aponta que, apesar das divergências encontradas
na temática, as informações acumuladas até então mostram que a relação entre
personalidade e delinqüência é clara. Ademais, este autor acrescenta que os traços de
impulsividade, locus de controle, auto-estima e raiva / hostilidade, também merecem ser
melhor averiguados em estudos que abordem o conjunto de comportamentos delinqüentes.
Outro traço de personalidade estudado mais freqüentemente nesta área é a busca de
sensações, que caracteriza os jovens pela atração por jogos e atividades que envolvem
novidade e risco. Os jovens que apresentam pontuações altas em medidas deste traço
tendem a apresentar condutas consideradas socialmente desviantes. De acordo com
pesquisadores do National Institute on Drug Abuse (NIDA), as pessoas que estão
constantemente buscando sentir excitação devido a novas experiências e os usuários de
drogas, especialmente a cocaína, podem ter algo em comum. Numa série de estudos os
pesquisadores têm comprovado que, a busca por novas experiências ativa o sistema de
44
recompensa do cérebro da mesma forma quando uma pessoa faz o uso de drogas. O fato
dos buscadores de sensações estarem guiados pelo mesmo mecanismo primário de
recompensa, assim como acontece com drogaditos, propõe uma interpretação biológica de
que indivíduos que constantemente buscam novidades e experiências excitantes têm mais
probabilidade de usar drogas do que outros que têm menos necessidade de estimulações
novas.
A descoberta de que a ‘novidade’ pode estimular o mesmo sistema do componente
de recompensa cerebral é importante porque sugere que esta poderia instigar o uso de
drogas, sendo mais provável este comportamento nos indivíduos buscadores de sensações
(Mathias, 1995). Nesta busca por novas sensações e experiências, de igual maneira, o
indivíduo também pode se envolver em condutas anti-sociais e delitivas. Portanto, desde
que os indivíduos fossem identificados, idealmente quando crianças, atividades específicas
que estimulassem o sistema de recompensa cerebral poderiam ser destinadas a estes
sujeitos com o intuito de substituir a necessidade futura de se envolver em comportamentos
anti-sociais e até com drogas. Porém, parece ainda precoce tomar estes dados como
conclusivos. Novos estudos parecem necessários a respeito, coisa que tem motivado
igualmente a presente dissertação.
A ênfase nos aspectos relacionados às condutas anti-sociais dos adolescentes e
jovens se revela como uma frente de pesquisas promissora na Psicologia Social. Nesta
área, se considera a necessidade de enfocar uma vertente mais psicossocial, levando em
conta algo que possua um componente desejável, tanto pessoal quanto socialmente.
Destarte, alguns autores têm apresentado especial destaque para os valores humanos, como
Romero e cols. (2001) que desenvolveram um estudo a respeito dos valores e das condutas
anti-sociais de jovens considerados delinqüentes e não delinqüentes. Contudo, encontrar
45
estudos que partam de um modelo teórico acerca dos valores é deveras raro, embora se
evidenciam intentos recentes nesta direção (Coelho Júnior, 2001; Formiga, 2002).
Outra exceção é o estudo de Tamayo, Nicareta, Ribeiro e Barbosa (1995). Estes
autores, através dos tipos motivacionais de Schwartz (1992), realizaram um contraste entre
os valores de estudantes universitários e usuários de drogas. A este respeito observaram
que a adesão a valores pessoais (por exemplo, emoção e prazer), em detrimento de valores
de cunho social (por exemplo, religiosidade e tradição), promove o uso de drogas, e um
padrão de condutas delinqüentes.
Diante do que se expôs, pode-se concluir que todas estas variáveis têm surgido
como fatores potenciais para entender as condutas socialmente indesejáveis, cada uma se
apresentando como relevante para tal. De forma que, como destacado anteriormente, esta
dissertação tornar-se-á, no âmbito brasileiro, mais uma contribuição teórica e empírica
acerca desta temática. No entanto, irá deter-se em alguns aspectos específicos. Mormente,
serão considerados traços de personalidade, valores humanos e algumas variáveis
demográficas (por exemplo, idade e gênero) na explicação de condutas socialmente
desviantes. Neste sentido, estes construtos precisam ser mais pormenorizadamente
tratados, destacando as pesquisas em que têm sido considerados.
46
CAPÍTULO II – PERSONALIDADE HUMANA
47
2- TRAÇOS DE PERSONALIDADE E CONDUTAS ANTI-SOCIAIS
A análise sistemática da personalidade é historicamente um tópico de grande
relevância no âmbito da Psicologia, tendo nos últimos anos recebido especial destaque a
discussão acerca das suas dimensões principais (ver Benet-Martínez & John, 1998). No
entanto, a literatura brasileira acerca desta temática ainda é escassa, especificamente no
que diz respeito à sua análise empírica (Hutz, & cols., 1998). Ademais, dentre os estudos
empíricos que vêm sendo realizados, poucos são os que a consideram em relação com
outros construtos, como podem ser os valores ou as condutas anti-sociais e pró-sociais.
Muitos foram os teóricos da Psicologia que, desde distintas abordagens, se
dedicaram durante décadas ao estudo da personalidade. Autores já clássicos na área, como
Albert Bandura, Alfred Adler, B. F. Skinner, Carl Jung, Carl Rogers, Eric Fromm, Hans
Eysenk, Henry Murray, John Dollard, Neal Miller, Raymond Cattell e Sigmund Freud,
apenas para citar alguns, realizaram incursões e propuseram modelos a respeito da
definição e/ou estrutura da personalidade (Hall, Lindzey & Campbell, 2000; Jesus, 2001;
Queiroga, 2002). Não poderia ser esquecida aqui a contribuição de Gordon Allport, quem
advogou que o nível mais proveitoso de estudo para o teórico da personalidade era o traço,
dando origem assim a uma nova maneira de refletir acerca deste construto. Por certo, nesta
dissertação se adota a perspectiva que considera a personalidade enquanto um conjunto de
traços. Em Marx e Hillix (1973) é possível recuperar a concepção de Allport sobre o que
seria um traço de personalidade:
“um sistema neuropsíquico (peculiar ao indivíduo), generalizado e
focalizado, com a capacidade de tornar muitos estímulos funcionalmente
equivalentes, de iniciar e guiar formas coesas (equivalentes) de
comportamento adaptativo e expressivo” (p. 295).
48
Portanto, pode-se assumir que um traço é uma característica ou qualidade pessoal
distinta. Neste sentido, o traço é algo pode ser empregado para resumir como as pessoas
são ou se comportam no seu dia-a-dia.
De acordo com Schultz e Schultz (2002), agrupar pessoas por traço é algo popular
há bastante tempo. As classificações por traços de maneira mais sistemática podem ser
referidas ao “médico” grego Hipócrates (460-377 a.C.), que distinguiu quatro tipos de
pessoas: felizes, infelizes, temperamentais e apáticas, sendo apontadas como explicações
para estas diferenças os “humores” ou fluidos corporais internos. Assim, tais traços de
personalidade eram explicados por variáveis biológicas e não pela aprendizagem. Em
1940, William Sheldon ofereceu uma outra tipologia da personalidade baseada na
constituição ou formato do corpo das pessoas, e propôs três tipos de corpos cada um deles,
associados com temperamentos diferentes. Tal como Hipócrates, Sheldon considera os
traços de personalidade como invariáveis, independente das situações nas quais as pessoas
se encontram (maiores detalhes ver Schultz & Schultz, 2002).
Adotando que o comportamento é uma função da interação entre variáveis pessoais
e situacionais, Gordon Allport e Raymond Cattell estudaram a personalidade desde uma
perspectiva genética, destacando a importância dos fatores biologicamente herdados para a
formação do traço. De acordo com Schultz e Schultz (2002), aparentemente existe um fator
genético significativo na personalidade, e a esta perspectiva assomam-se cada vez mais
estudos que a corroboram. Allport pretendia sublinhar o papel do traço na explicação das
diferenças individuais, evidenciando, assim, seu interesse pela investigação idiográfica.
Comparando os estudos de Allport com os de Skinner, pode-se observar uma diferença
clara entre os enfoques idiográfico e nomotético, pois, enquanto Skinner preocupava-se em
estudar o comportamento individual com a finalidade de elaborar leis de comportamento
49
nas quais todos os indivíduos pudessem ser encaixados, Allport ocupava-se do estudo do
indivíduo, procurando conhecer suas singularidades.
Considerando a visão de Allport acerca da personalidade, outros teóricos levaram a
cabo estudos objetivando compreender este construto, focalizando, todavia, aspectos
diferentes, como é o caso das teorias fatoriais. Estas implicam em análises estatísticas
direcionadas para o estudo de variáveis múltiplas, estando assim vinculadas ao método da
análise fatorial. Cattell foi um dos precursores no uso deste método, propondo o seu
modelo dos 16-PF (Dezesseis Fatores de Personalidade), com a finalidade de obter um
conjunto consistente de itens capazes de medir objetivamente a personalidade (Cattell &
Cattell, 1995; Jesus, 2001; Queiroga, 2002).
Desde seu primeiro lançamento, em 1949, o 16-PF tem sido empregado em vários
contextos em que a Psicologia se faz presente e necessária: indústria, organização, clínica,
educacional e pesquisa (Cattell & Cattell, 1995). Todavia, na época em que Cattell realizou
a análise fatorial para elaborar o seu modelo, esta técnica ainda era bastante limitada,
sobretudo se for tido em conta a complexidade do seu modelo, que assumia a existência de
dezesseis fatores primários e oito de segunda ordem. Em conseqüência deste fato, ainda
nessa época, embora não houvesse programas mais sofisticados, o modelo de Cattell foi
fortemente criticado, o que abriu caminho para novas soluções, conforme observam Hutz e
cols. (1998).
A partir das controvérsias existentes sobre os 16PF, muitos modelos inovadores
acerca das dimensões da personalidade, enfatizando diferentes quantidades de fatores, vêm
sendo propostos, a saber: o PEN (psicoticismo, extroversão, neuroticismo), elaborado por
Eysenck (1991), quem advoga três dimensões básicas da personalidade, e o OCEAN
(abertura, consciencioso, extroversão, sociabilidade e neuroticismo), proposto por Costa e
McCrae (1992), baseando-se na análise fatorial de uma série de questionários. Este último
50
modelo, conhecido como Big Five, tem bastante em comum com o anterior, inclusive
compartilhando os fatores de extroversão e neuroticismo. Portanto, evidencia-se a idéia
que existem dimensões básicas da personalidade, as quais são mais detidamente
consideradas a seguir.
2.1- As Dimensões Básicas da Personalidade em Eysenck
A idéia de que os traços de personalidade são influenciados por fatores genéticos
tem sido cada vez mais aceita entre alguns teóricos da personalidade. A área de estudo que
trata desta conexão é denominada de Genética Comportamental. Mesmo que o método
utilizado para investigar a personalidade não seja o mesmo, Allport e Cattell foram os
primeiros a adotar esta perspectiva. Hans Eysenck é igualmente um dos pesquisadores de
destaque que sugere a importância dos fatores herdados, compaginando-os com aqueles
denominados de ambientais.
Eysenck conduziu diversas pesquisas sobre a mensuração da personalidade.
Concordava com Cattell no que se refere a personalidade ser composta por traços (fatores
produzidos com base no método de análise fatorial). Contudo, criticou fortemente as
pesquisas deste último devido à sua (potencial) subjetividade e dificuldade de
replicabilidade de seus resultados. Assim, mesmo adotando a análise fatorial, Eysenck
complementava seus achados com diversos testes e estudos experimentais. Com base nos
seus estudos e trabalhando juntamente com sua esposa, Sybil Eysenck, ele desenvolveu
uma teoria acerca da personalidade, propondo um instrumento específico para medi-la: o
Inventário de Personalidade (Eysenck & Eysenck, 1963, citado por Schultz & Schultz,
2002). Como antes foi anteriormente mencionado, a teoria de Hans Eysenck define a
personalidade como composta por três dimensões principais, sendo estas combinações de
traços ou “superfatores”.
51
P – Psicoticismo versus Controle de Impulso.
E – Extroversão versus Introversão.
N – Neuroticismo versus Estabilidade Emocional.
Eysenck apontou que as dimensões de extroversão e neuroticismo são aquelas mais
estudadas desde muito e que são encontradas em praticamente todas as pesquisa,
independentemente dos métodos de avaliação da personalidade. O traço de extroversão
descreve pessoas orientadas para o mundo exterior, que preferem a companhia de outros e
tendem a ser sociáveis. São pessoas impulsivas, aventureiras, assertivas e dominadoras. No
pólo oposto destas características se encontram pessoas introvertidas, que Eysenck supõe
serem biologicamente diferentes, pois verificou que as extrovertidas apresentam um nível
básico de excitação cortical mais baixo, assim buscam e precisam ativamente excitação e
estímulo (Eysenck, 1990). As pessoas que apresentam alta pontuação no traço
neuroticismo são ansiosas, deprimidas, tensas e emotivas. Têm alta probabilidade de
apresentarem problemas na sua auto-estima, com bastante tendência a se sentirem
culpadas. Isso se manifesta em características tanto biológicas quanto comportamentais
que diferem daquelas das pessoas com alta pontuação em estabilidade emocional. O autor
destaca que os indivíduos são predispostos geneticamente ao neuroticismo ou à
estabilidade emocional. As pessoas que pontuam alto no traço psicoticismo são antisociais, agressivas, obstinadas, frias e egocêntricas. Hostilidade e insensibilidade em
relação às necessidades e sentimentos dos outros são freqüentemente apresentados por elas.
Eysenck aponta que possivelmente os homens apresentam pontuação mais elevada do que
as mulheres neste aspecto da personalidade, o que o levou a sugerir que possivelmente
tenha uma relação com os hormônios masculinos.
Em suma, para Eysenck, a sua abordagem acerca dos traços de personalidade se
baseia em intensidade elevada pela hereditariedade e pelos fatores genéticos, a importância
52
dada aos fatores ambientais e situacionais sobre a personalidade. De acordo com Schultz e
Schultz (2002), as dimensões da personalidade de Eysenck estão sendo estudadas em 35
nações, tais como Inglaterra, Japão, Nigéria, Suécia e Estados Unidos, em que se tem
encontrando evidências acerca da relevância dos fatores hereditários na formação da
personalidade. Porém, outro modelo vem tendo igualmente um impacto claro na literatura
sobre a estrutura da personalidade: os Cinco Grandes Fatores de Personalidade (Big Five).
Este é bastante adequado, apresentando um poder de síntese satisfatório, incluindo mais
dimensões de personalidade que o anterior e contando com alguns estudos a respeito no
Brasil (Hutz & cols., 1998; Jesus, 2001; Queiroga, 2002). Neste sentido, justifica-se que
este seja também resumido aqui, o que se faz a continuação.
2.2- O Modelo dos Cinco Grandes Fatores
Os traços ou disposições são um conjunto de componentes utilizados para descrever
as diferenças individuais e tem conquistado um lugar central na Psicologia (Laak, 1996).
Os traços não são completamente diferentes, independentes uns dos outros. No seu
trabalho intitulado Las Cinco Grandes Dimensiones de la Personalidad, Jan Laak faz um
apanhado histórico do surgimento do Modelo dos Cinco Grandes Fatores da personalidade
e comenta que as análises de correlação de diversos instrumentos que medem os traços ou
disposições, geralmente indicam duas dimensões, interpretadas como extroversão e
neuroticismo. Em seguida as pesquisas correlacionais com enfoque psicoléxico, ou seja,
aquelas que utilizavam adjetivos de personalidade, levaram a agregar outras três
dimensões, a saber: agradabilidade (sociabilidade), escrupulosidade (consciencioso) e
abertura à mudança (Laak, 1996). Este novo conjunto de dimensões passou a ser
conhecido como os cinco grandes fatores de personalidade (ver Goldberg, 1981).
53
De acordo com o que descreve Laak, foram Allport e Odbert que, em 1936,
realizaram, pela primeira vez, um estudo psicoléxico completo. Eles extraíram termos
pertinentes à personalidade que estavam contemplados no dicionário Oxford, e assumiram
que a maioria das características sociais de personalidade relevantes e sobressalentes havia
sido codificada em linguagem natural. Desta primeira consulta, selecionaram 17.953
termos que se referiam a algum atributo da personalidade. Em seguida, Cattell utilizou esta
lista para elaborar seu conhecido modelo dos Dezesseis Fatores da Personalidade (16PF),
enfoque este retomado, nos anos 80, através de diversos trabalhos (Prieto, Gouveia &
Fernández, 1996).
A filha de Raymond Cattell, Heather Cattell (1996) ressalta que o 16PF apresentado
por seu pai em 1943 provocou nos pesquisadores do tema o desejo por algo mais simples,
uma vez que o instrumento proposto tornava muito complexa a explicação da
personalidade. Neste sentido, diversas análises foram realizadas por outros estudiosos, por
exemplo, Robert R. McCrae, Lewis R.Goldberg e Oliver P. John, buscando reduzir o
número de fatores de personalidade.
Desde a publicação dos primeiros estudos a respeito dos cinco fatores, diversos
autores têm se empenhado em abordar esta questão cientificamente, propondo inclusive
novos instrumentos para medi-los (ver Benet-Martínez & John, 1998; Hofstee, Raad &
Goldberg, 1992). Falar em um modelo composto por cinco fatores de personalidade
significa prover uma linguagem comum para psicólogos de diferentes tradições, um
fenômeno básico para os teóricos da personalidade explicar uma estrutura natural para
organizar a pesquisa e um guia para a avaliação compreensiva dos indivíduos, podendo ser
de valor para psicólogos educacionais, industriais/organizacionais e clínicos (Queiroga,
2002). Todavia, mesmo seus mais ardentes defensores, não proclamam que o modelo dos
cinco fatores é a última palavra na descrição da personalidade, existindo, inclusive,
54
disputas entre os five-fatoristas sobre a melhor interpretação dos fatores (McCrae & John,
1992).
Costa e McCrae (1992) e Goldberg (1981) são, provavelmente, os maiores
proponentes do modelo dos cinco grandes fatores, tendo como embasamento teórico para
seus estudos a hipótese léxica e a díade genética/meio ambiente. A hipótese léxica é
operacionalizada através de adjetivos que dizem respeito às diferenças individuais que são
encontradas em determinada cultura, sendo consideradas apenas as mais evidentes e
socialmente relevantes. No que se refere à díade genética/meio ambiente, pode-se dizer que
esta implicaria em sentenças representativas dos traços, sendo provenientes de um modelo
compreensivo das influências exercidas pela hereditariedade e o meio ambiente (ver Five
Factor Model, 2001).
De qualquer forma, o modelo dos Cinco Grandes Fatores origina-se da análise de
linguagem para descrever pessoas. Todavia, a hipótese léxica tem sido defendida como a
melhor estratégia para entender as características da personalidade uma vez que as pessoas
tendem a ressaltar na linguagem suas diferenças mais significativas (Goldberg, 1981). Para
Goldberg, se uma característica de personalidade for saliente, ou seja, se for capaz de gerar
diferenças individuais socialmente relevantes, as pessoas vão notar esta característica e,
por ser importante, vão querer falar sobre ela. Como conseqüência, uma palavra ou
expressão possivelmente será criada para descrever essa característica ou traço.
Embora haja diferenciação em relação ao suporte teórico dos itens utilizados por
alguns dos autores, observa-se certa convergência acerca das etiquetas para os fatores,
podendo os mesmos ser apresentados da seguinte forma: extroversão, agradabilidade,
conscienciosidade, neuroticismo e abertura à mudança. Procura-se descrevê-los
sumariamente a seguir:
55
Fator I – Extroversão. O termo foi utilizado originalmente em 1961 por Tupes e Christal
e tem sido geralmente chamado de Extroversão / Introversão (Hutz & cols, 1998). É um
fator que sintetiza traços relacionados à atividade e energia, dominância, sociabilidade,
expressividade e emoções positivas ou ainda que procura saber se a pessoa é ativa e
dominante ou passiva e submissa (Benet-Martínez & John, 1998; Goldberg, 1981).
Fator II – Agradabilidade. Originalmente identificado em língua inglesa como
agreableness, este fator é empregado em português para expressar (nível de) socialização
ou simplesmente agradabilidade. Indica a tendência do indivíduo ser socialmente
agradável / desagradável, amigável, caloroso / frio, dócil (Goldberg, 1981). Hutz e seus
colaboradores (1998) descrevem que alguns autores, como Digman (1990), argumentam
que este termo ainda não seria adequado para expressar as características mais calorosas,
ou seja, que envolvem os aspectos mais humanos do indivíduo, como altruísmo, cuidado,
amor, sensibilidade, confiança, apoio social (que estariam numa dimensão positiva) e
hostilidade, indiferença aos outros, egoísmo e inveja (agrupados numa dimensão negativa).
Fator III - Consciensiosidade. De acordo com Hutz e cols. (1998), este fator geralmente
tem sido chamado de escrupulosidade ou ainda de vontade (Will). No entanto, estes
autores o denominaram de Vontade (desejo) de Realização (Will to Achive) devido ao fato
de alguns estudos (ver também Queiroga, 2002) mostrarem que se trata de um fator
correlacionado com desempenho acadêmico, organizado e dirigido ao comportamento. No
geral, é um fator que agrupa traços ou características de personalidade que levam a
responsabilidade,
honestidade,
em
um
extremo,
e
no
outro,
negligência
e
irresponsabilidade. Por isso, optou-se aqui por acentuar o atributo consciencioso (do inglês
conscientiousness).
Fator IV – Neuroticismo. Este fator contrasta emoções estáveis com afetos negativos,
incluindo ansiedade, tristeza, irritabilidade e tensão nervosa (Benet-Martínez & John,
56
1998). Resumidamente caracteriza a estabilidade emocional do sujeito e reúne
características ou traços de personalidade que procuram saber se a pessoa é desequilibrada,
imprevisível ou “equilibrada”, estável (Goldberg, 1981). Trata–se de um fator que faz parte
da maioria dos instrumentos de avaliação da personalidade (ver também comentários de
Hutz & cols., 1998).
Fator V – Abertura à Mudança. Esta etiqueta foi traduzida de acordo com a expressão
original em língua inglesa (Openess to Change). Porém, é possível igualmente denominálo de abertura a experiências, sendo ainda identificado pela denominação intelecto. Diz
respeito à percepção que a pessoa (ou os demais) tem de sua própria inteligência ou
capacidade, ou seja, se é esperta ou tola. Este fator agrupa características como
flexibilidade de pensamento, fantasia e imaginação, abertura a experiências novas,
principalmente aquelas com um foco cultural (Goldberg, 1981; Hutz & cols, 1998).
Falar que a personalidade humana pode ser representada por uma estrutura de cinco
grandes fatores, não implica dizer que as diferenças da personalidade possam ser reduzidas
a somente cinco traços, argumentam Costa e McCrae (1992). Contrariamente, as
dimensões dos cinco grandes fatores a representam no mais amplo nível de abstração e
cada dimensão inclui um vasto número de distintas, mas específicas, características de
personalidade.
Ainda que se comente que seja improvável que estes sejam os únicos fatores da
personalidade, parece relevante considerar a organização hierárquica da personalidade em
termos de cinco dimensões básicas, sendo estas úteis tanto para a avaliação individual,
quanto para auxiliar os psicólogos estudiosos da personalidade a compreender outros
fenômenos psíquicos (McCrae & John, 1992).
A este respeito, observa-se que um número considerável de pesquisas tem se
dedicado a estudar diversos construtos a partir do modelo dos cinco grandes fatores de
57
personalidade, nos quais são abordadas, por exemplo, as relações desta com aspectos
culturais, buscando saber acerca das características de personalidade que são universais ou
específicas. A Psicologia também tem dado atenção ao desenvolvimento de instrumentos
específicos para mensurar os traços em distintas culturas ocidentais e orientais (Gouveia &
cols. 2001; Katgbak, Church, Guazon-Lapeña, Carlota & Del Pilar, 2002). Outro tópico de
destaque diz respeito às diferenças de gênero e/ou idade (Feingold, 1994; Queiroga, 2001).
Schimitt e Bus (2000) encontraram algumas diferenças significativas quanto ao gênero,
precisamente, verificaram que as mulheres pontuaram mais que os homens nos traços
extroversão, conscienciosidade e agradabilidade. Por outro lado, os homens apresentaram
média estatisticamente superior a das mulheres no traço estabilidade. Por fim, verificaram
que não existiu diferença significativa no traço abertura à mudança.
2.3- PEN, Big Five e Condutas Anti-sociais
As pesquisas a respeito dos traços de personalidade têm considerado em maior
medida o modelo de Hans Eysenck. Por exemplo, Romero, Luengo e Sobral (2001), em
amostras de estudantes espanhóis, encontraram que os fatores de neuroticismo e
psicoticismo deste modelo se correlacionaram com condutas anti-sociais (rmédio = 0,14 e
0,32, respectivamente; p < 0,01 para ambos). Em outro estudo, realizado por Heaven
(1994) em estudantes de ensino médio da Austrália, observou-se que o psicoticismo se
correlacionou com medidas de vandalismo (rmédio = 0,35, p < 0,001) e violência (rmédio =
0,37, p < 0,001). Kemp e Center (2003) compararam as pontuações nos três fatores de
Eysenck de dois grupos de estudantes: adolescentes com problemas emocionais e
comportamentais vs. adolescentes da população geral. A propósito, observaram que os
primeiros apresentaram maior pontuação média em neuroticismo e menor em extroversão
do que o fizeram os últimos. Apesar destes resultados, Sigurdsson e Gudjonsson (1996),
58
tratando com jovens delinqüentes, não observaram diferenças significativas entre os
usuários e não usuários de drogas ilícitas.
No caso dos Big Five, Gullone e Moore (2000) afirmam que o padrão de correlação
dos traços de personalidade com as condutas anti-sociais depende dos fatores de risco que
são considerados; no caso destes autores, os traços de personalidade foram mais eficazes
para predizer os comportamentos de rebeldia, e menos os de busca de emoção. No caso
das condutas anti-sociais, o fator neuroticismo foi o único dos Cinco Grandes a explicá-las
satisfatoriamente ( = -0,15, p < 0,01); o fator de extroversão logrou explicar a busca de
emoção ( = 0,23, p < 0,001). Os resultados a respeito do fator abertura à mudança,
presente entre os Big Five, não tem aparecido como relevante nos estudos prévios que o
consideraram. Não obstante, Gullone e Moore (2000) observaram algumas correlações
com comportamentos socialmente desviantes, como rebeldia (r = -0,11, p < 0,05) e
imprudência (r = -0,15, p < 0,05). Porém, embora positiva, sua correlação foi fraca com a
medida empregada de conduta anti-social (r = 0,05, p > 0,05).
Em resumo, os traços de personalidade, a exemplo dos cinco grandes fatores, têm
sido considerados como construtos importantes para explicar as condutas anti-sociais e
delitivas (ver Miller, 1997; Heaven, 1996; Heaven, Caputi, Trivellion-Scott, & Swinton,
2000). Contudo, o traço busca de sensações parece ser mais relevante neste contexto, uma
vez que revela padrões de condutas intimamente relacionados com a possibilidade de
assumir riscos, como ficará evidenciado. Demanda-se aqui tratá-lo mais diretamente.
59
2.4- A Busca de Sensações e as Condutas Anti-sociais
Marvin Zuckerman, desde a segunda metade dos anos 60 até a atualidade, busca
analisar e aprimorar a teoria do traço de personalidade denominado de busca de sensações
(Zuckerman, 1994). Este autor verificou que tal traço se apresenta em todos os indivíduos
variando apenas na intensidade, sendo mais observado na faixa-etária que varia entre 16 e
20 anos (ver também Kopeikin, 1997). Este traço se encontra tanto em humanos como em
animais, posto que a teoria propõe que evoluiu de um genótipo comum. Sua definição pode
ser apresentada nos seguintes termos:
“um traço que descreve a tendência para procurar sensações e experiências
novas, variadas, complexas e intensas, e a disposição para correr riscos com
a finalidade de satisfazer tais experiências” (Zuckerman, 1994, p. 1).
A busca de sensações é apontada como uma característica peculiar do adolescente,
estando, na maioria das vezes, relacionada com comportamentos de risco, como, por
exemplo, uso de drogas, atividades de mergulho e de paraquedismo, além de dirigir
embriagado (ver Lin & Tsai, 2002). Neste sentido, parece clara a necessidade de considerar
tal construto nesta dissertação.
Com base nos estudos de Zuckerman (1983, 1994), observa-se que algumas
características são comuns aos chamados altos buscadores de sensações, a saber:
a) são não-conformistas e tendem a valorizar situações de risco;
b) têm algo de anti-social em seu senso, o que faz com que sejam guiados por suas
próprias vontades ao invés de convenções sociais, vontades ou atitudes dos outros;
c) são egocentricamente extrovertidos, tendem a manter autonomia através de
relacionamentos assertivos com outros ao invés de se manterem isolados; e
d) almejam a independência e satisfação hedonista com outros como eles.
60
Destaca-se ainda que suas atitudes são positivas em relação à emoção ou alegria e
suas expressões tendem a serem mais desinibidas. Neste sentido, espera-se que a busca de
sensações prediga uma abertura à mudança, uma atitude receptiva em relação às novas
experiências e a habilidade para tolerar sensações e idéias que são comumente estranhas
para a maioria das pessoas. Estes são também considerados como mais sociáveis,
impetuosos, assertivos, atrevidos e demonstram menos medo (Zuckerman, 1983).
Segundo Kopeikin (1997), a busca de sensações está relacionada positivamente
com liberalismo e negativamente com conservadorismo. Ademais, os altos buscadores de
sensações têm mais atitudes de permissividade sexual, tendem a começar a vida sexual
mais cedo, a ter mais parceiros e a ter uma extensão maior de experiências. Por outro lado,
este mesmo autor aponta que os baixos buscadores de sensações tendem a serem
autoritaristas.
Em populações clínicas, a busca de sensação está relacionada com mania e
desordens de caráter psicótico, embora este último esteja inicialmente relacionado com
facetas específicas da busca de sensações: desinibição e busca de experiências, ao invés de
medo e busca de aventura. Algumas pesquisas confirmam que a busca de sensação está
relacionada com um estilo de desordem de caráter, e minimamente relacionada com
neurose e estilos depressivos. Todavia, não existe correlação com a característica de
ansiedade, mas, trata-se de um construto que se encontra negativamente relacionado com
temores específicos, especialmente em situações onde há perigo de dano psicológico (ver
revisão de Kopeikin, 1997).
Em geral, os estudos têm enfocado um modelo biológico para explicar a busca de
sensações em humanos e animais, em que os dados obtidos são analisados em termos de
determinação genética e de relações com a química cerebral. Neste sentido, Aluja (1989)
advoga que para compreender a busca de sensações faz-se necessária uma análise biológica
61
complexa. Em relação às substâncias envolvidas nesse processo, ressalta-se o papel da
monoamina oxidase (MAO). Trata-se de uma enzima envolvida na diminuição dos níveis
dos neurotransmissores monoamínicos no cérebro e que tem o efeito de minimizar o
comportamento de extroversão, que por sua vez encontra-se reduzida nos buscadores de
sensações.
Para mensurar a busca de sensações, Aluja (1989) aponta que em seres humanos os
estudos psicológicos têm partido da Escala de Busca de Sensação (EBS), proposta por
Marvin Zuckerman. A primeira versão surgiu em 1964, a qual continha um só fator geral
derivado racionalmente. Em função das pesquisas realizadas com esta primeira versão,
teve lugar a segunda, que era composta por quatro sub-escalas, derivadas através de análise
fatorial: 1) Busca de Aventuras e Emoção (BEM); 2) Busca de Experiências (BEX); 3)
Desinibição (DES); e 4) Suscetibilidade ao Aborrecimento (SAB). Na Forma V esta escala
foi reconstruída tendo em conta os itens que contribuíam para sua pontuação total. Esta
versão foi replicada em amostras de língua inglesa e holandesa e, com base em análises
fatoriais, corroborou-se a presença de quatro fatores (BEM, BEX, DES, SAB) compostos
por 10 itens cada um.
De acordo com Aluja (1989), com base no esquema da revisão de Zuckerman e nos
dados reportados por ele, observa-se que a EBS tem sido geralmente administrada com
amostras de universitários que tenham um histórico de uso e abuso de drogas, mas também
com indivíduos drogaditos não estudantes. Verificou-se que a experiência com drogas
ilícitas está relacionada com as quatro sub-escalas da EBS, existindo também relação com
o consumo de álcool e tabaco, em que o consumo de álcool se correlaciona diretamente
com a sub-escala DES.
Observou-se também uma relação entre busca de sensações e conduta sexual
(excitação e freqüência), algumas atividades esportivas (por exemplo, surfar) e condutas
62
arriscadas tanto pró-social (por exemplo, saltar de pára-quedas) como anti-social (por
exemplo, dirigir embriagado). Com base nos mesmos dados, encontrou-se que em relação
ao tipo de preferências de lazer como música e esporte, os altos buscadores de sensações
tendem a selecionar atividades que supõem novidade e complexidade (ver Zuckerman,
1983).
Segundo Aluja (1990), relacionando as dimensões da personalidade de Eysenck
(Psicoticismo – P; Neuroticismo – N; e Extroversão – E) com as sub-escalas de busca de
sensações (Busca de Emoções – BEM; Busca de Excitação – BEX; Desinibição – DES; e
Suscetibilidade ao Aborrecimento – SAB), observou-se que estão correlacionadas entre si.
Por exemplo, verificaram-se correlações mais significativas entre Psicoticismo e DES
(mais em homens do que em mulheres), e entre Extroversão e DES (de forma mais
significativa em mulheres do que em homens). Aluja indica igualmente que, nos primeiros
trabalhos que datam dos anos 70, encontrou-se uma correlação mútua entre EBS (Escala de
Busca de Sensações) e EPQ (Questionário de Personalidade de Eysenck) em relação a
experiências sexuais. Desde então muitos trabalhos têm sido realizados com estas escalas e
os estudos de personalidade e condutas sexuais que confirmam esta relação.
Greene, Krcmar, Walters, Rubin e Hale (2000) observaram que os quatro fatores de
busca
de
sensação
estão
diretamente
correlacionados
com
um
conjunto
de
comportamentos socialmente desviantes, a exemplo de fumar (r = 0,22, p < 0,001), prática
sexual arriscada (r = 0,15, p < 0,001), uso de drogas (r = 0,37, p < 0,001), delinqüência (r
= 0,38, p < 0,001), usar bebidas alcoólicas (r = 0,43, p < 0,001) e dirigir embriagado (r =
0,30, p < 0,001). Resultados muito similares foram observados por Donohew e cols. (1999)
no que se refere ao uso de maconha e álcool.
Diante do exposto, considera-se que a busca de sensações pode contribuir para
entender as condutas anti-sociais e delitivas dos adolescente e jovens, como também se
63
pode estudar melhor a relação entre os traços de personalidade e a busca de sensações.
Ademais, considerando a necessidade de não se limitar a considerar variáveis isoladas na
compreensão de tais condutas, e a fim de abordar construtos simultaneamente de cunho
individual e mais social, considerar-se-ão também os valores humanos, ou prioridades
valorativas adotadas pelos adolescentes e jovens.
Como advogam Schwartz e Bilsky (1990), os valores são importantes
representações cognitivas de metas ou motivações humanas e que devem estar
coordenados com o comportamento de cada indivíduo. Sendo assim, aliados à
personalidade, os valores humanos apresentam-se como um outro construto bastante
relevante para a compreensão das interações sociais, descrição e explicação dos
comportamentos individuais. Ademais, de acordo estes autores, o princípio que organiza a
estrutura dos valores, ou seja, as variações na motivação, também embasa as diferenças da
personalidade. Portanto, o entendimento da relação valores-personalidade requer que os
traços de personalidade sejam relacionados em concordância com uma lista de tipos de
valores.
Diante do exposto, esta dissertação, como explicitado anteriormente, pretende
verificar a relação entre os valores e os traços de personalidade, bem como considerá-los
conjuntamente na explicação das condutas anti-sociais e delitivas. Para tanto, será
considerado o modelo dos Cinco Grande Fatores tratando, especificamente, os traços
neuroticismo e extroversão, além do traço busca de sensações. Em relação aos valores,
estes serão apresentados teoricamente a diante.
64
CAPÍTULO III - VALORES HUMANOS
65
3- PRIORIDADES VALORATIVAS E CONDUTAS ANTI-SOCIAIS
Os valores humanos sempre foram um tema extremamente especulado nas Ciências
Sociais por possuírem um importante papel no processo seletivo das ações humanas
(Rokeach, 1973). Estes têm se apresentado como de fundamental relevância na explicação
do comportamento das pessoas, pois são capazes de orientar tanto as escolhas quanto as
atitudes humanas. Assim, antes mesmo de apresentar os estudos que relacionam os valores
com as atitudes anti-sociais e delitivas (objetivo central da presente dissertação), faz-se
mister apresentar um breve histórico acerca dos valores humanos, ressaltando as
contribuições ao tema na Filosofia e Sociologia, para em seguida expor como este tema
tem sido tratado na ciência psicológica, na qual merece uma exposição desde as
contribuições de Rokeach até a tipologia aqui utilizada.
3.1-Posições Filosóficas e Sociológicas no Estudo dos Valores Humanos
A filosofia desenvolveu historicamente distintas teorias sobre valores que foram
posteriormente recorridas pela Psicologia, Sociologia e até Antropologia para explicar o
comportamento humano. A seguir são apresentadas algumas escolas filosóficas e seus
representantes, que segundo Garcés-Ferrer (1988), compreendem as que mais contribuíram
para o estudo dos valores em Psicologia. Ressalta-se que a análise aqui apresentada é,
sobretudo, fruto do trabalho deste autor.
Garcés-Ferrer destaca primeiramente a escola do Subjetivismo do valor, na qual
estão aqueles que consideram que os valores não têm consistência alguma; as coisas e os
objetos tampouco são valiosos em si, mas sua valoração depende de suas relações com o
sujeito que o valora. Raymond Polin é um dos representantes deste pensamento; ele
admitiu que o valor é renovação incessante e criação permanente do homem, e descartou
qualquer fundamentação real dos valores, pois se reduzem ao subjetivo e se projetam
66
quando a consciência busca algo futurístico. Nesta mesma escola, Christian Ehrenfels
retoma a idéia da relação entre objeto e sujeito, mas acrescenta que a importância de um
valor é determinada pela intensidade do desejo do individuo. Assim, o valor e a
desejabilidade são a mesma coisa, sendo esta considerada a base para os estudos
posteriores que consideram a característica socialmente desejável nos valores. Neste
sentido, não se apóia a concepção objetiva dos valores na qual dependem das preferências
individuais, mas, ao contrário, são os atos de agrado ou desagrado das demais pessoas que
fundamentam os valores.
Contrariamente à Teoria Absolutista, que define o valor como fundamento de todos
os atos, sendo desejável o que é valioso, a Teoria Subjetivista afirma que tem valor o
desejável. Observa-se que esta contribuição acerca dos valores é resgatada por Clyde
Kluckhohn na Antropologia, em que se consideram os valores humanos como concepções
do desejável.
Outra escola filosófica que considerou a idéia de valor, foi a Neokantiana. A idéia
básica consiste em considerar os valores como sendo normas a priori da razão, porém não
correspondem ao sujeito singular mais ao mundo transcendental, em que é o respeito à
norma o único que vale. Nesta corrente filosófica os valores transcendem a história e não
são realidades nem física nem psicológica. Um dos representantes desta corrente filosófica
é Enrique Rickert. Este entende que a pessoa humana é relativa e os valores são eternos.
Este elabora uma estrutura teórica que distingue três tipos de valores: 1) bens do futuro –
que define um todo que não se consegue jamais; 2) bens do presente – que se restringe a
um espaço finito, representado pela beleza e felicidade; e 3) bens eternos – são os valores
religiosos.
Ademais, na escola Neokantiana são destacadas as idéias de Hugo Munsterberg,
que divide os valores em duas áreas, uma compreendendo os valores vitais e a outra agrupa
67
os valores culturais, em que ambos respondem a exigência de “identidade” que se alcança
quando confluem quatro vertentes valorativas: os valores lógicos, estéticos, éticos e
metafísicos. Para este autor o valor é intemporal, eternamente valioso e normativo, desta
forma o sistema de valores reside na consciência moral e normativa.
Por último, destaca-se a contribuição da escola Fenomenológica. Tal escola
contrapõe-se ao empirismo das escolas Subjetivista e Neokantiana, no sentido de que o
valor não se define como uma reação subjetivista em relação a estímulos externos; nem
como uma forma apriorística. Por outro lado, igual à escola Neokantiana, designa um
caráter ideal ao valor que se capta por meio de uma intuição emocional de ordem superior:
“a estimativa”. Podem-se apontar duas contribuições principais desta escola, a de Marx
Scheler e a de Ortega e Gasset.
Scheler contribui ao enumerar regras do preferir ou critérios da hierarquia dos
valores. O primeiro critério de sua axiologia é a “duração”; uma coisa é mais estimada
quanto mais duradoura é. Outro critério é a “satisfação” que produz os valores. O caráter
“absoluto ou relativo” do valor é outro ponto. A “indivisibilidade” e que sejam ou não
“fundamentais” completam os cinco critérios gerais. No cerne destes critérios distingue
uma tipologia dos valores, apontando que existem: 1) valores de pessoas e coisas, e 2)
valores de disposição de ânimo, ação e êxito.
Por outro lado, Ortega e Gasset elaboraram uma teoria em que por meio dos valores
tentam valorizar a vida; estes apontaram que os valores são qualidades ideais
independentes do sujeito. Além de ressaltar seu caráter hierárquico, adotam uma
concepção polar dos valores, ao afirmarem que associado a cada valor positivo está seu
correspondente negativo. Ademais, propuseram uma axiologia que agrupa os valores em:
1) úteis; 2) vitais; 3) religiosos; e 4) espirituais (compostos por valores intelectuais, morais
e estéticos).
68
Observa-se que estas diversas concepções procedentes da Filosofia acerca dos
valores servem para compreender algumas das formulações teóricas desenvolvidas desde a
Psicologia. Com este intuito, também são apresentadas aqui algumas contribuições
importantes de sociólogos aos estudos dos valores humanos. Na Sociologia, segundo Ros
(2001), muitos foram os que se dedicaram ao estudo dos valores. Com base nesta autora,
duas são as contribuições que têm tido considerável impacto nas elaborações teóricas na
Psicologia, descritas a seguir.
A relevância da obra de Tomas e Znanieck na Psicologia Social se deve ao fato
destes autores terem contribuído ao esclarecimento do conceito de atitude, bem como dos
estudos acerca da relação entre atitudes e valores. Para eles o conceito de atitudes engloba
as dimensões comportamental e emocional, como já havia sido definida anteriormente por
outros autores; por outro lado, estes acrescentam o aspecto cognitivo à definição, no
sentido de que as pessoas, através de um processo cognitivo, captam a situação e decidem
como devem atuar. Em relação aos valores, especificamente, destacam que enquanto as
atitudes são intra-subjetivas, os valores são intersubjetivos e permitem uma conexão entre
a estrutura social e as atitudes. Tomas e Znanieck são considerados os precursores dos
estudos que relacionam os valores a metas e que são, conseqüentemente, motivados. Estes
destacam cinco motivos subjacentes aos valores: 1) reconhecimento social, 2) segurança,
3) resposta, 4) competência e 5) novas experiências (ver Ros, 2001).
A segunda contribuição importante da Sociologia é fornecida por Talcott Parsons.
Este trata principalmente do conceito de ação, e afirma que esta se realiza cada vez que os
atores tentam alcançar metas. Parsons aponta que a pessoa se encontra motivada a atuar
guiada por três critérios, a saber: cognitivos, avaliativos e orientações valorativas.
Diferentemente de Tomas e Znaniecki, adota a concepção de Kluckhohn na qual os valores
instigam o comportamento, são socialmente desejáveis e se organizam hierarquicamente.
69
Para Parsons, os valores são o que obriga as pessoas a respeitarem as normas vigentes
numa sociedade. Segundo ele, os valores possuem três aspectos: o cognitivo, o avaliativo e
o de responsabilidade pessoal frente às conseqüências de suas ações tanto para a pessoa
como para a sociedade. Ainda, deve-se a Parsons a separação dos conceitos de valores e
normas, haja vista os valores serem abstratos servindo de reflexão apenas para a ação,
enquanto que as normas apontam o que fazer em situações específicas.
Em resumo, o que hoje é conhecido a respeito dos valores humanos em Psicologia
se fundamentou principalmente em ensaios teóricos e estudos empíricos realizados em
diversas áreas das ciências humanas e sociais. São particularmente destacáveis as
contribuições das décadas de 50 e 60, sobretudo as efetuadas na Antropologia e Sociologia.
Por certo, um dos modelos que teve origem neste contexto foi o de Ronald Inglehart. Este
será descrito a continuação, seguido pela apresentação das abordagens que em Psicologia
têm fundamentado a concepção que hoje é predominante.
3.1.1- Valores Materialista e Pós-materialistas
Provavelmente, na atualidade seja Ronald Inglehart o autor de maior peso no tema
dos valores humanos nas Ciências Sociais e Políticas (Gouveia, 1998). Inglehart (1977,
1991) entende que os valores não são apenas úteis para estudar as condutas dos indivíduos,
mas são também bons indicadores do nível de vida de uma população, além de sua
utilidade para conhecer os estilos e hábitos de uma sociedade e/ou cultura. Para tanto,
propõe uma teoria sobre os valores humanos fundamentada na idéia de escassez e
socialização. A partir da teoria da hierarquia das necessidades (Maslow, 1954 / 1970), este
autor define duas dimensões básicas através das quais pretende identificar as mudanças
geracionais e comparar as culturas nacionais: materialismo – que diz respeito à satisfação
70
de necessidades mais básicas e de segurança, isto é, valores materiais, e pós-materialismo
– que se origina a partir da satisfação materialista, desencadeando os valores espirituais.
Gouveia (1998) trata este assunto expondo que a crescente tendência à diminuição
de valores religiosos e tradicionais na sociedade possibilita a substituição de valores
materialistas, próprios de sociedades baseadas na escassez, por outros valores pósmaterialistas, característicos das sociedades que têm logrado maiores níveis de segurança.
Neste sentido, considerando a Hipótese da Convergência, o desenvolvimento econômico
das sociedades acaba por influenciar a mudança gradual de valores.
Segundo Inglehart (1991), naquelas sociedades onde não estão satisfeitas as
necessidades de segurança (física ou econômica), o materialismo seria o padrão valorativo
predominante. Contrariamente, nas sociedades mais ricas, as quais ele chama de
sociedades industriais avançadas, seria imperativa a dimensão valorativa denominada de
pós-materialismo. De acordo com Formiga (2002), estas conjeturas, que são em princípio
simples, não necessariamente correspondem à realidade. É possível que em países ricos ou
pessoas que na atualidade gozem de estabilidade, siga-se dando importância à orientação
materialista.
Nesta perspectiva, estas orientações valorativas estão baseadas nas mudanças de
comportamentos que os indivíduos vão armazenando com suas experiências.
Especificamente, a mudança de valores materialistas para os pós-materialistas tem sido
fundamentada em duas hipóteses, que estão interligadas (Inglehart, 1991): a de escassez e a
de socialização. A fim de entender as prioridades valorativas dos indivíduos há que se
entender o processo de socialização por que passaram. Tal processo seria a forma dos
indivíduos captarem as prioridades dos valores de sua cultura com o estado
socioeconômico ao qual faz parte. É, portanto, necessário atentar para o período e o
contexto em que estes foram socializados, correspondendo aos anos de infância e
71
adolescência. Complementar a este aspecto, a hipótese da escassez sugere que a escassez
do ambiente socioeconômico em que vivem os indivíduos seria o que pautaria as
prioridades valorativas dos indivíduos. Assim, alguém que viveu em um contexto de
escassez, por exemplo, durante uma guerra, pode seguir dando importância à segurança
física e econômica, ainda que tenha garantido a satisfação destas necessidades.
Inglehart verificou, através de uma análise dos Componentes Principais, que os
indicadores dos valores materialistas se agrupavam no pólo positivo de um continuum, ao
passo que, no pólo negativo, agrupam-se os indicadores dos valores pós-materialistas,
pressupondo assim, uma dimensão bipolar. Contudo, esta dimensionalidade tem sido
criticada, pois outros estudos sugerem dimensões distintas (ver Pereira, 2000).
3.2- O Estudo dos Valores Humanos na Psicologia
O tema dos valores esteve, por um período de tempo, obscurecido na Psicologia
Social em função dos estudos sobre as atitudes, atribuições, cognição social e processos
grupais (Oishi, Schimmack, Diener & Suh, 1998). Segundo Lima (1997), o interesse pelo
estudo dos valores dentro da Psicologia começou mesmo nas décadas de 50 e 60 do século
passado, na ocasião em que se buscavam técnicas mais refinadas para mensurar as atitudes.
Posteriormente, Milton Rokeach, entre os anos 60 e 70, deu uma grande contribuição,
assentando as bases teóricas que colocou os valores como representação das necessidades
humanas. Porém, foi nos anos 80, através das pesquisas transculturais realizadas por Geert
Hofstede, primeiramente, e logo por Shalom House Schwartz e seus colaboradores, que
ocorreu a (re)vitalização do estudo dos valores.
Desde então, vários estudos foram realizados na tentativa de esclarecer melhor
quais valores são priorizados pelos indivíduos nas diferentes culturas, estabelecendo-se
assim tipologias de valores universais, que procuram resumir as prioridades axiológicas
72
que guiam a vida das pessoas. A seguir se procura resumir alguns dos principais modelos
teóricos sobre esta temática.
3.2.1- Valores Instrumentais e Terminais
Milton Rokeach figura como o teórico mais conhecido a escrever sobre os valores
humanos, pois ele além de fornecer critérios possibilitando pesquisas empíricas ao tema,
em sua obra/ clássica, The Nature of Human Value (1973), estabelece cinco pressupostos
básicos para a sua teoria: (1) o número de valores que uma pessoa possui é relativamente
pequeno; (2) independentemente da cultura na qual estejam inseridas, as pessoas possuem
os mesmos valores, diferenciando apenas o grau de importância atribuído a cada um deles;
(3) os valores são organizados em sistemas de valores; (4) os antecedentes dos valores
podem ser determinados pela cultura, pela sociedade e por suas instituições, além da
própria personalidade dos indivíduos; e (5) as manifestações dos valores se dão em
fenômenos considerados dignos de serem estudados e entendidos pelos cientistas sociais. A
partir destes pressupostos, este autor define os valores e os sistemas de valores como segue
(Rokeach, 1973, p. 5):
“Um valor é uma crença duradoura de que um modo específico ou um
estado final de existência, que é pessoal ou socialmente preferível a
um oposto ou contrário modo de conduta ou estado final de
existência. Um sistema de valor é uma organização duradoura de
crenças referentes a modos de conduta ou estados finais de existência
ao longo de um contínuo de relativa importância”.
Para este autor, os valores dependeriam da cultura, da sociedade e das instituições
sociais nas quais as pessoas estão inseridas; a personalidade pode igualmente moldar o
conjunto de valores de uma pessoa (Jesus, 2001).
73
Neste aporte teórico, os valores são divididos entre aqueles definidos como meios
para alcançar o desejável (valores instrumentais) e aqueles que são o próprio desejável
(valores terminais), referindo-se, respectivamente, aos modos de conduta e estados finais
de existência, indicados no conceito acima. Os valores instrumentais podem ser morais e
de competência. Estes independem da moralidade e sua violação provoca sentimentos de
vergonha ou de inadequação pessoal; já os morais correspondem a uma perspectiva
interpessoal, provocando sentimentos de culpa quando de sua transgressão. Os valores
terminais também apresentam duas tendências, podendo estar centrados no indivíduo
(intrapessoal) ou na sociedade (interpessoal).
Para a mensuração dos valores, Rokeach desenvolve a Rokeach Value Survey –
RVS. Esta escala é composta por 36 valores, sendo 18 terminais e 18 instrumentais, como
segue:
 Valores terminais: felicidade, auto-respeito, tempo livre, salvação, segurança familiar,
satisfação com a tarefa realizada, uma vida confortável, amizade verdadeira,
harmonia interna, maturidade, um mundo de paz, igualdade, reconhecimento
social, amor maduro, segurança nacional, um mundo de beleza, liberdade e uma
vida excitante.
 Valores instrumentais: valente, educado, intelectual, honrado, obediente, lógico,
imaginativo, capaz, alegre, autocontrolado, capaz de perdoar, capaz de amar,
responsável, independente, limpo, ambicioso, liberal e serviçal.
A fim de proceder a seleção dos 18 valores terminais, Rokeach utilizou a literatura
sobre valores, sua experiência pessoal e um levantamento feito com 100 pessoas de uma
cidade estadunidense. Já os valores instrumentais foram escolhidos de uma lista de 555
traços de personalidade identificados no vocabulário psicológico. Finalmente, para chegar
74
à lista final dos valores, foram eliminados aqueles semanticamente idênticos e mantidos os
que apresentavam relevância cultural e adequação ao conceito de valor.
A operacionalização de cada um dos valores se dá através de uma frase e os sujeitos
são solicitados a ordená-los de acordo com o grau de importância, sendo estes respondidos
numa escala ordinal, produzindo medidas ipsativas. A RVS foi validada para o contexto
brasileiro por Harmunt Günther e utilizada para verificar, por exemplo, diferenças
axiológicas com as variáveis idade, gênero e nível sócio-econômico (Milfont, 2001).
Sem dúvida, a contribuição de Rokeach aos estudos dos valores é inquestionável,
quiçá ninguém tenha contribuído tanto. Todavia, amiúde algumas críticas são feitas a sua
teoria e proposta de mensuração. Por exemplo, Gouveia (1998) adverte que Rokeach
distingue valor de conceitos como atitudes e normas sociais, porém não o faz com o de
crenças, pois na sua definição os valores se reduzem a estas, impossibilitando uma maior
delimitação do tema. Comenta igualmente que outro aspecto que merece destaque diz
respeito à metodologia utilizada na escolha dos valores, pois se baseia em suas próprias
convicções, além do mais a divisão em valores instrumentais e terminais não se confirma
em resultados de pesquisas posteriores, nas quais não apresentou fidedignidade confiável
para o contexto brasileiro.
A ausência de referência à natureza humana, o fato de o pesquisador não ter certeza
se o sujeito considera todos os valores ou apenas alguns deles ao responder seu
instrumento, e associado a isto, a questão de utilizar um modelo ordinal na medição dos
valores leva a dificuldade de realizar análises estatísticas mais rigorosas. Neste sentido,
estes pontos são criticados no modelo de Rokeach. Considerando tais aspectos, Shalom H.
Schwartz propôs a teoria dos tipos motivacionais, procurando sanar algumas das críticas
previamente indicadas (Maia, 2000). Dada sua importância na atualidade (Smith &
Schwartz, 1997), este modelo teórico merecerá maior atenção a seguir.
75
3.2.2- Estrutura e Conteúdo dos Valores Humanos
S. H. Schwartz e seus colaboradores procuraram definir uma Tipologia da
Estrutura e do Conteúdo dos Valores Humanos que tenha como característica principal a
universalidade, pretendendo que tenha validade tanto intra como inter-cultural. Para este
fim, o instrumento idealizado por Schwartz foi aplicado a 88 amostras em 44 países e os
resultados, aproximadamente, apresentaram a mesma estrutura, demonstrando que se
reconhece o conteúdo dos valores específicos e que estes obedecem a uma estrutura
determinada, segundo sua teoria (Tamayo & Schwartz, 1993).
Schwartz e Bilsky (1987, 1990) apresentam os valores como sendo concepções do
desejável que influenciam a maneira como as pessoas selecionam ações e avaliam eventos.
Estes autores incorporam os elementos sobre os valores que são consensuais nas teorias de
Kluckhohn e Rokeach, quais sejam: (1) a idéia de que estes são conceitos ou crenças; (2)
que são estados finais ou comportamentos desejáveis; (3) transcendem às situações
específicas; (4) guiam a seleção ou a avaliação de comportamentos ou eventos; e (5) são
ordenados conforme sua importância relativa.
Mesmo adotando estas características acerca dos valores, Schwartz reelabora alguns
aspectos destas. Por exemplo, considera que não está claro o conteúdo que possuem os
valores, motivo pelo qual sente falta de uma teoria que defina tais conteúdos (Andrade,
2001). Sua teoria distingue três fontes principais dos valores, consideradas como
requerimentos humanos universais, a saber: 1) as necessidades humanas (organismo
biológico), 2) os motivos sociais (interação) e 3) as demandas institucionais (bem-estar e
sobrevivência dos grupos). Neste sentido, propõe uma relevância maior para a tomada dos
valores como objetivos ou metas, em que seu conteúdo seria distinguido pelos tipos
motivacionais que eles expressariam. Desta forma, algumas outras características dos
valores se sobressaem: (a) servem a interesses de alguma entidade social; (b) podem
76
motivar a ação dando-lhe direção e intensidade emocional; (c) funcionam como padrões
para julgar e justificar as ações; e (d) são adquiridos tanto pela socialização do grupo
dominante como pelas experiências singulares dos indivíduos.
Estas considerações levaram Schwartz a desenvolver uma teoria que demonstrasse
o conteúdo e a estrutura básica dos valores humanos, de maneira que se propõe especificar
teoricamente os seguintes aspectos: 1) as dimensões conceituais que seriam necessárias
para definir os valores humanos; 2) os diferentes domínios de conteúdos dos valores que
seriam distinguidos por pessoas de todas as culturas, e os exemplos de valores típicos de
cada domínio, assim como 3) algumas das relações estruturais entre os diferentes domínios
de valores (Andrade, 2001; Maia, 2000).
Schwartz e Bilsky (1987) derivaram da literatura, principalmente da lista dos 36
valores de Rokeach (1973), os valores de sua tipologia e os domínios motivacionais a
partir do seu significado e das necessidades individuais, interacionais e institucionais. A
princípio compuseram sete domínios motivacionais que, mais tarde, após estudos
empíricos, consolidaram-se em dez grupos de valores. Cada tipo motivacional é definido
por seus objetivos ou metas centrais, seguidos pelos valores específicos que
fundamentalmente os representam (ver Quadro 1). Conforme explicam estes autores, um
valor específico representa um tipo de valor se as pessoas, ao agirem, pretenderem atingir
determinado objetivo central, de maneira que seu comportamento está exprimindo este
valor.
77
Quadro 1: Tipos motivacionais, Metas e Valores específicos.
Tipos
motivacionais
Metas
Valores específicos
Status social e prestígio, controle ou
domínio sobre as pessoas e sobre os
recursos.
Poder social, autoridade,
riqueza.
Realização
Sucesso pessoal pela demonstração de
competência segundo os padrões sociais.
Bem sucedido, capaz,
ambicioso, influente.
Hedonismo
Gratificação sensual e prazer para si
mesmo.
Prazer, apreciar a vida.
Estimulação
Excitação, novidade e desafio na vida.
Ousadia, vida variada, vida
excitante.
Independência de pensamento e de ação,
criando, explorando.
Criatividade, liberdade,
independência, curiosidade,
escolhendo seus próprios
objetivos, inteligente.
Poder
Auto-direção
Compreensão, estima, tolerância e
Universalismo proteção para com o bem-estar de todas as
pessoas e da natureza.
Mente aberta, justiça social,
igualdade, um mundo em
paz, um mundo de beleza,
protegendo o meio
ambiente.
Benevolência
Preservação e aumento do bem-estar das
pessoas com quem se tem contato pessoal
freqüente.
Prestativo, honesto, que
perdoa, leal, responsável e
verdadeiramente amigo.
Tradição
Respeito, compromisso e aceitação dos
costumes e das idéias que a tradição
cultural ou a religião fornecem.
Humilde, aceito minha
porção na vida, devoto,
respeito às tradições.
Conformismo
Contêm-se as ações, inclinações e
impulsos que possam fazer mal ou causar
sofrimento aos outros ou que violem as
expectativas ou normas sociais.
Polidez, auto-disciplina,
honrar seus pais e os mais
velhos.
Segurança
Segurança, harmonia e estabilidade da
sociedade, dos relacionamentos ou da
própria pessoa.
Segurança da família,
segurança nacional,
moderação, proteção da
imagem pública.
De acordo com a teoria de Schwartz, os valores encontrados em qualquer cultura
deveriam ser passíveis de serem virtualmente classificados em algum destes dez tipos
motivacionais. No entanto, o próprio autor encontrou uma possível exceção: um grupo de
78
valores denominados de espirituais. Ademais, segundo Schwartz e Bilsky (1987), a
tipologia dos valores permite que novos valores singulares possam ser acrescentados.
Outro ponto importante na teoria de Schwartz diz respeito às relações dinâmicas
entre os próprios tipos motivacionais de valores. Schwartz (1992) esclarece que, quando se
age tomando um dos valores como objetivo, as conseqüências práticas, psicológicas ou
sociais podem ser conflitantes ou compatíveis com um outro valor que se persiga.
Baseando-se nesta idéia, este autor propôs uma estrutura complexa que padroniza as
relações de conflito e compatibilidade entre os valores. Esta estrutura é circular, tal como
representada na Figura 1 a seguir. Nela, os valores que são conflitantes se situam em
direções opostas a partir do centro da figura, e aqueles que são compatíveis situam-se ao
lado um do outro ao longo do círculo.
AUTO-TRANSCENDÊNCIA
Benevolência
Tradição
4
Autodireção
Conformidade
Estimulação
Segurança
CONSERVAÇÃO
ABERTURA À MUDANÇA
Universalismo
Hedonismo
Realização
Poder
AUTO-PROMOÇÃO
Figura 1- Estrutura Bidimensional dos Tipos Motivacionais (adaptado de Schwartz, 1992,
p. 14).
79
Esta estrutura apresenta ainda duas dimensões bipolares básicas. Cada pólo
constitui um tipo de valor de ordem superior que combina dois ou mais dos dez tipos
motivacionais. Uma das dimensões põe em oposição a Abertura à Mudança (Autodireção
e Estimulação) à Conservação (Conformidade, Tradição e Segurança); a outra opõe a
Auto-Transcendência (Universalismo e Benevolência) à Auto-Promoção (Realização e
Poder). Cabe destacar que o Hedonismo está relacionado tanto com a Abertura à
Mudança como com a Auto-Promoção (Schwartz, 2001).
Esta tipologia tem sido testada empiricamente através de uma análise
multidimensional, verificando quão bem os domínios motivacionais, seus conteúdos, seus
valores típicos e sua estrutura de relações representam o uso que as pessoas fazem dos
valores. Mais precisamente, Schwartz utiliza a Smallest Space Analysis (SSA) para
distinguir a extensão pela qual as diferenças apontadas pela teoria correspondem às que as
pessoas fazem em diferentes sociedades ao avaliarem a importância relativa de seus
valores (ver Schwartz, 1994). Este procedimento, além de querer demonstrar a
universalidade desta tipologia da estrutura e do conteúdo dos valores, pretende identificar,
interpretar e predizer o impacto dos valores (como variável independente) sobre as atitudes
e o comportamento, através de índices de importância dos domínios de valores, além dos
efeitos de diferentes variáveis sociais e estruturais (econômicas, políticas, religiosas,
étnicas e familiares) sobre os valores como variáveis dependentes, pelo uso de domínios ao
invés de valores únicos e específicos (Schwartz & Bilsky, 1987).
Para completar a caracterização da teoria dos valores apresentada por Schwartz, não
se pode deixar de enfatizar o fato de que este autor considera que os valores, enquanto
metas, procuram atender a interesses específicos, quais sejam: interesses individualistas
(por exemplo, prazer, independência), interesses coletivistas (por exemplo, igualdade,
responsabilidade) ou interesses mistos (por exemplo, sabedoria, um mundo de beleza)
80
(Schwartz, 1990; Schwartz & Bilsky, 1990). Estas se tratam de dimensões relevantes para
a diferenciação de valores tanto no nível de análise social como individual. Neste sentido, a
importância dada aos valores é influenciada sistematicamente pelo interesse ao qual
servem. No Quadro 2 se apresenta um resumo deste aspecto da teoria.
Quadro 2: Interesses a que cumprem os Tipos Motivacionais.
Interesse
Individualista
Coletivista
Misto
Dimensão de Ordem Superior
Tipo Motivacional
Abertura à mudança
Autodireção, Estimulação,
Auto-Promoção
Hedonismo, Poder, Êxito
Conservação
Conformidade, Tradição
Auto-Transcendência
Benevolência
Conservação
Segurança.
Auto-Transcendência
Universalismo
Andrade (2001) aponta que Schwartz e Bilsky baseiam-se nas conclusões de
Hofstede de que os membros de uma sociedade variam substancialmente na ênfase que dão
ao individualismo e ao coletivismo, e isto afetaria a avaliação que o indivíduo faz sobre
qual interesse determinado valor estaria servindo. A classificação dos valores em
individualistas, coletivistas e mistos não é unânime na literatura, embora haja uma certa
convergência.
A teoria de Schwartz e seus colaboradores teve larga repercussão no mundo
acadêmico e é hoje em dia alvo de muitas pesquisas dentro da Psicologia Social.
Entretanto, alguns autores tecem críticas aos fundamentos e postulados teóricos da sua
proposta. Por exemplo, Molpeceres (1994) descreve que
“em ocasiões, tem-se a impressão de que não há, subjacente à
proposta de Schwartz, uma concepção elaborada do homem como
ser social, senão uma hábil revisão da literatura psicológica e
sociológica. Neste sentido, pois, não é uma teoria em si, mas uma
plataforma útil para a elaboração teórica [..]” (p. 76).
81
Também se pode observar que, tal como Rokeach, Schwartz não possui uma teoria
para elaborar sua lista de valores. Não obstante, é mais criterioso ao identificar os tipos
motivacionais e procurar definir seu conteúdo. Assim, frente aos modelos existentes e
reconhecendo a necessidade de diferenciar os valores de outros construtos com os quais
costumam ser confundidos, Gouveia (1998) pensou na possibilidade de elaborar uma
tipologia alternativa. Talvez seu aspecto mais inovador seja assumir a natureza humana
como benévola, e identificar uma teoria específica a partir da qual deriva sua lista de
valores. Este modelo servirá, nesta dissertação, de base teórica para compreender os
valores, exigindo assim que se faça um maior aprofundamento.
3.3- Tipologia dos Valores Humanos Básicos
Como dito, várias críticas são formuladas aos modelos sobre valores, dentre estas o
fato de terem sido construídos sem um embasamento teórico adequado. Considerando este
aspecto principal e tentando contribuir para superar esta dificuldade inerente aos estudos
dos valores humanos, Gouveia (1998) propôs a Tipologia dos Valores Humanos Básicos
que, fundamentada no modelo de Ronald Inglehart e tomando por base a Hierarquia de
Necessidades de Maslow (1954 / 1970), define os valores como sendo:
“Categorias de orientação,
consideradas
como
desejáveis,
baseadas nas necessidades humanas e/ou nas pré-condições para satisfazêlas, adotadas por atores sociais e variando, tanto dentro quanto entre
culturas, na magnitude e nos elementos que as definem” (Gouveia, 1998,
p. 293).
Para melhor compreensão da idéia central de cada um dos 24 valores básicos que
compõem a Tipologia dos Valores Humanos Básicos, estes são descritos a seguir:
82
01. Sobrevivência: representa as necessidades mais básicas, como comer ou beber, cuja
privação duradoura resultaria letal. Sua relevância parece evidente como um princípio-guia
de pessoas ou culturas socializadas em um contexto de escassez ou que não dispõem na
atualidade dos recursos básicos.
02. Sexual: representa a necessidade fisiológica que o organismo tem de sexo. Mostra-se
como um padrão de orientação, sobretudo, para jovens, adolescentes ou pessoas que foram
ou são privadas desse estímulo.
03. Prazer: corresponde à necessidade que o organismo tem de satisfação, entendida em
termos amplos (comer, beber, se divertir, etc.). Ainda que este valor esteja relacionado ao
anterior, sua especificidade radica em não ter uma fonte única e definida de satisfação.
04. Estimulação: as necessidades fisiológicas de movimento, variedade e novidade de
estímulos são representadas por este valor. Tem de peculiar a ênfase em estar sempre ativo
e ocupado, descrevendo alguém como impulsivo.
05. Emoção: representa as necessidades fisiológicas de ter excitação e buscar experiências
arriscadas. Difere do anterior principalmente pela ênfase no aspecto risco que precisa estar
presente neste último valor. As pessoas que o adotam são menos dadas a conformar-se às
regras sociais.
06. Estabilidade Pessoal: a necessidade de segurança é parcialmente representada por este
valor. Acentua ter uma vida organizada e planejada. Quem assume esta orientação procura
assegurar sua própria existência.
07. Saúde: também representa a necessidade de segurança. A idéia é de procurar não estar
doente. Seria alguém que percebe o drama pessoal da incerteza que a doença implica,
estando por tanto orientado a buscar um nível ótimo de saúde que não ameace sua
existência.
08. Religiosidade: mais um que representa a necessidade de segurança. É independente de
preceito religioso, abarcando conteúdo como: crer em Deus como o salvador da
humanidade ou cumprir a vontade de Deus. Busca-se a certeza das coisas e a harmonia
social suficiente para que possa viver tranqüilo.
09. Apoio Social: igual aos três valores antes descritos, este também representa a
necessidade de segurança. A ênfase é em obter ajuda quando a necessite e sentir que não
está só no mundo. Significa encontrar apoio no seu contexto social, sem que exatamente
exista implicação e relação íntima.
10. Ordem Social: com este valor se completa a representação da necessidade de
segurança. Destaca viver em um país ordenado e estruturado, e ter um governo estável e
eficaz. Representa a escolha de uma pessoa orientada a manutenção dos padrões sociais
que assegurem a possibilidade de viver dia após dia.
11. Afetividade: este valor e o seguinte representam a necessidade de amor e afiliação.
Neste se acentua as amizades íntimas, as relações familiares e próximas, com troca de
carinhos, afetos, prazeres e tristezas. Corresponde a uma esfera mais íntima da vida social.
83
12. Convivência: diferente do anterior que descreve relações pessoa-pessoa com uma
ênfase no aspecto íntimo, este valor se centra na dimensão pessoa-grupo e tem um sentido
socializador: fazer parte de grupos sociais, conviver com os vizinhos.
13. Êxito: a necessidade de estima é representada por este valor e pelos dois seguintes. Seu
conteúdo destaca a idéia de ser prático e alcançar as metas auto-impostas. As pessoas que o
adotam têm claro um ideal de triunfo, e tendem a se orientar nesta direção.
14. Prestígio: este valor tem de próprio a importância que se atribui ao contexto social; não
é uma questão de ser aceito pelos demais, mas sim reconhecido publicamente. Neste
sentido, quem o adota reconhece a importância dos demais, ainda que seja para seu
proveito próprio.
15. Poder: define a noção de poder social (ter poder para influenciar aos demais e
controlar as decisões) e autoridade (saber que é o chefe de uma equipe). É menos social
que o anterior; quem dá importância a este valor pode prescindir da noção de poder
legitimamente constituído.
16. Maturidade: a necessidade de auto-realização é representada por este valor. Trata de
descrever um sentido de auto-satisfação ou cumprimento como ser humano (desenvolver
todas suas capacidades). A pessoa que o considera importante como um princípio–guia
tende a apresentar uma orientação social que transcende a pessoa ou o grupo em concreto.
17. Autodireção: este valor e o que vem a continuação representam a pré-condição de
liberdade para satisfazer as necessidades básicas. Sua especificidade radica em destacar
uma condição da natureza humana: a liberdade (se sentir livre para vestir como queira,
estar livre para mover-se, ir e vir sem empecilhos). Adotá-lo significa em certa medida
reconhecer-se como auto-suficiente.
18. Privacidade: mais relacionado com o estilo de vida, este valor destaca a liberdade de
ter um espaço privado, onde se mantêm separados diferentes aspectos da vida (ter uma
vida privada alheia aos assuntos da comunidade, ter sua própria casa e receber nela só a
quem deseje). A pessoa que o adota não nega nem menospreza os demais, simplesmente
reconhece os benefícios de ter seu próprio espaço.
19. Justiça social: representa a pré-condição de justiça para satisfazer as necessidades
básicas, definindo condições mínimas de igualdade entre as pessoas. Contempla elementos
como: lutar por uma menor diferença entre ricos e pobres ou permitir que cada pessoa
seja tratada como alguém valioso. O indivíduo é considerado como um exemplar a mais
da espécie, tendo os direitos e deveres que correspondem a levar uma vida social digna.
20. Honestidade: este valor representa a pré-condição honestidade para satisfazer as
necessidades. Destaca o compromisso da pessoa frente às demais, permitindo que se
mantenha um contexto adequado para as relações pessoais (agir responsavelmente quando
dá sua palavra, ser honesto e honrado). Com este valor se estabelece condições ótimas
para que as relações pessoais subsistam como um fim.
84
21. Tradição: este valor e o seguinte representam a pré-condição de disciplina no grupo ou
na sociedade para satisfazer as necessidades humanas básicas. Neste caso específico,
sugere a idéia de se conformar com os padrões morais seculares, favorecendo um mínimo
de harmonia no âmbito social. A pessoa deve respeitar os símbolos e padrões culturais.
22. Obediência: destaca-se com este valor a importância de cumprir seus deveres e
obrigações do dia a dia e respeitar aos seus pais e aos mais velhos. É uma questão de
conduta do indivíduo, que deve assumir um papel e se conformar com a hierarquia social
tradicionalmente imposta.
23. Conhecimento: as necessidades cognitivas são representadas por este valor. Tem um
caráter extra-social, não compreendendo exatamente o interesse de obter benefícios
pessoais. Pretende-se ter conhecimentos atuais, e sobre temas pouco conhecidos.
24. Beleza: este valor representa as necessidades de estética. Compreende uma orientação
global sem interesses muito delimitados enquanto aos benefícios. Dois dos seus elementos
são: ser capaz de apreciar o melhor da arte, da música e da literatura, e ir a museus ou
exposições onde possa ver coisas bonitas.
Este conjunto de 24 valores humanos básicos forma, teoricamente, um sistema
valorativo fundamentado em três critérios de orientação, ou seja, três grandes grupos de
valores, tendo em vista a orientação que a pessoa adota: 1) valores que se baseiam em
critérios pessoais, subdivididos em funções psicossociais de experimentação e realização;
2) valores centrais, subdivididos em funções psicossociais de existência e suprapessal; e 3)
valores que se baseiam em critérios sociais, subdivididos em interacionais e normativos,
conforme se descreve na Figura 2 a seguir.
85
SOCIAL
Normativo




Obediência
Ordem Social
Religiosidade
Tradição
Interacional




CENTRAL
Existência

Estabilidade
Pessoal
 Sobrevivência
 Saúde
Suprapessoal




PESSOAL
Experimentação




Emoção
Estimulação
Prazer
Sexual
Afetividade
Apoio Social
Convivência
Honestidade
Beleza
Conhecimento
Justiça Social
Maturidade
Realização





Autodireção
Êxito
Poder
Prestígio
Privacidade
Figura 2: Organização dos Valores Humanos Básicos, segundo o critério de orientação e a
função psicossocial a que atendem.
Neste momento, além de compreender o significado particular de cada valor
específico, faz-se mister assimilar o sentido de cada critério de orientação e suas
respectivas funções psicossociais.
Valores Pessoais. Dá-se prioridade aos próprios benefícios. Na tipologia de
Rokeach (1973) compreendem os valores de foco intrapessoal, centrados na própria
pessoa. Na tipologia de Gouveia dividem-se em duas funções psicossociais: (a) valores de
86
experimentação: descobrir e apreciar novos estímulos, enfrentar situações limite, assim
como buscar satisfação sexual (estimulação, emoção, prazer e sexual); e (b) valores de
realização: além experimentar novos estímulos, neste ressaltam-se a realização, o
sentimento de ser importante e poderoso, ser uma pessoa com identidade e espaço próprio.
Quem assume este padrão de valores costuma manter relações pessoais contratuais, com o
fim de obter benefícios (autodireção, êxito, poder, prestígio e privacidade).
Valores Centrais. Esta etiqueta é utilizada aqui para indicar o caráter central ou
neutro destes valores; eles figuram entre e são compatíveis com os valores pessoais e
sociais. Em termos da tipologia de Schwartz (1994), tais valores serviriam a interesses
mistos (individualistas e coletivistas). Os valores centrais podem ser divididos em dois
conjuntos de valores, considerando suas funções psicossociais: (a) valores de existência:
expressam uma preocupação por garantir a sua própria existência orgânica (estabilidade
pessoal, saúde e sobrevivência). A ênfase não é sobre a individualidade pessoal, mas sobre
a existência individual. Neste sentido, tais valores não são incompatíveis com aqueles
denominados de pessoais ou sociais. Eles são importantes para todas as pessoas,
principalmente em contextos de escassez; e (b) valores suprapessoais: as pessoas que
assumem estes valores buscam cumprir seus objetivos independentemente do grupo de
pertença ou condição social. Estes descrevem alguém que é maduro, tem menos
preocupações materiais, quem é menos limitado a características descritivas ou traços
específicos para iniciar uma relação ou promover benefícios (beleza, conhecimento, justiça
social e maturidade). Tais valores enfatizam a importância de todas as pessoas, não
exclusivamente dos indivíduos que compõem o grupo de pertença. Deste modo, são
perfeitamente compatíveis com os valores pessoais e sociais. Embora Rokeach (1973)
utilize a expressão valores supraindividuais, ele não expressa a mesma idéia aqui tratada.
87
Espera-se que os tipos motivacionais segurança e universalismo (Schwartz, 1994) se
correlacionem com os valores de existência e suprapessoais, respectivamente.
Valores Sociais. Quem assume o padrão de valores sociais orienta-se em direção
aos demais. Seu comportamento pode traduzir o desejo de sentir-se considerado, assegurar
sua aceitação e integração no seu grupo, ou manter um nível indispensável de harmonia
entre os diversos atores sociais de um contexto específico. Esta orientação de valores
divide-se em duas funções psicossociais: (a) normativos: ênfase na vida social, na busca de
estabilidade do grupo, nos comportamentos socialmente corretos e no respeito pelos
símbolos e padrões culturais que prevaleceram durante anos; estima-se a ordem acima de
qualquer outra coisa (obediência, ordem social, religiosidade e tradição); e (b)
interacionais: o sentido comum é o foco de atenção, que neste caso são as demais pessoas.
Sua especificidade enquanto conjunto fundamenta-se no interesse por sentir-se querido, ter
amizades verdadeiras e uma vida social (afetividade, apoio social, convivência e
honestidade).
A tipologia que acaba de ser apresentada tem sido utilizada em diferentes estudos
no contexto paraibano. Por exemplo, Maia (2000) considerou como variáveis de seu estudo
o desenvolvimento moral e os valores humanos; Milfont (2001) abordou a relação entre
valores e intenção em constituir família; Schneider (2001) estudou a transmissão de valores
de pais para filhos; Jesus (2001) e Queiroga (2002) analisaram a relação entre valores e
traços de personalidade, entre outros estudos. O que se observa é que esta tipologia tem
sido utilizada tanto para compreender aspectos mais individuais quanto grupais,
mostrando-se adequada para estes fins.
Em todos estes estudos esta tipologia tem se apresentado como uma boa alternativa
teórica e empírica no campo dos valores, além de apresentar boa estrutura dimensional.
Estes e outros aspectos motivam a sua utilização na presente dissertação. Assim,
88
apresentado este breve histórico acerca dos valores humanos e definido o marco teórico
que embasa esta pesquisa, serão resumidos a seguir alguns estudos que têm demonstrado a
importância dos valores na compreensão de condutas socialmente desviantes.
3.4- Valores Humanos e Condutas Anti-sociais
É provável que os valores humanos compreendam uma das variáveis mais
mencionadas como relacionadas às condutas anti-sociais e delitivas (Coelho Júnior, 2001;
Formiga, 2002; Tamayo & cols., 1995). Não obstante, a menção que se faz a este construto
é geralmente muito vaga, como se observa em Petraitis, Flay e Miller (1995). De acordo
com o que se verifica na literatura, os valores humanos ou prioridades axiológicas surgem
como um fator de proteção das condutas socialmente desviantes no marco das teorias
sociológicas clássicas de Controle Social. Estes passam então a serem contemplados em
diversos estudos da área, mas sempre de modo superficial e auto-explicativo, como se a
própria menção aos valores não carecesse de uma estruturação teórica. Fala-se em sistemas
de valores que diferiam os delinqüentes dos não delinqüentes, mas sem indicar
especificamente de que valores se tratam (ver Gordon, Short Jr., Cartwright & Strodtbeck,
1970).
No campo da Psicologia, os valores têm recebido pouca atenção na explicação das
condutas socialmente desviantes. Porém, nos últimos dez anos este quadro parece começar
a se modificar. Por exemplo, Romero e cols. (2001) consideram os valores como um
explicador direto das condutas anti-sociais entre os adolescentes espanhóis. Sua
abordagem, não obstante, foi tipicamente exploratória, derivando os valores em função das
amostras consideradas (adolescentes delinqüentes vs. não delinqüentes), dificultando
comparações e mesmo a replicação dos seus resultados. Apesar desta limitação, seu estudo
teve o mérito de considerar jovens não institucionalizados, isso porque a maioria das
89
pesquisas se limita a um delineamento “known-groups”, isto é, compara adolescentes
institucionalizados com os não institucionalizados, assumindo que estes não são
delinqüentes. Em resumo, seus resultados evidenciam a importância dos valores para
entender as condutas anti-sociais. Especificamente, verificou-se que a religiosidade
(amostra de rapazes, n = 435) e o convencionalismo (amostra de moças, n = 529) se
correlacionaram negativamente com a pontuação total da medida de condutas anti-sociais
(r = -0,20 e -0,30, respectivamente).
Ludwing e Pittman (1999), considerando uma amostra de 2.146 adolescentes,
estudaram o poder preditivo do sistema de valores na explicação do comportamento
delinqüente. Especificamente, consideraram um conjunto de valores pró-sociais, tais como
senso de pertença, senso de realização e religiosidade, a fim de verificar se o baixo
comprometimento dos adolescentes com os valores pró-sociais era indicador de
comportamentos delinqüentes. Seus achados demonstraram que tal conjunto de valores
predisse negativamente (Beta = -0,16; p < 0,001) a delinqüência.
No contexto brasileiro, Tamayo e cols. (1995) também procuraram conhecer a
importância dos valores para explicar um tipo específico de conduta socialmente desviante:
o consumo de drogas. Sua amostra foi composta por estudantes universitários que faziam
uso de drogas ao menos uma vez durante a semana (grupo experimental, n = 92) e aqueles
que relataram que nunca tinham consumido drogas (grupo controle, n = 102). Comparando
a pontuação destes grupos em relação aos tipos motivacionais de valores de Schwartz
(Tamayo & Schwartz, 1993), observaram que o tipo motivacional que tinha um papel de
proteção da conduta de consumir drogas foi conformidade. Portanto, pessoas que assumem
como prioritários em suas vidas valores desta natureza (por exemplo, autodisciplina, bons
modos e obediência), procuram limitar suas ações, inclinações e impulsos que possam
90
prejudicar outros e violar expectativas ou normas sociais, sendo menos prováveis
apresentarem condutas anti-sociais e delitivas.
Percebe-se, pois, que não são todos os valores que vão atuar como um fator de
proteção de condutas socialmente desviantes, mas sim aqueles que põem ênfase na
manutenção do status quo (convencionalismo, religiosidade e conformidade). Estes
achados são reforçados com as pesquisas de Coelho Júnior (2001) e Formiga (2002) que,
utilizando a tipologia de Gouveia (1998), encontraram resultados bastante interessantes. O
primeiro destes, por exemplo, observou que a importância dada aos valores normativos
(ordem social, religiosidade, tradição e obediência) se correlacionou de modo negativo (r
= -0,25, p < 0,001) com um índice de potencial usuário de maconha e álcool. Por outro
lado, os valores de experimentação se correlacionaram diretamente com este índice (r =
0,12, p < 0,001), principalmente no caso dos valores emoção e prazer (r = 0,16, p < 0,001;
para ambos).
Em resumo, os estudos que tratam dos valores na compreensão das condutas
socialmente desviantes são recentes, e poucos estão suplantados em uma abordagem
teórica coerente acerca dos valores. Considerando que estes se apresentam como relevantes
para a compreensão das interações sociais, descrição e explicação dos comportamentos
tanto individuais quanto grupais, especifica-se aqui a relevância de conhecer os valores que
incutem aos adolescentes o desejo de apresentar comportamentos socialmente desviantes.
Estes valores expressam tanto o que é adotado como princípio-guia para a conduta como
refletem as crenças e normas dos grupos de pertença.
Chegado este ponto, tendo sido considerados os traços de personalidade e os
valores humanos, procura-se delinear um modelo causal (hipotético) para explicar as
condutas anti-sociais e delitivas de adolescentes e jovens estudantes não delinqüentes. Este
91
esforço é concretizado no próximo tópico, com as especificações das relações teoricamente
esperadas.
3.5- MODELO CAUSAL PARA EXPLICAR AS CONDUTAS ANTI-SOCIAIS E
DELITIVAS
Como foi possível apreciar, o objeto principal deste estudo, as condutas anti-sociais
e delitivas, tem como característica ser multi-determinado. Estudar o comportamento
adolescente é algo complexo, e quando se busca entender, mais propriamente, aqueles que
transgridem normas sociais, a complexidade é cada vez mais ressaltada. Aqui, tem-se claro
que não se pode adotar uma visão simplista, pois se sabe dos múltiplos fatores históricos,
culturais, econômicos, situacionais, macro ou micro sociais e individuais que influem nas
condutas anti-sociais e delitivas. Contudo, mesmo considerando tais dificuldades, realizouse uma tentativa de identificar um modelo teórico que vise integrar algumas das variáveis
apontadas pela literatura como sendo importantes na explicação destas condutas.
Endossando o dito, não se nega a importância de outros fatores, tais como o
ambiente familiar, a identificação endogrupal e mesmo as variáveis macro-sociais, como a
estrutura sócio-econômica de um país. No entanto, de forma parcimoniosa, este estudo
prioriza os traços de personalidade e os valores humanos como antecedentes das condutas
anti-sociais e delitivas. A propósito, apresenta-se na Figura 3 o modelo teórico proposto.
92
NEUTORITICISMO
NORMATIVO
E1
EXTROVERSÃO
BUSCA SENSAÇÃO
ANTI_SOCIAL
E2
DELITIVA
EXPERIMENTAÇÃO
Figura 3: Modelo Teórico para Analisar as Condutas Anti-sociais e Delitivas.
Embora tenham sido considerados dois construtos que têm relação entre si, como
são os casos dos traços de personalidade e dos valores (Bilsky & Schwartz, 1994; Roccas,
Sagiv, Schwartz & Knafo, 2002), decidiu-se aqui não estabelecer relações entre suas
dimensões específicas. No caso do construto personalidade, são considerados três traços
principais, sendo dois fatores dos Big Five (neuroticismo e extroversão) e um fator geral de
busca de sensações. Os estudos que relacionam os Big Five com as condutas anti-sociais e
delitivas são ainda escassos e pouco conclusivos; no Brasil não foi identificada nenhuma
pesquisa a respeito. No caso de busca de sensações, seus quatro fatores podem ser
reduzidos a uma dimensão geral, conforme advoga Zuckerman (1994), o que tem sido
apoiado por Greene, Krcmar, Walters, Rubin e Hale (2000).
Os achados empíricos a respeito dos traços de personalidade, como descritos
previamente, indicam que tais variáveis podem ser adequadas para explicar os
comportamentos socialmente desviantes. Espera-se um padrão que oponha a preocupação
em seguir as normas sociais, atender às recomendações dos mais velhos e seguir os
ensinamentos parentais com a ênfase na expressividade e apreciação de novos estímulos.
93
Neste sentido, o traço de busca de sensação, extroversão e neuroticismo e os valores de
experimentação tornariam mais prováveis as condutas anti-sociais, enquanto que as
pontuações nos valores normativos atuaria como fator de proteção.
Estes dois construtos, isto é, personalidade e valores, são pensados como
antecedentes das condutas anti-sociais; provavelmente têm mais em comum com o
rompimento de normas sociais, porém menos com a infração ao código penal. As condutas
anti-sociais, sim, de acordo com estudos prévios (Coelho Júnior, 2001; Formiga, 2002),
antecedem às condutas delitivas. Este modelo causal, obviamente, precisará ser
comprovado empiricamente na realidade brasileira, o que compreende o objetivo principal
da presente dissertação. Pretende-se ainda, como objetivos específicos, conhecer o padrão
de correlação do conjunto de valores e traços de personalidade medidos, bem como saber
se as condutas anti-sociais e delitivas e os traços de personalidade se diferenciam em
função do sexo e da faixa-etária.
94
CAPÍTULO V – MÉTODO
95
5- MÉTODO
5.1- Delineamento e Hipóteses
A presente dissertação obedeceu a um delineamento do tipo correlacional, ex post
facto, no qual se contou com os traços de personalidade neuroticismo, extroversão e busca
de sensações e os valores humanos de experimentação e normativos como variáveis
antecedentes, e as condutas anti-sociais como variável critério, a qual é considerada, por
sua vez, como antecedente das condutas delitivas. Com base na revisão da literatura,
realizada acerca dos temas em questão, e diante dos objetivos mencionados, foram
elaboradas dois conjuntos de hipóteses, conforme anunciadas a seguir:
 A relação das Condutas Anti-social e Delitiva com suas Variáveis Antecedentes.
Hipótese 1: As condutas anti-sociais e delitivas se correlacionarão diretamente entre si.
Hipótese 2: O traço de personalidade neuroticismo se correlacionará diretamente com as
condutas anti-sociais.
Hipótese 3: O traço de personalidade extroversão se correlacionará diretamente com as
condutas anti-sociais.
Hipótese 4: O fator de busca de aventura e emoção se correlacionará diretamente com as
condutas anti-sociais.
Hipótese 5: O fator de busca de experiência e excitação se correlacionará diretamente com
as condutas anti-sociais.
Hipótese 6: A função valorativa de experimentação se correlacionará diretamente com as
condutas anti-sociais.
Hipótese 7: A função psicossocial normativa se correlacionará inversamente com as
condutas anti-sociais.
96
 A relação das variáveis antecedentes com variáveis sócio-demográficas
Hipótese 8: As condutas anti-sociais e delitivas diferirão em relação ao gênero, nas quais
os homens apresentarão maior pontuação do que as mulheres.
Hipótese 9: As condutas anti-sociais e delitivas diferirão em relação à idade, em que os na
faixa-etária de 16 a 20 apresentarão maior pontuação do que aqueles na faixaetária de 21 a 26.
Hipótese 10: Existirá diferença em relação à idade no que se refere à pontuação de busca
de sensações, na qual aqueles com idades entre 16 e 20 anos apresentarão maior
pontuação do que aqueles na faixa-etária de 21 a 26 anos.
Hipótese 11: Existirá diferença em relação ao gênero no que se refere à pontuação de
busca de sensações, na qual os homens apresentarão maior pontuação do que as
mulheres.
Hipótese 12: As mulheres pontuarão mais que os homens no traço neuroticismo.
5.2- Amostra
Participaram desta pesquisa 755 estudantes, sendo 401 (53%) de escolas privadas e
354 de escolas públicas da cidade de João Pessoa (PB). Destes, 50,3% são do sexo
feminino, e com idades variando entre 16 e 26 anos (M = 20,21; DP = 3,12). A distribuição
detalhada destas informações é encontrada na Tabela 1 a seguir.
97
Tabela 1: Distribuição dos participantes quanto às variáveis Sexo, Faixa-etária e Tipo de
Escola
SEXO
ESCOLAS
Masculino
Feminino
375
380
FAIXA-ETÁRIA
16-20
21-26
FAIXA-ETÁRIA
16-20
21-26
Totais
Pública
100
75
102
77
354
Privada
100
100
101
100
401
Totais
200
175
201
177
755
Além destas variáveis demográficas, outras foram consideradas, as quais são aqui
descritas. Verificou-se que os participantes, num intervalo de 0 = Péssimo estudante a 4 =
Ótimo Estudante (mediana teórica de 2 pontos) apresentaram uma média de 2,91 (DP =
0,77). Estes apresentaram igualmente uma pontuação de religiosidade auto-percebida
acima da mediana teórica da escala de resposta (0 = Nada Religioso a 4 = Muito
Religioso): 2,67 (DP = 1,04). Também foi perguntado se já tinham ingerido bebida
alcoólica e se já tinham fumando maconha. A respeito, observou-se que a maioria (77,6%)
dos participantes já fez uso de bebidas alcoólicas, sendo menos freqüente o uso da
maconha (10,9%).
5.3- Instrumentos
Os participantes receberam uma bateria de quatro medidas, correspondendo aos
seguintes instrumentos:
 Inventário dos Cinco Grandes Fatores da Personalidade. Originalmente elaborado
em língua inglesa por John, Donahue e Kentle (1991), este foi adaptado para o
contexto brasileiro por Gouveia, Meira, Santos, Jesus e Formiga (2001). Utiliza-se
aqui uma versão reduzida, composta por 14 itens, sendo sete para cada um dos dois
98
fatores de interesse: extroversão (É sociável, extrovertido; É conversador,
comunicativo) e neuroticismo (Fica nervoso facilmente; Preocupa-se muito com
tudo). Estes itens são respondidos em escala de cinco pontos, tipo Likert, com os
seguintes extremos: 1 = Discordo Totalmente a 5 = Concordo Totalmente (Anexo
I). Os índices de consistência interna (Alfa de Cronbach) desta medida ficaram
acima de 0,70, como segue: neutoricismo (0,75) e extroversão (0,74).
 Escala de Busca de Sensações (EBS). Este instrumento foi originalmente
construído no contexto estadounidense (Zuckerman, Eysenck & Eysenck, 1978),
sendo posteriormente modificada por Schultz (2002). A versão empregada é
composta de 23 itens, distribuídos em dois fatores: busca de aventura e emoção
(por exemplo, Gostaria de escalar uma montanha; Gostaria de saltar de páraquedas) e busca de experiência e excitação (por exemplo, Sinto-me melhor depois
de tomar alguns copos de bebida alcoólica; Gostaria de provar drogas de causam
alucinações). Estes itens são respondidos em escalas de cinco pontos, variando de 1
= Discordo Totalmente a 5 = Concordo Totalmente (Anexo II). De acordo com os
dados da presente dissertação, os dois fatores desta medida estão diretamente
correlacionados entre si (r = 0,38, p < 0,001), sugerindo que pode ser considerada
uma pontuação total (Alfa de Cronbach de 0,87).
 Escala de Condutas Anti-sociais e Delitivas. Este instrumento, proposto por
Seisdedos (1988), compreende uma medida comportamental em relação às
Condutas Anti-Sociais e Delitivas. Tal medida é composta por 40 itens, distribuídos
em dois fatores, como segue: Condutas Anti-sociais, em que seus elementos não
expressam delitos, mas comportamentos que desafiam a ordem social e infligem
normas sociais (por exemplo, Jogar lixo no chão mesmo quando há perto um cesto
de lixo; Tocar a campainha na casa de alguém e sair correndo); e Condutas
99
Delitivas, seus itens incorporam comportamentos delitivos que estão fora da lei,
caracterizando uma infração ou uma conduta faltosa e prejudicial a alguém ou
mesmo a sociedade como um todo (por exemplo, Roubar coisas de um lugar
público; Conseguir dinheiro ameaçando pessoas mais fracas). Para cada frase, os
participantes devem indicar qual a freqüência que apresentam o comportamento no
seu dia a dia, utilizando uma escala de resposta com onze pontos, tendo os
seguintes extremos: 0 = Nunca e 10 = Sempre (Anexo III). Formiga (2002) adaptou
ao contexto brasileiro este instrumento, o qual apresentou parâmetros psicométricos
satisfatórios; observaram-se índices de consistência interna (Alfa de Cronbach) de
0,91 para as condutas anti-sociais, e 0,86 para as delitivas. Através de uma análise
fatorial confirmatória, comprovou-se igualmente a adequação desta estrutura (² /
g.l. = 1,78; GFI = 0,91, AGFI = 0,90 e RMSEA = 0,04).
 Questionário dos Valores Humanos Básicos. Este instrumento, elaborado e
validado por Gouveia (1998), está composto por 24 itens ou valores específicos.
Por exemplo, tradição (Seguir as normas sociais do seu país; Respeitar as
tradições de sua sociedade); êxito (Obter o que se propõe; Ser eficiente em tudo
que faz). Como mencionado anteriormente, os 24 valores estão agrupados segundo
o critério de orientação adotado: pessoal, central e social. Para responder o
instrumento o participante deverá indicar o grau de importância que cada um dos
valores tem como um princípio-guia na sua vida, utilizando uma escala de resposta
de sete pontos, com os seguintes extremos: 1 = Pouco Importante e 7 = Muito
Importante. Depois de terminada esta tarefa, terá que reconsiderar a lista dos 24
valores e indicar aquele que é o mais e o menos importante de todos enquanto um
princípio-guia na sua vida, a estes serão atribuídos os pesos 0 e 8, respectivamente.
Estas pontuações substituem as previamente anotadas pelos respondentes (Anexo
100
IV). Informações a respeito dos seus parâmetros psicométricos estão disponíveis no
estudo de Maia (2000). Gouveia (no prelo) relata, por exemplo, que esta medida
apresenta validade convergente com a que propõe S. H. Schwartz; ademais
observou índices de bondade de ajuste aceitáveis para estrutura fatorial proposta: ²
/ g.l = 2,67, GFI = 0,91, AGFI = 0,89 e RMSEA = 0,05.
Além das medidas antes listadas, os participantes responderam algumas perguntas que
de caráter sócio-demográfico (por exemplo, sexo, idade, em que medida se considera um
bom estudante). Estas contribuem para descrevê-los assim como permitem, no caso de ser
necessário, seu controle estatístico (Anexo V).
5.4- Procedimento
O levantamento de dados obedeceu a um procedimento padrão. Como comentado,
os aplicadores receberam um treinamento a fim de intervirem o mínimo possível no
processo. Da mesma maneira, as escolas foram contatadas pelos aplicadores tendo em
mãos uma carta de apresentação à diretoria de cada instituição de ensino. Os instrumentos
foram todos de auto-aplicação e foram contrabalançados. A aplicação foi coletiva em salas
de aula, e se informou aos participantes, de forma geral, o objetivo da pesquisa e sobre o
caráter confidencial e sigiloso de suas respostas. Enfatizou-se também que não existiam
respostas certas ou erradas, devendo os participantes responder individualmente da forma
mais sincera possível. Por fim, foram realizados os devidos agradecimentos. Um tempo
médio de 40 minutos foi necessário para responder ao conjunto de medidas.
101
5.5- Análise dos Dados
A versão 11 do pacote estatístico SPSSWIN (Statistical Package for the Social
Sciences) foi utilizada para tabulação e análise dos dados. Além dos indicadores
descritivos (média, desvio padrão etc.), comprovou-se consistência interna das escalas
referentes aos construtos estudados (personalidade, condutas anti-sociais e delitivas e
busca de sensações) através do Alfa de Cronbach. Também foram realizadas correlações r
de Pearson com a finalidade de verificar as relações existentes entre as condutas antisociais e delitivas, os valores humanos, os traços de personalidade e a busca de sensações.
Com este mesmo pacote estatístico, foram empregadas análises de comparações de médias
(MANOVA) para verificar, por exemplo, a existência de diferenças em função do sexo e da
faixa-etária no que diz respeito à busca de sensações.
O programa AMOS (Analysis Moment Structures) foi utilizado para provar o
modelo proposto. Esta prova do modelo se logrou utilizando equações estruturais,
conforme o modelo de path analysis. A análise de equações estruturais contempla dois
passos importantes: 1) verificar a relação entre as variáveis do modelo, através de
parâmetros estruturais das equações, e 2) mediante provas ad hoc, avaliar o ajuste do
modelo aos dados empíricos (Bisquerra, 1989).
Os principais indicadores desta análise se centram no efeito de variáveis
independentes (exógenas) sobre uma ou mais variáveis dependentes (endógenas), sejam
elas latentes ou observadas diretamente, bem como na consistência entre o modelo
proposto e os dados observados (maiores detalhes ver Byrne, 2001). No primeiro caso,
devem-se observar os pesos fatoriais entre as variáveis do modelo, sabendo-se que o
melhor poder preditivo é indicado por valores que diferem estatisticamente de zero (t >
1,96, p < 0,05).
102
Em relação aos indicadores de adequabilidade do modelo aos dados empíricos nas
análises de equações estruturais, calcula-se o p associado ao valor do ². Um ² não
significativo indica que o modelo é adequado empiricamente aos dados observados. Por ser
sensível ao tamanho da amostra, o teste de ² pode apresentar grandes diferenças entre o
modelo teórico e os dados, quando elas podem ser mínimas. Não obstante, outros índices
de ajustamento (FIT) menos sensíveis ao tamanho da amostra foram desenvolvidos. Dentre
eles se destacam a razão entre o 2 e os graus de liberdade (2/gl), o Comparative Fit Index
(CFI), o Goodness-of-Fit-Index (GFI), o Adjusted Goodness-of-Fit-Index (AGFI) e o Root
Mean Square Residual (RMSR). Para que o modelo seja considerado adequado, a razão
entre (2/gl) é recomendável que seja inferior a 5, o CFI, GFI ou AGFI devem apresentar
coeficientes superiores a 0,90. O GFI, por exemplo, indica a proporção da variância
explicada, sendo sua interpretação é muito parecida a do R2 da regressão múltipla.
Ademais, pode-se observar a adequabilidade do modelo através do RMSR, sendo quanto
mais próximo de zero melhor o ajuste do modelo; um valor superior a 0,05 indica um
ajuste insuficiente.
103
CAPÍTULO VI - RESULTADOS
104
6- RESULTADOS
Procurando facilitar a compreensão dos leitores, os resultados desta dissertação foram
organizados em três tópicos principais, procurando seguir uma ordem de complexidade que
culmina com a comprovação do modelo causal proposto.
6.1- Pontuações Médias dos Adolescentes e Jovens nos Construtos Estudados
Antes de proceder às análises estatísticas propriamente, procurou-se efetuar uma
limpeza do banco de dados. Neste sentido, procedeu-se primeiramente à verificação da
porcentagem de casos missing (faltosos, sem resposta). Estes não excederam, em nenhuma
variável, a 1% dos casos. Neste sentido, adotou-se o procedimento de transformação destes
missing, realizando a transformação pela média. Em seguida, foram realizadas as devidas
análises de outliers uni e multivariados, sendo encontrados outliers extremos apenas para
as variáveis condutas anti-sociais e condutas delitivas. Nestes casos, após a verificação da
distribuição de freqüência para identificação dos sujeitos extremos, adotou-se o
procedimento de substituir os escores extremos por escores menores que o ultimo caso não
outlier (ver procedimento estatístico em Tabachnick & Fidel, 1996). Tendo assegurado a
limpeza do banco de dados, procederam-se às análises descritivas, cujos resultados são
sumarizados a seguir.
 As condutas socialmente desviantes
A fim de caracterizar os adolescentes e jovens participantes deste estudo nos
diferentes construtos medidos, foram verificadas as suas pontuações médias em relação às
escalas de respostas dos diferentes instrumentos. Inicialmente, em relação às condutas
socialmente desviantes, num intervalo de variação de 0 = Nunca a 10 = Sempre, que avalia
a freqüência de apresentação destas condutas por parte dos respondentes, verificou-se que
105
a média empírica nas Condutas Anti-Sociais foi de 1,78 (DP = 1,23; amplitude mínima de
0 e máxima de 7), enquanto que nas Condutas Delitivas os participantes apresentaram uma
média de 0,25 (DP = 0,30; e amplitude de 0 e 2). Ambas médias são estatisticamente
inferiores ao ponto mediano teórico da escala de resposta (5), t (754)  71,96, p < 0,001.
 Os traços de personalidade
Em relação aos traços de personalidade, em que a escala de resposta variava de 1 =
Discordo Totalmente a 5 = Concordo Totalmente, só foi observada diferença estatística
em relação ao ponto mediano teórico da escala de resposta (3) em apenas um fator dos Big
Five: extroversão [M = 2,91, DP = 0,48; t (754) = 4,84, p < 0,001]. No fator neuroticismo
a média dos participantes (M = 3,04, DP = 0,81) não diferiu do ponto mediano antes
indicado, t (754) = 4,84, p > 0,05. Finalmente, a pontuação média em busca de aventura e
emoção (M = 3,11, DP = 0,74) foi superior ao ponto mediano (3) [t (754) = 4,12, p <
0,001], enquanto que a observada no fator busca de experiência e excitação (M = 2,34, DP
= 0,62) foi inferior ao citado ponto, t (754) = 28,57, p < 0,001
 Os valores humanos
No caso dos valores humanos, foram consideradas as pontuações dos participantes
unicamente para as duas funções psicossociais propostas no modelo teórico adotado.
Lembrando, a escala de resposta varia de 0 = Totalmente não importante a 8 =
Extremamente importante, com ponto mediano de 4. Os participantes apresentaram
médias superiores ao ponto mediano da escala tanto na função de experimentação [M =
4,88, DP = 1,00; t (754) = 24,25, p < 0,001] como normativos [M = 6,08, DP = 0,70; t
(754) = 49,28, p < 0,001]. Estes resultados, no entanto, poderiam ser esperados, visto que
os valores, como se afirmou na introdução, apresentam um forte componente de
106
desejabilidade social. Assim, faz mais sentido comparar as respostas dos participantes nas
duas funções valorativas antes descritas; neste caso, comprova-se que é predominante a
orientação normativa daqueles que compuseram a amostra deste estudo, t (754) = 15,27, p
< 0,001.
Em resumo, percebe-se que os participantes deste estudo apresentam uma orientação
que permite descrevê-los como não delinqüentes, pouco extrovertidos, e com uma
orientação axiológica que põe ênfase na manutenção do status quo, de cunho social.
6.2- A Relação entre os Construtos Estudados
Neste momento é possível testar as sete primeiras hipóteses desta dissertação. As
variáveis correspondentes serão inicialmente analisadas, embora no final também se
considerem as correlações entre as demais variáveis. A matriz de correlação resultante é
apresentada na Tabela 2 a seguir.
107
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108
Inicialmente, previu-se uma correlação direta entre as condutas delitivas e as antisociais, o que foi plenamente corroborada (r = 0,61, p < 0,001; Hipótese 1). Com respeito
às demais variáveis que compõem o primeiro conjunto de hipóteses, estas foram previstas
se relacionar com as condutas anti-sociais, tendo sido todas as hipóteses corroboradas,
como segue: neuroticismo (r = 0,13, p < 0,001; Hipótese 2), extroversão (r = 0,18, p <
0,001; Hipótese 3), aventura e emoção (r = 0,24, p < 0,001; Hipótese 4), experiência e
excitação (r = 0,50, p < 0,001; Hipótese 5), experimentação (r = 0,18, p < 0,001; Hipótese
6) e normativo (r = -0,19, p < 0,001; Hipótese 7). Ademais foram observadas as seguintes
correlações: Realização (r = 0,14, p < 0,001), Interacionais (r = -0,13, p < 0,001) e
Suprapessoais (r = -0,14, p < 0,001).
No tocante às condutas Delitivas, verificou-se que estas apresentaram correlação
direta e significativa com busca de aventura e emoção (r = 0,20; p < 0,001), busca de
experiência e excitação (r = 0,52; p < 0,001) e extroversão (r = 0,16; p < 0,001), e com as
funções valorativas de experimentação (r = 0,16; p < 0,001) e realização (r = 0,12; p <
0,001). E apresentou correlação inversa e significativa com as funções interacional (r = 0,24; p < 0,001), normativa (r = -0,19, p < 0,001) e suprapessoal (r = -0,18, p < 0,001).
Os fatores de busca de sensações apresentaram correlação entre si de forma direta e
significativa (r = 0,38, p < 0,001). Especificamente, a Busca de Aventura e Emoção
apresentou correlação direta com extroversão (r = 0,12; p < 0,01), e com as funções
experimentação (r = 0,31; p < 0,001), realização (r = 0,13; p < 0,001) e interacional (r =
0,07; p < 0,05); ao passo que apresentou correlação inversa com neuroticismo (r = -0,07; p
< 0,05) e com os valores suprapessoais (r = -0,18; p < 0,001). Já a busca de experiência e
excitação apresentou correlação direta com experimentação (r = 0,40; p < 0,001) e
realização (r = 0,29; p < 0,001). E inversa com normativos (r = -0,26; p < 0,001) e
interacionais (r = -0,18; p < 0,001) e suprapessoais (r = -0,06; p < 0,05).
109
Os traços de personalidade extroversão e neuroticismo se correlacionaram inversa e
significativamente (r = -0,12; p < 0,01). O traço extroversão manteve correlação direta
com realização (r = 0,11; p < 0,01), existência (r = 0,14; p < 0,01), e correlação inversa
com normativos (r = -0,12; p < 0,001) e suprapessoais (r = -0,06; p < 0,05).
6.3- Comparações intergrupais em relação às condutas socialmente desviantes e aos
traços de personalidade
Neste tópico, com objetivo de averiguar se existem diferenças em relação ao gênero
e à faixa-etária no que se refere às condutas anti-sociais e delitivas, aos fatores de busca de
sensações e aos traços de personalidade, foram realizadas análises de comparações de
médias, especificamente Análises Multivariada de Variância (MANOVA). Os principais
resultados desta análise para cada variável conseqüente são descritos a seguir.
As condutas socialmente desviantes
Antes mesmo de explicitar os resultados dos testes de comparações de médias,
torna-se relevante relembrar que, os escores mínimo e máximo que os adolescentes e
jovens poderiam obter nas condutas anti-sociais e nas do tipo delitivas, podem variar,
respectivamente, de 0 a 20 em função da divisão entre a variabilidade da escala de
respostas (0 = Nunca a 10 = Sempre) e do número de itens (20) que descrevem cada um
dos tipos de conduta. Assim, os resultados demonstraram que quando considerado o efeito
de interação (Sexo X Faixa-etária), não foram encontradas diferenças significativas. No
entanto, foram encontradas diferenças quando analisados os efeitos principais destas
variáveis com Lambda de Wilks de 0,91[F (2,751) = 35,01, p< 0,001]. Especificamente,
com relação às condutas anti-sociais verificou-se que os participantes do sexo masculino
apresentaram média superior (M = 1,96, DP = 1,33) a do grupo de mulheres (M = 1,60, DP
110
= 1,09), sendo esta diferença estatisticamente significativa [F = 15,89, p < 0,001; Hipótese
8].
A faixa-etária também se mostrou relevantes, pois aqueles com idades entre 16 e 20
anos apresentou estatisticamente superior (M = 1,90, DP = 1,25) quando comparados com
aqueles nas idades variando de 21 a 26 anos (M = 1,63, DP = 1,20) [F = 8,92, p < 0,01;
Hipótese 9]. Quando consideradas as condutas delitivas, apenas se encontrou diferença
significativa [F = 68,66, p < 0,001] na variável sexo, em que foram os homens (M = 0,36,
DP = 0,42) que apresentarem médias mais elevadas que as mulheres (M = 0,14, DP =
0,27).
Os fatores de Busca de Sensações
De igual maneira, buscou-se verificar se as variáveis sexo e idade são relevantes
para possibilitar diferenças em relação aos fatores de busca de sensações. Cabe ressaltar
que o escore médio dos grupos considerados podem variar num intervalo de 1 a 5.
Empiricamente, encontrou-se que no fator busca de experiência e excitação ocorreu efeito
de interação entre as variáveis sexo e faixa-etária com Lambda de Wilks de 0,98 [F (1, 754)
em que os grupos diferiram significativamente.
Concretamente, foram considerados na comparação quatro grupos, sendo dois de
homens, um com idade de 16 a 20 anos (M = 2,58, DP = 0,59) e outro com idades de 21 a
26 anos (M = 2,48, DP = 0,74) e dois grupos de mulheres, formados pelas mulheres com
16 a 20 anos (M = 2,10, DP = 0,49) e outro com aqueles na faixa-etária de 21 a 26 anos (M
= 2,23, DP = 0,56). Como se pode observar, foi o grupo de homens mais jovens que
apresentaram a maior média no fator busca de experiência e excitação, sendo esta
diferença estatisticamente significativa [F = 7,62, p < 0,01; Hipóteses 10 e 11].
111
Em relação ao fator busca de aventura e emoção, verificou-se que não houve efeito
de interação, e apenas a variável sexo se mostrou relevante, em que o grupo de homens
apresentaram um escore médio superior (M = 3,25, DP = 0,78) ao apresentado pelo grupo
constituído por mulheres (M = 2,98, DP = 0,68), sendo esta diferença considerada
significativa estatisticamente [F = 3,84, p < 0,001; Hipóteses 10 e 11].
Os traços de personalidade: neuroticismo e extroversão
Também foram considerados os traços de personalidade neuroticismo e
extroversão, a fim de verificar se estes sofriam efeito das variáveis sexo e faixa-etária.
Contudo, em nenhumas das variáveis foi verificado efeito de interação estatisticamente
significativo, e em relação aos efeitos principais, apenas no traço neuroticismo é que se
encontrou diferença estatisticamente significativa com Lambda de Wilks de 0,96 [F (1,
754) = 11,35, p < 0,001]. Objetivamente, num intervalo de 1 a 5, as participantes do sexo
feminino apresentaram média de 3,21 (DP = 0,85), o que foi superior a média do grupo de
participantes do sexo masculino (2,87, DP = 0,74), sendo esta diferença estatisticamente
significativa [F = 33,26, p < 0,001; Hipótese 12].
6.4- Comprovação do Modelo Teórico
A fim de lograr o objetivo de testar o modelo teórico (causal) para explicar as
condutas anti-sociais e delitivas, efetuou-se uma análise de caminhos (path analysis),
considerando as análises de equações estruturais. O modelo, tal como descrito na Figura 3,
procura definir três traços de personalidade (busca de sensações, extroversão e
neuroticismo) e duas funções valorativas (experimentação e normativa) como explicadores
das condutas anti-sociais, sendo estas o fator predominante para explicar as condutas
delitivas. Os coeficientes empíricos deste modelo são apresentados na Figura 4 a seguir.
112
NORMATIVO
NEUTORITICISMO
0,15***
-0,12***
E1
E2
0,12***
-0,04
-0,03
EXTROVERSÃO
0,60***
ANTI_SOCIAL
DELITIVA
0,40***
-0,10***
0,01
BUSCA SENSAÇÃO
EXPERIMENTAÇÃO
0,42***
Figura 4: Modelo empírico para as condutas anti-sociais e condutas delitivas
Notas: ** p < 0,01; *** p < 0,001.
Como é possível observar, este modelo teórico teve uma única modificação em
relação ao anteriormente proposto; corresponde à relação entre o fator de personalidade
busca de sensações e a função valorativa experimentação. A propósito, considerou-se o
Índice de Modificação para tomar tal decisão. Este modelo resultante pode ser considerado
satisfatório, segundo os indicadores de bondade de ajuste: RMSR = 0,03, GFI = 0,97, AGFI
= 0,91 e 0,90. Uma exceção correspondeu à razão ²/gl, (8,17) que superou o valor
teoricamente recomendável (5).
Em relação aos pesos das variáveis consideradas, observou-se que nem todos os
traços de personalidade apresentaram pesos fatoriais significativos na explicação das
condutas anti-sociais. Especificamente, o traço neuroticismo explicou direta e
significativamente (0,15, p < 0,001), ocorrendo o mesmo com busca de sensações (0,40, p
< 0,001). O traço Extroversão se apresentou significativo na explicação das condutas anti-
113
sociais. No que se refere às funções psicossociais, apenas a Normativa mostrou-se
adequada no modelo, apresentando um peso fatorial inverso e significativo de (-0,12, p <
0,001), já a Experimentação não se mostrou relevante estatisticamente.
Ademais, o modelo estrutural permitiu verificar que entre os traços neuroticismo e
extroversão existiu covariação direta e significativa (0,12, p < 0,001). Também se
observou que ocorreu covariação indireta entre extroversão e busca de sensações (-0,12, p
< 0,01); este apresentou peso direto e significativo com Busca de sensações (0,10, p <
0,01). A despeito da relação entre Estes dois últimos apresentaram um índice de covariação
direto e significativo de 0,13 (p < 0,001). Por fim, as condutas anti-sociais explicaram
diretamente as condutas delitivas (0,60, p < 0,001).
114
CAPÍTULO VII – DISCUSSÃO
115
7- DISCUSSÃO
Com base no exposto, pode-se verificar que os objetivos da presente dissertação
foram cumpridos. Cabendo lembrar que esta visava, primordialmente, abordar o fenômeno
das condutas socialmente desviantes apresentadas pelos adolescentes e jovens. Por ser este
um aspecto deveras presente na sociedade hodierna, verifica-se que muitos estudiosos
(Adalbjarnardotti & Rafnsson, 2002; Ding, Nelsen & Lassonde, 2002; Engels & Bogt,
2001; Hawkins, Catalano & Miller, 1992; Herrenkohl & cols., 2000;
Patterson,
DeBaryshe & Ramsey, 1989; Saner & Ellickson, 1996) têm se dedicado a analisá-lo.
Primeiramente, deve-se ter em mente que o estudo das condutas anti-sociais e, em grau
mais elevado, das condutas delitivas, apresenta algumas dificuldades, principalmente pela
natureza do fenômeno, haja vista ser este multideterminado.
O problema das condutas anti-sociais, em geral, é cada vez mais, um problema
multidimensional, em que seus fatores basilares são os mais dispares possível. Como foram
citados no decorrer deste estudo dissertativo, pode-se mencionar a influência de fatores
estruturais, culturais, institucionais, políticos, econômicos, sociais, históricos, psicológicos,
biológicos, entre outros. Daí decorre a existência de pesquisadores nas mais diversas áreas
de conhecimento que se interessam pela temática. Frente ao exposto, decidiu aqui verificar
em que medida, especificamente, os traços de personalidade e os valores humanos são
úteis para explicar as condutas anti-sociais e delitivas.
È possível verificar a crescente ênfase por parte da mídia mundial nos aspectos da
violência, os episódios são cada vez mais drásticos e assustadores, os depoimentos de
pobres e ricos que residem nos grandes centros urbanos são de total temor. Mas, que
fatores têm contribuído para a crescente onda de homicídios, assaltos, atentados,
vandalismo, drogadição etc? Até onde chegará a agressividade e destruição humana? Por
outro lado, fala-se em paz, quase que diariamente, através de propagandas, relatos
116
jornalísticos, passeatas ou atos públicos. A esse respeito Formiga (2002) indaga qual o real
efeito desse posicionamento adotado pela sociedade. E realça a necessidade de estudos
que, contemplando os diferentes níveis de análise, possam conhecer cientificamente que
fatores sociais ou individuais contribuem no delineamento de programas mais eficazes de
prevenção e controle deste problema.
Nesta problemática, observa-se, estão envolvidas crianças, adolescentes, jovens e
adultos, independente de classe social ou nível de escolaridade. Contrariamente ao que
muitos ainda pensam, não são apenas pessoas marginalizadas, pobres ou que estão
institucionalizados que roubam ou matam, os crimes cometidos por pessoas das classes
média e alta são cada vez mais freqüentes. Comumente, a principal causa apontada para
que um jovem viesse a se envolver com drogas e assaltos, por exemplo, era a pobreza;
contudo, através do referencial teórico aqui apresentado verifica-se que outras variáveis
são mais ou tão relevantes nesta analise, pois muitas pessoas, nascidas e criadas em
ambientes fartos e com boa educação, estão envolvidas em episódios extremos de
violência. Neste contexto, os pais têm se indagado a respeito dos padrões morais e
valorativos que estão passando para seus filhos, ou mesmo que estes últimos têm adotado.
Ademais destes aspectos, a presente dissertação centra-se em estudar as condutas
socialmente desviantes em um grupo de pessoas que tem características particulares, o
grupo de adolescentes e jovens. Frente às muitas teorias a respeito, que consideram a
adolescência um período marcado apenas por mudanças biológicas universais, Ozzella
(2002) aponta que esta visão está sendo, cada vez mais superada. Pois, tem-se considerado,
além disto os aspectos sociais, culturais e geracionais que produzem identidade e mudança.
Nos estudos que centram em abordar essa fase da vida de todo indivíduo, um aspecto
parece sempre presente, a ênfase no comportamento desafiador e algumas vezes
socialmente desviante. Pfromm Neto (1979) coloca que muitas das transgressões dos
117
adolescentes são por vezes uma ameaça à sociedade, porém estas são freqüentemente
atitudes necessárias para que o sujeito se sinta integrado ao seu grupo.
É considerando esta e outras questões que, a seguir os principais resultados desta
dissertação serão discutidos, sem esquecer, contudo, as limitações aqui encontradas. Este
capítulo será particularmente organizado em dois aspectos, primeiramente tratará de
abordar acerca de como foram operacionalizados os construtos de interesse, e em seguida,
abordará acerca do modelo teórico proposto para explicar as condutas socialmente
desviantes ora estudadas.
7.1- AS MEDIDAS UTILIZADAS
No que diz respeito às medidas utilizadas alguns comentários podem ser realizados:
- Escala de Busca de Sensações. Esta medida foi desenvolvida por Zuckerman,
Eysenck e Eysenck (1978) e, em seguida, foi modificada por Schultz e Schultz em 2002
(ver anexo II). Originalmente composta por 40 itens distribuídos eqüitativamente em
quatro fatores ou sub-escalas: 1) Busca de Aventura e Emoção; 2) Busca de Experiências;
3) Desinibição; e 4) Suscetibilidade ao Aborrecimento. Não obstante, após aplicação
realizada com uma amostra de adolescentes e jovens paraibano, a estrutura fatorial
mostrou-se de maneira diferente, porém similar. Cabe mencionar, que após levantamento
bibliográfico, constatou-se que estudos brasileiros ainda não tinham sido desenvolvidos
com a utilização da referida medida.
O traço Busca de Sensações, com base na análise de sua estrutura fatorial, ficou
composta por duas dimensões: a primeira, mantendo o nome original, Busca de Aventura e
Emoção e a segunda intitulada de Busca de Experiências e Excitação. A redução do
número de fatores levou também a diminuição do número de itens, resultando em um total
de 23 itens com cargas fatoriais acima de ± 0,40, sendo 13 do primeiro fator. Estes fatores
118
apresentaram índices de consistência interna aceitáveis (Alzina, 1989), respectivamente, de
0,88 e 0,80, além de explicarem conjuntamente 26% da variância total.
O traço busca de sensações é um construto ainda pouco estudado pela psicologia
social. Em se tratando de Brasil, o que se evidencia é uma certa escassez de material
bibliográfico e de instrumentos para sua medição. Apesar deste já ser um tema tratado
desde a década de 70. Fora do Brasil, contrariamente, têm sido desenvolvidos estudos
(Aluja, 1989; Kopeinkin, 1997; Zuckerman, 1994) com técnicas de papel e lápis para
avaliar a busca de sensações, bem como tem sido desenvolvidos pelo NIDA trabalhos de
base biológica para compreender o sistema cerebral dos alto buscadores de sensações.
- Inventário dos Cinco Grandes Fatores de Personalidade. Esta medida foi
utilizada no contexto Brasileiro por Gouveia, Meira, Santos, Jesus e Formiga (2001) e já
havia sido utilizada no contexto espanhol por Benet-Martínez e John. Foi originalmente
desenvolvido para avaliar cinco traços de personalidade: Extroversão, Agradabilidade,
Consciencioso, Neuroticismo e Abertura à Mudança. Na presente dissertação, foram
utilizados apenas os fatores neuroticismo e extroversão. Aqui se ressalta a necessidade de
outras pesquisas, que possam concretizar um instrumento valido e preciso que possibilite a
mensuração dos cinco grades fatores de personalidade.
- Escala de Condutas Anti-sociais e Delitivas e Questionário dos Valores
Humanos Básicos. As medidas utilizadas para mensurar as condutas socialmente
desviantes e as prioridades valorativas dos adolescentes e jovens, já são medidas adaptadas
e validadas ao contexto brasileiro, mas propriamente o paraibano. A primeira está
composta por 40 itens, sendo 20 em cada um dos fatores teoricamente esperados, Condutas
Anti-sociais e Condutas Delitivas. Foi proposta por Seisdedos (1988) e utilizada por
119
Formiga (2002), apresentando parâmetros psicométricos satisfatórios (Alphas de 0,91 e
0,86). Com relação ao questionário de valores, está composto por 24 itens que se
distribuem em seis funções psicossociais (Experimentação, Realização, Existência,
Suprapessoal, Normativo e Interacional) organizadas em três critérios de orientação
(Pessoal, Central e Social). Esta organização é proposta por Gouveia (1998) e apresenta
índices de bondade de ajuste satisfatórios (ver Maia, 2000).
Diante do exposto, pode-se chegar a duas prerrogativas, a primeira refere-se ao fato
de que se pode contar com medidas válidas à amostra a que se destina, e a segunda faz
menção à possibilidade de prosseguir com a confiança nos achados da presente dissertação.
Por outro lado, não se pode deixar de ressaltar que caberia o desenvolvimento de mais
pesquisas para que se possam confrontar as estruturas fatoriais encontradas, bem como
buscar um refinamento destas medidas.
7.2- DIFERENÇAS DE GÊNERO E IDADE NAS CONDUTAS ANTI-SOCIAIS E
DELITIVAS E NOS TRAÇOS DE PERSONALIDADE
Primeiramente, será tratado o papel do sexo e da idade dos participantes em relação
às condutas socialmente desviantes e aos traços de personalidade, busca de sensações e
neuroticismo.
Encontrou-se que homens e mulheres diferem significativamente em relação às
condutas anti-sociais e delitivas (Hipótese 8), busca de aventura e emoção (Hipótese 11)
e neuroticismo (Hipótese 12). Neste último, as mulheres pontuaram mais do que os
homens.
Verificou-se também que em relação à idade, aqueles com idades entre 16-20
quando comparados com os jovens de 21-26 anos, apresentaram pontuações mais elevadas
nas condutas anti-sociais (Hipótese 9) e em busca de experiência e emoção (Hipótese 10).
120
A esse respeito, Kopeikin (1997) já havia apontado que são, principalmente, aqueles com
idades entre 16 e 20 anos que as apresentam.
A diferença entre homens e mulheres em relação às condutas socialmente
desviantes provavelmente ocorre devido aos fatores envolvidos no processo de
socialização, visto que a menina é educada para o diálogo, enquanto que o menino é
educado para a ação (Schneider, 2001). Outra explicação fundamenta-se no pressuposto de
que as mulheres são mais sensíveis e românticas do que os homens, enquanto que estes são
vistos como mais ativos e até agressivos.
7.3- TRAÇOS DE PERSONALIDADE, VALORES HUMANOS E CONDUTAS
ANTI-SOCIAIS E DELITIVAS
A fim de analisar as relações existentes entre os construtos estudados, objetivo
principal desta dissertação, foi possível verificar que o padrão de correlação entre estes.
Primeiramente, considerando a relação entre os Traços de personalidade e as condutas antisociais, aspecto abordado por Miller (1997), Heaven (1996), foram elaboradas três
hipóteses:
Hipótese 1: As condutas anti-sociais e delitivas se correlacionarão diretamente entre si.
Hipótese 2: O traço de personalidade neuroticismo se correlacionará diretamente com as
condutas anti-sociais.
Hipótese 3: O traço de personalidade extroversão se correlacionará diretamente com as
condutas anti-sociais.
Hipótese 4: O fator de busca de aventura e emoção se correlacionará diretamente com as
condutas anti-sociais.
Hipótese 5: O fator de busca de experiência e excitação se correlacionará diretamente com
as condutas anti-sociais.
121
A despeito da primeira hipótese que aponta uma relação direta entre neuroticismo e
condutas socialmente desviantes, como também indica o estudo de Romero, Luengo e
Sobral (2001), verificou-se nesta dissertação que tal traço apresentou correlação como
esperada. Ao Contrário, neuroticismo relacionou-se diretamente com as condutas antisociais (r = 0,13, p < 0,001). Sendo assim, a primeira hipótese foi corroborada.
Com relação ao traço de extroversão, a Hipótese 2 postula que este estará
correlacionado diretamente com as condutas anti-sociais. O que realmente foi verificado
(r = 0,18, p < 0,001). Ademais, verificou-se relação direta deste traço também com as
condutas delitivas (r = 0,16, p < 0,001). Extroversão é um fator que descreve pessoas
impulsivas, aventureiras, assertivas e dominadoras (Schultz & Schultz, 2002), assim,
muitas vezes por serem assertivas demais as pessoas podem ser confundidas com
agressivas, principalmente, em culturas mais tradicionais.
De acordo com a literatura considerada, um traço de personalidade deveras
estudado como estando relacionado às condutas socialmente desviantes, é a busca de
sensações, sendo também considerado na presente dissertação. Este traço faz menção a
uma tendência que os indivíduos possuem por procurar viver sensações, experiências e
emoções que fogem a mesmice, é uma busca por coisas que lhes propicie sentimentos
intensos. Zuckerman (1994) é o principal pesquisador do assunto, e acrescenta que as
pessoas, na busca por novas e excitantes experiências, estão prontas a passar, inclusive, por
riscos a fim de lograr estas sensações.
De momento, elaborou-se a hipótese que indicava relações diretas entre os fatores
de busca de sensações e as condutas anti-sociais. O que foi comprovado, pois se verificou
que quanto mais os respondentes apresentavam concordância com os itens dos fatores de
busca, seja o fator de busca de aventura e emoção ou a busca de experiência e excitação,
mais apresentam pontuação elevada também nas condutas socialmente desviantes,
122
comprovando a hipótese proposta. Assim, foi possível verificar, concretamente, que as
condutas anti-sociais se correlacionaram significativamente com a busca de aventura e
emoção (r = 0,24, p < 0,001) e com a busca de experiência e excitação (r = 0,50, p <
0,001). Similarmente ao ocorrido com as condutas delitivas que se correlacionaram
diretamente com a busca de aventura e emoção (r = 0,20, p < 0,001) e com a Busca de
Experiência e Excitação (r = 0,52, p < 0,001). A relação entre as condutas anti-sociais e a
busca por novas experiências será melhor discutido ao analisar o modelo teórico.
No que diz respeito aos valores e as condutas socialmente desviantes encontrou-se
que os valores da função psicossocial de experimentação e realização que compõem o
critério de orientação Pessoal, apresentou correlação direta com as condutas com as
condutas socialmente desviantes. Especificamente, experimentação se correlacionou com
as condutas anti-sociais (r= 0,18, p < 0,001) e com as Delitivas (r = 0,20, p < 0,001), o
mesmo ocorrendo com a função de Realização (r= 0,14, p < 0,001) e (r= 0,12, p < 0,01) e
tais condutas, respectivamente. Por outro lado, as funções do critério de orientação Social
apresentaram correlação inversa com estas condutas, sendo verificado que a função
normativa se correlacionou com as condutas anti-sociais (r = -0,19; p < 0,001) e com as
delitivas (r = -0,19; p < 0,001). Já o critério de orientação dos valores Centrais que
compreende as funções psicossociais de Existência e Suprapessoal, encontrou-se que
apenas esta última função apresentou correlação significativa de modo inversamente
proporcional com as condutas anti-sociais (r = -0,14; p < 0,001) e com as delitivas (r = 0,18; p < 0,001).
Coelho Júnior (2001) também obteve resultados similares. Seu estudo contou com a
participação de aproximadamente 1.500 jovens da cidade de João Pessoa e, utilizando
outro instrumento de medida para avaliar as condutas anti-sociais, verificou o padrão de
correlação entre os valores da Tipologia de Gouveia (1998) e estas condutas. Dos valores
123
específicos, as correlações mais importantes para o seu estudo foram apresentadas pelos
valores de emoção (r = 0,13; p < 0,001) e sexual (r = 0,11; p < 0,001) de maneira direta, e
pelos valores obediência (r = -0,19; p < 0,001) e tradição (r = -0,18; p < 0,001). Coelho
Júnior concluiu que são, sobretudo, os valores que denotam assumir risco que promovem o
potencial uso de drogas, enquanto que os de cunho normativo, aqueles que destacam a
manutenção do status quo que inibem esse potencial uso.
Um outro estudo a respeito, mas utilizando a teoria de Schwartz (1994), foi
desenvolvido por Tamayo, Nicareta, Ribeiro e Barbosa (1995). Estes autores comparando
usuários e não usuários em relação às pontuações de importância atribuída ao conjunto de
10 tipos motivacionais, encontraram que os usuários de drogas apresentaram pontuações
superiores em hedonismo e estimulação, e deram menos importância aos tipos
conformidade e segurança quando comparados com os não usuários.
Estes resultados são bastante semelhantes aos encontrados por Formiga (2002)
também utilizando a Tipologia de Gouveia (1998) e considerando um índice geral das
socialmente desviantes, verificou a relação entre os critérios de orientação e estas condutas,
encontrando que o critério de orientação Pessoal (r = 0,20; p < 0,05), Social (r = -0,23; p <
0,05) e Central (r = -0,19; p < 0,05), confirmando as suas hipóteses.
Critério de Orientação Social
Como visto anteriormente, os indivíduos que priorizam os valores sociais são
aqueles que desejam sentir-se aceitos e integrados ao grupo de pertença, orientando-se,
portanto, sempre em direção aos demais (Gouveia, 1998). Como visto estes valores se
correlacionaram inversamente com as condutas socialmente desviantes, a função dos
valores de mantenimento do status quo na sociedade, visto que representa uma fonte de
controle ou prevenção cognitiva contra a agressão e as condutas que fogem às normas
124
estabelecidas, sendo assim, este pode ser visto como um fator de proteção frente aos
comportamentos desviantes socialmente (Romero, Sobral, Luengo & Marzoa, 2001). Este
aspecto, não obstante, não se apresentou tão claro no estudo de Andrade (2003) quando
considerada como variável critério as condutas agressivas das crianças.
Critério de Orientação Central
As pessoas que assumem o padrão valorativo central apresentam-se como guiadas
por valores que se situam entre os outros dois critérios de orientação e, portanto, se pautam
por interesses mistos (individuais e coletivos). Mesmo não existindo nenhuma hipótese a
respeito, especificamente, verificou-se que estes valores suprapessoais correlacionaram-se
negativamente com as condutas em questão, o que é compreensível, visto que para manter
a orientação em interesses mistos, o indivíduo, necessariamente, busca a coerência,
afastando-se de condutas injustas, que serviriam de ameaça tanto para sua segurança,
quanto para a dos demais. Os valores suprapessoais expressam uma situação social, na
qual a pessoa pode obter seus objetivos independentemente de sua condição social ou
grupo afiliativo, descrevendo alguém maduro, com preocupações menos materiais
(Gouveia, 1998). Assim, era de se esperar que as pessoas que adotassem este padrão
valorativo apresentassem uma tendência a não apresentarem condutas inadequadas perante
os demais.
Estes aspectos foram tratados por Andrade (2003) que sugere que a adoção destes
valores serviria de proteção para as condutas agressivas, por estas condutas não serem
compatíveis com os comportamentos preditos por estes valores, tais como apreciação das
artes, educação e igualdade social. Ademais, Formiga (2002) também destacou este
aspecto ao verificar que os valores suprapessoais se correlacionaram inversamente com a
adoção de condutas anti-sociais e delitivas.
125
Valores de Orientação Pessoal.
Nesta categoria, dá-se prioridade aos próprios benefícios, de forma que as pessoas
que assumem o padrão valorativo pessoal costumam manter relações pessoais do tipo
contratual (Gouveia, 1998). Como era de se esperar, as funções psicossociais que
compõem o critério de orientação pessoal (realização e experimentação) apresentaram
correlação direta e significativa com as condutas anti-sociais e delitivas.
Como dito, estes valores ressaltam a realização, o sentimento de ser importante e
poderoso, ser uma pessoa com identidade e espaço próprio (Gouveia, 1998). Muitas vezes,
no senso comum, ser poderoso pode indicar também ter um comportamento agressivo ou
comportar-se agressivamente para se obter o que se quer. Desta forma, poder-se-ia
justificar a presença de uma correlação do tipo positiva entre estes construtos, visto que o
indivíduo se utiliza de comportamentos agressivos para obter o que se propõe, ou seja,
conseguir o que quer ou resolver problemas cotidianos, o que evidencia ainda mais a
discussão anteriormente realizada.
A presente dissertação possibilitou ainda a verificação das relações existentes entre
os traços de personalidade entre si e com os valores. O traço de personalidade extroversão
não se correlacionou direta e significativamente com os dois fatores de busca,
exclusivamente o fez com o fator busca de aventura e emoção (r = 0,12; p < 0,01). A
relação entre extroversão e busca de sensações já foi apontada por Aluja (1990),
principalmente, fundamentada na idéia de que as atitudes dos buscadores de sensações são
positivas em relação à emoção ou alegria e suas expressões tendem a ser mais desinibidas.
Diante do exposto, parece ser que as condutas socialmente desviantes possuem uma
forte relação, principalmente, com a busca de sensações, com o a personalidade
extrovertida e com os valores de experimentação e realização. Aspectos que, como visto na
fundamentação teórica, já haviam sido contemplados. Assim, considerando os estudos
126
realizados a respeito de tais relações, este trabalho propõe algo, de certa maneira
desafiador, a testagem de um modelo teórico explicativo para as condutas anti-sociais e
delitivas, que verifique o poder explicativo dos traços neuroticismo, extroversão e busca de
sensações e de duas funções psicossociais, normativas e de experimentação na explicação
das condutas anti-sociais, estando estas como explicação para as condutas delitivas, como
pode ser visto na figura abaixo.
NORMATIVO
NEUTORITICISMO
0,15***
-0,12***
E1
E2
0,12***
-0,04
-0,03
EXTROVERSÃO
0,60***
ANTI_SOCIAL
DELITIVA
0,40***
-0,10***
0,01
BUSCA SENSAÇÃO
EXPERIMENTAÇÃO
0,42***
As principais indicações deste modelo dizem respeito, primeiro ao poder de
explicação dos traços de personalidade. Observou-se que os traços neuroticismo e busca de
sensações foram os únicos traços no modelo que predizem satisfatoriamente as condutas
anti-sociais de forma direta, neste sentido o traço extroversão não colaborou na explicação
de tais condutas.
As pessoas que apresentam alta pontuação no traço neuroticismo são, geralmente,
ansiosas, tensas e emotivas. Têm alta probabilidade de apresentarem problemas na sua
auto-estima. De acordo com Benet-Martínez e John (1998) este traço põem em destaque os
127
afetos negativos dos sujeitos os quais incluem tristeza, irritabilidade e tensão nervosa. Daí
pode se verificar a sua relevância para explicar as condutas socialmente desviantes, pois
muitas vezes, as pessoas por apresentarem estas características, se diferenciam do padrão
de comportamento que é socialmente esperado podendo então ser percebidos como antisociais e eles mesmos se perceberem como tal.
O segundo traço que mostrou-se relevante no modelo foi a busca de sensações.
Como dito, este reflete uma característica que as pessoas possuem em busca de viver novas
e intensas experiências. No modelo testado, o traço explicou diretamente as condutas antisociais, sendo o traço com maior peso fatorial no modelo. Estes achados corroboram os
estudos que tratam da relação entre a busca de sensações e os comportamentos de risco. A
despeito, Lin e Tsai (2002) encontraram que tanto comportamentos de risco socialmente
aceitáveis – como é o caso de paraquedismo e atividades de mergulho – quanto os não
aceitáveis – por exemplo, dirigir embriagado e usar drogas – estão diretamente
relacionados a altas pontuações em busca de sensações.
Estes achados do presente estudo confirmam o que aponta Zuckerman (1983,
1994), acerca dos alto buscadores de sensações, que eles têm algo de anti-social em seu
senso, o que faz com que seus comportamentos estejam baseados em sua própria vontade,
ao invés das convenções sociais, ou vontades de outrem. Ademais, eles são não
conformistas e valorizam situações de risco.
O modelo proposto também possibilitou verificar que o traço busca de sensações
covaria com os traços extroversão e a função valorativa experimentação. O que também
vem a corroborar Zuckerman (1983) que descreve os buscadores de sensações como
pessoas que apresentam comportamentos desinibidos e atitudes mais receptiva em relação
a novas experiências, são mais sociáveis, e tendem a tolerar idéias que são comumente
estranhas para a maioria das pessoas.
128
Além destas explicações, o modelo possibilitou testar o papel dos valores para as
condutas anti-sociais, centrando as análises, especificamente, em duas funções
psicossociais, a de experimentação e a normativa. Para tanto, duas hipóteses foram
elaboradas baseadas nos estudos de Coelho Júnior (2001) e Formiga (2002):
De acordo com os resultados, foi possível verificar que a função de
experimentação, diferente do esperado, não se mostrou significativa para explicar as
condutas anti-sociais. Contudo, a função normativa se mostrou estatisticamente
significativa no modelo, explicando inversamente as condutas anti-sociais.
A este respeito, pode-se verificar que vários estudos, já realizados, demonstram a
função orientadora dos valores para as condutas das pessoas (Coelho Júnior, 2001;
Formiga, 2002; Milfont, 2001). Dentre estes, alguns demonstram a relação entre alguns
valores com condutas socialmente indesejáveis. Por exemplo, Coelho Júnior (2001)
assinala que os valores de orientação pessoal ressaltam condutas de risco, como o uso de
drogas entre os jovens. Formiga (2002) verifica que estes mesmos valores também
predizem a adoção de condutas anti-sociais, enquanto que apenas os valores de
experimentação predizem as condutas delitivas. Semelhante é o estudo de Andrade (2003)
antes exposto.
As pessoas que priorizam os valores de Experimentação em sua vida, são aquelas
que procuram descobrir e apreciar novos estímulos, além de buscar enfrentar situações
limite. Tinha-se como pressuposto que os jovens que se guiassem por estes valores
apresentassem um padrão de condutas socialmente desviantes, visto que este
comportamento também não é aceito como socialmente adequado como nos estudos acima
descritos. No entanto, isto não foi constatado.
Quanto aos valores normativos estes fazem menção a busca de uma vida social que
prioriza a estabilidade do grupo, que se refletem em comportamentos socialmente corretos
129
e no respeito pelos padrões culturais existentes. Os valores específicos que compõem a
função normativa são religiosidade, ordem social, tradição e obediência. Assim, como era
esperado, esta função explicou diretamente as condutas anti-sociais.
130
CAPÍTULO VII – CONCLUSÃO
131
8- CONCLUSÃO
Diante do exposto, é chegado o momento de tecer alguns comentários conclusivos acerca
dos aspectos considerados neste estudo. Assim, a seguir, são apresentadas as principais
limitações da pesquisa ora desenvolvida, suas contribuições e possibilidades de
aplicabilidade, bem como a algumas indicações de pesquisas futuras. Pode-se dizer que
muitos outros aspectos poderiam ser destacados além dos mencionados a seguir, no
entanto, tentou-se elencar aqueles que foram mais salientes no processo.
LIMITAÇÕES DA PESQUISA
Primeiramente, a principal limitação deste estudo deve-se ao fato de que a variável
que se intenta explicar, as condutas socialmente desviantes, são multidimensionais, como
já se tem explicitado no decorrer deste estudo, e mesmo assim, aqui considerou apenas os
traços de personalidade e os valores em sua explicação. Um tratamento mais adequado das
condutas socialmente desviantes deveria considerar múltiplos fatores, sociais, ambientais e
individuais. Além dos aspectos econômicos e estruturais que o influenciam. Sem dúvida,
este é um aspecto que merece ser assumido. Poder-se-ia justificá-lo com base na
necessidade de parcimônia, mas esta limitação deve-se, principalmente, a falta de recursos
metodológicos e econômicos que dificultam delineamentos mais laboriosos.
Considerando este aspecto é que se assume que os resultados desta pesquisa não
são entendidos como algo conclusivo a respeito das condutas socialmente desviantes dos
jovens e adolescentes. Antes, sabe-se das limitações de ordem metodológica e teórica.
Outro ponto de destaque neste tópico refere-se às medidas utilizadas para mensurar
os construtos abordados. No que diz respeito à Escala de Condutas Anti-sociais e Delitivas
(Seisdedos, 1998), verifica-se que esta possui algumas características que são, comumente
criticadas no aporte teórico da teoria da medida. Como aponta Pimentel (2004), existem
132
algumas dificuldades inerentes à construção dos itens deste instrumento, haja vista alguns
possuírem sentidos múltiplos por fazerem menção a mais de um comportamento.
Considera-se, pois, que embora este instrumento tenha se mostrado válido para avaliar as
condutas anti-sociais e delitivas, sugere-se que alguns ajustes poderiam ser feitos a fim de
propiciar uma medida mais eficaz a este fim.
Merece ainda ser apontado que a forma de mensurar as condutas anti-sociais e
delitivas baseia-se numa escala de resposta que está ancorada nos extremos 0 = Nunca a 10
= Sempre, o que pode possibilitar a ocorrência de vieses no sentido de que a maioria dos
alunos adota o nunca como freqüência dos seus comportamentos, muitas vezes, por
desejabilidade social.
Questão também de relevância aqui, diz respeito à utilização dos traços de
personalidade na base explicativa das condutas socialmente desviantes. Este estudo poderia
ter possibilitado a utilização de outros traços além dos aqui considerados como, por
exemplo, locus de controle. Assume-se que pretender explicar o fato de um adolescente
apresentar tais condutas com base nos traços pode parecer algo simplista, sendo por isto
mesmo que também foram considerados os valores humanos como variável antecedente
neste estudo, por ser este um construto mais psicossocial.
Outro ponto que pode ser incluído nas limitações, é que não foram consideradas as
relações mais precisas que se estabelecem entre os traços de personalidade e valores, o que
seria útil para uma discussão mais detalhada do modelo. Ademais, possibilitaria uma
discussão já clássica na Psicologia Social, a hierarquia personalidade, valores e
comportamento. O modelo causal também poderia ter sido analisado considerando subamostras de homens e mulheres, na tentativa de verificar se o padrão de variáveis
preditoras para as condutas socialmente desviantes difere em função do sexo. Sem dúvida,
133
estas são questões relevantes e que, mas do que limitações propriamente ditas, são novas
possibilidades de pesquisas. Sendo assim, serão retomadas a diante.
PRINCIPAIS CONTRIBUIÇÕES E APLICABILIDADE DA PESQUISA
Apesar dos aspectos antes mencionados, fruto deste estudo podem ser apontadas
algumas contribuições. Uma primeira contribuição refere-se à apresentação de um modelo
causal para explicar as condutas socialmente desviantes em jovens e adolescentes que não
em situação de reclusão do convívio social, são estudantes. Contribuiu-se para verificar
empiricamente a relação entre personalidade e valores como preditoras de tais condutas
fazendo-se uso de procedimentos estatísticos mais arrojados, indo um pouco além das
relações bivariadas comumente efetuadas na área. Ademais, ressalta-se que estas relações
poderão ser melhor analisadas. O que se apresenta aqui é apenas o iniciar de uma série de
possibilidades de análises, que despontarão em outras publicações científicas. O conjunto
de dados que foi considerado possibilita ainda ser explorado, considerando, por exemplo, a
relação personalidade, valores, relação classicamente estudada pelos psicólogos sociais.
Este trabalho de dissertação surge como uma contribuição no âmbito brasileiro ao
considerar o traço busca de sensações, pois nenhum estudo que trate das condutas
socialmente desviantes nesta cultura fez menção a este traço. Assim, contribui-se aqui com
um instrumento válido e preciso para avaliar este construto, além de considerar a
verificação empírica das suas relações com outros traços de personalidade, com os valores
e com as condutas socialmente desviantes.
Na revisão da literatura empreendida, que o estudo da relação entre a busca de
sensações e as condutas dos jovens já possui pesquisadores interessados (Lin & Tsai, 2002,
Zuckerman, 1994). Contrariamente, entre busca e valores os estudos são bastante raros.
134
Nesta dissertação encontrou-se que um tipo particular de valores, os de experimentação,
estão diretamente relacionados à busca de sensações.
Em se tratando de um grupo particular de pessoas, os jovens, pensar nesta relação é
algo deveras importante. Levando-se em consideração que os jovens encontram-se na
socialização secundária, e que muitas das suas prioridades valorativas serão solidificadas
nesta fase, deve-se ter particular atenção com os grupos de adolescentes e jovens, pois,
sabendo-se que é justamente nesta fase onde está presente o maior índice de buscadores, os
jovens poderão seguir dando importância primordial em suas vidas apenas à busca por
aventura, emoção e experiências intensas e variadas. O que pode ter implicações em seus
comportamentos futuros.
Os dados aqui apresentados, mesmo longe de serem conclusivos, são interessantes e
coerentes com os encontrados na literatura. Especificamente no que diz respeito à
contribuição dos valores para explicar as condutas socialmente desviantes, foi possível
comprovar que os valores consistentemente têm sua relevância. O presente estudo
possibilitou um tratamento causal entre os valores e tais comportamentos, além da
consolidação teórica e empírica da tipologia de valores adotada (Gouveia, 1998). Como
apontado em outros estudos (ver Coelho Júnior, 2001; Formiga, 2002; Tamayo & cols.
1995) os valores normativos explicam a menor freqüência de comportamentos socialmente
desviantes por parte dos jovens, sendo este um fator de proteção. Estudos que visem o
controle e prevenção de condutas socialmente desviantes podem considerar este aspecto.
Outra contribuição deste estudo foi verificar empiricamente a hierarquia entre as
condutas anti-sociais e as delitivas. O modelo causal possibilitou a constatação de que as
condutas anti-sociais antecedem as delitivas, aspecto já comumente teorizado. Isto sugere
que os adolescentes que apresentam ainda em menor grau as condutas socialmente
desviantes podem ser acompanhados para que não cheguem a se tornar delitivos. Trabalhos
135
que ponham ênfase num padrão de prioridades de valores normativos, por exemplo, pode
ser útil como um fator de proteção.
Em resumo, foi possível iniciar uma discussão no âmbito brasileiro, mais
propriamente o paraibano, a despeito da relevância dos traços de personalidade
neuroticismo e busca de sensações na predição de condutas socialmente desviantes. E,
como dito, foi possível também consolidar os estudo que tratam dos valores como
preditores do comportamento.
POSSIBILIDADE DE FUTURAS PESQUISAS
Como dito, assumindo as limitações deste estudo, bem como suas contribuições,
alguns indicadores de futuras pesquisas podem ser delineados. O presente estudo partiu de
uma abordagem mais psicológica ou psicossocial para estudar o fenômeno das condutas
socialmente desviantes dos jovens, contudo, considerando que este é multidimensional,
muitas variáveis poderiam ser consideradas em sua análise (ver Petraits, Flay & Miller,
1995). Na literatura recorrente encontram-se modelos que põem ênfase em aspectos
biológicos, comportamentais, econômicos entre outros, aqui não serão esgotadas as
sugestões de pesquisas futuras, mas algumas serão mencionadas.
Uma variável que se revela como importante nesta temática é o grupo de pares, este
tem sua relevância tanto na formação das atitudes dos adolescentes como na estruturação
dos padrões de comportamento (Martín & Martinez, 1997). Se o grupo de pares
comumente transgride regras e possibilita que isto seja percebido como algo natural, os
adolescentes possivelmente continuarão a apresentar comportamentos socialmente
desviantes nos anos seguintes. A Psicologia Social já vem há muito estudando a
importância dos grupos de pertença para explicar uma série de comportamentos.
136
Adalbjarnardottir e Raffinson (2002) encontraram que fazer parte de grupos que fumam e
bebem com freqüência são fortes preditores dos comportamentos socialmente desviantes.
A qualidade de vida familiar tem sugerido alguns estudos nesta área (Giancola,
2000; Li, Feigelman & Stanton, 2000; Peiser & Heaven, 1996). O comportamento dos pais
parecem ser fortes preditores das condutas anti-sociais, pois o fato de ter pais com histórico
de uso de álcool, por exemplo, tem sido um real fator de risco para seus filhos. Torrente e
Rodrigues sugerem que os adolescentes podem elaborar uma percepção de aceitação e
normalização do uso de drogas e daí apresentar um padrão de condutas socialmente
desviante. Assim, as práticas parentais sugerem ser um dos principais fatores que deve ser
considerado em pesquisas futuras.
Desde uma abordagem transcultural e mais sociológica, poder-se-ia estudar os
padrões de condutas socialmente desviantes que diferem de sociedades consideradas
coletivistas das individualistas (Cohen, Nisbet, Browdle & Schwarz, 1996). E, considerar,
especificamente as sub-culturas juvenis, um estudo realizado com jovens membros de
gangs é algo interessante, conhecer a dinâmica psicossocial que estes grupos possuem
poderia auxiliar na análise das condutas socialmente desviantes.
Finalmente, chega-se a este último parágrafo ressaltando que, sem dúvida, as
limitações de uma pesquisa são muitas, sempre. Principalmente, porque é justamente com
o desenvolvimento da pesquisa que estas vão sendo observadas. Possivelmente num
próximo estudo, algumas destas lacunas poderão ser preenchidas, mas outras
inevitavelmente surgirão. Sendo isto uma dos aspectos caracterizadores da ciência, e que
motivam os pesquisadores a novas buscas pelas verdades.
137
CAPÍTULO IX – REFERÊNCIAS
138
9- REFERÊNCIAS
Adalbjarnardottir, S. & Rafnsson, F. D. (2002). Adolescent antisocial behavior and
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