adaptação de locomotivas sd 40 para bitola métrica

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adaptação de locomotivas sd 40 para bitola métrica
ADAPTAÇÃO DE LOCOMOTIVAS SD 40 PARA BITOLA MÉTRICA
Autor: Amélio Luiz Mandelli, CVRD.
E-mail: [email protected]
RESUMO
Desenvolvemos este trabalho com o intuito de documentar as soluções utilizadas na adaptação de bitola
standard para bitola métrica das locomotivas GM SD 40.
Descrevemos inicialmente as modificações básicas desenvolvidas nos truques, no chassi das locomotivas.
Devido à dificuldade de obedecer ao gabarito estabelecido para as ferrovias se fez necessária a modificação
das cabines, o que também está documentado.
A inscrição da locomotiva em curvas de raio da ordem de 60 m, obrigou o desenvolvimento de uma solução
para seus engates.
A solução é completada com as alterações introduzidas nos sistemas elétricos para garantir um desempenho
altamente satisfatório.
Finalmente, através da análise dos resultados dos testes de carga e de via realizados podemos mostrar que as
adaptações produziram uma locomotiva de alta capacidade de esforço de tração capaz de trafegar em linhas
de bitola métrica com curvas de raio fechado e gabarito bastante restrito.
Introdução
Desde o início das privatizações no Brasil, a crescente necessidade de transporte da demanda de cargas,
intensificou a busca por melhores resultados econômicos em toda a área de transportes, principalmente no
transporte ferroviário.
Nas ferrovias que movimentam basicamente carga em grandes volumes, o direcionamento é no sentido do
total aproveitamento da sua capacidade, formando trens longos que se deslocam a velocidades comerciais
elevadas, o que tem levado ao uso de trens cada vez maiores e mais pesados. A opção pelo trem maior
demanda por locomotivas de potência elevada (superior a 3.000 hp).
Devido à legislação americana que obrigou as operadoras locais a substituírem suas frotas por locomotivas
mais modernas, até bem recentemente, havia disponibilidade de uma quantidade bastante significativa de
locomotivas usadas de potência elevada, com aproximadamente 20 anos de uso, em território americano e
canadense.
Os escassos recursos financeiros de muitas concessionárias brasileiras, somados as dificuldades para
aquisição de locomotivas novas, tais como: não disponibilidade no mercado nacional, custo elevado, longo
prazo para fornecimento e definições de projeto (bitola métrica, gabarito da ferrovia), determinaram que
algumas ferrovias brasileiras tomassem a decisão de adquirir parte da frota dessas locomotivas usadas
disponíveis nos Estados Unidos e Canadá.
Já foram trazidos e adaptados no Brasil os seguintes modelos de locomotivas: B 36, C 30, C 36, SF 30, SD 45
e SD 40, mas somente a SD 40 receberá um destaque especial neste artigo.
O projeto de adaptação executado nos dois modelos de locomotivas SD 40 (SD40-2 e SD40-2T) requer uma
grande interferência em sua estrutura para acomodação do novo modelo de truques e a observância do
gabarito da ferrovia.
Descrição da adaptação da locomotiva
As locomotivas SD 40 trazidas para o Brasil foram fabricadas pela Electro Motive Division da General Motors
(EMD - GM) nos Estados Unidos na década de 60, em duas versões SD 40-2 e SD 40-2T.
Fig. 1 - Locomotiva SD40-2
Fig. 2 - Locomotiva SD40-2T
Interpretando a nomenclatura convencionada pela EMD para as locomotivas SD 40, temos:
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SD
40
2
2T
- Trabalhos Especiais (Special Duty);
- 3.000 hp de potência de tração;
- controle de excitação e potência utilizando cartões eletrônicos;
- especiais para operação em túneis.
Antes de entrarem em operação nas ferrovias brasileiras de bitola métrica, as locomotivas SD 40 usadas, que
estavam operando na bitola standard das ferrovias americanas e canadenses, demandam o conjunto de
alterações/modificações descritas a seguir.
Por atenderem com eficiência as adaptações propostas, os seguintes equipamentos do projeto original da
locomotiva permanecem inalterados:
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Motor diesel
Dispositivos de proteção do motor diesel
Gerador de tração
Soprador de arrefecimento dos motores de tração e alternador de tração
Gerador auxiliar
Compressor
Distância entre os dois centro de pião
Motores de tração
Em função da bitola métrica, se fez necessário à substituição dos motores de tração.
Os motores de tração GM D77/D87 originais foram substituídos por motores de tração GM D31.
É de vital importância à utilização dos 3.000 hp disponíveis para tração, que podem ser completamente
aproveitados com a utilização de somente 6 motores de tração do tipo GM D31, no entanto, devido às
limitações: carga por eixo da ferrovia (25 ton), carga por eixo do rodeiro utilizado (22,5 ton) e peso total da
locomotiva (180 ton), foi necessária a utilização de 8 motores de tração, o que produz uma carga por eixo de
22,5 ton/eixo.
A relação de engrenagem foi adequada para o motor GM D31 (64:13), de modo que o esforço de tração
produzido se mantivesse o mais próximo do apresentado pela locomotiva original.
Truques
A utilização de 8 motores de tração GM D31 obriga a substituição dos truques C-C por truques do tipo Bo-Bo.
Fig. 3 - Truques C-C
Fig. 4 - Truques Bo-Bo
Os truques do tipo Bo-Bo são constituídos por dois truques do tipo B articulados por uma travessa,
denominada por Span Bolster.
Fig. 5 - Vista do Span Bolster instalado sobre os truques
O desenvolvimento dos truques Bo-Bo para aplicação de motores de tração GM D31 foi baseado na adaptação
dos truques Bo-Bo das locomotivas GE Dash 9. Como os motores de tração GM D31 têm dimensões externas
maiores que as dos motores GE 761 empregados nas locomotivas GE Dash 9, foi necessário aumentar em
aproximadamente 200 mm o comprimento dos truques B.
Por serem articulados, os truques Bo-Bo permitem a inscrição da locomotiva em trechos com raio de curvatura
de até 70m, comuns nos traçados das centenárias ferrovias brasileiras.
Sendo os truques Bo-Bo das locomotivas Dash 9 desenvolvidos para motores GE 761 com rodas de 36”, se
fez necessária modificações no Span Bolster para permitir que rodas de 40”, utilizadas pelos motores GM D31,
fossem utilizadas sem que “pegassem” na estrutura do Span Bolster nas condições de curvas fechadas.
Componentes do sistema de freio nos truques
O novo modelo de truques requer o desenvolvimento de equipamentos do sistema de freio instalados nos
truques como: cilindros de freio, timonerias, ajustadores e rotas das canalizações.
Fig. 6 - Sistema de freio instalado nos truques
Dutos de ar de refrigeração dos motores de tração
As saídas de ar de refrigeração dos motores de tração na chapa de fundo da plataforma devem ser acrescidas
e reposicionadas em função do número de motores de tração e do novo modelo de truque.
Fig. 7 - Vista da saída de ar de refrigeração na chapa de fundo da plataforma
Plataforma
A locomotiva tem a plataforma como seu elemento principal, que basicamente é constituída de duas vigas
longitudinais tipo I e de duas vigas transversais, onde estão localizados os pontos de apoio dos truques (centro
de pião). Nas duas extremidades da plataforma são fixados os engates, que transmitem os esforços de tração
para os vagões. As vigas são unidas na sua parte superior e inferior por chapas, formando uma galeria que é
utilizada para o transporte do fluxo de ar de arrefecimento dos armários elétricos e dos equipamentos rotativos
elétricos, alternador e motores de tração.
Fig. 8 - Montagem das duas vigas longitudinais
Fig. 9 - Detalhes da plataforma
A instalação dos truques Bo-Bo sob a locomotiva demanda o alongamento de sua plataforma, tanto na parte
dianteira como na parte traseira (em torno de 1.200 mm).
Fig. 10 - Esquemático do alongamento da plataforma
Os alongamentos são realizados com chapas e vigas metálicas, e em seguida as testeiras são retornadas.
Fig. 11 - Vista do alongamento da traseira
Fig. 12 - Vista do alongamento da dianteira com a
testeira
Tanque de combustível
A instalação dos truques Bo-Bo sob a locomotiva e a manutenção da distância entre os centro de pião,
demandam uma redução no comprimento do tanque de combustível (em torno de 600 mm), através de um
corte realizado no seu centro.
Fig. 13 - Vista da região de corte do tanque de combustível
Lastro
A troca dos truques e o aumento do comprimento da locomotiva fazem com que seu peso seja aumentado.
Para manter o peso original da locomotiva é necessário que parte do lastro instalado durante a fabricação da
mesma seja retirada. A retirada do lastro deve ser realizada tendo em conta que a contra-flecha da plataforma
deve ser mantida.
Aparelho de choque e tração
O aparelho de choque e tração da locomotiva original não permite a inscrição da locomotiva em curvas de raio
fechado, sendo necessária a sua substituição por um aparelho semelhante ao utilizado na locomotiva DDM 45.
Fig. 14 - Aparelho de choque tração original
Fig. 15 - Aparelho de choque e tração da DDM 45
A altura do centro dos engates é corrigida para a bitola métrica (750 mm), o que exige também o
reposicionamento da bolsa do engate.
Fig. 16 - Alteração da altura do engate
Fig. 17 - Reposicionamento da bolsa do engate
Sistema de areeiros
Com a substituição dos truques da locomotiva, o sistema de areeiros também precisa ser adaptado. Foram
instalados novos bicos e canalizações.
Fig. 18 - Vista dos bicos dos areeiros
Carroçaria
Sobre a plataforma são inseridos os equipamentos protegidos pelas cabines.
A carroçaria da locomotiva é formada pelas cabines. A cabine do operador é soldada diretamente na estrutura
e as demais removíveis para facilitar a retirada dos equipamentos que elas protegem.
Em função do gabarito centenário das ferrovias, verificou-se que algumas obras de arte determinam que o
ponto máximo da altura da locomotiva não pode ultrapassar a 4,70 m.
Após a instalação dos truques Bo-Bo foi verificada a necessidade de:
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Deslocamento da buzina instalada sobre a cabine do maquinista;
Deslocamento da antena de radiocomunicação instalada sobre a cabine do maquinista;
Retirada do equipamento de ar condicionado instalado sobre a cabine do maquinista;
Rebaixamento da tampa superior do compartimento do filtro de inércia;
Deslocamento dos resistores de freio dinâmico;
Deslocamento e rebaixamento da cabine do radiador de resfriamento do motor diesel;
Fig. 19 - Esquemático do rebaixamento da locomotiva SD 40-2
Cabine dos radiadores de resfriamento
Nas locomotivas SD 40-2, para realização do rebaixamento da altura dos ventiladores do sistema de
resfriamento do motor diesel, é necessário que a cabine dos radiadores de resfriamento seja deslocada para a
parte posterior da plataforma em 1.600 mm e ao mesmo tempo rebaixada em aproximadamente 150 mm.
Fig. 20 - Vista do deslocamento da cabine dos radiadores de resfriamento da SD 40-2
O rebaixamento da cabine dos radiadores de resfriamento do motor diesel exigiu a modificação do reservatório
traseiro do sistema de areeiros da locomotiva.
Fig. 21 - Vista da modificação do reservatório traseiro do sistema de areeiros
Resistores de freio dinâmico
A dificuldade de rebaixar o compartimento do freio dinâmico demandou o deslocamento do conjunto dos
resistores de freio dinâmico com seus respectivos ventiladores de resfriamento para a parte inferior da cabine
dos radiadores de resfriamento do motor diesel.
Fig. 22 - Esquemático do deslocamento dos resistores de freio dinâmico na locomotiva SD 40-2T
Operação em tração
O projeto original possui dispositivos para acionamento de apenas seis motores de tração, com ligação do tipo
Série-Paralela e transição para ligação Paralela.
Fig. 23 - Ligação Série-Paralelela
Fig. 24 - Ligação Paralela
Com a modificação de seis para oito motores de tração, passou-se a usar somente a ligação do tipo Paralela,
todavia, as chaves de transição para a ligação Série-Paralela não foram eliminadas.
Fig. 25 - Esquemático da ligação dos oito motores de tração D 31
Após a definição do tipo de operação (tração ou frenagem dinâmica) e o sentido de deslocamento (frente ou
ré) pelas chaves BKT (Breaking Switch) e reversoras é necessário completar o circuito de modo a conectá-lo
ao barramento do alternador de tração.
Fig. 26 - Contator P
Fig. 27 - Chave BKT
Os motores de tração são acoplados ao alternador de tração pelos contatores de potência (P), é necessário
para um melhor controle dos motores de tração que seja utilizado um contator de potência para cada motor,
como a quantidade de motor de tração foi alterada, logo foi necessário alterar a quantidade de contatores de
potência.
Com a adição de dois novos motores de tração foi necessário adicionar dois novos contatores de potência (P)
e fazer alteração nos circuitos complementares desses dispositivos, além de demandar um aumento e a
criação de novas rotas dos cabos que os alimentam.
Fig. 28 - Novas rotas de cabos de alimentação dos motores de tração
A utilização de oito motores exigiu um aumento da corrente de saída do gerador de tração, sendo necessária à
modificação do circuito de controle da excitação.
Operação em frenagem dinâmica
Com a finalidade de não se aumentar o custo da transformação, foi feita à opção de não alterar o número de
resistores de freio dinâmico, isto é, o número foi mantido, mas a configuração foi modificada.
Fig. 29 - Esquemático da ligação dos oito motores de tração D 31
Em função da reconfiguração dos resistores do freio dinâmico, os circuitos de controle e proteção da frenagem
dinâmica também foram revistos e modificados.
Autocarga
Por ser muito utilizada pelo pessoal da manutenção para ajuste dos parâmetros funcionais da locomotiva, a
função autocarga é preservada, mas também com modificações.
Fig. 30 - Ligação com seis motores
Fig. 31 - Ligação com oito motores
Sistema de controle de patinação
Em função da reconfiguração dos motores de tração, os circuitos de controle de patinação de rodas também
foram revistos e modificados.
Simulações
Através de métodos computacionais de Elementos Finitos foram realizados estudos para determinação e
correção de comportamentos indesejáveis da estrutura modificada pelo projeto.
Fig. 33 - Modelamento da estrutura para estudo de Elementos Finitos
Para comprovação da facilidade de inscrição da locomotiva em curvas de raio fechado foram feitas simulações
computacionais e testes de campo.
Fig. 34 - Testes de campo nas condições de curvas fechadas
Conclusões
Dependendo do tipo da ferrovia, uma análise do LCC (Life Cost Cicle) demonstra que as locomotivas SD 40,
mesmo que seja necessária a sua adaptação para a bitola métrica, se mostra uma solução competitiva com a
aquisição de locomotivas novas de prateleira existente no mercado americano.
Curva de esforço de tração
O esforço de tração apresentado pela locomotiva modificada é semelhante ao desenvolvido pela locomotiva
original.
Fig. 35 – Curvas de Esforço de Tração x Velocidade
Curva de esforço de frenagem dinâmica
O esforço de frenagem apresentado pela locomotiva modificada é menor que o desenvolvido pela locomotiva
original, mas suficiente para a categoria de serviço da ferrovia.
Fig. 36 – Curvas de Esforço de Frenagem x Velocidade

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