Editorial - LBS Advogados

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Editorial - LBS Advogados
Editorial
Na época da Copa 2014, o documentário “Complexo de Vira-Latas” (Leandro Caproni, 2013) foi muito
difundido por tratar do sentimento de inferioridade, derrotismo e pessimismo que acompanha a
sociedade brasileira desde sempre e que estava particularmente exacerbado com a proximidade
do Mundial. Vários meses se passaram e o tal complexo parece ter aumentado estratosfericamente
diante da realidade paradoxal e chocante. Nosso Informativo tem procurado acompanhar e analisar
a onda avassaladora que percorre o Brasil e, na medida do possível, fomentar reflexão. Neste número,
mantemos o foco nos temas que estão na ordem do dia do movimento sindical brasileiro, destacando
- Tema do Momento - os desdobramentos da polêmica sobre a contribuição sindical no Congresso e
na Justiça; - Legislativo em Foco - a tramitação e o conteúdo do Projeto de Lei que trata do Estatuto
Jurídico das Estatais; e - Por Dentro do Judiciário - a sistemática do instituto da Repercussão Geral
do Supremo Tribunal Federal, que disciplina não só a uniformização do entendimento do Tribunal,
como também o procedimento decisório de casos que repercutem nacionalmente. A novidade está
no esforço em retratar que essa onda não é exclusividade tupiniquim nem é fenômeno recente.
Pelo contrário, a crise financeira que assola o mundo tem reavivado polêmicas sobre o sistema
econômico, distribuição de renda, retrocesso em direitos sociais, participação e democracia. Para
isso, - Reflexão & Crítica - reproduzimos uma série de artigos sobre os riscos da automação do
trabalho, o direito de greve na Grã-Bretanha e um estudo elaborado por economistas do FMI a
respeito de sindicalização e renda. Para fechar com chave de ouro, - Cultura - trazemos a sinopse
do filme alemão “A Onda” (2008), que problematiza os momentos/movimentos totalizantes, como
foram os regimes autoritários do século passado. Tudo isso para quê? Para lembrar que estamos
longe de ser os patinhos feios da humanidade e que a conjuntura mundial exige uma pronta reação,
exige uma contra-onda!
Fernanda Giorgi & Antonio Megale
Tema do Momento
Contribuição Sindical pode ser restrita a associados
O Deputado Laércio Oliveira (SD/SE) apresentou parecer, na Comissão de Trabalho, de Administração
e Serviço Público (CTASP), ao PL nº 6.706/2009, do Senador Paulo Paim (PT/RS), que entre outros
temas altera a forma de contribuição sindical. O relator recomendou a rejeição do PL nº 6.706/2009
e a aprovação dos projetos PL nº 6.708/2009 e PL nº 1.689/2011, apensados, que dispõem sobre a
Contribuição Assistencial e o recolhimento da Contribuição Sindical por empresas, respectivamente. O
texto acresce o artigo 610-A à Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) para regulamentar a Contribuição
Assistencial de trabalhadores e servidores públicos.
De acordo com o projeto, a Contribuição Assistencial seria recolhida de forma compulsória apenas dos
trabalhadores e servidores sindicalizados membros da categoria profissional. A mesma sistemática se
aplicaria aos integrantes de categorias econômicas ou profissões liberais sindicalizados.
A Contribuição Assistencial seria destinada ao financiamento das negociações coletivas e outras
atividades sindicais e o percentual a ser recolhido, bem como o rateio entre as entidades sindicais,
seriam definidos em Assembleia Geral. Este percentual não poderia ser maior que 1% da remuneração
bruta anual do trabalhador. As mesmas regras valeriam para os servidores públicos da União, Estados,
Distrito Federal e Municípios, da administração pública direta, autarquias e fundações públicas.
Para os trabalhadores autônomos e profissionais liberais, organizados em firmas ou empresas de capital
social registrado, a Contribuição Assistencial não poderia ser superior a 0,8% do valor do capital social
da empresa ou unidade econômica registrado nas respectivas juntas comerciais ou órgãos equivalentes
Após votação na CTASP, a matéria seguirá para análise de mérito e adequação financeira e orçamentária
pela Comissão de Finanças e Tributação (CFT).
(Fonte: DIAP – Deputado Laércio Oliveira apresenta parecer sobre contribuição sindical)
De volta ao STF: reconhecimento das Centrais e repasse do imposto sindical
A Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4.067, que questiona a constitucionalidade da Lei nº
11.648/08, a denominada “Lei das Centrais”, que reconheceu formalmente as centrais sindicais
e redistribuiu os recursos do imposto sindical, voltou a ser julgada no dia 26 de novembro, pelo
Plenário do Supremo Tribunal Federal.
A ADI, impetrada pelo partido Democratas (DEM), em 2008, argumenta que é vedada a utilização dos
recursos advindos da contribuição sindical para entidades que extrapolam os limites da respectiva
categoria profissional. O processo estava com vistas ao Ministro Roberto Barroso desde 2013 e foi
devolvido para julgamento em 21 de setembro.
Já haviam votado pelo não recebimento do imposto sindical e ajuste em outros dispositivos os
Ministros Joaquim Barbosa, relator, Ricardo Lewandowski e César Peluso. Pelo recebimento
do imposto sindical, votaram os Ministros Eros Grau, Carmen Lúcia e Marco Aurélio, que abriu a
divergência do voto do relator. Hoje, votaram o Ministro Luís Roberto Barroso e a Ministra Rosa
Weber.
O Ministro, no início de seu voto, resumiu as questões do processo: as centrais sindicais podem
participar de reuniões de interesse dos trabalhadores ao lado de sindicatos e confederações? Parte
da contribuição sindical pode ser repassada a elas? Em seu entendimento, é inegável que as centrais
representam sim os trabalhadores e é legítima a destinação das contribuições. A Constituição, em
nenhum dispositivo, estabelece que tais contribuições devam ser destinadas apenas aos sindicatos
e a outras entidades do sistema sindical brasileiro. O Ministro citou, ainda, precedente da própria
Corte no qual se reconheceu, bem antes do advento da Lei das Centrais, a constitucionalidade do
repasse de 20% das contribuições sindicais para a conta do FAT. Nas palavras dele, não é coerente
reconhecer a importância e representatividade das centrais e, de outro lado, negar-lhe recursos.
A Ministra Rosa Weber acompanhou o Ministro e, na sequência, após citar polêmico veto a dispositivo
da lei que obrigava a prestação de contas das centrais ao TCU e por serem as quantias vultosas, o
Ministro Gilmar Mendes pediu vista do processo. O pedido de vista serve para o ministro examinar
melhor o processo antes de votar e, segundo o Regimento Interno do STF, o processo deve ser
devolvido após duas sessões do Plenário, o que não ocorre na maioria dos casos.
Falta votar, ainda, além de Gilmar Mendes, o Ministro Celso de Mello. É impedido o Ministro Dias
Toffoli por ter atuado na ação como Advogado-Geral da União. O Ministro Luiz Fux não votará, já que
sucedeu Eros Grau, assim como o Ministro Luiz Edson Fachin, que sucedeu Joaquim Barbosa, e Teori
Zavascki, por suceder Peluso.
Reflexão & Crítica
A ascensão das máquinas
Philip Jennings1
Em 1913, Henry Ford implantou a primeira linha de montagem para produzir em massa seu inovador
automóvel Modelo T. Um pouco mais de um século depois, outro Ford está alertando que a automação
pode trazer uma crise de desemprego de uma forma que o mundo nunca viu.
A ironia me ocorreu quando li que o Financial
Times premiou o Rise of the Robots, de Martin
Ford, como o livro do ano. O livro traz uma
visão detalhada e, muitas vezes, perturbadora
sobre o futuro do trabalho. É frustrante
para um sindicalista ver que o alerta de um
empreendedor do Vale do Silício como Martin
chame a atenção do mundo dos negócios
repetindo o que estamos dizendo há muitos
anos, mas é positivo que os empregos estejam
de volta à agenda.
Hoje, os serviços estão sentindo os efeitos de máquinas cognitivamente avançadas que substituem os
trabalhadores humanos - auto-serviço, serviços bancários on-line e o e-commerce são alguns exemplos -,
mas tudo isso pode tornar-se insignificante quando uma revolução na automação atingir os nossos locais
de trabalho nas próximas duas décadas e o livro de Ford dá alguns exemplos do que podemos esperar.
A introdução do sistema de robótica KIVA nos armazéns da Amazon por Jeff Bezos faz com que robôs
localizem itens no depósito e levem para um humano embalar. Em São Francisco, uma empresa se lançou
no mercado com uma produção automatizada de 360 mil hambúrgueres por hora. São mais de 4 milhões
de pessoas ameaçadas na indústria de fast-food dos EUA. O McDonald’s é o terceiro maior empregador
do país.
A humilde máquina de venda automática foi modernizada e é capaz, hoje, de vender sofisticados iPhones
e iPads. E os bem remunerados empregos financeiros de Wall Street também estão ameaçados. De
acordo com o The Guardian, desde 2000, o número de trabalhadores nas mesas caiu em 50 mil - cerca de
um terço - em função de programas de negociação sofisticados que completam 100.000 transações em
um décimo de segundo.
O físico Stephen Hawking advertiu que, se os proprietários das máquinas do futuro tiverem sucesso em
sua luta contra uma distribuição mais justa da riqueza, a maioria das pessoas vai acabar miseravelmente
pobre e a nova tecnologia irá tornar cada vez maior o fosso entre ricos e pobres.
1 Philip Jennings é secretário-geral da UNI, Sindicato Global que representa os setores de serviços. Fizemos uma tradução resumida deste
artigo publicado pelo Huffington Post. O artigo de Jennings pode ser encontrado, na íntegra, na página da UNI (http://www.uniglobalunion.
org/news/rise-machines-robots-and-new-world-work). Jennings abrirá o Fórum de Políticas da OCDE sobre o Futuro do Trabalho em Paris em
14-15 de janeiro 2016.
Na WorldPost Future of Work Conference – Conferência do Trabalho no Futuro, no início deste ano,
eu disse que precisávamos de uma nova rede de segurança social, com garantias de renda básica.
Precisamos ir mais longe. Temos de aumentar a participação dos salários na riqueza produzida, buscar
garantias de salário digno, igualdade salarial de gênero e limites de pagamento dos administradores.
Podemos criar milhões de empregos com isso. Se tornarmos verde nossas economias, podemos criar
ainda mais milhões de empregos.
Em uma visita à fábrica da Ford na década de 1910, o então presidente do sindicato de trabalhadores
automotivos, Walter Reuther, foi provocado por um funcionário da empresa que apontou para as
máquinas automáticas e perguntou: “Como você vai recolher contribuição sindical desses caras?”. A
resposta de Reuther sintetiza o dilema escancarado no livro de Martin Ford: “Como você conseguirá que
eles comprem os carros da Ford?”.
Restrições ao direito de greve na Grã-Bretanha
A onda antissindical alastra-se pelo mundo e, na Europa, os trabalhadores no Reino Unido encontram-se
sob ameaça de uma lei conservadora.
“Os projetos de lei anti-greve apresentadas
pelos conservadores são um insulto à Carta
Magna e uma ameaça à segurança pública”,
declarou Frances O’Grady, secretária-geral do
TUC, em recente discurso aos seus associados
no Congresso dos Sindicatos da Grã-Bretanha.
O’Grady referia-se à Trade Union Bill - proposta
de lei enviada ao Parlamento no começo de
novembro com sérias restrições aos direitos
sindicais.
Para ela é inaceitável que o governo “Tory” (grupo político baseado no tradicionalismo e conservadorismo),
em um ano em que a pioneira constituição inglesa completa 800 anos, proponha uma lei para dificultar a
realização de greves, restringir os piquetes e o uso dos fundos financeiros sindicais.
O governo Thatcher nos anos 80 conseguiu a aprovação de leis bastante restritivas à ação sindical,
especialmente para a realização de greves. Os governos que se seguiram conseguiram manter vigentes
essas restrições, e mesmo o Novo Trabalhismo de Toni Blair não fez qualquer esforço para mudar essa
situação.
As leis que limitam a ação sindical na Grã-Bretanha são ainda mais restritivas do que as leis neoliberais
vigentes nos Estados Unidos. Nos 30 anos seguintes a Thatcher, decisões judiciais tornaram praticamente
impossível a realização de greves, já que sua deflagração dependia da observância de um procedimento
intricado sob pena de ser declarada ilegal: as greves, decididas em votação, poderiam ser maculadas
por qualquer erro ocorrido no envio pelo correio das cédulas de voto aos associados (de endereço, de
destinatário etc.), por exemplo. Apesar disso, em setores restritos, houve várias greves que desafiaram
a legislação nesse período.
Os projetos encampados pelos conservadores acrescentam mais restrições ao direito de greve e à
negociação coletiva. O Conselho Executivo da UNI, Sindicato Global, repudiou a proposta como uma
“tentativa mal-intencionada para restringir a oposição democrática, política e sindical ao seu programa
de austeridade”.
A nova legislação, que diante da composição atual do Parlamento britânico tem grande chance de ser
aprovada, quer tornar ainda mais difícil a realização das greves. Na apuração dos votos, a abstenção será
considerada um voto contrário e a aprovação da greve deverá contar com mais de 50% dos votos. As
cédulas de votação continuaram a ser enviadas pelo correio, apesar do grande avanço nas tecnologias
de comunicação (a proposta inicial, aliás, pretendia tornar ilegal o uso das novas mídias sociais para
propaganda da greve!).
O projeto propõe, ainda, restringir a utilização dos fundos sindicais para manter os sindicatos e as greves,
exigindo para sua utilização a aprovação individual dos associados, “a cada cinco anos”. E as mensalidades
associativas não poderão ser descontadas nas folhas de pagamento.
Os patrões poderão contratar trabalhadores temporários para substituir os grevistas. E os piquetes
diante dos locais de trabalho serão tratados como “uma presunção de intenção criminosa”. Os piqueteiros
deverão registrar seus nomes na polícia, usar faixas identificadoras e apresentar permissões para
estarem nos piquetes (permissões que seriam emitidas apenas para seis pessoas). Seria cômico, se não
fosse sinistro!
Os sindicatos britânicos têm resistido às inúmeras restrições que lhes foram impostas ao longo da
história e agora não será diferente. Aparentemente, haverá retrocesso na cena sindical britânica, com os
trabalhadores voltando aos primeiros tempos da revolução industrial e às greves selvagens.
Sindicalização e distribuição de renda
Um estudo recente de duas economistas do Fundo Monetário Internacional – FMI (!) liga o aumento da
desigualdade na distribuição da riqueza ao declínio da sindicalização (para acessar um resumo do estudo
clique aqui: El poder desde el pueblo.
Florence Jaumotte e Carolina Osorio Buitron inovam na análise desse fenômeno que vem acontecendo
nas economias avançadas desde os anos 80 e que, no Brasil, voltou a ocorrer nos últimos anos depois
do período de declínio da desigualdade. As explicações tradicionais para a questão se apoiam em
fatores objetivos como mudanças tecnológicas, qualificação profissional e globalização. Segundo o
estudo, porém, há fortes evidências de que a menor sindicalização está associada à perda do poder de
participação nas decisões da empresa e, por consequência, a um aumento da remuneração das cúpulas
empresariais e acionistas nas economias avançadas durante o período de 1980-2010 (veja o Gráfico
abaixo).
Efetivamente, as relações entre sindicatos/salário-mínimo e distribuição de rendimentos na base da
pirâmide de renda (partes inferior e média) não se limitam à dispersão de salários, ao desemprego e à
redistribuição. A debilidade do poder de barganha dos sindicatos repercute no declínio da negociação
coletiva e, consequentemente, a falta de incrementos salariais para os trabalhadores abre espaço para
uma concentração de renda ainda maior entre diretores, patrões e acionistas.
Embora não se tenha claro quais são as repercussões do aumento da desigualdade sobre a sociedade,
o estudo evidencia que esse quadro pode favorecer a manipulação do sistema econômico e político
pelos grupos sociais cada vez mais abastados. O que, de acordo com as autoras, justificaria a adoção
de reformas na gestão corporativa das empresas de modo a garantir a efetiva participação de todos
os atores sociais (empregados, diretores e acionistas) na tomada de decisões na empresa (e, portanto,
responsabilidade) e, também, a reafirmação de normas trabalhistas que permitam a negociação coletiva.
Para as autoras, a pesquisa econômica mostra que a sindicalização e os
salários-mínimos são geralmente pensados para reduzir a desigualdade,
ajudando equalizar a distribuição de renda.
Aos economistas que acreditam que sindicatos fortes podem reduzir a
desigualdade e, ao mesmo tempo, gerar desemprego por manter os salários
acima dos níveis “de equilíbrio de mercado”, elas respondem que a pesquisa
econômica não corrobora essa tese. Como exemplo, citam uma publicação
da Organização para a Cooperação Econômica e Desenvolvimento que reviu
17 estudos e encontrou em apenas 3 uma forte relação entre a densidade
sindical (ou cobertura da negociação) e o aumento do desemprego global.
Legislativo em Foco
O Estatuto das Estatais em debate no Congresso Nacional
Recente estudo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aponta as
diferenças no papel das empresas estatais nas estratégias de desenvolvimento em alguns dos países
membros do BRICS (Brasil, Índia, China e África do Sul). Países com níveis mais baixos de desenvolvimento
utilizam as estatais como importante fator para o alcance de políticas de industrialização, enquanto nas
economias mais desenvolvidas ocorre maior equilíbrio no papel dos setores público e privado. No Brasil,
historicamente, as estatais tiveram importante papel no processo de industrialização do país e ainda
têm importante peso, seja como instrumentos para a concretização de políticas públicas em áreas como
habitação, crédito e financiamento do desenvolvimento, ou como no desenvolvimento tecnológico, na
provisão de serviços públicos e infraestrutura.1
Na década de 90, na onda privatizante, 122 empresas estatais foram vendidas no Brasil, destacando-se a
Companhia Vale do Rio Doce, uma das maiores produtoras e exportadoras de minérios do mundo e maior
empresa do setor mineral do país (que foi vendida por apenas USD $ 5,4 bilhões). Até 2002 havia sido
arrecadados cerca de USD $105,8 bilhões com as privatizações (em um processo amplamente questionado,
no qual houve condições privilegiadas e incentivos proporcionados pelo Governo para a sua aquisição por
empresários nacionais e mesmo estrangeiros).
Atualmente, existem 150 empresas estatais federais, em setores essenciais como petróleo, energia,
comunicações, gestão de portos e aeroportos, financeiro, saúde, tecnologia agrícola, abastecimento
1 SANTOS, Luiz Alberto e UEMA, Jean Keiji. O Estatuto das Estatais frente ao Congresso Nacional: algumas considerações. Congresso
em Foco, 13/06/2015.
e armazenamento, transporte ferroviário, indústria, defesa, entre outros. No total são mais de 550 mil
empregados permanentes e outros 310.000 empregados temporários ou terceirizados. E ainda há outras
empresas em que estatais detêm participações acionárias relevantes.
A Constituição de 1988 estabeleceu que somente por lei específica pode ser constituída empresa pública
ou sociedade de economia mista, ou autorizada a criação de subsidiárias. A Emenda Constitucional nº 19, de
1998, passou a exigir que seja estabelecido, por lei, um estatuto jurídico próprio para as empresas estatais
que exploram atividades econômicas de produção ou comercialização de bens ou serviços.
Aos 2 de junho de 2015, foi criada, pelas Presidências da Câmara e do Senado, uma comissão mista para
elaborar projeto da Lei de Responsabilidade das Estatais, que resultou no PLS nº 555/15, que dispõe sobre
o estatuto jurídico, o regime societário e a função social da empresa pública e da sociedade de economia
mista. Estabelece as disposições aplicáveis a esses entes e suas subsidiárias que explorem atividade
econômica de produção ou comercialização de bens ou prestação de serviços, no que tange às licitações,
aos contratos e às formas de fiscalização do Estado e da sociedade. O projeto deriva de uma proposta
conjunta dos Presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara dos Deputados, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ) e está tramitando em regime de urgência e aguarda votação no Plenário do Senado,
tendo como relator o Senador Tasso Jereissati (PSDB/CE).
Sob pretexto da transparência na condução das estatais, o projeto traz em suas normas gerais a
determinação de que empresa pública e sociedade de economia mista serão constituídas sob a forma de
sociedade anônima. A mudança abrangerá toda e qualquer empresa pública e sociedade de economia mista,
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, inclusive as que exploram atividade econômica
em sentido estrito, as que prestam serviços públicos e as que exploram atividade econômica sujeita ao
regime de monopólio da União.
O projeto prevê, ainda, que o Conselho Administrativo das estatais deve ter a presença de 20% de
conselheiros “independentes”. Porém, o texto não explica o significado do conceito, abrindo espaço,
portanto, para interpretações subjetivas.
A organização jurídica e administrativa das empresas públicas também é tema de dois projetos que
tramitam no Senado, mas ainda não chegaram a Plenário. O PLS nº 238/09 e o PLS nº 420/14 estão na
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Sindicalistas fazem campanha contra o Estatuto das Estatais
No dia 22 de setembro passado, a Comissão de Direitos Humanos (CDH), presidida pelo Senador Paulo Paim
(PT-RS), reuniu líderes sindicais de empresas como Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal,
defendendo amplo debate com a sociedade antes de aprovar uma proposta que, segundo eles, representa
a possibilidade concreta de privatização e perda de controle estatal sobre empresas públicas. Ao final do
debate, o Senador Paim (PT-RS), que presidiu o debate, chegou a apelar para que o projeto não seja votado
apressadamente.
A crítica se concentra, basicamente, na possibilidade de abertura de capital e disponibilização de pelo
menos 25% das ações no mercado. Com isso, alegam, estaria descaracterizado o papel social e público
dessas instituições. “O papel de um banco público, por exemplo, é financiar projetos sociais e agricultura
familiar a juros mais convidativos, enquanto que o de um banco privado visa o lucro”, explicou Juliana Donato,
representante dos funcionários do Banco do Brasil.
(Fontes: DIAP, FUP, Senado)
Por dentro do Judiciário
A repercussão geral no Supremo Tribunal Federal
Recentemente, foi lançada a obra A repercussão geral no Supremo Tribunal Federal,
de autoria de Damares Medina. O livro advém da tese de doutorado da advogada e
aborda o comportamento decisório do Supremo Tribunal Federal, com análise de todos
os temas de repercussão geral julgados até 2013. A ideia da autora foi compreender o
instituto da repercussão geral e o seu impacto no acesso à jurisdição constitucional.
Aproveitando o mote do lançamento que contribui significativamente para entendermos o funcionamento
do STF, o Informativo Sindical, nesta edição, explica ao leitor qual a importância desse instituto para os
temas trabalhistas e sindicais.
A repercussão geral é, na verdade, instrumento processual inserido pela chamada Reforma do Judiciário,
advinda com a Emenda Constitucional nº 45, de 2004, e funciona como uma espécie de filtro dos temas que
serão julgados pela Corte Constitucional brasileira. Assim, somente serão julgados os recursos que tratam
de questões com relevância social, política, econômica ou jurídica, as quais ultrapassam os interesses das
partes envolvidas. Em outras palavras, o processamento dos recursos extraordinários ficou condicionado
ao reconhecimento de que a questão constitucional levantada pela parte tem repercussão geral, inclusive
quando o caso concreto verse sobre matéria penal. O principal objetivo desse instituto é, portanto,
uniformizar o entendimento adotado pelo Tribunal ao interpretar a Constituição, sem que para isso seja
necessário o exame de numerosos casos idênticos.
No site do STF, é possível consultar listas com os temas de repercussão geral, atualizados até o dia 23/11/15,
basta clicar em: Repercussão Geral – Estatísticas e relatórios.
Podemos relembrar o julgamento de alguns processos com repercussão geral relevantes para os
trabalhadores, como o Recurso Extraordinário nº 658.312, que reconheceu a constitucionalidade do artigo
384 da Consolidação das Leis do Trabalho, o qual prevê intervalo de 15 minutos para as trabalhadoras em
caso de prorrogação da jornada de trabalho antes do início das horas extras. A decisão de 2014, contudo, foi
anulada e aguarda inclusão na pauta do Tribunal para novo julgamento.
Outro caso que merece destaque é o Recurso Extraordinário nº 590.415, que admitiu, nos casos de planos
de dispensa incentivada (PDIs), a validade de cláusula que dá quitação ampla e irrestrita de todas as
parcelas decorrentes do contrato de emprego, desde que este item conste de acordo coletivo de trabalho
e dos demais instrumentos assinados pelo empregado. A decisão tem significativa influência no mundo do
trabalho, já que retoma novamente a prevalência do negociado sobre o legislado.
Para o ano de 2016, destacamos alguns processos que poderão ser julgados:
ARE nº 679.137: trata da exigência de comum acordo para instauração de dissídio coletivo. A exigência de
acordo prestigia a liberdade sindical e estimula a negociação coletiva.
RE nº 760.931: responsabilidade subsidiária da Administração Pública em casos de terceirização.
ARE nº 713.211: Recurso extraordinário em que se discute, à luz dos arts. 2º, 5º, II, XXXVI, LIV e LV e 97 da
Constituição federal, a licitude da contratação de mão de obra terceirizada, para prestação de serviços
relacionados com a atividade-fim da empresa tomadora de serviços, haja vista o que dispõe a Súmula 331
do Tribunal Superior do Trabalho e o alcance da liberdade de contratar na esfera trabalhista.
Cultura Sindical
A onda
A dica cultural deste mês é o filme alemão A onda (Die Welle, 2008),
baseado em fatos reais ocorridos em 1967, em uma escola de ensino médio
na cidade de Palo Alto, na Califórnia. Lá, o professor de História Ron Jones
fez o experimento abordado no filme e, a partir de sua vivência, escreveu
um ensaio intitulado A Terceira Onda (The Third Wave). Ele impôs uma
ambientação do nazismo em sua classe, com todos os padrões do partido
nazista. O projeto durou uma semana e causou diversos problemas. Anos
depois, baseado nessa história, o autor Todd Strasser, sob o pseudônimo
Morton Rhue, escreveu o livro de ficção A Onda, no qual o filme se baseia.
Uma primeira versão estreou na televisão norte-americana em 1981, mas a
refilmagem alemã é mais longa, elaborada e atual. O professor Ron Jones
colaborou com o diretor Dennis Gansel para a realização do longa-metragem.
A história é protagonizada pelo professor Rainer Wenger, que, devido a um atraso, fica responsável por
ensinar sobre autocracia, e não sobre anarquia, como preferia lecionar, em uma semana de um projeto
tradicional da escola, na qual cada professor aborda um tipo de governo. Na primeira aula, ao explicar como
o povo alemão aceitou o nazismo, ele se surpreende com os alunos ao afirmarem que seria impossível
um regime autoritário vingar nos dias atuais. Percebendo que a maioria da turma estava desmotivada, o
professor dá um intervalo e, quando os alunos voltam, a disposição dos lugares na sala já está diferente. Ele
propõe uma experiência autoritária com a classe, e os alunos aceitam.
O professor vai desenvolvendo na prática os conceitos de uma autocracia: presença de um líder,
personificada no próprio professor; um único gesto de saudação; disciplina, todos os alunos precisam de
autorização para falar e o chamam de Herr Wenger (Senhor Wenger); e unidade, os estudantes criam um
uniforme, um símbolo e um nome para o grupo – A onda. Os estudantes também marcham em perfeita
sincronia, passam a se sentir parte de uma única entidade e se tornam violentos com aqueles que não fazem
parte do movimento. Para disseminar a ideologia, também recorrem às novas tecnologias.
Tudo ocorre de forma muito natural, sem discussões, e o projeto é apoiado pelos pais e pela escola. Ao
mesmo tempo, a história mostra os desarranjos familiares e a carência dos jovens. Ao longo do curso, o
experimento foge ao controle do professor, que, curiosamente, inicialmente de ideologia anarquista, passa
a gostar de ser admirado como um líder carismático. O final do filme surpreende.
A narrativa traz discussões sobre os limites entre pensamentos autoritários e libertários,
fundamentalismo, racismo, aversão aos imigrantes, manipulação por parte da mídia e redes sociais,
dominação de massas, falta de objetivos e ideais dos jovens, alienação política. Assuntos que estão
na ordem do dia da sociedade contemporânea e que tem tudo a ver com a “onda” na qual o Brasil vem
surfando!
Para assistir ao trailer, clique em A onda.
Expediente
Coordenadores: José Eymard Loguercio e Fernanda Caldas Giorgi
Editora: Maria Sílvia Portela de Castro
Redatores: Antonio Carlos Castro e Antonio Fernando Megale Lopes
Arte: AT2D
Tecnologia: Vagner Cuccino
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Edição fechada em 3 de dezembro de 2015.
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