Livro Bioclimatologia Zootécnica
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Livro Bioclimatologia Zootécnica
Leonardo Susumu Takahashi Jaqueline Dalbello Biller Karina Manami Takahashi BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 1ª Edição Jaboticabal 2009 © 2009 - Todos os direitos reservados Leonardo Susumu Takahashi Jaqueline Dalbello Biller Karina Manami Takahashi Diagramação e capa: Renato Trizolio T136b Takahashi, Leonardo Susumu Bioclimatologia zootécnica / Leonardo Susumu Takahashi, Jaqueline Dalbello Biller, Karina Manami Takahashi. -- Jaboticabal : 2009. 91 p. ; il. ; 21 cm Inclui bibliografia ISBN: 1. Bioclimatologia. 2. Termorregulação. 3. Adaptação e evolução. I. Biller, Jaqueline Dalbello. II. Takahashi, Karina Manami. III. Título. CDU 591.54 Ficha catalográfica elaborada pela Seção Técnica de Aquisição e Tratamento da Informação - Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação - Unesp, Câmpus de Jaboticabal. Não é permitida a reprodução total ou parcial desta obra sem a autorização expressa dos editores. APRESENTAÇÃO Leonardo Susumu Takahashi: Engenheiro Agrônomo (ESALQUSP, 2001), Mestre em Zootecnia (FCAVJ-UNESP, 2003), Doutor em Zootecnia (FCAVJ-UNESP, 2007), Pós-Doutorando (FCAVJ-UNESP, 2008-2009), atualmente docente da Faculdade de Zootecnia – Campus Experimental de Dracena – UNESP. Jaqueline Dalbello Biller: Médica Veterinária (FCAVJ-UNESP, 2005), Mestre em Zootecnia (FCAVJ-UNESP, 2008), Doutoranda em Zootecnia (FCAVJ-UNESP). Karina Manami Takahashi: Engenheira Agrônoma (FCAVJUNESP, 1998), Mestre em Agronomia (FCAVJ-UNESP, 2001), Doutora em Entomologia Agrícola (ESALQ-USP, 2005), Pós-Doutorada em Entomologia (ESALQ-USP, 2007). AGRADECIMENTOS A Deus, pelas nossas vidas e luz e proteção em todos os momentos. Agradecemos especialmente ao emérito Docente e Pesquisador Prof. Dr. Roberto Gomes da Silva, pelos ensinamentos e vasto material científico, sendo que alguns dados estão aqui apresentados para enriquecer este trabalho, sem os quais não teria nenhum respaldo. Aos demais ilustres pesquisadores que divulgaram seus trabalhos na área, que também serviram para enriquecer este trabalho. À direção, aos colegas e acadêmicos do Curso de Zootecnia do Campus Experimental de Dracena – UNESP, pelo apoio e estímulo nesta luta em prol da Zootecnia Brasileira. Aos nossos pais, pela realização pessoal de cada um de nós, pelo apoio em todas as horas e também pela participação em nossos momentos de alegria. Os autores SUMÁRIO I. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA BIOCLIMATOLOGIA .................. 1 II. O MEIO AMBIENTE E ESTUDOS CORRELATOS ........................ 1. Generalidades ................................................................................ 2. Principais ciências que estudam o ambiente ................................. 3. Elementos e fatores que atuam no meio ambiente ........................ 3 3 5 8 III. CONFORTO TÉRMICO .............................................................. 1. Generalidades .............................................................................. 2. Calor corpóreo ............................................................................. 3. Radiação solar e suas implicações .............................................. 4. Sombreamento e radiação ........................................................... 5. Radiação refletida e emitida pelo Sol ........................................... 6. Determinação do estresse causado pela radiação ...................... 7. Índices ambientais ....................................................................... 13 13 14 14 18 19 20 21 IV. TERMORREGULAÇÃO .............................................................. 1. Generalidades .............................................................................. 2. Mecanismos de transferência de energia térmica ........................ 3. Regulação da temperatura corporal ............................................. 24 24 25 29 V. EFEITO DO ESTRESSE TÉRMICO E TERMORREGULAÇÃO ESPECÍFICA DOS ANIMAIS....................................................... 1. Generalidades .............................................................................. 2. Efeito do estresse térmico e termorregulação em aves ............... 3. Efeito do estresse térmico e termorregulação de bovinos ........... 4. Efeitos do estresse térmico e termorregulação em suínos .......... 5. Efeito do estresse térmico e termorregulação em outros animais ......................................................................................... 33 33 35 40 44 46 VI. ADAPTAÇÃO E EVOLUÇÃO DOS ANIMAIS ............................. 1. Generalidades .............................................................................. 2. Noções gerais da adaptação e evolução dos animais ................. 3. Aspectos morfológicos e fisiológicos preponderantes na adaptação dos animais ................................................................ 4. Adaptação e evolução por espécies ............................................ 48 48 49 50 61 VII. ATUAÇÃO DO HOMEM NO BEM-ESTAR DOS ANIMAIS ........ 1. Generalidades .............................................................................. 2. Estratégias de alimentação e conforto térmico ............................ 3. Atuação do homem no bem-estar das aves ................................. 4. Atuação do homem no bem estar dos bovinos ............................ 5. Atuação do homem no bem estar de suínos ................................ 67 67 68 69 74 78 VIII. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ................................................ 84 APÊNDICE ....................................................................................... 91 LISTA DE FIGURAS Figura 1. Fontes de radiação térmica sobre o animal. Pode ser observada a radiação solar de ondas curtas (a); radiação de ondas curtas refletidas pelas nuvens (b); radiação de ondas longas emitidas pelo Sol e refletidas nas nuvens (c); radiação celeste de ondas curtas (d); radiação de ondas longas emitidas por corpos e objetos vizinhos (e); radiação de ondas longas emitidas pelo solo (f) e radiação de ondas curtas refletidas na superfície do solo (g) (SILVA, 2000) .......................................... 17 Figura 2. Carga de energia recebida pelo animal ao sol (70 cal/ HS/cm²) e à sombra ................................................................... 18 Figura 3. Esquema do controle da temperatura corporal (MULLER, 1982) .......................................................................................... 23 Figura 4. Representação esquemática da troca de calor de um ovino (CUNNINGHAM, 2004). ................................................... 25 Figura 5. Esquema de transferência de calor (CUNNINGHAM, 2004). ......................................................................................... 27 Figura 6. Representação esquemática simplificada do processo de termorregulação (SILVA, 2000 .............................................. 28 Figura 7. Esquema da superfície cutânea. ...................................... 44 Figura 8. Camadas da epiderme (SILVA, 2000). ............................. 46 Figura 9. Esquema da melanogênese (SILVA, 2000). .................... 46 Figura 10. Representação esquemática de um melanócito inserido entre células da camada basal da epiderme (SILVA, 2000) ...... 46 Figura 11. Formação dos grânulos de melanina nos melanócitos (SILVA, 2000). ............................................................................ 46 Figura 12. Folículo secundário de ovino (A) e folículo piloso primário (B) (SILVA, 2000). ........................................................ 47 Figura 13. Folículo piloso (MULLER, 1982). ................................... 48 Figura 14. Localização da glândula sudorípara do tipo écrina (MULLER, 1982). ....................................................................... 49 Figura 15. Localização da glândula sudorípara do tipo apócrina (MULLER, 1982). ....................................................................... 50 PREFÁCIO Ainda na primeira década do século XXI, deparamo-nos com artigos assustadores, que no primeiro momento nos chocam e parecem até exagero, mas fatos comprovados não deixam dúvidas. Citamos aqui apenas alguns deles: “O mundo está derretendo”, afirmando que, pelas análises de milhares de pesquisas avaliando o aquecimento global, concluiu-se que a sobrevivência do planeta está em alerta vermelho e que somos culpados por isso; ou “catástrofe todos os anos”, esclarecendo que o Instituto Federal de Ciência e Tecnologia da Suíça prevê o futuro dominado pelos extremos climáticos (CHARÃO, 2006) ou, ainda, “Satélites comprovam o aquecimento global”, diz a NASA, informando que a temperatura média global aumentou 0,43°C por década, entre os anos 1981 a 1998. Em termos mais conciliadores, Cicerone (2007) publicou um artigo intitulado “Em nome dos nossos filhos” em que o autor não prega o abandono radical dos hábitos modernos o qual induz o aquecimento global, mas conclui que: “quanto mais ações em prol do ambiente tomar hoje, mais opções terão os nossos filhos e netos”. Com muita alegria e renovada esperança, deparamos com o artigo de Marques (2008), na Revista PESQUISA DA FAPESP – 151 (setembro de 2008), com destaque na capa: “Mudanças climáticas – Especialistas de várias áreas se organizam para entender e enfrentar os novos tempos”, quando foram convocados cientistas de várias áreas a participarem do lançamento oficial, no dia 21 de agosto do “Programa FAPESP de pesquisa sobre mudanças climáticas globais”, no qual serão investidos R$ 100 milhões em dez anos, sendo um dos temas: As mudanças climáticas sobre a agricultura e a pecuária. Sem dúvida, é uma grande notícia que nos dá esperança de um futuro melhor, ao constatar que lideranças de renomada e importante instituição estão preocupando se e abrindo a possibilidade de os pesquisadores disporem de recursos para estudar e, quem sabe, encontrar meios de minimizar o efeito catastrófico do aquecimento global. Neste panorama assustador e ao mesmo tempo animador, elaboramos este trabalho de forma simples e didática, com o intuito de oferecer subsídios para aqueles que se interessam pela bioclimatologia zootécnica, com esperança de contribuir não somente para o melhoramento quantitativo e qualitativo da produção animal, visando apenas à lucratividade da criação, mas sobretudo e principalmente visando ao bem-estar dos animais sob nossa responsabilidade. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 1 I. INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA BIOCLIMATOLOGIA Para melhor compreensão da bioclimatologia, é necessária, antes de tudo, a análise detalhada dos fenômenos naturais e dos conceitos destes fenômenos, pois a bioclimatologia nada mais é do que o estudo dos fenômenos naturais do ambiente, influenciando a vida animal e vegetal. Conforme Baccari Jr. (1986), os primeiros passos sobre a bioclimatologia foram dados por Hipócrates, filósofo grego, que há 2.000 anos elaborou o tratado “Ar, água e lugares”, mas estudos nessa área têm evoluído nestes dois mil anos. Algumas definições da bioclimatologia surgiram, tal como a de Baccari Jr (1986), definindo esta ciência como “ramo da climatologia e da ecologia, que trata dos efeitos do ambiente físico sobre os organismos vivos” e também a de Tito (1998), conceituando a bioclimatologia animal como “ciência que busca entender as relações entre elementos climáticos e a fisiologia animal, tendo como perspectiva a superação de barreiras (limitações) impostas pelo meio ambiente sobre a expressão do potencial genético dos animais”. Segundo Silva (2000), a bioclimatologia é “o campo especializado da climatologia que se ocupa das relações entre biosfera e atmosfera, e é também compartilhada com a ecologia”. Então, bioclimatologia animal é a ciência que busca entender as relações existentes entre os elementos climáticos e a fisiologia animal, tendo como meta o bom desempenho animal de acordo com o potencial genético. Segundo Pereira (2005), mudanças climáticas têm causado transtornos biológicos, e todas as regiões vão ser afetadas pelos efeitos negativos do aquecimento global, pelas ações devastadoras provocadas pelo homem ao meio ambiente, penalizando principalmente os países pobres e subdesenvolvidos que têm aumentado a frequência e a intensidade, do que é conhecido como “acontecimentos extremos”. 2 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. Chuvas intensas, inundações, deslizamentos e avalanches ocorridos no final de novembro de 2008, em Santa Catarina, não seriam consequência das alterações do clima provocados pelo homem? E o calor intenso (o efeito estufa) e a falta de chuva no sertão brasileiro, será que algum dia, poderão ser pelo menos atenuados? Tudo isso nos faz lembrar as sábias palavras de Cicerone (2007): “quanto mais ações hoje contra o aquecimento global, melhor para as futuras gerações” ou ainda: “quanto mais ações em prol do ambiente forem tomadas hoje, mais opções terão nossos filhos e netos”. Mas não basta apenas despertar para o problema, são necessárias bases científicas para a solução ou, pelo menos para atenuar os problemas destacados no artigo de Fabrício Marques, na revista Pesquisa – FAPESP nº 151, de setembro de 2008, “Caapiranga, no Amazonas, em outubro de 2005: o lago virou sertão”; “Seca em Manaus e tornado em Florianópolis: eventos extremos”; “Cheia no rio Tocantins invade Marabá: impacto provável no regime de chuvas”; “Poluição em São Paulo: risco de doenças respiratórias podem aumentar”. Esses são alguns fenômenos desastrosos apresentados pelo autor, mas com certeza ocorreram muitos outros. No momento, creio não ser oportuno apenas identificar os culpados e aplicar sanções que, na maioria das vezes, são ineficazes, é necessária a conscientização dos problemas e, como enfatiza Fernando Henrique Cardoso: “o esforço dos cientistas também deve ser direcionado a informar e envolver a sociedade, a fim de que o conhecimento gerado se transforme em ações concretas”, concluindo que: “Sem a pressão da sociedade não há cobranças e as coisas acontecem com mais dificuldades”. Enquanto as soluções para os problemas não aparecem, nós, os pesquisadores na área zootécnica, devemos conhecer melhor as adversidades impostas aos nossos animais, encontrar meios de interferência, de forma que os animais sob nossa responsabilidade, consigam ter melhor produtividade e, sobretudo, contribuir para o bemestar desses animais. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 3 II. O MEIO AMBIENTE E ESTUDOS CORRELATOS 1. GENERALIDADES O ambiente físico é constituído por quatro domínios que trocam energia entre si, sem nenhuma dominância entre eles. São eles: litosfera, hidrosfera, biosfera e atmosfera. Litosfera é a parte externa consolidada da terra, a crosta terrestre ou solo com suas características particulares, com grandes variações na composição de local para local, pela sua origem e estado de transformação ao longo do tempo, desde o regolito, que é solo na sua formação sem atuação de nenhum organismo, até o solo com possibilidade de vida biológica. Hidrosfera como o próprio nome já diz, é o domínio das águas oceânicas e continentais da superfície terrestre. Biosfera é a superfície da litosfera onde se encontram os seres vivos, a porção da terra onde atua o ecossistema, isto é, o solo, a água e o ar biologicamente habitados. Em resumo, todos os seres vivos utilizam, na sua constituição, a água da hidrosfera, o nitrogênio e outras fases da atmosfera e os minerais da litosfera. Atmosfera corresponde a camada que envolve a terra, constituída na sua maior parte por um reduzido número de elementos. Na atmosfera estão os gases “permanentes” ou “não variáveis” cuja concentração na atmosfera é aproximadamente constante (até 90 km de altura), e os “variáveis” representados pelos demais. Os constituintes de ar atmosférico estão apresentados na Tabela 1. A atmosfera terrestre possui uma estrutura vertical extremamente variável quanto a inúmeros aspectos: composição, temperatura, umidade, pressão, movimento, etc. Troposfera é a camada mais baixa da atmosfera que está em contato direto com a superfície da Terra. Tem a espessura de cerca de 18 km nas proximidades do equador, diminuindo para 8 km perto dos 4 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. polos. É bastante instável e é nela que ocorrem os fenômenos meteorológicos mais importantes. Estratosfera estende-se desde os limites superiores da troposfera até cerca de 45 km de altitude, sendo relativamente estável. Apresenta correntes horizontais de ventos fortes, que tendem a dispersar as partículas sólidas e gasosas que invadem esta área. Nesta camada existem poucas nuvens. Mesosfera é a camada que se estende entre 45 e 75 km de altitude. Ionosfera é a camada entre 75 e 400 km de altitude e representa o limite entre a atmosfera e o espaço exterior. Embora nessa grande altitude a concentração de oxigênio seja muito baixa, é nessa camada que se forma o ozônio (O3,) pela ação da radiação ultravioleta. Para fins meteorológicos, porém, é importante saber o que ocorre na troposfera, que é a primeira camada da atmosfera onde ocorre a maioria dos fenômenos meteorológicos. Tabela 1. Constituintes do ar atmosférico. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 5 2. PRINCIPAIS CIÊNCIAS QUE ESTUDAM O AMBIENTE O ambiente é estudado por várias ciências, cada uma atuando em áreas diferentes, para que, em seu conjunto, possamos entender a natureza e com isso, tentar esclarecer as causas, quando houver, e minimizar os efeitos negativos dos fenômenos naturais. E desta maneira preservar a natureza e, ao mesmo tempo, promover o bem- estar dos animais e vegetais. 2.1. Ecologia A ecologia é a ciência que trata das inter-relações entre os seres vivos e o ambiente físico. Dependendo do ser vivo em estudo, a ecologia divide-se em Ecologia Animal, que estuda a relação entre os animais e o meio, Ecologia Vegetal, que estuda a relação entre os vegetais e o meio e Ecologia de Micro-organismos, que estuda a relação entre os microorganismos e o meio. 2.2. Meteorologia Ramo da física que se ocupa dos fenômenos atmosféricos (meteoros). O seu campo de atuação abrange o estudo das condições atmosféricas em dado instante (o “tempo”), dos movimentos atmosféricos e das forças que os originam (dinâmica da atmosfera), do estudo das condições médias e das flutuações temporais da atmosfera em um local (clima), definindo-se as especialidades básicas. 2.3. Climatologia Climatologia estuda o clima e suas características num determinado lugar ou região. O clima é determinado pelos estudos de vários fatores que são denominados de fatores climáticos, que são de 6 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. ordem astronômica, meteorológica e geográfica, por um período médio de 10 a 30 anos. Os elementos climáticos, como temperatura, umidade, precipitação, ventos, radiação, pressões barométricas e ionização, são efeitos ou condições de momentos que derivam dos fatores climáticos mais constantes ou de características locais. Alguns desses fatores, como latitude, altitude, distribuição da terra, da água e contornos dos continentes, são físicos, já as correntes marítimas e vegetação são dependentes intermediários entre fatores físicos e os elementos climáticos. Entre os fatores de ordem meteorológica, podemos citar as massas de ar que podem estagnar num determinado local, influenciando, sobretudo, a temperatura, pelo tempo em que estiverem paradas neste local. Além disto, essas massas podem locomover-se para outras regiões, modificando as características das regiões para onde se movem. De acordo com a latitude da região onde se formam essas massas são denominadas de equatorial, tropical, ártica ou polar ou, ainda, classificando-se de acordo com a área, oceânica ou terrestre, sendo chamadas de marítima ou continental. Outro fato meteorológico é a camada da atmosfera, pois a massa gasosa da Terra é formada de várias camadas que são atravessadas pela radiação solar. Essa intensidade sobre a superfície terrestre modifica-se bastante. O total de energia radiante emitida pelo Sol sobre a Terra tem o seguinte destino: parte é difundida nas camadas atmosféricas e perdida nas nuvens, outra parte é refletida pela atmosfera e perde-se, e, portanto, a energia radiante que chega à superfície terrestre é em torno de 1/3 da energia emitida pelo Sol (SILVA, 2000), e quando existem fatores que favorecem maior incidência de radiação solar na Terra, ocorre maior contribuição para o aquecimento global. Um fator de ordem meteorológica muito importante é o limite de disponibilidade solar para a produção de alimento humano que está diretamente relacionado à produção e utilização de carbono, elemento BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 7 fundamental na formação de vida. Um homem de 70 kg de peso possui 12 kg de carbono na constituição (MULLER, 1982), e para poder então a humanidade manter o consumo de carbono, o homem teria de alimentar-se do seu semelhante. Porém, existe na natureza a fotossíntese, fenômeno biológico em que os vegetais são capazes de transformar a energia radiante em energia química, utilizando o CO2 disponível na atmosfera, incorporando-o no vegetal que alimenta o homem e os animais que também são consumidos pelo homem, o que podemos chamar de conversão de energia solar em alimento humano. Muller (1982) apresenta dados bastante interessantes sobre a superfície do solo necessária para produzir energia alimentícia para o homem em um ano, que são: alga – somente 1 m² seria o suficiente, batata – seriam necessários 600 m², leite – 1.500 m², carne de suíno – 4.000 m², e ovos – 20.000 m². Nos fatores geográficos, o elemento de maior influência é a latitude, pois o Hemisfério Norte apresenta 39,3% de solo e 60,7% de água, o Hemisfério Sul, a terra apresenta apenas 10,1% e a água 89,7%. Portanto, o Hemisfério Norte apresenta menor quantidade de água, fator este que produz influencia o clima de cada região. Caso a Terra fosse fisicamente uniforme, o verão seria mais quente e o inverno mais frio no Hemisfério Sul pela inclinação do eixo da Terra em relação ao Sol. Porém, tal fato não ocorre pela quantidade de água ser maior no Hemisfério Sul, e a energia do Sol é absorvida pela água dos oceanos, ocorrendo o seguinte: a água fria de baixo para cima libera frio, resfriando mais a Terra no verão e no inverno ela libera calor, amenizando o frio no Hemisfério Sul. 2.4. Bioclimatologia Entre as mais variadas definições sobre bioclimatologia, a forma mais simples e ao mesmo tempo mais ampla, é a que define como o estudo da inter-relação entre clima, solo, planta e animais, 8 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. complementado como um ramo da ecologia que estuda as reações e adaptações dos organismos vivos no ambiente em que vivem. Na área zootécnica, em países de clima quente como o nosso, um dos objetivos, senão o principal, é estudar o efeito do estresse térmico pelo excesso de calor sobre o desempenho produtivo e reprodutivo dos animais. Através desse estudo, definem-se o tipo e disposição das instalações e os métodos de manejo, com o objetivo de minimizar o efeito ou proporcionar o conforto térmico. 3. ELEMENTOS E FATORES QUE ATUAM NO MEIO AMBIENTE Elementos não variáveis que caracterizam o estado da atmosfera e os fatores são agentes casuais que condicionam os elementos climáticos, determinando o clima da região. Pois clima, segundo Köeppen, é o somatório das condições atmosféricas que fazem um lugar da superfície ser ou não ser habitável pelos homens, animais e plantas, ou ainda, clima é a interação de fatores meteorológicos que conferem a uma região suas características e sua individualidade (THORNTHWAITE, 1948). Os principais agentes que atuam no ambiente são: Radiação solar: a vida na Terra depende da radiação solar. Segundo Silva (2000), toda energia para os processos físicos e biológicos da superfície terrestre provém do Sol, e muitos aspectos da bioclimatologia envolvem fenômenos de transferência destas energias em sua forma radiante. Apesar da importância fundamental e vital para a biosfera, apenas em torno de 30 % da radiação solar são absorvidos pela Terra. Temperatura do ar: a temperatura é medida de acordo com a quantidade de calor do ar. O calor recebido do Sol a Terra conserva e irradia para a atmosfera, daí a diferença de temperatura entre o dia de temperatura mais alta e a noite de temperatura mais fria. Porém, pelo BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 9 fato da superfície terrestre absorver e irradiar o calor, o início da noite é geralmente mais quente que a madrugada, antes de nascer o Sol. A temperatura do ar sofre influência de vários fatores, como: horário do dia, sendo geralmente observada temperatura mais alta por volta das 15 h e mais fria durante a madrugada, estação do ano, sendo a estação mais fria o inverno e a mais quente o verão, pela distância da Terra e do Sol em sua translocação durante o ano, ocorrendo em altitudes menores temperaturas maiores, isto porque a camada de ar está mais distante da superfície da Terra, que irradia calor, além do ar rarefeito absorver menos calor, latitude, isto é, à medida que nos distanciamos da linha do equador, a temperatura torna-se mais baixa, porque sobre o equador os raios solares incidem perpendicularmente, e à medida que nos afastamos em direção ao pólo, aumenta a inclinação dos raios solares, nebulosidade, pois as nuvens diminuem a dispersão de massas aquecidas para camadas mais altas, por isso as noites estreladas e sem nuvens são sempre mais frias, distribuição das terras e águas, pois a água demora mais para aquecer e também para esfriar que a terra, além de outros fatores, tais como a vegetação, corrente marítima, ventos, chuvas e construção de alvenaria, asfalto, etc. A temperatura é medida por termômetros, que podem diferir de acordo com o elemento sensível (mercúrio, álcool e hidrocarboneto), sendo o mais utilizado o mercúrio, pela sua precisão. Quanto à escala, pode ser em graus centígrados ou em graus Fahrenheit, sendo o mais usual o centígrado, cuja escala vai de 0°C (gelo fundente) a 100 °C (água em ebulição), 0 °C corresponde a 32 °F, e 100 °C corresponde a 212 °F. De acordo com a temperatura durante o ano, segundo Köeppen, as zonas térmicas são divididas da seguinte forma: Zona tropical: pequena variação de temperatura, com calor durante o ano, não menor de 20 °C. Zona subtropical: temperatura acima de 20 °C, de 1 a 8 meses, diferença de temperaturas máximas e mínimas de 7 a 18 °C, de acordo com a altitude e a latitude. 10 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. Zona temperada: temperatura inferior a 20 °C, no mínimo 8 meses ao ano, com estações bem definidas. Zona fria: apenas 4 meses com temperatura acima de 10 °C, sem verão. Zona polar: temperatura abaixo de 10 °C o ano todo. Pressão atmosférica: a pressão atmosférica equivale ao peso de uma coluna de mercúrio com 760 mm de altura e 1 cm² de base ao nível do mar, e é medida geralmente por barômetros de mercúrio, por ser mais exato. A pressão varia de acordo com a hora do dia e a estação do ano, em função da temperatura e possui grande variação de acordo com a altitude. Com o aumento da altitude, diminui a densidade das camadas de ar, até a altitude de 300 m e a cada 10 a 11 m diminui 1 mm na pressão atmosférica. Ao nível do mar, ou seja, altitude zero, a pressão atmosférica é de 760 mm, diminuindo à medida que a altitude sobe; por exemplo, a 20.000 m de altitude, a pressão é de 41 mm. A pressão atmosférica é importante no deslocamento do ar no sentido horizontal. Pois o vento, na existência de um gradiente de pressão atmosférica, desloca-se da região de maior para a de menor pressão. Vento: com a movimentação das massas de ar de uma região de maior pressão para outra de menor pressão, formam-se os ventos, cuja intensidade varia de acordo com este gradiente de pressão, mas a sua velocidade é influenciada pelas características da superfície terrestre, ou seja, pela existência ou não de vegetação, de montanhas ou de outros acidentes geográficos como vale, água, etc. Outro fator muito importante que deve ser considerado é a velocidade e a direção dos ventos em função da diferença de como se aquecem e se esfriam a terra e a água. Por exemplo, as brisas aparecem nas regiões banhadas pelo mar durante o dia (10 h até o entardecer), a brisa marítima sopra do mar para a terra, pois a terra se aquece mais depressa do que a água do mar. Durante a noite, a brisa tem o sentido contrário, isto é, sopra do continente para o mar, sendo denominada de brisa terrestre, pois a terra esfria mais depressa que o mar. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 11 Umidade atmosférica: existem duas formas de se expressar a umidade atmosférica: a) umidade absoluta, que é o peso do vapor de água contido em 1 m³ de ar, conforme a temperatura pode variar esta quantidade, e b) umidade relativa do ar, que é a relação existente entre a quantidade de vapor de água contida no ar e a quantidade máxima que pode suportar, a uma dada temperatura, sem que ocorra a precipitação. Nebulosidade atmosférica: quando o ar atmosférico está saturado de vapor de água ele sofre uma diminuição de temperatura, ocorrendo a condensação, formando gotas de água em suspensão no ar e provocando o nevoeiro ou as nuvens. A formação dessa suspensão de gotículas de água na atmosfera pode ser causada pela mistura de duas massas de ar de temperaturas diferentes, passagem de massas de ar quente por uma superfície fria, e vento frio sobre uma superfície líquida mais quente. Denomina-se de nevoeiro a nebulosidade que se forma na camada inferior da atmosfera na superfície terrestre, e de nuvens, quando se forma na camada mais elevada, com nomenclatura diferente conforme a altura. De 8.000 a 11.000 m, recebe a denominação de cirros, de 2.000 a 6.000 m, cúmulos, de 500 a 1000 m, estratos, e quando são bem baixas e secas, nimbos. Precipitação atmosférica: as precipitações que ocorrem na superfície terrestre podem ser orvalho, geralmente formado em noites claras e sem vento, quando a superfície terrestre fica mais fria que o ar. Neste caso, o vapor de água precipita-se em gotículas, cobrem objetos e vegetação e quando a temperatura da superfície fica menor que 0° C, o orvalho congela e produz a geada. As precipitações que ocorrem na troposfera são resultantes do encontro de camadas de ar frio com uma nuvem saturada de vapor, formando gotículas que se congelam em pequenos cristais hexagonais e se precipitam, formando neve. Ou granizo, quando a precipitação resultante do vapor de água contida na nuvem cai em pequenas gotas 12 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. congeladas que em contato com a camada fria da atmosfera chegam ao solo em forma de pedras de gelo, por isso são conhecidas vulgarmente como “chuva de pedra”. As chuvas, importantes entre as precipitações, ocorrem quando nuvens saturadas de vapor de água, em contato com uma camada de ar frio, precipitam-se em gotas de água. A quantidade de água da chuva é medida pelo pluviômetro e é dada em mm, podendo ser medida em uma única chuva ou acumulada em um mês ou ano. É importante conhecer o total de chuvas caídas em um ano, porém é mais importante ainda a distribuição durante o ano. Através destes dados, temos o regime pluviométrico, sempre medido em mm. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 13 III. CONFORTO TÉRMICO 1. GENERALIDADES Conforto térmico para animais homeotérmicos é quando o animal se encontra em um ambiente de equilíbrio térmico, ou seja, situação em que o animal não necessita mobilizar os recursos de termorregulação para se ajustar às condições ambientais. Portanto, o animal não sofre estresse pelo frio ou pelo calor. Nestas condições, desde que alimentado adequadamente, o animal apresenta o máximo do desempenho produtivo de acordo com o potencial genético. Os limites de temperatura ideal para o conforto animal estão condicionados a vários fatores, tais como: espécie, raça, peso, idade, estado fisiológico, condição nutricional e fatores ambientais variados. Segundo Silva (2000), alguns autores determinam o conforto térmico de várias espécies de animais, baseando-se na umidade e na temperatura. É bem verdade que estes dois fatores são determinantes, porém é importante que se considere, também, a radiação solar, para não corrermos o risco de não considerar a diferença entre animais mantidos no interior de um abrigo à sombra e sob o sol direto. Outro fator que pode atuar na termoneutralidade é o vento. Em um ambiente com a mesma temperatura, mesma umidade do ar e mesma intensidade da radiação solar, a presença do vento influencia diretamente no bem-estar do animal. A importância do conforto animal reside no fato de que, na termoneutralidade, o gasto de energia para a mantença do animal ocorre a nível mínimo e desta forma, a energia metabolizada pode ser direcionada quase que na totalidade para os processos produtivos, não ocorrendo o consumo de energia de que todo e qualquer mecanismo de termorregulação necessita. 14 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. 2. CALOR CORPÓREO Para as funções básicas, ou seja, para as reações químicas do organismo, os animais dependem da temperatura corpórea. A elevação da temperatura acelera as reações provocando uma diminuição das atividades. Para que não ocorram essas flutuações nas funções fisiológicas pela variação da temperatura, os animais homeotérmicos desenvolveram um meio pelo qual a temperatura corporal é mantida relativamente constante, diferentemente dos animais pecilotermos, cuja temperatura corporal varia com a temperatura ambiente. As temperaturas das partes do corpo podem diferir devido às diferentes taxas metabólicas, ao fluxo sanguíneo ou a distância da superfície. O fígado e o encéfalo podem ter uma temperatura mais alta do que o sangue. A temperatura central do corpo é mais alta do que a temperatura dos membros e das orelhas ou qualquer outra parte externa do corpo. Isto acontece porque a produção de calor interno é consequência do metabolismo que, no processo de reações químicas do alimento, gera calor, e quanto mais distante da fonte de calor, menor a quantidade de calor. Considerando que o sangue circulante é um distribuidor de calor corpóreo, o calor pode ser levado e exposto a um gradiente de temperatura na superfície da pele e dissipado para o meio ambiente. A facilidade ou não da dissipação de calor para o ambiente depende basicamente dos fatores ambientais e, particularmente, da temperatura do ambiente, que é diretamente proporcional à intensidade da radiação solar. 3. RADIAÇÃO SOLAR E SUAS IMPLICAÇÕES A radiação solar é uma energia eletromagnética de ondas curtas, que atinge a Terra e é a fonte principal de calor no ambiente, portanto é BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 15 imprescindível para a vida na Terra. Da energia solar, grande parte é perdida na atmosfera, da seguinte forma: • Por reflexão: 30% são refletidas pelas camadas de nuvens de volta para o espaço, e 6% são refletida pela superfície terrestre. • Por absorção: 15% são absorvidas na atmosfera pelo vapor de água, CO2 e partículas (aerossóis) e 3% são absorvidas na ionosfera, na formação de ozônio. • Por dispersão: 15% são dispersadas pelas partículas sólidas e gasosas. Portanto, da radiação solar, apenas 31% atingem a superfície terrestre. As parcelas da radiação que atingem a superfície da Terra são constituídas basicamente por ondas curtas (0,3 a 4,0 µm). A energia solar que atinge a superfície terrestre ao nível do mar raramente excede 1.088 a 1.120 W/m², mesmo nos dias mais claros; em média, acha-se ao redor de 900 a 980 W/m². A banda UVC (0,20 – 0,28 µm) apresenta um efeito biológico particularmente intenso e perigoso, mas é quase toda absorvida pela camada de ozônio e não ultrapassa a estratosfera. A banda UVB (0,28 – 0,32 µm) é importante para a síntese de vitamina D, mas apresenta riscos de dano celular quando há exposição excessiva a ela. Os raios da banda UVA (0,32 – 0,40 µm) são menos penetrantes e estão associados à síntese de melanina. Entretanto a radiação solar tem vários efeitos biológicos importantes, entre eles: síntese orgânica (fotossíntese, síntese de vitamina D); transformação da matéria (melanogênese, eritemas, efeitos bactericidas), e efeitos diversos (fotoperiodismo, fototropismo, fototaxia, movimentos fotonásticos, germinação de sementes, fotomorfose, estímulos nervosos e glandulares). 3.1. Efeito da latitude na radiação solar Latitude é a distância angular entre um ponto qualquer da superfície terrestre e o equador. É contada de 0° a 90°, do equador em 16 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. direção aos polos norte e sul. Dois fatores relacionam a latitude e a radiação solar: a diferença nas inclinações dos raios solares devido à redondeza da Terra e as diferenças na espessura das camadas da atmosfera. Sobre o equador, os raios solares incidem perpendicularmente e à medida que se afasta em direção aos polos, aumenta a espessura das camadas da atmosfera que os raios solares tèm de atravessar. 3.2. Radiação e conforto térmico O balanço térmico ou a radiação trocada entre o animal e o meio ambiente depende dos tipos de exposição do animal à radiação. A radiação chega ao animal de duas formas: radiação solar direta – através da pelagem ou pelo, 50 a 70% do total em um ambiente aberto e radiação solar difusa – retransmissão do calor radiante. As trocas térmicas por radiação entre os animais e seu ambiente (climas tropicais) determinam as diferenças entre um ambiente tolerável ou insuportável. Todo e qualquer objeto ou superfície, cuja temperatura esteja acima de zero absoluto (0 °C ou – 273,15 °F) representa fonte de radiação térmica. Além disto, alguns outros conceitos são importantes, como: • Energia radiante: absorvida e convertida em energia calorífica. • Irradiação solar (Q): quantidade de radiação por unidade de área e de tempo, recebida por uma superfície da Terra, sendo expressa em joule/m² s ou watt/m² (1 J/s = 1 W). Outra forma de expressá-la é em caloria/cm³ min = 697,7 W/m². • Temperatura Radiante Média (TRM): temperatura média do conjunto de todas as superfícies reais e virtuais ao redor de um animal, em um dado local. Supõe-se que o animal esteja no centro de um envoltório esférico infinitamente grande, cuja superfície interna seja um corpo negro. • Carga Térmica Radiante (CTR): quantidade de energia que o animal troca com as superfícies ao seu redor. Quantidade total de energia BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 17 térmica trocada por um indivíduo através de radiação com o meio ambiente. Figura 1. Fontes de radiação térmica sobre o animal. Pode ser observada a radiação solar de ondas curtas (a); radiação de ondas curtas refletidas pelas nuvens (b); radiação de ondas longas emitidas pelo Sol e refletidas nas nuvens (c); radiação celeste de ondas curtas (d); radiação de ondas longas emitidas por corpos e objetos vizinhos (e); radiação de ondas longas emitidas pelo solo (f) e radiação de ondas curtas refletidas na superfície do solo (g) (SILVA, 2000). A velocidade do vento é um fator fundamental para a determinação das trocas térmicas por convecção e evaporação, influindo diretamente no conforto térmico. A radiação solar que atinge a superfície terrestre é mais ou menos absorvida pelo terreno, dependendo da 18 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. natureza do mesmo. Em consequência, a superfície transfere energia térmica para as moléculas de ar imediatamente em contato com elas (convecção). Quando a diferença de densidade do ar adjacente à superfície for tão grande em relação à densidade da atmosfera circundante que força ascensional permita vencer a gravidade, então uma bolha de ar aquecido desloca-se para cima e abre embaixo uma zona de baixa pressão, sendo imediatamente preenchida pelo ar menos quente e mais denso das vizinhanças. Outro fator que influencia as trocas térmicas entre o animal e o ambiente é a umidade relativa do ar. Quando o ambiente está quente e seco, a evaporação processa-se de uma maneira mais rápida e pode ocorrer irritação cutânea e desidratação geral. Por outro lado, em ambiente quente e úmido, a evaporação é muito lenta e causa redução na termólise, aumentando o estresse pelo calor. 4. SOMBREAMENTO E RADIAÇÃO No interior de abrigos a radiação solar direta e, consequentemente, a carga térmica radiante pode ser reduzida. A eficiência do sombreamento depende da radiação proveniente do Sol, do céu aberto, do solo e das demais superfícies que rodeiam os animais, além da própria estrutura da sombra. Os principais fatores que influenciam na CTR no interior de abrigos são: • Orientação – eixo longitudinal leste-oeste resulta em menor CTR interna do que na orientação norte-sul, pois nessa orientação a radiação solar incide diretamente numa grande área da parede lateral; • Altura do teto (pé-direito) – quanto maior esta altura maior a proporção de céu aberto (superfície mais fria que o resto do ambiente); • Existência de paredes – bloqueia a radiação térmica de origem externa, porém há menor ventilação e maior incremento de calor BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 19 devido a fontes internas de radiação e emissão de energia absorvida pelas paredes. Além disto, os materiais usados na construção de abrigos devem apresentar como características: • possuir elevada refletividade na superfície exterior exposta à radiação incidente; • possuir baixa condutividade térmica para evitar a transmissão de energia térmica para o interior do abrigo; • possuir estrutura da superfície favorável a dissipação do calor por convecção. Figura 2. Carga de energia recebida pelo animal ao sol (70 cal/HS/cm²) e à sombra (40 cal/HS/cm²). 5. RADIAÇÃO REFLETIDA E EMITIDA PELO SOL Da radiação solar que atinge a superfície do solo, parte é refletida e parte é absorvida. A porção de energia procedente do Sol absorvida pelo solo, o aquece, resultando na emissão de radiação de ondas longas de comprimento proporcional à temperatura do solo (Lei de Wien). Dependendo do material que cobre o solo, a absorção pode variar (Tabela 2 e 3). 20 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. Tabela 2. Absorção e emissão de calor por diferentes tipos de piso. Fonte: Silva, 2000. Tabela 3. Influência da cobertura vegetal na carga térmica radiante. Fonte: Silva, 2000. 6. DETERMINAÇÃO DO ESTRESSE CAUSADO PELA RADIAÇÃO Para estimar valores aproximados de estresse causado pela radiação, utiliza-se o globo de Vernon ou globo negro. Essa determinação torna-se de grande importância em climas tropicais. Tratase de um globo oco de metal (geralmente cobre) de diâmetros variáveis, superfície externa pintada de preto fosco e provido de termômetro para a medição de sua temperatura interna. O globo é colocado no espaço que o animal ocuparia, permitindo uma estimativa dos efeitos combinados da energia térmica radiante procedente do meio ambiente, em todas as direções possíveis, da temperatura do ar e da velocidade do vento, dando assim uma medida BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 21 do conforto térmico proporcionado pelo ambiente nessas determinadas condições, supondo-se não haver trocas térmicas por evaporação entre o ambiente e o animal. Utiliza-se o globo de Vernon como modelo físico, permitindo estimar o estresse em animais desprezando a termólise evaporativa. Para simular o processo de sudação, e consequentemente a termólise através da evaporação cutânea, o globo pode possuir uma superfície úmida. Quando o equipamento é colocado em um determinado local, o globo troca energia térmica com o ambiente através de mecanismos de radiação e convecção, até que seja atingido um estado de equilíbrio em que o calor ganho e o dissipado se igualam. A partir da temperatura de globo é possível se determinar a Temperatura Radiante Média e a Carga Térmica Radiante (Esmay, 1982), pelas fórmulas: TRM = 100 {[2,51(Vv)0,5 (Tg – Ts) + (Tg/100)4]0,25} (W m-2) e CTR (W m-2) = s (TRM)4, onde: Tg = temperatura de globo (K), Ts = temperatura de bulbo seco ou ambiente (K), Vv = velocidade do vento (m s-1) e constante de Stefan-Boltzmann (K-4.W.m-2) s = 5,67.10-8. 7. ÍNDICES AMBIENTAIS Como vimos diversos fatores podem influenciar no conforto térmico dos animais e a associação desses fatores constitui diferentes ambientes. Dessa forma, para possibilitar a comparação entre ambientes distintos, no que diz respeito a fatores climáticos que influenciam o conforto térmico, foram propostos alguns índices ambientais, como os apresentados a seguir. 7.1. Índice de Temperatura e Umidade (THI ou ITU) – Thom (1958) Proposto inicialmente para caracterizar ambientes quanto ao conforto térmico de humanos, não leva em consideração a radiação 22 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. térmica, não mostrando diferenças para ambientes no interior de abrigos, à sombra ou sob o sol direto. ITU = Ts + 0,36 Tpo + 41,5 Onde: Ts = temperatura ambiente (°C); Tpo = temperatura de ponto de orvalho(1) (°C); De modo geral, dependendo do valor de ITU observado, o ambiente pode ser classificado como: ITU = 70 – condição normal; 70 < ITU < 78 – crítico; 79 < ITU < 83 – perigo; ITU > 83 – emergência. 7.2. Índice de Globo Negro e Umidade (BGHI ou IGNU) – Buffington et al. (1981) Na tentativa de contornar a limitação do ITU, por não levar em consideração a radiação, foi proposto o índice de globo negro e umidade: IGNU = Tg + 0,36 Tpo + 41,5 Onde: Tg = temperatura do globo negro (°C), Tpo = temperatura de ponto de orvalho (°C). Este índice é bastante usado na bioclimatologia zootécnica, pois leva em consideração, através da temperatura de globo negro colocado na posição em que o animal ocuparia no ambiente, os efeitos combinados da radiação solar e do vento. Entretanto, este índice despreza a termólise evaporativa que os animais apresentam como mecanismo termorregulatório. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 23 7.3. Índice de Globo Úmido (WBGT) – Yaglou e Minardi (1957) Índice desenvolvido para caracterizar ambientes, especialmente importante para indivíduos com termólise evaporativa significativa através da evaporação cutânea. A principal crítica a esse índice é que despreza o movimento do ar. WBGT = 0,7 Tu + 0,3 Tg Onde: Tu = temperatura de bulbo úmido (°C), Tg = temperatura de globo negro (°C). Embora estes três índices apresentados estejam entre os mais populares, apresentam suas deficiências e limitações. Portanto, constantemente outros índices vêm sendo propostos e validados. A grande dificuldade continua sendo a aplicação destes índices em diferentes condições. 24 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. IV. TERMORREGULAÇÃO 1. GENERALIDADES Entende-se por termorregulação o processo de controle da temperatura corporal de um animal em um ambiente qualquer, quando há um gradiente de temperatura, ou seja, quando o animal não se encontra em termoneutralidade. Os seres vivos são sistemas geradores de energia térmica, produzida no processo metabólico de manutenção das funções vitais do organismo. A energia química, denominada de taxa metabólica, proveniente da transformação dos alimentos, dá origem à energia mecânica, isto é, atividade muscular. Além disto, ocorre troca de energia com o ambiente, denominada de energia térmica, que ocorre de diferentes modos: radiação, convecção e condução. Em um dado momento, o organismo está ganhando e perdendo energia, ou seja, o animal deve estar em equilíbrio térmico com o ambiente, a não ser quando o animal permanece numa condição de trabalho invariável em um ambiente absolutamente inalterado. Normalmente, o animal está em uma troca constante de energia e a temperatura corporal depende do equilíbrio entre os mecanismos de produção, ganho e perda de calor. Essa necessidade de troca de calor para proporcionar o conforto térmico ao animal apresenta grandes diferenças entre os tipos de animais. Nos animais pecilotérmicos, considerados animais de sangue frio ou animais ectotérmicos, a temperatura corporal varia com o meio ambiente externo em que vivem. Esses animais exigem menor energia, conseguindo sobreviver a longos períodos de escassez de alimento, pois despendem menor quantidade de energia na produção de calor, vivendo com baixa taxa metabólica. Por isso, podem utilizar grande parte de seu aporte de energia no crescimento e na reprodução, porém como não dispõem de mecanismos eficazes, no inverno, a maioria dos BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 25 répteis e anfíbios hibernam, pois é uma maneira de sobreviver com o mínimo de taxa metabólica, mas com o retorno das temperaturas mais quentes, voltam às atividades normais de sobrevivência e procriação. Nos animais homeotérmicos ou animais de sangue quente, a temperatura corporal não acompanha a do meio ambiente. Por este fato, todos esses animais apresentam mecanismos para produzir calor quando a temperatura ambiente está abaixo da corporal e também dissipar o calor, quando em excesso, pela energia metabólica e pela irradiação que recebe do meio ambiente. Quando estes mecanismos não conseguem manter a temperatura corporal no conforto térmico, podem sofrer transtornos fisiológicos, tais como: • Choque pelo calor: ocorre quando a produção ou ganho de calor excede as perdas, resultando em aumento de temperatura corporal (hipertermia). Quando ultrapassa 41,5 a 42,5 °C a função celular fica seriamente prejudicada, e o animal perde a consciência. A temperatura letal é aquela na qual ocorre a morte do animal, em torno de 45 °C; • Choque pelo frio: ocorre quando as perdas de calor ultrapassam a sua produção e ganho, de tal forma que a temperatura corporal cai a níveis perigosos (hipertermia). A capacidade hipotalâmica de regular a temperatura corporal fica prejudicada. A uma temperatura abaixo de 29 °C ocorre a parada cardíaca; • Febre: é uma elevação da temperatura corporal, resultante de aumento no “set point” provocado por pirógenos exógenos e/ou endógenos. O organismo inicia respostas para conservar e produzir calor até que a temperatura corporal alcance de novo o “set point”. 2. MECANISMOS DE TRANSFERÊNCIA DE ENERGIA TÉRMICA Os animais homeotérmicos precisam manter a temperatura fisiológica para produzir com o máximo de eficiência. Para isto dispõem 26 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. de um centro termorregulador localizado no sistema nervoso central. Este centro receptor se localiza no hipotálamo, que funciona como um termostato fisiológico e, quando a temperatura do animal está fora da termoneutralidade, comanda a mudança de produção ou perda de calor. O hipotálamo controla a produção e a dissipação de calor por vários mecanismos que serão discutidos na sequência. Na Figura 3, é apresentado o esquema do mecanismo para o controle de temperatura corporal, segundo Muller (1982). Figura 3. Esquema do controle da temperatura corporal (MULLER, 1982) As células especializadas funcionam com termorreceptores periféricos que captam sensações e levam ao sistema nervoso central. Quando as células receptoras periféricas sentem o calor, esta sensação é transmitida na parte anterior do hipotálamo, e este comanda a perda de calor por vasodilatação, sudorese, aumento no número de movimentos respiratórios e mudanças comportamentais. Quando as células receptoras recebem a sensação de frio, é encaminhado para a porção posterior do hipotálamo, desencadeando a conservação e produção de calor, através da vasoconstrição, piloereção, tremores, oxidação do tecido adiposo e alterações comportamentais. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 27 Os animais, para estarem em homeotermia, necessitam de uma constante troca de calor, e os principais mecanismos são: radiação, convecção e, somente para a dissipação de calor, a evaporação. Por definição, a radiação é a transferência de energia térmica de um corpo para o outro, através de ondas eletromagnéticas. Qualquer superfície, cuja temperatura esteja acima do zero absoluto (-273,15 °C ou 0 °K), emite radiação térmica. O fluxo de calor neste processo, depende da temperatura e da natureza da superfície da pele, por exemplo, animais de cor clara refletem mais radiação que animais de cores escuras. A energia incidente na superfície entra sob a forma de ondas de radiação térmica que pode ser refletida, absorvida e transmitida. As propriedades da superfície quanto à transferência de radiação podem ser: reflexividade, absorvidade, transmissidade e emissividade. A condução é a transferência de energia térmica entre corpos, entre partes de um mesmo corpo, por meio de energia cinética da movimentação das moléculas ou pela movimentação de elétrons livres. Esse fluxo passa das moléculas de alta energia para as de baixa, portanto necessitando de contato direto. É um processo importante na termorregulação do animal, pois este processo permite a passagem de calor desde o núcleo central do organismo até a superfície corporal externa, através do contato entre partículas dos tecidos, e também é responsável pela passagem do calor da superfície da pele para o meio. A velocidade depende do gradiente térmico entre a pele e o meio. A convecção é a transferência de energia através um fluido líquido ou gasoso. A corrente de fluido absorve energia térmica em um dado local e, então, desloca-se para o outro lado, onde se mistura e transfere energia. Ocorre a transferência de energia devido à movimentação de ar, cujas moléculas são de corpos mais quentes para os mais frios, portanto os fatores nesse processo são a movimentação do ar e a extensão da superfície corporal. A convecção pode ser natural ou passiva quando ocorre o deslocamento do fluido por diferença na densidade. 28 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. Mas pode ser forçada ou ativa, quando o deslocamento do fluido ocorre por forças ativas, como bombas, ventiladores, mecanismos geradores de ventos ou turbulências. Enqunato a evaporação é a transferência de calor pela passagem das moléculas de água ao ar, sob a forma de vapor. Esse mecanismo de dissipação de calor pode ocorrer na pele e nas vias respiratórias. É um processo muito importante, pois em temperaturas elevadas, a maior parte da dissipação de calor ocorre por evaporação. O animal perde calor quando a água contida no suor, na saliva e nas secreções respiratórias é transformada em vapor de água. A perda do calor por evaporação é contínua, mesmo em condições termoneutras, devido à ocorrência de difusão de água através da pele (sudorese) e vapor de água nas vias respiratórias. A sudorese ou sudação ocorre a partir de glândulas sudoríparas (écrinas e apócrinas) localizadas na derme. A maior parte dos mamíferos placentários possui glândulas sudoríparas , mas, nos cães e suínos, estas glândulas são pouco desenvolvidas. Nos mamíferos ungulados, as glândulas apócrinas são associadas ao folículo piloso (produzem secreção contendo proteínas). Nos primatas, as glândulas são écrinas, uma solução aquosa semelhante ao plasma. Os animais domésticos que mais suam, pela ordem decrescente de importância desse mecanismo para a termorregulação, são os equinos, asininos, bovinos, bubalinos, caprinos, ovinos e suínos. Além disto, existem sensíveis diferenças entre as raças desses animais. O ofego ou hiperpneia é a forma de aumentar a evaporação pelas vias respiratórias, principal meio de perda de calor por evaporação em aves, suínos, cães e ovinos submetidos a altas temperaturas. A perda de água provoca no animal um aumento no consumo para fazer a reposição. Uma representação gráfica da troca de calor de um animal com o meio ambiente é apresentada por Cunningham (2004), onde se pode BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 29 observar como o animal recebe irradiação do meio ambiente e como pode dissipar o excesso de calor (Figura 4). Figura 4. Representação esquemática da troca de calor de um ovino (CUNNINGHAM, 2004). 3. REGULAÇÃO DA TEMPERATURA CORPORAL Para a transferência de calor, os tecidos são maus condutores, e por este fato, o calor é transmitido mais efetivamente pelo sangue. Em altas temperaturas do ambiente, o fluxo sanguíneo aumenta, as arteríolas dos leitos vasculares dilatam-se e aumenta o fluxo sanguíneo capilar. Aumenta a temperatura nos membros e a perda de calor pela pele. No frio, o fluxo sanguíneo cutâneo diminui pela vasoconstrição nos leitos vasculares cutâneos e diminui a temperatura nos membros e a perda de calor pela pele. A regulação da temperatura corporal é comandada pelo hipotálamo, que possui dois tipos de neurônios: um respondendo ao 30 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. frio e outro ao calor. Quando a atividades dos neurônios responsáveis pelo calor e frio se igualam, a produção será igual à perda de calor, e a temperatura corporal será mantida estável. Esse ponto de atividade é denominado de “set point”. As informações provenientes dos neurônios termossensíveis centrais e periféricos são integradas no hipotálamo para regular os mecanismos de perda e conservação de calor. Existem três tipos de neurônios termossensíveis (sensores de temperatura): • Neurônios termossensíveis que monitoram a temperatura cerebral ou central, situados na área pré-óptica do hipotálamo, os quais dão início aos processos de vasodilatação periférica e sudorese; • Neurônios termossensíveis situados na pele, que são receptores cutâneos para o frio e para o calor; • Neurônios termossensíveis que estão situados em vários locais das víceras. A zona de termoneutralidade ou de conforto térmico, ou seja, é a faixa de temperatura ambiente dentro da qual o custo fisiológico é mínimo e o desempenho produtivo esperado é máximo. Nesta condição, a temperatura corporal pode ser regulada apenas por mecanismos vasomotores (convecção e irradiação). A sequência dos mecanismos de defesa contra o calor são: • Vasodilatação periférica: aumento da perda de calor sensível; • Início da sudorese: perda por evaporação cutânea; • Aumento da frequência respiratória: perda por evaporação respiratória; • Mudanças de comportamento: os animais, em geral, procuram a sombra, poças de água, ocorre a inibição do apetite e menor consumo de alimento; • Alterações na atividade endócrina: o estresse térmico reduz a atividade da tireóide e o metabolismo energético; • Maior consumo de água: para repor as perdas pela evaporação; • Elevação da temperatura corporal; BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 31 Por outro lado, nas respostas ao estresse causado pelo frio, ocorre: • Vasoconstrição periférica: redução do gradiente de temperatura entre a pele e o ambiente, com diminuição nas perdas por convecção e irradiação; • Piloereção: aumento na camada termo-isolante proporcionada pela pelagem e ar aprisionado entre os pelos; • Produção metabólica de calor: termogênese mediante tremores e não tremores (tecido adiposo marrom); • Aumento de secreção de tiroxina e do metabolismo basal. Ocorre a redistribuição por todo o corpo, principalmente pelo fluxo de sangue que transfere o calor para as partes mais frias, que são as extremidades, resfriando as partes mais quentes, que são o cérebro e as vísceras. Nas Figuras 5a e 5b está representado o esquema de transferência do calor (CUNNINGHAM, 2004). Figura 5. Esquema de transferência de calor (CUNNINGHAM, 2004). Nos ambientes quentes, a temperatura corpórea central estendese para baixo até os membros e aproxima-se da superfície cutânea do animal. Por outro lado, nas condições frias, a vasoconstrição nos vasos sanguíneos periféricos resulta em um gradiente de temperatura entre as partes centrais do corpo e as extremidades. A temperatura central 32 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. mantém-se apenas no abdômen, tórax e cérebro do animal, podendo esfriar consideravelmente nos tecidos mais periféricos. Para cada animal, existe o seu limite de temperatura inferior ou superior de conforto térmico (termoneutralidade). Existem temperaturas crticas inferior ou superior em que, pelos mecanismos de termorregulação, os animais conseguem manter a temperatura corporal. Além destas faixas, atingem-se as temperaturas críticas mínimas e máximas, que são os limites de sobrevivência, e ultrapassando esses limites os animais sucumbem. Na Figura 6 é apresentado o esquema simplificado do processo de termorregulação (SILVA, 2000), onde se observam a temperatura crítica inferior (TCI) e a temperatura crítica superior (TCS). Além desses limites, o animal desencadeia o processo de termorregulação. Até as temperaturas limites hi (inferior) e hs (superior), o animal consegue manter a temperatura interna com os mecanismos que ele dispõe, e quando a temperatura ambiente é inferior a hi e superior a hs, o animal consegue sobreviver com estresse extremo em hipotermia (inferior) e hipertermia (superior), pois não consegue mais manter a temperatura corporal constante. Quando ultrapassa os limites hi e hs o animal sucumbe. Figura 6. Representação esquemática simplificada do processo de termorregulação (SILVA, 2000). BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 33 V. EFEITO DO ESTRESSE TÉRMICO E TERMORREGULAÇÃO ESPECÍFICA DOS ANIMAIS 1. GENERALIDADES Neste capítulo, será dada especial atenção ao estresse térmico pelo excesso de calor, ou seja, estresse causado por temperaturas acima da termoneutralidade. Embora os animais possam sofrer estresse pelas temperaturas abaixo do conforto térmico, particularmente em se tratando de recém-nascidos ou com alguns dias de vida, que tem dificuldade na conservação de calor, e mesmo os adultos, que podem sofrer pela baixa temperatura alguns poucos dias do ano, pelo fato dos animais do nosso país serem encontrados em ambiente de elevada temperatura a maior parte do ano, este é um problema mais comum à produção animal. É bom lembrar que, além da temperatura, existem outros agentes estressores que são tão importantes quanto o estresse calórico, como: doenças, parasitas, qualidade e quantidade de alimento, manejo e uma infinidade de agentes que podem prejudicar o bem-estar dos animais e, consequentemente, a produtividade do animal. Pois, segundo Truman (1988), “o estresse atua em detrimento do bem-estar do organismo”. Outra definição apresentada por Baccari Jr. (1987) é que o “estresse é a soma de respostas do organismo à agressão de ordem física, psicológica, infecciosa e outros capazes de pertubar-lhe a homeostase”. Os tipos de estresse podem ser: mecânicos (traumatismo), físicos (calor, frio, umidade, eletricidade, som), químicos (drogas), biológicos (agentes infecciosos, estado de nutrição, dos esforços corporais) e fatores psíquicos (solidão, medo) conforme (BACCARI JR, 1987). Em se tratando de estresse térmico, para cada espécie animal existe uma faixa de temperatura de conforto térmico. Além das diferenças entre espécies, varia também de acordo com a raça, 34 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. idade, peso corporal e outros fatores que interferem na termoneutralidade. Quando a temperatura do meio é abaixo da temperatura crítica inferior ou acima da temperatura crítica superior, ou seja, fora da faixa de conforto térmico, desencadeiam no animal processos de termorregulação, na tentativa de manter a temperatura corporal em homeotermia. Porém, quando a temperatura inferior for abaixo do limite inferior ou acima do limite superior, o animal não consegue manter a temperatura corporal e entra em hipotermia (abaixo) ou hipertermia (superior), e o animal sobrevive com estresse extremo e grande desgaste, portanto com grande prejuízo no desempenho. O limite de sobrevivência do animal é atingido no limite inferior da hipotermia ou no limite superior da hipertermia. Na verdade os animais diferem quanto às altas temperaturas que podem suportar. A tolerância à temperatura extrema pode variar com o tempo de exposição, e um certo grau de adaptação à exposição por um longo tempo na temperatura próxima do limite térmico possa ocorrer. Frequentemente, se amplia este limite, porque o animal com excesso de calor acomoda-se e pode tolerar a temperatura que anteriormente era letal. Devemos lembrar que a temperatura letal para certos animais não pode ser determinada com precisão porque o tempo de exposição é também importante, pois uma temperatura abaixo ou acima do limite de sobrevivência, por alguns minutos, pode ser suportada pelo animal, mas se for mantido por várias horas, o animal pode vir a perecer. Outros elementos também atuam nessa tolerância, como a presença de vento, a umidade relativa do ar, a altitude e ainda outros fatores, como estado de saúde do animal, etc. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 35 2. EFEITO DO ESTRESSE TÉRMICO E TERMORREGULAÇÃO EM AVES 2.1. Efeito do estresse térmico em aves A moderna avicultura, para atingir melhores resultados, precisa considerar não só os aspectos genéticos, nutricionais e sanitários, mas também os aspectos ambientais, pois, se estes forem desfavoráveis, prejudicam a potencialidade genética na eficiência nutricional e até nos aspectos sanitários das aves, com prejuízos incalculáveis (BAÊTA e SOUZA, 1997). A temperatura ideal para produção de ovos encontra-se entre 21 e 26 ºC. Entre 26 e 29 oC ocorre redução do tamanho e da qualidade da casca. E dos 35 a 38 ºC, a produção é severamente afetada, podendo ocorrer até a prostração das aves. Segundo Truman (1988), a termoneutralidade dos recém-nascidos está entre 35 e 37 ºC, pelo fato do sistema termorregulador não estar ainda bem desenvolvido, portanto há necessidade de temperatura externa para sobreviver. Caso a temperatura esteja abaixo do necessário, os pintinhos podem amontoarse para se aquecerem uns aos outros, e alguns que ficarem por baixo, acabam morrendo por asfixia. Os efeitos mais evidentes do estresse térmico pelo excesso de calor é a redução do consumo alimentar, na tentativa de reduzir a produção de calor interno provocado pelo metabolismo do alimento. Para as aves (frango e poedeiras), a temperatura crítica superior é em torno de 25 ºC. Acima desta temperatura, as aves comem menos e ingerem maior quantidade de água, na tentativa de diminuir a temperatura corporal. A frequência respiratória aumenta para que possa ocorrer perda de calor por evaporação. O efeito do estresse térmico pelo calor em frangos torna-se mais prejudicial após a terceira semana de vida, ocasião em que as aves estão em crescimento expressivo, ocorrendo, também, diminuição no 36 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. desempenho, piora na conversão alimentar e aumento na mortalidade. Com a temperatura ambiente elevada, ocorre redução no ganho de peso das aves, na ordem de 0,33 g a cada 1 ºC de aumento de temperatura acima do conforto térmico. Conforme Macari (1995), o consumo de água aumenta com o aumento da temperatura ambiente da seguinte forma: 140 L/1.000 frangos, à temperatura ambiente de 20 ºC; 220 L/1.000 frangos, à temperatura de 32 oC. Para poedeiras com 90% de produção, à 20 oC consomem 200 L/1.000aves, e à 32 ºC consomem 400 L/1.000aves e para frangos de corte com 6 semanas de idade, 280 L/1.000 aves e 600 L/1.000 frangos à 20 e 32 oC, respectivamente. Sabe-se que os movimentos respiratórios (ofego) ajudam na eliminação do calor interno por evaporação, porém a hiperventilação pulmonar provoca perdas significativas de CO2, causando desequilíbrio acido-básico sanguíneo das aves que, dependendo do tempo de exposição ao estresse, podem vir a óbito. Segundo Wang et al. (1989), a eliminação de calor via respiratória através do ofego, quando muito intenso, aumenta a perda de dióxido de carbono pelos pulmões, reduzindo a quantidade de CO2, bicarbonato do plasma sanguíneo, ocasionando a concentração de íons de hidrogênio no plasma e aumentando o pH do sangue (alcalose respiratória), e isso inicia-se quando a temperatura ambiente atinge 35 ºC, podendo provocar a morte. Outro fato negativo causado pelo ofego das aves é que a passagem normal de ar pelas narinas retém poeira e até bactérias presentes no ar, e como no ofego o ar entra principalmente pelo bico, ocorre a introdução de patógenos que podem provocar infecções respiratórias. Nas aves expostas à temperatura inadequada, ou seja, à alta temperatura, a pressão sanguínea diminui, aumentando os batimentos cardíacos. Durante uma situação aguda de estresse térmico, o sistema cardiovascular distribui o sangue principalmente para a termorregulação, reduzindo em até 44% a distribuição de sangue para funções básicas, BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 37 como, por exemplo, a digestão (MOURA, 2001). As aves não sobrevivem por longo período expostas a ambientes com temperatura 5 ºC acima da temperatura ideal; entretanto, são capazes de suportar, relativamente bem, a ambientes com 25 ºC inferior a sua temperatura interna, por isso são poucos os casos em que sofrem pela temperatura abaixo da crítica nos períodos frios do ano, período em que as aves, por meio da termorregulação, podem estabilizar-se embora diminuam as atividades produtivas, mas sem grandes prejuízos. Porém, em período quente, quando ocorrem temporais e as aves em sistema coletivo se molham, sentem frio pela pena molhada e começam a se juntar nos cantos dos galpões, na tentativa de se aquecerem umas às outras, chegando a se amontoarem umas por cima das outras e, nesse momento, as que ficam por baixo morrem por falta de ar. Talvez este seja um dos casos raros de perdas de aves por temperatura abaixo da temperatura crítica em nosso País. Trabalhos de Zimmerman e Snetsinger (1976), comparando a postura de aves manejadas em ambiente com a temperatura de 16 ºC e 32 °C, constataram que o estresse calórico reduziu a produção de ovos em 6%, no tamanho em 14%, e na eficiência de conversão alimentar, a perda foi de 16%. Uma maneira simples e prática para determinar o índice de estresse para aves é proposta por Lara e Baião (2005), que é a seguinte: se a soma numérica da temperatura ambiente com a umidade relativa do ar (desprezando as unidades) for superior a 105, as aves apresentam dificuldade para perder calor, por exemplo, se a temperatura ambiente for de 27 °C e a umidade relativa do ar for de 78%, somam 105; então, a partir daí, as aves passam a sofrer estresse calórico; no entanto, em temperatura ambiente de 29 °C, se a umidade relativa do ar for 70%, então a soma de 29 mais 70 será 99, portanto as aves, nesse ambiente, não estão em estresse calórico, embora a temperatura esteja 2 °C acima da anterior. Lana (2000) avaliou duas instalações na produção de frangos, uma arejada e com ventiladores, mantendo a temperatura próxima ao 38 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. conforto térmico e outra com temperatura de 32 °C, e observou consumo de 4,6 kg de ração e ganho de peso de 2,2 kg ao abate nos animais em conforto térmico e consumo de 3,9 kg de ração e ganho de peso de 1,9 kg nos animais em estresse calórico (32 °C). Estudando o efeito da temperatura ambiente sobre o desempenho e as características de carcaça de frangos de corte, Oliveira Neto (2000) comparou o desempenho de frangos dos 22 a 42 dias criados às temperaturas de 23,3 °C e 32,3 °C, e observou consumo de água de 4,9 L e 7,8 L, peso final de 1,9 kg e 1,7 kg, conversão alimentar 1,48 e 2,26, consumo de ração 2,03 kg e 2,01 kg, para ambiente termoneutro e animais submetidos ao estresse térmico, respectivamente. May e Lott (2001), testando as temperaturas de 12, 14, 16, 18, 22, 24, 26, 28 e 30 °C, em pintinhos machos e fêmeas de 21 a 49 dias, observaram que o peso final de abate foi influenciado pela temperatura da seguinte forma: a 12 °C foi de 3,3 kg, que foi melhorando até a temperatura de 18 °C, que foi de 3,4 kg. A partir dessa temperatura, à medida que se submetiam os animais à temperaturas mais altas, o peso final decresceu linearmente, e aos 30 °C, o peso final foi de 2,7 kg. 2.2. Termorregulação em aves O sistema de termorregulação em aves é baseado em quatro diferentes unidades funcionais: o receptor, que percebe os estímulos; o controlador, que são os mecanismos de termorregulação; o efetor, que induz as respostas para a manutenção da temperatura corporal, e o passivo, quando o animal está em homeotermia (MACARI e FURLAN, 2001). Em estresse por excesso de calor, para aumentar a dissipação de calor, as aves procuram maximizar a área superficial do corpo mantendo as asas apartadas do corpo e ocorre aumento do fluxo de sangue para tecidos periféricos não cobertos por penas (pés, crista e BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 39 barbelas), aumentando a troca de calor sensível para o meio ambiente. Quando a temperatura ambiente ultrapassa a temperatura crítica superior, um dos primeiros mecanismos acionados é o aumento da ingestão de água e redução no consumo de ração. O acréscimo do consumo de água está diretamente relacionado ao aumento de demanda de água destinada ao processo da perda de calor por meio evaporativo e respiratório (MOURA, 2001). É importante ressaltar que a água fornecida às aves sejam bem frescas, pois já na ingestão pode ocorrer a troca de calor interno. A diminuição de consumo de ração é uma tentativa de diminuir a produção de calor pelas reações químicas geradoras de calor que o metabolismo de alimentação provoca. Estudos realizados por Linsley e Berger (1964) demonstram que, sob condições de estresse térmico, as aves podem aumentar sua taxa de respiração de 25 movimentos respiratórios por minuto para 250. A perda evaporativa de calor para manter o conforto térmico não é simplesmente proporcional à temperatura ambiente. Na verdade, outro elemento tão importante quanto a temperatura é a umidade relativa do ar. Os dados obtidos por Romijn e Lokhorst (1966) confirmam esta afirmação, pois em ambiente quente e seco (24 °C e 40% UR) a perda evaporativa foi de 50%, em ambiente quente e úmido (24 °C e 84% UR) a perda foi de apenas 22%; em ambiente muito quente e seco (34 °C e 40% de UR) a perda foi de 80%, e em ambiente muito quente e úmido (34 °C e 90% de UR) a perda foi de apenas 31%. Como se pode observar, as aves dispõem de poucos processos de termorregulação, particularmente em ambiente acima do limite crítico, daí a importância do homem interferir para possibilitar o conforto térmico em clima quente como o nosso, seja pela instalação, seja por equipamentos e manejos que proporcionem o bem-estar do animal. Assunto que será discutido posteriormente. 40 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. 3. EFEITO DO ESTRESSE TÉRMICO E TERMORREGULAÇÃO DE BOVINOS 3.1. Efeito do estresse térmico em bovinos Os principais sintomas do estresse calórico em bovinos são o aumento da frequência respiratória que, em ambiente de conforto térmico, é de 40 movimentos por minutos, podendo atingir níveis extremos de 100 movimentos respiratórios por minuto; mesmo com esse número, não representa mais de 25% da perda total de calor corporal. Assim como em aves, a respiração excessiva elimina CO2 que, quando exagerado, pode ocorrer a alcalose respiratória. O consumo de alimentos pode ser reduzido de 20 a 30%, dependendo da intensidade e da duração do estresse, reduzindo consequentemente a produção leiteira. O estresse provoca a sudorese que, em excesso, pode causar perda de minerais e do equilíbrio ácido-base, prejudicando a absorção de nutrientes da ração que já é diminuída pelo estresse. O animal procura sombra adequada, e caso não a encontre à disposição, procura a sombra de outros animais e cercas, e procura pastejar de manhã e à noite, diminuindo o consumo. O estresse calórico, quando muito severo, pode levar a morte de muitos animais. O excesso de calor não só diminui a quantidade de leite, mas também a sua composição (qualidade). As vacas expostas à temperatura de 36 ºC reduzem 14% o teor de gordura do leite e 13% o teor de proteína. O estresse térmico pode reduzir a gordura diária do leite, diminuir a taxa de concepção, além da redução do peso do bezerro ao nascer, aumentando a incidência de mastite e até a retenção da placenta no parto. Com a elevação da temperatura uterina, cria um ambiente hostil ao embrião e pode causar o aborto. O aumento da transpiração dá-se com temperatura de 32 ºC e hiperpneia com 33º C. Em novilhas, o ambiente quente retarda a BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 41 puberdade em determinadas raças oriundas de países frios ou temperados e, quando aparece o cio, é bem deprimida. As altas temperaturas provocam a diminuição da duração do estro e o aumento de ovulação silenciosa (sem manifestação). Nas vacas, o estresse pelo calor causa anormalidades nos óvulos, e após a concepção a taxa de crescimento do embrião descresse proporcionalmente à duração de estresse térmico. Observando o corpo lúteo em vacas abatidas, observou-se que, nos primeiros cinco meses de gestação, ocorria a hipoplasia, e, nos últimos três meses, a hiperplasia. Até mesmo em inseminação artificial, a temperatura elevada provoca problemas de reprodução, pois nas novilhas em ambiente de conforto, a taxa de concepção varia em torno de 50%. E na temperatura de 32 ºC, praticamente não ocorre fertilização. O peso do bezerro da raça holandesa ao nascer, no verão, é em média 6 kg inferior a bezerros nascido nos meses mais frios. Nos machos, o estresse térmico prejudica mais a reprodução do que propriamente o ganho de peso, pois atua diretamente no sistema neuroendócrino e, consequentemente, na função reprodutiva, causando decréscimo de fertilidade nas épocas mais quentes do ano. Isto ocorre pelo fato das altas temperaturas provocarem a diminuição da quantidade e qualidade do sêmen, reduzindo o volume do esperma e, ainda, provocando maior formação de espermatozóides anormais. Estes problemas todos são devidos, em grande parte, ao aquecimento do testículo. Quando o estresse térmico é muito prolongado, pode ocorrer até a degeneração testicular, com hipertrofia e tumores adrenais. Thatcher e Coller (1981), trabalhando com touros, relatam que o aquecimento do local do testículo ou os ambientes quentes provocam uma diminuição da mobilidade espermática. Além disto, touros submetidos a altas temperaturas demoram para se recuperar completamente (cerca de 8 semanas), após voltarem à temperatura adequada. 42 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. Mesmo em touros da raça zebuína que suportam relativamente bem o calor, o sêmen coletado de animais expostos ao ambiente de 30 a 36 °C, durante mais de 30 dias, teve baixa qualidade. Um fator de ordem psicológica provocado pelo estresse calórico em touros é a inibição do instinto sexual e até a suspensão total da libido em machos. O grande problema dos efeitos do estresse provocado pelo calor intenso na questão reprodutiva de fêmeas e machos de bovinos prende-se ao fato de que é bastante difícil detectar esses efeitos maléficos pela grande maioria (para não dizer a totalidade) dos criadores, pois não possuem equipamentos nem a tecnologia necessária. 3.2. Termorregulação em bovinos Muitas raças de bovinos oriundas de países mais quentes encontram-se, em parte, já adaptadas a ambientes mais quentes e, inegavelmente, suportam bem temperaturas ambientais mais quentes que as raças de origem européia. Em ambiente com calor excessivo, os bovinos procuram a sombra de árvores, abrigos e até de outros animais, pois, sem dúvida, é um meio bastante eficaz de termorregulação. É bom ressaltar que a existência de sombras adequadas em pastagem proporciona aumento na produção de leite da ordem de 25% em relação a outras vacas expostas o tempo todo à radiação. Isto acontece porque a sombra pode reduzir em até 30% a carga de calor radiante sobre o animal. Dentre os processos fisiológicos de termorregulação em bovinos, nos ambientes quentes, está o aumento da frequência respiratória, mas quando o animal utiliza o ofego para dissipar calor, processo que permite a dissipação de até 25% de calor, com um tempo prolongado de estresse, pode ocorrer a diminuição excessiva de CO2 e provocar a alcalose respiratória. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 43 Outro processo, talvez até mais importante é a perda de calor por sudação. Esse processo faz com que a vaca holandesa perca 133 g/cm2 de pele por hora e 174 g/m2 em vaca Jersey. Em ambiente com umidade relativa não superior a 70%, a termorregulação por sudação tem um custo bem menor para o animal. Outro elemento que facilita muito a troca de calor para o ambiente por sudação é a presença de vento, sendo ideal vento de 7 a 9 km/hora. Além do ofego e da sudação, o animal reduz a ingestão de alimento, no intuito de diminuir a produção de calor pelo metabolismo, mas como consequência direta, todo o desempenho do animal é prejudicado e isso deve ser evitado ou atenuado a todo custo. Enquanto diminui a ingestão de alimento, aumenta o consumo de água, recurso para reposição das perdas de água por sudação e respiração, além do resfriamento corporal. Em estresse térmico elevado, o consumo de água pode aumentar de 50 para 100 litros por dia, e cada grama de água evaporada representa 582 calorias eliminadas (JOHNSON, 1987). Como modificações comportamentais para a termorregulação, o animal em altas temperaturas diminui o tempo gasto com o pastejo, aumentando o tempo de ócio. Além disto, modifica os horários de pastejo, alimentando-se mais na parte da manhã e à noite. Como foi visto, um dos efeitos mais graves pelo excesso de calor que compromete o desempenho reprodutivo, ocorre no macho, que é a deficiência na produção quanti-qualitativa dos espermatozóides. O primeiro meio de termorregulação que a natureza dotou esses animais, é o fato de os testículos serem alongados na bolsa escrotal, fora da cavidade abdominal (exo-orquidas) e serem ricamente vascularizados por artérias e veias espermáticas. Atribuise que esse mecanismo de termorregulação é responsável por cerca de 60% de estabilidade da temperatura escrotal, e o fato de a pele escrotal ser bem fina e com poucos pelos, facilita a dissipação de calor. 44 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. Outro meio existente é a túnica de dardos formada por músculos na face interna do testículo, controlado pelo hipotálamo. Em temperaturas quentes, a musculatura mantém a bolsa escrotal distendida, o que favorece a perda de calor. Quando a temperatura ambiente for baixa, os músculos contraem-se provocando o deslocamento do saco escrotal para mais próximo do abdômen e melhorando o aquecimento do testículo. E ainda, para controlar o efeito de calor externo, a bolsa escrotal possui grande número de glândulas sudoríparas que, pela perda de calor por sudação, contribuem para esfriar os testículos, que devem estar de 2 a 6 0 C inferior à temperatura corporal. 4. EFEITOS DO ESTRESSE TÉRMICO E TERMORREGULAÇÃO EM SUÍNOS 4.1. Estresse térmico em suínos Devido ao seu elevado metabolismo, sua capa subcutânea de tecido adiposo e seu sistema termorregulador ineficiente, por não apresentar a sudação, quando a temperatura retal atinge 44,4 oC, eles morrem por hipertermia, apresentando uma concentração nove vezes maior de ácido lático no sangue, e o pH cai para 7,37, indicando uma desorganização no processo de oxidação (MULLER, 1989). O estresse calórico diminui a eficiência reprodutiva dos suínos como decorrência da redução voluntária de consumo alimentar, inibição ou atraso no comportamento estral, decréscimo na taxa de concepção e aumento da mortalidade embrionária. A eficiência da utilização da energia metabolizável pelos leitões reduz-se linearmente com o aumento da temperatura ambiental. Essa deficiência decresce 0,8% para cada ºC de aumento da temperatura ambiente, acima da temperatura crítica do animal. Os suínos são muito sensíveis ao frio quando jovens e ao calor quando adultos. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 45 Há dificuldade de se determinar as temperaturas ideais de suínos pelo fato da grande variação entre categorias de animais. Segundo Perdomo (1994), de forma geral, as faixas são de 32 a 24 ºC para leitões do nascimento ao desmame, de 18 a 23 ºC, para leitões em crescimento e de 12 a 18 ºC para adultos. Fora desses padrões, o animal sofre estresse calórico. Os animais mais pesados são mais sensíveis ao estresse térmico do que animais mais leves. Quiniou et al. (1996) constataram que, no intervalo de temperatura ambiental de 19 a 29 ºC, o consumo foi reduzido de 50 g para cada grau Celsius em leitões pesando 50 kg PV e 90 g para cada grau Celsius em animais com 75 kg de peso. Em uma pesquisa, dois grupos de suínos foram submetidos a altas temperaturas de 32 e 35 ºC, verificando-se que os suínos a 32 ºC aumentaram o estresse à temperatura retal até 41 ºC no final de 6 horas, porém não houve mortalidade, mas os suínos submetidos a 35 ºC, por 3 horas, apresentaram mortalidade. Em reprodutores submetidos à temperaturas elevadas, a produção de sêmen pode ser prejudicada tanto na quantidade como na qualidade, até 50 dias após o estresse térmico, embora o processo total de espermatogênese seja de 40 dias. As porcas expostas em ambientes com temperatura elevada, nos primeiros 15 dias de gestação, reduzem a sobrevivência dos embriões, assim como no final de gestação produzem menor quantidade de leitões vivos. Altas temperaturas provocam o retardamento do início da produção de sêmen e também diminui a libido. Provocando-se o aquecimento do testículo ou a exposição de suínos a ambientes quentes, ocasiona a diminuição da mobilidade espermática e o aumento anormal do espermatozóide. (THATCHER e COLLER, 1981). Dentre todas as categorias de suínos, o excesso de calor prejudica mais o desempenho dos porcos lactantes, pelo fato de diminuírem a ingestão de alimento, que como conseqüência produzem menor quantidade de leite. 46 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. 4.2. Termorregulação em suínos Os leitões após o nascimento são sensíveis ao frio porque o processo de termorregulação ainda não está desenvolvido e por terem pouco isolamento térmico, como gordura subcutânea e escassez de pelo, daí a necessidade de aquecimento artificial aos leitões. Muito cuidado quanto aos limites de conforto térmico, pois a variação da faixa de temperatura ideal varia muito de acordo com a idade do animal. Em leitões recém-nascidos, a faixa ideal é de 30 a 32 °C, e à medida que eles crescem, essa faixa ideal vai diminuindo gradativamente até que, nos adultos é entre 12 e 18 °C. Na prática, para os leitões até o desmame a atenção deve ser voltada ao frio e, nos adultos, ao excesso de calor. Quando a temperatura ambiental ultrapassa o limite do conforto térmico, os suínos tentam controlar o excesso de calor alterando o padrão comportamental, ou seja, protegendo-se das fontes de calor, buscando áreas sombreadas e ventiladas, superfície mais fria e úmida, afastando-se uns dos outros e movimentando-se menos. O suíno pode perder calor por transpiração, porém as glândulas sudoríparas da pele são poucas e menos eficientes em relação a outras espécies, daí a recomendação de reservatório de água dentro da baia ou na forma de aspersão direta sobre os animais. Como acontece com todos os animais, aumenta a ingestão de água e diminui a ingestão de alimento. 5. EFEITO DO ESTRESSE TÉRMICO E TERMORREGULAÇÃO EM OUTROS ANIMAIS 5.1. Efeito do estresse térmico em outros animais O calor ocasiona desprendimento do acrossoma dos carneiros, diminuição da atividade metabólica do sêmen e aumento do pH. Estas BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 47 irregularidades estão relacionadas ao controle local de termorregulação dos testículos, pois o ideal é 5 °C abaixo da temperatura corporal (ENCARNAÇÃO, 1989). Foi constatado que em ovelhas acasaladas à temperatura de 32 °C, a porcentagem de fecundação foi de 26% e a 10 °C, a fecundação foi de 64,2%, concluindo-se que, a medida do possível, deve-se evitar o acasalamento no verão, pois nesta época ocorre a baixa qualidade do material de reprodução. Ambiente quente, em carneiro de raças provenientes de regiões temperadas, retarda o início da produção espermática, além de diminuir a libido em temperaturas elevadas, o que não acontece em raças oriundas do Mediterrâneo. Dutt e Hamm (1957) submeteram carneiros de dupla finalidade da raça Southdown a 32 °C e a 10 °C e concluiu que o volume de sêmen foi de 0,77 mL a 32 °C; 0,98 mL a 10 °C; e a mobilidade dos espermatozóides foi de 41,8 a 32 °C, e 73,3 a 10 °C; a concentração de espermatozóides em 10.000 mL foi de 243,3 à temperatura de 32 °C; 343,5 à temperatura de 10 °C, e o número de espermatozóides anormais foi de 36,9 (32 °C) e 6,4 (10 °C). Em ovelhas, altas temperaturas provocam grande perda de embriões nos estágios iniciais, embora a fecundação em si pareça não ser afetada. A exposição de ovelhas em gestação ao estresse calórico provoca elevada incidência de cordeiros mais leves e menos desenvolvidos que o normal, além do aumento da mortalidade de animais novos. Inseminando artificialmente coelhos com esperma cultivado a 40 °C, por três horas, observou-se que diminui a sobrevida do embrião. A imersão do escroto de cobaias durante 10 minutos, em água a 47 °C, provocou degeneração dos tubos seminíferos e foram necessários 45 dias para voltar ao normal e para não se verificar nenhum efeito quando a temperatura foi de 45 °C. 48 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. VI. ADAPTAÇÃO E EVOLUÇÃO DOS ANIMAIS 1. GENERALIDADES Neste ano de 2009, em que se comemora os duzentos anos da existência de Darwin, fala-se muito em evolução dos animais e que estes, para se adaptarem ao meio ambiente em constante mudança, foram sofrendo modificações morfológicas e fisiológicas para se adaptarem às mudanças climáticas que ocorreram no decorrer de milhões de anos, e somente os que conseguiram adaptar-se é que evoluíram. Por outro lado, os cristãos crêem que Deus é o Criador e que Ele não só fez o mundo como todos os seres vivos, vegetal e animal. Os céticos afirmam que “naquele tempo” não existiam os animais que existem hoje. Com certeza não, mas será que Deus, com a divina sabedoria, não dotou os animais com a capacidade para se adaptarem e de evoluírem de acordo com as mudanças ambientais que certamente iriam acontecer? Se isso aconteceu, está plenamente justificado o aparecimento de espécies diferentes daquelas criadas por Ele. Não vamos aqui polemizar a origem dos animais e sim estudar as adaptações dos animais para garantirem o seu bem estar e, consequentemente, a sobrevivência. Considera-se um animal adaptado quando este apresenta o mínimo de perdas no desempenho produtivo, boa eficiência reprodutiva, resistência às doenças, longevidade e baixa taxa de mortalidade, estando exposto a agentes extressores que anteriormente lhe eram prejudiciais ou fatais. Segundo Baccari (1986), a evolução é a consequência da contínua adaptação das populações frente às mudanças ambientais e que foram modelandose paulatinamente ao longo de bilhões de anos. Neste particular, a seleção natural é o principal responsável por esse processo de modificações contínuas. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 49 Isto significa que os organismos que hoje existem, evoluíram gradativamente de algum antepassado, e nessa seleção natural contínua, somente os indivíduos mais aptos sobrevivem, ou seja, aqueles que conseguirem adaptar-se às condições do meio ambiente deixam seus descendentes que continuam evoluindo, os que não conseguem esta evolução contínua, sucumbem e tornam-se os ditos “animais extintos”. Quanto maior o grau de adaptação, maior a tendência da sobrevivência e reprodução do animal de forma que suas características biológicas persistam. 2. NOÇÕES GERAIS DA ADAPTAÇÃO E EVOLUÇÃO DOS ANIMAIS 2.1. Conceitos de adaptação O conceito genético de adaptação refere-se às características herdáveis que possibilitam a sobrevivência de uma espécie em determinado ambiente, podendo resultar da seleção natural, que envolve modificações evolutivas espontâneas através de gerações, ou seja, animais que conseguem adaptar-se geneticamente sobrevivem ou da seleção artificial, na qual, através do melhoramento genético dos animais, ocorre a incorporação de características desejáveis impostas pelo homem Já segundo o conceito biológico, adaptação é o resultado da ação das características morfológicas, anatômicas, fisiológicas, bioquímicas e comportamentais para proporcionar o bem-estar e a possibilidade de sobrevivência de um animal em um ambiente qualquer. 2.2. Formas de adaptação O animal apresenta diferentes respostas frete à pressão do ambiente, que podem ser definidas como: 50 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. • Adaptabilidade: a capacidade que o animal tem de se adaptar, ou seja, a habilidade de que o animal dispõe de se ajustar ao ambiente em que vive, até nos extremos climáticos. • Aclimatação: ajuste fisiológico ao longo do tempo que resulta na tolerância aumentada ao complexo de estressores imposto pelo meio a que o animal se submete. • Aclimação: quando o animal se adapta a uma única variável climática (por exemplo: temperatura). 3. ASPECTOS MORFOLÓGICOS E FISIOLÓGICOS PREPONDERANTES NA ADAPTAÇÃO DOS ANIMAIS Segundo Silva (2008), “a superfície externa do corpo representa a principal linha de fronteira entre o organismo e o ambiente, sendo a outra linha constituída pelos tecidos pulmonares e respiratórios”. Essa condição de fronteira determina as características da superfície externa do corpo, em função do ambiente e da natureza do organismo. Assim, animais que vivem em desertos e locais extremamente secos devem possuir proteção extra contra a perda de água e a intensa radiação solar. Os que são próprios de regiões frias necessitam de um isolamento adequado contra a perda de energia térmica. As espécies de regiões muito quentes devem ser capazes de transferir o excesso de energia metabólica para o ambiente e, ao mesmo tempo, evitar a entrada de calor procedente do ambiente. Outros ainda, que vivem em regiões de considerável variação climática, nas quais extremos de frio se alternam com extremos de calor, necessitam possuir características externas apropriadas à compensação destas bruscas alterações ambientais. Baseado nas informações deste ilustre docente de bioclimatologia animal, podemos entender a importância do estudo da superfície corporal do animal em sua adaptação ao ambiente com alterações constantes, algumas em poucos anos e outras em milhares de anos. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 51 Como o ambiente é complexo com muitas alterações, a superfície externa do corpo do animal deve ser dotada de adaptabilidade para se ajustar a variações do ambiente e assim poder sobreviver em ambiente inóspito. Para melhor compreensão dos conceitos envolvidos, devemos lembrar que a superfície cutânea é constituída por: capa externa, epiderme, derme e hipoderme (Figura 7). Figura 7. Esquema da superfície cutânea. 3.1. Capa externa A capa externa constitui a cobertura dos animais e os principais tipos são: pêlos, lã e epiderme nua (sem cobertura) nos mamíferos, 52 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. penas e penugem nas aves, escamas e couro nos peixes, escamas córneas em répteis, e superfície nua nos anfíbios. Entre os mamíferos, o pelame ou o conjunto de pêlos é a principal proteção térmica. Proporciona uma barreira do fluxo de calor sensível por meio do isolamento proporcionado pela estrutura e, principalmente, pelas camadas de ar aprisionadas entre os pêlos. Outra forma de cobertura é a lã, que pode ser densa, como em ovinos, e menos densa, como nos camelos. A lã pode servir de proteção para animais de clima frio, assim como os que vivem em clima quente e seco. Os ovinos primitivos apresentam sobre o velo de lã uma segunda camada de pelos grossos e mais compridos, e que serviam de proteção para não molhar a lã nas chuvas, pois, se isso acontecer, a lã encharcada não serve para isolamento térmico. A plumagem das aves apresenta uma gama de variações de tipos de penas quanto ao tamanho e à forma. Os principais tipos são as penas de contorno, que são predominantes e dão formato às aves, com penas maiores nas asas, que auxiliam nos vôos. As penas são constituídas na parte inferior por uma formação plumácea, com a parte superior ou as extremidades mais rígidas. Abaixo dessas penas, existem as penugens, que são filamentos localizados na base das penas de contorno, e sua função é essencialmente de isolamento térmico, por isso os pintinhos recém-nascidos, até aos doze dias de vida, são totalmente cobertos de penugem, pois, nesse período, necessitam de calor (32 ºC). Existem ainda, a semipluma, que é o intermediário entre a pena e a penugem e a filopluma que é semelhante a pêlos. Algumas aves possuem uma glândula uropígia que produz secreção oleosa, localizada sobre a última vértebra caudal e elas passam periodicamente essa secreção com o bico nas penas para impermeabilizar, e assim evitar que as penas se molhem nas chuvas e de maior utilidade para s aves aquáticas. Os animais desprovidos de capas protetoras, com a superfície corporal constituída de epiderme nua, têm outros meios de termorregulação para manter a temperatura corporal. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 53 3.2. Epiderme A epiderme é constituída pelos estratos: Stratum corneum, se encontra na porção mais externa e é composto por células mortas e queratinizadas, Stratum lucidum, constituído por uma fina camada de células, Stratum granulosum, zona de transição entre células viáveis e queratinizadas e Stratum germinativum, onde se encontram células cilíndricas responsáveis pela reposição das camadas superficiais (Figura 8). Figura 8. Camadas da epiderme (SILVA, 2000). Um aspecto muito importante da epiderme é a pigmentação, ou seja, a cor escura (negra e marrom) da pele e do pelame dos animais. A cor escura da epiderme e seus anexos são proporcionados pela formação de melanina, que é formada pela oxidação de um composto ortodi-hidroxifenílíco do aminoácido tirosina. Este pigmento tem como principal função a proteção contra radiação ultravioleta, fator muito importante na adaptação de animais em climas quentes. A melanina é produzida por células especializadas, os melanócitos, que se localizam na camada basal da epiderme e na base 54 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. dos folículos pilosos. A produção esquemática de melanina, denominada melanogênese, é apresentada nas Figuras 9, 10 e 11. Figura 9. Esquema da melanogênese (SILVA, 2000). Figura 10. Representação esquemática de um melanócito inserido entre células da camada basal da epiderme (SILVA, 2000). BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 55 Figura 11. Formação dos grânulos de melanina nos melanócitos (SILVA, 2000). A cor da capa externa é fundamental na preservação da espécie, pois apresenta as seguintes funções: camuflagem, para não ser percebido pelos predadores ou para poder aproximar-se sem ser visto pela presa, sinalização e atração sexual, pois alguns animais e particularmente as aves, mudam de cor quando atingem a maturidade sexual, e também, na maioria das espécies, o macho é bem mais colorido, e relacionado à radiação solar dependendo da cor, varia na intensidade de absorção ou reflexão da radiação solar, influenciando diretamente no conforto térmico dos animais. O grau de pigmentação está vinculado aos fatores climáticos, principalmente em relação à radiação solar. De modo geral, animais que vivem em regiões quentes e úmidas apresentam maior pigmentação, embora não haja diferença no número de melanócitos por unidade de área da epiderme. Portanto, o grau de pigmentação está relacionado à 56 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. quantidade de grânulos de melanina. Nas raças européias de bovinos, como a Holandesa e a Hereford, também existem melanócitos nas áreas despigmentadas, mas com pouquíssima produção de melanina. 3.3. Derme Entre as camadas que compõem a pele dos animais, a derme é uma das principais, uma vez que nela se encontram o folículo piloso, as glândulas sudoríparas, as glândulas sebáceas, além dos vasos sanguíneos, das fibras nervosas e das fibras musculares. O folículo piloso constitui um desenvolvimento de epiderme, ou seja, é a invaginação do Stratum glanulosum e spinosum, cujo número é estabelecido pela carga genética. De um modo geral, o animal já nasce com um número definido de folículos, de acordo com a característica da espécie e raça. Em bovinos, os folículos pilosos formamse no período de gestação, aos 78 dias (SILVA, 2000). Considerando a superfície corporal total do animal, alguns autores observaram que o número de unidades por área diminui com a idade. Em bovinos, estabiliza-se aos dois anos de idade, quando se encontra plenamente desenvolvido. Conforme Turner et al. (1962), o gado europeu, ao nascer, apresenta 23.300 folículos por cm² e, aos seis anos, apenas 887 folículos por cm², mas, como o animal é bem maior nessa idade, o total de folículos no corpo do animal não varia. Quanto ao tipo de folículo, varia de espécie para espécie e também entre raças, podendo ser comprido e grosso, curto e liso ou suave e lanado. Em bovinos, todos são provenientes de um único tipo de folículo, variando apenas em fios finos e grossos. Em ovinos, existem os folículos primários, que originam os pêlos e desenvolvem-se primeiro, e os folículos secundários, que produzem a lã e se desenvolvem ao redor dos primários (Figura 12). Pêlos compridos e grossos retêm muito ar entre a pele e a capa externa, dificultando a perda de calor, adequados, portanto, ao clima BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 57 frio para proteger da perda de calor. Por outro lado, o curto, liso e suave facilita a perda de calor e serve para os animais de regiões quentes. Pêlos curtos e brilhantes refletem o calor e também facilitam a perda por convecção. Em dias frios, os pelos compridos estão entremeados com fibras finas para proporcionar uma cobertura melhor. Figura 12. Folículo secundário de ovino (A) e folículo piloso primário (B) (SILVA, 2000). O folículo piloso (Figura 13) é constituído de cutícula com células escamosas à semelhança de telhas, córtex, cujas células são cornificadas, com crescimento semelhante ao da unha, e é a camada que dá a cor do pêlo, medula, que dá a coloração escura, isto é, todos os pelos que apresentam medula são pretos e bulbo, onde se encontram os melanócitos. Além destes constituintes, o folículo piloso está associado ao músculo eretor, o eretor pilum, responsável pela ereção do pelo. 58 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. Figura 13. Folículo piloso (MULLER, 1982). Conforme Silva (2000), uma vez completamente desenvolvido o folículo, o cumprimento do pêlo se faz alternadamente entre o período de crescimento e o período de quiescência, isto é, passa por uma fase ativa (anagênica), fase intermediária (catagênica) e fase de repouso ou quiescência (telogênica). O crescimento do pêlo ocorre pela intensa divisão mitótica das células do bulbo, que recebe a irrigação sanguínea através do papilo, e após a sua formação, as células migram para a extremidade onde se localizam as células queratinizadas, que ocorre pela transformação das proteínas citoplasmáticas em fibras queratinosas, acontecendo a desintegração das células e a decomposição do citoplasma e do núcleo. Os ciclos da atividade folicular ocorrem por mudas. No caso de bovinos, por exemplo, ocorrem duas mudas influenciadas pela temperatura e pelo fotoperíodo, isto é, na primavera apresenta pelame de verão, com pêlos curtos e grossos, e no outono, pelame de inverno, com pêlos longos e finos. Quanto à cor do pelame ou plumagem, podemos observar que com a pigmentação escura ocorre maior absorvidade e menor BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 59 refletividade da radiação solar, e consequentemente, maior armazenamento de energia térmica. Com a pigmentação clara, ocorre maior refletividade, mas maior transmissão de energia absorvida, principalmente radiação ultravioleta. Portanto, para animais criados em clima tropical como o nosso, é importante o pelame de cor branca ou clara com pelos grossos, curtos e bem assentados, sobre uma epiderme bem pigmentada. As glândulas sudoríparas, responsáveis pela produção e secreção de suor, desempenham um dos mais importantes papéis na termorregulação quando a temperatura ambiente supera a temperatura de conforto térmico. Com exceção de roedores e lagomorfos, todos os animais placentários utilizam a sudorese termorreguladora para dissipar calor para o meio ambiente. Entretanto, alguns animais, como cães e suínos, apresentam poucas glândulas sudoríparas, portanto utilizam outros processos para dissipar calor. Existem dois tipos de glândulas sudoríparas: écrinas e apócrinas. As écrinas, presentes no homem, localizam- se na camada papilar (Figura 14) e são compostas por uma parte secretora e outra parte excretora. O suor é produzido na parte secretora, que é constituída por uma camada basal e outra de células microepiteliais, além de uma camada de células epiteliais cubóide. A composição do suor produzido desta forma apresenta 99% de água e 1% de sais, principalmente NaCl e KCl, porém grande parte dos sais é reabsorvido pelo canal excretor. Outro tipo de glândula é denominado de apócrina, pois está diretamente associado ao folículo piloso, isto é, o bulbo do pêlo chega até o fim da camada papilar. O folículo piloso está do lado obtuso, e abrindo no folículo piloso, está o músculo eretor do pêlo (Figura 15). A composição do suor dessa glândula é de 94,5% de água, 5% de cloreto e outros sais e 0,5% de albumina. Para ser excretado o suor, uma parte da célula se rompe, e a secreção cai na luz da glândula. Quando a célula se desintegra, uma parte do citoplasma acompanha o suor, o núcleo das células permanece e recompõe-se novamente a partir do 60 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. núcleo e do resto do protoplasma que sobra. Dos animais homeotermos, o que tem as glândulas sudoríparas mais ativas é o cavalo (MULLER, 1982). Figura 14. Localização da glândula sudorípara do tipo écrina (MULLER, 1982). Figura 15. Localização da glândula sudorípara do tipo apócrina (MULLER, 1982). Existem ainda, as glândulas sebáceas, que localizam-se também na derme e formam um apêndice ou um anexo dos folículos pilosos de alguns animais e também em conjunto com as glândulas sudoríparas. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 61 As glândulas sebáceas produzem substâncias gordurosas que são excretadas com o suor e têm a finalidade de lubrificar as fibras (pelos ou lã) e, com isso, há maior proteção à radiação solar e também ao encharcamento. 3.4. Hipoderme A hipoderme é constituída de células adiposas, e no caso de suínos, pela camada de gordura (toucinho) e também de fibras musculares estriadas. As células adiposas têm a função de estoque de energia, mas podem funcionar também como camada termo-isolante em alguns animais. 4. ADAPTAÇÃO E EVOLUÇÃO POR ESPÉCIES 4.1. Generalidades Não vamos aqui discutir a evolução dos mamíferos e aves desde os tetrápodes primitivos da era paleozóica, há quase trezentos milhões de anos, e sim levantarmos as principais alterações genotípicas, fenotípicas e até os comportamentos que os animais vêm experimentando nos últimos tempos para facilitar sua vida ou melhorar a produtividade no meio em que vivem. Como os atuais animais criados pelo homem foram domesticados há milhares de anos, como bovinos (9.000 anos), ovinos (10.900 anos), caprinos (9.500 anos), suínos (9.000 anos), equinos (4.800 anos) entre outros, poucas adaptações ocorreram, porque o homem praticamente garante a sua sobrevivência. O que não acontece com os animais que continuam na natureza e têm de adaptar-se ao meio em que vivem. Nos animais domésticos, ocorrem algumas adaptações, principalmente envolvendo a seleção artificial, que é a incorporação de características desejáveis, efetuadas pelo homem. 62 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. Com esse levantamento, quem sabe, surjam idéias que possam melhorar a produtividade dos animais, mas o mais importante, a nosso ver, é o conforto dos animais que estão sob nossa responsabilidade e que, muitas vezes, esquecemos que são seres vivos, que talvez sintam como nós, e encaramos como sendo uma máquina de produzir alimento, trabalho e lazer. 4.2. Adaptação e evolução das aves Existem poucos estudos sobre a adaptação de aves, porém, na natureza, ocorreram e continuam adaptando-se para garantir satisfatoriamente sua sobrevivência. O mergulhão ou biguá é uma ave totalmente negra e permanece longo tempo no alto dos rochedos, exposta à radiação solar, absorvendo grande quantidade de energia térmica, tendo a necessidade de aumentar o ritmo respiratório para dissipação de calor. À primeira vista, parece até estranha a cor negra, porém acontece que o biguá mergulha profundamente em água fria do mar a caça de alimento, e ao retornar à superfície, a ave está encharcada, o que provoca um resfriamento do corpo. Para se aquecer rapidamente, a ave procura expor ao sol a maior área corporal possível, com as asas abertas, e neste sentido, a coloração negra favorece o rápido aquecimento. Alguns trabalhos sobre adaptações de aves para possibilitar a tolerância ao ambiente quente têm sido feitos com a introdução de genes, cujas características, comprovadamente, melhoram o seu bem-estar e, consequentemente, a produtividade. Uma alternativa ainda pouco explorada nas condições de clima quente em aves é a introdução do gene “pescoço pelado”. Esses genes reduzem em 30% o número de penas, aumentando a troca de calor da epiderme para o ambiente. Segundo Cahaner et al. (1993), em aves com empenamento normal e aves com gene de pescoço pelado, em ambiente de 23 e 32 ºC, a diferença de ganho de peso dos frangos foi de 22,5% em temperatura de 32 ºC, e de 7,1% em temperatura de 23 ºC. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 63 Existe também o gene do “empenamento tardio”. Ao promover o desenvolvimento tardio de penas, deixa a área do dorso das aves quase sem penas até uma idade adequada. Os genes do tamanho da crista (“crista ervilha”) também melhoram a adaptabilidade das aves (COELHO e SALVINO, 2001). Outra adaptação em aves é a “pena crespa”, que condiciona o aumento do contorno de pena para o lado de fora do corpo das aves. Segundo Gowe e Farfull (1995) essa característica implica na seleção do tamanho das penas, melhorando a perda de calor pela cobertura de pena e, com isso, as aves produzem maior quantidade e ovos mais pesados que as galinhas com empenamento normal. Yunis e Cahaner (1999) estudaram o efeito do gene crespo em frangos de corte de crescimento rápido ou lento, em temperatura de 32 °C. Entre os frangos de crescimento lento, os de empenamento crespo apresentaram ganho de peso significativamente maior na 7ª semana de idade. Para os frangos de crescimento rápido, os autores não encontraram diferenças significativas. Até o momento foram apresentadas algumas adaptações de aves que o homem pode utilizar no melhoramento genético. Apenas por curiosidade, apresentamos um fato interessante em que um homem adaptou o café ao modo de viver de uma ave, para tirar proveito. No Programa Globo Rural do dia 22 de fevereiro de 2009, foi apresentada uma reportagem com o título “Café Macuco” falando sobre um agricultor de Minas Gerais que tinha grandes prejuízos, quase inviabilizando a cultura, porque macucos que vivem na mata próxima ao cafezal se alimentam do café enquanto cereja e o que restava era muito pouco. Então, o cafeicultor teve a idéia de coletar as fezes desses macucos com os grãos de café intacto e, após a extração dos grãos de café limpo, produziu um café especial muito saboroso, de alto valor comercial. Hoje, tem uma indústria com boa renda com a comercialização desse café-macuco até para o exterior. 64 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. 4.3. Adaptações e evolução de bovinos Quanto à adaptabilidade dos bovinos, as raças de origem indiana ou africana, como a Nelore, parecem ser o padrão de adaptabilidade, a começar pelas pernas longas, o qual dá maior distância da radiação por reflexão do solo e, ao mesmo tempo aumenta a área com maior possibilidade de eliminar calor, e o pelame branco, constituído de pêlos curto e lisos que apresentam mais reflexão da radiação e permitem elevada dissipação de calor. Neste particular, os animais da raça Aberdeen Angus, de pêlos opacos refletem 93 unidades das 1.000 que recebem de energia radiante, o Zebu, de pêlos brilhantes, refletem 198 unidades das 1000 que recebem. Além desses fatores, a pigmentação intensa da epiderme protege da radiação ultravioleta, e ainda os zebuínos apresentam barbelas e cupim, aumentando a área superficial onde ocorre maior troca de calor. Udo (1978), estudando animais da raça holandesa no Quênia, recém-importados da Europa, encontrou que, nos primeiros 12 meses, ocorreu aumento no número de pêlos modulados, ao passo que os pêlos não modulados caíram gradualmente. Conforme Silva (1999), a cobertura pilosa apresenta papel muito importante na adaptação de bovinos nos climas tropicais, principalmente refletindo a radiação solar, pois o calor proveniente da mesma pode ser três vezes maior que o calor produzido pelos processos metabólicos. Silva et al. (2001), estudando a transmissão de radiação ultravioleta através do pelame e da epiderme de bovinos, concluíram que a combinação ideal para ambiente tropical é um pelame branco com baixo valor de massa de pêlo sobre epiderme negra. Mas, como é difícil encontrar esta pelagem em raças européias, sugeriram como alternativa uma pelagem negra com baixo valor de massa de pêlo. Não sendo aconselhada pelagem vermelha pela alta transmissão de radiação ultravioleta através da epiderme e da pelagem. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 65 Desenvolvendo um estudo genético e adaptativo com vacas Holandesas, em ambiente tropical, sobre as características do pelame, Maia et al. (2003) analisaram a espessura da capa, o comprimento médio do pêlo, o número de pêlos por unidade de área, a densidade de massa de pêlos, o ângulo de inclinação dos pêlos em uma área localizada a 20 cm abaixo da coluna vertebral no centro do tronco e concluíram que o pelame preto é menos denso, com pelos curtos e grossos, devido à maior necessidade de perder calor, o pelame branco é mais denso e com pelos mais compridos, oferecendo melhor proteção à radiação solar direta. Sugeriram para a seleção, vacas predominantemente negras, pois além das características de pelame e epiderme, as de manchas negras são altamente pigmentadas, conferindo maior proteção contra radiação ultravioleta. Bianchini et al. (2006), estudando a tolerância do calor entre raças naturalizadas Curraleiro, Mocho Nacional, Crioulo Lageasso, Pantaneira, e Junqueira, com Nelore e Holandesa, observaram que as raças Crioulo Lageano e Pantaneira apresentaram maior espessura de pêlo. A raça Mocho Nacional apresentou maior espessura da pele, concluindo que as raças Curraleiro e Junqueira foram mais tolerantes ao calor, demonstrando que, entre as estudadas, estas duas raças estão mais bem adaptados ao nosso país. Ao estudarem a adaptabilidade de bovinos da raça Pé duro às condições climáticas do semi-árido do Piauí, Azevedo et al. (2008) analisaram a temperatura retal e a frequência respiratória e concluíram que, nas condições ambientais estudadas, a raça Pé duro já se encontra adaptada ao clima do semi-árido do Piauí. 4.4. Adaptação e evolução de suínos Segundo Muller (1982), os suínos são animais de pouca adaptação aos climas quentes, sobretudo às altas temperaturas, porque possuem alto grau de domesticação. Ao estudar a adaptabilidade de 66 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. vários animais a altas temperaturas, este autor observou que o animal menos adaptado foi o suíno e o melhor, o carneiro da raça Merino. Robson, submetendo dois grupos de suínos às temperaturas elevadas de 32 a 35 ºC, obteve os seguintes resultados: os suínos submetidos à temperatura de 32 ºC apresentaram elevada temperatura retal, cerca 41 ºC, mas após 6 horas de exposição não morreram, enquanto os animais expostos à temperatura de 35 ºC, morreram após 3 horas. A pelagem do suíno é um elemento importante na adaptação deste animal, porque eles são muito sensíveis ao calor e têm poucos recursos de termorregulação. Os animais da raça Duroc, que são vermelhos, suportam muito melhor temperaturas elevadas do que os animais da raça Polland China, que são de cor predominantemente preta. Portanto, animais da raça Duroc têm melhor adaptabilidade que animais da raça Polland China. 4.5. Adaptação de outros animais Os ovinos da raça Merino são bem adaptados às regiões semiáridas com pouca água e resistem à desidratação em ambientes com alta temperatura. Macfarlane et al. (1966) comparam essa capacidade da raça Merino à do camelo, por apresentar alta eficiência na perda de calor pela respiração. As cabras Jamnapar, que vivem na Índia, são adaptadas às elevadas temperaturas e têm uma vida normal, mesmo que o calor chegue a 47,8 ºC, dados os pêlos modulados que servem de proteção. Na verdade, são encontrados infindáveis exemplos de adaptação de animais no estado selvagem, porque, sem a atuação do homem, eles têm de se adaptar da melhor maneira possível aos próprios recursos de que dispõem. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 67 VII. ATUAÇÃO DO HOMEM NO BEM-ESTAR DOS ANIMAIS 1. GENERALIDADES Pelo que foi visto nos capítulos anteriores, observamos que proporcionar ao animal um estado em que as necessidades fisiológicas, ambientais, nutricionais e sociais estejam satisfeitas é quase impossível. Isto porque existem muitos fatores estressantes que atuam na vida do animal e, como se não bastasse, os animais domésticos são muito sensíveis as oscilações de temperatura, umidade e outros fatores climáticos. Em nosso país, como já foi dito, um grande causador do estresse é a temperatura ambiental e com destaque o calor excessivo, porque o animal tem uma faixa muito estreita de conforto térmico, em que se encontra em termoneutralidade, ou seja, o animal não necessita acionar o mecanismo de termorregulação para manter a temperatura corporal desejável e esses mecanismos além de não serem muito eficazes na maioria dos animais, consomem energia que poderia ser direcionada para o processo produtivo. Lembrando ainda que, quando a temperatura ambiente se torna abaixo da temperatura crítica inferior o animal entra em hipotermia ou quando ultrapassa a temperatura crítica superior o animal entra em hipertermia e em ambos os casos o animal se encontra em estresse extremo, com excessivo desgaste, pois não consegue manter a temperatura corporal aos níveis de sobrevivência, quando o estresse ultrapassa em tempo ou em intensidade o animal sucumbe. Isto acontece com certa frequência em animais altamente produtivos importados de clima mais ameno na tentativa desenfreada de aumentar a produtividade, mas se esquecendo das diferenças entre os ambientes. Diante desses fatos, passamos a apresentar algumas técnicas que o homem pode desenvolver para proporcionar o bem-estar do animal e como consequência maior produtividade. Salientamos que, 68 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. o mesmo objetivo neste capítulo, não é dar as técnicas para a criação de animais, seja em termos de instalação, equipamentos ou manejo. Mas, elencar trabalhos científicos de renomados pesquisadores que provaram ser possível proporcionar o bem-estar dos animais, muitos dos quais, de fácil execução, apenas com o bom senso e vontade de melhorar. 2. ESTRATÉGIAS DE ALIMENTAÇÃO E CONFORTO TÉRMICO Um dos manejos importantes que deve ser adotado na tentativa de amenizar o estresse térmico dos animais é o alimentar. Uma das primeiras respostas comportamentais do animal em estresse térmico por temperatura elevada é a diminuição na ingestão de alimento com consequente prejuízo na produção. Dessa forma algumas medidas podem ser tomadas, como: • Fornecimento de água: os animais devem ter acesso fácil à fonte de água limpa e fresca com temperatura entre 18 a 24° C, com bebedouros colocados à sombra. • Manejo alimentar: oferecer aos animais, nas horas mais frescas do dia, maior número de refeições, devendo os alimentos ser colocados em alimentadores à sombra. • Uso de gordura ou óleos nas rações: a ração deve possuir elevado conteúdo energético e alta digestibilidade, proporcionando baixo incremento calórico, compensando a redução no consumo de alimento. • Redução do teor protéico das rações: a redução do teor de proteína na ração diminui o incremento calórico, além do fato da metabolização do excesso de proteína ter elevado custo energético. Essa redução deve ser acompanhada da suplementação com aminoácidos essenciais, principalmente lisina e metionina, para não comprometer o crescimento dos animais; BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 69 • Uso de dietas úmidas ou líquidas: proporciona aumento no consumo de alimento, favorece o consumo de água e permite o uso de ingredientes líquidos. • Suplementação de dietas: alimentos como alguns minerais que atuam no balanço hídrico, iônico e metabolismo, ou outras substancias, como vasodilatadores, podem atuar positivamente na fisiologia do animal. 3. ATUAÇÃO DO HOMEM NO BEM-ESTAR DAS AVES Hoje se fala até em Avicultura de Precisão com emprego de sensores e autuadores em toda instalação para coleta de informações com métodos avançados de controle e rastreamento do ambiente das aves (galpão) com processo inteiramente informatizado. Embora esse sistema com certeza seja extraordinário, podendo-se alcançar a produtividade máxima do potencial genético das aves, o nosso trabalho é muito mais modesto e procuramos aqui selecionar algumas técnicas que sejam viáveis, se não pela totalidade, pelo menos pela maioria dos avicultores. 3.1. Instalações Segundo Tinoco (2001), adequar as edificações avícolas de um determinado local, significa criar e construir espaços ajustados às necessidades dos animais, possibilitando condições favoráveis de conforto. Dessa forma, o galpão deve ser posicionado no sentido leste oeste para que o sol caminhe no sentido da cumeeira e a radiação solar não incida diretamente na parte lateral do galpão, evitando desta forma que os raios solares incidam dentro do galpão. Para diminuir ainda mais essa possibilidade, recomenda-se o beiral de 1,5 a 2,5 m, com inclinação de 45 graus em relação ao piso, a largura do galpão de 70 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. 8 a 14 m, com pé direito de 2,80 a 4,10 m, sendo o mais indicado a largura de 10 m e pé direito de 3,0 m e que seja mantida a distância entre galpões de 35 a 40 m (TINOCO, 1996). O uso de cortinas na lateral do galpão também pode ser interessante, para isto recomendase a de cor azul por ser mais eficiente que a de cor amarela. Hardoin (1989) recomenda para regiões quentes o lanternin no telhado com abertura adequada para cada região (geralmente 10% da largura do galpão) em toda extensão do galpão, pois esta medida favorece a saída do ar quente na parte superior (lanternin), além disso, é muito importante a renovação do ar com impurezas e entrada de ar mais limpo. Outra prática interessante é pintar de branco a parte superior da cobertura seja ela qual for, pois esta prática diminui em 50% a radiação solar, reduzindo a temperatura interna em até 8 °C (TEETER, 1990). Segundo Avila et al. (2003) a altura do pé direito está relacionada a largura do galpão, recomendando o seguinte: até 8 m de largura, pé direito de 2,8 m; 9 a 10 m de largura, 3,5 m de pé direito e 12 a 14 m de largura, 4,9 m de pé direito. Entretanto, em locais com ocorrência de fortes ventos é recomendado que a altura não ultrapasse 3 m e o comprimento esteja entre 100 a 125 m. O piso é importante para proteger o interior do aviário contra a entrada de umidade, facilitando o manejo. Avila et al. (2003) salienta que o material do piso deve ser de material lavável, impermeável e não liso. É indicado o tijolo deitado rejuntado com argamassa que apresenta boa condição de isolamento térmico e possibilita a lavagem com boa desinfecção. Silva et al. (2006) avaliando o bem-estar das aves desenvolveu um trabalho comparando o sistema de cama (coletiva), ninho e sistema de bateria de gaiolas, e observaram, pela análise do comportamento, que o sistema de cama apresentou melhor conforto nas aves. Uma das práticas recomendadas é o plantio de grama em volta dos galpões para diminuir a carga térmica de radiação em climas BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 71 quentes, assim como plantio de árvores na face leste ou oeste das construções, cuidados que praticamente não oneram o projeto e podem reverter completamente uma situação de desconforto (TINOCO, 2001). Outra orientação da autora é procurar construir os galpões após estudo detalhado da topografia do terreno, da localização do galpão, de tal maneira que favoreça a ventilação dentro dos galpões para renovação do ar com impurezas tais como poeira, amônia, CO2 e outros gases nocivos além de refrescar o ambiente podendo até fazer um renque de vegetação com a finalidade de canalizar o fluxo de vento para o galpão, considerando que o vento com velocidade até 2,0 m/s em torno das aves é capaz de reduzir a sensação térmica em até 8 °C. May et al. (2000) testaram a influência da velocidade do vento dentro do galpão no consumo de água e alimento, concluindo que aves de 21 a 49 dias de idade com alta velocidade de vento consumiram menos água e maiores quantidades de ração, isto nos mostra que o vento diminui o estresse térmico, porque o estresse térmico as principais reações das aves é maior consumo de água e redução do consumo de ração. O ambiente interno de uma instalação é o resultado das condições locais externas, da característica da construção, do material de construção, da espécie e número de animais por área, do manejo, do sistema produtivo e do condicionamento ambiental (BAETA, 1997). O conforto térmico no interior do galpão é de extrema importância. O excesso de frio e, principalmente, o excesso de calor, quase uma constância em nosso país, revertem em um menor desempenho e em situações extremas a mortalidade das aves. Quanto a escolha do tipo da instalação, esta deve atender em primeiro lugar a disponibilidade financeira do avicultor. De qualquer forma, o produtor tem que estar consciente de que, se não for capaz de construir uma instalação ótima, então é necessário se esforçar para tentar suprir as carências da instalação propriamente dita, com o manejo de cortinas, e também no manejo geral. 72 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. 3.2. Equipamento O equipamento mais comumente utilizado para melhorar as condições térmicas em galpões é o uso de ventiladores, e um dos aspectos importantes a ser considerado é o número adequado para o galpão, tomando o cuidado na especificação do aparelho, pois pode não estar atendendo a taxa mínima de renovação de ar (TURCO et al., 1998). A aspersão de água diretamente sobre a cobertura nas horas mais quentes do dia, com o objetivo de reduzir a temperatura do telhado e indiretamente, a temperatura ambiente, tem demonstrado bons resultados em frangos de corte com alta densidade (MATOS, 2000). O único inconveniente apontado pelo autor é o consumo de água, mas em locais com elevada disponibilidade de água, com certeza proporcionará ambiente melhor para aves. Muitos pesquisadores têm encontrado resultados surpreendentes com o Resfriamento Adiabático Evaporativo de galpões em região de clima quente, este sistema consiste em lançar vapor de água junto com a ventilação, isto é, uma associação entre ventilador e nebulização, ou seja, a formação de gotículas extremamente pequenas assegura evaporação muito rápida, portanto a gotícula não cai no piso umedecendo-o. Um sistema bem calibrado com água limpa é capaz de dividir uma gota de água em cerca de 612 gotículas com o diâmetro de 0,05 mm e com esse sistema pode reduzir a sensação de calor em até 12 °C. Testando sistemas de resfriamento evaporativo e o desempenho de frangos de corte Sartor et al. (2001) estudaram os seguintes sistemas: ventilação associada a nebulização, ventilação de alta rotação associado a nebulização e apenas a nebulização acoplada ao ventilador. Pelos resultados obtidos concluíram que o sistema evaporativo de ventiladores de alta rotação associado a nebulização e ventiladores associados a nebulização proporcionaram melhores resultados do que apenas o nebulizador acoplado ao ventilador. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 73 3.3. Manejo Como foi comentado em instalações e equipamentos o custo de algumas modificações é relativamente oneroso e muitos dos avicultores não podem dispor. Dessa forma, aqui neste item vamos apresentar o que se pode fazer para aumentar o conforto das aves, sem envolver altos recursos, mas, sobretudo a boa vontade e o bom censo do produtor. No estresse calórico devido a elevadas temperaturas a água é muito importante e através dela podemos propiciar as aves um melhor controle da temperatura corporal e neste particular a temperatura da água é um fator muito importante a ser considerado, sendo recomendado estar em torno de 20 °C (MACARI et al., 1994). Segundo Beker e Teeter (1994), o fornecimento de água a 12,8 °C diminui a temperatura retal das aves estressadas pelo calor, enquanto que a água a 24 °C não apresentou nenhum efeito. Esses autores concluíram que a água resfriada a 10 e 12,8 °C durante estresse provocado pela alta temperatura ambiente aumenta o consumo de ração e a taxa de crescimento. Macari et al. (1994) comenta que o principal regulador da sede parece ser a secretina encontrada no sangue e então com a adição de sais na água pode ocorrer variação osmótica. Alguns autores recomendam a incorporação de bicarbonato de potássio e bicarbonato de sódio para aumentar o consumo de alimento e a taxa de crescimento. Segundo Teeter et al. (1990), a adição de KCl na água aumentou o consumo de alimento e a taxa de crescimento, e que quando a temperatura da água foi inferior a temperatura corporal mesmo sem a adição de sal, também ocorreu estímulo a ingestão de alimento. Wiernusz e Teeter (1993) concluiu que a incorporação de uma mistura de sais (NaHCO3, KHCO3, KCl, NaCl) na água, aumentou a viabilidade, a taxa de crescimento e a eficiência alimentar em frangos de corte e melhorou a produção de ovos e a manutenção do peso corporal em poedeiras. 74 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. A adição de aditivos (NH4Cl, KCl, K2SO4) podem auxiliar no combate ao distúrbio do equilíbrio ácido-básico na alcalose respiratória, induzida pelo estresse calórico. Puron et al. (1994) observaram que a incorporação de 5% de bicarbonato de sódio em dietas de frangos alojados em alta densidade resultou em maior peso corporal e consumo de alimento. Segundo Borges et al. (2003), o balanço eletrolítico tem papel fundamental no mecanismo fisiológico das aves, representando uma importante ferramenta na disfunção causada pelo estresse por altas temperaturas ambiente. Além de sais, a suplementação da dieta com ácido ascórbico ao nível de 50 ou 100 ppm melhorou a eficiência reprodutiva das aves no verão (PARDUE et al., 1985). 4. ATUAÇÃO DO HOMEM NO BEM ESTAR DOS BOVINOS Quando se visa com maior ênfase a produtividade de bovinos, pura e simplesmente, a atenção se volta com maior enfoque na importação de raças de alta produtividade, na nutrição sofisticada, aspectos sanitários, etc. É verdade que estes aspectos são de extrema importância, porém, não se pode esquecer de outros aspectos que são tão importantes quanto e que podem até serem menos onerosos e viáveis na prática, e muitas vezes com melhor resultado. Vale salientar que esses animais melhorados, recebendo ração nutricionalmente correta, vivem em um ambiente. Por isto, não se pode deixar de dar a devida atenção às condições desse ambiente em que os animais permanecem dia após dia, semana após semana, mês após mês e até anos após anos. 4.1. Instalações A produção leiteira tem incrementado a produtividade, trabalhando com animais de alto potencial genético, utilizando alimentação de BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 75 qualidade superior com um investimento alto de capital, por outro lado para redução do custo/beneficio, as pesquisas em modificação das instalações vêm sendo realizado. (NAAS, 1998). Um dos aspectos bastante eficiente e de pouco investimento é o sombreamento, visto que no verão em horas de excessivo calor os animais deixam de alimentar e procuram sombras de arvores, das instalações e até de pouquíssima sombra em cercas. A recomendação de melhor sombreamento é o plantio de arvores com copa densa, porque as árvores têm maior eficiência na redução do calor que abrigos artificiais, pois sob as arvores os animais ficam expostos a menor radiação solar direta e maior ventilação natural. Na falta de árvores, recomenda-se o sombreamento artificial através de sombras portáteis ou abrigos permanentes. O importante desses abrigos é que seja de cobertura com laterais abertas o que dá melhores condições de renovação de ar. O sombreamento em piquetes de vacas leiteiras pode induzir o aumento de produção de leite em até 15%. A recomendação para abrigos permanentes é a altura mínima de 3,6 m com largura máxima de 15 m e instalada com distancia mínima de 15 m entre outras edificações, essas dimensões permitem a ventilação adequada, o piso deve ser de concreto áspero, para evitar que os animais escorreguem e com declividade de 1,5 a 2,0%, facilitando a limpeza do piso. Outro fato muito importante, caso seja possível, é a presença de lagos naturais ou represas artificiais para os animais se banharem. O fato de umedecer a superfície corporal favorece a ocorrência do resfriamento evaporativo, muito eficiente na diminuição da temperatura corporal. 4.2. Equipamentos Como os bovinos têm poucos meios de dissipar calor, mesmo em abrigos ou instalações, quando o calor é muito intenso, o animal 76 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. sente um estresse por calor, e nem sempre é possível manter represas adequadas ao banho. Uma forma muito efetiva é a aspersão de água em cima dos animais, provocando o resfriamento evaporativo, através da superfície corporal. Este aspersor deve ter uma pressão mínima de 20 libras por polegada quadrada. No México em região de clima tropical sub-úmido, vacas holandesas e pardo suíças, recebendo aspersão de água das 12h00 às 13h00 à sombra produziram 7% mais de leite (HERNANDES e CASTELLANOS, 1983). A aspersão de água se torna mais eficiente quando combinada com ventilação forçada através de ventiladores. Em Kentucky, este sistema promoveu um acréscimo de 15,8% na produção de leite (BUCKLIN et al., 1991). Outra possibilidade é a aspersão de água na cobertura das instalações, o que diminui em muito a temperatura, porém o consumo de água é bem maior que a aspersão diretamente no animal. A recomendação geral do uso da aspersão de água é quando a temperatura ultrapassa 27 °C e a umidade relativa for inferior a 70%. O máximo tempo de aplicação é determinado de acordo com a disponibilidade de água e, sobretudo o estado do estresse do animal. Um sistema que tem dado excelentes resultados é a associação de névoa de água com ventilação forçada, esse processo tem a vantagem de reduzir a água em gotículas de tamanho extremamente pequeno que ficam suspensas no ar e evaporam antes de umedecerem o piso ou a cama. Esse método necessita de um bom dimensionamento de equipamentos principalmente a posição e a velocidade dos ventiladores, pois estes mal posicionados podem levar as gotículas para fora da instalação. Lagana et al. (2005) avaliando o comportamento de vacas holandesas em Sergipe, testaram os tratamentos: aspersão de água nas horas mais quentes do dia (10h a 14h) e outro sem aspersão de água e concluíram que o consumo de água foi mais frequente nas vacas sem aspersão e que o conforto dos animais afetou diretamente no bem-estar dos animais. BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 77 Estudando a produção e composição do leite em sala de espera climatizada, testaram: sala de espera sem climatização, sala de espera com ventilação artificial e sala de espera com ventilação artificial e aspersão e concluíram pelos resultados obtidos, que a espera com ventilação e aspersão proporcionou melhor conforto aos animais, porém não resultou em aumento na produção leiteira pelo pouco tempo de permanência na sala climatizada (30 minutos/dia) (ARCARO JUNIOR et al., 2003). Souza et al. (2004), testaram um ambiente totalmente climatizado com ventiladores e nebulizadores e um ambiente sem climatização e concluíram que mesmo com os indícios indicando estresse leve ou moderado, os resultados foram melhores para o ambiente climatizado, indicando que os equipamentos (ventiladores e nebulizadores) ofereceram ambiente físico melhor para os animais. 4.3. Manejo Em ambiente muito quente, que provoca grande estresse, é importante atentar para o manejo na alimentação, isto é, manipular a concentração de minerais nas rações, embora isto não alivie do estresse calórico é uma tentativa de auxiliar a vaca na manutenção da homeostase (SANCHES et al., 1994). Ao alterar a proporção de proteína degradável e não degradável no rúmen, a suplementação com lipídios, alguns aditivos podem aliviar a fermentação ruminal e pode influenciar na quantidade de calor produzido pelo animal e com isso diminuir a produção de calor interno do animal. Outra maneira de aliviar o estresse calórico pelo manejo alimentar é a adição de gordura na ração, pelo fato da gordura ser altamente energética, em situação de menor consumo de alimento esta prática mantém o consumo de energia mesmo com pouca ingestão de ração. Segundo Knapp e Grummer (1991), vacas que recebem gordura na dieta em estresse calórico, não apresentam elevação na temperatura retal e nem na frequência respiratória. 78 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. Pode-se também diminuir o estresse calórico com a incorporação de niacina na ração, porque provoca uma vasodilatação o que beneficia a termorregulação. Peters (2008) estudou o efeito dos tipos de manejo aversivo e não aversivo no comportamento, produção e composição de leite de vacas e concluiu que o manejo aversivo altera o comportamento das vacas na ordenha, reduzindo o bem-estar animal, com diminuição da produção de leite de vacas com idade média de 60 meses. Um fato muito interessante é o manejo de água de beber, este deve estar sempre na sombra, com renovação constante se for possível e em quantidade de bebedouro suficiente para atender todos os animais, pois animais mais fracos, muitas vezes são impedidos de se aproximar ao bebedouro pelos animais mais dominantes e isso pode desestimular o consumo de água. Para determinar o tempo e a frequência de visitas ao bebedouro de vacas holandesas submetidas ao estresse térmico, Perissinotto et al. (2005) concluiu que as condições estressantes (calor excessivo) causaram aumento no número de visitas, no tempo de permanência dos animais nos bebedouros e também no tempo real de consumo de água pelos animais e a maior procura de água pelos animais ocorreu logo após a ordenha. 5. ATUAÇÃO DO HOMEM NO BEM ESTAR DE SUÍNOS Proporcionar conforto térmico em região de clima quente para suínos é uma tarefa muito delicada, isto porque as temperaturas ideais para suínos apresentam uma variação muito grande conforme a idade do animal, ou seja: recém nascidos de 30 a 32 °C, lactantes de 25 a 26 °C, na desmama 22 a 24 °C, de 25 a 48 kg de PV de 18 a 24 °C, de 45 a 90 kg de PV de 12 a 18 °C, matrizes e reprodutores de 12 a 18 °C (PEREIRA, 2005). Em uma granja suinícola existem todas estas categorias ao mesmo tempo, o que significa que cada instalação, de BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 79 acordo com a idade dos animais que abriga, deve apresentar uma temperatura especifica para proporcionar o bem estar dos animais. O que dificulta mais é que os suínos têm pouca capacidade de termorregulação, pois as glândulas sudoríparas nos suínos são poucas e menos eficientes que a maioria de outros animais, portanto o controle é precariamente feito com a vasodilatação periférica e o aumento de frequência respiratória, isto torna os suínos os mais sensíveis as altas temperaturas entre os animais domésticos. Desta forma, devemos procurar favorecer o melhor possível em instalações, equipamentos e manejo para minimizar as possibilidades do estresse calórico, particularmente nos meses entre dezembro e março, o período mais crítico do ano, segundo o zoneamento bioclimático da região sudeste efetuado por Oliveira et al. (2006). 5.1. Instalações Trabalhando com tanques de água dentro das instalações Heitman Jr e Hughes (1949) concluíram que os tanques de água trazem vantagens quando a temperatura ambiente for superior a 23 °C, o que acontece no maior período do ano em nosso país, mas no tanque exposto ao sol a temperatura da água pode atingir até 50 °C e nessa temperatura nenhum animal utiliza do tanque para a termorregulação, então a recomendação do autor é que o tanque de água para os suínos se banharem deve estar à sombra dentro da instalação. Morrison et al. (1969) afirmam que o animal não consegue perder calor pela imersão e sim pela evaporação da água sobre a pele e que cada litro de água evaporada consome 584 kcal de energia. Levando em consideração esse princípio, pode-se aspergir água diretamente no animal a cada 40 minutos para se obter ótimos resultados, portanto se o suinocultor que não pode dispor de equipamento de aspersão, pode molhar os animais com mangueira ou balde de água, o importante é molhar os animais nas horas mais quentes do dia. 80 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. São diversos os tipos de instalação que oferecem aos suínos um ambiente que proporciona o bem-estar, mas o mais relevante é encontrar soluções práticas e econômicas, pois a disponibilidade de recursos pode até ser um fator limitante, mas não se pode deixar de procurar meios para minimizar o estresse ao animal. Na construção das instalações suinícolas, um dos principais fatores que influenciam na carga térmica radiante é o telhado. Sevegnani et al. (1994) concluiu que o melhor material para cobertura é a telha de barro, em seguida cimento-amianto pintado de branco e alumínio. Esses autores recomendam ainda, a pintura da cobertura de branco. Outra possibilidade de proporcionar melhor ambiente para os animais é a arborização, porque a árvore não só proporciona sombra, mas absorve 90 %da radiação solar (RIBEIRO, 1986). Assim através do plantio de árvores tem-se a diminuição da radiação de onda curta, diminuindo o efeito de ofuscamento e reflexão no aquecimento das superfícies e consequentemente o calor emitido por estas superfícies. Além disto, a evapotranspiração dos vegetais contribui para o abaixamento da temperatura, pois uma árvore adulta perde por transpiração até 400 litros de água por dia, desde que encontre água suficiente no solo e esses efeitos correspondem a cinco condicionadores de ar com capacidade de 2.500 kcal cada, durante 20 horas por dia (KRAMER e KOZLOWSKI, 1972). A ventilação em uma instalação é outro fato de suma importância, pois é responsável pela remoção da umidade, dispersão de gases e dispersão de calor, então na construção das instalações deve ser feita de tal forma que favoreça o máximo a ventilação natural. A velocidade do vento recomendado é de 0,1 a 0,2 m/s em leitões e 1,0 a 3,0 m/s para suínos adultos (BENEDI, 1986 citado por Silva, 1999). Nas instalações dos suínos o tipo de piso também é importante, pois segundo Oliveira (1999) os suínos passam em média 60 a 80% do tempo deitado ou sentado sobre o piso e o material com que é construído interfere na temperatura efetiva da seguinte forma: ripado em cimento BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 81 (7 a 8 °C), chapa de metal perfurado (5,8 °C), chapa de plástico (3 °C) e concreto (2.8 °C). Portanto em altas temperaturas o melhor é ripado sobre concreto, porém no frio é o inverso, ou seja, o concreto é o melhor ou uma cama de palha que aumenta a temperatura em 6 °C. Segundo Oliveira (1999), o ambiente em condições climáticas adequadas pode aumentar a eficiência do alimento, ganho de peso e economia na produção, pois a cada 1 oC de aumento na temperatura em ambiente entre 10 e 20 °C, corresponde a uma economia de 3,3 kg de alimento por suíno ao abate. Moura (1999) comparando a temperatura ambiente em uma instalação com e sem lanternim, encontrou os seguintes valores de índice de temperatura do globo e umidade: às 11 horas 79,0 com lanternim e 83,4 sem lanternim, às 14 horas 81,0 com lanternim e 85,6 sem lanternim, concluindo que nestas horas quentes do dia a presença do laternim tem influência significativa no conforto térmico dos animais. Baêta e Souza (1997) recomendam como abertura do lanternim o critério de a cada 2 m de largura do galpão a abertura de 0,025 m ou seja instalações com 4 m de largura o lanternim deve ter 0,50 m de abertura. O tipo de cobertura das instalações também é importante. Sobestansky et al. (1998) afirma que a melhor cobertura é feita com telha de barro e pintada de branco, pois analisando o efeito da cor do telhado na temperatura da superfície, encontrou os seguintes resultados: 60 °C no telhado sem pintura, 70 °C na cor preta, 63 °C na cor vermelha, 50 °C no alumínio, 48 °C na cor creme e 44 °C n cor branca. Esses autores recomendam ainda o forro por baixo das telhas para evitar a transmissão do calor proveniente do telhado para o interior da instalação. 5.2. Equipamentos Como a ventilação natural em muitas situações não pode proporcionar um ambiente adequado, Moura (1999) recomenda o uso de ventilação forçada, apesar de ser mais oneroso. Isto porque a 82 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. ventilação forçada não depende das condições atmosféricas e pode distribui melhor o ar no galpão, ressaltando que na compra de ventiladores é essencial a criteriosa escolha e a correta utilização. Pandorfi et al. (2004) ao estudarem o comportamento de leitões em escamoteador, observaram que o melhor sistema de aquecimento foi o de piso térmico, em comparação a lâmpada incandescente, resistência elétrica e lâmpada incandescente, resistência elétrica e lâmpada infravermelha, embora a lâmpada incandescente e resistência elétrica tenham atendido as necessidades dos leitões. Estudando a influência de diferentes sistemas de acondicionamento na maternidade de suínos Tolon e Nääs (2005) testaram a ventilação resfriada e ventilação forçada, pelos resultados obtidos na frequência respiratória, espessura de toucinho, numero de leitões nascidos vivos, peso médio ao desmame e numero de leitões desmamando, o sistema de ventilação refrigerado apresentou os melhores resultados. Sator et al. (2003) estudando o efeito do resfriamento evaporativo no desempenho de suínos em fase de terminação, concluíram que nos animais criados em instalações com resfriamento evaporativo reduzem o índice de temperatura do globo e umidade de 83,5 para 82,4, melhoram a conversão alimentar de 3,32 para 2,82 e aumentam o ganho de peso de 0,95 kg para 1,05 kg por dia. 5.3. Manejo Segundo Nääs e Rodrigues (1999), a frequência de ida ao bebedouro é maior em períodos mais quentes. Dessa forma, oferecer água na temperatura de 18 a 24 °C em bebedouro coberto favorece a termorregulação e com isso o animal passa a ingerir mais alimento. Embora não seja um manejo para auxiliar a termorregulação do animal, algumas práticas podem atenuar o efeito do estresse térmico no que diz respeito ao consumo de ração, que automaticamente é BIOCLIMATOLOGIA ZOOTÉCNICA 83 diminuído com a finalidade de produzir menor quantidade de calor no metabolismo. Tal como fornecer alimento em maior número de vezes, principalmente nas horas mais frescas do dia e oferecer ração úmida para aumentar o consumo. Na falta de equipamentos de aspersão de água nos suínos, pode se jogar água com mangueira a cada 40 minutos nas horas mais quentes do dia. Na verdade tudo o que for feito ao animal em prol do bem-estar animal com toda certeza trará beneficio ao animal e também ao suinocultor. Lembrando que toda a atenção dada ao suíno é importante, principalmente observando o seu comportamento, pois, segundo um grande pesquisador em suínos “a linguagem suína é o comportamento”. 84 TAKAHASHI, L.S.; BILLER, J.D.; TAKAHASHI, K.M. VIII. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ARCARO JUNIOR, I. et al Teores plasmáticos de hormônios, produção e composição do leite em sala de espera climatizada. Revista Brasileira de Engenharia Agrícola e Ambiental, v.7, n.2, p.350-354, 2003. AVILA, V.S. et al. Sistemas de produção de frangos de corte. 2003. Embrapa suínos e aves. ISSN 16788850. 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