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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA – 2012
RELATÓRIO FINAL DE PESQUISA
PAULA HASSUNUMA
INICIAÇÃO CIENTÍFICA – PESQUISA VOLUNTÁRIA 2012
PLANO DE TRABALHO:
Cor e Tradição na Arquitetura de Luis Barragán
Relatório apresentado à Banca de Avaliação
do Departamento de Arquitetura e Urbanismo
para o 20º Evento de Iniciação Científica da
Universidade Federal do Paraná – UFPR por
ocasião da conclusão das atividades
voluntárias de pesquisa.
NOME DO ORIENTADOR:
Prof. Dr. Antonio Manoel Nunes Castelnou, neto
Departamento de Arquitetura e Urbanismo
TÍTULO DO PROJETO:
Arquitetura e Contexto: A Cor como Elemento de Identidade Cultural LatinoAmericana
BANPESQ/THALES: 2012025990
CURITIBA
2012
1
TÍTULO
Cor e Tradição na Arquitetura de Luis Barragán
2
RESUMO
Após séculos de dominação espanhola, vários artistas e intelectuais mexicanos
empenharam-se na busca de uma identidade nacional, almejada desde a Independência do
México (1821) e intensificada com a Revolução Institucionalista (1910/17), que favoreceu a
difusão das tendências modernas naquele país. Foi a partir desse contexto que Luis Barragán
(1902-1988) transformou o modernismo internacional em um vibrante e sensual estilo nacionalista,
fazendo uso de cores vivas e contrastes de texturas, tendo a água e a luz como temas favoritos.
Ganhador do Prêmio Pritzer em 1980, Barragán procurava, através de seu trabalho – que inclui
desde residências a obras institucionais – uma ligação entre a arquitetura moderna, de bases
corbusierianas; e a tradição e contexto cultural mexicano, por influência dos artistas muralistas.
Por meio dessa pesquisa em iniciação científica, de caráter exploratório e ligada à área de Teoria
e História da Arquitetura e Urbanismo, fez-se um estudo web e bibliográfico, com o objetivo de
identificar e descrever as características e principais elementos do trabalho e pensamento de Luis
Barragán.
De modo a comprovar sua relação da cor com a tradição, foram selecionadas 03 (três)
obras, que permitiram destacar suas maiores contribuições para a arquitetura contemporânea, em
especial o emprego de materiais locais, cores populares e agenciamentos espaciais com base na
tradição hispano-americana. Considerado figura excepcional do contextualismo arquitetônico,
seus projetos, todos realizados em sua terra natal, exemplificam o domínio do espaço e da luz
assim como a habilidade de unir princípios estruturais da arquitetura tradicional mexicana com o
vocabulário modernista. Sua arquitetura encontrou reflexos não só em seu país de origem como
também mundialmente, inclusive fora da América Latina, reforçando os traços estéticos do
minimalismo e da prática neomoderna.
3
OBJETIVOS
Basicamente, pretende-se fazer uma pesquisa web e bibliográfica sobre o pensamento e
obra do arquiteto e engenheiro mexicano Luis Barragán, descrevendo suas características e
principais elementos, de modo a definir quais foram suas maiores contribuições para a arquitetura
latino-americana contemporânea. De modo específico, busca-se definir, identificar e apontar as
relações existentes entre a arquitetura de Barragán e seu contexto cultural, a partir da descrição e
análise de 03 (três) obras, com imagens ilustrativas e elementos funcionais, técnicos e estéticos.
4
INTRODUÇÃO
Luis Barragán nasceu na cidade de Guadalajara, no México, em 9 de março de 1902,
tornando-se um dos expoentes mais importantes da arquitetura do século XX, sendo inclusive
considerado o maior arquiteto mexicano de todos os tempos. Tornou-se reconhecido e aclamado
mundialmente ao receber o Prêmio Pritzker em 1980, vindo a falecer em 22 de novembro de
1988, na Cidade do México. Seus projetos, todos realizados em sua terra natal, exemplificam a
sua habilidade de unir princípios estruturais da arquitetura tradicional mexicana com o vocabulário
do modernismo – criando assim um resultado intensamente mexicano e completamente universal.
Em termos gerais, as obras barraganianas expressavam um prazer estético incomum,
através da combinação entre o poético e o prático, reconciliando homem e natureza e explorando
a pureza geométrica; a fluidez espacial; o jogo de luzes e cores; e o emprego de elementos
naturais, tais como muros, pedras, vegetação e água. Barragán iniciou sua carreira no final dos
anos 1920 com a Casa Robles León (1927, Guadalajara) e, desde então, sua obra passou a ser
aclamada e discutida em diversas publicações. Na década de 1930, já morando na Cidade do
México, experimentou um pouco do International Style, especialmente influenciado pela pureza
estética de Le Corbusier (1887-1965). Na passagem para a década seguinte, na rua Francisco
Ramírez, n. 14, da capital mexicana, em Tacubaya, projetou a Casa-Estúdio Barragán, onde
aplicou a interação e caracterização dos espaços que marcariam definitivamente toda a sua obra.
De acordo com Buendía Júlbez (2003), Barragán foi atraído, como muitos outros, ao último
movimento de vanguarda a emergir da Europa central, o “Estilo Internacional”, apoiando-se em
seus princípios, dos quais se destacava a supressão da referência nacional e histórica. No
entanto, ele sabia que para contribuir para com a sua cultura, deveria seguir o seu caminho
‘’natural’’, ou seja, desenvolver e recriar suas tradições nativas. Se ele tivesse ficado nos
arredores do funcionalismo internacional, não teria se tornado um grande porta-voz de sua cultura.
E, felizmente, reteve somente o que lhe servia do racionalismo, começando sua última e terceira
fase, totalmente imersa no contextualismo. Após ter encontrado seu caminho – sua rota singular
guiada pela história –, enfim livrou seu trabalho do debate intelectual, da brecha estilística e das
atrações dos efêmeros conceitos novos.
Já nos anos 1950, Luis Barragán passou a expressar não somente a referência à casa
tradicional mexicana, como também a espiritualidade e intimidade com o passado colonial daquele
país. A Casa Prieto López, construída em 1950 na região vulcânica de El Pedregal, foi
considerada um símbolo do então novo design mexicano. Por volta de 1955, criou uma capela em
Tlalpan com cores festivas – como o magenta, o amarelo e o dourado –, revelando essa fusão
entre a tradição local e a consciência moderna em sua linguagem madura.
Segundo Montaner (2002), desenvolvida em três etapas bem diferenciadas – a vernacular,
a racionalista e a última, mais pessoal e depurada – a arquitetura barraganiana culmina na
elaboração de uma linguagem própria, na qual afloram tanto as suas experiências mais individuais
como suas afinidades com a vanguarda artística mexicana1. Ao final, considera-se seu trabalho
uma espécie de síntese entre o cubismo, o neoplasticismo e o regionalismo, o que acabou criando
uma arquitetura atemporal única, fundamentalmente minimal.
Constantemente, a obra de Barragán é mal interpretada ao ser examinada somente em
suas características formais, deixando o estudo dos seus aspectos mais importantes de lado. Ele
sempre destacou a importância da compreensão de sua arquitetura como seu modo pessoal de
expressão, afirmando que este nunca deveria ser copiado formalmente. Em uma entrevista,
explicou que seus melhores trabalhos eram resultados da rejeição ao funcionalismo e do retorno
às origens da arquitetura – suas percepções fundamentais. Dessa maneira, seria capaz de criar
verdadeiramente uma “arquitetura moderna” (RAMÍREZ UGARTE2, 1984; apud TOCA
FERNÁNDEZ, 2003).
Sua própria casa3 localizada no bairro de Tacubaya, construída entre 1947 e 1950; e sua
trilogia equestre – o Haras Las Arboledas, Los Clubes e a Escuela de Equitación de San Cristóban
–, realizada entre 1961 e 1969, todas obras na Cidade do México, mostraram a recriação de
formas arquitetônicas que, embora longe da qualidade tecnológica, reforçavam uma síntese de
elementos modernos e tradicionais, reinterpretados pelo tratamento dos muros, pelo recurso da
água e pelo uso das cores vivas da arquitetura mexicana, além de um altíssimo grau de abstração
(MONTANER, 2002).
Entre 1976 e 1980, Luis Barragán construiu a última das suas consideradas obras-primas,
a Casa Gilardi, também em Tacubaya, na Cidade do México, caracterizada por sua piscina
interna, cores puras e uma árvore de Jacarandá no espaço privado. Nela, a simplicidade da
arquitetura popular e o contexto local conciliam-se com a sofisticação moderna. Pode-se assim
dizer que, em sua arquitetura, percebe-se sensações plásticas e espaciais similares. Ao mesmo
tempo em que uma sequência de espaços abertos como pátios e fechamentos como estâncias
vão conduzindo ao recinto da intimidade, de acordo com Browne (1988), giros e extensões
enfatizam esta introversão de proveniência da arquitetura popular mediterrânea e árabe. Do
mesmo modo, está presente o recurso das formas, cores e texturas do vernacular, além de
objetos de arte popular nos espaços abertos e fechados.
1
Em 1957, Luis Barragán projetou, juntamente com Mario Pani (1911-93), um bairro residencial na Cidade do México, em cuja praça
dispôs um conjunto de cinco torres do artista plástico Mathias Goeritz (1915-90). Este se tratava de um monumento minimalista
constituído de peças gigantescas, de seção triangular, feitas em concreto armado como edifícios sem função, marcados por sua
pureza, cromatismo e exatidão construtiva (MONTANER, 2002).
2
RAMÍREZ UGARTE, A. Los jardines de Luis Barragán. In: MÉXICO EN EL ARTE, INBA, Verano 1984.
3
De acordo com Fernández Alba (2003), a casa que Barragán desenhou para si mesmo sintentizaria suas preocupações na
arquitetura. Nela, a parede representa uma fronteira que demarca o espaço onde viver. Sua arquitetura tenderia a ser unificada pelo
material, que é facilmente manufaturado e existiria em harmonia no seu ambiente natural imediato. Limitada em escala, a casa cresce
dentro do desenho de suas paredes, que são carregadas com evocações e memórias; texturas e ordem. Para o autor, esta casaestúdio incorporaria o relacionamento entre arquitetura e paisagem. Poucos arquitetos teriam o dom de usar a forma construída para
expressar o poder emocional contido nos materiais. Purificar as formas com as quais trabalha e recapturar a inocência original dos
materiais que usa sempre foram as funções de um grande arquiteto. O trabalho de Barragán, elementar e simples, aparenta fazer isso.
No México, conforme Buendía Júlbez (2003), há dezenas de discípulos de Barragán.
Infelizmente, com algumas exceções, a maioria imita seu trabalho, empregando erroneamente
materiais e cores. A não ser que determinada pelo seu conteúdo, a arquitetura é inevitavelmente
desprovida de significado. O conteúdo que inspira sua forma é produto exclusivo do espírito
criativo; e, mesmo sem saber, o arquiteto sempre estará impregnado com o espírito do lugar.
Barragán uma vez disse: “Não me pergunte sobre esse ou aquele prédio; não tente fazer o que eu
fiz: veja o que eu vi”.
A obra de outro célebre arquiteto mexicano, Ricardo Legorreta (1931-2011), é
frequentemente associada a de Luis Barragán. Desde 1968, segundo Toca Fernánez (2003),
Legorreta mudou radicalmente e passou a fazer um trabalho semelhante ao de Barragán, com
soluções conceituais de escalas, proporção e espaço, no entanto, muito diferentes. Legorreta
trabalhava com grandes espaços e complexas escalas enquanto que Barragán manipulava
escalas intimistas e pequenos espaços. Enquanto a face mais significante do trabalho
barraganiano é o interior – e suas obras não são marcos na paisagem – Legorreta foi adepto da
inserção de seus trabalhos no contexto urbano. Fazendo uso da tecnologia moderna e das novas
soluções estruturais, Legorreta tinha vantagem sobre Barragán, que usava técnicas já
ultrapassadas, pois se inspirava na arquitetura colonial espanhola4.
Depois de atingir reconhecimento internacional em meados da década de 1970 e
desacostumado com a mídia, conforme Toca Fernández (2003), Barragán perdeu sua habilidade
de ser objetivo e isto gradualmente contribuiu em sua mitificação. Com isso, houve confusão em
relação aos créditos de algumas obras devido ao fato dele não deixar claro ou se negar a
reconhecer seus colaboradores. No caso envolvendo os pintores Jesús “Chucho Reyes” Ferreira
(1880-1977) e o casal José Miguel (1904-57) e Rosa Rolando Covarrubias (1895-1970), Barragán
admitiu que estes haviam lhe influenciado no uso das cores – que se tornaram suas
características fundamentais –, mas não os deu o devido reconhecimento durante o período que
trabalharam juntos na sua fase mais criativa: a da negação à linguagem do racionalismo.
Apesar de ser excepcional, o trabalho de Barragán não pode ser considerado atípico ou
isolado das tradições arquitetônicas mexicanas, já que demonstrava fortes ligações com seus
precursores e se encaixava naturalmente ao contexto cronológico e geográfico. Muitos de seus
contemporâneos durante os anos em Guadalajara compartilhavam as mesmas ideias e realizaram
trabalhos louváveis – o que gerou a Escola ou Regionalismo de Guadalajara, que incluía amigos
de Barragán como Rafael Urzúa Arias (1905-91) e Ignacio Díaz Morales (1905-92), além dos
talentosos Pedro Castellanos (1902-61) e Enrique Gozález Madrid (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
4
Utilizando-se de variado jogo de formas e espaços, além do colorido e da trama para filtrar a luz, Legorreta produziu uma espécie de
regionalismo minimal, com o uso de muros, cores e luzes . Na Cidade do México, seus trabalhos destacados foram: o Hotel Camino
Real (1968), a Fábrica IBM (1977), o Edifício de Escritórios BANAMEX (1981) e o Museu de Arte Contemporânea de Monterey (1992)
(MONTANER, 2002).
5
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
A reputação de Luis Barragán como arquiteto, de acordo com Toca Fernánez (2003), é um
fenômeno curioso: ele mesmo já foi transformado em uma figura legendária enquanto que sua
obra permite infinitas interpretações. Com isso, tornou-se algo complicado conciliar o interesse
público com a personalidade reservada e solitária de Barragán. Como ele só atingiu
reconhecimento internacional e consagração da crítica no final de sua carreira, o caminho sempre
esteve aberto para que imitadores produzissem cópias baratas de seus trabalhos – o que gerou
uma espécie de “barraganismo”.
No México, segundo esse autor, por muitos anos existiam somente alguns poucos
admiradores de Barragán. Internacionalmente, no entanto, seu trabalho como arquiteto e
paisagista já havia conquistado grande apreciação. A prova de como sua obra era subestimada
no México aconteceu em 1976, com uma exibição de seu trabalho no MUSEU DE ARTE MODERNA
MoMA de Nova York, além do recebimento do Pritzker em 19805. Em ambos os eventos, foi
fundamental o apoio do arquiteto norte-americano Philip Johnson (1906-2005), que o considerava
o único arquiteto contemporâneo importante do México. E somente após ser reconhecido pelas
instituições norte-americanas que Barragán recebeu prêmios e exibições tanto em sua terra natal
como em toda a América Latina6.
A primeira contribuição de Luis Barragán à arquitetura contemporânea foi uma linguagem
pessoal e particular, a qual lhe permitiu produzir uma coleção de edificações tão radicalmente
diferentes daquelas que predominavam no estilo do seu tempo. Ele inspirava-se no familiar,
emprestando ideias, materiais, técnicas e formas; e utilizando-os de um jeito completamente
individual7. Seu ponto de partida foi atualizar alguns elementos da arquitetura mediterrânea para
depois, quando já dominava esse idioma, mudar para as formas do racionalismo europeu,
emprestando seus efeitos esculturais (TOCA FERNÁNDEZ, 2003).
Por fim, Barragán retornou ao básico e modificou seu trabalho radicalmente, em um
processo gradual no qual ele se inspirou em diversas fontes: a arquitetura popular, o racionalismo
corbusieriano e o neoplasticismo holandês, que serviu para sua manipulação de espaço e uso de
cores contrastantes (BROWNE8, 1989; apud TOCA FERNÁNDEZ, 2003).
5
Ao aceitar o Pritzker pelo que o júri declarou como “um ato sublime de imaginação poética”, Luis Barragán discursou: “É alarmante
que publicações dedicadas à arquitetura tenham banido de suas páginas palavras como beleza, inspiração, magia, confusão,
encantamento, assim como conceitos de serenidade, silêncio, intimidade e deslumbramento [...] elas nunca deixaram de ser meus
guias” (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
6
Esses acontecimentos marcaram o início do processo pelo qual Barragán foi transformado em uma figura legendária. Seus prédios
receberam o mesmo tratamento que o Pavilhão Alemão de Barcelona, criado por Mies van der Rohe (1886-1969) em 1929: quase
totalmente desconhecido em seu tempo, mas posteriormente canonizado como o “prédio mais importante do século XX” (BONTA, J. P.
Sistemas de significación em arquitectura. Barcelona: Gustavo Gili, 1977).
7
Barragán sempre homenageou a arquitetura vernacular de Jalisco – um dos estados mexicanos, cuja capital é Guadalajara – e sua
simples nobreza de expressão, uma vez que tanto seu povo como suas casas teriam uma linhagem mediterrânea. Ele também
lembrava de Mazamitla; a vila em que nasceu, formada por um planalto com rua íngremes, casas com paredes caiadas e tijolos
vermelhos, envolvidas pela água e raios de sol, onde o lugar e a experiência o ensinaram a virtude suprema da simplicidade
(BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
8
BROWNE, E. Barragán y De Stijl. In: ARQUITECTURA VIVA, septiembre 1989.
Para Toca Fernández (2003), a profunda análise do trabalho barraganiano é
recompensada pelo descobrimento de uma profunda criatividade e cuidado com cada detalhe.
Seu uso de fontes e piscinas, por exemplo, corresponde à sua interpretação pessoal da água
como um elemento do design. Além disso, ele aplica seu talento criativo não apenas na habitação
em si, mas na recriação do jardim eterno, em sua leitura pessoal do paraíso. Nos prédios em
Guadalajara, por sua vez, Barragán incorporou nos jardins sua interpretação da cultura hispanomuçulmana; e, em El Pedregal e Las Arboledas, intentava recapturar um paraíso privado onde
somente os privilegiados teriam acesso.
Conforme Buendía Júlbez (2003), a arquitetura de Barragán provoca uma emoção estética
pura, já que usava cores porque gostava de usá-las e não por querer algum significado (apesar de
ficar claro em seu trabalho que o branco era o básico de sua paleta), aplicando-as para conferir
dimensão ao espaço ou para adicionar um “toque de magia”. Em seus primeiros trabalhos, o uso
das cores era exclusivo de elementos secundários, tais como: balaustradas, painéis de grades,
portas envidraçadas, ocasionais janelas ou aberturas e móveis – todos sob influência óbvia das
cores do alemão Ferdinand Bac (1859-1952) e esporadicamente inspiradas nos desenhos de V.
Choukhaeff (1887-1973) para a ópera Boris Godunov, criada pelo russo Alexander Pushkin (17991837).
Barragán também recorreu à arquitetura religiosa mexicana do século XVI, especialmente
através de seus espaços cúbicos, efeitos de luz-e-sombra e pátios, recriando-a em uma escala
intimista9. Paralelamente, aspectos da arquitetura popular mediterrânea – como os jardins-terraço,
as extensões ininterruptas de paredes e as escadarias – foram também reinterpretados com
extraordinária sensibilidade. Foram esse trabalho minucioso e a análise das formas tradicionais
que tornaram seu trabalho algo tão significativo e relevante para sua própria cultura10. A postura
ideológica de Barragán – ao rejeitar a arquitetura funcionalista internacional e denunciar o dano à
qualidade de vida urbana ao se industrializar a sociedade – constituiu um legado ainda maior que
seus resultados formais (TOCA FERNÁNDEZ, 2003).
O trabalho de Barragán, de acordo com Toca Fernánez (2003), demonstra a importância
da intimidade e refinamento que podem ser atingidos com o mínimo e mais modesto dos recursos.
Com seus pátios, paredes, jardins, fontes e espaços, a pobreza elegante dos prédios
barraganianos é bem-sucedida em capturar a vitalidade da cultura mexicana. Ele soube identificar
e absorver o que era precioso da cultura estrangeira, incorporando-a seu modo pessoal de
expressão, de forma a torná-la apropriada ao clima, ao modo de vida e à sensibilidade mexicana –
em outras palavras, ele misturou o estrangeiro ao familiar.
9
Segundo Buendía Júlbez (2003), Barragán declarou-se católico e descreveu a paz espiritual que encontrava ao visitar monastérios,
conventos e pátios reclusos. Ele concluiu com a fervorosa esperança que “esses sentimentos deixariam sua marca no meu trabalho”.
10
Sobre a arquitetura popular mexicana, Barragán disse uma vez: “As doces lembranças de fontes maravilhosas me acompanharam
durante a vida. Eu me lembro de fontes da minha infância [...] A arquitetura despretensiosa da vila e cidade de meu país [...] As
paredes caiadas; a paz nos pátios; as ruas coloridas” (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
O trabalho de Luis Barragán expressa uma confiança na “arquitetura artesanal”
(architecture craft) acima dos recursos tecnológicos disponíveis, afirmando que a arquitetura não
precisa ser “moderna” (fashionable) para ser importante ou valiosa – simplicidade e humildade
têm um papel genuíno em uma arquitetura que a sociedade com um todo pode identificar. A
arquitetura barraganiana presenteou o México com uma nova forma de se reconhecer e ser
reconhecido (TOCA FERNÁNDEZ, 2003).
Para Buendía Júlbez (2003), quem desejar se aprofundar na arquitetura de Barragán
precisa conhecer os lugares e paisagens em que ele habitava. Refinado pela passagem do tempo
e por uma reconhecida fonte de inspiração, ele passou seus últimos anos próximo da Sierra de
Corrales, envolvido com o drama da paisagem e uma poderosa ligação com a natureza – ela o
esculpiu e deu direção a suas atividades.
Barragán considerava solidão, alegria e morte igualmente poderosas. Sobre jardins e
fontes, disse uma vez: “Em um lindo jardim, a majestade da Natureza está sempre presente, mas
é a Natureza reduzida a proporções humanas [...] Ao sul da Cidade do México existe uma vasta
extensão de rochas vulcânicas e, impressionado com a beleza dessa paisagem, eu decidi criar
uma série de jardins para humanizar, sem destruir, sua magia [...] A inesperada descoberta
dessas ‘joias’ me deu a sensação parecida com quando, depois de ter andado por um túnel
escuro e estreito da Alhambra, eu de repente saí no sereno, silencioso e solitário Patio de los
Arrayanes [...] Eu sentia que ele continha o que um jardim perfeito deveria conter: nada menos
que todo o universo [...] Desde o primeiro jardim pelo qual sou responsável
até todos os
seguintes, tentei capturar o eco da imensa lição a ser tirada da sabedoria estética dos mouros
espanhóis” (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
Mediante ao radicalismo da arquitetura contemporânea internacional, o trabalho de
Barragán foi um exceção. De acordo com Buendía Júlbez (2003), assim como o trabalho de
Antoni Gaudí (1852-1926), Henry van de Velde (1863-1957), Joseph Maria Olbrich (1867-1908), e
Teodoro de Anasagasti (1880-1938), a forma e poesia barraganianas foram densas e com uma
atmosfera carregada de um poder nem sempre alcançado na arquitetura. Seus prédios evocam
emoções e sensações que geralmente são negligenciadas: experiência interior, afastamento,
fantasia e nostalgia. O trabalho de Barragán desafia as onipresentes paredes envidraçadas –
anônimas, sem identidade, incógnitas, essas paredes traem a noção de panóptico dos
racionalistas11. Longe de oferecer privacidade à vida de seus habitantes, esse tipo de parede
aprisiona e desumaniza os espaços. E essas edificações continuam a ser construídas em nome
do funcionalismo, apesar da crise do Movimento Moderno desde a década de 1930.
11
Barragán comentou sobre seus excessos em 1960, durante a época do funcionalismo: “Toda arquitetura que não expressa
serenidade não é carregada de propósito espiritual. Esse é o motivo pelo qual é um erro substituir o abrigo proporcionado pelas
paredes com grandes extensões de janelas” (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
A arquitetura de Barragán incorporou mistério, surpresa e memória, transformando-se em
um reduto contra os excessos da vida. Ele dava às paredes força e autonomia, recuperando a
importância e dignidade ao mais antigo – e talvez o mais nobre – dos elementos arquitetônicos:
uma parede de Barragán rejeita o ditado da arquitetura contemporânea em usar fachadas
envidraçadas. A sua contraproposta a essas enormes jaulas de vidro foi uma arquitetura que
nascia de dentro da terra – como o solo onde está estabelecida, fornece abrigo e proteção; é
habitável; tem uma escala humana e significado (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
Ainda conforme Buendía Júlbez (2003), Barragán desmascarou as noções radicais do
modernismo e denunciou a filosofia por trás da machine à habiter em detrimento à qualidade de
vida. Aqueles eram tempos de mudança e violência; conflito religioso e nacionalista; perda de
identidade; desigualdades em um mundo alienado; confusão e contradição: nesse contexto, a
arquitetura barraganiana assumia um status monumental. Profundamente enraizadas nos valores
populares, as soluções de Barragán têm uma relevância que atravessa seu tempo, emitindo claros
sinais que ecoam suas tradições em um confuso processo de desenvolvimento.
Os espaços de Barragán, internos e externos, são ambientes nos quais se deve pensar e
sentir. Ele trabalhou com as emoções, sendo os sentimentos o fio condutor de suas obras. Luz;
luz lateral refletida, filtrada ou sombreada: esses efeitos alteram o humor dos habitantes e
induzem uma reflexão espiritual. Suas paredes são acolhedoras e convidativas; protegem e
proporcionam calmaria e segurança contra o desconhecido. Outro elemento: a água – criação e
fonte do Jardim do Éden; a essência do oásis – é apresentada de diferentes formas em seu
trabalho. Para Barragán, água e natureza eram talvez aproximações – ou metáforas – de um
paraíso escondido ou desconhecido; um anseio pelo jardim ideal (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
Segundo Buendía Júlbez (2003), os espaços intercalados de Barragán não são
distribuídos de acordo com um esquema racional. Suas plantas térreas, geralmente de uma
configuração aditiva, não são exemplos de uma habilidade para composição: observando-as
isoladamente, parecem carecer de simplicidade. Alguns padrões circulares estão desenquadrados
e mal distribuídos, como na Casa Gálvez (1955); ou não-funcionais e exagerados, como na Casa
Gilardi (1975/77). A análise da maior parte dos planos revela uma habilidade rudimentar – talvez
seus estudos de engenharia na juventude tenham o influenciado nesse aspecto12. Por outro lado,
seus desenhos geométricos de espaços exteriores são impressionantes: os delirantes
bebedouros, a Fuente de los Amantes, a Cuadra San Cristóbal e os estábulos Folke Egerstrom
(1966/68, Los Clubes de Las Arboledas) são bons exemplos.
12
Ainda assim, é essencial que se olhe seus desenhos depois de ver os prédios em si, o que proporciona uma leitura bem diferente –
todos os defeitos são anulados pela concepção prodígia de Barragán de espaço e sua sensibilidade em manipular a geometria sólida.
Largura, altura e profundidade combinados com sequência e luz; com atração e mistério, para constituir uma harmoniosa unidade, cuja
representação em plano é impossível. Estudiosos da geometria descrevem os arquitetos como pessoas que planejam no espaço, e é
assim que Barragán desenha: ele imaginava coisas e as construía mentalmente, sintetizando ambientes e elementos que emergiam de
sua memória (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
Barragán manteve-se fiel aos seus princípios e a expressão formal destes, já que seu
repertório temático e certos elementos são recorrentes em sua obra. A casa frequentemente
serviu como uma variação doméstica de volumes religiosos. Quartos com pé-direito duplo – e às
vezes ainda mais alto – e a luz filtrada (painéis translúcidos coloridos em seus primeiros trabalhos
e, mais tarde, vidro pintado de amarelo) aparecem nas casas de Guadalajara: Robles León
(1927), González Luna (1928) e Gustavo Cristo (1929), assim como na Casa Gilardi (1976,
Tacubaya) e na capela do Convento de las Capuchinas Sacramentarias del Purísimo Corazón de
María (194/60, Tlalpan) (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
A torre foi usada repetidamente – desde as torres vigorosas em Guadalajara até as Torres
de Satélite (1957) e outras torres menores de água –, que consiste em um elemento muito
importante na composição dos perfis – como a silhueta da Casa Ortega (1940/43) e da sua
própria Casa-Estúdio (1947/48), ambas em Tacubaya – e linhas de telhado. Há também, ainda
segundo o mesmo autor, a parede, que funciona como tema e elemento. Na Casa Orozco (1935,
Guadalajara), ele já havia usado a parede como superfície pura, sem marcas a não ser janelas.
Isso previa a nudez das suas últimas paredes, livres e suportando cargas, lacônicas e grandes a
luz do sol. Por fim, outro elemento intrínseco de seu trabalho foi a porta composta de diagonais,
de origem egípcia e típica da arquitetura popular: a Casa González Luna tem duas belas portas,
uma simples e a outra elaborada e trabalhada. A porta de entrada de Los Cubes (1966/68, Las
Arboledas) e a porta de acesso da Casa Gilardi também são exemplos notáveis.
De todos os elementos usados por Barragán, foi a janela que passou pelo maior número
de mudanças. Existe uma vasta diferença entre as dos projetos em Guadalajara e as do seu
último período. No início, ele usava pequenas aberturas, feitas em madeira ou ferro, com telas.
Mais tarde, vieram as janelas semicirculares, gradeadas e salientes. Quase todos esses tipos são
convencionais, introduzidos séculos atrás na América Latina pelas culturas populares e
sofisticadas de Andaluzia (Espanha). Barragán, no entanto, transformou essas janelas em
recursos especiais, dotando-as de novidade através da combinação de materiais. Puristas podem
considerar o uso dessas janelas algo inocente ou provinciano, mas elas são sem dúvidas
atraentes e proporcionam segurança, luz e sombra; privacidade e mistério (BUENDÍA JÚLBEZ,
2003).
As excepcionais muqarnas (suportes de teto feitos em madeira; uma característica da
arquitetura moura) sobre a entrada da Casa Ildefonso Franco (1929, Guadalajara) são finamente
trabalhadas. Igualmente interessantes são as janelas da Casa Harper, da já destruída Casa
Enrique Aguilar e da Casa Zaragoza, todas de 1928, criadas em Guadalajara. Ocasionalmente, de
acordo com Buendía Júlbez (2003), ele voltava no tempo e utilizava janelas do estilo colonial
espanhol. De modo semelhante, na Casa Gustavo Cristo, incorporou janelas quadradas de metal,
típicas do International Style. A linguagem fantasiosa da arquitetura de Barragán desapareceu
durante sua fase funcionalista – a qual ele chamou de “fase comercial” –; época em que usou as
janelas metálicas. Em alguns de seus prédios, chegou até a utilizar grandes extensões de vidros –
em alguns casos, a fenêtre en loungueur.
Em muitas de suas composições, aparecem como linhas de referência o quadrado e suas
relações. Em outras, cubos são emparelhados de um modo muito simples e quase idêntico. A
configuração alinhada caracteriza sua organização de volume que gerava a linha recortada de
suas fachadas. Um de seus motivos favoritos era transformar telhados menores em terraços;
telhados-jardins que serviriam de áreas de estar. Uma herança natural dos países de clima
quente, eles aparecem nas obras de Barragán muitas vezes: em Guadalajara, nas casas
González Luna13, Enrique Aguilar e Gustavo Cristo; em Chapala, na Casa Mago Vazquez; na
Cidade do México, na casa funcionalista Pizarro Suárez (1937); na Casa Ortega – onde aparece
seu primeiro grande jardim; em Tacubaya, no seu famoso telhado-jardim, o qual ele
continuamente modificou; e nas casas Gilardi e Meyer (1978) (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
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METODOLOGIA
De caráter teórico e exploratório, esta pesquisa de iniciação científica foi baseada na
revisão web e bibliográfica, tendo sido realizada por meio da investigação, seleção e coleta de
fontes impressas nacionais e internacionais; ou ainda publicadas on line, que tratavam direta ou
indiretamente sobre o pensamento e a obra do mexicano Luis Barragán. Além de material para
registro computacional, gráfico e fotográfico, utilizou-se as instalações físicas destinadas ao
docente-adjunto, autor do projeto e lotado na subárea de Teoria e História da Arquitetura e
Urbanismo, em Regime de Dedicação Exclusiva, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo,
com a participação de 01 (uma) discente do curso de graduação, autora do presente relatório.
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RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir do estudo biográfico e arquitetônico de Luis Barragán, optou-se em
selecionar 03 (três) obras de sua autoria – todas elas realizadas na Cidade do México –,
as quais se enquadrassem em seus maiores êxitos profissionais, mas, ao mesmo tempo,
exemplificasse toda a sua trajetória de meados da década de 1940, quando seu trabalho
inicia a assumir uma feição própria; até fins dos anos 1970, período em que sua
linguagem encontra-se madura e pronta para se tornar referência internacional. De forma
sintética, apresenta-se na sequência, na fora de fichas de estudos, estes casos
selecionados, acompanhados de algumas ilustrações e descrição de características
fundamentais.
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O telhado-jardim da Casa González Luna tem uma pérgola e um banco de canto; vista dos jardins nos arredores até os mais
distantes e um inesperado pátio ligado a um extenso espaço externo do qual ergue se uma escada secular. Se não é o mais escultural
dos terraços de Barragán, é certamente o mais sentimental: uma combinação de formas ruidosas, ritmos e texturas, amplitudes,
sombras silenciosas e evocações (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003).
ESTUDO CASO I
Casa-Estúdio Barragán
Rua Francisco Ramírez, 14 – Tacubaya, Cidade do México
(1947/48)
Luis Barragán construiu uma residência pessoal como projeto e laboratório de arquitetura, onde experimentou a
caracterização e interação de espaços. Fernández Alba (2003), ao visitar esta casa-estúdio, afirmou que era modesta
na aparência e discretamente localizada: ”Nós estávamos em um grande cômodo, feito para uma variedade de funções,
domésticas ou profissionais, fechado para a rua e aberto a um pátio interno onde um grupo de árvores filtrava a luz,
criando um efeito quase monástico. Havia uma pequena fonte e paredes de todas as cores que fechavam o pátio para
formar uma câmara de sensações tranquilizantes, de madeira, argila e cal. Basicamente, um lugar onde é possível se
olhar dentro do coração das coisas.” Em 2004, a Casa Barragán 14 – como ficou conhecida – foi declarada Patrimônio
da Humanidade pela UNESCO, transformada desde então em um museu (Figs. 1 a 4).
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Uso do branco e magenta (cores recorrentes em sua obra): verdade arquitetônica;
Ausência de ornamentação (Barragán acreditava que a arquitetura não deve acrescentar elementos supérfluos para
criar sua expressão física);
Abundância de iluminação natural (luz lateral refletida, filtrada ou sombreada): esses efeitos alteram o humor dos
habitantes e induzem uma reflexão espiritual (BUENDÍA JÚLBEZ, 2003);
Composição geométrica (jogo de volumes simples, através de uma sensibilidade em manipular a geometria sólida);
Uso da torre na composição do perfil;
Planta funcional e jardim privado enorme se comparado à construção (Barragán afirmava que “arquitetos tem de
desenhar jardins para serem usados, como as casas que eles constroem”).
ESTUDO CASO II
Capela del Purísimo Corazón de María
Tlalpan, Cidade do México
(1954/60)
A renovação da Igreja e Capela de Las Capuchinas Sacramentarias del Purísimo Corazón de María foi financiada e
realizada pelo próprio Barragán, como presente pessoal e prova de devoção àquela comunidade religiosa. Toda a
composição simbólica de emblemas e cores elaborada para a capela e todo o convento revela que, na linguagem mais
madura de Barragán, as referências à tradição local são fortemente ligadas à sua consciência moderna (Figs. 5 a 8).
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Tratamento cromático característico e voltado à tradição local (o magenta, o amarelo e o dourado);
Iluminação natural de caráter simbólico: o espaço do coro ilumina indiretamente o espaço da capela, lançando,
especialmente pela manhã, uma forte luz no ponto focal do altar, inteiramente virada para uma lâmina dourada
(simbolismo religioso);
Simplicidade e pureza volumétrica: caráter sóbrio e austero (arquitetura religiosa);
Uso de elementos vazados (treliça de alvenaria): tradição colonial espanhola (bases mouriscas);
Distribuição funcional dos espaços (planta moderna);
Presença de grande pátio interno, recorrente na obra do arquiteto: elemento tradicional (arquitetura monástica).
ESTUDO CASO III
Casa Gilardi
Colônia San Miguel, Chapultepec – Cidade do México
(1975/76)
As características morfológicas do terreno, a presença de uma enorme árvore de jacarandá e o pedido específico do
dono por uma piscina em tamanho normal para uso diário, correspondem a temas recorrentes de Barragán. O arquiteto
desenvolveu uma composição introvertida, que vira de costas para a cidade para virar de frente para o privado, onde a
árvore tornou-se o ponto de destaque (Figs. 9 a 12).
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Tratamento cromático característico e voltado à tradição local: cores vivas;
Uso de luz filtrada: emprego de painéis translúcidos coloridos de seus primeiros trabalhos e vidros coloridos;
Jogo volumétrico de planos e volumes (herança moderna): ritmo e contraste de cores;
Caráter intrínseco (a porta frequentemente é elemento excepcional em sua obra);
Funcionalidade: estrutura da piscina separada, porém perfeitamente integrada ao ritmo dos volumes.
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CONCLUSÃO
Luis Barragán (1902-88) pode ser considerado o grande porta-voz de sua cultura.
Cuidadoso, não se deixou levar para longe de seus princípios. Passeou por diversos estilos e
influências, porém nunca deixou de voltar para casa – sempre trazendo consigo o melhor da
viagem. A arquitetura de Barragán é um lembrete nostálgico do tempo passado em maravilhosas
vilas hispano-americanas, as quais marcaram a história do México, cuja simplicidade sempre foi
sua fonte permanente de inspiração. Explorar seu trabalho significa voltar à essência do povo.
De 1927, com seu primeiro trabalho, passando pelos anos 40 com suas primeiras obrasprimas, até chegar a 1981, com suas últimas criações, Barragán permaneceu fiel ao seu destino e
manteve sua integridade arquitetônica até a última parede que ergueu. Conciliando o tradicional e
o moderno, soube como ninguém aplicar o funcionalismo moderno à prática regional, em um
explícito contextualismo cultural que influenciaria gerações de arquitetos, sejam eles mexicanos
ou não.
Embasada na análise de três das suas cinco obras-primas – o que incluiria a Casa Gávez
(1955) e sua trilogia equestre (1966/68) –, esta pesquisa estudou o pensamento despretensioso
Luis Barragán, que acabou norteando todo seu trabalho e também de seus discípulos. O primeiro
caso, a Casa Barragán (1947/1948, Cidade do México), trata-se de uma obra-mestre no
desenvolvimento do Movimento Moderno naquele país, integrando funcionalidade com elementos
tradicionais e vernáculos em uma nova síntese. A segunda obra selecionada, a Capela em
Tlalpan (1954/1960, Cidade do México), usa as recorrentes cores da sua arquitetura e traz
consigo o desejo religioso de Barragán: deixar os sentimentos de paz e bem-estar marcarem seu
trabalho. Já o terceiro caso corresponde à sua última obra-prima, a Casa Gilardi (1974/75, Cidade
do México), eternizada nas fotos pelo Jacarandá, além de apresentar os demais temas relevantes
em sua obra e pensamento, tais como: a água, o pátio interno e o contraste de planos, texturas e
cores festivas.
Embora de iniciação científica, esta pesquisa abordou um profissional que escolheu dar
seu talento e sensibilidade em serviço da arquitetura. Ele viveu durante um período de
estagnação da arquitetura de seu país, a qual foi superada uma fantasia e vivacidade sem iguais
em sua geração; um tempo em que muitos arquitetos construíam em prol de sua própria glória; ou
ainda em que o foco do interesse mundial concentrava-se na Europa – em espacial, na França e
na Alemanha – ou mesmo nos EUA. Reconhecido como um grande mestre da arquitetura latinoamericana, Barragán antecipou varias discussões pós-modernas referentes à identidade cultural,
respeito à tradição e valorização minimal dos meios expressivos em arquitetura, principalmente
cor, textura e volume. Assim, pode ser considerado precursor do contextualismo e do
minimalismo; referência fundamental para a arquitetura contemporânea que busca uma relação
verdadeira com seus próprios espaço e tempo, em contraposição a importações gratuitas, sejam
elas culturais como tecnológicas, de outros países.
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REFERÊNCIAS

BROWNE, E. Otra arquitectura en América Latina. México: Gustavo Gili, 1988.

BUENDÍA JÚLBEZ, J. M. The spirit of place. In: BARRAGÁN, L.; SIZA, A.; TOCA
FERNÁNEZ, A.; BUENDÍA JÚLBEZ, J. M.; RISPA, R. et al. Barragán: the complete
works. New York: Princeton Architectural Press, 2003.
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BARRAGÁN, L. Secret Gardens. In: BARRAGÁN, L.; SIZA, A.; TOCA FERNÁNEZ, A.;
BUENDÍA JÚLBEZ, J. M.; RISPA, R. et al. Barragán: the complete works. New York:
Princeton Architectural Press, 2003.
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FERNÁNDEZ ALBA, A. Postscript: Shaded Walls. In: BARRAGÁN, L.; SIZA, A.; TOCA
FERNÁNEZ, A.; BUENDÍA JÚLBEZ, J. M.; RISPA, R. et al. Barragán: the complete
works. New York: Princeton Architectural Press, 2003.

MONTANER, J. M. Depois do movimento moderno: arquitetura da segunda metade
do século XX. Barcelona: Gustavo Gili, 2002.

TOCA FERNÁNDEZ, A.
: looking and seeing. In: BARRAGÁN,
L.; SIZA, A.; TOCA FERNÁNEZ, A.; BUENDÍA JÚLBEZ, J. M.; RISPA, R. et al. Barragán:
the complete works. New York: Princeton Architectural Press, 2003.
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BIBLIOGRAFIA DE APOIO
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BUENDÍA JÚLBEZ, J. M. The life and the work of Luis Barragán. New York: Rizzoli,
1997.
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BURRI, R. Luis Barragán. London: Phaidon, c.2000.
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CASTELNOU, A. M. Arquitetura e cidade contemporânea. Curitiba: Apostila,
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ – UFPR, 2010.

COMAS, C. E. D. Stud banker bang bang!: casa e ateliê Barragán em Tacubaya, México,
1947 (2000). In: VITRUVIUS. Disponível em: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/
arquitextos/01.006/961>. Acesso em: 11.set.2012.

DAL CO, F.; LAHUERTA, J. J.; MARTINEZ, A. R. Luis Barragán. New York: Monacelli
Press, 1998.
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HABERSETZER, J.; PAULY, D. Barragán. New York: Springer Verlag, 2008.

PORTUGAL, A.S. Luis Barragán: su obra, conceptos, reflexiones y vivencias
personales. Barcelona: Gustavo Gili, 1992.

RIGGEN, A. Luis Barragán: escritos y conversaciones. Barcelona : El Croquis, 2000.
11
FONTES DE ILUSTRAÇÕES

BARRAGÁN FOUNDATION. Life and works. Disponível em: <http://www.barraganfoundation.org/>. Acesso em: 25.maio.2012.

_____. Masterpieces. Disponível em: <http://www.barragan-foundation.org/>. Acesso em:
10.set.2012.

CASA LUIS BARRAGÁN. La Casa Luis Barragán Disponível em:
<http://www.casaluisbarragan.org/>. Acesso em: 11.set.2012.

Documentos relacionados

Apresentação do PowerPoint

Apresentação do PowerPoint segunda metade do século XX. Barcelona: Gustavo Gili, 2002. TOCA FERNÁNDEZ, A. The work of Luis Barragán : looking and seeing.

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