A cidade como constelação e a Eminência das
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A cidade como constelação e a Eminência das
Tobi Maier 16 30a Bienal de São Paulo 1 A cidade como constelação e a Eminência das pequenas escalas: Algumas reflexões sobre minha participação na 30ª Bienal de São Paulo – A iminência das poéticas Tobi Maier Tobi Maier é escritor e curador. Vive em São Paulo, onde trabalha como curador associado para a 30a Bienal de São Paulo (2011-2012). Anteriormente, atuou como curador no MINI / Goethe-Institut Curatorial Residencies Ludlow 38, em Nova York (2008-2011) e no Frankfurter Kunstverein (20062008). Uma exposição inspirado no livro de Simone de Beauvoir O Segundo Sexo, com curadoria de Tobi Maier, abrirá em 24 de maio de 2013, na La Galerie Centre d’art contemporain em Noisy-le-Sec, Paris. Maier é actualmente co-editor de uma edição dupla de arte e de literatura da revista sueca OEI, com lançamento previsto para junho de 2013. Tobi Maier 2 30a Bienal de São Paulo 1. Introdução Durante um almoço em dezembro de 2010, no refeitório da equipe do MoMA em Nova York, Luis Perez-Oramas me pediu uma opinião sobre o conceito de bienais como mostra de arte e a sua proliferação nas ultimas décadas no mundo. Pouco se sabia sobre a jornada que nos esperava: a 30ª Bienal de São Paulo, que eu sou grato por ter participado. Desenvolvemos juntos com Andre Severo e Isabela Villanueva as ideias principais para a exposição. Fizemos juntos inúmeras visitas a estúdios em grandes cidades da América Latina como Lima, Buenos Aires, Santiago, Caracas, Bogotá, D.F., entre outras na Europa e nos Estados Unidos. Conversamos, discutimos, rimos, choramos e, afinal, conseguimos montar uma mostra que transmitia muitas das nossas convicções e do que achávamos importante mostrar para o público a respeito da produção de arte contemporânea. Como escrever um livro, ou como conhecer o mar, saí diferente de uma experiência como esta. Algumas reflexões aqui expostas, quem sabe, podem ilustrar a visão de Oscar Wilde sobre o crítico: “é quem descreve o que não se pode ver“. Será esta uma das vontades deste segundo volume do Livro para Responder? “Quando termina a Bienal?”, me foi perguntado diversas vezes ao longo de sua duração. Essa pergunta me parecia uma espécie de estratégia de saída, de escape da conversa sobre uma determinada exposição que ainda não havia sido visitada ou sobre a qual a pessoa não esboçava alguma opinião. Martin Kippenberger METRO-Net Subway Entrance Kthma Canné, Hrousa, Syros Greece 1993 Concrete, cast-Iron grillwork 380 x 1380 x 280 cm © Estate Martin Kippenberger, Galerie Gisela Capitain, Cologne 15 Tobi Maier 14 1 Debord, Guy, Sociedade de espetáculo, 1967, #65, (ultimo acesso 8. Marco 2013, http://www. antiworld.se/project/references/texts/The_Society%20_Of%20_The%20_Spectacle.pdf) A forma difusa do espetáculo está associada com a abundância de commodities, com o imperturbável desenvolvimento do capitalismo moderno. Aqui, cada mercadoria considerada isoladamente está justificada por um apelo à grandeza da produção de mercadorias em geral – uma produção que o espetáculo é um catálogo apologético. [Tradução livre] 2 Em contraste a Ludlow 38, satélite de arte contemporânea do Instituto Goethe em Nova York, por exemplo, que é apoiado por uma grande marca de automóveis que não exige uma programação espetacular e garante os fundos necessários para uma programação a longo prazo. 3 Paulo Duarte, Mario de Andrade por ele mesmo, edição comemorativa dos 40 anos de falecimento de Mario de Andrade, Editora Hucitec, Prefeitura do município de São Paulo , Secretaria Municipal de Cultura, 1985, p.49 4 ibid, p.53-54 5 6 von Bismarck e professora da historia da arte e estudos visuais na Hochschule für Grafik und Buchkunst (HGB), Leipzig. Apresentou-se na ocasião da mostra The fourth wall (A quarta parede)do artista Clemens von Wedemeyer no Paço das Artes, 24 de Novembro 2012. 7 Vale a pena mencionar cada um das unidades que estavam planejadas para fazerem parte da Praça das Vozes: uma oficina de design gráfico experimental que incluia a imprensa; um espaço multidisciplinar para apresentações, performances e discussões; um estúdio de rádio; um teatro para projetar filmes; uma recepção e espaço de oficina para a equipe de educação da Bienal e uma sala de leitura, incluindo uma exposição com curadoria de documentos elaborada a partir do Arquivo Histórico Wanda Svevo da Fundação Bienal de São Paulo. O espaço estava planejado para ser fisicamente conectado ao café já existente e integrado arquitetonicamente à museógrafa da exposição. 8 Debord, Guy, Sociedade de espetáculo, 1967, #65, (ultimo acesso 8. Marco 2013, http://www. antiworld.se/project/references/texts/The_Society%20_Of%20_The%20_Spectacle.pdf) “assim, a lógica espetacular do automóvel defende um perfeito fluxo de tráfego que implica a destruição dos antigos centros das cidades, enquanto o espetáculo da própria cidade clamam para que estas mesmas áreas antigas sejam transformadas em museus.” [tradução livre]. 9 Metro-Net World Connection series (1993–7) é um subterrâneo global ligando Kthma Canne na ilha grega de Syros, na Grécia, onde Kippenberger construiu a primeira entrada do metrô em 1993, com Dawson City no Canadá e Münster, na Alemanha, onde a evidência deste metrô também foi plantada, com a de Nova York e do Alasca e uma serie de outras não realizadas. Kippenberger morreu em 1997, aos 43 anos, depois de ter completado apenas algumas entradas. 30a Bienal de São Paulo 3 A Bienal deveria servir, sobretudo para seus públicos variados, como uma mostra que reverbera na imaginação de cada um que a visita, que está ligada a sua historia e à produção de arte de hoje. Certamente o engajamento pessoal, o desafio, o envolvimento, empenho de tempo, a dedicação de cada um é o que faz a bienal presente na cidade. Se a 30ª Bienal de São Paulo – A iminência das poéticas foi concebida como uma mostra de grande porte, com mais de 3 mil obras expostas, o objetivo dela também foi de ser discursiva. Como isto foi recebido? Qual foi o acesso a estas formas discursivas na 30ª Bienal? Como se pode trabalhar em rede a partir do Parque Ibirapuera? 2. Acesso às formas discursivas Vale a pena mencionar os aparentes obstáculos à participação. Vivemos em um excesso de informação, onde a economia do conhecimento centraliza as decisões, temas e calendários das mostras, colocando um desafio enorme para quem pretende participar, consumir e contribuir na produção da cultura contemporânea. Em fim, há uma queixa constante sobre a dificuldade de se mover, de mobilizar-se nesta esfera, dentro de São Paulo. Guy Debord escreveu em Sociedade do espetáculo (1967): “The diffuse form of the spectacle is associated with the abundance of commodities, with the undisturbed development of modern capitalism. Here each commodity considered in isolation is justified by an appeal to the grandeur of commodity production in general – a production for which the spectacle is an apologetic catalog.”1 A obsessão com o contemporâneo é um fenômeno global, Tobi Maier 4 fortemente ligado aos mecanismos do capitalismo tardio. A indústria cultural incita seu público cada vez mais em direção ao novo; assim como a moda, oferece produtos a serem absorvidos pelo mercado. ‘O novo’, portanto, representa um desafio ao público, que se empenha em manter-se informado. Será precisamente por esta razão que o ato discursivo, através de simpósios, workshops e publicações, ganha em significação? Por outro lado, existem também os mecanismos de apoio público a arte contemporânea que nem sempre estão dispostos a patrocinar projetos menos visíveis, contingentes. Como já observei em outra ocasião, em conversa com o crítico e curador Fernando Oliva, a Lei Rouanet facilita o interesse dos departamentos de marketing de grandes empresas e dá a eles o poder de decidir quais projetos serão financiado e quais não. Essa dinâmica possibilita para a marca uma visibilidade instantânea, o que cria o único legado em termos de memória do consumidor. E para as instituições, apoiadas por grandes marcas que objetivam visibilidade, é mais conveniente convidar artistas de reconhecimento (inter)nacional que satisfaçam a expectativa de espetáculo.2 Estes processos de apoio dificultam a continuidade de uma programação institucional pensada a partir de projetos com menor visibilidade, como por exemplo os que organizam residências, debates, publicações ou performances efêmeras. A aparente atenção dada a eventos de grande atratividade popular, complica o acesso a incentivos monetários – de impostos dos contribuintes – para iniciativas idiossincráticas, de discurso crítico. A Bienal, nesta mesma lógica, pousa sobre a cidade a 30a Bienal de São Paulo 13 metrô; ir à Universidade de São Paulo (usp), ao aeroporto e até mesmo ao Parque Ibirapuera. Um desses sonhos me instigou a pensar na possibilidade de instalar, neste parque, uma das Metro-Net World Connection series (1993–1997) de Martin Kippenberger 9. A Metro-Net evoca a noção de rede, de uma estrutura de elementos interdependentes e relacionais. Evidentemente que as entradas não levam a lugar algum e, jogando com a ideia de porta-entrada, num gesto generoso, convida o transeunte a ingressar, como num túnel do tempo. Porém, ao invés de transportá-lo através de uma rede interligada como sugere: apenas produz frustração. A viagem antecipada, a suspensão do local no global, não acontece. Para mim, diante da discussão recorrente sobre o acesso à cultura, cujas propostas, também costumam remeter a uma estrutura de instituições em rede, e sobre o atual conflito e sua consequente negação da implementação de estações de metro no bairro de Higienopolis ou na usp, a escultura de Kippenberger me parece congruente à polêmica. A interrupção desta rede, em todas essas instancias – seja na dificuldade de conectar instituições culturais, ou na cessão de uma linha de transporte intermodal –, demonstra uma fragilidade na implementação deste preceito em São Paulo. A Metro-Net de Martin Kippenberger resume esse desejo de conectar pequenas escalas a uma malha complexa e heterogênea da cidade contemporânea. Agradecimento: Joana Barossi Tobi Maier 12 5. Fecha-dura A meu ver, se um dos êxitos da 30a Bienal foi se focar num processo de diálogo, o outro destaque certamente foi o pensamento em rede, o momento de constelação, fortemente presente nesta edição. Assim, a Bienal foi além da orquestração monumental de uma megaexposição que frequentemente se concentra num lugar apenas. Trabalhando em rede, outras exposições como a 10a Bienal de arquitetura no segundo semestre de 2013, nos convida a experimentar a cidade, introduzindo-nos a outros espaços, lugares onde o dia-a-dia não nos leva. A navegação no ambiente urbano como forma de apoderar-se da cidade, assim como a apropriação de espaços históricos para uso cultural, continua sendo um desafio para nós que amamos esta cidade e desejamos viver aqui. Como Debord alegava a respeito deste paradoxo: “thus the spectacular logic of the automobile argues for a perfect traffic flow entailing the destruction of the old city centers, whereas the spectacle of the city itself calls for these same ancient sections to be turned into museums.”8 30a Bienal de São Paulo 5 cada dois anos com uma ampla responsabilidade, com uma vasta carga de obras expostas e programações. Mas em quê queremos nortear essa incumbência se não houver um trabalho mais profundo, ao longo dos anos, que estimule o diálogo ao invés da mercadoria apenas? Dois exemplos me fizeram pensar nesta problemática ainda mais. Primeiro: no fim de Novembro de 2012, na mostra A Cidade e o Estrangeiro do artista Isidoro Valcárcel Medina, no MAC-USP, assisti a uma palestra de curadoras e críticas de Amsterdã e Bilbao (Frederique Bergholtz, Beatriz Cavia e Leire Vergara respectivamente) que debatia estratégias de exibir pesquisas e documentos ligados a performance art. Na palestra – a única apresentação delas em São Paulo –, havia um pequeno grupo de estudantes envolvido na mostra, e apenas algumas pessoas que não estavam ligadas diretamente ao ambiente acadêmico da usp. O tal fluxo perfeito de carros ao qual Guy Debord se refere, na São Paulo contemporânea semelhante protagonismo já não se justifica. Como será que podemos estabelecer uma dinâmica mais forte entre as universidades, críticos e intelectuais, artistas, revistas e os públicos, levando a conversa para um outro nível mais interligado? Será que essa tentativa de diálogo não seria, em si, um ato de resistência dentro de uma cultura que promove o acesso à informação como exclusividade? Tendo passado, somando tudo, dias inteiros em táxis ao longo dos últimos dois anos, devo desculpas aos motoristas por meus colapsos nervosos no trânsito infernal de São Paulo. Raramente foi culpa deles. Frequentemente sonhava como seria poder me deslocar apenas de O segundo exemplo, mais ligado à trigésima Bienal, que me fez entender esta complexidade: a Bienal de São Paulo, venerável instituição de arte contemporânea, promove uma grande exposição internacional, tem milhares de amigos no Facebook e, mesmo assim, um público mínimo Tobi Maier 6 comparece as palestras, eventos ou mostras de filmes. Enfrentamos uma fadiga cultural geral que é absorvida pela grande oferta de entretenimento. A procura por este entretenimento fica cada vez mais ligada a sua disponibilidade instantânea. Ou será que os públicos em São Paulo estão menos inclinados à participar de um ato discursivo de debate público? 3. Vale-cultura? Será que o vale-cultura, recentemente introduzido pela ministra da Cultura Marta Suplicy vai mudar isto, e facilitar o acesso para arte contemporânea? Duvido, pois, é possível que o vale aumente em certo sentido as atividades de consumo cultural das famílias com até 5 salários mínimos, porém, o mais provável é que este sustente as culturas do mainstream e do lazer popular. Duvido também que um vale-cultura pudesse estar contemplado no cenário de discussão entre os senhores em torno de Mario de Andrade, quando se estabelecia o assim chamado departamento da Cultura em São Paulo, em 1935: “Em torno de uma grande mesa de granito, fria como uma mesa de necrotério (...), discutíamos e construíamos coisas, algumas que mais tarde haviam de existir mesmo, como o Departamento de Cultura.”3 E continua o conto de Paulo Duarte: “E o trabalho continuava dia e noite. Levantamentos demográficos feitos cientificamente; restauração de documentos quase perdidos; museu da palavra; pesquisas folclóricas; 30a Bienal de São Paulo 11 A obra Tudo em sua mente – viagem em dois atos do artista argentino Leandro Tartaglia conectava o pavilhão do Parque Ibirapuera com a Capela do Morumbi. Neste trajeto o artista contava, através de um áudio, a historia de vários bairros de São Paulo pelos quais os passageiros passavam, assim abria um espaço entre o diálogo que soava nos headfones e o urbanismo paulista. Esta narrativa mudava a medida que se aproximava da Capela de Morumbi, indroduzindo os passageiros à obra de Amacher. No MASP, à artista Jutta Koether foram comissionadas três pinturas novas a partir da obra do Nicolas Poussin’s Hymeneus Travestido Assistindo a uma Dança em Honra a Príapo (1634-1636). Para Koether foi uma oportunidade única de mostrar sua obra em diálogo com Poussin, sobre o qual ela tinha trabalhado já em outras ocasiões (por exemplo a obra Landscape with Pyramus and Thisbe (1651), de Poussin, foi retrabalhada para uma mostra individual na Reena Spaulings Fine Art em Nova York, em 2009). E, também, a obra fez uso dos suportes de concreto e vidro, originais de Lina Bo Bardi, que tiveram seu uso abdicado pela museografia do masp desde os anos 1990. Mesmo com as possibilidades limitadas de ação na mostra já existente de Deuses e Madonas no masp, a intervenção trouxe uma nova leitura da obra histórica de Poussin e também da própria mostra Deuses e Madonas que estava em cartaz desde o final de 2010. Tobi Maier 10 do Morumbi e a Casa Modernista – além do masp, do Museu de Arte Brasileira na faap, do Instituto Tomie Ohtake e da Estação da Luz. Havia também obras nas ruas de São Paulo. Na maioria das ocasiões as mostras se orientavam a partir da arquitetura do espaço, ou seja, não foi construída nenhuma parede para receber as obras dos artistas nas três Casas-Museu, no masp ou na Estação da Luz. O artista português Hugo Canoilas, em três viagens ao interior do estado de São Paulo, seguiu os caminhos dos Bandeirantes no século xvii e xviii. Durante este processo de viagens ao interior o artista se apropriava de obras poéticas de Waly Salomão, Claude Lévi-Strauss, Roberto Piva e Mario de Andrade e as registrava em objetos encontrados. na Casa do Bandeirante Canoilas criou uma mostra que fazia analogia entre objetos históricos da coleção do Museu da Cidade de São Paulo com filmes criados ao longo das viagens e elaborou pinturas inspiradas pela historia dos bandeirantes. A instalação foi complementada por uma serie de pinturas tal como a tela de Henrique Bernardelli “Últimos momentos de um Bandeirante” (1932) que Canoilas encontrou no Museu Paulista no Ipiranga. A Capela do Morumbi apresentou uma composição feita a partir de arquivos da compositora Maryanne Amacher que em sua obra usou características arquitetônicas de edifícios para personalizar elementos sonoros, visuais e espaciais, na criação de uma instalação multidimensional, antecipando ambientes de imersão virtual. 30a Bienal de São Paulo 7 congresso da língua nacional cantada; e coro madrigalista já organizado; setor de iconografia; um verdadeiro tesouro de publicações, um grande prédio para a biblioteca, participação na Exposição de Paris em 1937, preparativos para o grande Instituto Brasileiro de Cultura, que seria a etapa final e natural do Departamento da Cultura (...).”4 Em fim, é mais provável que a ideia de Mario de Andrade fosse de estabelecer um ministério forte com expertise, que conseguisse distribuir o dinheiro dos contribuintes, lançando um planejamento a longo prazo em vez de distribuir vale-cultura num ato populista ou deixar a responsabilidade nas mãos de departamentos de marketing que aplicam (ou não) seus orçamentos em projetos espetaculares e pontuais, aprovados pela Lei Rouanet. 4. ‘Homem-espaço’ e ‘homem-discurso’ Considero que a atividade de curador está localizada dentro de um contexto social. Neste sentido, ao meu ver, o ato performático ou discursivo, o momento de dialogo, ganha cada vez mais fertilidade dentro das produções curatoriais. Me chamou a atenção a ideia de antipoesia, contida na obra do escritor chileno Nicanor Parra. Se é verdade que “Nicanor Parra pretende algo mais que o simples entretenimento do seu público, (ele) utiliza a antipoesia para criar uma cumplicidade com o leitor. Desta maneira, o texto literário, que tradicionalmente se apresentava como algo acima do destinatário, chega a ser visto como parte de nossa experiência cotidia- Tobi Maier 8 na (...).”5 Abrir um espaço na mostra de arte contemporânea para o visitante participar, dar depoimentos – de voz ou até performáticos – cria uma bela analogia a este comentário sobre a obra literária do Nicanor Parra. Foi este espaço de diálogo direto o que me pareceu um dos aspetos mais exitosos desta trigésima Bienal, pois amplificava as temporalidades que normalmente uma mostra pode oferecer. Nas palavras da Beatrice von Bismarck: “O meio expositivo como um lugar de encontro entre homem e objeto, homem e espaço e homem e discurso” nos expande as possibilidades, comparado a mostras de artes tradicionais.6 Enquanto a primeira relação de ‘homem-objeto’ estava bem articulada no ‘espaço superlativo’ do pavilhão modernista de Oscar Niemeyer, no Parque Ibirapuera, me focarei aqui nos dois encontros restantes, ‘homem-espaço’ e ‘homem-discurso’. Homem e discurso: para mim, que acompanhei de perto a trigésima Bienal durante os três meses e meio, a presença da Mobile Radio BSP foi o principal centro de ideias em fluxo. Mais de 600 participantes voluntários, entre eles artistas, músicos, pensadores, escritores, poetas, arquitetos e curadores passaram pela estação de radio. Transmitindo continuamente, sem repetições, a Mobile Radio BSP proporcionou uma plataforma para vozes e vocábulos que se demonstrou sublime em promover articulações de pensamentos e opiniões para a cidade de São Paulo. Se abriu ali um espaço para vozes inéditas, desconhecidas ou então atuantes em outras esferas incógnitas. A programação da rádio, transcendendo os padrões tradicionais, não apenas atingiu os ouvintes a través da internet e da 87.5FM, mas também se tornou, assim como o 30a Bienal de São Paulo 9 teatro, um lugar de experiência. A apresentação da Mobile Radio BSP virou um ponto de encontro, um local de mudança e de testemunho. Neste contexto eu acho que a Mobile Radio BSP realizou um dos desejos da curadoria que, anteriormente, no processo de planejamento da trigésima Bienal, se materializaria na Praça das Vozes (Hall of Voices).7 A Praça das Vozes era um pretexto para proporcionar um ponto de encontro da cena artística, transformando o pavilhão, que abrigava grande parte da 30ª Bienal de São Paulo, em um lugar de convergência. Mobile Radio BSP, então, fez o papel de agente potentializador neste sentido, juntamente com as ativações de obras de Simone Forti (Dance Constructions, 1961), Franz Erhard Walther (1. Werksatz, 1963-1969), as conversas coletivas do Ricardo Basbaum no pavilhão, bem como Sergei Tcherepnin e Ei Arakawa’s com as obras Looking at Listening (2011/2012) e ARCHICACTUS (outgrow/autogrow), 2012 na Casa Modernista em Santa Cruz, onde se apresentou uma serie de esculturas que investigavam uma percepção tonal do próprio visitante. Estes projetos foram potentializadores acerca do eixo homem-discurso, pois era ali, tal como na programação de simpósios, palestras, publicações e no projeto educativo, que o visitante ou voluntário realmente teve chance de se integrar, de ‘fazer’ a obra acontecer. Homem-espaço: a trigésima Bienal incentivou mostras que discutissem arquiteturas históricas ao lado de acervos históricos, por meio de uma constelação desenvolvida a partir da cidade. A curadoria trabalhou em conjunto com três Casas-Museu – a Casa do Bandeirante, a Capela