Música e Instrumentos Music and Instruments
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Música e Instrumentos Music and Instruments Carla Bromberg, Doutorado História da Ciência * Pesquisadora pos-doc CESIMA (PUC/SP) [email protected] (*Agradecimento à FAPESP) Resumo: A idéia imediata que surge da relação destas palavras música e instrumento é a união de ambas no objeto instrumento musical, cuja função primordial é a execução de uma música. Contudo, para que uma execução musical aconteça, muitos são os conhecimentos necessários, conhecimentos estes que quase nunca se configuravam num mesmo indivíduo. Sabe-se que historicamente músicos práticos, aqueles que cantam ou tocam; os teóricos, que são aqueles que discutem os conceitos e formulam estruturas e os luthiers, construtores de instrumentos, eram indivíduos que possuíam conhecimentos de naturezas diversas, utilizavam-se de métodos e conceitos muitas vezes não compartilhados nem reconhecidos por seus pares e ainda pertenciam a classes sociais diferentes. Neste artigo busca-se, através da análise de documentos italianos do século XVI, identificar algumas interações de conhecimentos práticos, teóricos e técnicos que se deram no meio musical e de que maneira os instrumentos foram abordados e tornaram-se ou não partes relevantes neste processo de conhecimento. Palavras Chaves: História da Ciência, Música e Ciência, Instrumento e Texto, Teoria e Prática. Abstract: The essential idea that comes to ones’ mind while reading the words music and instruments is the musical instrument itself, which is idealized to perform the abstract music within the musician’s mind or the composition. However, varied are the understandings necessary for a performance to take place and they are mostly acquired by different individuals. It is known that practical musicians, who play and sing; theorists, who define concepts and structures and luthiers, the builders of instruments were different individuals that had knowledge of different natures. Many times, they also hold different notions and concepts of the things and had mostly developed different methodologies. They were not assumed to be sharing their knowledge with their partners and they even belonged to different social stratum. The goal of this article is to identify interactions between the theoretical, practical and technical knowledge that took place within the cinquecento musical scene and to show how was the role played by the instruments on this process. Keywords: History of Science, Music and Science, Instrument and Text, Theory and Practice. Música e Instrumentos Menções à música e aos instrumentos musicais aparecem desde sempre na história. A historiografia clássica recorre às citações tão precoces quanto as da bíblia: a harpa do rei David, os trompetes de Jericó. Um dos principais personagens relacionado à “invenção” da música é Yuval. A história de Yuval aparece no livro Gênesis IV (2022). Yuval, “o pai da música”, que tocava a harpa e o órgão; é descendente de Caim, irmão de Tubalcaim, ferreiro e artesão do latão e do ferro; e de Yavel, pastor1. É interessante notar que esta lenda apresenta uma família, que representa um grupo com claras divisões de trabalho. Esta descrição histórica é análoga a descrições de povos árabes da Ásia. Alguns autores não consideram mera coincidência o fato de Caim ter três filhos, cada qual dedicado a uma atividade que representa as especialidades de tal sociedade: pastoreio, invenção da música e construção de instrumentos e trabalho na metalurgia2. No Renascimento, a maioria dos tratados teóricos de música resgata esta lenda3, seja em sua forma bíblica, na figura de Yuval e sua família, ou segundo sua herança grega, na figura de Pitágoras. Na versão pitagórica da lenda, que varia conforme as fontes biográficas de Pitágoras, as figuras dos irmãos são deixadas de lado e Pitágoras é descrito como o inventor das consonâncias, ou sons agradáveis, que ele identifica auditivamente ao passar por um ferreiro que bate martelos de diferentes pesos e tamanhos. Enquanto na Idade Média existiu uma preocupação em dar primazia a uma das versões e por vezes até excluir uma delas4, durante o Renascimento parece não ter havido esta preocupação. Pitágoras e Yuval, apresentados como responsáveis pela invenção e desenvolvimento da música como Ciência/Arte, encabeçam uma lista de nomes, na qual são incluídos personagens citados por autores como Cícero, Plínio, em suas grandes narrativas históricas, juntamente ao lado de compositores e músicos, tanto teóricos como práticos. 1 Genesis, (20) Genuitque Ada Jabal, qui fuit pater habitantium in tentoriis atque pastorum. (21) Et nomen fratis ejus Jubal: ipse fuit pater canentium cithara et organo. (22) Sella quoque genuit Tubalcain qui fuit malleator et faber in cuncta opera aeris et ferri. A tradição manuscrita varia nas diferentes maneiras de soletrar os nomes dos filhos de Lamech. 2 Albright, 1942, 2006, 98. 3 Bromberg, C. e Ana Maria Alfonso-Goldfarb, 2010, 165. 4 Ibid., 171. 2 Os autores dos tratados musicais do século XVI referem-se freqüentemente a essa lenda com o intuito de descrever a origem e invenção da música. Esta descrição tem por objetivo, não o fenômeno propriamente dito, como o canto, o som, ou o tocar de um instrumento; como parecem sugerir as descrições bíblicas, mas sim a descrição da invenção dos intervalos musicais. Os intervalos musicais, ao contrário dos instrumentos, configuram um material de estudo que pertencia aos currículos universitários “quadriviais”, pois a Música, ciência/arte era ensinada exclusivamente em sua forma teórica. Este estudo, de ordem especulativa, era legitimado por uma tradição literária. A tradição vigente era aquela transmitida através da Idade Média pelos escritos de S.N. Boécio5 e estabelecia a subalternação da Música à Aritmética. A finalidade última para Boécio era a filosofia, e o quadrivium, “um caminho que trazia a mente do conhecimento oferecido pelos sentidos às certezas do intelecto”6. Segundo Boécio, a primeira disciplina a ser estudada, a aritmética, seria aquela que possui “o papel de mãe”7 com relação às demais, pois a geometria, a música e a astronomia não podíam existir sem os números. Boécio exemplificou a subalternação destas ao dizer: “números são prioritários por sua natureza, pois são deles próprios constituídos e não dependem de sua referência a outro para existir [...]”8. No caso específico da música ele explica que os nomes dos intervalos são derivados de termos numéricos: a diatessaron (intervalo de quarta, do-fa), a diapente (intervalo de quinta, do-sol), e a diapason (intervalo de oitava, do-do) derivam respectivamente dos termos epitrita, hemiola e dupla, e menciona também o intervalo de tom, epogdous. Esta terminologia é ainda encontrada nos tratados de música do século XVI, contudo, seu uso mescla-se ao de termos utilizados por músicos práticos. Esta terminologia grega será um dos alicerces teóricos eleitos à crítica, por autores que, na Itália do XVI, buscavam um conhecimento fora desta tradição “boeciana”, mais conhecida pelo termo platônico-pitagórica. A música e a matemática não compartilhavam somente nomenclatura, mas também sua estrutura operacional, ou seja, a composição de razões é semelhante à 5 Boécio. De Institutione Arithmetica e De Institutione Musica. Masi. Boethian Number Theory: A Translation of the De Institutione Arithmetica, p.73. 7 Ibid., 74. 8 Ibid. 73. 6 3 composição de intervalos9, e a própria estrutura do tratado que comportava uma apresentação axiomática de seus elementos. Um terceiro fator, que demonstra a interação entre as áreas é visto através da freqüente menção, e por vezes da explicação10, do uso de instrumentos considerados matemáticos como o compasso, a régua, e outros, sobre os quais não existe um consenso na historiografia matemática, que são o mesolábio e o monocórdio, também chamado de canon ou régua harmônica. Nos tratados a descrição e classificação de intervalos são elementos comumente tratados pela maioria dos teóricos musicais do XVI: Pietro Aron, Giovanni Spataro, Nicola Vicentino, Francisco Salinas, Vincenzo Galilei, Franchino Gaffurio, Heinrich Glarean, Ludovico Fogliano e Gioseffo Zarlino, o principal teórico renascentista segundo a historiografia clássica. A definição dos intervalos aparece após a descrição dos números, das razões e das proporções de acordo com o método de descrição axiomática de Euclides, em sua obra Os Elementos11. Após a longa descrição dos números: pares, impares, parimente pares, imparimente pares, parimente impares, compostos, primos e etc, nos tratados teóricos musicais, segue-se à definição do número perfeito a de numero sonoro, objeto da música e sua “sub-classificação”, proposta na obra de Gioseffo Zarlino, o numero senario: “que são os números primos dentre os [números] perfeitos que contém qualquer intervalo em ato ou potência” (ZARLINO, 1555, p.210). Zarlino tentou, através do numero senario, tornar sustentável um fundamento teórico que já não respondia às demandas da prática musical. A tradição PlatônicoPitagórica proferia que a essência do fenômeno musical, assim como do cosmológico, consistia em razões numéricas. Os Pitagóricos aceitavam aqueles intervalos musicais que podiam ser obtidos através de razões de números inteiros de 1 a 4. Na prática, esta teoria não abarcava os intervalos musicais de terças e sextas que não eram contemplados por estes números, porém, eram amplamente utilizados no exercício musical. Existiu então, segundo a historiografia tradicional, uma distância entre a teoria e a prática musical, provocada pelo fluxo e interação de diferentes formas de 9 Szabó. The beginnings of Greek Mathematics, Part II. Galilei, 1581. Zarlino, 1558. Gaffurio;Kreyszig,1993. 11 Eram muitas as versões de Euclides acessíveis aos autores do XVI. Não somente aquelas parcialmente copiadas por Boécio, Valla, ou Cassiodorus, mas também as versões completas de Campanus (do árabe), de Zamberti (do grego) e de Tartaglia, do latim para o italiano. 10 4 conhecimento, que foi sanada por uma proposta vitoriosa, a do numero senario do teórico Gioseffo Zarlino12. Como vimos, a proposta de Gioseffo Zarlino manteve-se fiel a um fundamento matemático. Argumentando textualmente, utilizando-se de documentos novos, resgatados dos gregos ou mesmo de autores latinos já conhecidos, Zarlino proveu uma argumentação que tentava legitimar na autoridade, uma tradição ineficaz. Como resposta à opera de Zarlino vêm as obras de Vincenzo Galilei, pai de Galileo Galilei. Galilei, que vivia em Florença, havia sido discípulo de Zarlino, com quem havia estudado por um curto período de tempo em Veneza. Enquanto Gioseffo Zarlino confirmava sua crença na tradição pitagórica: “a música é uma ciência especulativa” 13 , cujo posicionamento filosófico está entre a metafísica e a física, para Galilei, a Música era uma ciência que consistia na prática e na teoria, assim como a Medicina14. Galilei confessava que mesmo ele, durante seus estudos com Zarlino15 acreditara na tradição pitagórica, porém enfatizava a necessidade da averiguação e da argüição dos fatos teóricos16. Assim como muitos humanistas de sua época, Galilei valeu-se dos estudos sobre textos antigos e das novas traduções que se tornavam acessíveis através do trabalho de filólogos e filósofos17. Contudo, para ele, os meios para detectar as soluções dos problemas teóricos e práticos musicais, não se resumiam a crítica das fontes, mas incluíam evidências advindas de experimentações18. Galilei confessava: “persuadidos pelos escritos de alguns, nos quais até eu acreditava, até que, movido pela força maestra da experiência...” 19 (GALILEI, 1580, p.171). 12 Palisca. Studies in the History of Italian Music and Music Theory. Zarlino, Istitutione harmoniche, p.20. 14 Galilei, Discorso…Zarlino, 1589. 15 Vincenzo Galilei foi discípulo de Gioseffo Zarlino provavelmente durantes os anos de 1562 e 63 em veneza, onde Zarlino era o responsável pela Música na Catedral de São Marcos. Vide o verbete “Vincenzo Galilei” in The New Grove Dictionary of Music and Musicians, C.V.Palisca, Vol.7, pp.96-98. 16 Galilei, Il primo libro del contraponto, p.8. 17 Galilei manteve uma correspondência com o filólogo romano Girolamo Mei, discípulo de Pietro Vettori, que traduzia principalmente a obra de Aristóteles. Palisca, 1977. 18 Goldfarb, 2006, 11-42. 19 Para a tradução preferimos manter o termo de acordo com o significado dado à palavra sperienza (ou esperienza) como aparece no Vocabolario della Crusca. A discussão sobre o que significariam as experimentações de Vincenzo foi amplamente abordada por Palisca, 1961 e 2000; D.P.Walker, 1978 e não constitui o escopo deste artigo. 13 5 Por sua vez, para Zarlino “o perfeito conhecimento da música” era adquirido através da “historia e da methodica”20. Esta última era composta de divisões taxonômicas responsáveis pela organização dos materiais musicais (classificação de intervalos, modos, escalas e etc) e Galilei iria refutar vários desses tópicos sistematicamente. Quanto a historia, Zarlino referia-se à narrativa histórica da origem da música. Consistia na parte do tratado musical mais comum, recontando diversos autores e tinha dentre suas finalidades a exaltação da música. O topos desta narrativa histórica era representada pela fábula de Pitágoras21. Galilei, que não possuía cargo eclesiástico nem acadêmico, exercia as atividades de professor de música, de alaúde, compunha e escrevia seus tratados teóricos. Para ele, a relevância da crítica textual estava na capacidade de trazer novos dados e em prover o autor com uma terminologia contextualizada. A terminologia utilizada pelos gregos na definição de intervalos, não podia ser adotada livremente pelos teóricos modernos. Embora diapason fosse corretamente entendida como intervalo de oitava, em grego,διαπασώυ significa “o acorde [no sentido de concordância] que passa por oito cordas”, assim como o intervalo de quarta, διαεσσάςων, é “o acorde que passa por quatro cordas” e o de quinta, διαπεντε,é “o acorde que passa por cinco cordas”. Esta terminologia, não só tem relação direta com o instrumento, como demonstra uma prática de numeração das cordas, que nem sempre aconteceu na história. Esta terminologia também servia para um estudo mais preciso dos instrumentos antigos, praticamente desconhecidos dos teóricos; e de grande relevância para Galilei, que traz ilustrações de alguns em sua obra Dialogo (1581)22. Nos tratados musicais aparece ainda o termo hypate nete, para oitava, que são os nomes de duas cordas, que tocadas simultaneamente geram um intervalo de oitava. Estas cordas são nomeadas de acordo com sua altura, ou registro, e posição no instrumento. Segundo Galilei, este fato demonstrava que os gregos sim conheciam a polifonia, ou seja, a prática de sons simultâneos, desacreditada por Zarlino. Quanto ao número e posicionamento de cordas, Galilei chamou atenção para o fato de os intervalos mudarem de característica sonora ao serem transpostos por registros. O posicionamento dos intervalos por registro não dependia apenas da vontade do músico ou do 20 Zarlino,1588, p.10. Gozza. “Desiderio di Natione Lombardo da Pavia e la teoria musicale del Rinascimento”, pp.129-148. 22 Galilei, 1581, pp.126-130. 21 6 compositor, mas do material da corda do instrumento, que por sua natureza estaria apta ou não a entoar aquele som. Ou seja, o material da corda deveria ser levado em consideração pois afetava (devido a efeitos de não linearidade) a posição dos intervalos musicais, desviando-se dos previstos pela geometria23. Quanto às experimentações, Galilei convencido da inadequação dos fundamentos matemáticos à explicação do fenômeno musical, demonstrou que intervalos aceitos pela teoria platônico-pitagórica, como era a oitava, a quinta e a quarta, podiam ser representados por outras razões matemáticas que não estavam contempladas pelo sistema. Em uma obra dedicada ao estudo da oitava Galilei concluiu: “[…] muitas deliberações foram consideradas por mim, quanto à diversidade de proporções em que poderíamos obter a diapason e, também relacionado a isto, a diversidade de intervalos musicais que pudemos encontrar com a proporção dupla, [...], os meios nos demonstrarão a diversidade de proporções de muitos outros intervalos24” (GALILEI, 1590?, p.188). Galilei demonstrara que a música era uma ciência que ia além da representação matemática e exigia nova fundamentação. Uma terceira proposta aparece nos escritos de Nicola Vicentino. Enquanto Galilei buscou novo fundamento para a música utilizando-se de crítica literária, mas principalmente de seus experimentos com instrumentos que focavam no estudo do comportamento de suas matérias e no estudo de suas qualidades, Nicola quis prover seus contemporâneos com a construção de instrumentos que pudessem ‘tocar’ as desconhecidas escalas e intervalos descritos pelos antigos e resgatados nos conhecidos e outros inéditos manuscritos. Assim como as pesquisas de Galilei foram, de certa forma incentivadas por sua discussão com Zarlino, Nicola Vicentino, italiano, regente de coro, sem vínculo acadêmico ou eclesiástico também entrara numa disputa com o cantor da Capela Papal de Roma, de origem portuguesa, Vicente Lusitano. Cada qual queria provar que havia 23 D.Abbot e E.Segerman, , pp.48-73. “[..] I say that when you listen to the sounds of 4 strings stretched as lines arranged in this order 1,2,3,4, you will hear the fourth and the fifth, but outside the octave, whereas between surfaces, in which the ratio of the octave is 4:1, you will hear them inside the octave….Thus the smaller intervals are both inside and outside the octave in their places, but whether it is more noble to b contained or o contain is something o consider further.[…] because by means of the heavier weights I get also the sounds that the lighter weights will give me, and similarly with the low pipes I can get the sounds of the higher pipes, but not vice-versa. Galilei. Discorso particolare…diapason,p.188. 24 7 um gênero de escala grega que perdurara no processo histórico e era sim executado por eles. Nicola perdeu a disputa, mas para provar sua hipótese construiu dois novos instrumentos que teoricamente conseguiam adequar-se à prática dos modelos de sistemas modais gregos. O principal instrumento, um archicembalo está descrito e ilustrado em sua obra L’antica musica ridotta alla moderna prattica, cap.5. Dos vários pormenores elencados por Nicola, que não compartilha da visão e metodologia de Galilei e parece mais adequado ao conservadorismo platônico-pitagórico de Zarlino aparece sua menção aos construtores de instrumentos, indivíduo, segundo ele, que meramente executaria o serviço e construção, visto que a elaboração intelectual, que era o mais importante, já havia sido feita (VICENTINO, 1555). Nicola chamou a atenção em sua obra para o problema terminológico dos intervalos explicando que “não se utilizará dos nomes gregos visto que não pretende ofuscar o intelecto dos ouvintes, e que quem os queira conhecer, que leia Boécio” (VICENTINO, 1555, p.4)25. Conclusão Embora tradicionalmente as diversas formas de conhecimentos fossem tidas como apartadas umas das outras, neste artigo foram identificados momentos que evidenciam a interação destes e identificam algumas formas pelas quais eles puderem ser sintetizados ou contrapostos. No caso de Zarlino, embora uma terminologia mista, que demonstra uma interação com a prática e mesmo com os intrumentos, sejam eles matemáticos ou musicais, como o alaúde e o trombone, ou o monocórdio e o mesolábio; o autor não chega a assumir a relevância destes estudos na música, que para ele continua sendo simplesmente uma ciência de escopo especulativo e toda a sua argüição é levada a servir uma tradição já pré-estabelecida. No caso de Nicola recorre-se à construção de instrumentos para legitimar na prática a eternidade de uma tradição de fundo teórico. É somente no caso de Galilei que os instrumentos são utilizados na investigação da natureza, porém como seus estudos não tinham na autoridade sua legitimação não foram reconhecidos até sua menção por Marin Mersenne no século XVII. 25 Vicentino, 1555, p.4. 8 É interessante notar que através da crítica textual e resgate de textos antigos, práticas comuns ainda no século XVI, aparecem temas relevantes como a correta identificação da terminologia. Visto que mesmo que uma tradução possa ser acurada do ponto de vista filológico, ainda assim pode dar espaço a uma interpretação errada do texto. Nos casos citados, assim como ao padronizar várias terminologias os autores puderam inferir um conteúdo matemático compreensível e de acordo, no âmbito musical estas palavras sugeriram ideias erradas sobre a música ciência. Bibliografia ABBOT,.Abbot e E.Segerman. Strings in the 16th and 17th Centuries. Galpin Society Journal XXVII, 1974, pp.48-73 ALBRIGHT, William F. 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