Educar para a cidadania
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Educar para a cidadania
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○○ ○○ ○○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ IX Encontro Nacional Metodista de Educadores Educar para a cidadania Educating for citizenship Regina Alcântara de Assis Doutora em Educação – Columbia University (USA) Ex-Secretária de Educação do Rio de Janeiro (RJ) R e s u m o Em sua fala no IX Encontro Nacional Metodista de Educadores, Regina Alcântara de Assis fala sobre as Diretrizes Curriculares Nacionais e na sua importância uma educação para a cidadania. Os princípios éticos, políticos e estéticos utilizados na elaboração das Diretrizes são abordados pela autora, que explicita a importância de se levar em conta, na elaboração de propostas pedagógicas, aspectos como a diversidade cultural, a autonomia e a solidariedade. Unitermos: diretrizes curriculares; diversidade cultural; princípios éticos; autonomia Synopsis The National Curricular Guidelines and their importance in education for citizenship are the main subject of this article. The ethical, political and aesthetic principles used in preparing the Guidelines are also covered, as well as the importance of taking into account, in the preparation of teaching proposals, aspects like cultural diversity, autonomy and solidarity. Terms: curricular guidelines; cultural diversity; ethical principles; autonomy Resumen Las Directrices Nacionales Curriculares y su importancia para la ciudadanía son el principal tema de este artículo. Los principios éticos, políticos y estéticos utilizados en la elaboración de las Directrices se abordan también, al igual que la importancia de tener en cuenta, en la elaboración de las propuestas pedagógicas, aspectos como la diversidad cultural, la autonomía y la solidaridad. Términos: directrices curriculares; diversidad cultural; principios éticos; autonomía Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ 57 ○ ○ ○ Ano 9 - n0 16 - Junho / 2000 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ G ostaria de esclarecer o lugar de que falo. Falo do lugar da professora por opção. Do lugar daqueles que, como nós, acreditam que a educação, se não for o melhor, é um dos caminhos para re-humanizar a humanidade. E isso passa pela espiritualidade na educação. Eu sou católica, mas tenho uma visão ecumênica e acho que os metodistas têm esse dom de trabalhar com delicadeza e energia a questão da espiritualidade, a concepção da relação do ser humano com a re-ligação, o religare ao mais transcendente. Desse lugar da professora que, como outros colegas, na Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação – CNE, receberam a incumbência de relatar as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação, gostaria de refletir sobre nossas responsabilidades, sobre nossas alegrias e nossos prazeres. Gostaria de falar sobre esse ofício de resguardar a capacidade de ser humano na entrada do terceiro milênio e, oxalá, sempre, pois a ação exercida pela educação passa para as outras gerações. A boa palavra, a boa semente, a boa escrita são coisas que permanecem. Assim, é nesse espírito que gostaria de discutir a importância das diretrizes nessa perspectiva de ser humano. A elaboração das Diretrizes foi um esforço coletivo, um dos maiores desafios nacionais que já enfrentei. Quando era secretária municipal do Rio de Janeiro, acreditava que não haveria nada mais difícil. A cidade mantém a maior rede pública municipal de ensino do País, com 1.033 escolas, 40 mil professores e cerca de 700 mil alunos. No entanto, quando fomos incumbidos de escrever as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica, encaramos um desa- ○ ○ Revista de Educação do Cogeime ○ ○ 58 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ fio bem maior. Afinal, são 5.500 municípios em todo o Brasil. É uma grande diversidade, ainda bem; mas infelizmente, também uma enorme desigualdade. E esse é um dos grandes desafios que temos que enfrentar neste terceiro milênio: a busca da igualdade na diversidade; a igualdade de oportunidades num país ainda muito desigual, injusto nas oportunidades educacionais que oferece à sua população, principalmente às famílias de baixa renda. Para dar continuidade ao meu raciocínio, é importante deixar bem clara a diferença entre Parâmetros e Diretrizes Curriculares Nacionais. A Lei de Diretrizes e Bases da educação consagra uma decisão da maior importância sob o ponto de vista educacional, que é a de definir o Brasil como um país que não terá um currículo nacional. Desse modo, foi conferida a cada unidade da federação, a cada secretaria estadual ou municipal e, mais do que isso, a cada equipe de cada unidade escolar, a autonomia para elaboração de suas próprias propostas pedagógicas e curriculares. Ora, isso coloca nas mãos de nós, educadores, uma independência oficializada pela lei, que nunca tivemos. Seja no sistema público ou privado, cada equipe pedagógica tem o direito de definir quais as influências teóricas que deverão iluminar as suas práticas pedagógicas, através das propostas curriculares. Por outro lado, o MEC definiu os chamados Parâmetros Curriculares como uma contribuição aos sistemas brasileiros de ensino, no sentido de orientar suas práticas pedagógicas, mas sem obrigatoriedade. Eles são uma contribuição feita pelo governo federal para um país onde, em muitos lugares, devido à desigualdade, não há Cada escola tem autonomia para elaboração de suas próprias propostas pedagógicas e curriculares ○ ○ ○ Ano 9 - n0 16 - Junho / 2000 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ pessoal qualificado, o material é escasso e a distância de universidades, centros de pesquisa e bibliotecas é grande. É importante que isso fique claro. Os Parâmetros são uma contribuição; no entanto, trazem um recorte teóricometodológico. Já as Diretrizes CurricuAs Diretrizes lares Nacionais, estas sim, são Curriculares Nacionais são mandatárias por mandatárias por força de lei, mencioforça de lei nadas pela LDB como aquelas que orientarão, obrigatoriamente, as práticas pedagógicas dos 5.500 municípios braA estética, muitas sileiros. vezes, está ausente das Por isso é tão desafiador escrever práticas pedagógicas, que se tornam essas Diretrizes – porque cabe ao Conselho Nacional de Educação defini-las cansativas e monótonas para toda a Educação Básica, composta pela Educação Infantil e pelo Ensino Fundamental, e para o Ensino Médio. Coube-me, então, a responsabilidade de escrever as Diretrizes para a Educação Infantil e o Ensino Fundamental, contando, para isso, com a colaboração de colegas como o professor Almir de Souza Maia e a professora Guiomar de Melo, ex-aluna do Colégio Piracicabano que escreveu as Diretrizes Curriculares para o Ensino Médio. Princípios éticos, políticos e estéticos da educação Agora, podemos partir para uma reflexão que, eu imagino, seja feita por vocês educadores a cada manhã, que diz respeito ao papel da escola, ao papel das instituições metodistas. Iniciamos, então, uma análise de qual seria o nosso trabalho num país com múltiplas religiões, com múltiplas etnias e com múltiplas situações culturais, econômicas e sociais. Depois de debater muito e ouvir muitos educadores pelo país, definimos que é preciso dizer de onde sa- Revista de Educação do Cogeime Nosso trabalho como educadores exige que definamos o que é trabalhar autonomia, solidariedade e responsabilidade ○ ○ ○ 59 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ímos e para onde queremos caminhar com os nossos alunos e professores. A partir daí, decidimos trabalhar com um conjunto de princípios éticos, políticos e estéticos. A estética, muitas vezes, está ausente das práticas pedagógicas, que se tornam cansativas e monótonas. Nós quisemos, com a normatização, definir a escola como um lugar onde o prazer, a beleza e a alegria têm que estar presentes, de uma forma múltipla, diversa. Trabalhamos, então, com a concepção de quem somos nós, educadores, quem são nossos alunos e quem queremos que eles sejam, nessa trajetória de entrada no mundo da cidadania plena. O caminho pela escola é um caminho que abre portas para a cidadania plena, isto é, para o exercício de direitos e deveres, da democracia tão recente. Por isso, achamos necessário definir certos princípios éticos que, para nós, são sagrados. O primeiro deles é o princípio da autonomia, ou seja, cada um com o direito de pensar a partir da sua própria capacidade de perceber o mundo, da sua cultura, da sua história, da sua trajetória. O segundo é o princípio da solidariedade; afinal não estamos sós, fazemos parte de uma nação. Assim, a ética, necessariamente, se complementa com os princípios da autonomia e da solidariedade. Se temos professores, diretores e alunos autônomos e solidários, certamente teremos pessoas muito mais responsáveis, que de fato assumam que ser humano é se importar, é olhar o lado do outro. O nosso trabalho como educadores – e isso precisa ficar explicitado nas nossas práticas pedagógicas, através da definição de uma proposta curricular – exige que a gente defina o que é trabalhar a autoAno 9 - n0 16 - Junho / 2000 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 60 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ mos que considerar o direito a uma vida digna, na qual a convivência seja prazerosa, respeitosa e feliz, mas onde haja limites e critérios de convivência pré-estabelecidos. Para que isso seja possível, é necessário que se faça a escolha pela ordem democrática. Claro que ainda falta muito para que possamos viver esse ambiente de democracia. No entanto, se não fizermos a nossa parte como educadores discutindo, dentro das escolas, o que é política, o que é convivência democrática, o que são direitos e deveres, isso vai tardar mais ainda. É um conjunto de ações que fará do Brasil um país mais humano, mais fraterno, mais democrático; um país onde todos tenham de fato direitos iguais. Finalmente, a elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais foi guiada também por um conjunto de princípios estéticos, que são os princípios da sensibilidade, da criatividade e do acolhimento à diversidade cultural. A partir deles, verifica-se como as propostas pedagógicas, na constituição de conhecimentos e valores, trabalham com uma pedagogia da sensibilidade, do dom da leveza – de que fala Ítalo Calvino em seu livro “Seis Propostas para o Próximo Milênio” – de perceber o ponto de vista de 30, 40 alunos. É a sensibilidade que vai permitir que a criatividade não seja apenas uma moda, mas um comportamento real de professores e alunos. E é isso que vai proporcionar a possibilidade de acolhimento da diversidade cultural que existe em cada sala de aula. A questão da diversidade cultural e a exigência de sensibilidade por parte dos educadores, para que eles possam recriar práticas pedagógicas a cada ano letivo, é imprescindível. Falamos, então, do conjunto de princípios que compõem a Primeira nomia, a solidariedade, a responsabilidade e, em conseqüência, a opção pelo bem comum. E isso significa trabalhar os princípios éticos desde as decisões que parecem prosaicas, pequenas, cotidianas, até decisões maiores, que têm a ver com o próprio regimento das escolas e dos grêmios Para uma convivência escolares, que são uma das mais prazerosa e respeitosa, é necessário que se importantes instituições dentro da esfaça a escolha pela cola, pois reumanizam o ambiente e ordem democrática levam os alunos a viverem a própria situação da cidadania, do voto, da vitória, da derrota e da manutenção do desejo da maioria e da busca do bem comum. O segundo conjunto são os princípios políticos. Esses princípios são consagrados na Constituição Federal de 1988 em seu Estatuto da Criança e do Adolescente. O problema da violência contra a criança e o adolescente que é perpretada em casa é cada vez mais sério neste país. A violência é punida pela lei; antes disso, no entanto, é importante que as escolas tenham refletido junto com os pais, mostrando que as crianças têm direitos. As crianças brasileiras que não vêem o reconhecimento de seus direitos ao carinho, ao acolhimento, à saúde e à educação com qualidade farão atos contra a sociedade e cometerão infrações. Na medida em que esses direitos forem respeitados e que problemas como trabalho precoce, gravidez precoce, prostituição infantil e adolescente, violência, drogas, Aids e doenças sexualmente transmissíveis sejam realmente enfrentados por nós A questão da na escola, em casa e na comunidade, diversidade cultural e a exigência de esse quadro de barbárie será sensibilidade por revertido. parte dos educadores Temos que lidar com esses direitos é imprescindível e deveres da cidadania através de nossas práticas pedagógicas explicitadas em nossas propostas curriculares. TeRevista de Educação do Cogeime ○ ○ Ano 9 - n0 16 - Junho / 2000 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Diretriz Curricular Nacional, cujo objetivo principal é iluminar a maneira de cada equipe pedagógica, de cada professor criar e recriar suas propostas pedagógicas. A questão da identidade A Segunda Diretriz Curricular Nacional trabalha a questão da identidade de alunos, de professores e das próprias instituições escolares. Nossas salas de aula têm alunos que trazem raízes africanas, européias, asiáticas, indígenas; nós temos a capacidade de entender nossa feminilidade ou masculinidade e, ao mesmo tempo, nossa herança étnica. Como isso se expressa nas nossas práticas, de que maneira somos capazes de perceber isso na presença de nossos alunos? A questão da identidade se manifesta através de aspectos relacionados ao gênero, por exemplo. Insisto em que não são questões referentes a sexo porque não se trata apenas da diferença biológica, mas também da cultural. As pessoas – alunos e professores – têm preferências sexuais e essa questão, assim como o homossexualismo, deve ser abordada nas escolas. Outra questão diz respeito à afirmação, feita muitas vezes, de que o povo brasileiro não é racista. Na verdade, há muito racismo no país; vêse muito pouco a manifestação e o orgulho da herança africana em nossas escolas. Os livros de história, os brinquedos e os cartazes não reconhecem a importância do raízes africanas para o Brasil. Vemos, ainda, o desprezo e a ignorância em relação aos povos indígenas. Também foram escritas as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educa- Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ção Índígena, o que resultou na realização de uma audiência pública com os povos indígenas no CNE. Felizmente, hoje já está definida legalmente a possibilidade de educação bilíngüe e trilíngüe para as populações indígenas. Mas a diversidade não diz respeito só à Língua. Refere-se, também, à cultura que é passada na História, na Geografia, nas Ciências. É essa visão étnica das nossas propostas pedagógicas que vai nos tornar mais humanos, mais brasileiros. O que é ser brasileiro? Qual a História do Brasil que nós contamos? Quais os conhecimentos das Ciências que nós trabalhaJoão Ubaldo Ribeiro mos? Que reconhecimento nós damos reconstitui a época das à força dessas populações de etnias vainvasões holandesas e mostra quem somos de riadas na constituição do povo verdade brasileiro? João Ubaldo Ribeiro, em seu livro “Viva o povo brasileiro”, reconstitui a época da invasão holandesa na região Norte do País e, ao mesmo tempo, mostra quem somos de A questão da identidade se manifesta verdade – uma mescla que inclui negros, europeus, indígenas e, mais reatravés de aspectos relacionados ao gênero centemente, asiáticos. De que maneira isso se expressa em nossas práticas? Como são reconhecidas as formas eficazes usadas por outras populações brasileiras para resolverem seus problemas e conviverem entre si? É a essas questões que a identidade se refere. As Diretrizes Curriculares Nacionais insistem que esse é um aspecto importantíssimo a ser levado em conta na definição de currículos e práticas pedagógicas. Educação e cidadania No conceito de paradigma curricular. Não se trata de um modelo de grade curricular, mas sim de uma indicação do que não pode faltar em nenhum currículo brasileiro. Qualquer que seja a proposta curricular adequa- ○ ○ ○ 61 ○ ○ ○ Ano 9 - n0 16 - Junho / 2000 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 62 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ seu estado, que está dentro de seu país, que está dentro de seu continente e assim por diante deve ser trabalhada com os alunos. Nosso planeta é frágil e o equilíbrio ecológico – da natureza e dos seres humanos com a natureza – depende da adoção dessa postura. Temos que reumanizar nossas práticas pedagógicas a partir dessa visão; sem isso, como já se prevê, o futuro dos nossos filhos e dos nossos alunos será difícil. É preciso que discutamos, no interior das escolas, a delicadeza da vida nesse planeta e a nossa responsabilidade. Finalmente, outro aspecto trabalhado por todas as Diretrizes Curriculares diz respeito à gestão democrática de qualidade das nossas escolas. Como vocês administram suas escolas? Há múltiplas formas de se avaliar a eficácia do nosso trabalho. Mas é importante refletir sobre quais são as estratégias que utilizamos para gerir as equipes de trabalho que reunimos. Esse conjunto de diretrizes é o que nos inspira, nesse final/início de século e de milênio, a reumanizar nosso trabalho e tornálo melhor, mais prazeroso e com efeitos visíveis não só em nossa comunidade mas, aos poucos, em nosso país. da, não se pode deixar de fora o paradigma curricular que veremos a seguir. Esse é o desafio: a base comum nacional, determinada pela LDB e composta pela língua materna, a Língua Portuguesa, a Matemática, as Ciências, Nosso planeta é frágil a Geografia, a História, a Educação Are o equilíbrio tística, a Educação Física e a Educação ecológico depende da Religiosa tem, necessariamente, que adoção dessa postura interagir com aspectos da vida cidadã, ou seja, com questões ligadas à saúde, à sexualidade, à vida familiar e social, ao mundo do trabalho, ao mundo da ciência e da tecnologia, ao meio ambiente, à cultura e às linguagens artísticas e tecnológicas. Portanto, o paradigma definido pelas Diretrizes Curriculares Nacionais não é a única forma de se elaborar um currículo, mas é que o Conselho Nacional de Educação, após consultar uma ampla gama de educadores brasileiros, definiu como a melhor maneira para que os educadores possam organizar suas propostas curriculaEsse conjunto de res, articulando conhecimentos e va- diretrizes é o que nos inspira, a reumanizar lores com a vida cidadã. nosso trabalho Um outro aspecto importante diz respeito ao planejamento, ao desenvolvimento e à avaliação da prática pedagógica das escolas. Não há como dizer que uma prática é de qualidade se ela não for avaliada. Externamente, já existem o SAEB – Sistema de Avaliação da Educação Básica e o ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio. Além disso, no entanto, é importante que os sistemas criem suas ferramentas de avaliação interna. As Diretrizes Curriculares Nacionais ressaltam, ainda, que a educação tem que se preocupar com o local, o regional e o global. Somos partes de uma galáxia, de um universo infinito. Essa visão holística de que somos indivíduos dentro de uma pequena aldeia, que está dentro de Revista de Educação do Cogeime ○ Propostas para o próximo milênio Concluindo, gostaria de retomar as “Seis Propostas para o Próximo Milênio” feitas por Ítalo Calvino. Elas me parecem muito interessantes, porque tratam do que se espera que os seres humanos sejam capazes de ser e de fazer no próximo milênio. Calvino escreveu esse livro num momento de grande perplexidade. Ele dedicou sua vida ○ Ano 9 - n0 16 - Junho / 2000 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ à literatura e, antes de falecer (esse livro resultou do texto de seis conferências que ele faria na Universidade de Harvard), se perguntava se, no terceiro milênio, os livros desapareceriam por causa da informática, da televisão e da tecnologia. Suas palavras nos levam a concluir que não – o livro jamais desaparecerá, assim como a escola e nós, professores, jamais desapareceremos. Claro que nós e as escolas nos transformaremos. O que Calvino coloca é que precisamos ter mais leveza na maneira de ser, de conviver e de trabalhar. Leveza não significa superficialidade, mas delicadeza, sensibilidade no trato consigo mesmo. Aqueles de nós que já ultrapassaram a barreira dos 50 anos sabem o quanto é importante ter paciência com nós mesmos. Precisamos ter a sensibilidade de saber conviver com os próprios limites e também com as próprias capacidades. Depois dos 40, dos 50 anos, a gente perde o medo. Para mim, isso é uma vantagem, pois nos estimula a realizar, ainda que tenhamos outros medos e peçamos a Deus para que nos dê uma boa saúde e que mantenha nossa capacidade de trabalhar e de nos transformar. Estamos educando as gerações do terceiro milênio, que vai precisar dessa leveza e sensibilidade para viver e conviver bem. Ao mesmo tempo, neste final de milênio, leveza e sensibilidade exigem rapidez, já que nosso mundo se caracteriza pela necessidade de resolver muitas coisas rapidamente. No entanto, vamos ter que resguardar uma coisa muito importante, que é a exatidão – ou seja, nós não podemos, nesse caminho de leveza e rapidez, ser superficiais. Nossos alunos têm que fazer escolhas com muita rapidez. A vida não vai esperar por eles com esperou por Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ As companhias telefônicas importam mão-de-obra, num país que sofre de desemprego Um lugar como a UNIMEP é importantíssimo para o país nesse momento ○ ○ 63 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ nós, os mais velhos, que tivemos mais tempo para fazer opções. O Brasil da nossa juventude é muito diferente do Brasil da juventude de nossos filhos. As opções têm que ser feitas com exatidão e rapidez mas, por outro lado, temos que ser capazes de fazer visível para os alunos a qualidade daquilo que produzimos. Quem dá valor à educação no Brasil? Só agora começamos a ver um número maior de pessoas dizendo que sem educação não há solução, porque isso está começando a doer no bolso do empresariado e a prejudicar a capacidade de competitividade do país no mundo globalizado. Está ocorrendo a privatização de vários serviços públicos e vivemos um dilema – não existe, no Brasil, um número suficiente de pessoas capacitadas a gerir e a trabalhar, sob o ponto de vista técnico, com várias das novas tecnologias de comunicação telefônica, por exemplo. As companhias telefônicas importam mão-de-obra, num país que sofre de desemprego. Isso acontece porque ainda não tivemos a capacidade de antecipar o que vem por aí. Um lugar como a UNIMEP é importantíssimo para o país nesse momento, exatamente para antecipar esses passos, esses caminhos. Quando falamos na possibilidade de, com a exatidão, fazer visíveis as nossas capacidades, é disso que estamos falando – educar para a competência, fazem com que nossa educação tenha valor e que nossos alunos, além de conhecerem, serem e conviverem, possam adaptar aquilo que aprenderam às novas exigências do mundo do trabalho e da sociedade brasileira. Outra situação é que vivemos num Brasil múltiplo e, por isso, as Diretrizes Curriculares se referem a um país com diversidade étnica, política, es- O Brasil da nossa juventude é muito diferente do Brasil da juventude de nossos filhos ○ ○ ○ Ano 9 - n0 16 - Junho / 2000 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ tética, espiritual. Nós precisamos, no âmbito de nossas atividades pedagógicas, ter competência de dar à luz essa multiplicidade. A multiplicidade é uma questão sobre a qual poderíamos discutir horas, porque ela traz dentro de si aquilo que anunciamos quando começamos a discutir a identidade – a variedade de situações e de modos através dos quais as pessoas aprendem. Uma conseqüência prática disso é que os cursos de Pedagogia e as licenciaturas precisam formar educadores que tenham todas essas capacidades. O novo educador brasileiro que se exige para essa educação é aquele que conhece muito de psicologia do desenvolvimento e de antropologia cultural e tem uma formação em filosofia e em princípios espirituais (seja qual for a denominação religiosa à qual pertence), além de conhecer as áreas da informática e da comunicação de massa. Revista de Educação do Cogeime ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 64 ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Encerro dizendo o seguinte: este país tem um caminho. Eu acho que grandes passos foram dados nesses últimos anos por nós e por órgãos governamentais. A criação do FUNDEF – Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e a definição das Diretrizes são importantíssimas nesse sentido. Gostaria de terminar com uma frase de Sêneca, um pensador latino, que dizia: “não há ventos favoráveis para quem não sabe aonde vai”. Eu acredito que todos sabemos para onde vamos. Muitas vezes, no entanto, vamos precisar de um timoneiro experiente e com capacidade de gestão. Uma iniciativa com esta, o Encontro Nacional de Educação, mostra isso – vários timoneiros experientes, trazendo outros para lhes dizer: “escutem, o curso dos ventos nos leva para lá, mas que tal se modificarmos um pouco a rota e fizermos uma nova opção?”. A criação do FUNDEF e a definição das Diretrizes foram importantíssimas ○ ○ ○ Ano 9 - n0 16 - Junho / 2000