As narrativas biblicas da Criação em diálogo com a ciência
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As narrativas biblicas da Criação em diálogo com a ciência
As narrativas bíblicas da criação em diálogo com a ciência Sexta 17/7/2009 Irmã Luisa Maria Almendra Prof. de Sagrada Escritura na Faculdade de Teologia, UCP-Lisboa, Doutorada em Teologia Bíblica - Roma. Objectivos deste curso: - Apreender novos paradigmas de leitura e interpretação (Gn 1-11), que permitam redimensionar a perspectiva bíblica, sem suprimir a competência da ciência -Distinguir a linguagem imagética da fé bíblica da linguagem da ciência, tirando daí as devidas consequências para um cristão. 1ª parte - Introdução A Bíblia nasceu e cresceu em tempos pré-científicos, mas dizer que conciliar a Bíblia com a cosmologia científica é impossível, é extremista. Há liberdade na forma como se interpreta a Bíblia, mas não pode haver colisão com a orientação da Igreja. É possível fazer uma analogia com uma casa: os fundamentos da Bíblia são os alicerces da casa; as interpretações são a decoração da casa. "No princípio, Deus criou os Céus e a Terra": assim é a primeira frase da Bíblia, no livro do Génesis. Em sete dias, o Criador fez a água e a terra, a luz e a escuridão, os animais e o homem. Se aceitarmos de forma literal esse relatório da Criação, o nosso planeta azul contaria, diga-se de passagem, apenas 6 mil anos de existência. Este tema foi escolhido devido à comemoração do nascimento de Darwin (200 anos, se ainda estivesse vivo) e do lançamento de A Origem das Espécies (150 anos). E nessa leva ouvimos algumas "pérolas" como: "Darwin abalou a religião", "Ciência e religião travam uma batalha de 150 anos" entre outras coisas. Na sua obra Darwin elabora a primeira tentativa científica de explicar a biodiversidade natural e o surgimento do ser humano. Na época, uma onda de indignação varreu a Inglaterra vitoriana. E hoje? "Darwin contra a Bíblia" – esta oposição ainda vale? – questionou a Irmã Luísa. As relações entre ciência e fé foram turbulentas. É justo reconhecer que houve momentos negativos, sobretudo o caso Galileu. No ano 2000, João Paulo II quis pedir perdão e enterrar este passado. Agora, procuramos nos orientar para o futuro. Vale a pena lembrar que a Igreja católica nunca condenou Darwin ou seus escritos. Em 1950, Pio XII considerava compatíveis evolução biológica e doutrina católica. Em 1996, João Paulo II disse que a teoria da evolução é praticamente um consenso entre os cientistas, o que convida a um diálogo com a teologia, que naturalmente se move em um plano diferente. Mas como interpretar os primeiros capítulos do Génesis? O livro de Génesis é em tudo especial: Nenhum livro da Bíblia provoca tantos comentários ou cismas quanto ele. Seu título quer dizer "origem", e a primeira palavra do livro vem do hebraico, significando "no princípio". Esta é uma das características mais importantes do livro, pois ele relata o começo de tudo, menos o começo de Deus. Sem tal livro, a revelação do Deus criador seria limitada e falha. No Génesis, fala-se da origem histórica da humanidade para revelar seu sentido profundo, que é metahistórico. Fala-se do primeiro homem, não porque desejamos descrever o que aconteceu durante a evolução não se pensava nisso quando a Bíblia foi escrita: as espécies são fixas na sua narrativa -, mas para compreender a humanidade. É uma realidade histórica que somos filhos de Adão - ou seja, todos descendemos da mesma linhagem humana -, mas a mensagem principal é meta-histórica. O relato do Génesis procura identificar as três relações fundamentais: com o Criador, com a criação e com o próximo. A Bíblia coloca naquele personagem primordial o rosto de todos os homens. O nome Adão, em hebraico, confirma esta intenção: ha'-adam. Ha é o artigo definido "o". 'adam significa "aquele que tem a cor ocre da argila". É o Homem com "H" maiúsculo. Não é um nome próprio, mas uma representação. Trata-se de uma análise sapiencial, o que não significa uma análise teórica ou vaga. Procuro quem sou eu reflectindo sobre minha origem. Mas a pergunta "quem sou eu" tem um carácter metafísico e meta-histórico. Não é uma indagação científica sobre a origem biológica do homem. Os relatos da criação são quase dos últimos escritos do AT. Não foi a primeira pergunta do povo de Israel, dos autores bíblicos. Já pressupõe uma experiência de fé do povo de Israel, já tem por base a sua vida diária. Entre os séculos XIII e XI a.C., dá-se o período da Conquista de Canãa (Terra prometida, hoje Israel). A Terra de Canaã ficou dividida em 12 zonas de ocupação, por 12 tribos: Judá, Simeão, Dan, Benjamim, Efraim, Manassés, Isaacar, Zabulão, Asser, Neftali, Gad e Ruben. Estas tribos não ingressaram todas em Canaã ao mesmo tempo, nem pelo mesmo local. Por volta do século XI a.C., começa a Monarquia em Israel, com SAÚL, como vimos (c. 1033-1012 AC): foi um grande guerreiro, que conquistou vastos territórios aos filisteus; no fim da sua vida, cresce a sua inimizade entre ele e o povo e com DAVID, que se torna o segundo rei de Israel (c. 1012-972). DAVID, começa por ser soldado de Saúl, mas chega a Rei de Israel, conseguindo impor-se às tribos do Norte e do Sul, unificando o Reino; torna Jerusalém como capital do Reino e muda para lá a Arca da Aliança, começando os preparativos para a construção de um Templo para Deus; no seu reinado, o território alcançou o apogeu. Por último, um dos seus filhos, SALOMÃO (c. 972-933), é o último rei de Israel unido; constrói um Templo magnífico. Foi nesta altura que o povo de Israel se começa a confrontar com o politeísmo. O monoteísmo não é um ponto de partida, mas um ponto de chegada, e daí a fé em Deus-Criador. A criação emerge do amor gratuito de Deus. No politeísmo os seres humanos criam deuses; no monoteísmo é Deus que cria o ser humano, sem se confundir com ele. Deus aparece como Pai. Há quem situe a escrita dos Génesis no exílio (587 a.C. e 538 a.C.) ou pós-exílio. Foi após o Cativeiro ou Exílio da Babilónia, em que se dá a deportação dos principais intervenientes da vida do Reino, para a Babilónia, que o povo se começou a questionar. A primeira experiência que o povo de Israel faz de Deus é o de Deus-Salvador (Êxodo). Deus faz Aliança com o povo no deserto. Assim, o Deus-Criador é posterior ao Deus-Salvador. O texto de Isaías capítulo 65 versículo 17 “Pois eis que eu crio novos céus e nova terra; e não haverá lembrança das coisas passadas, nem mais se recordarão”. Aqui o povo já regressou do exílio. Já está em Judá. Deus é que interviu junto do Deus Ciro da Babilónia e permitiu o regresso do povo (Nova Criação). Deus vai recriar Jerusálem e permitir que seja um paraíso. Quando chegam a Jerusalém reconstroem-se as muralhas (sob a liderança de Neemias), reconstrói-se o Templo (sob o comando de Zorobabel, já em 515 a.C. se tinha novo Templo) e Esdras promulga e faz respeitar as Leis de Moisés, redigindo a Tora (em 398 a.C.) O hebraico não tinha vogais: “Eu sou aquele que sou” = Yhwh (Javé) “El shadday” = Omnipotente “Elohim” = Deuses “Baal” = Senhor – deus da fertilidade (humano e da terra), um deus muito sedutor. 2ª parte 1º Texto - Gen 1, 1 – 2,4 – Criação do mundo 1* No princípio, quando Deus criou os céus e a terra, 2*a terra era informe e vazia, as trevas cobriam o abismo e o espírito de Deus movia-se sobre a superfície das águas. 3* Deus disse: «Exista a luz.» E a luz foi feita. 4Deus viu que a luz era boa e separou a luz das trevas. 5* Deus chamou dia à luz, e às trevas, noite. Assim, surgiu a tarde e, em seguida, a manhã: foi o primeiro dia. 6* Deus disse: «Exista o firmamento entre as águas, para as manter separadas umas das outras.» E assim aconteceu. 7Deus fez o firmamento e separou as águas que estavam sob o firmamento das que estavam por cima do firmamento. 8Deus chamou céus ao firmamento. Assim, surgiu a tarde e, em seguida, a manhã: foi o segundo dia. 9* Deus disse: «Reúnam-se as águas que estão debaixo dos céus, num único lugar, a fim de aparecer a terra seca.» E assim aconteceu. 10Deus chamou terra à parte sólida, e mar, ao conjunto das águas. E Deus viu que isto era bom. 11* Deus disse: «Que a terra produza verdura, erva com semente, árvores frutíferas que dêem fruto sobre a terra, segundo as suas espécies, e contendo semente.» E assim aconteceu. 12A terra produziu verdura, erva com semente, segundo a sua espécie, e árvores de fruto, segundo as suas espécies, com a respectiva semente. Deus viu que isto era bom. 13Assim, surgiu a tarde e, em seguida, a manhã: foi o terceiro dia. 14* Deus disse: «Existam luzeiros no firmamento dos céus, para separar o dia da noite e servirem de sinais, determinando as estações, os dias e os anos; 15servirão também de luzeiros no firmamento dos céus, para iluminarem a Terra.» E assim aconteceu. 16Deus fez dois grandes luzeiros: o maior para presidir ao dia, e o menor para presidir à noite; fez também as estrelas. 17Deus colocou-os no firmamento dos céus para iluminarem a Terra, 18para presidirem ao dia e à noite, e para separarem a luz das trevas. E Deus viu que isto era bom. 19Assim, surgiu a tarde e, em seguida, a manhã: foi o quarto dia. 20* Deus disse: «Que as águas sejam povoadas de inúmeros seres vivos, e que por cima da terra voem aves, sob o firmamento dos céus.» 21Deus criou, segundo as suas espécies, os monstros marinhos e todos os seres vivos que se movem nas águas, e todas as aves aladas, segundo as suas espécies. E Deus viu que isto era bom. 22Deus abençoou-os, dizendo: «Crescei e multiplicai-vos e enchei as águas do mar e multipliquem-se as aves sobre a terra.» 23Assim, surgiu a tarde e, em seguida, a manhã: foi o quinto dia. 24 Deus disse: «Que a terra produza seres vivos, segundo as suas espécies, animais domésticos, répteis e animais ferozes, segundo as suas espécies.» E assim aconteceu. 25Deus fez os animais ferozes, segundo as suas espécies, os animais domésticos, segundo as suas espécies, e todos os répteis da terra, segundo as suas espécies. E Deus viu que isto era bom. O ser humano - 26*Depois, Deus disse: «Façamos o ser humano à nossa imagem, à nossa semelhança, para que domine sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais domésticos e sobre todos os répteis que rastejam pela terra.» 27*Deus criou o ser humano à sua imagem, criou-o à imagem de Deus; Ele o criou homem e mulher. 28*Abençoando-os, Deus disse-lhes: «Crescei e multiplicai-vos, enchei e dominai a terra. Dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves dos céus e sobre todos os animais que se movem na terra.» 29*Deus disse: «Também vos dou todas as ervas com semente que existem à superfície da terra, assim como todas as árvores de fruto com semente, para que vos sirvam de alimento. 30E a todos os animais da terra, a todas as aves dos céus e a todos os seres vivos que existem e se movem sobre a terra, igualmente dou por alimento toda a erva verde que a terra produzir.» E assim aconteceu. 31*Deus, vendo toda a sua obra, considerou-a muito boa. Assim, surgiu a tarde e, em seguida, a manhã: foi o sexto dia. No primeiro versículo, a palavra hebraica utilizada para designar o nome do Senhor é “Elohim”, e neste nome hebraico existe uma pluralidade. Isso indica a ação do nosso Deus Trino desde os primórdios da criação. O texto começa Deus criou os céus e a terra e termina da mesma maneira. Significa que o texto está encerrado numa inclusão bíblica, formando uma unidade claramente determinada. A negrito estão as ordens de Deus e a cronologia. O repetir “Deus disse” é para insistir que Deus é o sujeito activo. As “coisas” são criadas pela palavra. Por 7 vezes aparece a palavra criar «bara‟» - em hebraico este verbo só é utilizado para Deus. O ser humano faz, não cria! Relativamente ao nº 7 (é o número perfeito, indica o máximo da perfeição, da totalidade), este aparece continuamente na obra da criação. Outro exemplo: desde logo a acção da criação inscreve-se numa semana de 7 dias. Ninguém pede a Deus para criar o mundo, Ele cria-o gratuitamente, não é a partir de uma necessidade. O autor bíblico está a fazer um poema, não é uma magia. Deus como Senhor da vida, pode dar a vida. O simples facto do poema usar o nome ELOHIM para dizer Deus, e não YHWH, indicia o tempo tardio da sua composição e a sua origem sacerdotal, do tempo do exílio ou pós-exílio, que eram de dificuldade, pobreza e incerteza. E é precisamente no meio de todas estas dificuldades que o autor bíblico nos apresenta a bondade da criação e a responsabilidade do homem-mulher sobre a mesma. Dividindo o texto (o poema) em 4 momentos, tem-se: 1º Momento – “A terra era informe e vazia” A Terra já existia, não se parte do nada, mas parte duma existência informe, caótica, de trevas e abismo. No entanto, não estava abandonada – o Espírito de Deus pairava por ali (era pré-existente). A “terra informe” apenas nos diz que ainda não tinha sido trabalhada pelo ser humano. A referência à terra e à massa aquática ajudam a compor esta imagem espectral. Esta afirmação faz parte da teoria do intervalo, na qual os seus defensores afirmam que houve um grande intervalo de tempo entre o primeiro e o segundo versículo de Génesis. 2º Momento – “Deus viu que isto era bom” Por um lado o autor bíblico reforça o poder de Deus ao utilizar o imperativo: “Exista” ou “haja”. Mas, para não ficarmos com a imagem de um Deus autoritário, logo a seguir expressa a bondade de Deus. Deus olha para o que criou, e gosta daquilo que fez. A obra criadora de Deus foi progressiva, e vemos que seres biologicamente mais desenvolvidos foram sendo deixados posteriormente na obra da criação, pois antes de criá-los Deus criou meios para sustentá-los. De nada serviria criar a vegetação sem água para irrigar. De nada adiantaria criar o sol, sem nada que ele pudesse iluminar. E de nada adiantaria criar animais, sem que pudessem se alimentar (das ervas) e se aquecer (com o sol). A criação de animais ocorreu num tempo onde eles já teriam onde morar (numa terra recém produzida), teriam o que beber (águas), o que comer (ervas) e uma noção de tempo e descanso (os limiares, o sol e a lua). 3º Momento – “Façamos o ser humano” A criação das outras realidades da Terra foi rápida. Na criação do ser humano, o autor bíblico utiliza seis versículos e Deus expressa uma finalidade “que domine”. À criação do ser humano, Deus dá particular relevância. Para a fé bíblica o que distingue o ser humano dos outros animais é ter sido criado à imagem e semelhança de Deus. Além disso, o autor bíblico coloca o plural “façamos”. Este “façamos” não é um plural majestático, mas um plural deliberativo ou declarativo. Dada a importância da obra que está para criar, Deus não se limita a pronunciar uma ordem, como fez até então, mas dá um toque muito pessoal. Deus como que fala consigo mesmo. Mas pode ser que, com este “façamos”, Deus fale, não apenas a si mesmo, mas também aos homens para os interpelar e associar como co-criadores na obra da criação. Podemos colocar a questão; Este misterioso plural não contém a nossa presença? Esta ideia ganha expressão na ordem que o ser humano recebe de Deus “dominai a terra” e “crescei e multiplicai-vos”. “Ele o criou homem e mulher”. Deus criou o ser humano, uma obra única, daí o singular. A exegese durante muito tempo falaciou o original colocando “os”. É ainda importante notar como o autor, estando já o homem presente na criação, modifica a litania do “bom” para “muito bom”. 4º Momento – “Deus repousou ao sétimo dia” Este é um dia fora de série, pois não aparece delimitado na expressão habitual “manhã/tarde”. Toda a criação está voltada para este dia, marcado pelos verbos “descansar”, “santificar” e “abençoar” também patentes no mandamento sobre o sábado (Ex 20, 8-11). Está desenhado de acordo com o modelo da semana hebraica em que o sétimo dia (sábado) é consagrado a Deus. A palavra “sabbath” significa literalmente "cessou". Este repouso vem da realização cumprida, não da inatividade, pois o próprio Jesus afirmou que Deus trabalha até agora (Jo 5.17). 2º Texto – Gn 2, 4b – 3, 24 – Criação da humanidade O homem - Quando o Senhor Deus fez a Terra e os céus, 5*e ainda não havia arbusto algum pelos campos, nem sequer uma planta germinara ainda, porque o Senhor Deus ainda não tinha feito chover sobre a terra, e não havia homem para a cultivar, 6e da terra brotava uma nascente que regava toda a superfície, 7* então o Senhor Deus formou o homem do pó da terra e insuflou-lhe pelas narinas o sopro da vida, e o homem transformou-se num ser vivo. 8* Depois, o Senhor Deus plantou um jardim no Éden, ao oriente, e nele colocou o homem que tinha formado. 9*O Senhor Deus fez brotar da terra toda a espécie de árvores agradáveis à vista e de saborosos frutos para comer; a árvore da Vida estava no meio do jardim, assim como a árvore do conhecimento do bem e do mal.10Um rio nascia no Éden para regar o jardim, dividindo-se, a seguir, em quatro braços. 11O nome do primeiro é Pichon, rio que rodeia toda a região de Havilá, onde se encontra ouro, 12ouro puro, sem misturas, e também se encontra lá bdélio e ónix. 13O nome do segundo rio é Guion, o qual rodeia toda a terra de Cuche. 14 O nome do terceiro é Tigre, e corre ao oriente da Assíria. O quarto rio é o Eufrates.15O Senhor Deus levou o homem e colocou-o no jardim do Éden, para o cultivar e, também, para o guardar. 16*E o Senhor Deus deu esta ordem ao homem: «Podes comer do fruto de todas as árvores do jardim; 17mas não comas o da árvore do conhecimento do bem e do mal, porque, no dia em que o comeres, certamente morrerás.» A mulher - 18*O Senhor Deus disse: «Não é conveniente que o homem esteja só; vou dar-lhe um auxílio semelhante a ele.» 19Então, o Senhor Deus, após ter formado da terra todos os animais dos campos e todas as aves dos céus, conduziu-os até junto do homem, a fim de verificar como ele os chamaria, para que todos os seres vivos fossem conhecidos pelos nomes que o homem lhes desse. 20O homem designou com nomes todos os animais domésticos, todas as aves dos céus e todos os animais ferozes; contudo, não encontrou auxílio semelhante a ele. 21Então, o Senhor Deus fez cair sobre o homem um sono profundo; e, enquanto ele dormia, tirou-lhe uma das suas costelas, cujo lugar preencheu de carne. 22Da costela que retirara do homem, o Senhor Deus fez a mulher e apresentou-a ao homem. 23*Então, o homem exclamou: «Esta é, realmente, osso dos meus ossos e carne da minha carne. Chamar-se-á mulher, visto ter sido tirada do homem!» 24Por esse motivo, o homem deixará o pai e a mãe, para se unir à sua mulher; e os dois serão uma só carne. Transgressão - 25*Estavam ambos nus, tanto o homem como a mulher, mas não sentiam vergonha. 1* 3 A serpente era o mais astuto de todos os animais selvagens que o Senhor Deus fizera; e disse à mulher: «É verdade ter-vos Deus proibido comer o fruto de alguma árvore do jardim?» 2A mulher respondeulhe: «Podemos comer o fruto das árvores do jardim; 3mas, quanto ao fruto da árvore que está no meio do jardim, Deus disse: «Nunca o deveis comer, nem sequer tocar nele, pois, se o fizerdes, morrereis.» 4A serpente retorquiu à mulher: «Não, não morrereis; 5porque Deus sabe que, no dia em que o comerdes, abrirse-ão os vossos olhos e sereis como Deus, ficareis a conhecer o bem e o mal.» 6*Vendo a mulher que o fruto da árvore devia ser bom para comer, pois era de atraente aspecto e precioso para esclarecer a inteligência, agarrou do fruto, comeu, deu dele também a seu marido, que estava junto dela, e ele também comeu. 7Então, abriram-se os olhos aos dois e, reconhecendo que estavam nus, coseram folhas de figueira umas às outras e colocaram-nas, como se fossem cinturas, à volta dos rins. 8*Ouviram, então, a voz do Senhor Deus, que percorria o jardim pela brisa da tarde, e o homem e a sua mulher logo se esconderam do Senhor Deus, por entre o arvoredo do jardim. 9*Mas o Senhor Deus chamou o homem e disse-lhe: «Onde estás?» 10Ele respondeu: «Ouvi a tua voz no jardim e, cheio de medo, escondi-me porque estou nu.» 11*O Senhor Deus perguntou: «Quem te disse que estás nu? Comeste, porventura, da árvore da qual te proibi comer?» 12O homem respondeu: «Foi a mulher que trouxeste para junto de mim que me ofereceu da árvore e eu comi.» 13O Senhor Deus perguntou à mulher: «Por que fizeste isso?» A mulher respondeu: Castigo e esperança - 14Então, o Senhor Deus disse à serpente: «Por teres feito isto, serás maldita entre todos os animais domésticos e entre os animais selvagens. Rastejarás sobre o teu ventre, alimentar-te-ás de terra todos os dias da tua vida. 15*Farei reinar a inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e a dela. Esta esmagar-te-á a cabeça e tu tentarás mordê-la no calcanhar.» 16 Depois, disse à mulher: «Aumentarei os sofrimentos da tua gravidez, entre dores darás à luz os filhos. Procurarás apaixonadamente o teu marido, mas ele te dominará.» 17 A seguir, disse ao homem: «Porque atendeste à voz da tua mulher e comeste o fruto da árvore, a respeito da qual Eu te tinha ordenado: “Não comas dela”, maldita seja a terra por tua causa. E dela só arrancarás alimento à custa de penoso trabalho, todos os dias da tua vida. 18Produzir-te-á espinhos e abrolhos, e comerás a erva dos campos. 19*Comerás o pão com o suor do teu rosto, até que voltes à terra de onde foste tirado; porque tu és pó e ao pó voltarás.» 20* Adão pôs à sua mulher o nome de Eva, porque ela seria mãe de todos os viventes. 21O Senhor Deus fez a Adão e à sua mulher túnicas de peles e vestiu-os. 22 O Senhor Deus disse: «Eis que o homem, quanto ao conhecimento do bem e do mal, se tornou como um de nós. Agora é preciso que ele não estenda a mão para se apoderar também do fruto da árvore da Vida e, comendo dele, viva para sempre.» 23O Senhor Deus expulsou-o do jardim do Éden, a fim de cultivar a terra, da qual fora tirado. 24*Depois de ter expulsado o homem, colocou, a oriente do jardim do Éden, os querubins com a espada flamejante, para guardar o caminho da árvore da Vida. O segundo relato da Criação O Génesis recolhe ainda esta outra tradição para exprimir a obra criadora de Deus, chamada Javista, por designar a Deus com o nome de Javé “YHWH” ; “o Senhor Deus” ; ao passo que o primeiro relato, da tradição sacerdotal dizia simplesmente “Deus” –“Elohim” Porquê tornar a falar de criação no Génesis? Porque de acordo com a mentalidade semita é necessária a repetição na medida em que as coisas não ficam logo ditas à primeira. Complementam-se! Enquanto a primeira narrativa traz o homem como clímax da criação, esta mostra o homem como o motivo pelo qual Deus criou todas as coisas. No Génesis os relatos bíblicos das origens foram redigidos na época do exílio de Babilónia ou depois. Sendo assim, é fácil de compreender que os autores sagrados pudessem conhecer a fundo as tradições mesopotâmicas sobre as origens e que nelas buscassem a sua fonte de inspiração. “É certo que a Bíblia, para expressar o mistério das origens, se serviu em grande medida dessa linguagem tão importante na antiguidade, que é a linguagem dos mitos. No entanto, na Bíblia essa linguagem está despojada do seu carácter politeísta e ritual, e impregnada da fé no Deus de Israel. O versículo sétimo traz luz à criação do homem. Aqui não aparece o homem como co-criador. A matéria prima utilizada para criar o homem “adam” foi o pó da terra “adamah”. Se Deus formou o homem, vemos aqui que havia relação entre o Artífice e a obra. O soprar tem um sentido extremamente pessoal e íntimo, como um contacto face a face, uma expressão de amor e concessão de vida do Criador a sua criatura recém criada. Respirar significa “estar vivo”. A primeira coisa que fazemos ao nascer é respirar e a última também. A segunda narrativa é muito diferente da primeira porque tem alguns contactos com os mitos mesopotâmicos, sobretudo com o Enuma Elish e Atra-hasis. Nesta narrativa, o homem é modelado do pó da terra, mas nos mitos supracitados, a argila é amassada juntamente com o sangue e com os restos dos principais deuses maus (Kingu e Wê-ila), aliados de Tiamat. Os deuses, nos seus ciúmes, guerreiam-se e matam-se e é com o sangue dos mortos que criam a humanidade. Os humanos não são mais do que uns títeres de maldade nas mãos dos deuses. Mas aqui, o homem é fruto da terra e do "sopro" de Deus. É como que um "beijo" de Deus. O homem é colocado por Deus num éden (jardim ou várzea cheia de água, árvores e frutos), com a permissão de comer de todas as suas maravilhas, menos da árvore do "conhecimento do bem e do mal". O autor bíblico demora-se muito tempo a explicar este jardim de “delícias” (éden). A palavra Éden significa "deleite". Éden era uma localidade, e essa verdade é comprovada quando analisamos os versículos 10-14, que nos mostram uma localidade real para o jardim. Esta área envolta por rios, provavelmente remete para uma região nas proximidades do Golfo Pérsico, para onde correm os rios Tigre e Eufrates. O jardim de “delícias” (éden) permite que pensemos, mais que num lugar geográfico, num estado de felicidade original e de comunhão com Deus; a “árvore da vida” simboliza a vida em plenitude e a imortalidade;“a árvore do conhecimento do bem e do mal” é a árvore reservada para Deus, esta é utilizada para marcar a diferença entre o criador e as criaturas e também entre as todas as criaturas e o homem. As imagens do "éden", "árvore do conhecimento do bem e do mal", "árvore da vida", "costela" de Adão, "serpente", etc., devem ser entendidas como imagens, símbolos, e nada mais. O que importa é o seu significado. “Não é conveniente que o homem esteja só: vou dar-lhe um auxílio semelhante a ele”. O homem não estava só; era o senhor da várzea; ele tinha podido dar o nome aos animais, mas não tinha encontrado alguém que pudesse viver em harmonia e amor com ele. A solidão do homem, sentida por ele e reconhecida por Deus (o “oleiro”) traduz, por um lado, a interioridade do ser humano, capaz de perceber a sua própria solidão (coisa de que os animais não são capazes), e, por outro lado, como este foi criado por Deus para a comunhão interpessoal. O "auxílio" (ézer, no masc.) é a mulher: "osso dos meus ossos, / carne da minha carne. / Será chamada 'ishsha (mulher) porque foi tirada de 'ish (homem)". Homem e mulher perfazem uma unidade indissolúvel. A palavra hebraica („ézer, auxílio), ao designar habitualmente o socorro que Deus concede ao seu povo, indicia que o relato está redigido com base na noção de aliança: a relação homem-mulher aparece então como um reflexo da relação Deus-homem, uma relação de aliança. “E apresentou-a ao homem”. Também é significativo que não se diga que é o homem a fazer aparecer a mulher ou a descobri-la: tudo é dom e iniciativa divina, e a relação do homem com a mulher enquadra-se na relação fundamental do homem com Deus. Este momento é tão importante que pela 1ª vez o homem fala: fala com amor, com admiração! “Ao vê-la, o homem exclamou”. As palavras que o autor bíblico coloca na boca de Adão são a expressão dum entusiasmo eufórico, próprio dum coração enamorado, em linguagem poética, com ritmo, elegância, paralelismo e jogo de palavras, logrando-se um belo efeito literário: Adão, ignorando como a mulher tinha sido formada, verifica que ela corresponde plenamente ao seu ideal; formada do lado ou da costela sobre o coração, a mulher procedia do coração do homem, respondendo às suas profundas aspirações. “Osso dos meus ossos...” Tratase duma expressão corrente para designar parentesco, comunidade de natureza. Esta afirmação é dum alcance extraordinário, transcendendo de longe as mais avançadas civilizações em que a mulher sempre foi considerada um ser inferior, quanto à natureza e direitos. Ela tem a mesma natureza e os mesmos direitos que o homem, por isso “chamar-se-á mulher: ela já não é mais a beulat-baal (a propriedade dum senhor – Dt 22, 22). Sem diluir diferenças e peculiaridades, há uma igualdade fundamental entre o homem e a mulher, mesmo quando o relato apresenta o homem a ser criado em primeiro lugar; a mulher, embora surja como um auxílio, ela é criada semelhante a ele (v. 18). Notar que as expressões “osso dos meus ossos” e “carne da minha carne” são uma espécie de superlativo hebraico (como “cântico dos cânticos”), equivalente a dizer que é mesmo carne e osso meu, um “alter ego”, correspondendo a: “é igual a mim quanto à natureza e quanto aos direitos”, segundo as categorias do nosso pensamento abstracto. “A serpente era o mais astuto de todos os animais”. A serpente é chamada de “arum”, isto é, astuta. Mas, num espectro mais amplo de sentido e significado, a serpente também estaria "nua", se aceitarmos o sentido da raiz da nossa palavra-chave, “arum”. Foram postos no "éden" para adorarem Deus, mas a "serpente", que é o símbolo dos deuses da fertilidade, atrai para o seu mundo a mulher e, com ela, o homem. Não se trata de explicar a origem do mal, mas de mostrar o poder atractivo e idolátrico de poder dizer NÃO a Deus, para dizer SIM aos ídolos. Sem a possibilidade de dizer NÃO a Deus o homem não podia ser considerado livre face a Deus. E quando o homem e a mulher descobrem o seu pecado, vêem que estão "arumim" (plural de “arum”), isto é, "nus", têm medo de Deus e escondem-se dele. A nudez que até aqui era algo natural, passa a ser negativa, `a qual acresce o medo, o escondimento. Tomam consciência dos seus limites, de dizer não a Deus. «Quem te disse que estás nu?» Deus desce ao nosso nível apontando a causa da nossa nudez e dos nossos medos: a desobediência aos mandamentos da vida. O homem reage violentamente para com Deus e diz “isso” deu-me de comer da árvore da vida. A mulher já não é aqui a “querida”, nem sequer o “ela”, mas um “isso” depreciativo. «Hás-de rastejar e comer do pó da terra». Na narrativa, a sentença é dada primeiro contra a serpente, a primeira a fazer mal. Ninguém pense que o autor quer insinuar que dantes as cobras tinham patas: a sentença é proferida contra o demónio tentador; a expressão designa uma profunda humilhação, infligida contra o demónio, que é o sentenciado, não as serpentes. «A serpente enganou-me e eu comi.» Qual o papel da serpente no relato da criação? Não foi por acaso que a serpente entra no relato. Mais uma vez o autor bíblico parte de uma realidade. Entre os povos cananeus, a serpente estava ligada aos rituais de fertilidade e de fecundidade devido ao facto de andar tão rente à deu-mãe, a terra, permanente força de fertilidade (é assim o símbolo atraente e regenerador que ainda hoje vemos às portas das farmácias). Os israelitas deixavam-se fascinar por esses cultos e, com frequência, abandonavam Javé para seguirem os rituais religiosos dos cananeus e assegurar, assim, a fecundidade dos campos e dos rebanhos. Na época em que o autor bíblico escreve a serpente era, pois, o “fruto proibido”, que seduzia os crentes e os levava a abandonar a Lei de Deus. A “serpente” é, neste contexto, um símbolo literário de tudo aquilo que afastava os israelitas de Javé. A resposta da “mulher” confirma tudo aquilo que até agora estava sugerido: é verdade, a humanidade que Deus criou prescindiu de Deus, ignorou as suas propostas e enveredou por outros caminhos. Deus retira o homem e a mulher do "éden" para não continuarem a endeusar-se, e coloca-os na realidade concreta da vida humana: o homem trabalha a terra com o suor do seu rosto e a mulher dará à luz com sofrimento. Não é para os castigar. Não foi Deus que criou estes factos, mas eles provêm da própria fragilidade humana. Ao fim e ao cabo, a narrativa é uma etiologia (uma “etiologia” é uma tentativa de explicar o porquê de uma determinada realidade que o autor conhece no seu tempo, a partir de um pretenso acontecimento primordial, que seria o responsável pela situação actual) ou narrativa justificativa da história de Israel, antes do povo possuir a Terra Prometida, durante a Terra Prometida, antes do exílio e durante o exílio. O homem-mulher devia adorar o verdadeiro Deus no "éden" da Terra Prometida, mas não o fez. Quis endeusar-se, seguiu o mundo apetecível da cobra, isto é, do politeísmo dos Baales e demais deuses e deusas da fertilidade. Deus expulsa-os para o exílio, mas não os abandona. Antes os acompanha com a sua misericórdia vestindo-os carinhosamente, e impedindo-os de terem acesso à árvore da vida. Alem disso a descendência do homem-mulher há-de vencer o sortilégio idolátrico da serpente. Síntese: As narrativas apresentam as grande interrogações humanas, de ontem e hoje: Quem criou os céus e a terra? Como é que Deus criou o homem? Quem é o Deus-criador? Qual a responsabilidade do homem neste jardim? O que é que o ser humano faz dessa responsabilidade? Como é que usa a sua liberdade? Como é que deus-criador se comporta com o ser humano criado. E como é que este se comporta com Deus? Como compreender o mal? A sua atracção? 18/7/2009 Marco Ferreira Professor de Biologia e Geologia na Escola secundária Ferreira de Castro Quais as principais ideias do evolucionismo, mais concretamente do darwinismo relativamente à criação do homem? Da sopa orgânica apareceu a vida unicelular. Esta, como se fosse uma árvore com muitos milhares de ramos deu plantas e outros animais primitivos. De entre estes, os que nos interessam por levarem ao homem moderno, são os mamíferos placentários primitivos. A "ratazana" Purgatorius é o fóssil mais antigo conhecido dos mamíferos. Este, evoluiu e, a páginas tantas, deu os primatas do tipo dos macacos, dos símios, etc, e os primatas humanóides, como os Australopithecus, o Homo habilis, o Homo erectus, o Homo sapiens, e o Homo sapiens sapiens. Darwin e Darwinismo Nascido em 12 de Fevereiro de 1809, em Inglaterra, Darwin inicialmente estudou Teologia antes de seguir em sua famosa viagem no navio H.M.S. Beagle. Durante a jornada de cinco anos, as observações e dados colhidos por Darwin começaram a formar os conceitos que finalmente resultaram em "A Origem das Espécies". O livro de Darwin iniciou uma controvérsia pública que ele acompanhou atentamente, obtendo recortes de jornais, críticas, artigos, sátiras e caricaturas. Críticos foram rápidos em apontar as implicações não discutidas no livro de que "E se os homens fossem descendentes de macacos?". Esta nova teoria ia contra tudo a que a igreja defendia, foi imediatamente recusada, pois a teoria tinha grandes implicações quanto à criação da vida. O corpo científico da Igreja da Inglaterra, incluindo os antigos tutores de Darwin em Cambridge, reagiu contra o livro, embora ele tenha sido bem recebido por uma nova geração de jovens naturalistas. Os fósseis observados por Darwin na sua viagem, tal como aqueles fósseis de conchas encontrados por estes em montanhas bastante altas, e o livro de Lyell fizeram permitir a explicação de vários aspectos, tais como, os processos geológicos ocorrem lentamente, pelo que a Terra deverá ter milhões de anos. Deste modo, também a vida se encontra em constante mudança e, para ocorrer evolução, é necessário tempo. A diversidade de seres que se podem observar consoante o continente inspirou Darwin a pensar que alguns daqueles seres deveriam ter antepassados comuns. Isto é, apesar da enorme diversidade de seres, alguns apresentam características muito semelhantes, que levam a crer na sua origem comum. Darwin tomou como exemplo as tartarugas existentes nas ilhas Galápagos pois, apesar de se ocuparem territórios muito próximos, apresentam diferenças que permitem que cada espécie de tartaruga esteja melhor adaptada ao ambiente onde vive. O conceito básico de selecção natural é que características favoráveis que são hereditárias tornam-se mais comuns em gerações sucessivas de uma população de organismos que se reproduzem, e que características desfavoráveis que são hereditárias tornam-se menos comuns. A selecção natural age no fenótipo, ou nas características observáveis de um organismo, de tal forma que indivíduos com fenótipos favoráveis têm mais hipóteses de sobreviver e reproduzir-se do que aqueles com fenótipos menos favoráveis. Exemplo: Representação esquemática de como a resistência aos antibióticos é aumentada por selecção natural. A sessão superior representa uma população de bactérias antes de serem expostas a antibióticos. Se o antibiótico não for tomado até ao fim, ou se for conjugado com outro, alguns bactérias, as mais resistentes, sobrevivem por selecção natural. Depois multiplicam-se e originam uma nova geração de bactérias, toda ela resistente ao antibiótico. É possível harmonizar o relato bíblico com a teoria da evolução? O texto bíblico e as teorias de Darwin não devem ser entendidos como opostos. Ambos podem – e devem – ser encarados como perspectivas distintas do mesmo fenómeno. "A Bíblia descreve a Criação como uma espécie de representação artístico-poética, interpretando a vida, enquanto Darwin tentou descrever a vida e a Criação como um observador." Enquanto as ciências naturais existem para explicar, a religião, a cultura e a arte servem à compreensão da vida. "Deste modo, ciência e religião não são concorrentes, mas sim formas distintas de descrever a vida, que não são mutuamente redutíveis." Um olhar superficial sobre os textos bíblicos da criação pode levar o leitor moderno a ficar decepcionado: Não será que tudo isto não tem valor, pois parecem contos de criança, uma pura ficção? Habituados ao rigor científico das Ciências da Natureza, da Astronomia, da Biologia, da Antropologia e da História, não teremos de pôr de parte tais relatos, em nome da Ciência? No entanto, desprezar estes textos em nome da Ciência é que seria uma falta de rigor científico! A verdade é que como já vimos, estes relatos bíblicos estão redigidos segundo moldes de outros tempos e culturas, que precisamos de conhecer para podermos captar-lhe não só a beleza da forma, mas sobretudo o valor do seu conteúdo. No entanto, nos nossos dias ainda há quem mantenha a criação do mundo em 6 dias e já num estado perfeito! Trata-se de grupos reduzidos de fundamentalistas, que procuram demonstrar cientificamente a sua teoria e sobretudo rebater teorias como a da evolução e a do Big Bang, apelando para certas incongruências que nelas encontram. O criacionismo nasceu nos Estados Unidos no início do século 20, representado, em especial, pelos cristãos evangélicos. Sob sua influência, o então presidente George W. Bush decretou em 2005 que, nas aulas de Biologia, a doutrina do intelligent design deveria ser ensinada em pé de igualdade com a Teoria da Evolução. Apelidam-se indevidamente da designação de “criacionistas”, como se não houvesse outra alternativa ao evolucionismo radical ateu. De facto a fé bíblica não se opõe a teorias científicas como a do Big Bang ou a da evolução, desde que estas não excluam a acção criadora e providente de Deus. Como já dizia Galileu, a Bíblia não diz “como vai o céu, mas como se vai para o Céu”. Ao contrário do que se passa com a maioria dos católicos, porém, os criacionistas, geralmente evangélicos, negam a possibilidade da evolução das espécies tal como é ensinada na escola, nomeadamente a parte em que a humanidade descende de outros primatas e é fruto de mais de um milhão de anos de diferenciações genéticas. Os criacionistas crêem que somos todos descendentes de um casal primordial - Adão e Eva, os próprios, ele feito de barro, ela de uma costela dele - cuja criação divina ocorreu há cerca de seis mil anos, e que como esse casal, criado já adulto como se narra no livro do Génesis, foram criadas todas as outras espécies, incluindo as extintas (como os dinossauros, cuja extinção é geralmente localizada há 65 milhões de anos). 19/7/2009 Como é que um catequista pode responder a pergunta de uma criança sobre “Quem é Deus?” permitindo o diálogo entre ciência e religião? Há várias maneiras de explicar quem é Deus. As pessoas que vão à missa acreditam que Deus criou primeiro os céus e a terra, depois a luz, e por aí fora, até que criou o homem. A ciência, como tu vais entender mais tarde, tem outra explicação. As duas explicações estão correctas porque há coisas que a ciência ainda não consegue explicar, mas que a nossa fé explica através da intervenção divina. Conferência de D. Manuel Clemente D. Manuel dirigiu-se inicialmente aos catequistas dizendo que o cristianismo não é uma gnose; é uma convivência; uma transmissão de vida. O que está em crise, no mundo ocidental, é a Igreja doméstica, Família. A família é uma comunidade porque visa fins essenciais. O grande problema da comunidade familiar é a perda de elos devido há grande dificuldade de emprego. Colocam-se assim, questões como: a que paróquia pertencem estas crianças? Como se transmitem valores que têm na comunidade os seus alicerces? O próprio andamento sócio-cultural e civilizacional cria redes de contacto cada vez mais complexas. Hoje desapareceram as tradicionais comunidades familiar e paroquial como transmissoras de valores, valores que eram transmitidos naturalmente, não eram ensinados na escola, na catequese, mas vivenciados no seio familiar. O seu reaparecimento é uma miragem! Onde é que diviso o futuro? – questionou D. Clemente. Na consolidação familiar, nos encontros de casais que desenvolvam uma contra-cultura, uma consolidação dos laços comunitários, da comunidade paroquial – comunidade das comunidades. Tudo isto é um enormíssimo contributo à sociedade que se vislumbra à nossa volta, onde nascerá um “mundo novo” como dizia Santo Agostinho. D. Manuel referiu de seguida que existiam três coisas que tinha planeado dizer aos catequistas como referência ao passado (Ano Paulino); ao presente (Ano Sacerdotal) e ao futuro (Ano da Missão Diocesana). Relativamente ao Ano Paulino que terminou, D. Manuel referiu que São Paulo nunca foi um santo popular. O que é estranho porque é o autor bíblico mais presente na liturgia (através das Cartas, e de São Lucas nos Actos dos Apóstolos). A explicação que encontra é que “nós de santos não gostamos nada, de santinhos gostamos imenso!”. O Ano Paulino foi importante porque trouxe para a ribalta alguém tão importante. O cristianismo não é só Jesus, mas também os que o absorvem Paulo é o exemplo máximo! Assim, neste ano que passou, Paulo, nesta comunhão de santos que é a Igreja, ficou mais conhecido. No que concerne ao presente, é importante desenvolver nas nossas comunidades cristãs, a começar pelos seus membros mais novinhos, esta dimensão sacerdotal. “Para que sejas membro de Cristo, Profeta, Sacerdote e Rei” – dizemos no baptismo. O que é que mais falta na nossa catequese? – questionou D. Clemente. A vida interior (exercício sacerdotal, no sentido lato do termo), e a caridade (oferta a Deus e ao próximo). Quanto à Missão Diocesana 2010, o objectivo é que as comunidades cristãs ganhem “um novo ardor, novos métodos, novas expressões”, como dizia João Paulo II. Todas as comunidades da Diocese do Porto devem sentir-se motivadas a alargar o âmbito daquilo que fazem. Devem questionar-se sobre “ Como podemos ir mais além no anúncio de Cristo Vivo?” Daqui até Dezembro devemos ir pensando sobre como é que podemos pegar neste objectivo com as nossas crianças, jovens e adultos. Não se tratará de um conjunto de acções para o "grande público", num período especial e concentrado de 2010, mas de uma multiplicidade de acções ao longo do ano, protagonizadas pelas comunidades e grupos da Diocese, com o permanente apoio ao estímulo das habituais estruturas diocesanas. Cada comunidade deverá deixar que o Espírito actue, e dinamizar uma actividade para cada mês do ano.