revista médica - Hospital Ana Costa

Transcrição

revista médica - Hospital Ana Costa
anacosta
revista médica
Outubro | Novembro | Dezembro
Revista Trimestral do Hospital Ana Costa - 2014
19.4
Revista Médica
ISSN 1677-194X
ANA COSTA
Órgão Científico Oficial do Hospital Ana Costa
Conselho Editorial Revista Médica
Dr. Airton Zogaib Rodrigues, Santos - SP - Brasil
Dr. André Vicente Guimarães, Santos - SP - Brasil
Dr. Celso Afonso Gonçalves, Santos - SP - Brasil
Dr. Evaldo Stanislau A. de Araújo, Santos - SP - Brasil
Dr. Everson Artifon, Santos - SP - Brasil
Dr. Luiz Alberto Oliveira Dallan, São Paulo - SP - Brasil
Dr. Rider Nogueira de Brito Filho, Santos - SP - Brasil
Dr. Rogério Aparecido Dedivitis, Santos - SP - Brasil
Dr. Waldimir Carollo dos Santos, Santos - SP - Brasil
Dr. Woite Antônio Bertoni Meloni, Santos - SP - Brasil
Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa
Rua Pedro Américo, 60 - Campo Grande, Santos/SP, Brasil
e-mail: [email protected]
www.anacosta.com.br
Periodicidade: trimestral
Tiragem: 500 exemplares
Jornalista Responsável: Lucinaira Souza (Mtb: 40.248)
Produção Gráfica: Comunicação e Marketing do Hospital Ana Costa
A Revista Médica Ana Costa é distribuída gratuitamente para os membros do Corpo Clínico do Hospital Ana Costa,
para bibliotecas e faculdades das áreas de saúde cadastradas.
É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos dessa revista, desde que citada a fonte.
Revista Médica Ana Costa / Divisão de Ensino do Hospital Ana Costa S.A.
v. 19, n. 4 (outubro / novembro / dezembro 2014). Santos: Divisão de Ensino do Hospital Ana
Costa S.A., 2014.
23 p. :il.
Periodicidade trimestral
ISSN 1677 194X
1.Ciências Médicas. 2. Medicina
CDD 610
CDU 616
Normas de Publicação
A Revista Médica Ana Costa é publicada trimestralmente pelo Hospital Ana Costa e aceita artigos na área de
saúde. Artigos de caráter comercial não serão aceitos.
Serão aceitos manuscritos originais relacionados às
seguintes categorias:
a) artigos originais - trabalhos resultantes de pesquisa
científica, apresentando dados originais de descobertas com relação a aspectos experimentais ou
observacionais, incluem análise descritiva e ou
inferências de dados próprios. Sua estrutura deverá
conter os seguintes itens: Introdução, Métodos,
Resultados, Discussão, Conclusão e Referências;
b) artigos de revisão - têm por objetivo resumir,
analisar, avaliar ou sintetizar trabalhos de investigação
já publicados em revistas científicas. Apresenta síntese
e análise crítica da literatura levantada e não pode ser
confundido com artigo de atualização;
c) artigos de atualização - destinados a relatar
informações geralmente atuais sobre tema de interesse
para determinada especialidade, uma nova técnica ou
método, por exemplo, e que têm características
distintas de um artigo de revisão, visto que não
apresentam análise crítica da literatura;
d) relato de caso - relata casos de uma determinada
situação médica especialmente rara, descrevendo
seus aspectos, história, condutas, etc, incluindo breve
revisão da literatura, descrição do caso e discussão
pertinente. Apresenta as características do indivíduo
estudado, com indicação de sexo e idade. Pode ser
realizado em humano ou animal.
c) indicação da instituição em que cada autor está
afiliado, acompanhada do respectivo endereço;
d) nome do departamento e da instituição no qual foi
realizado;
e) indicação do autor responsável para troca de
correspondência (nome completo, endereço, telefones
de contato e e-mail);
f) quando houver, indicar as fontes de auxílio à
pesquisa;
g) se extraído de dissertação ou tese, indicar título, ano
e instituição onde foi apresentada;
EXEMPLOS
h) se apresentado em reunião científica, indicar nome
do evento, local e data de realização.
Livros
RESUMO - Todos os artigos submetidos deverão ter
resumo em português e em inglês, com um mínimo de
150 e no máximo de 250 palavras. Para os artigos
originais os resumos devem ser estruturados
destacando: objetivos, métodos básicos adotados
(informando local, população e amostragem da
pesquisa), resultados e conclusões mais relevantes,
considerando os objetivos do trabalho, e indicar formas
de continuidade do estudo. Para as demais categorias,
o formato dos resumos deve ser o narrativo, mas com
as mesmas informações.
Capítulo de Livros
Discussão: deve explorar adequada e objetivamente
os resultados, discutidos à luz de outras observações já
registradas na literatura.
A primeira página deverá conter:
b) nome completo de todos os autores;
Meltzer PS, Kallioniemi A, Trent JM. Chromosome
alterations in human solid tumors. In: Vogelstein B,
Kinzler KW, editors. The genetic basis of human cancer.
New York: McGraw-Hill; 2002. p.93-113.
Dissertações e Teses
Silva LCB. Aspectos da fotoestimulação intermitente
em pacientes com epilepsia: Teófilo Otoni [dissertação]. Campinas: Pontifícia Universidade Católica de
Campinas; 2000.
Attenhofer Jost CH, Connolly HM, O'Leary PW, Warnes
CA, Tajik AJ, Seward JB. Left heart lesions in patients
with Ebstein anomaly. Mayo Clin Proc. 2005; 80(3):3618.
Trabalhos de Congressos, Simpósios, Encontros,
Seminários e outros
APRESENTAÇÃO DO MANUSCRITO
a) título do artigo (em português e em inglês);
Adolfi M. A terapia familiar. Lisboa: Editorial Veja; 1982.
Artigos de periódicos
TERMOS DE INDEXAÇÃO - Deverão acompanhar o
resumo, um mínimo de 3 e o máximo de 5 palavraschave descritoras do conteúdo do trabalho, utilizando
os descritores em Ciência da Saúde - DeCS - da
Bireme.
Resultados: sempre que possível, os resultados
devem ser apresentados em tabelas ou figuras,
elaboradas de forma a serem auto-explicativas, e com
análise estatística. Evitar repetir dados no texto.
Tabelas, quadros e figuras devem ser limitadas a 5 no
conjunto e numerados consecutiva e independentemente, com algarismos arábicos de acordo com a
ordem de menção dos dados, e devem vir em folhas
individuais e separadas, com indicação de sua
localização no texto. O autor responsabiliza-se pela
qualidade de desenhos, ilustrações e gráficos, que
devem permitir redução sem perda de definição.
Sugere-se impressão de alta qualidade. Ilustrações
coloridas não são publicadas, a não ser que sejam
custeadas pelos autores.
PÁGINA DE TÍTULO
A exatidão das referências é de responsabilidade
dos autores.
Citações bibliográficas no texto: deverão ser
colocadas em ordem numérica, em algarismos
arábicos, sobrescrito, após a citação e devem constar
da lista de referências.
SUBMISSÃO DOS ARTIGOS
A submissão dos artigos à Revista Médica Ana Costa
implica transferência dos direitos autorais da
publicação. Os trabalhos submetidos devem ser
originais e acompanhados por uma declaração dos
autores de que o trabalho não será publicado em
qualquer outra revista no formato impresso ou
eletrônico. Os trabalhos serão avaliados por pelo
menos dois revisores, em procedimento sigiloso quanto
a identidade tanto do(s) autor(es) quanto dos revisores.
Todo trabalho que envolva estudo em seres humanos
deverá apresentar a carta de aprovação de Comitê de
Ética e Pesquisa registrado no CONEP.
Caso haja utilização de ilustrações, fotografias e
tabelas devem ser de boa qualidade e marcadas no
verso somente com o número da figura e o título do
trabalho. As legendas devem ser impressas em folhas
separadas.
Modelo da carta de submissão
Título do Artigo:
Considerando a aceitação do trabalho acima, o(s)
autor(es) abaixo assinado(s) transfere(m) para a
Revista Médica Ana Costa, todos os direitos autorais do
artigo mencionado, sendo vedada qualquer
reprodução total ou parcial em outro meio de
divulgação. Declara(m) que o presente trabalho é
original, sendo que seu conteúdo não foi ou está sendo
considerado para publicação em outro periódico, quer
no formato impresso ou eletrônico.
Data:
Assinatura (s)
Os originais deverão ser enviados para o Hospital Ana
Costa - Divisão de Ensino, rua Pedro Américo, 60 - 10º
andar, CEP 11075-905, Santos/SP, Brasil.
Enviar os manuscritos à Revista Médica Ana Costa em
duas cópias, impressos em papel sulfite A4, preparados
em espaço duplo, com fonte Times New Roman,
tamanho 12.
Após as correções sugeridas pelos revisores, a forma
definitiva do trabalho deverá ser encaminhada em uma
via impressa e em disquete 3 ½” ou em CD-ROM. Os
originais não serão devolvidos.
primeiros autores seguido de et al. As abreviaturas dos
títulos dos periódicos citados deverão estar de acordo
com o Index Medicus.
ESTRUTURA DO TEXTO
Introdução: deve conter revisão da literatura
atualizada e pertinente ao tema, adequada à
apresentação do problema e que destaque sua
relevância. Não deve ser extensa, a não ser em
manuscritos submetidos como Artigo de Revisão.
Metodologia: deve conter descrição clara e sucinta,
acompanhada da correspondente citação bibliográfica,
dos seguintes itens:
·
procedimentos adotados;
Harnden P, Joffe JK, Jones WG, editors. Germ cell
tumours V. Proceedings of the 5th Gern Cell Tumour
Conference; 2001 Sep 13-15; Leeds, UK. New York:
Springer; 2002.
Material eletrônico
Periódicos eletrônicos, artigos
Sabbatini RME. A história da terapia por choque em
psiquiatria. Cérebro & Mente [periódico online] dez.
1997/fev. 1998 [Acesso em 12 ago. 2000]; (4).
Disponível em:
·
universo e amostra;
http://www.epub.org.br/cm/n04/historia/shock.htm
·
instrumentos de medida e, se aplicável, método de
validação,
Monografia em um meio eletrônico
·
tratamento estatístico.
Conclusão: apresentar as conclusões relevantes,
considerando os objetivos do trabalho, e indicar formas
de continuidade do estudo. Se incluídas na seção
Discussão, não devem ser repetidas.
Agradecimentos: podem ser registrados agradecimentos, em parágrafo não superior a três linhas,
dirigidos a instituições ou indivíduos que prestaram
efetiva colaboração para o trabalho.
Referências: devem ser numeradas consecutivamente
na ordem em que foram mencionadas a primeira vez no
texto, baseadas no estilo Vancouver. A ordem de
citação no texto obedecerá esta numeração. Nas
referências com 2 até o limite de 6 autores, citam-se
todos os autores; acima de 6 autores, citam-se os 6
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 92 - 114, out / nov / dez 2014
São Paulo (Estado). Secretaria do Meio Ambiente.
Entendendo o meio ambiente [monografia online]. São
Paulo; 1999. [Acesso em: 8 mar. 1999]; v.1. Disponível
em: http://www.bdt.org.br/sma/entendendo/atual.htm
Anexos e/ou Apêndices: incluir apenas quando
imprescindíveis à compreensão do texto. Caberá à
Comissão Editorial julgar a necessidade de sua
publicação.
Abreviaturas e Siglas: deverão ser utilizadas de forma
padronizada, restringindo-se apenas àquelas usadas
convencionalmente ou sancionadas pelo uso,
acompanhadas do significado por extenso quando da
primeira citação no texto. Não devem ser usadas no
título e no resumo.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 92 - 114, out / nov / dez 2014
Índice / Contents
Artigo Original
Alterações do mapeamento de retina em pacientes portadores de miopia.......................................................92
Changes of retinal mapping in patients with myopia
Christianne Neves Ruschi, Renata Angelini Moraes, Luciana Garcia Iervolino, Paula Carneiro Felici,
Érika Alessandra Silvino Rodrigues, Marcos Alonso Garcia e Celso Afonso Gonçalves
Relato de Caso
Óbito fetal por descolamento prematuro de placenta........................................................................................95
Fetal mortality due to placenta premature dislocation
Rafaella Rubim Camargo e João Henrique Araújo Fernandes
Doença de Kawasaki..............................................................................................................................................97
Kawasaki disease
Mariana Rodrigues Guelli, Paulo Sergio Ciola e Ana Cristina Martinez Carvalho
O desafio diagnóstico de tumores de plexo coroide durante a gestação............................................................99
The diagnostic challenge of tumors of the choroid plexus during pregnancy
Farah Nali Rosa Naufal e Guilherme Pereira Martins
Síndrome de insensibilidade completa aos andrógenos em parentes de primeiro grau...................................101
Complete androgen insensitivity syndrome in the first-degree relatives
Mohamad Dib Salah Ali, Fernando Mangolin, André Luiz Farinhas Tomé, Walter Fernandes Correa
Woite Antonio Bertoni Meloni e Maurício Costa Bestane
Fístula broncoesofágica maligna..........................................................................................................................103
Malignant bronchoesophageal fistula
Fernanda Campos Lopes Louzada e Egydio Pacheco
O diagnóstico de mieloma múltiplo.................................................................................................................. ..105
The diagnosis of multiple myeloma
Gabriela De Luca Oliveira, Letícia Medeiros e José Carlos Medina Carvalho
Artigo de Revisão
Uso de hidroxiuréia em pacientes pediátricos com anemia falciforme.............................................................107
Use of hydroxyurea in pediatric patients with sickle cell disease
Ana Nadyr de Almeida David Gibelli, Paulo Sergio Ciola e Ana Cristina Martinez Carvalho
A insuficiência cardíaca e a obesidade em sentidos opostos..............................................................................109
Cardiac insufficiency and obesity in opposite directions
Leonardo Ignácio Cação e Rodolfo Leite Arantes
Radioterapia IGRT no tratamento do tumor inicial de pulmão.........................................................................113
IGRT radiotherapy in the treatment of lung primary tumor
Ticila Peixoto Melo, Sueli Monterroso da Cruz e Osanna Esther Codjaian
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 92 - 114, out / nov / dez 2014
Artigo Original
Alterações do mapeamento
de retina em pacientes portadores de miopia
Changes of retinal mapping in patients with myopia
Christianne Neves Ruschi1
Renata Angelini Moraes1
Luciana Garcia Iervolino1
Paula Carneiro Felici2
Érika Alessandra Silvino Rodrigues3
Marcos Alonso Garcia3
Celso Afonso Gonçalves4
RESUMO
Objetivo: Descrever os achados do mapeamento de retina em
pacientes portadores de miopia. Métodos: Foi realizado um
estudo prospectivo, em um período de quatro meses, em
pacientes com indicação de mapeamento de retina no serviço
de oftalmologia do Hospital Ana Costa e que apresentavam
diagnóstico de miopia. Resultados: Foram identificados 29
(83%) pacientes apresentando o mesmo tipo de miopia em
ambos os olhos e 06 (17%) pacientes com classificação
diferente de miopia nos dois olhos. Em 23 olhos (33%), foram
encontrados fundos míopes, sendo que cinco olhos (7%)
estavam relacionados à miopia baixa, nove olhos (13%) à
miopia moderada e nove olhos (13%) à miopia alta. Em cinco
olhos (7%), foram encontrados estafiloma, sendo que um olho
(2%) estava relacionado à miopia baixa e quatro olhos (6%)
relacionados à miopia alta. Em nove olhos (13%), foram
encontrados crescente peripapilar, estando os 9 olhos (13%)
relacionados à miopia alta. Em 19 olhos (27%) foram
encontradas denegerações periféricas (lattice, opérculo,
branco sem pressão, pavingstone, horseshoe), estando seis
olhos (9%) relacionados com miopia média, sete olhos (10%)
relacionados com miopia moderada e 6 olhos (9%) com miopia
alta. Conclusão: O fundo míope foi o achado mais encontrado
nos olhos examinados, em segundo lugar de frequência
vieram as degenerações periféricas. Em seguida, observou-se
o crescente papilar e, por último, o estafiloma.
ABSTRACT
Objective: To describe the findings of retinal mapping in
patients with myopia. Methods: A prospective study was
conducted in the eye clinic ofHospital Ana Costa during a period
of 4 months in patients with indication for retinal mapping and a
diagnosis of myopia. Results: 29 patients (83%) were identified
with the same kind of myopia in both eyes and 6 of them (17%)
with a different classification of myopia in both eyes. In 23 eyes
(33%), myopic fundus were found, and that 5 eyes (7%) were
related to low-myopia, 9 eyes (13%) to moderate-myopia and 9
eyes (13%) to high-myopia. In 5 eyes (7%) were found
staphyloma and that 1 eye (2%) was related to low-myopia and
four eyes (6%) related to high-myopia. In 9 eyes (13%)
peripapillary crescents were found, with 9 eyes (13%) related to
high myopia. In 19 eyes (27%) peripheral degeneration (lattice,
operculum, white without pressure, pavingstone, horseshoe)
was found, with 6 eyes (9%) related to low-myopia, 7 eyes
(10%) related to moderate-myopia and 6 eyes (9%) with highmyopia. Conclusion: Myopic fund is the most common
change, followed by peripheral degeneration, peripapillary
crescent and staphyloma.
Key words: Myopia/Retinal Mapping. Myopia/Complications.
Myopia/Refraction. Myopia/Diopter.
Descritores: Miopia/Mapeamento Retina.
Miopia/Complicações. Miopia/Refração. Miopia/Dioptria.
Introdução
A miopia é uma das cinco maiores causas de cegueira legal em
todo mundo1. O déficit visual ocorre em idade precoce, comparado
com a faixa etária das outras quatro principais causas: catarata,
retinopatia diabética, glaucoma e degeneração macular
relacionada à idade, que ocorrem décadas depois. Do ponto de
vista social, a miopia causa um enorme impacto, pois pode alterar o
desempenho de indivíduos na etapa produtiva de suas vidas1.
A miopia pode ser dividida em fisiológica e patológica. A miopia
fisiológica, de longe a forma mais prevalente, é menor que –6
dioptrias esféricas (DE) em magnitude e considerada uma variação
biológica normal. Olhos que apresentam erros refrativos maiores
que –6 DE são definidos como altos míopes. Um subgrupo dos
altos míopes tem comprimento axial que não se estabiliza durante
a fase adulta. A fisiopatologia dessa forma progressiva e
degenerativa de miopia é desconhecida. A miopia patológica,
degenerativa ou progressiva apresenta-se mais frequentemente
nas miopias maiores que - 6DE2,3. Duke-Elder define a miopia
degenerativa como o tipo de miopia acompanhada por alterações
1) Residente de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2) Médica Estagiária do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
3) Médico oftalmologista, Preceptor de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
4) Mestre pelo Curso de Pós-Graduação em Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo Escola Paulista de Medicina; Chefe do Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos e
Assistente da Disciplina de Oftalmologia da Universidade Metropolitana de Santos.
Instituição: Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Christianne Neves Ruschi - Rua José Caballero 60 – 11055-300 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Recebido em: 30/10/2013; aceito para publicação em: 15/05/2014; publicado online em: 10/12/2014.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
92
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 92 - 94, out. / nov. / dez. 2014
degenerativas que ocorrem, particularmente, no segmento
posterior do globo ocular3. A alta miopia é freqüentemente
associada com prolongamento excessivo e progressivo do olho,
resultando em uma variedade de alterações fundoscópicas,
associadas com graus variáveis de perda visual4,5. Essas
alterações acometem desde a fóvea até a periferia retiniana. A
miopia, além de aumentar o risco de descolamento de retina (DR) ,
favorece o aparecimento precoce de lesão retiniana, por causa
direta – pela deficiência da matriz que une os fotorreceptores ao
epitélio pigmentado retiniano e/ou pela alteração do mecanismo de
bomba do epitélio pigmentado retiniano; ou por causa indireta –
pelo estiramento da retina, deixando-a suscetível a lesões
degenerativas e roturas causadas por uma menor resistência à
tração vítreo-retiniana6.
Dentre as causas de cegueira associadas a olhos míopes,
predominam as alterações do segmento posterior do bulbo ocular,
como: descolamento regmatogênico da retina, alterações
degenerativas maculares, estafilomas posteriores com ectasia
macular, neovascularização subretiniana macular, buraco de
mácula e glaucoma. O descolamento regmatogênico está
associado às degenerações periféricas de retina, as quais são
identificadas por meio da observação clínica, podendo ser
classificadas pela morfologia, prognóstico e predisposição ou não
ao descolamento regmatogênico de retina7.
O objetivo deste estudo é avaliar o mapeamento de retina em
pacientes portadores de miopia e relacioná-las às dioptrias.
Métodos
Tabela 1 – Distribuição dos olhos estudados segundo o tipo de miopia.
Em 23 olhos (33%), foram encontrados fundos míopes,
sendo que cinco olhos (7%) estavam relacionados à miopia baixa,
nove olhos (13%) à miopia moderada e nove olhos (13%) à miopia
alta. Em cinco olhos (7%) foram encontrados estafiloma, sendo que
um olho (2%) estava relacionado à miopia baixa e quatro olhos (6%)
relacionados à miopia alta. Em nove olhos (13%), foi encontrado
crescente peripapilar, estando os nove olhos (13%) relacionados à
miopia alta. Em 19 olhos (27%) foram encontradas denegerações
periféricas ( lattice, opérculo, branco sem pressão, pavingstone,
horseshoe), estando seis olhos (9%) relacionados com miopia
média, sete olhos (10%) relacionados com miopia moderada e 6
olhos (9%) com miopia alta – Tabela 2.
Foi realizado um estudo prospectivo, em um período de quatro
meses, em pacientes com indicação de mapeamento de retina no
Serviço de Oftalmologia do Hospital Ana Costa e que
apresentavam diagnóstico de miopia. Os dados obtidos dos
pacientes foram idade, sexo, achados no mapeamento de retina
(MR) e refração. Utilizamos como critérios de exclusão história de
cirurgia ocular prévia, diabetes e ceratocone.
Foram submetidos a exame de mapeamento de polo posterior e
periferia retiniana com colírio de ciclopentolato a 1% e fenilefrina a
10%. Todos os exames oftalmológicos foram realizados pelo
mesmo examinador.
Neste estudo foi utilizada a classificação de Otsuka8, que relaciona
o grau de ametropia com as alterações retinianas anatômicas e
estruturais, que segundo o exame de refração divide a miopia em
três categorias dependendo do equivalente esférico: Miopia baixa
(-1,00 e -3,00 dioptrias esféricas), Miopia moderada (-3,25 e -6,00
dioptrias esféricas.) e Miopia alta (superior a -6,00 dioptrias
esféricas).
Resultados
Foram examinados 70 olhos míopes de 35 pacientes, sendo 28
pacientes do sexo feminino e sete pacientes do masculino. A média
de idade da população estudada foi de 33 anos, variando de 12 a
66 anos. O grau de miopia variou de -1,00 DE à -23,00 DE.
De acordo com a classificação dos pacientes segundo tipo de
miopia, foram identificados 29 (83%) pacientes apresentandoo
mesmo tipo de miopia em ambos os olhos e seis (17%) com
classificação diferente de miopia nos dois olhos.
A miopia baixa foi detectada em 14 pacientes – Tabela 1. Esse tipo
de miopia ocorreu em ambos os olhos em 10 pacientes e em
apenas um dos olhos em quatro pacientes, perfazendo um total de
24 (34%) olhos. A miopia moderada foi identificada em 14
pacientes, sendo em ambos os olhos em 10 pacientes e em apenas
um dos olhos em 4 pacientes, somando 24 (34%) dos olhos. A
miopia alta, identificada em 12 pacientes, era bilateral em 12 e
unilateral em dois pacientes, totalizando 22 (32%) olhos.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 92 - 94, out. / nov. / dez. 2014
Tabela 2 - Freqüência de alterações fundoscópicas encontradas na miopia.
Discussão
No estudo em questão foi verificado que dos pacientes míopes
submetidos ao mapeamento de retina, 80 % destes eram do sexo
feminino. Ao observar, porém, que o número de mulheres
acometidas era superior aos homens9,10, faz-se algumas
justificativas para tentar solucionar a questão. Devido à maioria dos
costumeiros e culturais trabalhos femininos (costura, tricô, crochê,
etc), as mulheres se esforçam mais visualmente que os homens;
fatores hormonais diferentes; o não uso de óculos pelas mulheres;
fatores genéticos e outros; poder-se-ia supor a justificativa
adequada aos dados encontrados. Não se encontra, entretanto,
embasamento científico na literatura para esclarecer melhor essas
teorias11.
93
Em comparação com a miopia simples, que envolve um
baixo grau de ametropia e um fundo ocular relativamente saudável,
a miopia patológica é caracterizada pela presença de alterações
degenerativas que ocorrem no segmento posterior de olhos com
miopia elevada. Este tipo de miopia encontra-se muitas vezes
associado ao alongamento extremo do eixo ântero-posterior do
globo ocular.
Foram encontradas alterações fundoscópicas nas três
categorias de miopia, porém das quatro alterações encontradas
(fundo míope, estafiloma, crescente peripapilar e degenerações
eriféricas) todas estavam presentes na alta miopia. A presença e
desenvolvimento das lesões acima referidas dependem do grau da
ametropia em questão, sendo que um sujeito com miopia mais
elevada está predisposto a desenvolver lesões mais graves12.
Consideramos que é freqüente a presença de alterações
fundoscópicas em pacientes com miopia e observamos que tais
alterações podem, de forma variada, cursar com baixa visual.
Devemos ter especial atenção nestes pacientes devido ao risco
aumentado de descolamento de retina. O profissional que examina
esses pacientes deve estar familiarizado com a diferenciação entre
lesões predisponentes e não predisponentes, pois em boa parte
das lesões esse diagnóstico vai ser importante.
Desta forma, é preciso que seja feita uma avaliação de
forma contínua para que se possa detectar qualquer anormalidade
ou evolução de alterações já existentes, e se faça um
acompanhamento adequado, podendo prevenir o
desenvolvimento de alterações mais graves que levem à
diminuição ou mesmo à perda da visão.
94
Referências
1. Waring GO. Myopia. In: Myopia: surgery. St. Louis: Mosby; 1992. p. 4-15.
2. Lins AO, Going M, Garcia MA. Degenerações periféricas da retina em
pacientes
candidatos à cirurgia refrativa. Rev Méd Ana Costa. 2010;15(1):7-9.
3. Duke-Elder S. Pathological refractive errors. In: Duke-Elder S, ed. System
of Ophthalmology. St. Louis: Mosby; 1970.
4. Tokoro T. On the definition of pathologic myopia in group studies. Acta
Ophthalmol Suppl. 1988;185:107-8.
5. Tano Y. Pathologic myopia: where are we now? Am J Ophthalmol.
2002;134(5):645-60.
6. Buttram VC, Reiter RC. Uterine leiomyomata: etiology,symptomatology
and management. FertilSteril. 1981;36:433-5.
7. Kansky JJ. The classification and terminology of peripheral retinal
degenerations. Mod Probl Ophthalmol. 1975;15:103-11.
8. Otsuka J. Research on the etiology and treatment of myopia. Acta Soc
Ophthalmol Jpn. 1967;71:13.
9. Moreira H, Maia M, Maia EM, Godoy G, Huss HHA. Aspectos sôcioeconômicos do uso dos óculos no Hospital de Clínicas da UFPR. Arq Bras
Oftalmol. 1997;60(4):354.
10. Cavalcanti SJL, Lopes RACE, Carvalho RF. Anomalias refrativas em
população escolar. Arq Bras Oftal. 1996;59(4):352.
11. Barros E, Dias V. Incidência das ametropias no Hospital Universitário em
Campo Grande (MS) entre 1996 e 1998. Arq Bras Oftal. 2000;63(3):207.
12. Morales PHA, Farah ME, Lima AL, Alleman N, Bonomo PP.
Degenerações Periféricas da retina em pacientes candidatos à cirurgia
refrativa. Arq Bras Oftalmol. 2001;64:27-32.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 92 - 94, out. / nov. / dez. 2014
Relato de Caso
Óbito fetal por descolamento
prematuro de placenta
Fetal mortality due to placenta premature dislocation
Rafaella Rubim Camargo1
João Henrique Araújo Fernandes2
RESUMO
Relato de caso: Relatamos um caso de uma paciente
hipertensa de 29 anos, que teve uma gestação gemelar e com
doença hipertensiva na gravidez. Os fetos foram á óbito devido
a descolamento prematuro de placenta e hipertensão arterial
materna. Comentários: Este relato ressalta a importância do
diagnóstico precoce, pois o descolamento prematuro de
placenta é um grave problema obstétrico, com um importante
fator de risco a hipertensão arterial na gravidez, que podem
levar como conseqüência morte fetal, hemorragias e
complicações maternas.
ABSTRACT
Case report: We report a case of a 29-year-old hypertensive
patient, who had a twins gestation and hypertensive disease in
pregnancy. The fetuses died due to PPD. Comments: This
case report emphasizes the importance of early diagnosis,
because the premature separation of the placenta is a serious
obstetric problem, with a major risk factor hypertension in
pregnancy, which can lead consequently fetal death,
hemorrhage and maternal complications.
Key words: Placenta premature dislocation. Fetal mortality
Descritores: Descolamento Prematuro de Placenta. Óbito
Fetal
Introdução
O descolamento prematuro de placenta é definido com a
separação da placenta da parede uterina antes do parto1. Esta
separação pode ser total ou parcial. Os fatores de risco são
hipertensão gestacional, hipertensão pré- existente; rotura
prematura de membranas ovulares, cesárea prévia, tabagismo,
uso de drogas (álcool, cocaína e crack), condições que ocasionam
superdistensão uterina (polihidrâmnio, gestação gemelar), trauma.
O tratamento dependerá do grau de descolamento (grau 1, 2 ou 3)
que se reflete no estafo hemodinâmico materno e da vitalidade
fetal.
Relato de caso
Paciente 29 anos, IIG IPC com gestação gemelar de 34 semanas e
com doença hipertensiva na gravidez (DHEG) deu entrada no
pronto-socorro de Ginecologia e Obstetrícia com ultrassonografia
mostrando: feto A :situação longitudinal, cefálico, dorso a direita ,
bcf = 126 bpm , placenta normal grau I; e feto B: situação
longitudinal, cefálico, dorso á direita, bcf =119bpm, placenta
normal, posterior grau I. O feto B apresentava episódios limitados
de bradicardia fetal. Foi internada e foram solicitados exames
laboratoriais de rotina hipertensiva e ultrassonografia obstétrica
com Doppler e PB. Os exames laboratoriais que vieram alterados
foram: ácido úrico = 5,9; e DHL = 256. O ultrassom obstétrico com
Doppler mostrou gestação gemelar: feto 1: índice do líquido
amniótico = 6,5cm (normal 8-18cm), feto apresentação cefálica e
dorso à direita, peso: 1865g, perfil biofísico fetal: 08/10(normal
10/10), Doppler discreto aumento da resistência periférica mais
sem centralização; feto 2: índice do líquido amniótico = 6,5cm
(normal 8-18cm), pélvico e dorso á esquerda , peso =1864g, perfil
biofísico fetal 6/10, Doppler discreto aumento da resistência
periférica mais sem centralizações. Foi de alta hospitalar com
orientações e seguimento com seu pré-natalista. A mesma paciente
deu entrada no pronto-socorro de Ginecologia após 18 dias, com
IG: 36 semanas e 2 dias, com queixa de pouca movimentação fetal
e com aumento da pressão arterial sistêmica, com ultra-sonografia
apresentando: feto 1: movimento fetal presente, bcf presente com
bradicardia fetal severa e movimento respiratórios ausentes; e feto
2: movimento fetal ausente, bcf ausentes, movimentos respiratórios
ausentes; conclusão:
óbito fetal (feto B) e feto A com bradicardia importante. A conduta foi
resolução obstétrica por via alta de emergência. No intra-operatório
do parto cesárea, observou-se que durante o ato cirúrgico DPP
maior que 50%, com grande quantidade de sangramento intrauterino e enviado placenta para anatomopatológico. Após 48hs,
paciente teve alta hospitalar. O resultado do anatomopatológico foi
placenta gemelar monocorionica, diamniôtica, com micro-infartos e
focos de calcificações no estroma; cordões com duas artérias e
uma veia e membranas com edema moderado.
Discussão
Descolamento prematuro de placenta representa relevante causa
de morbimortalidade materna e perinatal. O que identifica os
fatores de risco relacionados a esta grave intercorrência obstétrica,
pode propiciar melhor estratégia de intervenção terapêutica,
melhorando o prognóstico de gestantes e de seus produtos
conceptuais2.
O DPP definido como separação da placenta implantada no corpo
do útero, antes do nascimento do feto com idade gestacional de 20
1) Residente de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2) Chefe do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Instituição: Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Correspondência: Rua Guedes Coelho, 78 ap. 34, Santos/SP. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 18/04/2014; publicado online em: 10/12/2014..
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 95 - 96, out. / nov. / dez. 2014
95
ou mais semanas completas, resulta de uma série de processos
fisiopatológicos, muitas vezes de origem desconhecida3.Os fatores
de risco dessa patologia
são: hipertensão (hipertensão
gestacional, hipertensão preexistente); rotura prematura de
membranas ovulares; cesariana previa; tabagismo; idade materna
avançada; uso de drogas (álcool, cocaína e crack);
polihidramnio,gestação gemelar;trauma (automobilístico, trauma
abdominal direto); DPP em gestação anterior; amniocentese,
cordocentese1.
A separação da placenta do útero, pode ser parcial ou total e
classificada em três graus, levando em conta os achados clínicos e
laboratoriais, de acordo com classificação de Sher1:
- Grau 1: sangramento genital discreto sem hipertonia uterina
significativa com vitalidade fetal preservada. Sem repercussões
hemodinâmicas e coagulopatia. Normalmente, é diagnosticado no
pós-parto com a identificação do coagulo retroplacentário.
- Grau 2: sangramento genital moderado e contrações tetânicas.
Presença de taquicardia materna e alterações posturais da
pressão arterial. Alterações iniciais da coagulação com queda dos
níveis de fibrinogênio. Batimentos cardíacos fetais presentes,
porém com sinais de comprometimento de vitalidade.
- Grau 3: sangramento genital importante com hipertonia uterina.
Hipotensão arterial materna e óbito fetal.
- Grau 3A: sem coagulopatia instalada.
- Grau 3B: com coagulopatia instalada.
A hipertensão é responsável por até 50% dos casos de DPP não
traumáticos. A ausência de hipertensão no momento da chegada
não exclui a etiologia hipertensiva, podendo a gestante estar
chocada. Os procedimentos relacionados à estabilização de uma
gestante com distúrbios hipertensivos devem ser considerados
(como por exemplo o sulfato de magnésio). O acidente
automobilístico é a maior causa de relacionada ao trauma
podendo ser causado pela desaceleração ou por trauma direto ao
abdome1.
O quadro clínico característico do DPP e a dor abdominal,
associada ou não a sangramento vaginal. A dor varia de leve
desconforto ate dor intensa, associada a aumento do tônus uterino,
que pode se manifestar desde uma taquihiperssistolia ate
hipertonia1.
O sangramento no DPP pode se manifestar das seguintes
maneiras: hemorragia exteriorizada; hemoâmnio; Sangramento
retroplacentário. Ate 20% dos sangramentos no DPP são ocultos,
com formação de coágulo retroplacentário e infiltração sanguínea
intramiometrial. Esse sangramento e responsável pela apoplexia
utero-placentária ou “útero de Couvelaire” que ocasiona déficit
contrátil, sendo importante causa de hemorragia pós-parto. A
quantidade do sangramento exteriorizado pode não refletir a exata
perda sanguínea. Sangramento de coloração escurecida pode
refletir a presença de formação de coagulo retroplacentário. O
sangramento que se inicia na rotura das membranas deve ser
diferenciado da rotura de vasa prévia. O diagnóstico de DPP é
clínico. A ultra-sonografia pode ser realizada em casos onde tem
estabilidade hemodinâmica materna e vitalidade fetal preservada,
e quando há dúvida sobre a localização placentária, e
apresentação fetal, assim como para estimativa de peso do feto,
presença de coágulo retroplacentário, espessamento anormal da
placenta e bordo placentário sem continuidade (borda “rasgada”)1.
Os exames que devem ser solicitados são: hemograma, contagem
de plaquetas, tipagem sanguínea e Rh, coagulograma, rotina de
doença hipertensiva na gravidez (uréia,creatinina,TGO,TGP,DHL,
ácido úrico)1.
O tratamento dependerá do grau do descolamento (Grau 1, 2 ou 3)
que se reflete no estado hemodinâmico materno e da vitalidade
fetal. No grau 1, o diagnóstico geralmente e feito no pós-parto,
portanto, não houve repercussões maternas ou fetais; grau 2, o
parto vaginal é possível se iminente, desde que a vitalidade fetal
esteja preservada e não haja comprometimento hemodinâmico
materno e o trabalho de parto em franco progresso, o débito
96
urinário deve ser monitorado e mantido em 30ml/hora e o
hematócrito acompanhado e acima de 30%. Caso a evolução não
seja favorável, o mais indicado é a cesarea. Em caso do feto morto,
Grau 3, o parto vaginal e aconselhável e adotar os mesmos
cuidados de monitoração materna do ponto de vista hemodinâmico
e do estado de coagulação1.
O descolamento prematuro de placenta ocorre em
aproximadamente 1 a 2 % das gestações. È das piores
complicações obstétricas com aumento importante da
morbimortalidade materna, por maior incidência de hemorragias,
anemias, coagulopatia, hemotransfusões, cesárea, histerectomia e
até morte materna. Podem ocorrer ainda complicações perinatais,
como prematuridade, restrição de crescimento fetal, baixo peso ao
nascer, sofrimento fetal e óbito perinatal, por isso é descrito como a
principal causa perinatal4.
O descolamento prematuro permanece grave problema obstétrico,
com conseqüências potencialmente fatais para binômio maternofetal5.
Referências
1. Jacinto OS, Pamplona MS, Kamila S.Gestação de Alto Risco. Manual
Técnico. 5ªed. 2010; pp.57-61.
2. Boyaciyan K, Marcus PF, Vega CEP, Barbosa AS, Pazero LC. Mortalidade
materna na Cidade de São Paulo 1993 a 1995. Rev Bras Ginecol
Obstetr.1998;20(1):16-7
3. . Cabar FR, Nomura RMY, Machado TRS, Zugaib M. Óbito fetal no
descolamento prematuro da placenta: Comparação entre os períodos. Rev
Assoc Med Bras. 2008;54(3):256-60.
4. Zugaib M. Descolamento prematuro de placenta. In: Zugaib M. 1ª ed.
Barueri: Manole; 2008.pp.713-24.
5. Cabar FR, Nomura RMY, Costa LCV, Alves EA, Zugaib M. Cesárea prévia
como fator de risco para o descolamento prematuro da placenta . Rev Bras
Ginecol Obstetr. 2004;26(9):709-
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 95 - 96, out. / nov. / dez. 2014
Relato de Caso
Doença de Kawasaki
Kawasaki disease
Mariana Rodrigues Guelli¹
Paulo Sergio Ciola²,
Ana Cristina Martinez Carvalho³
RESUMO
Introdução: A doença de Kawasaki consiste em uma moléstia
febril aguda descrita primeira vez por Tomisako Kawasaki em
1967, no Japão. Caracteriza-se por uma vasculite de vasos
pequenos e médios, apresentando como principal e temível
complicação o aneurisma de artérias coronárias. Relato de
caso: Criança de 3 anos de idade encaminhada ao Serviço de
Pediatria do Hospital Ana Costa de Santos apresentando
sinais e sintomas com quatorze dias de evolução, dentre eles,
febre e exantema generalizado entre outros que sugerem o
diagnóstico de Doença de Kawasaki. Considerações finais:
A apresentação da doença de Kawasaki com sinais e sintomas
inespecíficos tem diagnóstico difícil devido à inexistência de
teste diagnóstico laboratorial específico.
ABSTRACT
Introduction: The Kawasaki disease is an illness with acute
fever, first described by Tomisako Kawasaki in 1967, in Japan. It
is characterized by an intense vasculitis of small and medium
vessels, feared by your main complication, the coronary
aneurysm. Case Report: A 3 year-old children was referred to
Ana Costa Hospital, in Santos, to conclude the Kawasaki
disease diagnosis. He was with fever lasting more than fourteen
days, disseminated exanthema, among others symptoms.
Final considerations: The diagnosis may be difficult in case of
unspecific clinical presentation because there is not a specific
diagnostic laboratorial test.
Key words: Exanthema. Hyperemia. Kawasaki. Disease.
Diagnosis.
Descritores: Exantema. Hiperemia. Doença de Kawasaki.
Diagnóstico.
Introdução
A doença de Kawasaki (DK) é uma vasculite sistêmica, de etiologia
desconhecida, que se manifesta com quadro de febre, exantema,
conjuntivite, alterações da mucosa oral e das extremidades ,
linfadenopatia cervical e, em algumas crianças, dilatação ou
aneurismas de coronárias e outras artérias 1 . Acomete
principalmente crianças menores de cinco anos, mais
frequentemente meninos. A incidência anual varia de nove a 32,5
casos por 100.000 crianças menores de cinco anos, de acordo com
a população estudada. Embora seja uma doença aguda, pode
evoluir com sequelas cardíacas importantes caso não seja
diagnosticada e tratada precocemente1,2.
A doença é auto-limitada. Os sinais e sintomas evoluem em um
período médio de 10 dias e, depois, há resolução, na maioria das
crianças. No entanto, aneurismas ou ectasias de artérias
coronarianas ocorrem em 15% a 25% dos casos não tratados e o
seu desenvolvimento costuma ser clinicamente silencioso. O
tratamento com altas doses de imunoglobulina intravenosa nos
primeiros 10 dias da febre reduz o risco dessas complicações3.
A presença de febre persistente, por pelo menos cinco dias, sem
causa definida, associada a quatro ou mais dos seguintes critérios,
são características preponderantes à definição do diagnóstico para
a doença de Kawasaki: alterações de extremidades (fase aguda:
eritema palmar ou plantar e/ou edema de mãos ou pés e/ou fase
subaguda com descamação periungueal nos dedos das mãos ou
dos pés ou de região perineal- linhas de Beau); exantema
polimorfo, inespecífico; conjuntivite bilateral não purulenta;
alterações de lábios ou cavidade oral: eritema labial, fissuras
labiais, língua em framboesa, enantema de mucosa orofaríngea;
linfoadenopatia cervical, maior que 1,5 cm de diâmetro, usualmente
unilateral. Na presença de febre e envolvimento coronariano,
detectado pelo ecocardiograma, menos de quatro dos outros
critérios é suficiente para o diagnóstico.
Na fase aguda da doença, o hemograma mostra anemia,
leucocitose com neutrofilia e desvio à esquerda e trombocitose
(após a primeira semana da doença) e o VHS e PCR estão
aumentados. A avaliação cardiológica, por meio do
ecocardiograma, está indicada em todos os casos para identificar
ectasias ou aneurismas coronarianos.
O tratamento consiste na administração de imunoglobulina
intravenosa, em uma única dose (2g/kg/dose), até o décimo dia de
febre. Além disso, deve utilizar-se aspirina (AAS) em doses altas de
80-100 mg/kg/dia até que a criança permaneça sem febre, durante
48 horas, altura em que esta dose deve ser reduzida para 3-5
mg/kg/dia4.
O atendimento dos pacientes com DK é feito pelo especialista em
Reumatologia Pediátrica.
Relato de caso
Criança 3 anos, masculino, foi encaminhada ao Hospital Ana Costa
de Santos com quadro de febre havia 14 dias associada à
hiperemia labial e de conjuntiva. Esteve internado em outro serviço,
1. Médica Residente do 1º ano de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2. Chefe do Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
3. Pediatra do Hospital Ana Cost, Santos/SP
Instituição: Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência : Mariana Rodrigues Guelli, Rua República Argentina, 12 ap. 41 – 11065-030 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 15/05/2014; publicado online em: 10/12/2014.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 97 - 98, out. / nov. / dez. 2014
97
no qual permaneceu por sete dias com febre elevada e diagnóstico
inicial de faringoamigdalite e em uso de amoxicilina, porém, sem
melhora clínica. Evoluiu com lesões labiais, conjuntivite bilateral,
linfoadenopatia cervical persistência da febre, apesar da
medicação proposta, edema de membros inferiores e dificuldade
na deambulação. Foi consultado por uma Reumatologista infantil,
que sugeriu o diagnóstico de DK e encaminhou ao HAC para
seguimento e tratamento. À admissão, encontrava-se em regular
estado geral e febril (38ºC), com ausculta cardíaca e pulmonar sem
alterações. Havia discreta conjuntivite ocular, sem secreção. O
exame físico da orofaringe mostrava enantema e hiperemia de
lábios e palato, a língua, em framboesa. Otoscopia sem alterações.
Apresentava edema em joelhos 2+/4+ e muita dificuldade na
deambulação. A mãe referia dificuldade na alimentação e
prostração. Os exames laboratoriais iniciais mostraram - HB 10.9
g/dL - HT 34.6 % - LEUCÓCITOS 28.8000/mm3(promielócitos 0%,
mielócitos0%, bastonetes 12%, segmentados 76%, linfócitos 7%,
monócitos 4%, eosinófilos 1%) - PLAQUETAS 463.000/mm³ - PCR:
6.4mg/ml ; URINA 1 E BACTERIOSCOPIO sem alterações, DHL:
226 mm, ASLO : 100 UI/ml (normal < 200) , sorologias para
toxoplasmose, citomegalovírus e mononucleose infecciosa IGM e
IGG negativas. À ultrassonografia cervical: linfonodos de aspecto
reacional; USG de joelho esquerdo: sinais de derrame articular
moderado no recesso supra-patelar; USG de tornozelo direito:
sinais de derrame articular leve. Após a internação, foi solicitado
ecocardiograma de urgência, que não evidenciou alterações
coronarianas, e a Imunoglobulina intravenosa 2g/kg em 8 horas e
AAS de 80/mg/kg de 6/6 horas na enfermaria. Durante as primeiras
horas do uso da imunoglobulina, apresentou hipotensão como
efeito adverso do medicamento, sendo imediatamente
encaminhado à Unidade de Terapia Intensiva, por onde
permaneceu por 24 horas em observação. Após o início da terapia,
foi acompanhada na enfermaria e evoluiu com melhora dos
sintomas. Quando passou 24 horas afebril, a dose do AAS foi
reduzida para 3 mg/kg/dia (dose anti-agregante plaquetária).
Recebeu alta hospitalar uma semana após a internação e
permanece em acompanhamento ambulatorial, tendo feito dois
ecocardiogramas que não evidenciaram lesões.
Discussão
O critério diagnóstico é específico, mas tem limitada sensibilidade
como observado. O paciente em questão chegou ao serviço com
hipótese diagnóstica pré-estabelecida e apresentava os critérios
que definem a DK. Entretanto, os sintomas iniciais apresentados
se assemelham a moléstias frequentemente encontradas em
crianças nessa faixa etária, como escarlatina, faringoamigdalite
bacteriana, rubéola, entre tantas outras doenças exantemáticas da
infância, dificultando ainda mais o diagnóstico precoce e a
prevenção da complicação mais grave, o aneurisma coronariano6.
Nota-se que a hipótese de DK foi suspeitada após o aparecimento
de mais critérios que definem a doença, no caso, o edema de
membros inferiores.
A dificuldade diagnóstica tem importância devido à necessidade de
tratamento precoce da DK. Deve ser observado que cerca de 20 a
25% dos pacientes não tratados desenvolvem alterações nas
artérias coronárias, que felizmente não houve no caso
apresentado. Quando o diagnóstico é precoce e o tratamento é
realizado antes do 10º dia da doença, a incidência de alterações
coronarianas pode ser reduzida a menos de 55%
No sentido de diagnosticar ou, ao menos, suspeitar de DK, deve
ser observada inicialmente a febre com duração superior a cinco
dias. Esta é uma característica comum, mesmo quando ocorre de
forma atípica7. Adicionalmente à febre, sinais de exantema e
alterações na mucosa oral (>95%) devem ser levados em
consideração. As alterações de extremidades são menos comum e
direcionam o diagnóstico, porém, manifestam-se mais
tardiamente, atrasando o diagnóstico.
Na simples suspeita de DK, deve-se sempre realizar o
98
ecocardiograma, a fim de afastar as temidas complicações
coronarianas e cardíacas. Em muitos casos, é necessário repetir
evolutivamente o ecocardiograma, porém o intervalo não é
consensual4. No caso deste paciente, além de realizar dois ECG em
internação, foram realizados um no primeiro mês de seguimento e
outro no terceiro mês, após a alta.
É importante destacar que no critério diagnóstico de DK consta a
necessidade de excluir outras doenças. No presente caso, um dos
diagnósticos iniciais propostos foi o de estreptococcia. Essa
possibilidade foi afastada devido à ASLO negativo e pela ausência
de resposta ao tratamento com antibiótico. Houve suspeita de
reação adversa à droga, e dengue, devido à epidemiologia. Mas a
evolução da febre e do exantema foram independentes do uso dos
medicamentos e o VHS permanecia elevado, o que vai contra a
possibilidade de reação às drogas.
Observa-se que houve dificuldade no diagnóstico devido à raridade
da doença e a limitada sensibilidade do critério utilizado como
diagnóstico. A ausência de testes específicos laboratoriais atrasa a
terapêutica e podem levar ao aparecimento das complicações da
doença e o pior prognóstico do paciente¹. A grande quantidade de
doenças exantemáticas encontradas nessa faixa etária também
contribui para o atraso da suspeita diagnóstica. Algumas delas
como estrepcoccia amigdaliana, parvovírus B19, mononucleose
infecciosa, citomegaloviroses, adenovívrus, enterovírus,
leptosprose e até mesmo a artrite reumatóide juvenil. Porém, a faixa
etária, a epidemiologia e os testes laboratoriais realizados afastam
muitas dessas possibilidades, sendo um diagnóstico de exclusão.
Também já foi relatado o aparecimento da reativação da cicatriz da
vacina BCG como primeiro sintoma em crianças menores.
Referências
1. Castro PA, Urbano LMF, Costa IMC. Kawasaki disease. Arq Bras
Dermatol. 2009;84(4):317-31.
2.Levy M, Koren G. Atypical Kawasaki disease: analysis of clinical
presentation and diagnostic clues. Pediatr Infect Dis J. 1990;9:122-6.
3. Brogan PA, Bose A, Burgner D, Shingadia D, Tulloh R, Michie C, N Klein, R
Booy,
M Levin, M J Dillon. Kawasaki disease: an evidence based approach to
diagnosis, treatment, at proposals for future research. Arch Dis Child.
2002;86:286-90.
4. Azevedo ECL, Oliveira SKF. Reumatologia Pediátrica. Rio de janeiro:
Medsi; 1991.pp. 273-81.
5. Stapp J, Marshall GS. Fulfillment of diagnostic criteria in Kawasaki
disease. South Med J. 2000;93:44-7.
6. Herscheimer SS. Síndrome de Kawasaki. Rev Paul Pediatr. 1991;9:1567.
7. Tomikawa SO, Sakamoto RA, Gonçalves AMF, Sakani NetoJR.
Dificuldade diagnóstica na doença de Kawasaki: relato de caso. Pediatria.
2003(25):128-33.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 97 - 98, out. / nov. / dez. 2014
Relato de Caso
O desafio diagnóstico de tumores
de plexo coroide durante a gestação
The diagnostic challenge of tumors of the choroid plexus during pregnancy
Farah Nali Rosa Naufal1
Guilherme Pereira Martins2
RESUMO
ABSTRACT
Introdução: O plexo coroide é uma estrutura presente nos
ventrículos do sistema nervoso central e é o responsável por
grande parte da produção do líquido cefalorraquidiano. As
lesões expansivas nessa estrutura constituem um grupo amplo
e heterogêneo de doenças, dentre elas: tumores, infecções,
anomalias congênitas, hemorragias, cistos e fenômenos
degenerativos. Seu diagnóstico é complexo e depende, além
de história clínica, de exames de imagem precisos. Quando se
trata de um achado ultrassonográfico durante o período
neonatal a complexidade do diagnóstico torna-se ainda maior.
Relato de caso: Trata-se de uma paciente em
acopanhamento de pré-natal sem intercorrências que a partir
da 32ª semana de gestação começou a apresentar alterações
ultra-sonográficas compátiveis com lesões expansivas do
plexo coróide, mais precisamente do ventrículo esquerdo. A
partir dessa alteração, a equipe de obstetrícia do Hospital Ana
Costa iniciou um seguimento mais rígido de pré-natal com
exames ultra-sonográficos frequentes e métodos de imagens
mais precisos para melhor diagnóstico da lesão.
Introduction: The choroid plexus is a structure present in the
ventricles of the central nervous system and is responsible for
the production of most part of the cerebrospinal fluid. The
expansive lesions in this structure compose a wide and
heterogeneous group of diseases, including: tumors, infections,
congenital abnormalities, bleeding, cysts and degenerative
diseases. The diagnosis is complex and depends not only of the
clinical history, but also of accurate image exams. When an
ultrasound scan is searching during the neonatal period the
complexity of the diagnosis becomes greater. Case report: We
report the case of a patient with an uneventful prenatal, that
submitted, from 32 weeks of gestation. The ultrasound scan
showed expansive lesions compatible with choroid plexus,
specifically the left ventricle. From that amendment, she was
followed up with frequent ultrasound exams and more accurate
methods of images for better lesion diagnosis.
Key words: Tumor. Choroid Plexus. Pregnancy.
Descritores: Tumor. Plexo Coroide. Gestação.
Introdução
Os plexos coroides dos ventrículos laterais (do latim plexu,
enlaçamento, e do grego choroeidés, membrana delicada) são
estruturas geralmente simétricas em forma e tamanho, não são
revestidos pela barreira hematoencefálica e assim se tornam alvos
fáceis de doenças sistêmicas. Dentre elas, encontram-se os
tumores, que apesar de terem uma baixa incidência em todas as
faixas etárias (0,4-0,6%), quando comparadas ao grupo de
crianças abaixo de um ano de idade apresentam uma alta
incidência (12,5-20%). Uma explicação para essa alta incidência
de lesões expansivas de plexo coroide em crianças deve-se ao fato
da capacidade de expansão da calvária e de adaptação funcional.
Essas grandes dimensões, especialmente em pacientes no
período neonatal, sugerem que muitas dessas lesões sejam
congênitas1.
Relato de caso
Paciente de 34 anos, feminina, gestante de 32 semanas, procurou
o pronto-socorro do Hospital Ana Costa após realização de
ultrassonografia obstétrica eletiva apresentando leve alteração
ecotextural inespecífica com pequena dilatação ventricular
assimétrica sendo mais acentuada à esquerda. Encontrava-se
assintomática. Tinha três partos normais anteriores prematuros (36
e 37 semanas), nenhum aborto, todos os filhos provenientes do
mesmo marido. Apresentou, à ultrassonografia morfológica fetal do
1° trimestre, transluscência nucal = 2,5 mm (normal < 2,5 mm), sem
outras alterações do SNC. Ao exame físico, estava com sinais vitais
dentro da normalidade. Foi orientada a acompanhar o final da
gestação no Pré-Natal de gestação de Alto Risco e a fazer
corticoterapia com 33 semanas para aceleração da maturação
pulmonar fetal. A ressonância magnética fetal notou dilatação do
sistema supra-tentorial, sendo mais acentuado nos ventrículos
laterais, notando-se formação sólida lobulada do plexo coroide no
interior do ventrículo lateral esquerdo, além de alteração de sinal
inespecífico do parênquima encefálico sendo mais acentuada à
esquerda – Figura 1. Também realizou ultrassonografias seriadas.
A primeira observou dilatação ventricular cerebral bilateral
assimétrica mais acentuada à esquerda (Figura 2), enquanto a
segunda demonstrou alteração do sistema ventricular com
formação ecogênica expansiva no seu interior, com aumento das
dimensões dos átrios ventriculares à direita 3,3 cm e à esquerda 2,0
cm. O último exame antes do parto detalhou dilatação ventricular
cerebral bilateral assimétrica, mais acentuada à esquerda, com
leve progressão em relação ao exame anterior – Figura 3. A
paciente encontrava-se assintomática durante todo o
acompanhamento. Realizou parto cesárea com 36 semanas e 3
dias, devido à prematuridade dos partos anteriores. O parto ocorreu
sem intercorrências com feto vivo, sexo feminino, Apgar 9/10. Foi
1. Residente do Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospiatl Ana Costa, Santos/SP
2. Médico Ginecologista e Obstetra do Hospital Ana Costa, Santos/SP
Instituição: Serviço de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 11075-905 – Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 15/05/2014; publicado online em: 10/12/2014.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 99 - 100, out. / nov. / dez. 2014
99
encaminhada à UTI para observação, onde realizou tomografia
computadorizada de crânio, que mostrou plexo coroide esquerdo
espessado associado a focos de hemorragia subaguda com
extensão para o parênquima cortical adjacente, ventriculomegalia
assimétrica moderada do ventrículo lateral esquerdo, linha média
centrada, focos de gliose e cavitação cortical e subcortical frontoparieto-occipital esquerdo, parênquima cerebelar e do tronco
cerebral sem alterações. Também realizou ressonância magnética,
apresentando dilatação do sistema ventricular supra tentorial
maior à esquerda com imagens de espessamento do plexo coroide
com sangramento subagudo mimetizando processo pseudoexpansivo, com obstrução do forame de Monro, presença de
imagens de cistos porencefálico e áreas de gliose no parênquima
cerebral adjacente ao ventrículo lateral esquerdo. Encontra-se em
acompanhamento com o neuro-cirurgião e com a pediatra, que até
o presente no momento, não detectaram alteração no seu
desenvolvimento neuropsicomotor.
Figura 1 – Ressonância magnética fetal com dilatação do sistema supratentorial, formação sólida lobulada do plexo coroide no interior do ventrículo
lateral esquerdo e alteração de sinal inespecífico do parênquima encefálico
sendo mais acentuada à esquerda.
Discussão
Os tumores de plexo coroide ocorrem mais comumente em
crianças abaixo dos dois anos de idade. Esse fato deve-se a grande
capacidade de expansão da caixa craniana a acomodar o aumento
de volume, bem como a capacidade de adaptação funcional do
sistema nervoso imaturo, permitindo que o tumor atinja grandes
dimensões antes de ser feito o diagnóstico2.
As características radiológicas dos tumores são inespecíficas, mas
alguns achados sugerem malignidade: tumor volumoso, irregular,
hipervascularizado, com edema e desvio da linha média. O
diagnóstico diferencial de carcinoma do plexo coroide deve ser
realizado com os papilomas do plexo coróide, ependimomaspapilares, meningiomas, meduloblastomas, astrocitomas e
adenoma pituitário3. O tratamento preconizado é a ressecção
cirúrgica em bloco do tumor. A mortalidade e morbidade préoperatória variam de 0-19%, estando relacionadas principalmente
a sangramentos4. A técnica cirúrgica constitui em tentar interromper
o suprimento sanguíneo do tumor através do plexo coroide, assim
ele reduz de volume e pode ser removido intacto, é importante
abordar primeiramente o pedículo da neoplasia, para que não haja
uma hemorragia de difícil controle. Em grandes tumores, a técnica
utilizando aspiração é menos traumática5.
Esse relato de caso tem o objetivo de elucidar médicos obstetras
quanto à melhor maneira de lidar com casos como desta paciente.
Não foi encontrado na literatura pesquisada nenhum caso relatado
de tumores de plexo coroide diagnosticado durante a vida intrauterina. Com isso, torna-se difícil estabelecer um diagnóstico ou,
até mesmo, uma conduta frente ao relato. Entretanto, acreditamos
que, antes do nascimento, não exista nenhuma abordagem que
deva ser tomada em relação ao tumor. Concordamos que deve ser
feito um acompanhamento mais rigoroso da mãe, com exames de
imagem específicos para um diagnóstico precoce e mais
detalhado, lembrando que o diagnóstico final só será observado
através do desenvolvimento neuropsicomotor da criança. Também
se devem tomar as medidas necessárias para tentar evitar
infecções maternas ou outras intercorrências durante a gestação,
além de acelerar a maturidade pulmonar fetal para caso ocorra um
parto prematuro.
Referências
Figura 2 – Ultra-sonografia mostrando dilatação ventricular cerebral
bilateral assimétrica mais acentuada à esquerda.
1.Melo ELA, Garcia MRT, Fernandes RY, Barros NG, Cerri GG, Leite CC.
Lesões expansivas do plexo coróide. Radiol Bras. 2003;36(6):379-84.
2. Torres LFB, Noronha L, Scheffel DLH, Pinheiro DL, Gugelmin ES.
Tumores de plexo coróide: Estudo epidemiológico comparativo de 24
casos. Arq Neuropsiquiatr. 2004;62(1):127-30.
3. Torres LFB, Urban LABD, Antoniuk A, Carboni P, Ramina R, Gugelmin
ES. Carcinoma de plexo coróide: Relato de 15 casos. Arq Neuropsiquiatr.
2000;58(2-B):505-11.
4. Ellenbogen RG, Winston KR, Kupsky WJ. Tumors of the choroid plexus in
children. Neurosurgery. 1989;25:327-35.
5. Almeida GM, Tilbery CP, Gagliardi-Ferreira LG. Carcinoma bilateral do
plexo coróide operado com sucesso. Arq. Neuropsiquiatr. 1970;28(2):164-8.
Figura 3 – Ultrassonografia mostrando dilatação ventricular cerebral
bilateral assimétrica, mais acentuada à esquerda, com leve progressão em
relação à figura anterior.
100
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 99 - 100, out. / nov. / dez. 2014
Relato de Caso
Síndrome de insensibilidade completa
aos andrógenos em parentes de primeiro grau
Complete androgen insensitivity syndrome in the first-degree relatives
Mohamad Dib Salah Ali1
Fernando Mangolin1
André Luiz Farinhas Tomé2
Walter Fernandes Correa2
Woite Antonio Bertoni Meloni3
Maurício Costa Bestane4
RESUMO
Introdução: A síndrome de Morris é uma afecção rara
afetando um para cada 20.400 homens, no entanto, é
considerada a terceira causa de amenorréia primária. Morris,
em 1958, publicou 98 casos de uma síndrome que se
caracterizava por indivíduos com fenótipo e perfil psicológico
feminino, genitália feminina hipoplásica, algumas vezes com
desenvolvimento do clitóris e grandes lábios e ausência de
pelos sexuais. A vagina terminava em fundo cego e ausência
de útero, trompas e ovários. Relato de caso: Relata-se o caso
de duas irmãs de 26 e 28 anos que procuram o ambulatório
com queixa de amenorreia primária.
ABSTRACT
Introduction: Morris syndrome is a rare condition affecting one
in every 20,400 men, however, it is considered the third most
common cause of primary amenorrhea. Morris in 1958
published 98 cases of a syndrome characterized by individuals
with phenotype and psychological profile female, female
genitalia hypoplastic, sometimes with development of the
clitoris and labia, and the absence of sex. The vagina ended in a
blind and absence of uterus, tubes and ovaries. Case report:
We report the case of two sisters 26 and 28 years seeking the
clinic complaining of primary amenorrhea.
Key words: Morris. Orchiectomy. Chemotherapy.
Descritores: Morris. Orquiectomia. Quimioterapia.
Introdução
Relato de caso
A síndrome de Morris é uma afecção rara afetando um para cada
20.400 homens. No entanto é considerada a terceira causa de
amenorréia primária1. Apresenta-se como indivíduos com
características fenotípicas e psicológicas femininas, porém,
geneticamente considerados homens.
Os pacientes com SIA têm genitália externa feminina com clitóris e
introito vaginal. O fenótipo de indivíduos com SIA pode variar de
uma genitália feminina leve (clitorimegalia sem outras
anormalidades) a genitália externa masculina não virilizada
(hipospádias e/ou diminuição do tamanho do pênis).
Apesar da produção normal de testosterona, há uma resistência
dos tecidos à ação dos andrógenos, recebendo a denominação de
Síndrome da Insensibilidade aos Andrógenos (SIA)2.
A etiologia básica da SIA é uma perda de mutação do gene de
receptor de andrógeno (RA) que resulta na perda de função desse
receptor. Esse gene localiza-se no braço longo do cromossomo X,
sendo que as mutações variam da perda completa dos receptores
na superfície das células devido síntese incompleta de proteínas
até alterações na afinidade de ligação dos substratos3. A perda de
função significa que, apesar de dos níveis de síntese de
andrógenos, os eventos pós-receptores que mediam os efeitos dos
hormônios nos tecido não ocorrem.
Pacientes de 26 e 28 anos, irmãs, procuraram o ambulatório de
Ginecologia com queixa de amenorréia primária. Apresentavam
estatura de 1,63 e 1,66m e peso de 55 e 60Kg, respectivamente. O
desenvolvimento mamário e a genitália externa apresentavam
características femininas – Figura 1. Na avaliação hormonal,
apresentavam LH de 19,4 e 20,3 mUI/ml, FSH de 7,6 e 8,4 mUI/ml,
testosterona de 456 e 532 ng/ml e estradiol de 35,2 e 46,3 pg/ml. À
ultrassonografia, não era possível visualizar-se útero e ovários,
além de apresentarem massas inguinais, com fluxo sanguíneo ao
Doppler, com características de gônadas. Com base nestes
exames foi solicitado o cariótipo para as pacientes, que confirmou
46 XY (20 metáfases), sem anormalidades. Foram, então,
encaminhadas ao ambulatório de Urologia. Após serem informadas
do risco de transformação neoplásica das gônadas ectópicas, foi
indicada gonadectomia bilateral em ambas as irmãs (Figura 2), que
confirmou, por meio dos exames anatomopatológicos, serem
testículos, bem como a ausência de sinais de malignidade. Seguem
em terapia de reposição hormonal (TRH) com a equipe da
Endocrinologia.
1) Residente de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP
2) Assistente do Serviço de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP
3) Preceptor de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP
4) Chefe do Serviço de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP
Instituição: Serviço de Urologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Mohamad Dib Salah Ali, Av. Conselheiro Nébias, 757 ap. 22 – Santos, SP. E-mail: [email protected]
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 01/06/2014; publicado online em: 10/12/2014.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 101 - 102, out / nov / dez 2014
101
Figura 1-Abaulamento inguinal bilateral.
Durante o seguimento clínico, as irmãs não apresentaram
intercorrências e mantiveram vida social e sexual com padrão
feminino. A TRH, nesses casos, visa a manutenção dos caracteres
sexuais femininos, uma vez que os níveis de estradiol estavam
abaixo dos valores considerados normais.
A síndrome de Morris é uma doença rara, com grande impacto na
morbidade dos pacientes, além de trazer prejuízo significativo na
funcionalidade e interação social desses indivíduos. Reconhecê-la
e abordá-la precocemente pode garantir o melhor reconhecimento
social dos pacientes e proporcionar uma melhor qualidade de vida.
A melhor maneira de trabalhar os possíveis efeitos sociais e
psicológicos da SIA está frequentemente sendo desenvolvida e
muitas dificuldades têm aparecido. Entretanto, os pais ficam
ansiosos por manter a confidencialidade, e as mulheres afetadas
podem sentir insegurança sobre como os outros a verão. O público
em geral é desinformado sobre a SIA porque há uma pequena
cobertura da mídia sobre isso. Qualquer falha de compreensão da
comunidade está mais próxima da ignorância do que do
preconceito.
Referências
Figura 2 – Genitália tipicamente feminina com testículos expostos em
região inguinal bilateral.
Discussão
A SIA é a causa mais comum de pseudo-hermafroditismo
masculino e a terceira causa de amenorréia primária. Para a
diferenciação sexual masculina são necessários altos níveis de
andrógenos, isto promoverá a diferenciação dos ductos de Wolff
em epidídimo, vasos deferentes e vesículas seminais.
Uma preocupação constante é quanto à possível transformação
neoplásica, que ocorre em aproximadamente 25% dos casos,
originando principalmente os gonadoblastomas benignos e
digerminomas malignos. Esse fato justifica a realização de
gonadectomia profilática3.
Frente a isso, a equipe optou por realizar a remoção das massas
inguinais de ambas as pacientes, confirmadas nos exames
anatomopatológicos como testículos.
A avaliação laboratorial após a puberdade revela, em pacientes
com testículos in situ, altos níveis de hormônio luteinizante (LH),
concentrações normais ou elevadas de hormônio folículoestimulante (FSH) e testosterona comparável aos homens
normais. Tais níveis caem após o início da TRH3,4.
102
1. Quigley CA, Bellis A, Marschke KB, El-Awady MK, Wilson EM, French FS.
Androgen receptor defects: historical, clinical and molecular perspectives.
Endocr Rev. 1995;16:271-320.
2. Stephens JD. Prenatal diagnosis of testicular feminisation. Lancet. 1984;
2:1038-41.
3. Hiipakka RA, Liao S. Molecular mechanism of androgen action. TEM.
1998; 9:317-24.
4. Ahmed SF, Cheng A, Dovey L, Hawkins JR, Martin H, Rowland J.
Phenotypic features, androgen receptor binding and mutational analysis in
278 clinical cases reported as androgen insensitivity syndrome. J Clin
Endocrinol Metab. 2000;85:658-65.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 101 - 102, out / nov / dez 2014
Relato de Caso
Fístula broncoesofágica maligna
Malignant bronchoesophageal fistula
Fernanda Campos Lopes Louzada¹,
Egydio Pacheco²
RESUMO
Introdução: Fístula bronchoesofagica é reportada em 5-10%
dos pacientes com câncer esofágico. Na maioria dos casos, o
diagnóstico do câncer é tardio e o tratamento com único stent é
dificultado pelo grau de invasão da neoplasia. Em algumas
situações, faz-se necessária a colocação de stent tanto
esofágico quanto em via aérea para ocluir o trajeto fistuloso e
obter melhora da dispnéia e disfagia. Relato de caso:
Reportamos um paciente de 54 anos, consumido, com história
de emagrecimento, disfagia e pneumonia com oito semanas
de evolução. Foram realizados exames radiográficos e, devido
à alta suspeição, foi possível o diagnóstico e tratamento
definitivo em fase inicial da doença. Foi inserido stent
esofágico único e, em 15 dias, o paciente obteve alta hospitalar
com alimentação via oral.
Descritores: Fistula Bronco-Esofágica. Câncer Esofágico.
Stent.
Introdução
Fístula broncoesofágica é uma comunicação entre o brônquio
fonte e o esôfago. Ela pode ser de origem congênita ou adquirida. A
maioria das fístulas em adultos são de origem adquirida pois não é
comum que uma fistula de origem congênita permaneça assintomática até a idade adulta. Causas adquiridas de fístula broncoesofágica incluem malignidade, infecções e fatores traumáticos
como intubação orotraqueal prolongada e trauma torácico
fechado¹.
Devido à baixa especificidade dos sintomas, fistulas broncoesofágicas de origem benigna podem apresentar-se por um longo
período sem ser devidamente diagnosticadas e tratadas, resultando em aumento significativo de morbimortalidade².
Reportamos um caso de um paciente com fistula bronco-esofágica
de origem maligna que se apresentou com um quadro respiratório
prolongado e refratário ao tratamento antimicrobiano e que
rapidamente cedeu após o implante de prótese metálica autoexpansível esofágica.
Relato de caso
Homem 52 anos de idade, com histórico de tabagismo, carga
tabágica de 55 maços-ano, há 8 semanas apresentava tosse seca,
ABSTRACT
Introduction: Bronchoesophageal fistula is reported in 5-10%
of patients with esophageal cancer. In most of these cases the
diagnosis of cancer is late and the single stent treatment is
difficult due to the severely invaded malignancy. In some
situations, either a tracheobronquial and a esophageal stent are
needed to seal off the fistula and get better improvement of
dyspnea and dysphagia. Case report: We repport a 54 year-old
patient, under poor nutrition, with weight loss, dysphagia and
pneumonia since 8 weeks before. After the radiographic exams
and, because of the high index of suspicion, it was possible to
diagnose e apply the definitive treatment in early stage of the
disease. A single esophageal stent was inserted and 15 days
later the patient was discharged with mouth feeding.
Key words: Bronchoesophageal Fistula. Esophageal Cancer.
Stent.
dispnéia, disfagia e astenia progressivas, associada a perda
ponderal. Apresentava-se emagrecido, com dentes em péssimo
estado de conservação, presença de estertores subcrepitantes e
roncos à ausculta de base pulmonar esquerda. Esteve internado
em clínica de reabilitação para dependentes de álcool no ano
anterior, porém, negava contato com pessoas com tuberculose. À
internação, foi submetido à tomografia computadorizada de tórax
sem contraste, que evidenciou extensa área de consolidação em
lobo pulmonar esquerdo associado a derrame pleural. Possuía
exames laboratoriais de entrada com leucocitose, neutrofilia e
granulações tóxicas, além de PCR de 255,3. Foi iniciada antibioticoterapia com moxifloxacino e realizado ecocardiograma, evidenciando compressão extrínseca em átrio direito e ventrículo direito. Já
com 48 horas de internação e início da antibioticoterapia, não
apresentava melhora clínica significativa, mantinha queixa de
disfagia e anorexia e ainda apresentava alterações laboratoriais
(PCR elevado, leucograma infeccioso), associando-se clindamicina no tratamento antimicrobiano. Optou-se também pela realização
de endoscopia digestiva alta, quando foi visualizada lesão vegetante e infiltrativa do esôfago e fístula esôfago-brônquica, sendo
passada sonda naso-gástrica para alimentação e efetuadas
biópsias da lesão esofágica para anatomopatológico. O exame
anatomopatológico evidenciou neoplasia de pequenas células
infiltrando mucosa esofágica, sendo programada a passagem de
1) Médica Residente de Clinica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2) Médico Chefe do Serviço de Pneumologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Instituição: Serviço de Pneumologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Correspondência: Fernanda Campos Lopes Louzada, Av. Doutor Bernardino de Campos, 580 ap.32 -11065-002, Santos/SP, Brasil. E-mail:
Recebido em: 30/11/2013; aceito para publicação em: 15/05/2014; publicado online em: 10/12/2014.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 103 - 104, out / nov / dez 2014
103
prótese metálica auto-expansível esofágica para oclusão de trajeto
fistuloso. Durante todo esse período, o paciente manteve quadro
pulmonar sem melhora clinica importante. Observamos que,
imediatamente após a passagem da prótese metálica autoexpansível esofágica, houve melhora tanto clínica quanto laboratorial, com queda do PCR e do leucograma.
Discussão
Fístula bronco-esofágica é uma complicação devastadora,
reportada em 5-10% de pacientes com câncer esofágico³.
Entretanto, uma revisão dos casos dessas fístulas no
Massachusetts General Hospital concluiu que, em mais de 40
anos, somente 228 casos foram vistos, sendo que somente 6%
eram devido a causas benignas4.
Os dois tumores primários mais comumente associados são
esofágico (77%) e câncer de pulmão (16%) e são os dois com
maior possibilidade de atingirem o estádio localmente avançado5.
O diagnóstico definitivo é dificultado na ausência dos sinais e
sintomas típicos. Tosse recorrente é o sintoma mais comum (5665%), principalmente para aqueles recebendo dieta líquida.
Aspiração (37%) e febre (25%) são os seguintes, geralmente
decorrentes de pneumonia6.
Esofagografia baritada é o exame de escolha, embora a tomografia
computadorizada seja frequentemente usada para investigar
complicações como bronquiectasias ou patologias associadas.
Broncoscopia e endoscopia digestiva alta (EDA) podem visualizar
o orifício fistuloso, que geralmente é pequeno e somente evidenciado quando o sitio exato é conhecido7.
Os pacientes, geralmente, apresentam-se em condições debilitadas. Eles sofrem de depleção nutricional como resultado da baixa
ingesta alimentar, bem como dos efeitos sistêmicos do câncer.
Adicionalmente, muitos terão secreção no trato respiratório,
traqueobronquite purulenta e pneumonia aguda e não é possível
melhora clínica enquanto não for interrompida a contaminação
reconte da via aérea8.
O tratamento dessas fístulas é difícil, considerando que a maioria
dos pacientes possui um tumor inoperável quando é feito o
diagnóstico. Entretanto, tratamento paliativo e de suporte formam a
base para um aumento na qualidade de vida desses pacientes.
Fechamento direto da fistula, bypass ou fistulectomia não geraram
bons resultados e stents endoscópicos ou endopróteses são as
opções paliativas nessas situações. Stents podem ser locados
broncoscopicamente na via aérea, via EDA para o esôfago ou em
ambos para ocluir a fístula e reestabelecer a patência do esôfago e
permitir a alimentação oral e reduzir a contaminação bronquica9.
Complicações potenciais da passagem do stent incluem perfuração quando locado em esôfago cervical, compromentimento
respiratório devido à compressão de via aérea e migração do
stent9.
Na maioria dos casos, a inserção de um único stent, tanto brônquico quanto esofágico, é suficiente para ocluir a fístula. Um segundo
stent é indicado se não houver melhora da dispnéia ou da disfagia.
Stent em ambos, via aérea e esôfago, deve ser considerado
quando ambos são severamente invadidos por malignidade,
quando há compressão da via aérea ou quando a fistula é insuficientemente ocluída pelo stent esofágico10.
Após a inserção de stent esofágico único, nosso paciente rapidamente apresentou recuperação da pneumonia e da disfagia e pode
ser retirada sonda naso-enteral. Apresentamos um paciente com
quadro de broncopneumonia arrastada, sem melhora com
antibioticoterapia isolada, perda de peso e disfagia principalmente
após ingestão líquida – quadro clássico de fistula, porém, com
diagnóstico dificultado sem a alta suspeição de malignidade. A
fistula foi suspeitada à tomografia computadorizada, confirmada
após EDA e prontamente tratada com a colocação de stent
esofágico. Após 15 dias o paciente obteve alta hospitalar e segue
em acompanhamento oncológico.
104
Referências
1. Aggarwal D, Mohapatra RP, Malhotra B. Acquired bronchoesophageal
fistula. Lung India. 2009;26:24-5.
2. Ahn JY, Jung HY, Choi JY, Kim MY, Lee JH, Choi KS, Kim do H, Choi KD,
Song HJ, Lee GH, Kim JH. Benign bronchoesophageal fistula in adults:
endoscopic closure as primary treatment. Gut Liver. 2010;4:508-13.
3. Abadal JM, Echenagusia A, Simo G, Camunez F. Treatment of malignant
esophagorespiratory fistulas with covered stents. Abdom Imag.
2001;26:565-9.
4. Mangi AA, Gaissert HA, Wright CD, Allan JS, Wain JC, Grillo HC, Mathisen
DJ. Benign broncho-esofageal fistula in the adult. Ann Thorac Surg.
2002;73:911-5.
5. Burt M. Management of malignant esophago-respiratory fistula. Chest
Surg Clin N Am. 1996;6:765-76.
6. Spalding AR, Burnery DP, Richie RE. Acquired benign bronchoesophageal fistulas in the adult. Ann Thorac Surg. 1979;28:378-83.
7. Braimbridge MV, Keith HI. Oesophago-bronchial fistula in the adult.
Thorax. 1965;20:226-33.
8. Little AG, Ferguson MK, Demeester TR, Hoffman PC, Skinner DB.
Esophageal carcinoma with respiratory tract fistula. Cancer. 1984;53:13228.
9. Herth FJF, Peter S, Baty F, Eberhardt R, Leuppi JD, Chhajed PN.
Combined airway and oesophageal stenting in malignant airwayoesophageal fistulas a prospective study. Eur Respir J. 2010;36:1370-4.
10. Nam DH, Shin JH, Song HY, Jung GS, Han YM. Malignant esophagealtracheobronchial strictures: parallel placement of covered retrievable
expandable nitinol stents. Acta Radiol. 2006;47:3-9.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 103 - 104, out / nov / dez 2014
Relato de Caso
O diagnóstico de mieloma múltiplo
The diagnosis of multiple myeloma
Gabriela De Luca Oliveira1
Letícia Medeiros2
José Carlos Medina Carvalho3
RESUMO
Introdução: o mieloma múltiplo é uma neoplasia que cursa
com proliferação clonal anormal de células plasmocitárias,
sendo responsável por 10% dos cânceres hematológicos.
Geralmente acomete a população na 7º década de vida. Sua
incidência vem aumentando devido ao envelhecimento
populacional e à melhora das técnicas diagnósticas.
Frequentemente se apresenta como síndrome anêmica, dores
ósseas e fraturas patológicas. Dessa forma, é importante que
os profissionais de saúde saibam reconhecer a sua
apresentação clínica e o fluxograma de exames laboratoriais
para que o diagnóstico seja precoce. Relato de caso:
Descreve-se o caso de uma paciente que apresentou fraturas
patológicas vertebrais e anemia, quadro sugestivo de mieloma
múltiplo e foi internada para analgesia, porém, para a
investigação diagnóstica foi solicitado uma mamografia, uma
tomografia de abdome e tórax e um ultra-som pélvico, os quais
estavam dentro dos parâmetros da normalidade. Assim, foi
realizada biópsia da lesão óssea de coluna lombar que
constatou lesão sugestiva de plasmocitoma. A eletroforese de
proteínas, que deveria ser solicitada como exame inicial na
investigação do quadro, foi realizada posteriormente no
seguimento ambulatorial e demonstrou um pico monocolonal
em fração 1.
ABSTRACT
Introduction: Multiple myeloma is a neoplastic disorder
characterized by proliferation of a single clone of plasma cells
that accounts for 10% of all hematologic cancers. The average
age at diagnosis is 60 years. The increased incidence of this
cancer is predominantly due to an aging population and to
improved diagnostic techniques. The most common symptoms
of multiple myeloma include anemia, bone pain and pathologic
fractures. Therefore it is very important to be able to recognize
clinical and laboratorial characteristics of multiple myeloma.
Case report: We report the case of a woman who presented
with pathologic fractures in the vertebral column and anemia.
She had to be hospitalized for pain relief. However, for the
diagnostic investigation was requested a mammogram, a
computed tomography of the abdomen, thorax and pelvic
ultrasonography, were all within normal limits. So the bone
marrow biopsy was performed and showed a plasmacytoma.
The first test for recognition of monoclonal gammopathies is
usually serum protein electrophoresis, but in this case it was
requested after the other exams and showed, as expected a
monoclonal protein in the blood.
Key words: Multiple Myeloma. Plasmacytoma. Protein
Electrophoresis. Monoclonal Peak.
Descritores: Mieloma Múltiplo. Plasmocitoma. Eletroforese
de Proteína. Pico Monoclonal.
Introdução
O mieloma múltiplo é uma neoplasia que cursa com proliferação
clonal anormal de células plasmocitárias na medula óssea, com
produção de imunoglobulinas monoclonais, associadas a
disfunções orgânicas1. Corresponde a 10% dos cânceres
hematológicos2. A média de idade ao diagnóstico, em estudos
nacionais, é de 60,5 anos, sendo a maioria diagnosticados com
doença avançada3. A maior parte dos pacientes apresenta-se com
dores ósseas e fadiga principalmente relacionada à anemia2.
Muitos casos evoluem com insuficiência renal e fraturas
patológicas. O diagnóstico precoce pode resultar em melhor
qualidade de vida para o paciente4. Assim, após a suspeita clínica,
a investigação deve ser iniciada com a pesquisa de proteína M
sérica5. Para concluir o diagnóstico é necessário que seja
preenchido alguns critérios: a presença de proteína M sérica ou
urinária, mais de 10% de plasmócitos monoclonais na medula
óssea ou plasmocitoma e a evidência de lesão nos tecidos alvo, que
se caracteriza por hipercalcemia e/ou insuficiência renal e/ou
anemia e/ou lesão óssea lítica6.
Relato de caso
Paciente do sexo feminino, 57 anos, com queixa de dor lombar há
aproximadamente 3 meses, com piora há 2 dias, sem história de
queda ou esforço físico abusivo procurou o pronto socorro do
Hospital Ana Costa de Santos que a encaminhou para a internação
com hipótese diagnóstica de fratura de vértebra de coluna lombar.
Já internada, com melhora dos sintomas álgicos devido ao
tratamento com derivados opióides. Foi realizada ressonância
magnética de coluna lombar, que demonstrou fraturas de caráter
patológico em vértebras T12, L1 e L5. Recebeu alta hospitalar com
orientações analgésicas e de repouso relativo, com seguimento
ambulatorial. Porém, devido à persistência do quadro de lombalgia
1. Médica residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos /SP.
2. Médica assistente do Serviço de Hematologia do Hospital Ana Costa, Santos /SP.
3. Médico chefe do Serviço de hematologia do Hospital Ana Costa, Santos /SP.
Instituição: Serviço de Hematologia do Hospital Ana Costa, Santos /SP.
Correspondência: Gabriela De Luca Oliveira, Av. Dr. Epitácio Pessoa, 131 - 11045-301 Santos/SP. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 15/05/2014; publicado online em: 10/12/2014.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 105 - 106, out / nov / dez 2014
105
intensa e limitante, retornou após 10 dias para o pronto
atendimento que novamente indicou internação. Em investigação
diagnóstica, realizou-se mamografia, tomografia de abdome e
tórax, ultrassonografia pélvica e exames laboratoriais. Os exames
de imagem apresentaram-se dentro dos parâmetros de
normalidade e, nos exames laboratoriais, foi constatada anemia
normocítica normocrômica com necessidade transfusional de duas
unidades de concentrado de hemácias. Nesse momento, realizouse procedimento cirúrgico, com biópsia da lesão óssea de coluna
lombar para esclarecimento diagnóstico. O resultado do
anatomopatológico foi lesão sugestiva de plasmocitoma. A
paciente recebeu alta com encaminhamento ao ambulatório de
hematologia. Exames para estadiamento de mieloma múltiplo
foram solicitados em ambulatório, dentre eles a realização da
eletroforese de proteínas, a qual demonstrou pico monocolonal em
fração 1. O tratamento do mieloma múltiplo foi instituído com
melhora parcial dos sintomas álgicos iniciais.
Discussão
Nos últimos anos, com o aumento da expectativa de vida, houve
um acréscimo na incidência dos casos de mieloma múltiplo. Esse
fato deve-se principalmente ao melhor conhecimento da história
natural dessa doença e à acessibilidade a recursos diagnósticos7.
Assim, é importante que os profissionais da saúde recebam
educação continuada, principalmente relacionada às
manifestações clínicas de dores ósseas e alterações laboratoriais
como anemia, hipercalcemia ou hiperuricemia7, para que, na
presença do quadro clínico suspeito, a investigação seja iniciada
com exames simples e de baixo custo, como a eletroforese de
proteínas sérica e urinária e radiografia das áreas sintomáticas, o
que pode proporcionar diagnóstico precoce da doença, evitandose lesões permanentes de órgãos-alvo8. Na eletroforese de
proteínas, espera-se encontrar um pico de proteína monoclonal,
assim como na radiografia dos locais comumente acometidos
como corpos vertebrais, calota craniana, caixa torácica, pelve,
úmero e fêmur é esperado encontrar osteoporose difusa, lesões
líticas e fraturas patológicas9. Para uma abordagem mais efetiva do
mieloma múltiplo, sugere-se seguir o fluxograma abaixo10.
Referências
1. Palumbo A, Anderson K. Multiple myeloma. N Engl J Med. [periódico on
line] 2007 mar. [Acesso em 15 set. 2013] ; (364):1046-60. Disponível em:
http://www.nejm.org/doi/pdf/10.1056/NEJMra1011442
2. Kyle RA, Rajkumar SV. Multiple myeloma. Blood. [periódico online].
2008 mar. [Acesso 12 ago. 2013]; (6). Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2265446/
3. Hungria VT, Maiolino A, Martinez G, Colleoni GW, Coelho EO, Rocha L,
Nunes R, bittencourt R, Oliveira LC, Faria RM, Pasquini R, Magalhães
SM, SouzaCA, Pinto Neto JV, Barreto L, Andrade E, Portella Mdo S,
Bolejack V Durie BG. Confirmation of the utility of the International
Staging System and identification of a unique pattern of disease in
Brazilian patients with multiple myeloma. Haematologica. [periódico
online]. 2008 mai. [Acesso 20 set. 2013]; (5):791-2. Disponível em:
http://www.unboundmedicine.com/evidence/ub/citation/18450738/Confirm
ation_of_the_utility_of_the_International_Staging_System_and_identification_of_a_unique_pattern_of_disease_in_Brazilian_patients_with_multiple_myeloma_
4. Christopher R. Friese, Gregory A. Abel, Lysa S. Magazu, Bridget A.
Neville, Lisa C. Richardson, Craig C. Earle. Diagnostic delay and
complications for older adults with multiple myeloma. Leuk Lymphoma
[periódico on line]. 2009 mar. [Acesso em 20 ago. 2013]; (3). Disponível
em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2831081/
5. S. Vincent Rajkumar. Multiple myeloma: 2011 update on diagnosis,
risk-stratification, and management. Am. J. Hematol [periódico online] out.
2010 [Acesso em 21 ago. 2013]; (65). Disponível em:
http://onlinelibrary.wiley.com/doi/10.1002/ajh.21913/pdf
6. S. Vincent Rajkumar. Multiple myeloma overview. Updated [periódico
online] abr 2013 [Acesso em 28 ago. 2013]; Disponível em:
http://www.uptodate.com/contents/multiple-myeloma-symptomsdiagnosis-and-staging-beyond-the-basics#H16
7. Roberta O. Paula e Silva, Kamilla M. A. Brandão, Paula V. M. Pinto,
Rosa M. D. Faria, Nelma C. D. Clementino, Cristiane M. F. Silva, Aline F.
Lopes. Mieloma múltiplo: características clínicas e laboratoriais ao
diagnóstico e estudo prognóstico. Rev. Bras. Hematol. Hemoter.
[periódico online] dez 2008 [Acesso em 13 set. 2013]; (2). Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/rbhh/v31n2/aop1309.pdf
8. Robert A. Kyle. Sequence of Testing for Monoclonal Gammopathies.
Arch Pathol Lab Med. [periódico online] Fev 1999 [Acesso em 17 set.
2013]; (123). Disponível em:
http://www.archivesofpathology.org/doi/full/10.1043/00039985(1999)123%
3C0114:SOTFMG%3E2.0.CO;2
9. Hungria VTM. Doença óssea em Mieloma Múltiplo. Rev Bras Hematol
Hemoter. [periódico online] Nov. 2007 [Acesso em 28 set. 2013]; (29).
Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbhh/v29n1/v29n1a13.pdf
10. Silva ROP, Faria RMD, Côrtes MCJW, Clementino NCD, Faria JR,
Moraes TEC, Borges JL. Mieloma múltiplo: verificação do conhecimento
da doença em médicos que atuam na atenção primária à saúde. Rev
Bras Hematol Hemoter. [periódico online] Nov./Dec. 2008 [Acesso em 20
set. 2013]; (30). Disponível
em:http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S151684842008000600004
106
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 105 - 106, out / nov / dez 2014
Artigo de Revisão
Uso de hidroxiuréia em pacientes
pediátricos com anemia falciforme
Use of hydroxyurea in pediatric patients with sickle cell disease
Ana Nadyr de Almeida David Gibelli1
Paulo Sergio Ciola2
Ana Cristina Martinez Carvalho3
RESUMO
A anemia falciforme, em sua forma homozigota, é uma doença
grave e prevalente no Brasil. Sua identificação precoce por
meio do teste do pezinho trouxe benefícios aos pacientes
portadores, sendo possível seu acompanhamento e controle
precoces.
Alguns tratamentos existentes para o controle dessa patologia,
além de invasivos, trazem riscos a estes pacientes. O presente
estudo revisa publicações sobre o uso da hidroxiuréia em
pacientes pediátricos, que atualmente tem se mostrado a
melhor opção para a qualidade de vida dos mesmos, devido
sua ação no aumento de hemoglobina fetal circulante, que
possui maior afinidade pelas moléculas de oxigênio e
consequentemente, evitando crises de falcisação.
ABSTRACT
Homozygous sickle cell anemia is a severe and prevalent
disease in Brazil. Diagnosis through newborn screening tests
has brought several benefits to the patients, enabling earlier
control and monitoring. Existing treatments, besides invasive,
can bring risks to these patients. This study revises articles
about the use of hydroxyurea in pediatric patients. It had shown
its superiority in their quality life, due to fetal hemoglobin's
increment in these patients circulation, avoiding sickling crises
thanks to its higher affinity to oxygen molecules.
Key words: Sickle Cell Anemia. Hydroxyurea. Pediatric
Patients.
Descritores: Anemia Falciforme. Hidroxiuréia. Pacientes
Pediátricos.
Introdução
A anemia falciforme é uma hemoglobinopatia de caráter genético,
que se caracteriza pela homozigose da hemoglobina S (HbSS). A
HbS teve sua origem de uma mutação genética que ocorreu há
milhares de anos e afetou a cadeia beta da HbA e, por esse motivo,
as características da doença só podem ser percebidas a partir do
sexto mês de vida. Entre as doenças falciformes, esta é a forma
que apresenta maior gravidade clínica e hematológica além de ser
a mais prevalente1-3. Ela deforma as hemácias devido a um
processo de polimerização anormal (ligação de pontes de
hidrogênio)4 que ocorre nas moléculas de HbS após a sua desoxigenação, modificando a estrutura espacial da hemácia, que é
discoide (bicôncava) para forma de foice ou drepanócito2,4.
Apesar de afetar cerca de 0,1 a 0,3 % da população brasileira de
raça negra, a anemia falciforme é cada vez mais observada na
população caucasiana, devido a alta miscigenação observada e
nosso país. A Organização Mundial de Saúde estimou que, já na
década de 90, nascessem anualmente, no Brasil, perto de 2.500
crianças com doença falciforme, das quais cerca de 1.900
apresentavam anemia falciforme na forma homozigota.
A busca por um controle já na infância, com o teste do pezinho
(triagem neonatal) dá-se devido à alta letalidade, principalmente
em jovens, observada em nosso país5. Estima-se que 78,6% dos
óbitos ocorrem até os 29 anos de idade e que 37,5% concentramse nos menores de nove anos6.
Dos tratamentos utilizados, a hidroxiuréia vem tendo sucesso no
controle de crises dolorosas e vaso-oclusivas da anemia falciforme, devido ao seu efeito no aumento da HbF nos indivíduos,
diminuindo os efeitos de polimerização e, consequentemente, da
falcização das hemácias e suas repercussões clinicas.
O presente trabalho apresenta uma revisão da literatura sobre o
uso de hidroxiuréia em crianças portadores de anemia falciforme,
para que seja possível avaliarmos os benefícios desse medicamento na população pediátrica.
Métodos
Foram selecionados trabalhos publicados entre os anos 2000 e
2012, que abordavam o uso de hidroxiuréia em pacientes pediátricos ou hidroxiuréia e seus efeitos adversos, nos idiomas
Português, Inglês e Espanhol.
Discussão
A hidroxiuréia (HU) foi sintetizada na Alemanha, por Dressler e
Stein, em 1869 e está em uso desde 19672, após ser aprovada no
FDA norte-americano, para o tratamento de doenças neoplásicas.
Em 1998, passou a fazer parte do tratamento da anemia falciforme
e tornou-se o primeiro medicamento que previne as complicações
clínicas e aumenta a sobrevida dos pacientes portadores, além de
melhorar a qualidade de vida.
A hidroxiuréia tem efeitos múltiplos sobre a linhagem eritrocitária,
promovendo elevação no nível de HbF em cerca de 60%. Eleva a
taxa de hemoglobina, do VCM (volume corpuscular médio) e reduz
o numero de reticulócitos7,8. Seu uso tornou-se uma ótima opção, já
que os outros tratamentos disponíveis, como: transplante de
medula (TMO), que apesar de ser curativo, quando encontrado um
doador compatível, tem alto risco para o paciente por apresentar
1) Residente de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
2) Chefe do Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
3) Pediatra no Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Instituição: Serviço de Pediatria do Hospital Ana Costa, Santos/SP, Brasil.
Correspondência: Ana Nadyr Gibelli, Rua Joaquim Nabuco, 1028 – 04621-003, São Paulo/SP. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 08/05/2014; publicado online em: 10/12/2014.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 107 - 108, out / nov / dez 2014
107
índice elevado de complicações e mortalidade 9-11; e o sistema de
transfusão sanguínea regular, além de sujeitar o paciente ao risco
de doenças virais, aumenta a sobrecarga de ferro e possibilidade
de aloimunizações11,12. Assim, por tratar-se de um tratamento
relativamente simples, já que sua administração se dá por via oral,
tem sido uma excelente escolha.
A HU interfere na conversão de ribonucleotídeos em desoxirribonucleotideos, impedindo, assim, divisão celular e mantendo as
células na fase S do ciclo celular13-19, o que pode causar a mielossupressão, que é seu principal efeito adverso, porém, facilmente
detectável e, principalmente, reversível assim que seu uso é
suspenso. Existem também relatos de que pacientes, com uso em
longo prazo desenvolveram algum tipo de neoplasia, sugerindo
grande possibilidade da oncogênicidade da mesma. Isso ocorre
devido a sua genotoxicidade e lesão celular20,21. Porém, acredita-se
que os efeitos da doença de base são muito mais preocupantes e
debilitantes ao paciente do que o medicamento22.
Embora a maioria dos dados existentes sobre essa medicação
correspondam à sua eficácia em adultos, os poucos estudos
publicados em crianças demonstram eficácia, tolerância e
segurança semelhantes23,24.
Um grande estudo realizado, Baby Hug8, envolvendo 200 crianças
com idades entre cinco e 15 anos portadoras de anemia falciforme
que fizeram seu uso demonstrou que 68 crianças chegaram até a
dose máxima tolerada (MTD) e 52 mantiveram-na por um ano.
Foram observadas, nesses pacientes, alterações hematológicas
significativas, como: aumento na concentração de hemoglobina,
volume corpuscular médio, hemoglobina corpuscular média e os
parâmetros de hemoglobina fetal. Houve diminuição dos glóbulos
brancos, neutrófilos, plaquetas e contagem de reticulócitos.
Toxicidades laboratoriais geralmente foram leves, transitórias e
facilmente reversíveis com a interrupção do tratamento. Não
ocorreu nenhum evento adverso clínico fatal e não houve nenhuma
alteração de crescimento. As alterações hematológicas encontradas foram semelhantes às encontradas em adultos, mostrando
que o tratamento é seguro em crianças, desde que seja dirigido por
um hematologista infantil. AHU foi iniciada em15mg /kg/dia e
escalonada para 30mg /kg/dia, a menos que houvesse toxicidade
aparente e os pacientes foram monitorizados regularmente em
intervalo de duas semanas.
Um segundo estudo, Switch25, selecionou 130 crianças com
anemia falciforme pós-acidente vascular encefálico que estavam
em tratamento com regime de transfusão regular por 18 meses.
Desses, metade substituiu o tratamento por HU e a outra metade
manteve o tratamento habitual. Os resultados mostraram que,
entre os dois grupos, não ocorreram diferenças estatisticamente
significantes relacionadas ao controle de complicações e novos
eventos isquêmicos, havendo ainda uma melhor aceitação dos
familiares e principalmente dos pacientes, com relação ao novo
tratamento instituído, que, como descrito pelos autores, ansiavam
por alternativas.
Considerações finais
Há ação benéfica da HU em pacientes com anemia falciforme,
incluindo aqueles que já sofreram complicações da doença. Dentre
elas, o aumento de HbF, o aumento do volume corpuscular médio
(VCM), a elevação das taxas de hemoglobina e a redução do
numero de reticulócitos entre outros, que diminuem a falcisação
das hemácias compostas por HbS, diminuindo assim as crises
dolorosas e vaso-oclusivas da doença.
Não se pode negar a existência de seus efeitos adversos, sendo o
mais conhecido até o momento a mielossupressão, que está
comprovadamente relatada como facilmente reversível com a
interrupção do tratamento. A questão que ainda fica pendente tanto
para crianças como para adultos é a da oncogenicidade da droga.
Para esclarecê-la, mais estudos devem ser realizados.
Contudo, a qualidade de vida de um paciente homozigoto para
anemia falciforme, está sendo comprovadamente elevada com sua
108
introdução no tratamento da doença.
Referências
1. Embury SH. Anemia Falciforme e Hemoglobinopatias Associadas. In:
Bennett JC, Plum F. Cecil Tratado de Medicina Interna. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan; 1997. p976-88.
2. Naoum PC. Interferentes eritrocitários e ambientais na anemia falciforme.
Rev Bras Hematol Hemoter. 2000;22(1):5-22.
3. Silva RBP, Ramalho AS, Cassorla RMS. A anemia falciforme como
problema de Saúde Pública no Brasil. Rev Saúde Públ. 1993;27(1):54-8.
4. Zago MA, Falcão RP, Pasquini R. Hematologia: Fundamentos e prática.
São Paulo: Atheneu; 2004. p1081.
5. Alves AL. Estudo da mortalidade por anemia falciforme. Inf Epidemiol.
SUS. 1996;5:45-53.
6. Loureiro MM, Rozenfeld S. Epidemiologia de internações por doença
falciforme no Brasil. Rev Saúde Públ. 2005;39:943-9.
7. Covas DT, Lucena AI, Vianna BPP, Zago MA. Effects of hydroxyurea on
the membrane of erythrocytes and platelets in sickle cell anemia.
Haematologica. 2004;89(3):273-80.
8. Kinney TR, Helms RW, O'Branski EE, Ohene-Frempong K, Wang W,
Daeschner C, Vichinsky E, Redding-Lallinger R, Gee B, Platt OS, Ware RE.
Safety of hydroxyurea in children with sickle cell anemia: Results of the HUG
- KIDS Study, a Phase I/II Trial. Blood. 1999;94(5):1550-4.
9. Buchanan GR, DeBaun MR, Quinn CT, Steinberg MH. Sickle Cell
Disease. American Society of Hematology. 2004;pp.35-47.
10. Ferster A, Tahriri P, Vermylen C, Sturbois G, Corazza F, Fondu P, Devalck
C, Dresse MF, Feremans W, Hunninck K, Toppet M, Philippet P, Van Geet C,
Sariban E. Five years of experience with hydroxyurea in children and young
adults with sickle cell disease. Blood. 2001;97(11):3628-32.
11. Schnog JB, Duits AJ, Muskiet FA, ten Cate H, Rojer RA, Brandjes DP.
Sickle cell disease: a general overview. J Med. 2004;62(10):364-74.
12. Ware RE, Zimmerman SA, Sylvestre PB, Mortier NA, Davis JS, Treem
WR, Schultz WH. Prevention of secondary stroke and resolution of
transfusional iron overload in children with sickle cell anemia using
hydroxyurea and phlebotomy. J Pediatr. 2004;145(3):346-52.
13. Krakoff IH, Brown NC, Reichard P. Inhibition of ribonucleoside diphosphate reductase by hydroxyurea. Cancer Res. 1968;28(8):1559-65.
14. Galli A, Schiestl RH. Hydroxyurea induced recombination in dieting but
not in G1 or G2 cell cycle arrested yeast cells. Mutat Res. 1996;354(1):6975.
15. Hanft VN, Fruchtman SR, Pickens CV, Rosse WF, Howard TA, Ware RE.
Acquired DNA mutations associated with in vivo hydroxyurea exposure.
Blood. 2000;95(11):3589-93.
16. Lima PD, Cardoso PC, Khayat AS, Bahia Mde O, Burbano RR.
Evaluation of the mutagenic activity of hydroxyurea on the G1-S-G2 phases
of the cell cycle: an in vitro study. Gen Mol Res. 2003;2(3):328-33.
17. Rang HP, Dale, MM. Farmacologia. 6ª ed. São Paulo: Guanabara
Koogan. cap.42, p.571, 2007.
18. Sakano K, Oikawa S, Hasegawa K, . Hydroxyurea induces site-specific
DNA damage via formation of hydrogen peroxide and nitric oxide. J Cancer
Res. 2001;92(11):1166-74.
19. Scoot JP, Hillery CA, Brown ER, Misiewicz V, Labotka RJ. Hydroxyurea
therapy in children severely affected with sickle cell disease. J Pediatr.
1996;128(6):820-8.
20. Brawley OW, Cornelius LJ, , Gamble VN, Green BL, Inturrisi C, James
AH, Laraque D, Mendez M, Montoya CJ, Pollock BH, Robinson L, Scholnik
AP, Schori M. National Institutes of Health Consensus Development
Conference statement: hydroxyurea treatment for sickle cell disease. Ann
Intern Med. 2008;148(12):932-8.
21. Strouse JJ, Lanzkron S, Beach MC, Haywood C, Park H, Witkop C,
Wilson RF, Bass EB, Segal JB. Hydroxyurea for sickle cell disease: a
systematic review for efficacy and toxicity in children. Pediatrics.
2008;122(6):1332-42.
22. Ballas SK, Barton FB, Waclawiw MA, Swerdlow P, Eckman JR, Pegelow
CH, Koshy M, Barton BA, Bonds DR. Hydroxyurea and sickle cell anemia:
effect on quality of life. Health Qual Life Outcomes. 2006;4:59.
23. Figueiredo MS. Agentes indutores da síntese de hemoglobina fetal. Rev
Bras Hematol Hemoter. 2007;29(3):313-5.
24. Lanaro C, Franco-Penteado CF, Albuqueque DM, Saad ST, Conran N,
Costa FF. Altered levels of cytokines and inflammatory mediators in plasma
and leukocytes of sickle cell anemia patients and effects of hydroxyurea
therapy. J Leukoc Biol. 2009;85(2):235-42.
25. Ware RE, Helms RW. Stroke With Transfusions Changing to
Hydroxyurea (SWiTCH). Blood. 2012;119(17):3925-32.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 107 - 108, out / nov / dez 2014
Artigo de Revisão
A insuficiência cardíaca e a obesidade
em sentidos opostos
Cardiac insufficiency and obesity in opposite directions
Leonardo Ignácio Cação1
Rodolfo Leite Arantes2
RESUMO
Introdução: muitos trabalhos vêm mostrando um paradoxo em
relação à obesidade e à insuficiência cardíaca (IC), pois
pacientes com insuficiência cardíaca considerados acima do
peso e obesos têm apresentado mortalidade menor em
relação ao pacientes dentro do peso ou abaixo do peso ideal. A
maioria dos estudos tem levado em consideração apenas o
índice de massa corpórea (IMC) e novos estudos estão
tentando encontrar respostas para explicar esse paradoxo, já
que a obesidade é um fator de risco para desenvolver
insuficiência cardíaca. Objetivo: Revisar os artigos sobre a
relação entre obesidade e IC no prognóstico e mortalidade dos
pacientes estudados, para verificar se realmente existe uma
relação inversa entre obesidade e mortalidade no paciente
com IC. Métodos: Por meio da base de dados PUBMED e
SCIELO, foram pesquisados artigos da literatura médica da
língua inglesa e portuguesa, de 2001 a 2013, que abordaram o
tema mortalidade, obesidade e IC. Resultados: Dos sete
artigos utilizados nesta revisão todos confirmaram a existência
do “paradoxo da obesidade” por meio da comparação da taxa
de mortalidade por todas as causas com o IMC dos pacientes
com IC ou pela taxa de sobrevida desses mesmos pacientes
estudados. Considerações finais: Apesar do paradoxo, o IMC
por si só não consegue explicar o porquê da ocorrência desse
paradoxo e portanto novos estudos são necessários para que
seja melhor definido o estado nutricional do paciente e, assim,
saber como o padrão alimentar pode influenciar no prognóstico
do avanço da IC.
ABSTRACT
Introduction: Several studies have shown paradox in relation to
obesity and heart failure (HF), since HF patients considered
overweight and obese have shown lower mortality compared to
patients with normal weight or underweight. Most studies have
taken into account only the body mass index (BMI) and further
studies are trying to find answers to explain this paradox, since
obesity is a risk factor for developing heart failure. Objective: To
review articles about the relation between obesity and HF
prognosis and mortality of patients studied, to see if there is
actually an inverse relationship between obesity and mortality in
patients with HF. Methods: Through the PUBMED e SCIELO
database, we examined articles from the medical literature of
English and Portuguese languages, from 2001 to 2013, that
focused on mortality, obesity and IC. Results: Seven of the
articles used in this review all confirmed the existence of the
"obesity paradox" by comparing the rate of mortality from all
causes with BMI of patients with IC or the survival rate of those
patients. Final considerations: Despite the paradox, BMI alone
cannot explain why the occurrence of this paradox and
therefore further studies are needed to be better defined the
nutritional status of the patient and thus how the dietary pattern
may influence the prognosis of advancement the IC.
Key words: Heart Failure. Obesity. Mortality.
Descritores: Insuficiência Cardíaca. Obesidade. Mortalidade.
Introdução
A insuficiência cardíaca (IC) tornou-se um dos grandes problemas
de saúde pública do mundo moderno. Apesar dos avanços
terapêuticos, a morbidade e a mortalidade por IC permanecem
muito altas, sendo necessário, dessa forma, sua prevenção, que
deve ter um enfoque prioritário. A IC caracteriza-se pela incapacidade do coração em suprir as necessidades metabólicas dos
órgãos, devido a um bombeamento insuficiente de sangue por
meio da circulação. Teoricamente, o excesso de peso seria um
fator agravante para os pacientes portadores de IC, porém,
diversos estudos têm demonstrado que portadores de IC e que são
obesos, apresentam um menor risco de morte ao longo do tempo.
Essa observação tem sido definida como o “paradoxo da obesidade” e seu estudo tem aumentado nos últimos anos para uma melhor
compreensão desse paradoxo1.
Para a definição de obesidade, foi usado o índice de massa
corpórea (IMC), que é amplamente utilizado em todo o mundo.
Trata-se de um método fácil e rápido para a avaliação do nível de
gordura de cada pessoa, ou seja, é um preditor internacional de
obesidade adotado pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Embora o IMC seja o método mais comum para definir populações
obesas e com sobrepeso em estudos epidemiológicos, ele não
reflete claramente a composição corporal².
1) Médico Residente de Clínica Médica do Hospital Ana Costa, Santos/SP
2) Doutor em Cardiologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Médico Cardiologista do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Instituição: Serviço de Cardiologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Correspondência: Rua Paraíba, 37 ap. 41 – 11065-470 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 05/05/2014; publicado online em: 10/12/2014.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 109 - 112, out / nov / dez 2014
109
Dados para avaliar o valor prognóstico de outras medidas antropométricas indiretas da composição corporal, como a circunferência
da cintura (CC), circunferência muscular do braço (CMB) e prega
cutânea do tríceps (PCT), têm sido pouco examinados em pacientes com IC.
A avaliação nutricional também tem sido um ponto importante no
prognóstico dos pacientes com IC. Infelizmente ainda são muito
poucos estudos acerca deste assunto, pois se trata de uma
avaliação muito mais criteriosa e com muitas limitações. A avaliação
nutricional feita comumente nos pacientes hospitalizados é
imprecisa, podendo empregar diversos parâmetros para conseguir
uma impressão geral da existência ou não de desnutrição protéicocalórica. O ponto-chave de determinação do grau de desnutrição,
assim como os melhores parâmetros de avaliação, ainda não foram
adequadamente definidos e padronizados³.
O objetivo desta revisão é confirmar baseados nos estudos mais
atuais, se o “paradoxo da obesidade” realmente está presente nos
artigos revisados que abordaram a mortalidade e prognóstico no
paciente obeso com IC e se há necessidade de novos parâmetros
antropométricos e nutricionais para uma melhor definição de
obesidade.
pacientes com IC e a influência da disfunção ventricular sistólica
sobre este efeito. Os pacientes foram categorizados pelo IMC:
abaixo do peso (IMC<18,5kg/m²), peso normal (IMC 18.524.9kg/m2), sobrepeso (IMC 25.0-29.9kg/m2) e obeso (IMC=
30.0kg/m2). A taxa de mortalidade foi inversamente proporcional ao
aumento do IMC – Figura 1.
Métodos
Foi feita uma revisão bibliográfica sobre a influência do IMC na taxa
de mortalidade dos pacientes com IC. Procuramos na base de
dados do PUBMED, MEDSCAPE, ELSEVIER e SCIELO os
descritores de insuficiência cardíaca, obesidade e mortalidade por
todas as causas. Foram encontrados oito artigos no período de
2001 a 2013. Foram selecionados os artigos que tinham como
objetivo determinar qual a influência do IMC na mortalidade dos
pacientes com IC. O IMC foi calculado pela divisão do peso, em Kg,
pela altura, em metros, elevada ao quadrado(kg/m²).
Resultados
Foram encontrados sete artigos originais, sendo todos estudos
observacionais retrospectivos. Todos avaliaram a relação do IMC
com a taxa de mortalidade por todas as causas nos pacientes com
IC, no intuito de confirmar a existência do “paradoxo da obesidade”.
Alguns estudos se diferenciaram pela divisão dos grupos de
pacientes em relaçao ao IMC.
Gregg et al.4 analisaram as internações dos pacientes com IC
aguda no Registro Nacional de IC Aguda Descompensada nos
Estados Unidos de outubro de 2001 até dezembro de 2004 e
dividiram os pacientes em quatro grupos: abaixo do peso
(IMC<18,5kg/m²), peso normal (IMC 18.5-24.9kg/m2), sobrepeso
(IMC 25.0-29.9kg/m2) e obeso (IMC=30.0kg/m2). Nesse estudo, foi
demonstrada uma taxa de mortalidade intrahospitalar de 6,3% nos
pacientes abaixo do peso, 4,6% nos pacientes com o peso ideal,
3,4% nos pacientes com sobrepeso e 2,4% nos pacientes obesos e
com associações significativas (p<0.0001).
Cicoira et al.5 estudaram 5010 pacientes do Valsartan Heart Failure
Trial6 e categorizaram-nos com o seguinte IMC: abaixo do peso
(IMC<22kg/m²), peso normal (IMC 22-24.9kg/m2), sobrepeso (IMC
25.0-29.9kg/m2) e obeso (IMC=30.0kg/m2). A taxa de mortalidade
neste estudo foi de 27,2% nos pacientes abaixo do peso, 21,7% nos
pacientes com peso normal, 17,9% nos pacientes acima do peso e
16,5% nos obesos.
Zamora et al.7 analisaram a relação entre IMC e mortalidade, em
período de dois anos, em pacientes com IC em acompanhamento
ambulatorial. O IMC foi categorizado como: abaixo do peso
(IMC<20,5kg/m²), peso normal (IMC 20,5-25,4kg/m2), sobrepeso
(IMC 25,5-29,9kg/m2) e obeso (IMC= 30,0kg/m2). A taxa de
mortalidade neste estudo foi de 46,6% nos pacientes abaixo do
peso, 27,7% nos pacientes com peso normal, 18,7% nos pacientes
acima do peso e 16% nos obesos. Foi observado que a cada 1
ponto aumentado no IMC, o risco de morrer caia 8%.
Gustafsson et al.8 analisou o efeito do IMC na sobrevida dos
110
Figura 1 – Taxa de mortalidade em 4700 pacientes com IC de acordo com o
IMC; p<0.0001 para abaixo do peso, acima do peso e obeso em comparação com peso normal8. (underweight = baixo peso; overweight = sobrepeso;
obese = obeso).
No entanto, quando o paciente apresenta disfunção ventricular
sistólica esquerda, a proporção da taxa de mortalidade em relação
ao IMC altera-se, tendo uma sobrevida maior nos pacientes com
peso normal criando uma curva em forma de U, quando tanto os
obesos quanto os abaixo do peso apresentam taxa de mortalidade
maior8.
Nagarajan et al.9 estudaram 501 pacientes com IC avançada na fila
de transplante cardíaco da clínica Cleveland. Foram divididos em
relação ao IMC, mas em grupos diferentes dos estudos anteriormente citados. Foram excluídos os pacientes com IMC menor que
18,5kg/m², os pacientes com IMC normal (18.5-24.9kg/m2) e
sobrepeso (IMC 25.0-29.9kg/m2) foram agrupados juntos em grupo
definido como não obesos. Os paciente com IMC entre 30kg/m² e
39,9kg/m² entraram no grupo dos obesos e os pacientes com IMC
maior que 40kg/m² foram classificados como obesos mórbidos ou
extremos. A taxa de sobrevivência nos pacientes não obesos,
obesos e obesos mórbidos foi, respectivamente, de 48,4%, 57,4% e
28,6%. Foi possível verificar um novo dado antes desconhecido,
que avaliou em separado os pacientes obesos mórbidos e observou-se que a mortalidade foi maior neste grupo. Apesar disso, o
grupo de obesos manteve mortalidade menor que os não obesos,
confirmando novamente o “paradoxo da obesidade”
Curtis et al.10 analisaram 7788 pacientes com IC estável da base de
dados do estudo DIG (Digitalis Investigation Group)11,12, sendo
excluídos 21 pacientes pela indisponibilidade do IMC. Os pacientes
foram divididos em quatro grupos pelo IMC: abaixo do peso
(IMC<22kg/m²), peso normal (IMC 22-24,9kg/m2), sobrepeso (IMC
25,0-29,9kg/m2) e obeso (IMC= 30,0kg/m2). O estudo teve um
seguimento de 37 meses e observou a mortalidade por todas as
causas em relação ao IMC. Apresentou risco de morte por todas as
causas menor nos pacientes com sobrepeso e obesos (acima do
peso, 32,4%; obeso, 28,4%; P<0,001), comparado com os
pacientes com peso normal. Os pacientes abaixo do peso tiveram
uma mortalidade por todas as causas maior que os pacientes com
peso normal (45,0% VS. 37,8%; p=0.07). Examinando o IMC como
uma variável contínua, observou-se um decréscimo linear nas
mortes por todas as causas nos pacientes com IMC mais alto –
Figura 2.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 109 - 112, out / nov / dez 2014
Figura 2 – Associação do índice de massa corporal (IMC) como variável
contínua e não ajustada de mortalidade por todas as causas por meio de
regressão logística polinomial. Cada ponto representa a taxa de mortalidade associada com um IMC inteiro10.
Horwich et al.13 acompanharam 1203 pacientes com IC avançada
em um abragente programa de manejo na IC de um centro médico
universitário. Os pacientes foram classificados em quatro categorias de IMC: abaixo do peso (IMC<20,7kg/m²), peso normal (IMC
20,7-27,7kg/m²), sobrepeso (IMC 27,8-31kg/m²) e obeso
(IMC>31kg/m²). Os resultados mostraram sobrevida maior nos
pacientes com sobrepeso e obesos nos primeiros 36 meses de
seguimento, porém, a partir desse momento, a sobrevida igualouse entre todos os grupos e após 42 meses os pacientes com
sobrepeso tiveram uma sobrevida menor que os outros três grupos
– Figura 3.
grupos separados pelo IMC4,7,8.
É importante salientar que os artigos desta revisão preocuparam-se
em analisar apenas o desfecho da relação entre obesidade e
mortalidade no paciente com IC e não se preocuparam com a
fisiopatologia dessa relação. Não se sabe ao certo o estado
nutricional do paciente, pois o IMC apenas leva em consideração o
peso e altura. Portanto, pacientes com o mesmo IMC podem
apresentar porcentagens de gordura corporal diferente, além de
outras medidas de obesidade como circunferência muscular do
braço e prega cutânea triciptal.
A literatura tem poucos trabalhos avaliando outros fatores nutricionais e antropométricos para entender esse fênonemo da obesidade
no paciente com IC. Zuchinali et al.13 demonstraram que a prega
cutânea triciptal pode ser um melhor preditor de mortalidade em
pacientes ambulatoriais com IC e reforçaram o conceito de
paradoxo da obesidade.
Pouca atenção tem sido dada ao tratamento não farmacológico da
IC. Os estudos desta revisão preocuparam-se em analisar os
medicamentes em uso de todos os pacientes, contudo, não houve
atenção alguma na orientação nutricional. A IC está associada à
ingestão inadequada de calorias e proteínas, além de reduzida
disponibilidade energética para atividade física14. Lourenço et al.
demonstraram a ocorrência de depleção das reservas musculares
e inadequação da ingestão de diversos nutrientes da dieta, como
magnésio, zinco, ferro, tiamina, cálcio, potássio e sódio15. Apesar de
a maioria dos pacientes ter relatado ingestão de carboidratos,
lipídeos e proteínas dentro das recomendações atuais16. Esses
pacientes tinham IMC dentro dos limites normais (24,2 ± 3,2kg/m2),
chamando a atenção para a limitação do emprego do IMC como
marcador de adequação da ingestão calórica em pacientes com
insuficiência cardíaca.
A caquexia cardíaca causada pela IC é a principal justificativa para
o aumento na taxa de mortalidade nos pacientes com peso normal
ou abaixo do peso e deixa o “paradoxo da obesidade“ mais
compreensível mostrando que pacientes com reserva energética
maiores como os pacientes obesos e com sobrepeso não serão
rapidamente consumidos pela desnutrição causada pelo avanço da
insuficiência cardíaca e, então, terão uma sobrevida mais prevalente em médio prazo. Será que uma oferta mais balanceada para
contrapor essa desnutrição causada pela IC não faria mudar a
mortalidade nos pacientes não obesos e ainda evitaria os efeitos
maléficos da obesidade?
Considerações finais
Figura 3 – Curvas de sobrevida nas quatro categorias de IMC em cinco
anos.
Não a dúvida quanto à existência do “paradoxo da obesidade” nos
pacientes obesos com IC, porém, estudos são necessários para
descobrir qual padrão nutricional seria ideal para fazer um paciente
com IC avançada em pacientes não obesos poder aumentar sua
sobrevida sem aumentar suas comorbidades inerentes a obesidade. Novas pesquisas também são importantes para verificar outras
medidas antropométricas que possam ser mais seguras em avaliar
o estado nutricional do paciente.
Discussão
Referências
Todos os estudos presentes nessa revisão confirmaram o “paradoxo da obesidade” demonstrando que os pacientes considerados
com sobrepeso e obesos têm mortalidade menor em relação ao
pacientes com peso normal ou abaixo do peso. No entanto, nas
conclusões desses estudos, sempre houve a preocupação de
enfatizar a necessidade de estudos complementares para o
entendimento desse paradoxo. Apenas Nagarajan et al. compararam os pacientes com obesidade mórbida e foi observada uma taxa
de mortalidade maior que nos pacientes de peso normal9.
Outro parâmetro que foi levado em consideração em alguns
estudos foi a disfunção ventricular sistólica, para verificar se
pacientes com maior disfunção ventricular teriam um desfecho
diferente dos pacientes com função ventricular normal ou pouco
alterada, mas a taxa de mortalidade manteve o mesmo padrão nos
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 109 - 112, out / nov / dez 2014
1. Kenchaiah S, Evans JC, Levy D, Wilson PW, Benjamin EJ, Larson MG,
Kannel WB, Vasan RS. Obesity and the risk of heart failure. N Engl J Med.
2002;347:305-13.
2. Lavie CJ, Milani RV, Ventura HO, Romero-Corral A. Body composition and
heart failure prevalence and prognosis: getting to the fat of the matter in the
“obesity paradox”. Mayo Clin Proc. 2010;85(7):605-8.
3. Veloso LG, Oliveira JMT, Munhoz RT, Morgado PC, Ramires JAF, Barretto
ACP. Repercussão nutricional na insuficiência cardíaca avançada e seu
valor na avaliação prognóstica. Arq. Bras. Cardiol. 2005;84(6):480-5.
4. Fonarow GC, Srikanthan P, Costanzo MR, Cintron GB, Lopatin M. An
obesity paradox in acute heart failure: analysis of body mass index and in
hospital mortality for 108,927 patients in the acute decompensated heart
failure national registry. Am Heart J. 2007;153:74-81.
5. Cicoira M, Maggioni AP, Latini R, Barlera S, Carretta E, Janosi A, Soler JS,
Anand I, Cohn JN. Body mass index, prognosis and mode of death in chronic
heart failure: Results from the Valsartan Heart Failure Trial. Eur J Heart Fail.
2007;9:397-402.
111
6. Cohn J, Tognoni G, Glazer RD, Spormann D, Hester A. Rationale and
design of the Valsartan Heart Failure Trial: a large multinational trial to
assess the effects of Valsartan, an angiotensin-receptor blocker, on
morbidity and mortality in chronic Congestive Heart Failure. J Card Fail
1999;5:155-60.
7. Zamora E, Lupón J, Urrutia A, González B, Mas D, Pascual T, Domingo M,
Valle V. ¿El índice de masa corporal influye en la mortalidad de los pacientes
con insuficiencia cardiaca? Rev Esp Cardiol. 2007;60:1027-34.
8. Gustafsson F, Kragelund CB, Thorp-Pedersen C, Seibaek M, Burchardt
H, Akkan D, Thune J, Kober L. Effect of obesity and being overweight on
long-term mortality in congestive heart failure: in?uence of left ventricular
systolic function. Eur Heart J 2004; doi:10.1093/ eurheartj/ehi022.
9. Nagarajan V, Cauthen CA, Starling RC, Tang WH. Prognosis of morbid
obesity patients with advanced heart failure. Congest Heart Fail.
2013;19:160-4.
10. Curtis JP, Selter JG, Wang Y, Rathore SS, Jovin IS, Jadbabaie F, .
Kosiborod M, Portnay EL, Sokol SI, Bader F, Krumholz HM. The obesity
paradox: body mass index and outcomes in patients with heart failure. Arch
Intern Med. 2005;165:55-61.
11. Digitalis Investigation Group. Rationale, design, implementation, and
baseline characteristics of patients in the DIG trial: a large, simple, long-term
trial to evaluate the effect of digitalis on mortality in heart failure. Control Clin
Trials. 1996;17:77-97.
12. Digitalis Investigation Group. The effect of digoxin on mortality and
morbidity in patients with heart failure. N Engl J Med. 1997;336:525-33.
13. Zuchinali P, Souza GC, Alves FD, d'Almeida KSM, Goldraich LA,
112
Clausell NO, Rohde LEP. Prega cutânea tricipital como preditor prognóstico
na insuficiência cardíaca ambulatorial. Arq Bras Cardiol. 2013. Epub Sep
13, 2013. In press
14. Aquilani R, Opasich C, Verri M, Boschi F, Febo O, Pasini E, Pastoris O. Is
nutritional intake adequate in chronic heart failure patients? J Am Coll
Cardiol. 2003;42:1218-23.
15. Lourenço BH, Vieira LP, Macedo A, Nakasato M, Marucci MF, Bocchi EA.
Estudo nutricional e adequação da ingestão de energia e nutrients em
pacientes com insuficiência cardíaca. Arq Bras Cardiol. 2009;93(5): 541-8.
16. Food and Nutrition Board. Dietary reference intakes for energy,
carbohydrate, fiber, fat, fatty acids, cholesterol, protein, and amino acids.
Washington (DC): National Academic Press; 2005.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 109 - 112, out / nov / dez 2014
Artigo de Revisão
Radioterapia IGRT no tratamento
do tumor inicial de pulmão
IGRT radiotherapy in the treatment of lung primary tumor
Ticila Peixoto Melo1
Sueli Monterroso da Cruz2
Osanna Esther Codjaian3
RESUMO
Os tumores pulmonares iniciais de pequenas células têm como
tratamento-padrão a quimioradioterapia; porém, em casos de
comorbidades do paciente, a radioterapia pode ser utilizada.
No presente caso, a radioterapia com IGRT mostrou-se efetiva,
com diminuição do volume tumoral no primeiro seguimento
pós-tratamento, além de a paciente apresentar excelente
tolerabilidade ao mesmo. Assim, a radioterapia exclusiva com
IGRT pode ser alternativa interessante em pacientes que
apresentam contra-indicações ao tratamento padrão
quimioradioterápico.
ABSTRACT
Initial small cell lung tumors have chemoradiation as standard
treatment, however, in cases of comorbidity of the patient,
exclusive radiation therapy may be used. In this case, the IGRT
radiotherapy was effective, with reduction of tumor volume in
the first follow-up after treatment, besides the patient has the
same excellent tolerability. Thus, radiotherapy alone with IGRT
can be an attractive alternative in patients with
contraindications to standard chemoradiation treatment.
Key words: Neoplasms. Lung Injury. Radiotherapy.
Descritores: Neoplasias. Lesão Pulmonar. Radioterapia.
Introdução
O câncer de pulmão é um importante problema de saúde pública,
ocupando atualmente, a décima posição entre as principais causas
de morte no mundo1 e a principal causa de morte dentre as
neoplasias malignas2. O Instituto Nacional do Câncer (INCA)
estima para o ano de 2012 a ocorrência de 17.210 e 10.110 novos
casos de câncer de pulmão no Brasil em homens e mulheres,
respectivamente3. Há diversos fatores ambientais e comportamentais associados com o desenvolvimento do câncer de pulmão, o
que permite a consideração sobre estratégias visando sua
prevenção. O tabagismo é responsável por cerca de 90% dos
casos da doença, é o principal fator de risco4.
O carcinoma de pulmão de pequenas células (CPPC) é diagnosticado em aproximadamente 10 a 30% dos pacientes com câncer de
pulmão5. O principal fator de risco é a exposição ao cigarro,
responsável por até 90% dos casos diagnosticados6. Os sintomas
dependem da localização do tumor, sendo a tosse o sintoma mais
comum. Dispnéia e dor torácica são reportadas em 30-40% dos
pacientes no momento do diagnóstico.
Os objetivos do tratamento são controle local e de micro metástases, devido à recidiva local ser muito comum. Tratamento adicionais, com incorporação de radioterapia e cirurgia, devem ser
considerados.
A radioterapia guiada por imagens (IGRT) é outra opção de
tratamento que pode ser utilizada em condições que requer
extrema precisão, trazendo benefício ao paciente, com poucos
efeitos colaterais em longo prazo.
Relato de caso
Paciente de 64 anos, sexo feminino, tabagista há 20 anos, com
antecedente de enfisema pulmonar, coronariopatia e hipertensão
arterial sistêmica foi atendida. Em exames pré-operatórios para
colecistectomia, devido colelitíase, foi observado nódulo em
hemitórax esquerdo no RX de tórax. Foi realizada tomografia de
tórax, evidenciando nódulo espiculado 1,8x1,5x1,5 cm, sinais de
enfisema pulmonar difuso bilateral e linfonodomegalia menor que 1
cm paratraqueal inferior direito. Foi realizada biópsia, com
anatomopatológico compatível com carcinoma pouco diferenciado
do tipo pequenas células. Foi feito PET-CT para estadiamento,
mostrando nódulo em seguimento apical lobo superior esquerdo
2,2cm com SUV 5,3, associado a aspecto em vidro fosco, ausência
de linfonodos mediastinais, sem evidência de doença em outra
localização. Foi avaliado pelo cirurgião torácico, que contraindicou a cirurgia, devido às comorbidades. Optou-se por tratamento radioterápico com técnica IGRT, devido à localização,
recebendo dose total de 70 GY (35x200cgy), do período de
16/01/2013 à 06/03/2013. Não apresentou intercorrências durante
1) Estagiária de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
2) Chefe do Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
3) Medica Radioterapeuta do Hospital Dia ISO, Santos e Hospital Bandeirantes, São Paulo/SP
Instituição: Serviço de Oncologia do Hospital Ana Costa, Santos/SP.
Correspondência: Rua Pedro Américo, 60 – 11060-002 Santos/SP, Brasil. E-mail: [email protected]
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
Recebido em: 31/10/2013; aceito para publicação em: 15/04/2014; publicado online em: 10/12/2014.
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 113 - 114, out / nov / dez 2014
113
todo o tratamento radioterápico. Ao retorno em consulta após dois
meses com nova tomografia de tórax, verificou-se diminuição
significativa da lesão, estando assintomático – Figura 1.
5.Jemal A, Tiwari RC,Murray T, Ghaffor A, Samuels A, Ward E, Feur EJ, Thun
MJ. Cancer statistics, 2004. CA Cancer J Clin. 2004;54:8-29.
6.Shopland DR, Eyre HJ, Pechacek TF. Smoking attributable cancer
mortality in 1991: is lung cancer now the leading cause of death among
smokers in the United State? J Natl Cancer Inst. 1991;83:1142-8.
7.Murray N, Coy P, Pater JL, Hodson I, Arnold A, Zee BC. Importance of
timing for the thoracic irradiation in the combined modality treatment of
limited-stage small-cell-lung cancer, J Clin Oncol. 1993;11:336-44.
8.Curran WJ Jr. Combined-modality therapy for limited-satge small cell lung
cancer. Semin Oncol. 2001;28:14-22.
9.Liu HH, Balter P, Tutt T, Choi B, Zhang J, Wang C. Assessing respirationinduced tumor motion and iTV using 4D-CT for radiotherapy of lung cancer.
Int J Radiat Oncol Biol Phys. 2007; 68:531-54.
10.Marks LB, Yorke ED, Jackson A Ten Haken RK, Constine LS, Eisbruch A.
Use of normal tissue complication probability models in the clinic. Int J Radiat
Oncol Biol Phys. 2010;76:S10-9.
Figura 1A: Tomografia de Tórax mostrando neoplasia de pulmão antes do
tratamento com Radioterapia IGRT. Figura 1B: Tomografia de Tórax
evidenciando diminuição da lesão 2 meses após tratamento com
Radioterapia técnica IGRT. Figura 1C: Plano de tratamento utilizado com
Radioterapia técnica IGRT
Discussão
O tumor de pequenas células do pulmão em estádio clínico I (T1-2
N0) representa menos de 5% do total de neoplasias pulmonares,
com várias séries mostrando resultados promissores com cirurgia;
porém, em casos específicos, a radioterapia pode ser utilizada,
com finalidade radical, geralmente associada à quimioterapia, com
resultados superiores a quimioterapia isolada7.
No presente caso, utilizamos a técnica de radioterapia conformacional, associada à IGRT – radioterapia guiada por imagem -, que
permite alcançar altas doses na área tumoral, com diminuição
importante da dose/ toxicidade em tecidos normais adjacentes.
O estudo CALGB 30610/ RTOG 0538 mostra vários braços
randomizados de escalonamento de dose de radioterapia, entre os
quais o utilizado – 70 Gy em 35 frações de 2 Gy/ 1 vez ao dia, 5 dias
por semana; esse esquema se mostrou bem tolerado pela
paciente8.
O volume- alvo de tratamento (PTV – planning treatment volume)
foi delineado a partir da fusão de imagens obtidas por series
diferentes de tomografia computadorizada pulmonar – inspiração,
expiração e respiração livre, com intenção de acompanhar os
movimentos respiratórios (ITV), criando margem de segurança
suficiente para compensar esta movimentação durante o tratamento radioterápico9.
O plano final de tratamento mostra a disposição da curva de
isodose de 90%, abrangendo todo PTV, através de sete campos
coplanares.
O gráfico de dose-volume (DVH) fornece dados de dose em cada
estrutura delineada no plano, com estudo das diferentes doses de
tolerância nos diferentes órgãos10.
Referências
1.Silvestri GA, Alberg AJ, Ravenel J. The changing epidemiology of lung
cancer with a focus on screening. BJM. 2009;339:3053.
2. Alberg AJ, Ford JG, Samet JM. Epidemiology of lung cancer: ACCP
evidence based clinical practice guidelines. Chest. 2007;132:29S-55S.
3.Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer [Internet] Estimativa
2012: Incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA; 2011 Avaible i :
http://ww.inca.gov.br/estimativa/2012/estimativa20122111.pdf
4.Alberg AJ, Samet JM. Epidemiology of lung cancer. Chest. 2003;123:21S49S.
114
Revista Médica Ana Costa, v. 19, n. 4, p. 113 - 114, out / nov / dez 2014
Sua saúde em boas mãos
www.anacosta.com.br