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Biblioteca Digital Revista Brasileira de Estudos Constitucionais - RBEC,Belo Horizonte, ano 3, n. 10, abr. 2009
O direito de ofender. Sobre os limites da liberdade de expressão artística 1
Dimitris Christopoulos
Dimitri Dimoulis
Resumo: Os artistas reivindicam uma amplíssima liberdade de criação, e os religiosos exigem respeito de suas crenças sagradas. Em ambos os casos temos
direitos que parecem exceder a liberdade de manifestação do pensamento com suas múltiplas limitações. O presente estudo, baseado em comentários da
jurisprudência e doutrina sobre a liberdade artística em vários países, examina suas problemáticas relações com a liberdade religiosa. São apresentadas as
possíveis soluções e as justificativas de limitação da liberdade de arte que podem ser admitidas em uma sociedade democrática.
Palavras-chave: Blasfêmia. Colisão de direitos. Liberdade de arte. Liberdade religiosa.
Sumário: 1 Introdução - 2 Definindo a arte para fins jurídicos - 3 Caminhos de repressão - 4 Justifica-se a opção repressiva? - 5 Resolvendo o conflito - 6
Observações conclusivas - Bibliografia
A Igreja terá diversos confrontos com os movimentos de Direitos Humanos. A Igreja não está apenas a serviço dos Direitos Humanos,
mas os transcende, uma vez que no lugar dos Direitos, que é um conceito jurídico, apresenta o conceito de Serviço. Onde o Direito
permite, a Igreja propugna pelo servi ço livre e a dedicação. A Igreja não pode aceitar aquilo que os líderes deste mundo promovem por
meio do movimento dos Direitos Humanos: a abolição do pecado. O que eles querem apresentar como direito não é o respeito à pessoa
humana: é sua destruição. A proibição de que o homem perceba a sua fraqueza perante Deus, sua natureza pecaminosa. Está para
ocorrer a impossibilidade de o ser humano demonstrar seu arrependimento e ser perdoado. Em outras palavras, está sendo planejada a
abolição da consciência moral e sua substituição por normas jurídicas. No mundo que eles estão preparando, não haverá mais pecados,
mas apenas ilícitos. (…). Mas eu posso dizer que para a Igreja Ortodoxa o amor pela arte constituirá um critério de sua própria
habilidade em atender ao bem-estar de seus seguidores, uma vez que, quanto mais a nossa sociedade se torna impessoal e massificante,
maior deve ser o papel da Igreja em conceber a arte como uma arma de defesa do ser humano contra os poderes de alienação. Eu não
aceitarei, obviamente, que toda arte expressa a natureza humana. Estou bem consciente que muitas obras são ofensivas e deixam o ser
humano incapacitado. Contudo, a arte permanece, claramente, um fiel aliado e uma poderosa arma na batalha do ser humano para
enfrentar circunstâncias depressivas, respirar livremente e sentir o sopro divino.
(Christodoulos, Arcebispo da Igreja Ortodoxa da Grécia, 2006)
O cristianismo faz parte do direito inglês (...). Por essa razão, ofender o cristianismo significa praticar subversão contra o direito.
(Lord Chief Justice Hale, Rex vs. Taylor, 1676)
1 Introdução
Uma produção artística é apresentada ao público. Grupos religiosos sentem-se ofendidos e protestam. Na melhor das hipóteses teremos intensos debates
políticos e jornalísticos. Não será incomum a intervenção do Poder Judiciário, decidindo sobre a conveniência de atos de censura, sobre pedidos de
indenização e a responsabilidade penal dos artistas. Em alguns casos, haverá conflitos violentos entre partidários e opositores da liberdade artística com atos
de vandalismo, lesões corporais e até mortes.
Em 2006, quando se tornou mundialmente conhecida a publicação de charges sobre Maomé em um jornal dinamarquês, houve reações violentas que
causaram mais de 100 mortes.2 Isso criou um clima nebuloso para a liberdade de expressão artística na Europa. Semelhante foi a situação duas décadas atrás
após a publicação do livro de Salman Rushie Os versos satânicos.3 Atualmente, parece prevalecer a opinião de que o direito fundamental à liberdade de
expressão artística não permite que alguém torne públicas obras que possam ofender razoáveis sensibilidades dos crentes. Argumentaremos que essa posição
é insustentável em um regime democrático.
Como se posicionar politicamente em tais conflitos? E qual a resposta que deve dar o direito constitucional? É muito difícil superar a ambivalência no
relacionamento entre religião e arte: o sagrado sempre foi fonte de inspiração e razão de produção de grandes obras artísticas. Ao mesmo tempo, a liberdade
de expressão artística foi gravemente violada em nome da religião, tanto nos dias atuais como no passado.
Cada sociedade deve estabelecer um equilíbrio entre a liberdade religiosa e a liberdade de expressão artística. Mas o conflito entre ambas é uma questão
política e jurídica e não teológica ou estética. As sensibilidades das comunidades religiosas podem oferecer uma razão jurídica para restringir a liberdade dos
indivíduos em decidir o que é arte? Em quais hipóteses uma obra de arte ofende os sentimentos religiosos de certa comunidade a ponto de justificar a
intervenção repressiva do Estado? Como fixar os limites da expressão artística nos regimes democráticos?4
2 Definindo a arte para fins jurídicos
Cada ordenamento jurídico possui suas peculiaridades na garantia da liberdade artística. Ponto de partida comum é a definição da "arte" e do "artista" para,
em seguida, refletir sobre os limites de sua atividade.
Na doutrina constitucional brasileira não encontramos reflexões sobre a liberdade de arte, limitando-se os autores a análises genéricas da liberdade de
expressão. Isso gera problemas, pois as especificidades da produção artística modificam a área de proteção5 do direito. Em primeiro lugar, a arte não se limita
à manifestação de pensamento. Inclui ações (pensemos na intervenção de um artista que, com ou sem permissão do proprietário, picha a fachada de um
edifício) e envolve a manutenção de estruturas de produção (teatro, cinema). Em segundo lugar, a arte tem formas e justificativas de exercício diferentes das
demais espécies de manifestação do pensamento. Os artistas reivindicam uma liberdade quase absoluta, isto é, uma tutela particularmente intensa e privilegiada
de seu direito em comparação com os demais titulares de direitos de liberdade de expressão.6 Aquilo que em condições normais seria ato obsceno, deixa de
ser percebido como tal se for representado em uma tela ou no teatro. E uma peça humorística reivindica uma liberdade de expressão cuja amplitude seria
impensável para um jornalista ou cientista.
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O risco de ampliar ou restringir indevidamente a área de proteção da livre expressão artística faz surgir o problema do sujeito que realizará esse julgamento,
bem como da referência que será empregada. Na perspectiva jurídica esse julgamento será necessariamente feito por autoridades estatais e, em particular,
pelo Poder Judiciário, contrariando o mito liberal de que o Estado não deve "julgar" a arte.7 Já o problema da referência deve ser resolvido adotando critérios
de definição da arte.
Na doutrina e jurisprudência de vários países se cristalizam quatro critérios de definição:8
- Material. A arte consiste no trabalho criativo que permite se expressar dentro de uma tradição que usa determinadas formas de expressão.
- Formal. Possibilidade de classificar certa produção em uma categoria de obras que são reconhecidamente artísticas (pintura, teatro, dança
etc.).
- Significado. A obra permite várias interpretações, oferecendo sempre novas informações, idéias e estímulos.
- Reconhecimento. Atribuição do predicado "arte" a certa obra por terceiros que têm conhecimentos na área.9
Não há um critério prevalecente e há possibilidades de discrepância. Aquilo que segundo certo criador é arte pode ser considerado poluição visual ou sonora
pelos especialistas ou pelo público. Da mesma maneira, uma produção artística pode não satisfazer o critério do significado, por ser pouco profunda e original.
Mas nem por isso deixa de agradar vastos auditórios, como ocorre com produções musicais e televisivas com apelo popular. Isso indica que o Estado deve
intervir o mínimo possível, garantindo flexibilidade na definição da arte.10
Essa flexibilidade é necessária se pensarmos que os critérios e tendências estéticas modificam-se no tempo. As vanguardas produzem obras que alcançam
reconhecimento, apesar de não satisfazerem critérios de valor artístico vigentes no momento de sua criação.11 Basta comparar produções artísticas de
diferentes séculos, épocas e culturas para se certificar da incompatibilidade de "gostos".
Na perspectiva do presente estudo interessa o fato de que a maioria dos questionamentos sociais e judiciais das produções artísticas não se relaciona com o
problema de definição dos limites da arte. Quem pede a censura de certas obras raramente questiona sua natureza artística. Costuma alegar que certa
produção ofende valores ou direitos. Isso indica que o debate jurídico sobre a determinação da área de proteção da liberdade artística, por mais que seja
necessário, não é decisivo. Para decidir sobre a tutela constitucional de certas produções artísticas, devemos elaborar uma teoria sobre os direitos e,
eventualmente, os bens constitucionais que podem ser invocados, de maneira justificada, como limitadores da liberdade de arte.
3 Caminhos de repressão
A partir do caso emblemático das charges dinamarquesas sobre o profeta Maomé em 2006, observa-se a tendência de impor fortes restrições à liberdade
artística, tanto nos casos em que as obras de arte contrariam opiniões das religiões dominantes, como quando se referem a crenças minoritárias. A indignação
virulenta de parte do mundo muçulmano contra a publicação dessas charges e as reações, mais brandas, que se verificaram dois anos depois, contra o
documentário, Fitna, de autoria do político holandês de extrema direita Geert Wilders,12 apresentam o problema "liberdade de expressão ou liberdade de
insultar?" em termos maniqueístas.
A liberdade de expressão artística não objetiva tutelar obras banais e inócuas. Ninguém necessita de tutela jurídica para expor naturezas mortas e animais no
pasto verde. A liberdade de expressão só adquire relevância a partir do momento em que alguém questiona o nosso direito de expressar-se, desejando proibir
certa manifestação que reputa ofensiva de seus direitos ou valores. Como afirmou a Corte Européia de Direitos Humanos, em uma sociedade democrática,
esta liberdade diz respeito a pontos de vista perturbadores e chocantes.13
Como tratar produções artísticas que ofendem sentimentos religiosos? Círculos religiosos sugerem reativar o crime da blasfêmia que foi amplamente utilizado
no passado para censurar "obras blasfematórias".14
Na Grécia, foi processado por blasfêmia em 2006 o curador da exposição internacional de arte contemporânea Outlook, organizada em Atenas. A exibição
incluía um quadro do pintor belga Thierry de Cordier, considerado ofensivo a Cristo. O curador foi obrigado a retirar a obra da exposição em face da onda
de protestos promovidos pela Igreja ortodoxa e por alguns políticos. Finalmente foi absolvido do crime de blasfêmia em 2006: a pintura foi censurada e o
curador absolvido.15 Isso significa que há possibilidade de conciliar os interesses colidentes?
A penalização de condutas, palavras e obras "blasfemas" parece extremamente antiquada, mas está presente na maioria dos ordenamentos jurídicos.16
Podemos indicar alguns exemplos.
Na Irlanda, a Constituição considera como dever de todos o culto de Deus e proíbe as manifestações de opinião que o desrespeitem.17 Há normas penais
que reprimem a blasfêmia, como o artigo 13 do Defamation Act de 1961 que prevê pena de prisão de até dois anos e/ou multa em caso de blasfêmia.18 Os
tribunais irlandeses consideram que essa norma não é aplicável, porque não define o conteúdo da blasfêmia. Mas não se questiona a constitucionalidade de
normas que penalizariam a blasfêmia satisfazendo o princípio da taxatividade.19
Na Grécia há normas que punem a blasfêmia ("injuriar Deus publicamente e com má intenção"; "demonstrar publicamente, através de blasfêmia, falta de
respeito ao divino" — art. 198 do Código Penal), assim como ofensas a religiões (arts. 199 e 200). A pena prevista é a prisão de até dois anos, sendo muito
comuns as condenações penais na prática.20
Na Inglaterra vigorou uma discriminação no limite do escandaloso, pois por séculos constituía crime com base no common law somente a blasfêmia contra o
cristianismo. Em 1990, o escritor Salman Rushdie foi processado perante os tribunais ingleses, acusado de blasfemar a religião no referido livro Os versos
satânicos. Foi absolvido porque os juízes consideraram que ofendeu a religião muçulmana não tutelada pelo common law.21 Quase duas décadas depois, a
situação embaraçosa foi remediada com a abolição legislativa do crime de blasfêmia em 2008 mediante o n. 79 (1) do Criminal Justice and Immigration
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Act.22
Na Itália, o Código Penal penaliza as ofensas contra a Igreja Católica que designa como "religião do Estado" (art. 402). Apesar dos protestos políticos, essa
norma permaneceu em vigor durante décadas. A Corte Constitucional pronunciou-se repetidamente sobre o tema e acabou declarando a inconstitucionalidade
da penalização da blasfêmia em 2000.23
Observemos finalmente que a Corte Européia de Direitos Humanos considera que as normas que penalizam direta ou indiretamente a blasfêmia não contrariam
a Convenção Européia de Direitos Humanos, apesar de essa última tutelar a livre manifestação do pensamento.24
Mesmo nos países que não penalizam diretamente a blasfêmia há normas que tutelam o "sentimento" e/ou a "paz" no campo religioso. Isso ocorre no Brasil
onde constitui crime, "escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto
religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso: Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano, ou multa".
Tais normas podem parecer justificadas, pois tutelam interesses sociais concretos: a ordem e tranqüilidade pública e a crença dos fiéis. Mas mostram-se
constitucionalmente problemáticas quando se pergunta por que são criados delitos específicos para tutelar o sentimento religioso. Por que esse sentimento
deve ser protegido de maneira diferenciada do sentimento científico, político, esportivo ou qualquer outro? Por que o Código Penal brasileiro tipifica as
ofensas religiosas como crime passível de pena de prisão de até um ano (art. 208), enquanto nos demais casos só pode ser aplicada a norma geral que pune a
injúria com privação de liberdade de até seis meses (art. 140, caput)?
4 Justifica-se a opção repressiva?
Dito de outra forma, pergunta-se, por qual razão admitir, em benefício de religiões ofendidas, perseguições penais que seriam consideradas injustificadas em
outros contextos de manifestação de pensamento? A primeira resposta é que as crenças religiosas são mais valiosas das demais, em razão de seu caráter
existencial, sendo tutelado algo que diz respeito ao forum internum dos fiéis.25 Tal hierarquização de sensibilidades e valores não convence. Não possui base
constitucional para justificar a escolha de valores "superiores" e merecedores de tutela especial e conflita com o princípio da igualdade.
A segunda resposta afirma que bem protegido é o sentimento religioso e, "de forma secundária", a liberdade de culto26 ou a liberdade "religiosa e de crença"
em combinação com os imperativos do pluralismo político.27
Essa definição personalista do bem jurídico com referência aos titulares dos direitos fundamentais religiosos aparece dogmaticamente problemática, em razão
da configuração destes delitos como de ação pública incondicionada. O contrário ocorre nos crimes contra a honra, onde só se procede mediante queixa do
ofendido (art. 145 do Código Penal brasileiro).28 Ora, se o Estado não tem interesse em perseguir violações da honra individual mesmo quando são
particularmente graves, como a calúnia cometida mediante paga ou promessa de recompensa (pena: detenção de até quatro anos — arts. 138 e 141,
parágrafo único), mas persegue os crimes religiosos com ação pública incondicionada, a explicação só pode residir no fato de que a natureza do bem jurídico
é diferente e, no segundo caso, de interesse estatal.
Além disto, nos crimes contra o sentimento religioso inexistem as possibilidades jurídicas de perdão judicial, de perdão do ofendido ou de retratação previstas
nos crimes contra a honra (arts. 140, §1º, 105, 106 e 143 do Código Penal brasileiro), indicando igualmente o interesse estatal na repressão.
Uma terceira resposta é que nos Estados modernos só pode/deve ser protegida a paz religiosa, intervindo o direito penal para evitar conflitos religiosos, que
costumam ser acirrados. Essa resposta reconhece a despersonalização do bem tutelado no direito positivo e está sendo seguida por muitos doutrinadores
atuais, estando também de acordo com a denominação dos respectivos títulos de muitos Códigos Penais.29
Em nossa opinião, essa abordagem também padece de problemas. Em muitos casos a formulação do fato típico não inclui o elemento de comprometimento da
ordem pública, sendo a ofensa religiosa punível ainda que não tenha ocorrido nenhum conflito social. Além disso, há muitas normas penais e administrativas
tutelando a ordem e tranqüilidade pública, sendo qual for a causa e natureza da ameaça. Por que criar uma norma específica para conflitos de origem
religiosa?30
A quarta resposta sugere a despersonalização do bem jurídico em outra direção. Considera que o direito penal no campo religioso objetiva tutelar o Divino
como valor que deve ser respeitado por todos, independentemente de suas crenças.31 A religiosidade constitui um "valor ético-social", protegido "enquanto
bem em si mesmo", independentemente do indivíduo ou grupo que possa ser vítima da agressão.32 Nessa perspectiva, o valor transcendental do Divino
incorpora-se ao ordenamento jurídico: "theocracy is the only foundation for penalizing blasphemy".33
A tese segundo a qual o Estado tutela o valor da religião como elemento que impõe ordem e disciplina na sociedade é conhecida como
Religionsschutztheorie (doutrina da tutela da religião).34 Encontra-se em pensadores do século XVIII,35 e nos parece a mais convincente.36
Ora, do ponto de vista dos direitos fundamentais, a reivindicação de proibir opiniões que lesam a sensibilidade ou a crença religiosa alheia carece de
fundamento. O Estado constitucional fundamenta-se na promessa de garantir a todos a livre formação, manifestação e mudança de crenças relacionadas ao
Divino. Promete que todos poderão manifestar livremente suas opiniões em âmbito religioso sem serem expostos a sanções ou, inversamente, sem receber um
tratamento privilegiado em razão de suas opções metafísicas. Seria logicamente contraditório considerar que a Constituição deseja também proteger a
negação deste direito, reprimindo determinadas opiniões ou posturas perante o Divino.
Isso significa que, quando o ordenamento jurídico tutela a idéia do Divino, impondo deveres de respeito e imperativos de silêncio, o Estado constitucional
entra em evidente contradição com o princípio da laicidade.37
Essa contradição se explica politicamente. Nos ordenamentos jurídicos que (re)ativam a tutela do Divino, o direito à liberdade de expressão retrocede diante
do medo de reações incontroláveis de minorias religiosas particularmente ativas ou mesmo da maioria religiosa que costuma estar vinculada ao poder político.
Temos vários tipos de aliança entre o poder estatal e as igrejas contra quem questiona a ordem "moral" da religiosidade.38 A liberdade de expressão artística,
elo fraco na cadeia de interesses políticos, só é garantida quando não tiver em jogo interesses políticos prevalecentes...
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Pensando no caso das charges dinamarquesas, as reações causadas em nome da sensibilidade religiosa são devidas à posição social marginalizada dos
imigrantes muçulmanos na Europa, assim como à situação geopolítica das relações entre o Leste e o Oeste, com ênfase no Oriente Médio. Esses fatores
tornam os muçulmanos suscetíveis aos encantos de ideologias políticas reacionárias.
Os mais eficientes antídotos ao fundamentalismo islâmico seriam a integração social eqüitativa dos imigrantes e o abandono das políticas imperialistas no
Oriente Médio. Ambas têm um preço político, ideológico e econômico que as forças políticas dominantes não desejam assumir.39 Em contraste, a liberdade
artística pode sofrer restrições sem tais custos políticos.
A história da arte é uma história de restrições violentas, levadas a efeito não pela ausência de valor artístico, mas pela oposição de uma expressão artística às
preferências estéticas, morais e políticas dos detentores de poder social.40 Por outro lado, a liberdade de expressão, incluindo a artística, não é negociável.
Mesmo não sendo absoluta, nem privilegiada em relação às demais, é um elemento necessário de qualquer sociedade que pretende ser democrática. Os
limites desse direito devem ser buscados no instituto do dano moral, no sofrimento ou na dor que o exercício desta liberdade possa causar a pessoas reais.
Mas a arte deve ser censurada cada vez que alguém se sente moralmente lesado e sofre?
A resposta é negativa. Como afirmou Ronald Dworkin, "em uma democracia, ninguém, independentemente de quão poderoso ou impotente seja, pode ter o
direito de não ser insultado ou ofendido".41 A liberdade de proibir condutas que ofendem ou ridicularizam nossos valores não é apenas um indício de
imaturidade pessoal e política. Constitui uma clara expressão de intolerância. Não há lugar, na democracia, para o direito de não sermos ofendidos, sob pena
de qualquer alegação de ofensa tornar-se obstáculo ao exercício de qualquer liberdade. Uma minoria religiosa não poderia exercer seu culto, caso a maioria
se sentisse ofendida. E vice-versa. Os pensadores e artistas não seriam avaliados pelos seus pares, mas por quem se sente ofendido. Em resumo, em nome do
respeito das convicções sagradas de certa comunidade, a liberdade de expressão, individual e coletiva, seria abolida.
Um professor de direito grego com sensibilidade religiosa fez uma observação que deveria tranqüilizar quem se sente ofendido por expressões artísticas: "Deus
não precisa do apoio de seu ofensor para confirmar a Sua presença e tampouco Ele pode ser considerado como um interesse juridicamente protegido, uma
vez que Ele é o começo e o fim de todos os bens jurídicos protegidos."42
Essa declaração faz eco à notória frase de Ludwig Feuerbach que no século XIX afirmava que Deus não se ofende pelas blasfêmias nem precisa de tutela
penal, sendo única finalidade da repressão penal a tutela de interesses humanos.43
Acrescente-se que, do ponto de vista constitucional, ainda que seja considerada necessária a resposta específica a ofensas de sentimentos religiosos, isso não
justifica automaticamente a criminalização. Antes de admitir sua constitucionalidade deveríamos analisar a adequação e necessidade de uma resposta penal e
não só civil ou administrativa. Não conhecemos análises a esse respeito na bibliografia brasileira.44 Mas a falta de necessidade de intervenção penal a meras
ofensas de sentimentos religiosos parece-nos patente. Observe-se que, em recente relatório, a "Comissão de Veneza" do Conselho da Europa pronunciou-se
claramente contra a criminalização.45
"Pecado, mas não ilícito".46 Para dizê-lo de maneira menos técnica, qualquer pessoa que ofenda a religião por suas palavras ou por meio da arte poderá ir
para o inferno; mas não deve ir para a prisão.47
5 Resolvendo o conflito
Em 2005, um empresário alemão de 61 anos pensou ser uma boa idéia escrever a palavra Alcorão em papéis higiênicos e distribuí-los a jornais e autoridades
religiosas muçulmanas. Aquilo que a maioria deve considerar brincadeira de péssimo gosto ou intervenção artística-política de duvidoso valor custou ao seu
autor uma pena de prisão de doze meses e 300 horas de trabalho comunitário. O réu teve a má sorte de ser julgado em 2006, quando a crise das charges
dinamarquesas estava a pleno vapor. Sob a pressão dos acontecimentos e em face de um protesto oficial da República do Irã, o tribunal alemão se sentiu
obrigado a proferir uma condenação de inusitado rigor.48
Tais condenações resolvem o conflito em favor dos interesses de círculos religiosos (e não a favor da liberdade religiosa, pois a ofensa aos sentimentos
religiosos em nada impede o exercício da liberdade religiosa pelo ofendido).49 Isso não possui justificativa em um Estado constitucional. Expressa a tendência
de reativar os dispositivos que reprimem a blasfêmia, criando um Direito de "tolerância zero", com o propósito de aterrorizar os dissidentes.
Quem fala, escreve ou desenha pode, salvo estritas e exaustivamente justificadas exceções, tratar os símbolos e as idéias religiosas da forma que lhe aprouver.
Nesse sentido está correta a referência jornalística ao "sagrado direito à blasfêmia": "Temos o direito de criticar, negar, satirizar o profeta Maomé e Alá e
Jesus Cristo e Shiva e Buda e Xangô e Jeová e Zeus e toda a imensa fileira de deuses e deusas que a humanidade criou e criará".50
Tanto a representação de Maomé como terrorista, como os pôsteres que estavam à venda alguns anos atrás na Alemanha apresentando um porco
crucificado51 ou a controvertida obra Piss Christ do fotógrafo Andrés Serrano52 são constitucionalmente tutelados, até que seja comprovado o contrário.
Essa prova só pode ser dada no âmbito de um processo judicial e após interpretação constitucional e não nas ruas com ameaças, agressões, homicídios e
destruições.
Décadas antes, a Suprema Corte dos EUA avaliou a constitucionalidade da proibição de projeção do filme Il miracolo, de Roberto Rossellini. O filme
apresentava a triste vida de uma camponesa que pensava ser a Virgem Maria e que havia engravidado de um estranho que ela presumia ser José, expondo-se
ao ridículo e à exclusão.53 De acordo com o diretor, o filme possuía natureza mística e havia sido inspirado pelo cristianismo. Isso não convenceu o Vaticano e
os responsáveis da Igreja Católica em Nova Iorque. Após fortes protestos contra o filme, a Comissão Estatal de Censura considerou o filme como sacrílego,
revogando a permissão de projeção fosse cancelada.54
A Suprema Corte analisou o caso em 1952, decidindo que a Lei estadual que permitia a censura de obras "sacrílegas" e tinha sido utilizada como base da
decisão era incompatível com as previsões sobre a liberdade de expressão na Constituição dos EUA: "Não é de interesse do governo de nossa nação suprimir
ataques reais ou imaginários contra doutrinas religiosas específicas, quer estes ataques apareçam em publicações, quer em discursos ou em filmes".55
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Não há nada de original ou ousado nessa decisão. Um Estado que configura seu sistema constitucional no espírito liberal e pluralista de respeito à liberdade de
expressão e proclama sua neutralidade religiosa não pode se intrometer em disputas de pessoas e grupos sobre sensibilidades metafísicas. É suficiente
respeitar claros limites legais relacionados à tutela da honra e da reputação de pessoas e grupos religiosos, com mecanismos de indenização e, se for
necessário, de tutela penal. Nos demais casos de conflitos entre opiniões e posturas, o Estado não deveria interferir na esfera privada, dizendo às pessoas o
que elas podem dizer.
Por outro lado, a decisão jurídica e politicamente irritante do Tribunal alemão no caso do Alcorão parece condizente com o senso comum que exige "respeito"
em assuntos religiosos. Um homem que transforma textos sagrados de uma religião em papel higiênico talvez não mereça a prisão. Mas, certamente, deve ser
repreendido. Sabemos que certas coisas não devem ser ditas ou escritas. Esta afirmação enfraquece o liberalismo absoluto e a teoria de total abstenção
estatal, ao indicar a necessidade de estabelecer linhas divisórias e de produzir argumentos para justificá-las. Ao denunciar a censura em geral, o liberalismo
falha em se engajar na discussão sobre quem é responsável por estabelecer limites e em quais bases.
A Suprema Corte dos EUA afirmou que: "A Constituição diz que o Congresso (e os Estados) não podem tolher o direito à liberdade de expressão. Este
preceito quer dizer o que diz. Nós o lemos adequadamente, de forma a possibilitar a regulação razoável das atividades relacionadas à expressão em
circunstâncias cuidadosamente restritas".56 Essa afirmação mostra a impossibilidade do liberalismo absoluto. Mas por que a Corte não determina quando se
tolhe a liberdade de expressão? Quais os critérios para definir o que é "razoável" e quais as "circunstâncias cuidadosamente restritas" da censura?
O estudo comparativo indica diferenças significativas no grau e nas exigências de proteção dos sentimentos religiosos contra a blasfêmia.57 Não há mais
normas endereçando aos blasfemos a ameaça de terem suas línguas e lábios furados, como estipulado por Luis IX, em 1263,58 ou sua língua e mãos
amputadas, como previa a Constitutio Criminalis Theresiana, legislação penal criada na Áustria pela imperatriz Maria Theresia em 1768.59 A secularização
gradual levou a uma retirada do crime de blasfêmia.60
Apesar disso, a proibição da ofensa ao divino por palavras ou pela arte ainda se aplica a muitos países, que chegam a reconhecer o divino como valor
legislativo-constitucional.61 Para citar um exemplo, se aceitarmos o raciocínio da Corte Européia de Estrasburgo de que a proibição da projeção de obra
cinematográfica que escandalizaria a esmagadora maioria católica dos habitantes do Tirol62 almeja proteger a paz religiosa e a honra dos ditos católicos,
deveríamos também proibir qualquer atividade capaz de incomodar terroristas, com vistas a prevenir suas reações violentas! Em outras palavras, para
satisfazer a vontade de uma pessoa sensível (que, no caso, compraria ingresso para ser escandalizada!), deveríamos limitar o exercício de uma série de direitos
fundamentais e penalizar a dissidência.
Em termos de teoria dos direitos fundamentais, a decisão transforma os direitos fundamentais enquanto imperativos de abstenção estatal na esfera individual da
liberdade em obrigação de intervenção estatal nesses direitos. A Corte apresenta a liberdade religiosa dos católicos como obrigação de respeitar os católicos,
sob a ameaça de punição pública, revertendo, assim, os papéis dos indivíduos e do Estado.63 6 Observações conclusivas
A religião e a arte coexistem em condições de tensão. Os artistas reivindicam uma amplíssima liberdade de criação e os religiosos exigem respeito de suas
crenças sagradas. Em ambos os casos temos direitos que parecem exceder a liberdade de manifestação do pensamento com suas múltiplas limitações. Como
encontrar soluções?
Não há dúvida de que a melhor solução encontra-se no debate público, racional e democrático entre os interessados, evitando a judicialização e os conflitos
violentos.64 Mas como conseguir soluções consensuais e pacíficas nesse campo minado?
No ponto de encontro entre direito e política, não é suficiente fazer opções liberais para defender a liberdade de expressão artística contra ameaças
fundamentalistas. Exige-se um posicionamento teórico e ideológico de resistência-oposição às relações de poder e às autoridades públicas que impõem a
devoção pública e intimidam quem reflete de maneira desagradável sobre o "Divino".
O imperativo liberal da incondicional liberdade de expressão, artística e não, não leva em consideração essa dimensão de poder. Por isso não pode indicar
critérios de censura. Não faz sentido ser favorável à liberdade de expressão apenas como uma questão de princípio. Só podemos ser contrários a estruturas
específicas de poder que oprimem certos tipos de discurso em certos contextos. Em outras palavras, o ponto essencial da proibição das ofensas aos
"sentimentos" religiosos e da proteção da liberdade de expressão artística reside no antagonismo entre forças políticas. O resultado está indefinido...
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1O
texto desenvolve análises apresentadas no artigo: "Art can legitimately offend", publicado no volume: Venice Commission (org.). Tackling blasphemy,
insult and hatred in a democratic society. Strasbourg: Council of Europe, 2008, p. 265-272. Agradecemos o Professor Pedro Buck Avelino que,
gentilmente, traduziu a versão inicial.
2 Histórico em: <http://en.wikipedia.org/wiki/Jyllands-Posten_Muhammad_cartoons>; cf. os comentários em Grimm, 2009.
3 Histórico em: <http://en.wikipedia.org/wiki/The_Satanic_Verses_controversy>.
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4 Cf. as reflexões de especialistas internacionais em: Venice Commission (org.), 2008.
5 Sobre esse conceito Dimoulis; Martins, 2007, p. 136-141.
6 Essa tese é defendida em Tsakyrakis, 2006, p. 187-214, que afirma: "a arte nunca é obscena" (p. 207).
7 Cf. nota de rodapé 9.
8 Pieroth; Schlink, 2008, p. 153.
9 Alguns
autores acrescentam o critério subjetivo, considerando decisiva a intenção do criador (Tsakyrakis, 2006, p. 218-219). Esse critério exclui a
possibilidade de controle, ainda que mínimo, da liberdade artística, levando ao absurdo jurídico de termos um direito fundamental com área de proteção
definida pelo seu titular. Por detrás dessa abordagem encontramos o equívoco de que o Estado não deveria julgar o que é arte. Ora, se o Estado através da
Constituição decide proteger a expressão artística, como negar-lhe a possibilidade de defini-la? Não se pergunta, nesse contexto, ontologicamente o que "é"
arte, mas o que determinado ordenamento jurídico protege como tal. Por mais amplos que sejam os critérios escolhidos para delimitar o conceito jurídico da
"arte", cabe ao Estado estabelecê-los.
10 Pieroth; Schlink, 2008, p. 153.
11
Cf. a jurisprudência do Tribunal constitucional federal alemão : Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts, v. 67, 213 (225). Fonte:
<http://www.servat.unibe.ch/dfr/bv067213.html"Rn002>.
12 <http://en.wikipedia.org/wiki/Fitna_(film)>.
13
"A liberdade de expressão constitui uma das fundações essenciais de nossa sociedade, uma das condições básicas para o seu progresso e para o
desenvolvimento de todo e qualquer homem. De acordo com o art. 10-2, é aplicável não apenas a `informações' ou `idéias' que são recebidas de maneira
favorável, reputadas inofensivas ou tratadas de maneira indiferente, mas abrange também aquelas que ofendem, chocam ou perturbam o Estado ou qualquer
setor da população. Tais são as exigências do pluralismo, da tolerância e do espírito aberto, sem os quais não há `sociedade democrática'". CEDH,
H a n d y s i d e v s . R e i n o U n i d o , 7-12-1976, n. 49. Fonte: <http://cmiskp.echr.coe.int/tkp197 view.asp?action=html&documentId=
695376&portal=hbkm&source=externalbydocnumber&table=F69A27FD8FB86142BF01C1166DEA398649>. No mesmo sentido o Tribunal
constitucional federal alemão: Entscheidungen des Bundesverfassungsgerichts, v. 93, 266 (289). Fonte: <http://www.servat.unibe.ch/dfr/bv093266.html>.
14
O imame da Universidade Al-Azhar de Cairo sugeriu que os líderes religiosos redigissem uma lei com validade internacional para reprimir ofensas ao
sentimento religioso (Charim, 2007, p. 25).
15 Este caso motivou a publicação de uma coletânea de estudos, incluindo uma detalhada lista de casos de censura de obras de arte na Grécia: Ziogas et al.
(orgs.), 2008.
16
Cf. o levantamento da legislação vigente e da prática de aplicação em diversos países europeus em Venice Commission (org.), 2008, p. 61-248; cf.
Dartevelle et al. (orgs.), 1993 e o panorama histórico em Levy, 1995.
17 Art. 40.6.1.i: "The publication or utterance of blasphemous, seditious, or indecent matter is an offence which shall be punishable in accordance with law".
Art. 44.1: "The State acknowledges that the homage of public worship is due to Almighty God. It shall hold His Name in reverence, and shall respect and
honor religion". Fonte: <http://www.oefre.unibe.ch/law/icl/ei00000_.html>.
18<http://www.irishstatutebook.ie/plweb-cgi/fastweb?state_id=1238311054&view=ag-view&numhitsfound
=1&query_rule=%28%28$query3%29%29%
3Alegtitle&query3=Defamation%20act&docid=27527&docdb
=Acts&dbname=Acts&dbname=SIs&sorting=none&operator=and&TemplateName=predoc.tmpl&setCookie=1>.
19
Supreme Court, Corway vs. Independent Newspapers (Irland) Ltd, 1999, citada em: Venice Commission (org.), 2008, p. 91, 199. Há também propostas
de secularizar a Constituição, eliminando a referência da Constituição à blasfêmia (Venice Commission (org.), 2008, p. 202-203).
20 Venice Commission (org.), 2008, p. 193-198.
21
High Court, Ex parte Choudhury, 9-4-1990. Acórdão reproduzido em Dartevelle et al. (orgs.), 1993, p. 93-99.
22
" The offences of blasphemy and blasphemous libel under the common law of England and Wales are abolished". Fonte:
<http://www.opsi.gov.uk/acts/acts2008/ukpga_20080004_en_17"pt12-l1g154>.
23
Corte costituzionale, Sentença, n. 508 de 20.11.2000. Fonte: <http://www.giurcost.org/decisioni/2000/0508s-00.html>.
24
CEDH, W i n g r o v e v s . R e i n o U n i d o , S e n t e nça de 25.11.1996; <http://cmiskp.echr.coe.int/tkp197/view.asp?
item=1&portal=hbkm&action=html&highlight=Wingrove&sessionid=21367018&skin= hudoc-en>.
25 Alivizatos, 2008, p. 255-258.
26
Jesus, 2005, p. 69; Prado, 2006, p. 155.
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27 Franco; Silva, 2007, p. 982.
28
Há exceções no caso de emprego de violência que causa lesão corporal e nas ofensas contra chefes de governo ou funcionários públicos (art. 145). Ambas
são devidas ao fato de serem lesados bem além da honra individual.
29 Schilling, 1966, p. 110-115,
30
157-178; Perrière, 2007, p. 74; Grimm, 2009, p. 177, 186.
Crítica detalhada da teoria que considera a paz religiosa como bem jurídico tutelado pelas normas de tutela religiosa em Pawlik, 2007, p. 40-46.
31 Alguns autores optam por respostas ecléticas. Noronha (1988, p. 41) afirma que o bem jurídico protegido é duplo: a liberdade de religião
da vítima e a
religião enquanto valor protegido pelo Estado.
32
Exposição de motivos do Código Penal brasileiro (4.11.1940), n. 68.
33 Sarafianos, 2008, p. 292.
34 Schilling, 1966, p. 118.
35 Indicações bibliográficas em Schilling, 1966, p. 118-120; Pawlik, 2007, p. 34.
36 Dimoulis, 2000, p. 24-28; Sarafianos, 2008, p. 292; Tsapogas, 2008, p. 294-296.
37 Lorea (org.), 2008.
38 Tsapogas, 2008, p. 298.
39 Cf. as reflexões em Charim, 2007, p. 28-33.
40 Cf. a oportunamente comentada coletânea de obras plásticas "blasfematórias" em Plate, 2006.
41 Dworkin, 2006; cf. as reflexões de Rothenburg, 2006.
42
Kostaras, 2005, p. 428.
43 Apud Pawlik, 2007, p. 33.
44
Uma análise crítica dos crimes contra o sentimento religioso não problematiza sua constitucionalidade nem a afirmação de que protegem a liberdade de
crença (Franco; Silva, 2007, p. 978-985).
45 Relatório adotado na 76ª
sessão plenária em 2008: Venice Commission (org.), 2008, p. 33.
46 Rothenburg, 2006, p. 16.
47 Isensee, 2007, p. 116; Sarafianos, 2008, p. 292.
48 Lenhard, 2006, p. 21.
49 Cf. Pawlik, 2007, p. 56; Perrière, 2007, p. 75; Isensee, 2007, p. 119.
50 Petry, 2006.
51 <http://www.punk.de/ladnak.html>.
52 <http://en.wikipedia.org/wiki/Piss_Christ>.
53 Sobre o conteúdo do filme, cf. <http://www.imdb.com/title/tt0040092>.
54
Supreme Court, Joseph Burstyn Inc. v. Wilson, 343 U.S. 495. Fonte: <http://supreme.justia.com/us/343/495/case.html>.
55
Supreme Court, Joseph Burstyn Inc. v. Wilson, 343 U.S. 505. Fonte: <http://supreme.justia.com/us/343/495/case.html>.
56
Supreme Court, Tinker et al. v. Des Moines 393 U.S. 513. Fonte: <http://caselaw.lp.findlaw.com/scripts/getcase.pl?court=US&vol=393&invol=503>.
57 Schilling, 1966; Levy, 1995; Cabantous, 1998; Hildesheimer, 1989.
58 Cabantous, 1998, p. 58.
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59 Pawlik, 2007, p. 31.
60 Cabantous, 1998, p. 150-152; Levy, 1995, p. 522-533.
61 Referências em Hildesheimer, 1989, p. 63-64.
62 Otto-Preminger-Institut, 20.9.1994, n. 56, Revue trimestrielle des droits de l'homme
1995, p. 464.
63 Rigaux, 1995.
64 Cf. Perrière,
2007, p. 86.
Informações bibliográficas:
Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado
da seguinte forma:
DIMOULIS, Dimitri; CHRISTOPOULOS, Dimitris. O direito de ofender. Sobre os limites da liberdade de expressão artística. Biblioteca Digtal Revista
Brasileira de Estudos Constitucionais - RBEC, B e l o H o r i z o n t e , a n o 3 , n . 1 0 , p . 4 9-65, abr./jun. 2009. Disponível em:
<http://www.editoraforum.com.br/bid/bidConteudoShow.aspx?idConteudo=57990>. Acesso em: 24 março 2010.

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