Acesse - 60 anos Alstom Brasil
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Edição Especial Alstom 60 anos de Brasil Alstom 60 anosPrefácio de Brasil “Vamos contar o nosso lado da história” Caros e caras, Em 2015 temos a honra de celebrar 60 anos de presença no Brasil. Desde 1955, quando foi constituída a Mecânica Pesada, nossa primeira unidade na cidade de Taubaté (SP), e ao longo desses anos, assumimos um compromisso com o Brasil: o de apoiar o desenvolvimento da infraestrutura local, com projetos de energia elétrica e mobilidade urbana. Foram 60 anos de inovação, projetos pioneiros, tecnologia de ponta e realizações de sonhos profissionais e pessoais. Hoje estamos em 15 unidades presentes nos quatro cantos do Brasil, trabalhando dia após dia para levar desenvolvimento aos brasileiros, por meio do trabalho de mais de 5.500 funcionários. Esses anos foram marcados por projetos que mudaram a infraestrutura do Brasil, como as usinas Itaipu, Tucuruí, Santo Antonio, Jirau, Belo Monte, Termelétrica Celso Furtado (Termo Bahia) e Termelétrica Governador Leonel Brizola (Termo Rio). Tivemos também a grande expansão dos parques eólicos, especialmente no Nordeste e no Sul do Brasil, e onde assinamos a maior parceria do mercado onshore em um único país. Outro ponto de destaque nesses últimos anos foram os contratos de transmissão de energia, como o de uma estação conversora bipolo de corrente contínua de alta tensão para a maior linha de transmissão do mundo, conhecida como Linhão do Madeira. Além disso, ajudamos a transportar milhões de pessoas com os nossos fornecimentos aos metrôs de São Paulo, Distrito Federal, à SuperVia, no Rio de Janeiro, à Trensurb, no Rio Grande do Sul, entre tantas outras contribuições essenciais aos sistemas de transporte que temos. 3 Também foi aqui no Brasil que inauguramos nosso primeiro Centro Global de Tecnologia da América Latina com foco em hidrelétricas, onde construímos nossa primeira fábrica de Veículos Leves sobre Trilhos da região, onde abrimos nossas três unidades do segmento eólico, onde adquirimos negócios importantes em transmissão de energia, e assim comprovamos que sempre apostamos no futuro. Hoje, convido você a participar dessa história de vida com a Alstom. Nas próximas páginas você saberá um pouco como chegamos até aqui, como ajudamos a escrever a história da infraestrutura nacional e como podemos ainda levar essa história adiante com muito comprometimento, seriedade, ética e paixão pelo que fazemos. Boa leitura! Marcos Costa Presidente Acesse o site www.60anosAlstomBrasil.com.br para ter acesso a informações, fotos, vídeos e histórias de quem participou desses 60 anos. Se quiser participar dessa comemoração, publique uma foto em seu Instagram com a #60anosAlstomBrasil. As imagens devem estar relacionadas a nossos setores de atuação ou à sua historia com a empresa. por Roberto Rockmann Alstom 60 anos de Brasil 5 festa de Natal dos funcionários da Schneider, na França, teve sabor especial em 1955. Aproveitando a ocasião, o empresário Charles Schneider fez um anúncio: em pouco tempo, menos de dois anos, seria erguida, do nada, uma unidade industrial no Brasil, no interior de São Paulo. Passadas as festas de fim de ano, foi aberto o processo de seleção para os interessados em trabalhar nesse novo projeto, e aos selecionados oferecido um curso de preparação. Não havia tempo a perder. A tarefa de construir uma indústria pesada no Brasil era gigantesca. Com 35 mil habitantes, Taubaté, SP, era, em 1955, um retrato do Brasil. Algumas pequenas fundições, duas laminadoras e uma tecelagem tentavam dar um ar mais industrial para a cidade, mas as fazendas de café continuavam sendo o motor da economia. Inaugurada em 1951, a Via Dutra, que ligava São Paulo à capital federal, então Rio de Janeiro, ainda era uma rodovia de pista simples e em alguns trechos não havia asfalto. Atrair a indústria pesada sempre tinha sido idéia de Juscelino Kubitschek, o JK, desde os tempos de governador de Minas Gerais, no início da década de 50. Em vez de pequenas manufaturas, o país teria de pensar maior, ter grandes siderúrgicas, petroquímicas e aumentar a participação no comércio mundial, restrita na época a escassos 0,5%. Criada essa base, viriam equipamentos e veículos. Investir em infraestrutura também seria fundamental, já que sem estradas e energia não haveria pro-dução. Nesse processo, Estado e iniciativa privada teriam de juntar forças. Participar da construção industrial do Brasil era uma oportunidade que estava aliada à visão de Schneider de investir no exterior. O pós-guerra tinha mudado os ares na Europa e na França, que assistiam ao fortalecimento do Estado e à encampação de empresas privadas Juscelino Kubitschek, por regimes de esquerda. presidente da República ao lado de Charles O investimento da SchneiSchneider quando do lançamento da pedra fundamental da Mecânica Pesada. 1956. der no Brasil não era novidade, nem Alstom 60 anos de Brasil 6 seus laços com Juscelino. Em 1947, tinha sido criada a Bracorep, um escritório de representação dos negócios da empresa no país. Um ano depois, Charles e sua esposa, Liliane, puderam confirmar os relatos apaixonados feitos pelo irmão do empresário, Jean Schneider, que anos antes estivera na América do Sul implantando linhas aéreas na região. Praias, mar azul, muito verde, cidades que começavam a crescer e um povo carinhoso e hospitaleiro. Três anos depois, Schneider se encontrava com o então governador mineiro Juscelino Kubitschek em Saint Tropez e recebia uma sugestão: por que não investir em uma fábrica no Brasil? A idéia foi bem recebida, e uma pequena fundição na cidade de Caeté, perto de Belo Horizonte, foi construída. A parceria do empresário francês com JK deu certo e se esperava, pelos dois lados, que pudesse ser ampliada. Em maio de 1955, chegou à Comissão de Indústria Pesada, organizada pelo governo federal, um dossiê sobre os planos de construção da Mecânica Pesada (MEP) em Taubaté. A escolha do município e o planejamento da fábrica seriam feitos sob o modelo implementado pela Schneider na França. A cidade paulista estava entre o Rio de Janeiro e São Paulo, localizava-se próxima ao rio Paraíba, abrindo a oportunidade de se utilizar o transporte fluvial. Havia uma rodovia ao lado, e uma estrada de ferro. Tudo muito semelhante ao que fora feito em Chalon sur Saône, na Borgonha, pela Schneider. Construir uma unidade industrial demandaria investimentos externos e necessitaria de financiamento interno. No dossiê entregue ao governo, frisava-se a importância de que o BNDE (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico), criado em 1952 e já um importante instrumento para viabilizar projetos nacionais, pudesse apoiar o projeto. Meses depois, quando foi aprovado pelo governo, acertou-se a compra de uma velha fazenda de café que ficava na estrada para Quiririm. Não havia nada ao redor, apenas árvores e cafezais. Chegava-se ao terreno de carro ou caminhão por uma estrada de terra pequena e que ficava alagada com facilidade no verão. A vitória de JK nas eleições presidenciais, em novembro de 1955, cristalizou e acelerou a decisão de Schneider de ter uma unidade industrial no Brasil. Era o aval definitivo que o BNDE apoiaria a Mecânica Pesada. O governo tinha atenção especial no projeto, que seria observado de perto por investidores internacionais. Bem-sucedido, o fluxo de recursos internacionais ao Brasil poderia aumentar. Para crescer, capitais Alstom 60 anos de Brasil 7 privados internos e externos eram fundamentais. No dia 28 de novembro, na avenida Rio Branco, 81, 21º andar, no Rio de Janeiro, a direção da Schneider se reunia para a assembléia de constituição do capital da empresa: pouco mais de 60% estava nas mãos do grupo francês, 15% em seguradoras e o restante em diversos acionistas. Ao voltar para a França, para as festas de fim de ano, Schneider informou a seus funcionários os seus planos. Era preciso correr. Complexas, as tarefas envolviam a criação de mercado, desenvolvimento de tecnologia própria, para que um dia se reduzisse a dependência em relação à matriz, e formação de parcerias com fornecedores locais. Na França, uma equipe de operários e chefes era preparada com aulas de administração e aprendizagem das técnicas mais novas de produção industrial. No Brasil, funcionários franceses faziam pedidos de compras para a Mecânica Pesada. O arquiteto Jacques Pilon ajudava a obter o aval de construção com a prefeitura de Taubaté, fechava contratos com a Sociedade Comercial e Construtora para obras das fundações do galpão e construção de caixas d´água, e, em 19 de junho de 1956, era fechado acerto com a Estacas Franki. Em 8 de outubro de 1956, Taubaté viveu um momento histórico. O governador paulista, Jânio Quadros, e o presidente Juscelino Kubitschek participavam ao lado de Charles Schneider e de Liliane Schneider da cerimônia de lançamento da pedra fundamental da Mecânica Pesada, o primeiro investimento externo atraído no setor pelo Plano de Metas de JK. O presidente aproveitou a ocasião para, em seu discurso, ilustrar aquele dia: “É com o maior prazer que neste instante saúdo o grupo francês que vem colaborando conosco na obra do nosso desenvolvimento industrial. Charles Schneider, que conheci em Minas Gerais, como governador, aqui está conosco e só isto é garantia de que empreendimentos desta natureza virão em breve mudar a fisionomia industrial do Brasil. Os votos que eu formulo nesta hora são para que os capitais estrangeiros, técnicos estrangeiros e, sobretudo, mestres de indústrias – como Charles Schneider – venham para o Brasil colaborar conosco e ajudar-nos no nosso desenvolvimento, que fará desta nação, em poucos anos, uma das maiores expressões da riqueza mundial”. Além da construção, trabalhava-se em três frentes: mão-de-obra, máquinas e encomendas. Em 23 de julho de 1957, após viagem de 24 Alstom 60 anos de Brasil 8 horas, Henri Bideaux, um dos primeiros trabalhadores franceses especializados, chegava ao Brasil, em Taubaté. Entusiasmado pela oportunidade de trabalhar em uma terra distante, antes de viajar, Bideaux passou por um estágio de um ano em Creusot, onde a família Schneider começara a construção de um império industrial. Para colocar de pé a produção, seria necessário contar com um corpo técnico experiente. Não existia mão-de-obra especializada nem na cidade, nem no Brasil. Em 1955, menos de 5% dos bens de capital usados no Brasil eram fabricados localmente. Um exemplo podia ser verificado nas ruas: os pouco mais de 300 mil veículos eram quase todos importados. O café representava 60% das exportações brasileiras, e a indústria respondia por menos de 20% do PIB, então de US$ 12 bilhões. Boa parte dessa mão de obra viria da França. Bideaux contaria com o auxílio de outros 25 técnicos das mais diferentes nacionalidades (espanhóis, italianos, gregos, entre outros), que tinham experiência em usinagem, fabricação e montagem de peças – conhecimentos adquiridos em passagens pelas unidades da Schneider na França. Essa transferência de tecnologia era um passo fundamental para o fortalecimento da empresa no Brasil. Faltava compor a outra parte do pessoal da Mecânica Pesada, que viria do Brasil, até para que no futuro a empresa reduzisse sua dependência da matriz. Buscavam-se interessados nas fazendas, nas mecânicas de carros e bicicletas, em fundições. “Não havia exame de seleção. Faziam-se perguntas e percebia-se pelas respostas se o candidato tinha bom senso, aptidão para o trabalho industrial e se conhecia o trabalho em grupo. Víamos se eles sabiam ler e escrever e se eram honestos”, recorda-se Bideaux. “Muitos candidatos vieram das fazendas, nunca tinham visto ferramentas, tornos. Como não falávamos português, precisávamos mostrar o que cada um tinha de fazer usando mímica ou pegando nas mãos de cada um deles.” Os poucos mais de 200 operários e técnicos estrangeiros e brasileiros teriam à disposição máquinas novas vindas da França, como a fresadora Gambin, e máquinas velhas já desatualizadas, que tinham sido deixadas de lado na França. Enquanto os últimos detalhes eram arrumados, a Mecânica Pesada assistia a um mercado ainda incipiente: a primeira encomenda, recebida em 30 de junho de 1957, vinha da Siderúrgica Belgo Mineira, mas o futuro ainda oferecia obstáculos. “O Brasil era mais agrícola que industrial, e o mercado ainda era muito restrito”, diz Jean Alstom 60 anos de Brasil 9 Karmazin, outro técnico vindo do exterior para ajudar os brasileiros. O que produzia a Mecânica Pesada nesses primeiros anos? A fabricação de betoneiras, que no início da década de 60 chegaria a mais de 400 máquinas por mês, era um dos principais carros-chefes da empresa. A criação da Petrobras em 1955 tinha aberto a possibilidade de fornecimento de tubos para a indústria petroquímica, ao mesmo tempo em que as siderúrgicas, impulsionadas pelo Plano de Metas, aumentavam seus pedidos. Máquinas para indústrias de papel e comportas para usinas hidrelétricas da Cemig também faziam parte da carga da Mecânica Pesada nesses primeiros anos. Para dar conta das encomendas, novos equipamentos chegavam a Taubaté. Eram instalados fornos para reaquecimento de chapas e peças grandes, e novas ferramentas para calderaria. Não era para menos. Logo chegariam os pedidos para as usinas de Três Marias e Paulo Afonso. A Mecânica Pesada iniciava sua participação na expansão do Brasil. Com os primeiros pedidos, o cenário ao redor da fábrica ganhava novos contornos com a construção de um alojamento, conhecido depois como guest house, que poderia abrigar a família Schneider ou os diretores que viessem a Taubaté. Um clube de esportes para os funcionários era criado. As duas obras visavam um objetivo comum: unir os empregados, para que as diferenças existentes, como as de nacionalidade, não se transformassem em obstáculos. “A cada ano, o casal Schneider fazia questão de vir ao Brasil para um churrasco em Taubaté. Isso criava um clima de muito carinho, ainda mais que a indústria era pequena”, afirma Karmazin. O clima foi abalado na primeira semana de agosto de 1960, quando chegou a Taubaté a notícia de que Charles Schneider havia falecido. Dúvidas surgiram na cabeça de funcionários franceses e brasileiros. Haveria alguma mudança nos rumos da empresa? O comando da Schneider nos quatro cantos do mundo seria dividido entre Liliane Schneider e conselheiros. Executivos franceses e alguns funcionários que tinham ajudado na criação da Mecânica Pesada voltaram para a França, enquanto outros como Bideaux, Karmazin, René Chenevet e Henri Douhéret continuaram. Nesse período conturbado, os funcionários da Mecânica Pesada suavam a camisa para atender os pedidos. Mario Menichetti – italiano Alstom 60 anos de Brasil 10 recrutado em São Paulo anos antes – lembra-se de ter sido, por volta dessa época, que ajudou na montagem da primeira turbina com palhetas móveis, para a Hidrelétrica de Pato Branco, no Paraná. “Fazia-se de tudo nessa fábrica, o desafio de manter a Mecânica não era fácil”, afirma Menichetti. Eram tempos em que as turbinas eram fabricadas na França. O clima de incerteza, desde a morte de Schneider em 1960, foi alterado em 1963 com uma notícia. O grupo alemão MAN se unia à francesa Schneider e passava a deter cerca de 30% do capital da unidade de Taubaté. A vinda de recursos de uma das maiores fabricantes de motores marítimos a diesel do mundo trazia como novidade para os brasileiros a possibilidade de participar da expansão da indústria naval local, que passava a receber grandes incentivos do governo. Técnicos alemães vieram ao Brasil para transferir tecnologia para a unidade de Taubaté. Abria-se a oportunidade de um maior intercâmbio de funcionários, tanto na área naval quanto na área de energia elétrica. “Para que aumentássemos nosso conhecimento, éramos enviados para estágios na Europa regularmente”, diz Menichetti. Não demorou muito. Em 1965, na comemoração dos dez anos da Mecânica Pesada, o então ministro de Minas e Energia, Mauro Thibau, participava da celebração acionando, pela primeira vez no Brasil, um motor marítimo de 4.800 HP a diesel, cujo índice de nacionalização atingia 60%. Pouco mais de 800 funcionários, quatro vezes mais que o quadro do início, assistiam à cerimônia. Havia motivos para festejar, para frisar os desafios vencidos, mas também para apontar as dificuldades futuras. Em discurso, o diretor da MEP, João Pedro Gouveia Vieira, ressaltou o pulso firme de madame Schneider, que, mesmo após a morte do marido, manteve a decisão de continuar apostando na economia brasileira. “A decisão de manter a empresa foi salutar, corajosa e acertada, apesar dos problemas criados com o processo inflacionário.” Gouveia Vieira relembrou o difícil início da Mecânica Pesada que, para prosperar, precisava do aumento do parque energético, siderúrgico, petroquímico e de outros setores da indústria, e que só aos poucos foi se consolidando com o aumento do mercado. Em dez anos de existência, forneceu os alto-fornos, equipamentos para siderúrgicas e mais de 30 comportas de usinas hidrelétricas. Havia encomendas futuras, dizia o diretor da MEP. Outros seis motores marítimos a diesel, três para o Lloyd Brasileiro, três para o Estaleiro Mauá, seriam fabricados nos galpões da Mecânica Pesada. Na área de energia Alstom 60 anos de Brasil 11 elétrica, a criação da Cesp abria caminho para que a MEP pudesse fornecer equipamentos para as hidrelétricas de Jupiá e Ilha Solteira, contando com tecnologia da BVS, que mais tarde passaria a ser a da Neyrpic. Para atender essas encomendas e com a indicação de que sairia do papel a Hidrelétrica de Marimbondo, que teria mais de 1.000 MW, a Mecânica Pesada fez um esforço para se reequipar e dobrar sua produção. Mas sem uma administração eficiente de recursos e com uma política de investimentos muito dispersa – a empresa participaria até da construção de escadas rolantes para o aeroporto internacional do Rio de Janeiro, o que seria sua primeira e única incursão nesse universo – a empresa entrou na década de 70 em uma difícil situação financeira. O que estava difícil ficaria mais complicado. No início da década de 70, o choque do petróleo pegava em cheio as finanças de muitas empresas no mundo inteiro. Nessa época, o grupo Creusot-Loire passava a controlar a Mecânica Pesada. A matriz tinha um cenário desafiador pela frente: redução de custos e aumento da rentabilidade em todo o mundo. Para o Brasil, a notícia não era boa. Os rumores que chegavam a Taubaté indicavam que a fábrica, que completaria 20 anos, em 1975, estava sob o fio da navalha. Ao ser convidado para assumir a direção da Mecânica Pesada, Mauro Thibau viu que, para fortalecer a unidade, era necessário um empresário que pudesse dedicar tempo integral à MEP. Ele próprio não preenchia esses requisitos. Naquele momento, o ex-ministro de Minas e Energia dividia seu tempo no conselho de diversas empresas, como Saint Gobain e Cimentos Mauá. Thibau aceitava ser o presidente do Conselho, criado em 1975, mas um outro executivo teria de tocar o dia-a-dia. Quando René Vergne chegou à direção em 1975, pôde verificar in loco a situação da empresa. As encomendas no setor elétrico não rendiam dinheiro para a matriz e apenas o setor de motores navais conseguia algum resultado positivo. Durante 20 anos de existência, em meio ao desenvolvimento do mercado brasileiro, a empresa tinha colecionado muitos prejuízos para seus acionistas estrangeiros. Nos bastidores, a conversa era de que as contas não fechavam e que a beira do abismo estava próxima. Sobre a mesa de negociação havia duas possibilidades, ou fechava-se a unidade de Taubaté, abandonando de vez a experiência de ter uma fábrica no Brasil, ou a ajudava para que pudesse se reerguer financeiramente. Havia motivos para continuar. O Brasil da segunda me- Alstom 60 anos de Brasil 12 tade da década de 70, sob o impulso do I e do II Plano Nacional de Desenvolvimento, projetava investir pesadamente em infraestrutura. Grandes usinas hidrelétricas saíam do papel e um programa para incrementar a indústria naval brasileira estava deixando de ser promessa. Com uma administração eficiente e um aval do grupo na França, a Mecânica Pesada poderia reverter o quadro. “Conseguimos que nos fosse dado esse aval, e já em 1977 foi possível distribuir dividendos relativos a três anos de trabalho. Os bons resultados vieram principalmente do setor naval que estava em ritmo forte. A Mecânica Pesada começava a ganhar dinheiro”, afirma Vergne. Para a virada se consolidar, faltava abocanhar o contrato da usina de Itaipu. Com ele, o cenário seria outro. No segundo semestre de 1974, um acampamento pioneiro tinha sido montado às margens do rio Paraná para trazer técnicos para a construção daquela que seria a maior usina hidrelétrica do mundo, contando com turbinas superiores a 700 MW, somando uma capacidade total superior a 10 mil MW. As primeiras máquinas começaram a trabalhar no local sob as ordens de empreiteiras e engenheiros, cuja tarefa era imensa, semelhante aos números que envolveram a construção. Só o concreto utilizado para a obra seria suficiente para construir 210 Estádios do Maracanã, enquanto o ferro e o aço usados equivaleriam a mais de 300 Torres Eiffel. Enquanto a parte de construção civil da obra deslanchava, fabricantes de máquinas e equipamentos se preparavam para participar da obra. A concorrência, que traria diversas empresas de todos os cantos do mundo, implicou a formação de consórcios interessados no maior projeto do mundo. Havia o Ciem (Consórcio da Indústria Eletromecânica), que reunia tanto empresas brasileiras como, em alguns casos, suas matrizes. Integravam-no a Mecânica Pesada, Bardella, Brown Boveri, Siemens, Voith, Creusot-Loire e Alsthom-Atlantique. Outro grupo era formado pela Dominion Engineering Works, encabeçado pela General Electric, que já tinha participado da construção de turbinas superiores a 500 MW em uma hidrelétrica nas cataratas do Niágara. Por fim, o consórcio que agregava a Coemsa, Westinghouse Electric, Hitachi, Tókio, Mitsubishi, CBC Brasil e GIE Itália. O desafio sobre a mesa era que o índice de nacionalização de peças fosse o maior possível, podendo ultrapassar 80%. As empresas de bens de capital brasileiras começaram a investir pesado para mostrarem Alstom 60 anos de Brasil 13 que a fabricação local de turbinas e geradores poderia chegar a 85%. Itaipu não era um pedido qualquer, era a chance de o Brasil dar um grande passo no mercado internacional hidrelétrico. “Com a encomenda, o Brasil partiria na frente dessa corrida e, no futuro, se tornaria um centro de excelência mundial”, diz Thibau, na época presidente do Conselho da Mecânica Pesada. Os argumentos vinham de todos os consórcios e as pressões chegavam de todos os cantos do mundo. Enquanto esperavam uma decisão do governo, executivos da Mecânica Pesada davam a partida em uma série de novos investimentos na fábrica de Taubaté, para que ela pudesse dar conta caso o pedido de Itaipu fosse confirmado. Em 1977, era inaugurado o pavilhão pesado de usinagem, que três anos depois já teria capacidade para produzir peças de 300 toneladas. Testes de soldas por meio de raios-X também seriam instalados. “Trouxemos para o Brasil o primeiro torno vertical para usinar equipamentos e uma fresadora, investimentos superiores a US$ 15 milhões”, diz Vergne. A usina de Tucuruí, no norte do país, também estava saindo do papel. Em 21 de junho de 1978, quase quatro anos após o início das obras civis, o governo, depois de analisar 400 quilos de papéis dos grupos que disputavam o fornecimento de equipamentos para Itaipu, anunciou que o consórcio liderado pela Mecânica Pesada tinha vencido a batalha e lideraria as empresas que forneceriam 18 grupos turbogeradores de 750 MW para trabalhar em regime contínuo. A comemoração foi curta em Taubaté. Além da liderança em Itaipu, a Mecânica tinha obtido o pedido de Tucuruí, para o fornecimento de 50% das turbinas da hidrelétrica que iria gerar mais de 4 mil MW na Região Norte do Brasil. Além dos investimentos, a empresa contrataria mais funcionários (pouco mais de 2,7 mil empregados – quase 15 vezes mais do que no início das operações industriais em 1957). O desafio da nacionalização dos componentes de Itaipu e Tucuruí não passava apenas pelos investimentos em máquinas e pessoal, mas pela rotina estressante da direção, que trabalhava mais de 70 horas por semana. Uma equipe de cerca de dez engenheiros da Creusot-Loire e da Neyrpic, que elaborou os desenhos das turbinas, chegava a Taubaté para transferência de tecnologia. A partir daí, a Mecânica Pesada iria adquirir conhecimento suficiente para voar mais longe no futuro. Uma roda de Itaipu tinha 300 toneladas. Olhos experientes de fora e daqui juntavam forças. Muitos equipamentos, como um Alstom 60 anos de Brasil 14 posicionador para calderaria, eram desenhados fora, montados aqui e supervisionados pelos técnicos que tinham acabado de chegar a Taubaté. “Partia-se de uma estrutura brasileira e agregavam-se valor e tecnologia com a liderança técnica da Creusot-Loire e da Neyrpic”, diz Louis Laburthe, um dos engenheiros que ajudaram nesse processo de transferência tecnológica. “O desenho e a concepção do projeto das turbinas ainda eram feitos fora. A fabricação de eixos, comportas, pontes e turbinas foi em grande parte feita aqui, não deixou nada a desejar e foi realizada a um custo mais baixo”, afirma Thibau. O esforço deu resultado. Em 1979, a revista Exame informava que a Mecânica Pesada tinha conquistado o título de Empresa do Ano. O índice de nacionalização das peças de Itaipu, já perto da casa dos 85%, era uma prova do sucesso do consórcio liderado pelos executivos da MEP. “Esses grandes pedidos, aliados às encomendas de Porto Primavera, Três Irmãos e Balbina, fizeram as contas da empresa saltar”, diz Vergne. Manter o caixa cheio era uma política prudente naquela época. A Creusot-Loire enfrentava um longo processo judicial (que acarretaria sua falência) e não poderia mais ajudar a unidade de Taubaté, que teria de contar com as próprias forças para sobreviver. Ao mesmo tempo, as pressões para remeter recursos para o exterior eram cada vez maiores. “Havia uma grande pressão para enviar os lucros para fora, mas a direção da MEP não deixou. Os lucros foram acumulados e seriam usados quando as condições estivessem instáveis ou para os investimentos necessários para dar conta das grandes encomendas de hidrelétricas”, diz Thibau. Ameaçada por um surto inflacionário que no início da década de 80 corroia salários e faturamentos, a Mecânica Pesada diversificava suas fontes de investimento, chegando até a aplicar em ouro para manter suas reservas. As estratégias transformaram a fábrica de Taubaté de candidata a fechar as portas em jóia da Creusot-Loire. Melhor: a empresa, que tinha de se virar com as próprias pernas, ganharia flexibilidade, arma fundamental nos próximos anos. Às dificuldades no plano externo devem-se somar os tempos difíceis vividos, a partir de 1981, pela Mecânica Pesada e outros fabricantes de bens de capital no Brasil. O principal comprador de seus produtos, o governo, enfrentava uma situação financeira complicada. Inadimplência e renegociação dos prazos com clientes, redução dos efetivos e uma reestruturação interna eram palavras ouvidas em Taubaté. Na França, o Alstom 60 anos de Brasil 15 quadro era pior. Em 1982, falecia Liliane Schneider, que tantas vezes viera a Taubaté, pelo menos uma vez por ano, para acompanhar a evolução da MEP. A Creusot-Loire lutava pela sobrevivência. A batalha não durou muito. Em 1985, era anunciada a falência do grupo, mas outros olhos franceses se voltavam para a unidade de Taubaté. A boa gestão de recursos nos últimos anos tinha elevado a rentabilidade da Mecânica Pesada – que registrava bons resultados financeiros, estava com o caixa cheio e tinha atravessado toda a crise financeira da matriz com solidez. Havia oportunidades de exportação para mercados como Estados Unidos e América do Sul ainda a explorar. O corpo de engenheiros e operários tinha sido capacitado ao longo de décadas e, com a transferência de tecnologia para as obras de Itaipu e Tucuruí, a MEP dava os passos iniciais para se tornar o centro de excelência mundial na fabricação de turbinas e equipamentos para hidrelétricas. Com todos esses requisitos, a Alsthom começou a discutir a aquisição da jóia da coroa da massa falida. Era uma oportunidade de aumentar sua presença na América Latina. Quando executivos da Alsthom vieram ao Brasil, no fim de abril de 1985, conhecer as instalações de Taubaté, um comentário foi muito escutado pelos funcionários brasileiros que acompanhavam a visita. “A estrutura é muito creusontina”. Não era uma crítica, mas uma constatação de que o crescimento da Mecânica Pesada, desde sua fundação, tinha se pautado em detalhes criados primeiro em Creusot-Loire. No fim do segundo semestre Rotor para Usina Tucurui de 1985, a Alsthom entrou na MEP, e novos produtos eram adicionados ao portfolio, como turbinas a vapor, turbinas a gás, bombas e equipamentos de irrigação. “A administração manteria a linha francesa, em que se buscava a adaptação de regras de acordo com as particularidades de cada filial, ou seja, a cultura local era fortalecida”, diz Thibau. Buscou-se um escritório comercial mais ativo nos contatos com o exterior, para que a paralisação de pedidos no mercado interno não atingisse em cheio a fábrica. Mirou-se em nichos mais rentáveis, para que a lucratividade não fosse afetada. Com a nova Alstom 60 anos de Brasil 16 estratégia, exportação começava a ser palavra recorrente. Não poderia ser diferente. No mercado interno, a inflação continuava a corroer o setor de bens de capital, enquanto uma infinidade de moedas e planos econômicos era criada. Mais de 80 mil brasileiros perderam seus empregos entre 1979 e 1984 na indústria de base, que operava com uma ociosidade superior a 50%, segundo dados da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib). A década perdida ainda se tornaria mais difícil para o setor de infraestrutura. A Constituição de 1988 suspendia a existência de fundos vinculados, como o rodoviário e o Imposto Único de Energia Elétrica (IUEE), e dificultava o financiamento a projetos de energia elétrica. De 1988 a 1995 nenhuma nova concessão hidrelétrica foi outorgada pelo governo, segundo dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Fornecedora de equipamentos de longo prazo de maturação, em que boa parte dos pedidos leva de dois a três anos para ser fabricada, a Mecânica Pesada também enfrentava situação difícil. Ao ser contratada, recebia uma encomenda que valia Cr$ 1 milhão. Três anos depois, a moeda não era mais a mesma e a hiperinflação superior a 30% mensais reduzia a pó o acerto inicial. Executivos da MEP foram enviados para países com mercados atrativos, a fim de fazer contato com clientes em potencial. Comércio exterior não chegava a ser novidade para a empresa: em 1975, a MEP tinha participado da venda de um motor marítimo a diesel para a Alemanha, mas a exportação ainda não era uma atividade usual na estratégia do grupo. Nem poderia ser. Os pedidos de Itaipu e Tucuruí, além das encomendas para a indústria naval, ocupavam o nível de uso da unidade. Mas o cenário tinha mudado. A indústria naval estava completamente paralisada desde o início da década de 80 e a expansão do setor elétrico andava a passos lentos. De 1986 a 1987 inúmeras viagens foram feitas por executivos da Mecânica Pesada. No fim de 1987, a MEP já tinha em vista contratos de fornecimento de turbinas para o Chile e de equipamentos para a Indonésia e Equador. Pouco tempo depois, Estados Unidos, Alemanha e Colômbia seriam destinos de produtos fabricados em Taubaté. Uma aliança estratégica com a matriz na França ajudava nessa política. Sob o comando de Denis Laroche, a Mecânica Pesada tinha também passado por sua primeira grande reestruturação interna. Um com- Alstom 60 anos de Brasil 17 pleto estudo sobre todos os departamentos que compunham a fábrica foi feito e usado como base para apontar os pontos fracos da organização. Era preciso trabalhar com uma equipe enxuta, com estrutura de custos mais adequada à realidade. A redução de níveis hierárquicos dentro de uma mesma área era outro objetivo. Dado o primeiro passo da reestruturação interna, era necessário aprofundar essa política. Era esse o panorama em que a Mecânica Pesada (que passara a se chamar GEC Alsthom Mecânica Pesada a partir de 1988, na fusão da francesa Alsthom com a General Electric Company, GEC, da Inglaterra) se encontrava no início da década de 90. Para atender ao exigente mercado externo e em um ambiente de competição global, o novo presidente da Mecânica Pesada, Philippe Joubert, que sucedia Laroche, ampliava programas de redução de custos e aumento da produtividade, e dedicava atenção especial aos funcionários. Para que os novos planos dessem certo, era fundamental fazer todos vestirem a mesma camisa. Fé, alegria e disciplina seriam os valores promovidos pela direção para motivar os empregados e seriam também responsáveis por uma revolução humana, iniciada em Taubaté. A GEC Alsthom investia, a partir de 1991, na área de serviços, para criar maiores vínculos com seus clientes e oferecer outros produtos em seu portfolio. Estava na hora de expandir fronteiras e ingressar em um novo negócio, a prestação de serviços. Em São Paulo, a Promentec virava GEC Alsthom Serviços Mecânicos; em Recife, a Koblitz mudava seu nome para GEC Alsthom Serviços Elétricos, mesmo nome que teria em São Bernardo a antiga Westinghouse. Uma outra unidade em Campinas, a Engeturb, seria o braço de turbinas a vapor. Com a diversificação, a GEC Alsthom conseguiu se fortalecer no Brasil no início da década de 90. Elevou-se a participação das exportações na sua receita – que no início da década de 80 nada representavam, mas agora contribuíam com 20% do faturamento. Enquanto 35% da receita, um percentual considerável, viria do setor de serviços. Outra vantagem desse balanço era o aumento da participação de clientes privados, que respondia por 70% da receita da empresa no Brasil. Mas o salto da GEC Alsthom estava por vir. Em 1994, a economia brasileira começava a respirar novos ares com a adoção do Plano Real, que trazia estabilidade econômica e reduzia a hiperinflação. O governo Fernando Henrique Cardoso acenava com concessões privadas de infraestrutura e com o fim de monopólios estatais. Alstom 60 anos de Brasil 18 Diante desse cenário, o presidente Philippe Joubert teria novidades em breve. Fazia algum tempo que ele estava de olho numa fatia considerável do setor de transportes. A GEC Alsthom queria aumentar ainda mais seu tamanho no Brasil e ampliar seu leque de produtos na área de infraestrutura. Em um mundo global e em uma empresa global, o Brasil poderia crescer ainda mais dentro do grupo. A experiência em transporte não era novidade no Brasil. No início da década de 70, era criada a Empresa de Tração Elétrica (ETE), na qual o braço ferroviário do grupo Schneider e a Alsthom-Atlantique juntavam forças. Não havia unidade industrial, a empresa era um escritório de representação comercial com intenção de fechar negócios com a Fepasa e a Rede Ferroviária Federal. Posteriormente fez-se um acerto com a Cobrasma para que parte dos trens do metrô paulista fosse fabricada na unidade da empresa no interior de São Paulo e parte na França. Em maio de 1976, era assinado um protocolo de intenções com o governo federal para implementar a eletrificação do corredor UberabaSantos, a fim de aumentar o escoamento das exportações que passavam por essa região. A liquidez internacional, abastecida pelos petrodólares, seria um impulso ao projeto, que contaria com a ETE, Brown Boveri, Siemens, Acec, Telefunken. Mudanças de governo, alterações no projeto e a queda de liquidez internacional no fim da década de 70 fizeram com que grande parte do contrato não fosse efetivada. Apesar desse início, o futuro poderia ser promissor. Foi diante desse cenário que a direção da GEC Alsthom do Brasil planejou entrar firme no setor metroferroviário – era uma forma de ampliar ainda mais o leque de produtos oferecidos no país. Com a Lei da Informática, que obrigava as empresas do setor serem nacionais, a CMW (Cobrel Maquip Westinghouse) teria uma nova vida com o fechamento das fronteiras externas: tinha de se virar com as próprias armas. Com um cliente cativo, o metrô paulista, a empresa poderia se desenvolver e criar um corpo técnico muito bom – que tinha sido ajudado com a transferência de tecnologia da Westinghouse antes da Lei da Informática. Com o atraso em investimentos do Metrô paulista, a empresa, para sobreviver, teve de ir atrás de outros clientes, como Fepasa, CPTM e o Metrô de Recife. Em 1985, todo o centro de controle dos carros que circulavam no metrô de Recife era feito pela CMW. Os avanços não passaram despercebidos. No fim da década de 80, a Odebrecht entrou no capital Alstom 60 anos de Brasil 19 da empresa, para, além de participar das obras civis de construção de transportes metroferroviários, poder partilhar o mercado de sistemas e equipamentos de sinalização. “Era um ambiente de alta tecnologia com grande potencial, e isso também não passou despercebido pela Alsthom”, diz Guilherme Pedroso, que acompanhou os primeiros passos da CMW. Faltava um sinal. Em 1995, a Odebrecht manifestou a intenção de reduzir suas apostas no setor de transporte. Oportunidade que não passaria longe de Philippe Joubert, que via naquele negócio o início de uma entrada firme no setor metroferroviário do Brasil, um segmento que na Europa era um dos focos da GEC Alsthom. Em agosto, foi assinado um contrato pelo qual a GEC Alsthom passava a deter 60% da CMW, associando-se à Odebrecht no negócio. Pouco mais de um ano e meio depois, a CMW passaria a ser 100% da Alsthom. Enquanto Guilherme Pedroso foi para a França para entrar em contato com a tecnologia francesa, vinham quatro engenheiros franceses para a unidade localizada no bairro da Casa Verde, em São Paulo. Além de uma padronização das ferramentas virtuais e aquisição de novas tecnologias, a CMW iria também adotar padrões contábeis e financeiros da sua nova proprietária. Novos cursos Centro de Controle Operacional do Metrô de São Paulo. de treinamento foram realizados. “A administração dos projetos mudou muito com a entrada da Alsthom. Antes havia uma cultura de planejamento muito forte; com a aquisição, houve um reforço na parte de gestão, o que melhorou muito nosso desempenho”, diz Rinaldo Tsuruda. O acerto colocava a GEC Alsthom em posição privilegiada no fornecimento de sistemas para sinalização. Mantido o corpo de funcionários e feita uma injeção de recursos para modernizar a unidade, a CMW estava pronta para os novos desafios e em uma ótima posição: o centro de excelência de tecnologia ficaria ainda mais consolidado e ganharia alcance internacional. Philippe Joubert estava preparado para outro lance ousado, que do dia para a noite tornaria a Alsthom líder no setor metroferroviário do Brasil. Alstom 60 anos de Brasil 20 Em 13 de março de 1997, era assinado o acordo entre GEC Alsthom e Mafersa, que previa o aluguel das instalações da unidade da Lapa pelo grupo europeu, que no passado havia fabricado trens e carros de aço inoxidável, e a aquisição de contratos da Mafersa, como a entrega de material rodante para a linha 1 do metrô do Rio de Janeiro e a linha 3 do metrô paulistano. O aluguel das instalações existentes na Lapa fazia parte da estratégia de produzir trens no Brasil de olho no mercado interno e externo, tanto da América Latina quanto dos Estados Unidos, grande comprador de carros de aço inox. Philippe Joubert apostava alto e enxergava o futuro. “A idéia não era ter um escritório de representação, como foi feito com a ETE, mas ter capacidade de produção no Brasil. A intenção também não era começar do zero, mas ter algo bem posicionado”, diz Louis Laburthe, que foi um dos responsáveis por vislumbrar oportunidades de negócios no Brasil. A decisão da matriz foi apoiar a indicação de um diretor brasileiro, Carlos Alberto Almeida, Linha 2 do Metrô de São Paulo que estava cuidando da área de energia, mas que na década de 70 havia trabalhado na fábrica de locomotivas da GE em Campinas. Nomeado o responsável por tocar a operação, pôs-se em funcionamento uma verdadeira “Operação Fênix”, que tratava de fazer surgir das edificações da unidade da Lapa uma indústria. A tarefa não era fácil. Boa parte dos funcionários da Mafersa trabalhava em regime de cooperativa para não deixar a fábrica inteiramente paralisada, e as contas de luz e água estavam atrasadas. O passado da unidade tinha sido complicado. A queda de pedidos durante a década de 80 fizera a empresa buscar outros nichos, como a fabricação de trólebus, mas os obstáculos não foram superados. Apesar dos empecilhos, a unidade da Lapa tinha participado da fabricação de carros para diversos metrôs no Brasil desde o fim da década de 60, quando tinha feito um acerto de transferência de tecnologia com a norte-americana Budd. Posteriormente ganhou corpo com pedidos para os Estados Unidos, consolidando-se como a única fabricante de Alstom 60 anos de Brasil 21 carros de aço inox da América Latina. O problema era o mercado: num ano havia encomendas, nos cinco anos seguintes não havia pedido para um parafuso. As linhas de produção da Lapa foram modernizadas e atualizadas (foram compradas duas máquinas de solda-ponto, vieram os primeiros robôs, o que acabou levando a automatização a 70% de certas etapas de fabricação), e foi feito um intercâmbio com a França da parte técnica e de administração para padronização de processos. Os funcionários gostaram. O sopro de vida era o que eles queriam. “A melhoria nas máquinas fez com que a fabricação ficasse muito mais rápida. Antes o processo era mais artesanal. Anteriormente fabricavam-se 20 carros por mês, com a Alsthom produziam-se mais de 30”, diz Francisco Branco, que começou a trabalhar na unidade Lapa em 1961. Trabalhar o ânimo do pessoal era fundamental. “Tínhamos de abrir perspectivas e motivá-los, porque o corpo técnico era bom. Com novos investimentos, a unidade poderia trabalhar normalmente”, afirma Carlos Alberto, que comandou de 1997 a 2004 a unidade da Lapa. Retomar contratos da unidade da Lapa da Mafersa implicava dificuldades, uma delas se referia ao metrô de Brasília. Mesmo sendo deficitário em relação a algumas partes do material rodante, era fundamental colocar de pé o projeto. Deixá-lo morrer representaria um péssimo símbolo para o setor, um cemitério de equipamentos em plena capital do país. Pouco depois, a Alstom (com a abertura mundial de capital, o grupo GEC Alsthom mudou seu nome em junho de 1998 e passou a ser conhecido apenas como Alstom, perdendo a letra “h”) obtinha um contrato de exportação para os Estados Unidos. Segundo Carlos Alberto, o fato de ser a única planta da Alstom no mundo com know how na fabricação de carros de aço inox austenítico credenciava a fábrica da Lapa a participar da venda para o mercado norte-americano, ainda mais que na mesma época o grupo francês acertava os últimos detalhes da aquisição de uma unidade em Hornell, nos Estados Unidos. A unidade de São Paulo poderia fornecer para os Estados Unidos grandes compradores desse tipo de equipamento. – “Estamos prontos?“ – “Com certeza, vamos fazer um teste do que nós conseguimos melhorar nesses últimos anos” respondeu Carlos Alberto à pergunta de Philippe Joubert. A estratégia foi testada e aprovada. A fábrica de Hornell elogiou a entrega do pedido. Exportação seria uma das armas da unidade de Alstom 60 anos de Brasil 22 transportes da Alstom Brasil para reduzir a dependência do mercado interno, atrelado ao governo, que encontrava dificuldades para obter financiamentos. O ousado lance de Joubert provou-se correto. De 1997 a 2004, a unidade da Lapa sempre esteve no positivo, segundo Carlos Alberto, tendo alcançado em um ano 20% do lucro mundial de transportes da Alstom. Hoje a fabricação dos carros é feita integralmente no Brasil. A unidade brasileira cresceu nesses últimos anos e serve os mais diferentes cantos do mundo. Em 2002, o centro de controle de uma linha de subúrbio do metrô de Atenas teve auxílio brasileiro. Sistemas de informação para as ferrovias brasileiras também são criados por engenheiros brasileiros da Alstom, a fim de que as empresas possam acelerar ainda mais o escoamento de sua produção e possam acompanhar passo a passo o transporte de carga. Tecnologia brasileira que poderia um dia ser exportada. Se a Alstom tinha crescido de tamanho, tornando-se líder no setor metroferroviário, uma outra notícia fazia os funcionários da empresa comemorarem: a usina de Três Gargantas, que poderá desbancar a posição de Itaipu como a maior do mundo, teria mãos brasileiras. Das oito turbinas vencidas em licitação pela matriz, uma parte seria fabricada no Brasil. O salto obtido por Itaipu transformou a Alstom Brasil em centro de excelência mundial em turbinas e equipamentos hidrelétricos. Da soldagem de pequenas peças à fabricação de turbinas, tudo era feito por operários brasileiros sem problemas, mesmo que as peças superassem 300 toneladas. O movimento, então, passou a ser inverso. Missões de chineses iam à cidade de Taubaté interessadas em aprender mais sobre a tecnologia de ponta dos brasileiros. Hoje, dos projetos de turbinas hidrelétricas apenas uma pequena parte não pode ser feita no Brasil. “Não há um laboratório no Brasil que possa medir e validar o rendimento dos equipamentos”, diz Carlos Alberto. Um avanço enorme considerando-se que, na década de 50, as turbinas vinham da França e eram montadas aqui. O desafio de crescer no novo milênio ficaria a cargo de um engenheiro civil que tinha deixado o cargo de diretor-executivo do Bozano Simonsen em 1998, depois de quatro anos e muitos sábados de trabalho no grupo. O destino passou então a ser um prédio da avenida Rio Branco, 123, onde a JL Alquéres Engenharia Consultiva ocuparia as Alstom 60 anos de Brasil 23 salas 1.901 e 1.902, que por uma ironia do destino, anos atrás, haviam abrigado a sede da Mecânica Pesada. Logo René Vergne sondaria José Luiz Alquéres sobre a possibilidade de voltar a ser executivo. Joubert, presença frequente na Abdib, estava sendo chamado em 2000 pela matriz para coordenar a divisão de transmissão de energia elétrica. Seu trabalho no Brasil tinha impressionado a direção mundial. A Alstom havia se expandido muito além de Taubaté, tinha mudado seu portfolio, aumentando a participação de empresas privadas nas encomendas. Havia entrado na área de serviços e abria-se para o mercado externo, conquistando a liderança no setor de transportes metroferroviários. Nesse período, a fatia em distribuição e transmissão de energia cresceu, com investimentos em unidades destinadas à produção desses equipamentos. A Alstom agora era um grupo diversificado, com um leque amplo de clientes. Os desafios de comandar pela primeira vez uma multinacional e de morar em São Paulo, também pela primeira vez, falaram alto, e Alquéres aceitou o convite. Desde o início da Mecânica Pesada, na década de 50, à liderança na área de transportes metroferroviários, na metade da década de 90, a Alstom tinha incorporado diferentes culturas e cabeças. A área de energia elétrica dividia espaço com a de transportes. Fazer uma síntese dessas diversas subculturas era um dos objetivos traçados. Era preciso reforçar a marca Alstom e criar elos com os funcionários. Para atingir essas metas, criaram-se “cyber cafés” nas unidades fabris da empresa – locais em que os empregados poderiam acessar a Internet –, e nasceu o Instituto Alstom, para o desenvolvimento do treinamento e cultura empresarial. Unificar a comunicação era outro objetivo – cada unidade tinha um jornal, o que não contribuía para reforçar a idéia de comando centralizado. Reuniões periódicas com diretores das diversas unidades espalhadas pelo país foram estabelecidas. Ao mesmo tempo, a área de geração de energia assistia a mudanças, e o segmento de transmissão e distribuição era expandido. Em março de 1999, ABB e Alstom juntaram forças no mundo e criaram uma joint-venture, a ABB Alstom Power. A fusão das atividades de geração de energia durou pouco. Em agosto de 2000, a Alstom adquiria o controle acionário. Com isso, novas atividades eram acrescentadas à fábrica em Taubaté: geradores (transferência da unidade de Osasco, SP, da ABB) e turbinas industriais (transferência da planta de Cravinhos, SP, da ABB). Para abrigar a produção de geradores, um novo pavilhão de 10 mil m² Alstom 60 anos de Brasil 24 foi construído, e o antigo pavilhão destinado a produzir escadas rolantes era modernizado e ganhava uma nova função, a de sediar a fabricação de turbinas industriais. Consolidada essa posição, a Alstom Brasil partia para aumentar sua presença na área de transmissão e distribuição de energia elétrica, que aparecera na década de 70, quando tinha sido fabricado o primeiro grande distribuidor para a Usina de Marimbondo. Em 2000, a aquisição da fábrica sediada em Canoas, RS, da italiana Ansaldo Coemsa reforçava a presença da Alstom no setor, elevando também as possibilidades de exportação para a América Latina e Estados Unidos. A Coemsa tinha faturado no ano anterior pouco mais de R$ 100 milhões e se unia no portfolio a outros investimentos feitos em transmissão e distribuição: Balteau, em Itajubá, MG, adquirida no fim da década de 80, e a AEG, em Interlagos, São Paulo, em 1996. Aumentava-se a aposta na diversificação dos clientes e dos produtos, estratégia usada desde o fim da década de 80. O aumento da participação em T&D se vinculava a outra idéia, a de elevar ainda mais a fatia destinada às exportações. Fazia alguns anos que especialistas alertavam para o perigo iminente de um racionamento de energia no Brasil. De 1988 a 1995 pouco se fez em termos de geração, e a demora na implementação do novo modelo do setor (que nunca foi posto em prática integralmente) atrasou investimentos em geração. A desvalorização cambial de 1999 piorou as contas das elétricas e postergou recursos em termelétricas. Em junho de 2001, o país assistia ao maior racionamento de energia elétrica de sua história. A população, indústrias, comércio eram obrigados a reduzir em 20% seu consumo. A crise não pegou de surpresa José Luiz Alquéres, que desde sua entrada no grupo já alertava para a possibilidade imediata de um racionamento. “Procurei internamente fazer com que a Alstom estivesse preparada para reagir o mais rápido possível. Era uma questão de tempo que houvesse uma crise”, afirma. Deu resultado. As encomendas fariam a receita do grupo no Brasil saltar de US$ 250 milhões para US$ 500 milhões de 2000 a 2003 e recheariam a carteira de pedidos de termelétricas (turbinas a gás para a TermoRio, TermoBahia e Piratininga) a hidrelétricas (ampliação de Tucuruí e Itaipu). Se a crise abria oportunidades, ela também antecipava mudanças no rumo do setor elétrico, que respondia por 70% da receita do grupo no Brasil. A palavra de ordem era diversificação de mercado, já que uma eleição presidencial se aproximava e seria seguida por uma queda Alstom 60 anos de Brasil 25 nos investimentos locais. Exportar era uma saída. Era essa a estratégia de Alquéres. Buscou-se um contato mais próximo com o BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social – e uma aproximação com a matriz, a fim de convencê-la da importância de o Brasil ser uma plataforma de exportações para diversos países atendidos por outras filiais da Alstom. Exportações tanto da divisão de energia quanto da de transporte. A Alstom Brasil começou a abrir fronteiras e a ganhar destaque dentro do grupo. A fatia da produção destinada ao comércio exterior, que representava menos de 10% em 2000, então superou 40%. Novos nichos eram explorados. Um exemplo era o segmento de transmissão e distribuição de energia, que desde 2000, com a aquisição da Coemsa, tinha visto sua receita pular de US$ 30 milhões para US$ 150 milhões em 2003. A área de transporte também passava pelo aumento da fatia destinada ao exterior. Em 30 de julho de 2002, a unidade da Lapa celebrava o maior contrato de exportação de sua história, para fornecimento de equipamentos para o metrô de Nova York e de Santiago, no Chile, com financiamento do BNDES. Um acerto que poderia render US$ 500 milhões. Centro de excelência na fabricação de carros inox, a fábrica paulistana contaria com investimentos na compra de robôs, o que aumentaria a automatização de sua linha de produção. Foram aplicados US$ 12 milhões para ampliar e modernizar as instalações. Os ventos sopravam um bom futuro para a Alstom Brasil, quando um baque veio em setembro de 2003: pressionada por uma série crise financeira, a matriz na França anunciava a venda de sua divisão de transmissão e distribuição de energia para a Areva. O golpe era doloroso principalmente no Brasil. Além de perder 25% da receita do grupo no Brasil, havia outros motivos a lamentar. A divisão, que tinha crescido cinco vezes em três anos e tinha unidades em São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais, estava deixando de ser da Alstom em um momento delicado, já que as regras da área de geração de energia elétrica estavam sendo reformuladas pelo governo federal, o que indicava que novos pedidos de geração iriam demorar para vir. De uma só tacada, o portfolio do grupo viu aumentar a participação do Estado, que passou a representar 75% das vendas da Alstom, mais pulverizadas anteriormente, uma vez que os clientes de distribuição e transmissão eram em boa parte privados. No mesmo período, a Alstom Alstom 60 anos de Brasil 26 se desfazia da unidade de turbinas industriais de pequeno porte, cuja receita representava 2% do total do faturamento do grupo no Brasil. Uma fria e chuvosa terça-feira, 19 de julho de 2005, Taubaté. A primeira unidade da Alstom no Brasil estava em festa. A ocasião era especial: celebrar os 50 anos de atividade no país com a presença do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin. A história se fazia presente. Nascida sob o Plano de Metas, reforçada pelo apoio do BNDE, a Mecânica Pesada cresceu, se desenvolveu e acabou se tornando a primeira fábrica de um grupo que se expandiria no Brasil, chegando ao setor de serviços e ao de transporte. Com um faturamento equivalente a US$ 500 milhões e quase 3 mil funcionários espalhados pelas unidades de transporte (Lapa e Casa Verde), de energia (Taubaté e Jaguaré), conversão de energia (Belo Horizonte) e corporativo (São Paulo),era ampla a inserção da Alstom Brasil. No seu discurso, Alquéres frisou: “nesse meio século muita coisa mudou. Em 1955, a capacidade instalada de energia do Brasil estava em 4 mil MW. Hoje está em quase 100 mil MW, e metade dessas turbinas vieram da Alstom. No setor metroferroviário, carros de passageiros, equipamentos de sinalização e sistemas de automação são fabricados aqui. Ocorre também uma crescente participação no mercado externo, com pedidos do setor de transporte para Chile, Argentina e Estados Unidos, e do setor de energia para Sudão, China e Venezuela. Queremos ser lembrados como líderes no setor de infraestrutura.” O presidente Lula, em sua fala, frisou que o Brasil tem de pensar grande: “não podemos lamentar o que foi feito ontem, mas temos de pensar o que será feito amanhã, o papel que o Brasil terá na geografia mundial. O homem tem de pensar grande, porque ele é do tamanho do seu sonho. O Brasil tem de ser do tamanho que nós queremos que ele seja”. “Há muitas oportunidades ainda a serem aproveitadas”, dizia Alquéres pensando nos próximos anos. “O custo de produção e a alta tecnologia tornam o Brasil extremamente competitivo em alguns produtos, como equipamentos para hidrelétricas. Em um mundo mais global e competitivo, a filial brasileira enfrentará cada vez mais a concorrência da Índia e da China. Ganhar nesse complexo xadrez, em que acordos de livre comércio terão impacto, dependerá da empresa e do avanço econômico brasileiro. Alstom 60 anos de Brasil O que dificulta isso? A economia brasileira: volatilidade do câmbio, os juros altos, carga tributária, legislação trabalhista pesada e entraves logísticos. Para se consolidar no futuro, dentro do grupo Alstom, os desafios são tão grandes quanto os que Charles Schneider encontrou em 1955, quando em meio aos cafezais surgiu a Mecânica Pesada. Empreender é uma aventura consVista aérea da unidade Taubaté, onde começou a Mecânica Pesada. tante”, completa Alquéres. Últimos dez anos 27 O racionamento de 2001 despertou a necessidade de ampliar a geração de energia elétrica no país, para que a economia não sofresse de novo com a ameaça de desabastecimento. Era preciso, então, retomar os grandes projetos hidrelétricos na região Norte, onde se concentra mais de metade do potencial hidrelétrico do país e um dos grandes biomas do planeta, a Amazônia. Em 2002, no Diário Oficial, despacho da Aneel aprovou o estudo de inventário do rio Madeira, contemplando os aproveitamentos hidrelétricos de Santo Antônio e Jirau, elaborado por Furnas e pela Odebrecht Energia. Em 2003, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu sinal verde à construção das duas usinas. Depois de um longo processo de licenciamento ambiental e de ações na justiça que atrasaram a licitação, em dezembro de 2007, o consórcio Santo Antônio Energia, liderado pela Odebrecht, venceu o leilão A-5, comercializando a energia gerada pelo empreendimento. Menos de seis meses depois, em maio de 2008, o consórcio Energia Sustentável, liderado na época pela Suez Energy, venceu o leilão da usina de Jirau. Os dois projetos Alstom 60 anos de Brasil 28 contaram com participação expressiva do Grupo Eletrobras, por meio de Furnas em Santo Antonio e Chesf/ Eletrosul em Jirau. As duas licitações marcaram os primeiros grandes projetos hidrelétricos na região Norte depois da construção da usina de Tucuruí (PA), na década de 1970 e que passou por uma ampliação, iniciada no fim da década de 1990 e concluída em 2004. O executivo Celso Ferreira de Oliveira, presidente da construtora Camargo Correa entre 2003 e 2010 e atual diretor superintendente da Camargo Correa Desenvolvimento Imobiliário (CCDI), recorda-se da parceria montada com a Alstom na ampliação da usina de Tucuruí. “O alinhamento dos executivos e dos valores nossos com os da Alstom refletiam em uma ótima parceria, trazendo competitividade e agilidade para buscar soluções, como a de máquinas com um custo mais baixo que o previsto inicialmente. Essa expertise se comprovou quando a Alstom ganhou novos pedidos na região Norte.” A decisão do governo federal de licitar as usinas do rio Madeira reforçou o sinal de que os empreendimentos seriam os primeiros de uma série de projetos hidrelétricos a serem erguidos na região Norte. Em 2005, o país detinha cerca de 100 mil MW de capacidade, com cerca de 70% oriundo de hidrelétricas e 20% de termelétricas. O Plano Decenal 2006-2015, o primeiro realizado após a criação da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão estatal de planejamento do setor de energia estabelecido em 2004, indicava que as hidrelétricas se constituíam “numa das maiores vantagens competitivas do país, por se tratar de um recurso renovável e com possibilidade de ser implementado pelo parque industrial brasileiro com mais de 90% de bens e serviços nacionais. Além do mais, ao possuir uma das mais exigentes legislações ambientais do mundo, é possível ao Brasil garantir que as hidrelétricas sejam construídas atendendo aos ditames do desenvolvimento sustentável.” No documento, além das usinas do rio Madeira, indicava-se a importância da construção de Belo Monte, das usinas do rio Teles Pires e de avançar em estudos de inventários do rio Tapajós, onde se concentra o projeto de São Luiz do Tapajós, com pouco mais de 8 mil MW de potência. Esses sinais fizeram a direção da Alstom tomar uma decisão estratégica: tornava-se essencial ter uma unidade industrial na região Norte. Isso daria maior competitividade à empresa, que ganhava maior flexibilidade para reduzir distâncias e custos em uma área que se tornaria um dos maiores mercados de equipamentos hidrelétricos do planeta. Em 2007, executivos da Alstom começaram a visitar as cidades de Manaus, Belém, Cuiabá e Porto Velho para identificar a melhor localização da Alstom 60 anos de Brasil 29 fábrica. Três aspectos tinham peso importante na avaliação: incentivos fiscais, logística e mão de obra. A cidade de Porto Velho, epicentro dos investimentos das duas hidrelétricas, chamou a atenção dos executivos pelo compromisso do governo estadual em ceder terreno para a fábrica e pela disposição do diretório estadual do Senai, que abriu suas portas para cursos de capacitação. Para tirar do papel a primeira indústria de bens de capital sob encomenda da região Norte, a Alstom firmou, em agosto de 2008, uma joint venture com a Bardella para criar a Indústria Metalúrgica e Mecânica da Amazônia (IMMA), localizada em Porto Velho. “A unidade no Norte seria complementar, se dedicando, por exemplo, a comportas e ensecadeiras, enquanto Taubaté teria foco em turbinas e geradores, o que nos permitiria ser mais produtivos”, diz Marcos Costa, presidente da Alstom. A joint venture com a Bardella foi uma maneira de agregar a liderança de mercado da Alstom com o conhecimento da empresa brasileira, líder no fornecimento de equipamentos hidromecânicos para o setor de energia e para os setores industriais de metalurgia, além de compartilhar os riscos da instalação de um investimento inédito na região Norte. A decisão logo se provou acertada: um mês depois do anúncio da joint venture, em setembro de 2008, a Alstom anunciou um dos maiores contratos de fornecimento de equipamento hidrelétrico de sua história, se tornando líder do consórcio fornecedor para a usina de Santo Antônio. Dois meses depois, em dezembro, foi a vez de a empresa se tornar uma das fornecedoras de máquinas para a usina hidrelétrica de Jirau. Mal houve tempo para celebrar. Logo os engenheiros da Alstom se debruçaram sobre suas mesas. Era preciso superar um desafio inédito no mundo: as turbinas Bulbo usadas para gerar energia no rio Madeira teriam 75 MW de potência cada uma, sendo as mais potentes e maiores do mundo em operação. Essas unidades são especialmente apropriadas para um baixo fluxo de água e projetos hidrelétricos que aproveitam a correnteza do rio, como as de Santo Antônio e Jirau. Ainda oferecem alta eficiênIndústria Metalúrgica e Mecânica da Amazônia Alstom 60 anos de Brasil 30 cia, pois ficam completamente submersas, sendo assim capazes de lidar com grandes variações no fluxo de água, comuns na região Amazônica. Com 44 unidades geradoras do tipo bulbo, a Santo Antonio teve 19 turbinas e 22 geradores, além de 50% dos equipamentos hidromecânicos e de levantamento do projeto, fornecidos pela Alstom. Para Augusto Roque, diretor superintendente de energia da Odebrecht Infraestrutura Brasil, o projeto de Santo Antônio envolveu um esforço conjunto dos investidores, construtores, projetistas e dos fornecedores de peças e equipamentos. Na parte técnica, uma das inovações foi o uso das maiores turbinas tipo Bulbo já usadas no mundo. “As turbinas vieram de um projeto comum para todas as unidades geradoras, feito pelos fornecedores; liderados pela Alstom. Essa solução inovadora contribuiu para um projeto inédito”, ressalta, frisando que a instalação da IMMA, em Rondônia, contribuiu para reduzir distâncias e trazer maior produtividade ao andamento do projeto. A parceria com a Odebrecht envolveria, anos depois, outro projeto, o da usina de Teles Pires, com 1.820 MW de potência, construída no interior do Mato Grosso, cuja primeira máquina está apta para entrar em operação desde janeiro de 2015. Nesse caso, para entregar parte dos equipamentos encomendados, a Alstom teve de vencer um desafio logístico: as rodas das turbinas fabricadas no interior de São Paulo saem de Taubaté em veículos especiais que transportam toneladas de peso até o porto de Santos. De lá seguem em barcaças que vão até Montevidéo, capital uruguaia. Então sobem o rio Paraguai até a cidade de Cáceres, no Mato Grosso, de onde são colocadas em carretas que irão transportá-las por rodovia até o empreendimento. “São cinco mil quilômetros”, diz Roque. O desafio de tirar a IMMA, primeira fábrica de bens de capital sob encomenda da região Norte, do papel não foi simples. Formar mão de obra local e criar uma cultura corporativa foram dois dos principais desafios iniciais que a equipe da empresa encontrou quando chegou a Porto Velho, cuja economia ainda era agrícola. Nos primeiros dias da unidade, cuja inauguração se deu 20 de março de 2010, a taxa de ausência no trabalho ficou em cerca de 20%, enquanto no Sudeste oscilaria entre 2% e 3%. A gerência de Recursos Humanos começou a entrevistar os colaboradores que faltavam aos turnos, para saber o que estava ocorrendo. Havia várias razões: alguns deixavam de ir para fazer “bicos” e fazer trabalhos de reparo nos vizinhos; outros deixavam de comparecer para cuidar das crianças, enquanto a mulher ia trabalhar. Alstom 60 anos de Brasil 31 Ciente desse quadro, a empresa desenvolveu um conjunto de ações. Resultado: em poucos meses, a taxa de falta no trabalho caiu para mais da metade do que era no início. “Desde o início, buscamos formar mão de obra local com o projeto Guaporé, que serviu de alavanca para a indústria de Rondônia e do Norte e conseguimos formar essa mão de obra necessária”, afirma Gustavo Almeida, que comandou a iniciativa, que, desde sua criação, em 2009, formou cerca de duas mil pessoas em cinco turmas. O programa ainda foi responsável por recrutar 80% dos cerca de 600 funcionários da unidade entre moradores de Porto Velho ou municípios próximos. “Muitos moradores locais, que foram formados pelo projeto Guaporé, tornaram-se gestores e mostraram que a iniciativa foi um marco na formação profissional do local”, complementa Gustavo. Vencido o desafio de formar mão de obra e de criar uma cultura corporativa local, a IMMA trabalhava à plena carga para atender à carteira de pedidos, enquanto a equipe de negócios trabalhava para aumentar a carteira de encomendas. Em 20 de abril de 2010, o consórcio Norte Energia venceu o leilão de energia da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, no Pará, com o preço de lance de R$ 78 MWh, um deságio de 6,02% em relação ao preço inicial de R$ 83 por MWh. Assim que o martelo foi batido na licitação, iniciou-se uma longa negociação entre a Norte Energia e os fornecedores de equipamentos. Um fantasma pairava no ar: a hidrelétrica de Jirau tinha tido parte de seus equipamentos importados da China. Além dos chineses, fabricantes japoneses e russos estavam na concorrência e apresentavam propostas de financiamento internacional. Considerando o volume do projeto, a Alstom liderou um consórcio de fornecedores nacionais, concorrendo com diversos competidores internacionais. O intuito era viabilizar o contrato dos equipamentos com geração de empregos no Brasil e fortalecendo a indústria nacional, atendendo aos investimentos necessários para o crescimento da geração de energia. Líder de um consórcio formado pela alemã Voith e a austríaca Andritz, a empresa foi escolhida pelos investidores da usina de Belo Monte para fornecimento de 14 conjuntos turbina-gerador Francis de 611 MW e seis conjuntos turbina-gerador Bulbo. A Alstom ainda fornecerá sete conjuntos turbina-gerador Francis, equipamentos hidromecânicos, barramentos blindados e subestações isoladas a gás (GIS) para as dezoito unidades geradoras da terceira maior hidrelétrica do mundo, com 11,2 mil MW de potência. Com a conquista, os equipamentos fabricados pela Alstom 60 anos de Brasil 32 Alstom se tornaram presentes em cerca de 40% da capacidade hidrelétrica já construída ou em construção no país. “Nossa fábrica se transformou em uma referência dentro do grupo e a Hydro tem sido um celeiro de talentos, tendo formado pessoas que hoje ocupam posições importantes em todos os outros setores e businesses da Alstom Brasil e inclusive exportando talentos para outras unidades no exterior”, afirma Januário Dolores, Diretor Geral do negócio de Hidrogeração da Alstom na América Latina. Maior holding do setor de energia elétrica do Brasil e investidora dos projetos do rio Madeira e de Belo Monte, a Eletrobrás, com 52 anos de história, tem sido uma parceira estreita da Alstom. “Pelo seu tamanho e história, além de seu compromisso com o desenvolvimento do país, a Eletrobras procura parceiros que tenham valores em comum, como ética, transparência e respeito pelo meio ambiente e sociedade. No caso específico da Alstom essa parceria tem sido muito profícua. A empresa tem sido grande parceira da Eletrobras no enorme desafio que é construir grandes empreendimentos de geração de energia na Amazônia. São empreendimentos pioneiros, que colocam em prática o discurso da Eletrobras de levar desenvolvimento, respeitando o delicado equilíbrio entre o meio ambiente e a sociedade”, destaca o presidente da Eletrobras, José da Costa Carvalho Neto. Os investimentos da empresa em fabricar localmente seus produtos tem tido impacto na decisão da Eletrobrás de contratar a Alstom em seus projetos. “Claro que uma empresa que desenvolve equipamentos e serviços localmente para nossos empreendimentos recebe um peso maior no processo de avaliação.” Para o engenheiro José Luiz Alquéres, que presidiu a Alstom entre 2000 e 2005, a conquista dos pedidos se deveu à estratégia de fabricação local, que permitiu o acesso aos financiamentos de equipamentos do BNDES e maior competitividade para atender às encomendas, e ao conhecimento técnico. “O domínio das tecnologias de usinas de baixa queda, como as turbinas Kaplan e especialmente as turbinas bulbo, lhe conferiu uma importante vantagem competitiva nas licitações para os projetos de Santo Antonio e Jirau, onde a Alstom desenvolveu não só uma tecnologia modular para a configuração turbina/gerador, facilitando a construção e instalação local, como em conjunto com a empresa nacional Bardella”, aponta. Além do mercado interno, pedidos no exterior ampliaram a carteira de pedidos da Alstom. Em janeiro de 2012, um consórcio formado por Alstom e Schrader Camargo, montadora colombiana, assinou um Alstom 60 anos de Brasil 33 contrato com a Emgesa – subsidiária da Endesa e primeira operadora privada da Colômbia – para o fornecimento e montagem de equipamentos eletromecânicos para a usina hidrelétrica de El Quimbo, de 400 MW. Os principais equipamentos do projeto, turbinas Francis e geradores, foram fabricados na unidade da Alstom em Taubaté, no Estado de São Paulo. As encomendas no Brasil e no exterior reforçaram a posição do Brasil como um dos principais mercados mundiais de energia hidrelétrica para a Alstom no mundo, ao lado da China. Para destacar ainda mais a relevância do Brasil dentro da estratégia da empresa, faltava uma peça: era preciso consolidar e ampliar a capacidade de criação de novas soluções no Brasil, o que aumentaria a competitividade da empresa para obter mais contratos na região Norte. Segundo o Plano Decenal 2022, “o sistema de geração deverá se expandir para atender a um crescimento médio anual de cerca de 4.000 MW no SIN, o que representa um acréscimo médio de aproximadamente 4,2% a.a., totalizando 40.000 MW de expansão ao longo do período decenal.” Nesse contexto, será observada acréscimo importante da participação da região Norte na expansão de projetos de geração de energia elétrica, passando de 10%, no início de 2013, para 26% da capacidade instalada no SIN, em 2022, totalizando 34.344 MW de expansão. Além das usinas do rio Madeira e de Belo Monte, a usina de São Luiz do Tapajós, no rio Xingu (PA), com mais de 8 mil MW, é um dos vetores desse crescimento. Nesse contexto, ter equipamentos cada vez mais preparados para vencer os desafios da região Norte ganhou ainda mais importância. De olho nesse cenário, em 29 de novembro de 2011, após um encontro com a presidente da República, Dilma Rousseff, no Palácio do Planalto, em Brasília, o presidente mundial da Alstom, Patrick Kron, anunciou que o Brasil receberia o sexto Centro Global de Tecnologia para pesquisa e desenvolvimento de geração hidrelétrica da empresa no mundo e o primeiro da América Latina. Com foco em turbinas do tipo Kaplan, utilizadas em usinas hidrelétricas de baixa queda (até 60 metros), o centro tem importância estratégica para a empresa no Brasil, em que mais de metade do potencial hidrelétrico se localiza na região Norte, onde a geografia é plana, os volumes de água são muito grandes e a queda de água é menor. “A nova fronteira hidrelétrica é a região Norte e ter equipamentos específicos para os desafios existentes ali é essencial”, diz Ricardo Vasconcellos, responsável pelo GTC da Alstom na América Latina. O Brasil é responsá- Alstom 60 anos de Brasil 34 vel por 45% do mercado global futuro das turbinas Kaplan e, junto aos países asiáticos, compõe 80% do segmento. Desenvolver a própria tecnologia cria uma vantagem competitiva em um momento em que as usinas sem reservatório ganham espaço na matriz elétrica. Desde a década de 1990, por conta de pressões ambientais, o Brasil tem privilegiado investimentos em hidrelétricas a fio d’água, ou seja, sem reservatórios de armazenagem, ao contrário do que se via nas décadas de 1970 e 1980. Por aproveitarem a vazão do rio, as usinas a fio d’água dispensam a construção de grandes reservatórios, o que reduz a área alagada. A turbina é a mesma nos dois tipos de usina, mas o desenho delas muda bastante, a variação de queda na usina a fio d´água é muito maior, o que exige um novo design. Construído em Taubaté, extensão da unidade voltada a equipamentos hidrelétricos, o centro foi inaugurado em 22 de maio de 2014, resultado de mais de R$ 20 milhões em investimentos. Com 15 colaboradores dedicados às pesquisas, a unidade funciona como laboratório em escala reduzida para testar turbinas em condições semelhantes à realidade. “Antes os ajustes eram feitos na Europa, agora serão feitos aqui, o que traz uma proximidade maior com nossos clientes também. O centro permite estudos diferenciados porque as hidrologias do Norte, Nordeste, Sudeste, Centro-Oeste e Sul são diferentes, existem baixas e altas vazões, então administrar esses pontos não é Centro Global de Tecnologia simples e exige soluções próprias”, diz Vasconcellos. O centro de tecnologia é uma vertente da política de inovação da Alstom, que também tem firmado parcerias com universidades, para ampliar a discussão de ideias. A empresa mantém contato frequente com a Universidade Federal de Itajubá (Unifei), Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá, Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) e Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Se a geração hidrelétrica continua mantendo-se como a principal fonte de energia elétrica no país, as usinas termelétricas também têm ganho relevância. Por conta da estiagem que desde 2012 reduziu o nível dos reservatórios, as térmicas geraram, em vários momentos de 2013 Alstom 60 anos de Brasil 35 e 2014, um terço da energia consumida no país, um recorde histórico. Isso ocorre em um momento em que o sistema está mais dependente das chuvas. De 2000 a 2012 foram construídas 42 usinas hidrelétricas no País, com acréscimo de pouco mais de 28 mil MW de capacidade. Dessas, apenas dez, com potência de 1,9 mil MW, receberam autorização para a construção de reservatórios de água. Entre 2013 e 2018, serão adicionados 20 mil MW de capacidade hídrica ao sistema, mas apenas 200 MW, ou 1% dessas usinas, têm reservatórios, segundo previsões do Operador Nacional do Sistema (ONS). A capacidade de armazenamento das hidrelétricas caiu de 6,3 meses para 4,7 meses nos últimos dez anos. Como as usinas em construção são a fio d’água, esse período poderá cair para 3,8 meses em 2018, indica um estudo da CPFL Energia. Nesse contexto, a Alstom Brasil tem trabalhado, na área térmica, com foco em manutenções preventivas de usinas termelétricas, contribuindo para que os clientes tenham menores interrupções e que consigam gerenciar seus ativos com maior eficiência. “As termelétricas estão operando continuamente há algum tempo, o que tem feito nossa área de serviços trabalhar bastante na manutenção de equipamentos, o que cria um nicho relevante de negócios”, afirma Marcos Costa. Quando as usinas chegam perto de 12.500 horas de operação, elas geralmente param para manutenção. Os contratos podem envolver tanto a manutenção de equipamentos de terceiros quanto de termelétricas fabricadas pela Alstom. Em 2013, a empresa renovou um contrato de manutenção por sete anos para prestar assistência técnica para 11 turbinas a gás, quatro turbinas a vapor e 14 geradores instalados nas usinas de energia de ciclo combinado Governador Leonel Brizola (TermoRio), Fernando Gasparian (Piratininga) e Celso Furtado (TermoBahia). O contrato, no valor aproximado de 90 milhões de euros, compreendeu serviços de assistência técnica e peças para manutenção programada e não programada para as três usinas. As usinas Governador Leonel Brizola, de 1040 MW, e Fernando Gasparian, de 586 MW, utilizam as turbinas a gás GT11N2 da Alstom, e entraram em operação comercial em 2004. A usina Celso Furtado, de 185 MW, baseia-se na turbina a gás GT24 da Alstom e entrou em operação comercial em 2003. As plantas são atendidas pela Alstom desde a operação comercial. Alstom 60 anos de Brasil 36 Mais extensa linha de transmissão do mundo Enquanto as equipes de Taubaté e Porto Velho desenhavam e iniciavam a construção dos equipamentos hidrelétricos para a usina do rio Madeira, uma reviravolta no mundo dos negócios mudaria os rumos da Alstom: em junho de 2009, a divisão de transmissão de energia, que entre janeiro de 2004 a maio de 2009 esteve sob o comando da Areva, voltou para o controle da Alstom, com a Schneider assumindo a parte voltada à distribuição de energia. A retomada da divisão veio em um momento extremamente oportuno. A licitação de grandes projetos hidrelétricos na região Norte criou a necessidade de construção de milhares de quilômetros de linhas de transmissão que escoariam a energia produzida nas usinas do rio Madeira e Belo Monte para a região Sudeste, maior centro consumidor do país. Ciente desse contexto, a Alstom fez uma série de investimentos, para se preparar para obter grandes contratos na área. A fábrica de Itajubá (MG), voltada à produção de equipamentos para manobra em alta tensão (disjuntores, chaves e transformadores de medida) foi ampliada com a implantação de uma linha para produção de capacitores – equipamentos essenciais em sistemas de compensação de energia, aplicados em larga escala no sistema de transmissão nacional, um dos mais extensos do mundo – e passou por modernização, com a ampliação da nacionalização de algumas linhas de equipamentos. Já a unidade de Canoas (RS), voltada à produção de transformadores de potência e reatores foi totalmente modernizada e preparada para o fornecimento de transformadores conversores utilizados nos sistemas de corrente contínua. Nela foi inaugurado um laboratório de testes que permite o desenvolvimento, produção e testes de transformadores de potência de 800 quilovolts (kV) em corrente contínua. O projeto exigiu investimento de R$ 60 milhões. “O investimento em Canoas permitiu participar do contrato da linha de transmissão das usinas do rio Madeira, o que nos trouxe muito conhecimento e nos posiciona muito bem em um futuro em que os projetos hidrelétricos terão cada vez mais presença na região Norte e precisarão de linhas de transmissão até o centro-sul do país”, diz o vice-presidente da Alstom Grid na América Latina, Sergio Gomes. O contrato, firmado com o Consórcio Interligação Elétrica do Madeira (IE Madeira), representou um marco mundial para a Alstom Grid. Os transformadores conversores, de 314 MVA e 600 kV (28 peças ao todo), foram produzidos em sua maior parte no Brasil (20 peças), quatro Alstom 60 anos de Brasil 37 vieram do centro de excelência da Alstom Grid em Stafford (Reino Unido), sendo utilizados como protótipos e também para treinamento e aprendizado tecnológico de profissionais brasileiros, e outros quatro foram trazidos da fábrica que a companhia tem em Wuhan, na China. O contrato com a IE Madeira teve outro marco: com extensão de 2.386 quilômetros, as linhas de transmissão e subestações que compõem a interligação do complexo formado pelas usinas Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, através da subestação Porto Velho com a subestação Araraquara, no interior de São Paulo, são as mais extensas já construídas no planeta. Para reforçar sua presença em um mercado cheio de oportunidades, a empresa também fez duas aquisições estratégicas, ampliando a gama de produtos e serviços, bem como sua carteira de clientes, tanto entre agentes públicos quanto privados. Em julho de 2013, foi anunciada a compra da Engeman, empresa com expertise em serviços de manutenção em sistemas e equipamentos de média, alta e extra-alta tensão, com sede em Jaguariúna (SP), com especialização em manutenção de subestações e serviços para transformadores, com uma carteira de cerca de 300 clientes, englobando tanto concessionárias quanto indústrias. Engeman e Alstom tinham trabalhado juntas no projeto Rio Madeira. “Fazíamos de forma tímida a manutenção de equipamentos, de forma corretiva. Passamos a ser pró-ativos, podendo fazer ações preventivas”, destaca Gomes. Em janeiro de 2014, a Alstom Grid anunciou a aquisição da Reason Tecnologia, fornecedora de produtos de medição e rede de automação de subestação para clientes de transmissão e distribuição. Com a decisão, a Equipamentos para o linhão do Madeira Alstom ganhou ferramentas para ter mais espaço no mercado de automação de subestações na América Latina, tendo mais capacidade para a construção de subestações totalmente digitalizadas, uma tendência crescente, com os clientes em busca de maior confiabilidade e flexibilidade, além de custos mais baixos de construção. Com cerca de 100 colaboradores e sede em Florianópolis (SC), a Reason possui um centro de Pesquisa e Desenvolvimento, que envolve cerca de 20 colaboradores e contatos com universidades locais. A em- Alstom 60 anos de Brasil presa cresceu com força, apoiada em tecnologia própria, altamente reconhecida pelo mercado. Dentro de seu planejamento estratégico, a Reason buscou acesso ao mercado mundial e apoio para seguir investindo em aprimoramento de seus produtos e aumento de portfólio. A Alstom Grid, por sua vez, encontrou na Reason uma complementaridade perfeita para ofertar uma subestação totalmente digitalizada e com produtos Alstom Grid. Com a aquisição pela Alstom, a Reason passou a fazer parte dos centros de desenvolvimento de tecnologia para controle e proteção de subestações, o que permite o intercâmbio com outros centros da empresa no mundo, como os localizados na França, Canadá, Alemanha. “O núcleo de inovação da Reason foi integrado ao da Alstom Grid, o que permite o intercâmbio de ideias e tecnologias entre os vários centros de tecnologia da empresa nessa área em todo o mundo, permitindo que o desenvolvimento de novas soluções seja acelerado”, aponta Gomes. Força dos ventos 38 Embora as obras das usinas do rio Madeira e de Belo Monte andassem a todo vapor, uma certeza ganhava espaço no setor elétrico: o licenciamento ambiental desses empreendimentos na região Norte estava se tornando mais complexo e demorado. Associado à falta de reservatório de água nos empreendimentos em construção e à necessidade de complementaridade na matriz elétrica, uma das apostas do governo federal foi diversificar os investimentos em fontes renováveis, com destaque para as usinas eólicas, cujo potencial era promissor. O Atlas do Potencial Eólico Brasileiro, publicado em 2001 e elaborado pelo Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), apontou que o Brasil poderia chegar a uma potência instalada de 143 GW no segmento, dez vezes mais do que a capacidade da usina de Itaipu, uma das três maiores do mundo. Enquanto o governo brasileiro se preparava para estimular o ingresso da fonte alternativa na matriz elétrica nacional, a direção mundial da Alstom anunciou, em 2007, a aquisição da espanhola Ecotècnia por 350 milhões de euros. A empresa de Barcelona, que então centrava 90% de sua atividade em energia eólica e 10% em energia solar, era a nona mundial do setor, então com 2% de participação no mercado mundial de equipamentos eólicos. O investimento marcou o ingresso da Alstom no dinâmico mercado de energia gerada pela força dos ventos, uma tendência que havia ganho espaço nos últimos anos na Europa e nos Estados Unidos e que deveria agora ser adotada pelos países emergentes, com Alstom 60 anos de Brasil 39 destaque para Brasil e China. De olho nesse mercado nascente, a Alstom resolveu redobrar os esforços para liderar o fornecimento de equipamentos eólicos no Brasil. “Decidimos investir pesado em um segmento que era novo também para a Alstom, porque acreditávamos que ele seria muito promissor no Brasil”, relembra Phillipe Delleur, que dirigiu a empresa no Brasil entre 2009 e 2012. Não demorou muito para a empresa ir atrás dos primeiros clientes. Em 2009, o governo federal decidiu realizar, pela primeira vez, um leilão exclusivo para a fonte eólica. O certame contratou 71 projetos, em cinco Estados das regiões Nordeste e Sul, totalizando 1.805,7 MW, sendo 753 MW médios. O preço médio de venda de R$ 148,39 por MWh representou deságio de 21,49% em relação ao preço-teto de R$ 189 por MWh. Para impulsionar ainda mais o segmento, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) passou a conceder financiamento para máquinas e equipamentos, em um plano de nacionalização progressiva, que foi substituído posteriormente por regras específicas e exclusivas para o setor eólico. Para crescer no Brasil, o primeiro passo era ter produção nacional para ficar mais próxima do mercado e para que seus clientes pudessem ter acesso aos financiamentos do BNDES. A empresa decidiu instalar sua primeira fábrica voltada ao setor eólico, em Camaçari, na Bahia, estado com o maior potencial eólico do país. Inaugurada em 2011, com capacidade inicial de produção de 300 MW, a unidade marcou o ingresso da empresa em um segmento que teria uma explosão de demanda ao longo dos anos futuros: em 2005 o Brasil detinha dez usinas eólicas de 28 MW; em 2009, a capacidade chegou a 600 MW; em 2013 pulou para 3,4 mil MW e deverá superar 14 mil MW – mais do que a capacidade da usina de Itaipu – em 2018. Para ganhar espaço no mercado nacional, a empresa teve outro trunfo, desenvolvido pelo centro de tecnologia da empresa em energia eólica na Espanha: as turbinas ECO 122, com capacidade de gerar 2,7 megawatts, feitas para serem instaladas em terra. Essa turbina tem o maior diâmetro de rotor no segmento onshore de 2 MW a 3 MW. Ela combina alta potência e alto fator de capacidade para aumentar a produção de energia em regiões com ventos de baixa velocidade, adaptando-se perfeitamente às condições de vento brasileiras. “Ela se tornou um diferencial para que a gente ganhasse mercado”, afirma Marcos Costa. Um ano depois da inauguração da unidade de Camaçari, a fábrica já operava em dois turnos para fabricar 600 MW por ano de Alstom 60 anos de Brasil 40 capacidade, o dobro do ritmo inicial. Ao detectar que havia gargalo na produção de torres metálicas, a empresa decidiu investir na construção de uma unidade em Canoas (RS), ao lado da planta do setor Grid da Alstom, para atender ao segmento eólico. Inaugurada em 2013, com capacidade para produzir 120 torres por ano, o que representa em torno de 350 MW, tornou-se a primeira fábrica de torres metálicas da empresa na América Latina. A tecnologia diferenciada, mais apropriada aos ventos do Nordeste, deu uma competitividade ímpar à Alstom, que, em fevereiro de 2013, assinou um contrato histórico de parceria com a Renova Energia, de 1 bilhão de euros, com previsão de entrega de cerca de 440 aerogeradores, com capacidade instalada mínima de 1,2 gigawatts. O contrato – o maior onshore da Alstom no mundo – ainda contempla estreita cooperação entre as duas empresas para desenvolver equipamentos exclusivamente desenhados para os ventos dos parques eólicos de Caetité, no semiárido da Bahia, onde a geradora concentra seus maiores investimentos, por considerar a área como a de maior potencial eólico do país. A equipe da Renova trata a região como “mina de ouro dos ventos”. Com equipamentos mais propícios aos ventos da Bahia, a empresa passa a ter um fator de capacidade melhor, o que permite que ela gere mais energia do que o previsto, o que aumenta sua lucratividade e competitividade frente aos demais empreendedores do mercado. Além da tecnologia inovadora e de abrir as portas para as duas empresas desenvolverem em conjunto os equipamentos, dois outros pontos foram levados em consideração pela Renova para assinar a parceria com a Alstom: a unidade da empresa em Camaçari que reduzia gargalos logísticos e dava proximidade com a parceira, enquanto a produção local permitia o acesso aos financiamentos do BNDES, essenciais na equação de reduzir os custos de implementação dos projetos. “Manutenção, estabilidade de geração e incrementos adicionais de fator de potência Fábrica de Camaçari Alstom 60 anos de Brasil 41 serão pontos essenciais para ampliar a participação da fonte eólica na matriz energética do Brasil”, analisa Mathias Becker, diretor-presidente da Renova. Becker diz que o setor de geração elétrica ruma para maior diversificação e que há uma volatilidade estrutural que começa a ganhar espaço, por conta do ingresso de mais usinas a fio d’água. Isso faz com que as oscilações de preço possam ser maiores nesta década, em meio a custos crescentes, o que pode afetar o preço da energia nova - que deve elevar a demanda de grandes consumidores por lotes de energia. “Temos buscado destinar parte da energia dos nossos projetos para o mercado cativo e para o livre.” Os bons ventos do setor deverão se manter. Segundo previsões do presidente da EPE, Mauricio Tolmasquim, a participação da energia eólica na matriz deverá pular de 1,5%, em 2013, para 9,5% em 2022. Nesse contexto, a empresa preparou mais um investimento no segmento. Dessa vez, por meio de uma joint-venture com a Andrade Gutierrez, cujo foco é a construção e operação de uma fábrica na Bahia para produzir torres de aço para aerogeradores. A unidade recebeu investimentos de cerca de 30 milhões de euros e será composta 51% pela Andrade Gutierrez e 49% pela Alstom. A inauguração ocorreu em janeiro de 2015 e a fábrica tem capacidade de produzir 200 torres metálicas por ano. “A Torres Eólicas do Nordeste (TEN), nossa joint venture com a Alstom, vai dar origem a uma importante fábrica na região de Jacobina (BA), cidade próxima aos principais projetos eólicos atuais e potenciais da região que hoje tem cerca de 80% dos parques eólicos do país. Sabemos da relevância da energia eólica na estruturação de um mix energético no país e estamos investindo bastante nessa direção”, destaca Otavio Azevedo, presidente do conselho de administração da Andrade Gutierrez. O crescimento da produção da Alstom na geração eólica no Brasil teve outro impacto no país: os investimentos da empresa contribuíram para o adensamento da cadeia produtiva nacional voltada à produção de equipamentos eólicos, permitindo que mais riqueza fosse criada internamente e distribuída por outros elos da indústria. Hoje 29 empresas participam no país como subfornecedoras da Alstom. Uma nacelle usada em uma turbina eólica e montada em Camaçari possui cerca de 1000 componentes, sendo que a Alstom não produz nenhum deles. “Também não fabricamos pás, mas desenvolvemos parceiros locais que investiram com a gente”, destaca Marcos Costa. Alstom 60 anos de Brasil 42 Mobilidade urbana vira preocupação nacional As novidades não estavam apenas na movimentada área de energia. O anúncio de que o país sediaria os dois mais importantes eventos do mundo – a Copa do Mundo em 2014 e os Jogos Olímpicos em 2016 – fez com que o tema mobilidade urbana ganhasse espaço na agenda das cidades, cenário que também era impulsionado por outro fator: a ascensão social. Entre 2003 e 2013, dez milhões de brasileiros voaram pela primeira vez no Brasil. Na maior cidade do país, São Paulo, o número de passageiros transportados sobre rodas e trilhos, desde 2003, dobrou e superou as seis milhões de viagens diárias. O começo dos anos 2000 tinha sido marcado por uma desaceleração nos projetos nacionais, que ficaram estagnados devido à falta de investimentos no modal metroferroviário. A Alstom passou por um longo período sustentando-se por projetos internacionais, como para os metrôs de Nova York, Santiago e Buenos Aires, que foram produzidos na unidade brasileira, em São Paulo. No início da década de 2010, a divisão de transportes vislumbrava uma virada, com aumento de investimentos privados e estatais na área e a intenção de governos estaduais e municipais de investir em novos modais, para reduzir congestionamentos cada vez mais frequentes nas grandes cidades. Em dezembro de 2012, esse ponto de inflexão do mercado metroferroviário se cristalizou: no início daquele mês, no Palácio da Guanabara, sede do governo fluminense, o presidente da empresa no Brasil, Marcos Costa, participou da cerimônia de assinatura de contrato para a venda de novos trens para a concessionária SuperVia e para a instalação de uma fábrica de montagem no Rio de Janeiro, dedicada à fabricação dos equipamentos e depois com foco na manutenção. A aquisição dos novos trens, inicialmente prevista para 2016 a 2020, foi antecipada com o objetivo de acelerar o processo de modernização do sistema ferroviário do Estado fluminense. Todos os 10 trens encomendados – que somam 80 carros e contemplam a primeira etapa do contrato – foram entregues até o final de 2014, sendo que o primeiro foi entregue 13 meses depois da assinatura do contrato, um recorde no Brasil. O acordo confirmou que a demanda do setor tinha se ampliado: o mercado de transportes, antes muito concentrado em São Paulo e Brasília, começava a ampliar seu alcance e, além do governo, a iniciativa privada começava a despontar como novo agente de demanda. A SuperVia integra a Odebrecht TransPort. “Co- Alstom 60 anos de Brasil 43 meçamos a reabrir novos mercados, como o do Rio de Janeiro”, recorda-se Michel Boccaccio, Vice Presidente Sênior do setor Transporte da Alstom na América Latina. Para melhorar a circulação nas grandes capitais, governos municipais começaram a estudar outras opções de modais e se debruçar sobre projetos de Veículos Leves sobre Trilhos (VLT), monotrilhos e corredores expressos de ônibus. De olho na demanda por VLTs, a Alstom decidiu investir R$ 50 milhões na construção de uma unidade inaugurada no início de 2015, Primeiro trem entregue à SuperVia em Taubaté (SP), focada na construção desses trens urbanos. Um dos pedidos para o qual a unidade trabalha é o Porto Maravilha, que interligará, em 2016, os bairros da região portuária ao centro financeiro e ao Aeroporto Santos Dumont. Primeiro do gênero no Brasil, o VLT também será projetado totalmente sem catenárias (cabos para captar energia elétrica em fios suspensos). O abastecimento de energia será feito por um sistema de alimentação pelo solo, uma espécie de terceiro trilho já implantado com sucesso em diversas cidades européias. Inicialmente serão construídas cinco unidades do VLT na França pela Alstom, visando atender ao prazo previsto de início da operação. Os outros 27 trens serão construídos no Brasil a partir de transferência de tecnologia. Cidades como Santos, Rio de Janeiro, Cuiabá e Goiânia já estão com projetos em andamento de VLT, mas outras estão estudando. “Maceió, Salvador, Recife, Osasco estão avaliando o modal, que deve ter presença crescente, por isso estamos posicionados com essa unidade, que trará competitividade importante”, avalia Michel Boccaccio. Além do mercado interno, a unidade também terá foco no exterior, com prospecção de oportunidades no Peru, Colômbia, México e Equador. “Com a fabricação local, nossos clientes passam a poder ter financiamento do BNDES, o que dá competitividade aos projetos”, destaca Boccaccio. Para dar partida à fábrica de transportes no interior paulista, a área de recursos humanos desenvolveu um plano semelhante ao adotado para o início operacional da unidade em Rondônia. Chamado internamente de Projeto Maravilha (o VLT carioca circulará na área chamada pela prefeitura de Porto Maravilha), a iniciativa costurou uma parceria Alstom 60 anos de Brasil 44 com o Senai, para capacitação da mão de obra local. Em agosto de 2014, a entidade preparou uma prova para selecionar 130 candidatos. A procura foi muito maior: mais de 6500 pessoas se candidataram às vagas abertas, dez vezes acima da demanda prevista inicialmente. Duas novas turmas serão abertas para complementar as três fases de contratação da unidade, que receberá, gradualmente, novos colaboradores em janeiro, abril e dezembro de 2015. A transferência de tecnologia tem sido intensa nos últimos meses. Engenheiros brasileiros foram enviados para unidades na Europa para aprender as tecnologias usadas pela Alstom nas fábricas de VLTs da França, Itália e Polônia, que há anos trabalham com encomendas desse segmento, que poderá ter um crescimento relevante no mercado nacional ao longo dos próximos anos. Engenheiros de unidades da Alstom no exterior vieram ao Brasil para Modelo de veículo leve sobre trilhos mostrar como os projetos podem ter maior eficiência. O intercâmbio de ideias e experiências não tem sido de via única. Centro de excelência mundial da Alstom em fabricação de carros com aço inoxidável, a unidade da Lapa tem contribuído para a transferência de tecnologia para outras encomendas de fábricas da empresa pelo mundo. Em maio de 2013, foi concluída, na zona oeste de São Paulo, a fabricação da primeira composição para o metrô de Chennai, na Índia, resultado de um contrato de 243 milhões de euros em 2010 para fornecer 42 composições para a companhia Chennai Metro Rail Limited. Os primeiros nove trens foram fabricados na unidade Lapa, enquanto os outros 33 trens começaram a ser produzidos na Índia, na recém-construída planta de Sri City, primeira fábrica de material rodante da Alstom na Índia. Para que a unidade indiana obtivesse know-how operacional, 65 funcionários do país asiático foram acompanhados e treinados no Brasil para que adquirissem o conhecimento e a experiência necessários para atender às exigências definidas pelo cliente. O Brasil também exportou tecnologia para um pedido histórico conquistado pela Alstom na África do Sul. Pelo acerto firmado pela subsidiária sul-africana com a PRASA (Passenger Rail Agency of South Africa), Alstom 60 anos de Brasil 45 serão fornecidos 600 trens X’Ttrapolis Mega (3.600 carros) ao longo de um período de dez anos. O contrato inclui a construção de uma unidade fabril local em Dunnottar, 50 km a leste de Johanesburgo. Para atender a esse contrato, a unidade Lapa produzirá os primeiros 20 trens e também fará, a partir de 2015, a transferência de tecnologia para a nova fábrica que será erguida no país africano. Além do VLT e das linhas de metrô tradicionais, a Alstom tem outra aposta no setor de transportes no Brasil: a linha Axonis, uma nova solução em metrô leve, com capacidade para transportar entre 10.000 e 45.000 passageiros por hora. Graças ao seu viaduto pré-moldado e abordagem de sistemas pré-definidos, ele pode ser lançado e colocado em funcionamento em apenas três a quatro anos. Ao contrário dos monotrilhos e metrôs com pneu de borracha, o Axonis utiliza uma interface não proprietária, permitindo aos operadores aumentarem a capacidade e desenvolverem extensões de linha sem necessariamente contratar o mesmo fornecedor do início do projeto. Se existem motivos para comemorar, também existem frustrações. Uma delas é a não realização da licitação do Trem de Alta Velocidade (TAV), um projeto que contou com a participação de vários colaboradores da Alstom. Em 2005, o governo federal anunciou a contratação de um projeto básico para estudar a interligação por trilhos entre as duas maiores cidades da América Latina: São Paulo e Rio de Janeiro. Dois anos depois, em 2007, foi contratado um outro estudo que serviria de base para a elaboração do primeiro edital de licitação do TAV. Realizado em 2011, o primeiro leilão fracassou. A União então resolveu reformular o edital e dividiu o processo em duas fases: construção e operação, sendo que a Empresa de Planejamento e Logística (EPL, órgão estatal de planejamento do setor de transportes) assumiria parte do risco do negócio. Em agosto de 2013, o governo adiou a realização da licitação, sem estabelecer um prazo para a retomada do projeto. “Trabalhamos muito nele, foram conduzidas várias reuniões com os governos federal, do Rio de Janeiro e de São Paulo, até que foi decidida a suspensão do leilão, mas esse conhecimento adquirido no projeto é importante para o futuro, porque em algum momento o TAV será retomado, pelo tamanho das duas cidades e a necessidade de uma opção alternativa de transporte”, diz Michel Boccaccio. Alstom 60 anos de Brasil 46 Trabalho constante no reforço da ética De 2005, quando celebrou seus 50 anos de Brasil, a 2015, a Alstom conquistou vários contratos históricos, seja na área de energia, seja na de transportes. Ao participar do fornecimento de três dos maiores projetos hidrelétricos do mundo, da maior linha de transmissão de corrente contínua de 600 kV do planeta, do maior contrato de energia eólica onshore no mundo e de relevantes contratos na área de transportes, a empresa reforçou sua presença no grupo mundial e na economia brasileira: de três mil colaboradores, em 2005, a empresa conta hoje com mais de 5.500 espalhados em 15 unidades do país. O faturamento, que em 2005 chegou a US$ 500 milhões, pulou para quase US$ 2 bilhões no ano fiscal 2013/14. Os bons resultados são fruto da estratégia que combina um portfólio amplo de soluções, fabricação local, busca incessante de inovação, além de um trabalho permanente de gestão da imagem e de comunicação com seus públicos de interesse, um tema que ganhou importância para a Alstom, depois de a empresa ter tido seu nome envolvido em supostas irregularidades em contratos no Brasil. No início de maio de 2008, com a divulgação de uma suposta denúncia e abertura de investigações, a empresa teve sua imagem abalada no Brasil. A primeira tarefa da direção da empresa foi colaborar com todas as autoridades envolvidas na questão, seja no Brasil, seja no exterior. A segunda ação foi trabalhar a comunicação, de olho em reforçar a reputação. Era então preciso adotar um plano de comunicação mais abrangente. A empresa incrementou suas ações internas e externas para trabalhar com todos os seus públicos, reforçando ainda mais seu código de conduta e ética. Em 2011, a direção mundial da empresa deu sinal verde para que as subsidiárias criassem campanhas regionais para reforçar o código de ética entre os colaboradores, como um dos ativos mais importantes da empresa. Em 2012, a Alstom Brasil criou a campanha interna intitulada de “Caça ao Tesouro”, dividida em três fases. Na primeira, os 15 temas que compõem o Código de Ética foram divulgados semanalmente, durante quase quatro meses, em newsletters, intranet, TVs e quadros de aviso. Então os colaboradores receberam um documento semelhante a um mapa do tesouro. Nele, estavam algumas questões sobre os temas do Código de Ética que deveriam ser preenchidos em uma semana. Durante esse período, foram publicadas dicas de onde poderiam Alstom 60 anos de Brasil 47 ser encontradas as respostas dos questionamentos sobre o Código de Ética. Após o preenchimento e entrega, os formulários foram reunidos para sorteio. O tesouro, um pergaminho com uma mensagem especial sobre o código de ética da empresa, foi entregue aos sorteados em uma caixa de madeira recheada com moedas de chocolates. Apenas os funcionários que descobriram as respostas exatas sobre o Código de Ética, de acordo com as orientações do mapa, participaram do sorteio. Além dos funcionários sorteados, ao final da campanha todos os funcionários, independente da participação, receberam também um pergaminho com uma mensagem específica sobre o maior tesouro da empresa e a importância de conhecê-lo e aplicá-lo. Em 2012, o primeiro prêmio de ética e compliance do Grupo no mundo foi entregue ao Brasil, em reconhecimento à campanha. Em 2013, um novo baque atingiu a empresa no Brasil: em julho, a alemã Siemens, em acordo com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), denunciou a existência de um cartel no setor metroferroviário, envolvendo 12 empresas, incluindo a Alstom. A Alstom também enfrentou, naquele mesmo ano, a denúncia de que o Ministério Público da Suíça teria identificado supostos pagamentos a políticos que teriam sido realizados pela empresa. Foi preciso reagir com rapidez. Além de deixar claro o compromisso de cooperar com as autoridades e as investigações, a diretoria da empresa resolveu intensificar ações internas para reforçar ainda mais seu código de ética entre todos os colaboradores, enfatizar a política de tolerância zero em relação a atos de corrupção e ampliar mais o diálogo com todos os seus públicos de interesse. O presidente da empresa, Marcos Costa, visitou todas as unidades industriais da empresa e teve reuniões abertas, nas quais todos os colaboradores participaram, com a possibilidade de perguntar o que quisessem. Nos boletins internos voltados aos colaboradores, o diretor de compliance passou a ter uma coluna em que aborda, periodicamente, a ética. Campanhas internas foram criadas para enfatizar que qualquer funcionário que soubesse de alguma irregularidade deveria informar aos canais internos que tratam do tema. Em outubro de 2013, o canal de denúncias da empresa foi atualizado e pode ser usado por um site externo e um telefone 0800, o que amplia a segurança em denunciar. Além de se preocupar com o público interno, a direção traçou ações para dialogar de forma ainda mais transparente e clara com todos seus públicos de interesse. A alta direção marcou visitas com representan- Alstom 60 anos de Brasil tes de governos, clientes, parceiros, bancos e fornecedores, explicando a postura da empresa e o que ela estava fazendo internamente para reforçar seus procedimentos de compliance. Nos encontros, foi destacado o compromisso histórico com o Brasil. De 2009 a 2014, a empresa investiu mais de R$ 500 milhões no país, um volume histórico, reflexo dos pedidos conquistados nesses anos. A Alstom também resolveu abrir mais canais de diálogo com a sociedade civil, intensificando contatos com Organizações Não Governamentais (ONGs) e com a imprensa, participando de reuniões com jornalistas das principais revistas e jornais do país. A empresa também decidiu ter participação ativa no Instituto Ethos e se tornou uma das signatárias do Pacto Empresarial pela Integridade e Contra a Corrupção. A Alstom ainda se tornou membro do Grupo de Trabalho do Pacto e, ao lado de outras companhias, tem participado de encontros regulares para compartilhar experiências e discutir estratégias para a promoção da integridade no ambiente corporativo, bem como de prevenção e combate à corrupção. O amplo esforço tem dado resultado. A saída de colaboradores no Brasil no ano fiscal encerrado em março de 2014 ficou em 3,2%, abaixo da taxa mundial do Grupo de 4%. Os clientes mantiveram sua confiança na empresa: no ano fiscal 2013/2014, em plena crise de imagem, a empresa registrou crescimento de 30% no faturamento, que subiu para R$ 3,1 bilhões. Foram obtidos R$ 6 bilhões em novos contratos. “Nossos colaboradores continuam orgulhosos e comprometidos com a empresa, e nossos clientes continuam confiantes em nossos produtos e nosso conhecimento. Assim mantemos nosso otimismo em contribuir com o crescimento sustentável do Brasil e construir um futuro promissor com nossos públicos de interesse”, diz Costa. Um novo capítulo 48 Em abril de 2014, o Conselho de Administração da Alstom anunciou ter recebido uma oferta firme da General Eletric (GE) para adquirir as atividades de Geração de Energia Térmica e Renováveis, e Transmissão de Energia, assim como a área corporativa e os serviços compartilhados. Em dezembro, a Assembleia Extraordinária de Acionistas, que reuniu acionistas detentores de 64,25% do número total de ações com direito a voto, aprovou a transação, por uma maioria de 99,187%. Durante a Assembleia de Acionistas, Patrick Kron, Chairman e Alstom 60 anos de Brasil 49 CEO da Alstom, informou o progresso do projeto. Após o procedimento de consulta de informação com conselhos trabalhistas e a autorização relacionada a investimentos estrangeiros na França, o apoio expresso pelos acionistas é um marco chave na assinatura dos acordos com a GE. A transação continua sujeita às autorizações exigidas do ponto de vista regulatório e de controle de fusão em várias jurisdições. Sujeito a essa condição, espera-se que o fechamento da transação ocorra no segundo trimestre de 2015. Mas este não será o fim de uma história de 60 anos no Brasil. Os progressos feitos pela Alstom na área de energia seguirão ainda mais sólidos com uma nova empresa. Além disso, a marca Alstom continuará sendo levada aos quatro cantos do Brasil por meio da área de transporte metroferroviária, que continuará exercendo suas atividades separadamente. Foram 60 anos de incentivos à indústria brasileira, à formação de mão de obra de qualidade, à criação de empregos e à execução de projetos que marcaram o desenvolvimento da infraestrutura brasileira. Que venham mais 60 anos! Roberto Rockmann, jornalista, formado pela Universidade de São Paulo (USP). Trabalhou no Invest News da Gazeta Mercantil e na cobertura do setor de infraestrutura para o Valor Econômico. Escreveu em parceria com o jornalista Tom Cardoso a biografia de Paulo Machado de Carvalho, lançada no segundo semestre de 2005. por René Vergne Um casal que Alstom amava o60 Brasil anos de Brasil 50 Charles Marie Bernard Henri Schneider, terceiro filho do casal Eugène e Antoinette, nasceu em Paris a 28 de junho de 1898. Em 1916, ingressou no Exército francês que combatia as tropas alemãs na Europa. Com a derrota da Alemanha na Primeira Guerra Mundial, Charles Schneider juntou forças com o irmão, Jean, na empresa da família. Era preciso aproveitar a reconstrução européia, que poderia servir de impulso para a Schneider – que começara como uma pequena fundição em uma aldeia de Creusot, na França, em 1782, e passara a ser da família Schneider em 1836. O desafio de ajudar o pai, Eugéne, terminou em 1924, quando, por desavenças, Charles e Jean tomaram outros rumos. Enquanto Jean iria trabalhar na Air France, ajudando a implantar linhas aéreas pelos quatro cantos do mundo, Charles entraria na Gaumont Film Company, onde encontraria a paixão de sua vida, a atriz Liliane Volpert. Em 1942, com a morte de Eugène, os dois irmãos assumiram a Schneider. Dois anos depois, o irmão morreria, e Charles assumiria sozinho o comando da empresa. Em 8 de maio de 1945, a Segunda Guerra Mundial terminava e a Europa via surgirem dois blocos: um ocidental, democrático, e o outro, oriental e dominado pela União Soviética, que disseminava ideais comunistas pela Checoslováquia, Romênia, Hungria, Polônia, entre outras nações. O reflexo na economia veio rapidamente: a Skoda, unidade industrial que a Schneider tinha na Checoslováquia, seria nacionalizada pelo regime comunista. Convencido da necessidade de uma maior abertura para o mundo, Charles, então, passou a explorar novas fronteiras, estudando diversas possibilidades de inserção em países jovens e promissores, nos quais as necessidades de expansão industrial seriam mais fortes. Assim resolveu investir no Brasil, cuja demanda por equipamentos era ilimitada. O interesse pelo Brasil e pela América do Sul não era novidade na família Schneider. Em 1917, o pai de Charles tinha sido um dos acionistas da Bolivian Enterprise Limited e, oito anos depois, Eugène também seria decisivo na criação da Companhia Ferro-Brasileiro. A Segunda Guerra tornara necessário aprofundar a exploração de novas fronteiras. Um Alstom casal que60amava anos de o Brasil Brasil Em 1947, Charles abria a Bracorep, um escritório de representação comercial, e, um pouco adiante, investia em Minas Gerais. A vitória do amigo Juscelino Kubitschek nas eleições presidenciais em 1955 cristalizava o desejo de Schneider de fincar raízes no Brasil. No fim daquele ano, a Mecânica Pesada começava a sair do papel. Dois anos depois, a fábrica começava a operar. O primeiro superintendente foi Jean de Genouillac, um dos muitos franceses que vieram no início da operação industrial transferir tecnologia para o Brasil. Muito ligados ao Brasil, Charles e Liliane compraram uma residência no bairro da Urca, no Rio de Janeiro, onde passariam, todos os anos, longas temporadas. A felicidade do casal terminou em agosto de 1960, quando Charles morreu acidentalmente. Com ele à frente, a Schneider tinha se transformado em uma grande holding, com um braço principal, a Societé de Forges et Ateliers de Creusot (SFAC), que abrigava as unidades fabris do grupo, com destaque para a área da indústria pesada e siderúrgica. Sem ele, o grupo nunca mais seria o mesmo. Liliane, ou “Madame Schneider” como era conhecida pelos funcionários, assumiu o comando da empresa ao lado de um grupo de conselheiros no início de 1960. As viagens a Taubaté continuaram em sua rotina. Na década de 70, a Creusot-Loire, resultado de uma fusão, incentivada pelo governo, de parte da Schneider com outro grupo francês, assumia a Mecânica Pesada.. Liliane Schneider morreu em março de 1982. René Vergne, engenheiro mecânico e advogado, foi presidente da Mecânica 51 Pesada de 1975 a 1986. Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Brasil 1945 Maio Fim da Segunda Guerra Mundial. Outubro Criação da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf). Dezembro Fim do Estado Novo no Brasil. 1946 Setembro Promulgação de uma nova Constituição Brasileira. 1947 Criação da Brasileira de Comércio e Representações (Bracorep), escritório de representação do grupo francês M. M. Schneider no Brasil. 1948 Viagem de M. Charles Schneider e sua esposa, Liliane Schneider, ao Brasil. 1949 Fevereiro Iniciadas as obras de construção da Hidrelétrica de Paulo Afonso, da Chesf. 53 Marcos da trajetória Alstom da 60 Alstom anos no de Brasil Brasil 1950 Outubro Eleição de Getúlio Vargas para a Presidência da República e de Juscelino Kubitschek para o governo de Minas Gerais. 1951 Julho Criação da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos. Durante dois anos de atividades, a comissão elabora 41 projetos de desenvolvimento e modernização da infraestrutura do país, especialmente para os setores de transporte e energia elétrica. Charles Schneider encontra-se com Juscelino Kubitschek em Saint Tropez e decide instalar uma unidade industrial do grupo Schneider no Brasil. Construção de uma pequena fundição na cidade de Caeté (MG), primeiro investimento do grupo Schneider no país. 1952 Maio Criação da Centrais Elétricas de Minas Gerais (Cemig). Junho Criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), instituição de crédito voltada para os setores básicos da economia brasileira. Tem como finalidade original o financiamento a longo prazo dos programas recomendados pela Comissão Mista Brasil-Estados Unidos. 54 Alstom anos no de Brasil Brasil Marcos da trajetória da 60 Alstom 1953 Outubro Criação da Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras), que abre novas possibilidades para os fornecedores de bens de capital. 1954 Abril Enviado ao Congresso projeto de lei propondo a criação da Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobrás). Agosto Suicídio de Getúlio Vargas. Assume a Presidência da República João Café Filho. 1955 Janeiro Inauguração oficial da Hidrelétrica de Paulo Afonso. Outubro Eleição de Juscelino Kubitschek à Presidência da República. Novembro Realizada no Rio de Janeiro a assembléia de constituição da Mecânica Pesada (MEP). O grupo Schneider torna-se o principal acionista da empresa, com cerca de 60% do capital total. 55 Marcos da trajetória Alstom da 60 Alstom anos no de Brasil 1956 Fevereiro Um dia depois de tomar posse, Juscelino Kubitschek anuncia seu programa de desenvolvimento econômico -- o Plano de Metas. Este plano estabelece um conjunto de 30 objetivos a serem alcançados nos setores de energia, transporte, alimentação, indústrias de base e educação, além da construção de Brasília, chamada de metasíntese. Para sua execução é instituído o Conselho de Desenvolvimento, que passa a atuar por meio de grupos executivos. Junho Celebração de contrato com a Sociedade Comercial e Construtora e as Estacas Franki para as obras de fundação da MEP. Outubro Cerimônia de lançamento da pedra fundamental da MEP em Taubaté, primeiro investimento do setor de bens de capital sob o Plano de Metas. Participam do evento, entre outras autoridades, o casal Charles e Liliane Schneider, o governador de São Paulo, Jânio Quadros, e o presidente Juscelino Kubitschek. 1957 Fevereiro Criação da Central Elétrica de Furnas (Furnas). Junho A MEP recebe da Cia. Siderúrgica Belgo-Mineira sua 56 Alstom anos no de Brasil Marcos da trajetória da 60 Alstom primeira encomenda. Novembro Início das operações da MEP. Abertura de um escritório comercial da MEP em São Paulo. Início da construção de Brasília. 1958 Junho Criação do Grupo Executivo da Indústria de Construção Naval (Geicon). Construção da primeira comporta para a Usina Hidrelétrica de Camargos, da Cemig. Início da fabricação de máquinas para a indústria de papel. 1959 Agosto Criação do Grupo Executivo da Indústria Mecânica Pesada (Geimape). 1960 Agosto Falecimento de Charles Schneider, na França. Novembro A direção do grupo Schneider é dividida entre Liliane 57 Marcos da trajetória Alstom da 60 Alstom anos no de Brasil Schneider e conselheiros. Eleição de Jânio Quadros à Presidência da República. Fornecimento de equipamentos para as usinas hidrelétricas de Paulo Afonso II, da Chesf, e Três Marias, da Cemig. Entrada em operação da Usina Hidrelétrica de Camargos, da Cemig. Fornecimento de tubos para a indústria petroquímica. 1961 Agosto Renúncia de Jânio Quadros à Presidência da República. Setembro João Goulart assume a presidência do país, em regime parlamentarista. O primeiro-ministro é Tancredo Neves. Dois anos depois, por força de uma decisão plebiscitária, o sistema de governo no Brasil voltaria a ser presidencialista. 1962 Junho Criação da Centrais Elétricas Brasileiras S.A. (Eletrobrás), empresa holding das concessionárias de energia elétrica do governo federal. Entrada em operação da Usina Hidrelétrica de Três Marias (Cemig). 58 Alstom anos no de Brasil Marcos da trajetória da 60 Alstom 1963 União da Schneider com o grupo alemão Maschinenfabrik Augsburg Ntirnmberg A.G. (MAN), um dos maiores fabricantes de motores marítimos a diesel do mundo. Empresa alemã passa a deter 30% do capital da MEP (ações não votantes). Montagem da primeira turbina Kaplan de palhetas móveis para a Usina Hidrelétrica de Pato Branco, no rio Paraná. 1964 Março Deposição do presidente João Goulart por um golpe políticomilitar. Abril O general Humberto Castello Branco é empossado na Presidência da República. Fabricação pela MEP do primeiro carro torpedo brasileiro para a Cia. Siderúrgica Paulista (Cosipa). 1965 Nas comemorações pelos dez anos da MEP, o ministro de Minas e Energia, Mauro Thibau, aciona o primeiro motor marítimo a diesel fabricado no Brasil, com potência de 4.800 HP. A empresa trabalha para atender a outros pedidos da indústria naval e encomendas das usinas hidrelétricas de Jupiá e de Ilha Solteira. 59 Alstom anos no de Brasil Brasil Marcos da trajetória da 60 Alstom 1966 Setembro Constituição da Agência Especial de Financiamento Industrial (Finame), empresa subsidiária do BNDE criada para apoiar as empresas brasileiras produtoras de máquinas e equipamentos. Outubro O general Artur da Costa e Silva é eleito presidente da República pelo Congresso Nacional. Dezembro Constituição da Centrais Elétricas de São Paulo (Cesp). 1967 Entrada em operação da Usina Hidrelétrica de Paulo Afonso II (Chesf). 1968 Instalação da 1a turbina fabricada pela MEP, com potência de 55 MW, para a Usina Hidrelétrica de Peixoto. 1969 Outubro O general Emílio Garrastazu Médici é eleito presidente da República pelo Congresso Nacional. Entrada em operação da Usina Hidrelétrica de Jupiá, da Cesp. 60 Alstom anos no de Brasil Brasil Marcos da trajetória da 60 Alstom 1970 Ampliação das instalações da MEP para dar conta das encomendas da indústria naval e do setor elétrico, com destaque para a Usina Hidrelétrica de Marimbondo. Lançamento do I Plano de Construção Naval (I PCN), em vigor até 1974, prevê a ampliação da participação do capital nacional na exploração do transporte marítimo e a renovação das frotas das companhias de navegação. 1971 Lançamento do I Plano Nacional de Desenvolvimento (I PND). Estabelece como meta a aceleração do desenvolvimento econômico baseada na continuidade da política de substituição de importações e no incentivo aos investimentos externos. No âmbito do I PND é criado o Programa de Promoção de Grandes Empreendimentos, com o qual o governo busca atrair o empresariado nacional para os setores estratégicos da economia. 1972 Início da constituição da Empresa de Tração Elétrica (ETE), uma associação entre a MTE, braço ferroviário da Schneider, e a Alsthom-Atlantique. A intenção é aproveitar os planos dos governos federal e paulista de investir em transporte metroferroviário. É feita uma parceria com a Cobrasma para auxiliar no fornecimento de equipamentos para a linha 3 do metrô paulistano. 61 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil 1973 Dezembro Na França, o Grupo Schneider entra em profunda crise financeira. Os preços do petróleo produzido pelos países-membros da Opep quadruplicam, e o mundo entra em grave crise econômica. O Brasil, que importava quase todo o petróleo que consumia, é fortemente afetado pela medida. 1974 Janeiro O general Ernesto Geisel é eleito presidente da República por um Colégio Eleitoral formado por representantes do Congresso Nacional e das Assembléias Legislativas estaduais. Lançamento do II Plano Nacional de Desenvolvimento (II PND). Tendo por objetivo ajustar a economia brasileira à escassez de petróleo, o II PND busca garantir a autonomia do país no setor de bens de capital e na produção de insumos básicos. Outra preocupação é a redução da dependência em relação às fontes externas de energia, o que seria garantido com a construção de novos empreendimentos hidrelétricos e o apoio às pesquisas nas áreas de petróleo, de energia nuclear e do Proálcool. Construção do primeiro grande distribuidor para a Usina Hidrelétrica de Marimbondo, de Furnas. → 62 Marcos da trajetória Alstom da 60 Alstom anos no de Brasil Entrada em operação da Usina Hidrelétrica de Ilha Solteira, da Cesp. Criação da Mecânica Brasileira S.A. (Embramec), empresa subsidiária do BNDE destinada ao financiamento das indústrias privadas do setor de bens de capital. 1975 Outubro Entrada em operação da Usina Hidrelétrica de Marimbondo, de Furnas. Encomenda de escadas rolantes para o Aeroporto Internacional do Galeão (RJ). A MEP decide abandonar a fabricação de escadas rolantes e betoneiras. Lançamento do II Plano de Construção Naval (II PCN) para o período 1975-1979. Brasil torna-se o segundo produtor mundial de navios. A MEP recebe a encomenda de 51 motores para a indústria naval, seu maior pedido do setor. A MEP fabrica para a Alemanha seu primeiro motor marítimo destinado à exportação. Agrava-se a crise financeira do grupo Creusot-Loire, que assumira a Mecânica Pesada no início da década de 70. → 63 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Rumores dão conta de que a fábrica de Taubaté pode ser fechada. Criação do Conselho de Administração da MEP, cuja presidência é entregue ao ex-ministro Mauro Thibau. René Vergne assume a direção da MEP. 1976 Parceria com a empresa francesa Neyrpic para fornecimento de turbinas hidráulicas. 1977 Novos pedidos do setor naval e a perspectiva de grandes encomendas do setor elétrico abrem novas possibilidades para a MEP, e a empresa começa a superar a crise. Inauguração do pavilhão pesado de usinagem para construção de grandes turbinas hidráulicas. A MEP é a primeira companhia a utilizar um torno vertical no país. 1978 Março Celebração de contrato para fornecimento de 50% das turbinas da Usina Hidrelétrica de Tucuruí. Junho O Consórcio Itaipu Eletromecânico (Ciem), liderado pela MEP, vence licitação para fornecimento de 18 grupos turbogeradores de 700 MW para a Hidrelétrica de Itaipu. Equipe de técnicos franceses chegam a Taubaté para ajudar 64 Marcos da trajetória Alstom da 60 Alstom anos no de Brasil na transferência de tecnologia. Outubro O general João Batista Figueiredo é eleito presidente da República pelo Colégio Eleitoral. 1979 O início da Revolução Iraniana provoca o segundo choque do petróleo. A produção mundial é severamente afetada e o preço do barril atinge níveis recordes. A situação se prolongaria até meados da década seguinte, agravando o quadro recessivo da economia mundial. A MEP é eleita Empresa do Ano pela revista Exame. 1981 Aprofundamento da crise econômica iniciada no final do governo Geisel. O aumento da dívida externa e da inflação levam o governo federal a adotar um rigoroso programa de contenção de gastos. Os investimentos das estatais são drasticamente reduzidos. O setor energético praticamente não recebe mais investimentos e as empresas de bens de capital são duramente atingidas pela crise. Setor da construção naval começa a entrar em decadência. 65 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Brasil 1982 Março Falecimento de Liliane Schneider. 1983 Interrupção de encomendas e falta de pagamentos agravam a crise do setor de bens de capital. O nível de atividade da MEP tem redução de 50% em relação ao ano anterior. Para enfrentar a crise, a empresa decide diversificar suas fontes de investimentos. 1984 Outubro Inauguração da Usina Hidrelétrica de Itaipu (Itaipu Binacional). Novembro Inauguração da Usina Hidrelétrica de Tucuruí (Eletronorte). Manifestações populares em todo o país pedem o fim do regime militar e a convocação de eleições diretas para presidente da República. Emenda nesse sentido é rejeitada pelo Congresso Nacional. 1985 Janeiro O oposicionista Tancredo Neves é eleito presidente da República em eleição indireta realizada no Congresso Nacional. 66 Marcos da trajetória Alstom da 60 Alstom anos no de Brasil Brasil Março Gravemente enfermo, Tancredo não chega assumir a presidência. Em seu lugar é empossado o vice-presidente eleito José Sarney. Abril Falecimento de Tancredo Neves. José Sarney é efetivado na presidência. A direção mundial do grupo Alsthom visita a unidade de Taubaté e manifesta interesse em ter participação na MEP. Anunciada na França a falência do grupo Creusot-Loire. A Alsthom adquire a MEP. Novos produtos são incorporados ao portfolio da empresa: turbinas a vapor, turbinas a gás, bombas e equipamentos de irrigação. Com a crise no mercado interno, a empresa passa a priorizar o comércio exterior. 1986 Fevereiro O recrudescimento do processo inflacionário leva o governo a editar o Plano Cruzado. Preços e salários são congelados e é extinta a correção monetária. Uma nova moeda, o cruzado, é criada em substituição ao cruzeiro. Apesar de seu sucesso inicial, o plano não dá os resultados esperados. → 67 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Brasil Junho O comando da MEP é transferido do Rio de Janeiro para São Paulo. Novembro O anúncio do Plano Cruzado II põe fim ao congelamento de preços. As medidas provocam o declínio das exportações e o esgotamento das reservas cambiais. A inflação dispara novamente. 1987 Fevereiro O Brasil declara moratória dos serviços da dívida externa. Junho Lançamento do Plano Bresser, destinado ao equilíbrio das contas públicas. O plano institui o congelamento de preços e salários por 90 dias, a desvalorização da taxa de câmbio e o aumento das tarifas públicas. É criado um novo indexador para o reajuste dos salários: a Unidade de Referência de Preços (URP). No plano externo, é mantida a moratória. O plano provoca grandes perdas salariais e também não consegue debelar a inflação. 1988 Outubro Promulgação da nova Constituição Brasileira, que extingue os chamados fundos vinculados como o Imposto Único de Energia Elétrica (IUEE) e fundo rodoviário, medidas que vão 68 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Brasil dificultar ainda mais o financiamento desses setores. União da Alsthom com o grupo inglês General Electric Company (GEC) dá origem à GEC Alsthom. A MEP passa a se chamar GEC Alsthom Mecânica Pesada. 1989 Janeiro Decretado o fim da moratória da dívida externa. O governo edita o Plano Verão, programa de combate à inflação baseado na contenção do déficit público. Entre outras medidas, são previstas a privatização de empresas estatais, a demissão de funcionários públicos e a redução do consumo por meio da elevação da taxa de juros. Em substituição ao cruzado, é criada uma nova moeda, o cruzado novo. Tal como seus antecessores, o Plano Verão não consegue evitar a escalada inflacionária e o aprofundamento da recessão. Novembro O ex-governador de Alagoas Fernando Collor de Mello torna-se o primeiro presidente da República eleito pelo voto direto em quase 30 anos. Incorporação das empresas MASA e Balteau Produtos Elétricos pelo grupo GEC Alsthom do Brasil. A empresa cria vários programas visando diminuir os custos e aumentar a qualidade. Adoção de novos métodos de gestão levam à redução dos níveis hierárquicos e à criação 69 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Brasil de grupos de autogestão. Reuniões periódicas da chefia com os empregados são incorporadas à rotina da companhia. 1990 Março Anúncio do Plano Collor, um ambicioso programa de estabilização econômica que procura combinar medidas de combate à inflação com a desregulamentação da economia e a redução da presença estatal no setor. O cruzeiro volta a ser a moeda nacional e os depósitos bancários são congelados por 18 meses. Abril Criação do Programa Nacional de Desestatização. 1991 Outubro Philippe Joubert assume a direção da GEC Alsthom no Brasil. A GEC Alsthom passa a investir no setor de serviços e inicia um processo de aquisições de empresas, que se prolongaria até a metade da década. Aquisição da Promentec em São Paulo dá origem à GEC Alsthom Serviços Mecânicos. A entrada no setor de serviços e o aumento das exportações reduzem significativamente a participação do Estado nas encomendas feitas à empresa. O setor privado torna-se responsável por 70% do faturamento do grupo GEC Alsthom 70 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Brasil no Brasil. As exportações representam 20% da sua produção. O setor de serviços passa a responder por cerca de 35% da receita da empresa no país. Retomada do processo inflacionário. A crise econômica se agrava. 1992 Setembro Denúncias de corrupção levam a Câmara dos Deputados a aprovar o impeachment de Fernando Collor de Mello. Outubro O vice Itamar Franco assume interinamente a presidência do país. Dezembro O Senado Federal confirma a decisão da Câmara. Itamar Franco é efetivado na Presidência da República. Início da abertura do setor elétrico ao capital privado: Light Serviços de Eletricidade S.A. (Light) e a Espírito Santo Centrais Elétricas S.A. (Escelsa) são incluídas no Programa Nacional de Desestatização. A aquisição da Koblitz em Recife dá origem à GEC Alsthom Serviços Elétricos, mesmo nome que teria em São Bernardo a antiga Westinghouse. 71 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil 1993 Março A aprovação da Lei nº 8.361 estabelece novo regime tarifário para as companhias de energia elétrica. Dezembro Criação do Sistema Nacional de Transmissão de Energia Elétrica (Sintrel). O ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, anuncia o Plano Real, conjunto de medidas destinadas a promover um rigoroso ajuste fiscal como meio de combate à inflação. Paralelamente às medidas para contenção dos gastos públicos, o plano prevê a aceleração do processo de privatização das estatais, o controle do consumo por meio da elevação dos juros e o incentivo às importações. Como indexador único da economia é criada a Unidade Real de Valor (URV), que precede a adoção de uma nova moeda, o real. 1994 Junho O grupo GEC Alsthom adquire a empresa colombiana TYS. Criação da GEC Alsthom Turbinas y Servicios, cujo capital passa a ser controlado pela MEP e a G. A. Neyrpic France. Julho Lançamento do real. A inflação cai vertiginosamente. → 72 Marcos da trajetória Alstom da 60 Alstom anos no de Brasil Outubro Fernando Henrique Cardoso é eleito presidente da República. 1995 Janeiro O novo governo promete maior abertura do setor de infraestutura ao capital privado e o fim de monopólios estatais. O grupo GEC Alsthom prepara-se para expandir seus negócios na área de transporte. Julho A aprovação da Lei nº 9.074 estabelece novas regras para a concessão de serviços de eletricidade. É criada a figura do Produtor Independente de Energia. Os grandes consumidores são liberados do monopólio das concessionárias estatais. Agosto A GEC Alsthom dá início às atividades no setor de sinalização metro-ferroviária com a compra de 60% do capital da Cobrel Maquip Westinghouse Equipamentos S.A CMW, principal fornecedora de sistemas e equipamentos de sinalização metroferroviária do país. 1996 A GEC Alsthom compra a empresa alemã Allgemeine Electrivitats - Gesellschaft (AEG), em São Paulo. A empresa é contatada pela matriz para o fornecimento de equipamentos para a Usina Hidrelétrica de Três Gargantas, na China. 73 → Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Brasil Constituição da GEC Alsthom Engeturb em Campinas (SP), para fabricação de turbinas a vapor. 1997 Março A GEC Alsthom assume 100% do capital da CMW. Assinatura de contrato com a Mafersa, no qual a GEC Alsthom aluga as instalações localizadas no bairro da Lapa, em São Paulo, e aquisição de alguns contratos da Mafersa. Com o acordo, a GEC Alsthom Transporte do Brasil passa a liderar o mercado brasileiro de equipamentos para transporte metroferroviário. Agosto O Congresso Nacional promulga a Lei nº 9.478, que abriu à iniciativa privada as atividades da indústria petrolífera do país, aprovando o fim do monopólio estatal do petróleo. Setembro MAN anuncia sua saída do grupo Alsthom. O setor da indústria naval encontra-se praticamente paralisado. Outubro Abertura da GEC Alsthom Equipos y Servicios, em Lima (Peru). A GEC Alsthom dá início às operações para fabricação de carros metroferroviários de aço inox. 74 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Brasil 1998 Maio O grupo GEC Alsthom compra a Cegelec mundial, empresa de engenharia e sistemas elétricos atuante nos setores de energia e transporte ferroviário. Junho O Grupo GEC Alsthom ingressa nas bolsas de Paris, Londres e Nova Yorque e abre seu capital. As empresas do grupo têm a denominação alterada para Alstom. Agosto A Mecânica Pesada passa a se chamar Alstom Energia S.A. Outubro Fernando Henrique Cardoso é reeleito presidente da República. 1999 Março A associação das áreas de geração de energia da Alstom e da empresa suíço-sueca ABB dá origem à ABB Alstom Power. No Brasil, é criada a ABB Alstom Power Brasil Ltda. A Alstom adquire a empresa E.R. Equipamentos Elétricos de Alta Tensão. Constituição da ALTM S.A. – Tecnologia e Serviços de Manutenção, resultado de uma joint venture entre a Alstom e a Light. 75 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil 2000 Fevereiro A Alstom vence licitação para as obras de ampliação da Usina de Tucuruí. Março A Alstom adquire o controle acionário da ABB Alstom Power. A empresa aumenta a presença no Brasil. A unidade de geradores de Osasco (SP) e a fábrica de turbinas a vapor de Cravinhos (SP) são transferidas para a unidade de Taubaté (SP). Um novo pavilhão de 10.000 m² é construído para abrigar a linha de geradores. Abril O engenheiro brasileiro José Luiz Alquéres assume a direção da Alstom Brasil. Outubro O consórcio liderado pela Alstom vence a licitação para fornecer equipamentos para a linha 5 do metrô paulistano. Novembro Assinado contrato de ampliação de duas máquinas da Usina de Itaipu. A Alstom é uma das empresas do consórcio vencedor para fornecimento de equipamentos. A GEC Alsthom Turbinas y Servicios encerra suas atividades na Colômbia. Aquisição da fábrica de transmissão de energia da italiana Ansaldo Coemsa S.A, localizada em Canoas (RS). 76 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil 2001 Junho Anunciado pelo governo brasileiro o racionamento de energia elétrica, que visa reduzir em 20% o consumo no país. Setembro A Alstom fecha acordos para vender turbinas a gás para as termelétricas TermoRio, TermoBahia e Piratininga. Concluída a venda do setor Contracting da Alstom. Após os ataques terroristas de 11 de setembro, em Nova York, a economia mundial entra em crise. A este fato somam-se os problemas técnicos na linha de turbinas a gás GT/24 e com o setor Marine da Alstom. O efeito combinado dessa situação leva a Alstom mundial à maior crise de sua história. 2002 Março Fim do racionamento de energia. Julho A Alstom anuncia o maior acordo de exportação do setor metroferroviário brasileiro, que poderia render até US$ 500 milhões. São fechados contratos para o fornecimento de carros para os metrôs de Santiago (Chile) e Nova York. → 77 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil A empresa investe US$ 12 milhões para modernizar suas linhas de produção. Dois novos robôs são instalados na unidade localizada no bairro da Lapa, em São Paulo. Com esses contratos no setor de transporte e as vendas de equipamentos de energia para o exterior, o grupo eleva suas exportações para cerca de 40% do total produzido no Brasil. O ex-líder sindical Luiz Inácio Lula da Silva é eleito presidente da República. 2003 Janeiro Patrick Kron sucede Pierre Bilger na presidência da Alstom mundial. Junho O consórcio integrado pela Alstom vence licitação para a construção de um dos trechos da linha 4 do metrô de São Paulo. Agosto Em processo de saneamento financeiro, a Alstom mundial anuncia, na França, a venda da divisão de turbinas industriais para a Siemens. Logo em seguida é anunciado que todo o setor de transmissão e distribuição da empresa será vendido, para a Areva. → 78 Alstom anos no de Brasil Marcos da trajetória da 60 Alstom Dezembro Anunciado na França um pacote de ajuda financeira para a Alstom, com o aval do governo francês, que passa a fazer parte do capital da empresa. 2004 Janeiro A Alstom conclui a venda de suas atividades de transmissão e distribuição para a estatal francesa Areva. O grupo perde três grandes unidades no Brasil, uma em São Paulo, outra em Minas Gerais, e a última no Rio Grande do Sul. Por seu trabalho pioneiro na modernização da sinalização de ferrovias brasileiras, especialmente da Estrada de Ferro Carajás, a unidade de transporte da Alstom é premiada pela Revista Ferroviária como a melhor empresa do país na área de criação de tecnologia de informação. O faturamento da Alstom Brasil chega a US$ 500 milhões, cerca de duas vezes mais do que o registrado em 1991. 2005 Março O presidente mundial da Alstom, Patrick Kron, visita o Brasil, anuncia o sucesso do saneamento financeiro da empresa e é recebido pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, a quem convida para visitar Taubaté no ano do cinqüentenário da empresa no país. → 79 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Julho Com a presença do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva e do governador de São Paulo Geraldo Alckmin, a Alstom, celebra 50 anos de atuação no Brasil com um evento na unidade de Taubaté, SP. 2006 Governo trabalha no licenciamento ambiental dos projetos hidrelétricos do rio Madeira, que marcam a retomada dos empreendimentos na região Norte. Outubro Presidente Luiz Inácio Lula da Silva é reeleito presidente da República, no segundo turno. 2007 A Alstom estabelece um novo recorde mundial de velocidade sobre trilhos: 574,8 km/h. A Alstom ganha posição em energia eólica através da aquisição da fabricante espanhola Ecotècnia. Julho Brasil é anunciado pela Fifa como sede da Copa do Mundo de Futebol de 2014. Setembro Inauguração do novo complexo comercial: a Unidade Bandeirantes que integra os setores de Energia e Transporte. 80 Alstom anos no de Brasil Marcos da trajetória da 60 Alstom Dezembro A Câmara de Comercialização de Energia Elétrica realiza o leilão da usina hidrelétrica (UHE) Santo Antônio, no rio Madeira. O certame negociou um total de 1.552,60 MW médios. A usina teve 70% da energia alocada no Ambiente de Contratação Regulada, com início de suprimento previsto para 01/01/2012. 2008 A Alstom revela seu trem de altíssima velocidade AGV de quarta geração. Maio O consórcio Energia Sustentável do Brasil – composto por Suez Energy, Camargo Corrêa, Eletrosul e Chesf – venceu a licitação para construção da usina hidrelétrica de Santo Antônio (RO). Julho Contrato de sinalização em São Paulo. O projeto prevê o fornecimento de um sistema automático para as linhas 1, 2 e 3 do Metrô de São Paulo. Setembro Contrato para fornecimento de equipamentos para a usina hidrelétrica de Santo Antônio, no rio Madeira. Dezembro Contrato para fornecimento de equipamentos para a usina hidrelétrica de Jirau, também no rio Madeira. 81 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil 2009 Julho Proposta de aquisição da Areva T&D é feita pela Alstom e Schneider Electric. Setembro Contrato para uma Corrente Contínua de Alta Voltagem (HVDC) de dois pólos com IEMadeira para a maior linha de transmissão de energia do mundo, com comprimento total de 2.386 quilômetros. Outubro A cidade do Rio de Janeiro é eleita a sede dos Jogos Olímpicos de 2016. 2010 Março Inauguração da Indústria Metalúrgica e Mecânica da Amazônia (IMMA), primeira fabricante de bens da capital da região Norte, localizada em Porto Velho (RO), feita em parceria com a Bardella. Abril O consórcio Norte Energia foi o vencedor do leilão de energia da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Rio Xingu, no Pará. O consórcio Norte Energia é formado por: Companhia Hidro Elétrica do São Francisco (CHESF), Construtora Queiroz Galvão S/A, Galvão Engenharia S/A, Mendes Junior Trading Engenharia S/A, Serveng-Civilsan S/A, J Malucelli Construtora de Obras S/A, Contern Construções 82 Alstom anos no de Brasil Marcos da trajetória da 60 Alstom e Comércio Ltda, Cetenco Engenharia S/A, e Gaia Energia e Participações. Junho Após a aquisição conjunta do negócio de T&D da Areva junto à Schneider Electric, a Alstom absorve a divisão de Transmissão para criar um terceiro setor, a Alstom Grid. O novo segmento emprega cerca de 1.300 pessoas em três unidades (São Paulo, Canoas e Itajubá). Julho Conquista do primeiro contrato no mercado eólico brasileiro, no valor de 100 milhões de euros, com a brasileira Desenvix, para a construção de um complexo de 90 MW na Bahia. Outubro A economista Dilma Rousseff vence a eleição presidencial e se torna a primeira mulher presidente da República. 2011 Alinhada aos novos desenvolvimentos no mercado de energia, a Alstom reestrutura seu negócio em quatro setores: Transporte, Grid, Thermal Power e Renewable Power. Fevereiro Líder de um consórcio para fornecimento de 14 conjuntos turbina-gerador Francis de 611 MW e seis conjuntos turbinagerador Bulbo, a Alstom vai equipar a usina de Belo Monte, a terceira maior hidrelétrica do mundo. → 83 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Brasil Agosto O consórcio construtor da usina hidrelétrica de Teles Pires, formado por Odebrecht Energia, Voith e Alstom, é responsável pela execução do contrato EPC, que tem o valor de R$ 3,3 bilhões e prazo de execução de 48 meses com previsão de encerramento em agosto de 2015. Novembro Inauguração, em Camaçari (BA), da primeira fábrica de aerogeradores da companhia no Brasil e na América Latina. 2012 Março Lançamento da pedra fundamental do primeiro Centro Global de Tecnologia da América Latina em Taubaté, com foco em usinas hidrelétricas Kaplan. Outubro Assinado protocolo de intenção com o governo do Estado do Rio Grande do Sul para instalar sua primeira fábrica dedicada à produção de torres de aerogeradores da América Latina, em Canoas. → Dezembro O Governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, o presidente da SuperVia, Carlos José Cunha, e o presidente da Alstom Brasil, Marcos Costa, celebram contrato que antecipa a compra de novos trens pela SuperVia, inicialmente prevista para o período entre 2016 e 2020. 84 Alstom anos no de Brasil Brasil Marcos da trajetória da 60 Alstom 2013 Junho Aquisição da Engeman Serviços e Manutenção, uma referência nacional em serviços elétricos de média e alta tensão, pela Alstom Grid. Julho Anúncio da maior parceria para o mercado eólico onshore do mundo, firmada com a Renova Energia. Agosto Inauguração da segunda unidade do setor eólico no Brasil, em Canoas (RS), dedicada à produção de torres para aerogeradores. Setembro O consórcio VLT Carioca fecha acordo para fornecimento de carros para o sistema de VLT que circulará no centro da cidade do Rio de Janeiro. A entrega dos VLTs deve ocorrer entre o início de 2015 e meados de 2016, a tempo para os Jogos Olímpicos. Para atender ao prazo contratual, a Alstom produzirá os primeiros Citadis na Europa e os demais na nova unidade a ser construída em Taubaté, em São Paulo. 2014 O Conselho de Administração da Alstom decidiu, por unanimidade, emitir uma recomendação positiva para a oferta da GE para a aquisição dos negócios de geração e transmissão de energia. → 85 Marcos da trajetória da 60 Alstom Alstom anos no de Brasil Janeiro Aquisição da empresa brasileira Reason Tecnologia S.A. – fornecedora de produtos de medição e rede de automação de subestação para clientes de transmissão e distribuição (T&D), sediada em Florianópolis Anúncio de construção de uma unidade voltada à fabricação de VLTs em Taubaté, em área contígua à da fábrica de equipamentos hidrelétricos. Maio Inauguração do primeiro Centro Global de Tecnologia da Alstom na América Latina, em Taubaté. Agosto Anúncio de parceria com a Andrade Gutierrez para construir e operar uma fábrica na Bahia para produzir torres de aço para aerogeradores. A fábrica receberá investimentos de cerca de 30 milhões de euros e será composta 51% pela Andrade Gutierrez e 49% pela Alstom. Novembro A unidade de transporte da Lapa, em São Paulo, conclui a primeira caixa do primeiro trem do projeto de Prasa, para a África do Sul, o maior contrato da história do Grupo Alstom. Dezembro A Assembleia de Acionistas da Alstom aprova transação para venda de negócios de energia da Alstom para a GE. 86 Coordenação: Comunicação Alstom Brasil Projeto Gráfico e Impressão: W. Teixeira Comunicações Gráfica e Editora Ltda Pesquisa: Memória da Eletricidade Alstom Brasil Energia e Transporte Ltda. Av. Embaixador Macedo Soares, 10.001 - São Paulo - SP www.alstom.com.br www.60anosAlstomBrasil.com.br