Medidas cautelares pessoais diversas da prisão:

Transcrição

Medidas cautelares pessoais diversas da prisão:
Medidas cautelares
pessoais diversas da prisão:
comparação entre os sistemas brasileiro,
italiano, chileno e estadunidense
Gustavo Torres Soares
Mestre em Direito Processual pela PUC/MG.
Doutorando em Direito Processual pela USP, com estágio doutoral no Instituto
Max Planck de Direito Criminal, em Freiburg im Breisgau, na Alemanha.
Procurador da República na Capital de São Paulo.
Resumo: Este artigo apresenta breve comparação entre os sistemas jurídicocriminais italiano, chileno, estadunidense e brasileiro de medidas cautelares pessoais diversas da
prisão.
Palavras-chave: Processo penal. Cautelares pessoais diversas.
Abstract: This article presents a brief comparison between the criminal justice
systems in force in Italy, Chile, United States and Brazil, as regards to alternative personal
precautionary measures.
Key words: Criminal procedure. Alternative precautionary measures.
Página 1 de 24
Medidas cautelares pessoais diversas da prisão:
comparação entre os sistemas brasileiro, italiano, chileno e estadunidense
Gustavo Torres Soares
Mestre em Direito Processual pela PUC/MG.
Doutorando em Direito Processual pela USP, com estágio doutoral no Instituto
Max Planck de Direito Criminal, em Freiburg im Breisgau, na Alemanha.
Procurador da República na Capital de São Paulo.
Sumário: 1. Introdução. 2. Visão geral dos sistemas comparados: positivação,
corporificação, recepção pela doutrina e jurisprudência. 3. Semelhanças entre
os sistemas italiano, chileno, estadunidense e brasileiro de medidas cautelares
pessoais diversas da prisão. 4. Diferenças entre os sistemas italiano, chileno,
estadunidense e brasileiro de medidas cautelares pessoais diversas da prisão:
oralidade e audiência para a imposição de medidas cautelares; poder geral de
cautela; prazo para medidas e sua revisão; medidas cautelares pessoais
diversas da prisão não contempladas alguns dos sistemas aqui comparados. 5.
Conclusão. Bibliografia. Anexo: comparação esquemática entre os sistemas
brasileiro, italiano, chileno e estadunidense.
1. Introdução
O estabelecimento de variadas medidas cautelares pessoais diversas da prisão,
rompendo-se com o binário reducionista prisão cautelar ou liberdade provisória, tem sido
saudado como a mais importante alteração da Lei Federal nº 12.403/2011 no Código de Processo
Penal brasileiro, ao lado da revitalização do instituto da fiança 1.
1
V. LOPES JÚNIOR, Aury. O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e medidas
cautelares diversas – Lei 12.403/2011. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 4 e 119.V. tb. perspectivas
favoráveis em SCARANCE FERNANDES, Antonio. Processo penal constitucional. 7ª ed. São Paulo: RT, 2012, p.
289 e 311-324. Tb. em BADARÓ, Gustavo H. R. Ivahy. Processo penal. Rio de Janeiro: Campus Jurídico,
Elsevier, 2012, p. 715-721 e 752-788. E tb. em ZANOIDE DE MORAES, Maurício. Análise judicial da prisão em
flagrante: por uma abordagem sistêmico-constitucional. In: Revista do Advogado – Reforma do Processo
Penal, n. 113, setembro/2001, p. 92-100. Desse último autor, antevendo a necessidade político-criminal da
inovação ora positivada, v. ZANOIDE DE MORAES, Maurício. Presunção de inocência no processo penal
brasileiro: análise de sua estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial . Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 378-381.
Página 2 de 24
Até a entrada em vigor das alterações trazidas pela Lei Federal nº 12.403/2011
no CPP brasileiro, o sistema normativo regente da liberdade de quem se via sob imputação penal
em tese devida, especialmente em casos de prisão em flagrante, era fundado em lógica binária:
verificada a aparente legitimidade da imputação (constante de prisão em flagrante,
indiciamento ou denúncia), o magistrado competente deveria garantir a liberdade provisória do
imputado ou lhe impor prisão preventiva 2. O texto normativo da própria Constituição da
República de 1988 exprime tal dicotomia, como se depreende, por exemplo, de seu art. 5º, LXVI
(“ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória,
com ou sem fiança”).
A partir da Lei Federal nº 12.403/2011, o CPP brasileiro passou a estabelecer
modelo plúrimo (ou polimorfo3), como se depreende de seu art. 310: a prisão em flagrante ilegal
deve ser o quanto antes relaxada (assim como se impõe o óbice judicial a toda persecução penal
indevida); sendo legal a prisão (ou mesmo o processo penal instaurado contra acusado solto), o
magistrado competente deve, conforme as circunstâncias, garantir a liberdade provisória do
imputado sem quaisquer ônus4, sujeitar essa liberdade provisória a medidas cautelares diversas
da prisão (entre elas, a fiança) ou, em último caso, converter a prisão em flagrante em
2
3
4
BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Cautelares: superação da medíocre dicotomia. In: Boletim IBCCrim de agosto/2010
– edição especial sobre o CPP, p. 26-27.
V. LOPES JÚNIOR, Aury. O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e medidas
cautelares diversas, obra citada, p. 4 e 119.
Diante do princípio constitucional do estado de inocência, da possibilidade de o imputado ser libertado da
prisão em flagrante e responder ao processo sem qualquer ônus em sua liberdade, somados ao caráter não
automático e de extrema ratio fundamentada da prisão preventiva, renovam-se os questionamentos sobre o
termo liberdade provisória, empregado pela Constituição da República e pelo novo CPP – cf. BRITO, Alexis
Couto. Ainda existe liberdade provisória no processo penal brasileiro?. In: Boletim IBCCRIM de
novembro/2011, n. 228, ano 19, p. 10. Para este autor, agora “somente poderíamos falar de liberdade
provisória nas situações de flagrante, e pelo curto período de 24 horas dado pela lei para que o juiz adote as
providências do art. 310. Mas, ainda assim, não pela força jurídica que sempre se emprestou a este instituto
de liberdade precária diante da força evidente de sua prisão, mas sim pela situação real de que o acusado
preso em flagrante poderá ter contra si nova prisão decretada, e o provisório da liberdade, na verdade,
iguala-se à brevidade do intervalo no qual ficou livre do cárcere” (conceito extremamente limitado, a ponto
de quase retirar o interesse prático sobre instituto outrora central). Outra possibilidade de interpretação
sobre a provisoriedade em questão seria a de que o imputado em procedimento formal – preso em flagrante,
denunciado solto etc. – terá sua liberdade provavelmente ameaçada (e não necessariamente cerceada) por
ato estatal futuro. Ou seja: liberdade provisória seria aquela sob provável ameaça estatal, ameaça essa
decorrente da instauração de procedimento formal (conceito extremamente abrangente, a ponto de quase
inviabilizar seu emprego, por ausência de delimitação precisa). Como alerta SCARANCE FERNANDES, Antonio,
Processo penal constitucional, obra já citada, p. 311, o sentido tradicionalmente empregado para tal
provisoriedade seria o de “liberdade concedida àquele que estava preso”. E a correção desse emprego
vocabular, repita-se, está colocada em xeque pelas inovações trazidas pela Lei Federal nº 12.403/2011.
Página 3 de 24
preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312, e se revelarem inadequadas
ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão.
Com isso, para os flagrantes e persecuções formalizadas considerados devidos,
nos quais haja adequação e necessidade, foi instituído rol de medidas cautelares pessoais a
serem judicialmente aplicáveis, sob concreta fundamentação, todas elas menos aflitivas (e,
portanto, inicialmente preferíveis) que a prisão preventiva, a qual passa a ser expressamente a
última escolha do sistema de medidas cautelares pessoais.
Segundo o art. 319 do CPP reformado, são medidas cautelares diversas da
prisão:
I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo
juiz, para informar e justificar atividades;
II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por
circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer
distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;
III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por
circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela
permanecer distante;
IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja
conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;
V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o
investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;
VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza
econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a
prática de infrações penais;
VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com
violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou
semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;
VIII – fiança5, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a
5
É interessante notar que a fiança, no inciso VIII do art. 319, é apresentada como cautela, ou seja, medida
judicial destinada a resguardar finalidades processuais; já no inciso III do art. 310, recebe tratamento de
contracautela da prisão em flagrante recém ocorrida. Nesse sentido, BADARÓ, Gustavo, Processo penal, obra
Página 4 de 24
atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de
resistência injustificada à ordem judicial;
IX – monitoração eletrônica.
O propósito do presente estudo é apresentar aspectos gerais dessas novas
medidas e comparar, neste ponto específico, o sistema brasileiro com outros em que tais normas
já estejam por mais tempo assentadas, sendo um europeu continental (o italiano, instituído em
1988 e constantemente aperfeiçoado), um latino-americano (o chileno, instituído em 2000) e um
de common law (o estadunidense, cuja última grande alteração estrutural ocorreu, no âmbito
federal, em 1984).
2. Visão geral dos sistemas comparados: positivação, corporificação,
recepção pela doutrina e jurisprudência
O sistema italiano de medidas cautelares pessoais diversas da prisão foi
instituído no corpo do Codice di Procedura Penale, de 22 de setembro de 1988, e
constantemente aperfeiçoado.
O CPP italiano, disciplinando as medidas cautelares pessoais em seus artigos
272 a 315, reconhece expressamente a diferença entre medidas cautelares coercitivas e
interditivas.
Segundo Andrea Dalia e Marzia Ferraioli, as medidas cautelares coercitivas são
as que restringem a liberdade ambulatorial, mediante aprisionamento (misure di coercizione
custodiale) ou através da imposição de lugares aonde se deva ir ou não ir (misure di mera
coercizione); e as medidas cautelares interditivas são as que comprimem o exercício de
faculdades e direitos referentes às relações profissionais, familiares, ético-sociais, econômicas e
políticas do cidadão. Como exemplos das medidas coercitivas aprisionadoras (misure di
coercizione custodiale), as referidas autoras citam as prisões domiciliares, as prisões em cárcere
tradicional e as internações compulsórias em instituições psiquiátricas. Como exemplos das
citada, p. 776.
Página 5 de 24
medidas coercitivas não-aprisionadoras (misure di mera coercizione), as autoras mencionam a
proibição de sair do território nacional, o dever de apresentação periódica perante a polícia
judiciária, a proibição de frequentar determinados lugares, a imposição de permanência em
determinado espaço, o afastamento compulsório da casa familiar e a proibição de aproximação
entre suposto agressor e suposta vítima. São, para Dalia e Ferraioli, exemplos de medidas
cautelares interditivas a suspensão dos exercícios do poder familiar, de funções públicas e de
atividades profissionais ou empresariais6.
Vittorio Grevi parte da diferença legal entre medidas cautelares coercitivas e
interditivas. Ressaltando que ambas devem obedecer ao princípio da proporcionalidade, Grevi
destaca que a decisão, em cada caso concreto, sobre a medida coercitiva aplicável deve
obedecer à idéia de tendencial gradualidade (hierarquia), enquanto a decisão sobre a medida
interditiva a ser imposta decorre de escolha direta entre opções paralelas, em princípio
igualmente gravosas. Segundo tal autor, as medidas coercitivas tendem a seguir progressiva
aflitividade – figurariam, em ordem crescente de sacrifício para o imputado, a proibição de sair
do território nacional, o dever de apresentação periódica perante a polícia judiciária, o
afastamento compulsório da casa familiar, a proibição de aproximação entre suposto agressor e
suposta vítima, a proibição de frequentar determinados lugares, a imposição de permanência em
determinado espaço, as prisões domiciliares, as prisões em cárcere tradicional e as internações
compulsórias em instituições psiquiátricas7. Já as medidas interditivas (suspensão dos exercícios
do poder familiar, de funções públicas e de atividades profissionais ou empresariais), não trariam
ao julgador qualquer ordem preferencial inicial, de modo que o juízo de adequação e
necessidade da medida seria direto, não comparativo nem escalonado 8.
Tratando-se de sistema amadurecido há mais de vinte anos, a jurisprudência
italiana já o assimilou, tanto do ponto de vista procedimental quanto de sua conformação aos
princípios constitucionais de liberdade, presunção de inocência, processo justo e defesa 9.
6
7
8
9
Sobre a classificação e os exemplos apresentados, v. DALIA, Andrea Antonio. FERRAIOLI, Marzia. Manuale di
diritto processuale penale. 7ª ed. Milão: 2010, p. 230-231.
GREVI, Vittorio. Misure cautelari. In: CONSO, Giovanni. GREVI, Vittorio (coords.). Compendio di procedura
penale. 5ª ed. Milão: CEDAM, 2010, p. 412-415.
GREVI, Vittorio. Misure cautelari, op. cit., p. 417-418.
Para análise sistematizada da jurisprudência italiana sobre as medidas cautelares, cf. PANGALLO, Giovanna
Giulia. Le misure cautelari. Forli: Experta, 2007. Na obra, há citações de inúmeros julgados quanto a
pressupostos de aplicação (p. 113-169, 277, 336-340), cumulação de medidas (p. 279), medidas diversas das
Página 6 de 24
O sistema chileno de medidas cautelares diversas da prisão também foi
instituído no corpo do Codigo Procesal Penal, publicado em 12 de outubro de 2000, e, de lá para
cá, recebeu dois aperfeiçoamentos legislativos, decorrentes da Lei nº 20074, publicada em
14.11.2005, e da recente Lei nº 20585, publicada em 11.05.2012.
Os principais dispositivos chilenos sobre o tema são os artigos 155, 156 e 156bis do CPP.
O artigo 155, sob a rubrica “Enumeração e aplicação de outras medidas
cautelares pessoais”, dispõe que o órgão judicial competente, mediante requerimento do órgão
estatal de acusação (fiscal), do querelante ou da vítima, poderá impor ao imputado uma ou mais
das seguintes medidas, diversas dos encarceramentos tradicionais, “para garantir o êxito das
diligências de investigação ou a segurança da sociedade, proteger o ofendido, assegurar o
comparecimento do imputado aos atos processuais ou à execução da sentença, depois de
formalizada a investigação”: as prisões domiciliares (sob regime de privação total ou parcial da
liberdade); a sujeição à vigilância de pessoa ou instituição determinada (as quais devem se
reportar periodicamente ao juiz de garantias); o dever de apresentação periódica perante o juiz
de garantias ou autoridade por este designada; a proibição de sair do país, da localidade onde se
reside ou de outro âmbito territorial judicialmente fixado; a proibição de frequentar, ou sequer
visitar, determinados lugares, reuniões, recintos ou espetáculos públicos; a proibição de se
comunicar com determinadas pessoas, desde que isso não afete o direito de defesa; a proibição
de aproximação entre suposto agressor e suposta vítima (ou familiares desta); e, nos casos de
problemas conjugais com repercussões penais, a imposição de algum dos envolvidos afastar-se
do ambiente doméstico compartilhado.
O artigo 156 do CPP estabelece a possibilidade de o Poder Judiciário chileno,
atendendo a requerimento do interessado, ouvindo previamente o órgão estatal de acusação
(fiscal) e dando oportunidade de manifestação aos demais participantes diretos da respectiva
audiência (intervinientes), suspender a aplicação de qualquer das medidas cautelares
prisões provisórias tradicionais (p. 277-318 e 340-351), cujo sentido predominante será interpretado ao longo
deste trabalho.
Página 7 de 24
autorizadas pelo artigo 155 e em princípio impostas no caso concreto, quando julgar que isso não
coloca em perigo os objetivos visados pela sua imposição. Tal suspensão poderá ser acautelada
com a prestação de caução econômica pelo interessado, através de dinheiro, valores, direitos
reais ou terceiros fiadores (art. 146 do CPP chileno), em mecanismo assemelhado com a fiança
brasileira10.
O recente artigo 156-bis do CPP chileno, incluído pela Lei nº 20585, publicada
em 11.05.2012, instituiu hipótese muito particular de medida cautelar pessoal diversa da prisão:
nos casos de investigação por fraude na concessão de licenças médicas, o órgão judiciário
competente está autorizado a, mediante requerimento do fiscal, do querelante ou da vítima,
decretar a suspensão da referida atividade médica, enquanto durar a investigação ou por prazo
menor expressamente justificado.
Maria Ines Horvitz Lennon e Julian Lopez Masle denominam tais provimentos
como medidas cautelares pessoais de caráter geral, cuja aplicação, em princípio, prefere às
prisões provisórias tradicionais11. Mauricio Duce e Cristián Riego, concordando com seu caráter
preferencial em relação aos encarceramentos provisórios tradicionais, chamam-lhes medidas
alternativas12. O momento apropriado para sua imposição é a denominada audiência de controle
da detenção, prevista no art. 393 do CPP chileno, na qual a pessoa detida (em flagrante delito
ou por ordem judicial) é levada à presença do juiz de garantias para avaliação de seu status
processual ante eventual pretensão punitiva estatal 13.
Pela clara dicção do caput do art. 155 do CPP chileno, as medidas cautelares
10
11
12
13
HORVITZ, Maria Ines Lennon. LOPEZ, Julian Masle. Proceso penal chileno. Santiago: Editorial Juridica de
Chile, 2010, p. 437.
HORVITZ, Maria Ines Lennon. LOPEZ, Julian Masle, Proceso penal chileno, obra já citada, p. 433-437.
DUCE, Mauricio J. RIEGO, Cristián R. Proceso penal. Santiago: Editorial Juridica de Chile, 2009, p 280-282.
BLANCO SUAREZ, Rafael. DECAP FERNANDEZ, Mauricio. MORENO HOLMAN, Leonardo. ROJAS CORRAL, Hugo.
Litigación estratégica en el nuevo proceso penal. Santiago: Nexis Legis, 2005, p. 43-56.
Página 8 de 24
pessoais de caráter geral (ou alternativas) são legalmente enumeradas (sem espaço para se
cogitar de poder geral de cautela), cumuláveis e vinculadas a finalidades específicas (“garantir o
êxito das diligências de investigação ou a segurança da sociedade, proteger o ofendido,
assegurar o comparecimento do imputado aos atos processuais ou à execução da sentença,
depois de formalizada a investigação”; no caso do artigo 156-bis, a finalidade, ainda que não
expressa, é também contemplada pelo caput do art. 155 – segurança da sociedade).
Tratando-se de inovações relativamente recentes no até há pouco autoritário
processo penal chileno, tais medidas, ao mesmo tempo em que foram recebidas com boavontade pela doutrina14, têm sido objeto de aplicação ainda não pacífica nos tribunais 15.
Exemplo disso é o acórdão (resolución) nº 40488, da Corte Suprema de Chile, proferido em
26.10.2010, no qual é validada a manutenção em prisão cautelar de dois cidadãos chilenos,
Héctor Gabriel Pardo Latorre e Sebastián Alfonso Blanco Blanco, acusados de roubo qualificado,
aparentemente só com base na gravidade da acusação 16.
O sistema estadunidense de medidas cautelares diversas da prisão teve sua
última grande alteração estrutural, no âmbito federal, com o denominado Bail Reform Act de
1984, que reformulou integralmente o sistema até então instituído pela lei congênere editada
em 1966. O sistema federal pós-1984, com posteriores alterações consideradas não estruturais 17,
está codificado nas seções 3141 a 3150 do título 18 do United States Code (de forma abreviada,
18 USC §§ 3141-3150). Os sistemas judiciais estaduais, embora detenham autonomia legislativa,
tendem a seguir o modelo federal quanto ao tema18.
14
15
16
17
18
Cf. MARÍN GONZÁLEZ, Juan Carlos Marín. Las medidas cautelares personales en el nuevo Código Procesal
Penal chileno. In: REJ – Revista de Estudios de la Justicia, nº 1, ano 2002, p. 9-54. Santiago: Universidade do
Chile, 2002.
Cf. HORVITZ, Maria Ines Lennon. LOPEZ, Julian Masle, Proceso penal chileno, obra já citada, p. 433-437.
DUCE, Mauricio J. RIEGO, Cristián R. Proceso penal, obra já citada, p 280-282. BLANCO SUAREZ, Rafael.
DECAP FERNANDEZ, Mauricio. MORENO HOLMAN, Leonardo. ROJAS CORRAL, Hugo. Litigación estratégica en
el nuevo proceso penal, obra já citada, p. 7-14 e 43-56.
V. repositório eletrônico VLex.
Cf.
FEDERAL
JUDICIAL
CENTER.
The
Bail
Reform
Act
of
1984.
Disponível
em
http://www.fjc.gov/public/pdf.nsf/lookup/bailref.pdf/$file/bailref.pdf. Acesso em 25.10.2012.
Cf. SAMAHA, Joel. Criminal procedure. 8ª ed. Belmont: Wadsworth, 2012, p. 398-407.
Página 9 de 24
Segundo o 18 USC §§ 3141-3142 e normas regulamentadoras, dispositivos esses
reafirmados pela decisão da Suprema Corte no Caso County of Riverside versus McLaughlin et
alii19, qualquer pessoa presa deve ser levada, em até quarenta e oito horas (salvo justificado
motivo), à presença da autoridade judicial competente (em regra, o magistrate20), a qual deverá
determinar, conforme as circunstâncias: a liberdade do conduzido, condicionada apenas ao
compromisso de este comparecer em juízo, cooperar com o prosseguimento da causa (inclusive
fornecendo amostra de DNA) e de não se envolver em crime durante aquela situação de
indefinição penal (release on recognizance21); a liberdade do conduzido, condicionada ao
cumprimento de condições pessoais diversas da tradicional prisão provisória; a manutenção
provisória da prisão, para avaliação de eventual deportação, revogação de benefício
penitenciário ou sanção processual por descumprimento de algum dos compromissos ou
condições pessoais recém mencionados; a prisão preventiva do conduzido, se nenhuma condição
descarcerizante se demonstrar suficiente para garantir o comparecimento do imputado em juízo
e a segurança de qualquer outra pessoa da comunidade, havendo presunção relativa de perigo
nos casos de reincidência e de provável cometimento de crimes considerados de maior gravidade
abstrata.
As condições pessoais descarcerizantes potencialmente determináveis pelo
Poder Judiciário estadunidense, isolada ou cumulativamente, como requisitos para a colocação
do preso provisório em liberdade durante a discussão sobre a eventual imputação (conditions of
release), são exemplificadas no 18 USC § 3142, “c”: designação de terceira pessoa, considerada
confiável, para supervisionar e reportar ao juízo quaisquer violações, desde que esse terceiro
possa razoavelmente assegurar que o imputado comparecerá em juízo e não colocará em risco
qualquer pessoa da comunidade; manutenção do imputado no emprego ou, se desempregado,
19
20
21
V. LexisNexis Academic, nº de referência 500 U.S. 44; 111 S. Ct. 1661; 114 L. Ed. 2d 49; 1991 U.S. LEXIS
2528; 59 U.S.L.W. 4413; 91 Cal. Daily Op. Service 3503; 91 Daily Journal DAR 5506. No ano seguinte, 1992, no
caso Powell v. Nevada (511 U.S. 79), a U.S. Supreme Court explicitou a inaplicabilidade da decisão
McLaughlin a situações anteriores, sob pena de insegurança jurídica.
O ordenamento estadunidense diferencia os juízes vitalícios (judges) dos detentores de mandato (magistrate
judges ou simplesmente magistrates). No âmbito penal, geralmente os judges cuidam do julgamento de
casos considerados mais complexos ou graves, e aos magistrate judges são atribuídos casos reputados mais
simples e também a grande maioria das questões relativas a prisões provisórias, fianças e outras medidas
cautelares pessoais. V. DEL CARMEN, Rolando V. Criminal procedure – law and practice. 8ª ed. Belmont:
Wadsworth, 2010, p. 8-10 e 182-184.
V. Caso Sicar et alii versus Chertoff et alii, julgado em 27.08.2008 pela Corte de Apelos da Décima Primeira
Região (v. LexisNexis nº de referência 541 F.3d 1055; 2008 U.S. App. LEXIS 18375; 21 Fla. L. Weekly Fed. C
1030).
Página 10 de 24
sob compromisso de ativamente procurar trabalho regular; ingresso ou manutenção do imputado
em programa educacional; proibição de frequentar determinados lugares ou associações;
proibição de viajar; proibição de aproximação entre suposto agressor e suposta vítima, ou entre
suposto infrator e suposta testemunha; dever de apresentação periódica perante órgão policial,
judicial ou outra repartição pública; imposição de datas, horários e compromissos rotineiros ao
imputado (specified curfew); interdição do porte arma; interdição do uso de álcool ou drogas,
salvo necessidade médica comprovada; sujeição a tratamento clínico, psiquiátrico ou
psicológico, incluindo-se o ambulatorial ou a internação para controlar dependências químicas;
consignação judicial de dinheiro ou outro bem, como caução garantidora do comparecimento do
imputado em juízo; consignação judicial de títulos de alta liquidez (bail bonds), geralmente
garantidos por terceiro financiador, igualmente dados como caução assecuratória do
comparecimento do imputado em juízo; recolhimento prisional em parte do dia ou da noite;
imposição de qualquer outra condição que seja razoavelmente necessária para assegurar o
comparecimento do imputado em juízo e a segurança de outra pessoa da comunidade.
Tratando-se de sistema amadurecido há quase trinta anos (antes dos quais já
havia considerável legislação sobre o tema), a jurisprudência dos Estados Unidos já o assimilou,
tanto do ponto de vista procedimental quanto de sua conformação aos princípios constitucionais
de liberdade, presunção de inocência, devido processo e defesa, como se verá nos exemplos
citados ao longo deste trabalho22.
Em regra, a abordagem jurisprudencial estadunidense é pragmática e leva em
conta os grandes custos gerados pela manutenção de pessoas desnecessariamente em cárcere 23.
Entretanto há precedentes excessivamente rigorosos, como o Caso USA versus Roberto Fortes
Neves, julgado em 31.05.2001 pela Corte Federal de Apelos da Primeira Região 24. Nesse processo,
o cidadão caboverdiano, então com vinte e cinco anos de idade, fora preso por reingresso ilegal
nos EUA, país onde vivera clandestinamente desde a infância até sua condenação por tráfico de
22
23
24
Já se adiante que, tratando-se de tema com grande relevância fática e já pacificado quanto às principais
controvérsias jurídicas, são muitas – e sempre renovadas – as decisões regionais, mas poucas – e já antigas –
as decisões da US Supreme Court sobre o tema (destacando-se, entre estas, os casos USA versus Salerno,
sobre o qual se comentará abaixo, e Bell versus Wolfish).
V. parte final do voto concorrente do Juiz-presidente Breyer no Caso USA versus Carmen Tortora, julgado
pela Corte Federal de Apelos da Primeira Região, em 27.12.1990 (v. LexisNexis Academic, nº de referência
922 F.2d 880; 1990 U.S. App. LEXIS 22459).
V. LexisNexis Academic, nº de referência 11 Fed. Appx. 6; 2001 U.S. App. LEXIS 28362.
Página 11 de 24
drogas, dois anos antes. Logo levado à presença do competente magistrate, este, contrariando o
requerimento de prisão cautelar formulado pela acusação, concedeu ao preso liberdade
provisória, condicionada ao cumprimento de três conditions of release: 1) assinatura de
compromisso de comparecimento (appearence bond) sob caução de cento e cinquenta mil
dólares estadunidenses, dos quais quinze mil deveriam ser pagos no ato da liberação; 2)
confinamento do favorecido na casa de sua mãe, a qual deveria se comprometer em juízo por
sua custódia; 3) constante monitoração, através de tornozeleira eletrônica. Acolhendo recurso
da acusação, a qual insistia no grande risco de fuga do acusado, para não se ver novamente
deportado para Cabo Verde, a corte distrital, secundada pela Corte Federal de Apelos da
Primeira Região, consideraram insuficientes as conditions of release impostas pelo magistrate e
determinaram a prisão cautelar do imputado.
Como se depreende da bibliografia e jurisprudência consultadas, os EUA dão
especial destaque à fiança (bail) e ao compromisso de comparecimento sob caução (appearence
bond), especialmente por sua praticidade, muitas vezes associados às outras referidas conditions
of release, as quais são fiscalizadas por agentes in loco ou através de monitoramentos remotos
(por telefone, através da inquirição de terceiros próximos do imputado, por tornozeleiras
eletrônicas etc.)25.
O sistema brasileiro de medidas cautelares diversas da prisão praticamente veio
a ser instituído pela Lei Federal nº 12.403/2011, com a inserção de variado rol no art. 319 do
nosso CPP, rompendo-se com o binário reducionista prisão cautelar ou liberdade provisória.
Gustavo Badaró sinaliza que, também no novo ordenamento brasileiro, é
possível a verificação de imposições pessoais coercitivas e interditivas 26.
Numa primeira leitura, aparentam caráter coercitivo, por sujeitarem o
imputado a prestações ativas provavelmente contrárias a seu interesse e cotidiano, o
25
26
Cf. SAMAHA, Joel, Criminal procedure, obra já citada, p. 398-407. DEL CARMEN, Rolando V. Criminal
procedure – law and practice, obra já citada, p. 182-184. FEDERAL JUDICIAL CENTER. The Bail Reform Act of
1984, obra já citada, p. 1-6 e 37-39. Na jurisprudência, v. Caso USA versus Roberto Fortes Neves, recém
citado, e todos os outros mencionados ao longo deste trabalho.
BADARÓ, Gustavo, Processo Penal, obra já citada, p. 773.
Página 12 de 24
comparecimento periódico em juízo, o recolhimento domiciliar parcial, a internação provisória
nos casos de provável inimputabilidade ou semi-imputabilidade e a fiança (incisos I, V, VII e VIII
do mencionado art. 319).
Por outro lado denotam cunho interditivo, uma vez que impõem abstenções,
tolerâncias e intervenções extraordinárias na autodeterminação do imputado, a proibição de
acesso ou frequência a determinados lugares, a proibição de manter contato com pessoa
determinada, a proibição de se ausentar da comarca, a suspensão do exercício de função pública
ou de atividade de natureza econômica ou financeira e a monitoração eletrônica (incisos II, III,
IV, VI e IX do art. 319)27.
Como dito no início do trabalho, o estabelecimento de variadas medidas
cautelares pessoais diversas da prisão teve boa acolhida pela doutrina brasileira, apesar de
críticas a aspectos puntuais28.
A jurisprudência brasileira começa a tomar conhecimento do novo sistema 29,
27
28
29
Classificação parcialmente diversa é apresentada em DALIA, Andrea Antonio, FERRAIOLI, Marzia, Manuale di
diritto processuale penale, obra já citada. Para tais autores, as medidas cautelares coercitivas são as que
restringem a liberdade ambulatorial, mediante aprisionamento (misure di coercizione custodiale) ou através
da imposição de lugares aonde se deva ir ou não ir (misure di mera coercizione); e as medidas cautelares
interditivas são as que comprimem o exercício de faculdades e direitos referentes às relações profissionais,
familiares, ético-sociais, econômicas e políticas do cidadão. Desse modo, há divergência, por exemplo,
quanto à proibição de sair do território nacional, à proibição de frequentar determinados lugares e à
proibição de aproximação entre suposto agressor e suposta vítima. Para os autores italianos, tais medidas
seriam coercitivas. Aqui se sustenta que são interditivas, uma vez que impõem abstenções, tolerâncias e
intervenções extraordinárias na autodeterminação do imputado. Especialmente peculiares são as internações
compulsórias em instituições psiquiátricas, nos casos de provável inimputabilidade ou semi-imputabilidade:
são primordialmente coercitivas, uma vez que se impõem, na maioria das vezes, contra a vontade do
imputado, não raro com necessidade de força; entretanto, há nelas também caráter interditivo, uma vez
que dão ensejo à relativização de vários atos processuais dependentes da vontade do imputado (por
exemplo, constituição de advogado e renúncia ao direito de recorrer).
V., além das obras já citadas, FERNANDES, Og, et al. (coords.). Medidas cautelares no processo penal.
Prisões e suas alternativas. Comentários à Lei 12.403, de 04.05.2011. São Paulo: RT, 2011.
“(...) PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. (...) V – Pedido sucessivo de prisão domiciliar. Paciente que se
enquadra no inciso II do art. 318 do CPP, referente ao estado de extrema debilidade e/ou doença grave.
Condição clínica com embasamento documental e até o momento, corroborada por laudo elaborado por
peritos oficiais da Polícia Federal a partir de determinação do próprio MM. Juízo de origem. Possibilidade de
a autoridade judiciária de primeiro grau empreender o necessário controle de sua permanência no lar,
inclusive optando por conjugar a prisão cautelar domiciliar com a monitoração eletrônica de que trata o art.
319, IX do CPP. VI – Ordem denegada com relação ao pedido de revogação da custódia preventiva e
parcialmente concedida com relação ao pedido sucessivo para assegurar a prisão domiciliar do art. 318, II do
CPP, sem prejuízo de sua combinação com o art. 319, IX do CPP a critério da autoridade impetrada.” (HC
201202010033887, Rel. Des. Fed. Abel Gomes, TRF2, 1ª Turma Especializada, publicado no E-DJF2R de
Página 13 de 24
não sem relutância30.
3. Semelhanças entre os sistemas italiano, chileno, estadunidense e
brasileiro de medidas cautelares pessoais diversas da prisão
A análise comparativa aponta características comuns entre os quatro sistemas
aqui avaliados.
Os quatro sistemas, valorizadores da liberdade, da presunção de inocência e da
ampla defesa, demonstram preferência por medidas não aprisionadoras antes do julgamento da
causa, em caráter alternativo à prisão preventiva, como se depreende do art. 310, II, segunda
parte, do CPP brasileiro; do art. 275, 3, do CPP italiano; do art. 139, segunda parte, do CPP
chileno; e, nos EUA, do 18 USC § 3142, “e”. Nos EUA, deve-se ressaltar que as medidas se
demonstram alternativas em relação à preventive detention, mas substitutivas em relação à
prisão por flagrante, por mandado e quaisquer outras detenções anteriores ao julgamento da
causa.
30
09.05.2012). V. tb.: “Liberdade provisória concedida em primeiro grau aos pacientes mediante o pagamento
da fiança arbitrada em um salário mínimo. Pleito de dispensa da fiança. Possibilidade. Tratando-se de
acusados hipossuficientes, a teor do art. 350 do CPP, deve ser concedida a liberdade provisória, fixando-se,
entretanto, além do já disposto nos art. 327 e 328 do CPP, a medida cautelar disposta no art. 319, I, do CPP,
consistente no comparecimento semanal em juízo para informar e justificar atividades. Ordem concedida.”
(TJSP. Habeas Corpus 0054235-97.2012.8.26.0000. Autos de origem 0021705-84.2012.8.26.0050. Rel. Des.
Edison Brandão. Julgado em 19.06.2012).
“HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA. REVOGAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. CUSTÓDIA
CAUTELAR. REQUISITOS. Decreto de custódia cautelar pautado em indícios de autoria delitiva e prova da
materialidade, uma vez oferecida e recebida a denúncia. Necessidade da segregação cautelar, para a
garantia da ordem pública. Gravidade concreta da conduta. Perigosidade do agente que se depreende dos
próprios fatos descritos na denúncia. Evidências de envolvimento do paciente no crime de homicídio
mediante paga da própria vítima. Elementos fáticos claros a justificar a prisão preventiva. Medidas
cautelares diversas da prisão que não se mostram aptas, nesta hipótese, à salvaguarda da ordem pública. Ao
paciente é imputada a prática de crime hediondo, ao qual a lei veda a concessão de liberdade provisória
com fiança. Primariedade, residência fixa e ocupação lícita não bastam, de per si, para conceder a mercê de
aguardar o processamento da ação em liberdade. Alegações, ademais, não comprovadas na impetração.
Constrangimento ilegal. Inexistência. Ordem de habeas corpus denegada.” (Habeas Corpus nº 026809436.2011.8.26.0000. Rel. Des. Amado de Faria. Julgado em 01.03.2012.)
Página 14 de 24
Mesmo no caso da medida cautelar mais polêmica do rol, a monitoração
eletrônica, a jurisprudência dos países analisados a tem compreendido como instrumento válido
e menos aflitivo que a prisão provisória, desde que o equipamento empregado (geralmente uma
tornozeleira) mantenha o grau razoável de discrição e comodidade.
Um bom exemplo disso é a decisão da Corte Federal de Apelos da Nona Região,
julgada em 28.12.2010, no Caso USA versus Robert Ernest Peeples 31. Acusado de receber
dolosamente cerca de cinco mil arquivos eletrônicos de pornografia infantil, ao cidadão
estadunidense Robert Ernest Peeples foram impostas, como conditions of release decorrentes do
18 USC § 3142 e da Lei Walsh sobre crimes contra crianças e adolescentes, sancionada em 2006,
o cumprimento de agenda diária determinada pelo magistrate (specified curfew) e a
monitoração eletrônica. Irresignado, Peeples alegou, perante a corte de apelos, que, no seu caso
concreto, o endurecimento trazido pela Lei Walsh violaria a Quinta Emenda (devido processo, aí
incluída a presunção de inocência e a proporcionalidade), a Oitava Emenda (proibição de fiança
excessiva) e o princípio da separação dos Poderes (interferência indevida do Legislativo no
Judiciário), todos constantes da Constituição dos EUA. Improvendo o apelo, a Corte Federal da
Nona Região entendeu que as conditions of release não violavam, naquele caso, as normas
constitucionais alegadas. Especialmente quanto à proporcionalidade, a Corte de Apelos destacou
que o magistrate havia estabelecido agenda diária (curfew) plenamente adequada à rotina do
acusado
(considerando
trabalho,
estudos
e
lazer),
além
de
monitoração
eletrônica
suficientemente discreta e cômoda.
Outro exemplo, também dos EUA, é a decisão da Corte Federal de Apelos da
Segunda Região, nos EUA, julgada em 22.12.2011, no Caso USA versus Alon Wallach et alii
(referência: 669 F.3d 78; 2011 U.S. App. LEXIS 25435). Entre outros pontos, cidadão israelense
Alon Wallach, questionou, perante a corte de apelos, que o constrangimento causado pelo uso da
tornozeleira eletrônica lhe compelira a aceitar acordo desfavorável para se ver logo livre do caso
penal, no qual fora inicialmente preso sob acusação de contrabando. Examinando o caso, a Corte
Federal de Apelos da Segunda Região validou o acordo homologado em primeira instância,
julgando, entre outros pontos, que o questionado equipamento de monitoração fora instalado
sob padrões condizentes, não se constituindo em justificativa adequada para a alegação de
31
V. LexisNexis Academic, nº de referência 630 F.3d 1136; 2010 U.S. App. LEXIS 26273.
Página 15 de 24
ameaça, coação ou pressão ilegítima sob a livre vontade do então imputado.
Por outro lado, como quaisquer instituições humanas, o sistema de cautelares
descarcerizadoras depende das virtudes e vícios de seus operadores. Um triste exemplo de
deturpação sistêmica, verificado nos EUA, entre vários outros, deu origem ao Caso USA versus
Shynita Townsend, julgado pela Corte Federal de Apelos da Décima Primeira Região, em
13.01.2011 (referência: 630 F.3d 1003; 2011 U.S. App. LEXIS 655; 22 Fla. L. Weekly Fed. C 1677;
decisão já passada em julgado; a US Supreme Court negou-se a reexaminar o caso – certioriari
denied – em 16.05.2011, v. 179 L. Ed. 2d 1233, 2011 U.S. LEXIS 3592). No referido processo
penal, a servidora pública (agente de custódia) Shynita Townsend foi condenada a quinze anos
de prisão e dois anos de posterior liberdade supervisionada (supervised release) por ter recebido
dinheiro e outras vantagens indevidas para não causar quaisquer embaraços ao descumprimento
das conditions of release impostas a Humberto Febles, outrora preso e à época aguardando
julgamento (em fase de pretrial) quanto a acusação de tráfico de drogas e roubo a mão armada.
A Justiça dos EUA entendeu que, durante a liberdade provisória concedida a Humberto Febles, a
referida agente de custódia chegou até a encobrir novos crimes praticados pelo cidadão que
aquela deveria fiscalizar, pervertendo completamente o sentido das medidas cautelares diversas
da prisão.
Nos quatro sistemas, ao lado de medidas claramente cautelares, verificam-se
outras não propriamente cautelares, referentes ao que, no Brasil, historicamente se denominou
ordem pública32, como ainda hoje consignado no art. 312 do CPP brasileiro. Na Itália, o art. 274,
1, “c”, do CPP faz menção ao perigo do cometimento, pelo imputado, de graves delitos, com
violência ou sob estrutura de criminalidade organizada. No Chile, o art. 140, “c”, do CPP se
refere à situação de o imputado representar perigo para a segurança da sociedade ou do
ofendido. Nos EUA, o 18 USC § 3142, “e”, alude à impossibilidade de razoável proteção de
qualquer outra pessoa e da comunidade, na hipótese de liberdade do imputado.
Verifica-se, também, a adoção expressa dos parâmetros de legalidade (em
32
ZANOIDE DE MORAES, Maurício. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise de sua
estrutura normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2010, p. 382-398.
Página 16 de 24
maior ou menor grau33), judicialidade, motivação, adequação, necessidade e razoabilidade.
Observa-se a valorização do instituto da fiança. Nos EUA, é consagrado o
direito constitucional à não-imposição de fiança excessiva, positivado na Oitava Emenda. A US
Supreme Court, julgando o Caso U.S. versus Salerno34, reafirmou a inadmissibilidade do abuso
das fianças, mas entendeu válido o Bail Reform Act de 1984 e suas disposições quanto à prisão
preventiva, especialmente nos casos em que há objetivos indícios de que o imputado tem
atuação junto à criminalidade organizada.
Além da fiança, são medidas comuns aos quatro sistemas: prisões domiciliares,
proibição de sair do território nacional, dever de apresentação periódica, a proibição de
frequentar determinados lugares, a imposição de permanência em determinado espaço, o
afastamento compulsório da casa familiar e a proibição de aproximação entre suposto agressor e
suposta vítima.
Percebem-se, como outros traços comuns, a possibilidade de cumulação de
medidas e de imposição de medidas aprisionadoras em caso de descumprimento das cautelas
alternativas.
Um bom exemplo dessa segunda hipótese é a recente decisão da Corte Federal
de Apelos da Sexta Região, nos EUA, julgada em 13.02.2012, no Caso USA versus Shawn Taylor
(referência: 12a0167n.06; 461 Fed. Appx. 459; 2012 U.S. App. LEXIS 2822; 2012 FED App. 0167N
(6th Cir.)). O cidadão estadunidense Shawn Taylor, acusado de porte ilegal de drogas e arma,
fora submetido a monitoração eletrônica pelo competente magistrate, como condição imposta
para aguardar em liberdade a fase de preparação da audiência de julgamento (pretrial). Pouco
após, na tentativa de se tornar inacessível para as autoridades, Taylor destruiu sua tornozeleira.
Foi emitida ordem de prisão, somente sendo o fugitivo localizado três meses depois. Preso
cautelarmente até a audiência de julgamento, Taylor veio a ser condenado, condicionando-selhe o direito a futuras progressões penitenciárias, entre outras exigências, ao ressarcimento ao
Estado de parte das despesas causadas com a destruição da tornozeleira (fixando-se, na ocasião,
33
34
V. considerações abaixo sobre o chamado poder geral de cautela nos sistemas analisados.
481 U.S. 739 (1987).
Página 17 de 24
o valor de quinhentos e setenta e cinco dólares estadunidenses). Em grau recursal, a Corte
Federal de Apelos da Sexta Região julgou corretas ambas as questões processuais, tanto a
imposição de prisão cautelar após a destruição da tornozeleira, quanto o condicionamento do
direito a futuras progressões penitenciárias ao ressarcimento do valor fixado como prejuízos ao
Estado. Quanto à possibilidade de imposição de medidas aprisionadoras em caso de
descumprimento das cautelas alternativas, podem ser citados, entre vários outros, os casos USA
versus Aktham Abuhouran, julgado em 28.10.2010 pela Corte Federal de Apelos da Terceira
Região (referência: 398 Fed. Appx. 712; 2010 U.S. App. LEXIS 22563), e Sylvanus Biko Freeman
versus US Attorney General (referência: 596 F.3d 952; 2010 U.S. App. LEXIS 4784), julgado em
08.03.2010 pela Corte Federal de Apelos da Oitava Região.
4. Diferenças entre os sistemas italiano, chileno, estadunidense e brasileiro
de medidas cautelares pessoais diversas da prisão
A análise comparativa também aponta características não compartilhadas entre
os quatro sistemas – e, lamentavelmente, o Brasil não distoa em favor da vanguarda.
Verifica-se, no Chile, na Itália e nos EUA, forte característica de oralidade
quanto ao sistema de medidas cautelares, cujo cabimento é sempre examinado em audiência.
No Brasil, diversamente, a avaliação judicial sobre o tema é feita nos autos, através de
arrazoados e decisões escritas.
Tema bastante polêmico é o do denominado poder geral de cautela.
No Chile, o art. 155 do CPP diz que as medidas cautelares pessoais
descarcerizadoras estão ali enumeradas. Na Itália, o primeiro dispositivo título do CPP dedicado
às medidas cautelares pessoais, art. 272, diz claramente que “as liberdades da pessoa somente
podem ser limitadas com medidas cautelares mediante as normas dispostas no presente título”.
Nesses dois países, portanto, é expressamente vedado a criação jurisprudencial quanto a
medidas cautelares diversas.
Página 18 de 24
Diversamente, nos Estados Unidos, 18 USC § 3142, “c”, “B-XIV”, dispõe
expressamente que o magistrate poderá impor, nas conditions of release,
qualquer outra
condição que seja razoavelmente necessária para assegurar o comparecimento do imputado em
juízo e a segurança de outra pessoa da comunidade. Vale dizer: é expressamente permitida a
criação jurisprudencial quanto a medidas cautelares diversas.
Por outro lado, a jurisprudência estadunidense não recomenda que o
magistrate
leve
às
últimas
consequências
a
busca
criativa
de
medidas
cautelares
descarcerizadoras, especialmente quando essas causarem custos estatais não previstos. Como se
pode ler parte final do voto concorrente do Juiz-presidente Breyer no Caso USA versus Carmen
Tortora, julgado pela Corte Federal de Apelos da Primeira Região, em 27.12.1990, o magistrate
não deve, por exemplo, determinar à polícia que exerça constante vigilância sob o imputado,
pois isso, se feito repetidamente, prejudicará sensivelmente o serviço público policial. Se, no
exercício do poder geral de cautela, o magistrate não vislumbrar medidas descarcerizadoras
razoáveis, cabe-lhe a decretação da prisão cautelar35.
No Brasil, não há norma expressa sobre o poder geral de cautela no âmbito
criminal. Há, entretanto, tendência doutrinária à sua inadmissão 36, uma vez que a redação atual
do CPP é bastante detalhista e é inaugurada pelo sugestivo artigo 282, segundo o qual “as
medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se (...)”.
Aparentemente, não há possibilidade de aplicação de medidas cautelares fora das previstas
naquele Título.
Tema lamentavelmente não tratado pelo sistema brasileiro é o estabelecimento
de prazo para as cautelares impostas e para sua revisão. Perdeu o legislador brasileiro a
oportunidade de exercer maior controle sobre notórios abusos, sempre mais sentidos pelos
desprovidos de defesa mais atuante.
Há, por fim, medidas cautelares pessoais diversas da prisão não contempladas
35
36
V. LexisNexis Academic, nº de referência 922 F.2d 880; 1990 U.S. App. LEXIS 22459.
V. SCARANCE, obra citada, p. 285-324, e BADARÓ, obra citada, p. 708-709.
Página 19 de 24
em alguns dos sistemas aqui comparados. O Chile, por exemplo, não adota, pelo menos não
expressamente, a monitoração eletrônica, a suspensão dos exercícios do poder familiar, de
funções públicas e de atividades profissionais ou empresariais, admissíveis nos outros três países
comparados.
5. Conclusão
À guisa de conclusão, pontue-se que o Brasil andou bem ao instituir sistema
variado de medidas cautelares pessoais diversas da prisão, sintonizando-se com a tendência
descarcerizante dos países humanamente desenvolvidos.
Resta, agora, à doutrina e à jurisprudência o longo caminho da interpretação e
aplicação de normas com enorme potencial transformador da terrível realidade carcerária
brasileira.
Bibliografia
BADARÓ, Gustavo H. R. Ivahy. Processo penal. Rio de Janeiro: Campus Jurídico, Elsevier, 2012.
BARROS, Romeu Pires de Campos. Processo penal cautelar. Rio de Janeiro: Forense, 1982.
BLANCO SUAREZ, Rafael. DECAP FERNANDEZ, Mauricio. MORENO HOLMAN, Leonardo. ROJAS
CORRAL, Hugo. Litigación estratégica en el nuevo proceso penal. Santiago: Nexis Legis, 2005.
BOTTINI, Pierpaolo Cruz. “Cautelares: superação da medíocre dicotomia.” In: Boletim IBCCrim
de agosto/2010, ano 18 – edição especial sobre o CPP, p. 26-27.
BRITO, Alexis Couto de. “Ainda existe liberdade provisória no processo penal brasileiro?”. In:
Boletim IBCCRIM de novembro/2011, n. 228, ano 19, p. 10.
DALIA, Andrea Antonio. FERRAIOLI, Marzia. Manuale di diritto processuale penale. Milão: CEDAM,
7ª ed., 2010.
Página 20 de 24
DEL CARMEN, Rolando V. Criminal procedure – law and practice. Belmont: Wadsworth, 8ª ed.,
2010.
DUCE, Mauricio J. RIEGO, Cristián R. Proceso penal. Santiago: Editorial Juridica de Chile, 2009.
FEDERAL
JUDICIAL
CENTER.
The
Bail
Reform
Act
of
1984.
http://www.fjc.gov/public/pdf.nsf/lookup/bailref.pdf/$file/bailref.pdf.
Disponível
em
Acesso
em
25.10.2012.
FERNANDES, Og, et al. (coords.). Medidas cautelares no processo penal. Prisões e suas
alternativas. Comentários à Lei 12.403, de 04.05.2011. São Paulo: RT, 2011.
GREVI, Vittorio. Misure cautelari. In: CONSO, Giovanni. GREVI, Vittorio (coords.). Compendio di
procedura penale. Milão: CEDAM, 5ª ed., 2010.
HORVITZ, Maria Ines Lennon. LOPEZ, Julian Masle. Proceso penal chileno. Santiago: Editorial
Juridica de Chile, 2010.
LOPES JÚNIOR, Aury. O novo regime jurídico da prisão processual, liberdade provisória e
medidas cautelares diversas – Lei 12.403/2011. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
MARÍN GONZÁLEZ, Juan Carlos Marín. “Las medidas cautelares personales en el nuevo Código
Procesal Penal chileno”. In: REJ – Revista de Estudios de la Justicia, Santiago: Universidade
do Chile, 2002, nº 1, ano 2002, p. 9-54.
PANGALLO, Giovanna Giulia. Le misure cautelari. Forli: Experta, 2007.
SAMAHA, Joel. Criminal procedure. 8ª ed. Belmont: Wadsworth, 2012.
SCARANCE FERNANDES, Antonio. Processo penal constitucional. São Paulo: RT, 7ª ed., 2012.
Página 21 de 24
ZANOIDE DE MORAES, Maurício. “Análise judicial da prisão em flagrante: por uma abordagem
sistêmico-constitucional”. In: Revista do Advogado – Reforma do Processo Penal, n. 113,
setembro/2001, p. 92-100.
________. Presunção de inocência no processo penal brasileiro: análise de sua estrutura
normativa para a elaboração legislativa e para a decisão judicial. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2010.
Página 22 de 24
Quadro anexo ao artigo “Medidas cautelares pessoais diversas da prisão”: comparação esquemática
Semelhanças entre os ordenamentos jurídico-criminais de Brasil, Itália, Chile e Estados Unidos da América:
- preferência por medidas não aprisionadoras antes do julgamento da causa; provisoriedade;
- adoção expressa dos parâmetros de legalidade (em maior ou menor grau), judicialidade, motivação, adequação,
necessidade e razoabilidade;
- valorização do instituto da fiança (nos E.U.A., é consagrado o direito à “não-imposição de fiança excessiva”);
- possibilidade de cumulação de medidas;
- medidas comuns: prisões domiciliares, proibição de sair do território nacional, dever de apresentação periódica, a
proibição de frequentar determinados lugares, a imposição de permanência em determinado espaço, o afastamento
compulsório da casa familiar e a proibição de aproximação entre suposto agressor e suposta vítima.
Quadro comparativo das diferenças:
Brasil
Itália
Art. 319 do CPP brasileiro. Art. 280-290
italiano.
Chile
do
E.U.A.
CPP Art. 155 do CPP chileno. U. S. Code, Título 18, §
3142.
Divisão entre prisão e Divisão
entre
medidas
medidas
cautelares coercitivas
(misure
di
diversas da prisão.
coercizione custodiale e
misure
di
mera
coercizione) e interditivas.
Divisão entre citação,
detenção,
prisão
preventiva e “outras
medidas
cautelares
pessoais”.
Divisão entre liberdade sob
compromisso pessoal
de
comparecimento aos atos e
termos
do
processo,
liberdade
sob
caução
financeira, liberdade sob
condições complementares
e, em último caso, prisão
provisória.
A lei é silente quanto a
eventual “poder geral de
cautela”, mas a tendência
doutrinária
e
jurisprudencial
é
no
sentido
de
sua
inexistência.
A lei é expressa quanto à
inexistência de “poder
geral de cautela” (art. 272
do CPP).
A lei é expressa quanto
à inexistência de “poder
geral de cautela” (art.
155 do CPP).
O item “c” do § 3142 do
Título 18 do U. S. Code
admite certo “poder geral
de cautela” judicial.
Outras
divergências
importantes em relação
aos outros três sistemas:
- déficit na oralidade,
caracterizado
pela
desnecessidade
de
audiência sobre a situação
processual dos imputados
(na prática, a respectiva
análise judicial é apenas
baseada
nos
autos
escritos, sem que o juiz
tenha
tido
qualquer
contato com o imputado);
- ausência de prazo para
revisibilidade
das
medidas;
sistema
muito
recentemente reformado
(pela Lei Federal n.
12.403/2011), ainda pouco
assimilado
pela
jurisprudência.
O sistema italiano de
medidas
cautelares
diversas da prisão, quase
tanto
quanto
o
estadunidense,
já
apresenta significativo grau
de consolidação. Nele se
verificam
oralidade,
revisibilidade periódica das
medidas e rol bastante
variado (mas taxativo) de
opções legais conferidas ao
juiz competente.
O sistema chileno é
relativamente recente
(instituído em 2000,
com reformas em 2005
e
2012),
mas
já
minimamente
assimilado
pela
jurisprudência. Nele se
verificam
oralidade,
revisibilidade periódica
das medidas e rol
taxativo
e
menos
variado de opções legais
conferidas
ao
juiz
competente.
Medidas
encontradas nos outros
três ordenamentos e
não adotadas no Chile
(ao
menos,
não
expressamente):
monitoramento
eletrônico e medidas
cautelares interditivas
(suspensão
dos
exercícios do poder
familiar, de funções
públicas e de atividades
profissionais
ou
empresariais)
O sistema estadunidense de
medidas cautelares diversas
da prisão é, entre os
pesquisados, o de mais forte
consolidação
social
e
jurídica. Nele se verificam
oralidade,
revisibilidade
periódica das medidas e rol
bastante variado (e não
taxativo) de opções legais
conferidas
ao
juiz
competente (magistrate). As
denominadas conditions of
release são exemplificadas
no U. S. Code, Título 18, §
3142, mas há margem para
judicial discretion, o que
gera medidas inovadoras,
como a fiscalização através
do empregador do imputado.