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| Caso Clínico
Tratamento de Fratura Mandibular em Criança:
Relato de Caso Clínico
Treatment of Mandibular Fracture in Children: Case Report
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Danilo Maldonado e DUARTE , Carla Silva SIQUEIRA , Éverton Ribeiro LELIS , Flaviana Soares ROCHA ,
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Jonas Dantas BATISTA , Cláudia Jordão SILVA , Darceny Zanetta BARBOSA ;
Resumo
Abstract
O avanço no tratamento das fraturas mandibulares pediátricas deu-se principalmente após o
advento da fixação interna rígida com o uso de
mini-placas e parafusos, que possibilitaram
uma melhor redução e fixação das fraturas. A
abordagem primária e o diagnóstico preciso são
de fundamental importância para o sucesso do
tratamento executado. O uso de materiais
absorvíveis e não-absorvíveis tem sido discutido podendo se ressaltar as vantagens e desvantagens quanto ao uso de cada um desses
materiais.
The advance in the treatment of the pediatrics
mandibular fractures mainly after gave to the
advent of the rigid internal fixation with the
use of mini-plates and screws, that make
possible a better reduction and fixation of the
fractures. The primary accost and the exactness on diagnosis have a big importance for
the success of the treatment execution. The use
of resorbable and unresorbable materials has
been argued being able to stand out the
advantages and disadvantages about the use
of each one of these materials.
Unitermos
Key words
Traumatologia - Fraturas mandibulares Cirurgia bucal - Fixação de fratura.
Traumatology - Mandibular fractures Surgery, oral - Fracture fixation.
1 - Acadêmico do curso de Especialização em Cirurgia e
Traumatologia Buco-Maxilo-Facial da Universidade Federal de
Uberlândia. [email protected]
UFU e Doutorando pela Faculdade de Odontologia da PUCRS.
2 - Cirurgião-dentista graduado(a) pela Universidade Federal de
Uberlândia.
3 - Acadêmica do curso de Mestrado em Odontologia Universidade Federal de Uberlândia.
4 - Professor da disciplina de Cirurgia e Traumatologia BucoMaxilo-Facial - Faculdade de Odontologia - Universidade Federal
de Uberlândia - UFU; Mestre pela Faculdade de Odontologia da
5 - Professora da disciplina de Cirurgia e Traumatologia BucoMaxilo-Facial - Faculdade de Odontologia - Universidade Federal
de Uberlândia - UFU; Mestre e Doutora pela Faculdade de
Odontologia de Piracicaba - Unicamp.
6 - Professor titular da disciplina de Cirurgia e Traumatologia BucoMaxilo-Facial e Implantodontia - Faculdade de Odontologia Universidade Federal de Uberlândia - UFU; Mestre e Doutor pela
Faculdade de Odontologia Campus de Araçatuba - UNESP e Pósdoutor pelo Centre for Oral Health Sciences - Lund University.
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Danilo Maldonado e DUARTE, Carla Silva SIQUEIRA, Éverton Ribeiro LELIS, Flaviana Soares ROCHA,
Jonas Dantas BATISTA, Cláudia Jordão SILVA, Darceny Zanetta BARBOSA;
Introdução
Traumatismos envolvendo a região
craniomaxilofacial requerem atenção, o que
exige do profissional uma abordagem sistemática e precisa. O tratamento do traumatismo
facial em crianças merece considerações
especiais, quando comparado ao dos pacientes
adultos, devido a rapidez do reparo dos tecidos
moles e duros e à rica vascularização tecidual
em crianças. Soma-se a isso uma grande
capacidade adaptativa das estruturas orofaciais
que estão em desenvolvimento, além da
tendência à descompensação frente a traumas
severos10.
O índice de fraturas faciais em crianças
é relativamente baixo graças, principalmente, à
anatomia facial particular da idade e a dependência da criança em relação ao indivíduo
adulto2. Crianças de até 5 anos de idade vivem
normalmente protegidas sob a supervisão de
um adulto, possuem baixa massa corporal e
suas quedas normalmente são de alturas
limitadas e de baixo impacto. Assim, as forças
podem ser absorvidas por sua pele acolchoada,
esqueleto elástico e centros de crescimento
cartilaginosos6.
Após os 5 anos, a criança tem um
desenvolvimento neuromotor significativo e
possui maior interação social, o que implica no
aumento das possibilidades de um trauma
facial direto. Deve-se ainda considerar que o
constante crescimento das estruturas faciais
resulta em alterações anatômicas que também
podem favorecer o trauma na face6.
Nos últimos anos, o tratamento das
fraturas mandibulares passou por diversas
mudanças, especialmente após a introdução de
técnicas de fixação interna rígida e o desenvolvimento de novos materiais. Inicialmente, a
abordagem a essas fraturas era conservadora,
no entanto, atualmente, técnicas de abordagem
mais precisas e primárias, associadas a uma
fixação estável das fraturas faciais já têm sido
aplicadas com sucesso9,3.
É da responsabilidade do cirurgião
bucomaxilofacial prestar o primeiro atendimento ao paciente poli-traumatizado com lesão
facial, sem, entretanto, deixar que os aspectos,
aparentemente, mais dramáticos, prejudiquem
a avaliação de outras lesões importantes
associadas, como as lesões abdominais e
torácicas, as quais podem oferecer risco à vida
do paciente9.
O objetivo deste trabalho foi relatar um
caso clínico abordando o tratamento de fratura
mandibular em criança utilizando a técnica de
fixação interna rígida.
Relato Caso
D.R.S., 10 anos, vítima de acidente com
animal (coice de cavalo compareceu ao pronto
socorro do Hospital das clínicas da
Universidade federal de Uberlândia, e foi
avaliado pela equipe de Cirurgia e
Traumatologia Buco-Maxilo-Facial que, ao
exame clínico, observou lesão corto-contusa em
região de mento, mucosa oral da porção interna
do lábio inferior e fundo de saco de vestíbulo e
região vestibular ao dente 11; fraturas dento alveolares na região dos dentes 11 e 41; avulsão
dos dentes 11, 12 e 21; e fratura de sínfise
mandibular direita. Os exame radiográficos
foram realizados evidenciando a confirmação
do diagnóstico prévio de fratura sinfisária.
(Figura 1)
O paciente foi levado ao Centro
Cirúrgico sob anestesia geral para instalação
das barras.
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Tratamento de Fratura Mandibular em Criança: Relato de Caso Clínico
Figura 1: Pré-operatório (A). Radiografia póstero-anterior préoperatória evidenciando a fratura (B).
Foi realizada redução cruenta e fixação da
fratura, bem como reposicionamento dental e
instalação de barras de Erich, sob anestesia
geral. Inicialmente foi realizado o reposicionamento dental dos elementos comprometidos,
foram instaladas as barras de Erich com
posterior bloqueio maxilo-mandibular, tendo
em vista a oclusão do paciente. A lesão cortocontusa foi utilizada com via de acesso. Após
redução da fratura, foi instalada uma placa de
titânio (2.0mm de espessura e 6 furos) na borda
inferior da mandíbula, sendo que 3 furos
ficaram posicionados no coto proximal e os
outros 3 furos no coto distal associada a 6
parafusos de titânio, mono corticais de 5mm de
comprimento. Suturas por planos da pele foram
realizadas e a seguir o bloqueio maxilomandibular foi removido. (Figura 2)
Figura 2: Aspecto intra-bucal após instalação de barras de Erich (A).
Redução (B) e fixação (C) da fratura. Sutura (D).
No acompanhamento pós-operatório
de 7 dias, foram removidas as suturas intra e
extra-bucais notando-se boa cicatrização do
tecido afetado e oclusão satisfatória (Figura 3).
A Barra de Erich superior foi removida após 15
dias para facilitar o tratamento endodôntico
dos dentes envolvidos, iniciado no serviço de
traumatismo dento-alveolar situado na mesma
instituição.
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Danilo Maldonado e Duarte, Carla Silva Siqueira, Éverton Ribeiro Lelis, Flaviana Soares Rocha,
Jonas Dantas Batista, Cláudia Jordão Silva, Darceny Zanetta Barbosa;
faciais bem como bloqueio maxilo-mandibular,
quando indicado, em crianças dentadas em
todas as idades10.
O diagnóstico inicial bem como o plano
de tratamento deverão ser precisos visando
uma melhor abordagem frente ao quadro
oferecido. O cirurgião deverá optar pela melhor
conduta, dispondo-se de seus conhecimentos e
dos métodos adequados para a redução e
fixação das fraturas.
Figura 3: Pós-operatório de 7 dias (A-B). Radiografia panorâmica
pós-operatória ( C ).
A barra inferior foi mantida por 45 dias
exercendo o papel de estabilização da fratura já
que a placa na zona de tensão foi contraindicada devido à presença dos germes dos
dentes permanentes. A dieta líquida e pastosa
foi rigorosamente mantida durante 45 dias,
sendo que, a barra de Erich inferior foi removida após esse mesmo período.
Decorrido o tempo necessário, o
paciente recebeu alta do serviço de Cirurgia e
Traumatologia Buco-Maxilo-Facial podendose notar o restabelecimento funcional e estético
e manteve seu tratamento dentário no serviço
de traumatismo dento-alveolar, submetendose aos tratamentos endodônticos e restauradores que lhes eram necessários.
Discussão
Os padrões das fraturas mandibulares
em crianças são afetados pois existe o fato de
que a mandíbula da criança é preenchida por
germes dentários em vários estágios eruptivos1.
Somente um cirurgião familiarizado com a
cronologia da erupção dentária está apto a
realizar estabilização e fixação de fraturas
O uso de mini-placas de titânio não
absorvíveis tem obtido um alto índice de
sucesso, quando a indicação e a técnica são bem
designadas. Já o uso de placas absorvíveis tem
sido amplamente discutido e suas vantagens e
desvantagens devem ser considerados durante
a escolha da proposta de tratamento, visto que
cirurgiões menos experientes podem comprometê-lo devido às limitações e desvantagens
oferecidos por esse método de fixação dos quais
é possível citar: menor resistência mecânica,
custo, dificuldade de moldagem e adaptação da
placa devido à “memória” do material, resposta
inflamatória aumentada durante a reabsorção
do material, o que pode aumentar em muito o
tempo operatório10,12.
Para as fraturas que ocorrem em
regiões dentadas, a utilização de técnicas de
redução aberta com fixação estável com uma
placa na borda inferior da mandíbula, combinadas com redução e estabilização na dentição por
barras de Erich, mostram-se eficazes promovendo uma união óssea confiável da fratura,
sem deslocamento. A instalação de placas na
zona de tensão não é recomendada em pacientes com dentição mista, diferentemente da
abordagem cirúrgica nos adultos, em que a
conduta cirúrgica requer a colocação de duas
placas sendo uma na borda inferior da mandíbula e a outra na zona de tensão10,13.
Os materiais não absorvíveis devem ser
removidos assim que decorrido o tempo
necessário para a consolidação total da fratura,
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que gira em torno de 4 meses, visando a não
interferência durante os estágios de desenvolvimento dos ossos da face, principalmente
aqueles que envolvem o aparelho estomatognático, uma vez que as placas e parafusos de
titânio tendem a restringir o desenvolvimento
ósseo da criança devido à sua rigidez, podendo
causar assimetrias faciais permanentes8.
Referências
A criança deverá ser acompanhada a
longo prazo, visto que traumas na região facial
no período de desenvolvimento, bem como
abordagens cirúrgicas ou falta de tratamento,
podem interferir no padrão de crescimento e
desenvolvimento das estruturas faciais8.
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Conclusão
A abordagem inicial a criança com
trauma facial deverá incluir os princípios gerais
do tratamento de fraturas mandibulares,
entretanto em crianças deverá haver uma
indicação adequada para a fixação interna
rígida.
Caberá ao cirurgião realizar um
atendimento inicial diferenciado, tendo em
vista todas as particularidades encontradas na
abordagem e tratamento do trauma em criança.
O diagnóstico preciso e um plano de tratamento
com objetivos claros oferecem ao cirurgião um
prognóstico mais previsível ainda que sua
opção de tratamento não inclua a conduta
cirúrgica.
O acompanhamento a longo prazo é de
importância ímpar e caberá ao profissional
identificar e minimizar os efeitos produzidos
e/ou potencializados pelo trauma na criança,
visando a manutenção de um desenvolvimento
das estruturas faciais de maneira satisfatória.
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Endereço para Correspondência
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