Artigo 2

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Artigo 2
Esquina Científica
Terapia de Ressincronização
Cardíaca em Classe I e Ii
»» por Erlison Kleber Martins*
A terapia de ressincronização cardíaca (TRC), opção terapêutica não farmacológica para pacientes com insuficiência cardíaca refratária ao tratamento clínico, surgiu como alternativa a
um cenário onde apenas restava o transplante cardíaco; acessível apenas a doentes rigorosamente elegíveis e com doadores
disponíveis.
A compreensão, já há muito estabelecida, que a dessincronia ventricular derivada do bloqueio de ramo esquerdo é deletéria e concorre para um quadro de disfunção ventricular/ICC, nos
remete a um conceito de miocardiopatia “elétrica”.
Ressincronizando estes pacientes muito sintomáticos a partir
de critérios adrede estabelecidos por ensaios clínicos de grande
expressão, observamos melhoria clínica e dos índices de performance cardíaca que redundaram também em menos desfechos
de mortalidade e hospitalizações por ICC.
De forma ainda intrigante, existem os super-respondedores,
que nos sinalizam que os danos provocados no miocárdio podem ser reversíveis...
Do axioma que todo efeito provém de uma causa e reconhecendo que cardiomiopatia pode derivar de dessincronia provocada pelo BRE, era premente que novos estudos ousassem
inserir pacientes em classe I e II de NYHA para que o raciocínio
lógico de atuar em algo antes que este algo piore fosse testado.
Dessa forma, o critério de gravidade dos sintomas foi em
parte afrouxado e tais ensaios clínicos largaram a ideia tímida
trazida dos tempos primeiros da TRC, se atrevendo a agir de
forma racional em pacientes minimamente sintomáticos.
E os resultados tem sido positivos. No estudo REVERSE1, 610
pacientes com QRS > 120 ms, FE < 40% e VEd > 55 mm em
classe I e II da NYHA submetidos a TRC foram alocados em grupo
TRC ligado e desligado. Após 1 ano, 2 anos e 5 anos, os resultados clínicos e ecocardiográficos foram superiores no grupo TRC
ativo. FEVE (p<0,0001) e Volume sistólico final do VE (p=0,001)
com taxa de progressão da ICC significativamente retardada.
No MADIT-CRT2, 1820 pacientes cardiopatas isquêmicos e
não isquêmicos em classe I e II da NYHA com FE < 30% e QRS
>130 ms foram separados em Grupo TRC-CDI e Grupo CDI.
Os desfechos primários (mortalidade e eventos não fatais relacionados à ICC) foram reduzidos no Grupo TRC-D (p=0,001)
consistentemente naqueles com QRS>150 ms (p=0,001) em seguimento médio de 2,4 anos.
O estudo RAFT3 foi composto por 1798 pacientes em classe
II e III, FE < 30%, QRS > 120 ms (intrínseco) e > 200 ms (Mar-
capasso) divididos em grupos TRC-D e CDI. Em 40 meses de
seguimento observou-se redução de 27% (p<0,001) no desfecho
composto de mortalidade e hospitalização por ICC (end-point
primário).
A todos que se posicionam contra a difusão da TRC nestes
pacientes assintomáticos ou minimamente sintomáticos, inquirindo sobre a viabilidade financeira dentro da saúde pública e
privada, já existem trabalhos de custo-efetividade acenando a
favor desta terapia4.
Conquanto reconheçamos a legitimidade dos resultados
destes estudos indicando benefícios nos pacientes classes I e II
NYHA, o que motivou atualização em diretrizes internacionais,
temos que atentarmos para fatores sabidamente prejudiciais a
uma resposta positiva, como densidade da fibrose miocárdica
visto a RNM5 e posição apical6 ou paraseptal7 do eletrodo do
seio coronariano.
Assim, aprendendo a melhor selecionar o candidato a TRC
para extrair os benefícios esperados, caminhamos na direção
de abraçarmos todas as classes funcionais, entendendo que o
objetivo maior transcende a melhoria da capacidade funcional
dos doentes.
Referências
1.Linde C, Gold MR, Abraham WT, St John Sutton, Ghio S, Cerkvenik J, et
AL. Long-term impacto f cardíac resynchronization therapy in mild heart
failure: 5 years results from the Resynchronization Reverses Remodeling
in Systolic left ventricular dysfunction (REVERSE) study. Eur Heart J 2013
2.Zareba W, Klein H, Cygankiewicz I, et al. Effectiveness of Cardiac resynchronization Therapy by QRS Morphology in the Multicenter Automatic Defibrillator Implantation Trial- Cardiac Rsynchronization Theraphy
(MADIT-CRT). Circulation, 2011; 123: 1061-1072
3.Healey JS, Hohnloser SH, Exner DV, et al. Cardiac resynchronization for
ambulatory Heart Failure Trial (RAFT). Circ Heart Fail 2012; 5(5):566-70.
4.Linde C, Mealing S, Hawkins N, et AL; REVERSE study group. Cost-effectiveness of cardiac resynchronization therapy in patients with asymptomatic to mild heart failure: insights from the European cohort of the
REVERSE.
5.Marsan NA, Westenberg JJM, Ypenburg C, Bommel RJB, Roes S, et AL.
Magnetic ressonance imaging and response to cardiac Resinchronization
therapy: relative merits of left ventricular dysynchrony and scar tissue. European Heart Journal 2009;30:2360-67
6.Singh JP, Klein H, Huang DT et al. Left Ventricular Lead Position and Clinical outcome in the Multicenter Automatic Defibrillator Implantation
Trial-Cardiac Resynchronization Therapy (MADIT-CRT) Trial. Circulation,
2011; 123: 1159-1166
7.Marek J, Jerzy W, Kamil F, Tomasz S, Danuta C. Mortality and morbidity
in cardiac resynchronization patients: impacto of lead positions, paced left
ventricular QRS morphology and characteristics on long-term outcome.
Europace (2013) 15.258-265
* Especialista em eletrofisiologia cardíaca e habilitado em estimulação cardíaca artificial pelo Hospital Beneficência Portuguesa-SP e
coordenador do Serviço de Eletrofisiologia do Hospital Vera Cruz-BH.
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