o mineirão é nosso - Associação Mineira de Cronistas Esportivos

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o mineirão é nosso - Associação Mineira de Cronistas Esportivos
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Editorial
NO PROJETO MINEIRÃO,
O EMPENHO DA AMCE
PARABÉNS MINEIRÃO
A ideia nasceu em plena tribuna de
mídia do gigante. Companheiros
sugeriram: Presidente, vamos fazer
uma revista homenageando os 50
anos do Mineirão? - Topei na hora.
A causa era mais do que justa e eu
adoro um desafio.
Começamos então a formatar o projeto e correr atrás dos apoiadores. A
ideia básica não era contar a história do Mineirão. Mesmo porque isto
vem sendo feito com alta competência por jornalistas e escritores. Fácil
encontrar livros, revistas, suplementos, álbuns e artigos sobre o tema.
Nosso desejo era colher depoimentos de companheiros novos e antigos que
viveram ou ainda vivem a experiência, a emoção e até mesmo o sacrifício de
trabalhar dentro deste templo sagrado do futebol.
EXPEDIENTE
AMCE – Associação Mineira de Cronistas
Esportivos – Entidade pública municipal e
estadual
Rua Bom Despacho, 206. Bairro
Santa Tereza - Belo Horizonte / MG
CEP 31010-390
www.amce.org.br / [email protected]
(31) 3481-9796 / 3481-1357 / 3482-3373
Presidente: Luiz Carlos Gomes
A REVISTA AMCE
MINEIRÃO 50 ANOS é um produto da entidade
em parceria com a
Publimig Publicidade e Promoções Ltda
e BAC Ltda.
Jornalista Responsável
Flávio Eduardo
MG06903JP
Fotos: Arquivo da AMCE, Osmar Ladeia, Heleno
Mesquita, Luiz Carlos Alves, Ronan Ramos, Alex
Lanza
A tarefa não foi fácil. Muitos já deixaram a profissão, estão aposentados,
sumidos ou fora da cidade. Muitos outros já estão em outro plano. Importante destacar que a história do Mineirão está umbilicalmente ligada a crônica
esportiva mineira. A ideia nasceu e se transformou em realidade graças ao
esforço de nobres cronistas esportivos do passado. Foram eles que pressionaram as autoridades para que o projeto saísse do papel. Foram eles que
mobilizaram o povo para abraçar o sonho.
O velho e saudoso Mineirão marcou uma época de ouro para o futebol de
Minas. Foi palco de grandes conquistas, revelou e consagrou verdadeiros
craques. Nos deu projeção nacional e internacional. A própria crônica esportiva mineira cresceu muito, em quantidade e qualidade.
Agora, totalmente modernizado, mais bonito, forte e monumental, o Mineirão continua garantindo o pleno desenvolvimento do futebol mineiro. Nestes
50 anos bem vividos, o gigante guarda momentos incríveis e números impressionantes. Uma história maravilhosa que chega ao seu cinquentenário
devidamente registrada pelo seu porta voz maior, o cronista esportivo.
Colaboradores: Virgílio Araujo Filho, Paulo
Marques, Luiz Carlos Alves, Ronan Ramos, Leo
Coutinho, Daniel Seabra, Luiz Linhares, Paulo
Cesar Pedrosa, Ivan Drummond, Wanderlei Lima,
Gabriel Lima e Duke.
O Mineirão é o nosso habitat natural, onde misturamos lazer e labor com
imenso prazer.
Aí está a razão da nossa singela, mas sincera homenagem. Não tem placa,
troféu ou festa que substitua mensagens feitas de coração para quem a gente
ama.
Tiragem: 5.000 exemplares
Diagramação: Daniela Ângela
Impressão: Gráfica Millenium
Parabéns, MINEIRÃO! Vida longa.
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Luiz Carlos Gomes
Presidente da AMCE
O ambicioso projeto de construção do
Mineirão contou com o apoio intenso da
crônica esportiva de Minas Gerais. Entre
as indecisões que o projeto arquitetônico
exigia, de localização, falta de recursos e
interesses políticos, cronistas esportivos
empunharam a bandeira para sua realização e buscaram convencer a todos da
importância da construção. A partir de
1959, uma parcela de jornalistas e radialistas passou a dedicar maior tempo para
mostrar a importância da obra para o futebol mineiro.
O jornalista e associado da AMCE,
Benedito Adami de Carvalho, à época
presidente da Federação Mineira de Futebol, começou uma campanha que ganharia adeptos e chegaria ao gabinete do
governador Magalhães Pinto.
O movimento entendia que o Estádio
seria a redenção dos clubes mineiros e
apontava os caminhos para conseguir
recursos, como a Loteria do Estado. E
foi conseguindo seguidores. Entre eles,
o então presidente da AMCE, Jovelino
Nunes, redator da Rádio Inconfidência.
O movimento crescia e ganhou corpo
ainda na construção do Mineirão, que
via sua conclusão abalada por confrontos
políticos. Quando a seleção mineira venceu o torneio nacional, os governantes
sentiram o peso das ações dos jornalistas e radialistas, que cobravam um palco
digno para o esporte, tamanha a comoção
popular nas ruas pelo feito dos mineiros.
Osvaldo Faria, ainda repórter da Rádio
Itatiaia, acompanhava de perto a evolução das obras. Fazia gravações quase que
diárias e eram dele as principais notícias
do andamento dos trabalhos. Acompanhou, sozinho na imprensa, a festa da
“cumieira” do Mineirão, um grande
churrasco oferecido aos operários.
Jairo Anatólio Lima, considerado à época o melhor locutor esportivo de Minas,
entrou de corpo e alma na luta para a
conclusão das obras do Mineirão. É dele
uma das grandes
participações nos
debates, quando
abandonou
sua
costumeira calma
e educação para
bater boca com o
então presidente da
Federação Paulista
de Futebol, Mendonça Falcão, que não via
nenhuma importância
na obra e previa sua
transformação num elefante branco.
A participação dos cronistas não parou por aí.
Nos encontros em palácio ou em coletivas do governador, sempre estava presente um cronista esportivo, que fazia
perguntas pertinentes à obra, mesmo
sabendo dos interesses e ciúmes dos homens que comandavam as decisões políticas no estado (foto). Udenistas e pessedistas queriam o Mineirão, mas cada um
da sua maneira.
Para se ter noção da importância da
AMCE na construção do Mineirão, entre
idas e vindas do projeto na Assembleia,
nossa associação participou de todos
os debates. E quando a lei que gerou o
Mineirão determinou uma comissão de
administração, entre aqueles com direito a indicação de um membro estava a
AMCE, que indicou o associado José
Flávio Dias Vieira.
Esta união em torno da construção do
estádio mudou também us rumos da
imprensa esportiva em Minas. As emissoras de rádio passaram a dedicar mais
tempo para programas esportivos. Os
jornais aumentaram as editorias de es-
portes, apareceram novos colunistas e os profissionais recebiam maior
carinho do público. Muitos passaram a
ter status de estrelas no rádio e na TV.
Ganharam espaço para entrar na política
e dividiam com os próprios políticos a
sua popularidade.
Foram inúmeros os cronistas que ganharam o estrelato entre os mais importantes do país. Alguns até conquistaram
espaços em outras praças, mas a grande
maioria preferia ver o sonho realizado
aqui.
O ex-presidente Jovelino Nunes dizia
que “somente a construção do Mineirão
poderá reverter um quadro comum no
interior do estado. Ninguém queria saber
de Cruzeiro, Atlético e América. Queria
Flamengo, Botafogo, Vasco, São Paulo,
Corinthians e Palmeiras. O Mineirão vai
mudar esta rotina.” Em suas andanças
pelo interior de Minas como funcionário
do Instituto de Aposentadoria e Pensão
dos Comerciários, hoje INSS, via isso de
perto e divulgava a importância da obra
de construção do Estádio. Foi um pregador. E estava coberto de razão.
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CRONIQUÊS
Cronista esportivo adora arranjar apelido e codinome pra tudo. Trave é balisa, pau, ferro, arco e poste.
Campo de jogo é gramado, palco, quadrado, retângulo, círculo central e muitas outras geometrias. Outro
elemento do jogo (também chamado de peleja e ludopédio), a bola tem lá suas alcunhas. Algumas pomposas, como Brazuca e Jabulani. Outras populares, como balão de couro, pelota, cabeça, esfera, côco, redonda, gorduchinha, criança e menina. Abrindo o leque, temos caneta, banheira, frango, bomba, coruja,
bicicleta, bandeira, chapéu, catimba, vaca, firula, ladrão, ponte, volante, cartola, pipoca, alface, carrinho,
peixinho, açougue, veneno, cera, chocolate, relâmpago e muitos outros.
Só pra lembrar:
nesse dicionário, tapete e tapetão são coisas totalmente diferentes.
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HISTÓRIA VIVA DO ESPORTE
Imagine você, com 86 anos, saúde
de ferro, na ativa, memória de elefante e vontade de garoto. É ou não
é o resultado do elixir da longevidade! Pois bem, esse é Leontino Coutinho, Tininho para os mais antigos,
Léo Coutinho para todos nós.
Natural de Curvelo, esse boleiro inveterado já viveu de tudo
no futebol. Jogou, treinou,
preparou, descobriu, comentou, brigou, viajou,
ganhou, perdeu fez e
aconteceu. Foi preparador físico campeão brasileiro com
o Atlético, ajudou a
Rádio Itatiaia a dar
os primeiros passos,
treinou o América,
enfrentou Coutinho e
Pelé. É o cronista mais
longevo da crônica esportiva mineira, quiçá do
Brasil. Uma autoridade no
quesito futebol.
De quebra, compôs a comissão técnica da Seleção Mineira que
inaugurou o Mineirão. Gerson dos
Santos foi escolhido para treinador
e Paulo Benigno para preparador físico. “Foi o compadre Paulo quem
me chamou. Só que ele teve um
problema particular e não ficou. Então fui o preparador físico naquele
jogo inesquecível. Na antevéspera
da partida fizemos literalmente o
reconhecimento do gramado. Aliás,
fiz o primeiro gol no Mineirão. Eu
também treinava os goleiros. Su-
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bimos antes de todos. Ao começar
o bate bola, fiz questão de mandar
uma canhota bem forte e estufar as
redes. O Buglê fez o primeiro gol
oficial, mas quem colocou a bola lá
dentro primeiro fui eu”.
Foram jogos espetaculares, craques
diversos, lances inesquecíveis, públicos maravilhosos. “Disputei mais
de uma dezena de edições do Campeonato Mineiro trabalhando no
Mineirão, como preparador físico e
também treinador. Como cronista,
participei de quase todos”.
REDENÇÃO – Coutinho era sócio
de uma agência de publicidade em
Belo Horizonte na época em que o
projeto Mineirão ganhava corpo.
“Fazíamos as campanhas políticas
do Jorge Carone, que também era
cronista esportivo. Criamos o lema
“Carone realiza mesmo”. Ele foi
eleito prefeito da capital e se tornou a grande locomotiva para que
o Mineirão acontecesse. É claro que
houve muita gente trabalhando a
favor, e contra também, mas foi o
Carone quem realmente pegou o boi
pelo chifre”.
Leó revela que a crônica esportiva
mineira, de um modo geral, abraçou
a causa. “Eu estava na Itatiaia na
época e o Januário Carneiro, sempre muito inteligente, botou pilha
nas autoridades, já vislumbrando os
benefícios que o novo estádio traria
para o futebol mineiro e, por conseguinte, para nossa imprensa esportiva. O Mineirão foi a redenção do
futebol mineiro”.
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PELÉ E AS CATIVAS
“Tínhamos uma grande ligação com a ASA Publicidade,
empresa contratada para os
trabalhos de divulgação do
novo estádio. Uma das iniciativas foi a venda das cadeiras
cativas, como forma de arrecadar dinheiro, inclusive depois
do estádio pronto. Pelé foi
escolhido como garoto propaganda. Fui um dos que recebeu
o rei no aeroporto da Pampulha e o conduziu por aqui. Já
no Mineirão, cheio de autoridades, a imprensa toda e os
curiosos de carteirinha, Pelé
sentou-se numa cadeira improvisada para gravar o comercial. Colocaram a cadeira onde
hoje fica a torcida do Atlético.
Só depois perceberam que o
sol caía à tarde exatamente sob
o olhar dos torcedores. Então
mudaram as cativas para o
lado oposto, onde ficaram até a
última reforma do estádio. Inclusive as cabines de imprensa
também ficariam do lado de lá.
Por esse motivo foram construídas do lado oposto”.
Pelé e Zito no Mineirão, dois anos antes da inauguração
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O MINEIRÃO É NOSSO
“Sinto falta do povão no Mineirão, daquele torcedor da
geral, da galera que lotava
tudo e fazia uma festa maravilhosa. Hoje elitizou. Os
valores estão altíssimos. As
condições de trabalho também mudaram, assim como
o próprio futebol. Vi de perto
os maiores craques do Brasil
e do mundo jogar no Mineirão e pra mim o Reinaldo foi
o maior de todos. Sou um privilegiado.
Mas é fundamental ressaltar:
quem promove o futebol é o
cronista esportivo. Os estádios de Minas e, claro, o Mineirão, são a nossa casa sim!
É o cronista quem escreve,
mostra, emociona, comenta,
fala mal ou bem de jogadores,
estimula a torcida e fomenta a polêmica, fundamental
para a temperatura do jogo e
de tudo que o envolve. Tentar
diminuir ou cercear a imprensa esportiva é dilapidar o próprio futebol. Nós, cronistas,
precisamos nos manter fortes
e atuantes”.
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EU ESTAVA LÁ
GALERIA DE CRAQUES
Luiz Carlos Alves
Nem as irresponsáveis e repetidas entrevistas de um insano
morador de Contagem,
autointitulado “astrólogo”, apregoando com
sistemática contundência que o novo estádio
iria cair, evitaram que eu
fosse à inauguração.
Nem a tragédia anunciada
pelo fazedor de horóscopos para moçoilas à espera
de casamento, ou para venerandas senhoras à procura pelos signos de amantes
mais fogosos que seus maridos, evitaram que eu fosse à
inauguração.
Nem o quadro macabro que o
pretenso vidente pintava nas
manchetes dos jornais, lidas
em letras garrafais por Aldair
Pinto nos informativos de toda
hora da sua emisso
ra, evitaram que eu fosse à inauguração.
Nem o vermelho-sangue, com
o qual o precursor do apocalipse
esportivo banhava suas visões
catastróficas e bizarras, anunciando centenas de mortos e
milhares de feridos ao ruir das
arquibancadas, evitou que eu
fosse à inauguração do estádio.
Nem eu nem os outros 73.200
pagantes evitamos ir. No entanto, poderíamos ter ido em número maior, bem maior, dezenas de
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milhares mais, não fosse a onda
criada pelo tal Saturno, codinome
de um espertalhão em busca de
espaço para aumentar sua cotação
na bolsa esotérica.
Ele falhou. Os astros não o ajudaram. Saturno e seus anéis foram recolhidos à insignificância,
enquanto o estádio era elevado à
potência máxima da galáxia esportiva como o “Gigante da Pampulha” e para servir às verdadeiras estrelas da bola.
“Gigante da Pampulha” é jargão
de cronista esportivo. Tem o jeito e a sonoridade dos locutores.
Seu criador? Não importa. Sua
obra ficou maior que ele próprio.
Tornou-se expressão de domínio
público, que antes e durante todo
o período da obra eu já ouvira e
tantas vezes voltaria a ouvir.
Aquela expressão idiomática popular destruiu outra previsão, a de
Wilson de Oliveira, eficiente descobridor de jogadores: “O estádio
nunca ficará lotado. Será um elefante branco”. Me lembro bem da
voz e do infeliz vaticínio.
Eu estava lá. Cheguei logo depois
da abertura dos portões. Radinho
na mão, fone no ouvido, e uma
troca incessante de sintonias. Valia a pena, porque o rádio esportivo mineiro era múltiplo, competitivo. Cada emissora pretendendo
ser melhor que a outra.
Informar primeiro, oferecer mais
detalhes, ouvir anônimos que viravam notícia imediatamente, e
entrevistar os famosos de toda
hora, tudo fazia sentido.
Vi o Belini, meu ídolo, zagueiro
bicampeão do mundo, dar a volta olímpica vestindo o uniforme-agasalho da seleção brasileira e
carregando a tocha. Vi a eterna
demonstração dos cães amestrados da Polícia Militar. Vi a bola
do jogo sendo jogada de um helicóptero, pois não permitiram a
um paraquedista descer com ela
no gramado.
Eu, pré-vestibulando de medicina, torcedor de futebol e ouvinte
inveterado de rádio, vibrava com
a “marcha das informações” (ôpa,
outro jargão) e acompanhava da
arquibancada, ao lado dos tios
Nélson e Emília Portela Alves, as
andanças dos repórteres.
Via e ouvia o Paulo Celso, na pista, à direita das cabines de rádio e
TV. Ele e seu colega da Inconfidência, João Natal. Na cabine, os
locutores Lucélio Gomes, Jugurta
Anatólio Lima e seu irmão, Jairo,
ao lado do comentarista Sérgio
Ferrara.
Via e ouvia Ronan Ramos, andando pra lá e pra cá, Maurílio Costa, Paulo Roberto, Dirceu Pereira,
Januário Silvestre e Ely Zico de
Freitas, enquanto Osvaldo Faria
comentava e Emanuel Carneiro e Pinguim sustentavam as informações da retaguarda. Quem narrou foi
Alberto Rodrigues.
Troquei de sintonia e ouvi
os vozeirões empostados de
Euclides Santos e Armando
Alberto e o jovem Geraldo
Augusto na Guarani. Vi e
ouvi os repórteres Walter
Luiz, Carlos Alberto Souza e Mauro Lúcio, informando da
pista e dos coredores do estádio.
Busquei nova frequência no dial
para ouvir, com dificuldade, a
Rádio Minas, de pouca potência.
Porém, virando o radinho para
um lado e outro, escutei Luciano Silva, Normandes Moreira e o
comentarista Carlos Dias, nome
radiofônico do Carlos Gropen, e
os repórteres Max Chinait e Hélio
Zico.
Na Jornal de Minas, Aloísio Santos e Ito Abrahão reportavam para
o locutor Ilídio Costa. Aliás, os
locutores eram também speakers, um anglicismo já caindo
em desuso à época. Hoje eles
são narradores.
Eu estava lá e não podia imaginar que em apenas seis meses a
bola da vida, num lance imprevisto e muito rápido, me faria
um colega de todos eles. A medicina ficou para trás. O rádio
me levou.
Pois é! Ainda carrego na memória
o toque inicial do jogo de inauguração, Seleção Mineira x River
Plate: Tostão para Dirceu Lopes;
e também toda a cena do gol de
Buglê aos 2 minutos do segundo
tempo, uma vibração jamais vista
e sentida por tanta gente em Minas.
Mas o estádio não caiu. Nem em
5 de setembro de 1965, nem nos
demais jogos da programação de
inauguração. Estou vivo para testemunhar e provar. Eu estava lá.
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CENÁRIO DE EMOÇÕES
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A expressão ‘época de ouro’ tornou-se sinônimo de grande fase,
de plenitude em todos os sentidos.
Ela veio principalmente do rádio,
cujo apogeu deu-se na primeira
metade do século XX, antes da
chegada da tevê e, posteriormente, das mídias eletrônicas.
Quem viveu não exita em afirmar
que o futebol e a música foram os
expoentes máximos deste período.
Protagonista da imprensa esportiva em Minas quando da inauguração do Mineirão, Ronan Ramos
viveu momentos inesquecíveis.
“Comecei na Itatiaia, depois passei para repórter de campo da Rádio Guarani e na mesma função
fui para a TV Itacolomi, fazendo
parte de uma equipe maravilhosa,
com Fernando Sasso, Kafunga,
Rodrigo Mineiro, Magafa e Hélio
Fraga”.
Ronan exalta a
arte de Tostão,
Dirceu Lopes,
Piazza, Oldair,
Jair Bala, Dario, Raul, Natal,
Zé Carlos, Mazurkiewsk, Toninho Cerezzo,
Reinaldo, Cingunegui e tantos
cobras que fizeram a história do
futebol mineiro
e brasileiro. “O Yustrich fazia repórter tremer; Telê dava aula de
futebol-arte. Tinha o Gérson dos
Santos, o Marão, só fera”.
Era o tempo de jogos às quartas,
quintas, sábados e domingos. Tinha até rodada dupla. Conhecido
como o Repórter da Camisa Amarela, Ronan Ramos lembra de
“Na primeira
transmissão da tevê o
Sasso ficou encantado de
me localizar rápido e me
chamou de Repórter da
Camisa Amarela.
O apelido pegou e até
hoje tem gente que me
chama assim”
uma pesquisa feita pela agência
de publicidade JMM, a pedido do
Banco Nacional, mostrando que o
amarelo era a cor que mais se destacava quando o fundo era verde.
“Na primeira transmissão da tevê
o Sasso ficou encantado de me
localizar rápido e me chamou de
Repórter da Camisa Amarela. O
apelido pegou e até hoje tem gente
que me chama assim”.
Ele revela um grande facilitador
para conhecer cada pedaço de
chão do estádio. “A mobilidade
era enorme por causa do ponto
eletrônico e microfone sem fio,
criados especialmente por técnicos da TV Itacolomi. Num jogo
fui parar na cobertura do Mineirão, perto do placar, para ter uma
visão geral do espetáculo e da parte externa”.
Av. Brigadeiro Eduardo Gomes, 1300
Lj. 02 - B. Glória - BH - MG
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MODELO MUNDIAL
R
onan também atuou
como Relações Públicas do Atlético, realizando eventos inusitados para os torcedores, como a
descida de uma nave no Mineirão
trazendo um ET que “queria conhecer esse time do outro mundo”.
Uma criação sua tornou-se modelo mundial. “Ainda no Atlético,
tive a ideia de colocar mascotes,
crianças, entrando com os jogadores em campo, iniciando uma
tradição hoje empregada por to-
dos os times do mundo. No princípio foram onze crianças parecidas com os jogadores. Foi sucesso
o menino louro com faixa apache
igual ao excêntrico goleiro Ortiz.
A resposta positiva veio imediata. No jogo seguinte apareceram
cinquenta. Chegou a mil crianças;
uma revolução no estádio, pois os
corredores que davam acesso ao
vestiário e ao túnel ficavam lotados de meninos”.
O Mineirão continuou na vida
do Repórter da Camisa Amarela
quando passou a integrar o qua-
dro de funcionários da ADEMG,
com os presidentes e cronistas
esportivos Afonso Celso Raso,
Camil Caram e Oswaldo Nobre.
“Quando inauguramos o placar
eletrônico do estádio foi uma surpresa para o público de Atlético
e Flamengo, o jogo do dia. Todas as luzes estavam apagadas e
apareceu o placar “falando”, uma
grande novidade na época. Tenho
grande satisfação e gratidão por
fazer parte dos 50 anos do Mineirão e pelos grandes e emocionantes momentos”.
http://interpanelas.blogspot.com.br/
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ORDEM NA CASA
Considerado como a Casa do
Cronista Esportivo de Minas
Gerais, o Mineirão teve, ao
longo de seus 50 anos, a parti-
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cipação direta da categoria em
sua Administração. Durante um
longo período, o cargo de presidente da Administração dos Estádios de Minas Gerais
(ADEMG) era ocupado
por um dos associados da
AMCE. Foi assim também com a diretoria de
operações.
Por lá, como presidentes,
passaram os companheiros Afonso Celso Raso,
Osvaldo Nobre, Tancredo Naves, Erasmo Angelo e Fernando Sasso;
e como diretor de operações, Dirceu Pereira, que
também exerceu a função de chefe de gabinete.
Mas outros cronistas
também tiveram papel
de relevância nestes 50
anos do Mineirão, como
o companheiro Alencar
da Silveira Junior, hoje
deputado estadual em
sua sétima legislatura, e
presidente do América
Futebol Clube. Frequentador da sede campestre
da AMCE, como filho
do cronista Alencar da
Silveira, acompanhava
de perto os debates dos cronistas, o papo domingueiro. Sabia
de todas as dificuldades que os
associados passavam para administrar o patrimônio. Como
ele mesmo define, “passei a
infância com o seu Waldemar,
nadando na piscina de ladrilho
da Ressaca”.
Como deputado, foi dele a
Lei Estadual que oficializou a
AMCE como única entidade
apta a credenciar os profissionais de imprensa para os trabalhos nas praças esportivas de
Minas. Para se ter uma ideia,
o credenciamento da imprensa
esportiva nos dias de jogos era
bastante confuso, bem como a
entrada de demais autoridades
no estádio.
Durante anos, um pequeno portão, ao lado do hall principal,
vizinho ao portão 2, servia de
local para ingresso destas pessoas. O local foi conhecido
como PPJ (Prostituta, Polícia e
Jornalista).
A mesma Lei criava o ingresso
de acompanhante para o cronista esportivo. Uma conquista
trabalhada em conjunto com o
companheiro Afonso Alberto,
que respondia pela presidência
da entidade.
NOSSA HISTÓRIA
A famosa Lei da Carteirada veio
a reboque e reduziu em muito o
número de penetras nos jogos.
Atendia ainda teatros e shows.
No Mineirão, por exemplo,
obrigou as forças públicas a enviarem para o estádio a relação
dos profissionais que iriam trabalhar em tal evento. Esta Lei
foi o embrião da Lei Federal
12.395, de autoria do senador
Alvaro Dias, que alterou a Lei
Pelé.
Durante muito tempo a AMCE
teve participação no borderô
dos jogos, vendendo um número limitado de ingressos para
acompanhantes dos cronistas.
Era uma possibilidade de familiares verem de perto o trabalho
do pai, filho, irmão ou mesmo
de amigos. E de fãs estarem
próximos de seus ídolos da imprensa esportiva num jogo de
futebol.
Recentemente, Alencar criou
a Lei que libera no Estádio a
venda de cerveja. Contestada
por muitos, era um antigo desejo do torcedor. Para o deputado
e cronista, o futebol e o estádio
são bens do povo. “Por diversas vezes acompanhei meu pai,
irmãos, amigos em jogos no
Mineirão. Sempre foi um evento, um programa para toda a família. É parte da nossa história!
Afinal de contas, eu também
sou um cronista esportivo”.
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O MINEIRÃO
O
Daniel Seabra
Mineirão sempre foi
chamado de palco, não
é mesmo? Certo. E os
protagonistas, normalmente, estão com a bola nos pés e fazendo a alegria das torcidas. Mas e
quando o assunto é música? Aí
o Gigante da Pampulha, mais
uma vez, não fica para trás. Desde sua inauguração, o estádio
sempre encantou a todos por sua
imponência, recebendo grandes
clássico e jogos memoráveis.
Mas somente depois de quase 20
anos, em 1983, o Mineirão foi
usado pela primeira vez para um
grande show. E coube à banda
norte-americana Kiss, um dos
grandes fenômenos mundiais da
música (e do marketing) abrir as
portas do estádio para milhares
de espectadores, a maioria cabeludos, com camisas pretas e com
os dedos em forma de chifre (o
malocchio, introduzido no rock
por Ronnie James Dio).
E este foi o pontapé inicial para
que grandes nomes se apresentassem no Gigante. O que, aliás,
era uma das carências de Belo
Horizonte. A capital mineira já
mostrava um número expressivo
de habitantes. Porém, os locais
destinados aos shows de maior
volume não pareciam acompanhar os dados. O Mineirão então
passou a ser usado para festivais,
abrindo as portas para que os mineiros recebessem, por exemplo,
nomes de peso do rock nacional,
Fonte: perfilbhz.wordpress.com
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É SHOW
o chamado BRock, nos anos 80.
Na primeira edição do festival,
no mesmo ano, ainda chamado
de Rock Brasil, subiram ao palco do Gigante cantores e bandas como Lulu Santos, Marina,
Herva Doce, 14 Bis, Blitz, Rádio Táxi, Ritchie, Kid Abelha,
Barão Vermelho, entre outros.
O festival teve outras edições,
no Mineirinho e no Independência, mas coube ao Mineirão ter a
honra de receber o primeiro.
Pronto! Não tinha mais jeito, a
porta foi aberta. Ou melhor, escancarada. Agora estava provado que o Mineirão poderia, sim,
receber eventos de grande porte.
O festival voltou a ocorrer no
estádio em 2001 (Ira!, Nenhum
de Nós, Live e Soul Asylum, e
outros), em 2002 (Engenheiros
do Hawaii, Sepultura e Skank,
e outros), em 2005 (Pato Fu,
Skank, O Rappa, Capital Inicial,
e outros), em 2006 (New Order,
Black Eyed Peas, Nando Reis, e
outros) e em 2007 (Fresno, NX
Zero, Biquini Cavadão, e outros).
Mas não só o pop-rock tinha espaço. De 2005 a 2010, e depois
em 2013, foi a vez de o axé invadir o estádio, e por lá passaram grandes nomes do estilo.
Em 2006, os mexicanos do RBD
levaram cerca de 17 mil pessoas, a maioria delas adolescentes,
à loucura. Outro grande nome a
lotar o estádio foi o Skank. Os
mineiros gravaram um dvd no
local, no último evento antes da
reforma. Segundo os próprios
músicos, este foi o ponto alto
da carreira da banda. “A realização de um sonho”, revelou o
tecladista Henrique Portugal. A
banda ainda utilizou, como pano
de fundo do clipe de sua música É uma partida de futebol, um
clássico entre Atlético e Cruzeiro (1 a 1), realizado no estádio,
em 16 de março de 1997. Ainda
no rol de nomes internacionais,
passaram pelo estádio grandes
cantores, três deles em 2013. Em
março, quem bateu ponto foi sir
Elton John, que emocionou um
estádio lotado. Dois meses depois, ninguém menos que Paul
McCartney veio falar uai, encantando a todos com os clássicos dos Beatles e mostrando sua
simpatia característica. E em setembro, coube a Beyoncé lotar o
Gigante.
Mas a entrada do Mineirão na
lista de locais para grandes
nomes trouxe, na esteira, outro grande espaço para shows.
Pela esplanada do estádio, do
lado de fora, já estiveram nomes mundialmente concorridos.
O primeiro deles, em 2013, foi
o Black Sabbath, que com sua
formação quase original (só não
veio o baterista Bill Ward), mostrou estar em plena forma. No
ano seguinte ocorreu o festival
Planeta Brasil, que teve como
grande atração o Guns N’Roses.
Ainda em 2014, o festival Circuito Banco do Brasil contou
com apresentações de Linkin
Park, Panic! At The Disco, Titãs e Nação Zumbi. Em 2015,
foi a vez de Dave Grohl e o Foo
Fighters encherem o local. Ainda no mesmo ano, quem tomou
conta da esplanada foram os
sertanejos, com César Menotti e
Fabiano e outros fazendo a festa
dos amantes do estilo.
Como já está confirmada a apresentação dos norte-americanos
do Pearl Jam dentro do estádio,
em 20 de novembro, ao que parece os bons ventos continuam
soprando para os lados mineiros, quando o assunto é música.
23
TROPEIRO E MINEIRÃO:
BODAS DE OURO
Dizem que ir ao Mineirão e não
comer o tropeiro é o mesmo que
ir à Bahia e não comer acarajé.
O prato, da tradição mineira, ganhou destaque na gastronomia dos
campos de futebol do Brasil. Não
existe um torcedor que vai ao Mineirão que não provou da tentação. O prato faz parte do cardápio
do Estádio quase no mesmo período de sua existência. Ao longo dos
anos ele foi melhorado, ganhando
status culinário e modernizado na
forma de servi-lo.
Ainda na década de 60, o tropeirão era servido em pratinhos de
papelão, sem acompanhamento.
Era o feijão com farinha e seus
apetrechos. Que o diga Fernando
Luiz da Silva, o Fernandão (foto),
24
que ajudava o pai, seu Agrícola
Rocha, um dos permissionários
de bares do estádio. “O Mineirão
chegou a ter 68 bares funcionando
em dia de jogos. Eu transportava
o gelo. Buscava longe e trazia no
carrinho. O tropeiro, criado por
Luiz Molinari, era servido como
em aniversário, no pratinho de papelão e com aqueles garfinhos de
plástico. Era só o feijão mesmo. A
saída já era grande.”
Com o passar do tempo, Fernandão ganhou do pai a missão de tornar conta de dois bares na geral.
Aqueles que davam área para o
fosso. Fernandão introduziu outro
item no seu cardápio: o pão com
salame. “Em dias de jogos, a gente
vendia 1.800 sanduíches. Era uma
coisa simples e prática. Torcedor
da geral queria cerveja e pão com
salame. E saía satisfeito”.
Mas o tropeiro ainda era o carro
chefe dos bares. Foi ganhando
acompanhamentos. Primeiro o arroz, depois os chamados tropicos:
linguiça, pernil, a couve ... e por
fim o ovo, que deixou de ser feito
junto com o feijão e passou a ser
servido solto. Ganhou até apelido
dos torcedores: zoiudo. O prato
também cresceu, passou do pratinho de papelão para um verdadeiro marmitex.
A família de Eliane Assis dirigiu
o famoso Bar 13 por muitos anos
e introduziu o molho de tomate ao
tropeiro. “A gente achava o prato muito seco. Meu pai fazia um
molho de cachorro quente muito
gostoso e decidimos coloca-lo sobre a couve crua. Também resolvemos servir o ovo separado, para
dar opção ao cliente. Parece que
deu certo”, afirma aos risos.
O Bar 13 também servia os funcionários do Mineirão. Pela sua
localização, começava a trabalhar
mais cedo para atender o quadro
móvel, policiais e profissionais de
imprensa, o que ajudou muito a
divulgar a atração.
Hoje a gastronomia do Mineirão
ganhou outros ares, mas mantém
o sabor de 40, 50 anos atrás. Treze
dos 58 bares existentes no estádio
servem o tropeiro, todos em marmita de isopor. Na reabertura do
Mineirão para a Copa do Mundo
de 2014, os debates em torno do
menu foram muitos, com apenas
um consenso: o tropeiro.
Sônia Maria da Costa administra cinco bates no Setor Amarelo, com mais de 60 funcionários.
Antes da reforma, trabalhou por
25 anos no Mineirão e afirma que
não existe tropeiro melhor do que
o servido no estádio em dias de
jogos.
Quem comanda o bar da imprensa
é a Dona Marlene, esposa do Fernandão. É lá que a crônica esportiva se reúne para a maior resenha
do Brasil.
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RESENHA SABOROSA
Quem vem de fora delira.
Muitos levam o tropeirão
para casa, pra atender encomendas ou pro almoço do dia
seguinte.
Certa feita, uma empresa fez
sua festa de fim de ano na área
do Mineirinho. Como atração, contratou alguns permis-
26
sionários de bar que cuidaram
do buffet da festa. O prato
principal: tropeiro servido à
moda do Mineirão, inclusive
a embalagem. Sucesso total!
Por muitos anos, o tropeirão
e diversas outras guloseimas
foram servidas nas barracas
no entorno do estádio. Uma
verdadeira feira de alimentação, com espetinhos, sanduíches, tortas, tropeiro, pipoca,
milho verde e os acompanhamentos líquidos. Há um
sinal verde da Prefeitura em
andamento para o retorno dos
ambulantes. Pra dar água na
boca do torcedor.
27
MINEIRINHO, DO SONHO À REALIDADE
Ivan Drummond
Era o ao de 1965. Um menino
acompanha seu pai, jornalista,
na inauguração do Mineirão. Era
o dia 5 de setembro. Mas a partir
daquele dia, uma ideia parecia tomar conta de um grupo, de seu pai
e os amigos deste. “Ainda falta
alguma coisa. Além do estádio de
futebol, temos de ter um ginásio
para que nossas equipes de futebol de salão, vôlei e basquete, fortes no cenário nacional, possam
ganhar ainda mais força, possam
evoluir ainda mais”. Esse era, na
maneira de pensar do menino, o
que os mais velhos queriam dizer.
E ele tinha apenas sete anos.
Pois o sonho do menino não era
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só a partir daquele momento.
Desde a idealização do Mineirão,
que a construção de um Palácio,
dos Esportes, era motivo de luta.
Leis estaduais, de 12 de agosto de
1959, 27 de novembro de 1962,
dois de julho de 1964 e 8 de julho
de 1965, estabeleciam conceitos
jurídicos para a criação de um ginásio poliesportivo.
Seria um espaço em que o Viajantes (hoje Recreativo), Olympico,
Atlético, Itacolomi, nossas potências no futebol de salão, com
craques como Dawson, Mosquito, Spencer, Hervê, Beto Bom
de Bola, Piau, Minhoca, dentre
tantos outros, pudessem desfilar
a sua arte no esporte da bola pesada. Ou Marta Miraglia, Eliane,
Juraci Raso, Lia de Freitas, Leonésia, Elói, Luiz Eymard, Mário
Marcos, Sérgio Bruno, Fernando
Pavan, pudessem cravar suas bolas na quadra adversária. E ainda
no basquete, Ísio Dufles, Edu, Coqueiro, Zé Ernesto, João Marcos,
Rubinho, Luiz Carlos Drummond,
Chicão, Ravengar, do Ginástico, Israeli Blas, Betinho, Marcos
Renato, José Amado, Armando
Galizzi, Kouros Monadjemi, do
Minas. Nenhum deles tinha um
espaço à altura de sua categoria.
O menino crescia e, em 1974, vê
o Ginásio, tão sonhado, começar
DE GERAÇÃO A GERAÇÃO
a se tornar realidade. O trabalho é
lento, até que Afonso Celso Raso
assume a presidência da Ademg.
Ele era um daqueles sonhadores,
que em 1965 queriam a construção do espaço para o esporte especializado mineiro. Ainda em
sua gestão à frente do órgão, o
poliesportivo se torna realidade,
em 1979. E na inauguração, uma
homenagem a um daqueles que
lutaram pelo ginásio: o pai daquele menino. Uma lei projetada pelo
então deputado estadual Ademir
Lucas, do MBD, propõe que o
ginásio leve o nome do cronista
esportivo, do jornalista e cronis-
ta esportivo: Felipe Drummond.
Pois essa lei é aprovada e entra
para a história como única unanimidade na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
Pois o menino cresceu. Jogou futebol de salão algumas vezes naquele espaço. Chegou a marcar
um gol. Saiu doido, comemorando sem parar o feito. E ele se torna
jornalista. E lá, vê o esporte mineiro e brasileiro avançar. Nesse
espaço, Minas Gerais e Belo Horizonte entram no cenário esportivo mundial, fora o futebol.
São três recordes mundiais. Dois
deles, no vôlei. O primeiro, em
1994, Quando o Brasil derrotou a
China por 3 a 0, pelas quartas-de-final do Campeonato Mundial feminino. Eram 26.500 torcedores.
No ano seguinte, no masculino,
pela Liga Mundial, o Brasil perderia para a Itália, 3 a 2, diante de
26 mil. E, 1999, a vez do recorde
mundial no futsal, quando o Atlético conquistou o título brasileiro
(Liga Nacional de Futsal), pela
segunda vez, com 26.657 fanáticos nas arquibancadas. E tudo
isso, com aquele mesmo menino, já grande, trabalhando como
cronista esportivo, no espaço que
leva o nome de seu pai.
29
O DONO DA BOLA
Aquele cronista esportivo que começou a usar essa expressão para se referir a
quem de fato manda num time foi sábio. Afinal, por mais importante que seja o
atleta, o técnico, a torcida ou até mesmo o árbitro em um jogo de futebol, somente uma personagem tem a atenção plena das pessoas: a bola.
O time de craques da AMCE: Luiz Carlos Alves, Orlando José, Vilibaldo Alves, Martins, Warley, Romeu
Araújo e o campeão brasileiro de seleções, Amaury Horta. Agachados: Ronan Ramos, Carlyle, Afonso Celso
Raso, Aloísio Martins, Erasmo Angelo e o dono da bola,Tarcisio Cruz.
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DE TRIVELA
Ela é a protagonista! Sem ela não
tem jogo. Se bem tratada, retribui
com mansidão. Caso contrário,
bate no agressor sem piedade.
Redondinha, bonitinha, rechonchuda... maravilhosa essa bola. É
para ela que olhamos, é com ela
dentro do gol que nós sonhamos.
Ser o dono da bola, na pelada ou
na final de Copa, significa ser “o
cara”. Os tempos podem ter mudado, o futebol pode ter evoluído,
mas uma coisa nunca vai mudar:
todos querem ser o dono da bola.
A bola rolando macia na grama
do Mineirão é uma imagem que
muitos já viram. Porém, ela se
torna especial para a família de
Tarcísio Rodrigues Cruz, um dos
mais renomados fabricantes de
bolas do Brasil.
Nascido e criado em Belo Horizonte, o patriarca Tarcísio sempre
foi ligado ao futebol. “Sou um
apaixonado pelo esporte. Joguei
muitos anos nos campos de várzea de BH. Numa dessas, eu e um
colega tivemos a ideia de começar a fazer nossas próprias bolas”.
O Mineirão estava recém inaugurado e a concorrência local era
pequena. Nos fundos de uma casa
no bairro Padre Eustáquio nascia
a lendária bola Equipe, que por
muitos anos fizeram a alegria do
mundo do futebol no Mineirão e
muitos outros estádios, profissio-
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nais e amadores.
Como todo começo, as dificuldades eram muitas. Tarcísio lembra
que as bolas eram fabricadas de
couro natural, sem nenhuma tecnologia. “Não havia preocupação
quanto a bola encharcar ou aumentar de tamanho. Era uma bola
muito dura. Em tempos de chuva
era quase impossível terminar
uma partida pelo tanto que retia
água e aumentava de peso. Uma
bola, nessas condições, chegava a
ter 300 gramas a mais no peso”.
O fabricante de bolas conta que
sua produção ganhou mercado
“Anteriormente eram
bolas costuradas à mão.
Hoje o processo mais usado é o de fusão a quente,
com materiais externos
de ponta e com camadas
que deixam a bola muito
mais macia”
rapidamente, devido ao relacionamento direto com os clientes.
“Fizemos contrato com a Federação Mineira de Futebol e nossa
bola passou a ser a mais usada no
Mineirão, tanto em competições
nacionais quanto internacionais.
A primeira vez foi num domingo
de clássico entre Atlético e Amé-
rica, pelo Campeonato Mineiro,
em 1971. Na Libertadores de
1976 o Cruzeiro venceu aqui jogando com a nossa bola, feita em
Belo Horizonte”.
A família de Tarcísio atualmente fabrica as bolas Trivella, com
grande rotatividade em Minas e
no Brasil. Para o filho Tarcisinho,
chegar em qualquer campo ou
estádio e ver a Trivella rolando e
fazendo a alegria de todos é sua
maior satisfação. “Bola, pra nós,
é saúde, alegria, família, paixão.
Cresci vendo e ajudando meus
pais nesse negócio e pude acompanhar a evolução das bolas de
futebol. Mudou muito. É praticamente outro produto, mas com a
mesma essência”.
Segundo ele, a maior evolução
está no processo de montagem.
“Anteriormente eram bolas costuradas à mão. Hoje o processo
mais usado é o de fusão a quente,
com materiais externos de ponta
e com camadas que deixam a bola
muito mais macia”.
Nesse processo de fabricação as
bolas ficam perfeitas em qualquer
condição climática, são 100%
impermeáveis. “Nossa empresa
e outras no mercado já realizam
testes em bolas com chip e GPS.
Quem sabe, num futuro próximo,
tenhamos bolas que possam ajudar o esporte”.
mude sua vida!
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TODOS OS CAMINHOS LEVAM AO ESTÁDIO
A distância e o deslocamento sempre foram peculiaridades do futebol no continente Brasil. Até no
futebol amador tem viagem mais longa e complicada que na Liga dos Campeões. Imagina fazer isso
uma, duas, três, até quatro vezes por semana, o calendário inteiro, por mais de 30 anos seguidos!
Pois essa é a realidade de vários profissionais da
imprensa do nosso interior mineiro, em todos os
seus módulos. Eles rasgam o estado escoltando as
delegações para verdadeiras epopeias pelos rincões
da bola. Que o diga a turma da Rádio Teófilo Otoni,
distante 450 km de Belo Horizonte, uma das mais
longevas e pioneiras.
Atualmente, cerca de 12 emissoras do interior mineiro cobrem religiosamente os jogos de Atlético
e Cruzeiro em BH. A mais antiga delas trabalhando e viajando ininterruptamente é a Rádio Itabira.
Quem comanda o esporte na emissora é o cronista
Luiz Linhares. “Comecei como comentarista na
Rádio Itabira em 1986. Também fui repórter e há
muitos anos me fixei como narrador. Ano que vem
completo 30 anos de estrada, literalmente”.
Linhares lembra que as viagens sempre fizeram
parte do trabalho no departamento de Esportes da
emissora, devido à participação ativa do Valério
nos campeonatos mineiros. “Além do Valério, cobrimos todos os jogos de Cruzeiro e Atlético, ao
vivo, em BH. A Rádio Itabira é a única do interior
do estado a se manter presente nestes jogos por tal
período de forma constante”.
VIAGEM – Para o cronista, qualquer viagem sempre será cansativa, desgastante e ao mesmo tempo
prazerosa. “São outras praças, muitas vezes com
uma cultura nova e coisas diferentes para conhecer
e aprender. Sempre busco planeja-las de maneira
a contribuir com o trabalho a ser feito e um bom
período de descanso. O fato do Mineirão ficar a
pouco mais de 100 quilômetros facilita o deslocamento. Perigos fazem parte do dia a dia”.
34
Sobre a família e os finais de semana ocupados, Luiz
Linhares encara com naturalidade. “Tenho quase 28
anos de casado e 30 de rádio. Quando o relacionamento com minha esposa começou eu já encontrava cobria
futebol pelo rádio.Há compreensão e, em cada ação
uma reação. O radialista esportivo é como um garçom,
um cantor, profissões que se fazem ao lazer do outro.
Conversando, a gente combina bem”.
VOZ INTERIOR
O que faz Linhares e essa turma do interior de Minas
continuar viajando e cobrindo os jogos no Mineirão é
o prazer, o gostar do que faz. Para ele é uma grande satisfação estar presente em grandes jogos e ver de perto
as transformações do futebol e seu grande palco em
Minas. “Inegavelmente, o Mineirão tornou-se uma super arena multiuso, uma casa de espetáculo sem igual.
Nós, profissionais de imprensa, já tivemos condições
melhores de trabalho, mas vamos nos adaptando e buscando nosso espaço. A turma do interior vem ganhando mais voz, temos ótimos profissionais surgindo, galgando seu espaço, se fazendo ouvir. Com mais união
e iguais condições oferecidas pelas arenas, as coisas
poderão andar mais rápido e melhor”.
Para o cronista de Itabira fica difícil enumerar lembranças marcantes ao longo deste período de vários jogos
fantásticos e conquistas maiúsculas. “Para o bem do
novo Mineirão, espero urgentemente que mais e mais
conquistas apareçam, para apagar um pouco a memória do 7 a 1”.
35
O MOMENTO MÁGICO
A fotografia é um momento mágico. Assim como o rádio, carrega
consigo a imaginação. Detalha
um instante único de um movimento de sincronia entre os atores
e o observador, no caso, o fotógrafo.
O futebol sempre foi uma mina
abundante de recursos para imagens históricas, engraçadas, polêmicas, emocionantes. Ainda que
os vídeos e animações tenham
chegado para ficar, a fotografia
ainda é marca registrada do mundo da bola.
Aos 77 anos e em pela atividade,
60 deles dedicados à arte de fotografar, quem mais viveu esse
ambiente em Minas e no Brasil é
Heleno Gouveia de Mesquita. Frequentador assíduo dos estádios,
Heleno recorda os primeiros flashs
do Gigante de Pampulha.
“Usávamos máquinas Rolleicord,
de poucos recursos, com filmes de
12 fotos. Tínhamos que entregar
oito ao jornal. Mas no corte perdíamos as quatro restantes. No esporte a gente fazia uns dez filmes
seguidos e aí não perdia nada. Não
tinha zoom e as fotos eram melhores que as de hoje. Tínhamos mais
ângulo, porque entrávamos em
campo”.
Os jornais impressos tinham grande penetração popular e as fotos
eram disputadíssimas. Heleno
trabalhou em diversos deles; e
foi pelo Diário de Minas que fotografou a inauguração do Mineirão. “Trabalhava na seção Social
e cobri a inauguração. Comprei
o ingresso para guardar e o tenho
até hoje. Trabalhei antes do jogo e
assisti à partida da arquibancada.
Tirei muitas fotos do público, da
chegada ao estádio, das arquibancadas cheias. Fiz fotos da arquibancada inteira em blocos. Como
se fosse um lego. Ficou espetacular”.
O fotógrafo revela que o relacionamento com os protagonistas do
jogo é amistoso, apesar de algumas divergências. “Tem jogador
que não entende o processo. Eu
ganho algum dinheiro, porque
vivo disso, mas o atleta ganha
prestígio, ganha a eternidade no
coração e na imagem do torcedor.
Alguns reclamam, mas a maioria é
gente boa”.
A modernidade popularizou a produção de imagens e o profissional
sabe disso. “Hoje qualquer celular
tira foto. Todo mundo é fotógrafo
de plantão. Mas o que vai definir
a grande foto é a paciência e a
precisão. Por isso ainda trabalho
com o foco manual. É igual bang
bang. Tem que saber a hora certa
de apertar o gatilho”, explica
GALO NA VEIA
Na visão de Heleno Mesquita, o
jogo de inauguração do Mineirão
foi mais uma festa do que uma
grande euforia. “Não foi aquela
empolgação típica do futebol. O
bicho pegou mesmo quando surgiu a rivalidade do Atlético com
o Cruzeiro. Já no primeiro clássico teve o caso do pênalti marcado
36
O PRIMEIRO BANDEIRÃO
pelo Juan de La Passion Artez e
depois a expulsão do time inteiro
do Galo. Eu estava dentro do campo. A gente entrava no gramado a
toda hora. Numa dessa então, dava
até palpite (risos). A partir desse
clássico começou a rivalidade e o
Mineirão ganhava sua alma de gigante”.
E foi trabalhando para o Clube
Atlético Mineiro que Heleno se
realizou. “Fui diretor do acervo
fotográfico e fotógrafo oficial por
mais de 40 anos. Sou uma enciclopédia viva do clube. Em 1965
passei uma semana picando papel
preto e branco para um clássico.
Arranjei papel preto nas lojas de
fotografia. Também foi minha a
primeira bandeira usada nas arquibancadas do Mineirão. Tinha seis
metros de comprimento e foi autografada pelos jogadores da época. Na frente branca era um galo
pisando do Mineirão, escrito O
Rei do Terreiro. O verso era preto,
com o escudo do Galo e os dizeres: O Mais Querido. O bambu foi
presente do Monsenhor Juvenal e
era uma forquilha usada em andor
nas procissões religiosas. A estreia
do bandeirão e o papel picado foram no mesmo jogo. Uma festa
inesquecível. Quase perfeita, não
fosse o placar: Cruzeiro 4 a 1”.
Fotos de brigas, uma senhora ajudando uma criança a fazer xixi,
gols, frangos, quedas, duelos, teve
de tudo. Tombos de todo jeito
correndo atrás do melhor ângulo.
Consta até uma queda no fosso.
“Tirei uma foto do goleiro Carlos
fazendo uma defesa, uma ponte.
Atrás, no antigo placar eletrônico,
estava o nome dele, bem nítido.
Ele ficou doido. Mandou fazer um
pôster enorme. Coisa que só a fotografia oferece”.
XARÁ DE FREITAS – Heleno é
natural de Juiz de Fora e torcedor
do Vasco na adolescência. Foi inúmeras vezes ao Maracanã. “Vi três
jogos da Copa de 50, inclusive a
final. Ia a São Paulo com frequência ver os grandes jogos. E aqui no
Mineirão não foi diferente”.
E tem grandes lembranças de um
xará muito famoso. “Minha família é de São João Nepomuceno,
terra do Heleno de Freitas. Sou
afilhado de batismo da Dona Miquinha, mãe dele, que era nossa
vizinha. Eu ia para o Rio carregar
jornal para o Heleno de Freitas,
que não gostava de sujar as mãos
com o papel. Era vaidoso mesmo,
namorador; e jogava muito. Estava
ao lado dele, num restaurante em
Copacabana, quando um patrocinador do Botafogo chegou com
uma moto Haley Daividson, novinha, para o Heleno de Freitas. Ele
me disse pra eu subir na garupa
e dar uma volta com ele. Subi na
hora. Ele ligou a moto e arrancou
com tudo... e eu sobrei no chão.
Pena que ninguém fotografou”.
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