A morte da pitonisa.
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A morte da pitonisa.
, Quarta-Feira 17 de Março de 1993 Ano 4 nQ 1107 Diário 130$00 (Continente) 150$00 (Madeira) 160$00 (Açores) IVA incluido Director Vicente Jorge Silva Director-adjunto Jorge Wemans Rua Amílcar Cabral L1.1 . 1700 LISBOA Rua N. S. de Fálíma. 177-1. 4000 PORTO Apple Computer edição LISBOA Da Argélia ao Egipto Fundamentalisías sobem a parada Em Arge~ os islamistas subiram os seus alvos: disparam agora sohre ministros. De manhã foi abatido oex-ministro do Ensino Superior e, à tarde, ferido oministro do Trabalho. Também no Egipto se intensifica a violência. Num novo atentado "contra o turismo", os fundamentalistas fizeram explodir uma homba jlmto ao museu onde estão as reliquias de Tutankamon. p, 11/1'2 e 44 França • • Iro sa' Retrato de Balladur, virtual primeiro-ministro Dentro de poucas semanas a direita reocupará o poder em França e Edouard Bailadur surge como o"primeiro-ministro favorito" dos franceses e, ao que se diz, do próprio Presidente Mitterrand. Não promete milagres nem quer virar tudo de pernas para o ar. Prefere os factos às tiradas ideológicas, o realis,!!o à "grandeza da França". Eo mais hritânico dos politicos gauleses. Aenviada do PUBUCO fez o seu retrato num comicio em Paris. p. 8. Suspeita de fraude em escola profissional Responsável da Infortec denuncia desvio de fundos Uma das "pérolas" das escolas de formação profissional do Norte, aInfortec, visitada por ministros e apontada como exemplo de funcionamento, está soh suspeita. Um dos seus responsáveis denuociou odesvio de muitos milhares de contos dos fuodos comunitários. APolicia Judiciária esteve lá ontem eapreendeu acontabilidade e processos de aluoos. A direcção nega tudo. OGETAP,,,,ridadefiscalizadora,desconhece. p. 20/21 Caso do padre Frederico Bispo do Funchal pede compaixão ohispo do Fuochal, Teodoro Faria,qualificou ontem a história do padre Frederico Cunha, oseu ex-secretário condenado a 13 anos de prisão por homossexualidade com menor e homicídio, um "caso doloroso" que "feriu profundamente o povo cristáo" da Madeira. Embora quehrando osilêncio aque se remetera após ojulgamento, obispo evita qualquer comentário à sentença. E, se lembra que há castigo para ocrime quefoi impu- . tado ao sacerdote, sublinha também que, "apesar da condenação de tais delitos", as pessoas "devem ser acolhidas com respeito ecompaixão". p. 16 Em 'Milão . FC .JogaPorto , prestIgIo e dinheiro p.30 Em Turim .... .... .... -r----------------------------------~~~~ Benfica defronta Juventus em crise p.31 Negócio & BCI Está na hora da sua empresa crescer. ~BCI S",nco d~ CDtn.,f;,D • Indu.,,,.. _.- .- 2 destaque aUARTA-FEIAA. 17 MARço 1993 DESTAQUE A alma jovem censurada PfDAO tUNIIA Toreaio Sepúlue<ÚL Aescritora Natália Correia nwrreu ontem. Cultivou todos os géneros üterários, poesia, romance, teatro, ensaio. Foi deputada àAssembleia da República. Em todas as actividades pôs umafogosidade muito dela, excessiva e apaixonada. Quis transformar Portugal numa Mátriafeiticeira. Não o conseguiu, não a deixaram: "Por isso a nossa dimensão INão é a vida. Nem é a nwrte", revoúava:se no poema "Queixa das almas jovens censuradas", que José Mário Branco popularizou em canção. Natália Correia na sua casa em Lisboa: 8 vontade de mudar Portugal pela prosa. pela poesia e pela intervenção política oi uma das mulheres mais bonitas que Lisboa viu. -Mas a romancista, poetisa e ensaísta Natália Correia revoltava-se com o elogio: "Eu não era bonita, erainteligente, sou inteligente. E a inteligência vê-se na cara, vê-se no corpo." Natália de Oliveira Correia nasceu em 13 de Setembro de 1923, na Fajã de Baixo, ilha de S. Miguel, Açores. Filha de uma casal da média burguesia rural - a mãe era professora e o pai foi rico, mas arruinou-se ue fez·se aventureiro" -, veio ainda criança para Lisboa onde frequentou o liceu. Morreu ontem de enfisema pulmonar, complicado por problema cardíaco. Natália Correia ainda ontem à noite estivera no bar Botequim, em Lisboa, congratulando-se por as análises clínicas não haverem detectado a tuberculose que temia Mas às 5hOO da madrugada sentiu-se mal, tossiu muito, expeliu sangue e sob~ veio o ataque de coração. As 7hOO morreu. O corpo está desde ontem em câmara ardente na Casa dos Açores, de onde amanhá, às llh30, parte o funeral para o cemitério lisboeta do Alto de S. João, onde - por vontade expressa da escritora - será cremado. A Cámara Municipal de Ponta Delgada tinha prevista uma homenagem a Natália Correia, a 27 deste mês, durante uma Semana Cultural. A homenagem incluia um recital de p0esia no Teatro Micaelense, na presença da poetisa, que formalisaris então a entrega da sua biblioteca à Junta de Freguesia da Fajã de Baixo, localidade onde nascera Àprocura da Mátria Natália Correia, que muito cedo se evidenciou oomo uma das personalidades mais fortes do meio literário lisboeta - estreou-se em 1945 na ficçáo com "As Grandes Aventuras de um Pequeno Herói", a que se seguiu, em l!i46, o romance "Anoiteceu no Bairro" e, em 47, "Rio de Nuvens" (poesia) nunca se libertou da insularidade das suas raízes, insularidade que lhe marcou muito a obra Não por acaso, ecoam na sua poesia os tons trágicos de Antero, outro açoriano: "No Inverno tomando a caveira da vida, / lnterroga-a e o sossego aprende da descida / Sabiamente à lareira, esperando pela morte, / Ao so- Botequim Aúltima tertúlia HÁ SEMANAS, no Botequim, pela madrugada, um amigo de Natália Correia, poeta e escritor como ela, pegou-lhe na mão direita, viu· lhe a linha da vida e disse: "Vai acontecer-lhe algo de muito grave." "Vou morrer?", perguntou ela. Ele hesitou: "Vai deixar de escrever." "Então vou morrer! 'SÓ espero que me proporcionem condições, já que não tenho bens materiais, para ir morrer em paz .n a minha ilha." Nebuloso, o destino cercava-a nos últimos tempos de sombras e inquietações. A literatura, a arte, a solidariedade, a utopia, o oonvívio, coisas em que acreditava e porque sempre se bateu, s0friam revezes sucessivos dos tecnocratas da política e da cultura, dos colunistas da moda e da arrogância. Alguns ridicularizavam-na, enxovalhavam-na nos jornais depois de a terem, quando de pas- turno barqueiro compras melhor transporte", escrevia em 1985, no poema "As Estações". incluído no livro "Armisticio". À soturnidade anteriana juntou a preocupação filosófica do seu patricio oitocentista C0mo Antero, Natália quis mudar Portugal E, como ele, não sabia como fazê-lo. Apátria, queconsiderava decadente - não propriamente pelas mesmas razões de Antero -, causava-lhe revoltamastambémamor.Paraasalvar e para salvar os portugueses quis fazer dela mulher, a "Mãtria" (poesia - 1968): porque "cada mulher é uma cascata de trevos". Natália, que não tinha filhos; que defendia a "neoossária satanização da criança", em "Uma Estátua para Herodes" (1974); que punha uma personagem da peça de tea1ro "O Homúnculo" (1964)adizer: "Quan- do um filho não tira a vida ao pai. amolece-lhe o coração"; Natália Correia quis uma mãe para os portugueses. Porque "o pai faz da crianÇa o seu cavalo de Tróia para invadir o futuro e sobre ele exerce os seus direitDs", C'Uma EstátuaparaHerodes"). Romantismo e surreafumo Por fim,já nem a Mãtria lhe parecia suficientemente libertária, nem suficientemente igualitária No romance "As Núpcias" (1992),elogiao incesto como relação alquimica de que nascerá a Frátria O hermetismo e o es0terismo haviam-se tornado desde muito cedo constantes da obra da autora Em 1957, na in1rodução ao JlO!lma dramático "O Progressode Edipo" -com que iniciou a sua produção teatxal- escreve: "Há qua1ro letras, cada uma de- sagem pelo Governo, censurado e banido. lndomável, ela reagia-lhes, porém. "Não, não me mato. / Antes me zango até ficar um cacto, / Quem me tocar, maldito / Que se pique." O Botequim, bar que abriu para o seu primeiro marido (hoje propriedade de um pequeno grupo de amigos) fez-se o seu campo de batalha e subversão, de partilha e dádiva, lugar pagão onde circulava como uma grande deusa, uma grande profetisa - que o era porque grande poetisa. Do Botequim, todas as noites esconjurava os mafarricos sitiadores rindo alto, cantando alto, declamando alto, invectivando alto - a sua energia e a sua lnminosidade dissolviam os desãnimos, os medos. "O tempo do ódio está a passar, digo-vos", di· PÚBLICO las guardada por um dragão. Aquele que matar os quatro dragões fol)Il8. o Tetragrama e chama-se Edipo. Nele se unem as duas naturezas, divina e humana (. ..)" O tom de Natális vai-se aproximando cada vez mais do dos surrealistas. Este texto sobre Édipo poderia ser, aliás, subscrito por Antrinio Maria Lisboa ou até por André Breton. Breton que Natális defendejánoano seguinte, no ensaio "Poesia de Arte e Realismo Poético", quando explica a imagem surrealista: "'Um galináreo com uma estrela no bico' é um absurdo. Mas 'um anjo oom uma estrela na fronte' é uma fácil relação de coerência" Natália Correia chegou ao surrealismo, como Antero chegaraaoseumuitopeculiarreslismo: levando até às últimas consequências a revolução romântica: "Oulíriosouoluar./Eeuque zia, "os valores da eapiritualidade, do sagrado, dos sentimentos, da alegrià vão regressar, digo-vos" dizia Mantada no tempo, anunciava oom décadas de antecedência o suceder dos aoont.ecimentos, a queda do Muro de Berlim, a liberdade em Portugal, o regresso da escrita e do sagrado, a descrucificação, o fim das religiões monoteístas - "Armistício" lhe chamou, em livro que pouoos entenderiam. "Os homens só serão unidos quando crerem em todos os deuses", repetia. "Mais importante do que eles existirem é acreditarmos neles." Política (tantos golpes e contragolpes cresceram, foram abatidos nas mesas do Bote· quim!l, paixões (dele telefonou a Snu Abocas- QUARTA-FEIRA. 17 3 MARÇO 1993 Pacheco, Natália criou wna espécie de heterónimo surrealista, Delfim da Costa, que durante um tempo serviu de assinatura a panfletos violentíssimos contra meia Lisboa literária Delfim da Costa é tão devedor do insulto surrealista como do escárnio e mal-dizermedievais. Estamos perante wna obra diversificada, torrencial, por vezes desequilibrada, como a autora que lhe deu vida Para além dos livros citados escreveu ainda, entre outras: Poesia - "Poemas" (1955), "Dimensão Enoontrada" (1958), "C0municação" (1959), "Cântico do País Emerso" (1961), "O Vrnho e a Lira" (1966), "As Maçãs da Orestes" (1970), "A Mosca numinada" (1972), "O Anjo do Ocidente à Entrada do Ferro" (1973), "Poemas a Rebate" (1975), "Epístola aos lamitas" (1976), "O Dilúvio e a Pomba" (1979) e "O Armistício" (1985); Ficção - "A Madona" e a "nha de Circe (1983); Teatro- "OEnooberto(1969), "Erros Meus, Má fortuna, Amor ardente" (1981) e "A Pécora" (1983, escrita em ~~q";~ 1967, mascuja publicação o regime salazarista proibiu); Investigação e antologias - "A Questão académica de 1907" (1962), "Antologiada PoesiaEróticae Satirica" (1966), "Cantares Galeg<>-POrtugue5eS" (1970), "AMulher" (1973), "OSurrealismo na Poesia Portuguesa" (1973), "Antologia da Poesia portuguesa no Periodo Barrooo" (1982) e "A llha de Sam Nunca" (1982). A maior parte das obras disporúveis apresentam as chancelas das editoras Dom Quixote e O Jornal Foi directora da revista fico no meio? /Trago esse poço de "VIda Mundial" e o antigo Presiar I Como um aborto no seio." dente daRepública, Ramalho Ea("Passaporte", 1958). E juntan- nes condecorou-a DOm o grande do-lhe wna pessoalissima pro- oficialato da Ordem de Santiago pensão para o barroco: "Dizendo deEspada. 'templus' direis 'tempus'. PorEstá prevista para o próxique achando-se o templo no cen- mo dia 30 wna homenagem a tro do mundo que é o urnhigo da Natália Correia, durante a qual deusa, raiz da vida, cordão que li- será lançada, pelo Círculo de ga o homem à nascenre divina, Leitores, a edição agora póstunão só santifica o Cosmosoomo o ma da sua obra poética, em dois Tempo. Dali se fita o grande To- volumes, scb o titulo genérico de do." Este trecho de "AsNúpcias" "O Sol nas Noites e o Luar nos lernhra alguns do Padre Antórúo Dias". David Mouráo-Ferreira Vieira RDmantismo, barroquis- será o apresentador e Manuel mo, surrealismo ... Estranho se- Alegre lerá poemas. ria que Natália Correia não tivesse cultivado o fantástico. Mas Apaixão política te-lo, nas noveletas "Onde está o Menino Jesus?", "O Aplaudido O espírito inquieto de NatáDramaturgo Curado pelas Pilu- lia Correia não podia ficar-se peIasPink", "AMenina com a Rosa la intervenção artistica e cultuna Testa" e "Fragmento de um ral, por mais acutilanres que as Perdido Evangelho". suas posições neste campo se Com Manuel de Lima e Luis apresentassem. Não resistiu à sis para lhe apresentar Sá Carneiro), artes (são permanentes as exposições), literatura (regulares os lançamentos), culinária (o melhor rosbife da cidade), concertos, debates, má-lingua, indignações, tornaram o pequeno bar do Largo da Graça uma referência na vida de Lisboa, fizeram dele a última e grande, e louca, e generosa rertúlia do país. I "Não dispense o convívio com as pessoas de espírito, é fundamental para a criação lirerária, para evitar a lireratura desvivenciada, SÓ quando se está muito na vida se pode transmiti-la no acto criador." Presidenres da República e marechais, embaixadores ejuíz,es, escritores e cientistas, revolucionários e visionários, catedráticos e estudan~s, amanres e cartomanres sentavam-se à sua volta destaque participação politica. Anres da revolução do 25 de Abril, esteve ligada às actividades da Oposição Democrática, como era dever de wna insubmissa Instaurada a Espírito irreverente e livre, um pouco anarquista, o que a levou a cirdemocracia, foi deputada pelo cular por vários portidtJs depois do 25 <k Abril, mas continuou sempre PPDiPSD e, a partir de 1987, foi fiel a si própria ea umagrruuk uerdOOepessool. &mpre a mesmaNatáeleita para o Parlamento como lia, amante da lih€rdOOe. Uma grruuk escritoro, muito maior da que se independenre nas liatasdo PRD. pensa. cuja imagem pública de irreverência, às vezes polémica, igrwraua Mas a sua participação na vida aprofundidaik<kcaráclerdapoetisa. • partidária manteve as mesmas motivações do impulse poético. O PPDiPSD foi esoolhido porque admirava Sá Carneiro. Admiravao polítiDO, a sua frontalidade e a sua coragem, mas admiravasoEla esteue, sempre, com a vontade de ficar com os que amava, de rebretudo o amante, que impós a um pais católico e clerical os di- cusar a foce àqueles que nem por isso. Vi-a feroz, algumas vezes, pondo a reitos da paixão. Para Natália <kbandar, <k rabo entre as pel7UlS, a rafeircuia que tenúwa morder-IMOS Correia, Sá Carneiro era o rei D. artelhos. Vi-a dulcíssima, muitas outras, acariciando a cabeça dos que, Pedro do nosso rempo e Snu por tecto, nada mais tinham que um telhadn <k versos. Foi a coragem da voz que nunca, pelo caminho, se perdeu, em seu amor aos amantes e aos Abecassis a reencarnação de pedintes, em seu ódio aos estúpidos eaos burocratas.• Inês de Castro. "Morreram am• escritor bos na flor da paixão, enlaçados num abraço de chamas", escreveu depois do acidenre de Camarate, em "O Jornal". A hererodoxia de Natália Correia levava-a a alhear-se das Com a morte <k NaIólia Correia desaparece uma das vozes mais vidiferenças especificas entre os vas e originais da poesia portuguesa, sob certos aspectos também a mais partidos. Desde que a deixassem incómoda. &ráporenquanto impossível calcular o sulco por da <kimda, dizer o que lhe aperecia no hemi- não sónoscaminhosdapoesiaque semprepercorreuexemplamu!nte, mas ciclo. Foi wna prerrogativa que também nos domínios da prosa, quer de natureza namJtiua quer de cautilizou generosamente, e há rácter reflexivo. eainda no que respeita à suacontinuadaacçãociuica. Foquem diga que a Assembleia da ram 40 anos de amizade fraterna. Era a irmã que eu nunca tive, com República nunca mais foi a mes- quem tive algumas discordâncias, mas com quem nunca me zanguei. A ma depois da sua saída, em sua moneera impensávelpara mim.• • poeta e escritor 1991. Quem não se lembra de wna Natália Correia, repentista e esca.rninha, a estigmatisar o deputado do CDS João Morgado, que defendia, durante a disCostul7UlL<l chanw.r-IM "Senhara da Rosa ", porque luwia nela algo cussão da lei scbre o aborto, em 1982, que "o acto sexual é para de muito antigo, da marquesa deAloma e da feiticeira Cotovia, apersofazer filhos": "Já que o coito- nagem<k um dos seus mais bek!s poemas.lfavia nela algo <k sacerda/idiz Morgado - / rem como fim sa e <k oficiante, no sentUUJ bam e antigo. E essa a imagem que guardo cristalino, / precise e imaculado / <kla, a<kalguémparoquemapoesiaera umaespécie<kdam <kespírito: fazer menina ou menino; I e ca- não ero.por acaso que ela diziaque,paro os subalimentados do sonho, a da vez que o varão / sexual petis- poesiaé para comer. A sua morte abalou-me: eu tinha com ela uma relar co manduca, / temos na procria- ção<k respeilo múluoe<kgrondefrotemidaik.• • poeta ção / prova de que houve trucatruca, / sendo SÓ pai de um rebento, / lógica é a conclusão / de que o viril instrumento 1só usou - parca ração! - wna vez. E se a função / faz o órgão - diz o diConheci-a antes do 25 de Abril e,já nessa altura, fiquei surpreenduro tado -I conswnada essa excep- pela maneiracomo exercia a sua condi.ç&J <k mulMr na sociedade fechar ção,/ficou capado oMorgado." da de então. Era de uma subversão extraordinária. Uma mulher assuEnvolveu-se, noanopassado, mida, sem medo, de quem muitas vezes as pessoas não gostavam por nas movimentações da Frente causa da dureza e da frontalidaik com que <kfendia as suas convicções. Nacional para a Defesa da Cultu- Foi umagrruuk poetisa eescritoro, mas nunroconsegui separá-la daoura, elegendo a politica do secretá- troforçaquebroúwa<kla: a transgressão. • • encenador de "A Pécora". na Comuna rio de Estado da Cultura, SantanaLopes,comoadversáriapriocipai Era já uma mulher aflita, a que faltava a verve, a faisca, o dito demolidor. Santana Lopes, bom principe porwna vez, acabou por Era uma poetisa com uma garra extraordinária, além de ser uma lliedar a pensão que o Estadocosdo panorama cultural português. Foi uma mulMr polituma conceder aos artistas des- personagem mica, combativa, de uma irreverência que foi sempre coerente. Tinha munidos. Mas ísto não ficará para uma personalidaik fortíssima, que se impunha: quanOO faliWa, toda a a História Oreslosim. gente a ouvia. • . A morte chamou Natália * pintora Correia Ela esperava-a: "Uma dor fina que o peito me atravessa, I A escuridão que envolve o pensamento, 1Um não rer para onde ir cheio de pressa, tUm correr para o nada em passe lenUmdos elernentosfundmneniais da minhacarreirafoifeitocom um to... " ("Sonetos Românticos") • dos poemas <k NaIólia: "Queixadas almasjovens censuradas" que eu musiquei no meu primeiro álbum, em 1971. Esta canção tornou-se uma discutindo, bebendo, cantarolando, emocionan- eBpécie<kemblemadaresistência. Erouma mulher<k armas, nunca Mdo-se, irritando-se com ela sirou em dara caropelas causas nobres e muitas vezes foi mal compreenCosta Gomes, Ramalho Eanes, Manuela dida. Umalutodara. Eanes, Otelo, Vasco Lourenço, Vítor Alves, • compositor Maria de Lurdes Pintasilgo, Isabel Soares, José Manuel dos Santos, Cardoso Pires, D. Maria Pia, Antórúo Vitorino de Almeida, Maria João Pires, Eunice Munoz, Lagoa Henriques, Oliveira Marques, Tomás Ribas, João de Melo, Eurico da Costa, Martins Correia, Fernando Era uma mulher que dizia coisas que mais ninguém ousava Tordo, Mello e Castro, Baptista-Bastos, Ma- afirmar. Uma mulher <k gronde independência e <k uma coragem nuel Alegre eram, foram algumas das presen- extrema. Como poUtica, enganou-se várias vezes, o que não lhe retiças na sua tertúlia. ra nada ao seu valor como mulher tanto no campo da cultura, 00· Vai ser difícil, daqui para a frente, imaginar a mo na sua dimensão enquanto ser humano. Não se sei se ckua, mas vida cultural portuguesa sem Natália Correia no neste momento apetece-me recordar como era Natália Correia jo· Borequim. • uem, uma mulher <k uma beleza flsica rara. Mário Soares "V ma grande escntora . " Mário Cláudio* "A coragem da voz" David Mourão Ferreira* "A Senhora da Rosa" João Mota* "Vma personalidade apaixonada" Maluda* ""Quando falava, toda a gente a ouvia" José Mário Branco* ""Vma mulher de armas" Coimbra Martim* ""V ma beIeza f"ISlca rara" Fernando Oacosta PÚBUCO Torcato Sepúlveda Adeusa e os homens NATÁLIACORREIAfoiummereoro que atravessou o oéu negro da cultura portuguesa do século xx. A sua verve, a tirada repentista, a pose - a boquilha, o elogio da noire, a boémia, os amores - fizeram dela um mito. Uma mulher borúta que, com fragor, derruba os portões das tertúlias literárias liaboetas dos anos 40, muito dominadas pelos homens, desencadearia forçosamenre amores e ódios. Anre Natália Correia ninguém ficava indiferente: ou se aceitavam os seus modos cortantes, definitivos, de pitonisa moderna, ou se era atirado para uma periferia na qualreinava, em sua opinião, a ignorânciae aestupidez. Muito desse espírito reba"bativo e insubmissc foi buscá-, Natália Correiaàs amizades SUl realistas dajuventude, mas tam bém às cantigas de escárnio e mal-dizer medievais e ao muito português e camiliano gosto pela polémica Na intimidade, DOmo todos os excessivos, era capaz de ternura, humanidade e até enlevo pelas qualidades inrelectuais e morais dos que a rodeavam. Mas logo vinha o gesto largo, a frase ribombanre, o dito ferino e certeiro. Natália Correiaera umadeusa e, DOmo os deuses, desferia os seus raios irresponsáveis, não rui· dandodejustiças. Porisso seapaixonou por genre que depois desfez a golpes de sarcasmo. Por isso sereconciliavacomgenerosidade. Num Portugal clerical, rural, salazarista, com uma Lisboa mesquinha e provinciana romo capital, Natália Correia tinha que ser olhada DOmo heterodoxa E foi-o. Antes do 25 de Abril, esta açoriana tão doida DOmoAnrero-ecomo ele capaz dos entusiasmos mais solares e das depressões maisnocturnas-chooouqueros mediocresdo Estado Novo quer a oposição estalinista, cujo marenaliamo primário a maçava como wna cartilha mediocre. Por isso se afastou, depois do 25 de Abril, do republicanismo histórico conservador e moralista. Adoptou então Sá Carneiro, cuja paixão por Snu Abecassis lhe prometis um Novo Estado Amoroso. Com amorredeSáCarneiro,adeusaficou só. Oshomensjá não queriam segui-la Os seus reios não feriam. Asubstituição do mito Sá Carneiro pela ilusão Ramalho Eanes demonstra que os deuses também enlouquecem A saída do Parlamento, por causa da derrota do PRD, adenseu as nuvens que sobre ela se abatiam. Natália Correia, que escreveraumlivrocomosignificativo titulo de "Somos Todos Hispanos" (1988), acabou na Frente Nacional para a Defesa da Cultura, rodeada pelos antigos adversários neo-realistas e estalinistas, a defender um penoso nacionalismo cultural .. Os dislates da política cultural cavaquista exigiam a sua critica e a sua ironia Mas ela jánãoeradonadaironiadeoutro-' l"l- Estava triste, amarga e aflita: "E tédio? 1;: depressão? Talvez loucura? / E, para um além de mim, passagem escura? 1Um ir • eurodepulado socialista porirquenãoremoutrolado?" • "A irmã que nunca tive" Manuel Alegre * Comentário