[sp - 1] estado/primeira/páginas 26/09/11

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[sp - 1] estado/primeira/páginas 26/09/11
C6 Cidades/Metrópole
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O ESTADO DE S. PAULO
SEGUNDA-FEIRA, 26 DE SETEMBRO DE 2011
JOSÉ DE
SOUZA MARTINS
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●
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Violões de pedra
É
muito estranho pensar
uma São Paulo desprovida
de poesia, justo temor em
face do impoético dos dias
que correm, o belo e o lírico refugiados em recantos esquecidos da cidade. Esperam no abandono os românticos, os que têm memória.
Aqueles em cujo peito ainda pulsam sentimentos, os que nas ruas
veem mais do que indiferença e
pressa.
Nos meus tempos de adolescente e
de estudante era impensável entrar
numa livraria e não encontrar prateleiras alagadas por métricas e rimas e
mesmo pela musicalidade de poesias
cujos versos não rimavam nem seguiam o ritmo próprio da métrica de
convenção. A poesia não estava nas
medidas, mas sobretudo no pensamento e em nossa busca de cada dia.
Era impensável abrir um jornal no
sábado e no domingo e não encontrar
sonetos e poemas, suaves contrapontos de notícias sisudas e de análises
densas. Lembro da imensa surpresa
que tive um dia ao ver no Suplemento
Literário do Estadão um belo poema
de Bento Prado Júnior. Ele era meu
colega na Faculdade de Filosofia da
USP, professor de Filosofia, autor de
livros eruditos, mas sabê-lo poeta foi
tão bom quanto sabê-lo sábio. Na Faculdade, tive um professor de História da Filosofia, João Cunha Andrade,
um anticlerical ranheta e divertido,
que, descobri casualmente, era também poeta. Cometera suas poesias, como se dizia, nas páginas da revista do
Grêmio da Faculdade. Reuniu-as mais
tarde num livrinho precioso, A Árvore
da Montanha.
Nos meus tempos de adolescente,
nos anos 1950, havia poesia também
no rádio, em programas de literatura,
como na Rádio Gazeta. E era Judas
Isgorogota um dos poetas que lá diziam seus versos: “Vocês não queiram
mal aos que vêm de longe, rasgados,
famintos de dar compaixão... os olhos
na terra... os pés doloridos... pisando
saudades calcadas no chão...”
Mas era, sobretudo, Paulo Bomfim
que nos falava do Antonio Triste que
somos: “Esguio como um poste da Avenida / Cheio de fios e de pensamentos,
Antônio era triste como as árvores /
Despidas pelo inverno, / Alegre, às
vezes, como a passarada / Nos fins
da madrugada. (...) Não era velho /
Nem era moço, / Não tinha idade /
Antônio Triste.”
A melancolia bonita da cidade da
garoa e dos dias e noites de neblina,
dos invernos paulistanos, pulsava e
pulsa suavemente na poesia desse
poeta maior de todos nós, que é Paulo Bomfim. Sua poesia nos faz descendentes simbólicos de antepassados que vagaram um dia por ermos
e sertões em busca do Brasil que
ainda não éramos.
Mais do que ninguém, ele canta a
alma dos paulistas há 85 anos, com
a juventude que nos renova a cada
poema, em que concilia os tempos
que nos separam de nós mesmos e
que teimam em nos distanciar dos
marcos de nossa vida: “E, à noite,
este infinito que ainda medra: A voz
dos passos numa esquina calma, A
serenata nos violões de pedra.”
Galeria
1.
ERNESTO RODRIGUES/AE
2.
REPRODUÇÃO
3.
2. Folheto do fim do
século 19 divulga as
vantagens de se morar
na Penha, zona leste
1. No final do século 19, no auge do café, a Câmara de São Paulo
se dava ao luxo de utilizar livros com capas feitas de ouro
Em cartaz, uma viagem
pela São Paulo antiga
Por meio de 40 documentos – muitos inéditos –, exposição do Arquivo
Histórico mostra a evolução da cidade, dos primeiros anos ao século 20
Edison Veiga
Pela primeira vez, o Arquivo
Histórico de São Paulo expõe
alguns dos mais importantes
itens de seu acervo. Desde sábado, 40 documentos que ajudam a entender a história paulistana podem ser conferidos
pelo público. A mostra A Cidade eSeus Documentos égratuita e fica em cartaz até 21 de dezembro.
“A ideia surgiu porque estamos preparando um livro para a
divulgação dessas preciosidades
históricas. Então, aproveitamos
para abrir a exposição também”,
explica o historiador e arquivis-
Paulistices
ta Guido Gustavo Venturini Alvarenga, chefe da Seção Técnica
de Acervo Arquivístico da instituiçãoeresponsável pelamontagem da mostra.
Quem for à exposição vai encontrar atas da Câmara, plantas
antigas, pinturas, croquis, mapas, fotografias e outros docu● Aperitivo
A mostra antecipa alguns dos
itens que estarão no livro Arquivo Histórico de São Paulo: História Pública da Cidade, com lançamento previsto para o início do
ano que vem.
REPRODUÇÃO
mentos que datam de 1555 a 1954.
Todo o material foi selecionado
dentre os 4,5 milhões de itens
quecompõem oacervodo ArquivoHistórico.Amostratrazregistros que revelam momentos menos conhecidos da história paulistana – antigos usos e costumes, a cultura material e os dilemasdenaturezasocial,econômicaepolíticaqueagitaramasociedade. “O conjunto foi organizado em quatro módulos: Colônia
e Reino Unido, Império, Primeira República e Formação da Metrópole”, conta Alvarenga.
Percurso. O documento expos-
to mais antigo é também a mais
Curiosidades da metrópole
antiga ata preservada da Câmara
da Vila de Santo André da Borda
do Campo, de 1555. “Nela há um
relato um tanto nobre”, conta o
historiador. “Um oficial da Câmara renuncia ao cargo por não
se achar digno de tal posição, já
que estava sofrendo processos
judiciais.” Da então Vila de São
Paulo de Piratininga, a ata mais
antiga preservada, que também
será exibida, data de 1562. “Nessa época, as sessões da Câmara
eram esporádicas, aconteciam
quando havia um motivo. Podia
ser a cada 2 ou 6 meses...”, explica. “E as reuniões eram sempre
na casa de alguém, já que não havia uma sede própria.”
Do século 17, outro documento curioso chama a atenção. Trata-se de uma ata da Câmara proibindo que o bandeirante Fernão
Dias saísse para o sertão com sua
tropa. “Nessa época, a cidade tinha cerca de 850 habitantes. Cada vez que havia uma expedição
para o interior, a população caía
quase que pela metade, tantos
eramosque da viagemparticipavam, e tantos eram os que morriam pelo caminho. Assim, a Câmara julgou que seria um desas-
3. Projeto paisagístico
do Parque do
Ibirapuera, de 1954,
também exposto
tre perder tantos paulistanos de
uma só vez”, diz o historiador.
As atas de elevação da Vila de
São Paulo Piratiningacomo sede
da Capitania – praticamente virando “capital” – em 1683 – e de
elevação de São Paulo de vila a
cidade–em1711,exatostrêsséculos atrás – também são destaques. “A exposição é uma grande
viagem pelo tempo.”
Do século 19, destacam-se os
livros da Câmara Municipal. Entre 1871 e 1892, tinham as capas
revestidas de ouro. “Já era o dinheiro do café, movimentando a
economiapaulista e financiando
essas extravagâncias”, relata Alvarenga. Nesta época, em 1888,
aparece o primeiro projeto de
uma via elevada férrea na cidade
– ligando aRua São Bento aoLargo do Paiçandu. Nunca saiu do
papel. Datadas de 1894, estarão
expostas as plantas do Grande
Hotel Metropolitano, o maior da
cidade na virada do século. Também há croquis do primeiro projeto para o Viaduto do Chá e folhetos com anúncio imobiliário
sobre um loteamento na região
da Penha.
Naiminência do século20,da-
4. Ata mais antiga da
Câmara de São Paulo,
do século 16, está bem
deteriorada
ta de 1899 a ata da posse do primeiro prefeito da cidade, AntôniodaSilvaPrado.Tambémestarão expostas as discussões que
culminaram na derrubada da velha Catedral da Sé, em 1911, para
a construção da atual. “A antiga
ficava mais perto da Rua Direita.
Houve uma negociação para a
mudança do local”, conta.
Com um aviãozinho italiano
remanescenteda1.ªGuerraMundial, São Paulo ganhou seu primeiro levantamento aerofotográfico em 1929 e 1930. Por fim, a
exposição ainda mostra como
SãoPaulo sepreparoupara ascomemorações do Quarto Centenário, em 1954, com a construção do Parque do Ibirapuera – há
o projeto paisagístico para o parque e os croquis do Obelisco.
Serviço
A CIDADE E SEUS DOCUMENTOS. ARQUIVO HISTÓRICO MUNICIPAL. PÇA CORONEL
FERNANDO PRESTES, 152, BOM RETIRO.
TEL.: (11) 3396-6018. WWW.ARQUIVOHISTORICO.SP.GOV.BR. SEGUNDA A SÁBADO, DAS
10H ÀS 17H. ATÉ 21/12. GRÁTIS.
blogs.estadao.com.br/edison-veiga
HOMENAGENS
PARA DESCOBRIR SP
As novas curvas
de Heliópolis
Três mulheres,
três orquídeas
Crie uma rota
Repaginação no
turística na cidade Largo da Batata
ARQ!BACANA
O arquiteto Ruy Ohtake será o guia de
um tour, no próximo sábado, pela favela de Heliópolis. Ele vai mostrar aos
participantes as novas curvas da região: um projeto de reurbanização de
sua autoria. O passeio é promovido
pelo Portal Arq!Bacana. Informações e
inscrições pelo (11) 3078-2906.
ERNESTO RODRIGUES/AE
estadão.com.br
Edison Veiga
PASSEIO
MUDANÇA VISUAL
AGÊNCIA NOVA/SB
Três grandes artistas contemporâneas receberam uma insólita
homenagem na noite de quinta. A atriz Maria Della Costa,
de 85 anos; a escritora Lygia
Fagundes Telles (foto), de 88
anos; e a artista plástica Tomie
Ohtake, de 97, eternizaram-se emprestando
seus nomes para novas espécies de híbridos de orquídeas. As
três estão, pela
vida e pela obra,
profundamente
ligadas a São
Paulo.
4.
Um concurso está aberto
para escolher minirroteiros turísticos dentro da
cidade de São Paulo. Os
interessados têm até sexta para inscrever sua
ideia no site www.aoka.
com.br/pt.ebulicao.social.
Há prêmios para os melhores (mais informações no próprio site)
e o grande vencedor
terá sua rota realizada no dia 25 de
janeiro, quando a
capital completa
458 anos.
OLHA SÓ...
Versos urbanos. A importância da
poesia de rua – essas oferecidas,
algumas vezes de forma insistente,
em points culturais da cidade, como
o vão livre do Masp – será o tema de
debate marcado para sexta, às 19h,
na Biblioteca Alceu Amoroso Lima
(Rua Henrique Schaumann, 777, Pinheiros. Tel.: 11 3082-5023).
Esculturas de embalagem. Até
Entre abril e junho, publicitários prestaram serviços gratuitos a comerciantes do Largo da Batata. Os resultados
da ação, como o Bar das Batidas, que
assumiu o nome pelo qual era conhecido – O C do Padre (foto) – ficam expostos no Instituto Tomie Ohtake até dia
16. Informações pelo (11) 2245-1900.
domingo, 15 esculturas elaboradas
com embalagens longa-vida estarão
expostas na Praça Victor Civita (Rua
Sumidouro, 580, Pinheiros). As
obras foram criadas por estudantes
de cursos de Artes Plásticas, Artes
Visuais, Arquitetura, Design Gráfico
e Design Industrial.