Faculdade de Cincias da Universidade do Porto

Transcrição

Faculdade de Cincias da Universidade do Porto
Hélder Almeida Santos
Estudos de adsorção de fosfatidilcolinas em
interfaces ar-água e líquido-líquido polarizadas
Relatório de Seminário
Química Analítica
Dissertação para Licenciatura em Química
Faculdade de Ciências da Universidade do Porto
Departamento de Química
2003
Agradecimentos
Aos que tronaram o trabalho possível:
Ao Departamento de Química da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto por todas as condições
proporcionadas para a realização deste trabalho.
Aos colegas e amigos com quem partilhei o laboratório, e que sempre me apoiaram e ajudaram, em
especial, aos Licenciados Ricardo Silva, Ana Barbosa, Tiago Silva e Sérgio Barreira, por todo incentivo, bom
ambiente de trabalho proporcionado, camaradagem e simpatia.
Ao Prof. Doutor Carlos Melo Pereira, meu orientador, pelo apoio na execução experimental, pela
inestimável ajuda, interesse e dedicação com que sempre soube atender às minhas solicitações e por toda a amizade
revelada, que foram preponderantes para a obtenção deste excelente trabalho, os meus mais sinceros
agradecimentos.
À minha família e aos que de uma forma ou de outra me ajudaram.
A todos o meu muito obrigado.
i
Resumo
O presente trabalho é constituído por duas partes. Na primeira parte estudou-se o comportamento de
fosfolípidos na formação de monocamadas na interface ar-água, por aplicação da técnica de Langmuir-Blodgett
(LB), e na segunda, o efeito da adsorção dos fosfolípidos em interfaces líquido-líquido polarizadas, por aplicação de
técnicas voltamétricas e espectroscopia de impedância electroquímica (EIE).
Utilizando a técnica de LB mediram-se as curvas de tensão superficial dos fosfolípidos,
diaraquidoilfosfatidilcolina (DAPC), dibenoilfosfatidilcolina (DBPC), dipalmitoilfosfatidilcolina (DPPC) e
distearoilfosfatidilcolina (DSPC), bem como, a influência de diversos parâmetros na formação e estabilidade de
monocamadas desses fosfolípidos, nomeadamente a temperatura, o tipo de electrólito de suporte e a sua
concentração na subfase, e o efeito da presença da enzima Glucose Oxidase (GOx) na subfase aquosa. Efectuaramse também, estudos de transferência de filmes de LB para slides de Ouro e utilizou-se a espectroscopia de
infravermelho (FT-IR) para analisar esses slides.
Utilizando técnicas voltamétricas e recorrendo à EIE, estudou-se o efeito da adsorção de diferentes
fosfatidilcolinas (DAPC, DBPC e DPPC), em interfaces líquido-líquido polarizadas, bem como, a interacção
observada entre estes fosfolípidos presentes, e a enzima GOx, e os catiões acetilcolina (ACh+) e butirilcolina
(BuCh+).
Verificou-se que os diferentes fosfolípidos (DAPC, DBPC, DPPC, e DSPC), apresentam diferentes
comportamentos quando comprimidos sobre uma subfase aquosa. Os resultados parecem depender,
fundamentalmente, do comprimento da sua cadeia, não sendo notório, a diferença do comportamento dos
fosfolípidos por variação da concentração do electrólito de suporte da subfase aquosa. A temperatura afectou
drasticamente a estabilidade das monocamadas dos fosfolípidos. O estudo da transferência de filmes de LB para
slides de Ouro pretendeu avaliar a estrutura do filme dos fosfolípidos adsorvidos neste material, no entanto, os
resultados obtidos foram insuficientes para tirar qualquer tipo de conclusão. Da observação das isotérmicas de
mistura de fosfolípidos, pareceu que, a presença de GOx na subfase aquosa afectou o seu comportamento, mas, uma
vez mais, os resultados não foram totalmente esclarecedores para se tirar uma conclusão definitiva.
Através das curvas de capacidade observou-se que a adsorção dos diferentes fosfolípidos foi mais fraca a
potenciais positivos, enquanto que a potenciais negativos foram obtidas monocamadas estáveis, devido a uma forte
adsorção dos fosfolípidos na interface. A presença de GOx dificultou a adsorção dos fosfolípidos a potenciais
negativos, enquanto que, a potenciais positivos, o aumento dos valores das curvas de capacidade indicou uma
desorção do fosfolípido e uma possível adsorção da GOx na interface. Estes efeitos foram variáveis com a
concentração de GOx na fase aquosa e foram mais notórios na presença do solvente 1,2-dicloroetano, do que na
presença do solvente éter 2-nitrofeniloctílico.
Na presença de ACh+ e BuCh+ na fase aquosa, observa-se um pico nas curvas de capacidade a potenciais
positivos, devido à sua transferência iónica, não tendo estes qualquer influência na adsorção dos fosfolípidos
observada a potenciais mais negativos.
ii
Índice geral
Página
Agradecimentos
i
Resumo
ii
Índice geral
iii
Lista de símbolos e abreviações
vi
Capítulo 1 - Introdução
1
1.1. Filmes de Langmuir-Blodgett
2
1.1.1. Pequena história dos filmes de Langmuir-Blodgett
2
1.1.2. Tensão superficial
3
1.1.3. Técnica e filmes de Langmuir-Blodgett
4
1.1.4. Surfactantes e filmes de Langmuir
5
1.1.5. Monocamadas insolúveis e balança de Langmuir
6
1.1.6. Forças que actuam na superfície da subfase
8
1.1.7. Isotérmicas: pressão superficial vs. área
10
1.1.7. Fases dos filmes monomoleculares
1.2. Aplicações de Filmes de Langmuir
12
14
1.2.1. Materiais adequados para a técnica de LB
14
1.2.2. Subfase aquosa
14
1.2.3. Processo de deposição de filmes LB sobre um substracto
(hidrofóbico ou hidrofílico)
15
1.2.4. Tipos de deposição de filmes de LB
17
1.3. Métodos Voltamétricos
19
1.3.1. Voltametria Cíclica
19
1.4. As ITIES, a dupla camada eléctrica e a microinterface. A electroquímica nas
interfaces líquido-líquido
20
1.4.1. Interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis (ITIES)
21
1.4.2. Interfaces líquido-líquido idealmente polarizadas
22
1.4.3. Dupla camada eléctrica numa interface líquido-líquido
23
1.4.4. Janela de potencial
24
1.4.5. Transferência iónica
26
1.4.6. Transporte de massa nas ITIES: migração, convecção e difusão
27
1.5. Espectroscopia de impedância electroquímica (EIE)
iii
29
1.5.1. A impedância nas interfaces líquido-líquido
29
1.5.2. Dupla camada eléctrica
32
1.6. Formação de uma monocamada na interface
33
1.6.1. Membrana celular
33
1.6.2. Os fosfolípidos
34
1.6.3. Glucose Oxidase (GOx)
38
1.6.4. Neurotransmissores
38
1.6.5. Adsorção nas ITIES
39
Capítulo 2 – Execução Experimental
42
2.1. Reagentes utilizados na preparação das soluções
43
2.2. Técnica de Langmuir-Blodgett (LB)
44
2.2.1. Material e instrumentação
44
2.2.2. Procedimentos experimentais
45
2.3. Espectroscopia de impedância electroquímica
48
2.3.1. Material e instrumentação
48
2.3.2. Reagentes
49
2.3.2.1. Solventes
49
2.3.2.2. Electrólitos
50
2.3.3. Eléctrodos
51
2.3.4. Procedimentos experimentais
51
Capítulo 3 – Resultados e Discussão
53
3.1. Filmes de Langmuir-Blodgett
54
3.1.1. Estudo das isotérmicas de diferentes fosfolípidos na interface ar-água
54
3.1.2. Estudo da isotérmica do fosfolípido DBPC (C22) na interface ar-água.
Estudo do efeito do electrólito da subfase aquosa
3.1.3. Estudo da isotérmica do fosfolípido DAPC (C20) na interface ar-água
55
56
3.1.4. Estudo da isotérmica do fosfolípido DSPC (C18) na interface ar-água.
Estudo do efeito do electrólito da subfase aquosa
58
3.1.5. Estudo da isotérmica do fosfolípido DPPC (C16) na interface ar-água.
Estudo do efeito do electrólito de suporte e da sua concentração na subfase
aquosa, e estudo do efeito da temperatura na isotérmica de DPPC
59
3.1.6. Estudo da isotérmica de misturas de fosfatidilcolinas na presença
da enzima Glucose Oxidase (GOx) na interface ar-água
3.1.7. Transferência de monocamadas de fosfolípidos para substractos sólidos
3.1.7.1. Transferência da monocamada de DBPC para slides de Au
63
65
65
3.2. Estudos de adsorção de fosfatidilcolinas e da enzima GOx em interfaces
líquido-líquido polarizadas
68
iv
3.2.1. Efeito do pH na adsorção de GOx na interface água/1,2-DCE polarizada
69
3.2.2. Estudo de adsorção da GOx na interface água/1,2-DCE
71
3.2.3. Estudos de adsorção de DAPC (C20). Efeito da presença de GOx na
fase aquosa
77
3.2.4. Estudos de adsorção de DBPC (C22). Efeito da presença de GOx na
fase aquosa
79
3.2.5. Estudos de adsorção da DPPC (C16)
82
3.2.5.1. Adsorção de DPPC. Estudos da presença da enzima GOx na
fase aquosa
90
3.2.6. Comparação do efeito de adsorção dos diferentes fosfolípidos estudados
95
3.3. Estudos de adsorção de fosfolípidos na interface água/2-NPOE polarizada na
presença da enzima GOx
96
3.3.1. Efeito do solvente orgânico na adsorção da Glucose Oxidase (GOx)
3.3.1.1. Efeito do pH
96
99
3.3.2. Efeito do solvente orgânico na adsorção de DPPC
102
3.4. Estudos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE polarizada na
presença da acetilcolina (ACh+)
106
3.4.1. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE
na presença da acetilcolina na fase aquosa
106
3.4.2. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE
da acetilcolina (ACh+) na presença do fosfolípido DPPC
108
3.5. Estudos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE polarizada na
presença da butirilcolina (BuCh+)
114
3.5.1. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE
na presença da butirilcolina na fase aquosa
114
3.5.2. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE
da butirilcolina (BuCh+) na presença do fosfolípido DPPC
115
Capítulo 4 – Conclusões finais
117
Capítulo 5 – Bibliografia
121
v
Lista de símbolos e abreviaturas
EIE
Espectroscopia de impedância Electroquímica
ITIES
Interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis
TOATPB
Tetrafenilborato de tetraoctilamónio
TBATPB
Tetrafenilborato de tetrabutilamónio
NaTPB
Tetrafenilborato de sódio
GOx
Glucose Oxidase (Aspergillus Niger)
1,2-DCE
1,2-dicloroetano
2-NPOE
Éter 2-nitrofeniloctílico
LiCl
Cloreto de Lítio
NaCl
Cloreto de Sódio
KCl
Cloreto de Potássio
HCl
Ácido Clorídrico
CHCl3
.
Clorofórmio
CdCl2 H2O
Cloreto de Cádmio monohidratado
Ag/AgCl
Prata/Cloreto de prata
N2
Azoto líquido
Au
Slide de Ouro
DLPC
Dilauroilfosfatidilcolina (C12:0)
DMPC
Dimiristoilfosfatidilcolina (C14:0)
DPPC
DL-α-Dipalmitoilfosfatidilcolina(C16:0)
DSPC
DL- α-Distearoilfosfatidilcolina (C18:0)
DAPC
L-α-Diaraquidoilfosfatidilcolina (C20:0)
DBPC
L- α-Dibenoilfosfatidilcolina (C22:0)
LB
Filmes ou técnica de Langmuir-Blodgett
Π
Pressão superficial do filme de Langmuir (mN/m)
Πc
Pressão superficial de colapso (mN/m)
γ0
Tensão superficial do solvente puro
γ
Tensão superficial da solução
γprato
Tensão superficial do prato
A0
Área de pressão molecular zero (Å2)
A
Área molecular (Å2)
T
Temperatura absoluta (K)
KB
Constante de Boltzmann
lp, wp, tp e ρp
Respectivamente, o comprimento, a largura, a espessura e a densidade do prato de Wilhelmy
hl
Profundidade de imersão do prato de Wilhelmy
ρl
Densidade de um líquido usado na subfase
B
vi
c
Concentração (mol.dm-3)
Γ
Excesso superficial (mol.m-2)
g
Aceleração da gravidade (~ 9.8 m.s-2)
Π-A
Isotérmica pressão superficial vs. área por molécula
G
Estado gasoso de isotérmica
L1 ou LE
Estado líquido expandido de isotérmica
L2 ou LC
Estado líquido condensado de isotérmica
LE+LC
Estado intermediário líquido condensado-líquido expandido de isotérmica (também representado
por L1+L2)
S
Estado sólido de isotérmica
Ai
Pressão superficial à qual a transição de fase ocorre entre o estado L1 e L2 e os Estados L2 e S
τ
Velocidade de transferência ou espessura de uma monocamada de fosfolípido adsorvido
AL
Área ocupada pela monocamada na superfície aquosa durante uma deposição
AS
Área coberta do substrato sólido
LS
Técnica de Langmuir-Schaeffer
FAD
Flavina Adenina Dinucleótido
v
Velocidade de varrimento ou Velocidade termodinâmica
v.c.
Voltametria cíclica
PVC
Cloreto de polivinilo
L-L
Interface imiscível Líquido-Líquido
Z’’ ou ZIm
Componente imaginária da impedância
Z’ ou Zreal
Componente real da impedância
Rs
Resistência da solução
Cd, Cdc ou d.c.
Capacidade da dupla camada eléctrica
Rtc
Resistência de transferência de carga
Zw ou W
Impedância de Warburg
ZR
Impedância da resistência
Zf
Impedância faradaica
ZC
Impedância da capacidade
Zt
Impedância total
K
0
Velocidade específica da reacção
εr
Constante dieléctrica da região adsorvida
ε0
Constante dieléctrica relativa do vácuo (8.85x10-12 F.m-1)
IR
Queda óhmica
TI
Transferência iónica
TE
Transferência electrónica
TFI
Transferência facilitada de iões
α
Δβ φ
Diferença de potencial eléctrica Galvânica entre duas fases (α e β)
TPAsTPB
Tetrafenilarsénio de tetrafenilborato
μi
Potencial químico da molécula i
μ0i,α
Potencial químico padrão de i na fase α
vii
aiα
Actividade de i na fase α
ciα
Concentração de i na fase α
F
Constante de Faraday (~96484 C.mol-1) ou Força (mN)
R
Constante molar dos gases
zi
Carga do ião i
TOABr
Brometo de tetraoctilamónio
Ci
Capacidade interfacial
θ
Cobertura superficial
β
Coeficiente de adsorção
a
Parâmetro de interacção
p
Parâmetro correspondente ao número de colunas de solvente orgânico que pode ser substituído por
uma molécula de espécie adsorvida
r
Parâmetro correspondente ao número de agregação das moléculas de espécies adsorvidas na
interface
Potencial de carga zero
pcz
ACh+
Cloreto de acetilcolina ou AChCl
+
BuCh
Cloreto de Butirilcolina ou BuChCl
φ
Parâmetro de deposição ou potencial Galvânico (ou interno) entre duas fases
E
Potencial da célula
ΔE
Diferença de potencial entre o potencial obtido a partir da fase aquosa e o da fase orgânica
Ji,m
Fluxo de migração
Ji,c
Fluxo de convecção
Ji,d
Fluxo de difusão
Di
Coeficiente de difusão
TBuATPB
Tetrafenilborato de tetrabutilamónio
BTPPATPB
Tetrafenilborato de bis-trifenilfosforanilideno
Δφ(mín. cap.)
Potencial correspondente ao mínimo de capacidade
Clip
Capacidade interfacial da camada saturada na presença do lípido (μF.cm-2)
CGOx
Capacidade interfacial da camada saturada na presença da enzima GOx (μF.cm-2)
Caq’
Capacidade interfacial sem GOx (μF.cm-2)
Caq
Capacidade interfacial sem fosfolípido (μF.cm-2)
ΔG0ads
Energia de adsorção de Gibbs (KJ.mol-1)
Ip+
Intensidade de corrente do pico positivo
Ip-
Intensidade de corrente do pico negativo
FT-IR
Espectroscopia de Infravermalho
RT
Razão entre as variações/reduções da área da monocamada durante a deposição e a área do
substracto sólido que foi utilizada
Id
Intensidade de corrente de difusão
viii
Capítulo
Introdução
Neste capítulo, apresenta-se uma breve exposição dos fundamentos
teóricos das técnicas utilizadas ao longo deste trabalho, bem como,
alguns exemplos práticos onde estas técnicas são aplicáveis, e ainda
os princípios teóricos dos sistemas em estudo.
Este
primeiro
capítulo
é
constituído
por
seis
secções,
correspondendo cada uma delas a um tema em estudo. As duas
primeiras secções são relativas à técnica de Langmuir-Blodgett
(LB). As três secções seguintes dizem respeito às técnicas de
voltametria cíclica, electroquímica em interfaces líquido-líquido e
espectroscopia de impedância electroquímica (EIE). A última
secção está relacionada com os vários aspectos biológicos dos
estudos efectuados ao longo deste trabalho.
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
1.1. Filmes de Langmuir-Blodgett
O estudo das interfaces moleculares tem suscitado muito interesse nas últimas décadas devido aos rápidos
avanços tanto na teoria como na parte experimental. Estes estudos abrangem a área da química-física, onde se
estabelecem modelos relacionados com a reactividade e estrutura, modelos moleculares para a predição das
propriedades moleculares, e o uso da espectroscopia e técnicas de superfície para elucidar os passos dos mecanismos
de reacções.
De entre as várias técnicas que têm vindo a ser utilizadas, destaca-se o uso de técnicas de LangmuirBlodgett, utilizadas na modificação da estrutura das superfícies para reacções de transferência de carga e permitindo
efectuar uma analogia com os processos das membranas celulares.
Os filmes de LB têm uma variedade de aplicações em campos como, a electrónica, óptica, a biotecnologia e
a electrónica molecular. Os filmes orgânicos com espessura de alguns nanómetros (uma monocamada), são a fonte
de alguns dos componentes com aplicações práticas e comerciais, tais como, sensores, detectores, monitores e
componentes de circuitos electrónicos [1,2]. A possibilidade de sintetizar moléculas orgânicas, quase sem
limitações, com a estrutura e funcionalidade desejada em conjunto com uma tecnologia de deposição sofisticada de
filmes finos, facilita a produção de componentes eléctricos, ópticos e biologicamente activos numa escala
nanométrica. Um filme fino orgânico pode ser depositado num substrato sólido através de várias técnicas, tais como,
evaporação térmica, electrodeposição, adsorção a partir da solução, técnica de Langmuir-Blodgett (LB), automontagem, etc. A técnica LB é uma das mais promissoras para preparar tais filmes finos, porque permite: (i) o
controle preciso da espessura da monocamada, (ii) a deposição homogénea da monocamada sobre grandes áreas,
(iii) a possibilidade para fazer estruturas de multicamadas com composição de camada variável, e (iv) a deposição
de monocamadas em quase qualquer tipo de substrato sólido.
1.1.1. Pequena história dos filmes de Langmuir-Blodgett
Quando se descreve a história dos filmes de Langmuir ou Langmuir-Blodgett, pode começar por citar-se
Benjamim Franklin, que em 1774 descreveu à British Royal Society [1], a forma como uma pequena quantidade de
azeite (~ uma colher de sopa) se tinha espalhado sobre a superfície de uma pequena lagoa, de cerca de meio acre (~
2000 m2).
Franklin fez alguns cálculos quantitativos simples, chegando à conclusão que se uma colher de sopa (~ 2
ml) de azeite for espalhada em cima de uma área ~ 2000 m2, a espessura do filme na superfície da água deve ser
inferior a 1 nm.
Cerca de cem anos depois, Rayleigh suspeitou que a extensão máxima de um filme de azeite em água
representa uma camada, uma espessura molecular. Mais tarde, uma alemã chamada Agnes Pockles, estudou os
equilíbrios superficiais que ocorrem na interface ar-água, usado-os para determinar a contaminação superficial (da
água), para diferentes compostos orgânicos em função da área superficial. A publicação do trabalho de Pockels em
1891 na Nature, foi decisivo para o trabalho quantitativo de Langmuir em monocamadas de ácidos gordos, ésteres e
álcoois [3].
2
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Irwing Langmuir foi o primeiro a executar estudos sistemáticos em monocamadas flutuantes em água no
início do ano de 1910 até finais de 1920. Estes estudos conduziram-no ao prémio Nobel da Química em 1932. Já em
1920 observara a transferência de moléculas de ácidos gordos das superfícies de água para suportes sólidos, tais
como, filamentos de tungsténio e platina. Porém, a primeira descrição detalhada da sequência da transferência de
monocamadas, foi dada anos mais tarde por Katherine Blodgett [4]. A preparação de monocamadas montadas,
foram então designadas de filmes de Langmuir-Blodgett (LB). O termo "filme de Langmuir" é normalmente
atribuído a uma monocamada flutuante.
Depois do trabalho pioneiro feito por Langmuir e Blodgett, levou quase meio século antes de outros
cientistas do mundo começarem a perceber as oportunidades desta técnica única. A primeira conferência
internacional de filmes LB foi realizada em 1979, e desde então, o uso desta técnica tem vindo a aumentar.
Desde algum tempo a esta parte, a produção de filmes orgânicos ultra-finos com a técnica LB, começou
lentamente a encontrar possíveis aplicações práticas em muitos campos, tais como, a electrónica e a electrónica
molecular [5], a óptica [6] e a biotecnologia [7]. Como exemplos podem referir-se: na química, com o
desenvolvimento de sensores [8], e na física, com a utilização de condutores de ondas ópticas [9], utilizados, por
exemplo, nas comunicações e computadores.
1.1.2. Tensão superficial
Para entendermos o que estamos a medir, e como medir as propriedades de monocamadas (filmes de
Langmuir), é útil fazer uma pequena introdução à química das superfícies.
As moléculas num líquido têm interacções com as outras moléculas presentes nesse líquido. O grau desta
atracção, também chamada coesão, é dependente das propriedades da substância. As interacções de uma molécula
no líquido são equilibradas por uma força igualmente atractiva em todas as direcções. As moléculas na superfície do
líquido experimentam um desequilíbrio de forças, ou seja, uma molécula na interface ar-água tem uma maior
atracção para a fase líquida, do que para o ar ou para a fase gasosa. Consequentemente, haverá uma força de ligação
atractiva em relação ao líquido e a interface ar-água minimizará espontaneamente a sua área e o contacto. A tensão
superficial é uma medida da energia de coesão presente numa interface (figura 1.1.) [10,11].
Figura 1.1.: Ilustração esquemática da interacção de moléculas numa interface.
3
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
As unidades mais utilizadas para a tensão superficial são dynes/cm ou mN/m, sendo estas unidades
equivalentes. Os líquidos polares, como água, têm fortes interacções intermoleculares, e consequentemente,
elevadas tensões superficiais. Qualquer factor que diminua a força desta interacção, diminuirá a tensão superficial:
são exemplo disso, o aumento na temperatura do sistema, e qualquer contaminação, especialmente através de
surfactantes. Assim, é importante haver um grande cuidado em relação à questão da contaminação, sendo a limpeza
a palavra-chave em química das superfícies.
1.1.3. Técnica e filmes de Langmuir-Blodgett
Monocamadas monomoleculares insolúveis na superfície de um líquido, são designadas de filmes ou
monocamadas de Langmuir [1]. Estas são normalmente formadas à superfície da água por moléculas contendo uma
“cauda” hidrofóbica e uma “cabeça” hidrofílica (por exemplo, os lípidos).
A preparação de filmes de Langmuir pode ser feita de vários modos. Normalmente, a monocamada é
formada espalhando as moléculas orgânicas na subfase de água. A solução espalhada é aplicada à superfície da
subfase, permitindo que gotas pequenas caiam da seringa. Uma vez evaporado o solvente, o filme monomolecular
da espécie anfipática permanece à superfície da subfase, pode ser comprimido e expandido.
Quando as primeiras moléculas são espalhadas na água, elas estão muito dispersas, e assim, comportam-se
como um gás bidimensional. Isto significa que a área disponível na água para cada molécula é bastante grande e a
pressão superficial é baixa. A pressão superficial é normalmente medida usando um prato de Wilhelmy e uma
balança de precisão.
A pressão superficial pode ser aumentada por meio de uma ou duas barreiras móveis (figura 1.2.). A um
certo ponto a pressão superficial começa a subir, mais rapidamente, indicando uma transição para a fase líquida.
Quando a barreira é movida até para além da fase sólida, pode-se notar uma subida mais íngreme na pressão
superficial.
Figura 1.2.: Compressão lateral de um composto com “cabeça” hidrofílica e “cauda” hidrofóbica, formando uma
monocamada numa superfície de água [1].
Uma vez depositada a primeira camada, poderão ser depositadas camadas adicionais em cada passagem
subsequente do substrato pela interface ar-água. As multicamadas podem ser depositadas para produzir um filme,
cuja espessura é o produto do comprimento da cadeia molecular individual e o número de vezes que o substrato
atravessou a interface ar-água.
4
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
1.1.4. Surfactantes e filmes de Langmuir
Os agentes superficiais activos (surfactantes ou tensiactivos), são uma classe de moléculas com grande
importância tecnológica e uma enorme importância biológica. Geralmente, estas moléculas consistem numa parte
hidrofílica (solúvel em água) e uma parte hidrofóbica (insolúvel em água). Esta natureza anfipática de surfactantes é
responsável pelo comportamento de associação em solução (micelas, bicamadas, vesículas, etc.) e a sua acumulação
nas interfaces (ar-água ou água-solução orgânica). A parte hidrofóbica normalmente consiste numa cadeia de
hidrocarbonetos ou fluorocarbonetos, enquanto que a parte hidrofílica consiste num grupo polar (-OH, -COOH, NH3+, -PO4-, -(CH2)2NH3+, etc.) – figura 1.3.
Figura 1.3.: Ilustração esquemática que mostra os componentes de um composto anfipático (à esquerda), e a sua
orientação adoptada numa interface (à direita) [12].
O comportamento da associação de surfactantes em solução e a sua afinidade para as interfaces é
determinado pelas propriedades físico-químicas dos grupos hidrofóbicos e hidrofílicos, respectivamente. O tamanho
e a forma da cadeia de hidrocarbonetos, e o tamanho, a carga e a hidratação do grupo hidrofílico, é de extrema
importância nesta relação.
Os grupos hidrofílicos consistem em grupos, tais como, os ácidos carboxílicos, sulfatos, aminas e álcoois.
Estes são atraídos pelas partes polares, tais como, as da água, e as forças que nelas actuam são predominantemente
atractivas (1/r²). Os grupos hidrofóbicos (ou oleofílicos), tais como, as cadeia de hidrocarbonetos, gorduras e lipídios
são muito menos solúveis em água e as forças que nelas actuam são predominantemente do tipo de Van der Waals
(1/r12 e 1/r6). As moléculas anfipáticas “ligam-se” à interface, porque elas possuem dois tipos muito diferentes de
ligação dentro da sua estrutura molecular.
Dependendo do equilíbrio entre estas propriedades, foram observados uma larga variedade de estruturas
auto-montadas nas interfaces e em solução. A força motriz que está por detrás da associação, é a diminuição da
energia livre do sistema. Por conseguinte, quando um surfactante entra em contacto com a água, acumula-se na
interface ar-água, causando uma diminuição na tensão superfícial da água.
Quando os surfactantes, dissolvidos num solvente volátil não-aquoso (clorofórmio ou hexano, que são
normalmente os solventes mais usados), são introduzidos sobre uma superfície líquida polar, o solvente evaporará
deixando os surfactantes orientados na interface gás-líquido. Os grupos de “cabeça” hidrofílica puxam a molécula
para a subfase e os grupos de “cauda” hidrofóbica direccionam-se para o ar. Uma monocamada de superfície só será
alcançada se o equilíbrio anfipático da molécula for correcto; ou seja, o equilíbrio entre as partes hidrofóbicas e
5
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
hidrofílicas. Se o grupo de “cauda” hidrofóbica é muito pequeno (não suficientemente hidrofóbico), a molécula será
arrastada para a água e dissolver-se-á, enquanto que, se não houver nenhuma parte hidrofílica, as moléculas podem
formar filmes de multicamadas mais espessas na superfície, ou até mesmo evaporar.
1.1.5. Monocamadas insolúveis e balança de Langmuir
A natureza anfipática dos surfactantes dita a orientação das moléculas na interface (ar-água ou águasolução orgânica), de tal modo que, o grupo de cabeça polar é imergido na água e a longa cadeia de hidrocarbonetos
aponta na direcção do ar (figura 1.4.).
Ar
Água
Figura 1.4.: Ilustração esquemática que mostra uma deposição de monocamada na interface ar-água [1].
A cadeia carbonatada da substância usada para estudos de monocamada tem que ser suficientemente longa
para ser capaz de formar uma monocamada insolúvel [13]. Como regra, deverão existir mais do que 12
hidrocarbonetos ou outros grupos na cadeia ((CH2)n, n> 12) [14]. Se a cadeia é pequena, embora ainda insolúvel em
água, o composto anfipático na superfície da água, tende a formar micelas [1]. Estas micelas são solúveis em água, o
que impede a formação de uma monocamada na interface. Por outro lado, se o comprimento da cadeia é muito
longo, o composto anfipático tende a cristalizar na superfície da água e, por conseguinte, não forma uma
monocamada. É difícil determinar o comprimento óptimo para a cadeia de hidrocarbonetos, porque a sua capacidade
de formação do filme também depende da parte polar do composto anfipático. Além disso, o composto anfipático
tem que ser solúvel em algum solvente orgânico, muito volátil e insolúvel em água.
As monocamadas insolúveis representam meias bicamadas, e consequentemente, são normalmente
investigadas como um sistema modelo para entender melhor a estrutura e funcionalidade dos lípidos das
biomembranas. Elas são observadas frequentemente com ajuda de uma balança de filme, também chamada balança
de Langmuir. A figura 1.5. mostra esquematicamente uma balança de filme de Langmuir. A tina que contém a
subfase normalmente é feita de Teflon® para impedir qualquer transbordo da subfase sobre as extremidades. A tina é
termostatizada por água circulante em canais colocados debaixo da tina. A área superficial da tina pode ser variada
efectuando o varrimento com as barreiras móveis sobre a superfície da tina. A barreira é feita de Delrin®, um
material hidrofílico e suficientemente pesado para impedir qualquer transbordo da monocamada para fora da tina.
6
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Balança
com prato
de Wilhelmy
Barreira
Barreira
Monocamada espalhada
sobre a subfase
Tina com a subfase
Figura 1.5.: Ilustração esquemática de uma balança de filme de Langmuir, com um prato de Wilhelmy, para medir a
pressão superficial, e as barreiras para reduzir a área superficial da subfase disponível na tina.
A balança de Langmuir permite manipular a área molecular por compressão ou expansão do filme,
enquanto se mede a pressão do filme. Quando se comprime o filme, ou seja, diminuindo-se a área por molécula,
geralmente a pressão aumenta, enquanto que a tensão superficial diminuí. Isto acontece porque a interface ar-água
(com tensão superficial elevada), é convertida numa monocamada superficial hidrofóbica (baixa tensão superficial).
A barreira pode mover-se sobre a superfície do líquido que tem uma tensão superficial elevada, originando
uma redução da energia e da entalpia livre do sistema. A pressão do filme é definida como a diferença entre as
tensões superficiais do solvente puro, γ0, e a tensão superficial da solução, γ:
Π = γ0 - γ
(1.1.)
A pressão superficial e a área molecular são continuamente monitorizadas durante a compressão. A pressão
superficial é medida pelo método do prato de Wilhelmy [15]. Este método permite medir a força que actua no
menisco da água no perímetro do prato e é proporcional à tensão superficial da subfase, incluindo a monocamada.
Neste método é feita a determinação da força exercida, devido à tensão superficial num prato suspenso, de forma a
que este seja parcialmente imergido na subfase (figura 1.6.). Esta força é convertida então em tensão superficial com
a ajuda das dimensões do prato.
A)
B)
Figura 1.6.: Um prato de Wilhelmy parcialmente imergido numa superfície de água: A) visão frontal; B) visão
lateral. [1]
7
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Os efeitos da inclinação do prato de Wilhelmy e a validação das medidas efectuadas foram discutidas por
Jordan e Lane [16]. O prato é frequentemente muito fino e feito de platina, também podem ser usados pratos feitos
de vidro, quartzo, mica, etc. As forças que actuam no prato são a gravidade, a tensão superficial descendente, e a
flutuabilidade (devido ao movimento ascendente da água). Para um prato rectangular de dimensões lp, wp e tp
(respectivamente, comprimento, largura e espessura), de densidade, ρp, imergido a uma profundidade hl, num
líquido de densidade ρl, a tensão superfícial é dada por:
γprato = Força / 2.(largura + espessura) (1.2.)
onde, a tensão superficial vem em mN/m, a força em mN e o perímetro em metros. Geralmente por essa razão, a
tensão superfícial é determinada por:
γ = Força / perímetro (1.3.)
A pressão superficial é então determinada medindo as alterações em F (força) por um prato estacionário
entre uma superfície limpa e a mesma superfície com a monocamada presente. Se o prato está completamente
humedecido pelo líquido (isto é, cos θ = 1, ver figura 1.6.–B) a pressão superficial é obtida então a partir da seguinte
equação [17]:
Π = -Δγ = -[ΔF / 2(tp+wp)] = - ΔF / 2wp, se wp >> tp
(1.4.)
A sensibilidade pode, consequentemente, ser aumentada usando um prato mais fino. A força, é deste modo,
determinada por medição das alterações na massa do prato que está associado a uma electrobalança sensível. A
monocamada também pode ser mantida a uma pressão superficial constante, através de um sistema de controlo de
realimentação por computador entre a electrobalança e o motor responsável pelos movimentos da barreira de
compressão. Isto é útil quando se produzem filmes LB, ou seja, quando a monocamada é depositada num substrato
sólido.
1.1.6. Forças que actuam na superfície da subfase
As forças que afectam os grupos de cabeça polar, imergidos na subfase, são electrostáticas e proporcionais
2
a 1/r (em que r é a separação intermolecular), enquanto que as forças entre as cadeias de hidrocarbonetos são
devido às interacções de Van der Waals, e proporcionais a 1/r6 e 1/r12. Consequentemente, as interacções na subfase
são de mais longo alcance, do que as da superfase [1].
A isotérmica pode, normalmente, ser dividida em três regiões distintas, correspondendo cada uma delas
um estado físico de transição de fase (figura 1.7.):
8
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Pressão
Superficial
(mN/m)
Sólido
Líquido
Gasoso
Área Molecular
(Å2)
Figura 1.7.: Exemplo da isotérmica de um ácido esteárico em água pura e os seus respectivos estados físicos de
transição de fase [5].
Depois da deposição inicial sobre a subfase, nenhuma pressão externa é aplicada à monocamada e as
moléculas comportam-se como um gás bidimensional, pelo que pode ser descrito por:
ΠA = KT (1.5.)
onde Π, é a pressão superficial, A, a área molecular, K, a constante de Boltzmann, e T, é a temperatura
termodinâmica. Na compressão da monocamada, alguns filmes são reorganizados, e comportam-se, de maneira
semelhante ao esperado para um líquido bidimensional.
À medida que se comprime, o aumento na pressão causa ordenação adicional, e a monocamada comportase como um estado quasi-sólido. Este estado sólido é caracterizado por uma relação, normalmente, linear entre a
pressão superficial e área molecular.
Eventualmente a pressão de colapso, Πc, é alcançada quando o filme perde irreparavelmente a sua forma
monomolecular. O colapso ocorre quando a compressibilidade da monocamada é superior ao máximo de
compressão que a monocamada pode sofrer. Neste tipo de colapso as moléculas da monocamada sobrepõem-se
umas às outras, formando-se multicamadas desordenadas (figura 1.8.).
1)
2)
3)
4)
Figura 1.8.: Colapso de uma monocamada à medida que é efectuada a compressão.
9
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
As forças aqui exercidas tornam-se muito fortes para o confinamento em duas dimensões, e as moléculas
são lançadas para fora do plano da monocamada, ou para a subfase (moléculas mais hidrofílicas), ou para a
superfase (moléculas mais hidrofóbicas). Porém, o colapso da monocamada não é uniforme mas é, normalmente,
iniciado perto da extremidade da barreira principal ou nas discontinuidades da tina (tais como, os cantos ou o prato
de Wilhelmy). Normalmente um filme “colapsado”, consistirá numa grande área de monocamada não colapsada,
entrecalada com as monocamadas que foram esmagadas, para formar agregados volumosos.
A pressão de colapso pode ser definida como, o valor máximo para o qual uma monocamada pode ser
comprimida sem a expulsão detectável de moléculas do filme. Este valor de pressão depende dos detalhes do
procedimento experimental usado, ou seja, das substâncias químicas usadas, da temperatura, da velocidade à qual o
filme é comprimido e dos procedimentos para os quais o filme foi sujeito. O valor da pressão de colapso para um
ácido gordo simples saturado, pode ser de 50 mN/m, que é equivalente a aproximadamente 200 atmosferas, se se
fizer uma extrapolação para três dimensões [18].
Quando a monocamada está na fase bidimensional “sólida” ou “líquida condensada”, as moléculas estão
relativamente bem orientadas e bastante próximas umas das outras, e a área de pressão molecular zero (A0), pode ser
obtida extrapolando o declive da fase “sólida” para a pressão zero – o ponto no qual esta linha cruza o eixo das
abcissas, correspondente à área hipotética ocupada por uma molécula na fase condensada a pressão zero. Para um
ácido gordo completamente saturado, tal como, o ácido esteárico, a área molecular, determinada por este método, é
de 22-25 Å2 [1]. Tal área, corresponde à área de cruzamento seccional de uma cadeia de hidrocarboneto, sugerindo
que a compressão da monocamada consiste em cadeias acumuladas fechadas, orientadas verticalmente.
Este estudo permite obter informação sobre o modo como as moléculas se acumulam na interface e a
estabilidade da camada comprimida a pressões elevadas. O filme que está a ser comprimido pode ser “fortalecido”
(nunca indo acima de Πc), depois de se expandir várias vezes. Tal procedimento, permite uma acumulação mais
eficiente, e normalmente, é observada um desvio para áreas moleculares mais baixas.
Por exemplo, os estudos efectuados com fosfolípidos por Pethica, Mingis e Taylor e os seus colaboradores
[19,20,21], sugerem que os filmes de Langmuir podem existir num número diferente de fases líquidas cristalinas na
superfície da água, dependendo da temperatura e da pressão do filme.
1.1.7. Isotérmicas: pressão superficial vs. área
A representação gráfica da pressão superficial em função da área molecular (figura 1.9.), é normalmente
efectuada a temperatura constante, e é designado por isotérmica. Normalmente uma isotérmica é registada
comprimindo o filme (reduzindo a área com as barreiras) a uma velocidade constante enquanto se monitoriza
continuamente a pressão superficial. A forma da isotérmica é característica das moléculas que compõem o filme.
Uma vez formado o filme, podem efectuar-se deposições em substratos sólidos. Uma ou mais
monocamadas podem ser transferidas para um substrato imergido na monocamada. A monocamada é mantida
uniforme controlando a pressão superficial com as barreiras ao longo do processo.
Dependendo do material em estudo, compressões e expansões repetidas podem ser necessárias para
alcançar uma reprodutividade.
10
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Na figura 1.9.–A, está representado o esquema de uma isotérmica Π (pressão superficial)–A (área), típica
de um ácido gordo (ácido esteárico) com uma única cadeia de hidrocarbonetos (à esquerda) e de um fosfolípido com
duas cadeias de hidrocarbonetos (à direita). Na figura 1.9.–C, está ilustrado a orientação das moléculas nas
diferentes fases em que as monocamadas se podem encontrar.
Colapso
Π
Sólido
Líquido condensado
Líquido expandido
ΠC
A)
C)
(Å2)
Gasoso
B)
Gasoso
A
Líquido
Sólido
Figura 1.9.: A) Esquema de uma isotérmica típica de um ácido gordo (ácido esteárico) e de um fosfolípido (DPPC)
[22]. B) Representação de uma isotérmica pressão superficial-área (Π-A), e as diferentes fases dos filmes
monomoleculares. Estados físicos em que a monocamada se pode encontrar: G, gasoso; L1, líquido-expandido; L1L2 – líquido condensado-líquido expandido; L2, líquido-condensado; e S, sólido. C) Orientação das moléculas em
diferentes fases [1].
A observação da isotérmica mostra várias regiões distintas. Estas regiões são chamadas de fases. Como se
pode ver na figura 1.9.–A e B, quando a monocamada está comprimida, esta pode atravessar várias fases diferentes,
que são identificadas como discontinuidades na isotérmica. O comportamento da fase de monocamada é
principalmente determinado pelas propriedades físico-químicas do composto anfipático, a temperatura da subfase e
a composição da subfase. Por exemplo, existem vários estados de monocamadas, dependendo do comprimento da
cadeia de hidrocarbonetos e da magnitude de outras forças coesivas e repulsivas que existam entre a cabeça dos
grupos hidrofílicos. Um aumento no comprimento da cadeia, aumenta a atracção entre as moléculas, condensando a
isotérmica Π-A. Por outro lado, se é usado um composto anfipático ionizável, a ionização das cabeças dos grupos
hidrofílicos da cadeia, induzem as forças repulsivas que tendem a opor-se às transições de fase.
Uma terminologia simples, usada para classificar as fases de monocamadas de diferentes ácidos gordos, foi
proposto por Harkins em 1952 [18]. Na parte mais extensa, as monocamadas existem no estado gasoso (G) – estado
onde a compressibilidade é mínima. Na compressão este estado pode sofrer uma transição de fase para o estado
líquido-expandido (L1). À medida que compressão decorre, a fase L1 sofre uma transição para o estado líquido-
11
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
condensado (L2), e a densidades mais elevadas, a monocamada finalmente alcança o estado sólido (S). Se a
monocamada é comprimida, após se ter alcançado o estado S, ela colapsará em estruturas tridimensionais. O
colapso, é geralmente visto, como uma diminuição rápida na pressão superficial ou como uma quebra horizontal na
isotérmica, se a monocamada está num estado líquido. Neste caso, observa-se uma rápida e brusca diminuição da
pressão superficial à medida que ocorre a compressão.
Existem ainda outros pontos críticos numa isotérmica Π-A, tal como, a área molecular, na qual é observado
um aumento inicial acentuado na pressão superficial, Ai (pressão superficial à qual a transição de fase ocorre entre o
estado L1 e L2 e os estados L2 e S).
Seguindo as definições acima descritas, pode ver-se que o ácido gordo da figura 1.9.–A, tem três regiões
distintas: gás (G), líquido (L1) e sólido (S), enquanto que o fosfolípido tem uma fase de transição adicional quase
horizontal (L2-L1) entre as duas fases líquidas. Este é um caso muito comum para os fosfolípidos, e a posição desta
transição de fase horizontal é dependente da temperatura. À medida que a temperatura aumenta, o valor da pressão
superficial à qual a transição de fase horizontal ocorre, aumentará e vice-versa [19] (figura 1.10.). Desta forma, a
passagem da fase de transição L1 para L2 é fortemente afectada pela temperatura.
Temperatura
Π
A
Figura 1.10.: Alterações na forma da isotérmica (Π-A) com o aumento da temperatura [1].
Para além da temperatura, o comportamento da fase da monocamada é também afectado pelo número de
átomos de carbono e pelo grau de saturação das cadeias de hidrocarbonetos do grupo apolar de um composto
anfipático. Cadeias mais pequenas (contendo 10-14 átomos de carbono) existem apenas no estado L1, enquanto que
cadeias mais longas (contendo 18-22 átomos de carbono), existem apenas no estado L2. É ainda de salientar que, os
fosfolípidos com cadeias insaturadas existem muitas vezes apenas no estado L1, devido ao aumento da fluidez
provocada pela insaturação.
1.1.7.1. Fases dos filmes monomoleculares
Filmes monomoleculares mostram fases ordenadas semelhantes a sistemas tridimensionais, com uma
diferença específica que surge da sua estrutura molecular típica: eles podem formar uma malha bidimensional
pseudo-cristalina (posição ordenada), que é geralmente de alcance limitado, e uma orientação definida das
12
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
moléculas para moléculas vizinhas (ordem orientacional), que é frequentemente de longo alcance. Estas escalas de
diferentes ordens conduzem a uma variedade de fases. Estas fases são denominadas mesofases, tal como, para os
cristais líquidos, porque elas mostram os mesmos princípios de ordenamento. As fases de uma monocamada nas
isotérmicas, pressão-área (figura 1.9.–B), parecem ser bastante diferentes de substâncias para substâncias. Os ácidos
gordos, fosfolípidos, etc., em água, mostram frequentemente, as seguintes fases [13,23]:
Gasosa (G)
A equação que define este estado é dada por: ΠA = kBT. Esta pressão do filme, é porém, normalmente tão
B
pequena que é quase imperceptível. A área média por molécula na superfície é muito maior que a da molécula. A
área total pode ser expandida indefinidamente sem ter havido uma transição de fase. Há uma transição de fase de
primeira ordem para o estado líquido, que ocorre quando as monocamadas existentes no estado gasoso sofrem uma
compressão.
Filmes líquidos (L)
Nesta fase há uma interacção lateral significativa entre as moléculas. Existem pelo menos dois tipos de
fases líquidas:
Líquido expandido (LE ou L1): neste fase as moléculas tocam umas nas outras, mas não há nenhuma ordem
lateral. Elas são altamente hidratadas, e a equação de estado é frequentemente do tipo de Van der Waals. Para
hidrocarbonetos de cadeia longa com uma cabeça polar (por exemplo, ácidos gordos), esta área é aproximadamente
40-70 Å2 [1].
Líquido condensado (LC ou L2): Depois de passar um patamar em Πc, que indica uma transição de fase de
primeira ordem, ocorre uma fase de condensação de um líquido. Aqui, os lípidos exibem uma orientação inclinada
com um ângulo decrescente (medido perpendicularmente à subfase). O filme ainda é relativamente rígido, com
moléculas de água ainda presentes entre os grupos de cabeça polar. Os gráficos das isotérmicas Π-A são tipicamente
lineares.
Filmes sólidos (S)
Quando a área superficial é reduzida até ao ponto imediatamente antes de se atingir o colapso, a presença
de moléculas de água entre os grupos de cabeça polar é mínima. A partir deste ponto (normalmente, para Π entre
50-60 mN/m) os gráficos da isotérmica pressão superficial-área são lineares. A extrapolação para a pressão zero do
filme, resulta numa superfície que corresponde à área molecular resultante do cruzamento com o eixo das abcissas
(por exemplo, aproximadamente 20.5 Å2 para ácidos gordos com longas cadeias [19]). Neste estado, os filmes
sólidos têm uma elevada compressibilidade.
13
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
1.2. Aplicações de Filmes de Langmuir
Uma vez definidos os fundamentos teóricos da técnica de LB, importa também salientar algumas das suas
aplicações prácticas.
A técnica de LB, por definição, exige que as moléculas anfipáticas sejam adsorvidas na interface de duas
fases (líquido-líquido ou gás-líquido). Para as moléculas adsorverem na interface, o “equilíbrio anfipático”, ou seja,
o equilíbrio entre os componentes hidrofílicos e hidrofóbicos dentro da mesma molécula, deve ser o adequado para
as duas fases em estudo. Por exemplo, o equilíbrio anfipático de uma molécula, pode ser adequado para uma
interface ar-água, mas não para uma interface hexano-água. Consequentemente, a correcta escolha dos materiais, é
um factor a ter em conta.
1.2.1. Materiais adequados para a técnica de LB
Muitos investigadores têm produzido filmes de multicamadas usando a técnica de LB com moléculas que
têm apenas um pequeno componente hidrofílico e que flutuam literalmente na superfície da água. Rigorosamente
falando, estes não são filmes de LB.
Em geral, os materiais como os ácidos gordos e os álcoois de cadeia longa são usados na preparação de
filmes. A parte do hidrocarboneto, -CH2- da molécula, é responsável pela repulsão do material em relação à água,
enquanto que o grupo polar, -COOH ou –OH, tem afinidade suficiente para a água, “ancorando” a molécula na
subfase aquosa.
Numa interface ar-água, tais moléculas anfipáticas, orientam-se com a sua cadeia de hidrocarboneto
dirigida para o ar, e os grupos de cabeça hidrofílica dirigida para a fase aquosa:
Alguns dos materiais mais estudados na formação de monocamadas flutuantes são os ácidos carboxílicos e
os seus sais, e os álcoois de cadeias longas. O comprimento da cadeia do hidrocarboneto é crítica e o seu efeito na
tensão superficial da subfase é determinada pela regra de Traube, que diz que, para uma determinada série homóloga
de compostos anfipáticos, a concentração requerida por um igual abaixamento da tensão superfícial em soluções
diluídas, diminui por um factor de cerca de três por cada grupo adicional CH2.
1.2.2. Subfase aquosa
A subfase mais usada para o estudo de filmes monomoleculares é água ultra-pura. Normalmente, as
medições são efectuadas de forma a excluir qualquer contaminante da subfase, uma vez que, a introdução de iões em
água pura pode afectar drasticamente as propriedades da monocamada.
A preparação das soluções deve ser feita cuidadosamente, devendo ser usados reagentes de elevada
qualidade e água ultra-pura. Além disso, na subfase aquosa existem um número de variáveis, não necessariamente
independentes umas das outras. Uma mudança no equilíbrio iónico vai afectar o equilíbrio dentro da subfase. A
14
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
alteração da acidez e a adição de iões divalentes à subfase, permite um grau de controlo considerável sobre o
comportamento da monocamada e o sucesso da deposição de multicamadas.
1.2.3. Processo de deposição de filmes LB sobre um substrato (hidrofóbico ou
hidrofílico)
Dois tipos de superfícies podem formar camadas pela técnica de LB: hidrofóbica (repulsão da água) e
hidrofílica (atracção para a água). A deposição sobre uma superfície hidrofóbica assume sempre lugar na parte
inferior, enquanto que, para uma superfície hidrofílica, deposita-se sempre pela parte superior.
A superfície de um substrato coberta com um filme LB muda de hidrofóbica para hidrofílica com o
aumento do número de camadas. Consequentemente, quando uma superfície hidrofóbica é imergida e coberta com
uma monocamada, será completamente hidrofílica enquanto é imergida. Desta forma, quando é retirada da subfase e
uma segunda camada é depositada, a superfície será novamente hidrofóbica (figura 1.11.). Quando o substrato
sólido é hidrofílico (por exemplo, vidro), a primeira camada é depositada elevando o substrato sólido a partir da
subfase através da monocamada, enquanto que, se o substrato sólido é hidrofóbico (por exemplo, slide de ouro), a
primeira camada é depositada fazendo baixar o substrato na subfase através da monocamada [24].
Sentido da sequência do processo de deposição
A)
B)
C)
Figura 1.11.: Esquema da deposição de filmes de Langmuir sobre um substrato hidrofóbico. A superfície imergida
do substrato torna-se hidrofílica depois da deposição da primeira camada – A), e fica novamente hidrofóbica, depois
da deposição da segunda camada – B) e C).
Para se determinar que tipo de superfície temos, basta imergir o substrato na subfase. Se o menisco curvar
em baixo, a superfície é hidrofóbica (figura 1.12.–A); se curva em cima, então a superfície é hidrofílica (figura
1.12.–B).
15
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Sentido da sequência do processo de deposição
A)
B)
Figura 1.12.: Esquema representativo do tipo de superfície obtida quando o substrato sólido é imergido na subfase.
A) O menisco curva em baixo, a superfície é hidrofóbica. B) O menisco curva em cima, a superfície é hidrofílica.
No processo de deposição, a transferência do filme de LB para o substrato resultará da aderência da
“cauda” hidrofóbica do hidrocarboneto ao substrato sólido hidrofóbico. Com um substrato hidrofílico, não ocorrerá
nenhuma deposição ordenada, porque as “caudas” hidrofóbicas são repelidas pelo substrato hidrofílico à media que
este é imergido na água.
Por essa razão, um número par de camadas (2, 4, 6...) são sempre depositadas sobre uma superfície
hidrofóbica, e um número ímpar (1, 3, 5...) sobre superfícies hidrofílicas.
A qualidade superficial e a composição do substrato controlam a natureza da subsequente camada
depositada. A deposição da primeira camada também é importante, uma vez que, esta determina a maneira pela qual
as camadas subsequentes são colocadas. Para que a qualidade do filme seja consistente, as monocamadas devem ser
mantidas a uma pressão constante, mesmo quando a transferência está a ocorrer.
Num substrato hidrofílico a primeira monocamada é depositada no primeiro movimento ascendente do
substrato sólido (figura 1.13.). Quando se utilizam este tipo de materiais, o substrato deverá ser imergido na subfase
antes de iniciar o espalhamento e compressão da monocamada, por forma a impedir a formação de filmes de
agregados moleculares depositados sobre a superfície hidrofílica durante o primeiro movimento.
Figura 1.13.: Humedecimento e deposição da primeira monocamada sobre um substrato hidrofílico.
16
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
1.2.4. Tipos de deposição de filmes de LB
Existem uma grande variedade de formas que permitem a transferência de monocamadas de filmes de LB
para um substrato sólido.
As interacções moleculares envolvidas na deposição da primeira camada podem ser bastante diferentes
daquelas que são responsáveis pela transferência das camadas subsequentes. Por exemplo, pode ocorrer uma reacção
química entre a monocamada e o substrato [25], resultando numa forte ligação da primeira camada. Para alguns
materiais, a deposição de filmes parece também estar associada com uma mudança de fase distinta: de uma fase
líquida bidimensional cristalina na superfície da água, para uma forma sólida cristalina compactada no substrato
[26].
Na figura 1.14., é representado um diagrama esquemático que ilustra o processo de deposição de filmes LB
num substrato sólido.
Linha de contacto
de três fases
Camada aquosa intrínseca
Subfase aquosa
Substracto sólido
Monocamada na superfície líquida
A)
Substracto sólido
cabeça - cauda
cauda - cauda
cauda - cabeça
cabeça - cabeça
B)
tipo-X numa superfície
hidrofóbica
tipo-Y numa superfície
hidrofílica
tipo-Z numa superfície
hidrofílica
Figura 1.14.: A) Deposição de uma monocamada flutuante num substrato sólido. B) Diferentes tipos de deposição
de filmes LB num substrato sólido: tipo-X, tipo-Y e tipo-Z.
A deposição LB é feita tradicionalmente na fase “sólida”. A pressão superficial, é então, bastante elevada
para assegurar a coesão suficiente na monocamada, por exemplo, a atracção entre as moléculas na monocamada é
bastante elevada de forma a que, a monocamada não se quebre durante a transferência para o substrato sólido. O
valor da pressão superficial que dá o melhor resultado, depende da natureza da monocamada, e são normalmente
estabelecidas empiricamente. Porém, raramente podem ser depositados com sucesso compostos anfipáticos a
pressões superficiais inferiores a 10 mN/m, e a pressões superficiais superiores a 40 mN/m, pois as estas pressões o
colapso e a rigidez dos filmes causam problemas, impedindo a deposição.
Há vários parâmetros que afectam a produção dos tipos de filmes LB. Os mais importantes são: (i) a
natureza da dispersão do filme sobre a subfase; (ii) a composição da subfase e a temperatura; (iii) a pressão
17
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
superficial durante a deposição e a velocidade de deposição; (iv) o tipo e natureza do substrato sólido; (v) e o tempo
que o substrato sólido é armazenado ao ar ou na subfase entre os ciclos da deposição.
A quantidade e a qualidade da monocamada depositada num substrato sólido são medidas por uma
velocidade de transferência, τ. Esta é definida como a razão entre a diminuição da área ocupada pela monocamada
na superfície aquosa durante uma deposição (a uma pressão constante), AL, e a área coberta do substrato sólido, AS
[27]:
τ = AL/AS (1.6.)
Idealmente, cada vez que o substrato cruza a interface ar-água, a superfície do substrato é completamente
coberta por uma monocamada, originando uma τ de 100%.
Dependendo do comportamento da molécula, os substratos sólidos podem ser imergidos através do filme,
até serem alcançadas as espessuras desejadas do filme. Diferentes tipos de multicamadas LB podem ser produzidas
e/ou obtidas por sucessiva deposição de monocamadas no mesmo substrato (figura 1.14.). O mais comum é a
multicamada do tipo-Y, que é produzida quando a monocamada é deposita no substrato sólido em ambas direcções.
Quando a monocamada só deposita numa das direcções, cima ou baixo, a estrutura da multicamada é
chamada do tipo-Z ou do tipo-X, respectivamente. Por vezes são observadas estruturas intermédias para algumas
multicamadas LB, e são referidas frequentemente, como sendo multicamadas do tipo-XY, designadas camadas
alternadas.
A produção de tais camadas, que consistem em dois tipos diferentes de compostos anfipáticos, é também
possível usando instrumentos altamente sofisticados. Nestes instrumentos, existe uma tina com dois compartimentos
separados, ambos possuindo uma monocamada flutuante de um composto anfipático diferente. Estas monocamadas
podem depois ser alternadamente depositadas num substrato sólido.
Um modo alternativo para depositar a monocamada é a técnica de Langmuir-Schaeffer (LS). Esta técnica
difere da técnica vertical descrita anteriormente, apenas no que diz respeito ao facto do substrato sólido ser
mergulhado horizontalmente em contacto com a monocamada.
Honig et al. [28] sugeriram o uso de outro parâmetro, φ, para ajudar a quantificar os vários modos de
deposição. Este pode ser calculado da seguinte forma:
φ = τA/τD
(1.7.)
onde, τA e τD são as velocidades de deposição da passagem ascendente e descendente, respectivamente.
Consequentemente, para uma deposição do tipo-Y, φ = 1; para a deposição do tipo-X, φ = 0; e para a deposição tipoZ, φ é infinito.
As monocamadas dos ácidos gordos depositam normalmente como camadas do tipo-Y [1]. Contudo, a
deposição do tipo-X é possível com mudanças ligeiras nas condições de deposição; a deposição do tipo-X é
normalmente favorecida para valores de pH elevados [29]. No primeiro ciclo da deposição não é usual haver
formação de filmes do tipo-X, mas o caracter do filme torna-se do tipo-X à medida que a deposição prossegue
[28,29]. Por exemplo, para os fosfolípidos a deposição observada foi do tipo-X [30].
18
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
1.3. Métodos Voltamétricos
De entre os vários métodos disponíveis para estudar os processos de eléctrodo, os métodos de varrimento
de potencial são provavelmente os mais usados [31]. Estes métodos consistem na aplicação de um potencial que é
variado continuamente com o tempo, o que conduz à ocorrência de reacções de oxidação ou de redução de espécies
electroactivas presentes na solução (reacções faradaicas), possivelmente devido à adsorção de espécies, e a uma corrente capacitiva devida à carga de dupla camada. A técnica de varrimento de potencial é normalmente usada em
eléctrodos estacionários, mas também pode ser usada em eléctrodos hidrodinâmicos.
A voltametria é quantitativamente importante no estudo de interfaces moleculares, no diagnostico de
mecanismos de reacções electroquímicas, na identificação de espécies presentes em solução e para a análise de
velocidades de reacções [32]. Uma das formas de perturbação do potencial frequentemente usada em
electroquímica, é a voltametria cíclica de varrimento linear.
1.3.1. Voltametria Cíclica
A voltametria cíclica é das técnicas electroquímicas mais usada no estudo de espécies electroactivas.
Embora possa ser aplicada com fins quantitativos é mais utilizada como técnica de diagnóstico. A vantagem em
relação às outras técnicas, consiste em se poder aplicar diferentes escalas de tempo, isto é, diferentes velocidades de
varrimento, permitindo o estudo de fenómenos com velocidades lentas e rápidas.
A gama de potencial é varrida numa direcção, começando no potencial inicial até ao potencial final, sendo
a direcção do potencial invertida no final do primeiro varrimento. Assim, a onda tem, normalmente, a forma de um
triângulo isósceles, tal como é mostrado na figura 1.15.–A, ou seja, o potencial aumenta linearmente até um valor
limite e diminui até ao seu valor inicial, com a mesma velocidade. Desta forma, o produto da reacção da
transferência electrónica que eventualmente ocorra no varrimento directo, pode ser analisado novamente no
varrimento inverso (figura 1.15.–B). O ciclo pode ser repetido várias vezes [32]. Para se obter o voltamograma
cíclico regista-se o gráfico intensidade de corrente em função do potencial aplicado. Esta técnica, é uma ferramenta
importante para: (i) a determinação formal de potenciais redox; (ii) detecção de reacções químicas que precedem ou
seguem a reacção electroquímica; (iii) e evolução cinética das reacções que envolvem transferências electrónicas.
Atendendo à representação da figura 1.15., tem-se que, no começo da experiência, a solução contém apenas
a forma reduzida do par redox (R), por isso, a potenciais mais baixos que o potencial redox, que é o potencial inicial,
não há nenhuma conversão do R em O (forma oxidada) – ponto A. À medida que o potencial redox é alcançado, há
uma corrente anódica líquida que aumenta exponencialmente com o potencial. Como R é convertido em O, os
gradientes de concentração são fixos acima de R e O, e a difusão acorre abaixo destes gradientes de concentração.
No pico anódico (ponto B), o potencial redox é suficientemente positivo, que qualquer R que alcance a superfície do
eléctrodo é oxidado instantaneamente a O. Consequentemente, a corrente depende agora da velocidade de
transferência de massa à superfície do eléctrodo. No varrimento inverso (ponto C), a corrente continua a decair até o
potencial se aproximar do potencial redox. Neste momento, ocorre uma redução de O para R, que causa uma
corrente catódica, que eventualmente produz uma resposta em forma de pico (ponto D).
19
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Potencial / mV
A)
B)
Figura 1.15.: A) Exemplo de um varrimento de potencial, utilizando a voltametria cíclica. B) A forma da resposta
da corrente para uma experiência de voltametria cíclica [33].
Em voltametria cíclica, quando ocorre transferência de um ião através da interface, observa-se um aumento
de corrente no voltamograma, no potencial de transferência do ião. Este aumento de corrente resulta do maior fluxo
de iões através da interface a partir do potencial característico do ião. No entanto, à medida que a transferência
ocorre, a concentração do ião na vizinhança da interface diminui e os iões têm que percorrer uma distância maior, do
seio da solução até à interface, resultando numa diminuição da intensidade de corrente com a diminuição do
potencial e uma resposta em forma de pico.
1.4. As ITIES, a dupla camada eléctrica e a microinterface.
A electroquímica nas interfaces líquido-líquido
Tal como no caso do estudo de interfaces moleculares utilizando a técnica de LB, a electroquímica das
interfaces moleculares também tem sido objecto de grande interesse nos últimos anos. São exemplos destes avanços
a aplicação de métodos de dinâmica molecular no estudo de estruturas interfaciais, avanços na teoria da
transferência electrónica e iónica através de um meio heterogéneo, entre outros.
As propriedades electroquímicas das interfaces menos usuais, como emulsões e suspensões coloidais,
despertaram grande interesse na última década. Recentemente de especial interesse, são os estudos de dupla camada
na interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis (ITIES), microinterfaces líquido-líquido e microinterfaces
gel-líquido.
20
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
1.4.1. Interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis (ITIES)
Quando duas fases electricamente condutoras (α e β) são colocadas em contacto, ocorre o transporte de
partição de carga (isto é, electrões e/ou iões) entre as duas fases adjacentes, por causa da diferença na energia das
espécies transportadoras em ambas as fases. Este comportamento espontâneo gera uma região interfacial onde é
estabelecida uma diferença de potencial eléctrica Galvânica ( Δ β φ ):
α
Δαβ φ = φα – φβ (1.8.)
onde, φ representa o potencial Galvânico (ou interno) das respectivas fases. O equilíbrio termodinâmico é alcançado
quando a energia molar de Gibbs para a espécie i é igual em ambas as fases. Em termos de potenciais
electroquímicos, aplica-se a seguinte equação:
~α = μ
~β
μ
0
0
(1.9.)
~ , que representa o trabalho requerido para transferir o ião i do vazio para
O potencial electroquímico, μ
0
uma fase α, pode ser dividido numa parte química e eléctrica:
~ α = μ α + z Fφ α
μ
0
0
i
(1.10.)
onde, zi é a carga do ião, F é a constante de Faraday, e μ0α é o potencial químico da espécie i na fase α, e é definido
da seguinte forma:
μ0α = μ0org,α + RTln a0α
(1.11.)
com, μ0org,aq correspondendo ao potencial químico padrão (os expoentes aq e org representam a fase aquosa e
orgânica, respectivamente), e a0α correspondendo à actividade do ião na fase α. R e T, são a constante para os gases
ideais e a temperatura, respectivamente.
As ITIES são formadas quando uma solução aquosa contendo um electrólito hidrofílico (por exemplo,
cloreto de lítio, LiCl) e uma solução orgânica contendo o electrólito hidrofóbico (por exemplo, tetrafenilborato de
tetraoctilamónio, TOATPB) são colocados em contacto. A região interfacial entre duas fases imiscíveis, onde
espécies carregadas e dipolos orientados coexistem, é chamada a dupla camada eléctrica [34].
Koryta et al. [35] reconheceram que a interface entre uma solução aquosa e uma solução orgânica
(líquido-líquido) pode ser usada como um modelo simplificado para uma membrana biológica. Estes autores
começaram também a usar para a interface líquido-líquido (L-L) a designação de ITIES (interface entre duas
soluções de electrólitos imiscíveis). O seu objectivo inicial era o de estabelecer métodos experimentais na interface
de L-L de forma a melhorar o conhecimento sobre as membranas biológicas.
Segundo Vanýsek [34], uma das propriedades da interface L-L é a sua vasta aplicação em electroanálise.
21
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Assim, no caso da interface metal-líquido, a resposta eléctrica observada resultante de um estímulo eléctrico
aplicado, é devido principalmente à oxidação ou redução da mesma espécie na interface. No caso da interface L-L, a
mudança observada na resposta (a corrente ou o potencial), à perturbação do estímulo eléctrico (potencial ou
corrente), é o resultado da passagem (transporte) de iões através da interface.
É importante salientar que, o transporte de carga, quer os processos de oxidação-redução na interface levam
a um aumento da corrente do circuito eléctrico, e porque, geralmente, o processo limitante pode ser qualquer dos
casos, a difusão observada será uma resposta idêntica qualquer que seja o tipo de interface utilizada, podendo os
conhecimentos que se detêm sobre as interfaces eléctrodo-solução ser transpostos para as interfaces L-L.
As ITIES, podem ainda ser utilizadas no estudo da formação de uma monocamada de fosfolípidos,
resultante da sua adsorção na interface, podendo servir como um modelo simples de uma membrana biológica.
As suas aplicações incluem ainda a catálise heterogénea e nanopartículas metálicas adsorvidas na interface
como centros catalíticos, extracção de solvente, farmacocinética e conversão de energia solar que envolve
transferência electrónica foto-excitada [34].
1.4.2. Interfaces líquido-líquido idealmente polarizáveis
Interfaces electrificadas são as que contêm espécies carregadas livres entre as fases que estão habitualmente
acumuladas nas regiões superficiais dando, como tal, origem a um conjunto de cargas em cada fase [34].
Quando as espécies carregadas estão presentes nas duas fases, deve verificar-se a electroneutralidade.
Contudo, estas espécies carregadas podem, ou não, atravessar a interface. Desta forma, existem dois tipos de
interface conhecidos: polarizadas e não-polarizadas. As interfaces idealmente não-polarizadas são aquelas em que a
troca de espécies carregadas comuns entre as fases é permitida, enquanto que nas interfaces idealmente polarizadas a
troca é impedida, ou não há espécies comuns nas duas fases.
Por exemplo, se uma fase orgânica contém um electrólito altamente hidrofóbico B1A1 ou B1+ e A1-, e uma
B
fase aquosa contém um electrólito altamente hidrofílico B2A2 ou B2+ e A2-, a interface pode ser estudada usando a
seguinte célula electroquímica [36]:
R1| B1+, A1- (org)| B2+, A2- (aq)| R2
(1.12.)
onde, Bi+ e Ai- (i = 1,2) representam o catião e o anião, respectivamente, e Ri (i = 1,2) o eléctrodo de referência.
B
O campo eléctrico aplicado à interface água-solução orgânica, é efectuado através dos dois eléctrodos de
trabalho com uma fonte eléctrica externa. O potencial da célula, E, é definido como o potencial terminal do
eléctrodo de referência da direita, em relação ao potencial terminal da esquerda, e está relacionado com a diferença
de potencial através da interface [36]:
Δφ = Δwo φ = φw- φo e E = Δφ + ΔEref
(1.13.)
onde, φo é o potencial Galvânico da fase α, e ΔEref depende da composição dos dois eléctrodos de referência.
Consequentemente, na interface idealmente polarizável (figura 1.16.), os electrólitos não se distribuem
entre os dois solventes ou distribuem-se em pequena extensão, existindo principalmente na fase onde foram
22
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
inicialmente dissolvidos [37].
Figura 1.16.: Ilustração da camada mista numa interface água/o-NPOE (éter o-nitrofeniloctílico) idealmente
polarizável.
1.4.3. Dupla camada eléctrica numa interface líquido-líquido
A dupla camada eléctrica existe, quando entre duas fases separadas, pelo menos, uma delas é um condutor
iónico ou electrónico.
aq
Nestas condições, Δ org φ (equação 1.13.) é controlado pela carga eléctrica na região interfacial que pode
ser fornecida por uma fonte externa. Esta situação é semelhante a um eléctrodo sólido idealmente polarizado, tal
como é mostrado na figura 1.17. Em ambos os casos, as duas fases são caracterizadas por um excesso de carga na
interface. Porém, para eléctrodos sólidos (figura 1.17.–B), o excesso de carga no lado metálico origina um processo
puramente electrónico e é distribuído à superfície do metal (ou seja, no plano). No lado do electrólito, o excesso de
carga resulta da acumulação de iões de carga oposta relativamente à do metal e é distribuído dentro de uma
espessura finita, chamada camada difusa. A queda de potencial é localizada nesta camada.
Por outro lado, no caso de uma interface líquida, (figura 1.17.–A), a polarização é um fenómeno puramente
iónico, desde que ambas as regiões de excesso de carga envolvam iões. Neste caso, a queda de potencial poderá ser
descrita em termos de duas camadas difusas.
23
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
d.c. d.c.
Relatório de Seminário
d.c.
Figura 1.17.: Representação esquemática da carga de uma interface líquido-líquido idealmente polarizável por uma
fonte externa e correspondente evolução da queda de potencial como uma função da distância para a interface:
A) Caso de uma interface líquido-líquido; B) Caso de uma interface metal-líquido.
Nota: d.c. representa a dupla camada. [36]
Girault e Schiffrin [38,39] sugeriram ainda que, a região interfacial consistiria numa região de mistura de
solventes onde haveria uma gradual modificação das propriedades, particularmente da concentração de iões em
ambas as fases, e que separava duas camadas difusas (figuras 1.16. e 1.17.–A). Esta modificação considerava a
penetração de iões em ambas as fases adjacentes na interface.
1.4.4. Janela de potencial
Numa interface idealmente polarizável não ocorre nenhum processo faradaico, desde que todos os
componentes do sistema sejam considerados como tendo uma energia de transferência padrão de Gibbs infinita [36].
Desde que, as espécies iónicas tenham solubilidade finita em qualquer fase do electrólito, a interface líquido-líquido
idealmente polarizável pode ser definida numa gama de potencial limitado. A esta gama dá-se o nome de “intervalo
de polarização” (figura 1.18.), e a diferença de potencial Galvânica pode ser controlada potenciostaticamente.
24
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
1
2
1
2
Δ aqorg φ
1
2
1
2
1
2
Figura 1.18.: Representação esquemática do processo interfacial dentro da janela de potencial: interface entre a fase
aquosa (1) e a fase orgânica (2). [36]
Como os electrólitos não existem apenas na fase onde foram dissolvidos, existe um intervalo de
polarizabilidade, sendo esse intervalo dependente da composição de ambas as fases.
Assim, se na fase aquosa existir um sal do tipo A1- B1+ (hidrofílico) e na fase orgânica um sal do tipo A2B2+ (hidrofóbico), a transferência do ião B1+ da fase aquosa para a fase orgânica ocorrerá a potenciais positivos, tal
B
como a transferência do ião A2- da fase orgânica para a fase aquosa, dependendo do valor da energia de Gibbs de
cada espécie. De igual modo, a transferência do ião A1- da fase aquosa para a fase orgânica ocorrerá a potenciais
mais negativos, tal como a transferência do ião B2+ da fase orgânica para a fase aquosa. A diferença de potenciais de
transferência destes iões constitui um intervalo, no qual, a interface se comporta como idealmente polarizável.
Consequentemente, torna-se possível a determinação voltamétrica, fazendo uso das ITIES, das espécies cujos
potenciais de transferência estejam compreendidos entre os potenciais de transferência dos iões que constituem os
electrólitos de suporte, isto é, cujos potenciais de transferência se situem no intervalo de polarização ou "janela de
potencial" (figura 1.18.).
Esta janela pode ser expandida usando electrólitos de suporte mais hidrofóbicos e hidrofílicos na fase
orgânica e na fase aquosa, respectivamente, desde que este tipo de sais necessite de uma elevada energia para
transferir para a fase adjacente [36].
Neste trabalho foi utilizado o TOATPB como electrólito de suporte na fase orgânica e NaCl na fase aquosa.
A voltametria cíclica pode ser utilizada como técnica de diagnóstico quando se pretende verificar se a
interface se comporta como idealmente polarizada ou se ocorre transferência iónica. Um voltamograma cíclico
típico de uma situação em que os únicos iões presentes são os do electrólito de suporte encontram-se representado
na figura 1.19.
25
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
60
40
I / μA
20
0
-20
-40
I
II
III
-60
-700
-600
-500
-400
-300
-200
-100
E / mV
Figura 1.19.: Voltamograma cíclico demonstrando as três zonas distintas que o constituem usando a seguinte célula
electroquímica:
AglAgCl | LiCl 100 mM(aq) || TOATPB 10 mM(1,2-DCE) | NaTPB, NaCl 10 mM(aq) | AgCl|Ag.
Neste caso, a diferença de potencial medida corresponde à diferença entre o potencial da fase aquosa e o
potencial da fase orgânica. Assim, a variação de intensidade de corrente nos potenciais mais positivos deve-se à
transferência do catião lítio da fase aquosa para a fase orgânica, ou do anião tetrafenilborato da fase orgânica para a
fase aquosa. Nos potenciais mais negativos a variação da intensidade de corrente deve-se à transferência do anião
cloreto da fase aquosa para a fase orgânica, ou do catião tetraoctilamónio da fase orgânica para a fase aquosa.
Os estudos voltamétricos nas ITIES estão limitadas à zona II, isto porque, se pode considerar como tendo
um comportamento idealmente polarizável. As zonas I e III comportam-se como interfaces não-polarizáveis. O
aumento brusco da intensidade de corrente nas zonas I e III, deve-se à transferência de um ião ou iões do electrólito
de suporte. Enquanto que a intensidade de corrente na zona II deve-se a uma corrente residual.
1.4.5. Transferência Iónica
A forma do sinal que se obtém no voltamograma cíclico devido à transferência de um ião depende do tipo
de difusão que as espécies sofrem até à interface [40]. Podem ser observados dois tipos de difusão: a difusão planar,
ou seja, a difusão que é unidireccional e perpendicular a um dado plano, designada de difusão linear; e a difusão que
se distribui em todas as direcções, designa-se por difusão esférica [41]. A difusão linear verifica-se, geralmente, nas
macro-ITIES, enquanto que, a difusão esférica pode ocorrer quando a interface apresenta uma área reduzida, como é
o caso das micro-ITIES [42,43].
A voltametria cíclica tem uma aplicação importante, que consiste na determinação dos coeficientes de
difusão e dos potenciais de meia onda das espécies iónicas, e consequente, a determinação da energia de Gibbs para
26
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
essas espécies [44].
Nas interfaces líquido-líquido, são ainda possíveis três tipos de transferência de carga: transferência iónica
(TI), transferência iónica facilitada (TIF) e transferência electrónica (TE). Se existir um ião semi-hidrofóbico em
qualquer uma das fases, transferirá dentro da janela de potencial e ocorrerá um fluxo da corrente faradaica. Contudo,
estes processos de transferência não serão aqui discutidos.
A redistribuição iónica gerará uma resposta de corrente. Efectivamente, para restabelecer a
electroneutralidade de cada fase, ocorrerão reacções redox nos contra-eléctrodos (eléctrodos associados ao eléctrodo
de trabalho, que conduzem a corrente eléctrica através da solução) presentes nas soluções aquosa e orgânica. Por
convenção, a corrente é positiva para a passagem de uma carga positiva da fase aquosa para a fase orgânica.
A onda voltamétrica obtida para uma transferência catiónica reversível é esquematicamente mostrada na
figura 1.20.
Δaqorg φ eq
1
2
1
Δaqorg φ
2
Figura 1.20.: Representação do estado estacionário da evolução da corrente para a transferência catiónica ou
aniónica entre a fase aquosa (1) e a fase orgânica (2).
Existem várias formas de definir a escala de potencial. Entre elas pode referir-se a definição de escala de
potencial proposta por Girault e Schiffrin [45] usando o potencial de carga zero (pcz) como o ponto zero. O pcz é
uma quantidade prontamente acessível que pode ser medida usando um eléctrodo de electrólito de corrente [46,47]
ou por representação gráfica das curvas de electrocapilaridade.
1.4.6. Transporte de massa nas ITIES: migração, convecção e difusão
Nas ITIES, tal como para as interfaces metal-líquido, podem ocorrer três tipos de transporte de massa: (i)
migração, (ii) convecção e (iii) difusão.
Desta forma, o transporte de massa de uma espécie (i) é totalmente descrito pela equação de Nernst-Planck
[33]:
Ji = Ji,m + Ji,c + Ji,d
(1.14)
onde, o fluxo de i é igual à soma do fluxo de migração (Ji,m), do fluxo de convecção (Ji,c) e do fluxo de difusão (Ji,d).
A migração corresponde ao deslocamento das partículas carregadas por aplicação de um potencial eléctrico
φ. O fluxo resultante das espécies é dado por:
27
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Ji,m = – (ziF/RT)Dici (grad φ)
Relatório de Seminário
(1.15.)
onde, zi, Di e ci são a carga, o coeficiente de difusão e a concentração do ião, respectivamente.
A migração é o principal mecanismo que permite a passagem de carga através da solução quando uma
corrente é aplicada. Porém, desde que a carga possa ser transportada por qualquer espécie iónica, uma concentração
elevada do electrólito de suporte, originará um aumenta significativo na condutividade da solução, de tal modo que
apenas uma quantidade desprezável de espécies electroactivas são transportadas por migração. Consequentemente, o
termo Ji,m pode ser desprezado da equação 1.14., quando as espécies i estão na presença de sais concentrados do
electrólito de suporte.
A convecção é o movimento das espécie induzidas pelo movimento do meio no qual a espécie está
presente. Este movimento pode ser resultado de flutuações da temperatura ou da agitação mecânica. O fluxo de
convecção é escrito da seguinte forma:
Ji,c = civ
(1.16.)
onde, v é a velocidade hidrodinâmica da solução e c, é a concentração da solução. Na maioria das experiências de
soluções líquido-líquido, as soluções não são agitadas e os eléctrodos são estáticos (sem rotação, nem vibração), por
isso, o sistema não sofre nenhuma convecção forçada. A temperatura também é constante na escala do tempo das
experiências. Desde que, a convecção forçada e natural sejam eliminadas, o termo de convecção na equação 1.14.
pode ser desprezado.
Finalmente, a difusão é o movimento da espécie devido a um gradiente de potencial químico onde as
espécies provocaram o abaixamento desse gradiente para alcançar a homogeneidade ao longo da solução. O fluxo de
difusão para uma espécie dissolvida i é determinado por:
Ji,d = –Di(grad φ)
(1.17.)
Sendo o transporte de migração e convecção desprezáveis na maioria das experiências nas ITIES, o
movimento das espécies electroactivas é limitado pela difusão, de modo que, a equação de fluxo, (equação 1.14.)
reduz-se somente à primeira lei de Fick expressa pela equação 1.17. A corrente, que está directamente relacionada
com fluxo Ji, é consequentemente, originada pela chegada e remoção de espécies electroactivas difundidas até à
interface.
Nas ITIES a relação entre a intensidade de corrente de transferência e a concentração iónica apresenta uma
forma idêntica à das reacções redox [48]. A expressão da equação 1.18. permite quantificar a intensidade de corrente
para uma transferência iónica, quando a transferência ocorre por difusão num microeléctrodo [49], e é dada por:
Id = 4.zi.F.Di.a.Ci (1.18.)
onde, Id, zi, F, Di, a e Ci, são a intensidade de corrente de difusão, a carga do ião, a constante de Faraday (~96484
C.mol-1), o coeficiente de difusão do ião, a área da interface e a concentração da espécie i em solução,
respectivamente.
Uma outra expressão que pode ser utilizada para quantificar a intensidade de corrente para uma
28
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
transferência iónica reversível, quando a transferência ocorre por difusão é dada pela equação de Randles-Sevcik
[33]:
Id = 0,4463.zi.F.a.Ci.(zi.F/RT)1/2.(Di)1/2.ν1/2
(1.19.)
onde, os símbolos têm o mesmo significado que anteriormente, e ν é a velocidade de varrimento. No entanto esta
relação só é válida para processos reversíveis, isto é, a transferência que satisfaçam as seguintes condições:
1.
os potenciais de transferência são independentes da velocidade de varrimento;
2.
a diferença entre os potenciais de pico de transferência é igual a 59/z mV a 25 ºC;
3.
a relação da intensidade de corrente de pico com a raiz quadrada da velocidade de varrimento tem que
passar pela origem.
1.5. Espectroscopia de impedância electroquímica (EIE)
A impedância electroquímica ou espectroscopia de impedância, é uma técnica utilizada no estudo e
caracterização de sistemas electroquímicos, principalmente por ser uma técnica não destrutiva [50]. Esta técnica é
muito utilizada em estudos da dupla camada eléctrica e no estudo de membranas biológicas [36], entre muitas outras
aplicações.
1.5.1. A impedância nas interfaces líquido-líquido
Esta técnica consiste na aplicação, ao sistema em estudo, de uma perturbação sinusoidal de pequena
amplitude e na medição da resposta do sistema à perturbação, quando este se encontra em estado estacionário.
No estudo de estímulos sinusoidais, a propriedade do sistema que resulta da relação entre a intensidade de
corrente e o potencial aplicado é denominada a impedância, podendo ser definida como:
Z = dE / dI (1.20.)
A impedância pode ser representada de duas formas:
a) uma escalar, usando os números complexos, onde a impedância é definida como:
Z = Z’−iZ’’ (1.21.)
onde, Z’ e Z’’, são respectivamente as componentes real e imaginária da impedância.
29
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
A grandeza da impedância pode ser calculada pela seguinte equação:
|Z| = [(Z’)2 + (-iZ’’)2]1/2
(1.22.)
b) também pode ser representada de forma vectorial, utilizando um sistema de eixos
cartesianos. Na figura 1.21. pode observar-se uma representação esquemática do vector impedância.
Figura 1.21.: Representação vectorial da impedância.
É possível decompor a impedância nos seus componentes, projectando o vector sobre cada um dos eixos. A
projecção sobre o eixo das ordenadas, corresponde à componente imaginária da impedância, Z’’, e a projecção
efectuada sobre as abcissas corresponde à parte real da impedância, Z’:
Z’ = |Z| cosφ e Z’’ = |Z| senφ (1.23.)
O valor de φ pode ser calculado aplicando a seguinte expressão:
φ = arctg(Z’’/Z’)
(1.24.)
Utilizando um circuito eléctrico equivalente, pode efectuar-se o ajuste dos resultados experimentais e a sua
respectiva interpretação.
Na figura 1.22., encontra-se representado o circuito de Randles [51], que representa o equivalente eléctrico
de um processo de transferência de carga reversível.
Figura 1.22.: Circuito equivalente de Randles: Rs representa a resistência da solução, Cdc, a capacidade da dupla
camada, Rtc a resistência de transferência de carga (associado à cinética do processo de transferência electrónica ou
iónica) e W a impedância de Warburg. [50]
30
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
A impedância de um sistema é o resultado da adição (vectorial) da impedância de cada um dos
componentes que fazem parte do sistema. Na figura 1.22. encontram-se os componentes que normalmente são
utilizados para a simulação de resultados de impedância dos processos que ocorrem em sistemas líquido-líquido. A
impedância associada a uma resistência, ZR, é definida por:
ZR = R
(1.25.)
Ainda no circuito da figura 1.22., W representa a impedância de Warburg que está relacionada com os
processos de transporte de carga controlados por difusão. A sua expressão analítica é complexa, mas normalmente
utiliza-se na sua forma simplificada [52]:
ZW = (1 – i)(σ/ω1/2)
(1.26.)
onde ω, representa a frequência angular, e σ, o coeficiente de difusão de Warburg.
O valor de σ, para a transferência iónica através das ITIES, é o resultado da soma dos coeficientes de
Warburg, da espécie que se transfere, na fase aquosa, σaq, e na fase orgânica, σo.
A resistência de transferência de carga, Rtc, e a impedância de Warburg, ZW, estão associadas em série
porque os processos ocorrem em sequência, o primeiro referente à transferência de carga através da interface e o
segundo ao transporte de massa das espécies electroactivas do seio da solução até à interface.
A capacidade da interface, Cd, que se encontra em paralelo com os dois componentes anteriores, representa
a distribuição de carga na dupla camada eléctrica. A sua impedância é definida do seguinte modo:
ZC = (−i/Cω)
(1.27.)
A impedância total é calculada de acordo com as leis dos circuitos eléctricos. Quando as impedâncias Z1 e
Z2 se encontram em série, a impedância total, Zt, é igual a:
Zt = Z1 + Z2
(1.28.)
Se os componentes se encontram em paralelo, Zt é calculada por:
Zt = (Z1Z2) / (Z1 +Z2)
(1.29.)
Na figura 1.23. está representado um espectro de impedâncias, ou representação de Nyquist (também
designado por diagrama de Argand). Os resultados foram obtidos a partir de uma simulação efectuada utilizando o
circuito equivalente de Randles da figura 1.22.
31
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Z'' / Ω
2000
1000
0.1 Hz
10 KHz
0
0
1000
2000
3000
4000
5000
Z' / Ω
Figura 1.23.: Espectro de impedâncias calculado a partir do circuito de Randles, usando os seguintes valores para os
diferentes componentes: Rs = 1000 Ω; Rtc = 1500 Ω; σ = 1000 ΩS-1/2; Cd = 1 μF. A simulação foi efectuada
utilizando o programa “ZSimpWin” para o Windows.
Pereira [38], salienta que utilizando estes modelos, é possível efectuar a determinação dos diferentes
parâmetros sem erros exagerados. Contudo, quando se pretendem ajustar resultados experimentais, a existência de
erros associados à medição, mesmo que aleatórios ou devido ao simples ruído eléctrico, torna a tarefa de ajuste, em
alguns casos, praticamente impossível.
Alguns trabalhos [53,54,55] demostraram a importância da utilização de métodos de ajuste não-linear para
minimizar os erros introduzidos na determinação dos parâmetros dos circuitos equivalentes, e ainda a introdução de
procedimentos para a validação dos resultados experimentais [56].
Para encontrar-mos o melhor circuito equivalente a utilizar, devemos ter em conta algumas regras: (1) o
circuito deve ser análogo às propriedades físico/geométricas do sistema (ou seja, deve ser possível explicar o
significado de cada componente do circuito em termos de um modelo físico da interface); (2) Os elementos
individuais do circuito devem depender de variáveis experimentais, de formas razoáveis e relacionáveis; (3) o
mesmo circuito equivalente deve permitir, tanto quanto possível, relacionar as mudanças dos valores do elemento
com as mudanças da resposta electroquímica.
1.5.2. Dupla camada eléctrica
A capacidade de dupla camada consiste na combinação da capacidade da camada compacta em série com a
camada de difusão. A camada de difusão é dependente da quantidade de soluto, e altera drasticamente a sua
espessura com a concentração. Pelo contrário, a camada compacta é talvez menos espessa e independente da
concentração. Em suma, além deste efeito na capacidade, a variação na espessura afecta também a queda de
32
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
potencial através da camada de difusão.
A relação entre a capacidade e a impedância de dupla camada é dada pela expressão:
Z = 1/(2πƒCdc)
(1.30.)
onde ƒ, é a frequência em Hz e Cdc, a capacidade de dupla camada. A capacidade de dupla camada é definida
diferencialmente, representando o aumento na carga, dQ, que resulta quando o potencial é aumentado por dE:
Cdc = dQ/dE (1.31.)
1.6. Formação de uma monocamada na interface
A compreensão das estruturas das membranas biológicas tem sido muito importante para o
desenvolvimento de diversas áreas de investigação nas últimas décadas. Para se ter uma visão do funcionamento das
membranas, é necessário o conhecimento da composição, estrutura e dinâmica da membrana.
1.6.1. Membrana celular
Todos os seres vivos do planeta são constituídos por uma membrana. Estas membranas são estruturas finas,
possuindo uma espessura de alguns nanómetros e servem para separar o interior da célula da parte exterior,
permitindo assim, a interacção e selectivamente com ambiente. As membranas são estruturas organizadas e
assimétricas, possuindo duas faces com topologias e funções diferentes. Dada a sua capacidade de adaptação a novas
condições ambientais, as membranas são, também, dinâmicas.
As membranas são compostas fundamentalmente por lípidos e proteínas (figura 1.24.). As biomoléculas
insolúveis em água mas altamente solúveis em solventes orgânicos, como o clorofórmio, são designadas de lípidos.
Os lípidos existentes na membrana são: os fosfolípidos, os glicolípidos e o colesterol. A razão entre quantidade de
proteínas e lípidos existente na membrana varia enormemente.
Uma membrana consiste numa bicamada constituída por uma variedade de moléculas anfipáticas
(principalmente fosfolípidos). Existem também proteínas ligadas à superfície da bicamada, de onde elas podem ser
removidas, simplesmente por uma alteração do pH ou da concentração iónica [57]. Todas as membranas contêm
uma quantidade apreciável de fosfolípidos, tais como, a fosfatidilcolina, fosfatidilserina, fosfatidiletanoamida,
esfingomielina e fosfatidilinositol. As membranas contêm ainda colesterol. O difosfatidilglicerol encontra-se apenas
na membrana mitocondrial interna.
33
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Figura 1.24.: Esquema de uma bicamada de fosfolípidos (membrana celular). As pequenas moléculas existentes
entre os fosfolípidos (representadas na figura a preto), são de colesterol e servem para fornecer rigidez e estabilidade
à membrana. Por simplificação, não se representaram as proteínas.
Todas as membranas biológicas são constituídas por um padrão comum, qualquer que seja a sua
composição, ou seja, todas contêm uma bicamada fosfolipídica como unidade estrutural básica. Desta forma, as
bicamadas e as monocamadas de fosfolípidos têm sido intensamente estudadas, dado que representam modelos
simplificados das membranas biológicas. Os estudos electroquímicos têm sido mais vastamente aplicados às
monocamadas do que às bicamadas, porque a queda de potencial através da camada pode ser melhor monitorizada
no primeiro caso, tornando-as assim mais fiáveis.
1.6.2. Os fosfolípidos
Os fosfolípidos apresentam uma variedade de classificações de acordo com a sua composição química. No
entanto, em seguida destacar-se-ão alguns daqueles que foram objecto de estudo.
Os glicerofosfolípidos (fosfolípidos baseados no glicerol) que contêm o amino álcool colina
[HOCH2CH2N(CH3)3] são designados de fosfatidilcolinas ou lecitinas [alguns destes tipos de fosfolípidos foram
objecto
de
estudo
neste
trabalho,
tais
como,
a
DPPC
(dipalmitoilfosfatidilcolina),
DAPC
(diaraquidoilfosfatidilcolina), DSPC (distearoilfosfatidilcolina) e a DBPC (dibenoilfosfatidilcolina)]. Os fosfolípidos
que contêm o grupo amino álcool etanolamina (HOCH2CH2NH2), são designados de fosfatidiletanolaminas ou
cefalinas. Os fosfolípidos contêm um grupo carregado ou polar ligado a cadeias longas de ácidos gordos, como se
pode observar na figura 1.25.
34
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Fosfolípido
Ácido gordo
(1,2-Dipalmitoilglicero
(ácido hexadecanóico ≡
fosfatidilcolina ≡ DPPC)
ácido palmítico)
“Cauda”
Hidrofóbica
Grupo
Fosfato
A)
“Cabeça”
Hidrofílica
B)
C)
Figura 1.25.: A) Estrutura de um fosfolípido (DPPC). B) Estrutura de um ácido gordo (ácido palmítico).
C) Representação esquemática da estrutura de um fosfolípido.
Na tabela 1.1. estão representadas as principais fórmulas estruturais dos fosfolípidos derivados do glicerol.
Tabela 1.1.: Estruturas dos principais tipos de fosfolípidos derivados do glicerol [58].
Fórmula de estrutura
Designação
Fosfatidilcolina ou lecitina
(PC)
Fosfatidiletanoamina
(PE)
Fosfatidilserina
(PS)
35
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Fosfatidilinositol
(PI)
Fosfatidilglicerol
(PG)
Difosfatidilglicerol
(DPG)
Os diferentes fosfolípidos são designados de acordo com o tamanho das cadeias R apresentadas nas
estruturas da tabela 1.1. Algumas das fosfatidilcolinas simétricas e saturadas têm a seguinte designação:
•
12 átomos de carbono (dilauroil-PC ou DLPC)
•
14 átomos de carbono (dimiristoil-PC ou DMPC)
•
16 átomos de carbono (dipalmitoil-PC ou DPPC)
•
18 átomos de carbono (distearoil-PC ou DSPC)
•
20 átomos de carbono (diaraquidoil-PC ou DAPC)
•
22 átomos de carbono (dibenoil-PC ou DBPC)
•
etc.
Os fosfolípidos são constituídos por um grupo carregado ou polar (habitualmente fosfato), que efectua a
ligação com as longas cadeias de ácidos gordos, como está representado na tabela 1.1. A parte da molécula que
contém o grupo fosfato é hidrofílica e é atraída para a água. As cadeias carbonadas de ácidos gordos são
hidrofóbicas e são afastadas da água. Deste modo, o fosfolípido quando colocado num meio aquoso, tem tendência a
formar bicamadas de fosfolípidos ou micelas.
Por vezes, nas bicamadas de lípidos ocorre uma rápida junção espontânea das partes hidrofílicas ou
hidrofóbicas, formando uma camada, vesícula/micela, possuindo uma única camada circular de fosfolípidos com as
caudas a apontar para o interior, porque se encontra num meio aquoso. Esta vesículas/micelas são camadas muito
estáveis, sendo usadas para estudar certas propriedades da membrana (figura 1.26.–A). O carácter anfipático dos
fosfolípidos também lhes permite formar monocamadas biológicas (figura 1.26.–B), pois quando se encontram
36
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
numa mistura de dois solventes imiscíveis podem colocar-se na interface dos dois solventes formando uma
monocamada.
A)
B)
Figura 1.26.: A) Esquema de uma micela de fosfolípidos. B) Esquema de uma monocamada de fosfolípidos.
O ponto isoeléctrico (pI) de um fosfolípido, corresponde ao pH ao qual o fosfolípido está presente
exclusivamente na sua forma de zwiterião.
A pH igual ao ponto isoeléctrico do fosfolípido, estes encontram-se sob a forma de zwiterião ou ião
dipolar, ou seja, a molécula possui uma carga positiva e uma carga negativa em simultâneo.
São estas características estruturais dos fosfolípidos que permitem efectuar os estudos de bicamadas de
fosfolípidos, utilizando apenas monocamadas de fosfolípidos (meia bicamada).
Tal como foi dito anteriormente, muitos destes estudos são efectuados utilizando a técnica de LB ou
técnicas electroquímicas. As bicamadas de fosfolípidos podem existir em dois estados diferentes: um altamente
ordenado, designado de estado gel, e um mais fluído, designado de estado líquido cristalino. A transição entre estas
duas fases ocorre à medida que a bicamada é aquecida.
Aquecimento
Gel
Líquido
cristal
Figura 1.27.: Transição de fase do estado Gel para o estado líquido cristal.
Como se pode ver na figura 1.27., as moléculas de fosfolípidos estão mais expandidas na fase líquido
cristalino do que na fase gel. Esta expansão resulta no aumento da energia térmica, a qual produz mudanças
conformacionais trans-gauche nas ligações C-C, ao longo da cadeia de hidrocarbonetos. Uma transição semelhante
ocorre em monocamadas de fosfolípidos, entre a fase líquido expandido (LE) e líquido condensado (LC), que pode
ser estudada utilizando, por exemplo a técnica de LB, tal como foi objecto de estudo na primeira parte experimental
deste trabalho.
37
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
1.6.3. Glucose Oxidase (GOx)
Neste trabalho, para além do estudo efectuado com os fosfolípidos, também se estudou o efeito que a
presença da GOx provoca no processo de adsorção das monocamadas de fosfolípidos em interfaces líquido-líquido e
na interface ar-água.
A glucose oxidase (GOx) é uma enzima que tem atraído muito interesse, devido à sua aplicabilidade em
biosensores para a determinação de glucose em fluidos, bem como, para remoção da glucose e do oxigénio de
bebidas e de produtos alimentares, e ainda, nos estudos da adsorção em monocamadas na interface líquido-líquido
polarizadas [59].
A GOx é uma glicoproteína globular dimérica de dimensões de 60x52x77 Å [59] (figura 1.28.), construída
a partir de duas subunidades idênticas, cada uma com massa molecular de 77000 Da que são ligadas com pontes de
dissufito, ligações de sais e de hidrogénio [60]. A GOx é uma coenzima redox, contendo uma unidade FAD (Flavina
Adenina Dinucleótido) por monómero. A enzima tem um coeficiente de difusão de 4.94 x10-7 cm2.s-1 numa solução
de NaCl 0.1 M e uma parte da cadeia hidrofóbica encontra-se localizada perto da superfície [59]. O diâmetro médio
da enzima nativa em solução, de acordo com os dados da correlação espectroscópica de fotões, é de 76 Å a pH 7.4
[61]. Tem um raio de Stokes de 43 Å com velocidade fraccionária de 1.21, a partir do qual a enzima em solução é
uma proteína alongada com uma estrutura rígida. Hecht et al. [60], argumentam que cada monómero tem uma forma
esférica compacta de dimensões de 60x52x37 Å. A proteína nativa é acídica com um ponto isoeléctrico de 4.44. A
pH 7 está carregada negativamente com 11 cargas [59].
A)
B)
Figura 1.28.: A) Topologia global da haloenzima GOx. B) Estrutura da subunidade da GOx contendo FAD
(representada a vermelho).
1.6.4. Neurotransmissores
Neste trabalho também foram objecto de estudo dois neurotransmissores, o cloreto de acetilcolina (AChCl)
e o cloreto de butirilcolina (BuChCl). Os sais de cloreto de acetilcolina e butirilcolina pode ser considerados uma
versão sintética do neurotransmissor central e periférico, sendo também usados como vasodilatores e agentes
cardiovasculares.
38
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
De uma forma geral, nos sistemas biológicos o transporte de informações é efectuado por impulsos
nervosos, que passam através de diferentes etapas com a transformação de impulsos eléctricos em químicos e
impulsos químicos em eléctricos.
Segundo Jehring et al. [62], este comportamento dos interruptores dos neurónios pode ser simulada em
modelos simplificados por camadas de electrodesorção de compostos orgânicos em eléctrodos de mercúrio. Estes
autores utilizaram a polarografia ac e dc para caracterizar o fenómeno eléctrico. Jehring et al. estudaram também as
propriedades de camadas de electrodesorção na mistura da lecitina de ovo e acetilcolina, verificando que a
composição da camada de electrodesorção é fortemente dependente da concentração e do potencial eléctrico
aplicado.
O cloreto de acetilcolina (AChCl - C7H15NO2Cl, figura 1.29.–A), e o cloreto de butirilcolina (BuChCl C9H20NO2Cl, 1.29.–B), apresentam as seguintes fórmulas de estrutura:
A)
B)
Figura 1.29.: A) Estrutura química da molécula de cloreto de acetilcolina (AChCl). B) Estrutura química da
molécula de cloreto de butirilcolina (BuChCl).
Acetilcolina e a butirilcolina são também neuro-hormonas que medeiam a transmissão de impulsos do
nervo em todos os locais colinérgicos (onde a colina está presente) que envolvem os nervos autonômicos.
Desta forma, o estudo destas duas espécies electroactivas é de extrema importância para compreender
alguns dos fenómenos que ocorrem ao nível cerebral.
1.6.5. Adsorção nas ITIES
A adsorção de fosfolípidos na interface líquido-líquido também pode ser usada para estudar e modelar as
características de uma membrana biológica ou artificial. Assim, o sistema interfacial líquido-líquido está mais
directamente relacionado com os problemas dos sistemas biológicos e emulsões do que a interface ar-água. Este
sistema ainda tem outra vantagem relativamente ao estudo das monocamadas lipídicas numa interface ar-água, que é
a possibilidade de se controlar rigorosamente a queda de potencial através da monocamada. Com este controlo
podem aplicar-se várias técnicas electroquímicas para caracterizar os processos interfaciais, como a variação do
estado da monocamada em resposta ao potencial através desta, a transferência iónica ou electrónica através da
monocamada ou reacções enzimáticas dependentes do estado eléctrico numa interface lípido-solução.
Desta forma, quando a concentração na interface de alguma espécie é maior relativamente ao esperado
39
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
pelas interacções electrostáticas (interacções presentes em moléculas polares e espécies iónicas, resultantes da
atribuição de um conjunto de cargas estacionárias a cada um dos átomos da interacção [63]), pode falar-se em
adsorção. O grau de cobertura, θ, dá-nos uma indicação da quantidade de espécies adsorvidas, e representa a fracção
de superfície de eléctrodo que está coberta com a espécie adsorvida. Se a espécie adsorvida pode formar uma
monocamada, θ corresponderá à razão entre a quantidade de espécie adsorvida presente e a quantidade máxima de
espécie que pode ser adsorvida [64]. O valor de θ será unitário quando se forma a monocamada.
A adsorção de um material dissolvido à superfície do líquido pode ser tão forte que é formada uma camada
monomolecular compacta [65]. Como há materiais anfipáticos que praticamente não dissolvem no líquido, isto
conduz à formação de monocamadas insolúveis. Neste caso, o excesso superficial, Γ, corresponde à quantidade de
material adicionado, dividido pela área superficial.
Os fosfolípidos, em geral, são solúveis em nitrobenzeno (NB), 1,2-dicloroetano (1,2-DCE) e o-NPOE, que
são os solventes mais utilizados para estudos de ITIES. A monocamada é, por conseguinte, formada por adsorção
dos fosfolípidos a partir da fase orgânica da interface. Quando a monocamada está no estado líquido expandido
(LE), a formação da monocamada é limitada por difusão das moléculas de fosfolípido. Contudo, as monocamadas
na fase líquida condensada (LC) ou sólida (S), necessitam de algumas horas ou dias para estabilizar. [66]
No entanto, o estudo em monocamadas começou a ser feito na interface ar-água devido à simplicidade da
técnica e ao facto de nem todos os compostos poderem ser estudados nas interfaces líquido-líquido, pois muitos
destes compostos são solúveis na fase orgânica. Recorreu-se então, aos grupos carregados electricamente, pois os
compostos com estes grupos podem “prender-se” à interface e evitar a sua dissolução na solução.
Diversos estudos têm sido efectuados com fosfolípidos em filmes monomoleculares numa interface ar-água
ou líquido-líquido, no sentido de determinar as suas propriedades, comportamento, e transições de fase
[19,25,67,68,69,70,71,72].
Alguns autores [19,20,21], obtiveram relações de pressão superficial-área, para uma série homóloga de 1,2diacilfosfatidilcolinas e 1,2-diacilfosfatidiletanoamidas saturadas na interface ar-água, verificando que as
fosfatidilcolinas formavam filmes mais expandidos que as fosfatidiletanoaminas, devido ao tamanho e orientação
dos grupos polares das diferentes moléculas.
Anos mais tarde, foram feitos estudos para outras lecitinas [25] com diferentes tamanhos de cadeias e em
comparação com outro tipo de fosfolípidos (cefalinas). Os resultados mostram que, as curvas de isotérmicas, para a
zona pouco compacta, variavam com o tamanho do grupo polar do fosfolípido, mas eram independentes dos
tamanho das cadeias (C14 a C22). Verificaram ainda que, as lecitinas mais pequenas tinham pouca tendência a
formar agregados ou micelas.
Noutro trabalho [21], os mesmo autores estudaram o efeito do tamanho das cadeias nas fases de transição
com as lecitinas de C14 a C22 para zonas de maior empacotamento, verificando que nesta zona, ao contrário do que
acontece para a zona menos compacta, não há influência do tamanho da cadeia da lecitina.
Estudo realizados por Kakiuchi e colaboradores, mostraram que em interfaces água-nitrobenzeno o
comportamento de monocamadas da fosfotidilcolina (PC) [67], da fosfotidiletanolamina (PE) [68] com medição de
capacidades superficiais e da fosfotidilcolina com medição de tensão superficial [67,68], se pode efectuar utilizando
a técnica de medição da capacidade de dupla camada eléctrica em ITIES, Cdl. Esta técnica mostrou-se bastante
40
Capítulo 1 — Introdução
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
simples e muito sensível em fosfolípidos adsorvidos, e a medição da tensão superficial foi útil para determinar o
excesso de superfície termodinâmico.
De acordo com o trabalho de Kakiuchi e colaboradores [67], o processo de adsorção é lento sendo
necessário cerca de pelo menos 1 hora para se atingir um estado de equilíbrio. Estes autores verificaram a formação
de uma monocamada saturada estável de fosfotidilcolina (DLPC) quando a concentração de DLPC na solução
aquosa era maior que 10 μM. A cobertura de superfície determinada através das curvas de capacidade foi descrita
pela isotérmica de Frumkin, indicando que a monocamada estava num estado líquido-expandido com as caudas de
hidrocarbonetos orientadas para a fase orgânica e penetrando nas moléculas do solvente e iões em solução.
Wandlowski et al. [71,72], efectuaram estudos de adsorção também com DLPC, DMPC e DPPC, na
interface água-nitrobenzeno e observaram um deslocamento positivo do potencial de carga zero (pcz) com o
aumento da adsorção de DLPC obtido pelo máximo das curvas electrocapilares calculadas através da segunda
integração das curvas de capacidade em função do potencial.
Murtomaki et al. [73,74], estabeleceram um sistema electroquímico para estudar as monocamadas
depositadas numa interface líquido-líquido sob pressão superficial controlada e obter as isotérmicas de Langmuir de
fosfolípidos. Desta forma, obtiveram isotérmicas de fosfolípidos DPPC e DSPC, nas interfaces ar-água e água/1,2dicloroetano. Observaram ainda que, as interfaces ar-água mostravam uma transição de fase mais bem definida do
que a interface água/1,2-dicloroetano, devido talvez ao pequeno tamanho das moléculas de 1,2-dicloroetano que as
tornam muito móveis na interface. Também verificaram que para o caso da adsorção de DSPC, a potenciais mais
positivos a adsorção deste lípido parecia fraca, enquanto que a potenciais mais negativos obtiveram-se
monocamadas estáveis.
Estes autores mostraram ainda que, através da compressão lateral de fosfolípidos, conseguem-se atingir
monocamadas mais comprimidas do que pelo método de área constante com sucessiva adição de lípidos; no entanto,
o colapso das monocamadas dos fosfolípidos pode ocorrer para diferentes orientações da molécula [75]. Observaram
ainda que, a velocidade de compressão pode provocar diferentes formas dominantes nas monocamadas de
fosfolípidos [76], e no método dinâmico de compressão, ocorre uma perda significativa de fosfolípidos para a
solução orgânica por dissolução ou formação de micelas [73].
Estudos mais recentes têm sido efectuados não só com fosfatidilcolinas, mas também com compostos de
grande interesse biológico, tais como, fármacos, enzimas produzidas no corpo humano, entre outros. Como exemplo
de alguns trabalhos efectuados recentemente com compostos de grande interesse biológico, podem citar-se ainda,
Annika, Liljeroth et al. [77,78,79], da Universidade de Tecnologia de Helsínquia (Finlândia).
41
Capítulo
Execução
Experimental
Neste capítulo, descrevem-se os reagentes, os solventes, o material
de vidro, a instrumentação, as condições e os procedimentos
experimentais que foram utilizados neste trabalho. Desta forma,
como o estudo realizado consistiu na utilização de duas técnicas
diferentes –técnica de LB e espectroscopia de impedância ou
impedância
electroquímica–,
apresentam-se
em
seguida
os
diferentes materiais e instrumentação, para cada uma das técnicas
em questão.
Relativamente à primeira técnica, como se trata de uma técnica
nova no Departamento de Química da Faculdade de Ciências, a
parte experimental será descrita de forma exaustiva.
Capítulo 2 — Execução Experimental
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
2.1. Reagentes utilizados na preparação das soluções
Tabela 2.1.: Especificações dos reagentes utilizados neste trabalho.
Nome – Fórmula química
Marca
Nome – Fórmula química
Marca
DPPC (C16:0) - C40H80NO8P
Sigma
Brometo de tetraoctilamónio, ≥ 98 % - C32H68BrN
Fluka
(TOABr)
DSPC (C18:0) - C44H88NO8P
Sigma
Diidrogenofosfato de Sódio - NaH2PO4.2H2O
M&B
DAPC (C20:0) - C48H96NO8P
Sigma
1,2 – DCE, 99 % vol. - ClCH2CH2Cl
Aldrich
DBPC (C22:0) - C52H104NO8P
Sigma
Cloreto de cádmio monohidratado - CdCl2.H2O
Merck
Cloreto de Lítio (p.a.) - LiCl
Merck (GR)
Ácido acético glacial, 100% p.a. - CH3COOH
Pronalab
Cloreto de Sódio (p.a.) - NaCl
Merck (GR)
Éter 2 – Nitrofeniloctílico - C14H21NO3
Fluka
Cloreto de Potássio (p.a.) - KCl
Merck (GR)
Tetrafenilborato de Sódio 99.5 % (a.r.) -
Aldrich
(C6H5)4BNa (NaTPB)
Ácido Clorídrico 37 % (p.a.) -
Merck
Cloreto de Acetilcolina, 98 % C7H15NO2Cl (AChCl)
HCl
Ácido Sulfúrico 95-97 % (p.a.)
Aldrich
Pronalab
Cloreto de Butirilcolina, 98 % -C9H20NO2Cl
- H2SO4
Sigma
(BuChCl)
Clorofórmio (p.a.) - CHCl3
Pronalab
Hidrogenofosfato de Sódio (p.a.) - Na2HPO4
Merck
Acetona (a.r.) - C3H6O
Riedel-de-
Álcool etílico 99.8 % vol. - C2H6O
Aga
Haën
GOx (EC 1.1.3.4 – 23 U/mg)
Fluka
43
Capítulo 2 — Execução Experimental
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
2.2. Técnica de Langmuir-Blodgett (LB)
2.2.1. Material e instrumentação
Tabela 2.2.: Lista de materiais e instrumentos mais relevantes utilizados na técnica de LB.
Material / Instrumentação
Especificações / Marcas
1.
Balança de Langmuir
KSV Minitrough (figura 2.1.)
2.
Bomba de aspiração/sucção
Mini laboratory pumps – LABOPORT®
3.
Prato Wilhelmy
Perímetro = 39.240 mm
5.
Tina
Mini: comprimento = 75.0 mm;
Área = 24225.0 mm2; Teflon; Volume: 260 cm3
6.
Barreiras hidrofílicas e hidrofóbicas
Simétricas - Derlin® e Teflon®
7.
Termostatizador / Regulador de temperatura
Julabo Labortechanik Gmh F12
8.
Luvas de nitrilo sem pó
SAFE SKIN®
9.
Microseringas
Hamilton (50 e 100 μL) e SGE para gases (50 μL)
10.
Sistema de filtração de soluções
Vacuum Filtration System - Alltech
11.
Membrana para a filtração
Nylon membrane filters: 47 mm, 0.2 μm
12.
Slides de Ouro (Au)
Forma: rectangular; largura: 18 mm; altura:
18 mm; espessura: 3 mm
13.
Pincéis e pipetas de Pasteur
—
14.
Ultra-sons
Grant – XB6
15.
Perkin Elmer
System 2000 FT-IR
44
Capítulo 2 — Execução Experimental
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Legenda:
1 – Interface Vertical
2 – Controlo manual
3 – Braço mergulhador
12
4 – Tina de Langmuir
3
5 – Poço
6 – Barreiras
1
hidrofílicas/hidrofóbicas
7 – Suporte para a Tina
10
4
6
9
8
6
7
11
8 – Substracto sólido
9 – Prato Wilhemly
10 – Ligação do Regulador/
5
termostatizador da
temperatura do banho
2
11 – Local para a colocação
do sensor da temperatura
12 – Electrobalança
Figura 2.1.: Balança de Langmuir – “KSV Minitrough”, utilizada nos estudos das isotérmicas dos diversos
fosfolípidos. [80]
2.2.2. Procedimentos experimentais
Para se ter sucesso utilizando a técnica de LB, foi necessário ter-se muita atenção a todos os passos da
execução experimental, pois embora se trate de uma técnica de fácil execução, é muito sensível e fortemente afectada
por diversos factores, especialmente a limpeza, tornando-a assim numa das técnicas mais difíceis para a obtenção de
resultados reproduzíveis a curto prazo. É de salientar que nas experiências de LB a balança de Langmuir se
encontrava dentro de uma caixa de acrílico transparente, com abertura para um dos lados, não estando, portanto,
completamente isenta de contaminações devido a poeiras e/ou pó, dificultando assim a execução experimental para a
obtenção de resultados razoáveis.
Na técnica de LB a formação de monocamadas foi feita recorrendo a um sistema de compressão para a
obtenção das isotérmicas dos diversos fosfolípidos ou a um sistema de deposição quando se pretendeu transferir o
filme para um substrato sólido, tal como foi descrito no capítulo 1 (secções 1.1. e 1.2.).
Todo o material de vidro utilizado foi inicialmente mergulhado em ácido sulfúrico durante uma noite e,
posteriormente lavado, abundantemente, com água da torneira e em seguida com água Millipore.
Em seguida descrevem-se os procedimentos experimentais, utilizando a técnica de LB:
45
Capítulo 2 — Execução Experimental
•
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Compressão
1. Em cada experiência começou-se por lavar a tina (ver figura 2.1. nº 4) e as barreiras (ver figura 2.1. nº 6)
abundantemente com etanol e água Millipore, utilizando um pequeno pincel devidamente lavado e limpo, para
ajudar a remover poeiras e/ou outras partículas que podiam encontrar-se à superfície da tina/barreiras. É
fundamental que a tina de teflon e as barreiras sejam muito bem lavadas. No entanto, mais tarde verificou-se que
a utilização do pincel para efectuar a limpeza era uma má opção, pois tendia a deixar contaminantes na tina,
optando-se apenas pela limpeza utilizando água e etanol.
2. Em seguida, colocou-se a tina no local apropriado na balança de Langmuir (ver figura 2.1. nº 7) para se iniciar a
experiência e colocou-se sobre esta as barreiras na posição zero (posição que corresponde à abertura máxima das
barreiras na tina, quando estas se encontram o mais afastado possível uma da outra). Efectuou-se a ligação do
termostatizador/regulador da temperatura (ver figura 2.1. nº 10). Com o software desenvolvido por KSV
Instruments Ltd., efectuou-se o controlo da temperatura do banho da tina, da posição das barreiras e do prato
Wilhelmy.
3. Sobre a tina colocou-se a subfase pretendida (cerca de 260 cm3). Habitualmente a concentração de electrólito de
suporte foi cerca de 100 mM, para efectuar os estudos. Em seguida lavou-se abundantemente o prato Wilhelmy
(ver figura 2.1. nº 9) e o sensor da temperatura (ver figura 2.1. nº 11) com etanol e água Millipore, colocando-os
depois no local indicado para efectuar as medições.
4. Fechou-se o compartimento relativo à balança de Langmuir e deixou-se estabilizar a temperatura. Uma vez
estabilizada a temperatura, removeu-se algumas poeiras e/ou partículas que se encontravam à superfície da
subfase com a ajuda de uma pipeta de Pasteur (muito bem lavada com etanol e água Millipore), e de uma bomba
de sucção. Sempre que se efectuaram diferentes experiências, a pipeta de Pasteur foi substituída.
5. Em seguida, efectuou-se uma primeira compressão das barreiras. O valor de pressão superficial nesta fase, para a
subfase foi inferior a 0.1 mN/m (pois a tensão superficial da água é 0 mN/m). Moveram-se novamente as
barreiras para a posição zero, colocou-se a pressão superficial a zero, utilizando o software e voltou-se a
comprimir. Sempre que se obteve valores de pressão superficial acima de 0.1 mN/m, efectuou-se uma nova
limpeza da superfície da subfase tantas vezes quantas as necessárias para fazer baixar o valor da tensão
superficial. Para repor o volume da subfase adicionou-se mais solução, mas sempre pela parte de fora das
barreiras (ou seja, a adição da subfase nunca é efectuada entre a área de subfase que fica entre as barreiras,
correspondente à área central).
6. Após a pressão superficial apresentar um valor inferior a 0.1 mN/m, efectuou-se a deposição do volume de
fosfolípido pretendido (previamente retirado do frigorífico à temperatura ambiente) sobre a superfície da subfase
utilizando uma microseringa, tal como mostra a figura 2.2.–1. Foram utilizadas concentrações de fosfolípidos
cerca de 1 mg/mL e os volumes adicionados entre 30–50 μL.
7. Antes do início de qualquer experiência, a microseringa foi lavada com duas soluções de clorofórmio para
lavagem. Inicialmente começou-se por utilizar uma seringa Hamilton, mas devido aos problemas de evaporação
do clorofórmio das soluções de fosfolípidos, optou-se por utilizar uma seringa para gases SGE para minimizar as
perdas e os erros. A deposição foi feita ao longo da superfície da subfase, tendo-se o cuidado de não depositar,
nem muito perto das extremidades, nem muito perto do prato de Wilhelmy. Teve-se também o cuidado de, ao
depositar as gotas de fosfolípidos sobre a superfície não as deixar cair de uma altura elevada, mas sim deixando
formar uma gota na ponta da microseringa, depositando-a o mais junto possível à superfície da subfase, pois a
46
Capítulo 2 — Execução Experimental
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
queda de uma gota muito acima da superfície, leva a que estas não sejam adsorvidas na superfície, e
“mergulhem” para o interior da subfase.
8. Deixou-se evaporar o solvente durante cerca de 30 minutos. Após este tempo, utilizando o software da KSV
Instruments Ltd., efectuou-se a compressão das barreiras, com uma velocidade de compressão de 5 mm/min, tal
como se pode visualizar na figura 2.2.–2.
9. Após terminada a compressão, procedeu-se da seguinte forma:
- Efectuou-se a expansão das barreiras até à posição zero;
- Retirou-se o sensor da temperatura e o prato Wilhelmy que se encontravam no local próprio sobre a tina, e
foram lavados com água Millipore;
- Guardou-se o prato de Wilhemly num frasco fechado contendo etanol. Antes de voltar a ser colocado em
contacto com a subfase, lavou-se abundantemente com água Millipore para remover todo o etanol;
- Aspirou-se a subfase com a ajuda de uma bomba de sucção e efectua-se a limpeza descrita inicialmente, para
se efectuar nova experiência.
Notas: Todos os procedimentos anteriormente descritos foram efectuados utilizando luvas de nitrilo sem pó. As
subfases dos sais das soluções aquosas foram previamente filtradas utilizando o sistema de filtração de vácuo
(Vacuum Filtration System – Alltech) e uma membrana de Nylon para a filtração. As características dos
materiais e instrumentação podem ser visualizadas na tabela 2.2.
•
Deposição (“Dipping”)
Na deposição foram utilizados como substratos sólidos slides de ouro, com as características indicadas na
tabela 2.2., previamente lavados com etanol e água Millipore e secos com azoto (N2). A deposição de uma
monocamada de lípido sobre o substrato hidrofóbico deve ser feito mergulhando o slide de cima para baixo, ou seja,
de uma posição acima da superfície da subfase para o seu interior.
Depois de lavado e seco, coloca-se o substrato sólido (slide de ouro) no mergulhador (ver figura 2.1. nº 3),
na posição correcta na balança de Langmuir (ver figura 2.1. nº 8).
Para se efectuar a deposição de um substrato sólido sobre uma monocamada de fosfolípidos seguiu-se os
procedimentos anteriormente descritos na “compressão” até ao sétimo ponto inclusivé, e depois procedeu-se da
forma a seguir descrita.
Deixou-se evaporar o solvente durante cerca de 30 minutos. Após este tempo, utilizando o software da KSV
Instruments Ltd., seleccionou-se o “target” (valor da pressão superficial a atingir pela compressão para se efectuar a
deposição), na maioria das vezes antes de se atingir o colapso, o que normalmente corresponde a um valor entre 4550 mN/m. Este valor é mantido constante ao longo da deposição.
Uma vez atingido o “target”, esperou-se cerca de 30 minutos para o sistema estabilizar e em seguida,
procedeu-se à deposição do slide de ouro (figura 2.2.–3) utilizando o software, com uma velocidade de deposição de
2 mm/min.
Após a deposição o slide de ouro foi removido, seco em N2 e armazenado no frigorífico.
A sua análise foi deita por espectroscopia de infravermelho utilizando um FT-IR Perkin Elmer 2000.
47
Capítulo 2 — Execução Experimental
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Figura 2.2.: Representação esquemática dos vários procedimentos da técnica de LB: 1) Deposição do fosfolípido
sobre a superfície de uma subfase na balança de Langmuir, utilizando uma microseringa. 2) Compressão das
barreiras sobre a superfície da subfase contendo o fosfolípido em estudo. 3) Deposição de uma monocamada de
fosfolípidos sobre um substrato sólido (slide de ouro).
Nos ensaios com DPPC, DBPC, DSPC e DAPC foram usadas soluções dos compostos dissolvidos em
clorofórmio (CHCl3). Depois de preparadas, as soluções de fosfolípidos foram armazenadas no frigorífico.
Na preparação das soluções de DBPC, devido à maior dificuldade de dissolução deste fosfolípido em
clorofórmio, recorreu-se ao ultra-sons para se obter uma solução homogénea.
As soluções aquosas da subfase foram preparadas por pesagem do sal correspondente (LiCl, KCl, HCl,
NaCl e CdCl2.H2O) e sua dissolução em água Millipore (Milli-Q, 18 MΩ.cm-1 a 25 ºC).
As pesagens de todos os componentes sólidos foram efectuadas numa balança analítica Mettler AE100.
2.3. Espectroscopia de impedância electroquímica
2.3.1. Material e instrumentação
O pH das soluções aquosas (HCl, CH3COOH + CH3COONa e Na2HPO4 + NaH2PO4.H2O) utilizadas no
estudo do efeito do pH, foram medidos utilizando um medidor de pH, 654 pH Meter - Ω Metrohm.
48
Capítulo 2 — Execução Experimental
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
O controlo das variáveis experimentais e aquisição de dados na voltametria cíclica e na impedância
electroquímica, no estudo de adsorção dos fosfolípidos na interface líquido-líquido, foi feito utilizando um
potenciostato de quatro eléctrodos SI 1287, Solartron Instruments, para fazer o controlo do potencial aplicado aos
eléctrodos, e também um "Frequency Responce Analyser" 1250, Solartron Instruments. Os dados obtidos nessas
medições foram adquiridos e tratados num sistema computadorizado de aquisição de dados, com software
desenvolvido por Pereira et al. [81].
Os espectros de impedância foram ajustados ao circuito equivalente R[C(RW)], representado na figura
1.22., utilizando o programa EQUIVCRT, elaborado por Baukamp [56].
A montagem experimental, de todas as experiências, foi efectuada numa gaiola de Faraday com o intuito de
minimizar o ruído eléctrico.
Neste trabalho experimental utilizou-se células com uma interface macroscópica de 0.28 cm2 e 0.22 cm2. A
interface está posicionada entre dois capilares de Luggin por forma a minimizar a queda óhmica. Na figura 2.3. está
representado um esquema da célula electroquímica utilizada nos estudos de adsorção na interface líquido-líquido.
Todas as experiências foram realizadas à temperatura ambiente.
Figura 2.3.: Representação esquemática da célula electroquímica de quatro eléctrodos [82] para solventes orgânicos
menos densos que a água (1,2-DCE e 2-NPOE), usada neste trabalho: 1– Eléctrodo de referência na fase aquosa
(Ag/AgCl); 2– Contra-eléctrodo na fase aquosa (platina); 3– Contra-eléctrodo na fase orgânica (platina); 4–
Eléctrodo de referência na fase orgânica (Ag/AgCl).
2.3.2. Reagentes
2.3.2.1. Solventes
Para os estudos de adsorção na interface líquido-líquido utilizando a impedância electroquímica foram
utilizados os seguintes solventes orgânicos:
1,2- Dicloroetano (1,2-DCE);
Éter 2-Nitrofeniloctílico (2-NPOE).
49
Capítulo 2 — Execução Experimental
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
A água ultrapura Milli-Q (Millipore) foi usada como solvente na preparação de soluções aquosas e na
preparação da fase aquosa, a qual, é obtida a partir do sistema de purificação Millipore (18 MΩ.cm-1).
Para preparar as soluções dos diversos fosfolípidos a várias concentrações, adicionou-se a quantidade
apropriada de fosfolípido (dissolvido em CHCl3) à solução orgânica. As espécies electroactivas (AChCl e BuChCl)
a diferentes concentrações, foram adicionadas à fase aquosa, com o objectivo de estudar a interacção e/ou o efeito
entre estas e os fosfolípidos na fase orgânica.
Depois da adição das soluções de fosfolípido na célula, aguardou-se cerca de 60 minutos antes de se
iniciarem as medições de impedâncias, tempo que, segundo Kakiuchi [67] era suficiente para estabelecer e
equilibrar a posição dos fosfolípidos na interface.
Nos estudos em que foi utilizada a GOx, na ausência do fosfolípido na fase orgânica, o tempo de espera
antes do inicio das medições de impedâncias foi de cerca de 30 minutos [59].
2.3.2.2. Electrólitos
•
Fase aquosa:
Na fase aquosa utilizou-se uma solução contendo os seguintes sais: LiCl, NaH2PO4.2H2O e Na2HPO4. Na
sua preparação pesaram-se os sais e dissolveram-se em água Millipore.
Como referência da fase orgânica foi utilizada uma solução de tetrafenilborato de sódio (NaTPB) e o
cloreto de sódio (NaCl). Na sua preparação pesaram-se os sais e dissolveram-se em água Millipore. O uso desta
mistura como referência deve-se à baixa solubilidade do cloreto de tetraoctilamónio (TOACl) em água, garantindo
deste modo, o comportamento de eléctrodo selectivo em relação ao ião comum com a fase orgânica.
As soluções de Glucose Oxidase (GOx), cloreto de acetilcolina (AChCl) e cloreto de butirilcolina
(BuChCl) adicionadas à fase aquosa para efectuar os correspondentes estudos, foram preparadas por pesagem dos
respectivos compostos e sua dissolução em água Millipore. Depois de usadas, as soluções de GOx foram
armazenadas no frigorífico, por um período não superior a 5 dias.
•
Fase orgânica:
O composto orgânico utilizado nesta fase foi o tetrafenilborato de tetraoctilamónio (TOATPB). Este
composto foi sintetizado através da mistura de duas soluções aquosas equimolares de tetrafenilborato de sódio
(NaTPB) e brometo de tetraoctilamónio (TOABr). Ambas as soluções foram preparadas por pesagem do sal e
dissolução numa mistura água/etanol 1:1. Após a mistura obteve-se um precipitado branco (TOATPB) que foi
filtrado usando o vácuo e purificado por cristalização com acetona. Em seguida os cristais foram secos à temperatura
ambiente.
As soluções orgânicas de TOATPB, em cada um dos solventes considerados, foram preparadas por
pesagem do sal e posterior dissolução no solvente orgânico (1,2-DCE ou 2-NPOE). O solvente orgânico foi utilizado
sem qualquer purificação adicional.
As preparações das soluções utilizando o solvente orgânico 2-NPOE foram realizadas no saco de luvas
50
Capítulo 2 — Execução Experimental
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
numa atmosfera inerte (N2). Dada a grande dificuldade da dissolução do TOATPB em 2-NPOE, recorreu-se ao ultrasons para obter uma solução homogénea. No final de cada ensaio esta solução foi armazenada no frigorífico.
2.3.3. Eléctrodos
A preparação dos eléctrodos de Ag/AgCl foi efectuada a partir de um fio de prata por electrodeposição de
AgCl, no seio de uma solução concentrada de NaCl, geralmente durante cerca de 12 horas (aproximadamente).
2.3.4. Procedimentos experimentais
ƒ
Medição de impedâncias
A lavagem da célula (figura 2.3.) é um aspecto importante devido à grande sensibilidade da interface
líquido-líquido. Para a sua lavagem procedeu-se da seguinte forma:
— inicialmente lavou-se com álcool etílico comercial com a finalidade de remover a fase orgânica, depois
com água removendo os iões hidrofílicos, e por fim, com acetona, removendo possíveis restos de fase
orgânica permitindo uma secagem mais rápida.
A montagem da célula foi efectuada na hotte, com as soluções não equilibradas, e em seguida a célula foi
ligada ao potenciostato, tal como foi referido no ponto 2.3.3. A diferença de potencial medida, entre os dois
eléctrodos de referência, corresponde à diferença de potencial na célula, ΔE, sendo definida como a diferença de
potencial entre o eléctrodo da fase aquosa e o eléctrodo da fase orgânica:
ΔE = ERE (aq) – ERE (org) = Δowφ + ΔEref
(2.1.)
Determinou-se o valor de ΔEref por adição de TMA+ à fase aquosa da célula, medindo o potencial de meia
onda de transferência deste catião.
De acordo com os valores obtidos anteriormente, e por comparação com os resultados obtidos para os
diferentes sistemas em estudo, efectuou-se o ajuste dos valores de potencial a Δowφ, quer para os voltamogramas
cíclicos, quer para as curvas de capacidade, da seguinte forma:
Δowφ = ΔE – ΔEref
(2.2.)
Para a interface água/1,2-dicloroetano o valor obtido para ΔEref foi igual a –350 mV, enquanto que para a
interface água/2-NPOE obteve-se um valor de ΔEref igual a –226 mV.
51
Capítulo 2 — Execução Experimental
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Em cada sistema estudado começou-se por realizar experiências de voltametria cíclica, sem compensação
de queda óhmica, com o objectivo de determinar a janela de potencial. Os voltamogramas cíclicos foram registados,
após se verificar a sua forma estável, à velocidade de varrimento de 50 mV/s.
Para as experiências utilizando o solvente orgânico 1,2-dicloroetano, as medições de impedância foram
realizadas a um potencial ac com uma amplitude de 20 mV, sobreposto a um potencial dc constante, e a sua leitura
foi efectuada num intervalo de frequências de 200 Hz a 0.5 Hz, medindo-se 15 pontos por década. Nos estudos em
que se utilizou o solvente orgânico 2-NPOE, foram realizadas leituras de impedância num intervalo de frequências de
50 Hz a 0.5 Hz, medindo-se 20 pontos por década.
Cada leitura, a um dado potencial, só foi efectuada após 30 segundos do início da aplicação do respectivo
potencial, com o objectivo de permitir a estabilização do sistema. O varrimento do espectro de impedância foi
efectuado no sentido das frequências mais altas para as mais baixas.
As medições tinham início a um valor de potencial localizado aproximadamente no meio da janela de
potencial. Em seguida eram efectuadas medições para valores de potencial mais negativos, depois para valores de
potencial mais positivos, e por fim, a medição era terminada no mesmo valor inicial. Assim, a impedância foi medida
num intervalo de potencial definido pela janela de potencial, em intervalos de 50 mV.
52
Capítulo
Resultados
e Discussão
Neste capítulo apresentam-se os resultados dos estudos das
isotérmicas de fosfatidilcolinas na interface ar-água, por aplicação
da técnica de Langmuir-Blodgett (LB). Apresentam-se também os
estudos de adsorção de fosfatidilcolinas em interfaces líquidolíquido polarizadas, assim como, a sua interacção com a enzima
Glucose
Oxidase
(GOx)
e
espécies
com
características
neurotransmissoras, tais como, a acetilcolina e a butirilcolina, por
aplicação de técnicas voltamétricas e utilizando a espectroscopia de
impedância electroquímica.
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
3.1. Filmes de Langmuir-Blodgett
Antes de mais, convém referir que nesta primeira fase, o objectivo do estudo foi apenas caracterizar e
desenvolver a técnica de LB para a obtenção das diferentes isotérmicas das fosfatidilcolinas, não tido sido feito um
estudo aprofundado neste campo, uma vez que o período em que se trabalhou com esta técnica foi relativamente
curto, não sendo suficiente para efectuar um estudo mais exaustivo.
A técnica de LB tem sido usada extensivamente para produzir filmes de mono e multicamadas, assim
como, a sua transferência para substratos sólidos. O método envolve primeiro a “construção” de uma monocamada
na interface ar-água e depois a transferência para o substracto. As mono ou multicamadas resultantes podem ser
caracterizadas por várias técnicas espectroscópicas e electroquímicas.
Nesta primeira etapa do trabalho determinou-se e caracterizou-se as isotérmicas de diferentes
fosfatilcolinas, bem como, a influência de diversos parâmetros na formação e estabilidade das monocamadas dessas
fosfatidilcolinas, nomeadamente a temperatura, a concentração e tipo de electrólito de suporte utilizado na subfase
aquosa, assim como, o efeito da presença da enzima Glucose Oxidase (GOx) na subfase aquosa. Efectuaram-se
também, estudos de transferência de filmes de LB para slides de Ouro e utilizou-se a espectroscopia de
infravermelho (FT-IR) para analisar esses slides.
Em seguida são apresentados os resultados obtidos para cada um dos fosfolípidos estudados. Os gráficos
que a seguir se apresentam dizem respeito a estudos de compressão para a obtenção das isotérmicas de
fosfatidilcolinas na interface ar-água. Nestes gráficos está representada a pressão superficial (PS ou Π) em mN/m,
em função da área média aparente disponível por molécula (Mma ou A) em Å2, isto é, a razão entre a quantidade de
fosfatidilcolina adicionada e área geométrica do filme.
3.1.1. Estudo das isotérmicas de diferentes fosfolípidos na interface ar-água
Os estudos que a seguir se apresentam foram realizados com uma balança de Langmuir, com controlo da
pressão superficial. Efectuaram-se compressões laterais na interface ar-água, pois segundo Pallas e Pethica [83]
parece improvável que o estado líquido condensado da camada lipídica possa ser alcançada por adsorção, porque as
monocamadas a pressões acima da pressão de espalhamento, são termodinamicamente estáveis.
Dada a enorme sensibilidade da técnica e, uma vez que, as condições experimentais em que se encontrava a
balança de Langmuir não eram as mais adequadas (por exemplo, a balança não estava envolvida por câmara de
fluxo laminar para manter a atmosfera isenta de qualquer pó e/ou poeiras, e não estava assente sobre um suporte
“anti-vibratório”, fundamentais para a limpeza e estabilidade do sistema), a obtenção de resultados reprodutíveis e
concordantes com a literatura, foi muito difícil e em alguns casos, não se conseguiu obter reprodutividade nas
isotérmicas dos fosfolípidos, durante o período de ensaios utilizando esta técnica (cerca de dois meses e meio).
Dado que área molecular média das isotérmicas é característica de cada espécie, se não houver alterações a
nível das condições experimentais, os resultados deverão ser reprodutíveis e aquele valor será o mesmo para cada
experiência utilizando a mesma espécie. Os gráficos obtidos mostram que nem sempre isso aconteceu, o que
demonstra a grande dificuldade em controlar um conjunto variado de variáveis, não permitindo a obtenção de
54
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
resultados reprodutíveis. Consequentemente, a interpretação dos resultados será feita de acordo com os dados
obtidos.
3.1.2. Estudo da isotérmica do fosfolípido DBPC (C22) na interface ar-água. Estudo
do efeito do electrólito da subfase aquosa
A figura 3.1. mostra a isotérmica, pressão superficial (Π), em função da área molecular média (A), para o fosfolípido
DBPC à temperatura de ~20 ºC.
70
IV
III
II
VDBPC adicionada à subfase = 80 μL
I
60
Experiência 1subfase: água;
[DBPC] = 1.00 mg/mL;
Π / mN.m
-1
50
Experiência 2subfase: água+100 mM NaCl;
[DBPC] = 1.04 mg/mL;
40
30
Experiência 3subfase: água+100 mM NaCl;
[DBPC] = 1.00 mg/mL;
20
10
0
20
30
40 43
50
60
A/Å
70
80
90
100
2
Figura 3.1.: Isotérmicas do fosfolípido DBPC na interface ar-água e ar-solução aquosa. Velocidade de compressão:
5 mm/min.
Na isotérmica da DBPC podem ser encontradas quatro regiões correspondentes aos seguintes estados
físicos: I – “estado gasoso”; II – líquido expandido (LE); III – líquido condensado (LC); e IV – colapso.
À medida que a área superficial é reduzida do seu valor inicial, ocorre uma variação gradual da pressão
superficial até se atingir uma região aproximadamente horizontal (IV).
Na primeira região horizontal – I (desde ~70 Å2 até ~50 Å2), as cadeias hidrofóbicas do fosfolípido
inicialmente distribuído sobre a superfície, encontram-se bastante dispersas. A pressão superficial a que isto ocorre é
muito pequena (< 1mN/m), devido às fracas interacções entre a água e a parte hidrofóbica do fosfolípido;
consequentemente, esta porção da isotérmica não exibe nenhum patamar (esta primeira região corresponde a um
“estado gasoso”, semelhante a um gás bidimensional).
À medida que a compressão decorre, observa-se um ligeiro aumento na curva da isotérmica,
correspondente a uma transição de fase (região II). Para compressões mais elevadas, a área superficial vai sendo
55
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
sucessivamente reduzida e a pressão superficial tende a aumentar, devido ao aumento das interacções entre a água e
a cadeia hidrofóbica do fosfolípido, surgindo uma segunda transição abrupta, caracterizada por uma região linear
vertical muito inclinada (III). Este estado é devido à mudança de fase e representa uma transição para um estado
ordenado análogo ao sólido, de moléculas bidimensionais. Aqui a compressibilidade é aproximadamente constante,
sendo definida por [1]:
c = – 1/A (∂A/∂Π)T,P,ni
(3.1.)
onde, c é a concentração da espécie (neste caso, DBPC), A é a área comprimida, e (∂A/∂Π) é o declive da recta do
gráfico da isotérmica.
Efectuando a extrapolação para a pressão superficial zero, a intercepção dá-nos a área por molécula de
DBPC que seria esperada obter para um estado hipotético de uma camada empacotada-fechada, não comprimida,
correspondendo a um valor de ~43 Å2 para este fosfolípido. A áreas superficiais mais baixas (~35 Å2) e a pressões
elevadas (~60 mN/m), ocorre o colapso (região IV) da isotérmica e a compressibilidade aproxima-se do infinito,
pois as forças aqui exercidas são demasiado fortes para o confinamento em duas dimensões. Assim, as moléculas
são “lançadas” para fora do plano da monocamada, ou para a subfase (moléculas mais hidrofílicas), ou para a
superfase (moléculas mais hidrofóbicas), caracterizada por uma descida brusca da pressão superficial.
Todas as isotérmicas apresentadas mostram apenas o ponto inicial em que se atinge o colapso. Para que o
colapso seja atingido e registado nas isotérmicas é necessário, entre outros factores, que o nível da subfase não esteja
muito elevado, pois se tal acontecer a subfase começará a transbordar para fora da tina perto das extremidades das
barreiras ou nas descontinuidades (cantos), não sendo possível registar toda a isotérmica do fosfolípido.
O colapso das isotérmicas de DBPC, foi atingido a pressões superficiais ligeiramente inferiores a 60 mN/m,
quer na interface ar-água, quer na interface água-solução aquosa (NaCl ou LiCl), e a área molecular média do
colapso para as isotérmicas de DBPC foi de ~35 Å2, o que está de acordo o obtido por Rosilio et al. [75]. Tal como
Rosilio et al., também aqui se observou que a isotérmica não exibe uma fase fluída e a pressão superficial na
transição da fase expandida para a fase condensada é muito baixa (< 1 mN/m).
A isotérmica de DBPC apresenta o mesmo comportamento nas interfaces ar-água e ar-solução aquosa (LiCl
ou NaCl), não sendo aparentemente afectadas com a introdução destes sais na solução aquosa, pois para ambas
obteve-se as mesmas curvas da isotérmica e os mesmos estados de transição de fase. Ou seja, as isotérmicas
mostram não ser dependentes do electrólito da subfase aquosa.
3.1.3. Estudo da isotérmica do fosfolípido DAPC (C20) na interface ar-água
Na figura 3.2. está representada a pressão superficial (Π), em função da área molecular média (A), para o
fosfolípido DAPC à temperatura de ~20 ºC, correspondente à isotérmica deste fosfolípido obtida por compressão
lateral.
56
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
70
Subfase: água; VDAPC adicionado à subfase = 50 μL
Experiência 1-: [DAPC] = 1.04 mg/mL
Experiência 2-: [DAPC] = 1.04 mg/mL
Experiência 3-: [DAPC] = 1.05 mg/mL
Experiência 4-: [DAPC] = 1.05 mg/mL
60
-1
50
Π / mN.m
Relatório de Seminário
40
30
20
10
0
20
30
40
50
60
70
80
90
100
2
A/Å
Figura 3.2.: Isotérmicas do fosfolípido DAPC na interface ar-água. Velocidade de compressão: 5 mm/min.
As isotérmicas do fosfolípido DAPC apresentam uma variação no comportamento para as mesmas
condições experimentais, na interface ar-água. Tal diferença pode ser explicada pelo facto da concentração ou da
quantidade adicionadas à subfase aquosa não serem exactas. Dada a instabilidade da solução fosfolípidoclorofórmio, devido à rápida evaporação do solvente à temperatura ambiente, a concentração do fosfolípido é
alterada, o que faz com que os dados introduzidos no programa de software não correspondam à realidade, obtendose isotérmicas deslocadas ora para a esquerda, ora para a direita. Verificou-se que durante a abertura das soluções
contendo o fosfolípido, o solvente clorofórmio evaporava rapidamente, ocorrendo mudanças súbitas de
concentração, o que fez com que os resultados não fossem reprodutíveis de experiência para experiência. Este facto
não foi tão marcante no caso dos outros fosfolípidos.
Um outro factor que poderá ter contribuído para os resultados obtidos, terá sido a má limpeza da subfase ou
do material experimental, ou ainda, o facto do fosfolípido não se encontrar nas melhores condições, pois verificouse que ao longo do tempo este fosfolípido sofre uma rápida degradação, originando uma grande diferença entre as
isotérmicas com soluções novas, acabadas de preparar (experiência 1, 2 e 3), e com soluções mais antigas, ou seja,
abertas e usadas durante um maior número de vezes (experiência 4). As experiências 1 e 2 foram efectuadas com a
mesma solução de DAPC e a experiência 3 foi realizada com uma nova solução de DAPC.
Também neste caso, as diferenças observadas estão relacionadas com o que foi dito anteriormente, ou seja,
o facto de para o mesmo volume adicionado à subfase aquosa a concentração não ser a mesma, o número de
moléculas por área será também diferente. Estes erros no cálculo da concentração da solução, originam resultados
diferentes, daí o deslocamento das isotérmicas ao longo do eixo das abcissas. Como tal, o valor da área molecular
média para o qual a isotérmica começa a variar bruscamente e que é característica deste fosfolípido, não é
reprodutível nas experiências efectuadas. A isotérmica da experiência 4 apresenta ainda um comportamento
57
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
completamente diferente de todas as outras. Este facto poderá estar relacionado com a explicação dada
anteriormente, ou ainda ser resultado do fosfolípido não se encontrar nas melhores condições.
Desta forma, perante os resultados obtidos, nada se pode concluir quanto à forma e comportamento da
isotérmica deste fosfolípido.
Contudo, os resultados obtidos na experiência 3, mostram a existência de três regiões distintas (não
representadas no gráfico por simplificação), tal como no caso do fosfolípido DBPC, correspondentes a três estados
físicos de transição de fases. Este resultado parece ser concordante com as isotérmicas obtidas por elipsometria por
Ducharine et al. [84], que tal como a DBPC, o fosfolípido DAPC apresenta uma pressão superficial na transição da
fase expandida para a fase condensada também muito baixa (< 1mN/m), mostrando apenas um comportamento de
fase sólida em compressão.
Desta forma, analisando a experiência 3, observou-se que o colapso foi atingido ~55 mN/m, e a área
molecular média correspondente ao colapso foi de ~50 Å2. Verificou-se uma variação brusca na isotérmica,
correspondente à transição de fase (líquido expandido para líquido condensado) a uma área molecular média de ~57
Å2. Ducharine et al. obtiveram um valor de pressão superficial para o colapso ligeiramente inferior a 50 mN/m,
correspondente a uma área molecular média de ~44 Å2. A mudança brusca na isotérmica correspondente à transição
de fase, líquido expandido para líquido condensado, foi obtida para uma área molecular média de ~59 Å2.
Desta forma, a experiência 3 parece estar mais concordante com o que é observável para este fosfolípido
comparativamente ao obtido por aqueles autores. Contudo, os resultados obtidos até à data não foram
suficientemente esclarecedores para se puder dizer que esta é a isotérmica representativa do fosfolípido DAPC, pelo
que em futuras investigações, poderá ser objecto de estudo.
3.1.4. Estudo da isotérmica do fosfolípido DSPC (C18) na interface ar-água. Estudo
do efeito do electrólito da subfase aquosa
Tal como nos dois casos anteriores determinou-se a isotérmica de DSPC. As isotérmicas de DSPC, tal
como nas isotérmicas de DBPC, parecem não serem influenciadas pelo electrólito na subfase aquosa, uma vez que,
as isotérmicas obtidas nas interfaces ar-água e ar-solução aquosa (NaCl), apresentam as mesmas curvas e os mesmos
estados de transição de fase, observando-se ligeiras diferenças apenas na região III. Tal diferença pode ser explicada
pelo facto do volume da subfase contida na tina variar ligeiramente de experiência para experiência.
Na figura 3.3. está representada a pressão superficial (Π), em função da área molecular média (A), para o
fosfolípido DSPC à temperatura de ~20 ºC.
A isotérmica de DSPC apresenta também quatro regiões distintas correspondentes a quatro estados físicos
de transição de fases: I – “estado gasoso”; II – líquido expandido; III – líquido condensado; e IV – colapso. A
explicação para a formação destes estados ou fases é a mesma que para a isotérmica de DBPC.
58
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
70
QUÍMICA ANALÍTICA
II
III
IV
I
Experiência 1subfase: água+10 mM NaCl;
[DSPC] = 0.53 mg/mL;
V DSPC adicionado à subfase = 60 μ L
60
-1
50
Π / mN.m
Relatório de Seminário
Experiência 2subfase: água;
[DSPC] = 0.93 mg/mL;
V DSPC adicionado à subfase = 40 μ L
40
30
20
10
0
20
30
40
52
50
60
A/Å
70
80
90
100
2
Figura 3.3.: Isotérmicas do fosfolípido DSPC na interface ar-água e ar-solução aquosa. Velocidade de compressão:
5 mm/min.
Na isotérmica da figura 3.3. a pressão superficial na transição da fase expandida para a fase condensada é
também muito baixa, tal como nos casos anteriores. Para as isotérmicas de DSPC o colapso foi atingido a pressões
superficiais ~60 mN/m. Estes valores encontram-se muito próximos dos obtidos por Mälkiä et al. [79]. A área média
por molécula correspondente ao colapso foi de ~37 Å2, um pouco inferior à obtida por Liljeroth et al. [77], e
Grandell e Murtomäki [74], respectivamente, 43 Å2 e 40 Å2 (a diferença pode ser devido ao nível da subfase estar
um pouco elevado). Esta área molecular é cerca de duas vezes a área superficial do ácido esteárico (~22 Å2) [74].
Também de acordo com o que foi observado por Mälkiä et al. [79] e Liljeroth et al. [77], a pressão
superficial para a isotérmica de DSPC começou rapidamente a aumentar para valores situados entre 52–54 Å2,
correspondentes ao estado de mudança de transição de fase, líquido expandido para líquido condensado. Por
extrapolação para a pressão superficial zero, determinou-se a área média por molécula obtida para esta mudança de
fase, que foi de ~52 Å2, estando concordante com o obtido por aqueles autores.
3.1.5. Estudo da isotérmica do fosfolípido DPPC (C16) na interface ar-água. Estudo
do efeito do electrólito de suporte e da sua concentração na subfase aquosa, e
estudo do efeito da temperatura na isotérmica de DPPC
No seguimento do estudo da determinação das isotérmicas para diferentes fosfatidilcolinas, estudou-se a
isotérmica de DPPC na interface ar-água. Os resultados obtidos para a DPPC suscitaram um interesse especial,
porque este fosfolípido apresentou um comportamento bastante diferente do observado para as outras
fosfatidilcolinas.
59
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
A figura 3.4. mostra a isotérmica típica do fosfolípido DPPC, representada pela pressão superficial (Π) em
função da área molecular média (A), obtidas por compressão lateral à temperatura de ~20 ºC.
70
V
IV
II
III
I
60
Π / mN.m
-1
50
40
30
20
10
0
20
30
40
50
60
A/Å
70
80
90
100
110
2
Figura 3.4.: Isotérmica típica do fosfolípido DPPC na interface ar-água. Condições experimentais: subfase – água;
[DPPC] = 1.00 mg/mL; VDPPC adicionado à subfase = 30 μL. Velocidade de compressão: 5 mm/min.
Ducharme et al. [84] observaram por elipsometrica, que as isotérmicas do fosfolípido DPPC a 17 ºC, na
interface ar-solução aquosa (tampão de fosfato, 10-3 M e pH = 7.2), apresentava-se dividida em vários segmentos.
Cada segmento corresponderia à área molecular para a qual o filme exibe diferentes estados físicos.
Os resultados obtidos para este fosfolípido mostram um comportamento semelhante. Desta forma, nas
isotérmicas de DPPC é possível observar cinco regiões distintas correspondendo a cinco estados físicos diferentes,
resultantes da transição de fases: I – “estado gasoso”; II – líquido expandido (LE); III – líquido expandido + líquido
condensado (LE+LC); IV – líquido condensado (LC); e V – colapso. Na figura 3.4, é possível observar as diferentes
regiões da isotérmica de DPPC. Em seguida far-se-á uma análise pormenorizada para cada uma dessas regiões.
Inicialmente, as moléculas de DPPC espalhadas à superfície da subfase interagem muito fracamente com as
moléculas de água, encontrando-se completamente desordenadas à superfície, pois a área superficial disponível por
molécula é muito grande e a pressão superficial é muito baixa (~ 0 mN/m). Esta primeira região vai até ~100 Å2, e
corresponde a um “estado gasoso” – I, semelhante a um gás bidimensional.
Entre ~100 Å2 e até ~85 Å2, a diminuição da área por molécula origina um ligeiro aumento da pressão
superficial (desde ~0 mN/m até ~5 mN/m), ocorrendo uma mudança de fase da monocamada do fosfolípido, que
corresponde ao estado líquido expandido (LE ou L1) – II. Segundo Kaganer et al. [85], nesta fase, tal como na fase
gasosa, não são detectados sinais de difracção de raios-X, uma vez que, provavelmente, as “cabeças” das moléculas
estão translacionalmente desordenadas e as cadeias estão conformacionalmente desordenadas.
À medida que a compressão da monocamada continua, observou-se um patamar horizontal até ~55 Å2 e à
pressão superficial constante de ~5 mN/m, correspondente a uma região de estado físico coexistente, sendo um
estado de transição intermediário, designado por LE+LC – III. A existência do patamar horizontal indica que a
60
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
transição é de primeira ordem. O patamar não é perfeitamente horizontal em muitos sistemas, devido à possível
formação de pequenos agregados moleculares ou de micelas [85].
A partir de ~55 Å2 observou-se uma mudança brusca no estado físico, resultante da menor área disponível
por molécula, que é detectado pelo aumento súbito da pressão superficial (observou-se uma linha quase vertical) e
que corresponde à transição de fase para o estado LC – IV. Neste estado a monocamada é menos compressível do
que no estado líquido expandido. Aqui as moléculas devem encontrar-se alinhadas paralelamente umas às outras,
podendo encontrar-se inclinadas em relação à água ou perpendicularmente a ela [85].
O colapso do filme – V, foi observado para pressões ligeiramente inferiores a 60 mN/m, correspondendo a
uma área de ~35 Å2.
A isotérmica deste fosfolípido mostra a existência de um estado físico intermediário (LC+LE), que não foi
observado nas isotérmicas das outras fosfatidilcolinas. Esta região quase horizontal corresponde à coexistência de
um fluído isotrópico e uma fase mais condensada.
É sabido que as moléculas dos lípidos formam “ilhas” altamente organizadas, todavia, existe uma menor
organização entre as “ilhas” formadas [85]. A monocamada não é tão homogénea como a dos ácidos gordos. Esta
organização heterogénea parece ter um papel importante na biomembrana, na medida em que a permibilidade iónica
ocorrerá através das zonas “menos” organizadas.
A isotérmica de um fosfolípido pode ainda ser afectada por vários factores, tais como, a composição da
subfase aquosa, a concentração do electrólito de suporte ou ainda a temperatura da subfase.
Seguidamente apresentam-se os estudos respeitantes à variação destes factores no caso do fosfolípido
DPPC.
Na figura 3.5., estão representados as várias isotérmicas da DPPC para as diferentes situações em estudo: o
efeito da composição da subfase aquosa e o efeito da concentração do electrólito de suporte da subfase (figura 3.5.–
A e B); e o efeito da temperatura da subfase (figura 3.5.–C).
70
70
[DPPC] = 1.00 mg/mL;
VDPPC adicionado à subfase = 30 μL
60
40
30
Experiência4subfase: água
Experiência5subfase: água +10 mM CdCl2.H2O
Experiência6subfase: água +10 mM NaCl
50
Π (mN/m)
Π (mN/m)
60
Experiência 1subfase: água +100 mM HCl
Experiência 2subfase: água +100 mM KCl
Experiência 3subfase: água +100 mM LiCl
Experiência 4subfase: água
50
[DPPC] = 1.00 mg/mL;
VDPPC adicionado à subfase = 30 μL
40
30
20
20
10
10
0
0
20
30
40
50
60
70
80
90
100
20
2
A)
30
40
50
60
70
2
A/ Å
B)
61
A/ Å
80
90
100
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
70
[DPPC] = 1.00 mg/mL;
VDPPC adicionado à subfase = 30 μL
Subfase: água
Experiência 7Temperatura ~10ºC
Experiência 4Temperatura ~20ºC
Experiência 8Temperatura ~30ºC
Experiência 9Temperatura ~40ºC
60
Π (mN/m)
50
40
30
20
10
0
20
30
40
50
60
70
80
90
100
2
C)
A/ Å
Figura 3.5.: Isotérmicas do fosfolípido DPPC para diferentes estudos: A) e B) O efeito da composição e da
concentração da subfase aquosa na isotérmica de DPPC. C) O efeito da temperatura na isotérmica de DPPC.
Velocidade de compressão: 5 mm/min.
Os resultados obtidos mostram que todas as isotérmicas apresentam as mesmas curvas e os mesmos estados
físicos de transição de fases anteriormente descritos, com a excepção dos obtidos para diferentes valores de
temperatura. No entanto, observou-se alguns desvios das isotérmicas, ora para a esquerda ora para a direita, quando
comparadas com a isotérmica contendo apenas água Millipore (figura 3.4.). Este comportamento não seria de todo
esperado, pois os estados físicos ocorrem para áreas por molécula que são características deste fosfolípido. As
diferenças estão relacionadas, muito provavelmente, com o facto da concentração ou a quantidade de fosfolípido
adicionada à subfase não ser exacta, ou ainda, devido à presença de contaminantes na subfase aquosa, provocando
deslocamentos das isotérmicas ao longo do eixo das abcissas. Desta forma, para os sistemas estudados a
concentração e o tipo de electrólito de suporte da subfase, parecem não influenciar significativamente as curvas da
isotérmica e os estados de transição de fase da DPPC, como mostra a figura 3.35.–A e B, tal como tinha sido
observado por Mingis et al. [21].
A excepção parece estar relacionada com o ponto de colapso, onde a presença de catiões divalentes
originou um colapso mais rápido. O resultado não está de acordo com o previsto, pois sabe-se que, a estabilidade de
uma monocamada pode ser aumentada pela adição de catiões divalentes (aqui Cd2+) [1] à fase aquosa. A origem da
sua capacidade de ligação ainda não é muito clara –uma “afinidade” não especificada dos lípidos para catiões [74] –,
mas está provavelmente relacionado com a forte hidratação dos catiões divalentes e a partilha da sua esfera de
hidratação com os grupos da “cabeça” dos lípidos [74]. Os catiões divalentes também têm um campo eléctrico
relativamente forte à sua volta e algumas forças atractivas de longo alcance (ião-dipolo, etc.), podem também
contribuir para a ligação. Desta forma, seria de esperar que a experiência 5 apresenta-se um valor de colapso
ligeiramente superior ao observado. Tal facto não se verificou devido possivelmente ao nível da subfase estar
62
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
ligeiramente elevado, relativamente às outras experiências, provocando o transbordo da subfase para fora dos limites
da tina, antes de toda a isotérmica ser registada.
A figura 3.5.–C, mostra que a isotérmica do fosfolípido DPPC é fortemente dependente da temperatura.
Assim, para temperaturas mais baixas (10 ºC) ou mais elevadas (30 e 40 ºC), relativamente à temperatura de 20 ºC,
não é observado um patamar correspondente ao estado intermédio LE+LC, observando-se apenas a fase de transição
de primeira ordem de uma fase líquido expandida para uma fase líquido condensada. Este efeito é mais pronunciado
a baixas temperaturas (experiência 7), sendo quase imperceptível a temperaturas mais elevadas (experiência 8 e 9).
Estes resultados mostram ainda que a temperatura à qual é possível distinguir com clareza todos os estados físicos,
correspondentes à transição de fases, é ~20 ºC.
3.1.6. Estudo da isotérmica de misturas de fosfatidilcolinas na presença da enzima
Glucose Oxidase (GOx) na interface ar-água
Uma vez caracterizada as isotérmicas de cada uma das fosfatidilcolinas estudadas, foi também objectivo
deste trabalho observar o comportamento de misturas de fosfolípidos, bem como, a influência da GOx no
comportamento das isotérmicas dessa mistura.
Na figura 3.6. e na tabela 3.1., encontram-se os resultados obtidos para os estudos de misturas de
fosfatidilcolinas, e o efeito na presença da enzima GOx.
70
Experiência9
Experiência10
60
50
60
50
40
30
40
20
30
Experiência5
Experiência6
Experiência7
Experiência8
50
Π (mN/m)
Π (mN/m)
60
Π (mN/m)
70
70
10
40
30
0
20
20
30
40
50
Experiência1
Experiência2
Experiência3
Experiência4
10
60
70
80
90
100
20
2
A/ Å
10
0
0
20
30
40
50
60
70
80
90
100
20
2
A)
30
40
50
60
70
80
90
100
2
A/ Å
B)
A/ Å
Figura 3.6.: A) Isotérmicas da mistura de fosfatidilcolinas [DPPC+DSPC] na interface ar-água. B) Isotérmicas da
mistura de fosfatidilcolinas [DPPC+DSPC] na presença de GOx na interface ar-água. Velocidade de compressão: 5
mm/min. As condições experimentais referentes a cada experiência encontram-se descritas na tabela 3.1.
63
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Tabela 3.1.: Condições experimentais utilizadas para a obtenção das isotérmicas da mistura de
fosfatidilcolinas [DPPC+DSPC] na presença da GOx, na interface ar-água, representadas na figura 3.6.
Exp.*
Subfase: água +
Substâncias:
Volume das substâncias
Volume de GOx
100 mM NaCl
[DPPC+DSPC] /
adicionadas à subfase/ μL
adicionado à subfase
/ μL
-1
mg.mL
1
(0.54 + 0.45) = 0.99
30
−
2
(0.20 + 0.80) = 1.00
30
−
3
(0.80 + 0.20) = 1.00
30
−
4
(0.20 + 0.80) = 1.00
40
−
1
(0.54 + 0.45) = 0.99
30
1000 (9.6 nM GOx)
5
6
+ 98 nM GOx
(0.54 + 0.45) = 0.99
30
−
7
+ 10 μM GOx
(0.20 + 0.80) = 1.00
30
−
8
+ 10 μM GOx
(0.80 + 0.20) = 1.00
30
−
9
Só [DSPC] = 0.53
60
10
Só [DPPC] = 1.00
30
−
*Temperatura experimental: ~20 ºC.
1
Nesta experiência a GOx foi injecta na subfase. Em todas as outras experiências foram preparadas soluções de
GOx em solução aquosa de NaCl.
A figura 3.6.–A, mostra o comportamento das isotérmicas da mistura de fosfatidilcolinas (DPPC+DSPC).
Observou-se que para fracções aproximadamente equivalentes de DSPC e DPPC (0.45 e 0.54 mg/mL,
respectivamente – experiência 1) a isotérmica apresenta um comportamento intermédio entre as duas monocamadas
puras de fosfolípidos (experiência 9 e 10). Este facto sugere que a mistura de fosfolípidos forma monocamadas
contendo alternativamente moléculas de DPPC e DSPC à superfície da interface, ou seja, do tipo ABABAB...
Aumentando a concentração de DSPC relativamente à DPPC (experiência 2 e 4), observou-se que a maior
fracção deste fosfolípido (DSPC) à superfície da subfase aquosa por área da tina, originou uma isotérmica similar à
obtida quando estamos na presença apenas de DSPC, devido possivelmente ao seu melhor rearranjo molecular à
superfície da subfase (note-se a reprodutividade das duas experiências). De igual modo, quando a quantidade de
DPPC (experiência 3) foi muito superior à de DSPC, a isotérmica adquiriu um comportamento semelhante ao
observado para a isotérmica de DPPC, pelas razões já citadas. Contudo, a definição das regiões correspondentes à
transição de fases são agora menos perceptíveis que anteriormente, pois não se observa praticamente nenhuma
diferença na passagem da fase líquido expandido para a fase intermediária LC+LE.
Na figura 3.6.–B, verificou-se que a presença de GOx parece afectar ligeiramente o comportamento da
mistura de fosfatidilcolinas (DSPC+DPPC). O comportamento observado mostra algumas semelhantes com o obtido
por Sun et al. [86], que obtiveram a isotérmica da glucose oxidase nativa (GO) em 20% de metanol espalhada sobre
uma subfase contendo 2.5 mM BaCl2 e pH = 5.6. Nesta isotérmica observa-se apenas um estado sólido (tais como,
as que se obtiveram aqui). No entanto, a passagem ao estado líquido condensado é mais lento nas isotérmicas aqui
64
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
obtidas. Tal facto, dever-se-á à presença da mistura de fosfatidilcolinas que levam mais tempo a organizarem-se na
superfície da subfase aquosa. Comparando com a mistura inicial na ausência de GOx, verifica-se que a isotérmica
deixou de ter as regiões correspondentes à transição de fase, observando-se apenas uma fase líquido expandido e
outra líquido condensada. Verificou-se que o facto da GOx se encontrar já em solução na subfase aquosa
(experiência 6) ou a sua posterior injecção na subfase aquosa (experiência 5), não teve qualquer influencia nas
curvas da isotérmica (para concentrações de GOx muito baixas).
Para misturas de fosfatidilcolinas contendo maior quantidade de DSPC e na presença de GOx, observou-se
que a passagem até ao estado líquido condensado ocorre em condições idênticas, à observada na ausência de GOx.
Contudo, o estado condensado ocorre a uma área molecular média mais baixa na presença de GOx, devido à grande
quantidade de moléculas que se encontram em contacto na subfase aquosa, tal como pode ser observado pelo declive
menos acentuado da experiência 7, comparativamente com o das experiências 2 e 4.
Os desvios que são observados nas isotérmicas apresentadas em cada uma das experiências, estão
relacionados, com o facto da concentração ou da quantidade de fosfolípidos adicionados à subfase aquosa não serem
exactas, ou devido à presença de contaminantes na subfase, ou ainda, devido à presença da própria enzima (GOx).
Para determinar este último efeito seriam necessários efectuar estudos mais aprofundados para concentrações de
GOx mais elevadas.
3.1.7. Transferência de monocamadas de fosfolípidos para substractos sólidos
Os filmes de Langmuir podem ser transferidos para diferentes substratos sólidos, tais como, Si, Pt, Au e
vidro usando a técnica de Langmuir-Blodgett (LB). No entanto, há que ter em conta que alguns filmes nunca se
tornam estáveis, devido ao facto das moléculas serem parcialmente solúveis na água ou tenderem a formar micelas
na superfície que depois penetram na subfase aquosa.
Após um único ciclo de deposição efectuou-se a compressão e a deposição a uma pressão constante de 45
e/ou 50 mN/m, nas condições descritas no capítulo 2, secção 2.2.2.
O objectivo deste estudo foi verificar e detectar a transferência de monocamadas de fosfolípidos da
superfície da subfase aquosa na presença ou na ausência de GOx para slides de Au, utilizando o método de
deposição. Para facilitar a análise dos filmes utilizou-se substratos sólidos de Au e a sua análise foi efectuada a partir
dos espectros de transmitâncias e absorvâncias de infravermelho.
3.1.7.1. Transferência da monocamada de DBPC para slides de Au
Como o filme do fosfolípido formado à superfície da subfase é hidrofóbico, o slide de Au foi depositado de
cima para baixo (capítulo 1, secção 1.2.3.).
Depois de se espalhar o fosfolípido à superfície da subfase esperou-se cerca de 30 minutos para deixar o
solvente evaporar. Em seguida seleccionou-se um “target” (pressão superficial constante a que se efectuou a
deposição), e iniciou-se a compressão. Para se obter uma correcta razão de transferência (RT) teve que se esperar até
que a monocamada estivesse suficientemente estável. (RT = razão entre as variações/reduções da área da
monocamada durante a deposição e a área do substrato que foi utilizada).
65
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Desta forma, se atingir o “target” seleccionado (Π = 45 e/ou Π = 50 mN/m) injectou-se o volume de
enzima correspondente na subfase aquosa e esperou-se por um período de 20-30 minutos para obter a estabilidade
requerida para a deposição. Após este tempo efectuou-se a deposição do slide. Os resultados obtidos para a
deposição podem ser visualizados na figura 3.7.
A figura 3.7., mostra a isotérmica de DBPC na presença de GOx na subfase aquosa à temperatura de ~20
ºC. Verificou-se que à medida que o slide de Au penetra na subfase aquosa ocorre um aumento da transferência da
monocamada, diminuindo, consequentemente, a área da monocamada presente na subfase aquosa.
70
[DBPC] = 1.00 mg/mL
subfase: água
VDBPC adicionado à subfase = 40 μL
60
Π / mN.m
-1
50
Experiência 1Injecção de 100 μL de GOx 2.5 μM
na subfase aquosa
Experiência 2Injecção de 100 μL de GOx 5.0 μM
na subfase aquosa
40
30
20
10
0
20
30
40
50
60
70
80
90
100
2
A / Å
Figura 3.7.: Isotérmicas de DBPC obtidas por compressão na interface ar-água na presença da enzima GOx na fase
aquosa. Velocidade de compressão: 5 mm/min. Velocidade de deposição: 2 mm/min.
Através da análise do espectro de reflectância (figura 3.8.) do slide de Au, resultante da deposição da
monocamada de DBPC, na presença da enzima GOx na fase aquosa, verificou-se que ocorreu transferência da
monocamada de DBPC presente na superfície da subfase aquosa para o slide de Au, pois as bandas assinaladas a
azul, correspondem aos diferentes grupos funcionais que se podem encontrar na constituição da molécula de DBPC.
66
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
0,010
2
0,008
1
5
0,006
3 4
Experiência 1Injecção de 100 μL de GOx 2.5 μM
na subfase aquosa
Experiência 2Injecção de 100 μL de GOx 5.0 μM
na subfase aquosa
0,004
Reflectância
[DBPC] = 1.00 mg/mL
subfase: água
VDBPC adicionado à subfase = 40 μL
0,002
0,000
-0,002
-0,004
-0,006
5000
4000
3000
2000
1000
-1
Número de onda / cm
Figura 3.8.: Espectros de reflectância de slides de Au depositado na monocamada do fosfolípido DBPC, na
presença de GOx na subfase aquosa. Velocidade de compressão: 5 mm/min; velocidade de deposição: 2 mm/min.
Desta forma, recorrendo à tabela de espectros de infravermelho da referência [87], pode fazer-se uma
análise das bandas obtidas na figura 3.8. Assim, a banda assinalada com o n.º 1, com valores de absorvância entre
~3960-2830 cm-1 indica a presença de ligações O-H, devido à água contida no slide; a banda nº 2, com valores de
absorvância entre ~3010-2830 cm-1, indica a presença dos grupos da cadeia alifática, CH2, CH3 (ligações C-H) e de
grupos N-CH3; a banda n.º 3, com valores de absorvância entre ~1830-1610 cm-1 indica a presença de grupos ésteres
(COOR); a banda n.º 4, com valores de absorvância entre ~1480-1350 indica a presença de ligações C-H2 no plano;
a banda n.º 5, com absorvância entre ~1270-940 cm-1 indica a presença de grupos éter (R–O–R), ligações:
alquilaminas C-N strech e P-O alquil.
Não se evidencia a presença de grupos funcionais pertencentes à enzima GOx, pelo que esta não terá sido
transferida da subfase aquosa para o slide de Au durante a deposição, possivelmente devido ao seu grande tamanho
e volume, ou devido ao facto desta se dissolver na subfase aquosa não penetrando na monocamada do fosfolípido,
ou ainda, devido ao facto da concentração de GOx presente em solução ser muito pequena para que a sua
transferência ocorresse para o slide. Assim, para as gamas de concentrações de GOx estudadas, não se observa
qualquer influência desta, quer na isotérmica do fosfolípido, quer na transferência para substractos sólidos, como se
pode comprovar pelos espectros de absorvância obtidos.
A deposição da monocamada foi efectuada de acordo com o que está representado na figura 1.14. do
capítulo 1, secção 1.2.4. Trata-se de um processo de deposição do tipo-X para filmes hidrofóbicos do fosfolípido,
onde as “caudas” do fosfolípido estariam orientadas para o interior do substrato sólido, enquanto que as “cabeças”
ficaram dirigidas para fora do substrato.
67
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
3.2. Estudos de adsorção de fosfatidilcolinas e da enzima GOx em interfaces
líquido-líquido polarizadas
Nesta segunda fase, o presente trabalho teve como objectivo caracterizar e estudar electricamente a
adsorção de diferentes fosfatidilcolinas e da enzima GOx na interface entre duas soluções de electrólitos imiscíveis
(ITIES). Para caracterizar essa interacção obtiveram-se as curvas de capacidade de dupla camada na interface
polarizada, utilizando-se a espectroscopia de impedância electroquímica (EIE) e a voltametria cíclica (v.c.). Foram
também efectuados estudos de adsorção de fosfolípidos, na presença da GOx na fase aquosa, com o objectivo de
determinar o seu efeito e influência na formação de monocamadas de fosfatidilcolinas em interfaces líquido-líquido
polarizadas.
Embora as alterações na estrutura da dupla camada da interface, induzida pela adsorção de uma
monocamada de fosfolípido, possam ser consideradas como um modelo simplista para as membranas biológicas
[69], estas não produzem, um ambiente fisicamente realista para a configuração de proteínas transmembranares. A
principal diferença é a presença do solvente orgânico no interior da monocamada. As moléculas do solvente
orgânico “filtram” as interacções atractivas entre as caudas dos hidrocarbonetos dos fosfolípidos, e
consequentemente tornam a camada mais expandida. Na maior parte dos estudos de monocamadas de fosfolípidos
nas ITIES, a camada tem sido formada por adsorção do lípido a partir da fase orgânica [74]. Contudo, existe uma
incerteza quanto ao estado exacto da camada devido à incapacidade de controlar a pressão superficial.
Os estudos electroquímicos de tais monocamadas pode, por sua vez, fornecer informação fundamental na
transferência de massa através das bicamadas lipídicas, à medida que a velocidade de transferência de carga é
medida como uma corrente eléctrica.
Todas as experiências de medição de impedâncias electroquímica para a obtenção das curvas da capacidade
em função do potencial aplicado, que a seguir se apresentam, foram realizadas à temperatura ambiente e a pH ~7
(excepto aquelas em que o objectivo era estudar o efeito do pH), pois as fosfatidilcolinas utilizadas possuem um
grupo zwiterião cujo domínio de estabilidade corresponde ao pH de uma solução neutra [58].
As medições de impedâncias foram efectuadas após se terem definido as janelas de potencial a partir dos
voltamogramas cíclicos dos sistemas em estudo. Estas medições foram efectuadas na zona de potencial entre -250
mV e 250 mV para os diferentes sistemas em estudo, com o objectivo de se obterem as respectivas curvas de
capacidade.
Todas os dados de impedâncias obtidos a cada potencial para todos os sistemas em estudo formam bem
ajustados pelo circuito equivalente representado na figura 1.22. (erros de ajuste entre 2-5%), utilizando o programa
EQUIVCRT desenvolvido por Boukamp [56].
68
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
3.2.1. Efeito do pH na adsorção de GOx na interface água/1,2-DCE polarizada
Começou-se por estudar o efeito do pH da solução aquosa no processo de adsorção da GOx na interface
água/1,2-DCE. Para pH 7, a célula electroquímica utilizada pode ser esquematizada da seguinte forma:
10 mM NaTPB
Célula 1:
Ag AgCl
(RE2)
+
100 mM LiCl +
10 mM TOATPB
10 mM Na2HPO4 +
AgCl
Ag
.
10 mM NaCl
(1,2–DCE)
10 mM NaH2PO4 2H2O
(H2O)
(org)
(H2O)
(RE1)
pH ~ 7
A esta célula foi adicionado 0.1 μM de GOx à fase aquosa.
Para os restantes valores de pH foram preparadas as respectivas soluções aquosas, substituindo-se a solução
aquosa de pH 7 da célula anterior pelas soluções a seguir indicadas:
100 mM LiCl +: 100 mM HCl (pH 1), ou 10 mM HCl (pH 2), ou 0.158 M Na2HPO4 + 10 mM
NaH2PO4.2H2O (pH 8.4), ou 2.51x10-3 M Na2HPO4 + 10 mM NaH2PO4.2H2O (pH 6.6).
Da observação dos voltamogramas cíclicos (figura 3.9.–B) para os diferentes sistemas em estudo, não se
observaram diferenças significativas, nos valores de intensidade de corrente para as soluções a diferentes valores de
pH contendo 0.1 μM de GOx.
Na figura 3.9.–A, estão representadas as curvas de capacidade em função do potencial aplicado para uma
mesma concentração de GOx (0.1 μM) a diferentes valores de pH. Este valor de concentração de GOx foi escolhido,
no sentido de avaliar o efeito do pH para concentrações de GOx muito baixas, pois se o efeito aqui é notório, para
concentrações mais elevadas esse efeito será proporcional à concentração. A enzima possuí um ponto isoeléctrico
(pI) igual a 4.44, e quando em solução aquosa a pH neutro, encontra-se carregada negativamente com 11 cargas
[59]. Por esta razão, com o objectivo de avaliar o efeito do pH, foram escolhidas soluções aquosas com valores de
pH inferiores e superiores ao seu pI.
69
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
25
C / μF.cm-2
20
10
0
10
-10
5
-20
0
50
0.1 μMGOx - pH=7.0
0.1 μMGOx - pH=1.1
0.1 μMGOx - pH=2.0
0.1 μMGOx - pH=6.6
0.1 μMGOx - pH=7.0
0.1 μMGOx - pH=8.4
20
15
0
-250 -200 -150 -100 -50
Relatório de Seminário
30
0 μM GOx - pH = 7.0
0.1 μM GOx - pH = 1.1
0.1 μM GOx - pH = 2.0
0.1 μM GOx - pH = 6.6
0.1 μM GOx - pH = 7.0
0.1 μM GOx - pH = 8.4
I / μA
30
QUÍMICA ANALÍTICA
-30
-300
100 150 200 250
-200
Δφ/ mV
-100
0
100
200
300
400
Δφ / mV
A)
B)
Figura 3.9.: A) Curvas de capacidade interfacial em função do potencial aplicado na interface entre a solução de
1,2-DCE e a solução aquosa contendo 0.1 μM de GOx a diferentes valores de pH. B) Voltamogramas cíclicos
correspondentes ao sistema água/1,2-DCE contendo 0.1 μM de GOx a diferentes valores de pH. Velocidade de
varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação da queda óhmica (IR).
As curvas de capacidade apresentam comportamentos um pouco distintas para os diferentes valores de pH
estudados.
Os valores da capacidade encontram-se abaixo da do electrólito base, o que indica que a GOx adsorveu ao
longo de toda a gama de potenciais. A excepção aconteceu para valores de pH inferiores ao pI da enzima (pH 1 e 2),
onde se observou um aumento da capacidade acima do valor da do electrólito base para Δφ > ~ -50 mV. A estes
potenciais ocorrerá a protonação da enzima GOx na fase aquosa, dificultando a sua adsorção na interface e
aumentando a sua tendência para permanecer em solução aquosa (pois a enzima passará a estar carrega
positivamente), originando o aumento da capacidade interfacial, e consequente, a desorção de GOx da interface.
Para valores de pH superiores ao ponto pI da enzima (pH 6.6 e 8.4), observou-se um maior efeito na
adsorção da enzima, do que a pH próximo do pI da enzima, na interface água/1,2-DCE. Este facto resultará de que a
pH > 4.4, a enzima encontrar-se-á carregada negativamente, resultante da desprotonação dos grupos carregados
positivamente, ocorrendo adsorção ao nível da interface.
Desta forma, as diferenças observadas nas curvas de capacidade indicam que a adsorção de GOx na
interface água/1,2-DCE é afectada pelo pH da fase aquosa.
Este estudo possibilitou a análise da adsorção da enzima GOx (0.1 μM) quando em solução aquosa para
diferentes valores de pH. Uma vez que, se pensa, segundo diversos autores [59,88,89], que a pH ~7 a enzima GOx
terá uma actividade mais elevada, os estudos que a seguir se apresentam com GOx, são todos efectuados com este
valor de pH da solução aquosa.
70
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
3.2.2. Estudo de adsorção da GOx na interface água/1,2-DCE
A adsorção da enzima GOx na interface água/1,2-DCE foi estudada com base nas curvas de capacidade
interfacial, utilizando uma célula electroquímica idêntica à célula 1, representada na secção anterior, adicionandolhe x μM de GOx à fase aquosa.
Na figura 3.10. estão representados alguns exemplos dos voltamogramas cíclicos obtidos utilizando a
referida célula, para diferentes concentrações de GOx na fase aquosa.
80
0 μM GOx
1 μM GOx
2 μM GOx
15 μM GOx
60
40
I / μA
20
0
-20
-40
-60
-80
-300
-200
-100
0
100
200
300
400
Δφ / mV
Figura 3.10.: Voltamogramas cíclicos para a interface água/1,2-DCE na presença de GOx na fase aquosa.
Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização de compensação da queda óhmica (IR).
Os voltamogramas cíclicos mostram que a adição de GOx à fase aquosa não causa qualquer desvio
marcante nas margens da janela de potencial, não se observando diferenças significativas para os diferentes sistemas
em estudo. Não há sinais evidentes de precipitação na interface, resultantes de uma possível desnaturação da
enzima. Pressupõe-se que a enzima não precipita ou induz qualquer transferência iónica dos electrólitos de suporte.
Um exemplo dos espectros de impedância obtidos a –25 mV pode ser observado na figura 3.11.,
representado num diagrama de Nysquist ou de Argand.
71
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
0 μM GOx
0.5 μM GOx
12 μM GOx
4
6x10
4
5x10
4
-Z'' / Ω
4x10
4
3x10
0.5 Hz
4
2x10
4
1x10
200 Hz
0
3
5,0x10
4
1,0x10
4
1,5x10
4
2,0x10
Z' / Ω
4
2,5x10
4
3,0x10
4
3,5x10
4
4,0x10
Figura 3.11.: Exemplo de espectros de impedância para a interface água/1,2-DCE na presença de GOx na fase
aquosa. Δφ = -25 mV.
Após se efectuar o ajuste das impedâncias, obtiveram-se as curvas de capacidade (capacidade da dupla
camada, em função da variação de potencial), representadas na figura 3.12., para as diferentes concentrações de
GOx na fase aquosa.
20
0 μM GOx
0.1 μM GOx
0.5 μM GOx
1 μM GOx
2 μM GOx
5 μM GOx
10 μM GOx
12 μM GOx
C / μF.cm
-2
15
10
5
0
-250
-200
-150
-100
-50
0
50
100
150
200
250
Δφ / mV
Figura 3.12.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de x μM GOx na fase aquosa.
72
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Da análise da figura 3.12., são observáveis diferentes comportamentos nas curvas de capacidade à medida
que a GOx vai sendo adicionada à fase aquosa.
Os valores da capacidade para as diferentes concentrações de GOx encontram-se abaixo da do electrólito
base, o que indica que ocorreu adsorção da enzima ao longo de toda a gama de potenciais estudados.
A potenciais mais negativos a capacidade interfacial diminuiu à medida que se adicionou GOx à fase
aquosa até se atingir uma concentração de GOx de cerca de 5 μM (concentração para a qual os valores de
capacidade atingem um valor mais baixo, correspondente a uma possível saturação interfacial). A concentrações de
GOx superiores a 5 μM, observou-se um aumento nos valores da capacidade.
Uma possível explicação é que, à medida que a concentração de GOx aumenta na fase aquosa, a adsorção
da enzima na interface origina uma diminuição da capacidade até um valor mínimo para a qual se atinge a saturação
(para a gama de concentrações estudadas corresponde a CGOx = 5 μM). Para concentrações superiores a 5 μM, a
enzima poder-se-á comportar como uma camada dieléctrica [59], bloqueando a interface (pois a saturação foi
atingida), originando um aumento da capacidade interfacial.
Este comportamento foi também observado por Georganopoulou et al. [59] na interface água/TBuATPB
(DCE) e água/BTPPATPB (DCE). No entanto, ao contrário do que foi observado por aqueles autores, para o sistema
em estudo foi possível definir o valor de potencial de carga zero (pcz– potencial mínimo, resultante da intersecção
das curvas de capacidade [68]), ou seja, um ponto de intersecção das curvas Cd vs. E, para as diferentes
concentrações de GOx. No presente caso em estudo, é notório que a partir de Δφ = 0 mV, ocorre uma mudança no
comportamento dos sistemas.
A potenciais positivos a variação da capacidade interfacial com a concentração da enzima GOx na fase
aquosa é inferior à observada a potenciais negativos, o que indica que a estes potenciais a sua adsorção à interface é
menor.
Este efeito pode ter sido originado por variação do potencial de cobertura ou da conformação da enzima
[75,88,89], ou por alteração na co-adsorção do catião orgânico [59], causando uma alteração na quantidade de carga
armazenada na interface.
Também segundo Georganopoulou et al. [59], a capacidade interfacial varia com o tempo e com a
concentração da enzima GOx, alterando o estado de adsorção da enzima, sendo este também afectado pela natureza
e concentração do electrólito de suporte orgânico, daí os resultados não serem concordantes com os obtidos por
aqueles autores. Assim, a incorporação do catião orgânico na camada adsorvida da enzima carregada negativamente,
pode reduzir a reorientação conformacional da enzima, semelhante aos resultados publicados por Rosilio et al. [75]
para o fosfolípido DBPC, onde a adsorção da GOx na interface ar-água foi promovida por co-adsorção de lípido.
Desta forma, a adsorção a potenciais negativos, aumenta até um valor limite de concentração de GOx (CGOx
= 5 μM), podendo este estado de adsorção da enzima ser devido à co-adsorção do catião orgânico. Após a desorção
do catião, à medida que a fase aquosa se torna mais positiva, ocorre um aumento da capacidade, resultante da
desorção da enzima na interface.
Consequentemente, o comportamento observado nas curvas de capacidade para o sistema em estudo parece
depender, quer do potencial aplicado ao sistema, quer da concentração de GOx adicionada à fase aquosa da célula
73
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
electroquímica.
O comportamento observado a potenciais negativos é típico da adsorção de compostos orgânicos em
interfaces electrificadas. Através da representação do valor do potencial correspondente ao mínimo da capacidade,
Δφ(mín. cap.), em função da CGOx (figura 3.13.), pode observar-se que este valor de potencial se desloca para valores
negativos com o aumento da concentração de GOx, atingindo-se um valor constante de Δφ(mín. cap.) a cerca de –25
mV.
Δφmín. cap. / mV
0
-10
-20
-30
0
2
4
6
8
10
12
[GOx] / μM
Figura 3.13.: Deslocamento do potencial ao mínimo de capacidade com o aumento da concentração de GOx.
A partir dos valores da capacidade para as diferentes concentrações de GOx ensaiadas a Δφ = -25 mV
(potencial correspondente ao mínimo de capacidade nas curvas de capacidade para as diferentes concentrações de
GOx na fase aquosa) – figura 3.14., pode entender-se melhor o comportamento observado. A figura 3.14. mostra
claramente que a composição da interface é variável com a concentração de GOx para potenciais negativos.
74
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Δφ = -25 m V
5.5
C / μF.cm
-2
5.0
4.5
4.0
3.5
3.0
0
2
4
6
8
10
12
[G O x] / μ M
Figura 3.14.: Variação da capacidade da dupla camada com a concentração de GOx para Δφ = -25 mV.
Para se estudar o efeito da adsorção, é necessário determinar a isotérmica correspondente. A isotérmica de
adsorção pode ser definida como a relação entre as concentrações interfaciais de um dado surfactante e o grau de
cobertura a temperatura constante. Para interfaces sólido-líquido a equação de adsorção mais utilizada é a de
Langmuir. Uma outra, derivada da equação de Langmuir e mais elaborada, é a equação de isotérmica de Frumkin,
que contém um parâmetro relativo às interacções partícula-partícula, e foi utilizada por Kakiuchi et al. [68] no
estudo de adsorção da DLPC na interface água-nitrobenzeno.
Desta forma, os modelos anteriores podem ser aplicados para efectuar o estudo de adsorção da enzima
GOx.
A adsorção da enzima GOx pode ser descrita pelo modelo de Frumkin, numa primeira aproximação, na
zona de potencial –25 mV. Avaliou-se o valor de θ utilizando a equação de Frumkin, dada a impossibilidade de
determinar o excesso superficial:
Ct = (1–θ).Caq’ + θ.CGOx
(3.2.)
onde, Ct é a capacidade interfacial, θ é a cobertura superficial, Caq’ é a capacidade interfacial sem GOx, e CGOx é a
capacidade interfacial considerando que se forma uma monocamada de GOx completa e compacta na interface. Esta
equação, é apenas válida quando a variação de θ com o potencial é insignificante, facto que se admite neste caso.
Esta hipótese torna-se inadequada nas zonas de potencial positivo, onde dθ/dE é relativamente grande. Assim, dois
modelos de isotérmicas foram aplicados a este sistema:
1. Um modelo mais simples, formulado para uma interface sólido-líquido, modelo da isotérmica de
Frumkin:
75
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
βc = θ/(1–θ) e-2aθ
Relatório de Seminário
(3.3.)
onde, β é o coeficiente de adsorção, c a concentração de fosfolípido, e a o parâmetro de interacção. Rescrevendo a
equação 3.3., temos:
ln β = ln [(θ/c.(1-θ)]-2aθ
(3.4.)
2. Modelo de Volkov, formulado para uma interface líquido-líquido:
βcr = [θ(p–(p–1) θ)p–1] / [pp(1–θ)p] e-2aθ
(3.5.)
onde, p é o parâmetro correspondente ao número de colunas de solvente orgânico que pode ser substituído por uma
molécula de espécie adsorvida, e o parâmetro r corresponde ao número de agregação das moléculas de espécies
adsorvidas na interface.
Recorrendo à figura 3.14., e considerando que se forma uma primeira camada da enzima adsorvida para
concentrações da enzima de ~5 μM, retirou-se o valor da capacidade interfacial da camada saturada, CGOx = 3.3
μF.cm-2, e o valor da capacidade interfacial sem GOx obtido através da relação da capacidade com a concentração,
Caq’ = 5.4 μF.cm-2.
Na figura 3.15. o ln [(θ/CGOx.(1-θ)] é representado em função do grau de cobertura, θ.
18
Δφ = -25 mV
ln [θ/(CGOx.(1-θ)]
16
14
12
10
8
0,0
0,1
0,2
0,3
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
θ
Figura 3.15.: Teste da isotérmica de Frumkin para a enzima GOx a Δφ = –25 mV.
Na tabela 3.2. estão indicados os parâmetros termodinâmicos obtidos neste ajuste.
76
1,0
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Tabela 3.2.: Parâmetros termodinâmicos para a GOx na interface
água/1,2-DCE, obtidos a partir dos resultados da figura 3.12. e 3.15.
Isotérmica
Frumkin
Δφmín. cap. / mV
-25
a
4.0
ln β
8.4
ΔGºads* / KJ.mol-1
-21
Caq’ / μF.cm-2
5.4
CGOx / μF.cm-2
3.3
* ln β = -ΔGºads/RT
Os resultados obtidos mostram que as interacções entre as espécies interfaciais são atractivas, pois o valor
do parâmetro a é positivo. O valor de ln β 8.4, permite o cálculo da energia padrão de adsorção de -21 KJ.mol-1.
Os estudos anteriores possibilitaram a análise de adsorção da enzima GOx quando em solução aquosa, em
função de vários parâmetros químicos experimentais, nomeadamente o potencial, concentração da enzima e pH.
Contudo, foi também objectivo deste trabalho estudar o efeito da presença da GOx na fase aquosa, quando na
presença de fosfatidilcolinas na fase orgânica, no sentido de determinar em que medida a presença de GOx
condiciona ou não as características de adsorção das fosfatidilcolinas. Esses estudos são seguidamente apresentados.
3.2.3. Estudos de adsorção de DAPC (C20). Efeito da presença de GOx na fase
aquosa
O fosfolípido DAPC, é uma fosfatilcolina com duas cadeias de 20 átomos de carbono cada uma (C20). O
esquema da célula electroquímica é igual ao apresentado na secção 3.2.1. (célula 1), tendo-se, neste caso,
acrescentado 1 μM DAPC à fase orgânica e x μM de GOx à fase aquosa, para se obterem as respectivas curvas de
capacidade. Foi escolhida esta concentração de fosfolípido, apenas como ponto de partida para se iniciar o estudo.
Os voltamogramas cíclicos mostram que a presença do fosfolípido na fase orgânica e a adição de GOx na
fase aquosa não causam qualquer desvios marcantes nas margens da janela de potencial.
A figura 3.16., mostra as curvas de capacidade (capacidade da dupla camada em função da variação do
potencial), para o sistema em estudo e para as várias concentrações de GOx adicionadas à fase aquosa, na presença
do fosfolípido na fase orgânica.
77
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
30
0 μM DAPC + 0 μM GOx
1 μM DAPC + 0 μM GOx
1 μM DAPC + 0.2 μM GOx
1 μM DAPC + 1 μM GOx
1 μM DAPC + 10 μM GOx
25
C / μF.cm-
2
20
15
10
5
0
-200
-150
-100
-50
0
50
100
150
200
Δφ / mV
Figura 3.16.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2–DCE na presença de 1 μM de DAPC na fase orgânica,
e para diferentes concentrações de GOx adicionadas à fase aquosa.
Da análise das curvas de capacidade observou-se que a potenciais negativos, a presença do fosfolípido (e
na ausência de GOx na fase aquosa) origina uma diminuição da capacidade interfacial, resultante da adsorção do
fosfolípido na interface. À medida que a enzima vai sendo adicionada à fase aquosa, ocorreu um aumento da
capacidade interfacial, e consequente, à desorção do fosfolípido, sendo este efeito tanto maior quanto maior a
concentração da GOx na fase aquosa.
A explicação para este facto é que a enzima pode bloquear a interface, impedindo a adsorção do
fosfolípido, aumentando o valor da capacidade. O efeito observado a potenciais negativos poder-se-á dever ainda, a
uma possível substituição das moléculas de fosfolípido (desorção) da interface por moléculas de GOx (adsorção), ou
pela partilha mútua da interface por ambas as espécies (adsorção mútua).
A potenciais positivos, a capacidade interfacial para os diferentes sistemas segue praticamente a do
electrólito base, indicando que as espécies em estudo terão uma maior tendência para permanecer na solução em que
foram colocadas inicialmente.
Contudo, como demonstraram os estudos efectuados com a balança de Langmuir (apresentados na secção
3.1.3.), este fosfolípido possuí um comportamento que varia bruscamente com o factor tempo, sendo difícil de
avaliar até que ponto as suas soluções são estáveis, pois parece que este fosfolípido sofre uma rápida degradação ao
longo do tempo. Perante estas dúvidas não se realizaram mais ensaios com DAPC e os estudos foram orientados
para outras fosfatidilcolinas.
78
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
3.2.4. Estudos de adsorção de DBPC (C22). Efeito da presença da GOx na fase
aquosa
No seguimento do estudo anterior foram efectuados ensaios com o fosfolípido DBPC (C22). As condições
experimentais anteriormente descritas foram mantidas na realização destes ensaios, adicionando x μM de DBPC à
fase orgânica e x μM de GOx à fase aquosa, na célula electroquímica representada na secção 3.2.1.
Não se observaram diferenças significativas nos voltamogramas cíclicos pela adição de DBPC à fase
orgânica para os sistemas em estudo, nem mesmo com a adição de GOx na fase aquosa.
A figura 3.17.–A, B, C e D, mostra as curvas de capacidade, para o sistema com diferentes concentrações
de DBPC na fase orgânica, na ausência e na presença da enzima GOx na fase aquosa.
30
30
0 μM DBPC
1 μM DBPC
5 μM DBPC
50 μM DBPC
25
25
20
C / μF.cm-2
C / μF.cm-2
20
15
10
5
0
-200
0 μM DBPC + 0 μM GOx
1 μM DBPC + 0 μM GOx
1 μM DBPC + 0.1 μM GOx
1 μM DBPC + 0.5 μM GOx
1 μM DBPC + 1 μM GOx
1 μM DBPC + 2 μM GOx
1 μM DBPC + 3 μM GOx
15
10
5
-150
-100
-50
0
50
100
150
0
-200
200
Δφ/ mV
-150
-100
-50
0
Δφ / mV
A)
B)
79
50
100
150
200
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
30
30
0 μM DBPC + 0 μM GOx
5 μM DBPC + 0 μM GOx
5 μM DBPC + 0.125 μM GOx
5 μM DBPC + 3 μM GOx
25
20
C / μF.cm-2
C / μF.cm-2
0 μM DBPC + 0 μM GOx
50 μM DBPC + 0 μM GOx
50 μM DBPC + 1 μM GOx
25
20
15
10
5
0
-200
Relatório de Seminário
15
10
5
-150
-100
-50
0
50
100
150
0
-200
200
Δφ/ mV
-150
-100
-50
0
50
100
150
200
Δφ / mV
C)
D)
Figura 3.17.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE para diferentes concentrações de DBPC na fase
orgânica, na ausência da enzima GOx na fase aquosa–A), e na presença da enzima GOx na fase aquosa–B), C) e D).
Os valores das curvas de capacidade obtidos para a DBPC encontram-se bem abaixo da solução do
electrólito base, o que indica uma adsorção deste fosfolípido para toda a gama de potenciais estudados.
Da análise da figura 3.17.–A, observou-se que a potenciais negativos os valores da capacidade diminuem
com o aumento da concentração da DBPC na fase orgânica, enquanto que, a potenciais positivos, verificou-se um
ligeiro aumento da capacidade para concentrações mais baixas de DBPC, resultante da ligeira desorção do
fosfolípido da interface. Para a gama de concentrações estudadas, observou-se que a partir de CDBPC ≥ 5 μM, ocorreu
a formação de uma monocamada estável ao longo de toda a gama de potenciais estudados, sendo visível a existência
de um patamar quase horizontal constante na capacidade interfacial, contrariamente ao que foi observado para o
fosfolípido DAPC. Assim, a adsorção do fosfolípido na interface é tanto maior, quanto maior é a sua concentração,
na ausência da GOx na fase aquosa.
Para CDBPC = 1 μM (figura 3.17–B), e na presença de GOx na fase aquosa, a potenciais positivos, ocorreu
uma forte adsorção do fosfolípido na interface na presença de baixas concentrações de GOx na fase aquosa (0.1
μM), observável pelos baixos valores de capacidade obtidos, ao longo de toda a gama de potenciais.
A baixa concentração da enzima GOx e a presença do fosfolípido na interface, parece ser favorável para a
ocorrência de uma forte adsorção. À medida que se aumentou a concentração da enzima na solução aquosa,
observou-se um aumento nos valores da capacidade interfacial, resultante da desorção do fosfolípido na interface,
devido ao facto da enzima poder bloquear a interface, impedindo a adsorção do fosfolípido. Este efeito foi tanto
maior, quanto maior a concentração da enzima adicionada à fase aquosa (no entanto, para baixas concentrações de
GOx adicionadas à fase aquosa o efeito não foi muito pronunciado).
80
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
A potenciais positivos, observou-se, de uma forma geral, uma tendência para o aumento da capacidade
interfacial na presença da enzima GOx (tal como foi observado para o fosfolípido DAPC), indicando uma desorção
do fosfolípido na interface e um aumento da adsorção da enzima da GOx, à medida que a fase orgânica se torna
mais positiva relativamente à fase aquosa.
Também aqui, os efeitos observados a potenciais positivos podem ser explicados pelas hipóteses
apresentadas para o caso do fosfolípido DAPC: uma possível substituição das moléculas de fosfolípido (desorção)
da interface por moléculas de GOx (adsorção), ou ainda pela partilha mútua da interface por ambas as espécies
(adsorção mútua).
Para CDBPC = 5 e 50 μM (figura 3.17.–C e D, respectivamente), observou-se uma forte adsorção do
fosfolípido ao longo de toda a gama de potenciais estudados na presença da GOx.
Para concentrações elevadas de fosfolípido (50 μM) a adição da enzima à fase aquosa praticamente não
provocou qualquer alteração nas curvas de capacidade, pois a monocamada está saturada para esta concentração de
DBPC.
Para concentrações de DBPC de 5 μM, a presença da enzima na fase aquosa originou um aumento da
capacidade, resultante da desorção do fosfolípido na interface. Este efeito voltou a ser mais elevado para maiores
concentrações da enzima GOx adicionada à fase aquosa.
A adsorção do fosfolípido DBPC pode, tal como no caso da GOx, ser descrito pelo o modelo de Frumkin
anteriormente referido. Este estudo só é possível para o caso da presença de 1 μM de DBPC na fase orgânica e de x
μM de GOx na fase aquosa, uma vez que, para os outros casos em estudo o número de dados experimentais não é
suficiente para efectuar esta análise.
Na tabela 3.3. apresentam-se os valores dos parâmetros termodinâmicos para o caso referido anteriormente.
Nesta tabela, estão também representados os estudos efectuados por D.T. Reza [90], para x μM de DBPC adicionada
à fase orgânica.
Tabela 3.3.: Parâmetros termodinâmicos na presença de 1 μM de DBPC na fase orgânica,
e na presença de x μM de GOx na fase aquosa, para uma interface água/1,2-DCE, obtidos a
partir dos resultados da figura 3.17.–B, e comparação com os resultados obtidos por D.T. Reza [90].
1 μM de DBPC +
x μM de DBPC
x μM de GOx
[90]#
Isotérmica
Frumkin
Frumkin
Δφmín. cap. / mV
-50
-75
a
1.4
1.9
ln β
12.5
11.4
81
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
ΔGºads* / KJ.mol-1
-31
-28
Caq / μF.cm-2
4.8
4.4
Clip / μF.cm-2
2.7
0.80
* ln β = -ΔGºads/RT
#
Resultados obtidos a partir do trabalho desenvolvido por D.T. Reza (não publicados).
Onde, Caq é a capacidade interfacial sem fosfolípido, e Clip é a capacidade interfacial considerando que se
forma uma monocamada de fosfolípido completa e compacta na interface.
Por comparação dos resultados da tabela 3.3., verifica-se um ligeiro deslocamento do potencial mínimo da
capacidade quando se adiciona a GOx à fase aquosa.
O valor de a nos dois casos em estudo é positivo, o que indica que as interacções entre as moléculas
adsorvidas são atractivas. No entanto, estas interacções parecem ser mais fortes na ausência da enzima GOx na fase
aquosa, pois aqui o valor de a é ligeiramente superior.
Por outro lado, a adsorção da DBPC é mais forte na ausência de GOx na fase aquosa, pois o valor de Clip, é
muito mais baixo neste caso (0.80 μF.cm-2), do que no caso da presença de GOx (2.7 μF.cm-2).
O valor de ΔGºads obtido quando temos apenas DBPC na fase orgânica é ligeiramente inferior ao obtido na
presença de GOx na fase aquosa, indicando que a adsorção de DBPC é mais favorável no primeiro caso.
3.2.5. Estudos de adsorção de DPPC (C16)
Grande parte do estudo deste trabalho foi efectuado com fosfolípido DPPC (C16). Escolheu-se este
fosfolípido, por não existirem ainda muitos estudos sobre a sua adsorção em interfaces líquido-líquido na literatura,
ao contrário do que acontece com os fosfolípidos DBPC, DSPC e DLPC.
Os objectivos deste estudo e as condições experimentais utilizadas são semelhantes às anteriormente
mencionadas.
A adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE foi estudada, utilizando uma célula electroquímica igual à
apresentada na secção 3.2.1., adicionando x μM de DPPC à fase orgânica.
Na figura 3.18. estão representados alguns exemplos de voltamogramas cíclicos obtidos utilizando a célula
referida para o sistema em estudo.
82
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
100
0 μM DPPC
5 μM DPPC
15 μM DPPC
30 μM DPPC
50 μM DPPC
50
I / μA
Relatório de Seminário
0
-50
-100
-200
-100
0
100
200
300
Δφ / mV
Figura 3.18.: Voltamogramas cíclicos para a interface entre a solução de TOATPB 10 mM em 1,2-DCE e a solução
aquosa de LiCl 100 mM, 10 mM Na2HPO4 e 10 mM NaH2PO4.2H2O, na presença de x μM de DPPC na fase
orgânica. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação da queda óhmica (IR).
Os voltamogramas cíclicos não mostram diferenças significativas para concentrações de DPPC inferiores a
15 μM. Para concentrações iguais a 15 μM, observou-se o aparecimento de um pequeno pico de intensidade de
corrente nos voltamogramas no varrimento negativo a cerca de -100 mV, semelhante ao que foi observado por
Martins [58] para os fosfolípidos DSPC e DLPC a -110 mV.
Para concentrações superiores a 15 μM, para além do pico observado no varrimento inverso (negativo),
observou-se também um pico de intensidade de corrente no varrimento directo (positivo) a cerca de 200 mV.
Verificou-se que estes picos sofrem uma diminuição ao longo do tempo, à medida que se aplica um
programa cíclico de varrimento linear à célula electroquímica (no entanto, este efeito é mais notório no pico do
varrimento directo).
Esta diminuição ocorreu para concentrações mais elevadas de fosfolípido e a potenciais positivos, porque
neste caso a transferência por difusão dos iões na interface origina a sua saturação, resultante do equilíbrio químico
estabelecido entre as soluções. Observou-se ainda que, desligando o controlo de potencial e voltando novamente a
ligá-lo, o pico no varrimento directo deixou de ser observado. Contudo, após um período de repouso entre 20 a 30
minutos, observou-se de novo o pico a potenciais mais positivos (varrimento directo), uma vez que, os iões
regressaram à solução original, e em seguida voltarão a comportar-se da forma já descrita.
O pico de intensidade de corrente que aparece nos voltamogramas a potenciais mais negativos (varrimento
inverso), poderá ser resultante do fenómeno de adsorção do fosfolípido na interface, enquanto que o pico do
varrimento directo, resultará de um possível fenómeno de desorção do fosfolípido da interface – processo de
transferência de carga.
Estes fenómenos, segundo Martins [58], parecem indicar que o aumento da quantidade de fosfolípido
83
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
provoca o transporte de estruturas auto-montadas, tais como, micelas do seio das soluções para a interface. Assim, a
camada de fosfolípidos na interface poderá ser formada por micelas. Inicialmente ocorrerá difusão do fosfolípido até
à interface, seguido da desintegração destas estruturas para formar um filme interfacial. As micelas formadas na fase
orgânica em contacto com as moléculas de água podem formar microemulsões [74].
Para concentrações elevadas de fosfolípido na fase orgânica (acima de 15 μM), existirão também grandes
quantidades de emulsões, podendo estas transferir-se juntamente com alguns iões através da interface, originando
picos de corrente, tais como, os observados nos voltamogramas cíclicos da figura 3.18. Este fenómeno foi também
observado por Martins para o fosfolípido DSPC e DLPC a concentrações superiores a 20 μM.
Para as diferentes concentrações de DPPC e até 100 μM, adicionadas à interface água/1,2-DCE, obtiveramse as curvas de capacidade representadas na figura 3.19.
20
0 μM DPPC
0.2 μM DPPC
0.3 μM DPPC
0.5 μM DPPC
1 μM DPPC
1.4 μM DPPC
5 μM DPPC
30 μM DPPC
100 μM DPPC
C / μF.cm
-2
15
10
5
0
-200
-150
-100
-50
0
50
100
150
200
Δφ / mV
Figura 3.19.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de x μM de DPPC na fase orgânica.
Da análise da figura 3.19, observou-se um ponto de intersecção comum (pcz) nas curvas de capacidade para Δφ = 0
mV, correspondentes a um ponto de inflexão na dependência da quantidade de fosfolípido adsorvido, para o sistema
em equilíbrio, tal como foi observado por Kakiuchi [68] e Martins [58], para os fosfolípidos DLPC e DSPC. Nas
curvas de capacidade para as diferentes concentrações de DPPC são observáveis duas regiões distintas dependentes
do potencial eléctrico aplicado:
1.
a potenciais negativos, onde a capacidade interfacial diminuiu com a presença da DPPC na fase
orgânica, sendo sempre menor que a capacidade correspondente à dos electrólitos base;
2.
a potenciais positivos, onde a capacidade aumentou com a presença da DPPC, sendo sempre maior que
a correspondente à da solução base. O comportamento observado mostra que a potenciais positivos a
DPPC é desorvida da interface, tendo uma maior tendência para permanecer na fase orgânica.
84
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Para o caso dos potenciais negativos, temos que, para concentrações de fosfolípido na fase orgânica até
cerca de 1 μM, a capacidade diminuí com o aumento da concentração. A 1.4 μM de DPPC, observou-se um
aumento na curva de capacidade, que voltou novamente a diminuir para concentrações até cerca de 5 μM. Para 8
μM de DPPC a curva de capacidade voltou a aumentar, decaindo em seguida para concentrações de DPPC 15 μM.
A concentrações mais elevadas que 15 μM, as curvas de capacidade mantiveram-se praticamente constantes até
cerca de 100 μM, resultante da formação de uma camada saturada na interface.
Este efeito sugere que a adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE é fortemente dependente da
concentração de fosfolípido presente na solução orgânica. Este comportamento poderá estar relacionado com o que
foi observado nas isotérmicas obtidas a partir da técnica de Langmuir-Blodgett (secção 3.1.5.), onde a partir da
compressão do fosfolípido espalhado na interface ar-água, foi possível observar os diferentes estados de transição de
fase da DPPC. Uma analogia semelhante poderá ser efectuada neste caso. Assim, as variações observadas para a
gama de concentrações de 1 μM a 8 μM de DPPC, corresponderam a estados de transição de fase na interface
água/1,2-DCE. Os estudos efectuados não permitem, no entanto, saber a que estados físicos corresponderam essas
transições de fase.
Desta forma, pode afirmar-se que o comportamento observado para as curvas de capacidade na presença de
x μM de DPPC na fase orgânica é dependente, quer do potencial aplicado, quer da concentração de DPPC
adicionada à fase orgânica.
Convém ainda salientar que, apesar de se ter observado um pico de intensidade de corrente reversível e
irreversível nos voltamogramas cíclicos para concentrações superiores a 15 μM, não se observou qualquer pico nas
curvas de capacidade.
Desta forma, formou-se uma camada saturada de DPPC na interface para 20 μM. O valor mínimo de
capacidade obtido para esta monocamada saturada foi de cerca 1.0 μF.cm-2 a Δφ = -125 mV. Este valor é igual ao
valor encontrado nas bicamadas das membranas lipídicas (cerca de 1 μF.cm-2 [91]), o que poderá indicar que o
fosfolípido não está adsorvido numa monocamada, mas sim numa bicamada, sendo esta responsável pelo
comportamento anteriormente descrito.
Outra explicação para o efeito observado nas curvas de capacidade na interface água/1,2-DCE na presença
de DPPC na fase orgânica, pode estar relacionado com o que foi observado por Girault e Schiffrin [92]. Estes
autores sugeriram que a potenciais negativos os fosfolípidos adsorvem como zwiteriões numa interface água/1,2DCE, enquanto que a potenciais positivos ocorreria a reorganização dos fosfolípidos à superfície acompanhada da
neutralização do grupo fosfato começando a espécie a comportar-se como surfactante catiónico.
Kakiuchi et al. [67,70] obtiveram também o mesmo tipo de curvas de capacidade na interface águanitrobenzeno. Estes autores obtiveram curvas de capacidade e de tensão superficial experimentalmente, e
observaram um deslocamento do potencial de carga zero, Δ0wφpcz, com o aumento da concentração de fosfolípido,
para valores de potencial mais negativos, reafirmando a justificação de Girault e Schiffrin, que poderia estar
relacionado com a acumulação de moléculas de fosfolípido dipolares orientadas na interface.
Desta forma, Kakiuchi et al. [85] atribuíram os deslocamentos observados nos potenciais negativos à
adsorção específica de iões Li+ provenientes do electrólito de suporte da fase aquosa do grupo polar hidrofílico dos
fosfolípidos. Para estes autores, a explicação provável para o aumento da capacidade na região de potenciais
positivos será devido à desorção das moléculas de fosfolípidos da interface acompanhada da transferência facilitada
85
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
de iões Li+. Desta forma, isto explicaria o aumento da capacidade acima dos valores de capacidade da linha de base,
na zona positiva de potencial. A neutralização do grupo fosfato não parece muito provável, dado que, o ponto
isoeléctrico do grupo de zwiterião da fosfatidilcolina tem um pH muito próximo do pH das soluções aquosas
estudadas (pH ~7).
Kakiuchi et al. afirmam ainda que, na zonas de potencial positivo poderão ocorrer processos de nãoequilíbrio na interface relacionados com a parcial desorção e variação da diferença de potencial eléctrica através da
interface, o que permite justificar o facto de, nas zonas de potencial mais positivo, o aumento da capacidade com o
aumento da concentração de fosfolípido não ser linear. Nas zonas de potencial negativo ocorre a adsorção de DPPC
sob a forma de zwiterião, facto que provoca a diminuição dos valores de capacidade que estão directamente
relacionados com a concentração de DPPC.
Assim, a potenciais negativos, o comportamento observado para a DPPC é típico de componentes
orgânicos em interfaces electrificadas. O gráfico do potencial correspondente ao mínimo de capacidade, Δφmín. cap.,
em função da concentração de DPPC (figura 3.20.), mostra que o valor do potencial se desloca para potenciais mais
negativos com o aumento da concentração de DPPC na fase orgânica, atingindo um valor constante de Δφmín. cap. a
cerca de –125 mV.
20
0
-20
Δφmín. cap. / mV
-40
-60
-80
-100
-120
-125
-140
-160
-180
0
20
40
60
80
100
[DPPC] / μM
Figura 3.20.: Deslocamento do potencial relativo ao mínimo de capacidade com o aumento da concentração de
DPPC na fase orgânica.
Este estudo foi efectuado a –125 mV, por ser o potencial correspondente ao mínimo de capacidade nas
curvas de capacidade para as diferentes concentrações de DPPC na fase orgânica (a excepção é para CDPPC = 50 e
100 μM). As figuras 3.19., 3.20. e 3.21., mostram que a composição da interface se mantém inalterável com a
concentração de DPPC a concentrações mais elevadas deste fosfolípido na zona de potencial mais negativo. Como
primeira interpretação da figura 3.21., pode observa-se um patamar (representado a tracejado para concentrações
entre 1 μM até 15 μM), correspondente à possível mudança no estado(s) de transição de fase(s) do fosfolípido, como
foi atrás referido.
86
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Δφ = -125 mV
10
9.4
6
C / μF.cm
-2
8
4
2
1
0
0
20
40
60
80
100
[DPPC] / μM
Figura 3.21.: Variação da capacidade da dupla camada com a concentração de DPPC para Δφ = -125 mV.
A cobertura superficial, θ, pode ser estimada pela equação 3.2., mas agora aplicada ao fosfolípido. A
isotérmica de adsorção obtida a Δφ = -125 mV está representada na figura 3.22. Para o cálculo de θ, retirou-se da
figura 3.21. o valor da capacidade interfacial da camada saturada, Clip ~1.0 μF.cm-2, e o valor da capacidade
interfacial sem fosfolípido, Caq ~9.4 μF.cm-2.
Estes resultados mostram que a partir de uma concentração de DPPC de ~20 μM, ocorre a formação de
uma camada saturada.
1,0
0,8
Δφ = -125 mV
θ
0,6
0,4
0,2
0,0
0
20
40
60
80
100
[DPPC] / μM
Figura 3.22.: Isotérmica de adsorção para a DPPC a Δφ = -125 mV.
87
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
A figura 3.23, mostra o logaritmo da concentração de DPPC na solução orgânica em função do grau de
cobertura, bem como o ajuste para os dois modelos de isotérmicas anteriormente estabelecidos. Nestes ajustes fixouse r = 1 para diminuir o número de parâmetros obtidos pelos ajustes. Esta consideração é válida na medida em que
se considera que os fosfolípidos formam uma camada e não se encontram agregados em vesículas ou micelas na
interface.
Δφ = -125 mV
-9
Ajuste da isotérmica de Frumkin
Ajuste da isotérmica de Volkov
-10
ln [DPPC]
-11
-12
-13
-14
-15
-16
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
θ
Figura 3.23.: Teste para as isotérmicas de Frumkin e Volkov obtidos para as diferentes concentrações de DPPC
estudadas para Δφ = –125 mV.
Os parâmetros termodinâmicos obtidos a partir destes ajustes encontram-se na tabela 3.4. Comparando os
dois ajustes efectuados, pode afirmar-se que os valores dos parâmetros termodinâmicos dos dois ajustes são iguais, o
que sugere que os dois modelos podem ser utilizados para efectuar este tipo de estudo. Em ambos os ajustes o valor
de a é positivo, sendo, desta forma, atractivas as interacções entre as espécies interfaciais.
Na interface água/1,2-DCE obteve-se um valor mais baixo (1.1 e 1.0 μF.cm-2) para a capacidade na camada
saturada de DPPC, que tem a mesma magnitude que a estimada a partir da tensão superficial para fosfatidilcolinas
da gema de ovo adsorvidas na interface água/1,2-DCE na zona de potencial de adsorção [92].
Apesar destas diferenças indicarem a penetração do solvente orgânico em menor extensão, será necessário
efectuar-se o estudo do efeito do solvente para se concluir com clareza se de facto é assim que acontece.
88
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Tabela 3.4.: Parâmetros termodinâmicos de adsorção de DPPC na interface
água/1,2-DCE a pH ~7, obtidos a partir dos resultados para as diferentes
concentrações de DPPC e do ajustes das isotérmicas de Frumkin e Volkov.
Isotérmica
Frumkin
Δφmín. cap. / mV
Volkov
-125
p
1.0
0.92
a
1.1
1.0
ln β
13.4
13.4
ΔGºads* / KJ.mol-1
-33
-33
Caq / μF.cm-2
9.4
9.4
Clip / μF.cm-2
1.0
1.0
* ln β = -ΔGºads/RT
Os valores de a obtidos para a DPPC são superiores aos obtidos por Kakiuchi et al. [67] na interface águanitrobenzeno para a DLPC (a = 0.3), e são inferiores aos obtidos por Martins [58] para a DLPC e a DSPC na
interface água/1,2-DCE, respectivamente 1.8 e 2.3. O valor do parâmetro a obtido (1.1 e 1.0) e o valor da
capacidade na camada saturada menor (1.0 μF.cm-2), sugerem que as interacções entre as moléculas do fosfolípido
DPPC são menos intensas do que as observadas para a DLPC e DSPC por Martins, mas são mais intensas do que as
observadas por Kakiuchi et al. para a DLPC.
O facto do aumento da concentração de DPPC ter feito deslocar Δφmín. cap. para valores negativos (figura
3.20.), sugere que existe uma diferença de potencial de Galvani no Δowφpcz, de tal forma que o potencial interno da
fase aquosa se vai tornando mais negativo relativamente ao potencial interno da fase orgânica até cerca de 125 mV.
Esta alteração poder-se-á dever, ou à adsorção de iões perto do grupo carregado das moléculas de fosfolípido,
ficando a fase aquosa com excesso de cargas negativas ou a fase orgânica com excesso de cargas positivas e/ou
devido à alteração do momento dipolar com o aumento da concentração de fosfolípidos na interface [93,94]. Para
além destas contribuições, a orientação da molécula na interface [94,95], também poderá estar relacionada com o
deslocamento de Δφmín.cap. de cerca de -125 mV.
Obteve-se um valor baixo para a capacidade interfacial na camada saturada, o que indica que a capacidade
é controlada pela parte hidrofóbica da molécula do fosfolípido, sendo possível estimar a espessura da camada
orgânica, utilizando um modelo simples da interface:
Clip = εrε0/τ
(3.6.)
onde, Clip é a capacidade da interface, ε0 a constante dieléctrica relativa do vácuo (8.85x10-12 F/m), εr a constante
dieléctrica da região adsorvida e τ a espessura da camada orgânica. Girault e Schiffrin [92], proposeram que uma
89
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
monocamada estável na interface será equivalente a ter um estado condensado com espessura de cerca de 3 nm, com
uma constante dieléctrica para hidrocarboneto de aproximadamente 2. Desta forma, e para Clip = 1.0 μF.cm-2, a
espessura da camada da DPPC seria de 1.7 nm, mais pequena do que a espessura de uma monocamada compacta em
estado líquido condensado, o que indica que a camada saturada da DPPC poder-se-á encontrar no estado líquido
expandido.
Os estudos realizados mostraram também que para a interface água/1,2-DCE, as curvas da capacidade não
são significativamente afectadas pela presença do sal de fosfato na fase aquosa do electrólito de suporte
relativamente às soluções aquosas contendo apenas LiCl. Na presença do fosfolípido na fase orgânica não foram
observadas diferenças marcantes quando se utilizou apenas como electrólito de suporte da fase aquosa o LiCl. Desta
forma, pode concluir-se que a natureza do electrólito aquoso não tem um efeito significativo nas curvas de
capacidade obtidas numa interface água/1,2-DCE.
Desta forma, o aumento da capacidade observado a potenciais positivos não é atribuído à adsorção de iões
do electrólito de suporte da fase aquosa no grupo polar hidrofílico dos fosfolípidos, uma vez que, de acordo com os
resultados, a natureza e concentração do electrólito de suporte da fase aquosa não influencia significativamente os
valores de capacidade, não sendo esta afectada pela quantidade de cargas existentes na interface.
Tal como foi referido, o comportamento observado a potenciais positivos será devido à adsorção dos iões
da fase orgânica ou à existência de um pico de adsorção/desorção do fosfolípido. Nesta zona de potencial o ião TPBserá adsorvido, mas em pequena extensão, uma vez que, os grupos carregados da camada lipídica encontram-se na
fase aquosa. Desta forma, a existência de um pico de adsorção/desorção do fosfolípido, parece ser a mais credível.
3.2.5.1. Adsorção de DPPC. Estudos do efeito da presença da enzima GOx na fase
aquosa
A adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE foi também estudada na presença da enzima GOx na fase
aquosa, através da análise das curvas de capacidade interfacial. Utilizou-se uma célula electroquímica igual à
apresentada na secção 3.2.1., à excepção de se ter acrescentado x μM DPPC à fase orgânica e x μM de GOx à fase
aquosa.
Os voltamogramas cíclicos mostram um comportamento idêntico ao observado para os sistemas contendo
apenas DPPC na fase orgânica, ou seja, para baixas concentrações de DPPC os voltamogramas cíclicos não mostram
diferenças significativas, mesmo após a adição de GOx à fase aquosa. Para concentrações superiores a 15 μM de
DPPC na fase orgânica (figura 3.24.), observou-se o aparecimento de um pico de intensidade de corrente no
varrimento directo (positivo) e outro no varrimento inverso (negativo). Este efeito parece ser dependente da
concentração da enzima GOx, pois à medida que se adicionou GOx à fase aquosa, observou-se um ligeiro aumento
dos valores da intensidade de corrente nas regiões correspondentes ao aparecimento dos picos.
90
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
100
0 μM DPPC + 0 μM GOx
50 μM DPPC + 0 μM GOx
50 μM DPPC + 0.1 μM GOx
50 μM DPPC + 0.2 μM GOx
50 μM DPPC + 7 μM GOx
50
I / μA
Relatório de Seminário
0
-50
-100
-200
-100
0
100
200
300
Δφ / mV
Figura 3.24.: Voltamogramas cíclicos para a interface água/1,2-DCE na presença de x μM de DPPC na fase
orgânica e de x μM de GOx na fase aquosa. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação da
queda óhmica (IR).
Na figura 3.25. estão representadas as curvas de capacidade para diferentes concentrações de DPPC na fase
orgânica, na presença da enzima GOx na fase aquosa. De acordo com o estudo anterior, e dado o comportamento
observado para o fosfolípido DPPC na interface água/1,2-DCE, foram escolhidas as concentrações de DPPC 1 μM,
1.4 μM e 5 μM, porque correspondem a situações onde ocorre uma mudança no comportamento das curvas de
capacidade, quando apenas está presente o fosfolípido na fase orgânica. Foram também estudados os efeitos da
presença da enzima para concentrações mais elevadas de DPPC (50 μM).
25
C / μF.cm-2
20
30
0 μM DPPC + 0 μM GOx
1 μM DPPC + 0 μM GOx
1 μM DPPC + 0.1 μM GOx
1 μM DPPC + 1 μM GOx
1 μM DPPC + 5 μM GOx
1 μM DPPC + 10 μM GOx
1 μM DPPC + 30 μM GOx
25
15
10
A)
15
10
5
5
0
-250 -200 -150 -100 -50
0 μM DPPC + 0 μM GOx
1.4 μM DPPC + 0 μM GOx
1.4 μM DPPC + 0.1 μM GOx
1.4 μM DPPC + 0.2 μM GOx
1.4 μM DPPC + 1 μM GOx
20
C / μF.cm-2
30
0
50
0
-250 -200 -150 -100 -50
100 150 200 250
Δφ/ mV
B)
91
0
Δφ/ mV
50
100 150 200 250
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
25
C / μF.cm-2
20
30
0 μM DPPC + 0 μM GOx
5 μM DPPC + 0 μM GOx
5 μM DPPC + 0.15 μM GOx
5 μM DPPC + 1 μM GOx
5 μM DPPC + 3 μM GOx
5 μM DPPC + 7 μM GOx
5 μM DPPC + 10 μM GOx
25
20
C / μF.cm-2
30
QUÍMICA ANALÍTICA
15
10
5
0
-250 -200 -150 -100 -50
C)
Relatório de Seminário
0 μM DPPC + 0 μM GOx
50 μM DPPC + 0 μM GOx
50 μM DPPC + 0.1 μM GOx
50 μM DPPC + 0.15 μM GOx
50 μM DPPC + 0.2 μM GOx
50 μM DPPC + 7 μM GOx
50 μM DPPC + 20 μM GOx
15
10
5
0
50
0
-250 -200 -150 -100 -50
100 150 200 250
Δφ/ mV
D)
0
50
100 150 200 250
Δφ/ mV
Figura 3.25.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de: A) 1 μM de DPPC, B) 1.4 μM
de DPPC, C) 5 μM de DPPC e D) 50 μM DPPC na fase orgânica, na presença de x μM de GOx na fase aquosa.
Assim, para concentrações de 1 e 1.4 μM de DPPC (figura 3.25.–A e 3.25–B, respectivamente), a adição da
GOx à fase aquosa provocou um aumento nas curvas de capacidade. Este efeito parece ser maior, quanto maior a
concentração da enzima na fase aquosa. Para concentrações mais elevadas de GOx, a presença da enzima induz a
desorção do fosfolípido, resultando no aumento da capacidade, uma vez que, esta se comportará como uma camada
dieléctrica, bloqueando a interface e impedindo a adsorção do fosfolípido.
Para CDPPC = 5 μM (figura 3.25.–C), não se observou qualquer efeito na capacidade pela adição de GOx até
3 μM. Para concentrações de GOx mais elevadas, a capacidade aumentou, pelas razões já referidas.
Para CDPPC = 1 e 1.4 μM (figura 3.25.–A e 3.25.–B), e a potenciais Δφ > 0 mV, observou-se, de uma forma
geral, um aumento na capacidade interfacial, relativamente aos potenciais negativos. No entanto, concentrações
elevadas de GOx na fase aquosa, parecem provocar uma diminuição na capacidade para valores mais baixos do que
o electrólito base.
O comportamento observado quando se adicionou a GOx à fase aquosa, pode ser explicado, ou pela coadsorção da GOx na interface, por substituição das moléculas de DPPC presentes na interface (desorção), ou ainda,
devido ao facto da presença da enzima GOx contribuir para uma reorganização e reorientação do fosfolípido na
interface, de tal forma que, ambas as espécies contribuem para a adsorção (adsorção mútua), levando à diminuição
da capacidade.
Para a concentração de 5 μM de DPPC (figura 3.25.–C), a presença da GOx na fase aquosa provocou o
mesmo efeito já descrito. No entanto, esse comportamento só começou a ser significativo para concentrações iguais
a 10 μM de GOx. Este facto parece estar relacionado com a concentração do fosfolípido presente na fase orgânica.
Quanto maior a sua concentração, maior quantidade de GOx, será necessária adicionar à fase aquosa para se
observar um dos possíveis efeitos descritos para o caso da figura 3.25.–A (1 μM de DPPC).
92
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Para a concentração de 50 μM de DPPC (figura 3.25.–D), observou-se um comportamento diferente do
descrito para baixas concentrações de DPPC. Neste caso, observou-se que os valores de capacidade se encontram
bem abaixo da capacidade do electrólito base, assim como, a existência de um patamar praticamente horizontal, ao
longo de quase toda a gama de potenciais estudados, indicativo de uma adsorção estável.
A potenciais negativos a presença da enzima GOx na fase aquosa, não origina a desorção do fosfolípido (ao
contrário do que foi observado para concentrações de DPPC mais baixas), pois a concentração de fosfolípido é
demasiado elevada, e a existência de uma camada saturada de DPPC na interface impede qualquer interacção com a
enzima. A potenciais positivos, observou-se o aparecimento de um pico próximo da zona de potencial onde se
observou o pico voltamétrico no varrimento directo (positivo). Este pico parece diminuir de intensidade à medida
que se aumenta a concentração de GOx na fase aquosa.
Desta forma, o comportamento da capacidade parece ser depende da concentração de DPPC presente na
fase orgânica e da quantidade de GOx adicionada à fase aquosa.
O modelo de Frumkin para o estudo das isotérmicas de adsorção pode ser adoptado numa primeira
aproximação, para os estudos de adsorção dos fosfolípidos na presença da enzima GOx.
Na tabela 3.5. comparam-se os parâmetros termodinâmicos obtidos na formação de uma camada, para o
fosfolípido DPPC e para diferentes concentrações deste fosfolípido na presença de GOx, com os parâmetros
termodinâmicos obtidos quando apenas está presente a enzima GOx na fase aquosa. Na tabela estão ainda
representados o valor da espessura para as diferentes camadas formadas na interface. Todos os resultados foram
obtidos através do ajuste da isotérmica do modelo de Frumkin, anteriormente descrito.
Tabela 3.5.: Comparação dos parâmetros termodinâmicos obtidos para diferentes concentrações de DPPC na
ausência e na presença de x μM de GOx na fase aquosa, com os parâmetros termodinâmicos obtidos apenas na
presença de GOx na fase aquosa, num interface água/1,2-DCE a pH ~7.
x μM GOx
1 μM DPPC
5 μM DPPC
50 μM DPPC
+ x μM GOx
+ x μM Gox
+ x μM GOx
x μM DPPC
Δφmín. cap. / mV
-25
-50
-100
-75
-125
a
4.0
1.3
4.2
5.0
1.1
ln β
8.4
12.0
9.5
7.3
13.4
ΔGºads* / KJ.mol-1
-21
-30
-24
-18
-33
Caq / μF.cm-2
5.4
2.4
1.3
1.3
9.4
Clip / μF.cm-2
3.3
3.8
1.7
0.34
1.0
τ / nm
–
0.46
1.0
5.2
1.7
* ln β = -ΔGºads/RT
93
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Antes de mais, convém referir que os resultados obtidos para os sistemas em estudo indicados nas colunas
3, 4 e 5 da tabela 3.5., podem estar bastante afectados, pelo facto de, o número de pontos experimentais utilizados
para efectuar as determinações indicadas serem reduzidos. No entanto, de acordo com os resultados obtidos, é
seguidamente apresentada uma análise para o estudo efectuado.
As interacções atractivas entre as moléculas de DPPC adsorvidas e a enzima de GOx parecem, ser mais
fortes à medida que aumenta a concentração de DPPC, uma vez que, os valores de a são maiores para a camada
formada de fosfolípido. Estes valores são muito semelhantes aos obtidos nos estudos da enzima GOx na ausência de
fosfolípidos, e afastam-se dos valores obtidos quando temos DPPC. Este facto pode ser explicado pelo aumento do
empacotamento da camada formada, com o aumento do número de interacções entre as espécies, devido à grande
quantidade de espécies em contacto com a interface.
À medida que a concentração de DPPC na fase orgânica aumenta, a energia de Gibbs de adsorção, ΔGºads,
vai diminuindo progressivamente (torna-se menos negativo), ao contrário do que seria de prever, pois para
concentrações mais elevadas de DPPC seria de esperar que ΔGºads se aproxima-se mais do valor obtido para o
fosfolípido, do que do valor obtido para a GOx. Estes resultados parecem indicar que à medida que a concentração
de fosfolípido aumenta na fase orgânica as interacções entre as moléculas de DPPC e GOx são mais intensas
(valores de a maiores), podendo as moléculas de GOx penetrar na interface contendo o fosfolípido, substituindo as
moléculas de fosfolípido adsorvidas, e consequentemente, aumentando a adsorção da enzima.
Estes resultados parecem ainda estar de acordo com o que foi observado por Rosilio et al. [75] numa
interface ar-água para a GOx, na presença do fosfolípido DBPC. É de salientar que estes autores atribuem a
adsorção da GOx na interface contendo DBPC, à dependência na orientação da cadeia de hidrocarbonetos do
fosfolípido, bem como da GOx, devido à existência de interacções hidrofóbicas ao nível das cadeias carbonadas do
fosfolípido, na presença de moléculas da enzima adsorvida.
No caso em estudo, nada se pode concluir relativamente às mudanças na orientação das cadeias carbonadas
de DPPC ou à orientação da enzima GOx adoptadas na interface água/1,2-DCE, no entanto, pode fazer-se uma
interpretação especulativa, que considera que as cadeias hidrofóbicas da superfície da enzima podem penetrar na
solução orgânica. Assim, poderá existir interacção entre a enzima, os iões orgânicos e a molécula de DPPC. Este
tipo de interacção será mais favorável à adsorção da GOx na interface e à desorção do fosfolípido, podendo
aumentar a reorientação conformacional da enzima adsorvida. Daí a razão da diminuição do valor de ΔGºads à
medida que se aumenta a concentração da DPPC, na presença de GOx na fase aquosa. Existe pois, uma certa
analogia com o trabalho de Rosilio et al. [75], onde a adsorção de GOx na interface ar-água foi promovida por coadsorção de lípido, e com o trabalho de Georganopoulou et al. [59] nos estudos com GOx.
O valor da espessura da camada orgânica (τ), também aumenta com o aumento da concentração de DPPC,
o que indica que este fosfolípido sofre transições de estados físicos por variação da sua concentração. Para baixas
concentrações de DPPC (1 μM e 5 μM), a espessura da camada orgânica é menor na presença da GOx, 0.46 e 1,
respectivamente (sem GOx τ = 1.7 nm), o que também é indicativo de que a camada saturada de DPPC poderá
encontrar-se no estado líquido expandido (uma vez que, τ é inferior a 3 nm, correspondente a um estado líquido
condensado [92]). Para concentrações elevadas de DPPC (50 μM), o valor de τ obtido parece elevado, no entanto, a
elevada concentração de fosfolípido na fase orgânica, aliada a uma possível penetração das moléculas de GOx entre
as moléculas de fosfolípido adsorvidas numa camada saturada, poderão contribuir para o valor elevado obtido para a
espessura.
94
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
3.2.6. Comparação do efeito de adsorção dos diferentes fosfolípidos estudados
Na figura 3.26. estão representadas as curvas de capacidade na interface água/1,2-DCE na presença de
diferentes fosfolípidos na fase orgânica para uma concentração de 1 μM (figura 3.26.–A), e na presença de 1 μM de
GOx na fase aquosa (figura 3.26.–B).
30
30
25
SemFosfolípido
1 μMDPPC
1 μMDAPC
1 μMDBPC
25
20
C / μF.cm-2
C / μF.cm-2
20
15
10
5
0
-250 -200 -150 -100 -50
A)
Sem Fosfolípido e sem GOx
1 μM DPPC + 1 μM GOx
1 μM DAPC + 1 μM GOx
1 μM DBPC + 1 μM GOx
15
10
5
0
50
0
-250 -200 -150 -100 -50
100 150 200 250
Δφ/ mV
B)
0
50
100 150 200 250
Δφ/ mV
Figura 3.26.: Comparação das curvas de capacidade na interface água/1,2DCE na presença 1 μM de diferentes
fosfolípidos na fase orgânica – A), e na presença de 1 μM de GOx na fase aquosa – B).
Da análise da figura 3.26.–A, observou-se que para o valor de concentração estudada de fosfolípido (1 μM)
e a potenciais negativos, o efeito de adsorção é maior para a DPPC, pois o valor de capacidade nesta zona de
potencial foi menor relativamente aos outros fosfolípidos, o que indica que à medida que se aumenta a cadeia de
hidrocarbonetos do fosfolípidos, menor será o efeito de adsorção do fosfolípido na interface. Este facto está de
acordo com a literatura, uma vez que, quanto maior o tamanho da cadeia carbonada, maior o empacotamento da
camada formada no mesmo estado, pois as forças de Van der Waals são mais fortes entre cadeias de hidrocarbonetos
de cadeia longa, do que entre as cadeias de hidrocarbonetos de cadeia mais curta [57].
A potenciais positivos ocorreu um aumento das curvas de capacidade relativamente aos potenciais
negativos, para os diferentes fosfolípidos, resultantes da desorção do fosfolípido na interface, pelas razões atrás
enunciadas. Verificou-se, contudo, que a adsorção de DBPC é mais estável ao longo da gama de potenciais
estudados.
Por outro lado, a adição de GOx à fase aquosa (figura 3.26.–B), provocou alterações notórias. Assim, para
potenciais negativos, os valores da capacidade para os diferentes fosfolípidos aumentaram ligeiramente, o que indica
que a presença de GOx conduz a uma desorção do fosfolípido da interface. No entanto, mantém-se a mesma
tendência para as curvas de capacidade observada na ausência de GOx. Para potenciais positivos, ocorreu uma
aproximação das curvas da capacidade junto da capacidade do electrólito de suporte, sugerindo uma desorção do
fosfolípido da interface, resultante da maior tendência para o fosfolípido permanecer na fase orgânica e a GOx
95
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
permanecer na fase aquosa.
3.3. Estudos de adsorção de fosfolípidos na interface água/2-NPOE
polarizada na presença da enzima GOx
Para estudar o efeito do solvente numa interface líquido-líquido, foram também efectuados estudos de adsorção com
o solvente orgânico 2-NPOE.
Inicialmente estudou-se o efeito do solvente na adsorção da enzima GOx, na ausência de qualquer
fosfolípido na fase orgânica, e em seguida estudou-se o efeito do solvente na adsorção da GOx na presença do
fosfolípido DPPC.
A capacidade interfacial foi obtida a partir das medições de impedância. Todas os dados de impedâncias
obtidos a cada potencial, para as várias concentrações de GOx formam bem ajustados pelo circuito equivalente,
representado na figura 1.22. (os erros de ajuste foram inferiores a 5 %). É de salientar que o ajuste dos resultados
obtidos utilizando o solvente orgânico 2-NPOE, foram muito mais difíceis que no caso do solvente orgânico 1,2DCE, possivelmente dada a maior viscosidade do solvente NPOE. Este erro foi ligeiramente superior ao obtido para
a interface água/1,2-DCE (< 2 %).
As medições de impedâncias foram efectuadas na zona de potencial entre –250 mV e 250 mV.
Na tabela 3.6. são apresentadas algumas das propriedades mais importantes dos solventes utilizados neste
estudo.
Tabela 3.6.: Propriedade físico-químicas dos solventes orgânicos utilizados neste estudo [96].
Solvente
orgânico
Constante
Solubilidade
Densidade,
Viscosidade,
ρ / g.mL
η / cP
-1
dieléctrica,
ε
do solvente em água
da água no solvente
1,2-DCE
10.4
0.84
0.16
1.25
0.84
2-NPOE
24.2
2x10-6
0.046
1.04
13.8
3.3.1. Efeito do solvente orgânico na adsorção da Glucose Oxidase (GOx)
Neste estudo utilizou-se uma célula electroquímica igual à apresentada na secção 3.2.1. (célula 1), à
excepção do solvente orgânico que se substituiu por 2-NPOE.
96
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Os voltamogramas cíclicos obtidos encontram-se representados na figura 3.27. Não foram observadas
diferenças significativas nas janelas de potencial pela adição da enzima GOx, excepto para concentrações mais
elevadas (10 μM), onde foi visível um aumento da intensidade de corrente a potenciais negativos. A janela de
potencial obtida com o solvente orgânico 2-NPOE, foi ligeiramente superior à obtida na interface água/1,2-DCE,
assim como, os valores de intensidade de corrente foram muito menores para a interface água/2-NPOE, do que para
a interface água/1,2-DCE. Este facto estará relacionado com a maior viscosidade do solvente orgânico 2-NPOE.
0 μM GOx
0.2 μM GOx
1 μM GOx
5 μM GOx
10 μM GOx
6
4
I / μA
2
0
-2
-4
-6
-300
-200
-100
0
100
200
300
Δφ / mV
Figura 3.27.: Voltamogramas cíclicos correspondentes ao sistema água/2-NPOE na presença de várias
concentrações da enzima GOx na fase aquosa. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação
de queda óhmica (IR).
Na figura 3.28. estão representadas as curvas de capacidade (capacidade da dupla camada em função da
variação de potencial), para o sistema com diferentes concentrações de GOx na fase aquosa até 10 μM. Para este
sistema em estudo o comportamento observado para a interface água/2-NPOE, parece ser semelhante ao observado
na interface água/1,2-DCE.
Observou-se um deslocamento do potencial a que a capacidade é mínima para valores de potenciais
positivos (51 mV), ao contrário do que foi observado para o sistema água/1,2-DCE (-25 mV), indicando que o
deslocamento do potencial a que a capacidade é mínima varia com o solvente orgânico na presença da enzima GOx.
Estes valores estão representados na tabela 3.7.
97
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
30
0 μM GOx
0.2 μM GOx
1 μM GOx
5 μM GOx
10 μM GOx
25
C / μF.cm
-2
20
15
10
5
0
-250
-200
-150
-100
-50
0
50
100
150
200
250
Δφ / mV
Figura 3.28.: Curvas de capacidade interfacial em função do potencial aplicado na interface água/2-NPOE na
presença de x μM GOx na fase aquosa.
Tabela 3.7.: Deslocamento do potencial de mínimo de
capacidade para a adsorção de GOx nos solventes ensaiados.
Solvente orgânico
Δφmín. cap. sem GOx / mV
Δφmín. cap. da camada
Δ(Δφmín. cap.) / mV
saturada / mV
1,2-DCE
0
-25
25
2-NPOE
51
51
0
A partir das curvas de capacidade da figura 3.28., obtiveram-se os valores da capacidade interfacial para as
diferentes concentrações de GOx presentes na solução aquosa, para o potencial correspondente ao mínimo da curva
de capacidade da camada saturada.
Aplicando o modelo de isotérmica de Frumkin, podem determinar-se os parâmetros termodinâmicos para a
interface água/2-NPOE na presença da GOx. Na tabela 3.8. estão representados os resultados obtidos para a
interface água/1,2-DCE e para a interface água/2-NPOE.
98
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Tabela 3.8.: Parâmetros termodinâmicos obtidos para uma interface líquido-líquido
polarizadas a pH ~7 com diferentes solventes orgânicos, na presença da enzima GOx.
Solvente orgânico
1,2-DCE
2-NPOE
Δφmín. cap. / mV
-25
51
a
4.0
5.6
ln β
8.4
9.0
ΔGºads* / KJ.mol-1
-21
-22
Caq / μF.cm-2
5.4
6.6
Clip / μF.cm-2
3.3
4.2
* ln β = -ΔGºads/RT
Das propriedades do solvente apresentadas na tabela 3.8., a constante dieléctrica é aquela que é
directamente proporcional à capacidade atingida, o que parece indicar que a adsorção de GOx na interface se faz
envolvendo moléculas de solvente.
Como o parâmetro a nas interfaces estudadas é positivo, volta a indicar que as interacções entre as
moléculas de GOx são atractivas, colocando-se o solvente orgânico entre as moléculas de GOx durante a sua
adsorção na interface. Uma vez que, o valor de a é ligeiramente superior na interface água/2-NPOE, a camada de
adsorção da GOx deverá ser mais compacta nesta interface. O valor de ΔGºads é muito semelhante para ambas as
interfaces estudadas, pelo que a formação da camada de adsorção da GOx não é afectada pela natureza do solvente.
3.3.1.1. Efeito do pH
Estudou-se o efeito do pH da solução aquosa no processo de adsorção da GOx na interface água/2-NPOE.
A célula electroquímica utilizada a pH ~7.2 é igual à apresentada na secção 3.2.1. (célula 1), à excepção do solvente
orgânico que se substituiu por 2-NPOE, e se adicionou 0.1 μM de GOx à fase aquosa. Para o estudo a outros valores
de pH, foram adicionadas à fase aquosa da célula electroquímica as seguintes soluções:
100 mM LiCl +: 10 mM HCl (pH 2), ou 9 mM CH3COOH + 10 mM CH3COONa (4.9).
Como foi referido, a enzima GOx possuí um ponto isoeléctrico (pI) igual a 4.44, e quando em solução
aquosa a pH neutro encontra-se carregada negativamente com 11 cargas [59]. Por esta razão, foram escolhidas
soluções aquosas com valores de pH inferior, próximo e superior ao seu pI.
Observaram-se diferenças nos voltamogramas cíclicos para soluções mais ácidas do sistema contendo 0.1
μM de GOx e variando o pH (figura 3.29.–B), provocando um deslocamento do voltamograma para valores de
99
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
corrente mais elevados, a potenciais positivos.
30
25
7
0μMGOx
0.1μMGOx- pH=2.0
0.1μMGOx- pH=4.9
0.1μMGOx- pH=7.2
5
4
3
20
2
1
I / μA
C / μF.cm-2
0 μM GOx
0.1 μM GOx - pH = 2.0
0.1 μM GOx - pH = 4.9
0.1 μM GOx - pH = 7.2
6
15
0
-1
-2
10
-3
-4
5
-5
-6
0
-250 -200 -150 -100 -50
A)
-7
0
50
100 150 200 250
-300
Δφ/ mV
-200
B)
-100
0
100
200
300
Δφ / mV
Figura 3.29.: A) Curvas de capacidade interfacial em função do potencial aplicado na interface água/2-NPOE na
presença de 0.1 μM GOx na fase aquosa a diferentes valores de pH. B) Voltamogramas cíclicos correspondentes ao
sistemas em estudo. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação de queda óhmica (IR).
As curvas de capacidade interfacial representadas na figura 3.29.–A, mostram comportamentos diferentes
para os valores de pH estudados, tal como foi observado para a interface água/1,2-DCE. No entanto os efeitos de
adsorção parecem ser mais intensos na presença do solvente orgânico 2-NPOE.
A potenciais negativos, observou-se uma diminuição dos valores da capacidade para a gama de pH
estudados. Contudo, a pH inferior ao pI da enzima (pH 2), observou-se um aumento da capacidade acima do valor
da do electrólito base para Δφ ≈ -75 mV. A este potencial ocorrerá a protonação da enzima GOx na fase aquosa,
dificultando a sua adsorção na interface e aumentando a sua tendência para permanecer em solução aquosa (pois a
enzima passará a estar carrega positivamente), originando o aumento da capacidade interfacial. Para pH superior ao
ponto pI da enzima GOx, observou-se um maior efeito na adsorção da enzima na interface água/2-NPOE, do que a
pH próximo do pI da enzima, uma vez que para pH > 4.44, a enzima encontrar-se-á carregada negativamente,
resultante da desprotonação, ocorrendo adsorção ao nível da interface.
A potenciais positivos, e para pH > pI de GOx, a capacidade interfacial segue praticamente a do electrólito
base, indicando uma desorção da enzima, e consequentemente, uma maior tendência para esta permanecer em
solução aquosa, devido ao aumento do número de cargas negativas em solução.
Para estes estudos escolheu-se um valor de 0.1 μM de GOx, para verificar se o efeito do pH se fazia sentir
mesmo a concentrações de GOx baixas. Para concentrações mais elevadas da enzima, o efeito será proporcional à
sua concentração.
100
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Desta forma, os resultados mostram, tal como, no caso da interface água/1,2-DCE, que o comportamento
da capacidade interfacial é dependente do valor de pH de GOx adicionada à fase aquosa.
Estudou-se também o efeito de adsorção da GOx na interface água/2-NPOE, utilizando diferentes
concentrações de GOx e mantendo o pH fixo (4.9), para um valor próximo do pI da GOx. Embora estes estudos não
sejam suficientes para tirar uma conclusão definitiva, permitem dar-nos uma ideia da tendência do que poderá
acontecer. No entanto, será necessário aprofundar este tipo de estudos em futuros trabalhos.
Nestes ensaios foram mantidas as mesmas condições experimentais anteriores. A figura 3.30–B, mostra os
voltamogramas cíclicos obtidos para os sistemas em estudo. Aparentemente não são observadas diferenças
significativas para as diferentes concentrações de GOx a pH fixo.
Na figura 3.30.–A, estão representadas as curvas de capacidade interfacial na interface água/2-NPOE na
presença de várias concentrações de GOx a pH próximo do pI da enzima (4.9).
30
25
7
0 μM GOx
0.1 μM GOx - pH = 4.9
1 μM GOx - pH = 4.9
5 μM GOx - pH = 4.9
0 μM GOx
0.1 μM GOx - pH = 4.9
1 μM GOx - pH = 4.9
5 μM GOx - pH = 4.9
6
5
4
3
2
1
I / μA
C / μF.cm-2
20
15
0
-1
-2
10
-3
-4
5
-5
-6
0
-250 -200 -150 -100 -50
A)
-7
0
50
100 150 200 250
-300
Δφ/ mV
B)
-200
-100
0
100
200
300
Δφ / mV
Figura 3.30.: A) Curvas de capacidade interfacial em função do potencial aplicado na interface água/2-NPOE na
presença de x μM GOx na fase aquosa para um valor de pH fixo (4.9). B) Voltamogramas cíclicos correspondentes
aos sistemas em estudo. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação de queda óhmica (IR).
As curvas de capacidade mostram que para concentrações mais elevadas de GOx na fase aquosa (1 μM e 5
μM) não são observadas diferenças significativas entre si, mantendo a GOx um comportamento similar ao longo de
toda a gama de potenciais aplicados. Desta forma, para potenciais negativos a capacidade diminui até cerca de -100
mV. Deste valor de potencial até cerca de -25 mV, observa-se um maior efeito de adsorção de GOx. Para potenciais
positivos, a capacidade segue a do electrólito base, indicando uma maior tendência para a enzima permanecer em
solução aquosa.
Para concentrações mais baixas de GOx (0.1 μM), observou-se um comportamento ligeiramente diferente
do anteriormente descrito. Este último resultado parece um pouco estranho, uma vez que, a curva de capacidade
101
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
mostra uma maior adsorção da GOx na interface ao longo dos potenciais negativos, comparado com os resultados
obtidos para os outros valores de concentração de GOx. Seria de esperar, ou um comportamento semelhante ao
obtido para os outros dois valores de concentração de GOx, ou um menor efeito, dada a menor concentração de
GOx.
Desta forma, os resultados mostram também que, a capacidade interfacial é afecta pela concentração da
enzima GOx, quando adicionada à fase aquosa, para um valor de pH fixo (4.9).
3.3.2. Efeito do solvente orgânico na adsorção de DPPC
Foi também estudado o efeito de adsorção do fosfolípido DPPC na interface água/2-NPOE. Foi utilizada
uma célula electroquímica igual à apresentada na secção 3.2.1., à excepção do solvente orgânico que se substituiu
por 2-NPOE e se adicionou x μM DPPC à fase orgânica.
Na figura 3.31.–B, estão representados os voltamogramas cíclicos obtidos utilizando a célula referida. Ao
contrário do que foi observado para a interface água/1,2-DCE, para concentrações superiores a 15 μM não foi
observado nenhum pico de intensidade de corrente, quer no varrimento directo (positivo), quer no varrimento
inverso (negativo). Contudo, os voltamogramas continuam a não mostrar diferenças marcantes à medida que se vai
adicionando DPPC à fase orgânica.
30
25
0 μM DPPC
1 μM DPPC
20 μM DPPC
50 μM DPPC
100 μM DPPC
4
20
2
I / μA
C / μF.cm-2
0 μM DPPC
1 μM DPPC
20 μM DPPC
50 μM DPPC
100 μM DPPC
6
15
0
-2
10
-4
5
-6
0
-250 -200 -150 -100 -50
A)
0
50
-300
100 150 200 250
Δφ/ mV
B)
-200
-100
0
100
200
300
Δφ / mV
Figura 3.31.: A) Curvas de capacidade interfacial em função do potencial aplicado na interface água/2-NPOE na
presença de x μM de DPPC na fase orgânica. B) Voltamogramas cíclicos correspondentes aos sistemas em estudo.
Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação de queda óhmica (IR).
102
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
As curvas de capacidade obtidas estão representadas na figura 3.31.–A, para a interface água/2-NPOE, na
presença de diferentes concentrações de DPPC na fase orgânica.
Da análise da figura 3.31.–A, é possível observar comportamentos diferentes da capacidade interfacial,
dependentes do potencial eléctrico aplicado e da concentração de DPPC adicionada à fase orgânica, tal como foi
observado para o sistema água/1,2-DCE.
A potenciais negativos, ocorreu uma diminuição na capacidade interfacial à medida que se aumentou a
concentração de DPPC na fase orgânica (a excepção foi para CDPPC = 50 μM, onde a sua presença provocou o
aumento da capacidade), relativamente à dos electrólitos base. Este facto poderá estar relacionado com um possível
erro experimental, ou devido à mudança do estado de transição de fase que pode ocorrer para as diferentes
concentrações de DPPC, tal como foi observado para o solvente 1,2-DCE. No entanto, os resultados experimentais
não são suficientes para se efectuar uma análise contundente.
Comparando com os resultados obtidos para a interface água/1,2-DCE, observou-se que o efeito de
adsorção de DPPC é maior na presença do solvente 1,2-DCE, pois para este sistema os valores de capacidade são
mais baixos, do que os obtidos para o solvente 2-NPOE. A maior viscosidade deste último solvente dificultará a
penetração das moléculas de DPPC para perto da interface, e consequentemente, o efeito de adsorção ocorrerá em
menor extensão.
A potenciais positivos, a capacidade aumentou com a presença de DPPC na fase orgânica, para valores
superiores ou coincidentes com a do electrólito base, o que indica a ocorrência de desorção de DPPC da interface,
tal como foi observado para o solvente 1,2-DCE, indicando uma maior tendência para o fosfolípido permanecer na
fase orgânica.
Representado o gráfico do potencial mínimo de capacidade, Δφmín.
cap.,
em função da concentração de
DPPC (figura 3.32.–A), pode observar-se que o valor do potencial se desloca para potenciais mais negativos com o
aumento da concentração de DPPC na fase orgânica, atingindo um valor constante para Δφmín. cap. = -100 mV na
presença do solvente orgânico 2-NPOE. Este valor encontra-se um pouco deslocado relativamente ao obtido para o
solvente 1,2-DCE (-125 mV).
A figura 3.32., mostra ainda, uma tendência para a composição da interface se manter inalterável com
concentrações mais elevadas de DPPC na zona de potencial mais negativo, para ambos os solventes.
103
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
60
1,2-DCE
2-NPOE
40
Relatório de Seminário
1,2-DCE: Δφ = -125 mV
2-NPOE: Δφ = -100 mV
12
20
10
-20
8
-40
C / μF.cm-2
Δφ(mín. cap.) / mV
0
-60
-80
-100
6
4
-120
2
-140
-160
0
-180
0
A)
20
40
60
80
100
0
[DPPC] / μM
20
40
60
80
100
[DPPC] / μM
B)
Figura 3.32.: A) Efeito do aumento da concentração de DPPC no deslocamento do potencial a que a capacidade é
mínima nas curvas de capacidade nos solventes ensaiados. B) Capacidade interfacial em função da concentração de
DPPC a potencial mínimo Δφ = -125 mV para água/1,2-DCE, e a Δφ = -100 mV para água/2-NPOE.
A partir do valor da capacidade interfacial da camada saturada, Clip, e do valor da capacidade interfacial
sem fosfolípido, Caq, respectivamente 3.7 e 12.0, estimou-se o valor da cobertura superficial, θ, para o estudo com o
solvente orgânico 2-NPOE. Estes valores são um pouco superiores aos obtidos para o solvente 1,2-DCE (Clip = 1.0
μF.cm-2 e Caq = 9.4 μF.cm-2).
Utilizando o modelo de Frumkin, determinou-se os parâmetros termodinâmicos obtidos para os diferentes
solventes. Esses valores encontram-se resumidos na tabela 3.9.
Tabela 3.9.: Parâmetros termodinâmicos de adsorção de DPPC numa interface
água/1,2-DCE e água/2-NPOE, a pH ~7, obtidos a partir dos resultados para
as diferentes concentrações de DPPC e dos ajustes das isotérmicas de Frumkin.
Frumkin
Isotérmica
Solvente orgânico
1,2-DCE
2-NPOE
Δφmín. cap. / mV
-125
-100
a
1.1
-4.3
ln β
13.4
14.0
104
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
ΔGºads* / KJ.mol-1
-33
-35
Caq / μF.cm-2
9.4
12.0
Clip / μF.cm-2
1.0
3.7
τ / nm
1.7
0.48
* ln β = -ΔGºads/RT
Observou-se um ligeiro deslocamento do potencial a que a capacidade é mínima para os dois solventes
estudados, indicando que o potencial a que a capacidade é mínima varia com o solvente orgânico na presença do
fosfolípido DPPC (tabela 3.10.).
Tabela 3.10.: Deslocamento do potencial de mínimo de capacidade
para uma camada saturada de DPPC nos solventes ensaiados.
Solvente orgânico
Δφmín. cap. sem DPPC / mV
Δφmín. cap. da camada saturada /
Δ(Δφmín. cap.) / mV
mV
1,2-DCE
0
-125
125
2-NPOE
51
-100
149
Comparando os valores dos parâmetros termodinâmicos representados na tabela 3.9. para os dois solventes
na presença de DPPC na fase orgânica, obteve-se um valor negativo para o parâmetro a na interface água/2-NPOE,
o que sugere que nesta interface as interacções entre as moléculas de DPPC serão muito menos atractivas, e o
solvente orgânico não deverá colocar-se entre as moléculas de fosfolípido na camada saturada. As forças dominantes
deixam de ser atractivas devido ao aumento das repulsões electrostáticas. A camada deverá ser muito menos
compacta do que na interface água/1,2-DCE, dado o baixo valor obtido para o parâmetro a, o que poderá provocar
um maior deslocamento do potencial a que a capacidade é mínima com o aumento da concentração de DPPC, por
haver maior influência das interacções dos solventes aquoso e orgânico.
Como se apresentou na tabela 3.10., o valor de Δ(Δφmín. cap.) na interface água/2-NPOE é maior do que para
a interface água/1,2-DCE. Este facto é ainda confirmado pelo baixo valor de τ obtido na presença do solvente
orgânico 2-NPOE. De acordo com a relação da capacidade da camada saturada com a espessura (equação 3.6.), a
camada na presença do solvente orgânico 2-NPOE estará no estado líquido expandido.
O valor de ΔGºads nas interfaces líquido-líquido é similar, sugerindo que a formação da camada não é
afectada pela natureza do solvente.
Note-se novamente que, os resultados obtidos para este estudo constituem uma estimativa dos parâmetros,
devido ao número reduzido de pontos experimentais utilizados para efectuar as determinações indicadas para o
solvente 2-NPOE.
105
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
3.4. Estudos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE
polarizada na presença da acetilcolina (ACh+)
A acetilcolina e a butirilcolina são dois iões que podem transferir através da interface líquido-líquido dentro
de uma gama de potenciais.
A partir dos voltamogramas obtidos por voltametria cíclica é possível retirar parâmetros importantes, tais
como, a intensidade de corrente quando ocorre a transferência de iões para ambas as fases (Ip+ e Ip-) e o seu potencial
de pico (Ep+ e Ep-). Assim, na voltametria cíclica, os diferentes processos de difusão observados nas ITIES originam
respostas voltamétricas diferentes. No caso de uma transferência iónica em que o processo de difusão predominante
é a difusão linear, observa-se o aparecimento de um pico.
As experiências a seguir apresentadas foram efectuadas com o objectivo de estudar e analisar a facilidade
destes iões poderem atravessar a interface água/1,2-DCE, na ausência ou na presença do fosfolípido DPPC (C16) na
fase orgânica.
A partir das janelas de potencial definidas pelos voltamogramas, efectuaram-se medições de impedâncias
na zona de potencial entre -250 e 250 mV, em ensaios com diferentes concentrações de ACh+ na fase aquosa, para
se obterem as respectivas curvas de capacidade.
Os espectros de impedância foram analisados e ajustados utilizando o circuito equivalente da figura 1.22. e
o programa EQUIVCRT.
Todas as experiências foram realizadas à temperatura ambiente.
3.4.1. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE na
presença da acetilcolina na fase aquosa
Inicialmente realizaram-se ensaios adicionando ACh+ à fase aquosa na ausência de DPPC na fase orgânica. A célula
electroquímica utilizada nestes ensaios pode ser representada do seguinte modo:
100 mM LiCl +
Célula 2:
Ag
AgCl 10 mM NaTPB 10 mM TOATPB
+
(RE2)
(1,2–DCE)
(org)
AgCl
Ag
.
10 mM NaH2PO4 2H2O +
x μM ou x mM ACh+,
10 mM NaCl
(H2O)
10 mM Na2HPO4 +
(RE1)
(H2O)
pH ~7
Na figura 3.33. estão representados os voltamogramas cíclicos obtidos utilizando a célula anterior. Nestes
voltamogramas observou-se um aumento na intensidade de corrente, devido à presença da ACh+. Observou-se o
aparecimento de um pico de intensidade de corrente a potenciais positivos devido à ocorrência de transferência do
protão da acetilcolina da fase aquosa para a fase orgânica, para potenciais entre aproximadamente -25 mV (Ip-) e
106
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
150 mV (Ip+), uma vez que, a potenciais mais positivos da fase aquosa os iões de carga positiva têm tendência a
passar para a fase orgânica.
No entanto, o aparecimento deste pico só começa a ser perceptível para concentrações de ACh+ na ordem
dos mM. Observou-se que a intensidade de corrente dos voltamogramas aumentou à medida que se aumentou a
concentração de ACh+ na fase aquosa, assim como, a intensidade de corrente dos picos observados. A diferença de
potencial observada entre os picos de corrente directo e inverso, indica que a transferência da ACh+ não é reversível,
devido talvez à não introdução da compensação da queda óhmica (IR).
Mesmo dois dias após o primeiro ensaio, e para uma concentração de 1 mM de ACh+, observou-se o
mesmo comportamento nos voltamogramas cíclicos.
250
1º varrimento
2º varrimento
200
+
Sem ACh
10 μM ACh
3º varrimento
150
+
+
0.2 mM ACh
100
+
0.5 mM ACh
1 mM ACh
I / μA
50
+
0
-50
-100
3º varrimento
-150
1º varrimento
2º varrimento
-200
-250
-400
-300
-200
-100
0
100
200
300
Δφ / mV
Figura 3.33.: Voltamogramas cíclicos obtidos para a interface água/1,2-DCE na presença de diferentes
concentrações de ACh+ na fase aquosa. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem utilização da compensação de
queda óhmica (IR).
Da observação dos voltamogramas, importa salientar que:
1.
após a adição de uma concentração apreciável de ACh+ (digamos, CACh+ ≥ 0.2 mM), os picos de
corrente são observados de imediato, ou seja, adicionando ACh+ à fase aquosa e efectuando o
varrimento de seguida, observou-se o aparecimento imediato dos picos de intensidade de corrente, logo
no primeiro varrimento;
2.
tal como mostra a figura 3.33., observou-se que os picos têm tendência a diminuir ao longo do tempo
com o decorrer dos varrimentos. No entanto, estes nunca deixam de ser visíveis, isto é, a dada altura
após o estabelecimento do equilíbrio entre os iões em solução, observou-se que os voltamogramas
cíclicos se mantinham estáveis, ou seja, sem qualquer tipo de alteração ao nível da intensidade de
corrente dos picos.
107
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Obtiveram-se as curvas de capacidade que estão representadas na figura 3.34., para diferentes
concentrações de ACh+ adicionadas à fase aquosa na interface água/1,2-DCE, após o estabelecimento do equilíbrio
da célula electroquímica durante cerca de 60 minutos.
80
Sem Ach
+
10 μM Ach
70
60
+
0.2 mM Ach
+
0.5 mM Ach
+
1 mM Ach
+
C / μF.cm
-2
50
40
30
20
10
0
-250
-200
-150
-100
-50
0
50
100
150
200
250
Δφ / mV
Figura 3.34.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de x μM de ACh+ na fase aquosa.
Para a gama de potenciais estudados, observou-se que para potenciais negativos, não ocorreu qualquer
alteração significativa nas curvas de capacidade, o que indica que não há qualquer tipo de adsorção na interface por
parte do catião, pois os valores de capacidade seguem a do electrólito base. A potenciais positivos, observou-se o
aparecimento de um pico nas curvas de capacidade para Δφ ~ 125 mV, tal como, foi observado nos voltamogramas
cíclicos, correspondente à transferência da ACh+. Também aqui, se observou que o valor da capacidade dos picos
aumentou com o aumento da concentração da ACh+ na fase aquosa.
3.4.2. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE da
acetilcolina (ACh+) na presença do fosfolípido DPPC
O estudo da cinética de transferência de iões através de monocamadas de fosfolípidos em ITIES tem sido
vastamente efectuados por vários autores [68,73].
O estudo da transferência de iões através de fosfolípidos adsorvidos foi efectuada utilizando o ião
acetilcolina. No entanto, o estudo cinético na interface macroscópica utilizando a técnica de espectroscopia de
impedância apresentou alguns problemas, uma vez que, seria necessário corrigir a queda óhmica da célula, para se
obterem resultados válidos. Todos os resultados vem afectados pela não utilização da queda óhmica (IR). O
esquema da célula electroquímica é igual à apresentada na secção 3.4.1. (célula 2.), à excepção de se ter adicionado
1.4 μM ou 30 μM de DPPC à fase orgânica.
108
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Os voltamogramas cíclicos representados na figura 3.35.–B, mostram, uma vez mais que, mesmo na
presença do fosfolípido na fase orgânica, ocorre a transferência da acetilcolina a potenciais positivos, resultantes no
aparecimento de picos de intensidade de corrente, que também aumentam de intensidade com o aumento da
concentração da ACh+ (para CACh+ > 0.2 mM). A intensidade de corrente destes picos, voltou novamente a diminuir
ao longo do tempo, até ser atingido o equilíbrio químico entre as soluções. Observou-se, no entanto que, os valores
de intensidade de corrente para os sistemas em estudo são um pouco inferires aos observados para os sistemas
contendo apenas a ACh+, possivelmente devido à presença do fosfolípido na fase aquosa.
Por outro lado, verificou-se que, após a estabilização do sistema durante 60 minutos, e posterior adição de
várias concentrações de ACh+ à solução aquosa, não se observou qualquer tipo de alteração nos voltamogramas
cíclicos para concentrações de ACh+ superiores a 0.8 mM, mesmo após a adição de quantidades apreciáveis de
ACh+ à fase aquosa. Este facto sugere que, a partir de uma concentração elevada de ACh+ (> 1 mM), o elevado
número de iões em solução aquosa conduzirá à saturação do sistema.
As curvas de capacidade obtidas encontram-se representadas na figura 3.35.–A.
40
35
200
+
+
0 μM DPPC + 0 mM ACh
0 μM DPPC + 0 mM ACh
+
+
1.4 μM DPPC + 0 mM ACh
1.4 μM DPPC + 0 mM ACh
150
+
1.4 μM DPPC + 0.2 mM ACh
+
1.4 μM DPPC + 0.2 mM ACh
30
+
+
1.4 μM DPPC + 0.5 mM ACh
1.4 μM DPPC + 0.5 mM ACh
100
+
1.4 μM DPPC + 0.8 mM ACh
+
1.4 μM DPPC + 0.8 mM ACh
50
I / μA
C / μF.cm-2
25
20
0
15
-50
10
-100
5
-150
0
-250 -200 -150 -100 -50
A)
1º varrimento
2º varrimento
0
50
-200
-400
100 150 200 250
Δφ/ mV
B)
-300
-200
-100
0
100
200
300
Δφ/ mV
Figura 3.35.: A) Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de 1.4 μM de DPPC e x mM de
ACh+. B) Voltamogramas cíclicos obtidos para os sistemas em estudo. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem
utilização da compensação da queda óhmica (IR).
As curvas de capacidade interfacial apresentam duas zonas de potencial distintas:
1.
a potenciais negativos, onde a capacidade diminuiu com a presença do fosfolípido na fase orgânica
relativamente à da solução base, resultante da sua adsorção na interface. Para 1.4 μM de DPPC e para a
gama de concentrações de ACh+ estudadas, não se observou qualquer alteração marcante na
capacidade interfacial, pelo que se conclui que a presença da acetilcolina na fase aquosa não afectará a
109
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
adsorção do fosfolípido, contrariamente ao que foi observado quando na presença da enzima GOx na
fase aquosa.
2.
a potenciais positivos, onde a capacidade aumentou para valores superiores à capacidade do electrólito
base, indicando uma completa desorção do fosfolípido da interface. Neste caso, observou-se o
aparecimento de um pico para Δφ ≈125 mV, tal como, foi observado para o sistema contendo apenas
ACh+. Também aqui, a capacidade do pico aumentou com o aumento da concentração da acetilcolina
na fase aquosa. No entanto os valores obtidos são inferiores aos observados na figura 3.34. Este facto
dever-se-á à presença do fosfolípido na fase orgânica, que dificulta um pouco mais o processo de
transferência do ião ACh+, fazendo diminuir o valor da capacidade interfacial.
Desta forma, pode dizer-se que a capacidade interfacial para o sistema contendo ACh+ na fase aquosa e 1.4
μM de DPPC na fase orgânica, é afectada pela concentração de ACh+ e pelo potencial aplicado ao sistema em
estudo.
Foi escolhida esta concentração de fosfolípido (1.4 μM) para efectuar este estudo, porque se pretendia
avaliar o efeito da acetilcolina na adsorção de DPPC a baixas concentrações, optando-se por aquele valor.
Com o mesmo objectivo anterior, realizaram ensaios com diferentes concentrações de ACh+ na fase
aquosa, na presença de 30 μM de DPPC na fase orgânica. Foram mantidas as condições experimentais anteriores.
A capacidade interfacial e os voltamogramas cíclicos obtidos a partir deste estudo, estão representados na
figura 3.36.–A e 3.36.–B, respectivamente.
100
1000
+
0 μM DPPC + 0 mM ACh
800
+
30 μM DPPC + 0 mM ACh
80
+
30 μM DPPC + 0.2 mM ACh
600
+
30 μM DPPC + 0.5 mM ACh
+
60
30 μM DPPC + 1 mM ACh
400
+
C / μF.cm
-2
30 μM DPPC + 1 mM ACh + 0.2 μM GOx
200
40
0
-250 -200 -150 -100
-50
0
50
100
150
200
250
20
0
-250
-200
-150
-100
-50
0
50
100
150
Δφ / mV
A)
110
200
250
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
200
+
0 μM DPPC + 0 mM ACh
150
+
30 μM DPPC + 0 mM ACh
+
30 μM DPPC + 0.2 mM ACh
100
+
30 μM DPPC + 0.5 mM ACh
50
+
30 μM DPPC + 1 mM ACh
I / μA
+
30 μM DPPC + 1 mM ACh + 0.2 μM GOx
0
-50
-100
-150
-200
-300
B)
-200
-100
0
100
200
300
Δφ / mV
Figura 3.36.: A) Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de 30 μM de DPPC e x mM de
ACh+ na fase aquosa. B) Voltamogramas cíclicos obtidos para os sistemas em estudo. Velocidade de varrimento: 50
mV/s, sem utilização da compensação da queda óhmica (IR).
Os voltamogramas cíclicos da figura 3.36.–B, são semelhantes aos obtidos na figura 3.35.–B.
Aparentemente o comportamento observado nos voltamogramas cíclicos é independente da quantidade de
fosfolípido presente na solução orgânica, à medida que se adiciona ACh+ à fase aquosa. Também aqui, a intensidade
de corrente dos picos aumentou com o aumento da concentração de ACh+. Por adição de 0.2 μM de GOx à fase
aquosa, observou-se um abaixamento na intensidade da corrente do pico.
O pico que surge no varrimento inverso e que é característico da adsorção do fosfolípido, deixou de ser
visível após a adição da ACh+ à fase aquosa.
Da análise das curvas de capacidade e para a gama de potenciais estudados, observou-se, tal como no caso
anterior, duas regiões de potencial com comportamento diferente:
1.
a potenciais negativos, a presença da acetilcolina em solução aquosa não tem qualquer influência no
processo de adsorção do fosfolípido;
2.
a potenciais positivos, observou-se de igual modo, o aparecimento de um pico a Δφ ≈ 150 mV,
resultante do processo de transferência por difusão da acetilcolina através da interface. Os picos
obtidos, são no entanto, muito superiores aos observados para o sistema contendo 1.4 μM DPPC
(figura 3.35.–A). A elevada concentração de DPPC na fase orgânica será a responsável por este facto,
pois como já foi dito, o aparecimento de um pico de corrente no varrimento directo (positivo) para
concentrações de DPPC superiores a 15 μM, correspondentes à adsorção/desorção do fosfolípido,
resultante da possível transferência de um protão, conduzindo ao aumento dos valores de capacidade
111
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
nesta região de potencial. A não utilização da compensação da queda óhmica, poderá afectar ainda
mais os resultados.
Estudos realizados mostraram ainda que, a adição de diferentes concentrações de ACh+ à fase aquosa, antes
ou após um período de estabilização do sistema (cerca de 60 minutos), na presença de 30 μM de DPPC na fase
orgânica, não provoca qualquer alteração nas curvas de capacidade ou nos voltamogramas cíclicos.
Foram também observados dois limites de concentração de ACh+:
concentrações de ACh+ na fase aquosa inferiores a 0.2 mM não são suficientes para provocarem
1.
alterações nas curvas de capacidade ou nos voltamogramas cíclicos;
concentrações de ACh+ superiores a 1 mM, deixam de ser observadas diferenças significativas nas
2.
curvas de capacidade ou nos voltamogramas cíclicos, pois o sistema parece atingir a saturação.
Representando a intensidade de corrente dos picos onde ocorre a transferência da ACh+ na presença de
DPPC na fase orgânica, em função da concentração da ACh+ (figura 3.37.), observou-se a existência de uma relação
linear, o que indica que o processo de transferência da ACh+ da fase aquosa para a fase orgânica é controlado por
difusão. Esta relação foi também observada por Vanýsek e Behrendt [97] em ITIES. Este sistema mostra, portanto, a
ocorrência de processos cinéticos e de difusão na interface água/1,2–DCE a potenciais positivos.
180
0 μM DPPC + x mM ACh
160
+
Ip
+
140
1.4 μM DPPC + x mM ACh
120
Ip
+
30 μM DPPC + x mM ACh
100
Ipico / μA
+
+
Ip
+
80
60
40
20
0
-20
-0,2
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
+
[ACh ] / mM
Figura 3.37.: Representação gráfica da intensidade de corrente do pico positivo vs. a concentração da acetilcolina,
utilizada nos ensaios anteriores, na ausência de DPPC e na presença de 1.4 μM e 30 μM de DPPC na fase orgânica.
Ajustando os resultados obtidos anteriormente pelo método dos mínimos quadrados, obtiveram-se os
112
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
parâmetros da recta representados na tabela 3.11. O coeficiente de difusão foi calculado utilizando a relação da
equação 1.18., usando como área da interface o valor de 0.28 cm2.
Tabela 3.11.: Resumo dos valores dos parâmetros obtidos através do ajuste linear
da figura 3.37., e cálculo dos coeficientes de difusão utilizando a equação 1.18.
x mM ACh+
Pico Ip+
Declive / μA.mM-1
Daq / cm2.s-1
171
1.58x10-6
1.4 μM de DPPC + x mM ACh+
Pico Ip+
Declive / μA.mM-1
Daq / cm2.s-1
143
1.32x10-6
30 μM de DPPC + x mM ACh+
Pico Ip+
Declive / μA.mM-1
Daq / cm2.s-1
70
6.48x10-7
O valor obtido para o coeficiente de difusão em solução aquosa da ACh+ na interface água/1,2-DCE na
ausência de DPPC na fase orgânica é inferior ao obtido por Ohkouchi et al. [49] com um microeléctrodo na interface
água-nitrobenzeno (DaqACh+ = 8.9x10-6 cm2.s-1). No entanto, como seria de prever o coeficiente de difusão da ACh+
em solução orgânica é menor do que em solução aquosa, pois a viscosidade do solvente orgânico 1,2-DCE é maior
do que a da solução aquosa.
Um outro facto importante, especialmente do ponto de vista analítico, é que a corrente do pico catódico
(resultante do varrimento directo) é muito maior comparada com a corrente do pico anódico. Este facto pode ser
explicado pelos seguintes processos: durante o processo de transferência do ião anódico no primeiro varrimento de
potencial, a ACh+ progride na fase orgânica por difusão dos iões, a partir de um grande volume da fase aquosa para
o interior de um pequeno volume de fase orgânica. Uma observação semelhante foi efectuada por Ohkouchi et al.
[49].
Os resultados obtidos mostram ainda que, à medida que se aumenta a concentração de DPPC na fase
orgânica maior é a dificuldade de transferência da acetilcolina da fase aquosa para a fase orgânica, pois o valor do
coeficiente de difusão foi diminuindo para valores de concentração crescentes de DPPC na fase orgânica (tabela
3.11.). A presença do fosfolípido torna a solução orgânica mais viscosa, e portanto, mais difícil de ocorrerem
transferências de iões entre a fase orgânica e a fase aquosa.
Estudos realizados permitiram ainda determinar a resistência de transferência de carga obtida através do
estudo de impedâncias para os sistemas contendo ACh+, observando-se que esta foi mais elevada para soluções mais
113
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
concentradas de DPPC na fase orgânica, o que também vem justificar o valor mais baixo obtido na presença de 30
μM de DPPC na fase orgânica.
3.5. Estudos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE
polarizada na presença da butirilcolina (BuCh+)
No caso da BuCh+, estudou-se apenas o efeito da sua presença na interface água/1,2-DCE na ausência e na
presença de DPPC na fase orgânica. Todas as experiências foram realizadas à temperatura ambiente, mantendo-se
todas as condições utilizadas na secção 3.4.
3.5.1. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE na presença de
butirilcolina na fase aquosa
Começou-se por adicionar a BuCh+ à fase aquosa na interface água/1,2-DCE, na ausência de fosfolípido na
fase orgânica. Utilizou-se uma célula electroquímica igual à representada na secção 3.4.1., à excepção da ACh+ que
foi substituída por x μM de BuCh+ na fase aquosa.
Tal como, no caso da acetilcolina, também aqui a introdução da BuCh+ nos sistemas em estudo, provocou
alterações nos voltamogramas cíclicos (3.38.–B). Nestes voltamogramas é possível observar um pico de intensidade
de corrente a potenciais positivos, correspondentes à transferência deste ião BuCh+ da fase aquosa para a fase
orgânica. Esse pico foi observado no voltamograma cíclico para a mesma zona de potencial do sistema em estudo,
entre -25 mV (Ip-) e 50 mV (Ip+). Este resultado difere bastante do que foi obtido por Beattle et al. [98],
possivelmente devido ao facto de não se ter utilizado compensação da queda óhmica (IR). Deve ser notado que, o
pico de corrente que se desenvolve na figura 3.38.–B, corresponde ao fluxo de iões através da interface água/1,2DCE. A corrente negativa refere-se ao facto que o potencial da água, em relação à fase orgânica, se vai tornando
mais negativo no varrimento inverso, sendo isto uma convenção para todas as experiências das ITIES [98].
114
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
150
60
+
+
0 mM BuCh
0 mM BuCh
+
+
50
1 mM BuCh
1 mM BuCh
100
40
50
30
I / μA
C / μF.cm-2
Relatório de Seminário
20
0
-50
10
-100
0
-150
-250 -200 -150 -100 -50
0
50
-300
100 150 200 250
-200
-100
Δφ / mV
0
100
200
300
Δφ/ mV
A)
B)
Figura 3.38.: A) Curva de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de 1 mM de BuCh+ na fase
aquosa. B) Voltamogramas cíclicos obtidos para o sistema em estudo. Velocidade de varrimento: 50 mV/s, sem
utilização da compensação da queda óhmica (IR).
Na curva de capacidade interfacial observou-se o aparecimento de um pico entre Δφ ~ -25 mV e 50 mV,
correspondente à transferência do ião através da interface. Para a mesma concentração de espécie utilizada em
solução aquosa, verificou-se que o valor da capacidade interfacial do pico na presença da ACh+ é um pouco superior
à obtida para a BuCh+, aproximadamente 70 μF.cm-2 e 60 μF.cm-2, respectivamente.
Estes resultados, mostram que a BuCh+ transfere mais facilmente do que a ACh+, da fase aquosa para a fase
orgânica, pois comparando os respectivos voltamogramas, pode observar-se que o pico de intensidade de corrente da
BuCh+ surge a potenciais, primeiro do que o da ACh+.
3.5.2. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2-DCE da
butirilcolina (BuCh+) na presença do fosfolípido DPPC
Estudou-se o efeito da butirilcolina na adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE, tal como no caso da
acetilcolina. O esquema da célula electroquímica é igual à apresentada na secção 3.4.1. (célula 2.), à excepção de se
ter adicionado 30 μM de DPPC à fase orgânica, e substituído a ACh+ por x mM de BuCh+. Foram mantidas todas as
condições experimentais anteriormente descritas.
Na figura 3.39. estão representadas as curvas de capacidade na interface água/1,2-DCE na presença de 30
μM de DPPC na fase orgânica e x mM de BuCh+ na fase aquosa.
115
Capítulo 3 — Resultados e Discussão
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
120
0 μM DPPC + 0 mM BuCh
+
+
30 μM DPPC + 0 mM BuCh
100
30 μM DPPC + 0.5 mM BuCh
+
+
30 μM DPPC + 1 mM BuCh
C / μF.cm
-2
80
60
40
20
0
-250
-200
-150
-100
-50
0
50
100
150
200
250
Δφ / mV
Figura 3.39.: Curvas de capacidade para a interface água/1,2-DCE na presença de 30 μM de DPPC na fase orgânica
e x mM de BuCh+ na fase aquosa.
Tal como no caso da acetilcolina, as curvas de capacidade mostram também que a potenciais negativos a
presença de butirilcolina na fase aquosa não provoca qualquer alteração no processo de adsorção do fosfolípido, e a
potenciais positivos observou-se o aparecimento de um pico nas curvas de capacidade, resultante do processo de
transferência por difusão da butirilcolina através da interface. Este pico aumenta com o aumento da concentração de
butirilcolina adicionada à fase aquosa.
Observou-se ainda um deslocamento do pico nas curvas de potencial para potenciais mais positivos,
relativamente ao observado na figura 3.38., sem a presença do fosfolípido. Este facto poderá estar relacionado com a
presença do fosfolípido na fase orgânica, pois a adsorção do fosfolípido na interface dificultará o processo de
transferência da BuCh+, tornando-o mais lento, e consequentemente, este ocorre a potenciais mais positivos.
No entanto, para comprovar o que foi dito anteriormente, seria desejável efectuar-se um estudo cinético
para a transferência da butirilcolina na interface água/1,2-DCE na ausência e na presença de DPPC na fase orgânica.
116
Capítulo
Conclusões finais
Neste capítulo são apresentadas as conclusões gerais, obtidas a
partir da análise dos resultados do capítulo 3, para os diferentes
sistemas em estudo, utilizando a técnica de LB e a espectroscopia
de impedância electroquímica.
Capítulo 4 — Conclusões finais
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
As experiências levadas a cabo tiveram como objectivo fornecer uma profunda compreensão na formação
de monocamadas de fosfolípidos formadas na interface líquido-líquido e na interface ar-água.
Os estudos efectuados utilizando a técnica de LB para determinar as isotérmicas de diferentes
fosfatidilcolinas na interface ar-água, permitiram tirar as seguintes conclusões:
•
No estudo das isotérmicas de diferentes fosfatidilcolinas, foi possível observar a existência de 4 regiões
distintas, correspondentes a 4 estados físicos de transição de fases diferentes, para os fosfolípidos DBPC e
DSPC: I– Gasoso (G); II– Líquido expandido (LE); III– Líquido condensado (LC); IV– Sólido (S).
•
Para o fosfolípido DPPC, observou-se para além dos 4 estados referidos anteriormente, a existência de um
outro estado de transição de fase, correspondente a um estado físico coexistente, designado de líquido
condensado-líquido expandido (LC+LE).
•
A natureza e concentração do electrólito de suporte da subfase aquosa parece não influenciar o
comportamento das isotérmicas dos diversos fosfolípidos estudados. No entanto, o comportamento da
isotérmica de DPPC mostrou-se bastante dependente da temperatura, observando-se que para valores de
temperatura inferiores ou superiores a 20 ºC, o estado físico LC+LE, deixou de ser observado.
•
Os estudos não foram suficientemente esclarecedores quanto ao efeito da presença de GOx na isotérmica
de misturas de fosfolípidos [DSPC+DPPC]. Para baixas concentrações de GOx adicionadas à subfase
aquosa, o comportamento das isotérmicas parece ser ligeiramente afectado com a sua presença. No entanto,
para se obter uma conclusão mais esclarecedora, seria necessário efectuar outro tipo de misturas de
fosfolípidos e utilizar valores de GOx na fase aquosa mais elevados.
•
A transferência de monocamadas de fosfolípido DBPC para um substracto sólido de Au, mostrou-se eficaz
utilizando o método de deposição vertical. No entanto, o estudo efectuado com FT-IR não foi, contudo,
eficaz para a determinação da transferência de GOx juntamente com a monocamada de fosfolípido para o
slide de Au, devido talvez às baixas concentrações de GOx utilizadas, ou ainda, devido à sua dissolução na
subfase aquosa, não penetrando na monocamada do fosfolípido, e por conseguinte, não ocorrendo
transferência para o slide de Au.
Os estudos mostraram ainda que, as isotérmicas de diferentes fosfatidilcolinas na interface ar-água, variam
com o tamanho da cadeia de hidrocarbonetos (de C16 a C22), observando-se uma diminuição no valor da área
molecular média. Isto significa que a monocamada é muito mais compacta para o fosfolípido com a cadeia de
hidrocarbonetos maior, pois as forças atractivas de Van der Waals são mais fortes entre as cadeias mais longas de
hidrocarbonetos, do que entre as cadeias mais curtas.
Por outro lado, as isotérmicas da mistura de dois fosfolípidos [DSPC+DPPC], mostraram que se tratam de
dois fosfolípidos miscíveis entre si, sendo as suas isotérmicas aparentemente influenciadas com a presença da
enzima GOx. Esta miscibilidade torna, contudo, o comportamento da isotérmica imprevisível, pois não foi possível
determinar de que forma a que a mistura de moléculas de fosfatidilcolinas se rearranjam à superfície da subfase
aquosa.
118
Capítulo 4 — Conclusões finais
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
Os estudos de adsorção de fosfatidilcolinas na interface líquido-líquido polarizadas, utilizando a
técnica de espectroscopia de impedância electroquímica, permitiram realizar as seguintes conclusões:
1. Relativamente à GOx pode dizer-se que:
•
Para as interfaces líquido-líquido polarizadas estudadas, a capacidade interfacial é dependente da
concentração da GOx presente na fase aquosa, bem como, do potencial aplicado, ocorrendo um efeito de
adsorção maior, para potenciais negativos.
•
A adsorção da GOx nas interfaces estudadas parece não ser afectada pela natureza do solvente, pois o valor
de ΔG0ads foi de –21 e –22 KJ/mol, respectivamente, para a interface água/1,2-DCE e água/2-NPOE.
•
A capacidade interfacial foi afectada pelo pH da fase aquosa na presença de GOx, sendo este efeito mais
pronunciado a pH inferior ao pI da enzima (pH ácidos).
2. Relativamente à DAPC, pode referir-se que:
•
A adsorção deste fosfolípido na interface água/1,2-DCE é dependente, quer da concentração de GOx presente
na fase aquosa, quer do potencial aplicado, sendo maior o efeito a potenciais negativos.
3. Para o fosfolípido DBPC:
•
Ocorreram variações na capacidade interfacial para as diferentes concentrações de DBPC utilizadas na fase
orgânica, e também na presença da enzima GOx na fase aquosa. Os valores de capacidade mostraram uma
adsorção praticamente constante ao longo de toda a gama de potenciais estudados, sendo este efeito maior
para concentrações mais elevadas de DBPC, o que sugere uma adsorção estável de DBPC ao nível da
interface.
•
Os resultados mostram ainda uma adsorção menos favorável do fosfolípido na presença da enzima GOx na
fase aquosa.
4. Os estudos com DPPC mostraram que:
•
A existência de duas regiões de comportamento diferente nas curvas de capacidade: uma a potenciais
negativos, onde se observou a adsorção do fosfolípido; e outra a potenciais positivos, onde deverá ocorrer
uma desorção do fosfolípido da interface.
•
Ambas as isotérmicas de Frumkin e Volkov, obtidas para as diferentes concentrações de DPPC, permitem um
bom ajuste dos resultados, obtendo-se valores muito semelhantes para as duas isotérmicas.
•
O valor de ΔG0ads obtido para ambos os ajustes, foi de –33 KJ/mol em 1,2-DCE e –35 KJ/mol em 2-NPOE, o
que sugere que a formação da camada não é afectada pela natureza do solvente. Estes resultados mostram
ainda que, a DPPC tem uma maior tendência para ser adsorvida nesta interface, do que a DBPC e a GOx.
•
O valor de τ obtido para o solvente 1,2-DCE e 2-NPOE, foi, respectivamente, 1.7 e 0.48, o que sugere que a
camada adsorvida de DPPC à interface se encontra no estado líquido expandido em ambos os solventes,
sendo a sua espessura muito menor no solvente 2-NPOE.
119
Capítulo 4 — Conclusões finais
•
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
A adsorção de DPPC nas interfaces estudadas depende do potencial aplicado, da concentração de DPPC
presente na fase orgânica e da concentração de GOx (quando presente na fase aquosa). Para concentrações de
DPPC mais elevadas e na presença da enzima GOx, as curvas de capacidade apresentaram um pico a
potenciais positivos, devido a um fenómeno de transferência de carga da GOx da fase aquosa para a fase
orgânica.
•
Na presença de GOx, o valor de ΔG0ads obtido, foi maior para concentrações mais elevadas de DPPC na fase
orgânica, o que sugere que a adsorção de GOx na interface será mais favorável para concentrações de DPPC
mais elevadas na fase orgânica.
Os valores de a positivos obtidos na maioria dos casos estudados, indicam que as interacções entre as
espécies interfaciais são atractivas. Estes estudos mostram ainda que o efeito de adsorção é tanto maior, quanto
menor é a cadeia de hidrocarbonetos da fosfatidilcolina, para uma dada concentração de fosfolípido. Assim, o efeito
será maior para a DPPC > DAPC > DBPC. O mesmo efeito foi observado na presença de GOx na fase aquosa.
Os estudos de adsorção de DPPC na interface água/1,2-DCE, efectuados na presença de ACh+ e BuCh+ na
fase aquosa, mostraram não afectar o efeito de adsorção do fosfolípido a potenciais negativos, enquanto que a
potenciais positivos foi observado um pico nas curvas de capacidade, resultante do processo de difusão
(transferência de carga) dos iões em estudo da fase aquosa para a fase orgânica.
Futuras investigações:
Como projectos futuros dever-se-á aliar as técnicas de LB e de EIE para efectuar os estudos de
adsorção e com controlo da tensão interfacial em simultâneo, bem como, efectuar estudos com diversas
misturas de diferentes fosfolípidos e estudar também outras possíveis enzimas e fosfatidilcefalinas com
grande interesse biológico.
120
Capítulo
Bibliografia
Capítulo 5 — Bibliografia
QUÍMICA ANALÍTICA
Relatório de Seminário
[1] - G. Roberts (Ed.), Langmuir-Blodgett Films, Plenum Press, New York, 1990.
[2] - J.D. Swalen, D.L. Allara, J.D. Andrade, E.A. Chandross, S. Garoff, J. sraelachvili, T.J. McCarthy, R. Murray,
R.F. Pease, J.F. Rabolt, K.J. Wynne, H. Yu, Langmuir, 3, 932, (1987).
[3] - I. Langmuir, J. Am. Chem. Soc., 39, 1848, (1917).
[4] - K.B. Blodgett, J. Am. Chem. Soc., 57, 1007, (1935).
[5] - I.R. Peterson, G.J. Russell and G.G. Roberts, Thin solid films, 109, 371, (1983).
[6] - R.S. Potember, R.C. Hoffman, S.H. Kim, K.R. Speck, and K.A. Stetyick, J. Mol. Electron., 4, 5, (1988).
[7] - N.P. Franks and K. A. Snook, Thin Solid Films, 99, 139, (1983).
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124
ERRATA
•
Pág. i, Agradecimentos: onde se lê tronaram, deve ler-se tornaram.
•
Pág. ii, Resumo: onde se lê tensão superficial, deve ler-se pressão superficial.
•
Pág. 44, 2.2.1. Material e instrumentação: onde se lê Luvas de nitrilo sem pó,
deve ler-se Luvas de nitrilo sem pó talco.
•
Pág. 47, 2.2.2. Procedimentos experimentais: onde se lê luvas de nitrilo sem pó,
deve ler-se se luvas de nitrilo sem pó talco.
•
Pág. 58, 3.1.4. Estudo da isotérmica do fosfolípido DSPC (C18) na interface arágua. Estudo do efeito do electrólito da subfase aquosa: onde se lê observando-se
ligeiras diferenças apenas na região III, deve ler-se observando-se ligeiras
diferenças apenas na região IV.
•
Pág. 65, 3.1.7. Transferência de monocamadas de fosfolípidos para substractos
sólidos: onde se lê espectros de transmitância e absorvância, deve ler-se apenas
espectros de reflectância.
•
Pág. 66, 3.1.7.1. Transferência da monocamada de DBPC para slides de Au:
onde se lê Desta forma, se atingir, deve ler-se Desta forma, após se atingir.
•
Pág. 67, Transferência da monocamada de DBPC para slides de Au: onde se lê
absorvância, deve ler-se reflectância.
•
Pág. 70, 3.2.1. Efeito do pH na adsorção de GOx na interface água/1,2-DCE
polarizada: onde se lê carrega, deve ler-se carregada.
•
Pág. 80, 3.2.4. Estudos de adsorção de DBPC (C22). Efeito da presença da GOx
na fase aquosa: onde se lê Este efeito foi tanto maior, quanto maior a concentração
da enzima à fase aquosa (no entanto, para baixas concentrações de GOx
adicionadas à fase aquosa o efeito não foi muito pronunciado), deve ler-se apenas
Este efeito foi tanto maior, quanto maior a concentração da enzima adicionada à
fase aquosa.
•
Pág. 86, 3.2.5. Estudos de adsorção de DPPC (C16): onde se lê componentes
orgânicos, deve ler-se compostos orgânicos.
•
Pág. 109, 3.4.2. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2DCE da acetilcolina (ACh+) na presença do fosfolípido DPPC: onde se lê
inferires, deve ler-se inferiores.
•
Pág. 114, 3.5.1. Estudos da transferência iónica através da interface água/1,2DCE na presença de butirilcolina na fase aquosa: onde se lê substituída por x μM
de BuCh+, deve ler-se substituída por x mM de BuCh+.

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