Ler Dissertação - centro de ciências da saúde - ufpb
Transcrição
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM CÍNTIA BEZERRA ALMEIDA DESAFIOS VIVENCIADOS POR MULHERES EM BUSCA DE RECANALIZAÇÃO TUBÁRIA JOÃO PESSOA/PB 2005 17 DESAFIOS VIVENCIADOS POR MULHERES EM BUSCA DE RECANALIZAÇÃO TUBÁRIA 18 CINTIA BEZERRA ALMEIDA DESAFIOS VIVENCIADOS POR MULHERES EM BUSCA DE RECANALIZAÇÃO TUBÁRIA Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Enfermagem, nível Mestrado, do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba, em cumprimento às exigências para obtenção do grau de Mestre. Orientadora: Profa. Dra. Telma Ribeiro Garcia. Universidade Federal da Paraíba JOÃO PESSOA – PB 2005 19 20 A 447 r ALMEIDA, Cíntia Bezerra Desafios vivenciados por mulheres em busca de recanalização tubária / Cíntia Bezerra Almeida. – João Pessoa, 2005. 87p.: il. Orientadora: Telma Ribeiro Garcia Dissertação (Mestrado) – UFPB/CCS 1. Saúde da mulher. 2. Direitos reprodutivos. 3. Esterilização cirúrgica feminina. 4. Recanalização tubária. 21 UFPB/BC CDU 618. 12 – 089.87(043) 22 Dissertação inserida na linha Políticas e Práticas em Saúde e Enfermagem e no grupo de estudos sobre Saúde e Sociedade, do Programa de PósGraduação em Enfermagem, área de concentração Enfermagem de Saúde Pública. Durante a realização das atividades do Curso, a mestranda contou com o auxílio do CNPq, sob forma de Bolsa de Demanda Social. 23 CINTIA BEZERRA ALMEIDA DESAFIOS VIVENCIADOS POR MULHERES EM BUSCA DE RECANALIZAÇÃO TUBÁRIA Data da aprovação: ____/_____________/2005 BANCA EXAMINADORA: Profa. Dra. Telma Ribeiro Garcia - UFPB Profa. Dra. Maria de Fátima de Araújo Silveira - UEPB 24 Profa. Dra. Maria Djair Dias - UFPB Profa. Dra. Lenilde Duarte de Sá - UFPB 25 DEDICATÓRIA Dedico essa vitória aos meus pais, Hélio e Sônia, razão da minha vida, e ao meu noivo, Lúcio, pelo amor, pela confiança e presença constantes e fortalecedoras, ao longo desta caminhada. 26 AGRADECIMENTOS ESPECIAIS A Deus, que, com infinita bondade, deu-me forças para superar os obstáculos encontrados e os momentos mais difíceis desta caminhada; Aos meus pais, Hélio e Sônia, pela minha existência e por estarem presentes, compartilhando força e coragem, em cada momento da minha vida; Aos meus irmãos, Danielle e Júnior, pelo carinho e incentivo constantes; Ao meu noivo, Lúcio, pela força, compreensão, carinho e, sobretudo, por estar presente na concretização deste sonho, compartilhando comigo esta felicidade; À Profa. Dra. Telma Ribeiro Garcia, minha orientadora, a quem tanto admiro, por ter repartido comigo os seus conhecimentos, colocando nas minhas mãos as ferramentas com as quais abrirei novos horizontes rumo à satisfação plena dos meus ideais profissionais. 27 AGRADECIMENTOS Aos meus familiares, pela amizade, confiança e apoio; Aos meus amigos, que de várias formas contribuíram para a realização deste trabalho; À Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, na pessoa do Prof. Dr. César Cavalcanti da Silva, pelo apoio e incentivo; Às Professoras Dra. Maria Djair Dias, Dra. Maria de Fátima de Araújo Silveira e Dra. Lenilde Duarte de Sá, por fazerem parte da banca examinadora e por suas valiosas contribuições para o crescimento do estudo; À Profa. Dra. Maria Miriam Lima da Nóbrega, pela atenção e apoio durante o curso; À Profa. Dra. Ana Tereza Medeiros Cavalcanti da Silva, pelas sugestões, no momento da análise do projeto de pesquisa; Aos colegas de turma, em especial a Lindalva, pelos momentos agradáveis e partilha nos momentos difíceis; À Ana Cristina de Oliveira e Silva e Gisélia Alves Araújo pela amizade, apoio e estímulo, durante a concretização desta pesquisa; À amiga Casandra Martins por ter feito a versão para o espanhol do Resumo deste trabalho; À Profa. Jeane Garcia de Almeida, por ter feito a versão para o inglês do Resumo deste trabalho; 28 Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, pelos ensinamentos; Aos funcionários do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, Penha e Ismael, pela atenção e ajuda; À bibliotecária Maria de Fátima Alves, pela revisão das referências; Ao CNPq, pelo auxílio financeiro, sob a forma de bolsa de estudos, durante a realização do Curso de Mestrado; Às mulheres participantes do estudo, pela confiança e interesse; Ao Dr. Pedro Cordeiro e à Enfa. Ana Lúcia Pontes, do Ambulatório de Ginecologia do HULW/UFPB, pela receptividade, pelo apoio e por terem facilitado a coleta de dados no serviço; A todos os que, direta ou indiretamente, participaram da concretização deste sonho, MEU MUITO OBRIGADA! 29 RESUMO ALMEIDA, C. B. Desafios vivenciados por mulheres em busca de recanalização tubária. 2005. 87p. Dissertação (Mestrado) – Centro de Ciências da Saúde/Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa. Trata-se de um estudo descritivo, em que se utilizou a abordagem qualitativa do estudo de caso, objetivando-se Identificar que aspectos, presentes no contexto de vida das mulheres, motivaram a decisão de realizar a esterilização cirúrgica; averiguar que elementos influenciaram a decisão dessas mulheres de recorrer à cirurgia de recanalização tubária e quais os desafios enfrentados por elas nesse processo. A pesquisa foi realizada no Ambulatório de Ginecologia, Serviço de Planejamento Familiar, do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW) da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Participaram do estudo dezesseis mulheres que foram submetidas à esterilização cirúrgica, no passado, e que compareceram ao ambulatório do HULW, na tentativa de reversão da laqueadura tubária. Todas foram entrevistadas individualmente e os dados das entrevistas foram analisados pela técnica de análise de discurso proposta por Fiorin. A idade das participantes do estudo variou de 22 a 39 anos, no momento da entrevista, e de 16 a 29 anos, por ocasião da laqueadura. Predominaram mulheres casadas, ou em união consensual estável com novo companheiro (n=14). Das dezesseis participantes, onze não exerciam ocupação remunerada e doze possuíam escolaridade igual ou inferior ao primário incompleto. A decisão acerca da laqueadura tubária foi ocasionada, na maioria dos casos, por problemas conjugais, decorrentes de abuso de bebidas alcoólicas, violência e dificuldades financeiras. Uma parcela considerável de mulheres revelou não ter utilizado nenhum método contraceptivo reversível anteriormente à laqueadura. Quanto à busca pela recanalização, inúmeros motivos levaram as mulheres a manifestar arrependimento e desejo de uma nova gestação, entre os quais, destacaram-se a mudança de cônjuge, a perda de filhos e o desejo de ter outro filho, fosse com outro ou com o mesmo cônjuge. Dentre as dezesseis mulheres, onze já estavam no processo de atendimento no Serviço de Planejamento Familiar, há pelo menos um ano e cinco aguardavam a primeira consulta. No grupo das que já estavam inseridas no processo, duas haviam realizado a cirurgia de reversão – uma havia tido uma gravidez ectópica e a outra, decorridos três anos após a recanalização tubária, ainda não havia conseguido engravidar. Quanto às nove restantes, uma estava aguardando resultado dos exames realizados; quatro tiveram a cirurgia de reversão contra-indicada, por razões como oligospermia, trompas encurtadas e sobrepeso e quatro aguardavam a cirurgia o que, em média, dura um ano para ser realizada. Palavras-chave: 1. Saúde da mulher; 2. Direitos reprodutivos; 3. Esterilização cirúrgica feminina; 4. Recanalização tubária. 30 ABSTRACT ALMEIDA, C. B. Challenges experienced by women seeking to do tubal ligation reversal surgery. 2005. 87p. Dissertation (Master Degree) – Health Sciences Center of the Federal University of Paraíba. João Pessoa. This is a descriptive study, where it has been used the qualitative approach of case study. It aims to identify which aspects, presented on the context of women’s lives, have motivated the decision to do the surgical sterilization; to find out which elements had influenced these women’s decisions to seek the tubal ligation reversal surgery and which challenges they have faced along this process. The research has been accomplished in the Gynecology Clinic, Family Planning Service, of the Lauro Wanderley University Hospital (LWUH) of the Federal University of Paraiba. Sixteen women, who had been submitted to surgical sterilization in the past and went to the UHLW in order to seek the tubal ligation reversal surgery, have participated on the study. All of them have been interviewed individually and the interview’s data has been analyzed by Fiorin’s proposed technique. The age of the participants ranged from 22 to 39 years when they were interviewed, and from 16 to 29 years when the tubal ligation occurred. Most of these women were married or were in stable consensual kinship with a new consort (n=14). Eleven of the sixteen participants did not have a rewarded work and twelve of them have finished, or have not completed, elementary school. The decision concerning the tubal ligation came up, for the most part, from conjugal matters on alcoholism, domestic violence and financial difficulties. Great part of those women told that they haven’t used any reversible contraceptive method before tubal ligation. As to asking for tubal ligation reversal surgery, many reasons have taken those women on showing regret and desire for a new pregnancy, among which they have pointed the consort’s change, children’s loss, and wishes of having a new child, with the same or with another consort. Eleven of the sixteen women had been in the attendance process at the Family Planning Service at least for a year, and five of them were waiting for the first attendance. In the group of the ones who where in the process, two of them have already had the tubal ligation reversal surgery – one of them has had an ectopic pregnancy and the other one hasn’t still succeeded in being pregnant, although the tubal ligation reversal surgery 31 had happened three years before. As to the remaining nine ones, one of them was waiting for the exams results; four of them have the reversal surgery counter indicated because of oligospermia, shortened tubes or body overweight; and the last four ones were waiting to be submitted to the surgery, what takes, in most of the cases, a year to happen. Key words: 1. Women’s health. 2. Reproductive rights. sterilization. 4. Tubal ligation reversal surgery. 3. Surgical female 32 RESUMEN ALMEIDA, C.B. Los desafíos vivieron para las mujeres en la búsqueda del tubária recanalização. 2005. 87 p. Disertación (Mestrado) – Centro de Ciencias de la Salud / Universidad Federal de la Paraíba, João Pessoa. Se trata de estudio descritivo, donde se utilizó el abordaje cualitativa del estudio de caso, teniendo como objetivo identificar aspectos, presentes en el contexto de la vida de las mujeres, que han motivado la decisón de realizar la esterilizacón cirujica, averiguar que elementos han influenciado la decisón de esas mujeres a recorir a la cirurgia de recanalización tubaria y cuales los desafios por éllas enfrentados en ése proceso. La pesquisa fue realizada en el Ambulatório de Ginecologia en el setor de Planificación Familiar, del Hospital Universitario Lauro Wandreley (HULW) de la Universidad Federal de la Paraíba (UFPB). Han participado del estudio dieciseis mujeres que fueron sumetidas a esterilización cirurgica en el pasado y que han comparecido en el ambulatório del HULW intentando la revisión de la laqueación tubária. Todas élas fueron entrevistadas individualmente y los datos de las entrevistas fueron analisados por la técnica de análisis del discurso propuesta por Fiorin. La edad de las participantes del estudio fue entre los 22 y los 39 años en el momento de la entrevista, y de los 16 a los 29 años cuando hicieronla laqueadura. El predomínio fue de mujeres casadas o en unión consensual estable con nuevo compañero (n=14). De las dieciseis participantes, once no ejercian ocupación remunerada y doce tenian enseñanza igual o inferior al básio incompleto. La decisión sobre la laqueción fue ocasionada, en la mayoría de los casos por problemas conjugales, decorientes del abuso de bebidas alcoolicas, violencia y dificultades financeras. Una parte considerable de mujeres reveló no haber utilizado ningun metodo anticonceptivo reversible antes de la laqueación. En cuanto a la busqueda por la recanalización, inúmeros motivos llevaraon las mujeres a manifestarse arrependidas y con el deseo de una nueva gestación, entre otros se destacan el cambio de pareja, la pierda de hijos y el deseo de tener otro hijo, fuese con su compañero o no. De entre las dieciseis mujeres, once ya estaban en proceso de atendimiento en el setor Planeamento Familiar hacia por lo menos un año y cinco aguardaban la primera consulta. En el grupo de las que estaban inseridas en el proceso, dos ya habían realizado la cirurgia de reversión – una había tenido un embarazo, aunque ya habian pasado tres años de la recanalización tubaria. En cuanto a las restantes nueve, una estaba aguardando el resultado de los examenes realizados; cuatro tuvieron la cirurgia de reversión contra-indicada, por razones como oligospermia, trompas encuertadas y sobrepeso; y cuatro aguardaban la cirurgia el que, en media, dura un año para ser realizarse. Palabras clave: 1. Salud de la mujer. 2. Derechos Reproductivos. 3. Esterilización cirurgica feminina. 4. Recanalización tubaria. 33 SUMÁRIO 16 1. INTRODUÇÃO CONCEPÇÃO E CONTRACEPÇÃO NO CONTEXTO DAS 18 POLÍTICAS E PROGRAMAS DE SAÚDE DA MULHER 32 RECANALIZAÇÃO TUBÁRIA: O ESTADO DA ARTE 2. OBJETIVOS 43 3. METODOLOGIA 45 NATUREZA DO ESTUDO 46 LOCAL DE PESQUISA 46 POPULAÇÃO E AMOSTRA 47 COLETA DE DADOS 48 ANÁLISE DOS DADOS 48 51 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO A NECESSIDADE DE CONTROLE DA FECUNDIDADE 53 A DECISÃO PELA LAQUEADURA TUBÁRIA 59 O ARREPENDIMENTO E A BUSCA PELA REVERSÃO DA 62 LAQUEADURA TUBÁRIA 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 71 REFERÊNCIAS 76 APÊNDICES 83 APÊNDICE 1 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E 84 34 ESCLARECIDO APÊNDICE 2 – INSTRUMENTO DE COLETA DE DADOS ANEXO ANEXO 1 – CERTIDÃO DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA 85 86 87 35 De tudo ficaram três coisas: a certeza de que estamos começando, a certeza de que é preciso continuar e a certeza de que podemos ser interrompidos antes de terminar... 36 1. INTRODUÇÃO 37 Quando era discente do Curso de Graduação em Enfermagem, participei, como bolsista do Programa de Iniciação Científica – PIBIC/CNPq/UFPB, do projeto de pesquisa intitulado “Determinantes da esterilização cirúrgica feminina e efeitos secundários ao procedimento” (GARCIA, 1998), o que possibilitou a aproximação com a problemática referente à saúde das mulheres que haviam se submetido à esterilização cirúrgica. A partir desse projeto, elaborei minha monografia de conclusão de curso realizada no município de Campo de Santana – PB. (ALMEIDA, 2001). Os dados revelaram a complexidade do fenômeno da esterilização cirúrgica feminina, que tem sido o recurso mais amplamente usado pelas mulheres brasileiras para evitar a concepção. No cotidiano profissional, atuando como enfermeira do Programa de Saúde da Família (PSF), em especial no serviço de planejamento familiar, foi possível constatar que, em nosso meio, a responsabilidade da regulação da fecundidade é uma obrigação quase que exclusivamente feminina, sendo muito pequena a procura dos homens por métodos contraceptivos. Nas Unidades Básicas de Saúde da Família (UBSF), os métodos que são disponibilizados para as mulheres se restringem ao contraceptivo oral que, na maioria das vezes, pela alta dosagem hormonal, ocasiona inúmeros efeitos colaterais, fazendo com que elas recorram à esterilização cirúrgica feminina como opção de evitar uma gravidez indesejada. 38 Essas experiências despertaram inquietações relativas ao contexto de vida das mulheres, frente à concepção/contracepção, pois o sentimento de arrependimento resultante da escolha contraceptiva pela laqueadura tubária pode, no futuro, levá-las a procurar algum procedimento que lhes permita uma nova gravidez. Diante do exposto, motivei-me para aprofundar os estudos acerca dos fatores envolvidos na decisão das mulheres de realizar uma laqueadura tubária e sobre a trajetória que percorrem quando, arrependidas da decisão anterior, resolvem tentar a recanalização tubária. CONCEPÇÃO E CONTRACEPÇÃO NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS E PROGRAMAS DE SAÚDE DA MULHER Desde a Antigüidade, a contracepção é utilizada por mulheres e homens, para controlar a fecundidade e para prevenir a ocorrência de uma gravidez indesejada. Segundo historiadores, nossos antepassados já utilizavam alguns métodos contraceptivos, com a finalidade de controle do crescimento dos núcleos populacionais. (ZANCONATO et al., 1989). Atualmente, há uma ampla variedade de opções contraceptivas: os métodos naturais, os de barreira, os hormonais, os dispositivos intra-uterinos, a esterilização cirúrgica feminina e masculina. Para cada um dos métodos contraceptivos conhecidos são descritos, na literatura, seu mecanismo particular de ação; suas indicações e contra-indicações de uso; as vantagens e desvantagens; a eficácia teórica e de uso real, sabendo-se que uns são mais seguros que os outros, mas 39 nenhum deles é perfeito, porém, indiscutivelmente, quase todos estão destinados às mulheres. (GARCIA, 1998). Apesar de ser um direito e uma responsabilidade do casal, a regulação da fecundidade, observa-se, na prática, que a contracepção é realizada predominantemente pelas mulheres. Esse fato reafirma as desigualdades de gênero, pois é limitada a participação masculina na utilização dos métodos contraceptivos, revelando que a anticoncepção continua sendo uma responsabilidade quase que exclusivamente feminina. Ressalta-se que, no Brasil colonial, a Igreja foi a instituição que incentivou as mulheres à reprodução, promovendo o discurso, na sociedade, de que a mulher tinha que ter quantos filhos Deus determinasse. Esse discurso reforçava que a mulher não poderia assumir outro papel que não fosse o da vida familiar. (COSTA, 1999). Desse modo, a mulher, para se adequar às normas da Igreja, tinha que seguir o discurso preconizado por ela, em que sua sexualidade somente deveria servir à procriação e, portanto, o pecado do desejo carnal deveria ser anulado pela concepção. Sendo assim, os sofrimentos decorrentes do trabalho de parto eram vistos como purificadores do pecado do ato sexual. (COSTA, 1996). No entanto, a postura da Igreja foi flexibilizada em relação ao controle da fecundidade, quando permitiu que os casais realizassem a contracepção pela abstinência periódica da atividade sexual. Esse método de evitar a concepção foi denominado, pela própria Igreja, de “método natural”, representando um avanço na mudança de posicionamento da instituição quanto à regulação da fecundidade. (COSTA, 1996; STEPHAN-SOUZA, 1995). 40 No ano de 1952, a enfermeira e feminista Margaret Sanger criou, em Londres, a International Planned Parenthood Federation (IPPF), visando ao controle populacional e, portanto, restringindo as liberdades reprodutivas dos casais. A partir dos anos 1960, a IPPF passou a financiar instituições que realizavam planejamento familiar no Brasil. (COELHO, 1996; COSTA, 1999). No Brasil, as mulheres passaram a ter acesso aos métodos contraceptivos na década de 1960, sendo esses amplamente difundidos a partir da década de 1965, com a criação de instituições de caráter controlista, com ações de planejamento familiar, como a Sociedade Civil de Bem-Estar Familiar no Brasil (BENFAM). A entrada dessas entidades no país veio atender às pressões americanas sobre o governo brasileiro para a adoção de uma política de controle populacional neomalthusiana, como critério para empréstimos financeiros. (COELHO et al., 2000). A teoria neomalthusiana afirmava que a pobreza dos países subdesenvolvidos era decorrente da superpopulação, que retardava o crescimento econômico e degradava o meio ambiente. Para Malthus, o desenvolvimento econômico desses países só seria possível com a redução do ritmo do crescimento demográfico. (FERNANDES, 1996). Malthus, para atender aos interesses das classes dominantes, responsabilizou o pobre pela sua condição de miséria, excluindo os governantes das suas responsabilidades políticas, econômicas e sociais. (COELHO, 1996). O Brasil substituiu sua postura natalista, adotada no processo de consolidação da sociedade capitalista, por uma controlista. A partir dessa mudança, os anticoncepcionais entraram no mercado e as mulheres adotaram principalmente a 41 contracepção hormonal, mas, sem uma assistência adequada, ocasionado sérios danos à sua saúde. A partir do surgimento das entidades de planejamento familiar, iniciou-se a medicalização do corpo feminino, no que se refere ao controle da fecundidade. Observe-se que o corpo feminino é tomado apenas do ponto de vista de sua capacidade reprodutiva, na dualidade de poder ou não poder procriar, considerandose a mulher a única responsável pela prática contraceptiva. O termo medicalização do corpo feminino tem sido discutido por vários autores, desde da década de 1970. Para Vieira (1999), medicalizar significa o processo de transformar aspectos da vida cotidiana em objetos da Medicina, de forma a assegurar conformidade às normas sociais. A medicalização do corpo feminino particulariza-se nas implicações específicas da reprodução humana, sobretudo na maneira específica pela qual o corpo feminino vem sendo manipulado e apropriado pela medicina, a partir do momento em que se transforma em seu objeto de saber e prática. (VIEIRA, 1999). Nos anos 1970, organiza-se, no Brasil, o movimento feminista, composto por mulheres da classe média e inspirado em movimentos internacionais. Essas feministas se opunham ao regime militar e lutavam por um governo democrático, onde pudessem ter o direito à cidadania, à autonomia sobre o próprio corpo, reivindicando uma política que eliminasse a discriminação da mulher. No fim da década de 1970, as feministas passaram a defender a regulação da fecundidade como uma maneira de exercer sua cidadania, reivindicando o direito das mulheres sobre seu corpo e contestando os interesses controlistas. (COELHO et al., 2000). 42 Ressalte-se que, a partir dos movimentos de mulheres e, com a colaboração de agências internacionais, foi possível viabilizar-se, em 1979, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW), promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU), através da qual os países participantes se comprometeram a desenvolver políticas de saúde direcionadas para a eliminação de desigualdades entre os sexos. Assumiram, também, o compromisso de melhorar, no âmbito da assistência médica, o acesso das mulheres aos serviços de saúde. A CEDAW visa a coibir toda forma de discriminação contra a mulher, entendendo como discriminação a distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objetivo ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente do seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos políticos, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo. (BRASIL, 2004, p. 171). Todavia, no Brasil, no início dos anos 1980, a assistência à saúde das mulheres restringia-se ao período da reprodução, através de programas maternoinfantis, que se caracterizavam pela verticalidade, por ações oferecidas para o atendimento às mulheres que não se articulavam entre si, ocasionando às usuárias dos serviços de saúde uma assistência fragmentada e de má qualidade, com intervenções nem sempre as mais adequadas para suas necessidades reais. Nessa mesma época, as feministas levaram, para a esfera pública, temas como, saúde, sexualidade, aborto e direitos reprodutivos, em decorrência do processo de democratização do país. Iniciou-se, nesse período, a formulação e implantação de políticas públicas com perspectiva de gênero. Assim, em 1983, foi instituído o Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM) do 43 Ministério da Saúde, cuja finalidade seria assistir a mulher em todas a etapas de sua vida, ou seja, desde a puberdade até a terceira idade. O PAISM tem como princípios e diretrizes a descentralização, hierarquização e a regionalização dos serviços, assim com a integralidade e a eqüidade, que se tornou, mais tarde, com a Constituição de 1988, o arcabouço que embasou o Sistema Único de Saúde – SUS. (BRASIL, 2004). O conceito de assistência integral, preconizado pelo PAISM, envolve a oferta de ações globalmente dirigidas ao atendimento de todas as necessidades de saúde do grupo em questão, onde todo e qualquer contato que a mulher venha a ter com os serviços de saúde seja utilizado em benefício da promoção, proteção e recuperação da sua saúde. O novo programa para a saúde da mulher incluía ações educativas, preventivas, de diagnóstico, tratamento e recuperação, englobando a assistência à mulher em clínica ginecológica, no pré-natal, parto e puerpério, no climatério, em planejamento familiar, DST, câncer de colo de útero e de mama, além de outras necessidades identificadas a partir do perfil populacional das mulheres. (BRASIL, 1985). A partir da criação do PAISM, e tendo por base as reivindicações dos movimentos organizados de mulheres, a anticoncepção foi incorporada pelo Estado como direito das mulheres e dos casais, aos quais deveria ser facultado o acesso a todos os métodos contraceptivos. A proposta preconizada pelo PAISM com referência à atenção à saúde da mulher tem como finalidade aumentar a resolução dos serviços de saúde, por meio de assistência integral, envolvendo 44 a oferta de ações globalmente dirigidas ao atendimento de todas necessidades de saúde do grupo em questão, onde todo e qualquer contato que a mulher venha a ter com os serviços de saúde seja utilizado em benefício da promoção, proteção e recuperação de sua saúde. (BRASIL, 1985, p. 15). O PAISM constitui uma conquista dos movimentos de mulheres no Brasil e um redirecionamento da assistência à mulher, antes restrita ao período grávidicopuerperal, representando um caminho para o reconhecimento dos direitos reprodutivos das mulheres. Embora seja um modelo de referência no Brasil e no mundo, sua efetivação não aconteceu na maioria dos serviços, predominando a atenção fragmentada à saúde da mulher. (COELHO; GARCIA, 2004). Nesse contexto, como outro resultado da atuação e mobilização do movimento de mulheres participantes do processo de redemocratização, em todo o país, foi criado o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), órgão extremamente importante para fazer a articulação nacional entre o movimento de mulheres, o das ONGs e o das instâncias governamentais. (ÁVILA; CORRÊA, 1999). Após sua criação, o CNDM promoveu eventos para estimular o trabalho dos conselhos estaduais e municipais, denunciou discriminações, incentivou a formação de delegacias especializadas no atendimento a mulheres vítimas de violência e incentivou discussões sobre os direitos das mulheres. (BASTERD, 1994). A partir dos anos 1990, ocorrem importantes contribuições de profissionais de saúde, do movimento de mulheres e de cientistas, na elaboração dos conceitos de direitos reprodutivos e saúde da mulher e, incorporando essas contribuições, as feministas ampliaram o discurso e passaram a pressionar as mudanças nas políticas públicas, que estavam restritas ao período reprodutivo. (GALVÃO, 1999). 45 Segundo Pitanguy (1999), o movimento de mulheres reivindicava do Estado o desenvolvimento de ações de saúde reprodutiva e que se reconhecesse o direito das mulheres de vivenciar a maternidade como opção, com acesso a todas as informações necessárias e com um atendimento ao pré-natal, ao parto e à contracepção, em condições adequadas. Para as feministas, eram necessárias a liberdade e a eqüidade na vida reprodutiva e sexual, para que as mulheres conseguissem inserção em uma sociedade que estava restrita a construções patriarcais, onde as condições de existência da mulher estavam relacionadas com sua capacidade reprodutiva. (ÁVILA, 2002). Para que ocorresse uma nova concepção de cidadania no que concerne à sexualidade e à reprodução, era necessário que as mulheres passassem a ter autonomia sobre seu corpo, pois, como bem afirma Ávila (2002, p. 177), o corpo das mulheres não pode ser tomado como um lugar de definição do seu “destino”, mas justamente ao contrário, a sua integridade corporal e o reconhecimento do direito sobre seu próprio corpo como dimensão fundamental da sua cidadania, abrem caminho para vivenciar as diferenças que existem entre os vários aspectos de ser mulher. Vale enfatizar, que a formulação teórica sobre direitos reprodutivos foi iniciada a partir de articulações internacionais das feministas que resultaram nas definições aprovadas na Conferência das Nações Unidas sobre População e Desenvolvimento (CIPD), realizada no Cairo, em 1994, e na Conferência Mundial da Mulher, em Beijing, em 1995. (PORTELLA, 2002). De modo geral, direito reprodutivo é o direito que qualquer casal possui de decidir se quer ou não ter filhos, quando quer tê-los e com que intervalo. Para tal, é 46 imprescindível o direito de acesso a todas as informações que considerarem necessárias e a todos os níveis de atenção, sem sofrer qualquer tipo de discriminação. Nas duas últimas décadas do século XX, a discussão sobre os direitos reprodutivos ampliaram os horizontes para espaços institucionais, como a Organização Mundial de Saúde e outros organismos internacionais. (AQUINO et al., 1999). A partir de fóruns internacionais, particularmente na Conferência do Cairo e na Conferência de Beijing, a noção de direitos reprodutivos foi incorporada aos direitos humanos. Participaram dessas Conferências delegações de mulheres de vários países, pretendendo incorporar princípios que foram acordados anteriormente com o movimento feminista, através reuniões. (PITANGUY, 1999). Direitos reprodutivos são definidos, no relatório da Conferência Internacional do Cairo (CIPD, 1994, p. 17), capítulo VII, como: o estado de bem-estar físico, mental e social completo em todos os aspectos relacionados com o sistema reprodutivo e com as funções e processos. Ele implica que as pessoas tenham capacidade de se reproduzir e a liberdade de decidir se, quando e quantas vezes o pretendem fazer [...] o direito de homens e mulheres à informação e ao acesso a métodos de planejamento familiar de sua escolha, seguros e eficazes, aceitáveis e que estejam dentro de suas posses, assim como outros métodos de sua escolha para regular a fecundidade, que não infrinjam a lei, e o direito de acesso a serviços de cuidados sanitários que permitam à mulher uma gravidez e partos seguros. Para o pleno exercício dos direitos reprodutivos, é necessário que as pessoas sejam capazes de ter uma vida sexual satisfatória e segura, que tenham a capacidade de reproduzir-se. Portanto, é um direito do homem e da mulher de ter acesso a métodos contraceptivos, seguros e eficazes, como também de ter acesso a 47 serviços de saúde que lhes proporcionem a possibilidade de realizar o desejo de ter um filho. (RIVOIRE et al., 2003). Acrescentamos a essas recomendações a importância do acesso às informações sobre os diferentes métodos, suas conseqüências e possibilidades/impossibilidades de reversão. É importante ressaltar-se que, inserido no PAISM, há o planejamento familiar, garantido pela Constituição Federal e pela Lei 9.263/96, uma vez que nelas está afirmado o direito de escolha reprodutiva como um direito de mulheres e de homens. O planejamento familiar, da maneira como evoluiu nas últimas décadas, representa grande progresso para a humanidade e, principalmente, uma conquista para a mulher, além de ser uma das condições básicas para o exercício do direito de liberdade individual, que inclui o direito de decidir quantos filhos se deseja ter e quando se quer tê-los. (ADES, 1997). Para a garantia desse direito, ressalta-se ser imprescindível que os casais conheçam e tenham acesso a métodos anticoncepcionais cientificamente aprovados e disponíveis, de modo que possam escolher aquele que seja mais adequado às suas condições de vida e necessidades específicas naquele momento. (HARDY et al., 1993). No entanto, na atualidade, apesar de existir no Brasil uma política de assistência à saúde da mulher que insere o planejamento familiar, e cuja formulação é o resultado da luta organizada do movimento feminista pelo direito de regular a fecundidade, na prática, o acesso, tanto à informação, quanto à variedade de métodos contraceptivos disponíveis é restrito. Como questão social, existe um quadro grave no país: o uso maciço da esterilização feminina; a falta de oferta de 48 métodos reversíveis e de práticas educativas nos serviços públicos de saúde; uma profunda desinformação da população sobre os meios de evitar a gravidez, e, tudo isso, dentro de um contexto de acentuada pobreza e relações de gênero desiguais. (BARROSO, 1984; PINOTTI; FAÚNDES, 1988; MOURA; TEIXEIRA, 1998; ÁVILA, 2000). A esterilização cirúrgica feminina tem sido o método mais utilizado pelas mulheres na faixa etária de 15 a 49 anos, observando-se a tendência para o aumento progressivo de seu uso em idades cada vez menores. Isso é corroborado por dados do Ministério da Saúde (BRASIL, 1997), segundo os quais, no Brasil, a prevalência do uso dos métodos contraceptivos por mulheres em idade fértil é de 76,7%, com predominância da esterilização feminina (52,2%) e da pílula (26,9%). Como é sabido, a laqueadura tubária é um procedimento com alta eficácia anticoncepcional, porém, na maioria das vezes, irreversível. (BARROSO, 1984; BERQUÓ, 1993; SERRUYA, 1993). Sorrentino (1991), ao se referir à esterilização cirúrgica feminina como o método mais utilizado pelas mulheres brasileiras, afirma ainda que sua prevalência tem aumentado significativamente no nosso país, sobretudo entre as mulheres mais jovens, estando a sua realização predominantemente associada a uma cesariana. Conforme o estudo publicado por essa autora, em alguns Estados, como é o caso da Paraíba, a percentagem de mulheres em idade fértil submetidas à esterilização cirúrgica chega a quase 50%. O uso excessivo da cesariana, além de interferir na mortalidade materna e perinatal, está diretamente relacionado com as elevadas taxas de esterilizações entre as mulheres. Consolidou-se, dessa maneira, uma cultura reprodutiva onde, 49 ainda muito jovens, as mulheres, por desinformação e ausência de outras opções, incluem, na sua vida, a cesariana e a laqueadura tubária. Acredita-se ser um direito das mulheres o de optar pela esterilização cirúrgica como forma de controlar sua fecundidade, entretanto, é imprescindível que esse direito seja exercido em condições apropriadas, com plena informação e autodeterminação. Tendo em vista que se trata de um método definitivo de contracepção, a esterilização pode colocar-se como negação da mulher, enquanto reprodutora, negando-lhe, assim, papéis sociais de gênero tradicionais, numa tentativa, nem sempre consciente, de assumir o poder sobre o seu próprio corpo, historicamente subordinado ao papel de mãe em potencial. (MINELLA, 1998). Diversos estudos demonstram que a cultura patriarcal, somada à influência dos meios de comunicação, continua operando, a fim de fazer com que recaiam principalmente sobre a mulher as responsabilidades, tanto pela criação dos filhos e manutenção da casa, quanto pelos cuidados com a contracepção, independentemente do fato de que ela pode estar trabalhando, também, fora de casa. Ao mesmo tempo, essa cultura força a mulher a escolher a esterilização, que se apresenta para ela como o método “menos conspícuo, mais garantido e menos dependente da cooperação masculina” (BARROSO, 1984, p. 174), tentando-se garantir, dessa forma, para o casal, além do controle sobre os nascimentos, a segurança, a liberdade e o prazer. Entre os fatores que determinam a “escolha” pela laqueadura tubária como método contraceptivo, a literatura aponta a ausência de claras políticas populacionais, além do financiamento insuficiente do governo ao sistema de saúde, que, em conseqüência, tem dificuldades de implantação dos programas de 50 planejamento familiar e de acesso aos serviços, acrecentando-se, assim, a escassez de oferta das opções contraceptivas. Nesse contexto, segundo Hita (2000, p.10), a esterilização parece operar no imaginário das mulheres como a solução ideal para resolver problemas com a saúde e a dificuldade com os métodos contraceptivos, além de deixar para algumas o agradável legado da descoberta ou conquista de uma sexualidade com mais prazer e gozo. O principal problema da esterilização cirúrgica feminina, especialmente quando realizada precocemente e sem orientação apropriada, é a possibilidade de arrependimento, que pode ocorrer anos mais tarde, quando a mulher experimenta mudanças familiares, sociais e/ou econômicas. Estudos nacionais realizados para determinar o grau de satisfação das mulheres com o método mostraram que 7,4% a 9,3% das mulheres tinham algum grau de insatisfação ou estavam totalmente insatisfeitas, enquanto o arrependimento variou de 13,6% a 17,0%. (VIEIRA, 1998; OSIS et al., 1999). Muitos fatores influenciam o arrependimento das mulheres, como a idade precoce na época da esterilização, a morte de filhos, a separação e um novo casamento, a pressão ou influência no processo de decisão. (HARDY et al., 1993; VIEIRA, 1998). Devido ao arrependimento, algumas mulheres vão efetivamente tentar algum procedimento que lhes permita uma nova gravidez. As opções são a cirurgia para restauração da permeabilidade tubária ou técnicas de fertilidade assistida, que são procedimentos caros, invasivos e nem sempre com boa margem de sucesso garantido, podendo ocasionar grande desgaste emocional para a mulher. (ADES, 1997). 51 A recanalização tubária é uma cirurgia e, como todo procedimento dessa natureza, envolve riscos. Além disso, para ser realizada, a mulher é submetida a exames como histerossalpingografia, videolaparoscopia e ultrasonografia transvaginal, para se avaliarem as condições das tubas uterinas, do útero e dos ovários; como também, é obrigatório, para o companheiro, o espermograma, para a certificação da sua fertilidade. Portanto, se for para se reverter uma ligadura tubária, tudo isso tem que ser levado em consideração e pensado com cuidado. (MAEDA, 2002). Entretanto, deve-se levar em consideração que, nem sempre, a permeabilidade tubária conseguida na cirurgia é sinal de retorno de sua função, pois muitas mulheres não engravidam, mesmo tendo recuperado a permeabilidade das trompas. Quando as trompas reconstituídas não recuperam sua função, a alternativa de tratamento seria a reprodução assistida por meio da técnica de fertilização in vitro, disponível em vários centros. Porém, tanto o procedimento quanto os medicamentos utilizados são caros, o que torna inviável e limitante esse tratamento, para a maioria das mulheres em nosso meio. (FERNANDES et al., 2001). Estudo realizado por Petta et al. (2000) demonstra que, metade das solicitantes de reversão da ligadura de trompas abandonaram o serviço, após a primeira consulta, após terem sido orientadas sobre os procedimentos necessários para a reversão. Entre as que realizaram a laparoscopia, metade delas tinha tubas em condições cirúrgicas para realizar a reversão e, do total de mulheres que consultou o serviço, solicitando reversão, apenas 3,3% conseguiu uma nova gravidez. 52 Um ângulo perverso da questão é que as conseqüências mais graves são sentidas pelas mulheres das camadas menos favorecidas da população que, sem acesso aos diversos métodos reversíveis, encontram, na esterilização (habitualmente associada a uma cesariana desnecessária), a saída para evitarem uma gravidez indesejada. Apesar de, no Brasil, dispor-se da recanalização tubária, se uma mulher de baixa renda deseja voltar a engravidar porque contraiu um novo matrimônio, ou devido à morte de um filho, ela não encontra, habitualmente, instituições públicas que disponham de Serviço de Reprodução Humana capaz de possibilitar-lhe o direito de ter um filho. (LOPES, 2001). Diante da existência das dificuldades apontadas com relação à cirurgia de recanalização tubária, nós, profissionais de saúde, e em particular os ligados à saúde da mulher, devemos assumir o compromisso de refletir sobre a qualidade de vida dessas mulheres, arrependidas com a esterilização cirúrgica, bem como sobre sua trajetória rumo a uma reversão com poucas probabilidades de resultados efetivos. RECANALIZAÇÃO TUBÁRIA: O ESTADO DA ARTE Nos dias atuais, a principal técnica utilizada para restauração da permeabilidade tubária é a microcirurgia de recanalização das tubas, que é um procedimento caro, invasivo e não disponibilizado na maioria dos hospitais públicos, pois, para a sua realização, são necessários instrumentais e equipamentos adequados e profissionais capacitados. 53 A cirurgia de reversão da laqueadura tubária, que pode ser denominada de reanastomose, anastomose ou recanalização das tubas, consiste em uma técnica microcirúrgica para desobstruir ou reconstruir as trompas de Falópio, permitindo, com isso, a fertilidade da cliente. Essa cirurgia pode ser uma opção para as mulheres que, por várias razões, desejam ter um filho. Segundo Maeda (2002), a cirurgia tem maior porcentagem de sucesso, se realizada até cinco anos após a esterilização, o que não quer dizer que, depois disso, não possa haver êxito, porém, será menor. O índice de gravidez com a microcirurgia tubária pós-laqueadura varia de acordo com o tipo de esterilização, o local da reanastomose, as condições anátomofuncionais das tubas e a idade da mulher. (HALBE, 1994; PEREIRA, 2001). O grau de reversibilidade varia de acordo com a lesão que a técnica utilizada na laqueadura causou. A primeira técnica utilizada para realização da laqueadura tubária laparoscópica foi a realizada por um cautério monopolar, que consiste na preensão da tuba uterina na porção a ser interrompida com uma pinça de coagulação monopolar, em que o cirurgião aciona um gerador de baixa voltagem, com picos máximos de 600V e potência máxima de 100W. O procedimento estará completo, quando a área atingida, aproximadamente um centímetro de extensão da tuba, apresentar cor esbranquiçada. Ressalta-se que a corrente monopolar gera destruição tecidual de até 5 centímetros de extensão, dificultando eventual recanalização da tuba, em caso de arrependimento da cliente. (FREITAS, 2002). Nos anos 1970, com a finalidade de diminuir a morbimortalidade da técnica, utilizando-se corrente monopolar, foram desenvolvidas pinças com duas hastes 54 paralelas, uma agindo como condutor e a outra como retorno da corrente, permitindo que a corrente elétrica ficasse restrita aos tecidos compreendidos entre as mesmas. Tais pinças são denominadas cautério bipolar e, atualmente, é o método mais utilizado para laqueadura tubária laparoscópica. A potência utilizada nessa técnica é de 40V a 60W, durante cerca de vinte segundos, em uma extensão de 2 centímetros da tuba, e o ponto final do procedimento é o registro de corrente marcando zero. A reversibilidade, nesse caso, é mais facilmente realizada, quando comparada à técnica anterior, pela menor destruição tecidual verificada. (FREITAS, 2002). Outra técnica para realização da laqueadura tubária consiste na aplicação de um clipe, feito de material elástico cirúrgico de aço inoxidável banhado a ouro. A aplicação ocorre na porção ístmica das tubas uterinas: com o auxílio de um aplicador, apreendem-se as trompas e fecha-se o clipe. Recomenda-se a aplicação de um segundo clipe, para maior segurança. O fato da não utilização da corrente elétrica nesse procedimento contribui para a redução de complicações, além de, ocasionar menor lesão tubária, proporcionando melhores índices de recanalização, nas cirurgias de reversão em clientes arrependidas. (FREITAS, 2002). A técnica com a utilização do anel de silastic consiste em apreender a tuba em 2cm dos cornos uterinos, com um ou dois anéis. Após se repetir o procedimento do outro lado, injeta-se corante por uma cânula, para se confirmar a oclusão bilateral das tubas. Nesse caso, a reversibilidade é dificultada, devido à extensa destruição tecidual das tubas uterinas. (FREITAS, 2002). A esterilização histeroscópica consiste na introdução de silicone líquido nas tubas que, posteriormente, se solidifica e obstrui o lúmen tubário. Apesar de seu custo reduzido e de dispensar anestesia, esse procedimento permanece limitado, 55 pois são necessários vários estudos para avaliação dessa técnica, antes da sua incorporação na prática clínica dos ginecologistas. (FREITAS, 2002). Atualmente, a técnica Pomeroy é a mais utilizada, por ser um procedimento simples, rápido e eficaz para se obter a esterilização por via abdominal. (RIBEIRO, 2004). Nessa técnica as tubas são pinçadas e elevadas, para serem amarradas por fios inabsorvíveis e, logo após, são ressecadas. As extremidades tubárias cortadas se ocluirão por fibrose e serão cobertas por tecido peritonial. Alguns cirurgiões esmagam as extremidades cortadas das tubas, outros cauterizam os cotos de cada tuba. A reanastomose, após esse método, apresenta um índice mais elevado de gestações do que após as técnicas que utilizam a eletrocauterização. (RIVOIRE et al., 2003). Quando uma mulher procura um serviço de infertilidade, desejando uma reversão da laqueadura, ela é orientada sobre a necessidade de alguns exames prévios para serem avaliadas as condições das tubas uterinas, como também é informada que o companheiro deve submeter-se ao espermograma, para a confirmação da sua fertilidade. Tradicionalmente, é solicitada a histerossalpingografia (HSG), que é um exame utilizado para avaliação da cavidade uterina e permeabilidade tubária, como também para estimar o comprimento das tubas, o que irá determinar a possibilidade de reanastomose. Os principais inconvenientes da HSG são: a irradiação e o contraste iodado, que implicam alguns riscos para a cliente, como infecção intrauterina e abdominal. (HALBE, 1994; FRANCO et al., 2000; DINIZ, 2001; FERNANDES et al., 2001). 56 Atualmente, é indispensável a realização da laparoscopia no diagnóstico de infertilidade, para avaliação da permeabilidade tubária, pois permite visualizar diretamente as anormalidades morfológicas das trompas. (FRANCO et al., 2000; FERNANDES et al., 2001). Outro exame essencial é a ultra-sonografia transvaginal, para avaliação de qualquer alteração na cavidade pélvica, assim como a histeroscopia, um excelente método para avaliação da cavidade uterina e do canal cervical, na investigação de clientes inférteis. Esse exame é realizado por meio de aparelhos chamados histeroscópios, que permitem a visualização da cavidade uterina, com toda a nitidez e riqueza de detalhes, conseguindo-se diagnóstico precoce de enfermidades benignas e malignas. Todo o procedimento é gravado em vídeo e acompanhado por meio de fotos em cores para documentação. (FRANCO et al., 2000). Apesar de a histeroscopia ser um excelente método, o elevado custo do equipamento e a falta de profissionais especializados dificultam a realização desse exame pela população menos favorecida que, na maioria das vezes, tem de realizálo em consultórios particulares, pois somente uma pequena percentagem de ginecologistas estão aptos a executá-lo e a maioria dos hospitais públicos não dispõem dele. Também é necessário que o companheiro se submeta ao espermograma, pois a existência de alterações importantes no liquido seminal pode contra-indicar a cirurgia de recanalização. Esse exame é realizado somente em laboratórios capacitados. A amostra do líquido seminal pode ser colhida por coito interrompido ou por masturbação direta em um recipiente de vidro, após uma abstinência sexual mínima de três dias. O paciente deve ser orientado a permanecer pelo menos três 57 meses sem tomar hormônio ou medicamento tóxico antes do exame. (JEFFCOATE, 1979; DONADIO, 1986; FERNANDES et al., 2002). É analisado, nesse exame, o volume do sêmen, que pode variar de 2 a 5 ml; o número de espermatozóides, considerado normal entre 20 e 60 milhões por ml; a mobilidade quando 70% dos espermatozóides atravessam o campo microscópico rapidamente; a vitalidade, considerada adequada quando se encontram, pelo menos, 60% dos espermatozóides vivos, após três ou quatro horas da colheita; a morfologia, considerada normal, quando 80% ou mais dos espermatozóides têm forma ovóide. (JEFFCOATE, 1979; DONADIO, 1986). Uma vez comprovada a possibilidade de reversão, a microcirurgia de recanalização pode ser realizada por minilaparotomia ou videolaparoscopia, dependendo da experiência do cirurgião e dos instrumentais e equipamentos disponíveis no hospital. A minilaparotomia é utilizada como procedimento padrão nas cirurgias de reversão tubária. É realizada por uma incisão transversal na sínfise púbica, de 4 a 6 centímetros, sendo necessária a utilização de um manipulador uterino para uma melhor exteriorização do útero e anexos. A anestesia utilizada é local, podendo ser raqui ou peridural. Requer, no máximo, dois dias de hospitalização e a recuperação demora cerca de cinco dias. Sua maior limitação está relacionada com a dificuldade de identificação dos órgãos pélvicos, em casos de obesidade e de aderências peritoniais, quando se pode necessitar de alongamento da incisão. (MENEGOCI et al., 2003). Antes da minilaparotomia, é necessária a realização de uma laparoscopia prévia, como um prognóstico da futura recanalização. Ela é utilizada para a 58 certificação do tamanho da tuba, pois a cirurgia de reversão só será realizada se for comprovado que existem, pelo menos, cinco centímetros de tuba em boas condições aparentes. Isso se deve ao fato de que, para que haja sucesso na gestação, a tuba deve ter, após o reparo, pelo menos quatro centímetros de comprimento e fímbrias intactas. A possibilidade de gravidez é pequena, se a extensão da tuba reconstruída for menor ou igual a três centímetros. (MENEGOCI et al., 2003; BARJOT et al., 1999; RIBEIRO et al., 2002, 2004). O procedimento cirúrgico por videolaparoscopia é realizado por uma pequena incisão transversal na cavidade abdominal, na margem inferior do umbigo, com um endoscópio a ser introduzido na incisão, para uma melhor visualização no momento de conectar as trompas. São usados fios de sutura extremamente delicados para unir as partes. Essa cirurgia geralmente é realizada dentro de duas a três horas, com anestesia geral. Após a cirurgia, prescreve-se medicação para dor e, normalmente, a cliente tem alta no mesmo dia, retornando às suas atividades normais, dentro de duas semanas. (POLDEN; MANTLE, 1997). Os riscos dessa cirurgia incluem um potencial de complicações anestésicas e infecção. Após a reversão de laqueadura tubária, o risco de uma gestação ectópica aumenta de um em 100 para cinco em 100 gestações, o que significa que a cada 100 gestações, cinco poderão ser ectópicas. (SOUZA, 2004). Após a cirurgia de reanastomose, a mulher é orientada para usar algum método contraceptivo, durante 60 dias e, após três meses da cirurgia, é solicitada uma histerossalpingografia, para avaliar a permeabilidade das tubas, uma vez que esse é o tempo necessário para ocorrer a absorção do fio utilizado, que varia de 90 a 120 dias. (CUNHA et al., 1998; RIBEIRO et al., 2004). 59 O sucesso da cirurgia de recanalização depende de vários fatores, como o comprimento e a vitalidade dos segmentos das trompas a serem unidos; a habilidade do cirurgião; a idade da mulher no momento da cirurgia para reversão; a técnica utilizada para laqueadura tubária; a quantidade de tecido de cicatrização, nas trompas e a qualidade do espermograma do parceiro. É também imprescindível enfatizar-se que muitas mulheres não conseguem realizar o desejo de uma nova gestação, após terem-se submetido à cirurgia de reversão, pois as trompas reconstituídas muitas vezes não recuperam a sua função. (FERNANDES et al., 2001). A recanalização das trompas garante uma chance de gestação de 75% a 80%, caso as trompas da mulher sejam saudáveis (SOUSA, 2004). Tanto a taxa de sucesso como o tempo necessário para se conseguir a gestação após a cirurgia são influenciados pelos fatores acima descritos. Geralmente, a gestação ocorre dentro do primeiro ano após a cirurgia. Fernandes et al. (2002) realizaram um estudo retrospectivo sobre as causas do arrependimento de mulheres laqueadas que estavam em busca da cirurgia de reversão e, nos resultados desse estudo, foi observado que, das 147 mulheres que procuraram o serviço de esterilidade, 73,4% tinham entre 26 e 35 anos, na época da primeira consulta e cerca de 60% das mulheres tinham até 25 anos, no momento da laqueadura. Durante o acompanhamento no serviço, 54,4% desistiram do tratamento após terem sido informadas sobre os procedimentos a que seriam submetidas; 15% foram desaconselhadas a seguir na investigação, por inúmeros motivos, como, parceiros oligospérmicos, falência ovariana, dentre outros. De um total de 147, 60 somente 32 mulheres (21%) foram submetidas à reanastomose tubária, das quais quatorze (9,5%) conseguiram engravidar, e nove (6,1%) tiveram gestação a termo. Na pesquisa desenvolvida por Bahamondes et al. (1992) sobre o significado recente do aumento do número de solicitantes de reversão da laqueadura, foi constatado que quase 10% das mulheres foram laqueadas com menos de 20 anos e 89,4% foram operadas com menos de 30 anos. Em relação ao número de filhos vivos, 2,5% só tinham um filho vivo no momento da cirurgia e 42,8% só tinham dois. Quanto às razões que as levaram à decisão pela reversão, Fernandes et al. (2002), em estudo retrospectivo, encontraram que 92,7% das mulheres procuram o tratamento após iniciar um novo relacionamento. Esses resultados corroboram os obtidos por Ades (1997), em que essa situação foi observada em 90,8% das mulheres pesquisadas. Em estudo realizado por Barbosa et al. (1997), com 40 pacientes submetidas à laparoscopia diagnóstica, contataram que, em 16 casos (40%), a anastomose tubária foi contra-indicada por fatores como aderências e endometriose, diagnosticadas durante a laparoscopia. Dessa forma, o estudo confirmou a importância da utilização dessa técnica previamente, para poupar que a paciente seja submetida a uma laparotomia convencional, sem a mínima chance da recuperação da permeabilidade tubária. O fato de a possibilidade da reversão ser possível, mas não absolutamente certa, reforça a necessidade de ponderação antes de se fazer laqueadura. Além disso, as filas para se fazer a operação de recanalização, pelo SUS, são bastante longas, uma vez que uma minoria de hospitais públicos, como já foi afirmado, não 61 realizam esse tipo de cirurgia, seja por falta de recursos financeiros ou ausência de profissionais capacitados para o procedimento. A esterilização cirúrgica, portanto, deverá ser contra-indicada em casais ou indivíduos que não estejam suficientemente informados sobre o procedimento ou suas possíveis repercussões sobre a função ovariana, bem como sobre possíveis respostas psicológicas resultantes da perda definitiva da capacidade reprodutora. Reconhecer as possíveis conseqüências da ligadura tubária é fundamental para se identificarem os casos em que o risco de insatisfação psicológica é maior. Acreditase que, nesses casos, a recomendação de outros procedimentos, postergando a decisão de praticar a ligadura até melhor avaliação, é a conduta mais adequada. Isso se aplica, particularmente, à solicitação de esterilização, no fim de uma gravidez, durante e logo após um parto ou um aborto, quando as emoções estão muito mobilizadas. (VIGORITO, 1990). Nesse caso, o processo de informação e aconselhamento, que deve preceder a decisão, precisa deixar bem claro que se trata de um método definitivo, com chances de reversão muito pequenas, pois demanda procedimentos cirúrgicos altamente especializados e de custo financeiro elevado, não acessível a todas as mulheres. Logo, é um método a ser evitado quando as probabilidades de arrependimento são altas. (HARDY et al., 1993; VIGORITO, 1990). Costumam estar associados ao arrependimento fatores demográficos, como idade e paridade; fatores sociais, como mortalidade infantil, índices de divórcio, qualidade dos serviços de planejamento familiar; fatores pessoais. Esses últimos incluem algumas características individuais que influenciam o processo de decisão, como a idade à esterilização, o número e o sexo dos filhos vivos e a qualidade da 62 relação conjugal. (HARDY et al., 1993; VIEIRA, 1998; REGGIANI et al., 2000; PETTA et al., 2000). Segundo Passos (1994), muitos casais não recebem qualquer preparação para a cirurgia e, em muitos casos, ocorrem problemas sérios, devido à carência de explicações. Na verdade, muitos não estão preparados para o fato concreto de não poderem procriar: Uma coisa é não querer ter mais filhos, outra coisa é não poder. Em algumas situações, o casal passa a desejar outro filho e lança todas as esperanças na cirurgia de recanalização tubária. No entanto, mesmo em mãos de cirurgiões experientes, a taxa de gravidez normal após a reconstituição das trompas não ultrapassa os 50%. Desse modo, entende-se que o aconselhamento cuidadoso dos casais sobre a irreversibilidade da esterilização é essencial, particularmente em se tratando de clientes jovens. Além disso, os profissionais de saúde que acompanham as mulheres em idade reprodutiva devem estimular a utilização de métodos contraceptivos reversíveis e com baixos efeitos colaterais, o que certamente possibilitará diminuição do número de mulheres arrependidas nos ambulatórios de infertilidade. Mediante a problemática apresentada, as seguintes questões norteiam este estudo: Que aspectos, presentes no contexto de vida das mulheres, motivam a decisão de realizarem a esterilização cirúrgica? Que elementos influenciam a decisão dessas mulheres de recorrerem, posteriormente, à cirurgia de recanalização tubária? Quais os desafios enfrentados por essas mulheres, na tentativa de restaurar sua permeabilidade tubária? 63 2. OBJETIVOS 64 • Identificar que aspectos, presentes no contexto de vida das mulheres, motivam a decisão de realizarem a esterilização cirúrgica. • Averiguar que elementos influenciam a decisão dessas mulheres de recorrerem à cirurgia de recanalização tubária e quais os desafios vivenciados por elas nesse processo. 65 3. METODOLOGIA 66 NATUREZA DO ESTUDO Trata-se de um estudo descritivo, em que se utilizou a abordagem qualitativa do estudo de caso, tipo de pesquisa que tem como objetivo desenvolver, esclarecer e modificar conceitos e idéias preestabelecidos, visando a formular problemas mais precisos ou hipóteses para estudos posteriores, ou proporcionar uma visão geral, do tipo aproximativa, acerca de determinado problema. (GIL, 1995). LOCAL DE PESQUISA A pesquisa foi realizada no Ambulatório de Ginecologia, Serviço de Planejamento Familiar, do Hospital Universitário Lauro Wanderley (HULW), situado no Campus I da Universidade Federal da Paraíba, na cidade de João Pessoa-PB. Por se tratar de um hospital escola de médio porte, o HULW é uma referência em diversas especialidades, especialmente na cirurgia de recanalização tubária, sendo o único hospital público do Estado que a realiza. 67 Para o atendimento às mulheres, o Serviço de Planejamento Familiar o setor dispõe de uma equipe composta por um médico, uma enfermeira e uma auxiliar de enfermagem. POPULAÇÃO E AMOSTRA Participaram do estudo dezesseis mulheres que foram submetidas à esterilização cirúrgica no passado e que compareceram ao Ambulatório de Ginecologia do HULW, na tentativa de conseguirem uma cirurgia de reversão da laqueadura tubária. O método de amostragem foi assistemático, utilizando-se a amostra por conveniência. Foram considerados os aspectos éticos no que concerne à pesquisa envolvendo seres humanos, preconizados na Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde – CNS, no que diz respeito à leitura e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (Apêndice 1); ao tratamento das participantes com dignidade; ao respeito à sua autonomia; à garantia do sigilo, da liberdade de desistência e do acesso ao material empírico. Foram incluídas no estudo, mulheres da demanda espontânea do Ambulatório de Ginecologia do HULW, que preencheram os seguintes critérios: a) revelar desejo de realizar a recanalização tubária; b) dispor-se, voluntariamente, a assinar o termo de consentimento livre e esclarecido para participar do estudo; c) aceitar a gravação da entrevista. 68 COLETA DE DADOS Os dados foram obtidos através da técnica de entrevista individual, utilizando-se como instrumento um roteiro semi-estruturado (Apêndice 2), composto por questões abertas. As entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra. Além de dados sociodemográficos, as questões elaboradas buscaram verificar os fatores que motivaram a decisão das mulheres de realizar a esterilização cirúrgica, bem como os possíveis elementos que influenciaram sua decisão de recorrer à cirurgia de recanalização tubária. As entrevistas foram realizadas no período de três meses (março a maio de 2005), no próprio Serviço de Planejamento Familiar do HULW, em horário estabelecido pelas participantes do estudo. Buscando uma maior fidedignidade dos dados, foi solicitada a utilização do sistema de gravação em fita cassete. Cumpre ressaltar que, durante a entrevista, a pesquisadora manteve o gravador em local estratégico para não constranger as participantes. Após cada entrevista, foi dada às participantes a oportunidade de escutar o que foi gravado, para que decidissem se desejavam alterar algum conteúdo da fala. Nenhuma das mulheres solicitou alteração em seus discursos, não havendo, também, desistência de participação de nenhuma delas. ANÁLISE DOS DADOS Os dados das entrevistas foram analisados pela técnica de análise de discurso proposta por Fiorin (1998), para quem o texto é um objeto integralmente 69 lingüístico e histórico. Lingüístico, porque é formado por uma estrutura interna, disposto através de regras gramaticais que permitem sua coerência num todo organizado de sentido. O texto é histórico porque seu sentido é dado por suas relações com o exterior, com as concepções que existem na sociedade da época em que ele foi produzido. (FIORIN, 1999). Para Fiorin (1999), a técnica de análise de discurso é indicada nas pesquisas qualitativas, pelas possibilidades de relacionamento dos materiais que envolvem valores, juízos necessários e preferíveis como argumentos, ou meios que conduzem a um fazer crer relacionado com a totalidade do contexto sócio-histórico, pois o indivíduo não pensa e fala o que quer, mas o que a realidade impõe que ele pense e fale. Através do processo de análise dos dados, por essa técnica, busca-se identificar, em um texto, o seu nível mais abstrato ou temático, o que possibilita o reconhecimento da diferença entre aparência e essência. A identificação dos temas elucida valores, crenças, anseios, expectativas, que revelam a visão de mundo do enunciador. Desse modo, o texto pode ser compreendido como um tecido, no qual se procura a organização de seus fios, ou seja, o arranjo que lhes confere significado. (FIORIN, 1999). O primeiro momento da fase de análise do material empírico deste estudo foi a da organização desse material, quando foram realizadas as transcrições das entrevistas, a impressão e a leitura dos textos. O segundo momento foi o de re-leitura dos textos e identificação dos temas pertinentes às questões correspondentes. Em seguida, os dados foram agrupados, 70 segundo os elementos significativos (temas) que se somavam ou se confirmavam num mesmo plano de significado. Posteriormente, os textos foram decompostos e organizados em blocos de significados para permitir a construção das categorias empíricas de análise. Em todo o processo de análise e discussão, o material empírico foi relacionado com a literatura pertinente para respaldar a discussão. Neste estudo, o olhar analítico sobre os temas convergentes, organizados em blocos de significação, levou-nos a construir as seguintes categorias empíricas: • A necessidade de controle da fecundidade; • A decisão pela laqueadura tubária; • O arrependimento e a busca pela reversão da laqueadura tubária. Essas categorias, ao serem analisadas, mostraram especificidades temáticas, apontando para a dinâmica do contexto da laqueadura tubária, os motivos para o arrependimento e as possíveis razões para a busca da recanalização, dando sentido à existência de um ciclo de medicalização do corpo feminino, tão eficaz que, quase sempre, não se conclui, mesmo quando a reversão da laqueadura tubária é realizada. 71 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO 72 Esse estudo foi possível, graças à colaboração de dezesseis mulheres, dentre as quais, no momento da entrevista, onze já estavam no processo de atendimento no serviço, há pelo menos um ano e cinco aguardavam a primeira consulta. No grupo das que já estavam inseridas no processo, duas já haviam realizado a cirurgia de reversão – uma havia tido uma gravidez ectópica e a outra ainda não havia conseguido engravidar, mesmo já havendo decorrido três anos após a recanalização tubária. Quanto às nove restantes, uma estava aguardando resultado dos exames realizados; quatro tiveram a cirurgia de reversão contraindicada, por razões como oligospermia, trompas encurtadas e sobrepeso e quatro aguardavam a realização da cirurgia. Ressalte-se que o tempo de espera para a cirurgia dura, em média, um ano, pois a fila de espera é muito extensa e, no município de João Pessoa – PB, só há um hospital público que realiza essa cirurgia pelo SUS. Embora não se disponha de dados concretos, é possível afirmar-se que a dificuldade de acesso a serviços que realizam a cirurgia de reversão da laqueadura tubária não é específica de mulheres residentes na Paraíba, ou no município de João Pessoa – PB. Possivelmente, essa é uma situação comum no âmbito nacional. 73 A idade das participantes do estudo variou de 22 a 39 anos, no momento da entrevista e, por ocasião da laqueadura, variou de 16 a 29 anos. Predominaram mulheres casadas ou em união consensual estável, com novo companheiro (n= 14). Das dezesseis participantes, onze não exerciam ocupação remunerada e doze possuíam escolaridade igual ou inferior ao primário incompleto. Os resultados a seguir representam uma aproximação dos desafios que são vivenciados pelas mulheres quando, tendo iniciado a vida sexual ativa, percebem a necessidade de controlar sua fecundidade e, dadas as circunstâncias de vida, decidem realizar a laqueadura tubária. Conforme será descrito, os desafios assumem caráter mais dramático ainda para aquelas que, por razões, as mais diversas, dizem-se arrependidas e retornam aos serviços de saúde em busca da cirurgia de recanalização tubária, sem nenhuma garantia, seja de que a cirurgia será possível, ou de que o sonho de engravidar novamente se concretizará. A NECESSIDADE DE CONTROLE DA FECUNDIDADE Foram citados, nos depoimentos de algumas mulheres, problemas conjugais decorrentes da presença de violência contra elas e os filhos, abuso do álcool ou outros entorpecentes, infidelidade e precário apoio financeiro para a satisfação das necessidades básicas da família. Esse conjunto de fatores foram apontados por algumas das participantes deste estudo como determinantes para realizarem a esterilização cirúrgica. 74 ... O relacionamento anterior era ruim, porque ele era uma pessoa muito ruim, violento. Ele que me levou a fazer essa ligação. Ele brigava comigo, me ameaçava com ponta de faca, foice, bebia muito, era mulherengo, era muito ciumento... (E-04) ... Fui ligar porque meu marido era muito ruim, era ignorante, batia muito em mim e nos meninos e também por causa da situação financeira, aí eu resolvi e liguei... (E-03) ... O meu relacionamento com o meu outro parceiro era impossível, terrível, porque ele era mulherengo, gostava de beber, me batia muito, gostava de sair muito, entendeu? E era muito sofrimento pra ter mais filhos com ele. Foi tanto, que ele constituiu outra família. Nos nove anos que eu passei casada com ele, foi nove anos de sofrimento, então me levou a fazer a ligação... (E-07) ... O meu relacionamento com o companheiro anterior era horrível porque ele judiava comigo, me batia, usava droga (maconha), aí eu cheguei à conclusão que era melhor a gente se separar e eu ligar... (E-13) Em pesquisa semelhante, Vieira (1994) também encontrou as dificuldades conjugais como um dos principais motivos apontados pelas entrevistadas para terem-se submetido à operação, em especial, o abuso de bebidas alcoólicas pelo marido. Os resultados do estudo que realizamos, como pode ser deduzido dos exemplos que incluímos, corroboram os obtidos pela autora citada. Os conflitos conjugais são tidos, em alguns estudos sobre o processo de decisão da esterilização, como elementos que predispõem a futuros arrependimentos (HITA, 2000; REGGIANI, 2000). No nosso estudo, é justamente este o principal motivo que é relatado pelas mulheres para evitar a vinda de novos filhos e de decisão pela esterilização. 75 Algumas mulheres entrevistadas relataram, como motivo para se submeterem à esterilização cirúrgica, a influência ou imposição de familiares, dentre os quais se destaca a mãe. ... Quem me influenciou a fazer a ligação foi minha mãe e minha vó. Aí, depois que eu raciocinei direitinho, assim, quando eu me separei, comecei a ver o que eu tinha feito, porque eu era muito nova e poderia encontrar outra pessoa, como encontrei... (E-05) ... Fiz a laqueadura por influência da família e porque minha mãe tinha medo de me encher de filhos muito nova... (E-06) ... O que me levou mais a tomar essa atitude não foi nem por mim. Minha mãe que tomou a frente porque eu era de menor, na época. Minha mãe tomou a frente de tudo, praticamente comprou o médico. Foi ela quem resolveu tudo, contou a minha situação: ele era desempregado e eu vivia dependendo de meu pai, aí por eu ser dependente de meu pai e da minha mãe... (E-09) ... Ficava uma cunhada minha, as pessoas, dizendo: Liga. Conselho das pessoas mesmo. Foi tolice minha. Não pensei e fui pelo conselho dos outros. Então eu liguei mais por influência das pessoas, porque às vezes as pessoas vêm conversar, têm um filho assim ou dois, e liga e fica influenciando a pessoa a fazer a mesma coisa... (E-15) Os depoimentos acima parecem indicar que as mulheres não tiveram escolha ao submeteram-se à laqueadura tubária. A esterilização passou a ser uma passagem obrigatória na vida dessas mulheres, devido à imposição familiar. Entretanto, a aceitação de um método tão definitivo leva essas mulheres ao encerramento da vida reprodutiva. Em estudo semelhante, realizado por Costa et al. (1996), o principal motivo apresentado pelas mulheres para se submeterem à laqueadura tubária foi a 76 influência de familiares em seu processo de decisão. De acordo com Vieira (1998), algumas mulheres se submetem à esterilização, por essa escolha ser feita sob pressão. Nos depoimentos das participantes do estudo, a interferência do uso do anticoncepcional oral no cotidiano dessas mulheres tem vários desdobramentos importantes no processo de optarem por uma esterilização cirúrgica. ... Às vezes eu pegava comprimido lá no posto de saúde, eu tomava e passava o dia todinho vomitando, e tonta, em cima da cama... (E03) ... Antes de fazer a laqueadura, passei um tempo usando comprimido, mas eu não me sentia bem porque sentia muito enjôo, dor de cabeça... (E-01) ... Assim eu até tomei comprimido, me preveni mais, aí, quando eu vi, eu já tava grávida da segunda, aí eu resolvi ligar... (E-08) As mulheres acima, aparentemente, tinham conhecimento apenas da pílula como opção contraceptiva. Entretanto, poucas sabiam dizer como o método age e, principalmente, como usá-la corretamente, por falta de acesso a informações claras e simples. Pode-se inferir, portanto, que grande parte das usuárias desse método não se sentem seguras, causando o uso, a priori, desconfiança e medo (SERRUYA, 1993). Neste estudo, algumas mulheres relataram que já haviam usado a pílula, mas a haviam abandonado, pelos efeitos colaterais. A ausência de informações e o acesso adequado a outros métodos leva muitas mulheres a decidirem pela laqueadura, porque vêem a pílula como única alternativa, que não a toleram ou não a aceitam, por diversos motivos. 77 Por outro lado, essas informações mostram que a laqueadura é feita sem se seguir a lei de planejamento familiar, que diz que nenhuma mulher pode ser esterilizada sem antes ter sido informada e sem ter tido acesso a todos os métodos existentes para regulação da fecundidade. Como mostra o estudo de Vieira (1998), a falta de alternativas contraceptivas leva as mulheres jovens à cirurgia devido a problemas com a pílula ou à falha na utilização do método. A gravidez indesejada por causa da falha do método provavelmente precipita a decisão pela esterilização. A necessidade da anticoncepção, claramente vivenciada pelas mulheres, contrapõe-se à angústia de não saberem como controlar efetivamente a sua fecundidade, em vista de insucessos freqüentes traduzidos no incômodo de suportar efeitos colaterais e, principalmente, em gravidezes indesejadas. O papel reprodutivo é socialmente imposto às mulheres, como se a responsabilidade fosse unicamente sua, de maneira que os insucessos nessa área acabam sendo atribuídos à sua incapacidade pessoal de controlá-lo. Nesse contexto, a laqueadura aparece como a melhor “opção” (OSIS et al., 1990; VIEIRA, 1999). Por ser realizada pelo médico, sua eficácia se legitima, para a sociedade e, ao mesmo tempo, absolve a mulher da “culpa” das possíveis falhas dos métodos anticoncepcionais, pois, se a cirurgia não obtém êxito, é culpa do médico (SERRUYA, 1993). Por outro lado, por ser um método permanente de contracepção, a esterilização pode ser vista como uma negação da mulher ao papel de reprodutora, negação relacionada com os papéis sociais de gênero, numa tentativa, nem sempre consciente, de assumir o poder sobre o seu próprio corpo, historicamente subordinado ao papel de mãe em potencial. (MINELLA, 1998). 78 O que se tem verificado na prática é que as mulheres brasileiras dos estratos sócio-econômicos mais desfavorecidos, como é o caso da amostra deste estudo, por não terem garantidos o direito e a liberdade de escolha entre todos os métodos que a sociedade moderna oferece em outros países socialmente mais avançados, enfrentam condições adversas para controlar sua fecundidade. (PINOTTI; FAÚNDES, 1988). A falta de orientação e acompanhamento médico adequado, os eventuais efeitos colaterais da pílula e as próprias dificuldades relacionadas com seu uso fazem com que, depois de algum tempo, muitas mulheres busquem outros métodos. Essa não é uma questão simples, pois alguns dos outros possíveis métodos não são facilmente disponíveis no Brasil, além de encontrarem resistência a seu uso. Essa situação ilustra que a falta de alternativas quanto à anticoncepção tem-se mostrado um aspecto determinante para a prática, em massa, da esterilização feminina no Brasil. Tudo indica, pois, que, com mais informação e acesso a outros métodos, menos mulheres escolheriam a laqueadura. (SOF, 1994). Cinco mulheres revelaram não haver utilizado nenhum método contraceptivo reversível, antes da laqueadura tubária, quase sempre por falta de orientação. ... Antes de fazer a ligação, nunca usei nada pra evitar, porque era muito nova na época, e quando fazia as consultas de pré-natal, ninguém nunca me orientou... (E-16) ... Nunca usei nada para evitar e nunca fui orientada durante o prénatal dos meninos sobre os métodos de evitar... (E-04) ... Nunca utilizei nenhum método de evitar filhos, porque nunca tive informações... (E-09) 79 Desse modo, em grande parte dos casos, a opção pela laqueadura tubária se faz pela ineficácia dos serviços de saúde de promover o uso de outros métodos anticoncepcionais, dificultando, para as mulheres, o controle de sua fecundidade e, não raramente, resultando em gestações indesejadas. Essa afirmativa é corroborada por estudos que demonstram que a forte prevalência de laqueadura tubária pode estar relacionada com a falta de informação e acesso das mulheres aos métodos anticoncepcionais reversíveis. (SERRUYA, 1993; BERQUÓ, 1993; SOF, 1994; VIEIRA, 1994; BAHAMONDES et al., 1992; CORREIA et al., 1998; VIEIRA, 1999). Esforços significativos devem ser feitos, no sentido de se enfatizar a coresponsabilidade masculina e promover o efetivo envolvimento dos homens com relação à paternidade responsável e ao comportamento sexual e reprodutivo, incluindo-se, aí, o uso de anticoncepção, em especial, quando se trata da prevenção de gestações não desejadas ou de alto risco. A DECISÃO PELA LAQUEADURA TUBÁRIA Para algumas mulheres participantes do estudo, a decisão pela esterilização foi determinada por partos operatórios anteriores. ... Fiz a ligação porque já tinha tido três partos cesárea e eu não podia ter filho normal... (E-16) ... Eu não poderia ter mais filhos, por causa das cesáreas anteriores... (E-06) 80 ... Porque eu não poderia ter mais filhos, devido a partos cesarianos anteriores... (E-02) Dentre as mulheres entrevistadas que tinham sido submetidas à cirurgia cesariana, em partos anteriores, poucas sabiam relatar as indicações do procedimento, o que não é surpreendente. Segundo matéria divulgada pelo próprio Conselho Federal de Medicina (1997), “de todas as cesáreas realizadas dentro do Sistema SUS, no período de dezembro de 1995 a janeiro de 1996, apenas 33% das AIHs apresentam diagnóstico para sua indicação.” Observou-se, em vários estudos, que a esterilização é realizada de forma clandestina, através de uma cesariana desnecessária, ou seja, sem nenhuma indicação obstétrica. (ADES, 1997; VIEIRA, 1998; SILVA, 2001). A esterilização realizada clandestinamente não propicia, à mulher que irá submeter-se ao procedimento, orientações e informações necessárias para evitar um arrependimento futuro. Sabe-se que o Brasil é considerado o país que detém as maiores taxas de operações cesarianas do mundo, fato que vem sendo apontado na literatura, há bastante tempo. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 1998), o Brasil apresentou, em 1997, um total de 40,5% de partos cesáreos. Quanto à Paraíba, estudo realizado pelo Cunhã Coletivo Feminista, em três maternidades da rede pública de saúde do município de João Pessoa, demonstrou que o percentual de cirurgias cesarianas variou entre 43,3% do total de procedimentos realizados em 1995 e 41% no primeiro semestre de 1996 (Cunhã, 1997). A despeito da diminuição, esses números continuam ultrapassando o 81 estabelecido como percentual máximo aceitável de partos cesarianos para os países do eixo sul, ou seja, entre 20 e 30%. Algumas participantes do estudo relataram que a esterilização foi realizada no período eleitoral, o que traz à tona a necessidade de discussão da esterilização cirúrgica das mulheres como “moeda de troca” por votos. ... A cirurgia foi arrumadinho... Foi num tempo de política, aí um candidato arrumou e pronto... (E-02) ... Eu consegui ligação no tempo de política, porque, na época, eu morava no interior, na casa da minha sogra. Aí fui lá, falei com o médico e ele fez a ligação pra ganhar voto... (E-12) ... Minha mãe falou com uma conhecida dela, que conhecia uns médicos que faz ligação no tempo de política, pra fazer a minha ligação... (E-13) A enorme popularidade da laqueadura tubária no Brasil é incontestável. Entretanto, o que se argumenta é que o procedimento é cada vez mais acessível, como parte de campanha eleitoral de candidatos a cargos eletivos. Os depoimentos acima confirmam o clientelismo político que se institui em períodos eleitorais e que afeta, em especial, as camadas de menor poder aquisitivo e socialmente desassistidas. Assim, vários autores afirmam que, para as mulheres com menor poder aquisitivo, políticos em períodos de campanha eleitoral são uma fonte de financiamento de esterilização, pois trocam o pagamento da cirurgia por votos. (HARDY, 1993; SOF; 1994; FAÚNDES et al., 1998; POTTER; CAETANO, 1998). 82 O ARREPENDIMENTO E A BUSCA PELA REVERSÃO DA LAQUEADURA TUBÁRIA Das dezesseis mulheres entrevistadas, quatorze relataram, como motivo do arrependimento pós-laqueadura, o desejo de ter filho com o novo companheiro, e, apenas uma, referiu morte de filho e, uma outra, o desejo de ter mais filhos. ... O arrependimento é porque eu e meu novo companheiro queremos ter um filho... (E-11) ... Eu me arrependi muito de ter feito a ligadura, porque eu arrumei outra pessoa e queria ter filho com ele... (E-04) ... Não melhorou em nada a minha vida ter feito a laqueadura, porque agora estou arrependida e quero engravidar... (E-06) ... Eu me arrependi porque, depois que fiz a ligação, meus filhos gêmeos morreram... (E-16) Uma grave conseqüência da esterilização é o arrependimento, que pode ser definido como “o sentimento de mágoa ou pesar por faltas ou erros cometidos” (BUENO, 1996). O arrependimento é um efeito indesejado e uma complicação séria da laqueadura tubária, já que a reversão dessa cirurgia é cara, muito especializada e não é acessível à maioria das mulheres. (VIEIRA, 1998). O arrependimento pode ser entendido como a sensação de que se gostaria de voltar atrás da decisão de ter-se submetido à laqueadura no passado. Os estudos que examinam as conseqüências da esterilização mostram que os fatores associados ao arrependimento podem ser demográficos, como a idade a esterilização, especialmente quando a idade é inferior a 30 anos, e a paridade; ou 83 sociais, como mortalidade infantil, índice de divórcio ou separações, qualidade dos serviços de planejamento familiar. Podem ser citados, também, como fatores que exercem algum tipo de influência sobre o arrependimento, o fato de a decisão da laqueadura não ter partido da mulher; o tempo de união conjugal inferior a 5 anos por ocasião da cirurgia; o número e o sexo dos filhos vivos e a qualidade da relação conjugal entre os membros do casal; a laqueadura ter sido decidida na hora do parto ou aborto; e quando há perda de um filho ou separação. (VIGORITO, 1990; COSTA et al., 1996; PERPÉTUO, 1996; HITA, 2000;). Neste estudo, um dos principais motivos alegados, pelas mulheres entrevistadas, para a busca da reversão da laqueadura tubária, foi o desejo de ter filho com um novo companheiro. ... O que me levou a procurar a recanalização foi porque eu arrumei outra pessoa e eu queria ter um filho dessa outra pessoa... (E-04) ... O que me levou a procurar a recanalização foi o desejo de ter um filho e porque o meu novo companheiro sempre pedia um filho. O meu sonho é dar um filho a meu marido... (E-03) ... O que me levou a procurar a recanalização foi que eu estava vivendo com um novo companheiro que não tem filhos e quero muito poder ter filhos com ele... (E-07) Observa-se que o motivo dessa insatisfação ocorre, principalmente, por causa de uma mudança no status familiar, decorrente da vontade de ter filho com o novo companheiro. Os dados desta pesquisa são semelhantes a estudos em que a procura da recanalização foi motivada por um novo relacionamento, independente 84 de o novo companheiro ter ou não filhos. (DIAS et al., 1998; REGGIANI et al., 2000; FERNANDES et al., 2002; BARBOSA, 1997). Outro motivo que foi alegado por uma das entrevistadas foi o desejo de ter outro filho com o mesmo companheiro da época da laqueadura, devido a uma maior segurança no relacionamento. ... É só a vontade mesmo de ter outro filho e também porque me sinto mais segura agora. Faz mais de vinte anos que vivo com ele e ele mudou muito... (E-01) Com relação à morte de filho, apenas uma entrevistada revelou esse motivo como razão para a busca da recanalização tubária, conforme está ilustrado no discurso seguinte. ... Porque eu não consegui superar a morte dos filhos gêmeos e eu quero muito ter outro filho... (E-16) Em diversos estudos identificados na literatura da área, a perda de um filho foi uma causa particularmente forte para a busca pela reversão da laqueadura tubária. (REGGIANI et al., 2000; RIBEIRO et al., 2002; BAHAMONDES et al., 1992). Nas últimas décadas, a recanalização tem sido realizada nas mulheres que manifestam arrependimento e interesse por novas gestações. Porém, alguns fatores podem impedir a reversão da laqueadura tubária. Neste estudo, os fatores que impediram a realização da recanalização, em quatro entrevistadas, foram: oligospermia, trompas encurtadas e sobrepeso. 85 ... Pelos meus exames eu já teria feito. Só que tá dando problema no exame do meu marido. Ele fez, aí o médico pediu para repetir, porque tá dando pouco espermatozóide no exame... (E-01) ... O médico me disse hoje que só posso fazer a cirurgia se perder 20KG... (E-04) ... Eu vim hoje e mostrei a ele os exames e ele disse que não valia pena fazer cirurgia porque não tinha chance de engravidar mais, porque as trompas foi cortada muito curta, aí não tem como recanalizar... (E-12) ... Mostrei o exame das trompas ao médico e ele disse que a minha está muito pequena e disse que não tem chance de recanalizar... (E-15) Em vários estudos, a recanalização foi contra-indicada após o parceiro ter sido submetido ao espermograma, e nele ter sido detectado que a quantidade e a qualidade do sêmen são inviáveis para que a mulher se submeta à reversão da laqueadura. (FERNANDES, et al., 2001). Por outro lado, um comprimento mínimo da trompa usualmente entre 4 e 6cm é requerido para o sucesso do procedimento cirúrgico (BARJOT et al., 1999; CUNHA, et al., 1998; RIBEIRO, et al., 2004) . Para se certificar do comprimento das trompas, é necessário que a mulher seja submetida à histerossalpingografia, que é um exame utilizado para avaliação da permeabilidade tubária, como também para se estimar o comprimento das tubas, o que poderá determinar ou não a realização da cirurgia de reversão. Em vários estudos, a recanalização tubária foi contra-indicada, após a mulher ter sido submetida ao exame de histerossalpingografia, pois ele detectou 86 cotos com tamanho insatisfatório para a cirurgia de reversão. (FERNANDES, et al., 2001; RIBEIRO, 2002; RIBEIRO, 2004). Analisados os discursos daquelas que relataram impedimento para a reversão da laqueadura tubária, foram percebidos sentimentos de decepção, frustração, tristeza, angústia, nervosismo e até conformação. ... Estou arrasada, muito triste também, porque não vou poder ter filho com essa pessoa que estou vivendo agora, mas vou ter que me conformar... (E-01) ... Estou muito triste e angustiada, fico com medo de não conseguir perder os 20 Kg, pois só posso fazer a cirurgia se perder peso... (E04) ... Eu estou me sentido péssima. É uma tristeza pra gente que quer ter filhos com o novo companheiro. Uma notícia dessa! Eu estou tão nervosa, sei lá,estou toda me tremendo... (CHORO) (E-12) ... Estou muito triste e nervosa. Fico com medo do meu companheiro me deixar (CHORO), mas vou pedir forças a Jesus pra me conformar... (E-15) Isso representa um alto potencial de distúrbios psicológicos causados pelo conflito entre o desejo e a impossibilidade de ter filhos. Para Ades (1997), o desgaste psicológico e as implicações psicológicas para a mulher e o casal, ao serem informados da impossibilidade da recanalização, são problemas de saúde de grande importância. Quanto às reações emocionais negativas, de acordo com a SOF (1994) e VALLENILLA; QUIJADA (1989), elas parecem ser mais freqüentes, em especial, quando a mulher iguala sua feminilidade à sua capacidade de procriar; quando não 87 consegue separar, sem conflitos, a atividade sexual da reprodução; quando a decisão sobre a esterilização foi tomada de modo apressado, com base em razões pouco consistentes ou transitórias, como instabilidade/desarmonia conjugal, experiências desagradáveis em partos anteriores, medo de perder a forma física com as gestações subseqüentes. Algumas mulheres que ainda não haviam concluído o processo, ao serem indagadas sobre como se sentiriam se a cirurgia de reversão não pudesse ser realizada por algum motivo, responderam, com maior freqüência: conformação, tristeza, ansiedade, angústia e decepção. Observou-se, também, a utilização de mecanismo de defesa, para reparar, no imaginário, a não possibilidade de reversão, a possibilidade de culpa ou de arrependimento. ... Se a cirurgia não puder ser realizada, eu vou ter que me conformar, porque a gente só tem aquilo que Deus quer... (E-04) ... Se não puder fazer a cirurgia, vou ficar pra baixo, muito triste, nem sei explicar... (E-16) ... Vou ficar ansiosa, vou ficar triste porque não vou poder ter mais filho, mais tudo bem, vou só ficar um pouquinho decepcionada... (E10) ... Eu acho que vou me sentir decepcionada se a cirurgia não puder ser realizada... (E-02) É imprescindível ressaltar que a impossibilidade da recanalização, por qualquer motivo, pode trazer inúmeras conseqüências para a mulher, como problemas conjugais e distúrbios emocionais (depressão, angústia, sentimento de 88 culpa e diminuição da auto-estima). Esses problemas podem exercer influência, tanto na vida social, quanto na afetiva. Quando perguntadas como se sentiriam caso ocorresse fracasso após a cirurgia de recanalização, os depoimentos foram bastante variados, pois, incluíram sentimentos de tristeza, revolta, desgosto e, até, de conformação. ... Se a cirurgia acontecer e não der certo, eu vou me sentir revoltada comigo mesmo, porque não vou conseguir ter um filho... (E-03) ... Se a cirurgia acontecer, e não der certo vou ficar muito triste, porque eu quero muito ter outro filho... (E-06) ... Vou ficar muito triste, porque, mesmo você sabendo de todo esse trabalho, de toda essa etapa e não conseguir, vou ficar, vamos dizer assim, desgostosa... (E-05) ... Aí vou ter que me conformar, eu sei que eu tentei... (E-11) Para Bahamondes et al. (1992), as mulheres que não conseguem engravidar novamente, seja por não terem tido a oportunidade de reversão da laqueadura tubária, ou por terem realizado o procedimento de reversão sem sucesso, irão provavelmente precisar de aconselhamento, apoio psicológico, incentivo à procura de adoção de uma criança e de outras formas de assistência. Uma das principais expectativas quanto ao sucesso da cirurgia de recanalização é a vontade de realização do desejo de ter o filho com um novo companheiro. Outras mulheres referiram que, após a cirurgia, esperam conseguir engravidar. Uma das entrevistadas relatou que irá se sentir mais segura no relacionamento. 89 ... De bom, seria engravidar do meu novo companheiro... (E-05) ... De bom, espero que eu consiga engravidar dessa pessoa maravilhosa que tou vivendo agora... (E-08) ... A chegada de uma criança vai ser muito bom pra o meu relacionamento. Vou me sentir mais segura... (E-10) Dentre as dezesseis mulheres entrevistadas, duas já haviam-se submetido à cirurgia de recanalização. Uma delas estava procurando o serviço para acompanhamento, pois tinha tido gravidez ectópica. ... Eu estou vindo fazer essa consulta, porque eu tive um aborto, entendeu?... Porque eu engravidei e a criança estava nas trompas e foi o médico que me disse, depois que eu fiz uns exames. E agora estou vindo pra ter um acompanhamento... (E-07) A outra procurou o serviço porque já fazia três anos que tinha-se submetido à recanalização e não estava conseguindo engravidar. “Faz três anos que fiz a recanalização e não estou conseguindo engravidar” (E14) Em alguns estudos, verificou-se que uma parcela significativa de mulheres pós-recanalização evoluiu para uma gravidez ectópica. (RIBEIRO et al., 2002; BARBOSA, 1997; HALBE, 1994; BARJOT, 1999). Isso comprova que, após terem-se submetido à recanalização tubária, nem sempre o desejo das mulheres de ter um outro filho é alcançado, pois, em alguns casos, não há o restabelecimento da função tubária. 90 A cirurgia determina que o companheiro e a mulher tenham que se submeter a inúmeros exames caros e dolorosos e muitos deles não são disponibilizados nos hospitais públicos. Há também a necessidade de internação para a realização do procedimento e de se esperar algum tempo, em média seis meses, até que a paciente saiba se houve sucesso ou não, após a recanalização. Todo esse processo, demorado e emocionalmente desgastante, pode ser fonte de ansiedade para o casal além de, na maioria das vezes, não ser controlado de forma adequada. Portanto, é indispensável que os profissionais de saúde repensem a prática indiscrimida da laqueadura, pois nem sempre as mulheres conseguem realizar o desejo de ter outro filho, após se submeterem à recanalização. Isso causa inúmeros problemas psicológicos nas mulheres, sendo necessário que os serviços de saúde estejam preparados para assisti-las, caso não ocorra sucesso após a cirurgia. São todas essas questões complexas, que requerem uma política de saúde da mulher mais atuante no âmbito da anticoncepção, com mais orientações para os casais e acesso a métodos anticoncepcionais reversíveis. Infelizmente, até o momento, não foram observadas mudanças em relação ao problema do arrependimento pós-laqueadura. 91 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS 92 O objeto deste estudo insere-se em uma temática mais ampla: a dos direitos reprodutivos, de caráter polêmico e eivada de conotações políticas, econômicas, ideológicas, morais e éticas. Sua finalidade foi identificar os aspectos presentes no contexto de vida de mulheres atendidas em um Serviço de Planejamento Familiar de um hospital público em busca de recanalização tubária, que determinaram a decisão de submeterem-se à esterilização cirúrgica no passado, bem como os desafios que enfrentam nesse processo. As mulheres que participaram do estudo fazem parte de agrupamentos sociais desfavorecidos economicamente. Sobressaíram-se mulheres casadas ou que viviam em união consensual com um novo companheiro; com escolaridade igual ou inferior ao primário incompleto e que não exerciam ocupação remunerada. Quanto ao contexto da laqueadura tubária, observou-se que a maioria das mulheres recorreram ao procedimento por causa de problemas conjugais decorrentes de abuso de bebidas alcoólicas, violência e dificuldades financeiras. Uma parcela considerável de mulheres revelou não ter utilizado nenhum método contraceptivo reversível em período anterior à laqueadura. Isso pode ser explicado 93 pelo baixo nível de escolaridade encontrado na maior parte da amostra e, também, pelo desconhecimento dos métodos. Conforme já afirmado, no Brasil, as mulheres, de modo geral, enfrentam problemas para controlar a sua fecundidade. Isso se deve, entre outros possíveis fatores, à dificuldade de acesso aos métodos contraceptivos, ao uso deficiente daqueles a que têm acesso, ou à má qualidade do acompanhamento dos serviços de saúde. Somados, esses fatores têm favorecido a predominância da esterilização cirúrgica como recurso para se controlar a fecundidade. Percebeu-se, nas falas das mulheres que foram entrevistadas para este estudo, o desejo de um método definitivo, eficaz, que as deixassem tranqüilas em relação a gestações indesejadas e à não preocupação com a anticoncepção. De acordo com seus depoimentos, a decisão pela laqueadura é influenciada, em grande parte, por problemas conjugais, por efeitos colaterais indesejáveis dos anticoncepcionais orais e/ou a não confiança na eficácia deles, ou por imposição familiar. Muitas delas tiveram acesso ao procedimento cirúrgico em período eleitoral, confirmando o clientelismo político que trata a laqueadura tubária como moeda de troca por votos. A partir dos dados apresentados, acredita-se que a esterilização cirúrgica feminina afigura-se como uma opção tentadora para a mulher, sobre quem recaem as responsabilidades, tanto pela criação dos filhos, quanto pelos cuidados com a contracepção, independentemente, como se sabe, do fato de, em certos casos, trabalhar fora de casa. Os dados também reafirmam que a prática da anticoncepção se dissemina dentro de um leque bastante estreito de alternativas, que, praticamente, se resume à 94 esterilização ou à pílula anticoncepcional. Há que se levar em conta que, por mais que as técnicas cirúrgicas da esterilização tenham avançado, aumentando perspectivas de reversão, a laqueadura tubária ainda é considerada um método definitivo, o que precisa ser deixado muito claro para o casal que faz essa opção contraceptiva. Quanto à busca pela recanalização, destacaram-se, entre os motivos, o desejo de nova gestação, seja por mudança de cônjuge, perda de filhos, ou pelo desejo de ter outro filho, fosse com outro ou com o mesmo cônjuge. Os exames a que uma mulher que busca a recanalização tubária tem que se submeter são inúmeros, muitos dos quais, dolorosos e caros. Esses exames demarcam a fronteira entre a possibilidade (não a certeza!) de satisfação do desejo de voltar a engravidar e a decepção ou frustração por não poder mais gestar um filho. Mesmo para aquelas cujos resultados de exames são satisfatórios, a certeza da gravidez não existe. Os desafios enfrentados por essas mulheres, portanto, são das mais diversas ordens, destacando-se os emocionais. Neste estudo, no grupo das mulheres que estavam inseridas no processo de atendimento no Serviço de Planejamento Familiar, há pelo menos um ano, duas já haviam realizado a cirurgia de reversão – uma havia tido uma gravidez ectópica e a outra ainda não havia conseguido engravidar, mesmo já havendo decorrido três anos após a recanalização tubária. São mulheres que devem ser acompanhadas por profissionais capacitados pois, provavelmente, irão precisar de apoio psicológico. De acordo com os autores, isso é particularmente grave, num país em que não há cobertura suficiente sequer para cuidados pré-natais e de planejamento familiar, e em que, certamente, os 95 serviços de saúde também não estão preparados para atender à demanda de solicitações de reversão da laqueadura tubária de mulheres arrependidas, tendo em vista que o procedimento representa considerável elevação nos gastos de saúde para assistência à mulher. A estratégia de assistência integral à saúde da mulher constitui importante instrumento na garantia do planejamento familiar, de forma que todas as pessoas tenham o direito à livre escolha dos padrões de reprodução que lhes convenham, como indivíduos ou como casais. Para que esse direito possa ser efetivamente exercido, é necessário que os casais tenham conhecimento e acesso a todos os métodos contraceptivos para que possam utilizá-los, se assim o desejarem, para separar o exercício da sexualidade da função reprodutiva e, em conseqüência, exercer, na plenitude, o planejamento de sua prole, objetivo complexo, porém de alcance possível com a implantação e a firme execução da proposta de assistência integral à saúde da mulher e com o apoio de todos os segmentos da sociedade. Os resultados obtidos por este estudo reforçam a necessidade de divulgação e implementação dos direitos reprodutivos, o incentivo à participação do homem no processo de controle da fecundidade, as garantias de orientação e acesso à saúde reprodutiva e de consolidação e aperfeiçoamento das políticas e programas de saúde da mulher. São todos esses desafios que se colocam para o sistema de saúde, que deverá torná-los viáveis e eficazes para todas as pessoas que dele necessitem. 96 REFERÊNCIAS ADES, A. Identificação de fatores associados ao arrependimento após laqueadura tubária. Rev. Gin. Obst., São Paulo, v. 8, n. 1, p. 30-36, 1997. ALMEIDA, C. B. Esterilização cirúrgica feminina: estudo no município de Campo de Santana – PB. 2001. 47f. Monografia (Graduação) – Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa. AQUINO, E. M. L. et al. Padrões e tendências em saúde reprodutiva no Brasil: bases para uma análise epidemiológica. In: GIFFIN, K.; COSTA, S. H. (org.) Questões de saúde reprodutiva. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1999. p. 187-204. ÁVILA, M. B. Reflexões sobre direitos reprodutivos. In: SEMINÁRIO REGIONAL DIREITOS SEXUAIS, DIREITOS REPRODUTIVOS E DIREITOS HUMANOS, 3, 2002, Lima: CLADEM, 2002. p. 171-181. ÁVILA, M. B. A. Contracepção em debate: velhos conflitos, novas perspectivas. Jornal da Rede Feminista de Saúde, São Paulo, n. 20, maio, 2000. Disponível em: <www.redesaude.org.br/jornal/html/ body_jr20-enc-betania.html> . Acesso em: 22 dez. 2002. ÁVILA, M. B. de M.; CORRÊA, S. O movimento de saúde e direitos reprodutivos no Brasil: revisitando percursos. In: GALVÃO, L.; DIAZ, J. (org.). Saúde sexual e reprodutiva no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1999. p. 70-103. BAHAMONDES, L. et al. Significado do recente aumento do número de solicitantes de reversão de laqueadura em um serviço de esterilidade. Femina, Rio de Janeiro, v. 20, n. 5, maio, 1992. 97 BARBOSA, C. P. et al. Anastomose tubária após esterilização voluntaria: avaliação laparoscópica e resultados. Reprod. Clim., v. 12, n. 4, out./dez. 1997. BARJOT, P. J. et al. Laparoscopic tubal anastomosis and reversal of sterilization. Hum. Reprodution, v. 14, n. 5, 1999. BARROSO, C. Esterilização feminina: liberdade e opressão. Rev. Saúde Públ., São Paulo, v.18, p. 170-180, 1984. BARSTED, L. L. Em busca do tempo perdido: mulher e políticas públicas no Brasil 1983-1993. Rev. Estudos feministas, Rio de Janeiro, ano 2, p. 38-53, 1994, n. esp. BERQUÓ, E. Brasil, um caso exemplar: anticoncepção e partos cirúrgicos – à espera de uma ação – exemplar. Estudos Feministas, Rio de Janeiro, v.1, n.2, p. 366-381, 1993. BRASIL. Ministério da Saúde. Assistência integral à saúde da mulher: bases de ação programática. Brasília, DF: Centro de Documentação, 1985. BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Comissão de Ética em Pesquisa. Resolução n. 196/96. Dispõe sobre pesquisa envolvendo seres humanos. Brasília, DF: CONEP, 1996. BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde da mulher: planejamento familiar. Brasília, DF, 1997. Disponível em: <http://www.saude.gov.br/programas/mulher/planej.html>. Acesso em: 13 agost. 2004. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política nacional de atenção integral à saúde da mulher: princípios e diretrizes. Brasília, DF, 2004. BRASIL. Presidência da República. Contribuição da secretaria especial de políticas para as mulheres para as conferências estaduais. Brasília, DF, 2004. BUENO, S. Minidicionário da língua portuguesa. São Paulo: FTD, 1996, Edição atualizada. COELHO, E. A. C. Política de planejamento familiar em João Pessoa-PB: análise das contradições existentes entre o discurso oficial e a prática. 1996. 242f. Dissertação (Mestrado) – Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal da Paraíba, João Pessoa. COELHO, E. A. C.; GARCIA, T. R. Política de atenção à saúde da mulher: um jogo de luzes e sombras. Toques de saúde, João Pessoa, n. 3, p. 6-9, 2004. COELHO, E. A. C. et al. O planejamento familiar no Brasil no contexto das políticas públicas de saúde: determinantes históricos. Rev. Esc. Enf. USP, São Paulo, v.34, n. 1, p. 37-44, mar. 2000. 98 CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Cesariana: uma epidemia invisível. Medicina Conselho Federal, Brasília, DF: Conselho Federal de Medicina, ano 10, n. 84, p. 18-19, ago. 1997. CORREIA, G. B. et al. Variáveis que sustentam a demanda da laqueadura tubária na visão das pacientes. Reprodução e Climatério, Curitiba, v.13, n.2, p. 112-116, abr./jun. 1998. COSTA, A. M. Desenvolvimento e implantação do PAISM no Brasil. In: GIFFIN, K.; COSTA, S. H. (org.) Questões de saúde reprodutiva. Rio de Janeiro, FIOCRUZ, 1999. p. 319-335. ______. Planejamento familiar no Brasil. Bioética, Brasília, v. 4, n. 2, p. 209-215, 1996. COSTA, R. G. et al. Considerações sobre o processo de decisão pela laqueadura. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 10, 1996, Caxumba. Anais... Belo Horizonte: Associação Brasileira de Estudos Populacionais, 1998. v. 4. n. 1. jan. p. 2523-2536. CUNHA, G. B. da et al. Recanalização tubária videolaroscópica pós-laqueadura: resultados iniciais. Rev. Bras. Ginec. Obst., São Paulo, v.20, n.2, mar. 1998. CUNHÃ COLETIVO FEMINISTA. História do abandono: aborto na Paraíba: a luta pela implantação do serviço de atendimento aos casos previstos na Lei. João Pessoa, 1997. DIAS, R. et al. Síndrome pós-laqueadura – repercussões clínicas e psíquicas da pós-laqueadura. Rev. Bras. Ginec. Obstet., São Paulo, v.20, n.4, p.198-205, 1998. DINIZ, A. L. D. A histerossalpingo-sonografia como método de avaliação da permeabilidade tubária em pacientes inférteis. Rev. Bras. Ginec. Obst., São Paulo, v. 23, n. 8, set. 2001. DONADIO, N. Esterilidade conjugal. In: PIATO, S. (org.). Diagnóstico e terapêutica em ginecologia. 3 ed. Rio de Janeiro: Atheneu, 1986. FAÚNDES, A. et al. Associação entre prevalência de laqueadura tubária e características sócio-demográficas de mulheres e seus companheiros no estado de São Paulo, Brasil. Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, v. 14, n. 1, p. 49-57, 1998. FERNANDES, D. Perspectivas demográficas para o próximo milênio. Bioética, Brasília, DF, v. 4, n. 2, p. 189-194, 1996. FERNANDES, A. M. dos S. et al. Seguimento de mulheres laqueadas arrependidas em serviço público de esterilidade conjugal. Rev. Bras. Ginecol. Obstet. [online], Rio de Janeiro, v.23, n.2, p.69-73, mar. 2001. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php> Acesso em: 19 out. 2004. 99 FERNANDES, A. M. dos S. et al. Características de casais que buscam reversão de laqueadura em serviço público de esterilidade conjugal e seu arrependimento. Rev. Ciênc. Méd., Campinas, v. 11, n. 2, maio/ago. 2002. FIORIN, J. L. Elementos da análise do discurso. 7 ed. São Paulo: Contexto, 1999. ______. Linguagem e ideologia. 6 ed. São Paulo: Ática, 1998. FRANCO, R. C. et al. Avaliação da cavidade uterina: estudo comparativo entre histerografia, histerossonografia e histeroscopia. Rev. Bras. Ginec. Obst., São Paulo, v.22, n.10, nov./dez., 2000. FREITAS, A. N. A. R. Técnicas endoscópicas de esterilização tubária. São Paulo, 2002. Disponível em: <http:www.usp.br/medicina/departamento/g-o/gineco/>. Acesso em: 13 agost. 2004. GALVÃO, L. Saúde sexual e reprodutiva, saúde da mulher e saúde materna: a evolução dos conceitos no mundo e no Brasil. In GALVÃO, L.; DIAZ, J. (org.). Saúde sexual e reprodutiva no Brasil. São Paulo: Hucitec, 1999. p.165-79. GARCIA, T. R. Determinantes da esterilização cirúrgica feminina e efeitos secundários ao procedimento. João Pessoa, 1998. 17p. Projeto de pesquisa. Mimeo. GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. 4 ed. São Paulo: Atlas, 1995. p.45 -124. HALBE, H. W. Tratado de ginecologia. 2 ed. São Paulo: Roca, 1994. HARDY, E. et al. A laqueadura tubária precoce e durante a cesárea: dimensões atuais e fatores que a determinam. Rev. Gin. Obst., São Paulo, v.4, n.2, p.70-76, abr. 1993. HITA, M. G. Esterilização e raça: pontos para refletir sobre a sexualidade brasileira. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 12, 2000, Caxumba. Anais... Caxumba: Associação Brasileira de Estudos Populacionais, 2000. p. 1-25. INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE. Síntese dos Indicadores Sociais. Brasília, DF, 1998. JEFFCOATE, S. N. Princípios de ginecologia. 4 ed. São Paulo: Manole, 1979. p. 730-738. LOPES, R. C. A esterilização no Brasil. Brasília, DF, 2001. Disponível em: <www.sbrh.med.br/boletins/bol04maio-junho/bl010401.htm - 8k>. Acesso em: 22 dez. 2002. 100 MAEDA, M. Infertilidade. São Paulo, 2002. Disponível em: <www.ipcdigital.com/portugues/eventos/infertilidade/index5.shtml>. Acesso em: 22 dez. 2002. MENEGOCI, J. C. et al. Reanastomose tubária pós-laqueadura: uma revisão. Femina, Rio de Janeiro, v. 17, n. 11, nov., 2003. MINELLA, L. S. Aspectos positivos e negativos da esterilização tubária do ponto de vista de mulheres esterilizadas. Cad. Saúde Públ., Rio de janeiro, v.14, n.1, p.6979, 1998. MOURA, H. A; TEIXEIRA, P. As tendências recentes do crescimento populacional nordestino. Recife: Fundação Joaquim Nabuco, 1998. Disponível em:<http://w.w.w.fundaj.gov.br/docs/text/textpop.html>. Acesso em: 18 jun. 2001. OSIS, M. J. D. et al. Laqueadura tubária nos serviços de saúde do estado de São Paulo. Rev. Gin. Obst., São Paulo, v.1, n.3, p.195-204, jul. 1990. OSIS, M. J. D. et al. Conseqüências do uso de métodos anticoncepcionais na vida das mulheres: o caso da laqueadura tubária. Cad. Saúde Públ., Rio de janeiro, v.15, supl.3, p.521-532, jul./set. 1999. PASSOS, M. R. L. Planejamento Familiar. Jornal Brasileiro de Medicina, Rio de Janeiro, v. 66, n. 1/2, 1994. PETTA, C. A. et al. Solicitações de reversão de laqueadura em um serviço de esterilidade: o problema continua. Rev. Reprodução e Climatério, Campinas, v. 15, n. 4, p. 214-217, 2000. PEREIRA, D. H. M. Fertilização assistida quando e como indicar?. Anais ginecologia e obstetrícia. São Paulo, 2001. Disponível em: <www.sogesp.com.br/protocolos/manuais/anais-go/cap01>. Acesso em: 13 agost. 2004. PERPETOU, I. H. O. Uma década de esterilização feminina no nordeste. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 10, 1996, Caxumba. Anais... Belo Horizonte: Associação Brasileira de Estudos Populacionais, 1998. v. 4. n. 1. jan. p. 2587-2610. PINOTTI, J. A; FAÚNDES, A. Saúde da mulher e planejamento familiar. In: _____. A mulher e seu direito à saúde: por uma política de saúde no Brasil. São Paulo: Manole, 1988. cap. 9, p.105-115. PITANGUY, J. O movimento nacional e internacional de saúde e direitos reprodutivos. In: GIFFIN, K.; COSTA, S. H. (org.) Questões de saúde reprodutiva. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1999. p. 19-38. 101 POLDEN, M.; MANTLE, J. Fisioterapia em obstetrícia e ginecologia. 2 ed. São Paulo: Santos, 1997. PORTELLA, A. P. Direitos reprodutivos: alguns comentários. Rio de Janeiro, 2002. Disponível em: < http://www.soscorpo.org.br/download/direitos_reprodutivos_para_CRP.doc> Acesso em: 01 out. 2004. POTTER, J. E.; CAETANO, A. J. Clientelismo e esterilização no nordeste brasileiro: 1986-1995. In: ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS POPULACIONAIS, 10, 1996, Caxumba. Anais... Belo Horizonte: Associação Brasileira de Estudos Populacionais, 1998. v. 4. n. 1. jan. p. 2587-2610. REGGIANI, C. P. D. et al. Laqueadura e reversão. JBM, v. 79, n. 5/6, nov./dez. 2000. RESUMO do programa de ação da conferência internacional sobre população e desenvolvimento, 1995, Nova Iorque, FNUAP, 1994. RIBEIRO, S. C. et al. Laparoscopic tubal anastomosis. Int. J. Gynecol. Obstet., n.84, 2004. Disponível em: <http://www.sciencedirect.com/>. Acesso em: 09 nov. 2004. RIBEIRO, S. C. et al. Reanastomose tubária laparoscópica: resultados preliminares. Rev. Bras. Ginec. Obst., Rio de Janeiro, v.24, n.5, jun. 2002. RIVOIRE, H. C. et al. Revisão da esterilização cirúrgica e a lei nº 9.263/96. Rio Grande, 2003. Disponível em: < www.ebiomedbrazil.com.> Acesso em: 03 jun. 2004. SERRUYA, S. Mulheres esterilizadas: submissão e desejo. 1993. 188f. Dissertação (Mestrado) - Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, Universidade Federal do Pará, Belém. SEMPREVIVA ORGANIZAÇÃO FEMINISTA (SOF). Esterilização Feminina. São Paulo, 1994. (Série “Saúde e Direitos Reprodutivos”, v.1). SILVA, J. C. Esterilização: uma prática em questão. In: FERREIRA et al (org.) Os saberes e poderes das mulheres: a construção do gênero. Salvador: Redor, 2001. p. 177-191. STEPHAN-SOUZA, A. I. Relendo a política de contracepção: o olhar de um profiional sobre o cotidiano das unidades públicas de saúde. Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, v. 11, n. 3, p. 408-424, 1995. Disponível em: <http://www.scielo.br/>. Acesso em: 13 out. 2004. SOUSA, T. M. A laqueadura de trompas: esterilidade definitiva. São Paulo, 2004. Disponível em: <http://geocities.yahoo.com.br/lalique1001/laqueadura.htm>. Acesso em: 07 nov. 2004. 102 SORRENTINO, S. Esterilização: direito ou abuso? Presença da Mulher, São Paulo, ano 4, n. 19, p. 6-9, abr./jun. 1991. VALLENILLA, J. M.; QUIJADA, J. M. Aspectos psicologicos de la anticoncepción. In: ZANCONATO, G.; ZIGHELBOIM, I.; ROS, A. Anticoncepción: principios científicos y practicos. Venezuela: Gráfica Europa, 1989. Sección II, p.331-338. VIEIRA, E. M. A esterilização de mulheres de baixa renda em região metropolitana do sudeste do Brasil e fatores ligados à sua prevalência. Rev. Saúde Públ., v.28, n. 6, p. 440-448, dez. 1994. ______. O arrependimento após a esterilização feminina. Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, v.14, n.1, p.59-68, 1998. ______. A medicalização do corpo feminino. In: GIFFIN, K.; COSTA, S. H. (org.) Questões de saúde reprodutiva. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1999. p. 67-77. ______.Do women’s attitudes towards abortion and contraceptive methods influence their option for sterilization? Cad. Saúde Públ., Rio de Janeiro, v. 15, n.4, p.739-747, 1999. VIGORITO, N. M. Esterilização feminina puerperal. JBM, v.58, n.6, jun. 1990. ZANCONATO, G.; ZIGHELBOIM, I. ; ROS, A. Anticoncepción: princípios científicos y practicos. Venezuela: Gráfica Europa, 1989. 103 APÊNDICES 104 UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM APÊNDICE 1 - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Esta pesquisa intitula-se “Desafios vivenciados por mulheres em busca de recanalização tubária” e está sendo desenvolvida por Cíntia Bezerra Almeida, aluna do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem, nível de Mestrado, da Universidade Federal da Paraíba, sob a orientação da Profa. Dra. Telma Ribeiro Garcia. Os objetivos da pesquisa são os de identificar que aspectos, presentes no contexto de vida das mulheres, motivam a decisão de realizarem a esterilização cirúrgica; averiguar que elementos influenciam a decisão dessas mulheres de recorrerem à cirurgia de recanalização tubária e quais os desafios vivenciados por elas, nesse processo. Pretende-se, com esta pesquisa, contribuir para a compreensão da vivência de mulheres arrependidas da esterilização cirúrgica e que estão em busca da cirurgia de reversão. A participação na pesquisa é voluntária e, portanto, a senhora não é obrigada a fornecer as informações requeridas. Solicito sua permissão para que a entrevista seja gravada. Caso decida não participar da pesquisa, ou se resolver posteriormente desistir da participação, não sofrerá nenhum dano, nem haverá modificação na assistência que vem recebendo na Instituição. A pesquisadora estará a sua disposição para qualquer esclarecimento que considere necessário. Por ocasião da publicação dos resultados da pesquisa, seu nome será mantido em sigilo. Esse documento será guardado pela responsável pela pesquisa e, em nenhuma circunstância, ele será dado a conhecer a outra(s) pessoa(s). Eu, ________________________________________________, dou o meu consentimento para participar da pesquisa. João Pessoa, ______ de ___________________de 2004 ______________________________________ Assinatura da Cliente ______________________________________ Testemunha ______________________________________ Testemunha ______________________________________ Assinatura da Pesquisadora Fone para contato: 216710 105 UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM APÊNDICE 2 - ROTEIRO PARA ENTREVISTAS I – DADOS SOCIODEMOGRÁFICOS Idade: _________________________ Estado civil: ________________________ Escolaridade:_________________Profissão/Ocupação:_____________________ Religião: ____________________ II – DADOS DO ESTUDO Que idade tinha quando teve a primeira menstruação? Com que idade teve a primeira relação sexual? Que idade tinha quando engravidou a primeira vez? Teve algum abortamento? Quantos filhos teve e quantos estão vivos? Seu esposo/companheiro atual é o mesmo da época em que fez a laqueadura tubária? No dia-a-dia de seu relacionamento com seu esposo/companheiro, quais os aspectos desse relacionamento de que você mais gostava/gosta e o que menos gostava/gosta? Antes de fazer a ligadura das trompas, usou algum outro método para evitar a gestação? Que idade tinha quando fez a ligadura das trompas? Por que resolveu fazer a ligadura das trompas? Ter feito ligadura das trompas melhorou sua vida em algum aspecto? Aconteceu algo após a ligadura das trompas que lhe tenha feito arrepender-se da decisão tomada? O que a levou a procurar a recanalização tubária? O que lhe informaram sobre a cirurgia de reconstituição das trompas? Como acha que vai se sentir se a cirurgia não puder ser realizada por alguma razão? Como acha que vai se sentir, se a cirurgia acontecer e não der certo? O que espera que pode acontecer (de bom ou de ruim) em sua vida, após a cirurgia de reconstituição das trompas? Quantos filhos pretende ter após a cirurgia? 106 ANEXO 107 ANEXO 1 – CERTIDÃO DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA HOSPITAL UNIVERSITÁRIO LAURO WANDERLEY COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA IDENTIFICAÇÃO DO PROJETO Número do Processo: 631 Título do Projeto: Desafios vivenciados por mulheres em busca de recanalização tubária Pesquisador (a) Responsável: Cíntia Bezerra Almeida Curso de Origem: Enfermagem Relator(a): Patrícia Serpa de Souza Batista PARECER Com base na Resolução 196/96 do CNS/MS que regulamenta a ética da pesquisa em Seres Humanos, o Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Lauro Wanderley da Universidade Federal da Paraíba, em sua sessão realizada em 14/12/04, após análise do parecer do relator, resolveu considerar, APROVADO, o projeto de pesquisa acima especificado. João Pessoa, 17 de dezembro de 2004 Solange Fátima Geraldo da Costa Coordenadora do Comitê de Ética em Pesquisa
Documentos relacionados
laqueadura tubária - Eletros
Informamos que, de acordo com as diretrizes da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), Resolução Normativa 167 e baseado na lei 9.263 de 12 de janeiro de 1996 do Ministério da Saúde, o present...
Leia maisDeclaração de Consentimento Informado – Laqueadura O presente
espermatozóides fica bloqueada na sua porção mais distal e a do óvulo bloqueada na porção mais proximal. Para tanto, realiza-se abertura da cavidade abdominal, diretamente ou por laparoscopia. 3 – ...
Leia maisSC: Planejamento Familiar como método contraceptivo
Abstract: This article is the result of a study regarding the use of the feminine sterilization in thecity of São José do Cedro/SC. The study aimed to investigate the reasons that lead the women to...
Leia maisobstrução das tubas uterinas (trompas de falópio)
As trompas são duas estruturas finas e delicadas situadas na região superior do útero. Para que uma mulher consiga engravidar naturalmente, é necessário o encontro do óvulo com o espermatozóide. Es...
Leia maisProf. Dr. Daniel Dias Spadotto - IAM
menstrual e de sintomas pré-menstruais, principalmente em mulheres com idade anos, tendo também influenciado negativamente na atividade sexual. Palavras-Chaves: alterações menstruais; laquead...
Leia mais