BRASIL - Faculdade Montenegro

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BRASIL - Faculdade Montenegro
Ano 5 nº 1 - janeiro/fevereiro de 2006
ISSN 1678-2410
Enfermagem Brasil - Volume 5 - Número 1 - janeiro/fevereiro de 2006
Periódico científico dos profissionais de enfermagem
em
g
Enferma
BRASIL
Assistência de Enfermagem
Saúde
• Participação da família nas
tomadas de decisão na assistência
ao paciente terminal
• Cuidar de pessoas com
deficiência na comunidade
• Avaliação de feridas
• Relações entre meio ambiente e saúde
Psicologia
• Fatores estressantes entre usuários de um
centro de atenção psicossocial
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Ano 5 nº 2 - março/abril de 2006
ISSN 1678-2410
Enfermagem Brasil - Volume 5 - Número 2 - março/abril de 2006
Periódico científico dos profissionais de enfermagem
em
g
Enferma
BRASIL
Assistência de Enfermagem
Saúde
• O ser humano em coma como objeto
do cuidado
• Enfermagem atuando com adolescentes
• Cuidados de enfermagem ao cliente
intubado
• Custo e preço de cuidar da enfermeira
• Crianças portadoras de bexiga
neurogênica
• Equipamentos de proteção individual
Psicologia
• A dor e o sofrimento psíquico
em pacientes queimados
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Ano 5 nº 3 - maio/junho de 2006
ISSN 1678-2410
Enfermagem Brasil - Volume 5 - Número 3 - maio/junho de 2006
em
g
Enferma
Periódico científico dos profissionais de enfermagem
BRASIL
Educação
• Motivos da escolha profissional
• Educação em diabetes
Saúde
• Triagem neonatal
• Indivíduo com seqüela de AVE
Assistência de Enfermagem
• Aspectos éticos da imobilização
pediátrica pela enfermagem
• Relato de experiência de um enfermeiro
especialista
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Ano 5 nº 4 - julho/agosto de 2006
ISSN 1678-2410
Enfermagem Brasil - Volume 5 - Número 4 - julho/agosto de 2006
em
g
Enferma
Periódico científico dos profissionais de enfermagem
BRASIL
Educação
• Relato de experiência em clínica cirúrgica:
um olhar acadêmico
• Reforma do serviço público na Escola
Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras
(1936/1938)
Saúde
• Reeducação vesicointestinal
Assistência de Enfermagem
• Banho no leito no pós-operatório
de artroplastia total de quadril
• Análise do registro do enfermeiro
• Intervenção do enfermeiro na
monitorização hemodinâmica
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Ano 5 nº 5 - setembro/outubro de 2006
ISSN 1678-2410
Enfermagem Brasil - Volume 5 - Número 5 - setembro/outubro de 2006
em
g
Enferma
Periódico científico dos profissionais de enfermagem
BRASIL
Assistência de enfermagem
• O cuidado de enfermagem na morte
do idoso
• As concepções de enfermeiros sobre
álcool e alcoolismo
Educação
• O ensino de ética e seus reflexos
no cuidado
Saúde
• Realidade do indivíduo que convive
com HIV/AIDS
• Cateterização enteral em pediatria
• Contaminação ambiental por formas
infectantes de parasitos
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Ano 5 nº 6 - novembro/dezembro de 2006
Início no volume 6 número 1 – Janeiro/Fevereiro de 2007
Docente
Aulas
Enfermeira Adriana Roloff
1) Triagem e Gerenciamento de desastres;
Mestre em Genética Molecular
e Toxicologia pela Universidade
Luterana do Brasil, Rio Grande
do Sul, Especialização em Terapia
Intensiva Adulto Crítico
2) Cinemática do trauma;
E-mail: [email protected]
Enfermagem Brasil - Volume 5 - Número 6 - novembro/dezembro de 2006
Curso de Urgências
e Emergências
ISSN 1678-2410
em
g
Enferma
Periódico científico dos profissionais de enfermagem
BRASIL
3) Atendimento inicial à vitima de trauma;
4) Atendimento inicial ao paciente
queimado;
5) Atendimento à criança vítima de trauma;
6) Atendimento na parada
cardiorespiratória: SBV e SAV
Saúde
Assistência de enfermagem
• Hábitos alimentares
e desenvolvimento do Diabetes tipo II
• Posicionamento canguru
e amamentação de recém-nascidos
a termo
• Enfermeiros do Programa Saúde
da Família em João Pessoa – PB
• Acompanhamento e transporte
de pacientes para exames e procedimentos
• Cuidando do portador de ostomia
• Cuidados de enfermagem
ao recém-nascido em
tratamento da fototerapia
Educação
Será feita uma avaliação pós-curso para emissão de certificado pela Atlantica Educacional.
• Saberes e práticas profissionais
no ensino de enfermagem
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Enfermagem Brasil
Janeiro / Fevereiro 2006;5(1)
Índice
Volume 5 número 1 - Janeiro / Fevereiro de 2006
EDITORIAL
Doutor... ser ou não ser, eis a questão, Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento
........................ 3
ARTIGOS ORIGINAIS
Análise de fatores estressantes entre usuários de um centro
de atenção psicossocial (CAPS), Marcela de Abreu Moniz,
Cláudia Mara de Melo Tavares ................................................................................................................................... 5
Percepções/posturas da equipe multiprofissional de saúde sobre
a participação da família nas tomadas de decisão na assistência
ao paciente terminal, Glaunise Pauletti, Wilson Danilo Lunardi Filho,
Mara Regina Santos da Silva, Valéria Lerch Lunardi .......................................................................................... 12
Cuidar de pessoas com deficiência na comunidade: implicações
e evidências de um ensino diferenciado, Wiliam César Alves Machado,
Danielle Braga Portes, Felipe Azevedo Berbert,
Luiz dos Santos Freitas Mattos Júnior, Patrícia do Carmo Mello ...................................................................... 20
Nível do estresse entre os profissionais de Saúde da Família
em Palmas-TO, Andréa Rego, Anna Nunes Pereira Neta,
Erasmo Antoneli Dotor, Rosemeri Segecin Moro ................................................................................................ 31
REVISÃO
Avaliação de feridas: uma descrição para sistematização da assistência,
Simone Shirasaki Orosco, Eleine Aparecida Penha Martins ............................................................................... 39
As relações meio ambiente e saúde no contexto do desenvolvimento
sustentável: um ponto de partida para a análise da questão
ambiental na enfermagem, Liliana Angel Vargas ............................................................................................... 48
Alfredo Pinto Vieira de Mello: a busca pela compreensão
de uma homenagem através da enfermagem, Almerinda Moreira,
Gláucia Alexandre Formozo, Tadeu Lessa da Costa, Ricardo Menezes da Silva .............................................. 57
NORMAS DE PUBLICAÇÃO ................................................................................................................... 65
CALENDÁRIO DE EVENTOS .................................................................................................................. 68
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Enfermagem Brasil
Janeiro / Fevereiro 2006;5(1)
EDITOR CIENTÍFICO – PRESIDENTE DO CONSELHO CIENTÍFICO
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento (UniRio – Rio de Janeiro)
CONSELHO CIENTÍFICO
Profa. Dra. Almerinda Moreira (Escola de Enfermagem Alfredo Pinto – UniRio – Rio de Janeiro)
Prof. Dr. Carlos Bezerra de Lima (UFPB – Paraíba)
Profa. Dra. Joséte Luzia Leite (UniRio – Rio de Janeiro)
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Profa. Dra. Nebia Maria Almeida de Figueiredo (UniRio – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Rita Batista Santos (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Rita de Cássia Tapié Martins (USP – São Paulo)
Prof. Dr. Sérgio Ribeiro dos Santos (UFPB – Paraíba)
Profa. Dra. Silvia Helena de Bortoli Cassiani (USP – Ribeirão Preto)
Profa. Dra. Taka Oguisso (USP – São Paulo)
Profa. Dra. Vera Regina Salles Sobral (UFF – Rio de Janeiro)
Prof. Dr. William César Alves Machado (UNIPAC – Minas Gerais)
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GRUPO DE ASSESSORES
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Profa Ms. Dóris Maria Volquind (Clínica de Florais de RAFF – Rio Grande do Sul)
Profa Ms. Dulce Dirclair Huf (UFMS – Mato Grosso do Sul)
Profa Ms. Gisele Cristina Tertuliano (Rio Grande do Sul)
a
Prof Ms. Sonia Maria Ponciano dos Santos (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
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Enfermagem Brasil
Janeiro / Fevereiro 2006;5(1)
Editorial
Doutor... ser ou não ser,
eis a questão
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento
Ao ler o jornal “O Globo”, dia 20 de janeiro
do corrente ano, deparei com a seguinte manchete,
acima de uma pequenina matéria: Identificação
deve ser “médico” e não “doutor”.
Diante do apelo da manchete, pensei: “Até
que enfim reconheceu-se que ‘doutor’ é um título acadêmico!” A minha reação foi baseada, no
incômodo, não só, de ter que, constantemente,
explicar a alguns profissionais, até mesmo da área
da saúde, que eu era doutora em enfermagem por
haver concluído um curso de doutorado, como
também, com o incômodo de conviver, até hoje,
com o fato de alguns Conselhos Profissionais
tomarem para si, equivocadamente, a competência de decidir se os seus respectivos profissionais
devem ou não utilizar o título de doutor.
Vale ressaltar que o título de doutor, atualmente, só pode ser conferido àquele profissional
que tenha concluído um curso de doutorado,
defendendo uma tese, ou àquele profissional, cujo
saber é de tal monta, que recebe o referido título
pelo seu notório saber, conferido por uma universidade, através de seu corpo docente. O título
outorgado pela academia, quando da conclusão
de qualquer curso de graduação universitária, é
relativo ao título de bacharel.
Várias são as exigências que devem ser cumpridas para o credenciamento e a manutenção de
um curso de doutorado em nosso país, que constantemente são submetidos à avaliação, baseados
em critérios rígidos de qualidade, e sempre vinculados à esfera pública, através de seus Ministérios
e Órgãos de fomento à Pesquisa. Porém, não cabe
aqui enumerá-las, por não tratar-se do objetivo do
presente editorial.
Bem, voltando à manchete acima mencionada, qual não foi a minha surpresa, ao constatar
que o conteúdo da matéria não era exatamente,
ou nem de longe, aquilo que eu estava supondo.
Era muito pior, porquanto estava eivada de preconceito e de falta de informação.
Eis a matéria na íntegra, transcrita literalmente do jornal acima identificado, portanto de
saber público.
“Para que a população não se confunda,
o Conselho Regional de Medicina do Rio
de Janeiro (CREMERJ) publicou ontem
no Diário Oficial, uma Resolução que
obriga o médico a se identificar com a
inscrição “médico” no jaleco, e não mais
como “doutor”. A confusão, segundo a
diretoria do Cremerj, foi provocado por
profissionais como enfermeiros, técnicos,
nutricionistas e assistentes sociais, que
se identificam para os pacientes como
doutores. Quem responde civil, criminalmente, e administrativamente pelos
atos, disse o presidente do Cremerj, Paulo
César Geraldes.“
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Enfermagem Brasil
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A análise do texto nos remete à preocupação
que o Cremerj tem com o fato dos pacientes confundirem os médicos com outros profissionais. Por quê?
Os outros profissionais estão exercendo a medicina?
Senão, a preocupação não faz sentido. Se for pelo
fato dos médicos não quererem ser confundidos,
como destaca a matéria, porque outros profissionais
se intitulam como doutor, o fato é meramente preconceituoso, como se somente os médicos, devessem
merecer destaque ao serem caracterizados como
doutores, diferentemente dos outros profissionais,
igualmente universitários e autônomos.
Outro detalhe no conteúdo da matéria, ao
destacar que os médicos respondem; civil, criminal
e administrativamente pelos atos, parece ignorar
que todos os profissionais são regidos pelas leis de
seus respectivos Conselhos Profissionais, e exercem
as suas profissões, à luz de seus respectivos Códigos
de Deontologia, portanto, todos os profissionais
são passíveis de punição, e todas as profissões têm
os seus Códigos de Deontologia específicos. Daí,
todas as profissões respondem civil, criminal e administrativamente pelos seus atos.
Sem considerar que séculos atrás, as profissões
advindas de um curso universitário eram poucas,
e que esses profissionais recebiam destaque social,
e com ele, o título de doutor. Seria interessante
observar que estamos no século XXI, e que as profissões de nível universitário emergem pelo clamor
de uma demanda social, e que, também através
dela, se solidificam. A julgar pelos valores atuais,
quais seriam as profissões que se destacariam socialmente? Aquelas ligadas à esfera da informática,
da genética, da robótica, da nanotecnologia, tal o
avanço da ciência?
Bem, mas o que é preciso deixar claro é que se
convencionou chamar de doutor, a todo o profissional de nível universitário, quando na realidade ele
é bacharel. Mera formalidade, talvez sim, mas a julgar
pelos fatos descritos acima, aquilo que era convenção,
passou a ser considerado um direito de determinada
categoria profissional, que para não ser “confundida”,
optou por ser caracterizada com o seu título de bacharel, esse sim, seu título, de fato e de direito.
Nesse ponto, seria interessante ressaltar que a
convenção não dá título a ninguém, se assim fosse,
bastaria ir a Porto Seguro, para toda mulher se tornar
uma “rainha”, e todo homem, um “rei”, pois lá a
convenção é essa, todos se tratam como “meu rei”,
ou “minha rainha”. Insufla o ego, sem dúvida, mas,
mais do que ninguém, sabemos que não nascemos
com o “sangue azul”.
Acredito que diante de tanta desinformação das
leis que regem os cursos de pós-graduação “stricto
sensu” e das respectivas titulações que deles derivam,
um posicionamento das entidades oficiais já não
seria sem tempo.
Sendo assim, todos os profissionais deveriam
ser identificados pelo título outorgado pela Universidade pela qual ele se graduou. Em caso de dúvida, é
só consultar o diploma, lá, literalmente, está escrito
esse título...
Aos doutores, de qualquer área, a esses sim,
caberia o título, fruto de tanta polêmica. Afinal,
os cursos de doutorado estão aí, à espera de quem
queira concorrer a uma das suas poucas vagas, para
ser um doutorando. Para isso, resumidamente, é só
submeter-se, no caso do curso de doutorado em enfermagem, a uma seleção de currículo, com destaque
para a publicação de livros e artigos publicados em
revistas científicas indexadas, nacionais e internacionais, e à prova de títulos, submeter-se à prova de
proficiência de duas línguas estrangeiras, apresentar
um anteprojeto de tese, obedecendo ao rigor de uma
metodologia científica, e que verse sobre um tema
relevante de pesquisa para a área.
Sendo aprovado, é só freqüentar as aulas,
normalmente, com características reflexivas e discursivas, cumprir prazos de entrega de material,
processo que se desenvolve, concomitantemente,
ao longo, de, no mínimo, três longos anos, e, se
submeter, humildemente, às críticas de três bancas
examinadoras, quando das etapas relativas às defesas
de projeto de Tese, Qualificação de Tese e à Defesa
de Tese, propriamente dita, quando lhe será concedido, se aprovado, o título de doutor.
Por oportuno, cabe acrescentar que o referido
título não tem a ver com a competência profissional,
e sim com a capacidade intelectual, o que não impede das duas coisas caminharem lado a lado.
“Não há saber maior ou menor, há saberes
diferentes” – Paulo Freire
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Artigo original
Análise de fatores estressantes entre usuários
de um centro de atenção psicossocial (CAPS)
Marcela de Abreu Moniz*, Cláudia Mara de Melo Tavares, D.Sc.**
*Enfermeira, Escola de Enfermagem Aurora de Afonso Costa da Universidade Federal Fluminense (UFF),
** Titular do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil e Psiquiátrica da Escola de Enfermagem Aurora
de Afonso Costa/ UFF, Coordenadora do Núcleo de Estudos Imaginário, Criatividade e Cuidado em Saúde (NEICSS).
O presente trabalho não foi subvencionado ou baseado em outra tese acadêmica e foi realizado no Centro de Atenção
Psicossocial Herbert de Souza no município de Niterói/RJ, com a contribuição da equipe multiprofissional e dos pacientes
deste serviço.
Resumo
O paciente psiquiátrico é vulnerável às diversas tensões psicossociais, principalmente, no seu núcleo familiar. O serviço de
saúde que o acompanha deve contribuir para atenuá-las através de medidas sócio-terapêuticas. O objetivo deste trabalho
é descrever fatores estressantes para usuários de um CAPS, relacionando-os ao serviço de saúde e à família. Trata-se de
pesquisa descritiva e social, realizada por meio de observação direta no campo e entrevista aberta com usuários de um CAPS
do município de Niterói/RJ. A análise das respostas dos pacientes à entrevista foi realizada por procedimentos de avaliação
categorial de conteúdo. Foram incluídos 11 usuários capazes de estabelecer diálogo para as entrevistas. Verificou-se que os
fatores estressantes para os usuários situam-se no ambiente social fora do CAPS e as formas de resoluções que encontram para
lidar com estas situações constituem-se no isolamento social e no não enfrentamento do estressógeno.
Palavras-chaves: estresse, relações familiares, saúde mental, isolamento social.
Abstract
Analysis of stress factors among users of a Psychosocial Care Center (CAPS)
The psychiatric patient is vulnerable to psychosocial tensions, mainly, in familiar nucleus. The health service that follow-up
this patients should contribute to attenuate this stress through stimulation by social therapy. The objective of this work is to
describe stress factors for users of CAPS, relating them with the health service and to the family. It is a descriptive and social
Artigo recebido em 1 de julho de 2005; aceito em 19 de janeiro de 2006.
Endereço para correspondência: Marcela de Abreu Moniz, Rua Major Duque Estrada, 27,
Rocha, 24421-320 São Gonçalo RJ, Tel: (21) 27120338. E-mail: [email protected].
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research, carried out by direct observation in the field and opened interview with users of CAPS in the city of Niterói/RJ.
The analysis of the patients’ answers to the interview was carried out by procedures of categorial evaluation of content. The
participants were 11 users who are capable to establish dialogue to the interviews. It was verified that the stress factors for the
users take place in the social environment out of the CAPS and that the resolution methods that they find to deal with these
situations consist in the social isolation and not in the confrontation with the stress.
Key-words: stress, family relationships, mental health, social isolation.
Resumen
Análisis de factores estresantes entre usuarios de un Centro de Atención Psicosocial
(CAPS)
El paciente psiquiátrico es vulnerable a las diversas tensiones psicosociales, principalmente, en su núcleo familiar. El servicio
de salud que lo acompaña debe contribuir para atenuarlas a través de medidas socio-terapéuticas. El objetivo de este trabajo es
describir factores estresantes para usuarios de un CAPS, relacionándolos al servicio de salud y a la familia. Se trata de encuesta
descriptiva y social, realizada por medio de observación directa en el campo y entrevista abierta con usuarios de un CAPS del
municipio de Niterói/ RJ. El análisis de las repuestas de los pacientes a la entrevista fue realizado por procedimiento categorial
de evaluación de contenido. Fueron incluidos 11 usuarios capaces de establecer diálogo para las entrevistas. Se verificó que
los factores estresantes para los usuarios están en el ambiente social fuera del CAPS y las formas de resolución que encuentran
para tratar de paliar esta situación se constituyen en aislamiento social y en el no enfrentamiento del estrosógeno.
Palabras-clave: estrés, relaciones familiares, salud mental, aislamiento social.
Introdução
A todo o momento o ser humano é submetido
a situações tristes ou mesmo inesperadas que desencadeiam uma série de reações físico-emocionais
denominadas estresse. O estresse é definido como
uma condição de rompimento do equilíbrio fisiológico e psicológico do organismo em resposta a
influências externas [1-3].
Um estudo concluiu que não há uma definição
única aceita sobre o estresse, quando ocorre ou não,
ou como observá-lo e quantificá-lo. Somente há
um nível razoável de concordância entre os autores
quando referem a respeito das fontes de estresse e
das conseqüências física, psíquica e ambiental do
estresse sobre o ser humano [4-6].
O estresse é um dos antigos mecanismos de
sobrevivência. É uma forma extrema do corpo se
preservar de novas agressões. O termo estresse,
derivado do latim, foi usado no século XVII com o
significado de aflição, adversidade e evoluiu para o
final do século XVIII, com os significados de força,
pressão ou esforço exercido pelo próprio organismo
humano. Mas, somente no início do século XX, as
ciências da saúde e social iniciaram os estudos sobre
os efeitos físicos e mentais do estresse [1,5,7].
O pesquisador canadense, de origem francesa,
Hans Selye (1907-1982), em 1936, a partir de
experimentos em animais que eram submetidos a
estímulos estressores diversos e reagiam sempre de
forma regular e específica, foi o primeiro a apresentar o conceito de estresse e estudar profundamente
sobre este assunto. Seyle foi o criador de um modelo
bioquímico de estresse conhecido como a “síndrome
geral de adaptação” (SGA) [1,2,7,8].
O estresse exerce uma série de mecanismos pelos quais o ambiente psicológico e físico determinam
padrões de adaptação, morbidade e mortalidade.
As características do ambiente psicossocial devem
ser sempre consideradas como determinantes das
condições de saúde.
Eventos operam como estressores na medida
que eles sobrecarregam ou excedem os recursos
adaptativos da pessoa. Muitas vezes nossas reações
adaptativas são excessivas frente ao estresse, sobrevindo como resposta à doença [4,7,8-10].
As formas de resoluções são adotadas como
estratégias para superar o estresse pela sua minimização, eliminação ou negação e se relacionam
com a existência de resistência pessoal ao estresse
e a presença de uma rede social de suporte. Assim,
cada indivíduo irá utilizar alguns de seus mecanismos de “escape”, de fuga ou mesmo de adaptação
disponíveis, diante uma situação de ameaça ou
prejuízo à sua vida. Alguns autores dividem os
comportamentos psicológicos adaptativos, também
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chamados de mecanismos de luta ou de defesa, em
comportamentos orientados por tarefas e mecanismos
de defesa do ego, ambos dirigidos para a supressão
ou controle do estresse [1-11].
O estresse comanda pensamentos e emoções
que ativam o circuito bidirecional, via eixo hipotálamo- hipófise-adrenal, iniciando uma cascata por
todo organismo e agindo fortemente no sistema nervoso central e no sistema imune [3,7,8]. As emoções
são reações do ser humano que informam o que é
importante para ele: as pessoas, os afetos, os valores,
as necessidades. Portanto, nossa capacidade de responder e expressar as emoções permite aos outros
descobrirem como lidamos com uma determinada
situação [12-14].
O estresse é citado como um produto da sociedade mercantil que se mobiliza exageradamente
para a produção de bens, em detrimento de ritmos
sadios de descanso e diversão. O estresse pode surgir
ou conduzir a sentimentos negativos, ameaçando o
bem-estar emocional de uma pessoa e, assim, sua
relação e atitude com todos a sua volta [8,15,16].
O mundo de interesses humanos gera negociações entre as noções de normalidade e desvio, convenientes a um determinado grupo social e político,
conforme vemos no processo da etnopsiquiatria
[17]. A psiquiatria é um dos ramos da ciência que
mais tem associado os fatores psicossociais nas investigações sobre mecanismos causais do processo
saúde e doença.
Personalidades mais frágeis não suportam o
ritmo de vida imposto por seu meio social e vão
perdendo contato com o real. A influência do crescimento e da diferenciação da civilização humana
sobre o aparecimento de transtornos mentais pode
ser constatada por diversos estudos na área [18].
Na área social, as fontes de estresse são identificadas como situações que demandam socialmente
a apresentação ou a imposição de certos padrões
de comportamento [4,17,19]. Esta exigência de
escolha de comportamento social, dependendo dos
valores do sujeito, poderá ser a origem de estresse e
a produção de disfunções emocionais. O processo de
escolha tem atuação mais importante sobre o estado
de saúde que a exposição às fontes de estresse [10].
O indivíduo ao ser diagnosticado como doente
mental se torna mais vulnerável às tensões psicossociais, principalmente no seu próprio núcleo familiar,
sendo este um estímulo estressante de grande valia,
pois gera um afeto negativo facilitando ainda mais
seu comportamento de afastamento [17,20-22].
Um dos pontos mais relevantes para se analisar
a ligação da pessoa em sofrimento psíquico com a
sociedade, é o meio em que se dá à interação familiar
na qual ela vive e convive [20,23]. A dinâmica
relacional da família ajuda a modular os padrões,
normas e características de cada um dos seus membros, transmitindo-lhes comportamentos aceitáveis
de acordo com a cultura a qual está inserida. Sendo
assim, o suporte familiar, talvez, seja um dos contribuintes mais fortes para uma maior ou menor
resistência corporal do indivíduo doente [24,25].
Vários autores citam a família como ponto fundamental de estratégia para assistência e tratamento
do doente mental, pois têm chamado atenção sobre
a sobrecarga emocional e a crescente intolerância que
a família enfrenta na convivência com o membro
doente [24,26]. O relacionamento entre o familiar
ou a pessoa que convive com o paciente no espaço
domiciliar é um estressor em potencial, denotando
um grande esforço adaptativo para ambos, pois os
atritos relacionais são freqüentes.
Só é possível estabelecer metas de intervenção
terapêutica visando à reabilitação do paciente após o
conhecimento da dinâmica familiar e de seu contato
relacional domiciliar [27].
Por outro lado, a assistência profissional e
o tipo de serviço que acompanham a evolução e
a reabilitação da pessoa com transtorno psíquico
são também fatores muitos importantes para a
geração ou inibição de mais situações conflitantes
e estressantes para eles [22,28].
Os Centros de Atenção Psicossocial são novos
dispositivos em saúde mental criados com a finalidade de reabilitação psicossocial de seus usuários, o
que constitui fundamentalmente na reinserção social
de indivíduos excluídos, estigmatizados e isolados
[29-31]. Por isto, as atividades terapêuticas devem
estar direcionadas para a fase de conflito (estresse)
que o indivíduo esteja passando, o que envolve pesquisar sua história de vida, principalmente familiar
e social, de onde surgem a maior parte dos fatores
estressantes não resolvidos. É preciso conhecer os
fatores que contribuíram ou, ainda, contribuem
para o surgimento ou o agravamento do transtorno
psíquico do sujeito, pois assim, será mais fácil
elaborar estratégias de intervenções terapêuticas
que ajudem-no a restauração de uma capacidade
adaptativa eficaz.
Este estudo possibilitou conhecer as situações
desencadeadoras de estresse em dois âmbitos: no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), nos ajudando a
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reaver se a prática assistencial do serviço condiz com
seus reais propósitos, e na família, pois é através dela
que surgem e persistem os principais problemas interrelacionais do usuário. Os relacionamentos familiares
servem como suporte ou como potencial precipitador
e agravador da crise de um de seus membros.
Situações que permitam a reinserção social do
paciente, podem expô-lo ao estresse. Situações inovadoras freqüentemente denotam ansiedade e algum
nível de estresse, por isso é importante que os profissionais elaborem estratégias para ajudar o paciente
a adaptar-se às antigas e novas situações de sua vida.
Estes momentos são os que, talvez, requeiram maior
criatividade e manejo por parte dos profissionais,
para que saibam respeitar os limites do paciente
e ao mesmo tempo ajudá-lo a lidar e adaptar-se a
determinada situação. Não basta criar formas para
a reinserção social do sujeito, é preciso ajudá-lo em
sua adaptação às novas situações [28,30-32].
Frente o exposto acima, o objeto de estudo
deste trabalho se constituiu na investigação de fatores estressantes nos âmbitos do serviço e da família
em um grupo de usuários de um CAPS.
Assim, espera-se com este estudo contribuir
com a conscientização da equipe de saúde mental
acerca desta problemática, visando o adequado
planejamento de ações profissionais neste campo
de saber.
Com vistas ao estudo do estresse, foi proposto
como objetivos descrever fatores estressantes para os
usuários de um CAPS no âmbito do próprio serviço
e do espaço familiar e as formas de resolução encontradas pelos usuários para lidar com o estresse.
Material e métodos
Esta pesquisa de natureza social foi viabilizada
por meio de uma investigação exploratória de campo
realizada no CAPS Herbert de Souza no município
de Niterói/RJ, no período de março a julho de 2004.
Os sujeitos do estudo foram 11 (onze) usuários,
maiores de 21 anos, selecionados aleatoriamente.
Os dados foram obtidos por meio de entrevista aberta com os usuários e da observação direta
no campo, visando apreender os significados da
experiência do cliente através de suas expressões
verbais e não-verbais e captar as emoções, sensações
e sentimentos [33,34]. Os resultados foram interpretados com base na análise do discurso.
A pesquisa foi aprovada pelo comitê de ética
em pesquisa do Hospital Universitário Antônio
Pedro/UFF. O anonimato de tais participantes e a
autorização para a sua realização obedeceram à resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde.
Resultados e discussão
Estresse e seus fatores desencadeadores no
âmbito do serviço e da convivência familiar segundo os usuários
Verificou-se neste estudo que o CAPS constitui um dispositivo de acolhimento, de prática
terapêutica, de lazer, de trabalho, de diálogo de
hospitalidade e respeito aos desejos dos usuários,
ajudando-os a resolver seus problemas, sofrimentos, conflitos e situações de estresse geradas fora do
âmbito do serviço.
“Sinto-me melhor aqui. Aqui posso escutar minha
música, desenhar.” (Usuário 2).
“Gosto do serviço e de todos.... Não me estresso
aqui..” (Usuário 5).
“Converso com todos, nunca me irrito .. só acho
que tinha que ter mais atividades aqui” (Usuário
3).
As poucas atividades ligadas à aprendizagem de
novos conhecimentos e ao trabalho, o pouco espaço
e o pouco investimento financeiro no serviço são
fatores apontados como desfavoráveis ao bom andamento do serviço. Estes dados são extremamente
relevantes, na medida que podem ampliar situações
promovedoras de estresse nos usuários, uma vez
que o tempo ocioso pode levá-los a uma exacerbação de ansiedade, já presente no cotidiano de suas
vidas e averiguada através de suas falas e expressões
corporais. Foi observada uma ociosidade entre os
usuários no CAPS. Compreendemos que não basta
ao serviço servir como ambiente “desestressor” para
seus usuários, ele precisa criar formas de ajudá-los
a enfrentar as situações desagradáveis fora e dentro
de seu âmbito.
A satisfação do usuário sobre seus relacionamentos interpessoais dentro e fora do serviço é
um dos aspectos importantes para conhecermos as
dificuldades que este encontra para estabelecer suas
relações sociais restritas e tentarmos ajudá-los nelas.
Nove usuários referiram um bom relacionamento
com todos dentro do serviço. Três usuários disseram
que se aborreceram uma ou duas vezes com outros
usuários e com alguns profissionais.
Apesar disto, houve referência por grande
parte deles, de não desejarem relacionar-se socialmente, uns afirmaram que o motivo é por causa
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de sua doença, enquanto outros não quiseram ou
souberam relatar.
“...Não moro com ninguém, não consigo me
relacionar com ninguém por causa da minha doença”
(Usuário 6).
“...Não gosto de me relacionar com ninguém,
apenas com mulheres bonitas” (Usuário 2).
“..Não quero me relacionar com ninguém, por
causa da minha doença” (Usuário 8).
Entre os fatores referidos como estressantes no
espaço domiciliar, destacamos as relações interpessoais familiares conflituosas, a ausência de aceitação
e de entendimento da doença mental, a ausência de
recursos materiais no domicílio e o tempo ocioso
em casa. Segundo a percepção de oito usuários
entrevistados, o estresse gerado no ambiente domiciliar relaciona-se a não aceitação pelo familiar
de suas vontades e desejos. Três usuários disseram
que se estressam porque os familiares não aceitam
suas doenças e querem que ajam como “pessoas
normais.” As difíceis relações produzidas entre o
paciente psiquiátrico e os familiares, como já vimos, podem ser averiguadas por diversos autores
[20,24,26,35,36].
Os usuários entrevistados moram exclusivamente com a mãe, exceto três, um com a mãe e o
irmão, outro com o filho e o irmão e outro sozinho.
Neste caso, as pessoas que fazem parte da convivência
do paciente são ligadas a ele por laços de consangüinidade. Como e por quem o cuidado é dado ao usuário
fora do espaço dos serviços da psiquiatria são assuntos
importantes, no que se refere ao tipo de suporte social
e familiar que o paciente recebe ou não, pois interfere
em todo o processo terapêutico a fim de reintegrálo socialmente. Não são freqüentes as pesquisas e
discussões acerca deste assunto [26,37].
Nove usuários não têm um bom relacionamento com seus familiares, apontando como
motivos: não gostarem ou não desejarem conversar
e a não aceitação por parte dos familiares de suas
atitudes e vontades.
Sete usuários relataram que não executam
nenhuma tarefa em casa, porque não há atividades
de seu interesse, enquanto no CAPS há. As atividades relacionadas foram: realização de textos para a
confecção do jornal do serviço, oficina de desenhos,
de bijuterias e de música. Muitos usuários não
gostam ou não se sentem motivados em ajudar nas
atividades do lar, preferem dormir ou se manterem
afastados e isolados. De acordo com as falas dos
usuários, podemos notar que em decorrência da
classe social menos favorecida, muitos não dispõem
de maiores e melhores recursos materiais para o
lazer e o conforto no lar, e até mesmo, passam por
dificuldades de ordem econômica relacionadas à
sua própria sobrevivência e de seus familiares. Este
fato reflete no tempo ocioso, na geração de mais
ansiedade e no aumento de maiores conflitos intrafamiliares. Assim, podemos classificar tais situações
como geradoras de estresse, embora os usuários não
tenham feito esta associação.
“Venho almoçar ..e depois vou embora..”
(Usuário 3).
“Venho aqui muitas vezes, mais para almoçar...”
(Usuário 8).
“Aqui posso escutar minha música, desenhar...e
em casa eu não posso.. em casa só tenho um rádio muito
velho que não toca as músicas que gosto de ouvir..”
(Usuário 2).
“No serviço a gente trabalha, ganha um dinheirinho que ajuda a sobreviver” (Usuário 5).
Quando as equipes de saúde mental passam a entender e acompanhar o paciente no seu
real contexto social e familiar, descobrem que há
vários fatores estressantes do seu meio que ajudam
a promover a sua estigmatização e suas reações
comportamentais pouco concebíveis socialmente.
Os reflexos da reforma psiquiátrica sobre o cuidado
do doente mental na família revelam dificuldades
de ordem emocional, social, relacional, econômica
e materiais e, assim, alterando toda a dinâmica de
relações entre o cuidador, a família, o paciente, os
serviços psiquiátricos e a comunidade [26,36].
Formas de resoluções encontradas pelos
usuários para lidar com os fatores estressantes
Todos os usuários relataram que em certos momentos, quando se sentem com “mal-estar”, tristes,
deprimidos, aborrecidos e estressados preferem ficar
isolados em casa, sem conversar com ninguém e que
podem permanecer desta maneira por dias e até
semanas, enquanto em outros momentos, preferem
ir ao CAPS, conversarem ou realizarem alguma
atividade. Acostumado ao isolamento, muitas vezes
imposto, é o mecanismo que o paciente encontra,
pois o reconhece de outras experiências como o da
hospitalização e já se adaptou a ele.
Estes resultados nos confirmam que embora as
formas de resoluções sejam individuais e afetadas pela
natureza e intensidade do estressor, todos os usuários
apresentaram o isolamento como o principal recurso
adaptativo utilizado continuadamente. Muitos precisam, mas não conseguem mudar suas respostas aos
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estressores, permanecendo os conflitos produzidos
por eles. A resposta adaptativa ineficaz contínua do
paciente é o isolamento social, o que nos lembra
solidão e uma forma de escape dos problemas.
“Quando não acordo bem, prefiro ficar sozinho”
(Usuário 10).
“Na maioria das vezes, quando estou irritado, quero
ficar sozinho, sem falar com ninguém” (Usuário 2).
“Me irrito em casa, depois eu vou ao CAPS e
melhora.” (Usuário 3).
O isolamento ressalta o represamento dos desejos, vontades, qualidades, sentimentos, deveres e
direitos do sujeito, ao invés de ajudá-lo a resolver
um problema imediato de estresse. Uma intervenção
eficaz é aquela que estimula o próprio indivíduo a
conseguir criar condições físicas e mentais de enfrentar e controlar o estressor, deslocando o tratamento
da doença para a pessoa doente [32,38].
O isolamento social do usuário afirma a reprodução do modelo tradicional psiquiátrico, o que
contraria a finalidade de reabilitação psicossocial dos
CAPS. A equipe profissional precisa reaver a forma
que está conduzindo o serviço. O estilo de trabalho
da equipe reflete uma melhor ou pior organização
das atividades e do funcionamento do serviço e escolha do tipo de estratégia de intervenção utilizada
para cada usuário [32, 38,39].
É preciso diversificar as formas de resoluções
adaptativas individuais, para que se encontre a
mais adequada à determinada situação de estresse.
Uma destas formas é o enfrentamento do estressor,
ou seja, a interação do paciente com os seus reais
problemas de origem familiar e social, dando-lhe
suporte emocional.
Portanto, os profissionais dos CAPS devem
estar dispostos a elaborar novas estratégias que
ajudem os usuários a mudar seus mecanismos de
defesa ineficazes e conseguir eliminar ou atenuar
fatores estressantes em suas vidas.
CAPS, estando relacionados às dificuldades com
relacionamentos interpessoais e a realização de um
projeto de vida.
Podemos entender que algumas das causas
para a ocorrência dos difíceis relacionamentos
entre familiares e pacientes psiquiátricos se devam
ao pouco entendimento e compreensão sobre as
atitudes e comportamentos que um toma com o
outro. Sendo assim, o espaço domiciliar propicia,
com maior freqüência que o CAPS, situações indutoras de estresse e que exacerbam a ansiedade dos
usuários, exigindo uma reorientação de ações de
saúde para esse cenário.
Não basta reconhecer o estressor, mas entender
o significado que o indivíduo dá para ele e os recursos adaptativos que utiliza. É a falha no sistema de
adaptação de qualquer organismo humano, diante
de fatores estressores externos ou internos mantidos
continuamente, que poderá levá-lo a conflitos internos não resolvidos, e assim, a alterações orgânicas
reais e desequilíbrio da homeostase interna, variando
de acordo com a individualidade, situações expostas,
envolvimento e apoio social [7,11].
As formas de resoluções que os usuários encontram, na maioria das vezes, para lidar com situações
de estresse, angústia, tristeza, aborrecimento constituem-se no isolamento social e não enfrentamento
do estressógeno.
Desta forma, o CAPS atende o princípio do
acolhimento, mas não prepara os usuários para novas relações sociais, haja vista que eles continuam a
utilizar o isolamento social como mecanismo exclusivo e ineficaz de resolução de conflitos. É preciso
que o CAPS desenvolva ações junto à família e à
sociedade direcionadas para que o usuário enfrente
e amplie as possibilidades de comunicação fora
do CAPS. Por outro lado, é preciso reconhecer os
próprios limites pessoais impostos pelo sofrimento
psíquico.
Conclusão
Referências
Na área de saúde mental, a associação entre o
estresse, o surgimento e a progressão das doenças
mentais é um tema ainda bastante delicado e pouco
estudado. Muitos são os estímulos estressores para
os doentes mentais, que contribuem para abandono
do tratamento, piora do quadro e redução de sua
produtividade.
Os fatores estressantes se concentram no
âmbito familiar e na convivência social fora do
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Artigo original
Percepções/posturas da equipe
multiprofissional de saúde sobre a
participação da família nas tomadas de
decisão na assistência ao paciente terminal
Glaunise Pauletti*, Wilson Danilo Lunardi Filho, D.Sc.**, Mara Regina Santos da Silva, D.Sc.***,
Valéria Lerch Lunardi, D.Sc.****
*Enfermeira, Ex-Bolsista de Iniciação Científica. Membro do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Enfermagem e Saúde - NEPES/
FURG, ** Enfermeiro, Professor Adjunto IV do Departamento de Enfermagem da FURG, Membro do NEPES/FURG,
Orientador, ***Enfermeira, Professora Adjunto IV do Departamento de Enfermagem da FURG, Membro do NEPES/FURG.
Coordenadora da Disciplina Trabalho Monográfico II, ****Enfermeira, Professora Adjunto IV do Departamento de Enfermagem
da FURG, Líder do NEPES/FURG
Resumo
Estudo exploratório descritivo, com abordagem qualitativa, tendo como objetivos conhecer as diferentes percepções/posturas
dos profissionais da equipe de saúde, relativas ao respeito à autonomia do paciente terminal e de sua família sobre suas
participações nas tomadas de decisão sobre a assistência prestada, e identificar quem participa das tomadas de decisão e quais são
os elementos levados em consideração pela equipe de saúde na decisão de reanimação cardiorrespiratória do cliente internado
em uma UTI. Os dados foram coletados por meio de entrevistas semi-estruturadas realizadas com seis profissionais da equipe
de saúde, que trabalham com pacientes em estado crítico, gravadas, transcritas e posteriormente analisadas. Identificou-se que
a decisão em reanimar um paciente terminal envolve outros membros da equipe, embora prevalecendo a opinião médica. É
levada em consideração para a tomada dessa decisão, a impossibilidade terapêutica, devido à irreversibilidade do quadro clínico.
Os profissionais da equipe de saúde, apesar da adoção de atitudes contraditórias, estão conscientes do direito de exercício da
autonomia pelo paciente e sua família como auxílio nas tomadas de decisão sobre a continuidade ou não dos investimentos
na assistência ao paciente terminal.
Palavras-chave: paciente terminal, família, equipe multiprofissional de saúde, unidade de terapia intensiva, cuidados paliativos.
Artigo recebido em 10 de fevereiro de 2006; aceito em 16 de fevereiro de 2006.
Endereço para correspondência: Wilson Danilo Lunardi Filho, Rua Dr. Laviera, 167, Jardim
do Sol, 96216-040 Rio Grande RS, E-mail: [email protected]
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Abstract
Health multiprofessional team´s perceptions/conducts about the family’s
participation in the terminal patient assistance decision making process
This is a descriptive exploratory study based on a qualitative approach. The aims are to know different perceptions/conducts of
health professionals, with regard to the respect for the terminal patient and family’s autonomy about their participations in the
decision making process about the care given, and to identify who participate in the decision making and which elements are
taking into consideration by the health team in cardiorespiratory reanimation of the hospitalized patient in an intensive care
unit. Data was collected during semi-structured interviews and carried out with six health professionals, who work with critical
patients. Such interviews were recorded, transcribed and afterwards analyzed. It was observed that the decision to reanimate
terminal patients involves other team members, although medical opinion is prevalent. It is taking into consideration to the
decision making, the therapeutic impossibility, due to irreversibility of the clinical process. The health professionals team, in
spite of taking contradictory measures, are aware of the patients and family’s rights of autonomy. The family opinion helps
the professional in the decision making about the continuity or not of the terminal patient assistance.
Key-words: terminal patient, family, health multiprofessional team, intensive care unit, palliative care.
Resumen
Percepciones/posturas del equipo multiprofisional de salud sobre la participación de
la familia en las tomas de decisión en la asistencia al paciente terminal
Estudio exploratorio descriptivo, con abordaje cualitativo, cuyos objetivos han sido conocer las diferentes percepciones/
posturas de profesionales del equipo de salud, relativas al respeto de la autonomía del paciente terminal y de su familia sobre
sus participaciones en la toma de decisión sobre la asistencia prestada, e identificar quién participa de las tomas de decisión y
cuáles son los elementos tomados en consideración por el equipo de salud en la decisión de reanimación cardiorespiratoria del
paciente internado en una unidad de terapia intensiva. Los datos fueron colectados a través de entrevistas semi-estructuradas
realizadas con seis profesionales del equipo de salud, que trabajan con pacientes en estado crítico. Dichas entrevistas fueron
grabadas, transcritas y posteriormente analizadas. Se identificó que la decisión en reanimar un paciente terminal envuelve
otros miembros del equipo, pero prevaleciendo la opinión medica. Se toma en consideración para la toma de esa decisión,
la imposibilidad terapéutica, debido a la irreversibilidad del cuadro clínico. Los profesionales del equipo de salud, a pesar de
adopción de actitudes contradictorias, están conscientes del derecho de ejercicio de autonomía por parte del paciente y su
familia como auxilio en las tomas de decisión sobre la continuidad o no de insistir en la asistencia al paciente terminal.
Palabras-clave: paciente terminal, equipo multiprofesional de salud, unidad de terapia intensiva, cuidados paliativos.
Introdução
A morte, ao longo da história, foi se tranformando e ocupando um cenário diferenciado na vida
das pessoas. No Século XIX, a morte era percebida
como uma etapa natural, íntima e solene [1]. Nesse
período, no processo de morte, dentro do aconchego do lar, toda a família reunia-se em torno do
ser central deste acontecimento, demonstrando a
ele seus sentimentos, o prazer de ouvi-lo, falar-lhe,
participar, atender seus pedidos e vontades, fortalecendo-o e fortalecendo-se, de modo a confortar e
confortar-se e demonstrar a satisfação de estar a seu
lado, nessa fase final da sua vida [2].
Percebe-se, então, que a morte, naquela época,
era tida como uma etapa pertinente ao processo da
vida humana. Portanto, entendida como natural
e não como uma navalha, extirpando do convívio
familiar os seres que amamos. “A mesma naturalidade no ato de morrer era utilizada na prestação
de cuidados aos pacientes terminais”. Assim sendo,
via-se esta situação como uma oportunidade de se
conversar, de trocar experiências, e não como uma
fase que deve ser anulada de nosso meio, mas, também, como uma possibilidade de transmitir amor,
carinho e compaixão, através do ato de cuidar,
amparando, confortando e dando atenção à pessoa
moribunda [2].
Porém, esse pensamento, ao longo das décadas,
foi se modificando. A morte foi se transformando,
tornando-se sombria, percebida como um castigo
não merecido. Assim, a morte, antes consumada
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nas casas, transferiu-se para centros hospitalares e a
família, que tomava para si os cuidados do familiar
adoentado, paulatinamente, começou a transferi-los
para os trabalhadores das instituições de saúde.
Os avanços científicos e tecnológicos apresentados nos últimos tempos estão permitindo muitos
benefícios para a área da saúde, contribuindo tanto
para o prolongamento como para o aumento da
qualidade de vida dos indivíduos. Portanto, o tempo
médio de vida está aumentando, bem como se está
conseguindo reverter um grande número de doenças, porém esses mesmos avanços ainda apresentamse impotentes, diante da morte [3].
No caso das Unidades de Terapia Intensiva,
isso se torna cada vez mais freqüente por conta
da implementação de condutas mais sofisticadas
de reanimação de paradas cardiorrespiratórias e
utilização de instrumentos mais avançados de suporte à vida. Estes avanços científicos e tecnológicos
foram alcançados, através da criação de aparelhos
e instrumentos sofisticados e seguros, capazes de
regular ou, até mesmo, prolongar a vida, adiando
a hora da morte.
Kovács [4] nos diz que “a morte mais desejada
de nosso tempo é a morte rápida, preferencialmente,
quando se estiver dormindo, sem consciência, a
morte que nem se percebe”. Concordamos com
Mota [5], quando diz que os profissionais de saúde
consideram a morte como algo estranho à vida e
que deve ser evitada a todo custo. Porém, há que
se chegar, em algum momento, a falar sobre ela
abertamente. Mas como, se nos recusamos a admiti-la? Assim, esta é uma questão que se mostra
ainda difícil de trabalhar, pois a morte é vista como
uma derrota e, conseqüentemente, somos tentados
a mantê-la distante do nosso cotidiano ou ausente
de nosso vocabulário.
Em relação ao paciente terminal, é muito
difícil discernir qual o momento em que todas as
possibilidades de cura já foram utilizadas, mas não
houve resultados animadores, nem sinal de melhora considerável. Há, também, que se considerar a
autonomia do próprio paciente e de sua família,
pois são os mais diretamente envolvidos em relação
às tomadas de decisão. Porém, não raro, acabam
ficando à deriva dos acontecimentos. Entretanto,
não se pode esquecer que, “mesmo que um paciente
esteja próximo do processo de morrer, ainda está
vivo, e é uma pessoa com desejos. O resgate desse
desejo favorece uma significação de vida, mesmo
nos seus momentos finais” [4].
Paciente terminal e morte
Pode-se considerar como paciente terminal
àquele em que todas as possibilidades de reverter
o quadro patológico foram utilizadas, porém seu
organismo não manifestou melhora adequada. Portanto, “existe um determinado momento na evolução
de uma doença que, mesmo que se disponha de todos
os recursos, o paciente não é mais salvável, ou seja,
está em processo de morte inevitável” [3].
Muitas pessoas, ao depararem-se com pacientes gravemente enfermos, afastam-se, por temerem
contagiar-se com a dor e o sofrimento insuportáveis
pelos quais pensam que estão passando e contra os
quais acham que nada mais podem fazer. Assim,
parecem desconsiderar que “o paciente, a família e a
equipe de saúde podem trabalhar em conjunto para
favorecer uma morte com dignidade”, prestando
cuidados que garantam um morrer confortável e
tranqüilo [4].
Aplicação dos princípios morais e éticos
A questão que envolve o uso e a permanência
ou não de instrumentos e aparelhos mantenedores
da vida não pode deixar de englobar as considerações
éticas envolvidas na decisão de cessar com as ações
de cura e iniciar os métodos paliativos de alívio
do sofrimento humano pelo qual passa o paciente
terminal [3]. Essa decisão envolve opiniões, desejos,
anseios e escolhas. Envolve, também, conflitos, além
de questões morais e aspectos éticos [4].
Gavicagogeascoa [6] apresenta que “a utilização de tratamentos, cujos inconvenientes para os
pacientes são excessivos e os benefícios esperados
são incertos, desencadeou um intenso debate ético
sobre a utilização de sua aplicação e sobre os custos
para se atingir um benefício exíguo”. Refere que
os limites são imprecisos, em relação à insistência
prudente em uma terapêutica que poderia ser ineficaz, excessiva e inúteis tratamentos, porventura
utilizados. Assim, podem ser utilizadas as Ordens
de Não Reanimação (ONR), quando se considera
que tais manobras oferecem, em razão do estado e
circunstância do paciente, um benefício marginal ou
nulo. Kovács [4] também tem essa mesma opinião,
quando diz que deve haver debate, quando se trata
de pacientes terminais e, nesse contexto, quando
se instalam “medidas extraordinárias”, infligindo
sofrimento intolerável a pretexto de se manter a
vida a todo custo.
A respeito da sua autonomia, “o enfermo pode
sempre se negar a ser submetido a tratamentos que
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considere pouco benéficos, em comparação aos
riscos da sua própria doença”. Mesmo sendo a qualidade de vida de um paciente muito exígua, ele permanece como um ser com dignidade indestrutível.
Assim, enquanto qualquer paciente for capaz de
compreensão, os profissionais de saúde devem favorecer a comunicação, estimulando a sua participação, conhecendo e respeitando as suas preferências,
com vistas a proporcionar possibilidades para uma
adequada tomada de decisão [6].
Em outras palavras, isso significa dizer que
“a conquista da autonomia e do poder de decisão
passam pelas relações de comunicação, ou seja, a
informação deve ser veiculada por meio de uma relação dialógica entre os participantes” [7]. Quando,
porém, o paciente encontra-se incapaz de decidir
sozinho, devido a um maior comprometimento
de seu estado de saúde (por exemplo: estado de
coma), a família poderá assumir essa função, já
que ela “ é a unidade social com autoridade moral
e status próprio, que atua buscando o bem-estar
dos seus membros”. Portanto, devido à sua relação
de proximidade com o paciente, habitualmente, os
familiares são aqueles que conhecem melhor as suas
convicções, os seus valores e a sua forma de pensar,
daí o seu direito de participar nas tomadas de decisão sobre o tipo de assistência a ser instituída, sua
manutenção ou interrupção [6].
O cuidado ao paciente terminal
Nas situações em que o leque de opções para
curar já foi esgotado, deve-se investir nas ações de
cuidado. Devemos sempre levar em consideração
que “a intenção fim do cuidado baseia-se na proteção, no engrandecimento e na preservação da
dignidade humana, buscando significações para
doença, sofrimento, dor e existência” [8]. Quando
não há mais possibilidade de investimento na cura,
do ponto de vista clínico, a enfermagem continua
prestando ações de cuidado. As mesmas precisam
contemplar e expressar respeito e dignidade, para
além dos cuidados higiênicos e de conforto para
aquele que, apesar de sua grave situação, não perdeu
a sua condição de ser humano.
Os profissionais de saúde devem estar aptos
a refletir e dialogar francamente com todos os envolvidos nesse processo, ou seja, com o paciente,
seus familiares e demais membros da equipe multiprofissional de saúde [5]. Nas situações em que o
paciente terminal está impedido de desenvolver uma
vida autônoma, dependendo de meios técnicos e de
tratamento especializado não direcionados à cura,
deve-se continuar a investir em ações de cuidado
e presença, evitando que a proximidade da morte
traduza-se em afastamento da equipe [6].
“No século XX, os pacientes com doenças
graves, em estágio terminal, participam de programas paliativos” [4]. Nestes casos, a equipe
multiprofissional tem por função oferecer alívio
dos sintomas incapacitantes, nas esferas física,
psíquica, social e espiritual e, também, melhorar
a sua qualidade de vida, estimulando-o a buscar
atividades interessantes, tornando seus últimos
momentos de vida mais significativos, bem como
proporcionando a dignificação do seu processo de
morrer. Ou seja, um processo de morrer em que
“uma morte digna é aquela em que o médico e o
ambiente familiar e social, em torno do paciente
terminal, respeitam a vida que termina, aliviam a
dor, confortam e acompanham o paciente em seus
últimos momentos” [6].
A atuação na área da enfermagem e da saúde
exige de cada indivíduo a habilidade de lidar, principalmente, com questões como a vida e a morte
de seus semelhantes. De acordo com as temáticas
já desenvolvidas e em desenvolvimento, percebe-se
que uma possível inabilidade dos profissionais da
saúde em lidar com sentimentos conflitantes pode
desencadear um processo de crise, com a utilização
de mecanismos de defesa para não enfrentar uma
situação com a qual não se consiga lidar adequadamente.
Na tentativa de amenizar o próprio sofrimento,
muitos profissionais acabam por furtar-se ao diálogo
com familiares de pacientes terminais. Assim, a
relação saudável que poderia existir entre ambos
facilmente fica prejudicada, privando tanto a família
como o paciente de informações e esclarecimentos
importantes às tomadas de decisão o que, muitas
vezes, os mantêm à margem do processo decisório e à
deriva dos acontecimentos, totalmente dependentes
das decisões dos membros da equipe multiprofissional de saúde.
A partir dos achados de pesquisas já realizadas,
percebemos que a interação entre o paciente terminal, sua família e os profissionais de saúde pode
ser prejudicada, muitas vezes, em decorrência do
sofrimento pelo qual passam todos os envolvidos
no processo de morrer e morte [9-13]. Portanto,
em relação a um paciente em estado crítico, é muito
difícil discernir qual o momento em que todas as
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possibilidades de manutenção da vida já foram utilizadas e as tentativas apresentaram resultados pouco
animadores, sem sinais de melhora e possibilidades
de recuperação e cura.
Assim, propomos, nesta pesquisa, como objetivo geral conhecer as diferentes percepções/posturas
dos profissionais da equipe multiprofissional de
saúde, em relação ao respeito à autonomia do paciente terminal e de sua família e, como objetivos
específicos: a) identificar quem participa das tomadas de decisão na assistência ao paciente terminal;
e b) identificar quais são os elementos levados em
consideração pela equipe multiprofissional de saúde
na decisão de reanimação cardiorrespiratória do
cliente internado em uma UTI.
Metodologia
Por haver questões éticas permeando esse assunto, percebemos que é muito importante haver
um diálogo com os participantes do processo de
tomadas de decisão. Na tentativa de poder evidenciar a necessidade de sua autonomia e conforto,
durante esse processo, além da revisão de literatura,
buscamos conhecer junto à equipe multiprofissional
de saúde formas pelas quais vêm sendo satisfeitas
as necessidades, angústias, questionamentos e o respeito às tomadas de decisão do paciente internado
bem como de sua família.
Trata-se de um estudo exploratório descritivo, com abordagem qualitativa, portanto, sem a
necessidade de ser realizado com grandes amostras
numéricas, cuja coleta dos dados foi encerrada,
quando os mesmos tornaram-se repetitivos [14].
Após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa
em Saúde da Fundação Universidade Federal do
Rio Grande – CEPAS/FURG – e em atenção às
recomendações da Resolução 196/96 do Ministério
da Saúde [15], solicitamos o consentimento livre e
esclarecido dos sujeitos, por escrito, para realizar e
participar de pesquisa, mediante esclarecimentos
sobre os objetivos, riscos e benefícios, da garantia
do anonimato e sigilo, do respeito à privacidade e
intimidade e de sua liberdade de participar ou não
da mesma.
Assim, o processo investigativo realizou-se
através de entrevistas semi-estruturadas, gravadas
e transcritas para posterior análise. Nesse tipo de
coleta de dados, o respondente versa sobre o assunto
de forma natural e narrativa e o entrevistador utiliza-se de um guia de tópicos escritos, para garantir
que todas as áreas das questões sejam cobertas
[16]. Sendo assim, foram delimitadas as seguintes
questões: Qual o profissional de saúde que decide
sobre a manutenção de investimentos na reanimação
de um paciente terminal? Quais os aspectos que são
levados em consideração para tomar esta decisão?
É respeitado o princípio de autonomia do paciente
e de seus familiares? Como você se sente a respeito
da tomada de decisão? Como você reage, quando
ocorre uma situação, na qual não há chances de
melhora do paciente? Os cuidados prestados a um
paciente que não apresenta chances de melhora são
semelhantes aos dos outros pacientes?
A coleta dos dados ocorreu nas Unidades de
Terapia Intensiva da Santa Casa de Misericórdia
da cidade do Rio Grande e do Hospital Universitário Dr. Miguel Riet Correa Jr., localizadas na
cidade do Rio Grande. Nestas unidades, internam
pacientes graves com possibilidades terapêuticas de
recuperação.
Os sujeitos da pesquisa consistiram em profissionais da equipe multiprofissional de saúde que
trabalham com pacientes em estado crítico e com
prognóstico grave que, após informados acerca dos
objetivos e metodologia do estudo, assinaram o
termo de Consentimento Livre e Esclarecido para
participarem do mesmo.
Realizaram-se as entrevistas, que foram gravadas e posteriormente transcritas. As mesmas foram
aplicadas junto a seis profissionais de saúde que
atuavam à época, nestas Unidades e que tiveram por
finalidade conhecer os diferentes posicionamentos
individuais e coletivos, frente à problemática sob
investigação.
Os dados coletados foram analisados, segundo
a técnica de análise de conteúdo. Ao seguir este referencial teórico, foram realizadas inúmeras leituras
do material coletado, posteriormente categorizado
e estruturado por aproximações semânticas, resultando nas categorias de análise apresentadas a
seguir [17].
Ações de reanimação como decisão profissional
coletiva
A decisão de manter o investimento em ações
de reanimação de um paciente terminal, pela equipe
multiprofissional de saúde, “é decidido em round.
No round, tem um médico, um enfermeiro e um
residente de plantão e eles decidem, no round,
se vai-se investir ou não no paciente. Não é uma
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decisão única do médico. É uma decisão coletiva”
(Respondente 1).
Entretanto, aparentemente, mesmo havendo
este espaço dialógico para que os demais profissionais das diversas áreas da saúde opinem quanto
às decisões a respeito da continuidade ou não dos
investimentos no tratamento clínico de um paciente terminal, o que se percebe é a prevalência
da decisão médica, pois “é de praxe que o médico
decida pelo investimento no paciente que tem
uma PCR (Parada Cardiorrespiratória) e que é
considerado um paciente terminal. Na nossa UTI,
existe uma conversa, um diálogo, nesse sentido,
com enfermeiros, fisioterapeutas, que trabalham
na unidade, mas a tomada de decisão é do médico”
(Respondente 2).
Assim, pode-se perceber que, apesar da manutenção de certa autonomia de avaliação e de
tomadas de decisão dos demais membros da equipe
multiprofissional, quando existe conflito gerado por
opiniões divergentes, institucionalmente, prevalece a
decisão médica. Entretanto, informalmente, dependendo das características pessoais dos profissionais
envolvidos, é possível que ocorram momentos de
troca e de tomadas de decisão conjuntas [18].
Aspectos considerados para as tomadas de
decisão
Os aspectos levados em consideração para
manter ou não o investimento em ações de prolongamento da vida, adiamento da morte e reanimação
de um paciente terminal foram explicitados, quase
que de forma única e uniforme pelos membros da
equipe multiprofissional de saúde entrevistados.
Assim, percebe-se que a decisão, apesar de difícil,
é observada de uma mesma ótica, uma vez que
“o aspecto, basicamente, é a impossibilidade terapêutica do paciente, que ele venha a responder a
qualquer tipo de terapêutica que esteja disponível no
momento atual. Não havendo possibilidade de que
o quadro dele seja revertido por nenhuma terapia
conhecida atualmente, se opta pela não intervenção;
que a doença siga seu curso sem intervenção médica,
porque o paciente não vai ter nenhuma outra possibilidade terapêutica” (Respondente 6).
Portanto, o investimento em ações de prolongamento da vida, adiamento da morte e reanimação
de um paciente terminal, mantém-se até que a
equipe se convença da inexistência de possibilidade
de recuperação e que a morte apresenta-se como inevitável. “Aqui, na UTI, é feita até a última tentativa.
Enquanto a gente pode fazer alguma coisa em prol
do paciente, é feito. Se não tiver mesmo, aí sim, se
decide em aguardar e não tentar mais. A gente só
espera a natureza agir, mas ele (paciente) continua
no ventilador, continua sendo medicado, continua
se dando toda a assistência, não se suspende todo
o tratamento. A gente continua dando tudo o que
pode pelo paciente, mas não tenta nada daquilo que
a gente já fez” (Respondente 5).
“Então, é uma coisa que, infelizmente, a gente
vivencia e nós não temos o que fazer, nem o que
reagir. Pra mim, como profissional, eu tenho que
encarar como uma coisa normal na minha profissão.
Eu não posso sofrer com a morte dos meus pacientes porque, senão, eu estaria sofrendo, também.
Eu dou o meu sangue, aqui dentro, em função dos
meus pacientes, mas, por mais que eu me apegue
a um paciente, eu não permito que isso me traga
sofrimento. Pode me trazer, assim, uma tristeza, que
é normal do ser humano, né” (Respondente 6)
Desse modo, foi evidenciada que a decisão
de manter ou supender o tratamento de pacientes
terminais pode representar uma situação de extrema
dificuldade e geradora de sentimentos que, embora
haja a adoção de mecanismos de negação e defesa,
contribuem para o sofrimento da equipe multiprofissional de saúde, apesar da explícita e manifesta
consciência de ser a morte uma experiência que
todos os seres vivos estão fadados a vivenciar. “Com
certeza, é muito triste, porque a reação é de impotência, de não conseguir reverter uma situação,
mas que, talvez, futuramente, possa ser revertida,
porque a ciência e a medicina evoluem rapidamente.
O que hoje não se consegue, amanhã, talvez, irá se
conseguir. Mas é frustrante, entristecedor” (Respondente 2). Esse tipo de sentimentos, a incerteza que
deles se origina, em relação à conduta a ser adotada
estar correta ou incorreta, aliados à crença, esperança
ou dúvidas quanto à possibilidade do avanço futuro
do conhecimento contribuem para aumentar as
dificuldades e inseguranças nas tomadas de decisão
da equipe multiprofissional de saúde.
A decisão do paciente ou família versus a decisão profissional
Em relação à participação tanto do paciente
como de sua família nas tomadas de decisão quanto à
manutenção ou não do tratamento clínico, há o entendimento de que “sempre é respeitado o princípio
de autonomia do paciente. No entanto, eu acho que
algo que é pouco realizado é ter uma conversa maior
com os familiares. Deveria ter um diálogo maior,
nesse sentido” (Respondente 4).
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Assim, quando o tratamento clínico atingiu
o limite da sua possibilidade, há o entendimento
de que o sentido ético deva basear-se na questão da
autonomia e do direito de decidir do paciente terminal e de sua família. Porém, contraditoriamente,
prevalece o entendimento de que “numa regra geral,
se for caráter de urgência, o profissional tem respaldo
para fazer os procedimentos no paciente. Se não for
em caráter de urgência, em alguns procedimentos,
nós temos que comunicar a família, pedir autorização e tudo mais” (Respondente 3).
“O princípio da autonomia do paciente e de
sua família é respeitado, até certo ponto. Enquanto
nós temos essa responsabilidade com o paciente, nós
temos o compromisso como profissionais, sobretudo, o que está acontecendo com aquele paciente na
UTI. Então, a gente vai tentar, de qualquer maneira,
todos os esforços: ou para amenizar o sofrimento do
paciente, se não for possível reverter o quadro, ou do
maior recurso possível que tiver eu vou lançar mão,
mesmo que o familiar fale pra gente que ele não
quer” (Respondente 1). Portanto, o que se evidencia,
na maior parte das vezes, é o uso de justificativas
dessa natureza para dar sutentação e respaldo a essa
nítida prevalência da vontade dos profissionais em
fazerem o máximo possível para “salvar” a vida do
paciente, independentemente e apesar da opinião
e desejo da família ser no sentido de não aceitar a
cotinuidade do tratamento clínico e da realização
de demais procedimentos, com vistas ao prolongamento da vida e do adiamento da morte.
Dessa forma, pode-se perceber que as tomadas
de decisão a respeito de um paciente terminal é um
assunto complexo e muito difícil de ser conversado
com os familiares. Porém, isto deve ser feito, antes
que ocorra uma situação de emergência, dentre as
quais, a parada cardiorrespiratória e, prontamente,
aconteça a conseqüente urgência na tomada da
decisão. Assim, as decisões devem ser conversadas
entre a família e todos os membros da equipe multiprofissional de saúde que participam no cuidado ao
paciente. A família se sentirá mais envolvida e com
melhores condições de auxiliar e decidir, quando a
equipe multiprofissional busca uma aproximação
com ela, prestando-lhe informações com clareza e
sensibilidade e estimulando o seu fortalecimento.
Conclusões
Hoje em dia, não se discute mais apenas os
benefícios que a tecnologia vem trazendo para a
preservação da vida e na cura de doenças, antes ditas
como irreversíveis. O que se propõe discutir são os
malefícios que os procedimentos excessivos causam,
tendo como intuito o prolongamento da vida e o
adiamento da morte para além das possibilidades
terapêuticas.
Admitir que se esgotaram os recursos para o
alcance da cura e que o paciente segue seu curso
natural para o fim da vida, não significa que não
haja mais o que se possa fazer. Ao contrário, abre-se
uma vasta possibilidade de cuidados e condutas, no
sentido de oferecer ao paciente e sua família a chance
de ouvir, conversar e realizar desejos.
Busca-se, assim, uma nova perspectiva no
trabalho em saúde, em que a equipe multiprofissional empenhe-se não só na busca da cura,
mas que trabalhe, visando o alívio da dor e do
sofrimento, a diminuição do desconforto, o respeito à autonomia e escolhas do paciente e de sua
família, dirima suas dúvidas e corresponda aos
seus anseios, para favorecer, assim, não somente
o entendimento do processo de morrer e morte,
mas para que esse processo aconteça de modo
tranqüilo e digno.
Neste sentido, os cuidados paliativos são tipos
especiais de cuidados destinados a proporcionar bem
estar, conforto e suporte aos pacientes e seus familiares, nas fases finais de uma enfermidade terminal.
Este tipo de cuidado não prolonga a vida nem, tampouco, acelera a morte. Visa, sobretudo, melhorar
a maneira do paciente e sua família lidarem com as
questões de vida e morte. Norteada pelos aspectos
como a morte sem dor, a manutenção da higiene
e conforto, bem como a possibilidade do diálogo e
o não distanciamento da equipe multiprofissional
da saúde tanto do paciente como de sua família,
auxiliam o paciente terminal a dar sentido à sua
vida no seu final.
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Artigo original
Cuidar de pessoas com deficiência
na comunidade: implicações e evidências
de um ensino diferenciado
Wiliam César Alves Machado, D.Sc.*, Danielle Braga Portes**, Felipe Azevedo Berbert**,
Luiz dos Santos Freitas Mattos Júnior**, Patrícia do Carmo Mello**
*Enfermeiro, Professor Titular da Faculdade de Ciências da Saúde de Juiz de Fora – UNIPAC, Pesquisador da FUNADESP,
** Curso de Enfermagem da Faculdade de Ciências de Saúde de Juiz de Fora, Bolsistas de Iniciação Científica do convênio
FUNADESP-UNIPAC.
Resumo
Estudo que teve como objetivo discutir as implicações do cuidado domiciliar para pessoas com deficiência na comunidade,
tomando como perspectiva o envolvimento de estudantes de enfermagem no processo de orientação das famílias para o
autocuidado. Trata-se de uma pesquisa descritiva, com abordagem quanti-qualitativa, realizada no ano de 2004, na cidade
de Juiz de Fora, voltada para atender as necessidades de cuidados das pessoas com deficiência da comunidade. Os sujeitos
do estudo foram 54 pessoas com deficiência física, auditiva e visual e o instrumento utilizado para a coleta dos dados foi
representado por um questionário contendo perguntas abertas e fechadas. Optou-se por orientar a investigação com as
ponderações de Sassaki acerca da inclusão social do deficiente na sociedade. Os resultados sinalizam que precisamos investir na
capacitação de familiares para assumir tarefas específicas de cuidar no cotidiano das pessoas com deficiência, além de ampliar
discussão das questões do segmento nos conteúdos de ensino de enfermagem para que seus profissionais possam exercer sua
responsabilidade social indistintamente.
Palavras-chave: cuidado de enfermagem, deficiência, promoção da saúde, reabilitação.
Abstract
Caring for people with disability in the community: implications and evidences of a
differentiated teaching
The aim of this study was to discuss the implications of home care for people with disability in the community, taking as
perspective the nursing students’ involvement in the process of family guidance for the self-care. It is a descriptive research,
with quantitative-qualitative approach, carried out in 2004, in the city of Juiz de Fora, aiming at attending to the needs
of people with disability in the community. The subjects of the study were 54 people with physical, auditory, and visual
Artigo recebido em 13 de fevereiro de 2006; aceito em 16 de fevereiro de 2006.
Endereço para correspondência: : Wiliam César Alves Machado, Rua Silva Jardim 5,
Centro, 25805-160 Três Rios RJ, E-mail: [email protected]
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disabilities, and a questionnaire with open and closed questions was used as instrument for data collection. We opted to guide
the investigation based on Sassaki considerations with regard to the social inclusion of the person with disability into society.
The results pointed out that the relatives should be prepared to assume specific tasks to take care for people with disabilities,
and also, to increase discussion on this theme in the contents of teaching nursing so that professionals can profess their social
responsibility indistinctly.
Key-words: nursing care, disability, health promotion, rehabilitation.
Resumen
Cuidar de personas con deficiencia en la comunidad: las implicaciones y evidencias
de una enseñanza diferenciada
Estudio que tuvo como objetivo discutir las implicaciones del cuidado domiciliar para las personas con deficiencia en la
comunidad, tomando como perspectiva el envolvimiento de estudiantes de enfermaría en el proceso de orientación de las
familias para el autocuidado. Se trata de una investigación descriptiva, mediante un abordaje cuanti-cualitativo, realizada en
el año de 2004, en la ciudad de Juiz de Fora, dirigida a atender las necesidades de cuidados de las personas con deficiencia
de la comunidad. Los sujetos del estudio fueron 54 personas con deficiencia física, auditiva y visual y el instrumento para la
colecta de datos fue representado por un cuestionario con preguntas abiertas y cerradas. Se optó por orientar la investigación
con las ponderaciones de Sassaki acerca de la inclusión social del deficiente en la sociedad. Los resultados señalan que
necesitamos investir en el entrenamiento de familiares para asumir tareas específicas de cuidar en el cotidiano de las personas
con deficiencia, además de ampliar discusión de las cuestiones del segmento en los contenidos de enseñanza de enfermería
para que sus profesionales puedan ejercer su responsabilidad social indistintamente.
Palabras-clave: cuidado de enfermería, deficiencia, promoción de la salud, rehabilitación.
Introdução
O presente estudo nasceu de nossa experiência
como enfermeiro e docente da área de Enfermagem
Fundamental, na vivencia do significado de cuidar
e ser cuidado na condição de deficiente físico, e
com os demais estudantes de graduação e bolsistas
de Iniciação Científica – envolvidos em atividades
voltadas para o cuidar de pessoas com deficiência
na comunidade.
A temática central desta investigação delimitase a estudar as implicações e evidências para promoção da qualidade de vida e saúde, com ênfase nos
cuidados de Enfermagem para e com as pessoas com
deficiências da Comunidade de Granjas Bethânia,
tendo em vista fazer valer o papel da universidade
como lócus de produção de conhecimento e sua
aplicação na sociedade, até porque de nada serve
a laboração de saber e fazer acadêmico sem que o
mesmo seja dimensionado na prática social.
Não é de hoje que questionamos, ainda que
sem ressonância, a lacuna existente no ensino universitário, aqui, o de enfermagem em seus mais
diversos níveis, no que diz respeito ao planejamento,
avaliação e prestação de cuidados aos clientes com
deficiências, o que em muito nos intimida na prática
clínica, onde somos flagrados por não saber como
agir no que teoricamente seria de nossa competência
[1]. Ademais, como educadores estamos sendo intimados a aderir a Campanha Nacional de Inclusão
das Pessoas Portadoras de Deficiências, lançada pelo
Governo Federal, já que a questão da deficiência
conquistou espaço na agenda social brasileira, além
de grande repercussão na mídia com o jargão: Igualdade de Oportunidade: O lema do novo milênio.
A propósito, dados do Censo Demográfico
2000, divulgados pelo IBGE – Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística, no dia 8 de maio de 2002,
indicam que o Brasil possui 24,5 milhões de pessoas
com algum tipo de deficiência, ou seja, 14,5% da
população, informações que estão sendo aprofundadas para posterior divulgação dos números por municípios, distritos e bairros em grandes cidades [2].
Procurando soluções gradativas para a questão
no âmbito das atividades de ensino e pesquisa
em nível de graduação da Faculdade de Ciências
da Saúde de Juiz de Fora (UNIPAC), o presente
estudo teve como uma de suas metas envolver
docentes, estudantes e clientes na discussão de
temas sobre cuidar e cuidados de pessoas com
deficiências da comunidade Granjas Bethânia,
onde a IES está inserida, dimensionando o con21
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hecimento produzido nas atividades acadêmicas
para o suprimento da necessidade dos sujeitos da
investigação, através de consultas em caráter ambulatorial e/ou domiciliário, além de estender tais
conhecimentos para profissionais das instituições
de saúde onde estejam desenvolvendo atividades
acadêmicas ou venham desempenhar ações que
envolvam planejamento, avaliação e prestação de
cuidados de enfermagem.
Na concepção de Sassaki [3], a inclusão social
é o processo pelo qual a sociedade se adapta para
poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas
com necessidades especiais e, simultaneamente, estas
se preparam para assumir seus papeis na sociedade.
Perspectiva que nos sugere – enquanto terapeutas
do cuidado –, a tomada de iniciativas voltadas
para educação para a saúde através de estratégias
efetivamente produtivas para assegurar que as pessoas com deficiência possam assumir com a menor
dependência de outrem o cotidiano de autocuidado,
considerando os aspectos peculiares da deficiência
face ao processo inclusivo.
O objetivo do estudo foi discutir as implicações
do cuidado domiciliar para pessoas com deficiência na comunidade, tomando como perspectiva
o envolvimento de estudantes de enfermagem no
processo de orientação das famílias para o autocuidado.
Metodologia
Optamos pela pesquisa descritiva, com abordagem quanti-qualitativa, do tipo investigação
participante, voltada para a construção de conteúdos
de ensino que atendam as necessidades de cuidados
para e com as pessoas deficientes, contemplando
de maneira complementar os dados numéricos e
as idéias que nos foram passadas pelos sujeitos do
estudo, o que possibilita uma maior compreensão
dos aspectos de realidade investigada. O desenho de
pesquisa delimita-se as ações direcionadas ao grupo
de pessoas com deficiência física e/ou mobilidade
reduzida, auditiva e visual, como maneira de melhor
nortear o desenvolvimento do estudo.
A pesquisa quanti-qualitativa é uma abordagem que possibilita ao pesquisador interligar
e complementar aspectos relevantes da realidade
estudada, conferindo mais amplitude aos resultados pelo fato de decodificar as relações e os dados
objetivos e subjetivos do fenômeno. Compreendido
como método que associa análise estatística à in-
vestigação dos significados das relações humanas,
privilegiando a melhor compreensão do tema a ser
estudado, facilitando desta forma a interpretação dos
dados obtidos. No entender de Polit e Hungler [4], a
abordagem quanti-qualitativa é aquela que “permite
a complementação entre palavras e números, as duas
linguagens fundamentais da comunicação humana”.
O pensamento de Maturana e Varela [5], entretanto,
nos parece mais pertinente e adequado aos estudos
da enfermagem pelo caráter multidimensional que
os envolve, quando afirmam que o maior problema epistemológico de nossa cultura é a extrema
dificuldade que temos de lidar com tudo aquilo que
é subjetivo e qualitativo. Não é fácil aceitar que o
subjetivo e o qualitativo não se propõem a ser superiores ao objetivo e ao quantitativo, mas sim manter
com eles uma relação complementar.
A técnica de observação é um processo rico para
a coleta de dados na pesquisa qualitativa, uma vez
que permite apreender as características específicas
de determinado fenômeno social, enfatizando que
observar, naturalmente, não é simplesmente olhar,
significa sim, procurar dentro de um determinado
evento social, estudá-lo de forma a tomar além de
seus aspectos aparentes, buscando compreendê-lo
em suas contradições, dinamismos e relações [6].
A observação participante, por sua vez, é definida
por Minayo [7] como um processo pelo qual mantém-se a presença do observador numa situação
social, com a finalidade de realizar a investigação
científica. O observador está em relação face a face
com os observados e, ao participar da vida deles,
no seu cenário cultural, colhe os dados. Assim o
observador é parte do contexto sobre observação,
ao mesmo tempo modificando e sendo modificado
por este contexto.
O instrumento para a coleta de dados foi um
formulário contendo perguntas abertas e fechadas, aplicado no primeiro e segundo semestres de
2004, voltado para a identificação do perfil sócioeconômico-cultural de 54 pessoas com deficiência
e/ou mobilidade reduzida, propiciando captação
de informações suficientes para propor medidas de
cuidados de enfermagem que atendam suas necessidades. Sobretudo, estratégias voltadas para minimizar a distância existente entre os enfermeiros que
atuam nos programas públicos de saúde, na docência
e na assistência hospitalar, tendo em vista a função e
responsabilidade dos mesmos para com a sociedade.
Para registro dos atendimentos domiciliares foi
elaborado diário de campo, visando proporcionar
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informações relevantes para continuidade dos atendimentos nos períodos subseqüentes.
Esclarecemos que foi solicitada autorização
aos participantes do presente estudo, respeitandose a resolução 196/96 do Conselho Nacional de
Saúde[8], devidamente arquivada para eventual
necessidade de consulta.
Resultados e discussão
Com efeito, a estratégia utilizada na coleta dos
dados conferiu visão ampla da realidade vivenciada
pelas pessoas com deficiência na comunidade, suas
carências e necessidades de cuidados e/ou orientações para se autocuidar e a análise das informações
coletadas nos indicou as categorias a seguir:
Entrando na comunidade: considerações sobre
as dificuldades das pessoas com deficiência face
às necessidades de cuidado e aos papéis dos estudantes
Quando começamos a ministrar a disciplina
Enfermagem na Assistência das Pessoas com Deficiência para estudantes do sexto período do Curso
de Graduação em Enfermagem, da Faculdade de
Ciências da Saúde de Juiz de Fora, da UNIPAC,
pudemos, finalmente, dar início a uma nova fase na
proposta de formação profissional das novas gerações
de enfermeiros, fundamentadas nas mais avançadas concepções da educação para o novo milênio.
Estávamos preocupados com a qualidade de vida,
saúde e nível de informação das pessoas que residem
na comunidade vizinha à Universidade, um grupo
populacional constituído de cidadãos com perfil
bastante heterogêneo, tanto no aspecto econômicosocial quanto no que diz respeito as mais básicas
noções de higiene pessoal, saúde, doença, entre
outros aspectos gerados pela desigualdade social.
A seguir, apresentamos um demonstrativo sobre o cadastramento das pessoas com deficiência da
comunidade, tendo como parâmetro o desenho do
presente estudo, ou seja, deficientes físicos, auditivos
e visuais, além daquelas pessoas com mobilidade reduzida pela falta de equilíbrio postural. Vale ressaltar
que estivemos preocupados em chamar atenção para
o aspecto gênero relacionado aos tipos de deficiência,
considerando as peculiaridades que a característica
implica e requer para se traçar planejamento de
cuidados de enfermagem com ênfase na preservação
da privacidade das pessoas.
Tabela I - Demonstrativo do cadastramento de pessoas
na Comunidade de Granjas Bethânia, por gênero e tipo
de deficiência/dependência. Juiz de Fora, 2004.
Sexo
Masculino
Feminino
f
%
Deficiência
Auditiva
2
4
6
11,2
Física
16
3
19
35,1
Visual
1
1
2
3,7
Mobilidade
14
13
27
50
Reduzida
TOTAL
33
21
54
100
As visitas foram realizadas levando-se em
consideração as necessidades das pessoas, o tempo
disponível das famílias e a operacionalização das
atividades pelos grupos de visitadores. Oportunidade ímpar para realizar orientações às pessoas responsáveis pela continuidade do cuidado
no domicílio [9]. Além disso, a visita domiciliar
garante o vínculo e o acesso da equipe de saúde ao
contexto familiar e social dos assistidos e destacase como uma atividade que permite acompanhar
regularmente a saúde da família, prestar ou supervisionar cuidados e identificar, no domicílio e nas
dinâmicas e relacionamentos do grupo familiar,
os fatores que poderão auxiliar a determinação do
processo saúde-doença [10]. Considerações sobremodo pertinentes ao desempenho satisfatório das
atividades do grupo, inclusive conferindo maior
desenvoltura, segurança e habilidade ao interagir
para cuidar e/ou orientar quanto aos procedimentos na vida cotidiana.
Para contextualizar os aspectos da realidade
estudada com a perspectiva inclusiva, faz mister considerar que uma sociedade inclusiva deve ousar e ir
bem além de garantir apenas espaços adequados para
todos. Deve fortalecer as atitudes de aceitação das
diferenças individuais e de valorização da diversidade
humana e enfatizar a importância do pertencer, da
convivência e da contribuição que todas as pessoas
podem dar para construírem vidas comunitárias
mais justas, mais saudáveis e mais satisfatórias [3].
No que diz respeito ao processo educacional
e formação profissional do enfermeiro, reportamos
às seguintes reflexões:
Pensamos que a tarefa da educação é formar seres humanos para o presente, para
qualquer presente, seres nos quais qualquer
outro ser humano possa confiar e respeitar,
seres capazes de pensar tudo e de fazer tudo
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o que é preciso como um ato responsável a
partir de sua consciência social: [11].
Apostando no potencial do grupo ao atuar
junto às necessidades das pessoas com deficiência,
o estudo envolveu 83 estudantes (36 estudantes
no primeiro semestre de 2004 e 47 estudantes no
segundo semestre de 2004) para o levantamento das
condições do campo a ser estudado, inclusive preparados para interagir com pessoas indispostas a lhes
receber em decorrência da descrença nos serviços de
saúde em geral, ou mesmo por questões pessoais,
familiares, sociais e culturais. Diante de negativas
em nos aceitar, recomendou-se ponderações, dando
as pessoas o tempo necessário para mudança ou
preservação do ponto de vista que comungam.
Ademais, não podemos esquecer que a maioria dos
estudantes também resistiu muito antes de assimilar
a nova postura que teria de assumir junto aos clientes
na comunidade, demonstrando insegurança face
ao novo e a possibilidade de ser criativos, pois que
estavam acostumados a atuar em contextos onde
existem limites preestabelecidos e sem qualquer
possibilidade de intervenções originais.
Tabela II - Distribuição dos clientes atendidos pela
equipe de pesquisa, no 1º e 2º semestres, Juiz de Fora,
2004. Atividades: consultas de enfermagem, cuidados
prestados e orientação para cuidadores.
Semestres Clientes Atendimentos Atendimentos
2004
Atendidos
por Cliente
por Semestre
1º Sem
54
5
270
2º Sem
54
5
270
TOTAL
540
A tabela II demonstra como foram divididas
e implementadas as atividades no ano de 2004.
No primeiro e segundo semestres, os grupos de
acadêmicos sob a coordenação do pesquisador
ficaram responsáveis pelos 54 deficientes e famílias, tendo como tarefa cinco visitas domiciliares
e atendimento das necessidades de cuidados em
cada caso específico. O número de atendimentos
domiciliários em 2004 foi de 540, sendo 270 para
cada semestre.
Dos registros de campo que os estudantes
fizeram sobre as particularidades dos atendimentos,
visitas, consultas e/ou orientações destacamos:
Foi muito gratificante para o grupo a experiência de cadastramento individual para diagnóstico
sócio-econômico e de saúde das pessoas com defi-
ciência da comunidade. Tivemos a oportunidade
de interagir com as famílias visitadas através das
dificuldades encontradas em seu meio. (Grupo
3/segundo semestre de 2004)
A assistência de enfermagem, tanto para as
pessoas portadoras de deficiências quanto para seus
familiares, é extremamente importante para que haja
uma melhoria da qualidade de vida delas. (Grupo
4/segundo semestre de 2004)
No início das visitas ficamos sem saber por
onde começar, mas acabamos descobrindo que as
pessoas deficientes e seus familiares precisam muito
de toda e qualquer ajuda acerca de como se cuidar
em casa. (Grupo 6/segundo semestre de 2004)
Ficamos muito ansiosos e pensando que nada
daria certo, mas, aos poucos percebemos que as pessoas são tão receptivas e necessitadas que acabamos
ficando bem a vontade para cuidar e orientar sobre
os cuidados de enfermagem no domicílio. (Grupo
5/primeiro semestre de 2004).
Quanto às condições de habitação constatouse muita dificuldade devido ao estado precário de
acessibilidade que compromete o direito de ir e vir
das pessoas idosas (mobilidade reduzida) e as com
deficiência, pois a maioria das casas foi construída
em terrenos acidentados, alguns barranco acima,
outros barranco abaixo, além de áreas em espaços
planos e alagadiços com casas construídas e habitadas. Por isso, a grande maioria das casas apresenta
muitas escadas, freqüentemente sem proteção lateral
(corre-mão, barras de apoio e similares), colocando
em risco a vida das pessoas que ali residem.
Considerando o grande número de idosos
com mobilidade reduzida que residem em áreas de
risco para quedas, destacamos as contribuições de
especialistas [12], quando chamam atenção ao fato
de que o crescente número de idosos aponta maior
probabilidade de surgimento de doenças crônicas,
dentre elas a demência, sendo a mais comum a
decorrente do Mal de Alzheimer. Essa doença
provoca deficiência cognitiva progressiva, afetando
mais a memória, entretanto, outras funções como
orientação, linguagem, julgamento, função social
e habilidade de realizar tarefas motoras (praxia),
também declinam à medida que a doença evolui.
Tendo em vista que os idosos estão expostos a várias
situações que podem levar à perda da autonomia e
independência, principalmente os portadores de
demência, estes ficam sujeitos também à perda do
equilíbrio, pela dificuldade de manter a postura
ereta do corpo, aumentando assim, o risco para a
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ocorrência de queda com sérios complicadores. Dos
relatos dos estudantes destacamos:
[...] enquanto alguns moradores encontram-se completamente desinformados e
em condições de moradias inadequadas,
outros apresentam-se com quadro de estabilidade sócio-econômica e vivendo em
boas ou ótimas condições de moradia e
acessibilidade. (grupo 5/primeiro semestre
de 2004)
[...] as casas são construídas em morros e encostas, e sem saneamento básico,
além de destino inadequado para o lixo
produzido, tornando inviável e mesmo
impossível o trânsito de pessoas portadoras
de deficiência. (grupo 4/primeiro semestre
de 2004)
No que se refere à segurança, há um clima de
muito medo e intranqüilidade por todo o bairro,
principalmente após as 22 horas, quando os marginais se apossam das ruas sentindo-se donos delas
e das pessoas que nelas transitam, fazendo dos passeios verdadeiros “Shoppings” de drogas, cenários
de brigas e pequenos furtos.
A questão analisada pelo ponto de vista dos
estudantes:
Os moradores da comunidade se queixam
muito da falta de segurança e afirmam
que não se pode deixar uma janela aberta,
sem uma grande grade de ferro. (grupo
6/segundo semestre de 2004)
Enquanto ficam presos em casa os bandidos
andam livres pela rua após as 20 horas.
(grupo 4/primeiro semestre de 2004)
O mesmo pode ser observado no aspecto
serviços de saúde, já que o bairro não dispõe de
Unidade Básica de Saúde (UBS), portanto, seus
moradores dividem com outra comunidade os serviços oferecidos pela UBS do bairro Parque Guarani,
com suas duas equipes do PSF, sendo uma para
atender aos moradores do Bairro Parque Guarani e
a outra aos do Bairro Granjas Bethânia, visto que
pela extensão geográfica e populacional de ambos
os bairros, dever-se-ia tomar decisão político-social
para aumento do número de equipes do PSF. É im-
portante registrar que não existe no bairro nenhum
ponto comercial de farmácia.
Dos registros destacamos:
Fica muito difícil ir ao médico, não tenho
com quem deixar meus netos. Mês passado,
marcaram e eu não pude ir mais uma vez.
(grupo 6/segundo semestre de 2004)
Se existisse um posto de saúde em Granjas
Bethânia seria mais fácil ir ao médico
para tratar das nossas doenças... (grupo
3/primeiro semestre de 2004)
Das vias públicas, constatou-se que as ruas e
calçadas de acesso à Unidade Básica de Saúde (UBS)
do Parque Guarani estão em péssimo estado, além de
a distância em nada favorecer idosos e pessoas com
deficiência que se proponham receber atendimentos
na UBS, o que não é exceção face à maior parte
das vias públicas do bairro de Granjas Bethânia. A
qualidade do calçamento das ruas deixa a desejar,
exceto nas próximas da Avenida Juiz de Fora, ainda
assim, com calçadas inclinadas, repletas de buracos.
Existem pontos onde o esgoto corre a céu aberto
e raros são os locais em que se podem utilizar as
calçadas com segurança.
Entre os registros dos grupos destacam-se:
É inaceitável que nos dias de hoje, com
todas as informações que temos sobre a importância da higiene e saneamento básico,
ainda existam lugares onde os esgotos
correm a céu aberto propagando doenças.
(grupo 1/segundo semestre de 2004)
Segundo informou a presidente da associação de moradores, já foram feitos pedidos
para mudanças que pudessem facilitar o
acesso dos deficientes aos diversos locais
da comunidade, tais como: igrejas, pontos
de ônibus, lojas etc. (grupo 6/primeiro
semestre de 2004)
Oportuno se faz destacar que o artigo 196, da
Constituição de 1988 [13], determina que a saúde
é direito de todos e dever do Estado, garantindo
mediante políticas sociais e econômicas que visem
a redução do risco de doenças e de outros agravos e
ao acesso universal e igualitário às ações e serviços
para a sua promoção, proteção e recuperação. Neste
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sentido a população está reivindicando apenas o
cumprimento do que determina a Constituição da
República, tão somente, além de estar se sentindo
excluída com relação aos seus direitos de cidadania.
Além do mais, o Decreto 5.296, de 2 de dezembro
de 2004 [14], Art. 6º, § 3o determina que seja
conferido caráter prioritário às pessoas com deficiência que procurem atendimento nos serviços de
emergência dos estabelecimentos públicos e privados
de saúde, mesmo que condicionado à avaliação
médica em face da gravidade dos casos a atender,
representa conquista do segmento.
Ainda com base no Decreto 5.296 [14], em
seu Art. 8º, IX, chama-nos atenção o conceito e
abrangência do desenho universal definido como
uma concepção de espaços, artefatos e produtos que
visam atender simultaneamente todas as pessoas,
com diferentes características antropométricas e
sensoriais, de forma autônoma, segura e confortável, constituindo-se nos elementos ou soluções
que compõem a acessibilidade. Efetivamente
demonstrando o quanto precisamos investir na
orientação das pessoas com deficiência e seus familiares, a partir do compromisso social que nos
compete de compartilhar informações com quem
precise ser esclarecido acerca de seus direitos, e
do dever do poder público no cumprimento das
disposições legais vigentes. Afinal, compartilhar
informações também é demonstrar cuidado para
com o outro.
Cuidado de enfermagem na comunidade: da
necessidade dos deficientes à desarticulação dos
serviços de saúde
O cenário ou realidade contextual reproduz
as características da sociedade brasileira, mais especificamente marcado pelo convívio entre a maioria
das famílias com baixa renda e minoria de famílias
de classe média. Enquanto os menos favorecidos
economicamente buscam atendimento no sistema
público de serviços de saúde, os pertencentes à classe
média dispõem do conforto e garantias oferecidas
pelas operadoras de planos de saúde. Porém, nossa
proposta de cuidado não exclui nenhuma dessas
variáveis sociais, visitamos e atendemos a todos
indistintamente.
Detectamos nas conversas que tivemos com
as pessoas ao visitá-las em casa o quanto elas se
mostram preocupadas com o descompasso existente
nos serviços de saúde, o que poderia ser mais ar-
ticulado para assegurar as pessoas continuidade do
tratamento, tanto os oferecidos pela rede pública
de serviços de saúde quanto os prestados nas instituições do setor privado. Há que se investir na
mudança de postura dos profissionais. Dentro
dessa perspectiva, destaca-se o pensamento de
Morin [15], segundo o qual a missão do ensino
é transmitir não apenas o mero saber, mas uma
cultura que permita melhor compreender nossos
papéis sociais, respeitando as condições e limitações dos outros, para vivermos em harmonia com
tudo que nos cerca, sobretudo dando margem
a um modo de pensar aberto e livre. Para ele a
expressão cabeça bem feita “significa que, em vez
de acumular o saber, é mais importante dispor ao
mesmo tempo de: uma aptidão geral para colocar
e tratar os problemas; princípios organizadores
que permitam ligar os saberes e lhes dar sentido”
[15]. Abrir a cabeça também implica sermos mais
humanos, certamente.
Morin [16] chama atenção para o que denomina aprendizagem cidadã, compreendida como
a educação voltada para contribuir no processo de
auto-formação da pessoa, ensinando-a a assumir a
condição humana, ensinar a viver e ensinar como
se tornar um cidadão definido pelo seu perfil de
solidariedade e responsabilidade em relação ao bemestar de seus semelhantes.
Na busca de estratégias para lidar com os
hábitos das pessoas mais velhas da comunidade e
respeitando-os para sermos aceitos, pudemos constatar efetivos espaços para trabalhar novas formas
de compreender questões fundamentais para a
promoção da qualidade de vida de toda a família,
a começar pelos mais velhos e, conseqüentemente,
os demais. Assim, procuramos compreender o que
sucede nos indivíduos durante a velhice, como
um período de acumulação das experiências, e o
que determina a ação dos idosos no cuidado de
si, acreditando ser um grande desafio, também
essencial para identificarmos o que é considerado
fundamental na concepção do idoso sobre cuidados
para si mesmo [17]. Estratégia que nos conferiu
credibilidade e maior transparência para sugerir,
implementar e avaliar cuidados de enfermagem
com enfoque preventivo, sobretudo voltados para
promover a qualidade de vida e saúde do idoso e
de sua família.
A seguir apresentamos resultados obtidos pelo
grupo em termos de aceitação ou negativa de nos
receber.
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Tabela III - Demonstrativo da reação e participação
das pessoas com deficiência e famílias quanto ao trabalho desenvolvido na comunidade, Juiz de Fora, 2004.
VISITAS
f
%
Visitas com
511
94,6
êxito
Visitas sem
29
5,4
êxito
TOTAL
540
100
Ao que se pode observar na tabela 3 é muito
importante considerar a importância do engajamento
de amigos, parentes, pessoas próximas e até mesmo
o sujeito, numa situação de deficiência qualquer.
Os dados obtidos revelam que as pessoas da comunidade, de uma forma geral, colaboraram bastante
com as atividades implementadas pelos grupos e/ou
a equipe do projeto de pesquisa, favorecendo também
sua articulação com graduandos do sexto período e,
por conseguinte, atribuindo novo desenho à relação
ensino e prática clínica e social de enfermagem.
Entre os registros efetuados pelos grupos destacamos os que seguem:
Não podemos deixar de relatar a boa
receptividade das famílias em relação a
nossa equipe. (grupo 2/primeiro semestre
de 2004)
No geral, todos foram bastante receptivos,
ficando patente, entretanto, a carência de
trabalhos comunitários que visem orientação e acompanhamento das famílias locais.
(grupo 3/primeiro semestre de 2004)
Sabemos que o caminho é difícil, mas agora
acreditamos que é preciso mobilização
para que eles acreditem que somos capazes
de melhorar a qualidade de saúde deles.
(grupo 5/segundo semestre de 2004).
Retomando a perspectiva inclusiva,
Uma sociedade inclusiva garante seus
espaços a todas as pessoas, sem prejudicar aquelas que conseguem ocupá-los
só por méritos próprios. Neste ponto,
é oportuno acrescentar que o conceito
de sociedade inclusiva, introduzido
nos meios especializados em deficiência, tornou-se hoje válido também em
outros meios, ou seja, naqueles em que
estão presentes as pessoas com outras
condições atípicas [3].
Nesse caso, em particular e entre as pessoas visitadas/cuidadas, destacam-se os idosos com seqüelas
de AVC e/ou pessoas com mobilidade reduzida que
vivem na comunidade e que precisam recuperar seus
espaços sociais para viver em melhores condições
inclusivas.
A despeito das inúmeras dificuldades, oriundas de vários fatores políticos, econômicos, sociais,
culturais e religiosos, compreendemos que cabe aos
enfermeiros continuar a luta pela qualidade de vida
dos indivíduos, atuando como agentes multiplicadores do conhecimento e de ações humanizadas,
sobretudo na mobilização de atividades conjuntas
da sociedade civil e do Estado [18]. Só assim estaremos assumindo a parte que nos cabe cumprir, como
terapeutas do cuidado e genuínos agentes sociais
imbuídos do compromisso de promover a qualidade
dos serviços de saúde prestados a sociedade, onde
quer que se desenvolvam tais práticas.
Conclusões
Concluímos que a experiência de cuidar das pessoas na comunidade é deveras produtiva e enriquecedora para todos, desde docentes, estudantes e pessoal
da assistência. Sua relevância aumenta na medida
que se propõe estabelecer e que se estabelece contato
direto das pessoas que necessitam de cuidados básicos
de saúde, com docentes, pesquisadores, estudantes
de graduação, equipe interdisciplinar que atua no
Programa de Saúde da Família da Unidade Básica de
Saúde, além de lideranças comunitárias, todos imbuídos da tarefa de promover a qualidade de vida e saúde
das pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida,
como no caso do presente estudo. Uma rica troca de
experiências, traduzida pelo esforço na compreensão de saberes e fazeres oriundos do senso comum
ou da vida cotidiana das pessoas da comunidade,
cuidadosamente articulados com conhecimentos
técnico-científico próprios da formação acadêmica,
visando um processo interacional respeitoso e fecundo
que muito acrescentou a todos.
Quanto aos reflexos no ensino, pesquisa e
extensão, o estudo demonstrou que precisamos
desenvolver mais atividades voltadas para aproximar os contextos (desenhos de pesquisa) e pessoas
(sujeitos – cidadãos – profissionais – estudantes)
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onde os fenômenos sociais relacionados ao setor
saúde ocorrem no cotidiano, com vistas na adequação dos conteúdos de ensino aos contextos sociais
e expectativas da sociedade, fazendo cumprir o
papel da universidade como lócus de produção de
conhecimento e seu direcionamento/aplicação na
realidade. O instrumento foi deveras importante
em sua aplicação, já que nos revelou o perfil das
pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida,
bem assim como por constituir acervo e banco de
dados para investigações posteriores, tendo sido
também oferecido à equipe de saúde da UBS do
Parque Guarani para ampliar suas intervenções
junto à comunidade.
Em suma, o estudo nos apresentou novas
questões a serem investigadas posteriormente, como
a clara premência de implementar oficinas para
simulação de situações relativas as necessidades de
cuidados de enfermagem para e com clientes especiais, com vistas na capacitação dos próprios clientes
para se cuidar sozinho – autocuidado – segundo a
capacidade funcional de cada um, além de investir
na qualificação de cuidadores domiciliários para
atender as necessidades de familiares de pessoas com
grandes limitações funcionais. Identificamos também a grande e premente necessidade de aproximar
as equipes de profissionais de saúde, em especial os
enfermeiros que atuam no ensino, na prática assistencial hospitalar, enfermeiros e agentes de saúde
que atuam nos PSFs, para, num esforço conjunto,
investir na identificação e operacionalização de estratégias que visem minimizar a distância que os separa,
considerando tal desarticulação como altamente
negativa para os clientes, famílias e sociedade.
Para concluir, reportamo-nos ao entendimento
de Sassaki [19] sobre a importância do paradigma da
inclusão. Segundo ele, o direito de igualdade deve ser
usufruído pelas pessoas com deficiência sem serem
separadas das outras pessoas. Pelo modelo inclusivo,
a sociedade reconhece que ela deve ser um lugar que
não exclua ninguém sob qualquer pretexto e que ela
deve modificar radicalmente seus sistemas e regras
tradicionalmente excludentes. A inclusão favorece o
empoderamento, a independência, a autonomia, a
autodefesa e a autodeterminação, assim como acolhe
a diversidade humana e as diferenças individuais.
Referências
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eficiente físico, a reabilitação e o desafio de sobreviver com
o corpo partido. Rio de Janeiro: Papel Virtual; 2000.
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de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos
para a promoção da acessibilidade. Diário Oficial da
União, Brasília ,03 de Dez. 2004.
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Anexo
Formulário individual para diagnóstico sócio-econômico-cultural das pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida
da comunidade de Granjas Bethânia.
1. Identificação
1.1 Nome:
1.2 Data nasc:
1.3 Endereço:
1.6 CEP:
1.7 Cidade:
1.4 Nº
1.5 Bairro:
1.8 Fone:
1.9 E-mail:
2. Composição familiar:
Nome
Parent.
Idade
Sexo
Estado civil
Escolaridade
Profissão
Renda
(S.M)
2.1.
2.2.
2.3.
2.4.
2.5.
2.6.
2.7.
2.8.
2.9.
2.10.
3. Dados complementares
3.1 Exerce alguma atividade remunerada. ( ) sim; ( ) não - qual:
3.2 Local de trabalho:
3.3 Possui previdência social. ( ) sim; ( ) não - qual:
3.4 Tempo de recebimento:
3.5 Valor (Salário Mínimo): ( ) 1 a 2 ( ) 3 a 4 ( ) 5 a 7 ( ) Mais de 8 Salários mínimos
3.6 Recebe outra renda: ( ) sim; ( ) não - qual:
( ) aposentadoria/pensão ( ) seguro-desemprego ( ) ajuda da família
( ) pensão alimentícia ( ) outra - especificar:
3.7 Despesas realizadas com recursos da previdência social:
Despesas própria família
• Medicamentos ( ) ( )
• Alimentação ( ) ( )
• Habitação ( ) ( )
• Vestuário ( ) ( )
• Água e luz ( ) ( )
• Convênio de saúde ( ) ( )
• Educacional e/ou profissionalizante ( ) ( )
• Taxa de clube ou de grupo de serviços ( ) ( )
3.8. Freqüenta entidade de pessoas com deficiência ou grupo de idosos. ( ) sim, ( ) não; qual:
Se não, por que:
3.9.Meio de transporte utilizado:
3.10. Tipo de deficiência: ( ) física ( ) auditiva ( ) visual ( ) mental ( ) múltipla
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3.11. Origem da deficiência:
( ) Congênita
( ) Adquirida por: ( ) acidente doméstico ( ) acidente de trabalho ( ) acidente de trânsito ( ) doença
( ) Outra. Especificar:
3.12.Utiliza órtese, prótese ou meio auxiliar de locomoção: ( ) sim; ( ) não - qual:
3.13. Faz reabilitação: ( ) sim, ( ) não – por que:
3.14. Possui alguma doença: ( ) Hipertensão ( ) AVC ( ) Artrose ( ) Artrite ( ) Diabetes ( )Depressão ( ) Osteoporose ( )
Problemas na coluna ( ) Problemas cardíacos ( ) Mal de Alzheimer ( ) Mal de Parkinson ( ) outras. Especificar:
3.15. Faz uso contínuo de medicamentos: ( ) sim; ( ) não – qual(ais):
Onde adquire: ( ) Sistema de Saúde ( ) Recursos próprios
3.16 Atua em algum órgão (conselhos, associações, outros). ( ) sim; ( ) não – qual(ais):
3.17 Passatempo(s) preferido(s):
3.18 Atividades desportivas e culturais. ( ) sim; ( ) não – qual(ais):
3.19 Sugestões para melhoria da sua qualidade de vida:
Pela presente declaro serem completas e verdadeiras as informações acima expostas.
__________________________________________
Assinatura do entrevistado
Data de preenchimento: _____/_____/_____ entrevistador: ___________________________________________
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Artigo original
Nível do estresse entre os profissionais de
Saúde da Família em Palmas-TO
Andréa Rego*, Anna Nunes Pereira Neta**, Erasmo Antoneli Dotor***, Rosemeri Segecin Moro ****
*Enfermeira do PSF de Palmas-TO, **Enfermeira do PSF de Porto Nacional-TO, Especialista em Formação Pedagógica na Área
de Educação e Saúde: Enfermagem, ***Médico do PSF de Porto Nacional-TO, ***Docente do Departamento de Biologia Geral
da Universidade Estadual de Ponta Grossa, PR
Resumo
Realizou-se uma pesquisa do tipo exploratória descritiva na abordagem quantitativa, sobre o nível do estresse entre os
profissionais de Saúde da Família (SF) em Palmas, TO. O objetivo foi avaliar o nível de stress entre 66 (91,7% do total)
profissionais médicos e enfermeiros, que atuam no programa, utilizando um questionário estruturado. As fases quase-exaustão
(35,6%) e resistência (33,5%) foram as mais prevalentes. A incidência de exaustão entre os profissionais, que requer uma
avaliação médica ou de um psicólogo, também é alta (12,2%). Apenas 18,7% se enquadraram no estágio de alarme. Ficou
evidente que os problemas prevalentes foram de origem administrativa e os profissionais não conseguem separar o estresse
da vida profissional da pessoal. Estes resultados confirmam estudos anteriores, mostrando que o nível de estresse é elevado
entre os profissionais da saúde.
Palavras-chave: estresse, médicos, enfermeiros, saúde da família.
Abstract
Stress level among professionals of Family Health in Palmas-TO
A descriptive and exploratory research was carried out in order to know the level of stress among professionals of Family
Health (SF) at Palmas, Tocantins city. The aim was to evaluate the stress level of 66 (91.7% of total) doctors and nurses, who
work in the Program, using a structured questionnaire. The most prevalent stages were: almost-complete exhaustion (35.6%)
and resistance (33.5%). The incidence of exhaustion among professionals, who require medical or psychological evaluation,
is also higher (12.2%). Only (18.7%) were included in the alarm stage. It was clear that the prevalent problems were mainly
of management order and the professionals cannot succeed in separating professional stress from personal life. These results
confirm former studies, pointing out the high stress level among health professionals.
Key-words: stress, doctors, nurses, family health.
Artigo recebido em 31 de março de 2005; aceito em 10 de novembro de 2005.
Endereço para correspondência: Anna Nunes Pereira Neta, Rua Bartolomeu Teixeira Palha
1169 Setor Aeroporto Porto Nacional TO. E-mail: [email protected] ou annanunes.
[email protected]
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Resumen
Nivel de estrés entre los profesionales de Salud de la Familia en Palmas-TO
Se realizó un estudio exploratorio descriptivo para comprender el nivel de estrés relacionado con las actividades ocupacionales
de los profesionales de Salud de la Familia (SF) en Palmas, Tocatins. El objetivo fue evaluar el nivel de estrés entre 66 (91,7%
del total) profesionales médicos y enfermeros, que actúan en el programa, utilizando un cuestionario estructurado. Las fases
“próxima al agotamiento” (35,6%) y resistencia (33,5%) fueron las más predominantes. La incidencia de agotamiento entre
los profesionales que requiere evaluación médica o de un psicólogo también fue alta (12,2%). Apenas 18,7% se encontraron
en la fase de alarma. Así, quedó evidente que los problemas predominantes fueron de origen administrativo y los profesionales
no consiguen separar el estrés de la vida profesional de la personal.
Palabras-clave: estrés, médicos, enfermeros, salud de la familia.
Introdução
O Programa de Saúde da Família desponta
como uma das estratégias mais recentes assumidas
pelo Ministério da Saúde: reorganização da atenção
básica à saúde. De acordo com Franco e Merhy [1],
sua implantação tem o objetivo de proceder “à reorganização da prática assistencial, em substituição ao
modelo tradicional de assistência orientado para a
cura de doenças e centrado no hospital. No SF a
atenção está centrada na família, entendida e percebida a partir do seu ambiente físico e social”.
O SF não se constitui em uma proposta de organização dos serviços de saúde, mas em uma estratégia de substituição e reestruturação do modelo. Uma
característica importante do SF refere-se ao trabalho
inter e multidisciplinar, entre as equipes de saúde da
família, onde cada um tem as suas atribuições e responsabilidades. Sendo assim, o objetivo geral do SF
é melhorar o estado de saúde da população, através
da assistência integral, resolutiva, contínua e de boa
qualidade, mediante a construção de um modelo assistencial baseado nas ações de promoção, proteção,
diagnóstico precoce, tratamento e reabilitação do
indivíduo, de acordo com os princípios e diretrizes
do Sistema Único de Saúde (SUS).
Campos [2] refere que cada equipe de multiprofissionais deve se responsabilizar por um conjunto de problemas delimitados, com planejamento
e execução de ações capazes de resolvê-los por meio
de vinculação de cada equipe a um certo número de
usuários inscritos. Através dessas informações, esse
novo modelo de assistência sugere que deve haver
entrosamento dos trabalhadores das equipes com a
população de sua área de abrangência.
Trabalhar no SF requer conhecimentos
teóricos e práticos. Algumas situações como, por
exemplo, o contato direto com a população, a
identificação dos problemas vivenciados pela comunidade, a falta de instrumentos para captação
das necessidades da população atendida, a sobrecarga de trabalho, dificuldade para trabalhar em
equipe, a falta de apoio dos gestores e de recursos
materiais, financeiros, são alguns dos problemas
que podem desencadear ansiedade e posteriormente o estresse entre os profissionais que compõe
a equipe do SF.
Além dessas observações, estudos têm demonstrado que uma das profissões campeãs do estresse é
a dos profissionais que trabalham na área da saúde
[3-5]. Estes sofrem pressões de diversas ordens,
tais como, concorrência profissional, pressões dos
chefes, pacientes ou subordinados. Há estudos
sobre profissionais de centro-cirúrgico, unidade
de emergência, central de material e outros, mas
ainda não se estudou o stress que acomete o pessoal envolvido no SF, o que leva à indagação se esta
nova forma de atendimento à saúde estaria sujeita
à mesma problemática.
Fundamentação teórica
Conceituando estresse
A palavra estresse tem origem da palavra inglesa
stress que significa força, pressão ou compressão. As
primeiras referências à palavra stress, com significado
de “aflição” e “adversidade”, datam do século XIV
[6].
Segundo Zakabi [7] a palavra estresse está
associada a sensações de desconforto. Não é uma
doença, e, sim, uma reação instintiva ao perigo
real ou imaginário ou a uma situação de desafio.
A vida moderna apresenta momentos estressantes
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tais como, demissão, divórcio, pressão no trabalho,
disputas com colegas. Não só os fatos negativos mas,
qualquer situação que nos remeta ao desconhecido,
pode ser geradora de estresse.
Margis et al. [8] revelam que em 1936, o fisiologista canadense Hans Selye introduziu o termo
stress para designar a resposta geral e inespecífica
do organismo a um estressor ou a uma situação
estressante. Ele observou que muitas pessoas sofriam de doenças físicas e reclamavam de sintomas
comuns. Tais observações o levaram a investigações
científicas em laboratório, com animais, e definir
stress como o resultado inespecífico de qualquer
demanda do corpo, ou seja, do efeito mental ou
somático e “estressor”, seja de natureza física, mental
ou emocional. Em seus estudos, Selye observou que
o estresse produzia reações de defesa e adaptação
frente ao agente agressor. A partir dessas observações, ele descreveu a Síndrome Geral da Adaptação
(SAG), que pode ser entendida como o “conjunto
de todas as reações gerais do organismo que acompanham a exposição prolongada de “estressor”. Tal
síndrome apresenta três fases: fase de alarme, fase
de resistência e fase de exaustão.
1. Fase de alarme: o organismo tem uma excitação
de agressão ou de fuga ao estressor. Nos dois casos,
reconhece-se uma situação de reação saudável ao
estresse, porquanto possibilita o retorno à situação de equilíbrio após a experiência estressante.
Essa fase é caracterizada por alguns sintomas:
taquicardia, tensão crônica, cefaléia, sensação de
esgotamento, pressão no peito, extremidades frias
etc.
2. Fase de resistência: nesta fase, o organismo altera
seus parâmetros de normalidade e concentra a
reação interna em um determinado órgão-alvo,
desencadeando a Síndrome de Adaptação Local
(SAG). Essa fase é caracterizada por sintomas de
esfera psicossocial como ansiedade, medo, isolamento social, roer unhas, oscilação do apetite,
impotência sexual, dentre outros.
3. Fase de exaustão: o organismo encontra-se extenuado pelo excesso de atividades e pelo alto
consumo de energia. Ocorre, então, a falência do
órgão, o que se manifesta sob a forma de doenças
orgânicas.
Lipp 9, no decorrer de seus estudos, identificou uma outra fase do processo de estresse. A essa
nova fase foi dado o nome de quase-exaustão, por se
encontrar entre a fase de resistência e a de exaustão.
Essa fase caracteriza-se por um enfraquecimento
da pessoa que não está conseguindo adaptar-se ou
resistir ao agressor. A partir daí, as doenças começam
a surgir, porém de forma grave.
Nesta fase, as manifestações que ocorrem com
freqüência de nível físico são: aumento da sudorese,
tensão muscular, taquicardia, hipertensão, ranger de
dentes, hiperatividade, náuseas, mãos e pés frios. Em
termos psicológicos, podem ocorrer: ansiedade, tensão, angústia, insônia, alienação, dificuldades interpessoais, preocupação excessiva, dúvidas quanto a si
próprio, dificuldade para concentrar-se, dificuldades
de relaxar, ira e hipersensibilidade emotiva [9].
Problemas causados pelo estresse
De acordo com Bermik [10], o estresse pode ser
causador de uma série de doenças, que vão da asma,
às doenças dermatológicas, alérgicas e imunológicas.
Ele refere que no sistema digestivo, o estresse pode
desencadear gastrite, até mesmo uma úlcera. Em se
tratando do coração, o estresse pode ser um matador silencioso, causando uma diminuição do fluxo
sanguíneo ao miocárdio, levando a uma isquemia
do miocárdio, que é acompanhada de dores no
coração(angina), principalmente quando se faz
algum esforço, e até um infarto do coração.
Ainda segundo o mesmo autor, outros problemas comuns são a ruptura da parede dos vasos
enfraquecidos, ou a trombose, causando obstrução
do vaso coronariano. As arritmias também podem
ocorrer, devido ao nível elevado de adrenalina,
provocando alterações irregulares no ritmo cardíaco
e conseqüentemente diminuem o fluxo de sangue
pelo sistema cardiovascular.
Lipp [6] refere que o estresse, quando presente
no indivíduo, pode desencadear uma série de doenças dentre elas, a síndrome do pânico e outras. Se
nada for feito para amenizar essa situação, a pessoa
poderá apresentar problemas no cérebro, dentre
outros. O estresse não é uma doença, mas propicia
o desencadeamento de doenças oportunistas.
De acordo com Cantos et al. [11], o estresse
também provoca o aumento de LDL-colesterol
(LDL) e a diminuição da fração HDL-colesterol
(HDL), sugerindo um aumento de doenças cardiovasculares. O estresse também afeta a pressão arterial
com a estimulação do sistema nervoso simpático,
produzindo aumento da freqüência cardíaca e dos
batimentos cardíacos, aumentando o risco de doença
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arterial coronariana. No aparelho circulatório, o
estresse aumenta a atividade simpática, liberando
adrenalina, promovendo taquicardia e vasoconstricção.
Estresse e trabalho
O estresse resulta da percepção do trabalhador
entre a discordância e as exigências da tarefa e os
recursos pessoais para cumprir estas exigências. A
discordância pode ser percebida como desafio e gerar
como reação a dedicação à tarefa; ou, se a discordância for percebida como ameaça, então o trabalhador
enfrentará uma situação estressante negativa, que
pode conduzi-lo a evitar a tarefa [12].
No ambiente de trabalho os estímulos estressores são muitos, tais como: ansiedade significativa
diante de desentendimentos com colegas, sobrecarga
de trabalho, insatisfação salarial. A desorganização
no ambiente ocupacional põe em risco a ordem e a
capacidade de rendimento do trabalhador. Fatores
intrapsíquicos relacionados ao serviço também
contribuem para a pessoa manter-se estressada, por
exemplo: sensação de insegurança no emprego e de
insuficiência profissional [13].
Dentre os vários sinais/sintomas do estresse,
a síndrome do burnout em profissionais da área da
saúde é composta por sintomas somáticos, psicológicos e comportamentais. Segundo Nogueira-Martins
[14], os sintomas somáticos compreendem: exaustão,
fadiga, cefaléias, distúrbios gastrointestinais, insônia
e dispnéia. Humor depressivo, irritabilidade, ansiedade, rigidez, negativismo, ceticismo e desinteresse
são sintomas psicológicos. A sintomatologia se expressa no comportamento: fazer consultas rápidas,
colocar rótulos depreciativos, evitar os pacientes e o
contato visual são alguns dos exemplos ilustrativos.
De acordo com a mesma autora, um profissional
que está em burnout, tende a criticar tudo e todos
que o cercam, tem pouca energia, desenvolve frieza e
indiferença para com as necessidades e o sofrimento
dos outros, tem sentimentos de decepção e frustração e comprometimento da auto-estima.
de 38 Unidades de Saúde da Família (USF), portanto 91,6% dos profissionais aceitaram participar
anonimamente da pesquisa, em conformidade com
a Resolução 196/96 do Ministério da Saúde, com
termo de consentimento livre e esclarecido.
Sendo um estudo exploratório prospectivo,
optou-se pelo aumento da amostra em detrimento
do aprofundamento das questões. Por isto, foi
descartada a possibilidade de se trabalhar com entrevistas [5,15,16], ou com questões abertas. Numa
segunda etapa, serão utilizados instrumentos com
questões abertas para análise de conteúdo e relação
estresse/gênero, qualidade de vida, entre outros.
O nível de estresse e sua sintomatologia foram
avaliados através de elaboração de um instrumento
próprio, contendo questões fechadas, com sintomas
indicativos das quatro fases do estresse: alarme, resistência, quase-exaustão e exaustão. O questionário
é composto de três blocos, cada um se referindo
a uma perspectiva do problema: sintomatologia
física e emocional (56 itens, em ordem aleatória,
com estimativa de freqüência), auto-percepção (dez
itens, com estimativa de freqüência) e atribuição da
origem do estresse (cinco itens). Permite avaliar os
sintomas de estresse tanto no nível cognitivo como
no nível somático e possibilita ainda identificar a
fase de estresse em que o indivíduo se encontra. A
avaliação é feita em termos das tabelas percentuais
do teste.
Resultados
Através da Fig. 1, observamos que, nos profissionais avaliados, as fases quase-exaustão (35,6%)
e resistência (33,5%) foram as mais prevalentes, o
que é preocupante, pois é a partir dessa fase que
as doenças começam a surgir, de forma grave. A
incidência de exaustão entre os profissionais, que
requer uma avaliação médica ou de um psicólogo,
também é alta (12,2%). Apenas 18,7% dos profissionais enquadram-se na fase de alarme.
Figura 1 - Prevalência das formas de stress na população pesquisada.
Metodologia
Trata-se de uma pesquisa do tipo exploratória
descritiva de abordagem quantitativa, desenvolvida
no período de julho a setembro no ano de 2004, no
município de Palmas (TO). A amostra foi composta
por 66 dos 72 profissionais que compõem a equipe
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A figura 2 mostra que os sinais/sintomas da
fase de quase-exaustão mais apresentados foram:
preocupação excessiva (8,4%), esquecimentos ou
lapsos (7,9%), insônia (6,9%), hiperatividade
(6,5%) ou sonolência (6,5%), prisão de ventre
(5,4%), seguido das dificuldades interpessoais
(5,0%), dúvidas quanto a si próprio (4,8%), diarréia
(4,7%) e crises de choro (4,6%). Outros sintomas
compõem 39,3%.
A fase quase-exaustão medeia a de resistência e
a de exaustão. Nesta fase, o indivíduo pode encontrar
dificuldade para resistir ao agente agressor. Portanto,
faz-se necessário a adoção de medidas preventivas
para evitar que se passe à fase de exaustão.
com prazos curtos para sua execução e com muitas
interrupções, a ambigüidade de prioridades, o nível
de autoridade e de autonomia, a incerteza quanto
ao futuro, bem como o convívio com colegas insatisfeitos são fatores estressantes relacionados ao
estresse ocupacional.
Neste sentido, os resultados concordam que
a fonte de estresse não está predominantemente
na pessoa do profissional ou nos pacientes por ele
atendidos, mas em como este profissional responde
às exigências do dia-a-dia.
Figura 3 - Fontes de insatisfação declarados pelos
profissionais pesquisados.
Figura 2 - Principais sinais/sintomas de quase-exaustão apresentados pelos profissionais pesquisados.
Analisando-se as fontes de insatisfação declaradas pelos profissionais pesquisados (Fig. 3), a insatisfação com a administração é a mais alta, (64,9%),
seguida pela insatisfação com os colegas (16,4%),
com os pacientes (11,8%) e consigo mesmo (6,9%).
Os resultados revelam que os problemas administrativos têm maior prevalência de desencadear o processo de estresse entre os profissionais da saúde.
Kyriacow e Sutcliffe [17] definem o estresse
ocupacional como um estado emocional desagradável, pela tensão, frustração, ansiedade, exaustão
emocional em função de aspectos do trabalho
definidos pelos indivíduos como ameaçadores. O
estresse ocupacional agrava-se quando há por parte
do indivíduo a percepção das responsabilidades
e poucas possibilidades de autonomia e controle.
Para Lazarus e Lazarus [18], a sobrecarga de trabalho, causada pela designação de muitas tarefas
Stehle [19], numa ampla revisão, não encontrou razões para crer que o pessoal de saúde extrahospitalar fosse menos estressado do que aqueles
em hospitais ou emergências. De fato, Stacciarini
e Tróccoli [5], analisando profissionais tanto de
hospitais quanto de centros de saúde, detectaram
como principal fonte de estresse condições externas
e internas, como sobrecarga de trabalho, o esforço
exigido e algumas características ligadas ao exercício
da profissão. Mas o paciente, igualmente, também
não foi arrolado como uma fonte importante de
estresse.
Os resultados apontam para a importância da
organização como mediadora do relacionamento
entre a equipe e as variáveis envolvidas, o que se
coaduna com a tendência nos estudos, de priorizar
aspectos organizacionais (coletivos e mais amplos)
em oposição aos aspectos mais individualizados e
restritos [20], enfatizando a promoção dos valores
humanos como estratégia preventiva da síndrome
[21, 22].
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Conclusões
O presente estudo nos revela que a 1ª fase do
estresse (alarme) apresenta prevalência de 18,7%,
seguido da 2ª fase (resistência) com 33,5%; na 3ª
fase (quase-exaustão) inclui-se a maioria dos profissionais pesquisados, com 35,57%; na última fase
(exaustão), situam-se 12,2% dos profissionais
As dez manifestações clínicas mais freqüentes
foram: preocupação excessiva, esquecimentos/lapsos,
insônia, hiperatividade, sonolência, prisão de ventre, dificuldades interpessoais, dúvidas quanto a si
próprio, diarréia, crise de choro e outros sintomas.
Pesquisas realizadas sobre o trabalho dos enfermeiros em hospitais relatam que os efeitos do estresse
estão associados à tarefa assistencial, ou seja, alto
nível de tensão, angústia e ansiedade entre mudanças freqüentes de emprego e uma alta freqüência de
problemas de saúde. Porém, nesse estudo, quanto à
fonte do estresse, prevaleceu a origem tanto na vida
pessoal como na vida profissional de cada um. Deste
modo, ficou evidente que o estresse existe nestes profissionais, justamente por não conseguirem separar
os problemas profissionais da vida pessoal
Dos itens relacionados quanto aos problemas
referentes ao estresse, na sua grande maioria a
insatisfação é gerada quanto à administração do
serviço. Acredita-se que os problemas e dificuldades
enfrentados se relacionem às lacunas percebidas no
desenvolvimento das competências básicas, como
a escassez de recursos materiais, essenciais para o
desempenho de trabalhos de rotina; a fragmentação das atividades, devido à falta de protocolos ou
sistematização dos serviços e planejamento; a deficiência formal e técnica da equipe, pela ausência de
educação continuada; os escassos recursos humanos,
sobrecarregando os enfermeiros assistenciais; o déficit
de preparo em relações humanas, que age de modo
nevrálgico na auto-estima e, por último, o desabafado
despreparo administrativo, tornando alguns profissionais inoperantes no aspecto de liderança.
A partir dos resultados obtidos em nossa pesquisa e conscientes da realidade vivenciada pelos
profissionais médicos e enfermeiros, consideramos
de grande valia analisar e fornecer subsídios para a
implementação de medidas preventivas, no intuito
de amenizar a presença do stress. Deve-se rever a
interferência da administração dos serviços providencias e agilizações dos mesmos.
Os resultados sugerem a criação de capacitação e qualificação de profissionais para gerenciar
coordenações de programas, unidades de saúde e
secretaria, e que os mesmos sejam efetivamente
profissionais da área de saúde, que visem avaliar as
normas e diretrizes atuais.
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22. Maslach C, Leiter MP. Trabalho: Fonte de prazer
ou desgaste? Guia para vencer o estresse na empresa.
Campinas: Papirus; 1999.
Anexo
Modelo do instrumento
Prezado Colega,
Você está colaborando numa sondagem sobre a incidência do estresse na nossa rotina. Por favor, analise as questões
abaixo e responda, usando as escalas de freqüência ou de intensidade, quando for o caso, na descrição mais aproximada de situações ligadas ao exercício profissional.
Você, em seu dia-a-dia, apresenta/possui um desses problemas? (marque com o número que mais se aproxime de sua
percepção)
Nunca – não ocorreu nos últimos anos (1)
Quase nunca – uma vez em meses (2)
Raramente – pelo menos uma vez ao mês (3)
Às vezes – mais de uma vez ao mês (4)
Freqüentemente – pelo menos uma vez na semana (5)
Sempre – pelo menos uma vez ao dia (6)
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
) taquicardia
) prisão de ventre
) diarréia
) dor de cabeça
) sensação de esgotamento
) pressão no peito
) falta de ar
) medo
) angústia
) isolamento social
) aumento da sudorese
) gagueira
) tremor de mãos
) tensão muscular
) hipertensão
) ranger de dentes
) hiperatividade
) náuseas
) mãos e pés frios
) confusão mental
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
(
) esquecimentos/ lapsos/ atos falhos
) insônia
) sonolência excessiva
) pesadelos
) alienação (“desligamento”)
) alienação (fantasias)
) dificuldades interpessoais
) preocupação excessiva
) dúvidas quanto a si próprio
) dificuldade para concentrar-se
) dificuldades de relaxar
) irritabilidade
) impulsos agressivos (que não
se exteriorizam)
) vontade de “se vingar”
) sentimentos de inadequação
) sentimentos de inferioridade
) depressão (tristeza continuada)
) falta de energia
) vontade de fugir para outro lugar
( ) descontrole verbal (gritar)
( ) agressão verbal (insultar)
( ) descontrole motor (quebrar/
atirar coisas)
( ) agressão física a outrem
( ) agressão física auto-infligida
( ) hipersensibilidade emotiva
( ) roer unhas
( ) arrancar cabelos
( ) oscilação do apetite (para mais
ou para menos)
( ) tiques nervosos
( ) vertigens/ tonturas
( ) falta de libido
( ) excesso de libido
( ) dificuldades para manter o interes
se/ ereção no ato sexual
( ) dificuldades para atingir o orgasmo
( ) crises de choro
( ) desmaio
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Marque com que freqüência estes pensamentos passam pela sua cabeça:
Quase nunca – uma vez em meses (1)
Raramente – pelo menos uma vez ao mês (2)
Às vezes – mais de uma vez ao mês (3)
Freqüentemente – pelo menos uma vez na semana (4)
( ) estou perdendo tempo neste serviço, as coisas não vão mudar
( ) porque parece que só eu me importo?
( ) porque as “bombas” vem sempre para mim?
( ) ninguém reconhece meu valor/ vê meu potencial
( ) mereço coisa melhor
( ) o serviço é bom, ruim é aturar os colegas
( ) a equipe é boa, ruim são as condições de trabalho
( ) o trabalho é ótimo, mas o salário deixa muito a desejar
( ) o trabalho é ótimo, difícil são as condições que nos dão para realizá-lo
( ) preciso me preparar melhor, estou inseguro quanto ao procedimento
Marque as afirmativas que mais se aplicam a você, mesmo que ocasionalmente:
( ) a fonte de meu estresse tem origem exclusivamente em minha vida pessoal, e interfe no exercício profissional
( ) a fonte de meu estresse tem origem exclusivamente em minha vida pessoal, e não interfe no exercício profissional
( ) a fonte de meu estresse tem origem exclusivamente em minha vida profissional, e interfe na vida pessoal
( ) a fonte de meu estresse tem origem exclusivamente em minha vida profissional, e não interfe na vida pessoal
( ) a fonte de meu estresse tem origem tanto na vida profissional quanto na pessoal.
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Revisão
Avaliação de feridas: uma descrição para
sistematização da assistência
Simone Shirasaki Orosco*, Eleine Aparecida Penha Martins, M.Sc.**
* Especialista em Assistência de Enfermagem a Pacientes com Feridas pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), docente
do Departamento de Enfermagem da Universidade do Oeste Paulista, ** Docente do Departamento de Enfermagem da
Universidade Estadual de Londrina.
Resumo
O tratamento de feridas tem sofrido profundas transformações e inovações, exigindo do enfermeiro conhecimento técnicocientífico para nortear a assistência. Para isso, o profissional deve realizar a avaliação de feridas baseado em princípios objetivos,
identificando fatores que possam interferir no processo de cicatrização. Este estudo, através de levantamento bibliográfico,
tem como objetivo descrever fatores locais e sistêmicos relevantes para a avaliação de feridas, proporcionando informações
necessárias para prática, bem como para auxiliar na criação de instrumentos de avaliação. Dessa forma, será possível sistematizar
a avaliação de feridas, prestando assistência de enfermagem com qualidade e ética profissional.
Palavras-chave: enfermagem, assistência, avaliação, cicatrização de feridas.
Abstract
Evaluation of wounds: a description for systematization of assistance
The treatment of wounds has gone through profound transformations and innovations, demanding technical and scientific
knowledge from the nurse to guide the assistance. For that, the professional should carry out the evaluation of wounds based
on objective principles, identifying factors that might interfere in the healing process. This study, through bibliographical
survey, aims at describing local and systemic factors relevant to the evaluation of wounds, furnishing necessary information
for the practice, as well as for helping the creation of evaluation tools. Thus, it will be possible to systematize the evaluation
of wounds, offering nursing assistance with quality and professional ethics.
Key-words: nursing, assistance, evaluation, wound healing.
Artigo recebido em 1 de agosto de 2005; aceito em 19 de janeiro de 2006.
Endereço para correspondência: Simone Shirasaki Orosco, Rua Rita Rocha Luizari
51, Jardim Maracanã, 19026-330 Presidente Prudente SP, Tel: (018) 227-4617, E-mail:
[email protected]
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Resumen
Evaluación de heridas: una descripción para la sistematización de la ayuda
El tratamiento de heridas ha sufrido profundas transformaciones e innovaciones, exigiendo del enfermero conocimiento
técnico y científico para nortear la asistencia. Para eso, el profesional debe de realizar la evaluación de heridas basado en
principios objetivos, identificando factores que pueden interferir en el proceso de cicatrización. Este estudio, a través de
levantamiento bibliográfico, tiene como objetivo describir factores locales y sistémicos relevantes para evaluación de heridas,
siendo información necesaria para la práctica, así como para auxiliar en la creación de instrumentos de evaluación. Así, será
posible sistematizar la evaluación de heridas, prestando asistencia de enfermería con calidad y ética profesional.
Palabras-clave: enfermería, asistencia, evaluación, cicatrización de heridas.
Introdução
Nas últimas décadas a discussão sobre curativos e o cuidado com as feridas tem deixado de ser
analisado com base em dados empíricos, priorizando
os dados científicos, apoiando-se na fisiologia da
cicatrização [1].
O enfermeiro exerce papel importante no
tratamento de lesões por ser o profissional que
tem condições de avaliar o cuidado diariamente,
incorporando princípios técnico-científicos e valores
éticos indispensáveis à prática profissional [2].
No Brasil, muitos são os enfermeiros que têm
buscado o aperfeiçoamento científico para auxiliar
no tratamento de lesões de pele, transformando
a prática do cuidar de feridas em uma atividade
baseada na avaliação clínica [3].
Assim, o sucesso no tratamento de feridas deve
estar baseado em vários fatores, como na identificação do agente etiológico, da enfermidade de base e
da fase evolutiva da ferida [4].
Atualmente, observa-se ainda que na prática de
algumas instituições, avaliar a realização de curativos
não é uma atividade efetiva, e tão pouco sistematizada, pois há muitas divergências e mudanças
de conduta com relação a melhor cobertura a ser
utilizada, retardando o processo de cicatrização, com
disperdício dos recursos materiais e humanos. Para
solucionar tal problema, é necessário a elaboração
de um instrumento de avaliação de feridas para
adequar a assistência e promover a continuidade
do tratamento.
Ao observar os instrumentos de avaliação de
feridas já existentes, pôde-se detectar que os mesmos
variavam em seu conteúdo. Assim, verificou-se a
necessidade de realizar um estudo bibliográfico sobre avaliação de feridas para englobar informações
tanto para elaboração de instrumento de avaliação
como para a prática geral do cuidado com lesões,
relacionando-as com o processo cicatricial e desta
forma sistematizar a assistência de enfermagem a
pacientes com feridas.
Avaliação de feridas
Avaliar uma ferida significa descrevê-la, registrar suas características e sua fase evolutiva, de forma
que a documentação clínica proporcione um referencial útil no tratamento de feridas [3,5].
Assim, a avaliação precisa de feridas depende da
compreensão do enfermeiro em relação à fisiologia
da cicatrização e aos fatores que podem retardar este
processo, tal como as condições ótimas necessárias
à superfície da ferida para maximizar a cicatrização
[6].
A pele pode ser atingida por qualquer fenômeno patológico que determinará alterações microscópicas fundamentais e macroscopicamente
podem ser traduzidas como lesões elementares [7].
Na tentativa de reconstituir a lesão, imediatamente
inicia-se a cicatrização. A reparação do tecido exige
que o ambiente local propicie a formação de colágeno, angiogênese, epitelização e a contratura da
ferida. Esses processos ocorrem com mais sucesso
em ambiente local onde existam ótimas condições
de temperatura, hidratação e oxigenação [1].
Vários fatores locais e sistêmicos podem
influenciar, tanto de forma positiva como negativa
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no reparo tecidual. Por isso, os profissionais que
lidam com pacientes portadores de lesão devem
avaliar o paciente e sua ferida, acompanhando a
evolução da cicatrização norteada por princípios
objetivos [4,8].
Avaliação local
Na avaliação local da ferida existem diversos
fatores que devem ser considerados [4, 5].
• Classificação da ferida
A classificação da ferida pode ser abordada
por diversos parâmetros: quanto à evolução da
ferida – aguda ou crônica; quanto à profundidade
da ferida, isto é, avaliar o tipo de tecido visualizado
na porção mais profunda da lesão ou por sistema
de estágio, segundo graus de comprometimento
tecidual [3,5,8].
A classificação quanto à profundidade da ferida,
geralmente é utilizada para descrever queimaduras
ou, às vezes, úlcera de pressão. Para isso, o enfermeiro deverá ser capaz de identificar a epiderme, a
derme e o tecido subcutâneo e diferenciar o tecido
granulado e o músculo, tendões e ossos [5,9]. Dessa
forma, a ferida é classificada em superficial ou parcial
quando atinge apenas a epiderme, podendo chegar
à derme sem, no entanto atravessá-la; e profunda
ou total quando envolve também o subcutâneo,
músculos e ossos [8].
A classificação de feridas por sistema de estágio
foi estabelecida pela National Pressure Ulcer Advisory Panel (NPUAP) que determina os estágios da
úlcera de pressão através da descrição da anatomia
do tecido lesado e observado, sendo dividido em
estágios I, II, III e IV [3, 8,10].
• Mensuração da ferida
A avaliação apropriada e periódica do tamanho
da ferida é imprescindível para documentar com
maior fidelidade a evolução do processo de cicatrização e demonstrar os resultados do tratamento
proposto ou a necessidade de reavaliar a estratégia
de tratamento da ferida [11,12].
As feridas crônicas devem ser medidas a cada
2 a 4 semanas, pois pouca mudança será observada
numa mensuração mais freqüente. Porém, as feridas
agudas evoluem com maior rapidez e a medida deve
ser realizada a cada troca de curativo [5].
A avaliação dimensional pode ser realizada de
três formas: medida linear, medida da área e medida
do volume [12].
A medida linear pode ser avaliada com uma
régua ou papel milimetrado, medindo duas dimensões (comprimento e largura). Um dos métodos
mais simples é a utilização da técnica do relógio.
Nesse procedimento, para verificar o comprimento,
deve-se olhar para lesão como se fosse o mostrador
de um relógio, respeitando o sentido cefalocaudal,
onde a marca de 12 horas corresponde à cabeça e a
de 6 horas, os pés. No caso da largura considera-se
a marca de 3 e 9 horas [8].
A medida da área é calculada em centímetros
quadrados (cm2), multiplicando-se duas dimensões
perpendiculares. Essa área da ferida pode ser calculada através da planimetria, por meio do traçado da
ferida. São realizados dois cálculos da área do mesmo
traçado e a média determina a área da ferida [12].
Segundo Flanagan [13], embora impreciso,
especialmente no caso de feridas com formato
imperfeito ou cavidades, tal método fornece, pelo
menos, uma linha de base para uma avaliação objetiva da cicatrização.
A medida do volume da ferida é utilizada para
avaliar sua profundidade. Esse método é empregado
para mensurar feridas cavitárias, utilizando-se sonda
ou “swab” estéreis colocados verticalmente na região
mais profunda da lesão [8,12].
Para realização desse método é necessário
conhecimento das estruturas anatômicas na proximidade do local da ferida, pois ao introduzir o
“swab” pode-se provocar um ferimento [12].
Outro método para medir o volume é o emprego de um alginato composto (utilizado para retirar
impressões dentárias) para construir o molde da ferida
ou pelo enchimento da cavidade com soro fisiológico
até o nível da pele sobre uma película [5,14].
O desenho da ferida é outra forma de medir
feridas abertas através de contorno perimetral em
folha de acetato transparente, na qual o desenho é
efetuado na camada superior, enquanto a camada
inferior que esteve em contato com a ferida, é
desprezada, e o traçado transferido para o papel
milimetrado [3].
Uma versão mais sofisticada de decalque é o
uso de papel que converte em peso a área da superfície. Ao fazer o decalque, recorta-se o formato da
ferida que então é pesado [5].
A fotografia demonstra a aparência da ferida
e fornece uma idéia de seu tamanho. A avaliação
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qualitativa da aparência da ferida auxilia na visualização do progresso do tratamento para o paciente
e os profissionais de saúde [12].
Contudo, o primeiro passo a dar quando se
planeja tirar uma fotografia do paciente é a obtenção
de uma autorização escrita por parte deste [13].
A imagem digital permite a transferência da
imagem de vídeos ou câmaras digitais para o computador [12].
Um dos métodos atuais envolve o emprego
de luz estruturada, onde uma câmara conectada ao
computador escanea a imagem da ferida banhada
em luz. Esse método possibilita uma representação
gráfica gerando cálculos das dimensões da ferida e
sua aparência, sendo incapaz de mensurar feridas
profundas e que mudam de formato [5].
A estereofotogrametria é um sistema desenvolvido para obter medida do volume da ferida. Ela
fornece uma imagem de aspecto tridimensional, a
partir de duas fotografias tiradas simultaneamente
em ângulos diferentes, que podem ser medidos
[5].
Goldman e Salcido [12] relatam que a estereofotogrametria computadorizada obtém informações
objetivas sobre tamanho da ferida, formato, volume,
área, cor, tecido ao redor da ferida, através da captura da imagem por fotografia computadorizada,
equilibrando luz e cor da imagem.
Esse método tem seus inconvenientes devido
ao difícil acesso do equipamento e pessoal disponível
para manuseio do mesmo [3].
• Características do tecido presente na ferida
A característica do tecido presente na ferida é
um importante indicador do estágio de cicatrização
alcançado ou qualquer complicação que possa estar
presente [3].
O sistema de cores da ferida é um método
rápido e fácil de observar a característica da coloração predominante em sua superfície, relacionando
com o aspecto clínico da ferida. Esse sistema segue
as cores vermelha, amarela e preta e suas variações
[8,12,13].
Assim, as feridas podem se apresentar como:
1) ferida necrótica que possui uma área de tecido
isquêmico resultando na formação de escara ou
crosta necrótica, de coloração preta ou marrom,
podendo ser cinzenta ou esbranquiçada; 2) ferida
fibrótica (com esfacelos) que possui esfacelo típico
de coloração branca/amarelada, encontrado como
fragmentos sobre a superfície da ferida. O esfacelo
é composto de células mortas que se acumularam
no exsudato, relacionado, muitas vezes com o estágio final do processo inflamatório; 3) ferida com
tecido de granulação que possui cor vermelha. A
extremidade dos laços capilares faz a ferida parecer
granular. As paredes dos vasos capilares são bem
finas e facilmente lesadas, causando sangramento
com facilidade; 4) ferida com tecido de epitelização
que é caracterizada pela coloração rosa-azulada à
medida que o epitélio nas bordas da ferida começa
se dividir rapidamente. Quando o epitélio se espalha
pela superfície da ferida, as bordas ficam achatadas
e o novo tecido tem cor branco-rosado. Nas feridas
com grande área de superfície, ilhotas de epitelização podem ser vistas, pois o tecido pode migrar a
partir do que resta de folículos capilares dentro da
derme [5,13].
• Característica da pele ao redor da ferida
Quando se avalia a ferida e planeja o tratamento adequado, é importante monitorar a característica
da pele ao redor da ferida, pois a reprodução de
células epiteliais se dará a partir da borda da lesão
[5]. Deve-se verificar se há excesso de umidade nas
bordas da lesão, pois conseqüentemente ocorre a
maceração das bordas (borda fina). A hiperplasia da
camada córnea pode levar a formação de queratose
ou calosidade das bordas (borda espessa), inibindo a
perfusão e impedindo a migração epitelial. Quando
as bordas estão deslocadas e desniveladas do leito da
lesão indicam insuficiência tecidual de base para a
migração de células epiteliais [15].
• Grau de infecção
A infecção desencoraja as atividades dos
fibroblastos na produção de colágeno e estimula
os leucócitos a libertar lisozimas que destroem o
colágeno existente. Os microrganismos competem
com o tecido em cicatrização e com as células para
obtenção de nutrientes e oxigênio, interferindo no
processo de epitelização [1,16].
A infecção na ferida pode ser determinada
por contagem bacteriana e quantidade de tecido
desvitalizado, pois uma lesão pode ser considerada
infectada quando contém 106 bactérias por grama
de tecido, enquanto uma ferida que apresenta tecido
necrótico precisa apenas de 104 colônias de bactérias por grama de tecido. Contudo, a cicatrização
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somente ocorre quando a ferida possui menos do
que 106 colônias de bactérias por grama de tecido
[16,17].
Quando a infecção atinge todo o corpo através
da corrente sangüínea, pode ser classificada como infecção sistêmica, sendo freqüentemente associada a
pirexia que causa aumento do ritmo metabólico, do
catabolismo ou colapso tecidual. Algumas complicações resultantes da infecção sistêmica de úlceras de
pressão incluem presença de celulite, osteomielite,
meningite, endocardite, artrite séptica, bacteremia
e septicemia [5, 17].
A característica do exsudato presente na ferida
é um indicador que auxilia no diagnóstico clínico
de infecção e escolha de terapias a serem utilizadas
[3].
Há diferentes tipos de exsudatos que possibilitam conhecimento da ferida durante a avaliação
e permite um registro mais preciso. O exsudato
seroso é plasmático, aquoso, transparente e está
relacionado normalmente a lesões limpas. O exsudato sanguinolento indica, muitas vezes, presença
de lesão vascular. O exsudato purulento é resultado
de leucócitos e microrganismos vivos ou mortos,
apresentando coloração que podem variar entre,
amarelo, verde ou marrom de acordo com o agente
infeccioso [4,8].
Flanagan [6] evidencia que a característica do
exsudato purulento é normalmente determinada
pelo microrganismo predominante: a presença de
exsudato purulento espesso, cremoso e amarelado,
pode ser indicativo de uma infecção por Staphylococcus; a produção de um exsudato de coloração
verde-azulada é, normalmente, associada à infecção
por Pseudomonas aeruginosa.
Além disso, a avaliação do odor também é importante, pois alguns microrganismos anaeróbicos
apresentam cheiro característico, como Pseudomonas
sp [4].
• Cultura de exsudato
A cultura de exsudato define o agente etiológico da infecção e determina antibioticoterapia
específica [4]. Para identificação microbiológica
adequada, deve-se utilizar técnica correta de
colheita para minimizar o risco de contaminação.
Determina-se que a colheita de material deverá ser
realizada após lavagem de todo exsudato purulento
com solução fisiológica. O “swab” pode ser à base
de alginato de cálcio, que é o mais seletivo, pas-
sando por dez pontos no leito da ferida em forma
de “zig-zag” [4,17].
O método de “swab” é o menos confiável
para isolar patógenos exclusivamente, porém a
chave do sucesso da cultura é colher material onde
é aparentemente limpo e viável, pois é o local onde
mais se concentram microrganismos. As culturas
por aspiração e biópsia requerem uso de antisséptico, sendo a biópsia o método mais confiável. O
método de cultura por aspiração é indicado para
feridas fechadas, como abscessos e celulites, sendo
um volume de apenas 0,25 mL, é suficiente para
analise [17].
Avaliação sistêmica
As causas que levam ao aparecimento de uma
solução de continuidade do tecido cutâneo-mucoso são várias, interdependentes e, muitas vezes,
resultam de um processo relacionado às condições
sistêmicas do portador de lesão [8].
• Idade
A idade avançada torna as pessoas mais suscetíveis às lesões, pois ocorrem alterações dos sistemas
fisiológicos decorrentes de modificações nutricionais, metabólicas, vasculares e imunológicas que
afetam a função e o aspecto da pele. A epiderme e
derme tornam-se mais delgadas. As fibras elásticas
ficam reduzidas em número, o colágeno se torna
mais rígido. Diminui a gordura subcutânea e a pigmentação dos pêlos. A pele torna-se mais seca devido
à redução das atividades das glândulas sudoríparas
e sebáceas. Ocorre uma distribuição macular e irregular de pigmento. Essas alterações resultam em
enrrugamento e flacidez da pele [8,18].
Quando essas pessoas são acometidas por
lesões, fisiologicamente diminuem em intensidade e
velocidade quase todas as fases da cicatrização [16].
Feridas idênticas cicatrizam muito mais rápido em
crianças que no idoso, pois os processos metabólicos
diminuem com a idade [1].
O paciente idoso apresenta menores respostas
inflamatórias iniciais, o que retarda o processo de
cicatrização [19]. É possível que apresente, também,
redução da circulação, retardando a migração de
leucócitos para o local da lesão e da fagocitose. Por
outro lado, há aumento da fragilidade capilar e do
tempo de epitelização [8].
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• Estado nutricional
• Fatores psicológicos
A cicatrização de feridas envolve uma série de
reações físico-químicas complexas, onde é necessária
a presença de uma gama de nutrientes para a formação de novo tecido, diminuição da oxidação tecidual
e melhora na região lesada [20].
Quando ocorre desnutrição, o processo fisiológico normal do organismo é prolongado e o
resultado final da cicatrização é mais fraco. Os pacientes com lesões complexas correm grande risco
de desnutrição, devido ao aumento das necessidades
metabólicas, ao aumento da perda de nutrientes e a
uma dieta inadequada devido à perda de interesse
e apetite [6].
A desnutrição protéico-calórica é um dos
principais fatores que influenciam a cicatrização de
feridas, pois a deficiência de proteínas diminui a síntese de colágeno e leucócitos e o déficit de lipídios e
carboidratos retarda todas as fases de cicatrização, já
que a proteína é desdobrada em energia [19, 20].
Assim, a desnutrição protéico-calórica em suas
várias formas pode ser detectada por monitoração
dos níveis séricos de albumina, transferrina e linfócitos. Estes elementos estão todos associados ao
estado protéico do corpo [21].
A deficiência de vitamina C além de causar diminuição na síntese de colágeno, prejudica também
a fase de fibroplasia da cicatrização [1].
Os minerais desempenham papel importante
na cicatrização, pois auxiliam na produção de
colágeno, síntese de elastina e atuam na resposta
imune [20].
Contudo, cada fase do processo de cicatrização necessita de determinados nutrientes. Na fase
inflamatória a vitamina K, proteínas e aminoácidos
exercem papel fundamental para que o processo de
cicatrização se desenvolva adequadamente. Já a fase
proliferativa requer o adequado fornecimento de
proteínas, aminoácidos, vitamina C, ferro, zinco e
oxigênio [20,22].
Na fase reparadora, é necessário o fornecimento
protéico adequado para que não ocorra um retardo
na contração de feridas abertas por alteração do substrato morfológico responsável pela reparação [16].
Além disso, deve-se ressaltar que a obesidade
também reduz a capacidade de cicatrização, pois a
camada de tecido subcutâneo exuberante tem pouca
vascularização durante o processo de cicatrização,
recebendo um aporte insuficiente de oxigênio e
nutriente [1].
Existem muitos fatores psicológicos que atuam
no processo saúde-doença, a tensão e o estresse entre
humanos e também entre animais estão em primeiro
plano como geradores de doenças infecciosas. A
relação entre depressão psicológica e depressão imunológica, podem afetar a cicatrização de feridas. A
resistência ou não da pessoa à infecção não depende
apenas de componente genético, mas também do
grau de defesa psicológica frente a uma situação de
estresse e sofrimento [4, 23].
Estudo realizado por Cole-King & Harding
[24] em pacientes portadores de úlceras venosas
crônicas, demonstrou que a ansiedade e depressão
causam atraso no processo de cicatrização, agindo
de forma direta ou indireta.
De maneira direta, os fatores psicológicos podem interromper a atividade dos macrófagos e dos
linfócitos no processo de cicatrização. A depressão
pode causar prejuízo na imunidade celular e humoral
e o estresse pode influenciar na secreção de citocinas
no local da ferida, retardando sua cicatrização. Os
fatores indiretos que podem conduzir ao retardo
na cicatrização incluem o padrão do sono alterado
e falta de apetite. O padrão do sono alterado pode
interferir no sistema imune e a falta de apetite conduz
a desnutrição, levando principalmente a deficiência
de vitaminas, interferindo na cicatrização [24].
• Terapia medicamentosa
Pacientes submetidos à ação de drogas antiinflamatórias, hormônios, antibióticos, imunossupressores e agentes quimioterápicos, apresentam
velocidade de cicatrização retardada [1-5].
O uso de corticosteróides e antiinflamatórios
diminuem a força de tênsil das feridas fechadas,
reduzem a epitelização, limitam a neovascularização,
inibem a proliferação de fibroblastos e a contração
da ferida [1,5,16].
Estudos clínicos realizados demonstraram
que o uso de antiinflamatórios e corticosteróides
durante o processo de cicatrização em animais, proporciona menor fibrogênese, diminuição na síntese
de colágeno, resultando em cicatrização com menor
densidade de fibras colágenas, menor quantidade de
tecido de granulação e menor quantidade de células
inflamatórias [25].
Os antibióticos podem produzir efeitos tóxicos
e inibir a cicatrização [4]. Porém, os antibióticos
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destinados a prevenir infecções aumentam a capacidade de resistência da ferida à contaminação
local [3].
Assim, os antibióticos devem ser utilizados
com cautela durante o processo cicatricial, pois caso
contrário, haverá risco de retardar a cicatrização e
favorecer o surgimento de bactérias multirresistentes
[4].
O tratamento citotóxico acarreta defeitos na
cicatrização. As drogas imunossupressoras e antineoplásicas concorrem para uma aplasia medular,
anemia, agranulocitose e inadequada produção de
plaquetas, predispondo os pacientes a processos
infecciosos. Portanto, pacientes submetidos a tal
terapêutica são vítimas de alterações na cicatrização.[3,16].
Essas drogas alteram o equilíbrio de nitrogênio
na ferida, inibem a síntese protéica, a fibroplasia,
reduzem a deposição de colágeno e diminuem a
neovascularização [4].
Estudo realizado por Santis et al. [26] com
objetivo de verificar os aspectos morfológicos da
cicatrização em ratos submetidos a anastomoses
colo-cólicas após injeção intraperitoneal de cisplatina demonstrou que a droga não impede, mas
retarda a cicatrização.
• Radioterapia
A radiação afeta a cicatrização de qualquer
ferida já existente ou pode causar ulceração com
facilidade. Isso pode ser explicado pela ocorrência
de isquemia secundária a endarterite obliterante
progressiva, com diminuição do fluxo sangüíneo e
um efeito direto da radiação sobre os fibroblastos e
sua proliferação [16].
A irradiação local de uma ferida com doses
aproximadamente de 1000 rad (radation absorbed
dose) retarda a cicatrização e em doses em torno
de 3000 rad, destrói irreversivelmente o tecido
de granulação. Quando todo corpo é irradiado
ocorre uma diminuição da força tênsil da cicatriz
[3,16].
Spierer et al. [27] verificaram em seu estudo
que a maioria dos pacientes submetidos à cirurgia
conservadora de membro e reconstrução de defeitos cirúrgicos para o tratamento de sarcoma de
extremidades, toleraram a radioterapia subseqüente.
Porém, ocorreram muitas complicações na ferida
submetida a braquiterapia, sendo preciso realizar
nova intervenção cirúrgica.
• Mobilidade
Entre os fatores que retardam a cicatrização
está a mobilidade reduzida que leva a manutenção
da pressão contínua sobre a área da lesão ou de proeminências ósseas, cujo resultado é a interrupção do
suprimento sangüíneo da rede vascular, impedindo
que o fluxo de sangue chegue aos tecidos [8].
A mobilidade reduzida causa problemas de
cicatrização de feridas, pois leva a estase na circulação periférica e demora na remoção de substâncias
tóxicas [5].
Além de a mobilidade reduzida influenciar no
retardo do processo de cicatrização de feridas já existentes, também aumenta o risco de desenvolvimento
de novas feridas, ou seja, úlceras de pressão [28].
As úlceras de pressão são de difícil cicatrização devido às circunstâncias em que ocorrem e ao
tratamento que recebem, causando preocupação
aos profissionais de saúde, pois este tipo de ferida,
além de incômoda e ameaçadora à saúde, faz com
que o paciente permaneça internado durante tempo
maior [10].
• Doenças crônicas
As enfermidades metabólicas sistêmicas interferem no processo de cicatrização, pois algumas
delas reduzem significativamente a capacidade do
organismo de sintetizar colágeno [1,4].
Indivíduos com diabetes mellitus são suscetíveis
em até cinco vezes mais à infecção da ferida com posterior atraso no reparo da lesão, constituindo uma
das principais causas de descompensação do diabetes
[29]. A suscetibilidade aumentada à infecção ocorre
devido à função leucocitária defeituosa. Os leucócitos diminuem a quimiotaxia e a capacidade para
fagocitose e lise intracelular de bactérias [16].
Além disso, o diabetes leva a alterações circulatórias determinadas pela microangiopatia e por
aterosclerose principalmente das extremidades dos
membros inferiores. A isquemia dificulta o processo
cicatricial de qualquer lesão, lentificando-o e, às
vezes, impossibilitando-o [30].
Outra complicação que pode ocorrer no paciente diabético é a neuropatia diabética, que nos
membros inferiores leva a diminuição progressiva
da sudorese, o que acarreta no surgimento de uma
pele mais fina, ressecada, portanto mais suscetível
a rupturas. A sensibilidade diminuída, a atrofia da
musculatura intraóssea dos metacarpianos e das
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falanges e alteração de marcha resultam em traumatismos mecânicos repetitivos, o que interfere no
reparo tecidual [3,30].
Contudo, a proliferação de fibroblastos e a síntese de colágeno, também diminuem, acarretando
em comprometimento do tecido de granulação
com posterior substituição deste tecido fibroso,
podendo resultar em uma cicatriz não muito resistente [3,4].
As insuficiências vasculogênicas alteram o aporte
sangüíneo, reduzem o suprimento de oxigênio,
prejudicando a cicatrização e aumentando o risco
de infecção [4].
Assim, as insuficiências vasculogênicas têm
efeito prejudicial principalmente sobre a cicatrização
das feridas de membros inferiores, podendo até ser
um fator predisponente à sua ocorrência [5].
O suprimento sangüíneo prejudicado não
causa alterações de cicatrização somente em feridas
de membros inferiores. Segundo estudo realizado
por Greca et al. [31], o fluxo sangüíneo diminuído
decorrente do choque hipovolêmico, acarreta deterioração do processo cicatricial das anastomoses
intestinais em cães, isto é, altera significativamente
a deposição de colágeno total na área anastomótica
e aumenta os índices de complicações sépticas.
Em relação à oxigenação, a hipóxia parece ser
o principal indutor de uma série de eventos que
levam a imunodepressão e a infecção. Isso ocorre,
pois através do sistema imunológico inespecífico, o
oxigênio é necessário para destruição das bactérias
fagocitadas pelos granulócitos [31].
A imunodeficiência leva a diminuição da cicatrização, com diminuição da deposição de colágeno
e da força tênsil [4,16].
Já foram descritas alterações em pacientes aidéticos, provavelmente devido ao imunocomprometimento, pois existe relação inversa entre o número de
leucócitos e a velocidade de cicatrização. Em termos
gerais, existe retardo na cicatrização de 33 a 88% e
infecção da ferida de 5 a 16% dos pacientes [16].
Contudo, cirurgias em portadores de HIV
assintomáticos, podem ser realizadas sem prejuízo na
cicatrização. Segundo estudo realizado por Eriguchi
et al. [32], pacientes portadores de HIV podem ser
submetidos a procedimentos cirúrgicos paliativos
e curativos, enquanto as infecções oportunistas e
neoplasias relacionadas ao HIV forem controladas.
Assim, as cirurgias em portadores de HIV podem
ser realizadas para melhorar qualidade de vida e
prognóstico da doença.
Insuficiências renal e hepática acarretam acúmulo de catabólitos, dificultando a oxigenação tecidual
e a ação dos mecanismos celulares e humorais de
defesa [33].
O aumento dos níveis de uréia in vitro resulta
em quebra da estrutura helicoidal do colágeno com
precipitação das proteínas componentes da fibra. Ao
mesmo tempo, o paciente urêmico está em constante
acidose, o que leva a alteração celular e conseqüentemente, eventuais falhas na cicatrização [16].
Kane et al. [34] dizem que pacientes com
doença renal demonstram freqüentemente retardo
na cicatrização de feridas cirúrgicas, porém o surgimento de lesões nesses pacientes ainda não é bem
compreendido. Sabe-se que pacientes urêmicos podem desenvolver uma síndrome gangrenosa urêmica
que causa lesões de pele dolorosas que progridem
para úlceras ou gangrena.
Conclusão
A avaliação de feridas é uma atividade complexa, pois além de realizar uma avaliação local da
ferida é preciso estar atento a fatores sistêmicos que
podem otimizar ou até mesmo retardar a cura das
lesões.
Assim, verifica-se que a partir da identificação
de fatores que influenciam o processo de cicatrização, o profissional responsável pelo tratamento de
pacientes com feridas pode criar instrumentos de
avaliação de forma objetiva e criteriosa, tornando a
avaliação de feridas um método científico e sistematizado de prestar assistência de enfermagem com
qualidade e ética profissional.
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Revisão
As relações meio ambiente e saúde
no contexto do desenvolvimento sustentável:
um ponto de partida para a análise
da questão ambiental na enfermagem
*Liliana Angel Vargas, D. Sc
*Professor adjunto do Departamento de Enfermagem em Saúde Pública da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto / UNIRIO.
Trabalho contemplado com o 3º lugar no Prêmio Izaura Barbosa Lima, patrocinado pela Associação Brasileira de
Enfermagem, no 11º Congresso Panamericano de Profesionales de Enfermería e 55º Congresso Brasileiro de Enfermagem,
realizado em novembro de 2003, na cidade do Rio de Janeiro.
Resumo
Apesar de entendidas como incontestáveis as relações entre meio ambiente/saúde têm sido objeto de encontros e desencontros
tanto no campo normativo como acadêmico e operacional, resultado de uma história de (in)sustentabilidade ambiental,
tanto a nível local como planetário, diretamente proporcional à divida social acumulada nos países, principalmente, de
capitalismo periférico. No entanto, no final da década de 80 surge o conceito de desenvolvimento sustentável, baseado no tripé
crescimento econômico, equilíbrio ecológico e equidade social o que se constitui numa importante estratégia na construção
de uma sociedade mais justa e solidária. Este estudo tem por objetivo analisar a importância desta temática como ponto de
partida para um maior entendimento da questão ambiental na enfermagem, o que servirá como base teórica, valorativa e
estruturante dos princípios éticos necessários para que o futuro profissional de enfermagem, além das competências e habilidades
especificas de sua área de conhecimento, seja capaz de ter uma postura mais consciente e comprometida com a sustentabilidade
sócioambiental. A metodologia foi a análise documental e pesquisa bibliográfica sobre a temática em questão. Conclui-se
que o modelo de desenvolvimento adotado pela sociedade é o grande marco de referência para se entender a ocorrência do
processo saúde/doença e que o profissional de enfermagem deve estar preparado e sensível às demandas e necessidades de
saúde que emergem nesse contexto.
Palavras-chave: saúde ambiental, desenvolvimento sustentável, qualidade de vida, enfermagem.
Artigo recebido em 9 de agosto de 2005; aceito em 06 de fevereiro de 2006.
Endereço para correspondência: Rua Doutor Xavier Sigaud 290/504, 22290-180 Rio de
Janeiro RJ, Tel. (21) 22955737 ramal 274, E-mail: [email protected]
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Abstract
Environment and health relations in the context of a sustainable development: a
starting point for the analysis of the ambiental subject and nursing
Although understood as undeniable, the relation between environment and health has been object of engagements and
disagreements in normative, operational and academic fields, as the result of a historic (un)sustainable environment, on local
and planetary level, directly proportional to the accumulated social debts, mainly in countries with a peripheral capitalism
system. However, at the end of the 80’s, the concept of sustainable development emerges, based on the tripod: economic
growth, ecological balance and social equity, consisting in an important strategy for the construction of a more equitable and
solidarily society. This study aims to analyze the importance of this thematic as the starting point for a better understanding
of the environmental subject and nursing, underpinning theoretical, valuable and structural fundaments of ethical principles,
so that the undergraduating nursing students, beyond the specific competencies and abilities of their area of knowledge,
will be either capable to have a conscientious and compromised attitude to the social and environment sustainability. The
methodology was a documentary analysis and a bibliographical research about the thematic in question. It is concluded that
the model of development adopted for the society is the great landmark of reference to understand the occurrence of the
health and disease process and that the nursing professional must be able and sensible to the demands and health needs that
emerge in this context.
Key-words: environmental health, sustainable development, quality of life, nursing.
Resumen
Las relaciones entre medio ambiente y salud en el contexto del desarrollo sostenible:
un punto de partida para el análisis de la problemática ambiental por enfermeras
A pesar de entendidas como incontestables las relaciones entre medio ambiente y salud han sufrido encuentros y desencuentros
tanto en campo normativo como académico y operacional, resultado de la historia de desarrollo ambiental (in)sostenible,
tanto a nivel local como planetario, directamente proporcional a la deuda social acumulada en países, principalmente en los
de capitalismo periférico. Sin embargo, el surgimiento del concepto de desarrollo sostenible en el final de la década de 80,
con base en el tripié: crecimiento económico, equilibrio ecológico y equidad social se constituye en una importante estrategia
para la construcción de una sociedad más justa y solidaria. Este estudio se propone analizar la importancia de este tema para
facilitar un mayor entendimiento de la problemática ambiental durante la formación del futuro profesional de enfermería,
quien además de las competencias y habilidades específicas de su área de conocimiento debe tener una postura más consciente
y comprometida con el desarrollo sostenible. La metodología fue el análisis de documentos y la investigación bibliográfica sobre
el tema aquí tratado. Se concluye que el modelo de desarrollo adoptado por la sociedad es un marco de referencia importante
para entender el proceso salud/enfermedad, por lo tanto el profesional de enfermería debe estar preparado y sensible para
atender las demandas que surgen en este contexto.
Palabras-clave: salud ambiental, desarrollo sostenible, calidad de vida, enfermería.
Introdução
Apesar de entendidas como obvias as relações
entre meio ambiente e saúde, mesmo pelo senso
comum, sua reflexão e discussão dentro dos espaços
acadêmicos têm-se dado de forma periférica, reducionista e descontextualizada o que tem impedido
a construção e acumulação de conhecimentos,
experiências e possibilidades de abordá-las como
aspectos integrados numa realidade cada vez mas
complexa de onde emergem demandas que precisam
ser atendidas de maneira abrangente e comprometida.
Acreditamos que uma das razões desta situação
tenha sido a tradicional dicotomia entre meio am-
biente e saúde tanto em seus aspectos conceituais,
como metodológicos e práticos que têm colocado
esses termos, como categorias ligadas a áreas de
conhecimento diferentes e com possibilidades de
diálogo restritas.
No entanto, a própria complexificação da
realidade, que nos obriga a pensar de forma mais
relacional, permite que este debate aos poucos se
introduza e ganhe mais notoriedade dentro dos espaços sociais e acadêmicos como eixos fundamentais
para o entendimento, promoção e manutenção da
saúde humana e ambiental.
Portanto, este artigo visa estimular essa reflexão
e discussão no intuito de colocar as relações entre
meio ambiente/saúde como elementos fundantes
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das políticas públicas, do desenvolvimento, do
processo saúde/doença, das desigualdades sociais e
demais elementos relacionados à questão ambiental,
que expressa o conflito gerado nas relações entre
Estado, sociedade, e natureza e que hoje se coloca
como uma prioridade a ser discutida no cerne da
sociedade, o que significa rever conceitos, atitudes,
valores e responsabilidades perante o meio ambiente
e a vida nesta e nas futuras gerações.
Neste contexto torna-se relevante esta análise
para os profissionais de saúde de forma geral e para
enfermagem em particular, no intuito de ter uma
maior compreensão do impacto dessas relações nos
padrões epidemiológicos e na qualidade de vida
da população, o que nos possibilitará uma prática
profissional mais resolutiva e sintonizada com as
necessidades de saúde da sociedade.
Desta forma, ampliam-se as possibilidades de
construir não só discursos, mas práticas comprometidas com a superação da tendência histórica
que colocaram a saúde e o meio ambiente como
aspectos dicotômicos tanto no campo cognitivo
da produção do conhecimento como na gestão
das políticas públicas o que se traduz em ações
desconexas e superpostas sem praticamente nenhum
impacto na melhoria das condições de vida e muito
menos na garantia a longo prazo de estilos de vida
sustentáveis.
A metodologia utilizada foi a análise documental e pesquisa bibliográfica que priorizou a
abordagem qualitativa no tratamento das informações coletadas. Espera-se com esta reflexão dar
uma humilde, porém importante contribuição ao
melhor entendimento deste binômio (meio ambiente/saúde) e seus reflexos na ocorrência do processo
saúde/doença, o que no nosso entender é fundamental para que na enfermagem possamos integrar estes
aspectos à dimensão do cuidado e do cuidar.
Antecedentes das relações meio ambiente e
saúde:
No cenário internacional até meados do
século XIX a explicação dos estados mórbidos e
da ocorrência da doença estava associada à “teoria
miasmática”, originada na Europa, e segundo a qual
esta (a doença) emergia dos vapores resultantes da
decomposição da matéria orgânica nos “ambientes”
pobres e decaídos da cidade [1]. Para Rosen “os
surtos epidêmicos de doenças infecciosas seriam
causadas pelo estado da atmosfera” [2].
No Brasil, particularmente no Rio de Janeiro,
a associação entre ambientes úmidos e insalubres da
cidade colonial eram colocadas como responsáveis
pela ocorrência das chamadas doenças pestilenciais,
na virada do século XIX para o século XX, entre
as quais se destacaram a febre amarela, a varíola, a
peste, o cólera, entre outras, que dizimaram grandes
camadas da população e que serviu como fundamento para a aprovação, em 1904, do Plano Urbanístico
da Cidade, que permitiu ao então prefeito Francisco
Pereira Passos dar início a uma série de intervenções
no espaço urbano e social da cidade [3].
O que estes fatos tem em comum é a omissão
histórica da discussão da responsabilidade social
na ocorrência do processo saúde/doença e de se
ter colocado as relações meio ambiente/saúde
numa dimensão linear e determinística de causa/
efeito, conforme tratada pela epidemiologia clássica
ecológico-funcionalista de Leavell-Clark ao distribuir triangularmente os elementos interatuantes
(homem-agente-meio ambiente). Assim o homem
converte-se numa categoria meramente “natural”
classificável dentro de critérios de igualdade, segundo os quais diferenças são também meramente
naturais, como sexo, raça, idade etc. Nesta ótica, as
relações entre homem e meio ambiente dependem
do equilíbrio natural dessa tríade e negligencia a
importância da estrutura social [4].
Somente no final da década de 60, a ameaça de
uma catástrofe de proporções planetárias decorrente
do uso intensivo dos recursos naturais, fez com que
a questão ambiental fosse incorporada às agendas
governamentais em diversos países, centrais e periféricos, e sua discussão mediada pela Organização
das Nações Unidas (ONU).
O destaque da temática ambiental no cenário
internacional a partir da década de 70, esteve
impulsionada por processos como “a crescente degradação ambiental e o reconhecimento científico
dos chamados riscos ecológicos globais [...] a previsão de escassez de recursos naturais básicos para a
produção e consumo das sociedades industriais [...]
a crescente pressão política de novos movimentos
sociais” [5].
Como se pode observar, a complexidade destes
aspectos não permitem abordagens reducionistas e
sim demanda uma ampla discussão sobre os aspectos
políticos, sociais, culturais, econômicos que se configuram como aspectos estruturais e conjunturais,
objetivos e subjetivos da dinâmica social. Assim a
questão ambiental no cenário internacional apre-
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senta-se intimamente associada a categorias como
hegemonia, Estado, capital, poder, mercado, entre
outras, o que hoje se relaciona a um modelo insustentável de desenvolvimento.
Foi justamente esta última categoria que, uma
vez introduzida na dimensão ambiental permitiu
ampliar o escopo desta discussão. Assim a Conferencia das Nações Unidas sobre Meio Ambiente
Humano, realizada em Estocolmo em 1972 sob o
lema de “uma terra só”, se propôs não só discutir os
problemas ambientais, mas a estimular os países a
assumir suas soluções a nível local e planetário.
A publicação, em 1987, do relatório elaborado
pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, intitulado Nosso Futuro Comum,
colocou na arena política internacional a necessidade de repensar o modelo de desenvolvimento
adotado na maioria dos países e que priorizava o
desenvolvimento econômico em detrimento do
desenvolvimento social.
Pela primeira vez expressa-se como uma alternativa a adoção de um modelo de desenvolvimento
sustentável onde se compatibilizem o desenvolvimento econômico, o equilíbrio ecológico e a equidade
social, na medida que
satisfazer as necessidades e aspirações
humanas é o principal objetivo do desenvolvimento [...] num mundo onde
a pobreza e a injustiça são endêmicas,
sempre poderão ocorrer crises ecológicas e de outros tipos. Para que haja
desenvolvimento sustentável, é preciso
que todos tenham atendidas suas necessidades básicas e lhes sejam proporcionadas oportunidades de concretizar suas
aspirações de concretizar de uma vida
melhor [6].
Vinte anos se passaram desde a Conferencia
de Estocolmo até a realização da Conferencia
Mundial de Ambiente e Desenvolvimento, mais
conhecida como Rio 92, sediada na cidade do Rio
de Janeiro que contou com a participação de 178
chefes de estado e de aproximadamente quatro mil
organizações não governamentais que participaram
do Fórum Global. Deste amplo debate surgiu um
documento que sintetiza em quarenta capítulos
os principais anseios, desafios e expectativas da
humanidade perante à questão ambiental, denominado Agenda 21.
• As relações meio ambiente /saúde após a Rio
92:
Com o título Proteção e Promoção das
Condições da Saúde Humana o capitulo sexto da
Agenda 21 constitui-se num design de um plano
capaz de auxiliar os diferentes governos na concretização de esforços para garantir a saúde ambiental
e indica a Organização Mundial da Saúde (OMS)
como a instituição mais adequada para coordenar
as distintas atividades que conduzam ao alcance
desse propósito. No entanto, o pouco amadurecimento da discussão ambiental fez com que dentro
do setor esta discussão ficasse reduzida a um plano
periférico.
No capítulo em questão assinala-se que
(...) por si própria, a área da saúde não
tem como satisfazer suas necessidades e
atender seus objetivos; ela depende do
desenvolvimento social, econômico e espiritual, ao mesmo tempo que contribui
diretamente para tal desenvolvimento. A
área da saúde também depende de um
meio ambiente saudável, inclusive da
existência de um abastecimento seguro
de água, de serviços de saneamento e da
disponibilidade de um abastecimento
seguro de alimentos e de nutrição adequada [7].
Isto significa dizer que a saúde é resultante de
uma rede de relações que envolvem acesso à educação, à moradia, ao saneamento básico, ao meio
ambiente, tal como foi indicado pelo Movimento
da Reforma Sanitária no Brasil, na década de 80,
o que pressupõe ações interdisciplinares e intersetoriais que permitam o acesso à saúde, esta última
decorrente de condições dignas e qualidade de
vida. Ao mesmo tempo estabelece-se uma relação
indissolúvel e incontestável entre meio ambiente
e saúde.
Logo após a realização da Rio 92, a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) decidiu
realizar, em 1995, a Conferência Pan-Americana
sobre Saúde, Ambiente e Desenvolvimento (COPASAD), “[...] com o objetivo de definir e adotar
um conjunto de políticas e estratégias sobre saúde
e ambiente, bem como elaborar um Plano Regional de Ação no contexto do desenvolvimento
sustentável” [5]. Para honrar o compromisso da
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participação brasileira, o governo criou a Comissão
Interministerial para o Desenvolvimento Sustentável (CIDES), que deveria assessorar o Presidente
da República na viabilização da implementação
dos compromissos assumidos pelo país na Rio-92.
No entanto, a citada comissão só foi formalmente
instalada em 1997, dois anos depois da realização
da COPASAD.
Portanto, a responsabilidade da participação
na COPASAD recaiu sobre o Grupo de Trabalho
Intersectorial (GTI), criado em 1994 pelo então
Presidente da República Itamar Franco, e sob a
coordenação do Ministério da Saúde, que contando
com apoio da OPAS e da UNICEF realizou quatro
oficinas de trabalho. Ao final destas, foi elaborado o
Plano Nacional de Saúde e Ambiente (PNSA), publicado pelo Ministério da Saúde em 1995 e adotado
pelo Governo brasileiro como o documento oficial
do país na COPASAD
Adotando três dos princípios do SUS – universalização, eqüidade e integralidade – esse plano caracterizou-se pela pouca objetividade e ambigüidade de
suas propostas, as quais até hoje não conseguiram
sair do papel. A morosidade de sua implementação
deveu-se à carência estrutural do Estado brasileiro
na criação de ações integradas quem dessem lógica
e coerência à ação pública em saúde e ambiente,
assim como a impossibilidade de conduzi-la e organizá-la [8].
Nos últimos anos, observaram-se avanços e
retrocessos na discussão das inter-relações entre
saúde e meio ambiente. A nível nacional o I e II
Seminário Nacional de Saúde e Meio Ambiente,
ambos realizados na cidade do Rio de Janeiro no ano
2000 e 2002 respectivamente, foram provavelmente
os únicos fóruns que trouxeram para dentro do
setor saúde a possibilidade de pensar de forma mais
abrangente e integrada os desafios e as possibilidades
que estas duas categorias nos oferecem na promoção
da saúde humana e ambiental [9].
Hoje a análise das relações entre meio ambiente
e saúde exige a valorização das relações de poder
existentes entre o Norte e o Sul; a globalização e o
capitalismo periférico; o desenvolvimento e o subdesenvolvimento, o papel do Estado e das políticas
públicas. Estes aspectos geram tensões permanentes
e agressões ambientais, tanto no nível local como
planetário, manifestadas através de fenômenos como
a pobreza, a violência, a doença, o efeito estufa, o
buraco na camada de ozônio, as mudanças climáticas, entre outras.
• As relações meio ambiente/saúde e a promoção
da saúde:
No Brasil, a VIII Conferência Nacional de
Saúde (CNS), em 1986, se constitui o marco para
um melhor entendimento do complexo e abrangente
termo saúde quando assinala que a “saúde é resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, emprego, transporte,
lazer, liberdade, acesso e posse da terra, e acesso aos
serviços de saúde”.
Essa conquista do Movimento Sanitário, concretiza-se ao ser incorporado o conceito ampliado
de saúde à Carta Magna do país em 1988. Nesta, no
título VIII, capítulo II, seção II, artigo 196, afirma-se
que “a saúde é direito de todos e dever do Estado”. Tal
direito é garantido através de políticas públicas que
dêem respostas às demandas de saneamento, saúde,
educação, moradia etc. Igualmente o artigo 200 criou
o Sistema Único de Saúde (SUS), sob os preceitos de
universalidade, eqüidade, integralidade e descentralização, que seriam a base para alcançar o salto qualitativo na superação de uma cidadania regulada para
uma cidadania plena – portanto, passar-se-ia da idéia
de saúde para doentes para saúde para cidadãos.
Na mesma época, no cenário internacional
se coloca a promoção da saúde como o arcabouço
teórico-metodológico capaz de delinear novas trilhas
no caminho à saúde. Tendo como base as propostas
formuladas na 32ª Assembléia Mundial da Saúde,
em 1977, que propôs como meta alcançar “a saúde
para todos no ano 2000” e um ano depois, em
1978, a Conferência de Alma Ata, que deu ênfase
à atenção primária como uma estratégia que permitiria às comunidades se envolverem na solução de
seus próprios problemas, foi realizada em 1986 a I
Conferência Internacional sobre Promoção da Saúde
em Ottawa, Canadá.
Enfatizou-se, no referido evento, que a saúde
está inerentemente associada à qualidade de vida, a
qual depende da capacidade da comunidade atuar
e participar do processo de tomada de decisões. São
assinalados nessa conferência os seguintes aspectos,
como pré-requisitos para a saúde: paz, habitação,
educação, alimentação, renda, ecossistema estável,
justiça social e eqüidade. Assinala também que “a
proteção do meio ambiente e a conservação dos
recursos naturais devem fazer parte de qualquer
estratégia de promoção da saúde” [10].
A II Conferencia, realizada em Adelaide, Austrália, em 1988, priorizou as “Políticas Saudáveis”,
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cujo principal objetivo é criar ambientes favoráveis
para que as pessoas possam viver vidas saudáveis.
Isso se traduz em dar maiores oportunidades àqueles
que historicamente estiveram em desvantagem
social, através de ações governamentais concretas
em níveis nacional, regional e local, viabilizadas
através de parcerias tecidas entre os diversos setores
da sociedade.
A III Conferência Internacional e I Conferência
Mundial sobre Promoção da Saúde, realizadas em
Sundsvall, Suécia, em 1991, conclamavam à formação de uma aliança social que permitisse atingir
o objetivo da “Saúde para todos no ano 2000”.
Chamava a atenção para os graves problemas de
degradação ambiental sofridos por grande número
de países do mundo, afirmando que “ambiente e
saúde são interdependentes e inseparáveis”.
Em 1992 foi realizada em Santa Fé de Bogotá, Colômbia, a Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde na Região das Américas. Esta foi
a primeira a focalizar o cenário da América Latina,
e a assinalar que o maior desafio, em matéria de
saúde para a região, está em “transformar as relações
excludentes, conciliando interesses econômicos e
propósitos sociais de bem-estar para todos” [10].
Apontavam também que a superação da iniqüidade
através da solidariedade são condições indispensáveis
para a saúde e o desenvolvimento. Portanto, promover a saúde não é somente identificar os aspectos
que favorecem essa iniqüidade, nem propor ações
para aliviar seus efeitos, e sim atuar como agente de
mudança na sociedade.
A IV Conferência Internacional sobre Promoção
da Saúde ocorreu em Jakarta, em 1997, e foi a
primeira realizada num país em desenvolvimento.
Seu tema principal foi “Novos atores para uma
nova era, a promoção da saúde no século XXI”.
Reafirmou os inegáveis vínculos entre saúde e
desenvolvimento, chamando a atenção para o
surgimento de novos determinantes da saúde,
destacando os que denominou “fatores transnacionais”, entre eles a globalização da economia,
o mercado e o comércio, as comunicações e a
degradação ambiental.
Foi assim que no Brasil a partir da década de
80, mas principalmente na década de 90, começou
a se formalizar dentro do setor saúde, pelo menos
no plano normativo, a incontestável relação entre
meio ambiente e saúde. Além do capítulo da saúde
a Constituição Federal de 1988 estabeleceu, no
artigo 225, que “todos têm direito ao meio ecologi-
camente equilibrado, bem de uso comum do povo
e essencial à sadia qualidade de vida”, o que pode
vir a estimular uma atitude mais dialógica entre as
instituições responsáveis pela saúde e o meio ambiente dialogo este que deve ser ampliado a todos
os setores da sociedade, para que os diversos atores
sociais estabeleçam relações de mediação, articulação
e compromisso perante os desafios decorrentes dos
efeitos residuais de um processo de desenvolvimento
predatório e desigual.
Foi neste sentido que no documento conhecido
como Declaração de México, que reúne os anseios
expressados na V Conferência Internacional sobre
Promoção da Saúde, realizada em Junho de 2000, na
Cidade do México se afirma que deve-se “ constatar
a necessidade urgente de abordar os determinantes
sociais, econômicos e ambientais de saúde, sendo
preciso fortalecer os mecanismos de colaboração
para a promoção da saúde em todos os setores e
níveis da sociedade”. (www.opas.org.br).
Estes e outros pressupostos tanto desta conferência como das que a precederam são retomadas
na II Conferência Latino-americana de Promoção
da Saúde, sediada em São Paulo, em novembro de
2002, e teve como tema central a “Visão crítica da
promoção da saúde e educação para a saúde: situação
atual e perspectivas”.
• As relações meio ambiente/saúde em outros
fóruns de discussão:
No Brasil tanto no setor da saúde como de
meio ambiente, a mediação destas relações, encontra-se, quase que exclusivamente no plano normativo, embora não possamos negar que algumas
conquistas já começam a se vislumbrar em matéria
de sustentabilidade sócio-ambiental, cerne das relações meio ambiente/saúde.
Assim, segundo informações disponíveis no
site do Ministério do Meio Ambiente, o artigo 8o
do Decreto No 2.972 de 26 de fevereiro de 1999,
assinala que, compete à Secretaria de Qualidade
Ambiental nos Assentamentos Humanos propor
políticas, estratégias e desenvolver projetos e programas nos temas relacionados à política ambiental
urbana, às diferentes formas de degradação ambiental e poluição e a “os resíduos danosos à saúde e ao
meio ambiente”
Em paralelo surge também nesse ministério,
a Lei No 9.795 de 27 de abril de 1999 que dispõe
sobre a política de educação ambiental no país e
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segundo a qual, no seu artigo 1o assinala-se que se
entende por “[...] educação ambiental os processos
por meio dos quais o indivíduo e a coletividade constroem valores sociais, conhecimentos, habilidades,
atitudes e competências voltadas para a conservação
do meio ambiente bem comum do povo, essencial à
sadia qualidade de vida e sua sustentabilidade” [11].
A mesma lei em seu artigo 5o prega o desenvolvimento de uma compreensão mais integrada do meio
ambiente onde sejam levados em consideração os
aspectos políticos, sociais, econômicos, éticos, entre
outros, envolvidos no processo histórico social da
sociedade. Esta lei for regulamentada pelo Decreto
No 4.281 de 25 de junho de 2002.
Um dos frutos destes esforços é a criação do
Movimento de Proteção à Vida, em outubro de 1999
em Brasília, que aglutinou jovens entre 10 e 14 anos
de idade, que tinham como missão a realização de
uma ampla discussão sobre a qualidade de vida
e o meio ambiente que daria origem à Carta dos
Princípios de Proteção a Vida, que serviu de base para
a elaboração do caderno de princípios de proteção
à vida desenvolvido pela equipe do Programa Nacional de Educação Ambiental, referencia para os
trabalhos junto às escolas.
• As relações meio ambiente/saúde e a Saúde
Coletiva:
Levando em consideração os aspectos aqui
levantados nas relações meio ambiente/saúde em diversos contextos, entendemos que estas relações têm
como ponto de encontro uma categoria comum: a
qualidade de vida.
Em 1995, a Organização Mundial da Saúde
(OMS) reuniu especialistas de diversos países do
mundo os quais definiram a qualidade de vida
como “[...] a percepção do indivíduo de sua
posição na vida no contexto da cultura e sistema
de valores nos quais ele vive e em relação aos seus
objetivos, expectativas, padrões e preocupações”
[12]. Considero, no entanto, que esta definição,
acatada pela OMS contém uma visão que privilegia
o individual e está carregada de subjetivismo, neste
caso, desligado de um contexto e das relações nele
estabelecidas.
Já Minayo et al. assinalam:
[...] a qualidade de vida diz respeito ao
padrão que a própria sociedade define e
se mobiliza para conquistar, consciente
ou inconscientemente, e ao conjunto das
políticas públicas e sociais que induzem
e norteiam o desenvolvimento humano,
as mudanças positivas no modo, nas
condições e estilos de vida, cabendo
parcela significativa da formulação e das
responsabilidades ao denominado setor
saúde [13].
Portanto, levando em consideração a noção
polissêmica do termo, entendemos saúde e qualidade de vida como categorias associadas a um conjunto complexo e dinâmico de relações de aspectos,
como moradia, educação, lazer, acesso à informação,
à propriedade, à paz , ao meio ambiente e a tudo
aquilo que se traduz em condições mínimas de vida
digna, ter sonhos, ser feliz.
Para Birman “[...] o campo da saúde coletiva
representa uma ruptura com a concepção de saúde
pública, ao negar que os discursos biológicos detenham o monopólio do campo da saúde” [14]. Já
na opinião de Breilh,
[...] a saúde coletiva surge como um
termo vinculado a um esforço de transformação, como opção oposta, como
veículo de uma construção alternativa
da realidade que é objeto de ação, dos
métodos para estudar essa realidade e das
formas de práxis que se requerem (grifo
do autor) [4].
Assim na Saúde Coletiva abre-se espaço para
a diversidade de discursos, tratados de forma não
hierárquica, e para a pluralidade nos saberes e nas
práticas, dando lugar à interdisciplinaridade e ao
policentrismo.
Assim sendo, consideramos legítimo assinalar
que as relações meio ambiente/saúde têm na saúde
coletiva a grande possibilidade de superar seus reducionismos historicamente construídos dentro do
setor saúde resultado de uma tradição que priorizou
uma leitura medicalizada da saúde.
A Saúde Coletiva apresenta como seu postulado fundamental que a problemática da saúde é
muito mais complexa e abrangente que aquela assinalada pela medicina. Desta forma, saúde e meio
ambiente passam a ser vistas como duas faces de
uma mesma moeda fundamentais para concretizar
os anseios de se construir uma sociedade mais justa,
mais sustentável e mais solidária.
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• As relações meio ambiente/saúde na formação
do futuro profissional de Enfermagem:
Apesar da formação tradicional do profissional
de enfermagem não ter priorizado uma leitura mais
ampliada sobre os elementos interactuantes na ocorrência do processo saúde/doença, uma vez que o
principal objetivo era formar profissionais capazes
de auxiliar o ato médico, cuidar um corpo doente,
dentro de um espaço domiciliar ou institucional, e
cumprir com uma serie de tarefas administrativas
e assistenciais, que tinham como base quase que
exclusivamente o conhecimento produzido dentro
da medicina. Isto significa dizer que a enfermagem
sempre atuou como ator coadjuvante e muito pouco
conseguiu mostrar sobre suas capacidades para se
tornar um ator principal na cena das políticas e da
tomada de decisões dentro do setor saúde.
Estas palavras porém não buscam fazer uma
descrição amarga de nossa categoria. Este como
todos os aspectos que constituem nossa realidade
são histórica e politicamente determinados. E é
justamente nessa lógica que entendemos que hoje
a Enfermagem tem mais condições de conquistar
seu espaço, tanto dentro do setor como na própria
sociedade, mas para isso será necessário preparar
e ampliar seus horizontes cognitivos para que sua
prática profissional seja uma verdadeira práxis
transformadora.
Assim a produção do conhecimento dentro da enfermagem deve acompanhar o próprio
movimento político, social, cultural, ambiental da
sociedade, para que este surja como conseqüência
das próprias necessidades de saúde e demandas da
população e não mais como uma mera reprodução
de saberes hierarquicamente tratados e utilizados
para manter a hegemonia de discursos e práticas
dentro do setor.
Uma dessas demandas é a que, sob a ótica do
cuidado, possamos ver a questão ambiental como
a possibilidade de sensibilizar o futuro profissional
de enfermagem, em seus diferentes níveis, de uma
realidade local e global que mostra o esgotamento,
em alguns casos irreversível das diferentes formas de
vida e que portanto precisa de nossa atenção e intervenção como seres humanos, como profissionais
e como cidadãos.
Já dizia Edgar Morin em seu livro os “Sete
saberes necessários à educação do futuro” que “será
preciso indicar o complexo de crise planetária que
marca o século XX, mostrando que todos os seres
humanos, confrontados de agora em diante aos
mesmos problemas de vida e morte, partilham um
destino comum” [15].
Assim incorporar a preocupação e discussão
com a questão ambiental é uma nova forma de
discutirmos não só a saúde e a doença mais a vida,
e não só desta, mas das futuras gerações, e isto não
tem nada de romântico. Trata-se de um posicionamento ético e politicamente correto na medida que
a educação ambiental é sem dúvida nenhuma uma
nova forma de educação em saúde.
Conclusões
Como podemos observar um longo caminho
ainda precisa ser percorrido na trilha da sustentabilidade sócio-ambiental, produto das heranças que
nos ensinaram a penar e agir de forma dicotomizada
perante os diferentes desafios de nossa realidade
entre eles nos relacionados ao binômio meio ambiente/saúde.
Nesse contexto o profissional de saúde e em
particular de enfermagem pode, a partir de sua
sensibilidade, ética e compromisso historicamente
demonstrados estimular tanto os futuros profissionais da categoria em seu processo de formação
como a sociedade em geral para que tenham um
outro olhar e valoração perante a questão ambiental,
na medida que esta nos leva a ampliar os horizontes
do nosso principal legado: O cuidado, que entendemos não como um ato e sim como uma atitude.
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Revisão
Alfredo Pinto Vieira de Mello:
a busca pela compreensão de uma
homenagem através da enfermagem
Almerinda Moreira, D.Sc.*, Gláucia Alexandre Formozo**, Tadeu Lessa da Costa**, Ricardo Menezes da Silva
*Pesquisadora do Laboratório de Pesquisa em História da Enfermagem (LAPHE)/EEAP. Professora Adjunta do Departamento de
Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto (EEAP), da Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro (UNIRIO), **Enfermeira do Hospital dos Servidores do Estado/Ministério da Saúde.
Resumo
Trata-se de um estudo histórico-social, objetivando descrever os principais traços biográficos de Alfredo Pinto Vieira de Mello
e discutir as circunstâncias concorrentes para a homenagem a ele, tendo seu nome dado à seção feminina da Escola Profissional
de Enfermeiros e Enfermeiras (EPEE), em 1921. Utilizamos como fontes: periódicos, legislações e anais da Colônia de Alienadas
do Engenho de Dentro (CAED). A análise dos dados foi do tipo análise de prosa, sendo a discussão pautada em bibliografia
pertinente. Como resultados, obtivemos que Alfredo Pinto, advogado, teve imensa participação no cenário político brasileiro,
tendo ocupado cargos como de Ministro da Justiça e Negócios Interiores e Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF).
A referida homenagem adveio por este ter regulamentado a EPEE, criando as seções mista, feminina e masculina. Poderiam
estar relacionados outros aspectos, como a aprovação da Assistência Hétero-Familiar na CAED e o destaque alcançado pelo
homenageado com sua promoção ao STF. Assim, pensamos que este estudo contribui para o resgate da história da Escola
de Enfermagem Alfredo Pinto e da enfermagem brasileira, haja vista ter sido esta escola pioneira na profissionalização da
enfermagem no Brasil.
Palavras-chave: enfermagem, profissionalização, história, psiquiatria.
Abstract
A nursing tribute to Alfredo Pinto Vieira de Mello
It is a social and historical study which aims at describing summarily the Alfredo Pinto Vieira de Mello’s biography and to
debate the reason to pay homage to him, whose name was given to the feminine section of the Professional School of Male and
Female Nurses (PSMNN), in 1921. It was used periodics, legislations and publications from Colônia de Alienados do Engenho
de Dentro (CAED). Data analysis is based on a prose approach, and the discussion concerning pertinent bibliography. The
obtained results showed us that Alfredo Pinto, lawyer, had immense participation in the Brazilian political scene, and held
good positions as of Minister of Justice and Home Affairs and President of the Federal Court of Justice (FCJ). The homage
Artigo recebido em 03 de novembro de 2005; aceito em 06 de fevereiro de 2006.
Endereço para correspondência: Almerinda Moreira, Rua: Lauro Muller 96/1005 Botafogo,
22290-160 Rio de Janeiro RJ, E-mail: [email protected]
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paid to him was because he regulated PSMNN, creating the mixed, feminine and masculine sections. Other aspects could
also be related, such as the approval of the “Hetero-Familiar Assistance” in the CAED and the prominence reached with his
promotion to the FCJ. Thus, we think that this study contribute to rescue the history of Alfredo Pinto School of Nursing
and the Brazilian nursing, since this school has been the pioneer of the professionalization of nursing in Brazil.
Key-words: nursing, professionalization, history, psychiatry.
Resumen
Alfredo Pinto Vieira de Mello: una búsqueda histórica para la comprensión
de un homenaje a través de la enfermería
Se trata de un estudio histórico social, objetivando describir los principales rasgos biográficos de Alfredo Pinto Vieira de Mello
y discutir las circunstancias que concurrieron para homenajearlo, teniendo en cuenta que su nombre fue dado a la sección
femenina de la Escuela Profesional de Enfermeros y Enfermeras (EPEE), en 1921. Utilizamos como fuentes de información:
periódicos, legislaciones y anales de la Colônia de Alienadas do Engenho de Dentro (CAED). El análisis de los datos ha sido
según el método de análisis de prosa y la discusión basada en bibliografía pertinente. Los resultados mostraron que Alfredo
Pinto, abogado, tuvo inmensa participación en el escenario político brasileño, ejerció diversos cargos como de Ministro de la
Justicia y Asuntos Interiores y Presidente de la Suprema Corte de Justicia (SCJ). El homenaje citado resultó por Alfredo Pinto
haber reglamentado la EPEE, en 1921, creando las secciones mixta, femenina y masculina. Otros aspectos podrían estar
relacionados como la aprobación de la Asistencia Hetero-familiar en la CAED y el destaque alcanzado por el homenajeado
con su elevación al cargo de presidente de la SCJ. Así, pensamos que este estudio contribuye para el rescate de la historia de la
Escuela de Enfermería Alfredo Pinto y de la enfermería brasileña, por haber sido esta escuela pionera en la profesionalización
de la enfermería en Brasil.
Palabras-clave: enfermería, profesionalización, historia, psiquiatría.
Introdução
A possibilidade para a efetivação deste estudo
adveio da disciplina optativa “Tópicos emergentes
em enfermagem fundamental: metodologia da
pesquisa em história da enfermagem”, do Departamento de Enfermagem Fundamental (DEF) da
Escola de Enfermagem Alfredo Pinto (EEAP), da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
(UNIRIO).
Tal disciplina encontra-se vinculada, ainda, ao
Laboratório de Pesquisa em História da Enfermagem (LAPHE) que, desde sua fundação, em 2000,
vem tentando resgatar a memória da referida escola,
bem como contribuir para preencher lacunas da
história da profissão em questão [1].
De um modo geral, podemos dizer que objetiva
estimular a construção e a produção de conhecimentos acerca da história da enfermagem, sobretudo, no
que diz respeito à sua profissionalização no contexto
brasileiro. Para tanto, buscava propiciar a seus integrantes, ainda que preliminarmente, subsídios para
a prática de investigação científica em história da
enfermagem.
A história da enfermagem pode ser definida
como uma área interdisciplinar situada na interseção
de dois campos de conhecimento: enfermagem
e história [2] e a sua abordagem requer avaliação
crítica de aspectos estreitamente relacionados com
os diversos eventos da época que se deseja estudar,
além do aquilatamento de valores dos elementos de
cada acontecimento [3].
Assim, o evento trazido à baila pela presente
investigação refere-se à homenagem que foi prestada
a Alfredo Pinto Vieira de Mello, pela escola de
enfermagem em tela, conferindo-lhe o seu próprio
nome.
Este acontecimento tem gerado intensa inquietação, entre outras pessoas, nos discentes e
docentes da EEAP, sobretudo, após a fundação do
LAPHE, uma vez que pouco se sabe a respeito das
circunstâncias concorrentes para tal.
Acrescenta-se a isso, o fato de que Alfredo
Pinto “não era do sexo feminino” ou enfermeiro,
bem como não desenvolvia atividades características a esta profissão, como o eram e/ou o faziam as
pessoas que, por exemplo, receberam semelhante
homenagem das escolas públicas de enfermagem de
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nível superior da cidade do Rio de Janeiro e Niterói,
quais sejam: Anna Nery; Raquel Haddock Lobo; e
Aurora Afonso Costa [4,5].
De acordo com um estudo de Moreira, esta
homenagem teve sua gênese no fato deste jurista,
na condição de Ministro da Justiça e Negócios Interiores (MJNI) e tendo sob sua responsabilidade
as pastas de Educação e da Saúde, ter patrocinado
a criação, em 1921, da Seção Feminina da “Escola
Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras” (EPEE),
precursora da EEAP [3].
Esta Seção, que, então, foi denominada “Escola
Profissional de Enfermeiras Alfredo Pinto”, funcionava na “Colônia de Psicopatas”, no Engenho de
Dentro, situado no município do Rio de Janeiro, e,
posteriormente, com a sua ida para a Avenida Pasteur, foi fundida à Seção Mista da EPEE, sob a formalização do Decreto nº 4.725, de 22 de setembro
de 1942. Assim, passou, finalmente, a intitular-se
“Escola de Enfermagem Alfredo Pinto” [3].
Diante disso, muitas inquietações persistem,
somadas a outras, como por exemplo; de quais atores
sociais partiu a iniciativa para a referida homenagem? Haveria outro motivo para esta homenagem?
Quem era Alfredo Pinto Vieira de Mello? Como
teria se efetivado o seu referido patrocínio?
Considerando, os aspectos enunciados, sobretudo, o fato de que, anteriormente à mencionada
fusão, a Seção Feminina da EPEE já ostentava o
nome de Alfredo Pinto, delimitamos por objetivos
para este estudo:
• descrever os principais traços biográficos de Alfredo Pinto Vieira de Mello; e
• discutir as circunstâncias concorrentes para a
denominação da referida Seção de “Escola de
Enfermeiras Alfredo Pinto”.
Relevância do estudo
Este estudo justifica-se pela necessidade do resgate da história da enfermagem brasileira e, mais especificamente, da EEAP, pela busca da compreensão
de um dos significativos elementos que configuram
sua identidade, qual seja: sua denominação [6].
Além disso, encontra-se vinculado à linha de
pesquisa “Desenvolvimento da Enfermagem no
Brasil” do LAPHE, que tem por objetivos: buscar,
preservar e recuperar documentos de interesse para
a pesquisa e a Enfermagem brasileira; facilitar o
acesso ao acervo documental e manter intercâmbio
com pesquisadores e entidades ligadas à pesquisa de
enfermagem, em nível nacional e internacional.
Metodologia
Trata-se de um estudo histórico-social, ou seja,
consiste na explicação global dos fatos considerando
as dimensões sociais, culturais, econômicas e políticas, sem compartimentalização [7].
Para a sua efetivação utilizamos como fontes:
jornais; decretos; leis; anais da “Colônia de Psicopatas de Engenho de Dentro”; artigos publicados em
periódicos; livros; dissertações; e teses.
A análise dos dados foi do tipo análise de
prosa, a qual pode ser definida como uma forma de
investigação do significado dos dados qualitativos.
Constitui-se num meio, geralmente, mais amplo que
a análise de conteúdo, de levantar questões sobre o
conteúdo de um determinado material, abarcando
suas mensagens intencionais e não-intencionais,
explícitas ou implícitas [8].
Em lugar de um sistema pré-estabelecido de
categorias, os tópicos e temas são gerados a partir
do exame dos dados e de sua contextualização
no estudo, devendo ser freqüentemente revistos
na medida em que a análise se desenvolve, tendo
em vista os princípios teóricos e os pressupostos
da investigação. Isto porque conforme a pesquisa
é efetivada podem surgir novas idéias, direções e
questões, pelo que se faz necessário um método de
análise que auxilie, também, no constante questionamento das interpretações e ofereça indicações para
interpretações alternativas [8].
Para a discussão dos dados foram utilizados
autores de enfermagem, bem como de outras áreas
do conhecimento, cuja produção possui afinidade
pela temática do estudo.
Deste modo, apresentamos os resultados e
sua discussão em dois subtópicos: “Alfredo Pinto:
conhecendo alguns traços biográficos”; e “Escola
de Enfermeiras Alfredo Pinto, por quê?”, que são
apresentados a seguir.
Resultados e discussão
Alfredo Pinto: conhecendo alguns traços biográficos
Alfredo Pinto Vieira de Mello, nascido no
dia 20 de junho de 1863 na cidade de Recife (PE),
bacharelou-se pela Faculdade de Direito de Recife,
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em 20 de março de 1886, juntamente com Epitácio
Pessoa [9-12].
Durante o período de sua formação superior,
destacou-se como republicano e abolicionista. Para
exemplificar, podemos citar o fato de conseguir que
sua família libertasse os próprios escravos, e, no
Club do Cupim, núcleo de partidários de libertação
do elemento servil, impor-se pelo ardor com que se
entregava à causa [9].
Em 1887, foi nomeado Promotor da comarca
de Baependi, na província de Minas Gerais, onde
exerceu o cargo até ser nomeado Juiz de Direito
da comarca de Ouro Fino, em decreto de 27 de
dezembro de 1890 [9,13].
Em 1897, elegeu-se Deputado Federal, sendo
reeleito em 1902 [9,12]. Não podemos deixar de
mencionar que, no desenrolar deste período, em
1899, foi criada a Lei Alfredo Pinto, resultante de
projeto de sua autoria, de severa repressão ao jogo e
aos crimes contra a propriedade (Lei nº 628/1899)
[9].
Prosseguindo sua atuação como advogado, em
1903, abriu seu escritório de advocacia no Rio de
Janeiro exercendo conjuntamente o cargo de representante da Fazenda Nacional junto à Comissão das
Obras do Porto [12,13].
Três anos mais tarde, em 15 de novembro de
1906, aceitando o convite feito pelo Dr. Affonso
Pena para auxiliar seu governo, foi nomeado Chefe
de Polícia da capital da República, deixando este
cargo em 26 de junho de 1909, após o falecimento
do referido presidente, apesar de convidado por
Nilo Peçanha para continuar. Aceitou, no entanto,
o convite para participar da Comissão que elaborou
os projetos de Código de Processo Civil e Comercial
e do Código de Processo Penal do Distrito Federal,
que deram origem aos Decretos nos 8.259 e 8.332,
ambos de 1909 [6].
Cabe destacar que, naquele tempo, não havia
o Departamento Federal de Segurança Pública, e as
funções de Chefe de Polícia eram restritas ao Distrito
Federal, assim, este cargo era de suma importância,
sendo de nomeação do Presidente da República. Desta forma, pela eminência da função, só a ocupando
civis, era a Chefia de Polícia, às vezes, degrau para
a investidura, altíssima, de Ministro do Supremo
Tribunal. Fato este ocorrido com Alfredo Pinto, que
foi nomeado Ministro da Justiça na Presidência de
Epitácio Pessoa [9].
Foi empossado na Presidência do Instituto
dos Advogados em 1911, sendo reeleito, pela una-
nimidade dos presentes, por duas vezes em 11 de
novembro de 1912 e em 30 de outubro de 1913,
e perdendo a eleição, em 1915, para Ruy Barbosa
[9].
Alfredo Pinto continuou a dedicar-se à advocacia, sendo, professor de Direito Comercial na
Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais, na qual
recebeu o grau de doutor (1914) [9].
Lutou pela criação da Ordem dos Advogados
do Brasil (OAB), pugnando por sua criação, desdobrada do Instituto da Ordem criado em 1843,
em discurso pronunciado em 16 de abril de 1914
[10], além de ter influído diretamente, quanto
MJNI, no andamento do Projeto nº 26 de criação
da OAB [12].
A convite de Epitácio Pessoa, ocupou a pasta
de MJNI, desde 28 de julho de 1919 – e, interinamente, a da Guerra, até 03 de outubro deste ano,
quando o titular efetivo, Dr. João Pandiá Calógeras,
que estava na Europa, assumiu o cargo. Cabe destacar que, à época, ao MJNI ainda compreendia as
pastas de Educação e de Saúde [9].
Um dos pontos altos de sua gestão foi a Conferência de Limites Interestaduais, iniciada em 1920
e presidida por ele. Tal Conferência empenhou-se
em resolver as questões de limites entre as diversas
unidades da Federação antes de 07 de setembro de
1922, primeiro centenário da independência política
do país, tarefa que logrou êxito [9,13].
Como MJNI, também reorganizou os serviços
da Inspetoria de Segurança Pública, da Inspetoria
de Veículos, da Guarda Civil e da Saúde Pública; e
cuidou da unificação administrativa do Território
do Acre [9].
Além disso, criou a Universidade do Rio de
Janeiro, incorporando a Escola Politécnica, a Faculdade de Medicina e a Faculdade de Direito, esta
resultante da fusão da Faculdade Livre de Direito
e da Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais (Decreto nº 14.343/1920), e voltou a atenção para o
Colégio Pedro II, onde foi especializado no curso
de bacharelado, dividido em Seção de Letras e Seção
de Ciências [9].
Em 03 de setembro de 1921, abandonou
o cargo de MJNI para atuar como Ministro do
Supremo Tribunal Federal, cargo exercido até sua
morte [13].
Alfredo Pinto Vieira de Mello publicou diversas obras, entre as quais: “O Jury”; “Conceito
de Preferência nos Contratos Administrativos”;
“Característicos do Imposto de Importação”; “Natu-
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ralização de Estrangeiros”; “Liberdade Profissional”;
“Direito à Aposentadoria”; “Menores Abandonados
e Menores Delinqüentes”; “A Organização Administrativa do Território do Acre”; “Na Defensiva”
(resposta a Ruy Barbosa); “Direito das Sucessões”;
“A Ordem dos Advogados”; “O Poder Judiciário
no Brasil” (1572 a 1871); além de outros estudos
jurídicos publicados em revistas especializadas e em
jornais cotidianos [9,10].
Faleceu em 08 de julho de 1923, na cidade do
Rio de Janeiro, sendo sepultado no Cemitério de
São João Batista [10,13]. Sua morte foi noticiada
por dois importantes jornais à época, quais sejam:
Jornal do Brasil e Jornal do Commercio.
No primeiro periódico, o registro noticioso
data de 10 de julho de 1923, tendo chamado-nos
a atenção, por sua relação com a EPEE, instituição
ligada à assistência a alienados, o seguinte trecho de
seus marcos biográficos:
“(...) outra obra referente de humanidade e de progresso social, foi a solução,
no Distrito Federal, do Problema da
Assistência aos Alienados, que procurou,
desde o começo, o espírito do Sr. Dr.
Alfredo Pinto, que, desde logo enfrentou e pôde-se dizer estar quase resolvido
definitivamente (...)” [14]
Em relação ao segundo periódico citado, o
registro noticioso data de 09 de julho de 1923 e não
revelou nenhum fato relacionado à EPEE [15].
“Escola de Enfermeiras Alfredo Pinto”, por
quê?
A busca pela resposta às nossas inquietações
levou-nos, inicialmente, ao levantamento de dados
em legislações produzidas por Alfredo Pinto, como
MJNI no governo do presidente Epitácio Pessoa, no
período de 28 de julho de 1919 a 03 de setembro
de 1921, visto que, tal qual anteriormente mencionado este ministério abarcava as pastas da Saúde e
da Educação, cujas deliberações poderiam trazer
implicações para a EEAP, àquela época denominada
EPEE.
Assim, não encontramos, no acervo do Arquivo
Nacional, do Museu Histórico Nacional da cidade
do Rio de Janeiro, bem como no site do Senado
Nacional Brasileiro, produções legais relacionadas
à EPEE ou à Colônia de Psicopatas do Engenho
de Dentro, posteriormente, denominada Colônia
Gustavo Riedel.
Procuramos, igualmente, por relatórios da
Colônia de Psicopatas do Engenho de Dentro, da
Escola de Enfermeiras Alfredo Pinto, bem como da
Escola de Enfermagem Alfredo Pinto, não obtendo
êxito em relação aos dois primeiros e, nos últimos,
identificados, até o momento, no acervo do LAPHE,
não encontramos dados referentes à questão enfocada no estudo.
Porém, basicamente, dois documentos encontrados trouxeram-nos dados importantes ao estudo,
quais sejam: “Annaes da Colônia de Psychopathas”,
de 1929, e “Anais da Colônia Gustavo Riedel”, de
1942.
De acordo com o artigo, do primeiro documento citado, “As colônias de alienados: Retrospecto
e visão da Colônia de Psychopathas no Engenho de
Dentro”, redigido por Dr. Álvaro Cardoso, administrador da Colônia de Psychopathas à época, Dr.
Gustavo Riedel, então, diretor desta instituição,
homenageou Alfredo Pinto, dando seu nome à seção
feminina da EEPE, pelo apoio recebido para sua
fundação, em 1921, tal qual pode ser constatado
no seguinte trecho:
(...) notando o actual diretor a dificiencia dos serviços de enfermagem pela
falta completa e absoluta de enfermeiras
idôneas, pois que, taes serviços vinham
sendo confiados à enfermeiras leigas,
pela não existência em nosso meio de
enfermeiras diplomadas, com notório
prejuízo para aquelles serviços, sem
duvida um dos mais importantes de um
hospital; aproveitando-se do disposto
no decreto n. 791 de 27 de Setembro
de 1890, e conseguindo o mais franco
e decidido apoio do então ministro da
Justiça e Negócios Interiores, Dr. Alfredo
Pinto, fundou, annexa à Colônia, a escola de enfermeiras, a que deu o nome
de “Escola Profissional de Enfermeiras
Alfredo Pinto”, em homenagem àquele
saudoso ministro (...) [16].
É importante ressaltar, neste ponto, que o
citado decreto cria a EPEE, fundamentalmente,
com o objetivo de: suprir a falta de mão-de-obra, no
momento, agravada pela saída das irmãs de caridade
do Hospício Nacional dos Alienados, sob ordem de
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seu então diretor Dr. João Carlos Brandão, como
conseqüência da cisão entre o Estado e a Igreja na
Proclamação do regime republicano; e solucionar o
problema das pessoas de sexo feminino, com dificuldades em relação à profissionalização [3].
Por sua vez, os Anais da Colônia Gustavo
Riedel, de 1942, em sua notícia “Homenagens à
memória de Alfredo Pinto”, da seção “Noticiário”,
apresenta Alfredo Pinto como “eminente jurista e
político brasileiro” e “grande patrono” da Escola de
Enfermeiras vinculada àquela instituição [17].
Tal notícia versava sobre uma homenagem
prestada a Alfredo Pinto no dia 12 de maio – dia
da enfermeira – de 1942, a qual consistiu numa
romaria ao seu túmulo, no Cemitério São João
Batista, no Rio de Janeiro, em que compareceram
atores sociais de diversos segmentos da sociedade,
tais como: alunas de todos os cursos da Escola de
Enfermeiras Alfredo Pinto, seus antigos professores
e os que lecionavam no momento; Drs. Alfredo
Heitor Carrilho, diretor do Manicômio Judiciário;
Odilon Gallotti, professor da Escola de Enfermeiros
do Hospital Psiquiátrico; Alfredo Sapucí, da Cruz
Vermelha, acompanhado por um grupo de alunas
desta instituição; funcionários do Serviço Nacional
de Doenças Mentais; representantes da imprensa e
de outras escolas de enfermagem [17].
Além disso, reforçando a importância do acontecimento, associaram-se a ele, também, Dr. Herbert
Moses, diretor da Associação Brasileira de Imprensa
(A.B.I.), por meio de um telegrama, o qual foi lido
pelo então psiquiatra da Colônia Gustavo Riedel e
professor da Escola de Enfermeiras Alfredo Pinto,
Dr. Gustavo de Rezende, sendo seguido pelo discurso dos Drs. Alfredo Neves, ex-professor da referida
escola, e Mario Reis, seu atual professor [17].
As alunas da Escola de Enfermagem “Alfredo
Pinto” depositaram sobre a campa, “lindas flores
naturais” [17].
Ao buscarmos menções do evento nos dias 11,
12 e 13 de maio de 1942 no Jornal do Commercio,
por este ter ampla circulação, influência e consumo
à época, encontramos um registro noticioso na edição destinada aos dois primeiros dias, pois houve
somente uma publicação abarcando os fatos correspondentes a estes dias.
Tal registro consistia num comunicado de
que no dia 12 de maio, data da publicação, estaria
ocorrendo uma romaria, às 10:00h da manhã, no
Cemitério São João Batista, ao túmulo de Alfredo
Pinto, “Patrono” da Escola de Enfermagem com
seu nome e a quem se deve a sua efetividade, na administração de “Gustavo Riedel” da antiga Colônia
da Alienadas do Engenho de Dentro, tendo sido,
também, anunciados os discursos dos Drs. Alfredo
Neves e Mario Reis [18].
Conforme os discursos dos últimos professores
mencionados, publicados na seção “D – Conferências, alocuções, inquéritos sociais, etc.”, sob o título
de “Discursos à beira do túmulo de Alfredo Pinto”,
este era patrono da Escola de Enfermeiras da Colônia Gustavo Riedel, no interior da qual, de acordo
com Dr. Mario Reis, havia um retrato seu “como um
estímulo ao labor de suas alunas”, sendo, também,
considerado “um pioneiro da enfermagem o varão
ilustre” [19].
Nas palavras de Dr. Mario Mendes, que reflete
a perspectiva de todos que versavam sobre a Escola
em questão nos “Annaes”, de 1929 e “nos Anais”,
de 1942:
(...) foi Gustavo Riedel quem criou a
Escola “Alfredo Pinto”, foi ele quem a
organizou, quem lhe deu corpo. Não
havia até então, em efetivo trabalho de
ensino; foi o preclaro e saudoso diretor
da colônia de psicopatas que hoje tem o
seu nome, quem, com a sua autoridade,
consolidada em seu amor ao trabalho
orientado para o bem do Brasil, em sua
sólida cultura científica e em seu superior
tino administrativo, conseguiu incutir
nos ânimos dos nossos governantes a
necessidade de se criar uma escola oficial
de enfermeira (...) [19].
Este ator social acrescenta que o decreto n° 791
de 27 de setembro de 1890, criando a EPEE, não
teve execução plena, não se podendo, contudo, dizer
que esta tenha ficado no papel, tendo apresentado
funcionamento regular. Em 1904, afirma, ainda,
após um período de inatividade, iniciou uma nova
fase de trabalho, com a reorganização da Assistência a Alienados, elaborada por Juliano Moreira,
no governo do presidente Rodrigues Alves. Tendo
a irregularidade, entretanto, persistido, Gustavo
Riedel “valendo-se de sua posição e de seu prestígio
pessoal”, conseguiu do governo a regulamentação,
de modo a lhe permitir a fundação de uma escola
de enfermeiras com sede na Colônia [19].
Assim, segundo o discurso deste, formou-se
a Escola de Enfermeiras “Alfredo Pinto”, com tal
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denominação em homenagem ao ministro que “lhe
facilitou a criação, referendando a regulamentação
requerida [19], qual seja, o Regimento Interno da
Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras da
Assistência a Alienados, publicado no diário oficial
de 02 de setembro de 1921, que compor-se-ia de
três seções: mista, masculina e feminina, tendo por
superintendentes o próprio diretor da Colônia a
qual cada uma estiver vinculada. No caso da seção
feminina, a Colônia de Alienadas, então, dirigida por
Gustavo Riedel [20]. Em suas palavras, “Riedel organizou a escola, deu-lhe o corpo, mas foi Alfredo Pinto
quem lhe deu a vida oficial que a tem valido”[17].
Os feitos de Gustavo Riedel são exaltados
freqüentemente nos textos produzidos pelos integrantes da Colônia contemporâneos e posteriores à
sua atuação como seu diretor, sendo representado
como um marco na trajetória da assistência a alienados no país [16,17,19]. Este fato, aliado a outros
apresentados neste estudo, nos leva ao reforço da
crença segundo a qual a indicação do nome de
Alfredo Pinto para a denominação da escola não
poderia partir de outro, senão de Gustavo Riedel,
pois, a depender de seus pares, não seria ele a receber
tal homenagem?
Além disso, identificamos outros fatos que
poderiam ter contribuído para a motivação da homenagem em tela neste estudo a Alfredo Pinto, um de
natureza mais específica, intimamente relacionado à
Colônia de Psychopathas ou Alienadas do Engenho
de Dentro e outro de caráter circunstancial.
O primeiro refere-se à regulamentação da
Assistência Hetero-Familiar, obtida por Gustavo
Riedel, junto a Alfredo Pinto, em 24 de maio de
1921, sendo publicada no Diário Oficial de 07 de
junho do mesmo ano, conforme disposto no artigo
“A Assistência Hetero-Familiar (A.H-F) no Engenho
de Dentro”, redigido pelo Dr. Ernani Lopes, diretor
da Colônia Gustavo Riedel, quando da publicação
deste texto nos “Anais da Colônia Gustavo Riedel”,
de 1942.
Cabe salientar que, à época, tal modalidade
de assistência consistia em um avanço importante
na área da psiquiatria, sendo aplicada com êxito em
“países mais avançados”, sobretudo, nos europeus.
Consistia em desejo e luta de longa data dos alienistas brasileiros, em especial, da Colônia de Alienadas
[16,21]. De acordo com Juliano Moreira: “A assistência hetero-familiar é a maneira de assistência
mais compatível com os princípios de liberdade a
que se habituou o homem” [21].
Foi Alfredo Pinto, então, que aprovando a
Assistência Doméstica, como também era denominada a A.H-F, e garantindo-lhe uma verba anual
de 100:000$0, quantitativo significativamente elevado à época, tornou possível a sua efetivação. Tal
serviço ganhou tamanho vulto que se chegou a
criar, conforme as palavras de Ernani Lopes, uma
“verdadeira vila de assistência familiar de insanos”, a
qual recebeu a denominação de “Vila Gustavo Riedel”, quando o mesmo encontrava-se, ainda, vivo, e
aventava-se sua ampliação de modo a constituir um
“município de assistência a insanos” [21].
O outro aspecto que poderia ter concorrido
para a homenagem da Escola a Alfredo Pinto,
consiste em que se aventava, ao menos, desde meados do mês de agosto de 1921, a sua nomeação
para a presidência do Supremo Tribunal Federal,
a partir do dia 04 de setembro de 1921, cargo de
suma importância à época, suscitando freqüentes
elogios, congratulações e homenagens por parte de
autoridades e outras figuras de relevo social, como
atestam os registros noticiosos encontrados no Jornal do Commercio neste período, sobretudo, nos
últimos dias do mês de agosto e nos primeiros dias
de setembro[22-29].
Conclusão
Considerando os dados levantados pela presente
investigação, pudemos identificar alguns importantes
traços biográficos de Alfredo Pinto Vieira de Mello, o
que revelou um significativo envolvimento deste no
contexto político brasileiro, tendo ocupado cargos
de suma relevância nos governos dos presidentes
Affonso Penna (1906-1909) e Epitácio Pessoa (19191922). No mandato deste último, este advogado
exerceu suas mais destacadas funções, sendo Ministro da Justiça e Negócios Interiores (1919-1921),
Ministro Interino da Guerra (1919) e Presidente do
Supremo Tribunal Federal (1921-1923).
De acordo com artigos publicados em anais
da Colônia de Psychopathas ou Alienadas, posteriormente denominada Colônia Gustavo Riedel,
de 1929 e 1942, com autoria de seus funcionários,
e discursos proferidos por um professor e um exprofessor da Escola de Enfermeiras “Alfredo Pinto”
na romaria ao túmulo deste, como homenagem no
dia da enfermeira de 1942, também integrantes dos
anais deste ano, Dr. Gustavo Riedel deu a referida
denominação à seção feminina da EPEE, em 1921,
por ter o então Ministro da Justiça e Negócios
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Interiores Alfredo Pinto aprovado o Regimento
Interno desta Escola em setembro do mesmo ano,
oficializando-a, após vários períodos de funcionamento irregular.
Além disso, identificamos dois outros aspectos que poderiam ter concorrido para motivar a
denominação da seção feminina da EPEE de Escola de Enfermeiras “Alfredo Pinto”, quais sejam:
a regulamentação, por este sujeito, em maio de
1921, da Assistência Hétero-Familiar, na Colônia
de Alienadas do Engenho de Dentro, atendendo
ao pedido do seu então diretor Gustavo Riedel; e a
nomeação de Alfredo Pinto para a presidência do
Supremo Tribunal Federal, noticiada em jornal de
grande circulação à época, desde meados do mês de
agosto de 1921, tendo ocupado o cargo em 04 de
setembro do mesmo ano. Este fato gerou freqüentes
menções honrosas, homenagens e congratulações na
imprensa escrita a este ator social.
Assim, pensamos que o presente estudo permitindo-nos refletir mais profundamente sobre
um dos aspectos que estruturam a identidade da
EEAP, contribuiu para a construção e produção de
conhecimento sobre a sua história, bem como da
própria enfermagem brasileira, haja vista ter sido esta
escola pioneira na profissionalização da enfermagem
neste país.
O garimpo exaustivo em novas fontes de pesquisa vem se mostrando frutífero na recomposição
da trajetória da EEAP [1], pelo que pensamos e,
mesmo, esperamos não ter esgotado as discussões,
mas sim, suscitado novos debates, sem os quais
a construção e a produção de conhecimento não
podem avançar.
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questões na análise de dados qualitativos. Cad Pesq
1983;(45):66-71.
9. Reis DA. Alfredo Pinto Vieira de Mello. In: IAB. Expresidentes do IAB desde Montezuno: traços biográficos. Rio de Janeiro: Falcão; 1988.
10. Oliveira JG. História dos Órgãos de Classe dos Advogados. São Paulo: Indústria Gráfica Bentivegna; 1968.
11. IOAB. O Décimo Quinto Presidente. In: Livro do Centenário. Páginas Jurídicas: jurisconsultas, professores,
magistrados e advogados. 2º volume. Rio de Janeiro:
Jornal do Commercio; 1948.
12. OAB. História da OAB: luta pela criação e resistências.
Santa Maria: Pallelti Gráfica; 2003.
13. Supremo Tribunal Federal. Ministros do Supremo
Tribunal Federal. Disponível em: http://www.stf.gov.
br/institucional/ministros/republica.asp?cod_min=64.
Acesso em: 15 maio 2004.
14. Ministro Alfredo Pinto. Jornal do Brasil 1923; Jul 10.
p.Notas-7.
15. Ministro Alfredo Pinto: o seu fallecimento – notas biographicas. Jornal do Commercio 1923; Jul 9.p.Notas-1.
16. Annaes da Colônia de Psychopathas do Engenho de
Dentro. Rio de Janeiro, 1929. p. 45-57.
17. Noticiário: Homenagens à memória da Alfredo Pinto.
In: Ministério da Educação e Saúde. Serviço Nacional
de Doenças Mentais. Anais da Colônia Gustavo Riedel.
Rio de Janeiro: Imprensa Nacional; 1942;5(5).
18. Dia da Enfermeira. Jornal do Commercio 1942;Mai
11 e 12 .; Várias Notícias: 6.
19. Conferências, alocuções, inquéritos sociais, etc.:discursos à beira do túmulo de Alfredo Pinto. In: Ministério
da Educação e Saúde. Serviço Nacional de Doenças
Mentais. Anais da Colônia Gustavo Riedel. Rio de
Janeiro: Imprensa Nacional;1942;5(5).
20. Regimento Interno da Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras da Assistência a Alienados, publicado
no diário oficial de 02 de setembro de 1921.
21. Lopes E. A Assistência Hétero-Familiar no Engenho
de Dentro. In: Ministério da Educação e Saúde. Serviço Nacional de Doenças Mentais. Anais da Colônia
Gustavo Riedel. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional;
1942;5(5).
22. Dr. Alfredo Pinto. Jornal do Commercio 1921; Set 01.
p. Várias Notícias-5.
23. O Dr. Alfredo Pinto deixa a presidência da commissão
executiva – resoluções tomadas. Jornal do Commercio
1921; Set 01. p. Centenário da Independência-4.
24. Várias notícias. Jornal do Commercio 1921; Set 01.
p.5.
25. Dr. Alfredo Pinto. Jornal do Commercio 1921; Set 01.
p.Registro-5.
26. Várias Notícias. Jornal do Commercio 1921; Set 02.
p.6.
27. Dr. Alfredo Pinto. Jornal do Commercio 1921; Set 02.
p.Registro-7.
28. Várias notícias. Jornal do Commercio 1921; Set 03.
p.5.
29. Dr. Alfredo Pinto. Jornal do Commercio 03 de setembro de 1921; Set 03. p. Registro-6.
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Normas de publicação Enfermagem Brasil
A revista Enfermagem Brasil é uma publicação com periodicidade bimestral e está aberta para a publicação e divulgação
de artigos científicos das áreas relacionadas à Enfermagem.
Os artigos publicados em Enfermagem Brasil poderão
também ser publicados na versão eletrônica da revista (Internet)
assim como em outros meios eletrônicos (CD-ROM) ou outros
que surjam no futuro, sendo que pela publicação na revista os
autores já aceitem estas condições.
A revista Enfermagem Brasil assume o “estilo Vancouver”
(Uniform requirements for manuscripts submitted to biomedical
journals, N Engl J Med. 1997;336(4):309-315) preconizado pelo
Comitê Internacional de Diretores de Revistas Médicas, com as
especificações que são resumidas a seguir. Ver o texto completo
em inglês desses Requisitos Uniformes no site do International
Committee of Medical Journal Editors (ICMJE), http://www.
icmje.org, na versão atualizada de outubro de 2001.
Os autores que desejarem colaborar em alguma das
seções da revista podem enviar sua contribuição (em arquivo
eletrônico/e-mail) para nossa redação, sendo que fica entendido que isto não implica na aceitação do mesmo, o que será
notificado ao autor.
O Comitê Editorial poderá devolver, sugerir trocas ou retorno de acordo com a circunstância, realizar modificações nos
textos recebidos; neste último caso não se alterará o conteúdo
científico, limitando-se unicamente ao estilo literário.
1. Editorial
Trabalhos escritos por sugestão do Comitê Científico, ou
por um de seus membros.
Extensão: Não devem ultrapassar três páginas formato
A4 em corpo 12 com a fonte Times New Roman com todas as
formatações de texto, tais como negrito, itálico, sobrescrito, etc;
a bibliografia não deve conter mais que dez referências.
2. Artigos originais
São trabalhos resultantes de pesquisa científica apresentando dados originais de descobertas com relaçaõ a aspectos
experimentais ou observacionais, e inclui análise descritiva e/ou
inferências de dados próprios. Sua estrutura é a convencional
que traz os seguintes itens: Introdução, Métodos, Resultados,
Discussão e Conclusão.
Texto: Recomendamos que não seja superior a 12 páginas,
formato A4, fonte English Times (Times Roman) tamanho 12,
om todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobre-escrito, etc. O total de caracteres não deve ultrapassar
25.000/30.000 caracteres, inclusos espaçamentos.
Tabelas: Considerar no máximo seis tabelas, no formato
Excel/Word.
Figuras: Considerar no máximo 8 figuras, digitalizadas
(formato .tif ou .gif ) ou que possam ser editados em PowerPoint, Excel, etc.
Bibliografia: É aconselhável no máximo 50 referências
bibliográficas.
Os critérios que valorizarão a aceitação dos trabalhos
serão o de rigor metodológico científico, novidade, interesse
profissional, concisão da exposição, assim como a qualidade
literária do texto.
3. Revisão
São trabalhos que versem sobre alguma das áreas relacionadas à Enfermagem, que têm por objeto resumir, analisar,
avaliar ou sintetizar trabalhos de investigação já publicados em
revistas científicas. Quanto aos limites do trabalho, aconselha-se
o mesmo dos artigos originais.
4. Atualização
São trabalhos que relatam informações geralmente atuais
sobre tema de interesse dos profissionais de Enfermagem (novas
técnicas, legislação, por exemplo) e que têm características
distintas de um artigo de revisão.
5. Relato de caso
São artigos dados descritivos de um ou mais casos explorando um método ou problema através de exemplo. Apresenta
as características do indivíduo estudado, com indicação de sexo,
idade e pode ser realizado em humano ou animal.
6. Comunicação breve
Esta seção permitirá a publicação de artigos curtos, com
maior rapidez. Isto facilita que os autores apresentem observações, resultados iniciais de estudos em curso, e inclusive realizar
comentários a trabalhos já editados na revista, com condições de
argumentação mais extensa que na seção de cartas do leitor.
Texto: Recomendamos que não seja superior a três páginas, formato A4, fonte Times New Roman, tamanho 12,
com todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobre-escrito, etc.
Tabelas e figuras: No máximo quatro tabelas em Excel
e figuras digitalizadas (formato .tif ou .gif) ou que possam
ser editados em Power Point, Excel, etc
Bibliografia: São aconselháveis no máximo 15 referências
bibliográficas.
7. Resumos
Nesta seção serão publicados resumos de trabalhos e
artigos inéditos ou já publicados em outras revistas, ao cargo
do Comitê Científico, inclusive traduções de trabalhos de
outros idiomas.
8.Correspondência
Esta seção publicará correspondência recebida, sem que
necessariamente haja relação com artigos publicados, porém
relacionados à linha editorial da revista. Caso estejam relacionados a artigos anteriormente publicados, será enviada ao autor
do artigo ou trabalho antes de se publicar a carta.
Texto: Com no máximo duas páginas A4, com as especificações anteriores, bibliografia incluída, sem tabelas ou
figuras.
PREPARAÇÃO DO ORIGINAL
1.1 Os artigos enviados deverão estar digitados em processador de texto (Word), em página de formato A4, formatado
da seguinte maneira: fonte Times New Roman, tamanho 12,
com todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobrescrito, etc.
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1.2 Numere as tabelas em romano, com as legendas para
cada tabela junto à mesma.
1.3 Numere as figuras em arábico, e envie de acordo com
as especificações anteriores.
As imagens devem estar em tons de cinza, jamais coloridas,
e com qualidade ótima (qualidade gráfica – 300 dpi). Fotos e
desenhos devem estar digitalizados e nos formatos .tif ou .gif.
1.4 As seções dos artigos originais são estas: resumo, introdução, material e métodos, resultados, discussão, conclusão
e bibliografia. O autor deve ser o responsável pela tradução
do resumo para o inglês e o espanhol e também das palavraschave (key-words). O envio deve ser efetuado em arquivo, por
meio de disquete, zip-drive, CD-ROM ou e-mail. Para os
artigos enviados por correio em mídia magnética (disquetes,
etc) anexar uma cópia impressa e identificar com etiqueta no
disquete ou CD-ROM o nome do artigo, data e autor, incluir
informação dos arquivos, tais como o processador de texto
utilizado e outros programas e sistemas.
2. Página de apresentação
A primeira página do artigo apresentará as seguintes
informações:
- Título em português, inglês e espanhol.
- Nome completo dos autores, com a qualificação curricular e títulos acadêmicos.
- Local de trabalho dos autores.
- Autor que se responsabiliza pela correspondência, com
o respectivo endereço, telefone e E-mail.
- Título abreviado do artigo, com não mais de 40 toques,
para paginação.
- As fontes de contribuição ao artigo, tais como equipe,
aparelhos, etc.
3.Autoria
Todas as pessoas consignadas como autores devem ter
participado do trabalho o suficiente para assumir a responsabilidade pública do seu conteúdo.
O crédito como autor se baseará unicamente nas contribuições essenciais que são: a) a concepção e desenvolvimento,
a análise e interpretação dos dados; b) a redação do artigo ou
a revisão crítica de uma parte importante de seu conteúdo
intelectual; c) a aprovação definitiva da versão que será publicada. Deverão ser cumpridas simultaneamente as condições
a), b) e c). A participação exclusivamente na obtenção de
recursos ou na coleta de dados não justifica a participação
como autor. A supervisão geral do grupo de pesquisa também
não é suficiente.
4. Resumo e palavras-chave
Na segunda página deverá conter um resumo (com no
máximo 150 palavras para resumos não estruturados e 200 palavras
para os estruturados), seguido da versão em inglês e espanhol.
O conteúdo do resumo deve conter as seguintes informações:
- Objetivos do estudo.
- Procedimentos básicos empregados (amostragem,
metodologia, análise).
- Descobertas principais do estudo (dados concretos e
estatísticos).
Enfermagem_v5n1.indb 66
- Conclusão do estudo, destacando os aspectos de maior
novidade.
Em seguida os autores deverão indicar quatro palavraschave para facilitar a indexação do artigo. Para tanto deverão
utilizar os termos utilizados na lista dos DeCS (Descritores
em Ciências da Saúde) da Biblioteca Virtual da Saúde, que se
encontra no endereço internet seguinte: http://decs.bvs.br. Na
medida do possível, é melhor usar os descritores existentes.
5. Agradecimentos
Os agradecimentos de pessoas, colaboradores, auxílio
financeiro e material, incluindo auxílio governamental e/ou
de laboratórios farmacêuticos devem ser inseridos no final do
artigo, antes as referências, em uma secção especial.
6. Referências
As referências bibliográficas devem seguir o estilo Vancouver definido nos Requisitos Uniformes. As referências
bibliográficas devem ser numeradas por numerais arábicos
entre parênteses e relacionadas em ordem na qual aparecem
no texto, seguindo as seguintes normas:
Livros - Número de ordem, sobrenome do autor, letras
iniciais de seu nome, ponto, título do capítulo, ponto, In: autor
do livro (se diferente do capítulo), ponto, título do livro, ponto,
local da edição, dois pontos, editora, ponto e vírgula, ano da
impressão, ponto, páginas inicial e final, ponto.
Exemplos:
Livro:
May M. The facial nerve. New-York: Thieme; 1986
Capítulo ou parte de livro:
Phillips SJ. Hypertension and Stroke. In: Laragh JH, editor.
Hypertension: pathophysiology, diagnosis and management. 2nd
ed. New-York: Raven Press; 1995. p.465-78.
Artigos – Número de ordem, sobrenome do(s) autor(es),
letras iniciais de seus nomes (sem pontos nem espaço), ponto.
Título do trabalha, ponto. Título da revista ano de publicação
seguido de ponto e vírgula, número do volume seguido de dois
pontos, páginas inicial e final, ponto. Não utilizar maiúsculas
ou itálicos. Os títulos das revistas são abreviados de acordo
com o Index Medicus, na publicação List of Journals Indexed in
Index Medicus ou com a lista das revistas nacionais, disponível
no site da Biblioteca Virtual de Saúde (http://www.bireme.br).
Devem ser citados todos os autores até 6 autores. Quando mais
de 6, colocar a abreviação latina et al.
Exemplo:
Yamamoto M, Sawaya R, Mohanam S. Expression and
localization of urokinase-type plasminogen activator receptor
in human gliomas. Cancer Res 1994;54:5016-20.
Os artigos, cartas e resumos devem ser enviados para:
Jean-Louis Peytavin
Atlantica Editora
Rua da Lapa, 180/1103 - Lapa
20021-180 Rio de Janeiro RJ
Tel: (21) 2221 4164
E-mail: [email protected]
23/2/2006 16:25:13
Calendário de eventos
2006
Março
24 a 26 de março
II Encontro Baiano de Enfermagem em Nefrologia
Salvador, Bahia
Informações: www.wcn2007.org
27 a 30 de março
9º Encontro de Pesquisadores em Saúde Mental
e Especialistas em Enfermagem Psiquiátrica
São Paulo, SP
Informação:(16) 3602-3390
E-mail: [email protected]
25 a 27 de maio
10º. Congresso Regional de Videocirurgia
Sobracil RJ 2006
Centro de Convenções do Atlântico Búzios Convention
& Resort
Búzios, RJ
E-mail: [email protected]
Setembro
24 a 28 de setembro
9 º Congresso Brasileiro dos Conselhos de Enfermagem
Porto Seguro, BA
Informações: 0800-2822507
Outubro
Abril
7 a 11 de outubro
XIII Congresso Brasileiro de Enfermagem em
Nefrologia
Expo Gramado, RS
Informação: (11)32898347
6 a 8 de abril
XXIII Congreso Nacional de Enfermería de
Salud Mental
Torremolinos (Málaga), Espanha
E-mail: [email protected]
21 a 25 de outubro
VIII Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva
Riocentro
Rio de Janeiro, RJ
E-mail: [email protected]
27 a 28 de abril
4º. Congresso Nursing 2006
Universidade Anhembi Morumbi – Campus Brás
São Paulo, SP
E-mail: [email protected]
Maio
12 a 20 de maio
Semana da Enfermagem
Hospital Municipal Carlos Tortelly
Niterói, RJ
Informação: 2729-9345
23 a 28 de outubro
XII Congreso de la Sociedad Cubana de Enfermería
Sociedad Cubana de Enfermería (SOCUENF)
Santiago de Cuba, Cuba
Informação: Tel: 537 8323614
E-mail: [email protected]
Novembro
23 a 26 de maio
8º. Simpósio Nacional de Diagnóstico de Enfermagem
João Pessoa, PB
Informação: (61) 32260653
E-mail: abennacional.org.br
5 a 9 de novembro
58º. Congresso Brasileiro de Enfermagem
Salvador, Bahia
E-mail: [email protected]
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Enfermagem Brasil
Março / Abril 2006;5(2)
Índice
Volume 5 número 2 - Março / Abril de 2006
EDITORIAL
De quem a enfermagem cuida, do cliente ou do paciente?,
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento .................................................................................... 71
Equipamentos de proteção individual – um estudo com os profissionais
de saúde, Liu Chin Chin, Liane Albino da Silva,
Renata Castro da Silva Pereira, Rita Batista Santos ................................................................................. 73
Sistematização dos cuidados de enfermagem ao cliente intubado
à luz da teoria de Imogene King, Heleonora Diva Borges Rodrigues,
Maria José Coelho, Patricia de Souza Godinho ...................................................................................... 86
Ações sem sentido por (aparente) ausência de sentido: O ser humano
em coma como objeto do cuidado da equipe de enfermagem,
Mariana Gomes Cardim, Marcio Martins da Costa,
Maria Aparecida de Luca Nascimento, Nébia Maria Almeida de Figueiredo............................................. 95
Crianças portadoras de bexiga neurogênica submetidas a cateterismo
vesical intermitente limpo – Evolução clínica observada durante
a consulta de enfermagem, Taís da Silva Siqueira, Inês Maria Meneses dos Santos ................................ 101
Educação para a saúde e redução de danos:
enfermagem atuando com adolescentes, Luciana da Costa Monteiro,
Vera Lúcia Freitas de Moura, Viviane Tinoco Martins .......................................................................... 108
REVISÃO
A dor e o sofrimento psíquico em pacientes queimados:
implicações para a assistência de enfermagem,
Divane de Vargas, Milrley Lucia de Araújo .......................................................................................... 114
Custo e preço do processo de cuidar da enfermeira:
uma revisão bibliográfica, Vivian Schutz, Joséte Luzia Leite ............................................................... 120
NORMAS DE PUBLICAÇÃO ................................................................................................ 126
CALENDÁRIO DE EVENTOS................................................................................................ 128
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Enfermagem Brasil
Março / Abril 2006;5(2)
EDITOR CIENTÍFICO – PRESIDENTE DO CONSELHO CIENTÍFICO
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento (UniRio – Rio de Janeiro)
EDITOR ASSISTENTE
Guillermina Arias
CONSELHO CIENTÍFICO
Profa. Dra. Almerinda Moreira (Escola de Enfermagem Alfredo Pinto – UniRio – Rio de Janeiro)
Prof. Dr. Carlos Bezerra de Lima (UFPB – Paraíba)
Profa. Dra. Márcia Maria Fontão Zago (USP – Ribeirão Preto)
Profa. Dra. Margarethe Maria Santiago Rêgo (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Maria da Graça Piva (ULBRA – RS)
Profa. Dra. Maria Helena da Silva Nery (UFRGS – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Nebia Maria Almeida de Figueiredo (UniRio – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Rita Batista Santos (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Rita de Cássia Tapié Martins (USP – São Paulo)
Prof. Dr. Sérgio Ribeiro dos Santos (UFPB – Paraíba)
Profa. Dra. Silvia Helena de Bortoli Cassiani (USP – Ribeirão Preto)
Profa. Dra. Taka Oguisso (USP – São Paulo)
Profa. Dra. Valéria Lerch Lunardi (FURG – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Vera Regina Salles Sobral (UFF – Rio de Janeiro)
Prof. Dr. Wiliam César Alves Machado (UNIPAC – Minas Gerais)
Prof. Dr. Wilson D. Lunardi Filho (FURG – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Zaida Aurora Sperli Geraldes Soler (FAMERP – São José do Rio Preto – São Paulo)
GRUPO DE ASSESSORES
Profa Ms. Andréia Saccol Lourenço (Escola Técnica de Enfermagem São Francisco – Rio Grande do Sul)
Profa Ms. Dóris Maria Volquind (Clínica de Florais de RAFF – Rio Grande do Sul)
Profa Ms. Dulce Dirclair Huf (UFMS – Mato Grosso do Sul)
Profa Ms. Gisele Cristina Tertuliano (Rio Grande do Sul)
Profa Ms. Sonia Maria Ponciano dos Santos (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Prof. Ms. Dalmo Valério Machado de Lima (UFF – Rio de Janeiro)
Profª. Ms. Maria Filomena Vancellote Almeida (UniRio – Rio de Janeiro)
Rio de Janeiro
Direção de arte
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Atlântica Editora edita as revistas Fisioterapia Brasil, Nutrição Brasil, Brasilis, Ação & Movimento e Neurociências.
Foto da capa: Edmara Tabagiba (vice coordenadora da Casa do Parto e enfermeira obstetra), Sandra Yara, Telma Garrido (assistêntes sociais), Rafael
Ferreira, Débora Ribeiro, Rosana Figueiredo (enfermeiros obstetras), Maria Inês Silva (auxiliar de enfermagem) da Casa do Parto, Realengo, RJ.
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idéias expostos no material publicado.
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Enfermagem Brasil
Março / Abril 2006;5(2)
Editorial
De quem a enfermagem cuida,
do cliente ou do paciente?
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento
Muitas vezes, durante a apresentação de
palestras, conferências, atividades acadêmicas, tais
como; apresentação de trabalhos científicos, de
dissertações de mestrado e teses de doutorado, ou
até mesmo em conversas informais entre os profissionais que compõem a equipe de enfermagem,
ouço a seguinte pergunta quando a referência é
voltada para aquele ser humano que é alvo dos
nossos cuidados. Ele é paciente ou cliente?
Quase sempre, a narrativa se desenvolve
utilizando o termo “paciente”, sendo logo a seguir, corrigida para o termo “cliente”, como se
o termo “paciente” não soasse bem aos ouvidos
da platéia.
Consideração à parte, eu confesso que sempre usei, de uma forma geral, a palavra “paciente”
para me referir àquele de quem cuidava, pois, de
forma específica, sempre que possível, tratava-o
pelo nome, nem que para isso fosse preciso consultar o prontuário, no caso de ainda não conhecê-lo,
quando da sua entrada na emergência e/ou no
centro cirúrgico.
Porém, a título de uma assistência holística,
na qual todos os aspectos daquele que cuidamos
devem ser observados, inclusive a sua vontade e
a sua cidadania, começou-se a discutir nos meios
acadêmicos, se o termo “paciente” seria o mais
adequado para se referir àquela pessoa que estava
sendo alvo do nosso cuidado.
Dizem uns; o termo “paciente” tem uma
conotação de passividade, de dependência, ao
passo que o termo “cliente”, confere a ele, uma
característica de independência, de autonomia.
Sendo assim, após observar esses pontos de
vista, sempre que usava o termo “paciente”, comecei a me sentir culpada, mas, não convencida
de que estava criando uma pseudo dependência,
pois não era assim que entendia.
Porém, não conseguia explicar, nem, a minha relutância em aceitar o termo cliente, nem,
a minha opção pelo termo paciente, que eu considerava um termo isento de qualquer conotação
que não fosse aquela que eu pretendia dar; qual
seja a de me referir à pessoa que estava sob os
meus cuidados.
Bem, numa manhã, ao ouvir um programa
intitulado “Mundo Corporativo”, apresentado
pelo comentarista Max Gehringer, pude observar
como um programa, que a princípio nada tem a
ver com a enfermagem, me dava a resposta que
precisava, para poder entender uma dúvida que
há muito tempo me acompanhava.
O comentarista acima citado, durante a
sua narrativa, como sempre, leva o ouvinte, pelo
método indutivo, a perceber “pequenos” detalhes,
que ao final dela, fazem grandes diferenças.
A crônica aludia ao fato de que não ter paciência poderia não ser um defeito, e não tinha
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Enfermagem Brasil
Março / Abril 2006;5(2)
nada a ver com a enfermagem, volto a repetir, pois
era centrada no processo da entrevista, etapa pela
qual os candidatos a um emprego se submetem para
serem admitidos nas empresas.
Porém, no meio da narrativa, uma informação me chamou a atenção. Segundo ele, a palavra
“paciente” deriva do vocábulo “pathos”, do qual
derivou a palavra patologia, o estudo das doenças
humanas, e quando o médico se refere ao “paciente”,
não quer dizer que essa pessoa ficou à espera de uma
consulta, pacientemente, não, quer dizer que ele é,
simplesmente, um doente.
Ao consultar o dicionário da Academia Brasileira de Letras, entre outros significados, o vocábulo “paciente”, refere-se a “quem padece”, “quem
suporta resignadamente”, mas também quer dizer,
“doente”, simplesmente.
Por outro lado, o significado de “cliente”, entre
outros, no mesmo dicionário, refere-se àquela pessoa que consulta habitualmente os profissionais de
saúde, sem nenhuma alusão àquele que, de alguma
forma, depende de um cuidado, mas sim de uma
consulta.
Voltando ao impasse, se a referência deve ser
“cliente” ou “paciente”, em que pese o fato de muitas
vezes o “paciente” ter que ser “tolerante”, para espe-
rar a sua vez de ser atendido nos serviços públicos,
confesso que, determinantemente, e sem qualquer
culpa, continuarei a usar o vocábulo “paciente”,
para me referir àquele de quem cuido. Ademais,
se considerar que Florence Nightingale referia-se a
quem cuidava, por “doente” ou “enfermo”.
Contudo, pude perceber que a discussão sobre
a terminologia a ser adotada parte sempre de quem
vai prestar o cuidado, e não daquele que é alvo dele.
Nunca ouvi uma pesquisa a respeito da opinião do
paciente, não seria interessante ouvi-lo? Será que
não estamos, nós, profissionais de saúde, inferindo
aquilo que o paciente possa estar sentindo ao ser
tratado assim?
Considerar o “paciente” um doente, não deveria ter grandes implicações pré-conceituais, pois
estar doente não denigre nenhum ser humano, só
o torna mais frágil, e todos nós, seres humanos,
somos passíveis de desequilíbrios nas mais diferentes
esferas.
A meu ver, o pequeno detalhe que faz a grande
diferença durante a realização dos cuidados de enfermagem, é a possibilidade que tem o profissional de
se deter na fragilidade do momento pelo qual passa
o seu paciente, para que, a partir disso, possa atendêlo, respeitando toda a sua dignidade humana.
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Enfermagem Brasil
Março / Abril 2006;5(2)
Artigo Original
Equipamentos de proteção individual –
um estudo com os profissionais de saúde
*Liu Chin Chin, *Liane Albino da Silva, *Renata Castro da Silva Pereira, ** Rita Batista Santos, D.Sc.
**Curso de Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro – RJ,
**Enfermeira, Professora Adjunto do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem Anna Nery da
Universidade Federal do Rio de Janeiro – RJ
Resumo
O presente estudo teve por objetivo levantar artigos que explicam diversos temas relacionados à precaução universal (PU) e
que descrevem o uso correto dos equipamentos de proteção individual (EPI) e coletivo para o uso dos profissionais de saúde
ao entrarem em contato com pacientes em precaução. Sabemos que as precauções universais (PU) surgiram na tentativa de
aumentar a proteção destes profissionais, assim como na tentativa de diminuir a disseminação de microorganismos entre
pacientes, profissionais de saúde e visitantes. No entanto, percebemos que há uma certa negligência, resistência ou mesmo
desconhecimento por parte destes profissionais em adotarem essas medidas básicas de proteção. Almejamos com o estudo
conscientizar a todos os trabalhadores da área de saúde da importância do uso dos equipamentos de proteção.
Palavras-chave: infecção hospitalar, precaução universal, equipamento de proteção individual.
Abstract
Individual protection equipments – health professionals study
This paper is dedicated to the study of articles that explain different themes related to Universal Precautions (UP), which
describes the correct use of the Individual and Collective Protection Equipment (IPE) for health professionals when in
contact with patients who require special precaution. We know that Universal Precautions (UP) results from the need of
increasing protection to these professionals, as well as to reduce the dissemination of microorganisms between patients, health
professionals and visitors. However, it seems that there is a certain negligence and resistance or even unfamiliarity of these
professionals in adopting these basic measures of protection. The aim of this study is to make health professionals aware of
the importance of using protection equipments.
Key-words: hospital infection, universal precaution, individual protection equipment.
Artigo recebido em 08 de junho de 2005; aceito em 22 de março de 2006.
Endereço para correspondência: Rita Batista Santos, Rua Afonso Cavalcanti, 275, Cidade
Nova, Rio de Janeiro RJ, E-mail: [email protected]
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Resumen
Equipos de protección Individual – un estudio con profesionales de salud
El objetivo de este estudio ha sido buscar artículos que explican los diversos temas relacionados con la Precaución Universal (PU) y
que describen el uso correcto del Equipo de Protección Individual (EPI) y colectivo para uso de los profesionales de la salud al entrar
en contacto con los pacientes que requieren una especial precaución. Sabemos que las precauciones universales (PU) han surgido en
la tentativa de aumentar la protección de estos profesionales, así como tentativa de reducir la difusión de microorganismos entre los
pacientes, los profesionales de la salud y los visitantes. Sin embargo, percibimos que existe una cierta negligencia, resistencia o mismo
desconocimiento por parte de estos profesionales en adoptar esas medidas básicas de protección. Deseamos con el estudio concienciar
a todos los profesionales del área de la salud de la importancia del uso de los equipos de protección.
Palabras-clave: infección del hospital, precaución universal, equipo de protección individual.
Introdução
Percebemos que em um hospital universitário, muitos dos profissionais da área da saúde não
utilizavam ou utilizavam inadequadamente a paramentação específica ao entrarem em contato com
pacientes em precaução.
O incentivo para a escolha do tema foi nosso
descontentamento ao notarmos um confronto entre o
ensinado e exigido na teoria e o encontrado na prática.
Diante de tal fato, propomo-nos a levantar
arquivos na área de saúde, tanto nacionais quanto
internacionais, que preconizem técnicas para descreverem a forma correta da assistência da equipe de
saúde prestada a pacientes em precaução, descrever
as diferentes medidas preventivas e as técnicas corretas para melhorar a conduta dos profissionais de
saúde e, por fim, alertar e orientar a equipe de saúde
impedindo a disseminação de um agente infeccioso
de um paciente infectado ou colonizado a outros
pacientes e ao próprio profissional.
Dentre as precauções encontradas no hospital, podemos citar a Precaução Padrão ou Básica e
as Precauções Específicas. A Precaução Específica
engloba Precaução por Contato (Marsa, escabiose,
gastroenterite, etc.) e a Precaução Respiratória que
podemos classificar em Precaução de disseminação
por gotículas (caxumba, meningite, rubéola não
congênita, etc.) e Precaução de disseminação aérea
(sarampo, tuberculose, varicela, etc.).
Segundo o Manual de Infecções Hospitalares
[1], isolamento é a segregação de pessoas infectadas
durante o período de transmissibilidade da doença,
sob condições que permitam evitar a transmissão
direta ou indireta do agente infeccioso a indivíduos suscetíveis ou que possam transmiti-lo a outros
cujo objetivo é prevenir a disseminação de microrganismos entre pacientes, profissionais de saúde e
visitantes.
Quando estas medidas preventivas são negligenciadas, as doenças controladas por elas se disseminarão com grande facilidade. Caso o desprezo
dessas precauções ocorra num país subdesenvolvido
que apresenta saneamento básico precário e programas de saúde, inclusive o programa de imunização,
mal estabelecidos, podemos então testemunhar
freqüentes endemias e/ou epidemias.
No caso de ocorrer no ambiente hospitalar,
podemos então observar o surgimento de infecções
cruzadas (IC), e verificar a alteração no quadro clínico dos pacientes, o que afeta diretamente o tempo
de internação e uma elevação dos riscos ocupacionais
gerando um alto custo para as instituições hospitalares. Assim como mostra o REBEn [2]:
“Os riscos ocupacionais ligados à aquisição
de infecções pelos profissionais de saúde são de
particular importância tanto por acarretarem danos
à saúde dos profissionais, como por gerarem custos
elevados às instituições hospitalares”.
É válido para todos os profissionais da área de
saúde aplicar as precauções básicas, pois podemos
desconhecer, num primeiro instante, que estamos
atendendo pessoas consideradas portadoras de algum tipo de infecção.
A importância da prática dessas normas e o
uso de diferentes tipos de equipamento de proteção
individual (EPIs) tais como capote, máscara cirúrgica, máscara com proteção para micropartículas
(com filtro), luvas, óculos, botas, entre outros, está
intimamente ligada ao tipo de precaução imposta ao
paciente e ao procedimento a ser executado.
A equipe de saúde por atuar efetivamente no
cuidado dos pacientes, sempre em contato com vários pacientes, torna as normas de precaução básica
e/ou específica extremamente importantes. Por essa
e outras razões, os profissionais de saúde devem não
apenas conhecer, mas devem estar sempre atualizados com as novas normas preconizadas, receber
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constantemente treinamentos para o uso correto dos
equipamentos de proteção e estar sempre atentos na
execução das medidas preventivas para evitar a autocontaminação, impedindo a transmissão cruzada
e oferecendo assistência de qualidade.
Como acadêmicas, durante nossas experiências
de estágio supervisionado em diferentes setores, vimos
que muitos profissionais não utilizavam adequadamente tanto em relação ao uso de Equipamentos de
Proteção Individuais (EPIs), assim como no armazenamento, na destinação destes materiais.
O objeto de estudo desta pesquisa é descrever a
conduta dos profissionais de saúde com pacientes em
precaução, que será alcançado baseado na análise das
publicações na área de saúde, já que os periódicos,
artigos, livros constituem as principais fontes de
divulgação quando se deseja obter conhecimento
sobre determinado assunto.
Por esta razão, o nosso objeto de estudo será alcançado a partir dos estudos que ilustram a técnica correta
das equipes de saúde frente a pacientes em precaução.
Os objetivos do estudo foram:
• Levantar artigos na área de saúde, tanto nacionais
quanto internacionais, que preconizam a forma
correta das técnicas para assistência pelos profissionais da equipe de saúde de pacientes em uso
de precaução.
• Descrever as diferentes medidas preventivas e as
técnicas corretas para melhorar a conduta dos profissionais de saúde com pacientes em precaução.
• Alertar e orientar sobre a disseminação de um agente infeccioso do paciente infectado ou colonizado
a outros pacientes e ao próprio profissional.
As contribuições dos estudos residem no fato
de que os profissionais de saúde atendem constantemente a diversos pacientes simultaneamente e,
por isso, são mais suscetíveis a entrar em contato
e transmitir microrganismos infectantes, portanto,
desconsiderar o estudo e a execução dessas medidas
preventivas põe em risco a vida dos pacientes e do
próprio profissional. Por este motivo, se a equipe de
saúde está atualizada com essas precauções básicas e
específicas significa garantir a eficácia da imposição
da barreira de transmissão. Desse modo, o estudo
contribui alertando e orientando os profissionais
quanto à eficácia dessas medidas de precaução
despertando o interesse em usá-las corretamente
contribuindo diretamente para uma assistência
de qualidade. A pesquisa foi válida, pois levam os
profissionais a fazer o autoquestionamento acerca
de sua contribuição na prevenção da disseminação
de microrganismos no ambiente hospitalar. Além
disso, o estudo contribui não só para a produção
e uso de conhecimento sobre como evitar a transmissão do microrganismo de um paciente a outro,
mas também de um sítio para outro no mesmo
paciente.
Revisão de literatura
Epidemiologia
O quadro abaixo mostra a probabilidade da
aquisição do HIV por profissionais de saúde. Apesar
de serem dados americanos, podemos dizer que a
realidade brasileira seria similar, porém com índices
mais altos de acidentes.
Quadro I – Documentação e probabilidade da aquisição do HIV por profissionais de saúde, conforme o Center for
disease control and prevention. (CDCP)*
1992
1997
Atividade profissional
Documentado Probabilidade
Documentado Probabilidade
Consultório odontológico, inclusive dentista
0
6
0
7
Trabalhadores em funerárias
0
3
0
2
Técnicos socorristas e paramédicos
0
7
0
10
Outros técnicos e terapeutas
0
3
1
8
Fisioterapeuta (aparelho respiratório)
1
1
1
2
Atendentes
1
5
1
12
Trabalhador em manutenção de hospitais
1
5
1
7
Enfermeira
12
14
21
29
Técnico de laboratório
1
1
3
1
Médico clínico
4
7
6
10
Médico cirurgião
0
2
0
6
Auxiliar técnico de cirurgias
1
1
2
2
Outras atividades em saúde
0
2
0
2
Total
21
57
36
100
Fonte: [3]
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O índice documentado é baixo, comparado a
probabilidade, pois muitos profissionais têm medo
de relatar o acidente. O maior índice de acidentados é dos enfermeiros, o que abrange técnicos e
auxiliares de enfermagem, sendo de 57,14 % em
1992 e 58,3% em 1993, pois eles são de maior
contingente entre os profissionais no hospital.
Além disso, exercem procedimentos/ atividades
assistenciais e acompanham os pacientes nas suas
24 horas.
A Tabela seguinte mostra a freqüência de acidentes ocorridos com trabalhadores de enfermagem
em 1996, justificando e destrinchando o alto índice
entre os trabalhadores de enfermagem.
Tabela I – Freqüência de acidentes ocorridos com trabalhadores de enfermagem, segundo a categoria profissional,
1996.
Categoria Profissional
Total de trabalhadores
Trabalhadores acidentados
CR
nº
%
nº
%
Auxiliar de Enfermagem
436
70,6
66
80,5
15,13
Atendente de Enfermagem
135
21,8
12
14,6
8,88
Enfermeiro
47
7,6
4
4,9
8,51
Total
618
100
82
100
13,26
Fonte: [2]
Ao comparamos o contingente de trabalhadores acidentados, verificamos que houve variação
na freqüência de acidentes que pode ser analisada
pelos coeficientes de risco (CR). Constatamos na
categoria auxiliares de enfermagem que o CR de
acidentes de trabalho é quase o dobro das demais,
isto se justifica pelo fato de exercerem maior número
de procedimentos ou atividade junto ao paciente.
O menos CR é verificado na categoria enfermeiro,
isto ocorre porque a formação desta categoria se dá
através de curso superior, cujo processo abrange os
cuidados e as condutas nas precauções.
As tabelas abaixo mostram a distribuição do
uso dos EPIs entre os trabalhadores de enfermagem
acidentados e os motivos alegados pelos profissionais
acidentados para o não uso dos EPIs.
Tabela II – Distribuição do uso de equipamento de proteção individual, entre os trabalhadores de enfermagem acidentados, segundo o tipo, 1996.
Equipamento de Proteção Individual - EPI
Usava
Não usava
Total
Nº
%
Nº
%
Nº
%
Nenhum EPI
25
46,29
25
46,29
Luvas
21
38,89
21
38,89
Luvas e avental
2
3,7
2
3,7
Máscaras e luvas
1
1,85
1
1,85
Luvas, avental, gorro e máscara
1
1,85
1
1,85
Não responderam
4
7,42
Total
25
46,29
25
46,29
54
100
Fonte: [2]
Quanto ao uso dos EPI’S os profissionais alegaram os motivos resumidos na tabela 3.
Tabela III – Distribuição dos motivos alegados pelos trabalhadores para o não uso do equipamento de proteção individual pelos trabalhadores de enfermagem acidentados com perfurocortantes,1996.
Motivos alegados pelo não uso do EPI
nº
%
Desnecessário por não haver contaminação
21
84
Não usava por estar em horário de descanso
2
8
Negligência pessoal
1
4
Ineficácia da luva
1
4
Total
25
100
Fonte: [2]
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Apesar do índice ser igual entre os que usavam e não usavam EPIs, no momento do acidente,
mesmo assim podemos verificar que a maioria dos
trabalhadores (84%) julga ser desnecessário o uso
dos equipamentos de proteção individual. Este fator
pode estar relacionado à falta de informação e treinamento entre os profissionais de saúde. Segundo
o Manual de Infecções Hospitalares [1]:
“Uma das funções mais importantes de uma
comissão de controle de infecção hospitalar é promover cursos de treinamento para os profissionais
de diversos níveis e setores do hospital.”
Comissão de controle de infecção hospitalar
A implantação da Comissão de Controle de
Infecção Hospitalar (CCIH) ocorreu em 1983
como uma exigência do Ministério da Saúde para
todo e qualquer hospital, alegando que as infecções
hospitalares poderiam causar danos significativos à
clientela dos serviços de saúde. De acordo com o
Manual de Infecções Hospitalares [1]:
“Em 24 de junho de 1983, pela Portaria 196,
o Ministério da Saúde (MS), considerando que as
infecções hospitalares podem causar significativos
danos à clientela dos serviços de saúde, expediu
instruções para o controle e prevenção das infecções
hospitalares. Estabeleceu que a ocorrência de casos
de infecção hospitalar decorrentes do uso inadequado de procedimentos diagnósticos e terapêuticos
e em descumprimento das normas estabelecidas,
incorrerá nas medidas previstas no Código Penal.
Todos os Hospitais do País, independentemente
da natureza da entidade mantenedora, deverão ter
comissão de Controle de Infecção Hospitalar.”
Composição
A CCIH consiste de representantes multiprofissionais, tais como da área médica, da
enfermagem, farmácia, nutrição, laboratório e
administração.
realizar ação educativa. De acordo com a Portaria
196, são consideradas funções da CCIH:
• Implantar um sistema de Vigilância Epidemiológica das Infecções Hospitalares;
• Treinamento em serviço;
• Elaboração de técnicas complementares para
prevenção das infecções;
• Elaboração de medidas e supervisionar a sua
aplicação;
• Implantar controle do uso de antimicrobianos;
• Participar na investigação dos casos.
Além disso, a CCIH deve traçar metas semestrais e anuais, as quais devem ser reavaliadas periodicamente pela própria comissão e pela comunidade
hospitalar.
Treinamento em serviço
A CCIH tem o dever de oferecer treinamento
e reciclagem direcionado para todos os profissionais
de saúde. Segundo o Manual de Infecções Hospitalares [1]:
“Uma das funções mais importantes de uma
comissão de controle de infecção hospitalar é promover cursos de treinamento para os profissionais
de diversos níveis e setores do hospital. Alguns hospitais do país são credenciados pelo Ministério da
Saúde como Centros de Treinamento em controle
de infecções hospitalares. Junto com a Secretaria de
Saúde do Estado planejam curso de introdução ao
Controle de Infecção Hospitalar, dentro do programa nacional de controle de infecção do Ministério
da Saúde”.
Riscos de transmissão
O quadro a seguir mostra o risco de transmissão das doenças entre profissionais e pacientes
e vice-versa. A classificação dos tipos de precaução
para cada tipo de doença são baseados nesses fatores
de risco. Lembrando que o uso de precaução padrão
cabe a todos os tipos de doença independente do
estágio em que ela se encontra.
Funções
A Função básica de toda comissão de controle
de infecção é exercer o papel de educador, ou seja,
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Quadro II – Categorização dos riscos de transmissão de infecções entre os que trabalham em hospitais e pacientes
relacionados com o sentido da transmissão.
Infecção
Pacientes => profissionais
Profissionais => pacientes
HIV¹
Pequeno
Pequeno
Varicela/zoster²
Alto
Alto
Conjuntivite viral³
Médio
Médio
Citomegalovírus²
Baixo
Baixo
Hepatite A¹
Baixo
Raro
Hepatite B¹
Médio
Raro
Hepatite C¹
Baixo
Indeterminado
Herpes simples¹
Baixo
Raro
Influenza¹
Médio
Médio
Sarampo²
Alto
Alto
Infecção menigocócica²
Raro
Indeterminado
Parotidite infecciosa²
Médio
Médio
Parvovírus B19²
Médio
Médio
B. pertussis²
Médio
Médio
Rotavírus²
Médio
Médio
Rubéola²
Médio
Baixo
Salmonella/Shigella4
Baixo
Baixo
Escabiosa “Sarna” ³
Baixo
Baixo
Staphylococcus aureus¹
Indeterminado
Raro
Streptococcus Grupo A¹
Indeterminado
Indeterminado
Sífilis (T. pallidum)¹
Baixo
Indeterminado
Tuberculose²
Baixo a alto
Baixo a alto
1
Transmitido por inoculação; 2transmitido por inalação; 3transmitido por contato; 4transmitido por ingestão.
Fonte: [3]
Tipos de transmissão
Basicamente podemos classificar os tipos de
transmissão em contato direto, contato indireto,
por gotículas e pelo ar.
• Transmissão por contato direto: acontece quando
há um contato direto com a superfície corporal,
ocorrendo assim à transferência do microrganismo entre o paciente infectado ou colonizado e o
indivíduo suscetível.
• Transmissão por contato indireto: ocorre através
da transferência do microrganismo que está presente num objeto contaminado para um outro
indivíduo suscetível.
• Transmissão por gotículas: é causada pelas gotículas produzidas durante a fala, espirro, tosse e/ou
durante a realização de alguns procedimentos
hospitalares. Este tipo de transmissão ocorre
quando há um contato muito próximo com uma
distância aproximada ou menor que um metro (≤
1 metro) entre a fonte de infecção e o indivíduo
suscetível.
• Transmissão pelo ar: ocorre por disseminação de
micropartículas infectantes (≤ 5 µm) evaporadas
de gotículas.
As figuras e o quadro abaixo foram anexados
para melhor ilustrar as vias e o modo de transmissão,
e o meio de invasão de microrganismos.
Figura 1 – Vias de transmissão de infecções cruzadas
(IC).
Fonte: [3]
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Quadro III – Os modos de transmissão de infecções e
as rotas de entrada dos microrganismos.
Modalidades
Contato direto. Ex. contato com a boca de um paciente
Contato indireto. Ex. contato com objetos contaminados
Gotículas. Ex. Névoas, espirros, aerossóis, derramamentos
Vias
Inalação
Ingestão
Membranas mucosas
Rupturas de pele
Fonte: [3]
Figura 2 – Meios de invasão de microrganismos.
Fonte: [3]
Categorias de precaução
• Podemos classificá-las em Precaução Padrão ou
Básica e Precaução Específica a qual é baseada no
mecanismo de transmissão das doenças. Podemos
subdividir esta última precaução em: Precaução
de disseminação Aérea, Precaução de disseminação por Gotículas e a Precaução de disseminação
por Contato.
• Precaução Padrão ou Básica: também conhecida
por Precaução Universal.
Esta precaução foi proposta por Centers for
Disease Control and Prevention (Centros para o
Controle e Prevenção de Doenças – CDC) dos
EUA, sendo amplamente adotadas pelas instituições
de saúde como normas de conduta. A implementação da Precaução Padrão foi em resposta a dados
publicados em 1978 que mostravam um aumento
do índice de infecção em profissionais de saúde,
comparado à população em geral, por esta razão,
houve uma maior preocupação em relação à exposição dos profissionais de saúde ao sangue e outros
fluidos potencialmente contaminados. É indicado
para todos os pacientes independente do seu diagnóstico e engloba o uso de barreiras, para reduzir a
exposição dos agentes de saúde. Deve ser adotado
na manipulação de sangue, fluídos corporais, secreções, excreções (exceto suor), pele não-íntegra
e mucosas.
Tem como objetivo evitar a exposição dos profissionais de saúde a materiais contaminados com
potencial transmissão de HIV, HVB, HVC.
Compreendem o uso de barreiras de proteção
como: lavagem das mãos antes e após o contato com
o paciente, mesmo quando com o uso de luvas; uso
de EPI – luvas não estéreis, capote impermeável de
manga longa, máscara cirúrgica, protetor ocular,
sapato fechado; imunização para hepatite B de
todos os profissionais de saúde que trabalham em
assistência à saúde; entre outros.
• Precaução aérea
Tem como objetivo evitar a transmissão de
patologias transmitidas por microgotículas (<5 µ)
que ficam em suspensão no ar por longos períodos
podendo ser dispersas a longas distâncias e com
movimento das pessoas pode ressuspender essas
micropartículas infectantes. Estas podem ser geradas
durante a tosse, fala, espirro ou durante a realização
de procedimentos como a aspiração, broncoscopia
e intervenções odontológicas.
Compreende o uso obrigatório do quarto privativo com banheiro e pia, que deve ser mantido com as
portas fechadas e as janelas abertas. O ideal é quarto
com sistema de ventilação com pressão de ar negativa
(instalação de exaustor que retira ar do ambiente e lança
para o exterior do prédio), com o mínimo de 06 trocas
de ar/hora e filtro HEPA (High Efficiency Particulate
Air – filtro de alta eficiência); utilizar sempre a máscara
com filtro (N95) antes de entrar no quarto; e colocar
máscara cirúrgica no paciente ao transportá-lo para
realizar exames ou outros procedimentos.
• Precaução contra perdigotos ou gotículas
Tem como objetivo evitar a transmissão de
patologias transmitidas por partículas maiores que 5
µ que ficam em suspensão no ar e percorrem curtas
distâncias (até 1 m).
Compreende preferivelmente uso do quarto
privativo, caso não seja possível, manter distância
mínima de 1,20m entre os leitos; utilização de
máscaras cirúrgicas pelos profissionais quando se
aproximarem à distância mínima de 1m do leito
do paciente infectado.
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• Precaução de contato
Indicada para pacientes portadores de microrganismos transmitidos pelo contato direto através
das mãos ou indiretamente por equipamentos. É a
mais importante e mais freqüente via de transmissão
das infecções hospitalares.
Compreende quarto preferivelmente privativo
(com banheiro e pia); uso de equipamentos individualizados. Caso isso não seja possível, os equipamentos deverão passar pelo processo de desinfecção
após cada uso; uso de luvas e avental de mangas compridas não estéreis (capote), que devem ser trocados
após o cuidado com cada paciente e no manuseio de
seus utensílios e mobiliários. Retirá-los antes de sair
do quarto e lavar as mãos imediatamente.
•Tipos de materiais utilizados
O equipamento de proteção individual (EPI)
tem como objetivo formar a barreira primária para os
usuários e reduzir para um risco mínimo a exposição
dos trabalhadores e agentes contaminantes. A seleção
dos EPIs deve seguir as determinações da avaliação de
risco realizada nos ambientes de trabalho e dependerá
também do procedimento a ser realizado. Os profissionais devem estar conscientes e usar EPIs e EPCs,
sempre que estiverem expostos a riscos, bem como saber
selecioná-los, para garantir a usa própria proteção.
Considera-se EPI todo dispositivo de uso
individual, de fabricação nacional ou estrangeira,
destinado a proteger a saúde e a integridade física do
usuário. EPI é um equipamento de uso individual,
portanto, não é adequado o uso coletivo destes por
questões de segurança e higiene.
A utilização dos EPIs encontra-se regulamentada pelo Ministério do Trabalho através da NR-6
(Norma regulamentadora), em que estão definidas
as obrigações do empregador e do empregado. Citaremos algumas das obrigações.
São obrigações do empregador:
• Adquirir e fornecer gratuitamente o EPI adequado e em perfeito estado de conservação e
funcionamento;
• Fornecer EPI aprovado pelo Ministério do Trabalho e Administração (MTA) sendo de empresas cadastradas no Departamento Nacional de
Segurança e Saúde do Trabalhador (DNSST),
acompanhado do Certificado de Aprovação (CA),
expedido pelo MTA;
• Oferecer treinamento ao trabalhador sobre o seu
uso adequado;
• Tornar obrigatório o uso de EPIs;
• Substituí-lo imediatamente quando danificado
ou extraviado;
• Responsabilizar-se por sua higienização e manutenção periódica.
São obrigações do empregado:
• Usar o EPI apenas para a finalidade a que se
destina;
• Responsabilizar-se por sua guarda e conservação;
• Comunicar ao empregador qualquer alteração
que torne o EPI impróprio para o uso.
Para prolongar a vida útil dos EPIs, o usuário
deve ter alguns cuidados tais como:
• Mantê-lo em bom estado de limpeza;
• Guardar os EPIs em local próprio, longe da luz
solar, fontes de calor, umidade e de contaminação.
Os equipamentos de proteção individual consistem em: avental não cirúrgico, avental cirúrgico,
capote, gorro, máscara, óculos, sapatilhas (propé)
ou sapato próprio do consultório, luvas. Isolamento
absoluto e campos do paciente.
a) Luvas
As luvas são de uso obrigatório para todos
aqueles que trabalham e manipulam microrganismos
patogênicos, coleta de amostras para análise, manipulação e transporte de excreções, fluidos corporais,
sangue, secreções, operação com materiais quentes
ou frios, manuseio de animais, lavagem de material,
preparação de reagentes, manipulação, transporte e
estocagem de produtos químicos, ou em qualquer
outra atividade com risco conhecido ou suspeito, pois
elas impedem o contato direto desses materiais com
as mãos desnudas. Elas constituem uma das barreiras
mais importantes na proteção do profissional.
No ambiente hospitalar, as luvas devem ser
trocadas após a manipulação de cada paciente e as
mãos lavadas imediatamente após sua retirada.
As luvas devem ser anatômicas, resistentes e
não devem causar desconforto ao usuário bem como
tirar a destreza do mesmo. Devem proporcionar
sempre que possível maleabilidade e flexibilidade.
Em geral, as luvas utilizadas pelos profissionais de
saúde apresentam estrutura leve fornecendo grande maleabilidade e flexibilidade, o que é indicada
para trabalhos leves. Na sua grande maioria são de
borracha natural, o que a torna de baixo custo. Elas
são conhecidas no mercado brasileiro como luvas de
látex. Possuem boa propriedade física e são usadas
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para trabalhos gerais. Podemos subdividir essas luvas
de látex descartáveis em:
• Luvas de procedimento, ou seja, não estéreis.
• Luvas cirúrgicas, também conhecidas por luvas
estéreis.
b) Máscaras
As vias aéreas superiores representam a principal
via de penetração de contaminantes no organismo e
é por esta razão que devemos minimizar os riscos de
contaminação por esta via. Com o uso de máscaras,
as vias aéreas superiores são protegidas com alta eficiência, pois estas são capazes de filtrar partículas de
aerossóis produzidas durante a fala, espirro, tosse ou
mesmo por certos procedimentos hospitalares.
As máscaras utilizadas em precauções podem
ser de dois tipos: A cirúrgica ou com proteção para
micropartículas, também chamadas por respiradores.
As máscaras cirúrgicas são eficientes nas precauções
de patologias transmitidas por gotículas. As máscaras
com proteção para micropartículas, ou seja, com filtros N95 são utilizadas na prevenção de transmissão
aérea. As máscaras N95 retêm quantidade igual ou
maior que 95% de partículas menores que 5 (são de
uso individual e têm durabilidade de até 3 meses se
mantidas secas e íntegras. Não devem ser dobradas.
c) Óculos
Os óculos são equipamentos de proteção individual, destinada à proteção dos olhos, evitando
respingo de material infectante, substâncias químicas, partículas ou outros materiais que possam
causar irritação nos olhos ou lesões. Os óculos
devem ser compatíveis aos demais EPIs, devem ser
confortáveis, leves, resistentes e maleáveis, confeccionados para proteger completamente os olhos sem
comprometer o campo visual do usuário.
Para prolongar a vida útil dos óculos de proteção,
devem-se ter alguns cuidados básicos, tais como:
• Colocar e remover os óculos com as duas mãos,
para evitar desalinhar as hastes;
• Ao retirar os óculos no intervalo de um procedimento com outro, evitar deixá-lo próximo a
fontes de calor ou de contaminação;
• Guardá-lo em local apropriado e com as lentes
para cima, protegidos do calor, impacto e contato
com produtos químicos ou biológicos.
cobre todo o cabelo e orelhas, sem deixar pendentes,
cuja função é de evitar a contaminação dos cabelos
por aerossóis constituídos por microrganismos, matéria orgânica, partículas expelidas e parasitas.
e) Capote
Os capotes são usados ao prestarmos cuidados
aos pacientes em Precaução de Contato e serve para
prevenir a contaminação das roupas e da pele dos
profissionais de saúde, quando há risco de exposição
ao material orgânico. Os capotes devem ser:
• Grande o bastante para cobrir a roupa do usuário;
• Feito de material resistente o suficiente para
impedir ao máximo que os fluidos corporais,
secreções e eliminações entre em contato com o
profissional caso haja um acidente;
• Trocados após o cuidado de cada paciente.
f ) Botas
Utilizados para proteção dos membros inferiores e dorso do pé quando expostos em procedimentos que possibilitam respingos de fluidos orgânicos,
ou durante a limpeza do ambiente hospitalar.
g) Quarto privativo
Indicado para pacientes que transmitem a sua
patologia por ar ou por aerossol. Deve-se manter a
porta do quarto sempre fechada independente da
presença ou ausência deste no quarto.
Após ter discutido cada equipamento, o quadro
a seguir mostra a ordem sugerida para a paramentação
segundo o livro de Biossegurança e Controle de Infecção
Cruzada em Consultórios Odontológicos:
Quadro IV – Ordem sugerida para colocar-se ou retirar-se
as barreiras mecânicas em cirurgias e outros procedimentos.
Colocação
Manilúvio (sumário) => Propé => manilúvio (minucioso) => Avental => Óculos => Máscara => Luvas
Retirada
Avental => Luvas => Óculos => Máscara => Propé
=> Manilúvio final (minucioso)
Fonte: [3]
Metodologia
Tipo de estudo
d) Gorro
O gorro é a medida de prevenção individual tanto para a equipe de saúde quanto para o paciente. Este
É um estudo exploratório, com abordagem
bibliográfica. Através do levantamento de livros de
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referência e de publicações periódicas para descrever
a conduta dos profissionais de saúde em relação aos
pacientes em precaução.
autoras no sexto período de graduação em enfermagem
de uma universidade federal do Rio de Janeiro.
Resultados
Coleta de dados
O procedimento metodológico utilizado foi a
coleta de dados, que ocorreu de agosto a dezembro
de 2004 através de livros de leitura corrente, livro de
referência, publicações e impressos. Para realização do
levantamento de dados foi acumulado o maior número
possível de material para investigação. Os dados foram
coletados nos acervos de diferentes bibliotecas em uma
universidade pública do Rio de Janeiro e através de pesquisas na rede mundial de computadores (Internet).
Apresentação, análise e discussão dos dados
Os dados foram submetidos à análise temática e
analisados à luz do referencial teórico. Para discutir os resultados, foram considerados os cuidados gerais preconizados pelo Ministério da Saúde aos pacientes em precaução.
Este estudo foi apresentado como relatório elaborado pelas
A pesquisa feita em livros, periódicos e na rede
mundial de computadores (Internet) demonstrou
que há escassez no estudo referente à infecção hospitalar, sendo a maioria dos artigos encontrados
relacionados a acidentes de trabalho por materiais
perfurocortantes. A aquisição de doenças pelos profissionais através de outros meios como por contato,
pelo ar e por gotículas foi muito pouco citada.
Dos livros referentes à infecção, poucos exemplares eram dedicados à área hospitalar, sendo que
os dois manuais de infecção hospitalar encontrados
foram publicados por hospitais universitários . A
maioria das publicações era voltada para área laboratorial e consultórios odontológicos.
Além dos livros, foram também analisados 178
periódicos, sendo a Revista Brasileira de Enfermagem e
a Revista da Escola de Enfermagem da USP [2,] os que
publicaram um maior número de exemplares durante
o recorte temporal da pesquisa (52 exemplares cada).
Tabela IV – Distribuição de acordo com o número de exemplares dos periódicos nacionais entre 1988 e 2004 e dos
livros nacionais e internacionais entre 1988 e 2004 [1-21]. Rio de Janeiro 2004.
Título de livros e periódicos
Número de exemplares
Fi
Fi%
Revista Brasileira de Enfermagem
52
26,3
Revista da Escola de Enfermagem da USP
52
26,3
Revista de Enfermagem UERJ
24
12,1
Revista Gaúcha de Enfermagem
22
11,1
Texto & Contexto Enfermagem – UFSC
28
14,2
Control of Hospital Infection
1
0,5
Epidemiologia Aplicada ao Controle das Infecções Hospitalares
1
0,5
Biossegurança de OGM
1
0,5
Biossegurança em Ambientes Hospitalares e odontológicos.
1
0,5
Epidemiology of Hospital Associated Infections
1
0,5
Guia de Vigilância Epidemiológica
1
0,5
Manual de Biossegurança
1
0,5
Biossegurança e controle de Infecção Cruzada em Consultórios Odontológicos.
1
0,5
Elementos de Epidemiologia Geral
1
0,5
Manual de Infecções Hospitalares
1
0,5
Doenças infecciosas
1
0,5
Biossegurança Aplicada a Laboratórios e Serviços de Saúde
1
0,5
Imunologia Básica e Clínica
1
0,5
Epidemiologia Teoria e Prática
2
1
Epidemiologia e Saúde
1
0,5
Estrutura e Dinâmica das Comissões de Controle de Infecção Hospitalar
1
0,5
Biossegurança
1
0,5
Yale New Heaven Hospital Infection Control Manual
1
0,5
Total
198
100
82
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A explicação para o fato de a Revista Brasileira
de Enfermagem e a Revista da Escola de Enfermagem
da USP terem o maior número de exemplares é
porque elas tem tido freqüência quadrimestral que
passou a ser trimestral. De outro modo, o periódico
que publicou o menor número de exemplares foi
a Revista Gaúcha de enfermagem (22 exemplares),
fato explicado pela periodicidade essencialmente
semestral do periódico. Desconsideramos o número
de exemplares de cada livro, pelo fato de não termos
buscado todas as suas edições.
Tabela V – Distribuição de acordo com o número de artigos científicos publicados nos periódicos nacionais entre 1988
e 2004. Rio de Janeiro, 2004.
Década
80
90
0
Total
Periódico
Fi
Fi%
Fi
Fi%
Fi
Fi%
Fi
Fi%
Revista Brasileira de Enfermagem
56
7,6
342
46,6
336
45,8
734
100
Revista da Escola de Enfermagem da USP
60
9,3
333
51,5
253
39,2
646
100
Revista de Enfermagem UERJ
Revista Gaúcha de Enfermagem
NE
-180
57,3
134
42,7
314
100
Texto & Contexto Enfermagem – UFSC
28
14,9
106
56,4
54
28,7
188
100
NE
-466
61
298
39
764
100
Total
144
5,5
1427
53,9
1075
40,6
2646
100
Legenda: NE – Volume “Não Encontrado” nos sistemas de informação e bibliotecas disponíveis para a pesquisa.
De acordo com a tabela 2, foram pesquisados
nos periódicos um total de 2646 artigos científicos
nacionais. Em conjunto, os periódicos pesquisados
publicaram mais artigos na década de 90 (1427
artigos), em oposição a década de 80 (somente 144
artigos). Isto se deve ao fato de ter muitos volumes
não encontrados e por não termos buscado periódicos anteriores a 1988.
O periódico Texto & Contexto Enfermagem
– UFSC foi o que mais publicou artigos científicos, o
que não foi previsto na análise da tabela 1. Em con-
trapartida, apesar da Revista Brasileira de Enfermagem
ter quase o dobro de exemplares (52 exemplares) que
a Texto & Contexto Enfermagem – UFSC (somente 28
exemplares), esta última tem o maior número de artigos
publicados mesmo não estando com a sua totalidade
de publicações no recorte temporal da pesquisa.
Os periódicos Revista Gaúcha de Enfermagem e a
Revista de Enfermagem UERJ , além de terem menos
exemplares (tabela1), têm também o menor número de
artigos publicados na recorte temporal da pesquisa ( 188
exemplares e 314 exemplares respectivamente).
Tabela VI – Distribuição de acordo com o número de publicações científicos relacionados as precauções universais
nos periódicos nacionais entre 1988 e 2004. Rio de Janeiro 2004.
Década
80
90
0
Total
Periódico
Fi
Fi%
Fi
Fi%
Fi
Fi%
Fi
Fi%
Revista Brasileira de Enfermagem
0
0
2
100
0
0
2
100
Podemos observar através da leitura da tabela
6 que somente o periódico Revista Brasileira de
Enfermagem publicou artigos referente à Precaução
Universal. Nenhum outro periódico pesquisado
apresentou artigos sobre esta mesma temática, po-
rém foram encontrados diversos artigos referentes
à infecção hospitalar, doenças transmissíveis e isolamento, uso de EPIs e acidentes com perfurocortantes nos cinco periódicos pesquisados.
Quadro 4 – Título do artigo referente a Precaução Universal encontrados no periódico da Revista Brasileira de Enfermagem, no período de 1988 e 2004. Rio de janeiro 2004.
Periódico
Revista Brasileira de Enfermagem
Ano
Volume
Título dos artigos
1993
46
Incidência de acidentes de trabalho relacionada com a não utilização das precauções universais.
1995
48
Adesão às precauções universais: Uma análise do comportamento da equipe de enfermagem.
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Enfermagem Brasil
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O quadro 4 demonstra a distribuição dos títulos dos artigos pesquisados de acordo com o ano
e o volume em que foi publicado.
Na leitura dos títulos, podemos notar que o
ártico refere-se a adesão e a não adesão às precauções
universais. Foi analisado em especial a equipe de
enfermagem por este exercer a assistência integral
ao paciente e por ser o maior contingente dos trabalhadores hospitalares.
Quadro 5 – Distribuição de acordo com as palavraschaves dos artigos referentes à precaução universal e
infecção hospitalar nos periódicos nacionais entre 1988
e 2004. Rio de janeiro 2004.
Palavras-chaves
Números de Ocorrências
Precaução universal
2
Infecção Hospitalar
5
Isolamento
2
Acidentes de trabalho
10
Instrumentos perfurocortantes
4
Através do quadro 5, podemos perceber que a
palavra mais utilizada é “ Acidentes de trabalho” com
10 ocorrências, as menos utilizadas são “ Precaução
Universal” e “ Isolamento” (2 ocorrências). A utilização da palavra-chave facilita a procura dos artigos
a serem pesquisados principalmente na realização de
pesquisa nos banco de dados.
Conclusão
A partir dos dados obtidos com esta pesquisa no
recorte temporal de 1988 a 2004, pode-se perceber
que os profissionais, embora tenham conhecimento
da importância da paramentação perante os pacientes
em precaução, não a utilizam, alegando acharem desnecessário por não haver contaminação, negligência
pessoal e até mesmo ineficácia dos EPI’S.
Embora seja notória a importância de estudos
pertinentes ao tema em questão, identificamos um
déficit significante de material bibliográfico sobre
métodos e instruções de precaução direcionados aos
profissionais de saúde na área hospitalar. Achamos,
a partir deste fato, que a negligência de certos profissionais neste contexto, advêm desta dificuldade
ao acesso de informações.
Por fim, almejamos que, por meio deste estudo, possamos contribuir não só para uma maior
conscientização dos profissionais de saúde, como
também para o incentivo a outras pesquisas que
abordem esta temática.
Referências
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Janeiro: Medsi; 1993.
2. Sarquis LMM, Felli VEA. O uso dos equipamentos de
proteção individual entre os trabalhadores de enfermagem acidentados com instrumentos perfurocortantes.
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Paulo: Santos; 2002. p.73-224.
4. Aylitte GAJ, Lowbury EJL, Williams JD. Control of
hospital infection: a practical handbook. Rio de Janeiro:
Revinter Ltda; 1998.
5. Couto CR, Pedrosa TMG. Epidemiologia aplicada
ao controle das infecções hospitalares. Rio de Janeiro:
Medsi; p.5-37. Medsi, 2000. p. 5-37.
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2003.
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Virtual; 2003. p.93-97.
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1980.
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de Saúde, Centro Nacional de Epidemiologia. Ministério da Saúde: Brasília; 1994.
10. Hirata MH, Mancini Filho J. Manual de Biossegurança.
1a ed. Manole; 2002.
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12. Maragoni DV, Schechter M. Doenças infecciosas:
conduta diagnóstica e terapêutica. Rio de Janeiro:
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13. Mastroeni MF. Biossegurança aplicada a laboratórios e
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15. Pereira MG. Epidemiologia teoria e prática. Rio de
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16. Rouqwayrol MZ. Epidemiologia e saúde. 3a ed. Rio
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comissões de controle de infecção hospitalar. São Paulo:
Sarvier; 1997. p.34-41.
19. Starling CEF. Vigilância epidemiológica das infecções
hospitalares. Edição Especial. Rio de Janeiro: Skorpia
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21. Yale New Heaven Hospital Infection Control Manual
[online].New Haven:Yale New Haven Hospital; 2001.
Disponível em: URL: http://www.med.yale.edu/ynhh/
infection.
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Anexo I
Ficha para coleta de dados
1.
2.
3.
4.
5.
6.
7.
8.
Título da revista
Referência da publicação (ano, número, página)
Título do artigo
Autor (es) do artigo
Categoria profissional dos autores
Procedências do(s) autor(es)
Sumário do artigo
Palavras chaves
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Artigo Original
Sistematização dos cuidados
de enfermagem ao cliente intubado
à luz da teoria de Imogene King
Heleonora Diva Borges Rodrigues*, Maria José Coelho, D.Sc.**, Patricia de Souza Godinho***
*Aluna especial do curso de mestrado UFRJ, Especialista em Terapia Intensiva pela UERJ e Enfermeira do Instituto de traumatoortopedia, **DEMC/ EEAN/ UFRJ e Coordenadora do Grupo de Pesquisa Cuidar/cuidados de Enfermagem,*** Aluna especial
do curso de mestrado UFRJ, Especialista em Terapia Intensiva pela Anna Nery/ UFRJ e Enfermeira do Hospital Geral de
Bonsucesso
Resumo
Trata-se de uma breve revisão sobre os cuidados que a equipe de enfermagem deve ter com o cliente em uso de vias aéreas
artificiais, ressaltando-se os altos índices de complicações, capazes de impedir que o cliente retorne à sua vida normal após
a extubação. Com este estudo objetivamos elaborar um protocolo de cuidados de enfermagem sistematizados, visando à
qualidade dos cuidados de enfermagem e recuperação do cliente hospitalizado, utilizando as concepções de Imogene King
para o alcance de objetivos mútuos: percepção, interação e transação.
Palavras–chave: vias aéreas artificiais, cuidados de enfermagem, concepções de Imogene King.
Abstract
Systematization of nursing care of the intubated patient in the light of Imogene
King’s theory
This paper is a brief revision about the care that the nursing team should have with patients in use of artificial airways,
pointing out the high rate of complications, capable to prevent the patient to return to his/her normal life after extubation.
The purpose of this study is to develop a systemized nursing care protocol, aiming the quality of nursing care and recovery
of the hospitalized patient, using the Imogene King’s conception to achieve mutual objectives: perception, interaction and
dealings.
Key-words: artificial airways, nursing care, Imogene King’s conception.
Artigo recebido em 1 de agosto de 2005; aceito em 14 de março de 2006.
Endereço para correspondência: Heleonora Diva Borges Rodrigues, Rua Alexandre Ramos
315/203 Tanque 227350-140 Rio de Janeiro RJ, E-mail: [email protected]
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Resumen
Sistematización de atención de enfermería al paciente entubado a la luz de la teoría
de Imogene King
Se trata de una breve revisión acerca de los cuidados que el equipo de enfermería debe tener con el
paciente en uso de vías aéreas artificiales, resaltando los altos índices de complicaciones, capaces de impedir
que el paciente vuelva a la vida normal después de la extubación. Este estudio tiene como finalidad elaborar
un protocolo de atención de enfermería sistematizado, objetivando la calidad de la atención de enfermería
y la recuperación del paciente hospitalizado, utilizando los conceptos de Imogene King para el alcance de
objetivos mutuos: percepción, interacción y transacción.
Palabras-clave: vías aéreas artificiales, atención de enfermería, conceptos de Imogene King.
Introdução
Este artigo tem como finalidade dar subsídios
à equipe de enfermagem sobre a importância da
manutenção do cuidado de enfermagem aos clientes
hospitalizados em uso de vias aéreas artificiais, objetivando a qualidade da assistência prestada. Sendo
estes profissionais responsáveis por um cuidado
inteligente e invasivo para manter a permeabilidade
das vias aéreas, minimizando assim futuros danos
aos clientes por respiração assistida.
A perfeita monitorização nesta situação pode
eliminar a necessidade de uma via aérea artificial e
um possível suporte ventilatório, mas se todas as
medidas utilizadas não forem adequadas as suas
necessidades para manter uma perfeita troca gasosa, torna-se necessário à instalação de uma via
aérea artificial, através de um tubo oro traqueal ou
traqueostomia para assegurarmos um modo eficaz
da função respiratória.
Através da inserção de um tubo ou cânula providos de balonete, garantimos uma via de acesso para
a ventilação, oxigenação pulmonar, umidificação,
aspiração de secreções e, isolamento definitivo das
vias aéreas inferiores e profilaxia da broncoaspiração
de conteúdo gástrico.
Agora, toda atenção deve ser dada para os
cuidados e manutenção dessa via aérea e para o
tratamento que levou à sua instalação.
Com a finalidade de atingir nosso objetivo,
nos reunimos com a equipe de enfermagem, para
uma troca de conhecimentos quanto aos cuidados
necessários e com isso descobrir qual a dificuldade
que esta tem em relação a tais procedimentos ou
cuidados, e a partir dessa interação, elaborar uma
proposta de protocolo como forma de treinamento.
Segundo King [1] “O processo de interação é influenciado pelas percepções, objetivos, necessidades
e valores tanto do cliente, quanto do enfermeiro”.
Durante estes encontros observamos que a
equipe de enfermagem vem de vários níveis de
formação cujos conteúdos teórico e prático dados
e consolidados de várias formas e com isso, 60%
deles tem dúvidas sobre os procedimentos a serem
realizados para estes clientes e, às vezes, a falta de percepção e a insegurança em relação à complexidade
clínica que se encontra o cliente retarda o processo
de interação entre eles.
Observamos que as dificuldades para prestar o
cuidado, além da formação profissional estão muitas vezes relacionadas com a falta de um protocolo
sobre: parâmetros, medições, uso correto do cuffômetro, posicionamento do tubo, fixações e higiene
oral e nasal, o que pode minimizar o estresse desse
cliente e proporcionar um cuidado eficaz no aspecto
terapêutico de Enfermagem.
A partir dessa análise utilizamos Imogene King,
Teoria do Alcance dos Objetivos, pois a Enfermagem é o processo de interação e é através dele que
conseguimos alcançar o objetivo mútuo de cuidar
e ser cuidado [2].
Objetivos
• Objetivo geral
Demonstrar como a Teoria do Alcance dos
Objetivos de Imogene King norteia a elaboração de
um protocolo para os cuidados de Enfermagem para
o cliente em uso de vias aéreas artificiais.
• Objetivo específico
Elaborar um protocolo de cuidados de enfermagem para o cliente em uso de vias aéreas artifi87
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ciais, com a finalidade de dar subsídios à equipe de
enfermagem sobre a importância da manutenção do
cuidado de enfermagem aos clientes hospitalizados
em uso de vias aéreas artificiais, objetivando a qualidade da assistência prestada.
Material e método
Foram selecionados aleatoriamente 10 (dez)
membros da equipe de enfermagem, do plantão
noturno da UTI, composto por 4 (quatro) sujeitos
do sexo masculino e 6 (seis) do sexo feminino, no
qual foram levantadas suas dificuldades ao cuidar do
cliente com vias aéreas artificiais e uma proposta de
elaboração de protocolo de cuidados de enfermagem
e posterior treinamento e aplicação do mesmo.
O cenário utilizado foi uma Unidade de Terapia Intensiva, contendo 19 (dezenove) leitos, em
uma instituição privada, na cidade do Rio de Janeiro, durante a noite, no dia 29 de junho de 2004.
O instrumento utilizado foi um roteiro para
formulário (em anexo) a ser preenchido pelos sujeitos, sendo feitas três perguntas fechadas, uma
semi-aberta e uma aberta [3]. Foi utilizada uma
abordagem quantitativa de freqüência simples e
percentual, do estudo de caso com base na teoria
de King.
Desenvolvimento
É importante ressaltar mais uma vez que o
cliente em uso de vias aéreas artificiais necessita
de uma assistência contínua da equipe de Enfermagem. Esse cliente jamais deverá ficar sozinho,
pois é sensível a alterações hemodinâmicas de O2
e CO2, sendo necessário avaliações contínuas para
acompanhar as alterações nos parâmetros, coleta de
gasometria e, sobretudo, cuidados na manutenção
das vias aéreas, de forma a atender às necessidades
respiratórias desse cliente.
É muito importante que os membros da equipe
de Enfermagem saibam usar o método de observação para executarem os procedimentos que iremos
discutir neste trabalho.
Todos os cuidados antes de serem realizados,
devem ser comunicados ao cliente, o porquê, para
que e qual o benefício que trará para ele, conduta
universal adotada pela equipe de Enfermagem, mesmo aqueles sedados por necessidade clínica [4].
A comunicação entre a equipe de Enfermagem
e o cliente é um processo dinâmico, fundamental
para a existência de crescimento, desenvolvimento
e trocas.
Para Leopardi [5] “Comunicação é um processo que se dá entre duas consciências. A do emissor
que elabora e codifica a mensagem e a do receptor
que a capta e decodifica” e ainda “O processo comunicativo interior é que possibilita ao ser humano
perceber suas emoções e/ou sentimentos, pensar
sobre eles e expressá-los ou não, como e quando
melhor lhe convier”.
Quando não ocorre a interação, podemos
prever o aparecimento de conflitos de papéis e gerar
estresse, consequentemente não haverá transação
entre os mesmos.
Sendo assim o processo de interação, enfermagem e cliente estão compartilhando informações,
através da comunicação (verbal e não verbal) [6]
e estão efetuando transações para atingir seus objetivos.
Ainda para Leopardi [5] “O processo de enfermagem é o foco de sua teoria e a interação enfermeiro – cliente é o modo de operar esse processo,
no sentido de atingir objetivos de saúde acordados
entre ambos”, ainda, “O foco da teoria de King é o
processo de Enfermagem que, para ela, é um processo de interação/transação, para buscar o alcance de
objetivos de saúde. É um processo de ação, reação,
interação e transação”.
Utilizando três dos cinco conceitos que King
tem como base para desenvolver sua Teoria, a partir
do foco central que é o alcance dos objetivos de
saúde e mostrar o quanto é importante que a equipe esteja preparada para realizar o cuidado com o
cliente. São eles:
Percepção-é a representação que cada ser humano tem da realidade, organizando, interpretando
e transformando a informação obtida pelos sentidos
e registrando-as na memória.
Interação-é a troca de conhecimentos. Representa a seqüência de condutas verbais e não
verbais, dirigidas por duas ou mais indivíduos para
um objetivo.
Transação-é o intercâmbio de canais de valores, entre dois ou mais indivíduos. Ocorre transação
somente quando os comportamentos demonstram
alcance dos objetivos.
King faz sua inter-relação de conceitos através
de proposições com sua lógica e sistematização e
daí estabelece já um modo de realizar o processo de
enfermagem, como podemos observar na ilustração
nº1 a seguir.
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Ilustração 1
Modelo conceitual – adaptado de King, IM Toward a Theory for
Nursing [1]
Quando um ou mais indivíduos, ou em grupos
interagem, formam os sistemas interpessoais. Na
manutenção do cuidado de Enfermagem aos clientes
em uso de vias aéreas artificiais, esse relacionamento
ocorre entre a equipe de Enfermagem e o cliente.
O sistema interpessoal é a interação de dois ou
mais indivíduos num tempo para um propósito ou
um objetivo. Este é composto de:
Interação – comunicação – estresse – papel
– transação.
O relacionamento interpessoal em enfermagem é baseado na percepção, ação, reação, interação
e transação, e na prestação contínua dos cuidados
de Enfermagem a este cliente, esta base se renova e
se concretiza a cada instante.
O processo humano de interação pode ser
observado na ilustração nº 2.
Ilustração 2
Logo, a equipe de Enfermagem observa o cliente no leito e conhece ou não as implicações decorrentes do uso de vias aéreas artificiais. Esta equipe
necessita ter como meta de quais são as percepções
do indivíduo enfermo de si mesmo e dos eventos que
estão ocorrendo ao seu redor e no ambiente. Essas
percepções da equipe que fazem parte dos cuidados
prestados devem ser claramente identificadas, e para
isso é necessário conhecimento técnico-científico na
sua composição.
É importante identificar até onde as percepções
da equipe e do cliente em uso de vias aéreas artificiais se identificaram ou não. Os cuidados devem
ser baseados em percepções que se igualam, após as
ações da equipe, não devem entrar em conflito com
as percepções do cliente.
As ações podem ser verbais e não verbais, como
ressaltamos anteriormente e envolverá a seqüência de
comportamentos relacionados com reconhecimentos e esforços para controlar condições e eventos.
A reação envolve a indicação da percepção de
alguém e ações dos outros, segundo Silveira [7] “A
percepção é um conceito a ser sempre delineado
para a aplicação pela Enfermagem, por estabelecer
uma conexão imprescindível entre os quatro grandes
conceitos das teorias da Enfermagem: o ser humano,
a saúde, o meio ambiente e a Enfermagem”.
A equipe de enfermagem age para com o
cliente em uso de vias aéreas artificiais e este com
a equipe.
Resultados
Com base nesses cuidados e juntamente com
os membros da equipe criamos um protocolo de Enfermagem para assistência de enfermagem a clientes
em uso de vias aéreas artificiais (apêndice 1).
Os cuidados com vias aéreas consistem em:
higiene oral e umidificação adequadas, medidas
para mobilizar secreção, mudança de decúbito e
aspiração [8]:
• Higiene oral e nasal – deve ser realizada de 4/4
horas ou conforme a necessidade do cliente, com
solução anti-séptica utilizando uma escova macia
ou swab bem acolchoado para evitar lesão na mucosa oral-facial . Mantendo a cavidade oral limpa
e diminuindo o crescimento de placas bacterianas
ou fúngicas.
• Fixação do TOT / TQT – o tubo endotraqueal
deve ser fixado de modo que ele não possa ser
desalojado pelo peso das traquéias ou movimen89
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tos do cliente. A troca do fixador deve ser diária
ou sempre que necessário, evitando assim lesão
na rima bucal ou região auricular. É importante
que a fixação seja feita de modo correto, acima
do pavilhão auricular e não na nuca do cliente
que levará a uma elevação da PIC. No caso da
traqueostomia, a fixação é trocada com a mesma
freqüência, sendo que a higiene do óstio deve ser
feita com clorohex e gaze, manter o óstio sempre
limpo e seco, evitando infecção e maceração do
tecido da borda; manter um acolchoado de gaze
entre a cânula e o óstio para absorver secreções.
Deve-se observar que o circuito do respirador
está apoiado de modo que a tração não seja aplicada à cânula de traqueostomia, pois pode levar ao
deslocamento da cânula.
• Posicionamento do tubo orotraqueal ( TOT ) – atentar para manter o TOT sempre bem posicionado,
ou seja, centralizado, pois diminui o risco de lesão
da comissura labial, traquéias e edema de glote.
Realizar uma mobilização do tubo com cautela
a cada 12 horas, podendo aproveitar a hora para
troca do fixador, pois a permanência do tubo sob
a mucosa, pode levar a lesão da língua e lábios. É
importante antes prestar a atenção e marcar a altura do TOT na comissura labial, caso seja necessário reposicionar. Evitar tracionar o TOT/TQT
para não lesionar a traquéia com a mobilização
do cuff insuflado. Caso ocorra desposicionamento
do TOT/TQT, atentar para sinais de extubação
inadvertida: vocalização, disparo do alarme de
baixa pressão, alterações na ausculta respiratória
e distensão gástrica.
• Comissura labial e pressão do cuff – devem ser
verificadas e registradas a cada 12 horas, pois é
através da medida da comissura que saberemos
se o tubo está bem posicionado, evitando déficit
ventilatório. A pressão do cuff deve ser mantida
em até 25mmHg, utilizando o cuffômetro. O
balonete sendo hiperinsuflado pode acarretar necrose, fístulas traqueoesofágicas, traqueomalácias,
estenose da traquéia e hemorragias. Em caso de
escape de ar, o balonete pode estar danificado ou
furado e devemos providenciar a troca.
O posicionamento do TOT / TQT também
deve ser controlado pelo raio-X de tórax, ( 2 cm
acima da Carina).
• Remoção de secreção traqueal e Peep (Pressão positiva expiratória final) – a obstrução da via aérea
por excesso de secreção estimula a tosse, gerando
aumento da pressão intrapulmonar e diminuindo
o volume corrente, que também favorece a infecção respiratória. Cabe a equipe de enfermagem
eliminar essas secreções, através da aspiração.
Utilizando a técnica asséptica devemos antes observar: a oximetria de pulso, a peep , a oxigenação
prévia a 100%, a seqüência de aspiração (sempre
primeiro a VAI e depois a VAS), respeitando o
tempo de aspiração de acordo com o protocolo
de cada instituição. Preconiza-se 20”e conecta-se
o cliente ao ventilador; devemos atentar para a
peep, pois caso o cliente esteja com peep elevada
(acima de 10mmHg) deve-se utilizar aspiração
com sistema fechado. A ausculta do cliente deverá
ser realizada antes e após cada aspiração.
Caso haja obstrução parcial do TOT, instilar
soro fisiológico e aspirar em seguida. Introduzir a
sonda de aspiração ao máximo dentro da via aérea,
sem aspirar, pois muitos clientes tossem quando
a sonda toca a Carina, isso ajudará a mobilizar a
secreção, mas devemos retirar de 2 a 3 cm, rodar a
sonda e aspirar. Se entrarmos na cânula aspirando,
a sonda pode diminuir o oxigênio da via aérea e a
falha em rodar a sonda pode resultar em lesão da
mucosa traqueal. Lembrando sempre que devemos
lubrificar a sonda com gel anestésico para evitar
traumas no caso de aspiração nasal. Após o término
lavar a sonda e o circuito com água destilada, desprezando a sonda e fechar o circuito, para prevenir
a contaminação do mesmo.
É de grande importância que o filtro hidrofóbico esteja limpo, para perfeita umidificação das vias
aéreas. Sua troca deve ser realizada a cada 24 horas,
ou sempre que necessário, pois funciona como uma
barreira bacteriológica, caso esteja saturado causará
danos ao cliente. O filtro tem que garantir uma temperatura em torno de 32°C enquanto a temperatura
ao nível do tecido pulmonar oscila em torno de 37°C
. Para entender a teoria do alcance dos objetivos de
Imogene King e a elaboração de um protocolo de
cuidados é necessário destacar as complicações de
uma super umidificação:
* Aumento do risco de infecção
* Aumento de secreção da mucosa
* Aumenta a necessidade do processo de aspiração
* Aumenta o risco potencial de retenção e oclusão
do tubo
* Condensação da água pode bloquear as vias
aéreas causando atelectasia.
Também de igual importância são as complicações, devido à baixa umidificação:
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* Oclusão do tubo traqueal
* Espessamento do muco e diminuição da atividade ciliar
* Atelectasia
* Aumento na incidência de complicações pulmonares pós-operatório
* Comprometimento alveolar
* Alteração da mecânica pulmonar causando
hipoxemia.
• Prevenção de broncoaspiração – todo cliente em
suporte ventilatório, geralmente está em uso de
nutrição enteral ou parenteral adequada, sem
riscos de broncoaspiração. Com isso, alguns
cuidados devem ser observados:
* Perfeito posicionamento da sonda, no duodeno.
* Manter cabeceira elevada, no mínimo 30°, caso
necessário baixar, desligar a dieta 30 minutos antes, tempo suficiente para o esvaziamento gástrico
e evitar broncoaspiração, assim como, também
for aspirar e higienizar o cliente.
• Mobilização no leito – realizar um planejamento
horário de mobilização do cliente, para que este
não fique no mesmo decúbito durante períodos
prolongados, revezando-os em dorsal com laterais, para que o cliente com suporte ventilatório
não tenha problemas como: tromboembolismo,
edema, infecção urinária, constipação, diminuição da capacidade funcional motora, aumento
da resistência mecânica respiratória, redução da
tosse, contraturas articulares.
Convém realizar mudança de decúbito a cada
2/2 horas, salvo o lado em que houver pulmão
atelectasiado. Deve ser montado um protocolo
para essa mobilização, para evitarmos que o cliente
venha, com o posicionamento inadequado, sofrer
dores e perda de tônus.
A Teoria do alcance dos objetivos de Imogene
King também é utilizada para a melhoria do cuidado. Imogene King também desenvolveu o registro
de enfermagem constituído de metas para direcionar
o cuidado de enfermagem.
Assim, acreditamos que um protocolo ajudará
a enfermagem a atingir a qualidade no cuidado e
com isso poderemos analisar a interação enfermagem-cliente e a presença de transações.
Como a teoria necessita ser testada, nosso
protocolo também, e assim sabermos se estaremos
contribuindo para a qualidade do cuidado de enfermagem.
Resultados
Levando-se em conta por ser uma profissão de
predominância feminina, apenas 60% dos profissionais têm experiência de 3 a 6 anos em UTI, 60% têm
dúvidas sobre os cuidados com clientes em uso de vias
aéreas artificiais e mais especificamente 30% não sabem
cuidar de cliente em uso de PEEP elevada.
Gráfico 1 – Distribuição dos respondentes, segundo
sexo.
Observamos um percentual maior no sexo feminino, por ser esta profissão de predominância feminina
e necessitar de um cuidado mais sensível e de um senso
de audição organização mais perspicaz.
Gráfico 2 – Distribuição em anos de atuação de profissionais de enfermagem em terapia intensiva.
Observamos que o tempo de atuação dos
profissionais de enfermagem em terapia intensiva
é muito diversificado, porque enquanto 20% têm
quase 10 anos de atuação, 60% ainda estão adquirindo experiência com clientes críticos, pois são
recém formados ou nunca trabalharam em terapia
intensiva, apesar de já trabalharem em outros setores, o que demonstra a necessidade de protocolar o
cuidado visando a qualidade da assistência.
Gráfico 3 – Distribuição das respostas segundo dúvidas (demonstradas no gráfico 4), em cuidados com
clientes com vias aéreas artificiais.
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Observamos a necessidade de treinamento
através de Educação Permanente e elaboração de
um protocolo para alcançar a qualidade do cuidado
com esses clientes.
Gráfico 4 – Distribuição segundo as dúvidas mais
freqüentes em relação ao cuidado com clientes em uso
de vias aéreas artificiais.
Observamos que a maior dúvida dos profissionais de enfermagem é com o cuidado de clientes
em uso de Peep elevado.
Gráfico 5 – Distribuição quanto importância de elaboração de protocolo.
A grande aceitação da equipe pela elaboração
de um protocolo, demonstra o interesse em atingir
a qualidade do cuidado para o cliente .
Gráfico 5.1 – Distribuição de respostas quanto à justificativa dessa importância.
Observa-se a preocupação da equipe em
sistematizar o cuidado com conhecimento científico e com isso atingir a qualidade, pois 13% não
souberam responder sobre o cuidado com vias
aéreas artificiais; 25% não souberam porque ter
mais conhecimento e outros 25% o porque seria
importante unificar o serviço, já os 37% restantes
não acreditam que o protocolo não irá facilitar o
trabalho, pois se caracterizam como um grupo de
resistência as propostas inovadoras.
Mediante os dados apresentados anteriormente, foi necessário construir o protocolo apresentado
a seguir
Protocolo de enfermagem:
Protocolo de cuidados de enfermagem para clientes em uso de vias aéreas artificiais
Objetivo de enfermagem
1- Profilaxia de infecção
em trato respiratório
Atitudes de enfermagem
Realizar higiene oral de 4/4 horas e SQN
Princípios científicos
Mantendo cavidade oral limpa, diminui crescimento de placas bacterianas e fúngicas.
Realizar curativo em ósteo de TQT
diariamente
Acúmulo de sujidades e secreções em
ósteo, aumenta potencialmente o risco de
infecção.
Parâmetros para observação de exteriorização ou introdução do tubo, o posicionamento adequado evita déficit ventilatório
por ordem posicional.
2- Evitar desposicionamen- Verificar comissura labial de 12/12 horas
to do TOT ou cânula de
TQT
Manter fixação do cadarço ou fita adesiva
centralizando TOT/TQT
Fixação centralizada diminui o risco de traqueite, traqueomalácia e edema de glote.
Evitar tracionamento de TOT/TQT e
posicionar adequadamente o circuito do
ventilador
Tracionamento TOT/TQT pode causar lesões graves em traquéias com mobilização
do balonete insufla
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3- Evitar lesões por pressões excessivas de cuff ou
escape
Verificar pressão do cuff após instalação
do TOT/TQT de 12/12 horas
Aumento de pressão do cuff leva a diminuição da atividade do epitélio ciliado,
isquemia, necrose, até fístulas traqueais
Manter pressão de cuff entre 20 a 25
mmHg
Pressões acima de 25 mmHg interrompem o fluxo arterial causando isquemia e
necrose
Atentar para ruídos de gases em TOT/TQT Mesmo com baixas pressões pode ocorrer
caso seja evidenciado, insuflar cuff e verifi- necrose e isquemias, podendo levar a broncar pressão
coaspiração. Lembre! TOT desobstruído e
bem posicionado, o cliente não faz barulho
para respirar
Protocolo de cuidados de enfermagem para clientes em uso de vias aéreas artificiais
4- Impedir obstrução do
fluxo aéreo por secreção
Selecionar tipo de aspiração (aberto ou
fechado)
Sistema aberto: aumenta o risco de contaminação
Sistema fechado: diminui o risco de contaminação
5- Proporcionar umidificação adequada
Estabelecer o processo de aspiração eficaz
sem causar diminuição de saturação de
O2
Trocar filtro a cada 24 horas ou SQN
(quando estiver saturado)
Aspiração feita de forma inadequada, produz arritmias, diminui o volume corrente de
ar, podendo causar diminuição de O2
É necessária a troca para não ocorrer
ressecamento ou hiper umidificação das
secreções. O filtro é uma barreira bacteriológica eficiente.
A estagnação de secreções aumenta potencialmente o risco de infecção no trato
respiratório
6- Mobilização do cliente
e prevenção de broncoaspiração
Mobilizar o cliente de 2/2 horas
Manter cabeceira elevada a 45º
Cabeceira elevada evita broncoaspiração
de refluxos gástricos e secreções orais
Conclusão
É de fundamental importância o contínuo
aperfeiçoamento para prestar cuidados com segurança, tanto para o próprio profissional de enfermagem, quanto para o cliente. Vivemos hoje uma
fase de cursos de especializações, de conhecimentos
voláteis, e o cuidado tem que fazer parte dessa busca.
Só conseguiremos uma qualidade de assistência se
tivermos um verdadeiro conhecimento.
Esse tema foi escolhido quando observamos
uma grande maioria de cuidados em UTI ressaltando a valorização deste tanto para o profissional de
enfermagem quanto para o cliente. Portanto, fica
registrada a necessidade do contínuo aperfeiçoamento da enfermagem, com verdadeiro conhecimento
científico e a intensa necessidade do treinamento
intensivo de cada equipe e reflexão sobre suas
ações, contribuindo para o verdadeiro crescimento
profissional da classe e melhoria da qualidade de
vida do cliente.
Com a teoria de Imogene King podemos
observar que o cuidado de enfermagem é, antes
de tudo, uma interação humana. E com aplicação
de um protocolo contribuiremos para segurança e
tranqüilidade na aplicação de técnicas e manuseio
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de equipamentos que são necessários para poder
cuidar do cliente.
Este protocolo será futuramente aplicado
com objetivo de sistematizar o cuidado e manter a
equipe trabalhando de forma clara e nossos clientes
com grande satisfação por terem alcançado seus
objetivos e retornado a suas vidas sem medos e
receios.
Referências
1. King IM. A theory for nursing: systems, concepts,
process. New York: Wiley; 1981.
2. George JB et al. Teorias de enfermagem: Fundamentos
para prática profissional. Porto Alegre: Artes médicas;
1993.
3. Polit DF et al. Fundamentos de pesquisa em enfermagem: métodos, avaliação e utilização. 6a. Ed.Porto
Alegre: Artes Médicas; 1995.
4. Coelho MJ. O socorro, o socorrido e o socorrer: cuidar/cuidados de enfermagem em emergência. Rio de
Janeiro: Anna Nery; 1999.
5. Leopardi MT. Teorias em enfermagem: instrumentos
para a prática. Florianópolis: Papa-Livros; 1999. p.9094.
6. Moreira TMM et al. O modelo conceitual de sistemas abertos interatuantes e a teoria de alcance de
metas de Imogene King. Rev Latinoam Enfermagem
2002;10(1):97-103.
7. Silveira MFA et al. Percepção da realidade: uma abordagem conceitual para a enfermagem. Revista Nursing
1999;2(15):15-21.
8. Brunner LS, Suddarth DS et al. Tratado de Enfermagem
Médico Cirúrgico. 6a ed. Rio de Janeiro. Guanabara
Koogan; 1990.
Apêndice
• Formulário
1- Sexo:
( ) Masculino
( ) Feminino
2- Tempo (em anos) de atuação em unidade de terapia intensiva:
( ) 1 a 2,11 anos
( ) 3 a 4,11 anos
( ) 5 a 6,11 anos
( ) 7 a 8,11 anos
( ) 9 ou mais anos
3- Tem dificuldade (s) em algum (ns) cuidado (s) com o cliente em uso de vias aéreas artificiais?
( )Sim ( )Não
4- Qual (is)?
( ) Fixação
( ) Posicionamento
( ) Higiene oral
( ) Aspiração
(
(
(
(
) Comissura labial e pressão do cuff
) PEEP
) Mobilização no leito
) Outras:______________________________________________________
5- Acha importante a elaboração de um protocolo visando treinamento sobre o assunto?
( ) Sim
Justifique:_______________________________________________________
( ) Não
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Artigo original
Ações sem sentido por (aparente) ausência
de sentido: o ser humano em coma como
objeto do cuidado da equipe de enfermagem
Mariana Gomes Cardim*, Marcio Martins da Costa*, Maria Aparecida de Luca Nascimento, D.Sc.**,
Nébia Maria Almeida de Figueiredo, D.Sc.***
*Alunos do Mestrado em Enfermagem da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), **Professora do
Programa de Mestrado em Enfermagem da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto (EEAP), da Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro (UNIRIO), ***Professora Titular do Departamento de Enfermagem Fundamental (DEF) da EEAP / UNIRIO
Resumo
O presente estudo trata de resultados de nossa observação no cotidiano da prática de cuidar de clientes
graves no Centro de Terapia Intensiva (CTI) que recebiam, dos profissionais de saúde deste setor, uma assistência diferenciada daquela prestada aos clientes lúcidos. Trata-se de um estudo de natureza teórico reflexivo
que utiliza a abordagem qualitativa para atingir os objetivos de: identificar, nos trabalhos já produzidos, evidencias de como os cuidados de enfermagem têm sido prestados aos clientes em estado de coma em um CTI
e discutir as implicações do cuidado ofertado para esta clientela. A metodologia utilizada é a de metanálise
para a produção de dados da produção científica dos autores na área em apreço. Os resultados apontam para
uma evidencia denominada de: A enfermagem SABE mas NÃO FAZ o cuidado que o cliente deve receber.
Este resultado nos leva a considerar que existe um paradoxo entre a teoria e a prática de cuidar em CTI, onde
o sujeito em coma perde sua natureza de humanidade.
Palavras-chave: cuidado, cliente em coma, enfermagem.
Abstract
Purposeless actions due to (possible) absence of sense: The human being in coma as
care object of the nursing team
The present study deals with observation results on daily care practice with critical patients in the Intensive Care Unit (ICU)
who received special care from health professionals from this unit. The study is based on a reflexive theoretical nature which
uses a qualitative approach to achieve the following aims: to identify in the latest studies evidences regarding the way nursing
care has been rendered to patients in coma in a (ICU) and to discuss the implications of care given to these patients. The
methodology used is the metanalysis for data production of authors’ scientific production in this area. The results point out
Artigo recebido em 10 de fevereiro de 2006; aceito em 06 de março de 2006.
Endereço para correspondência: Mariana Gomes Cardim, Rua Alfredo Ceschiatti, 105
Bloco 01, Apt. 409, Barra da Tijuca, 22775-045 Rio de Janeiro RJ, Tel: (21) 2421-5908, E-mail:
[email protected]
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for evidence entitled: The nursing team knows how to provide needed care but does not put into practice. This result showed
that a paradox between theory and UCI care practice exists, where the subject in coma loses his/her humanity nature.
Key-words: care, customer in coma, nursing.
Resumen
Acciones sin sentido por (aparente) ausencia de sentido: el ser humano en coma
como objeto del cuidado del equipo enfermería
El presente estudio trata de resultados de nuestra observación en el cotidiano de la práctica de cuidar de clientes graves en el
Centro de Terapia Intensiva que recibían, de los profesionales de salud de esta sección, una asistencia diferenciada de aquella
prestada a los pacientes lúcidos. Se trata de un estudio de naturaleza teórico reflexivo que usa el abordaje cualitativo para
alcanzar los objetivos de: identificar, en los trabajos ya producidos, evidencias de cómo es la atención de enfermería prestada
a los pacientes en estado de coma en un Centro de Terapia Intensiva. La metodología utilizada es la de metanálise para la
producción de datos de la producción científica de los autores en el área en cuestión. Los resultados señalan para una evidencia
denominada de: La enfermería sabe pero no pone en práctica el cuidado que el cliente debe recibir. Este resultado nos lleva
a considerar que existe una paradoja entre la teoría y la práctica de cuidar en CTI, en la cual el sujeto en coma pierde su
naturaleza de humanidad.
Palabras-clave: cuidado, cliente en coma, enfermería.
Introdução
Quem nunca ouviu falar de alguém que esteve
em estado de coma? Através de experiência própria,
parentes, amigos ou até mesmo através da televisão,
todos já tiveram alguma experiência ou ouviram
falar de alguém em coma. Ao ouvir a palavra coma,
geralmente algumas idéias vêm rapidamente à
mente: permanência em CTI, meses ou anos desacordado, morte.
Diante dessas idéias a imagem visualizada de
um cliente em estado de coma, em consenso, seria a
de uma pessoa deitada em um leito hospitalar de um
ambiente de cuidados intensivos, numa espécie de
sonolência, totalmente inerte, rodeado de aparelhos,
fios, tubos e tecnologia.
“O coma é um estado de inconsciência, habitualmente prolongado, do qual o paciente pode ou
não emergir. Esse estado de inconsciência não pode
ser revertido por estímulos externos comuns” [1].
O cliente nesta condição não pode ser despertado
por um incentivo comum, o que sugere a perda de
seus sentidos. Porém, segundo Zerati [2]:
Embora em coma o indivíduo pareça
adormecido, o cérebro de quem dorme,
ao contrário do comatoso, tem condições
de responder rapidamente a estímulos e
atingir em instantes um estado de alerta
máximo. Mas não se pode afirmar com
certeza até que ponto um paciente em coma
não ouve ou não tem noção do que acontece
à sua volta. O indivíduo pode estar incapaz de falar ou mover-se, mas isso apenas
quer dizer que aqueles que o cercam não
sabem se ele pode ver, ouvir ou compreender
o que se passa. Alguns pacientes em coma
podem de fato ficar totalmente alheios ao
que acontece, mas outros podem perceber
a própria situação, sem que se possa atestar
isso, pois não conseguem se comunicar.
Este fato nos indica a importância de tentarmos
a comunicação com o ser humano em coma de todas
as formas, de modo a tentar trazê-lo de volta ao fluxo
da vida, uma vez que, já sabemos que a comunicação
na enfermagem, “circula através dos sentidos não só
da FALA, mas da audição, dos odores, do toque e
da visão e esses são referenciais indispensáveis para
que conheçamos quem cuidamos e para que eles
conheçam quem cuida deles” [3].
Porém, o problema deste estudo está em observar, durante a prática diária, no desenvolvimento
dos estágios curriculares e extracurriculares, ao
cuidar de pacientes graves no Centro de Terapia
Intensiva (CTI), que, diferentemente dos clientes
lúcidos, aqueles que se encontravam num estado
de coma, recebiam uma assistência/cuidado de
maneira diferenciada pelos profissionais de saúde
deste setor.
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Objetivos
Identificar nos trabalhos já produzidos evidências de como os cuidados de enfermagem têm
sido prestados aos clientes em estado de coma em
um Centro de Terapia Intensiva (CTI) e discutir
as implicações dos cuidados ofertados para esta
clientela.
componentes do Grupo de Incentivo às Inovações
Tecnológicas em Enfermagem (GrIITE), do qual
os autores deste estudo fazem parte, que tratam do
cuidado do cliente em coma, e que foram extraídos
do currículo Lattes de seus autores, disponível na
home page do CNPq.
De acordo com Chaves et al. [4]:
A Metanálise ou Revisão Sistemática
da Literatura tem sido utilizada para
avaliar os resultados de estudos originais
sobre um determinado tema. Consiste
em um método mais avançado do que o
tradicional artigo de revisão, porque além
de resumir o resultado dos vários estudos
de uma área de pesquisa e de propor recomendações com implicações clínicas (...) A
metanálise avalia mais objetivamente uma
dada questão clínica e a sua relação com o
tratamento, causalidade e acurácia de um
teste diagnóstico.
Justificativa
O cliente em coma possui um estado de
inconsciência, não podendo ser revertido pelos
estímulos externos comuns, o que torna o individuo/corpo a mercê do poder do profissional que dele
cuida, ademais, se considerarmos a sua incapacidade
motora e lingüística de intervir/reagir nas situações
em que é manipulado durante o cuidado.
Portanto, esse estudo justifica-se por acreditarmos na necessidade de refletirmos a partir do
que já estamos produzindo sobre o cuidado de enfermagem ao cliente em coma e de como este vem
sendo prestado a este tipo de clientela, de forma que
possamos estar sempre identificando implicações
em nossa prática diária, observando que o cliente
em coma não se trata apenas de um corpo sobre o
leito, mas de uma pessoa presa em seu corpo, que
não consegue se expressar.
Metodologia
Estudo que se utiliza da metanálise e da abordagem qualitativa, onde investigamos em fontes
primárias 03 (três) artigos científicos produzidos por
Para trabalhar os dados foi construído um
instrumento para concentrar o título dos trabalhos
estudados e algumas informações referentes a sua
respectiva temática.
Apresentação dos resultados
A seguir apresentamos o quadro demonstrativo
relativo ao título, objeto das produções científicas
do GrIITE e a essência identificada neles com relação ao cuidado de enfermagem ao cliente em coma
(Quadro I).
Quadro I – Título, objeto e essência do cuidado das produções científicas.
Tema
Objeto
1- O banho no leito e o uso do biombo
pela equipe de enfermagem (Considerações acerca da relação entre a
privacidade e o estado de consciência
do cliente em uma Unidade de Terapia
Intensiva) [5].
2- O ser humano em coma e a comunicação verbal: Quando o silêncio da
equipe de enfermagem é uma forma de
violência no ato de cuidar [6].
3- O corpo em coma: Como os enfermeiros se comunicam com este quando
cuidam [7].
Essência identificada com relação ao
cuidado do cliente em coma
O uso do biombo, pela equipe de Os profissionais de enfermagem,
enfermagem, durante a realização muitas vezes, não utilizam o biombo
do banho no leito.
para a realização do banho no leito,
situação que é intensificada quando o
cliente não se encontra em coma.
O cliente em estado de coma e a
comunicação verbal por parte da
equipe de enfermagem.
Os profissionais de enfermagem pouco
utilizam a comunicação verbal para informar ou explicar os procedimentos a
serem realizados no cliente em coma.
O cliente em estado de coma e a Os enfermeiros acreditam que o cliente
necessidade de comunicação tera- em coma percebe o que ocorre em sua
pêutica intensiva em enfermagem volta, e, por isso, dizem que se comunicam com ele.
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O primeiro e o segundo artigo tiveram como
metodologia a observação não participativa dos
profissionais que compuseram a população alvo
dos respectivos estudos, ao atuarem na sua prática
cotidiana, realizando os cuidados de enfermagem.
Já o terceiro artigo refere-se a uma análise qualitativa das falas dos profissionais quanto à temática
“comunicação”.
A partir destas informações (contidas nos quadro I) emergiu uma categoria de análise, entendida
como:
A enfermagem SABE mas NÃO FAZ o cuidado que o cliente deve receber: Como um paradoxo
entre a teoria e a prática de cuidar em CTI do ser
humano em coma
Resultados e discussão
Antes de discutir o que encontramos, é fundamental reconhecer que três artigos são insignificantes em termos quantitativos, mas que trazem em si a
qualidade de discursos que tratam do cuidado sobre
o cliente em coma pesquisado por nós. Também é
necessário dizer que não temos muitas produções
na enfermagem para pesquisar o cuidado a estes
clientes. Tudo o que existe está ligado a uma prática
que envolve a doença e não o sujeito.
Categoria: A enfermagem SABE mas NÃO FAZ o
cuidado que o cliente deve receber: Como um paradoxo
entre a teoria e a prática de cuidar em CTI do ser
humano em coma
Ao analisarmos a essência identificada no que
pensamos saber-fazer sobre o cuidado do cliente
em coma nos artigos em questão, verificamos que
não só a comunicação com este tipo de clientela,
assim como outros procedimentos, embora de igual
importância, estão prejudicados, tal como a preservação da privacidade deste durante a realização do
procedimento de banho no leito. Isto é, no ato de
enfermagem de um lado existe passos, processos e
princípios que devem ser seguidos e comunicar e
proteger o cliente, são alguns deles, principalmente
quando o cliente está impossibilitado de falar para
reagir, ou seja, “Pedir para que mantenhamos sua
privacidade preservada”, do outro lado, as enfermeiras sabem que é isto que devem fazer, mas não
o fazem.
Esta situação muito nos preocupa uma vez
que, percebemos uma assistência ao indivíduo em
estado de coma que não corresponde aos preceitos
contidos no Código de Ética de Enfermagem, onde
se defende a orientação do cliente acerca de todo
cuidado a ele dispensando e o respeito ao natural
pudor, a privacidade e a intimidade do cliente.
Cabe ressaltar que o profissional de enfermagem durante sua prática diária de cuidar, deve ter
como objetivo final, a geração do bem-estar do
cliente em todas as dimensões (físico e psico-biológico). Não podemos esquecer que são seres humanos,
dependentes, mas com sentimentos, expectativas e
direitos e, portanto, devem ter suas necessidades
básicas atendidas de maneira satisfatória e digna.
Verificamos a partir do terceiro artigo explicitado no Quadro I, que os enfermeiros sabem da
importância da comunicação com o cliente em
coma, porém ao observarmos o cotidiano de cuidar
(explícita nos outros dois artigos) verificamos uma
prática que não corresponde ao falado. Acreditamos
que as realizações destas ações sem sentido podem
ter três justificativas as quais ousamos destacar:
A primeira delas pode estar relacionada ao fato
da(o) enfermeira(o) estar imersa(o) no seu fazer.
Neste sentido, encontramos apoio entre Cintra et
al. [8] quando nos diz que: “O profissional de UTI
precisa estar tão preocupado e atento às necessidades fisiológicas básicas que, às vezes, pode achar
ter cumprido o seu dever com o paciente e com o
próximo quando não o tem lesado ou não o tem
desrespeitado (conscientemente)”. E esta afirmativa
nos faz pensar o que é desrespeito para nós.
A segunda justificativa pode estar relacionada
a uma questão de rotina, costume, falta de hábito
de procurar interagir com o outro. Os profissionais
de saúde, inclusive muitos enfermeiros, “não consideram os aspectos humanísticos importantes na
assistência à pessoa enferma porque, já habituados
ao ambiente hospitalar, consideram “normais” suas
rotinas e, nem percebem que elas podem ser causa
de desconforto para a pessoa hospitalizada” [9].
Uma terceira justificativa pode estar relacionada à grande incógnita que representa a dúvida sobre
a presença ou falta dos sentidos do cliente (como
muitos acreditam) ou a sua ciência com relação ao
ambiente que o cerca. Acreditamos que esta situação
deve-se muitas vezes, ao receio que os enfermeiros
têm de se comunicar com o cliente em coma, o que
poderia parecer um comportamento insano, ao falar
com alguém que não responde.
Esta preocupação encontra respaldo em
Cianciarullo [10], quando diz que “para que se
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inicie o processo comunicativo, o emissor envia
uma mensagem. O receptor, por sua vez, recebe a
mensagem e decifra-a com o objetivo de entendêla. Mas para que ocorra o processo comunicativo o
receptor deve emitir uma resposta ao emissor”.
Neste contexto, pudemos observar que, muitas
vezes, o cuidado de enfermagem ao cliente em coma
tem como foco central o corpo físico, deixando de
lado algumas características humanas da assistência
que não podem ser substituídas por tecnologia
como: tocar, falar, envolver-se. De acordo com
Silva [9]:
o tipo de relacionamento da equipe de
saúde com a pessoa enferma, durante
o período de hospitalização, contribui
para os sofrimentos, quase tanto quanto
a enfermidade que a acomete, chegando
a interferir significativamente no seu
tratamento, dificultando, inclusive o seu
restabelecimento.
Neste sentido, acreditamos na necessidade de
atentarmos para todos os dispositivos de ação que a
clientela exige e que irão interferir de forma direta
na terapêutica a ser implementada em sua pronta
recuperação, ademais, se levarmos em consideração
que este sujeito apesar de não poder se expressar
verbalmente, pode estar “gritando”, através de outras
expressões do corpo, por um cuidado sensível, que
no nosso entendimento é aquele que se utiliza de
um conjunto de ações que se envolve: comunicação,
respeito, compromisso, afeto, compaixão, apreço,
sensibilidade e toque entendendo o cliente como um
ser humano bio-psico-social-histórico-espiritual.
Sendo assim, é necessário servirmos ao corpo, mas sem negligenciar a pessoa, uma vez que,
corroboramos com Cruz e Siqueira [11] quando
atribuem ao cuidado duas esferas distintas, que ao
nosso ver devem estar juntas na assistência ao cliente:
“uma objetiva, que se refere ao desenvolvimento de
técnicas e procedimentos, e uma subjetiva, que se
baseia em sensibilidade, criatividade e intuição para
cuidar de outro ser”.
Diante do exposto acima começamos a refletir: Por que destas ações sem sentido? Será devido
a aparente ausência dos sentidos do cliente em
estado de coma? Seria o coma um estado em que
o cliente deixa de ser sujeito e se torna um corpo
vazio? Estas questões ainda ficarão “em aberto”, uma
vez que observamos uma prática de enfermagem
que não condiz com o que os profissionais dizem
e teorizam.
Conclusão
De acordo com os resultados do estudo podemos inferir que o imaginário dos profissionais de
enfermagem com relação aos clientes comatosos é
o de um ser inerte, que não percebe o que acontece
à sua volta, possui seus sentidos abolidos e, portanto, não há necessidade de ser cuidado da mesma
maneira que os clientes lúcidos.
Tal quadro nos indica que, na maioria das
vezes, os cuidados prestados pelos profissionais de
enfermagem têm como foco central o corpo físico
do cliente, o que nos leva a crer que o modelo biomédico continua ainda respaldando a formação de
muitos profissionais e que os procedimentos técnicos
e tecnológicos ainda são os motivos de aproximação
da enfermagem com os clientes.
Neste sentido, corroboramos com Thomas [12]
quando nos diz que: “(...) o cliente corre o risco de
morrer tecnicamente bem assistido carecendo, porém da assistência no que se considera fundamental:
a presença humana carinhosa e amiga, a qual nenhum conforto tecnológico será capaz de suprir”.
É necessário atentarmos também para o fato de
que não é possível prestar um cuidado dissociando
o corpo físico, do sujeito. Esta afirmativa se faz premente, principalmente ao considerarmos o cliente
em coma, uma vez que ele não consegue se expressar
verbalmente e, portanto, a equipe de enfermagem
deve atuar no cuidado com todos os seus sentidos,
buscando estilos e estratégias para que este ser, aparentemente inerte, seja “tocado”, de qualquer forma,
de modo a tentar trazê-lo de volta ao fluxo da vida.
Assim sendo consideramos que o ato de cuidar
do cliente em coma deve e precisa estar além do ato
de realizar um procedimento. É necessário atentar
que estes atos envolvem comunicação verbal, não
verbal, atenção, zelo e respeito com outra interface
que pulsa e troca energia com quem cuida dele.
A partir do exposto acima, ressaltamos a importância de se criar condições que permitam que
esse momento da vida do individuo, onde ele não
possui poder decisório, possa ser vivido com dignidade. Não podemos esquecer que estamos falando
de um ser humano, e que, abolida a expressão verbal,
resta ainda a sensibilidade da alma, que pode estar
sofrendo diante das ações sem sentido, através das
quais são invadidos.
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Artigo original
Crianças portadoras de bexiga neurogênica
submetidas a cateterismo vesical
intermitente limpo – evolução clínica
observada durante a consulta de enfermagem
Taís da Silva Siqueira *, Inês Maria Meneses dos Santos, M.Sc.**
* Graduada em Enfermagem pela Escola de Enfermagem Alfredo Pinto – UNIRIO, Residente em Enfermagem Pediátrica
do IFF, ** Professora Assistente do Departamento de Enfermagem Materno-Infantil da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto
– UNIRIO
Resumo
Pesquisa descritiva, tipo estudo de caso, que utiliza a abordagem quantitativa para alcançar o objetivo de identificar a
evolução clínica de crianças portadoras de bexiga neurogênica que realizam cateterismo vesical intermitente limpo (CIL). O
estudo foi desenvolvido no Ambulatório de Urodinâmica Pediátrica do Instituto Fernandes Figueira – FIOCRUZ, através
da observação de 48 crianças, entre 1 e 12 anos, durante a consulta de enfermagem. Os dados foram coletados através da
leitura dos prontuários, utilizando como instrumento uma ficha de anotações, em busca do grau de adesão ao CIL como
forma de tratamento e de três complicações comuns na evolução da bexiga neurogênica: infecção do trato urinário (ITU),
refluxo vesicoureteral e comprometimento renal. Após a análise, o CIL mostrou-se eficaz, pois, das 31 crianças que a ele
eram submetidas regularmente, 21 apresentaram duas ou menos ITU/ano, 24 não desenvolveram refluxo e somente uma
apresentou prejuízo da função renal. Conclui-se que a enfermeira deve praticar ações educativas e assistenciais objetivando o
preparo tanto da criança como da família para o autocuidado.
Palavras-chave: bexiga neurogênica, consulta de enfermagem, enfermagem pediátrica.
Abstract
Children with neurogenic bladder who undergo clean intermittent bladder
catheterization – clinical evolution observed during nursing assessment
It is a case study descriptive research with quantitative approach, which aims to identify the clinical evolution of children with
neurogenic bladder who undergo clean intermittent bladder catheterization (CIBC). The study was developed in the Children’s
Urodynamics Ambulatory of the Instituto Fernandes Figueira – FIOCRUZ, through observation of 48 children, between 1
and 12 years, during nursing assessment. Data were collected through reading of medical registers, using an annotation file
Artigo recebido em 12 de dezembro de 2005; aceito em 15 de março de 2006.
Endereço para correspondência: Inês Maria Meneses dos Santos, Caminho da
Covanca, 522, Tanque, Jacarepaguá, 22735-010 Rio de Janeiro RJ, Tel: 3392-0384, E-mail:
[email protected]
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in order to know the degree of adhesion to the CIBC for treatment, and three common complications in the evolution of the
neurogenic bladder: urinary tract infection (UTI), vesicoureteral reflux and renal damage. After analysis, the CIBC showed
to be efficient, because among the 31 children who undergo CIBC regularly, 21 presented two or less UTI/year, 24 children
did not develop reflux and only one presented renal failure. We conclude that the nurse should apply to educative and care
actions in order to prepare the child and the family for the self care.
Key-words: neurogenic bladder, nursing assessment, pediatric nursing.
Resumen
Niños con vejiga neurogênica sometidos a cateterismo vesical limpio intermitente
– evolución clínica observada durante la consulta de enfermería
Investigación descriptiva, tipo estudio de caso, que utiliza un abordaje cuantitativo para alcanzar el objetivo de identificar la
evolución clínica de niños con vejiga neurogénica que realizan cateterismo vesical limpio intermitente (CVLI). El estudio
fue desarrollado en el Ambulatorio de Urodinámica Pediátrica del “Instituto Fernandes Figueira - FIOCRUZ, a través de la
observación de 48 niños, entre 1 y 12 años, durante la consulta de enfermería. Los datos fueron colectados a través de la lectura
de los prontuarios, utilizando como instrumento una hoja de anotaciones, en la búsqueda del grado de adhesión al CVLI
como tratamiento y de tres complicaciones comunes en la evolución de la vejiga neurogénica: infección del aparato urinario
(IAU), reflujo vesicoureteral y comprometimiento renal. Después del análisis, el CVLI señaló su eficacia, pues entre los 31
niños que lo realizaron regularmente, 21 presentaron dos o menos IAU/año, 24 niños no desarrollaron reflujo y solamente
uno presentó trastorno de la función renal. Se concluye que la enfermera debe practicar acciones educativas y asistenciales
con el objetivo de preparar el niño y su familia para el autocuidado.
Palabras-clave: vejiga neurogénica, consulta de enfermería, enfermería pediátrica.
Introdução
Este estudo surgiu no Ambulatório Especializado de Urodinâmica Pediátrica do Instituto Fernandes Figueira (IFF), no período de março a dezembro
de 2004, convivendo com crianças portadoras de
diversas formas de disfunção vesical, que é a alteração funcional da bexiga e/ou da uretra provocada
por diversos tipos de lesão, dentre elas, neurológica,
muscular, anatômica ou psicológica [1].
Entre as crianças com disfunções vesicais
observadas, as que mais despertaram o interesse
foram as portadoras de bexiga neurogênica, que é
a perda da função normal da bexiga decorrente de
lesão do sistema nervoso. “A contração da bexiga
depende de centros nervosos centrais (encefálicos)
e medulares” [2]. Assim, quando surgem lesões
nestes centros ocorrem graves perturbações funcionais da bexiga, com evolução crônica e difícil
tratamento.
A complicação mais comum da bexiga neurogênica é a infecção urinária e a de maior gravidade
é a insuficiência renal que pode ocorrer a partir do
refluxo vesicoureteral, com eventual hidronefrose
e atrofia do rim. Essas complicações resultam da
estase urinária e fluxo retrógrado dessa urina retida
na bexiga para dentro dos ureteres podendo chegar
até o rim [3].
O método diagnóstico mais eficiente nos
pacientes com bexiga neurogênica é a avaliação
urodinâmica, que consiste no estudo funcional da
bexiga e/ou da uretra. Esse exame também tem papel
importante no diagnóstico da situação de risco, na
orientação terapêutica e no acompanhamento do
paciente, por isso deve ser indicado o mais cedo
possível [4]. O tratamento adequado compreende
um bom esvaziamento da bexiga; baixa pressão
intravesical; prevenir a infecção do trato urinário;
tratar o refluxo vesicoureteral, e em crianças mais
velhas conseguir a continência urinária.
Uma das formas de tratamento da bexiga neurogênica é o cateterismo vesical intermitente limpo
(CIL), que consiste na introdução de um cateter
através da uretra até a bexiga, com a finalidade de
drenar toda a urina presente nesse órgão. A técnica
mais comumente utilizada é a limpa, pois apresenta
mais facilidade de utilização e menor custo.
Esta técnica limpa foi proposta como método
eficiente para promover o esvaziamento vesical,
reduzir o número de ITU e reeducar a bexiga de
crianças portadoras de bexiga neurogênica [5], e
deve ser assumida pela família e pela criança como
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forma de prevenir complicações e melhorar o seu
quadro clínico.
O treinamento do familiar para a realização
do CIL, atividade sob a responsabilidade da enfermeira [6], é realizado no próprio ambulatório,
através de demonstração prática, e sob o seu “olhar
atento”, o responsável pela criança realiza o referido
procedimento.
Durante a demonstração prática, a enfermeira
encoraja o responsável e retira dúvidas imediatas,
além de reforçar orientações. Após o término do
treinamento o retorno da criança é agendado para
a semana seguinte onde será feita uma análise da
primeira semana de cateterismo domiciliar.
Outra atividade muito importante desenvolvida no Ambulatório de Urodinâmica é a consulta
de enfermagem, realizada semanalmente e que
se destina a promover as orientações e coleta de
material para urinocultura, visando a monitoração
de infecções no trato urinário (ITU). Aproveita-se
este momento para obter informações a respeito do
estado geral da criança e realização do CIL.
Foi através das consultas de enfermagem e da
participação nas consultas médicas e nos estudos
urodinâmicos que observou-se que algumas crianças
em programa de CIL continuavam apresentando
infecções urinárias graves e repetidas, além de graus
variados de refluxo vesicoureteral e presença de
comprometimento renal.
Dessa forma, considerando que estas complicações podem ser evitadas ou minimizadas pelo esvaziamento periódico da bexiga através de uma sonda
vesical, foram formuladas as questões norteadoras: O
cateterismo vesical intermitente é realizado de forma
regular? Qual a relação entre cateterismo vesical
intermitente e redução de episódios de infecção do
trato urinário, prevenção ou minimização do refluxo
vesicoureteral e preservação dos rins?
Desse modo, objetivou-se com o presente
estudo, identificar a evolução clínica de crianças
portadoras de bexiga neurogênica que realizam
cateterismo vesical intermitente limpo.
portantes ao desenvolvimento e cuidado dispensado
a um indivíduo ou grupo [7].
O campo de estudo foi o Instituto Fernandes
Figueira (IFF), uma das unidades da Fundação
Oswaldo Cruz, sendo considerado um Hospital de
referência para tratamento de malformações congênitas como a mielomeningocele, principal causa da
bexiga neurogênica na população pediátrica.
O IFF possui um Ambulatório Especializado
de Urodinâmica Pediátrica, responsável pelo acompanhamento de crianças e adolescentes portadores
de disfunção vesical. Nesse setor são realizados
exames periódicos para avaliar o funcionamento da
bexiga (Estudo Urodinâmico) e controlar o número
de infecções no trato urinário (urinoculturas). Nesse
ambulatório, também são realizados os treinamentos
de familiares ou das próprias crianças acometidas da
patologia em tela, para a realização da técnica do
cateterismo vesical intermitente.
Em respeito à Resolução nº. 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, o presente estudo foi
submetido à aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da própria Instituição onde foi desenvolvido.
Os sujeitos do estudo foram crianças portadoras de
bexiga neurogênica, na faixa etária entre 01 e 12
anos, de ambos os sexos, nascidos, ou não, no Instituto Fernandes Figueira, e que realizam cateterismo
vesical intermitente limpo há, pelo menos, um ano,
e que atualmente são acompanhados no ambulatório
de Urodinâmica da Instituição supramencionada.
Isso correspondia a 121 crianças, destas foram selecionadas aleatoriamente 48.
Os dados foram coletados através da leitura
dos prontuários realizada nos meses de outubro a
novembro de 2004. Para a coleta de informações
através dos prontuários, foi elaborado um instrumento, sob a forma de uma ficha de anotações,
onde constava a identificação da criança, a busca
das três complicações comuns na evolução da bexiga neurogênica, quais sejam; infecção do trato
urinário, refluxo vesicoureteral e comprometimento
renal, e o grau de adesão ao CIL como forma de
tratamento.
Metodologia
Resultados e discussão
Estudo descritivo, tipo estudo de caso, que
utiliza a abordagem quantitativa para alcançar o
seu objetivo. A característica desse estudo prende-se
ao fato de investigar em profundidade um grupo
específico. O pesquisador que realiza um estudo de
caso tenta analisar e compreender as variáveis im-
Identificação das crianças
A faixa etária variou de 1 a 12 anos de idade,
com média de 6 anos, sendo 19 (39,6%) do sexo
masculino e 29 (60,4%) do sexo feminino.
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Infecção do Trato Urinário (ITU)
Para que a ITU ocorra, os microorganismos devem ter acesso à bexiga, fixar-se no local e colonizar
o epitélio para não serem eliminados com a micção
ou pelos mecanismos de defesa do hospedeiro. Alguns mecanismos mantêm a esterilidade da bexiga
como a barreira fisiológica da uretra, o fluxo urinário
e a competência da junção ureterovesical [3]. Em
crianças portadoras de bexiga neurogênica, todos
estes fatores encontram-se alterados, o que facilita
infecções recorrentes do trato urinário.
Da população total do estudo, apenas 6 crianças, (12,5%), não apresentaram nenhum episódio de
ITU no ano de 2004, e 42 (87,5%) apresentaram
de um a nove episódios de ITU neste mesmo ano.
No ambulatório do IFF, considera-se nenhuma
infecção/ano como resultado excelente do CIL, 1-2
infecções/ano um resultado bom e 3 ou mais infecções/ano um resultado ruim, devendo-se investigar
a causa destes episódios. A Tabela I possibilita a
visualização da freqüência destas infecções de forma
mais clara.
Tabela I – Distribuição das crianças de acordo com a
freqüência de ITU em 2004.
Número de ITU
f
f%
0
6
12,5%
1e2
17
35,4%
3e4
18
37,5%
5 ou +
7
14,6%
Total
48
100%
Fonte: Ambulatório do IFF / FIOCRUZ.
Com relação à Tabela I, observa-se que através dos 48 prontuários das crianças que realizam
CIL e compuseram a população alvo, 35,4% (17)
apresentaram entre 1 e 2 ITU, e que 12,5% (6)
crianças não apresentaram o referido quadro clínico.
Em contrapartida, 37,5% (18) apresentaram 3 e 4
ITUS, enquanto 4,6% (7) apresentaram 5 ou mais
ITU. Este resultado é assustador, uma vez que o
CIL quando realizado adequadamente (freqüência
regular e ideal higienização das mãos e da região
urogenital) promove o esvaziamento periódico e
freqüente da bexiga favorecendo as defesas vesicais
naturais à infecção, pois evita o resíduo urinário e
a isquemia do detrusor causada pela hiperdistenção
vesical, mesmo que a técnica não seja estéril (6).
Dessa forma, optou-se por relacionar a
ocorrência de ITU com a regularidade do CIL,
obtendo-se os seguintes dados observados na
Tabela II.
Tabela II – Distribuição das crianças de acordo com
a regularidade do CIL correlacionada aos episódios de
ITU em 2004.
CIL
ITUs em 2004
Total
0a2
≥3
Regular
21 (43,8%)
10 (20,8%)
31 (64,6%)
Irregular
2 (4,2%)
15 (31,2%)
17 (35,4%)
Σ
23 (48%)
25 (52%)
48 (100%)
Fonte: Ambulatório do IFF / FIOCRUZ.
A Tabela II demonstra que a assiduidade na
execução do CIL reduz as ITU uma vez que das
crianças que realizavam esse procedimento de forma regular 21 (43,8%) apresentaram 2 ou menos
episódios/ano e apenas 10 (20,8%) apresentaram
3 ou mais ITU. Entre as crianças que realizavam o
procedimento irregularmente, somente 2 (4,2%)
manifestaram 2 ou menos ITU, em contraposição
15 (31,2%) foram expostas a 3 ou mais ITU/ano.
As infecções urinárias apresentadas por crianças
que realizam o cateterismo de forma regular podem
estar relacionados à higiene inadequada das mãos,
da região perineal ou até mesmo das sondas vesicais.
Este fator também pode estar atribuído à evolução
da doença, pois existem bexigas neurogênicas que
respondem mais lentamente ou não respondem ao
tratamento.
Na Tabela II observa-se, ainda, que entre a
população total (48 crianças), 17 (35,4%) realizavam o CIL de forma irregular e 31(64,6%) regularmente. Esse dado chamou a atenção, uma vez que
o cateterismo vesical é realizado de forma limpa e
de baixo custo financeiro. Uma sonda vesical nos 4,
6, 8 ou 10 custa aproximadamente R$ 0,60 a unidade (em outubro de 2004) e pode ser reutilizada
através da limpeza adequada por 1 a 2 meses. Se
o cateterismo for realizado 4 vezes ao dia o gasto
mensal será de R$ 2,40. Esse gasto é muito menor
do que o de um antibiótico usado no tratamento
de ITU e menor ainda quando comparado ao bem
estar da criança.
Esse é um dado importante para ser considerado pelos gestores do sistema de saúde visto que a
relação custo-benefício do fornecimento das sondas
para crianças que fazem cateterismo intermitente
compensa o gasto com a antibioticoterapia, com a
internação para tratamento da ITU e com as complicações futuras.
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Assim, ao relacionar os motivos apresentados
para a realização do CIL irregular na Tabela III, o
motivo mais apresentado foi falta de tempo, uma vez
que 6 (35,29%) referiram dificuldade em conciliar
o CIL com afazeres domésticos, trabalho e cuidado
dispensado a outros filhos; 5 (29,41%) referiram a
dificuldade financeira; 3 (17,65%) não havia registro no prontuário do motivo da adesão irregular ao
CIL e 3 (17,65%) relataram que não confiavam na
reutilização das sondas, associando esta ao aumento
de episódios de ITU.
Tabela III – Motivos apresentados para a não adesão
ao CIL regular.
Motivos
f
f%
Falta de tempo
6
35,29%
Dificuldades financeiras
5
29,41%
Não confiar no CIL
3
17,65%
Sem registro
3
17,65%
Total
17
100%
Fonte: Ambulatório do IFF / FIOCRUZ.
Os dados apresentados na Tabela III demonstram a necessidade de estratégias direcionadas a
resolução destes problemas envolvendo orientações
sobre os benefícios do CIL, treinamento de uma
outra pessoa para a realização do procedimento
(podendo inclusive ser a própria criança dependendo da idade e vontade em realizar o autocateterismo) e informações a respeito do custo mensal
do CIL.
Refluxo Vesicoureteral (RVU)
Consiste no fluxo retrógrado de urina proveniente da bexiga para cima e para dentro dos ureteres. Uma pequena parte do ureter penetra na parede
vesical, sendo esta porção comprimida durante a
micção normal impedindo o refluxo de urina [3].
No caso de crianças portadoras de bexiga neurogênica pode haver um comprometimento da válvula
ureterovesical o que justifica a evolução da doença
com presença de RVU em graus variados.
Na Tabela IV, observa-se que das 48 crianças
que tiveram o prontuário analisado, 17 (35,42%)
apresentavam RVU. Dentre as 31 (64,6%) que não
apresentavam RVU, 2 (4,2%) estavam em processo
de investigação do RVU.
Tabela IV – Regularidade do CIL correlacionada ao
Refluxo Vesicoureteral.
CIL
Refluxo Vesicoureteral
Total
Presente
Ausente
Regular
7 (14,6%)
24* (50%)
31 (64,6%)
Irregular 10 (20,8%)
7 (14,6%)
17 (35,4%)
Σ
17 (35,4%)
31* (64,6%)
48 (100%)
Fonte: Ambulatório do IFF / FIOCRUZ.
*2 (4,17%) estavam em processo de investigação do RVU
Através da observação da Tabela IV pode-se
afirmar que há uma relação positiva entre o CIL
e a minimização ou prevenção do RVU, uma vez
que 24 (50%) das 31 crianças que realizavam o
CIL regularmente não desenvolveram RVU e 10
(20,8%) das 17 crianças que não realizavam o cateterismo regular da bexiga desenvolveram refluxo.
A execução do cateterismo de forma regular é importante, pois evita o acúmulo de urina na bexiga
e conseqüentemente diminui a estase urinária e o
aumento da pressão intravesical, fatores agravantes
e desencadeantes do RVU.
O fato de crianças que fazem o CIL corretamente apresentarem refluxo pode ser justificado,
pois a origem e a gravidade da bexiga neurogênica é
variada e evolui de forma particular em cada criança.
Algumas reagem bem ao CIL e outras apresentam
pouca melhora.
Comprometimento renal
A insuficiência renal é uma doença sistêmica
que ocorre quando os rins se tornam incapazes de
remover os produtos da degradação metabólica do
corpo. Também é considerada a via final comum de
diferentes doenças do rim e do trato urinário [3].
O RVU é um risco para o funcionamento
urinário adequado, pois através dele “as bactérias
podem alcançar, e eventualmente, destruir os rins”
(3:1086). Dessa forma foram consideradas para
análise apenas as 17 crianças com RVU.
Tabela V – Presença de comprometimento renal em
crianças com RVU.
Comprometimento renal
f
f%
Função renal preservada
12
70,6%
Hipofunção do rim
3
17,6%
Atrofia renal
1
5,9%
Insuficiência renal crônica
1
5,9%
Total
17
100%
Fonte: Ambulatório do IFF / FIOCRUZ.
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Através da Tabela V observa-se que, dentre
as crianças que apresentam RVU, a maioria significativa 12 (70,6%) apresentavam função renal
preservada, enquanto 5 (corresponde a 29,4%)
demonstravam algum tipo de comprometimento: 1
(5,9%) apresentou insuficiência renal crônica causada por ITU recorrente e nefropatia de refluxo, 1
(5,9%) apresentou comprometimento total de um
dos rins com posterior atrofia do órgão, 3 (17,6%)
apresentaram rim hipofuncionante, com função
glomerular diminuída e múltiplas lesões focais.
A insuficiência renal crônica consiste na perda
progressiva e irreversível da função renal normal, onde
a capacidade do corpo em manter o equilíbrio metabólico e hidroeletrolítico falha. O objetivo maior do
acompanhamento e tratamento urológico de crianças
portadoras de bexiga neurogênica é impedir que o
quadro clínico evolua até este estágio crítico.
Ao relacionar as crianças que apresentavam
comprometimento renal com a regularidade do CIL,
na Tabela VI, obtiveram-se os seguintes resultados:
1 (6%) realizava o cateterismo de forma regular e 4
(23,5%) de forma irregular.
Tabela VI – Regularidade do CIL correlacionada ao
comprometimento renal.
CIL
Comprometimento renal
Total
Presente
Ausente
Regular
1 (6%)
8 (47%)
9 (53%)
Irregular
4 (23,5%)
4 (23,5%)
8 (47%)
Σ
5 (29,5%)
12 (70,5%)
17 (100%)
Fonte: Ambulatório do IFF / FIOCRUZ.
Através destes dados considera-se importante
que durante a inserção da criança no Programa
de Cateterismo Vesical Intermitente Limpo, a
enfermeira deve, além de treinar o familiar para a
realização da técnica, enfatizar a importância de uma
adesão regular a este Programa através da cateterização vesical diária e com intervalos regulares.
A insuficiência renal crônica é a doença renal
em estágio terminal e a lesão do rim torna-se irreversível e progressiva, caso o fator desencadeante (RVU)
não seja corrigido. Quando ocorre a insuficiência
renal crônica, o tratamento disponível para manutenção da vida é a hemodiálise, que usualmente é
realizada três vezes por semana, por um mínimo de
3 a 4 horas por tratamento. Somente um transplante
de rim bem sucedido eliminará a necessidade de
hemodiálise e essa criança deverá provavelmente
esperar muitos anos na fila.
Conclusão
O CIL mostrou-se eficaz como forma de
tratamento, já que as crianças que o realizaram
regularmente apresentaram menor número de complicações e principalmente conseguiram preservar a
função renal normal, que é o principal objetivo da
assistência e acompanhamento desses pequeninos.
Dos 48 prontuários analisados, 31(64,6%) crianças
realizavam o CIL regularmente, 21(43,8%) apresentaram 2 ou menos ITU no ano de 2004, 24 (50%)
não apresentaram RVU e apenas 1 (2%) evoluiu
com comprometimento renal (lesão parenquimatosa
com diminuição da função renal em um dos rins).
Trabalhar com crianças portadoras de bexiga
neurogênica requer da enfermeira amplos conhecimentos sobre urologia pediátrica, desenvolvimento
infantil, além da evolução clínica e resultados do
CIL como forma de tratamento. A enfermeira deve
assistir a criança e sua família desde o processo de
elucidação diagnóstica até o acompanhamento
ambulatorial, colaborando com a equipe interdisciplinar enquanto exerce o papel de orientador,
cuidador e principalmente o de capacitar para os
cuidados especiais.
A consulta de enfermagem, atividade privativa
do enfermeiro, envolve os três níveis de assistência,
tem cunho educativo e visa preparar tanto o indivíduo como a família para o autocuidado em termos
de promoção, proteção, recuperação e reabilitação
da saúde. Também permite uma interação mais
efetiva do enfermeiro com o cliente, favorecendo a
continuidade da assistência, fator importante para
avaliar a eficiência das orientações prestadas durante
o atendimento.
Durante esta consulta, a enfermeira deve
conscientizar o familiar sobre a importância do
esvaziamento periódico da bexiga, através de uma
técnica simples, segura e de baixo custo frente a um
prognóstico tão sombrio e estabelecer uma parceria
com o responsável reforçando a necessidade e o valor
da atuação assídua nos cuidados diários prestados
a criança.
Prestar assistência de enfermagem com qualidade as crianças portadoras de bexiga neurogênica
e a sua família com ênfase no atendimento personalizado e humanizado, respeitando os mais elevados
princípios éticos e impedindo o comprometimento
renal é um dever da enfermeira. Impedindo o prejuízo renal, a enfermeira participa ativamente na
melhoria da qualidade de vida destas crianças. Ações
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educativas e o comprometimento com a clientela
visando a aderência regular ao CIL são fundamentais
para impedir danos irreversíveis e o risco de vida
representado pelo mau prognóstico da insuficiência
renal crônica.
Referências
1. D’ Ancona CA, Netto NR. Urodinâmica: princípios
e aplicações clínicas. São Paulo: Editora Gráfica Prol;
1996. p. 53-70.
2. Araújo GF. Repercussão do cateterismo vesical intermitente na vida dos pais de crianças portadoras de mielomeningocele [dissertação]. Rio de Janeiro: FIOCRUZ;
2000. p.17.
3. Brunner LS, Suddarth DS. Tratado de enfermagem
médico-cirúrgica. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan;
2002. p.1055-99.
4. Levi D’Ancona CA. Avaliação urodinâmica. Aplicações
clínicas da urodinâmica. Campinas: Cartgraf; 1995.
5. Lapides I, Dionko AC, Silber SJ, Lowe BS. Clean
intermittent self-catheterization in the treatment of
urinary tract disease. J Urol 1972;107:485-91.
6. Furlan MF. Experiência do cateterismo vesical intermitente por crianças e adolescentes portadores de
bexiga neurogênica. [tese]. Ribeirão Preto: Escola de
Enfermagem de Ribeirão Preto - USP; 2002.
7. Polit DF, Hungler BP. Fundamentos de pesquisa em enfermagem. 3a ed. Porto Alegre: Artes Médicas; 1995.
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Artigo original
Educação para a saúde e redução de danos:
enfermagem atuando com adolescentes
Luciana da Costa Monteiro*, Vera Lúcia Freitas de Moura**, Viviane Tinoco Martins***
*Acadêmica de Enfermagem da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO, **Enfermeira e Professora
Assistente da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto – UNIRIO, ***Psicóloga Coordenadora do CAPS ad Raul Seixas
Resumo
Este estudo apresenta dados relevantes à definição de estratégias referentes à assistência a usuários de substâncias psicoativas no
Centro de Atenção Psicossocial. Teve como objetivo identificar o perfil dos adolescentes inseridos no tratamento, somando um
total de 12 jovens. Trata-se de uma pesquisa descritiva do tipo qualitativa. A realização da coleta de dados ocorreu no período
de outubro de 2004 a março de 2005. Na primeira etapa da coleta de dados foram utilizados prontuários e documentos de
recepção dos clientes. Na segunda etapa foi utilizada a técnica de observação participativa com roteiro estruturado, através da
experiência diária da autora em oficinas terapêuticas e no espaço de convivência do CAPS. A produção de novas interpretações
sobre a trajetória da estratégia da redução de danos no CAPS ad proporcionou conhecer características prevalentes no grupo
e contribuir para aumentar a visibilidade da enfermagem como área de saber essencial a essa estratégia multidisciplinar.
Palavras-chave: drogas, danos, saúde, enfermagem.
Abstract
Health education and reduction of damages: nursing working with adolescents
This study presents relevant data concerning strategies for caring for users of psychoactive substances in a Psychosocial Care
Center. It aimed to identify the adolescents’ profile inserted in the treatment, a total of 12 young adults. It is a descriptive
research with qualitative approach. Data collection were performed from October 2004 to March 2005. At first stage of
data collection medical register and patient’s documents admission were used. At second stage the participant observation
technique was used with structured guidance, through the author’s daily experience in therapeutic workshops and in the
space of sociability of CAPS. The production of new interpretations about the strategy trajectory of the reduction of damages
in the CAPS ad provided to know prevalent characteristics in the group and contribute to increase nursing’s visibility as an
essential area of knowledge to that multidisciplinary strategy.
Key-words: drugs, damages, health, nursing.
Artigo recebido em 27 de junho de 2005; aceito em 20 de fevereiro de 2006.
Endereço para correspondência: Luciana da Costa Monteiro, Travessa Gonçalves Dias, nº.
38, sobrado Neves, 24425-780 São Gonçalo RJ, Tel: (21) 2720-0020, E-mail: [email protected]
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Resumen
Educación para la salud y reducción de daños: enfermería actuando con
adolescentes
Este estudio presenta los datos relevantes a la definición de estrategias referentes a la atención prestada a los usuarios de
sustancias psicoactivas en el Centro de Atención Psicosocial. Tuvo como objetivo identificar el perfil de los adolescentes
inseridos en el tratamiento, totalizando un total de 12 jóvenes. Se trata de una investigación descriptiva del tipo cualitativo.
La colecta de datos se realizó en el período de Octubre de 2004 a Marzo de 2005. En la primera fase de la colecta de datos
fueron utilizados prontuarios y documentos de recepción de los pacientes. En la segunda fase fue utilizada la técnica de la
observación participante con guión estructurado, a través de la experiencia diaria de la autora en los talleres terapéuticos
y en el espacio de convivencia del CAPS. La producción de nuevas interpretaciones sobre la trayectoria de la estrategia de
reducción de daños en el CAPS ad proporcionó saber las características predominantes en el grupo y contribuir para aumentar
la visibilidad de la enfermería como área esencial del saber a esa estrategia multidisciplinaria.
Palabras-clave: drogas, daños, salud, enfermería.
Introdução
A redução de danos constitui um “conjunto de
medidas de saúde pública voltadas para minimizar
as conseqüências adversas do uso de drogas” [1].
Constitui-se um importante caminho para escolhas alternativas de tratamento “porque reconhece
cada usuário em suas singularidades, traça com ele
estratégias que estão voltadas não para a abstinência
imediata como objetivo a ser alcançado, mas para a
defesa de sua vida” [2].
Além disto, a política de redução de danos
norteia a “execução de ações para a prevenção das
conseqüências danosas à saúde que decorrem do uso
das drogas, orientada pelo respeito à liberdade de
escolha, à medida que estudos apontam que muitos
usuários não querem ou não conseguem deixar de
usar drogas” [1].
Ao estabelecer uma interação através do convívio com os usuários do serviço e tendo participado das várias atividades do CAPS ad, com base
nesta forma de tratar desconhecida em nosso meio
acadêmico, buscou-se conhecer como o estilo de
vida destes é alterado, de modo a reduzir os riscos
e prejuízos advindos do seu contato contínuo com
as drogas, utilizando-se de formas alternativas para
manter esse uso, assumindo de forma responsável
o seu papel no tratamento.
O objetivo deste estudo é identificar o perfil
dos adolescentes usuários de drogas em relação à
intensidade do consumo de drogas, práticas de risco
e outros cuidados com a saúde, diante da adesão ao
tratamento voltado para a redução de danos sociais
e à saúde.
Os Centros de Atenção Psicossocial para
usuários de álcool e outras drogas (CAPS ad) são
serviços de saúde extra-hospitalares comunitários
de atendimento diário, intensivo, personalizado e
promotor da vida, que conta com a participação da
família e da comunidade. Objetiva, através de suas
ações, promover a reinserção social dos usuários,
utilizando para tanto recursos intersetoriais, ou
seja, setores como educação, saúde, cultura, esporte
e lazer, montando estratégias conjuntas para o enfrentamento dos problemas.
Referencial teórico
Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, considera-se adolescente aquela “pessoa que
tem entre 12 e 18 anos de idade” [3].
O aumento progressivo e indiscriminado do
uso de drogas pelos adolescentes os leva cada vez
mais a se distanciarem dos estudos, da família, do
trabalho, a abandonar toda a rotina de sua vida em
função da busca pela droga, ao favorecer o comprometimento das relações interpessoais, da capacidade
produtiva, do seu envolvimento com atos violentos
e a transmissão de doenças infecto-contagiosas.
Assim, destaca-se a importância deste trabalho
de orientação em saúde contínuo e dinâmico, visando estimular mudanças significativas nos padrões de
comportamento dos usuários de drogas na busca
pela cidadania e inclusão social.
O que inicialmente representou uma atividade assustadora e um desafio, hoje constitui um
vasto campo para a atuação da enfermagem. “É a
dimensão das ações de redução de danos que esti109
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mula a inserção e a permanência da enfermagem
no projeto” [4].
Antes de conhecer a Política de Redução de Danos, a forma de tratamento conhecida era a internação,
baseada no isolamento social e na abstinência. Com este
estudo busca-se meios para conhecer os impactos que
este tratamento baseado na redução de danos sociais
e a saúde alcançam na vida destes indivíduos, e poder
contribuir para sua divulgação na enfermagem.
A redução de danos tem um olhar diferente das
antigas abordagens, que só admitem a abstinência
como resultado satisfatório no tratamento. Ao contrário destas, a redução de danos possibilita a criação
de alternativas na conduta com problemas de drogas;
oferecendo uma área de ajuda a essas pessoas no sentido de “crescerem acima das ideologias opressivas
contra os usuários de substâncias ilícitas” [5].
Atuando nos caminhos pelos quais as pessoas
são atingidas pela prática de novos comportamentos e
mudando seu estilo de vida, cria-se a possibilidade de
mudança no perfil dos usuários de drogas, fazendo uma
passagem para o reconhecimento do corpo e de seus
limites, como estes se maltratam e se cuidam de maneira
autônoma, induzindo a uma outra forma de cuidar de
si mesmo, sendo responsáveis pelo seu corpo e não mais
vitimizados todo tempo pelo que lhes acontece.
Apesar de este programa ser visto como potencial fonte de estímulo ao uso de drogas, é necessário ver a redução de danos como “uma iniciativa
preventiva de saúde pública, de natureza similar às
demais e que devem ser complementadas por outras iniciativas” [6]; sendo importante para que se
possa atingir a parcela de usuários que não desejam
o tratamento tradicional.
Material e métodos
Trata-se de um estudo de natureza descritiva, e
apresenta abordagem qualitativa, segundo Hunger
e Polit [7].
Os sujeitos desta pesquisa são os adolescentes
inseridos no projeto terapêutico de tratamento do
Centro de Atenção Psicossocial para usuários de
álcool e outras drogas Raul Seixas, e que participam
do espaço de convivência e oficinas terapêuticas.
Estes foram selecionados aleatoriamente, somando
um total de 12 clientes. A quantificação do número
de participantes foi realizada ao final do estudo,
possibilitando concluir todas as etapas da coleta.
O CAPS ad Raul Seixas fica localizado na Rua
2 de Fevereiro, nº. 785, Bairro Engenho de Dentro,
anexo ao IMAS Nise da Silveira, Município do Rio
de Janeiro, e que foi o cenário no qual se realizou
a pesquisa.
Os critérios para inclusão no estudo foram: a)
Ser adolescente; b) Participar das atividades terapêuticas e da convivência do CAPS; c) Aceitarem
participar do estudo.
A realização da coleta de dados ocorreu no
período de novembro de 2004 a março de 2005; foi
realizada nas dependências do CAPS e no horário de
tratamento dos clientes. Na primeira etapa da coleta
de dados foi feito um estudo para subsidiar o perfil
da referida população, no qual foram utilizados,
após autorização da instituição, documentos institucionais presentes, como prontuários, documentos de
recepção dos clientes. Na segunda etapa foi utilizada
a técnica de observação participativa [7,8], com
roteiro estruturado, através da experiência diária
da autora em atividades das oficinas terapêuticas e
na convivência do CAPS, além da utilização de um
diário de campo com observações sobre as atividades
desenvolvidas; não sendo condicionada a coleta de
dados a uma entrevista.
A análise dos dados foi realizada com leitura
exaustiva dos elementos colhidos e categorizados
em temas e sub-temas. As categorias são interpretadas por Deslandes e Minayo como “conceitos que
abrangem elementos ou aspectos com características
comuns ou que se relacionam entre si”, ou ainda,
como agrupamento de “elementos, idéias ou expressões em torno de um conceito” [9].
Resultados
Categoria 1. Características demográficas dos jovens; história de internações; estudo e trabalho.
Gráfico 1 – Distribuição da amostra quanto ao sexo e
idade (n = 12).
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Gráfico 2 – Distribuição da amostra em relação a
tratamentos anteriores (n = 12).
Categoria 5. Divulgação das ações do CAPS.
Gráfico 7 – Distribuição da amostra quanto à divulgação do CAPS (n = 12).
Gráfico 3 – Distribuição da amostra quanto ao nível
de inserção social (n = 12).
Discussão
Categoria 2. Comportamento em relação ao sexo
mais protegido.
Gráfico 4 – Distribuição da amostra quanto à utilização de preservativos (n = 12).
Categoria 3. Conhecimento sobre DSTs, Hepatites e HIV/AIDS.
Gráfico 5 – Distribuição da amostra quanto ao conhecimento sobre DSTs, Hepatites e HIV/AIDS (n = 12).
Categoria 4. Expectativas quanto ao uso de drogas.
Gráfico 6 – Distribuição da amostra quanto às drogas
mais consumidas (n = 12).
Diante do exposto, pode-se afirmar que os
adolescentes que participaram do estudo têm idade
entre 15 e 18 anos, sendo que a grande maioria,
83%, é do sexo masculino.
A média de tempo de tratamento no serviço
é de aproximadamente 1 ano. A vinculação com o
serviço representa um bom indicador para avaliação
do trabalho, expressada pelo retorno dos clientes ao
serviço para participar das atividades.
No que diz respeito à educação, houve um
aumento de 8% de pacientes que voltaram ou
iniciaram os estudos, assim como o vínculo de trabalho, que alcançou 41%. Estes dados representam
o estabelecimento de laços sociais do cliente desde
sua recepção até o momento.
Diante disto, podemos observar que o jovem
incentivado a optar por uma inscrição na sociedade,
seja por meio do estudo ou do trabalho, aumenta
suas chances de construir algo em sua vida que vai
além das drogas. Os vínculos empregatícios e/ou
escolares estabelecidos e preservados constituem
os mais importantes veículos da elaboração individual de concepções e valores a partir do convívio
social.
A instituição mostra o caminho e o jovem
seleciona aonde e como quer chegar, ratificando a
ideologia de Paulo Freire [10] de que “ensinar não
é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para sua própria produção ou sua construção
(...)”.
Quanto à prática do sexo mais protegido
através do uso de preservativos, observou-se em
dinâmicas e jogos que 58% dos jovens aderem ao
chamado “sexo seguro”. Isto representa um número
aceitável, mas não o objetivado; porém, é claramente
visível no dia-a-dia que a continuidade das ações
de saúde de orientação e informação desenvolvidas
no CAPS garantirá que um maior contingente de
usuários do serviço venha a adotar práticas mais
seguras referentes ao sexo.
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Uma atenção especial deve ser dada às adolescentes do sexo feminino. Mesmo representando
16,67% da população da pesquisa, estas apresentam
uma particularidade em relação às vulnerabilidades
acerca do comportamento sexual relacionado ao
uso de drogas: a prostituição (a troca do sexo por
dinheiro ou por drogas), e sua relação inferiorizada
em relação aos homens bastante expressiva no convívio dos clientes.
Um estudo publicado pelo Ministério da
Saúde, com 150 mulheres, revelou que “80% das
meninas tiveram a primeira experiência sexual antes
dos 15 anos” [2]; indicando o início precoce das
relações sexuais e do uso de drogas, “geralmente por
influência do companheiro” [2].
Durante a realização de jogos e debates sobre
DSTs e AIDs, foi possível observar que 75% dos
usuários que participam das atividades do CAPS
têm algum conhecimento sobre este tema. Isto representa que algum trabalho com impacto positivo
já foi realizado anteriormente.
“A liberação sexual, a facilidade de contatos
íntimos e os estímulos vindos dos meios de comunicação propiciam contatos sexuais precoces” [11].
Assim, a informação torna os jovens orientados em
relação à prevenção do contágio de doenças, diminuindo suas vulnerabilidades.
Abandonar o uso de drogas, segundo a clientela, não é a meta principal. 50% dos jovens não
desejam parar de usar drogas, abandonar o uso. E,
segundo os dados, a abstinência não constitui uma
meta principal.
Com a apresentação do material, pode-se
concluir que uma das principais metas do programa redução de danos à saúde está sendo alcançada.
A maioria dos dados sobre o uso dos vários tipos
de drogas expressou uma queda de consumo ou a
substituição por drogas menos associadas a danos
graves. “O emprego da substituição de drogas por
outras substâncias menos associadas a danos, mesmo
quando oferecem risco de abuso ou dependência,
também podem ser compreendidas entre as ações
das estratégias de redução de danos” [12].
É importante comentar que ocorre o uso de
mais de um tipo de droga na maioria dos casos.
Em 92% ocorre associação de pelo menos 2 tipos
de drogas. As drogas mais usadas são: o tabaco, a
maconha, a cocaína e o álcool.
Há uma exceção em relação ao tabaco (Nicotina), que não apresentou alterações no consumo
entre os jovens, e que, ainda que considerada uma
substância lícita, constitui um grande problema de
saúde pública, como sabemos, mantém um alto índice de agravos à saúde e de mortalidade prematura.
O uso do álcool e do tabaco, “substâncias de uso
historicamente lícito e as mais consumidas em todo
mundo, são as que mais trazem as maiores e mais
graves conseqüências para a saúde pública mundial”
[2], o que confirma o dado encontrado.
O uso injetável de drogas entre os clientes representa 0%. Assim, concluímos com o estudo que
o uso injetável de drogas não é uma característica do
grupo estudado. Demandando da equipe estratégias
de abordagem preventiva, no sentido de desmistificar e orientar quanto ao uso e promovendo debates
e discussões sobre o tema, para que cada um analise
criticamente as opções que lhe couberem diante das
oportunidades de uso que surgirem no seu dia-a-dia.
“Os usuários de droga injetáveis, com o predomínio
do uso da cocaína, são jovens com idade entre 18 e
30 anos” [2]. Isto caracteriza o resultado do estudo
acerca do assunto.
A divulgação das ações de redução de danos
na família, nos pares do indivíduo, na escola, na
comunidade e em qualquer outro nível de convivência sócio-ambiental é de extrema importância
para a continuidade desta estratégia. Observou-se
no estudo que 33% dos usuários do serviço falam
sobre o que aprendem no CAPS com seus pares.
O objetivo do programa é também “incorporar
as ações de redução de danos no âmbito de outras
ações de saúde, tais quais os Programas de Agentes
Comunitários de Saúde e Saúde da Família (PACS
e PSF)” [2].
Enquanto isto não se implanta definitivamente, o CAPS deve apostar na formação de multiplicadores, ou seja, no desenvolvimento do espírito
multiplicador que se caracteriza por: informar-se
para informar e aprender a prevenir para ensinar
prevenção; com o objetivo de aumentar a visibilidade das ações nas comunidades.
Conclusão
Considerando as questões abordadas pelo
CAPS (em relação à família, saúde, drogas e relações
sociais), a clientela e as oscilações vivenciadas por
eles no decorrer do acompanhamento no serviço,
acredita-se que qualquer forma de aceitação de
inserção no tratamento consiste numa motivação
eficaz para a mudança de comportamento e uma
diminuição da resistência ao tratamento.
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A oportunidade de construção do trabalho da
enfermagem junto aos usuários de álcool e outras
drogas permitiu desconstruir os conceitos pré-estabelecidos e os medos predominantes, possibilitando
a participação no conhecimento do processo saúdedoença desta população e na identificação de novas
formas de abordagem.
O trabalho desenvolvido apontou para a necessidade de implantação de um espaço destinado
a consulta de enfermagem, que inclui a coleta de
dados através de anamnese e exame físico do cliente.
Além de proporcionar autonomia ao enfermeiro,
favorece a elaboração de ações de enfermagem
voltadas para a promoção da saúde, orientação e
esclarecimento em saúde e prevenção dos riscos
advindos da agressão à saúde e ao corpo causado
pelo uso contínuo de drogas. E assim, favorecer
o enriquecimento do conhecimento científico em
nosso meio acadêmico.
Acreditamos que este espaço poderá contribuir para diminuir os índices de agravos em saúde
e complementar o trabalho multidisciplinar da
equipe, promovendo a integração dos vários saberes
envolvidos nesta prática. O CAPS proporciona este
meio para a enfermagem atuar internamente e com
os serviços de referência em saúde, atingindo a meta
de formação das redes em saúde.
Outro dado para o qual apontou o estudo foi
quanto à necessidade de atuar frente às doenças
preveníveis por imunização, especialmente falando
da Hepatite B e do Tétano. Devido às dificuldades
identificadas em relação à clientela em se vincularem aos outros serviços, este pode se constituir um
importante recurso para complementar à estratégia
de redução de danos no CAPS.
Confirmando o papel essencial da enfermagem
no campo da redução de danos de maneira sábia,
voltada para comunicação e orientação em saúde,
gostaria de concluir este trabalho com as palavras
de Paulo Freire:
“Não posso proibir que os oprimidos com
quem trabalho numa favela votem em candidatos
reacionários, mas tenho o dever de adverti-los do erro
que cometem, da contradição em que emaranham”
[10].
Apesar de toda discussão que gera na sociedade a questão da Redução de Danos, devemos
levar em consideração que esta forma de atuar em
saúde proporciona também gerar metas e novos
caminhos antes desconhecidos na abordagem do
assunto Drogas.
Referências
1. Ministério da Saúde. Manual de redução de danos:
saúde e cidadania. Brasília: Ministério da Saúde; 2001.
p.11. [Série manuais, 42].
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Revisão
A dor e o sofrimento psíquico
em pacientes queimados: implicações
para a assistência de enfermagem
Divane de Vargas, D.Sc. *, Milrley Lucia de Araújo**
*Professor do Curso de Enfermagem da Universidade de Ribeirão Preto – UNAERP, **Enfermeira graduada pela Universidade
de Ribeirão Preto – UNAERP
Resumo
Trata-se de um estudo descritivo de cunho bibliográfico, que objetiva refletir sobre as questões que envolvem a dor e o
sofrimento psíquico do paciente queimado, internado em unidades de tratamento; bem como, a atuação do enfermeiro
frente a essa questão. Discute-se o conceito de dor física e de dor psíquica, além da complexidade que se refere ao tema. Os
autores apontam que é imprescindível para a prestação de uma assistência integral ao paciente queimado que o enfermeiro
transcenda o aspecto físico da queimadura, a dor do corpo; é necessário ir além, ao perceber a dor e o sofrimento psíquico do
sujeito, refletindo sobre a assistência e implementando medidas que passarão a conduzir todo o sofrimento experimentado,
a ser convertido em capacidade de superação seja em médio ou em longo prazo. Eis um desafio para o enfermeiro que presta
assistência ao paciente queimado.
Palavras-chave: sofrimento psíquico, dor, queimadura, enfermagem.
Abstract
The pain and the psychic suffering in burn patients: implications for nursing care
It is a descriptive study with a bibliographical approach, which aims at pondering about questions that involve the pain
and the psychic suffering of the burn patient, hospitalized in treatment units; as well as, nurse performance related to this
question. The concept of physical pain and psychic pain is discussed, and also the complexity that refers to the theme. The
authors point out that it is indispensable for an integral care to burn patient that the nurse transcends the physical aspect
of the burn, the body pain. It is necessary to go beyond, when she/he notices the pain and the subject’s psychic suffering,
she/he should consider carefully about the care and implement measures to surpass suffering at medium or long term. Here
is a challenge for the nurse that renders cares to the burn patient.
Key-words: psychic suffering, pain, burn, nursing.
Artigo recebido em 4 de novembro de 2005; aceito em 30 de março de 2006.
Endereço para correspondência: Divane de Vargas, Rua Prudente de Morais, 1569/172,
14015-100 Ribeirão Preto SP, Tel: (16)3904-9314, E-mail:[email protected]
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Resumen
El dolor y el sufrimiento psíquico en pacientes quemados: implicaciones para la
atención de enfermería
Se trata de un estudio descriptivo caracterizado como bibliográfico, el cual objetiva reflexionar sobre las cuestiones que envuelven
el dolor y el sufrimiento psíquico del paciente quemado, internado en las unidades de tratamiento; así como la actuación
del enfermero frente a esa cuestión. Se discute el concepto de dolor físico y de dolor psíquico, además de la complejidad que
se refiere al tema. Los autores apuntan que es imprescindible para prestar una atención integral al paciente quemado, que
el enfermero transcienda el aspecto físico de la quemadura, el dolor del cuerpo; es necesario ir más adelante, al percibir el
dolor y el sufrimiento psíquico del sujeto, debe reflexionar sobre la asistencia e implementar medidas que conducirán todo
el sufrimiento vivido a convertirse en capacidad de superación a medio o largo plazo. Aquí está un desafío para el enfermero
que presta atención al paciente quemado.
Palabras-clave: sufrimiento psíquico, dolor, quemadura, enfermería.
Introdução
A dor aguda tem impacto significativo na
percepção da qualidade de vida dos indivíduos [1],
podendo levar a modificações no âmbito orgânico,
emocional, comportamental e social. Esses aspectos
podem influenciar nas respostas da dor de pacientes
vítimas do mesmo tipo de lesão tecidual; nesse caso,
as queimaduras.
Em unidade de queimados, a dor vivenciada
pelo paciente talvez se constitua em um dos principais desafios para o enfermeiro que assiste essa
clientela. Diante disso, a valorização da dor é importante para a humanização da assistência ao paciente,
além de promover o planejamento das intervenções
a serem realizadas. Na condição de profissionais
de saúde devemos lembrar que cada ser humano é
único e que não podemos generalizar as suas ações,
percepções e comportamentos, principalmente em
relação à dor [2]
A dor vivenciada pelo paciente queimado resulta em queixas álgicas constantes, que demanda
intervenções freqüentes do enfermeiro, que precisa
lançar mão de meios para minimizar tal quadro e diminuir o sofrimento. Somando-se a dor decorrente
das lesões, pode-se dizer que o estresse diário do paciente é intensificado pelas intervenções médicas e de
enfermagem, dentre elas os curativos sucessivos, que
desencadeiam, na maioria das vezes, manifestações
dolorosas; não só físicas, mas também se nota um
sofrimento psíquico intenso, enquanto ele aguarda
tais procedimentos.
Dentro desse contexto, este estudo se propõe a
oferecer subsídios para reflexão a respeito do papel
do enfermeiro frente à dor física e à psíquica em pa-
ciente queimado, tendo em vista que é o enfermeiro
quem presencia a queixa de dor, avalia a manifestação e age com a finalidade de dar alivio ao cliente
em qualquer uma das circunstâncias [3].
Considerações gerais sobre a queimadura
Queimadura é uma lesão dos tecidos orgânicos
em decorrência de trauma de origem térmica. Pode
variar desde uma pequena bolha ou frictema, até
formas mais graves, capazes de desencadear grande
número de respostas sistêmicas proporcionais à
extensão e à profundidade das lesões [4].
No início do século IX, foi observado que as
vítimas de queimaduras eram assistidas por profissionais de saúde de boa vontade, que se preocupavam em realizar trocas de curativos, mantendo
um estado geral consideravelmente bom, sem que
houvesse uma visão holística do que de fato era o
episódio da queimadura [4].
Em meados do século XX, começam a surgir
preocupações em organizar setores hospitalares ou
serviços, onde vítimas de queimaduras pudessem
ser atendidas e agrupadas para receber assistência
qualificada [5].
Na década de 60, as vítimas tinham o prognóstico fechado, se tivessem em torno de 50% da
área corporal queimada [6]. Entretanto, afirma-se
que atualmente é possível recuperar vítimas de
queimadura com até 85% de superfície corporal
queimada [3].
Estima-se que no Brasil ocorram quase
1.000.000 (um milhão) de acidentes com queimadura por ano. Desses casos, 100.000 (cem mil)
procurarão atendimento hospitalar e 2.500 (dois mil
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e quinhentos) falecerão, direta ou indiretamente em
virtude de suas lesões [4].
Considerações gerais sobre a dor
O comitê de taxonomia da Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP), conceitua a
dor como: “Uma experiência sensorial e emocional
desagradável, que é associada e descrita em termos
de lesões teciduais” [7].
A dor caracteriza-se por uma percepção de
uma sensação aversiva, desagradável, originada por
estímulos intensos, potencialmente capazes de lesionar o organismo; que atuam sobre os receptores
específicos. Trata-se de uma sensação de grande
importância para a sobrevivência do homem; é provocada por estímulos potencialmente prejudiciais
para o organismo e que produzem reações reflexas
com finalidade de protegê-lo [8].
A dor é classificada em duas categorias: a
crônica, que tem duração extensa de vários meses a
vários anos, e geralmente acompanha o processo da
doença ou está associada à lesão já tratada; e a dor
recorrente, que é caracterizada por uma dor aguda,
porque ocorre em episódios de curta duração, mas
tem características crônicas, porque se repete ao
longo do tempo e não está claramente associada a
uma etiologia especifica [9].
Além dessa classificação, a dor pode também
ser classificada como: superficial (cutânea), que
decorre da estimulação dos receptores da pele e das
membranas mucosas, com localização precisa na
superfície corporal tais como (picada, ardência);
e a dor profunda, originada principalmente nas
estruturas mais internas, sendo impertinente ou
incomodativa, mais relacionada a músculos, ossos,
articulações e vasos, caracterizada por pontadas,
choques e adormecimento.
As dores são percepções sensoriais desagradáveis, que apresentam um sintoma de componente
psíquico, um sinal de alerta útil, na medida que o
indivíduo busca ajuda para o seu alívio, e conseqüentemente, para determinar a origem dela [10].
Cabe ressaltar que as considerações tecidas até
aqui se referem à dor física, que pode ser delimitada
e descrita; porém, quando se fala de paciente queimado, tão importante e presente quanto à dor física
é a dor psíquica, para a qual o enfermeiro deve estar
atento e apto a reconhecer. Trata-se daquela dor que
o paciente não se queixa, não consegue localizar e
nem descrever, e que muitas vezes pode ser expressa
por meio de uma queixa física, passando muitas
vezes despercebida pela pessoa que cuida dele.
Devido à complexidade que envolve o paciente
queimado, a dor e o sofrimento psíquico podem ser
intensos. Desta forma, há necessidade de o enfermeiro que atua nesta área refletir sobre sua prática diária,
quanto ao reconhecimento e à intervenção adequada. Uma vez que seja capaz de identificar e atuar
diante dessa problemática, o enfermeiro será capaz
de intervir, favorecendo a adaptação do indivíduo à
situação estressante (a queimadura), bem como, ao
tratamento ao qual será submetido o paciente.
Dor psíquica e dor física nas queimaduras
Conforme já discutido, a dor é uma reclamação
constante, quando se fala de assistência ao paciente
vítima de queimadura. Associada a essa dor física,
decorrente da lesão e algumas vezes intensificada
pelas intervenções médicas e de enfermagem, não
se pode negar a existência da dor ou do sofrimento
psíquico, causado, na maioria das vezes, pela insegurança e pelo medo frente ao futuro, já que o paciente
teme deformidades; até mesmo por sentimento de
culpa, em casos em que o próprio indivíduo é responsável pela queimadura (tentativas de suicídio).
Sem dúvida, essas questões precisam ser
consideradas quando se avalia a questão da dor no
paciente queimado. Cabe ao enfermeiro reconhecer
e valorizar a dor psíquica, pois certamente esta, ao
contrário da dor física, não pode ser aliviada com a
ministração de um analgésico.
“O sofrimento é aquela dor física ou moral
ante a qual não podemos fazer absolutamente nada, porque já tentamos inclusive
até o limite de nossa capacidade e de nossas
forças, mas não desaparece” [11].
No paciente queimado a queixa de dor geralmente é do tipo protopática, classificada assim pela
fenomenologia, por ser difusa e difícil de ser descrita;
o limiar de dor do paciente geralmente é alterado
e intensificado com a interação dos sentimentos de
medo, ansiedade, fuga, desânimo, perdas, dependência, mutilação, desfiguramento, sofrimento e
morte [3]. Esses sentimentos interagem originando a
dor física e/ou psíquica, que fazem parte da vivência
do paciente queimado.
Devido à mescla de fatores interatuantes (fatores emocionais, cognitivos, sociais e culturais [12])
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que estão presentes na queimadura, os pacientes
experimentam dores físicas e/ou psíquicas intensas,
sendo que essa última freqüentemente se sobressai.
Neste quadro, o paciente reage à dor de três formas:
ignorando-a, reagindo a ela realisticamente ou supervalorizando o quadro doloroso [3].
Estar queimado é uma das mais traumáticas
situações que o indivíduo pode experimentar física
e emocionalmente, porque trata-se de um acontecimento que interrompe bruscamente a existência,
passando da integridade física ao desequilíbrio; cuja
gravidade varia com a extensão do dano [13].
No entanto alguns estudos [3,11] baseados
na observação clínica constataram que não existe
relação linear entre a quantidade de tecido lesado e
a intensidade da dor que o indivíduo expressa, ou
seja, é possível que um indivíduo com uma lesão
pouco extensa reaja com intensa sensação dolorosa
ao passo que um grande queimado por exemplo,
queixe-se com menos freqüência de dor, havendo
assim importantes componentes subjetivos envolvidos na situação. Diante disso, é necessário que o
enfermeiro esteja apto a interpretar estas formas de
reação frente a dor: indiferença ou supervalorização;
não como um sinal de recusa de ajuda ou um meio
para obter maior atenção da equipe, mas sim como
mecanismos utilizados para enfrentar essa situação
tão traumática e desgastante.
Para isso, dentre outras observações, é necessário que o enfermeiro vislumbre no próprio tratamento um desencadeador da dor psíquica, pois ao
ser internado na unidade de queimados, o paciente
passa a conviver em um ambiente totalmente modificado da sua realidade; onde iniciará, na maioria
das vezes, um tratamento longo, árduo e geralmente
estressante, tanto para quem cuida quanto para
quem é cuidado [14]. Além das características da
unidade de queimados, é preciso considerar ainda
a própria hospitalização, como uma circunstância
que atinge a identidade do paciente. Ao entrar no
hospital, muitas vezes, o pensar é anulado, e, em
alguns casos, a pessoa é despojada de sua identidade
de ser pensante e estimulado a exercer a passividade
e a submissão. Tal sentimento pode ser reforçado
em se tratando de um paciente queimado, devido
à total dependência física a qual a maioria desses
pacientes fica sujeito, especialmente nos quadros
em que o paciente sofre com grande percentual de
seu corpo queimado.
Essas e outras questões permitem, através
da experiência profissional com esses pacientes,
vivenciar situações de extrema dor psíquica; o que
pode ser verificado, dentre outros, nas horas que
antecedem os procedimentos terapêuticos, em que
é comum o uso de expressões verbais e não verbais
que evidenciam tal sofrimento. Por exemplo, no
momento da balneoterapia (terapêutica por meio de
banho), caracterizado pelos pacientes como “hora
da dor”; a sessão de fisioterapia passa a ser denominada “sessão tortura” e a simples deambulação, de
“pesadelo”.
Ao vivenciar isso torna-se muitas vezes difícil
ao profissional distinguir entre dor do “eu psíquico”
e do “eu corpo”
“A queimadura realiza um equivalente de
situação experimental onde certas funções
da pele são suspensas ou alteradas e onde é
possível observar as repercussões correspondentes sobre certas funções psíquicas. O eupele, privado de apoio corporal, apresenta
então um certo número de falhas as quais
é possível, no entanto, remediar em parte
por meios psíquicos” [6].
A utilização dos meios psíquicos para enfrentar
a situação é muitas vezes traduzida em vários comportamentos; dentre outros, inquietação, introspecção e intensificação das queixas álgicas. Essa última
pode ser utilizada como uma forma de pedir ajuda,
frente ao medo e às perdas (de si como ser social,
de si com ser físico e do outro, pela separação das
pessoas que ama). Portanto, é possível inferir disso
que a vivência da queimadura extrapola a dor física; é
difícil, na maioria das vezes, saber onde começa a dor
física e onde termina a dor psíquica e vice-versa.
A dor é invisível; assim, é possível inferir a
presença dela em alguém, indiretamente, por meio
de observação ou de comunicação do sofrimento
do comportamento da dor [15]. É provável que
o comportamento da dor seja uma tentativa de
comunicar uma experiência que muitas vezes envolve emoções, sofrimento, desmoralização e outros
sentimentos ou idéias associadas, que talvez torne
a visão da dor irreal (emocional), separada da dor
física. Tal constatação leva a pressupor que separá-la
seja tarefa impossível.
É sabido que indivíduos acometidos por doenças físicas vivem um estado de crise, a qual pode
ser precipitada pela natureza da doença ou de seu
tratamento ou por ambas. Segundo a teoria da crise
[16], esse é o momento de maior vulnerabilidade
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para o indivíduo; geralmente é desencadeado por
traumas sempre acompanhados por interrupções
dos mecanismos usuais de luta ou de soluções de
problemas.
Assim, no momento da crise o indivíduo fica
desprovido de armaduras pessoais e aceita melhor
a ajuda; é momento que o profissional deve gerar
oportunidades para que esse indivíduo recupere
suas capacidades de enfrentamento condizentes à
realidade vivida, a fim de que a pessoa não use meios
de negação frente a ela. Para isso, é importante que
o enfermeiro utilize, dentre outros recursos, a escuta
terapêutica, que proporciona ao paciente expor seus
medos, receios e inquietações.
Pode-se dizer que exercer assistências nessa
área é estimular o desenvolvimento de capacidades
de resistência e de superação com o paciente, pois o
fato de estar queimado requer superações e quebra
de obstáculos diariamente. Faz-se necessário que o
enfermeiro ajude o paciente a lidar com o medo
diante da desfiguração do corpo, da incapacidade
e da dor.
Portanto, para proporcionar ao paciente queimado uma assistência integral, é preciso desenvolver
condutas que se sobressaiam ao aspecto físico da
dor. Mediante as poucas opções de escolha, deixadas por uma experiência tão traumatizante, cabe
ao enfermeiro lançar mão de instrumentos básicos
da enfermagem: a comunicação e a empatia, representadas aqui pelo interesse sincero pelo outro;
operacionalizado, como já mencionado, dentre
outros, pela escuta.
Ouvir é um instrumento essencial para
compreensão do outro, é uma atitude positiva de calor, interesse e respeito, sendo,
portanto, terapêutica [17].
Para obter êxito na assistência à pessoa queimada e auxiliá-la a vencer os vários obstáculos
que se apresentam no decorrer do tratamento e da
reabilitação, é necessário que o enfermeiro ofereça
uma assistência criativa e estimulante, exercendo
observação cuidadosa a fim de combater adaptações
ineficazes e ineficientes em seu tratamento; entre
eles: a difícil aceitação de sua aparência e a baixa
auto-estima.
Uma vez utilizados esses instrumentos, pode
tornar-se mais fácil para o profissional reconhecer e
atuar frente à “todas as dores” do paciente queima-
do. No entanto, cabe lembrar que para a utilização
adequada das estratégias, faz-se necessário que o
enfermeiro avalie seu próprio conceito e julgamento
sobre a dor psíquica, para que possa então atuar de
maneira desprovida de julgamentos e de pré-concepções, que podem surgir quando se avaliam questões
tão subjetivas como a temática dor.
Conclusões
O enfermeiro de uma unidade de queimados
vive o desafio de administrar constantemente a dor,
seja ela física causada pelas lesões decorrentes da
queimadura, seja psíquica provocada pelos vários
fatores que se interpõem nessas condições, dentre
elas: medo da morte, ansiedade, fuga, desanimo,
perdas, dependência, mutilação e desfiguramento.
Diante disso, o paciente precisa estar apto a valorizar
e a reconhecer também a dor, atuando efetivamente
frente a ela, no sentido de assegurar a sua plena
reabilitação e a sua reinserção social.
Propor-se a redescobrir novos horizontes
em prol do paciente queimado são conquistas
que o enfermeiro tem de exercer todos os dias. É
indispensável oferecer às vítimas de queimaduras
um espaço de acolhimento e de apoio durante o
período de internação e tratamento, que objetiva a
recuperação física, emocional e a reinserção social e
familiar do indivíduo. Para isso, ao enfermeiro cabe
reconhecer o potencial do ser humano em superar
dificuldades e obstáculos; em um cenário que exige
a utilização de estratégias como o acolhimento, a
escuta, a confiança e o respeito ao indivíduo; no
sentido de compreender, valorizar e oferecer suporte
em seu sofrimento.
Portanto, pode-se dizer que é imprescindível,
para a prestação de uma assistência integral ao
paciente queimado, que o enfermeiro transcenda
o aspecto físico da queimadura, compreendendo
que muitas vezes, a dor e o sofrimento psíquico
sobressaem-se à dor do corpo. Ao reconhecer tal
fato, é possível ao enfermeiro refletir a respeito
de sua assistência ao paciente queimado, implementando medidas que passarão a conduzir todo
o sofrimento experimentado, a ser convertido
em capacidade de superação seja em médio ou
longo prazo. Eis um dos muitos desafios para
o enfermeiro que presta assistência ao paciente
queimado: reconhecer e intervir diante da dor e
do sofrimento psíquico.
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Revisão
Custo e preço do processo de cuidar da
enfermeira: uma revisão bibliográfica
Vivian Schutz*, Joséte Luzia Leite, D.Sc.**
*Enfermeira, Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro, **Enfermeira, Orientador, Escola de
Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Resumo
Foram realizadas buscas por artigos, dissertações e teses nas principais bases de dados bibliográficos brasileiros que tratassem
da temática sobre Custo e Preço do Processo de Cuidar da Enfermeira. Encontramos apenas uma tese que abordou o assunto
em questão, onde a autora relata que o valor do serviço da enfermagem prestado era constante, independente da intensidade
ou complexidade do atendimento realizado; e que o pagamento da assistência de enfermagem estava incluído nas diárias
hospitalares e em taxas de procedimentos. Como conclusão, mencionamos a necessidade da enfermeira se aproximar dos
conceitos sobre economia para que possa buscar um melhor valor monetário para o seu trabalho.
Palavras-chave: custos e análise de custos, economia, cuidados de enfermagem.
Abstract
Cost and price of the nursing care process: a bibliographic revision
Searches in the main Brazilian bibliographic databases were carried out in order to find out articles regarding Cost and Price
of the nursing care process. We found only one thesis that matched perfectly the aim of our study. This work presented some
interesting results, in particular that the cost of the nurse care was constant (i.e. independent of the intensity or complexity),
and that the payment of the nurse was included in the hospital or procedures bills. We believe it is of extreme importance
that nurses become aware of concepts of the current economy to allow for a better understanding of the monetary value of
their work.
Key-words: costs and cost analysis, economics, nursing care.
Artigo recebido em 6 de junho de 2005; aceito em 23 de março de 2006.
Endereço para correspondência: Vivian Schutz, Rua Desembargador Paulo Alonso nº
165- Recreio dos Bandeirantes, 22790-540 Rio de Janeiro RJ, Tels: 2486-8755, E-mail:
[email protected]
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Resumen
Costo y precio del proceso de atención de enfermería: una revisión bibliográfica
Fueron realizadas búsquedas de artículos, disertaciones y tesis en las principales bases de datos bibliográficas brasileñas con
respecto a la temática de Coste y Precio del proceso de atención de la enfermera. Encontramos solamente una tesis que abordó
el tema en cuestión, donde la autora relata que el valor del servicio de enfermería prestado era constante, independiente de la
intensidad o complejidad de atención realizada; y que el pago de la asistencia de enfermería estaba incluido en la tarifa diaria
del hospital y en tasas de procedimientos. Como conclusión, mencionamos la necesidad de la enfermera aproximarse de los
conceptos sobre economía para que pueda buscar un mejor valor monetario para su trabajo.
Palabras-clave: costos y análisis de costos, economía, atención de enfermería.
Introdução
O tema Custo e Preço do Processo de Cuidar
da Enfermeira, sob o ponto de vista da Economia,
ainda está muito distante da enfermagem, que se
concretiza muito na práxis como forma de realizar
suas atividades diárias.
Podemos definir Custo [1], como sendo medidas monetárias dos sacrifícios com os quais uma
organização tem que arcar a fim de atingir seus
objetivos. Se o objetivo de uma empresa de saúde é
resgatar a saúde do indivíduo enfermo que se interna
para tratamento e cuidados, esta empresa deverá
arcar com a compra de materiais, medicamentos,
com os equipamentos que forem necessários a este
tratamento, com a mão de obra necessária para
colocar o serviço em prática. Após, estes valores
serão embutidos nas contas hospitalares a serem
cobradas de seus clientes (seguradoras ou próprios
clientes externos).
Preço, por sua vez, pode ser definido [1], como
sendo a importância recebida pelas entidades em
decorrência da oferta de seus produtos ou serviços.
Deve ser suficiente o bastante para cobrir todos os
custos incorridos e ainda fornecer um lucro para a
entidade. Sem lucro, nenhuma empresa sobrevive.
Se retornarmos ao exemplo acima mencionado,
quando a conta hospitalar é apresentada a seu pagador (comprador de seus serviços), nesta devem estar
inseridos os custos e a margem de lucro estabelecida
pela instituição. Porém, os limites superiores de
preço são definidos pelo mercado consumidor e pelo
valor percebido e atribuído ao produto ou serviço
comercializado.
O trabalho da enfermeira está muito atrelado a
uma estrutura e funcionamento com instrumentos
normativos e legais em direção a uma atividade
específica da profissão que é o Cuidado de Enferma-
gem – distante do financeiro – realidade ainda não
incorporada pela enfermeira. O comportamento da
enfermeira vai rumo a um processo habitual, repetitivo e rotineiro, reduzindo seus esforços a simples
técnicas hierarquizadas na divisão social do trabalho.
Esta orientação tecnocrática resulta na preocupação
maior com o cotidiano do cuidar, não lhe restando
tempo para que pense, estude ou discuta sobre
outros assuntos de seu interesse, como neste caso,
o valor econômico do trabalho que realiza dentro
das Instituições Hospitalares.
Vivemos hoje um período filosoficamente chamado de pós-modernidade onde o poder econômico
e político pertencem ao capital financeiro e ao setor
de serviços. Sob esta ótica, o pensamento critica as
idéias modernas e as recusa, como, por exemplo,
quando dá importância à idéia de diferença. Entendemos como diferença, a condição que concebe a
sociedade como uma estrutura que opera pela divisão social das classes (cada uma das quais com uma
realidade e uma identidade definidas pela economia
e pela política, e contrárias umas as outras, ou em
luta contínua), e considera o social, como uma teia
fragmentada de grupos que se diferenciam por etnia,
gênero, religião, costumes, comportamentos, gostos
e preferências.
Dentro do contexto pós-moderno, a enfermagem vem buscando aquilo que deve ser considerado
fundamental em seu processo de cuidar, o Ser Humano, e, nesse processo, mostrar a diferença que
existe entre o seu trabalho e o trabalho dos demais
membros da equipe de saúde.
O cliente é quem determina o padrão de qualidade através de seus valores sociais, morais, espirituais e de conhecimento. Suas experiências servem de
parâmetros de valorização, ou insatisfação, que são
levadas ao mercado podendo beneficiar as empresas
e/ou afastar outros clientes potenciais.
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Esta temática, relativa a custo e preço, tem merecido uma atenção generalizada dos empresários e
profissionais da saúde, pois a má qualidade prejudica
a imagem da empresa e seu custo é incalculável.
Portanto, a preocupação deve estar voltada para o
aumento da produtividade, agregando-se o máximo
de valor ao menor custo.
No contexto acima descrito, o trabalho da
enfermeira é de fundamental importância para que
esta relação, custo-benefício, seja bem implementada e controlada dentro da empresa. Sendo assim,
devemos nos preocupar em saber quanto custa nosso
trabalho para a empresa e para nós mesmas, a fim
de buscar intensivamente a melhoraria do preço de
cada ação que praticamos e a valorização do nosso
trabalho, perante os compradores dos serviços de
saúde dos hospitais e donos de empresas de saúde.
A qualidade da assistência de enfermagem
prestada é um indicador de qualidade da empresa
responsável pela prestação deste serviço, no entanto, somente ao dimensionarmos o valor da nossa
prática, será possível exigir o real valor monetário
que dela advém.
Objetivo
Rever, através de uma revisão bibliográfica
sistemática dentro das diversas áreas do conhecimento, priorizando a enfermagem, artigos sobre
o tema: Custo e Preço do Processo de Cuidar da
Enfermeira.
Metodologia
Foi realizada uma pesquisa documental nas
principais bases de dados bibliográficas brasileiras,
entre dissertações, teses, periódicos, artigos e outros
tipos de publicações nos últimos cinco anos.
Nesta busca, sobre custo e preço do processo
de cuidar da enfermeira, levantamos nas bases
da Revista Latino-Americana de Enfermagem;
Portal Capes - na área de Ciências Sociais e Ciências da Saúde; Revista Texto e Contexto; Sites
da Bireme; Medline e Lilacs; Scielo Brasil; CD
ABEn 75 anos; e algumas livrarias, como foi o
caso da Livraria da Fundação Getúlio Vargas;
UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e Livraria Universo.
Foram utilizados os preditores: Custo; Preço;
Custo do Cuidado; Preço do Cuidado; Custo do
Trabalho da Enfermeira; Preço do Trabalho da En-
fermeira; Custo do Processo de Cuidar; Preço do
Processo de Cuidar.
O que encontramos na Revista Latino-Americana de Enfermagem, dos anos 2001 a 2004,
foram 398 trabalhos, sendo uma tese que abordava
o tema “Custos na Área Hospitalar”, que talvez nos
dê alguns subsídios futuros, porém, no momento,
não se adéqua ao nosso tema.
No Portal Capes, na área de Ciências Sociais,
de 2000 a 2004, 90 artigos encontrados e na Área de
Ciências da Saúde, 30. Do mesmo modo, nenhum
deles voltados ao nosso objeto de pesquisa.
Na Revista Texto e Contexto foram analisados
140 trabalhos, entre 2001 e 2004, não havendo
resultado relevante e de interesse sobre o tema.
No Medline, foram encontrados 4420 trabalhos; no Lilacs, 1706 trabalhos e no Scielo Brasil,
566. Somente neste último foram encontrados 05
trabalhos sobre “Custos Hospitalares”, mas não
direcionados ao nosso objeto de estudo.
No CD da ABen 75 anos, foram analisados
415 trabalhos, sendo que apenas três estavam próximos do objeto de investigação, entre dissertações
de mestrado, teses de doutorado e pós-doutorado
dos anos de 1979 a 2000. Um deles abordava bem
a questão do preço do trabalho da enfermeira.
Além destes sites mencionados, pesquisamos
em algumas livrarias – FGV/Fundação Getúlio
Vargas; UERJ/ Universidade do Estado do Rio de
Janeiro; UNIVERSO/ Livraria da UFRJ, livros que
tratassem do tema. Os resultados encontrados foram
vários livros nas áreas de finanças, contabilidade,
administração e economia. Desta forma, escolhemos
um livro sobre Gestão de Custos e Formação de
Preços, que pudesse nos dar um suporte teórico.
Nos livros procurados sobre enfermagem,
nossa área de atuação, não encontramos trabalho
algum que viesse ao encontro do objeto deste estudo. Muitos temas sobre custos hospitalares foram
encontrados, mas abordando noções sobre auditoria
hospitalar ou gestão econômica nos serviços de
saúde, mais relacionados com a redução de custos
dentro dos diversos serviços da empresa.
Resultados
De um total de 9.269 trabalhos existentes,
apenas nove abordavam a temática sobre custos,
sendo oito deles, sobre custo hospitalar, e, um sobre
salário. Este último se relacionou bem com o que
pretendemos estudar em nossa pesquisa. Com o
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título: O estudo do pagamento da assistência de
enfermagem hospitalar na rede privada do município de Ribeirão Preto. Esta pesquisa foi a tese de
doutorado da Dra. Janete Rodrigues da Silva Nakao,
defendida em 1995.
Em sua tese de doutorado, a Dra. Janete
Nakao [2], estudou o pagamento da assistência
de enfermagem prestada a pacientes internados
em instituições hospitalares privadas. Seu estudo
objetivou conhecer os parâmetros utilizados para
a cobrança do atendimento hospitalar e como a
enfermagem encontrava-se inserida nele. A análise realizada mostrou que o valor do serviço de
enfermagem prestado era constante, independente
da intensidade ou complexidade do atendimento
realizado. Ainda, o pagamento da assistência de
enfermagem estava incluído nas diárias hospitalares
e em taxas de procedimentos. A autora concluiu:
“.... Isto mostra que a assistência de enfermagem
realmente não é considerada como parâmetro no
estabelecimento de valores para o atendimento da
Saúde no Brasil.” [2]
Estes resultados encontrados vêm ao encontro
de questões que pretendemos estudar, quando trazemos como objeto de estudo, o Custo e o Preço
do Processo de Cuidar da Enfermeira.
Discussão
A maioria dos nossos hospitais, e dos profissionais, não sabe quanto custa cada um dos seus
serviços ou procedimentos. Como salientou Nakau
[2], os valores monetários referentes ao trabalho
que a enfermeira realiza estão embutidos nas diárias hospitalares e nas taxas de procedimentos, isto
quando a empresa a cobra. Neste sentido, torna-se
imprescindível que a enfermagem tenha consciência
do quanto vale cada cuidado que presta, para, talvez,
buscar a separação deste conjunto de atividades e
das outras que o hospital mercantiliza.
Nesta perspectiva, para que ela possa ter bases
para discussão junto aos administradores das Instituições de Saúde e compradores diretos do cuidado,
a noção sobre custo e preço precisa ser melhor entendida e inserida em sua área de conhecimento. Isto
porque, a forma como as empresas estabelecem seus
preços sempre foram baseadas no custo que tinham
com seus materiais, equipamentos, medicamentos,
mão de obra, dentre outras e acrescidas de uma margem de lucro, repassada ao comprador final, ficando
de fora o custo e o preço do cuidado da enfermeira.
No início da década de 80, se usava muito a
equação onde o Preço era igual ao Custo + Lucro.
Isto pôde ser observado no trabalho da Dra. Nakao
[2] onde nos mostra que o pagamento do trabalho
da enfermeira era feito com base nos custos dos
serviços faturados.
Aos poucos, a inflação de demanda começou
a transformar-se em inflação de custos. O preço
passou a ser determinado pelo mercado e a equação sofreu uma inversão, ficando: Preço – Custo =
Lucro.
Hoje as empresas têm que passar a centralizar
a administração da crise econômica através do corte
de despesas e, formatar seus preços sob uma nova
abordagem que é observada pela equação: Preço
– Lucro = Custo.
A enfermeira seria a profissional mais adequada para realizar este tipo de serviço, pois está
presente durante todas às 24h no hospital, podendo
gerenciar o controle das perdas (desperdícios) e
dessa forma reduzir o custo hospitalar, um dos
grandes indicadores para a formação dos preços
dos serviços.
Porém, poucas empresas conseguem perceber
isto e colocar em prática esta atividade. Poucas, desta
forma, conseguem atender a esta última equação.
O preço é determinado pelo mercado, e o lucro,
pela empresa. Os custos são reduzidos, querendo-se
acreditar, que a qualidade não será pedida.
Daí observarmos que, atualmente, os indicadores financeiros e econômicos, para se falar em
formação de preços, perpassam os custos e margem
de lucros, indo ao encontro de valores de mercado
e do valor percebido pelo cliente, quem compra os
serviços.
Ainda existe uma dificuldade brasileira em se
estabelecer valores de pagamentos que retratem a
realidade dos cuidados prestados aos clientes, do
ponto de vista, tanto do empresário, quanto do
próprio sujeito do cuidar – no caso em estudo, a
enfermeira.
Faz-se necessário o conhecimento do custo
do tratamento, ou dos procedimentos, para que os
valores adequados lhes sejam atribuídos.
Poucos enxergam que a assistência de qualidade
prestada pela enfermeira tem grande influência na
redução dos custos como, por exemplo, aumentar
a rotatividade dos leitos pela diminuição do tempo
de permanência dos clientes nos hospitais. Desta
forma, poderíamos ter uma maximização no preço
de nosso trabalho.
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O cuidado ofertado pelas enfermeiras [3], sendo
de melhor qualidade, proporciona ao cliente maior
possibilidade de recuperação e maior rapidez em sua
cura. Essa rapidez traz como conseqüência para a Instituição, maior rotatividade em seus leitos, diminuindo os custos e aumentando os lucros, porque uma
alta tem como conseqüência a imediata ocupação do
leito. E só a prática pode mostrar isto, reforçando sua
importância no mercado de trabalho, mostrando, de
fato, para a sociedade, que a enfermeira se diferencia
dos outros membros da equipe de enfermagem pelo
cuidado que presta, podendo se mostrar como ciência
e ser melhor remunerada pelo serviço que presta.
Mesmo estando mais evoluídas em nosso
processo de trabalho, com algumas Instituições
contratando mais enfermeiras pelos melhores resultados, ainda estamos inseridas no contexto em que
o trabalhador da enfermagem tem um baixo nível
de remuneração.
Inicialmente, os cuidados de enfermagem
eram prestados por religiosas que se dedicavam à
caridade, cuidando daqueles que precisavam, e que,
por pertencerem a instituições que praticavam a
caridade, como por exemplo, as Santas Casas, não
eram remuneradas.
Mais tarde, mulheres de uma classe sócio–econômica–cultural inferior, com exigências de um
padrão de vida social, também inferior, não necessitavam de uma alta remuneração. O preço pago por
estes esforços, eram valores inferiores aos daqueles
profissionais que possuíam um padrão de vida mais
sofisticado.
Mesmo estando hoje entre a modernidade e a
pós-modernidade, a enfermagem se constitui como
atividade remunerada, com uma nova modalidade
de trabalho profissional, porém ainda não reconhecida como tal.
Nosso intuito aqui, com este estudo, é o de
começar a suscitar dúvidas em relação ao melhor
valor que deve ser instituído no processo de cuidar
da enfermeira para que ele tenha um valor monetário maior e digno, uma vez que entendemos que
o salário está diretamente ligado à remuneração de
cada procedimento que realiza em seu cotidiano
do cuidar e que isto, exige um pleno conhecimento
destas atividades que não são poucas e, muito menos
simples, afinal, como menciona Nascimento [4],
o cuidado de enfermagem prestado ao cliente é
realizado a partir de um conjunto de ações técnicas
que são desenvolvidas com arte e subsidiadas por
conhecimentos de diversas ciências.
Ao entendermos que o preço de cada procedimento é a retribuição financeira pelo trabalho que
prestamos quer nas Instituições de Saúde ou de
forma autônoma, prestando cuidados diretamente
aos compradores de nossos serviços, temos que começar a pensar no preço de cada uma destas ações
que praticamos.
Para isto, devemos transitar pela área econômica–financeira, mesmo que seja apenas para
iniciarmos um processo de aprendizagem, reconhecimento de terminologias e conceitos, para que, em
um futuro próximo, possamos discutir com maior
segurança, de que forma nosso trabalho é vendido,
e qual a melhor valorização financeira para ele.
Conclusão
Observarmos que existem poucos artigos, ou
quase nenhum, principalmente dentro de nossa
área, que se preocupe com as questões econômicas
para o trabalho da enfermeira, indicando o quanto
se faz necessário um estudo mais profundo sobre
este tema.
Por outro lado, observamos que o referido
tema está embutido no processo de trabalho da
enfermagem, tão pouco investigado e/ou valorizado, sob esta ótica. Ressalta-se neste ponto, que as
enfermeiras vêm estudando custos hospitalares [2],
mas não do ponto de vista da economia e do lucro
que o seu trabalho gera.
A equipe de enfermagem constitui-se no próprio setor de serviços. Assim sendo; devemos buscar
qualidade nos processos de trabalho e com isso, a
valorização para o cuidado, por ser considerado de
suma importância dentro das empresas hospitalares
e fora delas.
Através da valorização do cuidado de enfermagem, será possível melhorar a assistência de enfermagem aos clientes, e estaríamos, cada vez mais,
preocupadas em qualificar os profissionais que fazem
parte desta equipe, através de estudos, pesquisas e
treinamentos, agregando um valor bem maior ao
produto/serviço final da empresa.
Nesse contexto, entendemos a enfermagem
como uma empresa que presta serviços para outras
empresas (Instituições de Saúde) e que por isto
precisa de um valor econômico melhor definido
e justo, onde possa vender seus serviços em bases
sólidas e consistentes, gerando credibilidade em
seus clientes. É a enfermeira quem dá suporte ao
funcionamento do hospital, das atividades mais
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simples às mais complexas, no campo do curar, do
cuidar, do educar/orientar, do organizar.
Concluímos, enfatizando que todo o processo
de trabalho tem um custo e tem um preço, que é
pago pelo cliente a partir do momento em que perceba que está conseguindo resultado de promoção de
sua saúde. Ao agregarmos esse valor ao cuidado prestado, precisamos apresentá-lo ao mercado da saúde,
tanto para as Instituições quanto para aqueles que
compram diretamente os nossos serviços. Somente
através dos valores percebidos pela prestação dos
nossos cuidados de enfermagem, será possível sermos mais valorizados, economicamente falando.
Referências
1. Bruni AL, Famá R. Gestão de custos e formação de
preços. 3a ed. São Paulo: Atlas; 2004.
2. Nakao JRS. Estudo do pagamento da assistência de
enfermagem hospitalar na rede privada do município
de Ribeirão Preto [tese]. Ribeirão Preto: USP; 1995.
3. Schutz V. Ações intensivas: qualidade do cuidado
prestado por enfermeiras “Um Ensaio sobre Custos”
[dissertação]. Rio de Janeiro: Universidade Federal do
Estado do Rio de Janeiro/UNIRIO; 1996.
4. Nascimento MAL. O cuidado de enfermagem e as
ciências que nele incidem. Revista Enfermagem Brasil
2004;3(3):165-69.
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Normas de publicação Enfermagem Brasil
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sobre-escrito, etc. O total de caracteres não deve ultrapassar
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Bibliografia: É aconselhável no máximo 50 referências
bibliográficas.
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serão o de rigor metodológico científico, novidade, interesse
profissional, concisão da exposição, assim como a qualidade
literária do texto.
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avaliar ou sintetizar trabalhos de investigação já publicados em
revistas científicas. Quanto aos limites do trabalho, aconselha-se
o mesmo dos artigos originais.
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São trabalhos que relatam informações geralmente atuais
sobre tema de interesse dos profissionais de Enfermagem (novas
técnicas, legislação, por exemplo) e que têm características
distintas de um artigo de revisão.
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as características do indivíduo estudado, com indicação de sexo,
idade e pode ser realizado em humano ou animal.
6. Comunicação breve
Esta seção permitirá a publicação de artigos curtos, com
maior rapidez. Isto facilita que os autores apresentem observações, resultados iniciais de estudos em curso, e inclusive realizar
comentários a trabalhos já editados na revista, com condições de
argumentação mais extensa que na seção de cartas do leitor.
Texto: Recomendamos que não seja superior a três páginas, formato A4, fonte Times New Roman, tamanho 12,
com todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobre-escrito, etc.
Tabelas e figuras: No máximo quatro tabelas em Excel
e figuras digitalizadas (formato .tif ou .gif) ou que possam
ser editados em Power Point, Excel, etc
Bibliografia: São aconselháveis no máximo 15 referências
bibliográficas.
7. Resumos
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artigos inéditos ou já publicados em outras revistas, ao cargo
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necessariamente haja relação com artigos publicados, porém
relacionados à linha editorial da revista. Caso estejam relacionados a artigos anteriormente publicados, será enviada ao autor
do artigo ou trabalho antes de se publicar a carta.
Texto: Com no máximo duas páginas A4, com as especificações anteriores, bibliografia incluída, sem tabelas ou
figuras.
PREPARAÇÃO DO ORIGINAL
1.1 Os artigos enviados deverão estar digitados em processador de texto (Word), em página de formato A4, formatado
da seguinte maneira: fonte Times New Roman, tamanho 12,
com todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobrescrito, etc.
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1.2 Numere as tabelas em romano, com as legendas para
cada tabela junto à mesma.
1.3 Numere as figuras em arábico, e envie de acordo com
as especificações anteriores.
As imagens devem estar em tons de cinza, jamais coloridas,
e com qualidade ótima (qualidade gráfica – 300 dpi). Fotos e
desenhos devem estar digitalizados e nos formatos .tif ou .gif.
1.4 As seções dos artigos originais são estas: resumo, introdução, material e métodos, resultados, discussão, conclusão
e bibliografia. O autor deve ser o responsável pela tradução
do resumo para o inglês e o espanhol e também das palavraschave (key-words). O envio deve ser efetuado em arquivo, por
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etc) anexar uma cópia impressa e identificar com etiqueta no
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utilizado e outros programas e sistemas.
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máximo 150 palavras para resumos não estruturados e 200 palavras
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- Objetivos do estudo.
- Procedimentos básicos empregados (amostragem,
metodologia, análise).
- Descobertas principais do estudo (dados concretos e
estatísticos).
- Conclusão do estudo, destacando os aspectos de maior
novidade.
Em seguida os autores deverão indicar quatro palavraschave para facilitar a indexação do artigo. Para tanto deverão
utilizar os termos utilizados na lista dos DeCS (Descritores
em Ciências da Saúde) da Biblioteca Virtual da Saúde, que se
encontra no endereço internet seguinte: http://decs.bvs.br. Na
medida do possível, é melhor usar os descritores existentes.
5. Agradecimentos
Os agradecimentos de pessoas, colaboradores, auxílio
financeiro e material, incluindo auxílio governamental e/ou
de laboratórios farmacêuticos devem ser inseridos no final do
artigo, antes as referências, em uma secção especial.
6. Referências
As referências bibliográficas devem seguir o estilo Vancouver definido nos Requisitos Uniformes. As referências
bibliográficas devem ser numeradas por numerais arábicos
entre parênteses e relacionadas em ordem na qual aparecem
no texto, seguindo as seguintes normas:
Livros - Número de ordem, sobrenome do autor, letras
iniciais de seu nome, ponto, título do capítulo, ponto, In: autor
do livro (se diferente do capítulo), ponto, título do livro, ponto,
local da edição, dois pontos, editora, ponto e vírgula, ano da
impressão, ponto, páginas inicial e final, ponto.
Exemplos:
Livro:
May M. The facial nerve. New-York: Thieme; 1986
Capítulo ou parte de livro:
Phillips SJ. Hypertension and Stroke. In: Laragh JH, editor.
Hypertension: pathophysiology, diagnosis and management. 2nd
ed. New-York: Raven Press; 1995. p.465-78.
Artigos – Número de ordem, sobrenome do(s) autor(es),
letras iniciais de seus nomes (sem pontos nem espaço), ponto.
Título do trabalha, ponto. Título da revista ano de publicação
seguido de ponto e vírgula, número do volume seguido de dois
pontos, páginas inicial e final, ponto. Não utilizar maiúsculas
ou itálicos. Os títulos das revistas são abreviados de acordo
com o Index Medicus, na publicação List of Journals Indexed in
Index Medicus ou com a lista das revistas nacionais, disponível
no site da Biblioteca Virtual de Saúde (http://www.bireme.br).
Devem ser citados todos os autores até 6 autores. Quando mais
de 6, colocar a abreviação latina et al.
Exemplo:
Yamamoto M, Sawaya R, Mohanam S. Expression and
localization of urokinase-type plasminogen activator receptor
in human gliomas. Cancer Res 1994;54:5016-20.
Os artigos, cartas e resumos devem ser enviados para:
Jean-Louis Peytavin
Atlantica Editora
Rua da Lapa, 180/1103 - Lapa
20021-180 Rio de Janeiro RJ
Tel: (21) 2221 4164
E-mail: [email protected]
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Calendário de eventos
Outubro
2006
Maio
17 a 19 de maio
Semana da Enfermagem do Hospital
Municipal Souza Aguiar: o desafio
contemporâneo
Praça da República 111 – Centro
Rio de Janeiro, RJ
Informações: (21) 3111-2724 (Sr. Erivan, Sra. Walcileia)
12 a 20 de maio
Semana da Enfermagem
Hospital Municipal Carlos Tortelly
Niterói, RJ
Informações: (21) 2729-9345
23 a 26 de maio
8º. Simpósio Nacional de Diagnóstico de
Enfermagem
João Pessoa, PB
Informações: (61) 3226-0653, abennacional.org.br
25 a 27 de maio
10º. Congresso Regional de Videocirurgia
Sobracil RJ 2006
Centro de Convenções do Atlântico Búzios Convention
& Resort – Búzios, RJ
Informações: [email protected]
Setembro
24 a 28 de setembro
9º Congresso Brasileiro dos Conselhos de
Enfermagem
Porto Seguro, BA
Informações: 0800-2822507
Enfermagem_v5n2.indb 128
7 a 11 de outubro
XIII Congresso Brasileiro de Enfermagem em
Nefrologia
Expo Gramado, RS
Informações: (11) 3289-8347
8 a 10 de outubro
III Seminário Internacional de Filosofia e
Saúde
30 anos do Programa de Pós-Graduação em
Enfermagem da UFSC
Hotel Castelmar – Florianópolis, SC
Informações: [email protected]
21 a 25 de outubro
VIII Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva
Riocentro – Rio de Janeiro, RJ
Informações: [email protected]
23 a 28 de outubro
XII Congreso de la Sociedad Cubana de
Enfermería
Sociedad Cubana de Enfermería (SOCUENF)
Santiago de Cuba, Cuba
Informações: 537 8323614, [email protected].
cu
Novembro
5 a 9 de novembro
58º Congresso Brasileiro de Enfermagem
Salvador, Bahia
Informações: [email protected]
28/4/2006 11:52:04
Enfermagem Brasil
Maio / Junho 2006;5(3)
Índice
Volume 5 número 3 - Maio / Junho de 2006
EDITORIAL
Servir é diferente de subservir (Reflexões a partir de um fato real),
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento ................................................................... 131
ARTIGOS ORIGINAIS
Motivos (des)considerados por alunos dos Cursos de Graduação
e Especialização em Enfermagem quanto a escolha profissional,
Marcelina Lopes Souto, Maria da Penha Pereira Mota,
Karyn Cristina Balbeck, Leila C. Rosa dos Santos ................................................................. 133
Avaliação do aprendizado na prática (Um estudo sobre os conhecimentos
adquiridos pelos pacientes diabéticos em reuniões multiprofissionais,
Amanda Virginia Coneglian, Thaís Basso de Brito, Sandra Regina Leite Rosa Olbrich,
Maria José Trevisani Nitche, Walkyria de Paula Pimenta......................................................... 140
Triagem neonatal: as percepções de mães na consulta de enfermagem,
Marialda Moreira Christoffel, Daniela Monteiro de Oliveira, Caroline Alessandra Terra ................... 148
ATUALIZAÇÃO
Aspectos éticos da imobilização pediátrica realizada pela equipe
de enfermagem (A crítica reflexiva desafiando o reprodutivismo),
Flávia Cristina de Araújo Cordeiro Biesbroeck, Maria Aparecida de Luca Nascimento,
Kaneji Shiratori, Mariana Gomes Cardim .......................................................................... 155
O indivíduo portador de seqüela de acidente vascular encefálico
(O Despertar para o autocuidado), Delcilene Fátima de Aquino, Telma Geovanini ....................... 161
REVISÃO
Considerações gerais sobre o envelhecimento brasileiro,
Teresa Cristina Prochet, Tânia Ruiz, Ione Correia ................................................................ 168
RELATO DE CASO
O enfermeiro especialista no cenário de uma unidade coronariana:
um relato de experiência, Rafael Celestino da Silva, Deyse Conceição Santoro ............................. 175
As diversas maneiras de executar a avaliação através da pedagogia problematizadora:
um relato de experiência, Giseli Santos, Maíra Melissa Meira .................................................. 180
NORMAS DE PUBLICAÇÃO ............................................................................... 184
CALENDÁRIO DE EVENTOS .............................................................................. 186
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EDITOR CIENTÍFICO – PRESIDENTE DO CONSELHO CIENTÍFICO
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento (UniRio – Rio de Janeiro)
CONSELHO CIENTÍFICO
Profa. Dra. Almerinda Moreira (Escola de Enfermagem Alfredo Pinto – UniRio – Rio de Janeiro)
Prof. Dr. Carlos Bezerra de Lima (UFPB – Paraíba)
Profa. Dra. Márcia Maria Fontão Zago (USP – Ribeirão Preto)
Profa. Dra. Margarethe Maria Santiago Rêgo (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Maria da Graça Piva (ULBRA – RS)
Profa. Dra. Maria Helena da Silva Nery (UFRGS – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Nebia Maria Almeida de Figueiredo (UniRio – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Rita Batista Santos (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Rita de Cássia Tapié Martins (USP – São Paulo)
Prof. Dr. Sérgio Ribeiro dos Santos (UFPB – Paraíba)
Profa. Dra. Silvia Helena de Bortoli Cassiani (USP – Ribeirão Preto)
Profa. Dra. Taka Oguisso (USP – São Paulo)
Profa. Dra. Valéria Lerch Lunardi (FURG – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Vera Regina Salles Sobral (UFF – Rio de Janeiro)
Prof. Dr. Wiliam César Alves Machado (UNIPAC – Minas Gerais)
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Profa. Dra. Zaida Aurora Sperli Geraldes Soler (FAMERP – São José do Rio Preto – São Paulo)
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Editorial
Servir é diferente de subservir
(Reflexões a partir de um fato real)
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento
Em maio do corrente ano, comemoramos
mais uma vez a semana da enfermagem, e, tal como
no ano passado, vamos voltar ao mesmo tema.
Era maio, estávamos, eu e uma outra professora, em pleno desenvolvimento do ensino clínico
em um hospital municipal da cidade do Rio de
Janeiro. O referido hospital estava programando
um ciclo de debates científicos para comemorar
a semana de enfermagem, e sendo assim, fomos
convidadas para dele participar.
Como sempre fazíamos ao organizar um
evento científico, dividimos a turma em várias
comissões; de apoio, de secretaria, de recepção,
etc. Até porque, todas as alunas poderiam, um dia,
ser convocadas, em seus futuros locais de trabalho,
para desenvolver estas mesmas atividades.
No dia seguinte, fui informada pela representante de turma, que o grupo faria todas as
atividades que havíamos programado, menos uma:
oferecer água aos palestrantes...
De imediato não consegui atentar para
os detalhes que permeavam a referida situação,
mas, assim que consegui raciocinar, solicitei uma
reunião com todo o grupo, após o horário do
ensino clínico, para que pudéssemos discutir esta
decisão, a meu ver, repleta de situações reflexivas
e de aprendizado.
Ao chegarmos à reunião, solicitei que a
representante de turma expusesse o problema, e
pedi que todo o grupo também se posicionasse
a respeito. Sendo assim, todos concordaram em
participar do evento, porém, não ofereceriam água
ao palestrante...
Depois que a decisão unânime, foi proclamada, fiz a pergunta crucial: Por quê?
A resposta que ouvi; categórica, taxativa e
pontual, e que até hoje parece ressoar em meus
ouvidos foi a seguinte:
- Porque é por isto que a enfermagem não
vai “pra frente!”
Respirei fundo e respondi, quase que impulsivamente, que, só se fosse a enfermagem do
grupo, pois a minha estava adiante disto.
Logo a seguir, ao me recuperar da reação à
resposta que ouvira, e lembrando que as situações
de aprendizado se apresentam a toda hora, quotidianamente, pedi a atenção de todo o grupo para
contar a história de Fernão Capelo Gaivota, de
Richard Bach, para exemplificar o que eu gostaria
de dizer.
Passei a narrar então, do modo como depreendi da referida leitura, que Fernão Capelo
Gaivota se diferenciava das outras gaivotas, porque
sempre queria ir mais alto que elas, não para ser
diferente, mas para aproveitar a oportunidade que
tinha de saber voar, ao passo que os seus pares
alçavam vôo somente para ver de cima a pesca que
estava embaixo, e assim, poderem se alimentar.
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Ele pensava que saber voar, só para descer, era
um desperdício de oportunidades...
Pois é, disse, vocês estão aprendendo a voar
para pescar sardinhas...
Neste momento, observei a expressão do olhar
de cada um e pude perceber que havia conseguido
o meu objetivo, que era o de levá-los a refletir a
respeito do servir, levando-os a pensar sobre as
seguintes perguntas:
- Como não oferecer água a uma pessoa que
vem aqui falar, de graça, durante 40 minutos, sobre algum tema de interesse, sobre o qual ela vem
estudando?
- Como querer que, preconceituosamente, alguém venha, paramentada a caráter, realizar este ato
de delicadeza e atenção em um evento científico?
- Como não saber a sutil diferença entre servir
e subservir?
A partir de todos estes questionamentos, saímos da reunião, todos nós, fortalecidos pela crença
de que, as oportunidades quando se apresentam,
não se pode deixá-las escapar.
O tempo passou, mas até hoje, acredito que
este dia tenha ficado na lembrança daquele grupo.
Sendo assim, o que de mais importante, para
mim, aconteceu com este fato, foi; como enfermeira,
não permitir que houvesse uma deturpação do papel
primordial da minha profissão, o cuidar, e, como
educadora, aproveitar a oportunidade para levar o
grupo à reflexão e aprender que sempre há um viés
para se chegar a um lugar comum, quando as opiniões não são as mesmas a respeito de um fato.
Na semana de enfermagem, nunca é demais
lembrar a definição da Enfermagem, ditada pela Dra.
Wanda de Aguiar Horta: “A enfermagem é gente que
cuida de gente”, e como cuidar sem servir? Inclusive, cuidar é um dos sinônimos de servir, segundo o
Dicionário da Academia Brasileira de Letras.
No exemplo citado, pôde-se, claramente, observar que a acadêmica de enfermagem já possuía um
pré-conceito a respeito da profissão que escolhera,
ditado, talvez por uma sociedade que não sabe,
ainda, fazer esta diferença, mas saberá senti-la, se
soubermos mostrá-la, pois, quem não reconhece
um cuidado, quando dele precisa?
Nos mínimos atos, profissionalmente, e até
mesmo da vida de relação, é preciso que se faça esta
distinção. Servir sempre, subservir, jamais!
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Artigo original
Motivos (des)considerados por alunos dos
Cursos de Graduação e Especialização em
Enfermagem quanto a escolha profissional
Marcelina Lopes Souto*, Maria da Penha Pereira Mota*, Karyn Cristina Balbeck*,
Leila C. Rosa dos Santos, D.Sc.**
*Curso de Graduação em Enfermagem do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas - UniFMU, **Enfermeira,
Docente da Faculdade de Enfermagem do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas - UniFMU e gerente do Núcleo
de Assistência à Pessoa com Deficiência da Secretaria de Saúde do Município de Jundiaí
Resumo
Estudo descritivo exploratório de campo, realizado com alunos do primeiro período da graduação e
pós-graduação (especialização) em enfermagem, com os objetivos de verificar se os motivos que levaram os
alunos a optar pela graduação em enfermagem são os mesmos relacionados na bibliografia; conhecer o grau de
importância atribuído aos motivos considerados e comparar se há diferenças entre os motivos apontados por
alunos da graduação e da especialização. Os resultados mostraram que os motivos são os mesmos relacionados
na bibliografia, sendo que, os fortemente considerados são a vontade de ajudar o próximo e ter dom ou vocação
para a profissão. Os menos considerados são acesso mais fácil à universidade e status profissional. Na categoria
garantia de emprego parece existir uma tendência dos alunos da graduação apresentarem maior freqüência de
motivo fortemente considerado (21%) em relação ao grupo da especialização (2,6%).
Palavras-chave: escolha da profissão, educação em enfermagem, enfermagem.
Abstract
Motives, considered or not, by undergraduate and graduate students of Nursing for
professional choice
A descriptive exploratory field study, conducted on undergraduate and graduate (specialization) students in the first part of
study in their respective nursing courses, with the objective of verifying: if the motives that led the students to opt for nursing
are the same listed in the literature; how they scale the strength of their declared motives by importance; and comparatively, if
there are differences between the motives declared by the undergraduate and the graduate students. The results demonstrate
Artigo recebido em 20 de setembro de 2005; aceito em 11 de abril de 2006.
Endereço para correspondência: Leila Conceição Rosa dos Santos, Rua Nossa Senhora
Aparecida 227, 13206-310 Jundiaí SP, Tel: (011) 48164815, E-mail: [email protected]
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that the motives are the same related in the literature; thus the strongest considerations are the desire to help ones fellow man
and having the vocational gift for the profession. The least highly considered were: easy access to a university and professional status.
In the category guaranteed employment there seems to be a tendency for undergraduate students to present a larger percentage
attributing it as an important motive consideration (21%) in relation to the graduate students (2,5%).
Key-words: career choice, nursing education, nursing.
Resumen
Motivos (des)considerados por alumnos de los Cursos de Graduación y
Especialización en Enfermería cuanto a la selección profesional
Estudio descriptivo exploratorio de campo, realizado con alumnos del primer semestre de graduación y postgrado (especialización)
en enfermería, con los objetivos de verificar si los motivos que llevaron los alumnos a optar por la graduación en enfermería son
los mismos relacionados en la bibliografía; conocer el grado de importancia atribuido a los motivos considerados y comparar
si hay diferencias entre los motivos señalados por los alumnos de graduación y de especialización. Los resultados mostraron
que los motivos son los mismos relacionados en la literatura, siendo que, los fuertemente considerados son la voluntad de
ayudar al prójimo y tener talento o vocación para la profesión. Los menos considerados son acceso más fácil a la universidad y
status profesional. En la categoría garantía de empleo parece existir una tendencia de los alumnos de graduación presentaren
mayor frecuencia de motivo fuertemente considerado (21%) en relación al grupo de especialización (2,6%).
Palabras-clave: selección de profesión, educación en enfermería, enfermería.
Introdução
A profissão de enfermagem ao longo de sua história esteve relacionada a questões religiosas das pessoas que cuidavam dos doentes com a idéia de que o
importante seria ajudar o próximo para alcançar um
lugar no céu. A ideologia da abnegação, obediência e
dedicação irrestrita, preponderaram na enfermagem
brasileira até o final do século XIX [1,2].
Com a chegada de enfermeiras francesas ao
hospital dos alienados no Rio de Janeiro, em 1890,
houve reformulação na enfermagem que até então
era praticada por religiosos. Dessa forma, o modelo
francês de ensinar e exercer essa profissão começou
a ser conhecido em nosso país, mesmo antes da
implantação do modelo inglês, fato este que só
veio a ocorrer em 1923 com a criação da Escola de
Enfermagem do Departamento Nacional de Saúde
Pública no Rio de Janeiro [2,3].
Em 1973 a enfermagem passou a ser reconhecida oficialmente como categoria profissional, organizada com a Lei n. 5905/73 que criou os Conselhos
Federal e Regional de Enfermagem [2].
Assim, de uma profissão que antes era uma
extensão dos cuidados domésticos, da caridade e da
religião, a enfermagem vem se firmando como uma
profissão autônoma que no Brasil tem sua principal
vitória, em 25 de junho de 1986, com a Lei n. 7.498
que dispõe sobre a regulamentação do exercício da
enfermagem e dá outras providências [4].
Segundo Machado [5], a carreira de enfermagem, analisada sob perspectiva histórica, é caracterizada como seguimento profissional de pouca
expressão e valor social na qual os interessados
migram em maioria de classes sociais menos abastadas financeiramente e/ou sem grandes pretensões
materiais. Porém, o autor reconhece que essa maioria
tem a intenção de obter com o título de bacharel
em enfermagem, a médio prazo, recursos financeiros que viabilizem ascensão sócio-econômico e/ou
mudança de classe social.
A enfermagem como profissão vem caminhando junto ao desenvolvimento brasileiro, ora
se mostrando em situações de desprestígio, ora
como a profissão do futuro, alternando postura de
subserviência com a de autonomia.
Rodrigues [6] realizou uma pesquisa envolvendo 37 alunos do primeiro e 23 do último ano do
Curso de graduação em enfermagem objetivando
explorar entre eles o significado da enfermagem e
porque estavam fazendo o curso. O estudo qualitativo feito sob perspectiva histórica e dialética permitiu
construir as seguintes categorias: ajuda, ou doação,
dom/vocação, status, acesso mais fácil à universidade,
garantia de emprego e profissão reconhecida na área
da saúde.
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O estudo de Rodrigues [6] não revela as características dos alunos estudados, principalmente
se pertenciam a faculdade pública ou privada e se
tinham formação de técnico ou auxiliar de enfermagem. Interessadas em aprofundar os estudos nesse
tema, as autoras do presente estudo, utilizando-se
das mesmas categorias encontradas por Rodrigues se
propuseram a pesquisar junto a alunos da graduação e
da especialização, que peso, em grau de importância,
atribuíram às categorias relacionadas quando decidiram optar pela enfermagem. Com a finalidade de
discutir e fornecer subsídios para uma reorientação
dos alunos da graduação, este trabalho teve como
objetivos verificar se os motivos que levaram os alunos a optar pela graduação em enfermagem são os
mesmos relacionados por Rodrigues: conhecer o grau
de importância atribuído aos motivos considerados e
comparar se há diferenças entre os motivos apontados
por alunos da graduação e da especialização.
Material e métodos
Estudo descritivo exploratório de campo, realizado em um Centro Universitário particular situado
na cidade de São Paulo, que oferece cursos de Graduação e Pós Graduação em Enfermagem. Tais cursos
foram selecionados por conveniência, por se tratar da
instituição na qual as autoras estudam. O projeto da
pesquisa foi previamente avaliado pelo Sub Comitê
de Ética em Pesquisa do referido curso.
Participaram desta pesquisa alunos do primeiro
período do Curso de graduação em enfermagem
e alunos do Curso de Especialização em Enfermagem em Terapia Intensiva e Centro Cirúrgico,
que concordaram voluntariamente em participar
da mesma, assinando o Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido.
A população foi constituída de 172 alunos do
primeiro período e 42 enfermeiros dos cursos de
Especialização.
Distribuídos os questionários (Anexos I para a
graduação e II para especialização) seu preenchimento foi feito em conjunto, após leitura e explicação
de cada dado solicitado.
Os dados foram coletados na última quinzena
de maio de 2004 para os alunos da graduação e
primeira quinzena de junho de 2004 para os alunos
da especialização.
Os dados referentes ao perfil dos alunos e os
pesos atribuídos aos motivos que os levaram a optar
pelo Curso de Graduação em Enfermagem foram
tratados em números absolutos e percentuais, e
apresentados por meio de figuras.
Para verificar a associação entre os Grupos (1o
Semestre e Especialização) e Peso atribuído (0, 1,
2, 3) foram utilizados o teste de Qui-Quadrado de
Pearson e a extensão do teste exato de Fisher, quando
necessário [7]. Os indivíduos que não responderam
foram excluídos desta análise.
Resultados e discussão
Os dados obtidos neste estudo mostraram que
dos alunos do primeiro período, 84% pertenciam
ao sexo feminino e 16% ao masculino. Dos alunos
da especialização, 86% eram do sexo feminino e
14% do masculino.
A presença feminina na enfermagem ainda é
grande. O que temos observado é uma tendência ou
um aumento gradativo da presença masculina nessa
categoria profissional. Esse fato precisa ser considerado, principalmente, quando nos reportamos à
abertura do mercado de trabalho. Machado [5], por
exemplo, cita as longas jornadas de trabalhos nas
plataformas oceânicas de petróleo como uma das
situações atuais nas quais a presença do enfermeiro
do sexo masculino é indicada.
A faixa etária mais freqüente dos alunos ingressantes na graduação está entre 24 e 29 anos de idade
(39%), seguido pelas faixas etárias compreendidas
entre 17 e 23 anos (33%), 30 anos ou mais (23%).
Outros autores encontraram resultados diferentes quando pesquisaram alunos ingressantes na
graduação. Tavares, Rolin, Franco e Oliveira [8], em
pesquisa realizada junto à universidade pública, encontraram uma faixa etária predominante entre 16
e 21 anos e, Val, Sá, Santos [9], realizando estudos
semelhantes em uma universidade privada, encontraram uma média de idade de 31,7 anos.
Quanto aos alunos da especialização, os dados
demonstram uma faixa etária predominante (64%)
em idade acima de 30 anos e uma atuação profissional como enfermeiro há menos de dois anos (40%).
Ou seja, mesmo que esse aluno termine tardiamente
a graduação, parte logo em seguida para a Pós-graduação, evidenciando a disposição ou necessidade na
busca de atualização, aquisição ou aprofundamento
de conhecimentos ou mesmo de títulos.
Quanto à formação prévia no nível de ensino
médio profissionalizante, constatamos que 75%
dos alunos do primeiro período tinham formação
de auxiliar ou técnico de enfermagem. Resultados
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diferentes foram encontrados por Val, Sá, Santos
com um percentual de 54,7% [9].
De acordo com a Lei n 7.498, de 25 de junho
de 1986, o exercício da Enfermagem é privativo
do enfermeiro, parteiro, técnico e auxiliar de enfermagem. Estes dois últimos exercem atividades
auxiliares, de nível médio que somente poderão ser
exercidas sob supervisão, orientação e direção de
Enfermeiro [4].
Zanei [10] considera que, dos diversos motivos que levam os trabalhadores em enfermagem
a optar pela graduação, destacam-se os seguintes:
é um curso menos seletivo, permite a ascensão
profissional, melhora o conhecimento científico,
e consequentemente, possibilita mudar de status
dentro da profissão e da equipe.
Não podemos ter uma visão reducionista a
respeito do significado de uma escolha profissional,
pois isso enfraqueceria nossos ideais na busca pela
competência pessoal e profissional. Inclusive, vale
lembrar que no estudo feito por Medina e Takahashi
[11], um dos motivos que levaram os técnicos e auxiliares à opção pela graduação em enfermagem foi
“a enfermeira como modelo”. Compreendemos que
a discussão está longe de ser esgotada, mas cabem
aqui alguns questionamentos como: até que ponto a
instituição contribui ou dificulta a atuação do enfermeiro para que ele sirva de modelo positivo para sua
equipe de trabalho? Até que ponto a formação desse
enfermeiro pode influenciar essa mesma situação?
Quanto à pesquisa sobre os motivos que levaram a população deste estudo a optar pela graduação
em enfermagem, listamos os mesmos motivos encontrados por Rodrigues [6] e elaboramos a seguinte
pergunta “De 0 a 3, qual o peso que você daria para
a sua decisão de ser enfermeiro?”
Figura 1 - Respostas dos alunos do 1º semestre do
curso de graduação em enfermagem para a importância dos motivos que os levaram a fazer enfermagem,
São Paulo (SP), 2004.
Figura 2 - Respostas dos alunos do curso de especialização em enfermagem para a importância dos motivos
que os levaram a fazer enfermagem. São Paulo (SP),
2004.
O motivo quer ajudar o próximo foi fortemente
considerado pela população deste estudo (60 % na
graduação e 50% da especialização).
O ato ou ação de ajudar o próximo está intimamente ligado aos sentimentos religiosos, sejam
eles cristãos ou não. Acreditamos que o enfermeiro
pode trazer dentro de si essa finalidade como uma
missão pessoal e profissional. Contudo, isso não o
torna menos profissional que um engenheiro, médico ou arquiteto. Ajuda não deve ser confundida
com caridade ou ainda necessariamente nos levar a
uma postura de subserviência. Podemos nos utilizar
dessa característica histórico-cultural a nosso favor,
pois em uma sociedade individualista, a capacidade
de saber ajudar o outro através de uma assistência
com bases conceituais e estruturais fortalecerá ainda
mais nossa profissão. Cabe aqui uma afirmação de
Miranda [12] “ajudar é somar e não doar”.
A categoria dom/vocação representa um motivo
importante na opção da escolha pela graduação (58 %
na graduação e 48% da especialização).
Da mesma forma que a ajuda, dom/vocação
ou ainda, arte, também traz em si um toque sobrenatural. Historicamente isso vai acontecer em
um momento posterior à forte influência religiosa,
inspirado, principalmente pelos pensamentos de
Florence Nightingale [13,14].
O termo vocação muitas vezes pode ser utilizado de forma errada por pessoas que, não tendo
condições de fazer outra coisa, ou de fazer outras
escolhas profissionais, recorrem a formas simplistas
para explicar (para si mesmas?) algo tão complexo
como a opção profissional.
A descoberta vocacional também foi uma das
categorias encontradas por Medina e Takahashi [11]
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e expressada com outras palavras “ter sempre o desejo
de fazer esse curso” nos dados encontrados por Tavares,
Rolin, Franco e Oliveira [8] em seus estudos.
Florence Nightingale entendia sua própria
vocação como um chamamento de Deus. Outros a
compreendem como tendência, inclinação ou talento.
O perigo em se atribuir uma escolha (que é uma ação
realizada por um ser humano ativo) a algo sobrenatural, pode levar essa mesma pessoa se tornar passivo
diante de todas as outras ações e atitudes que vai
precisar tomar ao longo da vida pessoal e profissional.
Florence não incorreu nesse erro. Ela conseguiu ser
sujeito ativo no seu próprio percurso de vida.
O motivo status mostrou-se não considerado
na decisão em fazer enfermagem (30 % na graduação
e 32 % da especialização).
O que nos perguntamos é, como pode alguém
deliberadamente escolher cursar uma faculdade,
trabalhar para custear seus estudos, privar-se de sono
e lazer durante pelo menos quatro anos e estar consciente de que não a escolheu por status? Teria embutido aí aquele espírito religioso de abnegação?
Talvez a elaboração da questão não tenha sido
clara, uma vez que esse status pode ser compreendido pelo menos de duas formas diferentes, ou
seja, quando considerado externamente comparado a outras profissões de nível superior e, quando
comparado internamente, dentro da equipe de
enfermagem.
Para a primeira situação citada no parágrafo
anterior, temos o estudo de Souza e Silva [15] sobre o prestígio das profissões de nível universitário.
A carreira de maior prestígio é a do médico. A de
enfermagem vem em sétimo, sendo precedida pela
de psicólogo, fisioterapeuta e farmacêutico.
Na segunda situação, dentre os motivos encontrados por Zanei [10] tais como “curso menos seletivo,
permite ascensão profissional, melhora o conhecimento
científico”, encontramos a idéia de que a elevação de
grau dentro da mesma profissão, possibilita mudança de status dentro da equipe.
Status profissional é definido por Stamps apud
Lino [16] como a importância ou significância
percebidas acerca do trabalho, tanto pelo ponto de
vista individual como pelo ponto de vista de outros
membros de um grupo social. Na verdade existe um
conjunto de componentes que permitem avaliar
o nível de satisfação do profissional que incluem
também remuneração, autonomia e interação.
Para 60% dos alunos de graduação e 49% dos
alunos da especialização, o acesso mais fácil à univer-
sidade apresentou-se como um motivo não considerado ao optarem pela graduação em enfermagem.
Alguns estudos apontam a escolha da enfermagem
como segunda opção depois de não conseguirem
passar no vestibular para cursos como de medicina,
odontologia, dentre outros [9].
Teixeira [17] faz duras críticas ao afirmar que
“O mercantilismo é tão marcante e indecente nos
estabelecimentos pagos, que alguns docentes/dirigentes
expressam para os demais, como uma forma de orientação, que “não se pode perder qualquer aluno”- tem
que motivar, mentir, enaltecer a profissão porque aquele
aluno representa uma fonte de renda para a empresa.
Na realidade, os que vendem ilusões também se iludem,
buscam a todo custo e de qualquer forma armar um
amplo cenário incômodo e decorativo na fachada da
enfermagem”.
Souza, Cavalcanti, Monteiro e Silva [18] realizaram pesquisa com abordagem qualitativa em
três faculdades de enfermagem, sendo duas públicas
e uma particular e, em relação à escolha pela profissão, obteve as subcategorias: “Enfermagem como
última opção” e “Enfermagem como primeira opção”.
A questão a ser discutida é que, talvez, acesso fácil
compreenda o que é possível naquele determinado
momento. Dizer que foi pela facilidade de acesso,
desmerece todo o empenho e esforço que um aluno
fez ao imbuir-se de coragem, e, rompendo com
todas as dificuldades socioculturais e financeiras
que possui, reprogramar sua vida e decidir pelo
compromisso de cursar uma faculdade.
Quanto à categoria profissão reconhecida na
área de saúde, para 31% dos alunos da graduação
foi um motivo “fortemente considerado” e para
28% dos alunos da especialização, “moderadamente
considerados”. O reconhecimento da enfermagem,
como uma profissão importante e necessária na área
da saúde, é construído através de vários elementos
que vão desde sua inserção social até o marketing
pessoal. Reconhecimento é um elemento importante
do conjunto que compõe a valorização profissional,
sem a qual não haverá remuneração, status e nem
mesmo a possibilidade de exercer sua vocação ou
realizar a ajuda bio-psico-sócio-espiritual deliberada
na assistência de enfermagem.
A pergunta que se faz é a quem compete a
construção de uma imagem reconhecida ou valorizada da profissão?
Garantia de emprego foi motivo não considerado por 20,9% dos alunos de graduação e
por 21,4% dos alunos da especialização. Apenas
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20,3% dos alunos da graduação referiram garantia
de emprego como motivo fortemente considerado
na opção pelo curso. Nesse caso, somado os pesos
de pouco e moderadamente considerado, temos
55,7% dos alunos em uma posição de cautela em
relação a perspectiva de trabalho. Por outro lado, dos
alunos da especialização, apenas 2,3% consideram
fortemente o motivo garantia de emprego, o que
nos leva a inferir um certo pessimismo relacionado
ao mercado de trabalho atual.
Talvez a afirmação de Texeira, Lins e Lira
[17] de que o ingresso na carreira de enfermagem,
tradicionalmente mal remunerada, é, freqüentemente, uma solução de emergência para mulheres
não especializadas, que procuram trabalho a todo
o custo, premiadas por dificuldades econômicas,
possa estar sendo ultrapassada pelas possibilidades
de mercado que têm ocorrido nos últimos anos.
Segundo Linhares [19], um exame menos superficial da enfermagem como profissão vai revelar
que somos a maior força de trabalho no âmbito da
Saúde – em meio a um conjunto de 14 carreiras
– somos 59% de mão-de-obra empregada. Afirma
ainda que, em anúncio publicado há pouco em
revistas de grande circulação, o Ministério da Saúde
oferecia emprego para enfermeiros em municípios
distantes, com salários superiores à média praticada
no País.
Os demais motivos citados pela população
deste estudo foram assim relacionados: situação de
doença na família; dentro da área da saúde é o mais
acessível; queria medicina e não conseguiu; quer
abrir empresa própria; ampliar área de trabalho;
influência familiar e aperfeiçoamento profissional.
Destacamos aqui o motivo aperfeiçoamento
profissional (citado 29 vezes) que, como dito anteriormente, por se tratar de técnicos e auxiliares de
enfermagem, ao optarem por um curso superior
estarão ascendendo profissionalmente posto que
mudarão de categoria profissional.
Em relação à associação entre grupo de alunos (graduação e especialização), e Peso atribuído
(0,1,2,3), a utilização do teste de Qui-Quadrado
de Pearson e a extensão do teste exato de Fisher,
quando necessário, nos permitiu constatar que nas
categorias : ajuda, dom/vocação; status; mais fácil na
universidade; reconhecimento profissional, não existe
associação estatisticamente significante.
Na categoria garantia de emprego, podemos
dizer que parece existir uma tendência do grupo
do primeiro semestre apresentar maior freqüência
(21%) de peso 3 (“fortemente considerado”), em
relação ao grupo da especialização, no qual apenas
2,6% optaram por esse mesmo peso.
Conclusão
De acordo com os objetivos traçados para este
estudo, constatou-se que a enfermagem continua
sendo uma profissão predominantemente feminina
(84%), com alunos que, em sua grande maioria, já
possuem formação de auxiliar ou técnico em enfermagem (75%), e ingressam na graduação entre os
24 a 29 anos de idade.
Em relação aos motivos que os levaram a fazer
enfermagem, assim como foi citado por Rodrigues
[6], ainda hoje a escolhem enfermagem porque querem ajudar o próximo (60% na graduação e 50%
na especialização), ou por dom/vocação (58% e 48%
respectivamente). De certa forma desconsideram
os motivos status, acesso mais fácil à universidade,
garantia de emprego e reconhecimento da profissão,
atribuindo-lhes pesos mais baixos.
Quando comparamos os graus atribuídos aos
motivos pelos alunos do primeiro semestre com o
da especialização, o único que se mostrou diferente
foi garantia de emprego.
A compreensão da motivação que levou o
aluno a optar pela enfermagem é ainda um processo
complexo a ser desvendado, principalmente quando
relacionada ao desenvolvimento de atitudes para o
enfrentamento das condições inadequadas de trabalho, como Rodrigues [6] tentou associar.
Ensinar ao aluno que a assistência de enfermagem é fim e não meio e, a produtividade, entendida
na sociedade capitalista como um fim, na lógica
do profissional que escolheu enfermagem como
profissão que ajuda, na qual sente-se vocacionado,
é apenas um dentre todos os aspectos que terá que
observar e respeitar no seu exercício profissional.
Enfim, seja de que forma ou com que palavras
esses motivos sejam revelados ou descritos, eles expressam vontade, desejos, sonhos que são matéria
prima na formação do aluno e na manutenção dos
ideais profissionais, e não podem ser considerados
separadamente.
Referências
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no Brasil. São Paulo: Cortez; 1983. 118p.
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de Janeiro: Revinter; 2002.
3. Lima MJ. O que é enfermagem. 2a ed. São Paulo:
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4. Brasil. Decreto n.94.406, de 8 de junho de 1987.
Regulamenta a Lei n.7.498, de 25 de junho de 1986.
Dispõe sobre o exercício da Enfermagem, e dá outras
providências. [Publicado no Diário Oficial da União;
1998; Jun 9].
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vocação e sua relação com as atitudes dos enfermeiros
frente às condições de trabalho. Rev Latinoam Enfermagem 2001;9(4):77-81.
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14. Almeida MCP, Rocha JSY. O saber da enfermagem e sua
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16. Lino ML. Qualidade de vida e satisfação profissional
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17. Teixeira EMR, Lins, LCS, Lira IV. Apreciação crítica
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18. Souza Júnior JGC, Cavalcanti ATA, Monteiro EML,
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19. Linhares G. Enfermagem: Termômetro da economia
na saúde. Jornal da Cidade, 10 de Agosto de 2001.
Anexo 1 – Alunos da graduação
Sexo fem____masc___.
Idade _____anos.
Exerce a função de técnico ou auxiliar de enfermagem. Sim ( ) Não ( )
De 0 a 3 qual o peso que você daria para sua decisão em ser enfermeiro?
Coloque um X na coluna correspondente ou acrescente motivos outros que o levaram a fazer enfermagem.
Motivos
0
1
2
3
Quer ajudar o próximo
Dom/vocação
Status
Acesso mais fácil a Universidade que outros cursos
Garantia de emprego
Profissão reconhecida na área da saúde
Outros (cite)
Anexo 2 - Alunos da Especialização
Sexo fem____masc___.
Idade _____anos.
Há quanto tempo exerce a função de enfermeiro? ___________________
De 0 a 3 qual o peso que você daria para sua decisão em ser enfermeiro?
Coloque um X na coluna correspondente ou acrescente motivos outros que o levaram a fazer enfermagem
Motivos
0
1
2
3
Quer ajudar o próximo
Dom/vocação
Status
Acesso mais fácil a Universidade que outros cursos
Garantia de emprego
Profissão reconhecida na área da saúde
Outros (cite)
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Artigo original
Avaliação do aprendizado na prática (Um
estudo sobre os conhecimentos adquiridos
pelos pacientes diabéticos em reuniões
multiprofissionais)
Amanda Virginia Coneglian*, Thaís Basso de Brito*, Sandra Regina Leite Rosa Olbrich**,
Maria José Trevisani Nitche**, Walkyria de Paula Pimenta**
*Graduação em Enfermagem da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP, **Professoras do Departamento de Enfermagem
e do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP
Resumo
O presente estudo objetivou avaliar o aprendizado e a prática dos conhecimentos ministrados pela equipe multiprofissional
aos pacientes diabéticos que freqüentavam as reuniões em grupo do Ambulatório de Diabetes da Faculdade de Medicina de
Botucatu – UNESP. Trata-se de estudo descritivo-exploratório. Foram avaliados 25 pacientes com média de idade de 51 anos,
a maioria (60%) com ensino fundamental, sendo diabéticos em media há 11,4 anos. Quando indagados sobre o conhecimento
que tinham acerca da doença, a maioria (64%) tinha conhecimento superficial e de forma simples sobre a doença; alguns
revelaram preocupação quanto às complicações decorrentes da doença; todos disseram que o autocuidado e a dieta são essenciais
ao tratamento, porém 44% referiram utilizar-se de chás e outros tipos de fitoterápicos para o tratamento; todos sabiam dos
cuidados que deveriam ser tomados com os pés, talvez por este fato estar diretamente ligado à amputação, medo presente na
maioria deles. Assim como em outros estudos, demonstrou-se a importância das atividades educativas, buscando aumentar
e utilizar o conhecimento sobre a doença, seu tratamento, bem como suas intercorrências.
Palavras-chave: diabetes mellitus, educação em saúde, equipe multidisciplinar, tratamento.
Abstract
Evaluation of learning in practice (Study about knowledge learned by diabetic
patients during multiprofessional meetings)
The present study aimed to evaluate learning and application of knowledge taught by a multiprofessional team to diabetic
patients that frequented group meetings at the Diabetes Ambulatory Unit of the Botucatu School of Medicine – UNESP.
This descriptive-exploratory study evaluated 25 patients with a mean age of 51 years, the majority (60%) with fundamental
education, having been diabetics for an average of 11.4 years. When examined on knowledge they had about the disease, the
majority (64%) had superficial knowledge of a simple form on the disease; some revealed a preoccupation as to complications
Artigo recebido em 29 de setembro de 2005; aceito em 29 de junho de 2006.
Endereço para correspondência: Amanda Virginia Coneglian, Rua Pedro Ângela, 777, Vila
Pinheiro, 18600-000 Botucatu SP, Tel: (14)3814-0108, E-mail: [email protected]
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arising from the disease; all said that self-care and diet are essential to treatment, although 44% referenced utilizing teas and
other types of phytotherapies for treatment; all knew of precautions that should be taken with the feet, perhaps due to this
fact being directly linked to amputation, a fear present in most of them. As in other studies, the importance of educational
activities was demonstrated, seeking to increase and utilize knowledge on the disease, its treatment, as well as its potential
complications.
Key-words: diabetes Mellitus, health education, multidisciplinary team, treatment.
Resumen
Evaluación del aprendizaje en la práctica (Estudio sobre los conocimientos
aprendidos por los pacientes diabéticos en reuniones multiprofesionales
El presente estudio tuvo como objetivo evaluar el aprendizaje y la aplicación práctica de los conocimientos ministrados por el
equipo multiprofesional a los pacientes diabéticos que frecuentaban las reuniones en grupo del Ambulatorio de Diabetes de la
Facultad de Medicina de Botucatu – UNESP. Se trata de un estudio descriptivo-exploratorio. Fueron evaluados 25 pacientes
con un promedio de edad de 51 años, la mayoría (60%) con enseñanza fundamental, diabéticos en promedio hace 11,4
años. Cuando indagados sobre el conocimiento que tenían acerca de la enfermedad, la mayoría (64%) tenía conocimiento
superficial y de forma simple sobre la enfermedad; algunos revelaron preocupación en cuanto a las complicaciones causadas
por la enfermedad, pero el 44% dijo hacer uso de tés y otros tipos de fitoterápicos para el tratamiento; todos sabían de los
cuidados que deberían ser tomados con los pies, tal vez porque ello está directamente ligado a la amputación, miedo presente
en la mayoría de ellos. Así como en otros estudios, se demostró la importancia de las actividades educativas y se procuró
aumentar y utilizar el conocimiento sobre la enfermedad, su tratamiento, así como sus intercurrencias.
Palabras-clave: diabetes mellitus, educación en salud, equipo multidisciplinar, tratamiento.
Introdução
Nas últimas décadas tem se observado, em todos os países, um aumento progressivo das doenças
crônico-degenerativas, sendo uma das principais o
Diabetes Mellitus [1,2]. Segundo dados da Secretaria
do Estado da Saúde de São Paulo, no Brasil a prevalência desta doença é de 7,6% na população urbana
com idade entre 30-69 anos, o que corresponde à
metade dos portadores na América Latina, sendo que
cerca da metade desconhece o diagnóstico [3].
O controle desta doença baseia-se na tríade:
dieta, hipoglicemiantes orais e, ou insulina e exercícios físicos. A educação sobre a doença possibilita ao
doente um estilo de vida mais flexível, na medida em
que pode integrar e interagir com os fatores dieta,
medicação e exercício, permitindo-lhe a alteração
ou ajustamento de um deles em decorrência da
modificação dos demais [4]. Porém, tão importante,
se não mais, quanto esses três itens é a participação
ativa do doente no tratamento. Na verdade, ele é o
principal agente do processo.
Para que todo este processo funcione, é necessário que o diabético conheça a doença, tenha sido
orientado por um profissional especializado e tenha
consciência da própria condição.
Os profissionais que atuam com diabéticos
têm observado a existência de um grande desconhecimento por parte desta clientela, com relação
às noções básicas da doença e dos fatores predisponentes ao seu aparecimento, bem como as medidas
de autocuidado, com a finalidade de se obter um
controle adequado e evitar as complicações agudas
e crônicas [5]. Corroborando esta afirmação o
Diabetes Control and Complications Trial Research
Group demonstrou que o diabético bem informado,
monitorando adequadamente a glicemia, reduziu
em 50 a 70% os riscos de complicações da doença
[6]. Além disto, exerce forte impacto nos custos
hospitalares, reduzindo pela metade o número de
hospitalizações por diabetes mellitus.
Considerando os diversos aspectos inerentes à
complexidade dessa síndrome, tais como restrições
dietéticas, tratamento com medicamentos, alteração
da função de diversos órgãos e segmentos do organismo, impacto pessoal, familiar e social da doença, os
gestores e profissionais de saúde têm sentido cada vez
mais a necessidade de desenvolver ações educativas
voltadas para os portadores da síndrome, contando
com a participação de equipes multiprofissionais.
Sabe-se que a educação em diabetes produz
modificações importantes no curso da morbi-mor141
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talidade da doença [7]. A educação deve ser parte integrante do tratamento, sendo indispensável para o
alcance de um bom padrão de autocuidado, do qual
depende um bom controle do diabetes [8-10].
O objetivo da educação em diabetes para melhorar o conhecimento do paciente é desenvolver
atitudes e habilidades para facilitar a autonomia,
promover a adesão, tornando-o capaz de entender
como as próprias ações influenciam seu padrão de
saúde [11,12]. Ações educativas devem ocorrer de
forma permanente, sistemática, planejada e atualizada [13,14].
A abordagem educativa deverá acontecer de
forma integrada entre os profissionais de saúde, sendo que a importância do atendimento por esta equipe multiprofissional é justificada pelas capacitações e
qualificações destes profissionais para o atendimento
global ao portador de diabetes e, principalmente, a
sua família [15]. O enfermeiro, como membro desta
equipe, deve atuar na orientação das habilidades e
recursos disponíveis para os portadores de diabetes, capacitando-os para o autocuidado, além de
contribuir efetivamente para obtenção de um bom
controle metabólico e, conseqüentemente, a redução
das complicações agudas e crônicas [16].
Cabe ressaltar que é fundamental incluir o
doente, bem como seus familiares e acompanhantes, nas orientações e nas demonstrações de todos
os cuidados necessários ao bom convívio com a
doença, lembrando-os, sempre, da necessidade do
autocuidado como forma de independência [17],
enfatizando que a atuação do paciente é altamente
decisiva para o sucesso do tratamento.
Partindo de tais reflexões, o presente estudo
objetivou avaliar o aprendizado e a aplicação dos
conhecimentos ministrados pela equipe multiprofissional aos pacientes diabéticos que freqüentavam as
reuniões em grupo do Ambulatório de Diabetes da
Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP.
Material e método
Estudo descritivo-exploratório, realizado com
25 pacientes que freqüentavam o ambulatório de
diabetes do Hospital das Clínicas da Faculdade de
Medicina de Botucatu durante o segundo semestre
de 2004. O ambulatório semanal é composto por
médicos residentes, enfermeiras, nutricionistas,
psicólogas, assistente social e alunos de graduação
em enfermagem, nutrição e medicina, para uma
população de 350 doentes adultos. Além das con-
sultas médicas, são realizadas reuniões semanais
em grupo onde são discutidos temas referentes à
doença, tratamento, complicações, autocuidado,
questões nutricionais, psicológicas, sociais e a troca
de experiências entre os pacientes.
Os critérios de inclusão foram: ser adulto, diabético há pelo menos um ano, estar participando das
reuniões multiprofissionais há pelo menos seis meses
e concordar em participar da pesquisa. A coleta de
dados foi realizada por meio de entrevista semiestruturada composta de duas partes: na primeira
foram levantados os aspectos epidemiológicos; na
segunda parte a retenção e aplicação dos conhecimentos sobre a doença e o auto cuidado.
Todos os pacientes foram informados por
escrito, através do termo de consentimento livre
e esclarecido. O estudo foi aprovado pelo Comitê
de Ética em pesquisa da Faculdade de Medicina de
Botucatu - UNESP.
Resultados e discussão
Foram avaliados 25 pacientes com média de
idade de 51 anos, sendo a maioria (64%) mulheres. Em relação à escolaridade, 4 (16%) eram semi
analfabetos, 15 (60%) com ensino fundamental
completo, 4 (16%) com ensino médio completo e
2 (8%) analfabetos. Percebe-se que com esse nível
de escolaridade as condições para assimilação dos
ensinamentos ficam muito prejudicadas, mesmo se
utilizarmos métodos e linguajar bastante simples.
A média de tempo que estes pacientes sabiam
ser diabéticos foi de 11,4 anos com um máximo
de 24 anos.
Quadro demonstrativo - Período de tempo sobre o
conhecimento do diagnóstico de diabetes.
Tempo( anos )
Número
Percentual
1a5
6
24
6 a 10
8
32
11 a 15
4
16
16 a 20
4
16
> 20
3
12
Fonte: Instrumento de coleta de dados.
Quando indagados sobre o conhecimento que
tinham acerca da doença, a maioria (64%) tinha
conhecimento superficial e de forma simples sobre o
que era o diabetes, utilizando termos como: “Falta de
produção de insulina pelo pâncreas”; “Excesso de açúcar
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no sangue, pode ser hereditário”,“Diz que é açúcar no
sangue, não pode comer nada de fritura, nem pão”,
“O pâncreas deixa de funcionar por falta de insulina”,
entretanto 9 (36%) tinham muitas dúvidas em relação à doença : “É coisa ruim”,“É uma coisa muito
complicada, tem que fazer regime”“Dá muita sede e
canseira”, ou se realmente o diabetes é uma doença:
“É grave, mas não é uma doença”.
Vários autores, dentre eles Vasconcelos [18],
entendem que possuindo apenas conhecimentos
adquiridos no senso popular, não é fácil ao diabético encontrar mecanismos de adaptação, nem a
conscientização da necessidade de novos hábitos
de vida.
Apesar de semanalmente os profissionais de
saúde informarem ao grupo em análise sobre as
complicações decorrentes do diabetes, três (12%)
dos participantes do estudo relataram não saber
sobre elas.
Segundo Teixeira, “a forma pela qual os sujeitos
entendem a realidade vai determinar a sua maneira
de se conduzir na vida” [19]. Assim, o paciente
sabendo de sua doença, seu real significado, seus
riscos e controle, pode mudar suas atitudes e estilo
de vida.
Quando questionados sobre os fatores importantes no seu tratamento, dois (8%) responderam
que somente a medicação era suficiente; 24 (96%)
afirmaram que a atividade física era importante,
porém, poucos a praticavam; todos disseram que a
dieta e o autocuidado são essenciais ao tratamento.
Contudo, mesmo entre aqueles que se consideram
informados, 44% faziam uso de chá caseiro, 16%
utilizavam outros tratamentos como guaraná diet
com berinjela, iacon – um tipo de batata, guaco,
acreditando que estes recursos são controladores
do diabetes.
O seguimento incorreto da dieta, o uso de
medidas alternativas e o fato da não realização de
atividade física, mesmo tendo conhecimento da sua
importância, são fatores que contribuem significativamente para o descontrole metabólico. As atividades físicas, como caminhada, foi apontada pelos
participantes do estudo, como sendo irrelevante,
resultado semelhante ao encontrado por Guimarães
et al. em uma comunidade diabética de Ribeirão
Preto no ano de 2001 [20].
Outro fato importante observado no estudo
de Smeltzer e Bare foi que poucos têm consciência
quanto à necessidade de alterações pessoais no
estilo de vida e que o tratamento para o diabetes
vai muito além do uso de hipoglicemiantes orais
e/ou insulina, que este engloba um conjunto de
atitudes que envolvem atividade física regular, dieta
alimentar adequada, perda de peso e monitorização
da glicemia com redução riscos [4].
Em relação a hipoglicemia, 21 (84%) por já
terem apresentados pelo menos um episódio, sabiam
corretamente quais eram os sinais e sintomas mais
freqüentes, assim, os mais lembrados foram: sudorese (23,2%), tremores (19,6%), tontura (14,4%),
fraqueza (10,7%), calor intenso, visão turva (7,2%)
e desorientação (5,4%). Sabe-se que tanto nos
casos dos pacientes com diabetes do tipo 1 quanto
aqueles do tipo 2, a freqüência de hipoglicemia é
inversamente proporcional ao controle glicêmico;
desta forma, quanto mais rigoroso ou intensivo
for o tratamento do diabetes, maior será o risco de
hipoglicemia, o que constitui em um obstáculo para
se atingir os objetivos do controle glicêmico [21].
Quando questionados sobre as atitudes que devem ser tomadas nos casos de hipoglicemia, 23,8%
referiram chupar bala, 23,8% tomar leite com
açúcar, 14,3% procurar ajuda de um profissional
de saúde, enquanto 9,5% tomar água com açúcar
ou refrigerante, demonstrando que nos casos onde
os sinais e sintomas estão presentes com intensidade
exagerada, eles têm conhecimento da atitude que
devem tomar. Corroborando esta afirmação, Oliveira et al. afirmam que nos indivíduos com nível
de consciência preservado deve-se utilizar tabletes
de glicose via oral e carboidratos de absorção rápida,
tais como : balas, sucos de frutas, refrigerante, mel,
açucares, etc. [22]
Dos 17 (68%) usuários de insulina, 12 (70,
6%) realizavam a auto-aplicação, sendo que os demais necessitavam do auxílio de outras pessoas como
filhos, cônjuges, farmacêuticos ou procuravam o
posto de saúde. Em relação ao preparo, 14 (82,3%)
referiram desinfetar com álcool o frasco de insulina,
16 (94,1%) conferem a dose, 13 (76,4%) fazem a
prega no local de aplicação, 8 (47%) aspiram antes
de injetar a insulina e 8 (47%) massageiam o local
após a aplicação. Sabe-se que o conhecimento que
o paciente dispõe acerca da sua medicação é de vital
importância e as suas limitações, provavelmente,
estejam relacionadas à falta de informação e treinamento adequado para auto-aplicação e alguns
deles às próprias limitações como idade, dificuldade
visual, medo, insegurança, entre outros fatores.
Quanto à reutilização de seringas e agulhas,
14 (82,3%) reutilizavam por no mínimo 2 e no
de
m
er
fu
m
ce
co
fic
m
sa
um
Q
o
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máximo 14 vezes. Destes, 10 (71,4%) usavam
técnicas inadequadas de desinfecção como limpeza
com algodão com álcool. Souza e Zanetti relataram
que, provavelmente, a dificuldade esteja também
associada às eventuais complicações locais e injúrias
que essa prática pode ocasionar ao paciente, devido à
freqüente reutilização das seringas e agulhas [23].
Em relação ao local de aplicação, 14 (82,3%)
referiram aplicar no abdome, 11 (64,7%) no braço, 7 (41,1%) na perna e 2 (11,7%) nas nádegas;
porém, em relação ao rodízio nas aplicações, cinco
(29,4%) referiram não fazê-lo, enquanto a maioria
(82,3%) o faz. Sabe-se que para que a aplicação da
insulina atinja a atividade terapêutica esperada, é
necessário que seja aplicada em locais apropriados
e com técnica adequada [24-26].
Reconhecemos que para a aplicação de insulina são imprescindíveis métodos como escolha
do instrumental adequado, domínio da técnica e
rodízio dos sítios de aplicação na pele, entre outros. No entanto, é comum o portador de diabetes
apresentar complicações e reações cutâneas, como
lipodistrofia insulínica, lipo-hipertrofia, nódulos
endurecidos, equimose, ardência, prurido também
alergia à insulina, a qual pode incidir no local da
aplicação ou se caracterizar por uma reação sistêmica
[27,28]. Os sinais e sintomas de alergia localizada
podem surgir de uma reação imediata com urticária,
enduração e prurido; de uma reação intermediária,
com lesões pruriginosas, endurecidas e dolorosas ou
de uma reação tardia, apresentando lesões pruriginosas, endurecidas, eritematosas, com queimação
local [29].
Quando questionados sobre o transporte da
insulina, 9 (52,9%) referiram que esta deve ser transportada em isopor com gelo, 2 (11,7%) em isopor
sem gelo, 2 (11,7%) em outros locais (mochila,
bolso) e 2 (11,7%) não aplicam a insulina quando
saem de casa. Percebe-se que ocorre muita divergência nestes aspectos, porém, o que mais chama
a atenção é o fato de que dois deles não utilizaram
a medicação no dia da consulta. Grossi recomenda
que durante viagens, a insulina não deve ser transportada em recipientes contendo gelo, uma vez que
ela pode ser mantida em temperatura ambiente,
desde que protegida de temperaturas extremas e da
luz e retornar à geladeira [26].
Ao serem questionados sobre como deveriam
ser os cuidados com os pés, todos demonstraram
conhecimento: “Lavar e enxugar bem entre os dedos,
cuidado ao cortar as unhas para não ferir”, destacan-
do as amputações, úlceras, micoses, dificuldade de
cicatrização e o uso de calçado adequado.
O pé diabético é uma das complicações mais
comuns nos pacientes diabéticos uma vez que causa
uma queda significativa da qualidade de vida dos
pacientes vulneráveis, além de seu elevado custo
econômico. Vários autores têm demonstrado que
as lesões dos pés destes pacientes são as complicações que melhor podem ser prevenidas por atitudes
afirmativas e eficientes [30-32]. O descontrole
metabólico e a longa evolução da doença levam
os pacientes a apresentarem neuropatia periférica,
com diminuição da sensibilidade dos pés, formação
de calos e, posteriormente, úlceras. Lesões macro e
microvasculares são fatores que contribuem para as
complicações das úlceras [33]. Além disso, infecções
também são fatores determinantes para piora das
lesões, podendo evoluir para amputação, caso não
seja instituído o tratamento precoce e adequado.
Estudo do American Diabetes Association Consensus
Group (2001) mostrou que o risco de úlcera dos pés
é maior para pacientes do sexo masculino, pacientes
com mais de 10 anos de diabetes e aqueles com
complicações microvasculares [34].
Desta forma, a equipe de saúde deve mostrar
aos pacientes a importância de inspecionar os pés
diariamente buscando alterações na cor da pele,
cortes e escoriações; não fumar; evitar a imersão dos
pés; cortar as unhas retas; usar creme hidratante após
o banho; evitar andar descalço; remover calos apenas
com lixa ou pedra-pomes e procurar atendimento
profissional, após a ocorrência de qualquer ferimento, assim como revisar o esquema de imunização
antitetânica [35].
Entendemos que esta atividade obterá sucesso
se os profissionais de saúde estabelecerem vínculo
com os pacientes, sem muitas cobranças, mas reforçando sempre a importância da prevenção, reforçando investimentos nas atividades de ensino para com
os pacientes, bem como seus familiares.
Conclusão
Assim como em outros estudos, demonstrouse a importância da implantação de um grupo de
apoio aos pacientes portadores de diabetes, buscando aumento e assimilação do conhecimento desses
pacientes sobre sua doença. Observou-se ainda que
o conhecimento teórico é limitado, muitas vezes
baseado na sabedoria popular e em experiências
transmitidas por outras pessoas. Mesmo entre aque-
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les que se consideravam mais informados pôde-se
perceber que o conhecimento adquirido não era
colocado em prática e faltava a conscientização
quanto à necessidade de mudanças pessoais no
estilo de vida.
Sabemos que conseguir a adesão do paciente
a tratamentos que exigem mudanças de comportamento nem sempre é uma tarefa fácil para a equipe
de saúde. Entretanto, torna-se necessário avaliar e
rever os métodos e a abordagem utilizados na educação do cliente diabético a fim de detectar uma
possível falha no processo educativo.
Defendemos estratégias de educação na qual
é necessário estimular formas de participação nas
quais as pessoas se envolvam na tomada de decisões
e assim, obtenham maior aderência aos diferentes
programas de saúde.
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Consenso Internacional sobre Pé Diabético. Brasília:
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2001.
Anexo I
Questionário
Nome: _____________________________________________________________
RG:_________________________ Data da entrevista:______/________/________
Data de nascimento:_______/________/________
Sexo: ( ) masculino ( ) feminino Peso atual: _________ Kg
Procedência:_____________________________ Altura: ____________ m
Estado civil:_____________________________ Tabagista? ( ) sim ( ) não
Número de habitantes da casa:__________ Etilista? ( ) sim ( ) não
Ocupação: __________________________ Atividade física?
Nível de instrução: ___________________ ( ) sim ( ) não
Renda familiar: ______________________
Faz atividade física? ( ) sim ( ) não
1) Há quanto tempo é diabético? ______________
2) Há quanto tempo é tratado na UNESP de Botucatu? ________________
3) Vai ao posto de saúde para atendimento médico? ( ) sim ( ) não
Porque? _________________________________________________________________________________________________
4) Há quanto tempo freqüenta as reuniões? ________________
5) Apresenta alguma complicação do diabetes ? ( ) sim ( ) não
Qual? ___________________________________________________________________________________________________
Desde quando? __________________________________________________________________________________________
6) Apresenta alguma doença associada? ( ) sim ( ) não
Qual? ___________________________________________________________________________________________________
Desde quando? __________________________________________________________________________________________
7) Em relação ao tratamento, faz uso de:
( ) hipoglicemiante oral (comprimido)
Qual(s)? ____________________ Quantos/dia?_______________________
( ) insulina
( ) controle alimentar
( ) atividade física
( ) caminhada ( ) natação ( ) hidroginástica ( ) musculação ( ) outra__________________
8) Freqüência da realização dos testes de HGT: ______________________________
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9) Valor da glicemia nos últimos dois anos:
Data Valor Peso
Data
Valor
Peso
10) Se usa insulina:
- Qual é o tipo e horário? NPH ( ) Horário: _______________
Regular ( ) Horário: _______________
Outra ( ) Qual?______________ Horário: _________
- Onde adquire? ________________________________
- Quem aplica? _________________________________
- Como prepara? _________________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________________________________
- Como transporta? _______________________________________________________________________________________
- Onde guarda? ________________________________________________________
- Como aplica? ( ) limpa com álcool ( ) faz prega ( ) aspira ( ) massageia o local
- Onde aplica? ( ) barriga ( ) braço ( ) perna ( ) outra ________________
- Reutiliza a seringa e a agulha? ( ) sim ( ) não
Quantas vezes? ___________________________
- Como desinfeta? ________________________________________________________________________________________
11)Como deve ser o cuidado com os pés?
_________________________________________________________________________________________________________
_________________________________________________________________________________________________________
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Artigo original
Triagem neonatal: as percepções de mães na
consulta de enfermagem
Marialda Moreira Christoffel*, Daniela Monteiro de Oliveira**,Caroline Alessandra Terra**
*Professora Adjunta do Departamento Materno-Infantil. Faculdade de Enfermagem da UERJ, Coordenadora Projeto de
Extensão: Consulta de Enfermagem no Atendimento Ambulatorial ao Recém-Nascido: uma alternativa para a Assistência,
**Enfermeiras, Ex-bolsistas do Projeto de Extensão: Consulta de Enfermagem no Atendimento Ambulatorial ao Recém-Nascido:
uma alternativa para a Assistência. Faculdade de Enfermagem da UERJ
Resumo
O presente estudo tem como objetivos: identificar e descrever as percepções de mães sobre a Triagem Neonatal na consulta
de enfermagem a fim de propor estratégias educativas sobre a importância do Teste do Pezinho. Trata-se de um estudo de
abordagem quantitativa, realizado com 60 mães em um Centro Municipal de Saúde no município do Rio de Janeiro. Os dados
foram coletados no período de maio a janeiro de 2004, respeitando todos os aspectos éticos da pesquisa, sendo utilizado como
instrumento, um questionário com questões fechadas. Os resultados evidenciaram que ainda existe um grande quantitativo de
mães que desconhecem, não só, a triagem neonatal, como também, o período para a realização do referido teste e a importância
deste resultado ser anotado na caderneta da criança. Conclui-se, em virtude dos achados, que há uma grande necessidade da
implantação, pelos enfermeiros, desde o pré-natal, de práticas educativas relacionadas à triagem neonatal.
Palavras-chave: consulta de enfermagem, triagem neonatal, educação para saúde, cuidado.
Abstract
Newborn screening: the mother’s perception in nursing consultation
The present study has these objectives: identify and describes the mother’s perceptions of newborn screening in nursing
consultation to propose little foot educative strategies. This is a quantitative approach study, carried out with 60 mothers of
municipal health center in Rio de Janeiro. The data collection was in the year 2004 between May and January, respecting all
the ethics aspects of the research. For the data collection was used a questionnaire with closed questions. The results showed
that a great number of mothers are not aware of the newborn screening test, as well as period to undergo screening and the
importance of writing down the result in child little notebook. This study highlights the necessity of educative practices
implementation by nurses for the newborn screening since the first consultation.
Key-words: nursing consulting, newborn screening, education for health, care.
Artigo recebido em 20 de junho de 2006; aceito em 26 de junho de 2006.
Endereço para correspondência: Marialda Moreira Christoffel, Rua Presidente Domiciano,
171/401, Ingá, 24210-270 Niterói RJ, E-mail: [email protected]
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Resumen
Prueba del talón: las percepciones de madres en la consulta de enfermería
La presente investigación tiene como objetivos: identificar y describir las percepciones de madres sobre la prueba del talón
en la consulta de enfermería a fin de proponer estrategias educativas sobre importancia del control neonatal. Se trata de un
estudio de abordaje cuantitativo realizado con 60 madres en un centro municipal de salud en el municipio de Rio de Janeiro.
Los datos fueron colectados en el periodo de Mayo a Enero de 2004 respetando todos los aspectos éticos de la investigación.
Para la colecta de datos fue utilizado un cuestionario con cuestiones cerradas. Los resultados evidenciaron que hay todavía
un gran número de madres que desconocen la prueba del talón, así como el periodo para la realización del test y su resultado
apuntado en la libreta del niño. Este estudio resalta la necesidad de la implementación de prácticas educativas por los enfermeros
sobre los errores congénitos del metabolismo desde el prenatal.
Palabras-clave: consulta de enfermería, prueba del talón, educación para la salud, cuidado.
Introdução
A estimativa da Organização Mundial de Saúde
[1], é que cerca de 10% da população, em tempo de
paz, é portadora de algum tipo de deficiência, das
quais 5% portadora de deficiência mental; 2% de
deficiência física; 1.5% deficiência auditiva; 0.5%
deficiência visual e 1% de deficiência múltipla.
Com base nestes percentuais, estima-se que no
Brasil existam 16 milhões de pessoas portadoras de
deficiências, constituindo-se um grave problema de
saúde pública.
Dentre as causas da deficiência mental estão
às doenças genéticas e congênitas, mais frequentemente encontradas, tais como; a fenilcetonúria e o
hipotireoidismo congênito. Essas doenças podem
ser detectadas facilmente através de um teste de
triagem populacional.
A Triagem Neonatal (TN) é um dos vários
programas de triagem populacional existentes, sendo
empregada para o diagnóstico precoce de doenças
genéticas e de doenças infecciosas, no período neonatal. O teste é simples, realizado através da coleta
de sangue do calcanhar do recém-nascido [2,3].
Para garantir o resultado confiável, o ideal é que
este teste, conhecido como Teste do Pezinho, seja
realizado preferencialmente na primeira semana de
vida do bebê, depois de 48 horas após o nascimento, ou seja, entre o 3º. e o 7º. dia de vida. Crianças
com menos de 48 horas de vida ainda não ingeriram
proteína suficiente para serem detectadas de forma
segura na triagem de Fenilcetonúria [2].
Desde a década de 60, a Organização Mundial
de Saúde (OMS) [1,2] preconiza a importância da
realização dos Programas Populacionais de Triagem
Neonatal, para a prevenção aos agravos à saúde do
recém-nascido, recomendando sua implementação,
especialmente em países em desenvolvimento, além
de criar critérios para a sua realização.
A maioria das crianças que apresentam as doenças detectadas pela triagem neonatal nasce, aparentemente, normal sem apresentar sinais clínicos de
deficiência no exame clínico na maternidade [1,2].
A introdução dos programas de triagem
ocorreu de forma desorganizada, sem estrutura de
controle da qualidade, e precedeu à discussão ética
em torno do assunto. No Brasil, uma das primeiras
tentativas de implementação da Triagem Neonatal
iniciou em 1976, a partir de iniciativas isoladas de
triagem, sem uma política governamental normativa, apesar de 17 estados brasileiros realizaram a
Triagem Neonatal em pelo menos 30% dos nascidos
vivos [2-4].
A primeira doença a ser tratada foi a fenilcetonúria, a partir de um trabalho da Associação de Pais
e Amigos Excepcionais/APAE de São Paulo [4]. O
Estado de São Paulo foi um dos primeiros na formulação da Lei nº 3.914/1983, seguido do Paraná
(Lei Estadual de nº.67/1897), que garantia o diagnóstico precoce de fenilcetonúria e hipotireoidismo
congênito, mas sem caráter obrigatório [5].
Um dos grandes marcos da contribuição da
enfermagem na implementação do Programa de
Triagem Neonatal foi à dissertação da enfermeira
Thereza Neuma de Tostes Freitas [5]. Ela realizou
uma pesquisa com 259 profissionais de hospitais e
maternidades dos Municípios de São Paulo e Rio
de Janeiro, entre eles diretores, administradores,
médicos, enfermeiros e auxiliares de enfermagem,
com o objetivo de medir seus conhecimentos sobre,
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como na época era chamado, o Programa de Seleção
Populacional de Recém-Nascido com Fenilcetonúria
e/ou hipotireoidismo congênito. Os resultados deste
estudo [5] mostravam que 62% dos profissionais
do Município de São Paulo e 53,8% do Município
do Rio de Janeiro nunca tinham ouvido falar do
Programa e não conheciam a técnica de coleta, mas
a grande maioria reconhecia a importância de sua
implantação na rotina dos exames dos recém-nascidos. O estudo trouxe grandes contribuições para
a saúde da criança, pois logo em seguida, criado
um Decreto do Presidente da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro, em 03 de Julho de 1985,
estendendo a obrigatoriedade dos exames a todas
as maternidades da rede oficial e particular para o
diagnóstico e controle da criança com fenilcetonúria
e/ou hipotireoidismo congênito.
Em 13 de Julho de 1990, com a criação do
Estatuto da Criança e do Adolescente [6], houve a
tentativa inicial de formalização da obrigatoriedade
do teste na rotina de hospitais estaduais, municipais
e particulares, contemplado no Título II, do Capítulo I, Artigo 10, Inciso III.
A Triagem Neonatal, conhecido popularmente
pelo “Teste do Pezinho”, foi incorporada ao Sistema Único de Saúde /SUS no ano de 1992, através
da Portaria GM/MS nº 22, de 15 de janeiro, com
uma legislação que determinava a obrigatoriedade
do teste em todos os recém nascidos vivos e incluía
a avaliação para fenilcetonúria e hipotireoidismo
congênito [2].
O Ministério da Saúde [2], através da Secretaria de Assistência à Saúde, empenhou-se na
reavaliação da Triagem Neonatal no Sistema Único
de Saúde/SUS, o que culminou na publicação da
Portaria Ministerial GM/MS nº 822, de 06 de junho
de 2001 que criou o Programa Nacional de Triagem
Neonatal /PNTN.
O PNTN tem o objetivo de ampliar a Triagem
Neonatal existente (Fenilcetonúria e hipotireoidismo congênito), incluindo a detecção precoce de
outras doenças congênitas como as doenças falciformes, outras hemoglobinopatias e a fibrose cística.
Esta ação envolve não apenas a realização do exame
laboratorial, mas a busca ativa dos casos suspeitos,
a confirmação diagnóstica, o acompanhamento
multidisciplinar especializado e o tratamento dos
pacientes detectados, o que deve estar garantido e
pactuado na rede de assistência local, bem como a
avaliação de cobertura, do funcionamento e resultados do programa [2].
O município do Rio de Janeiro foi habilitado,
em 2002, na fase II do Programa e passa a incluir a
triagem das hemoglobinopatias, além da de fenilcetonúria e hipotireoidismo congênito. Atualmente a
Triagem Neonatal pode ser feita tanto em laboratórios provados (diagnosticar até 30 doenças metabólicas) ou pelo sistema público (dependendo do estado
pode ser diagnosticado até 4 grupos de doenças:
hipotireoidismo congênito, hiperfenilalaninemias,
hemoglobinopatias e fibrose cística [4,7].
Muitas mães e familiares têm dúvidas a respeito
da Triagem Neonatal, sua finalidade, a técnica de
coleta e sobre o resultado do Teste do Pezinho,
apesar de serem orientadas pelos profissionais de
saúde das maternidades e encaminhados à Unidade
Básica de referência após a alta hospitalar para a
coleta do exame.
Neste sentido o presente estudo tem como
objetivos: identificar e descrever as percepções de
mães sobre a Triagem Neonatal na consulta de
enfermagem a fim de propor estratégias educativas
para maior informação das mães e familiares sobre
a importância do PNTN.
Material e métodos
Trata-se de um estudo descritivo, com abordagem quantitativa, realizado no período de Maio
a Janeiro de 2004 em um Centro Municipal de
Saúde no município do Rio de Janeiro. Foram estabelecidos os seguintes critérios de inclusão: as mães
deveriam estar agendadas para a primeira consulta
de enfermagem, e advindas da sala do “Teste do Pezinho”. Foram excluídas mães que compareceram na
consulta através do Serviço de Pronto Atendimento,
por não estarem com o registro de nascimento da
criança, embora fossem dadas todas as orientações
sobre a Triagem Neonatal, sendo a amostra constituída de 60 mães.
As participantes foram esclarecidas quanto ao
caráter espontâneo da participação e ao sigilo das
informações, tendo sido solicitado o consentimento
informado, que no caso das menores de 18 anos
de idade foi assinado por seus responsáveis, de
acordo com a resolução 196/96. Os dados foram
coletados, após autorização do Comitê de Ética da
Instituição.
Para a coleta de dados foi utilizado um questionário contendo treze questões fechadas sobre
as características sócio-demográficas das mães e
sobre a Triagem Neonatal. Os questionários foram
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aplicados pela docente responsável pelo projeto, e
pelas bolsistas do projeto de extensão, nos dias da
consulta de enfermagem.
As entrevistas foram realizadas antes do inicio
da consulta de enfermagem, enquanto as mães
aguardavam a sua vez de entrar no consultório.
Após a coleta de dados todos os questionários foram
revisados para identificar erro, omissões de respostas
e deficiências na legibilidade dos registros.
Resultados e discussão
O perfil sócio-demográfico das mães mostra
que 46,7% (28) têm entre 15 a 20 anos de idade,
35% (21) entre 20 a 25 anos e 18% (11) têm 25
a 30 anos. Em relação à escolaridade, 57% (34)
cursaram mais de oito anos o sistema formal de
educação, sendo que 5% (3) concluíram o curso
universitário, enquanto 43% (26) cursaram de 5 a
8 anos. Cerca de 71,7% (43), vivem com o companheiro, enquanto 26,7% (16) são solteiras e apenas
1.6 % (1) é viúva. As condições de saúde e o processo
de adoecer e morrer são diretamente influenciados
pelas características sócio-demográficas das mães.
Quanto maior o nível de escolaridade, maior o nível
de informação da mãe e o conhecimento necessário
para os cuidados prestados ao seu filho garantindolhe o direito à vida e à saúde.
Em relação às consultas no pré-natal, 75% (45)
das mães realizaram entre 6 a 9 consultas, 6,6% (4)
realizaram de 1 a 5 consultas, apenas 1,7% (1) não
souberam informar número de consultas realizadas
no pré-natal. O Ministério da Saúde [8] preconiza
no mínimo 6 consultas de pré-natal com a finalidade
de conhecer a história prévia da saúde da gestante
e da criança. Embora a maioria das mães tenha
realizado o pré-natal, nenhuma foi orientada sobre
a realização da Triagem Neonatal.
Tabela I - Conhecimento das mães em relação à triagem neonatal durante a última gravidez. Rio de Janeiro
2004.
Conhecimento
F
%
Sim
25
42,0
Não
35
58,0
Total
60
100
Fonte: Instrumento de coleta de dados.
Em relação às informações sobre a Triagem Neonatal durante a última gravidez, 42% (25) das mães
afirmaram receber alguma orientação durante o
pré-natal e no momento da alta hospitalar, enquanto
58% (35) não receberam nenhuma informação dos
profissionais de saúde. Aquelas que não receberam
alguma informação na última gravidez alegaram
ter levado seus filhos para realizarem o teste, por
ter outros filhos, ou porque tinham lido os cartazes
espalhados nos postos onde realizavam o pré-natal.
A cultura, a experiência de vida e o meio em que o
recém-nascido e sua família estão inseridos influenciam no conhecimento da Triagem Neonatal.
Tabela II - Profissionais que informaram as mães sobre a triagem neonatal. Rio de Janeiro 2004.
Profissionais
F
%
Pediatra
12
48
Enfermeiro
11
44
Pediatra e Enfermeiro
1
4
Outros
1
4
Total
25
100
Fonte: Instrumento de coleta de dados.
Em relação à procedência das informações
recebidas, das 25 mães que receberam informações,
48% (12) informaram ser o pediatra, 44% (11) ser
a enfermeira e 8% (2) outros profissionais. Podemos
observar que os profissionais de saúde, principalmente os enfermeiros, exercem papel fundamental
na importância do diagnóstico precoce das enfermidades pesquisadas no PNTN, com a finalidade
de promover o desenvolvimento físico, neurológico,
psicológico e intelectual da criança.
A coleta do teste do pezinho geralmente é realizada por um profissional de enfermagem, cuja atividade é regulamentada por legislação específica [2].
As informações sobre a triagem neonatal devem ser
iniciadas desde o pré-natal e todos os profissionais
de saúde devem realizá-la de uma maneira simples
durante o acesso da mulher e da família ao serviço de
saúde. A enfermagem tem participação importante
e intransferível no PNTN, porque é o profissional
de enfermagem quem mais interage com a clientela
alvo: a mãe e o recém-nascido [9].
Das 25 mães que receberam informações sobre
a Triagem neonatal, 52% (13) referiam que o Teste
do Pezinho era para detectar a doença e prevenir
agravos, 28% (07) referiam que era para detectar e
prevenir problemas mentais e 20% (05) diziam que
o teste era utilizado para detectar a Síndrome de
Down. Das sete mães que referiram que a Triagem
Neonatal detectava e prevenia problemas mentais,
57,1% (04) já tinham lido sobre o hipotireoidis151
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mo congênito e 42,9% (03) a respeito da anemia
falciforme.
Podemos observar que ainda é grande a desinformação das mães sobre a finalidade da Triagem
Neonatal, e que na rede pública, a Síndrome de
Down não pode ser identificada através do Teste do
Pezinho, como na rede privada.
Em relação à idade ideal da criança para a
coleta do Teste do Pezinho, das 60 mães, 33% (20)
responderam ao nascer, 20% (12) do 2º ao 7º dia
de vida, 37% (22) respondeu até 30 dias e 10% (6)
não souberam informar.
Esses dados mostram que a grande maioria
desconhece o período adequado para a realização
do teste. Crianças com menos de 48 horas de
vida ainda não ingeriram proteína suficiente para
serem detectadas de forma segura na triagem da
fenilcetonúria e os níveis de TSH (hipotireoidismo
congênito) podem estar elevado [7,9]. A estabilização da função hormonal do recém-nascido que
possibilita diagnóstico e tratamento precoce ocorre
por volta do 5º ao 7º dia e não deve ultrapassar a
trinta dias [2].
Das 60 mães que levaram seu filho para realizar
o teste do pezinho, 79% (47) seguraram seu filho no
colo durante a coleta, 13% (8) por outros parentes
e 8% (5) foram segurados pelos pais. Das 47 que
presenciaram a coleta de sangue, 78,7% (37), não
receberam orientação sobre o procedimento sobre
a coleta, apenas 21,3% (10) alegaram ter recebido
orientações acerca do modo de segurar a criança, e
com relação à data de entrega do resultado, entre
30 a 60 dias.
Outros estudos [10] revelaram que apesar de
todas as mães possuírem algum tipo de informação
sobre a triagem neonatal, esse conhecimento ainda
é superficial.
Todos os profissionais de saúde, principalmente os enfermeiros, devem orientar às mães que não
há necessidade de jejum para a realização da coleta
de sangue para o teste do pezinho, e sobre; a idade
ideal para a coleta do referido material, o procedimento propriamente dito, a posição da criança, o
local da punção, a importância do resultado e da
sua anotação na Caderneta da criança [11], uma
vez que a detecção precoce e o tratamento imediato,
realizados antes dos dois meses de vida, podem evitar
a deficiência mental.
Quando a coleta ocorre precocemente, com
menos de 48 horas de vida, poderá levar a resultados
não confiáveis – falso positivo para hipotireoidis-
mo congênito e falso negativo para fenilcetonúria
[2,7,9].
Quadro Demonstrativo 1- Percepção das mães com
relação a dor do recém-nascido e com relação às suas
reações durante a punção de calcâneo e medidas adotadas para amenizar a reação - Rio de Janeiro 2004.
Procedimento
F
%
Muito doloroso
28
59,6
Pouco doloroso
15
31,9
Indolor
4
8,5
Reação do RN
F
%
Chora
34
72,3
Chora e grita
5
10,6
Não apresenta reação
4
8,5
Gemido
2
4,3
grito
2
4,3
Para amenizar a reação
F
%
Colocar RN braços
37
78.7
Amamentar
8
17,0
Dar a chupeta
2
4,3
Total
47
100
Fonte: Instrumento de coleta de dados.
De acordo com o Quadro Demonstrativo
1, das 47 mães que seguraram seu filho no colo,
59,6% (28) consideram o procedimento muito
doloroso, 31,9% (15) pouco doloroso e 8,5% (4)
consideram o procedimento indolor. Em relação
à reação da criança ao procedimento das crianças
que apresentaram algum tipo de reação, as mães
referiram que 72,3% (34) apresentaram o choro,
10,6 % (5) apresentaram o choro associado ao grito,
4,3% (2) o grito, e 4,3% (2) gemido, 8,5% (4) não
apresentaram nenhuma reação.
O estímulo agudo como a punção de calcâneo
é considerado doloroso, principalmente se houver
coleta de repetição ou novas punções em relação ao
procedimento eficiente de uma única coleta [2]. O
recém-nascido apresenta maior sensibilidade à dor,
podendo o estímulo doloroso durar até 90 minutos
[12].
A Triagem Neonatal deve ser realizado por um
profissional treinado para orientar as mães e apóialas na realização de um teste, aparentemente fácil de
ser realizado, mas que as mães sentem medo ou dó
por ser um procedimento invasivo [9,13].
A posição da criança também é importante ser
observada, pois para que haja uma boa circulação
de sangue nos seus pés, suficiente para o sucesso
da coleta, o calcanhar deve ficar abaixo do nível do
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coração [2]. A mãe ou o acompanhante deverá ficar
em pé, segurando a criança.
O profissional também deve estar atento à escolha do local da punção (laterais da região plantar
do calcanhar), pois uma punção superficial não produzirá sangramento suficiente para preencher todos
os círculos necessários à realização do teste, evitando
nova coleta e complicações como infecção, dor no
local e estresse para a criança e a família [2].
Das 47 mães que seguraram seu filho no colo
utilizaram algumas medidas para amenizar a reação
da criança à dor, 78,7% (37) referiram acalentar o
bebê nos seus braços, 17% (8) acreditaram que amamentar o bebê no momento da coleta faz com que
este sofra menos, e 4,3% (2) oferecem a chupeta.
As medidas não farmacológicas como o carinho, afeto, o colo e a sucção nutritiva devem
ser incentivadas pelos profissionais, pois podem
aumentar a habilidade da criança em lidar com a
dor e o estresse.
Conclusão
Este estudo mostrou que ainda exista um
grande quantitativo de mães que desconhece vários
aspectos da triagem neonatal, incluindo as doenças
detectadas e a maneira de prevenir o retardamento
mental, assim como o período ideal para a realização
do teste do pezinho, o que pode provocar sérios
agravos à saúde da criança.
Além disso, ficou evidenciado que o referido
teste ainda é pouco valorizado pelos profissionais
de saúde, assim como a orientação a respeito da
realização da triagem neonatal e sua importância
para o desenvolvimento da criança, principalmente
pelo seu caráter obrigatório.
Deste modo, concluiu-se, em virtude dos achados, que há uma grande necessidade da implantação,
pelos enfermeiros, desde o pré-natal, de práticas educativas relacionadas à triagem neonatal, tais como;
práticas educativas objetivando esclarecer as dúvidas
a respeito do teste do pezinho, orientações sobre as
principais doenças que podem ser detectadas através
dele, a técnica da coleta de sangue específica para
este exame, sua finalidade e o resultado, a fim de
garantir aos pais e familiares esclarecimentos sobre
este procedimento, que é um direito de toda a
criança na primeira semana de vida.
Referências
1. Organização Mundial de Saúde. Classificação Internacional das Deficiências, Atividades e Participação:
um manual da dimensão das incapacidades e da saúde.
Genebra: OMS; 1997.
2. Ministério da Saúde. Manual de Técnicas e Rotina Operacionais do Programa Nacional de Triagem Noenatal.
Brasília: MS; 2002.
3. Schwartz IVD, Neto EC, Giugliani R. Considerações
sobre o momento da colheita da triagem neonatal. J
Pediatr (Rio de J) 2000;76(6):474-75.
4. Souza CFM, Schawartz IV, Giugliani R, Triagem neonatal de distúrbios metabólicos. Ciênc Saúde Coletiva
2002;7(1):356-60.
5. Freitas TNT. Fenilcetonúria e Hipotireoidismo Congênito: Diagnóstico precoce e prevenção da deficiência
mental. Niterói: EDUFF; 1990.
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Humanos; 2002.
7. Seminário de Implantação do Projeto “Acolhimento
Mãe-Bebê”. Prefeitura Municipal do Rio de janeiro:
Superintendia de Saúde Coletiva. Coordenação de
Programas de Atendimento Integral à Saúde. Gerência
de Programas de Saúde da Criança; 2003.
8. Ministério da Saúde. Gestação, parto e puerpério.
Brasília: MS; 1995.
9. Silva MBGM, Lacerda MR. Teste do pezinho: por
que coletar na alta hospitalar. Revista Eletrônica de
Enfermagem 2003:5(2):50-4.
10. Amorim JF, Souza MHN. O conhecimento das mães
acerca da triagem neonatal. Rev Enfermagem UERJ
2005;13(27)31.
11. Ministério da Saúde. Agenda de compromissos para
a saúde integral da criança: e redução de mortalidade
infantil. Brasília: MS; 2004.
12. Christoffel MM. Navegando no mar da neonatologia.
Rio de Janeiro: Anna Nery; 2003.
13. Freitas TNT. Teste do Pezinho: um marco expressivo
na história da enfermagem preventiva no Brasil. Enfermagem Brasil 2004;3(4):230-35.
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APENDICE
Parte I
1- Idade materna:
2- Escolaridade:
3- Estado conjugal:
4- No. consultas no pré-natal:
Parte II
5- Conhece sobre o teste do pezinho? sim ( ) não ( )
6- Recebeu informação sobre o teste do pezinho:
pré-natal ( ) alta maternidade ( ) outro ( ) não recebeu nenhuma informação ( )
7- Profissional que informou sobre o teste do pezinho:
Enfermeiro ( ) pediatra ( ) outros( ). Qual:
8- Quais as doenças detectadas pelo teste do pezinho:
Fenilcetonúria ( ) hipotireoidismo congênito ( )
anemia falciforme ( ) outra ( ) Qual:
9- Idade ideal para realizar o teste do pezinho?
10- Recebeu informação como proceder com seu filho durante a coleta do teste do pezinho? Sim ( ) Não Qual:
11- Considera o teste do pezinho um procedimento:
doloroso ( ) pouco doloroso () indolor ( )
12- Quais reações apresentadas pelo seu filho, durante a punção do calcâneo?
13 – Quais medidas utilizadas para alívio da dor?
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Atualização
Aspectos éticos da imobilização pediátrica
realizada pela equipe de enfermagem
(A crítica reflexiva desafiando
o reprodutivismo)
Flávia Cristina de Araújo Cordeiro Biesbroeck, M.Sc. *, Maria Aparecida de Luca Nascimento, D.Sc.**,
Kaneji Shiratori, D. Sc.***, Mariana Gomes Cardim*
*Enfermeira, Agência Nacional de Saúde (ANS),** Orientadora Acadêmica do Programa de Mestrado da Universidade Federal
do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), ***Professora Adjunto do Departamento de Enfermagem Fundamental (DEF) da Escola
de Enfermagem Alfredo Pinto (EEAP) da UNIRIO, Enfermeira, Instituto Fernandes Figueira (FIOCRUZ), Mestranda da
UNIRIO
Resumo
Estudo crítico reflexivo que trata do reprodutivismo observado no cotidiano da prática de cuidar em enfermagem, mais
especificamente, durante a imobilização do membro superior da criança para que ela seja submetida à infusão venosa. Tendo
como objetivos: correlacionar os aspectos éticos e bioéticos que incidem sobre o procedimento técnico em apreço, e, enfatizar
a importância da análise crítico reflexiva do profissional da equipe de enfermagem, como um desafio ao reprodutivismo
observado no cotidiano da prática de cuidar, com vistas a uma prática social, centrada na cidadania de quem a ela é submetido,
as discussões foram divididas em três momentos. O primeiro, denominado de O procedimento técnico de enfermagem à luz da
ética e da bioética, o segundo, A imprevisão do previsível e o terceiro, A produção do saber e a mudança de paradigmas. As autoras,
através destes momentos, descrevem a familiaridade dos profissionais de enfermagem com determinados procedimentos técnicos,
dificultando a reflexão crítica sobre eles, a falta de observação do cuidado que se deve ter durante a realização da imobilização
pediátrica, tendo em vista a vulnerabilidade infantil, à luz das ciências jurídicas, e o reprodutivismo como o responsável pela
falta do exercício da crítica reflexiva diante dos procedimentos técnicos de Enfermagem e a mudança de paradigma pautado na
aquisição de um novo conhecimento. Conclui-se que é através da postura crítica reflexiva do enfermeiro que se garante o direito
à cidadania da criança e o respeito à dignidade da pessoa humana e que as atitudes profissionais respaldadas pela sabedoria
prática e reflexão filosófica promovem o Bem, expressando o teor da ética Aristoteliana e o Código de Ética da profissão.
Palavras-chave: cuidado de enfermagem, ética, pediatria.
Artigo recebido em 1 de junho de 2006; aceito em 20 de junho de 2006.
Endereço para correspondência: Maria Aparecida de Luca Nascimento, UNIRIO, Av.
Pasteur, 296, 22290-240 Rio de Janeiro RJ, E-mail:[email protected]
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Abstract
Ethical aspects of the child’s arm immobilization performed by the nursing team
(Critical thinking challenging non critical repetition)
Critical reflexive study focused on the non critical repetition observed on the daily nursing care, specifically during
immobilization of the child’s arm for venous infusion. Its objectives are: to correlate the ethical aspects influencing the
technical procedure in matter, and, to emphasize the importance of critical reflexive thinking of the nursing professional as a
challenge to non critical repetition observed on the everyday nursing practice in order to achieve a social practice centered on
the citizenship of the one submitted to it. Discussions were divided in 3 parts: the first named The technical procedure analyzed
through ethics and bioethics; the second, The non prediction of the predictable; and the third, The production of knowledge and
the change in paradigms. The authors, through these three moments, describe the familiarization of nursing professionals with
certain technical procedures, making it difficult to critically analyze them, the lack of observation of the peculiar care that must
be taken during pediatric immobilization acknowledging children’s vulnerability in the light of juridical science, and the non
critical repetition as responsible for the absence of the practice of critical thinking towards nursing technical procedures and
the change in paradigms based on the acquisition of knowledge. Its conclusion is given through the nurse’s critical reflexive
attitude as a means of guaranteeing the child’s rights and citizenship as well as the respect for the human dignity and that the
professional attitudes based on practical knowledge and philosophical thinking promote wellness, expressing the foundation
of the Aristotelian ethics and the profession’s ethical code.
Key-words: nursing care, ethics, pediatrics.
Resumen
Aspectos éticos de inmovilización pediátrica realizada por el equipo de enfermería
(La crítica reflexiva desafiando la reproducción acrítica)
Estudio crítico reflexivo que trata de reproducir acríticamente lo observado en el quehacer del cotidiano de cuidar en enfermería,
más específicamente, durante la inmovilización del miembro superior del niño para que sea sometido a infusión venosa. Los
objetivos son los siguientes: correlacionar los aspectos éticos y bioéticos que inciden sobre el procedimiento técnico de referencia,
y, enfatizar la importancia del análisis crítico y reflexivo del profesional de enfermería, como un desafío a la reproducción
acrítica observada en el quehacer cotidiano de cuidar, para conseguir una práctica social, centrada en la ciudadanía de quien
a ella es sometido. Las discusiones fueron divididas en tres momentos: el primero, denominado El procedimiento técnico de
enfermería a la luz de la ética y bioética; el segundo, La imprevisión de lo previsible y el tercero, La producción del saber y el
cambio de paradigmas. Las autoras, a través de estos tres momentos, describen la familiaridad de los profesionales de enfermería
con determinados procedimientos técnicos, dificultando la reflexión crítica sobre ellos, la falta de observación del cuidado
que se debe tener durante la realización de inmovilización pediátrica, teniendo en cuenta la vulnerabilidad infantil, a la luz
de las ciencias jurídicas, y la reproducción acrítica como responsable por la falta de ejercicio de la crítica reflexiva frente a los
procedimientos técnicos de enfermería y el cambio de paradigma basado en la adquisición de un nuevo conocimiento. Se
concluye que es a través de la postura crítica reflexiva del enfermero que se garantiza el derecho a la ciudadanía del niño y el
respecto a la dignidad de la persona humana y que las actitudes profesionales respaldadas por la sabiduría práctica y reflexión
filosófica promueven el bien, expresando el contenido de la ética de Aristóteles y el código de ética de la profesión.
Palabras-clave: cuidado de enfermería, ética, pediatría.
Introdução
Este estudo surgiu de discussões durante a
disciplina Bioética e Enfermagem, que é oferecida
no Programa de Mestrado em Enfermagem da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro
(UNIRIO).
Levando-se em consideração que o teor da
referida disciplina é fomentar, baseada na bioéti-
ca, a análise crítica reflexiva acerca dos princípios
e fundamentos que norteiam o ser humano nas
suas relações contextuais, elegeu-se como objeto
deste estudo, o reprodutivismo observado no
cotidiano da prática de cuidar, inerente a determinados procedimentos técnicos de enfermagem,
mais especificamente, à imobilização do membro
superior da criança para que ela seja submetida à
infusão venosa.
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O procedimento acima mencionado é o responsável por um conjunto de sinais e sintomas, que
por elas foi denominado de “síndrome da criança
com o membro superior imobilizado para infusão
venosa” [1]. Vale ressaltar que estes sinais estavam
impressos no corpo da criança, que ao serem observados sistematicamente, e, decodificados como uma
comunicação não verbal, possibilitou a descrição
de tal síndrome, baseada em referenciais teóricos
pontuais, quais sejam, psicomotricidade, fisiologia
humana, biomecânica corporal, entre outras.
No estudo supracitado, as autoras descrevem
a referida síndrome como sendo aquela composta
por: ansiedade, medo, dor e tristeza, resultantes da
imobilização do membro superior da criança em
hiperextensão.
A hiperextensão do membro superior, ao
promover uma Ação no referido membro para que
ele seja colocado sobre a tala imobilizadora, que
é um procedimento, normalmente realizado por
profissionais da equipe de enfermagem, provoca em
resposta, explicitada pela 3ª Lei de Newton, uma
Reação, de mesmo módulo, mesma intensidade, e
de sentido oposto.
Considerando-se que a Ação da força é provocada por um adulto, no caso tomado como exemplo,
um profissional da equipe de enfermagem, e que a
força de resposta é realizada por uma criança, que no
citado estudo, refere-se a um pré-escolar, segundo a
classificação de Marcondes [2], de 2 a 7 anos, há uma
desproporção de forças atuando no seu corpo, que
para manter o equilíbrio, mantêm-se “quietinho” no
leito, demonstrando que nem sempre criança que
não chora, está sem dor.
Apesar de a criança submetida a tal tratamento
não chorar, mantendo-se “quietinha”, à simples
menção de tocá-la, ela choraminga, para, efetivamente chorar, se esse toque for de fato consumado,
mesmo que não propicie o seu posicionamento no
leito, fato que demonstra seu medo, a princípio, e,
posteriormente, a sua dor.
A referida postura, sobejamente conhecida dos
profissionais de enfermagem que cuidam de crianças, muitas vezes ganha requintes, relacionados às
fixações do braço da criança à tala, e da fixação da
tala ao leito, tracionando-a, para impedir a “perda
da veia”.
Tal descrição faz-se mister, para que, em um
raciocínio indutivo, possamos perceber que a técnica
de imobilização de membro superior em pediatria
foi assim ensinada, assim praticada, e, em um movi-
mento circular, novamente ensinada para os futuros
enfermeiros, que, por sua vez, davam continuidade
ao processo, configurando um comportamento
reprodutivista, acrítico e sem reflexão.
Objetivos
• Correlacionar os aspectos éticos e bioéticos que
incidem sobre os procedimentos técnicos de enfermagem, especificamente, na imobilização de
membro superior em pediatria.
• Enfatizar a importância da análise crítico - reflexiva do profissional da equipe de enfermagem,
como um desafio ao reprodutivismo observado no
cotidiano da prática de cuidar, com vistas a uma
prática social, centrada na cidadania de quem a
ela é submetido.
O procedimento técnico de enfermagem à luz da
ética e da bioética
Durand [3], ao definir a ética, citou que, primeiramente, ela é uma questão de visão, interrogação, e legitimação, complementando-se através da
intenção, motivação e atitude.
No final do século passado, tendo em vista o
avanço científico e tecnológico, houve a necessidade de expandir-se esse conceito, direcionando-o
exclusivamente à preservação da ética da vida.
Desse modo, nascendo a bioética, a qual refere-se
“a todos os profissionais, intervenientes e usuários
do mundo da saúde”, não sendo, ainda segundo o
autor, exclusividade de alguém, mas, um dever e
uma responsabilidade de todos.
Vale acrescentar que a análise que se segue,
deverá ser observada sob o ponto de vista da pesquisa
em enfermagem, e da produção de conhecimentos
dela advindos, no sentido de entender que não
nos preocupamos em chamar a atenção, pejorativamente, para um procedimento que atualmente
vem sendo realizado acriticamente, situação que,
por si só poderia ser considerado um procedimento
antiético, mas, em demonstrar que temos, hoje, a
ousadia de discutir os objetos da nossa prática, em
prol de uma profissão ampla e democrática, voltada
para o social.
A nosso ver, essa discussão é tão urgente quanto necessária, haja vista o estudo de Germano [4]
que, ao analisar vários textos voltados para o ensino
da ética no Brasil, publicados em periódicos de
enfermagem, observou que apesar da formação do
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enfermeiro estar marcado pela religiosidade, na prática, “constatamos um comportamento desumano
e muito pouco solidário por parte dos enfermeiros
e demais membros da equipe de saúde”.
Ainda sob a vertente reflexiva, ao considerarmos os efeitos adversos do procedimento técnico em
foco, não podemos considerá-lo um procedimento
desumano, quando muito, um cuidado desprovido
de cuidado, uma vez que ele visa a preservação de um
acesso venoso, mas que, em contrapartida, produz
ansiedade, dor, medo e tristeza. No entanto, sendo
ele desprovido de análise crítica na sua realização,
remete-nos às questões jurídicas, éticas, e bioética,
pelas quais, todos que se vêem nele envolvidos, são
responsáveis.
A falta de observação dos cuidados inerentes
à vulnerabilidade infantil pode ser creditada ao reprodutivismo na formação profissional, como por
exemplo no que se refere às técnicas de enfermagem,
em especial a imobilização da qual trata o presente
estudo, não terem sofrido modificação pautada na
reflexão, sendo a sua realização, procedida de forma
acrítica, institucionalizada, e com certa familiaridade
[1].
No entanto, a familiaridade impede o avanço
do conhecimento, uma vez que tudo o que é familiar,
é aceito sem questionamentos [5], “...no momento
em que lançamos mão de questionamentos que
possam explicar a nossa prática cotidiana, o mundo
fixo e estável do familiar se põe a dançar” [5].
Reportando-nos a um dos objetivos propostos
neste estudo, qual seja, o de correlacionar os aspectos
éticos que incidem sobre a imobilização do membro
superior da criança para ser submetida à infusão
venosa, passamos a apresentar, a partir do acima
exposto, as correlações existentes entre este procedimento técnico e as etapas citadas por Durand [3],
ao definir a ética e a bioética, numa demonstração
clara do desafio que a análise crítico reflexiva promove, em relação à familiaridade, e ao “status quo”
de um determinado procedimento técnico realizado
da mesma forma, e há tanto tempo, pela equipe de
enfermagem, a ponto de institucionalizá-lo.
A imprevisão do previsível
Considerando que a ética é, primeiramente,
uma questão de visão, conforme citado anteriormente, podemos perceber que visualizar uma outra
forma de proceder-se, tecnicamente falando, é o primeiro passo a ser dado, porém, mudar paradigmas, é
encontrar resistência, que só será vencida, mediante
a comprovação da evidência do fato tratado.
A comprovação da evidência que o procedimento técnico da imobilização do membro superior
da criança, para que ela seja submetida à infusão
venosa, deve romper o paradigma institucionalizado
que prevê a hiperextensão deste membro, associado, muitas vezes, à sua tração. Tal consideração é
respaldada por várias ciências dos mais diversos
campos de saber.
Neste ponto, encontramos apoio na citação
de Garrafa [6], quando, ao definir os verdadeiros
fundamentos da bioética, diz que eles podem ser
encontrados através de uma ação multidisciplinar,
que inclui, além das ciências médicas e biológicas,
a filosofia e o direito.
O ponto mais contundente relacionado ao
direito, precisamente às ciências jurídicas, considerando o evento em foco, diz respeito à falta de
observação do cuidado que se deve ter durante a
sua efetivação, tendo em vista a vulnerabilidade
infantil.
A análise de qualquer situação que possa
gerar um fato jurídico, como no caso, a instalação
da síndrome citada, a partir da imobilização para
infusão venosa, é procedida a partir da análise
comparativa entre uma pessoa leiga, mas dotada
de discernimento e prudência, e o profissional que
executa esta ação [7].
Ao observar-se que a pessoa leiga prevê, diante
da imobilização do membro superior em hiperextensão, que a criança poderá sentir algum efeito em
virtude desta postura, surge o que o autor supracitado denomina de previsibilidade objetiva, ao passo
que, na previsibilidade subjetiva, espera-se que o
profissional, dotado, além dos quesitos da pessoa
leiga, de conhecimento técnico e científico, preveja
este resultado.
A previsibilidade subjetiva é o elemento que
fundamenta a falta de observância do cuidado
exigido [8].
A falta de observância do cuidado exigido, diz
respeito à possibilidade da antevisão do profissional
da equipe de enfermagem, segundo a sua formação,
considerando os aspectos relativos ao conhecimento da
anatomia humana, da psicologia infantil, da biomecânica corporal, da fisiologia humana, entre outros.
A partir de todos estes fatos, surgem os questionamentos e suas respectivas reflexões que legitimarão uma mudança, pautada na análise crítica do
procedimento em apreço.
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Considerando que toda mudança é resultado
de uma motivação para fazê-la, há de se esperar,
como conseqüência, uma atitude transformadora.
A produção do saber e a mudança de paradigmas
Ao evidenciarmos neste estudo que o reprodutivismo na formação profissional seria o responsável
pela falta do exercício da crítica reflexiva diante dos
procedimentos técnicos de enfermagem, e, conseqüentemente, pela execução das técnicas, sem a
observância do cuidado exigido, passamos a analisar,
a mudança do paradigma, pautado na aquisição de
um novo conhecimento.
A enfermagem, como todas as outras profissões, possui um corpo de conhecimentos próprio. A
produção destes conhecimentos, no entanto, pode
não estar ligado, necessariamente ao seu campo
específico de formação.
Ao analisarmos todos os pontos que tangenciam o procedimento técnico em referência,
podemos observar que várias são as ciências que o
respaldam, demonstrando toda a complexidade que
existe no ato de cuidar em enfermagem.
Mas, em se tratando de uma profissão relacionada ao cuidar, a tônica relativa à interação humana
toma um vulto maior.
Com relação às modificações de comportamento, advindas do saber adquirido, e inerentes
aos procedimentos técnicos de enfermagem, vale
ressaltar que:
“A partir do momento que os profissionais
desconhecerem as ‘síndromes da assistência
de enfermagem’ difundidas, e por este motivo não mudarem o seu comportamento
técnico, continuando a permitir que elas
se instalem, estará havendo uma negligência”.[1]
Por negligência observamos que se trata da
displicência no agir, a falta de precaução com a indiferença do agente, que podendo adotar as cautelas
necessárias não o faz [8].
Desta forma observa-se que a negligência constitui-se em uma das formas de realização de crime
culposo, o qual se configura como sendo de ato
voluntário, proveniente de imperícia, imprudência
e negligência.
Conclusão
Ao concluirmos o presente estudo, enfatizamos que a mudança de paradigma com relação à
postura do membro da criança para ser submetida
à infusão venosa, está relacionada à substituição da
hiperextensão pela postura funcional do referido
membro.
A referida postura poderá ser realizada através
de uma tala especialmente elaborada para este fim,
que, além de privilegiar a postura funcional do antebraço, em detrimento da postura em hiperextensão,
será confeccionada em material lavável para impedir
o crescimento de bactérias e fungos [9].
Por oportuno, vale acrescentar que a referida
tecnologia foi apresentada ao Instituto Nacional de
Propriedade Industrial (INPI), sendo a sua patente
de invenção concedida por este órgão a uma das
autoras deste estudo, e sendo descrita por Nascimento [10] .
Sendo assim, ao privilegiarmos, através de uma
postura crítico reflexiva, o direito à cidadania da
criança, conforme prevê a Constituição da República Federativa do Brasil [11], em seu artigo 227, e que
se constitui, juntamente com a dignidade da pessoa
humana, em alguns dos fundamentos do Estado
Democrático de Direito da nossa República, estaremos dando-lhe segurança em todos os sentidos, e
resguardando-a de sofrimento desnecessários.
Além disso;
“Na medida em que desenvolvemos a nossa
prática profissional de acordo com um perfil
reflexivo, e não meramente como um reprodutor de ações, poderemos observar a quantidade
de aspectos interdisciplinares que os compõem,
fato que contribui para o desenvolvimento de
adaptações e modificações no ato de cuidar,
gerando em quem cuida, motivação e interesse, e em quem é submetido ao cuidado,
segurança e confiabilidade, legitimando deste
modo a dimensão científica do cuidado de
enfermagem [12]”.
Seriam essas atitudes profissionais, respaldadas
pela sabedoria prática, advinda do saber adquirido,
assim como pela reflexão filosófica, que ao serem
utilizadas com a finalidade de promover o bem,
expressariam o teor da ética, citada por Aristóteles [13], e corroborada pelo Código de Ética dos
Profissionais de Enfermagem [14], que cita em seu
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preâmbulo, que a Enfermagem é a perfeita forma
de projeção do Bem ao nível do Homem.
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com o membro superior imobilizado para infusão venosa – uma contribuição da semiologia para o cuidado de
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2. Marcondes E, Alcântara P. Pediatria Básica. 6a ed. São
Paulo: Sarvier; 1978. 599p.
3. Durand G. Introdução geral à bioética: história, conceitos e instrumentos. São Paulo: Loyola; 2003.
4. Germano RM. A ética e o ensino de ética na enfermagem brasileira. São Paulo: Cortez; 1993.
5. Alves R. Conversas com quem gosta de ensinar. 2a ed.
Campinas: Papirus; 1988.
6. Garrafa V. Dimensões da Ética em Saúde Pública. São
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8. Jesus DE. Direito Penal. São Paulo: Saraiva; 1986.
9. Brito IJ, Nascimento MA de L, Dehoul M da S. A
tala imobilizadora de membro superior em pediatria
e a infecção hospitalar: Um estudo experimental. Rev
Enfermagem UERJ 2002;10(3): 194-8.
10. Nascimento MAL. Apresentando a tala imobilizadora
de membros superiores em pediatria (Uma tecnologia
advinda da ciência do cuidado de enfermagem aliado às
outras áreas do conhecimento). Revista da Sociedade Brasileira de Enfermeiros Pediatras 2003;3(2):147-151.
11. Brasil. Constituição (1988). Constituição da República
Federativa do Brasil. Brasília:Senado; 1988.
12. Nascimento MAL. O cuidado de enfermagem e as
ciências que nele incidem. Revista Enfermagem Brasil
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13. Aristóteles. Ética a Nicômaco. São Paulo: Martin Claret;
2004.
14. Conselho Federal de Enfermagem. Código de deontologia de enfermagem. Rio de Janeiro: Gráfica do Coren
– RJ; 1975.
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Atualização
O indivíduo portador de seqüela
de acidente vascular encefálico
(O despertar para o autocuidado)
Delcilene Fátima de Aquino*, Telma Geovanini, M.Sc.**
*Enfermeira, Faculdade de Enfermagem da UNIPAC - Universidade Presidente Antônio Carlos de Juiz de Fora, **Professora e
Coordenadora da Faculdade de Enfermagem da UNIPAC – Universidade Presidente Antônio Carlos de Juiz de Fora
Resumo
Nos países desenvolvidos, o acidente vascular encefálico (AVE) é a entidade que mais provoca invalidez, ocasionando danos
físicos e emocionais para o indivíduo acometido e sua família. Este estudo, teórico reflexivo, de natureza qualitativa, tem
por objetivo demonstrar a importância do autocuidado e da interação familiar, a fim de tornar possível ao cliente, adaptar-se
às suas limitações de uma maneira saudável, apoiando-se no referencial teórico de Dorothea Orem, e na Sistematização da
Assistência de Enfermagem proposta pela NANDA (Noth American Nursing Diagnosis Association). A metodologia utilizada
foi a observação participante, além do depoimento da cliente portadora da patologia em foco, assim como das observações
de seus familiares, que, em relação ao AVE, referiram os seguintes sentimentos; vergonha, impotência, e incerteza diante da
possibilidade da morte, que foram superados através do apoio familiar e do autocuidado, procedimentos estimulados pelas
autoras. Conclui-se que a prática do estímulo ao autocuidado é efetiva, e que ela só será possível quando se possuir um serviço
de enfermagem organizado, com profissionais motivados para desenvolvê-la.
Palavras-chave: Acidente Vascular Encefálico, autocuidado, enfermagem.
Abstract
Individual with encephalic vascular accident sequela – awakening to the self-care
In developed countries the encephalic vascular accident EVA is one of the main causes of invalidity, causing physical and
emotional damages for the person who was taken ill and his family. This is a theoretical-reflexive study, with qualitative
approach, aiming at demonstrating the importance of self-care and family interaction, in order to make possible to the patient
to adapt to his/her limitations in a healthy manner, based on Dorothea Orem’s theory and on Systematization of Nursing
Assistance proposed by NANDA (North American Nursing Diagnosis Association. The methodology used was the participative
observation, and also patient report as well as her family observations related to EVA. They refer to the following feelings:
Artigo recebido em 15 de abril de 2006; aceito em 15 de maio de 2006.
Endereço para correspondência: Delcilene Fátima de Aquino, Rua Aquim Ribeiro
Guimarães, 92 centro 37300-000 Andrelândia Minas Gerais, Tel: (35) 332512256, E-mail:
[email protected]
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shame, impotence and uncertainty about death, which were surpassed through family support and self-care, procedures
stimulated by the authors. One concluded that the practice of stimulus to self-care is effective and it will only be possible
when we have an organized nursing service, with motivated professionals to develop it.
Key-words: encephalic vascular accident, self-care, nursing.
Resumen
El individuo con secuela de accidente vascular encefálico – el despertar para el
autocuidado
En los países desarrollados, el accidente vascular cerebral (AVE), es la entidad que provoca más invalidez, daños físicos y
emocionales, para el individuo que sufrió un AVE y su familia. Este estudio, teórico reflexivo, de naturaleza cualitativa, tiene
por objetivo demostrar la importancia del autocuidado y de la interacción familiar, con la finalidad de posibilitar al paciente
a adaptarse a sus limitaciones de una manera saludable, apoyándose en la teoría de Dorotea Orem y en la Sistematización
de la Asistencia de Enfermería propuesta por la NANDA (North American Nursing Diagnosis Association). La metodología
utilizada fue la observación participante, además de los relatos de la paciente, así como las observaciones de sus familiares, que,
en relación al AVE, se refirieron a los siguientes sentimientos: vergüenza, impotencia e incertidumbre frente a la posibilidad
de muerte; los cuales fueron superados a través del apoyo familiar y del autocuidado, procedimientos estimulados por las
autoras. Se concluye que la práctica de estímulo al autocuidado es efectiva, y que ella solamente será posible cuando exista
un servicio de enfermería organizado, con profesionales motivados para desarrollarla.
Palabras-clave: accidente vascular encefálico, autocuidado, enfermería.
Introdução
De acordo com Smeltzer & Bare [1], o acidente
vascular encefálico (AVE), ou acidente cérebro vascular, tanto isquêmico (interrupção sangüínea por
um trombo venoso) quanto hemorrágico (derramamento sangüíneo na massa encefálica), estão sendo
chamados de “ataque cerebral”, consistindo na perda
súbita da função cerebral em decorrência da ruptura
do aporte sanguíneo para uma região do cérebro.
De uma forma geral, o prognóstico da linguagem
se define em seis meses, enquanto o motor em um
a dois anos. Após tais intervalos, usualmente os déficits existentes devem ser considerados seqüela do
evento ocorrido. Cerca de 33% dos pacientes apresentarão recuperação completa, 33% déficits parciais
que não comprometerão a independência e 23%
ficarão completamente dependentes. A mortalidade
por AVE se situa em torno de 10% relacionando-se
à própria lesão neurológica ou complicações clínicas
decorrentes, principalmente infecciosas.
Para Lima [2] a recuperação e processo de
reabilitação após o acidente vascular encefálico são
prolongados, exigindo paciência e perseverança por
parte do paciente e da família. No entanto sabe-se
que o ato de cuidar é próprio da natureza humana,
de modo que todo ser humano é capaz de cuidar de
si e do outro. Tal afirmação é consolidada pela teoria
do autocuidado de Dorothea Orem apud George
& Júlia [3] que é a capacidade de um indivíduo
promover sua manutenção, sendo manutenção de
ingesta de ar, água e alimentos, manutenção dos
processos de eliminação e excrementos, manutenção
entre atividade e repouso, manutenção do equilíbrio
entre a solidão e a interação social, a prevenção do
perigo à vida em benefício do bem estar humano.
No entanto o déficit ou quebra destes elos é o que
delineia quando “o cuidar” é necessário.
Timby [4] explica que Orem definiu autocuidado como o desempenho ou a prática de atividades que
os indivíduos realizam em seu benefício para manter
a vida, a saúde e o bem-estar. Quando o autocuidado
é efetivamente realizado, ajuda a manter a integridade
estrutural e o funcionamento corporal e emocional,
contribuindo para o equilíbrio humano.
Diante da percepção da dificuldade que o cliente
portador de seqüela de AVE tem de se autocuidar,
foi desenvolvido este estudo, tendo como base o caso
clinico da cliente CMCA, residente na cidade de Andrelândia – MG, a qual veio sofrendo recidivas de AVE, no
total de quatro episódios na atualidade. A cliente possui
hipertensão severa, tendo sofrido isquemia cerebral em
lobo esquerdo há dez anos com seqüelas. Apresentou
no teste ergométrico, isquemia miocárdica, com déficit
de contratilidade no ventrículo esquerdo, pelo ecocardiograma. Em fevereiro de 2000, apresentou novo
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episódio isquêmico cerebral direito, persistindo a lesão
antiga no lado esquerdo. Atualmente faz tratamento
para hipertensão arterial e isquemia cerebral, apresenta
hemiplegia, disfagia, ataxia e dislalia crônica. Mesmo
assim a cliente é capaz de desenvolver diversas funções
psicomotoras, tais como: trocar-se, alimentar-se, usar
o toalete, deambular, levantar-se, sentar-se e banhar-se
com auxílio; estando à mesma classificada no Padrão
de Atividade e Capacidade de Autocuidado como:
necessidade de auxilio de outros, segundo a primeira
taxionomia da NANDA [5].
Materiais e métodos
Estudo teórico reflexivo, com abordagem
qualitativa, tendo como suporte teórico, a Teoria
do Autocuidado de Orem apud George & Júlia
[3], para o alcance do objetivo proposto. Desse
modo, as autoras procuraram demonstrar que com
o incentivo ao autocuidado e à interação familiar,
é possível adaptar o cliente portador de seqüela de
AVE, às suas limitações, de uma maneira saudável,
visando a promoção de uma melhor qualidade de
vida, através da técnica de observação participante,
além do depoimento de uma cliente acometida de
AVE, e das observações de seus familiares.
A referida cliente, CMCA, sexo feminino, 54
anos, residente na cidade de Andrelândia, MG, casada, quatro filhos, escolaridade 1º. grau, raça branca,
classe média, portadora de seqüela de AVE há cinco
anos. Para efeito deste estudo, instituiu-se o Processo
de Enfermagem, direcionado pela sistematização da
assistência proposta pela NANDA [5], que analisa
a importância da participação família no processo
de superação das limitações, e na implementação de
medidas que minimizaria a dependência da cliente
para com os cuidados básicos necessários a manutenção do seu bem estar.
Conforme preconiza Minayo [6], a pesquisa
qualitativa responde questões muito particulares. Ela
se preocupa com um nível de realidade que não pode
ser quantificado. Trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes,
o que corresponde a um espaço profundo das relações,
dos processos e dos fenômenos que não podem ser
reduzidos à operacionalização de variáveis.
Aspecto ético da pesquisa
Os dados foram extraídos de depoimentos dos
familiares e da própria cliente, para confirmação de
sua situação como portadora de seqüela de AVE e
também para se conhecer seu ponto de vista com
relação à doença e às suas próprias limitações. A
observação participante, devidamente registrada
em um diário de campo, mostrou-se de grande importância para que se pudessem atingir os objetivos
propostos.
Após a concordância dos participantes e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido,
foi iniciada a observação e a interação com os familiares, tendo como foco os sentimentos e percepções
da pessoa acometida por AVE, a influência dos familiares no processo de reabilitação, a dependência
para a realização das atividades diárias geradas pela
ocorrência do AVE, as perdas funcionais e sensoriais
ocasionadas pelo AVE; alterações na auto-imagem
e auto-estima; o AVE como fator impeditivo para
o desempenho de atividades profissionais e sociais.
Sujeito do estudo
A cliente escolhida para o desenvolvimento
do presente estudo, foi vítima de três episódios de
AVE, no entanto o terceiro, foi o mais grave, comprometendo os dois hemisférios craniano direito e
esquerdo, após o qual, sua vida se modificou.
Dados obtidos da observação participante e da
interação familiar
CMCA é hipertensa grave, com insuficiência
cardíaca, apresentando varizes em membros inferiores. É casada há trinta e oito anos, mora com o
esposo e dois filhos. Sua casa tem onze cômodos,
possui condições hidrosanitárias satisfatórias, boa
iluminação e estrutura física adequada para uma
pessoa acometida por AVE, sendo necessário apenas,
a instalação de acessórios, como barras de segurança
no banheiro e piso antiderrapante.
Antes de ser acometida, CMCA tinha como
hábito, acordar pela manhã, fazer o café, trocar-se
e ir ajudar seu esposo no açougue da família, em
frente a casa. No dia treze de fevereiro de 2000,
um domingo, sua filha mais nova foi abruptamente
acordada pelo irmão, que alegava que a mãe ainda
não havia despertado e que já era bem tarde, em
relação ao horário que ela costumava levantar-se. A
filha mais nova preocupou-se e foi até o quarto de
CMCA, notando sua ausência, foi até o banheiro
e encontrou CMCA caída, totalmente imóvel.
Não respondia a estímulos verbais, porém estava
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consciente e acordada. Durante o episódio, seus
familiares mantiveram comunicação não verbal
com ela através “do piscar dos olhos”, e constataram ausência de qualquer tipo de dor que a cliente
eventualmente pudesse estar sentindo. A filha mais
nova recém egressa do curso técnico de enfermagem,
aferiu a pressão arterial da mãe, obtendo o resultado
de 120 x 80mmHg, pulso 80btm/min e respiração
de 20 irpm. Sem saber o que estava acontecendo,
ofereceu água para CMCA e constatou que ela não
estava conseguindo deglutir.
Passado algum tempo sem saber o que fazer e
sem nenhuma ajuda especializada, já se suspeitava
ser um quadro de AVE. Posteriormente, a cliente foi
vista pelo cardiologista da família, que relatou ser a
crise passageira, tendo administrado medicamentos
endovenosos. A família revezou-se nos cuidados a
CMCA, durante o período, administrando alimentos, medicamentos e líquidos através de uma seringa
que era introduzida na boca da cliente de forma
empírica. Durante aquela noite, permaneceram em
sua companhia e observaram que ela não recuperava
suas habilidades psico-motoras. Após este episódio,
foi encaminhada para internação no hospital da
cidade vizinha, onde havia maiores recursos, lá foi
medicada, permanecendo internada por um período
de dois meses.
Contrariamente ao que enfatiza Laurenti apud
Machado [7], ao mencionar a importância de médicos e enfermeiros oferecerem suporte educacional
e emocional a familiares de clientes em situações
críticas, neste hospital, a família de CMCA relatou
não ter recebido dos profissionais de saúde, nenhuma informação nem orientação quanto à doença e
condições gerais da cliente, conforme se pode extrair
de suas falas:
“Em momento algum houve explicação
do que era a doença e de como deveríamos
proceder diante dela. Apenas foi mencionado que ela apresentava um prognóstico
de 20% de chance de conseguir sentar-se
na cama e que o caso era muito grave, não
havendo o que fazer a não ser esperar uma
resposta dos medicamentos.”
Lima [2], concorda com Laurenti apud
Machado [7], quando explica a importância da
informação e da interação dos profissionais de
saúde com a família, no processo de reabilitação de
clientes acometidos de AVE. Diante dessas evidên-
cias, observa-se as deficiência do serviço de saúde
e dos profissionais envolvidos no caso em questão,
quanto a este aspecto tão relevante, pois segundo
os depoentes, sequer foi mencionada a importância
da adaptação e reestruturação do espaço domiciliar
para a nova realidade de vida da cliente.
De acordo com a teoria da motivação humana
de Maslow apud Horta [ 8] e tomando como referência a teoria de Orem, estas questões deveriam ser
minuciosamente explicadas à família pela enfermagem, através do estabelecimento de um plano de alta
hospitalar. Também durante a internação, deveria
ter sido ressaltada a importância de se incentivar a
cliente para conquistar a sua independência fisiológica; e de nunca fazer por ela, aquilo que se sentisse
capacitada para fazer por si mesma.
É sabido ser um direito do cliente, conhecer seu
diagnóstico e participar do tratamento e do plano
terapêutico, ações estas que se expressam através do
cuidado, tendo como referência o respeito ao ser
humano enquanto cidadão: “Cidadão com direitos
e deveres, que pode e deve exigir cuidados qualificados
e/ou recusá-los, quando se sentir pressionado ou em
risco. É o que participa dos cuidados prestados pela
enfermagem ou aceita quando não pode fazê-lo. É
aquele que se encontra sob a responsabilidade da
enfermagem”. Assim se expressa Figueiredo [9] ao
conceituar o termo cliente.
Segundo Lima [2], estudos demonstram que
um ambiente enriquecido para a recuperação e
aprendizagem estimula o cérebro a adaptar-se e
organizar-se o mais precocemente possível após a
lesão por AVE, permitindo ao cliente um retorno
às suas funções o mais independente possível. Esta
autora nos lembra que para este processo ser efetivo,
as adaptações propostas devem respeitar a ética e a
estética do usuário.
Ao final da internação CMCA surpreendeu as
expectativas, pois já conseguia permanecer de pé.
Em seu domicílio, começou a andar com o auxílio
de outrem, levantava-se sozinha da cadeira, fazia
pinçamento com os dedos, balbuciava algumas
palavras, tendo retornado em sua face alguns sinais
de expressão. Progressivamente notava-se uma nova
conquista a cada dia e o incentivo familiar não a
deixava desistir por nenhum momento.
Boff [10] ao divagar sobre o cuidado, nos diz
que “é do time de gotinhas que se forma o mar e é pela
motivação de cada gotinha, que se formam as ondas”.
Traçando um paralelo entre suas reflexões e este estudo de caso, pode-se inferir, que a principal “gotinha”
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do processo, foi a automotivação de CMCA, através
do constante cuidado e carinho de sua família, o que
a levou a alcançar a atual qualidade de vida. Hoje,
cinco anos após aquele terceiro episódio de AVE,
ela já consegue vestir-se, alimentar-se, cumpre os
horários medicamentosos rigorosamente, ajuda nos
afazeres domésticos mais simples, como cozinhar,
lavar louça e cuidar de plantas. Locomove-se com
dificuldade, porém sem o auxílio de bengalas ou
andadores, precisa de auxílio apenas para banhar-se,
subir e descer escadas, fala com dificuldade, mas há
comunicação verbal, com compreensão tanto do
receptor quanto do informante.
Para melhor compreensão das limitações de
Dona CMCA foi proposto o diagnóstico de enfermagem segundo a NANDA [5], que define esta
etapa da sistematização da assistência, da seguinte
forma: “diagnóstico de enfermagem é o julgamento
clínico sobre as respostas do indivíduo, da família
ou da comunidade, dos problemas de saúde/processos
vitais, ou potenciais. O diagnóstico proporciona base
para a seleção das intervenções de enfermagem, visando
o alcance de resultados pelos quais a enfermagem é
responsável”.
Diagnósticos de enfermagem estabelecidos para
a cliente CMCA:
• Deglutição prejudicada relacionada a prejuízos
neuromusculares, a tossir e sufocar; caracterizado por evidência observada de dificuldade para
deglutir.
• Deambulação prejudicada relacionada a nível
zero; caracterizada pela incapacidade de subir
escadas, andar em declive ou aclive e superfícies
irregulares.
• Mobilidade física prejudicada relacionada à força, prejuízos neuromusculares; caracterizada por
amplitude limitada de movimentos, dificuldade
para virar-se, lentidão e mudança no padrão da
marcha.
• Comunicação verbal prejudicada, relacionada a
déficit na circulação cerebral; caracterizada por
fala e verbalização dificultada para expressar seus
pensamentos.
• Risco de baixa auto-estima relacionado à imagem
corporal perturbada, prejuízo funcional e doença.
De acordo com a Sistematização da Assistência
de Enfermagem, o passo seguinte consiste em estabelecer a prescrição dos cuidados de enfermagem e
após, avaliar sua implementação.
Citamos neste artigo um exemplo de prescrição
e avaliação de enfermagem, proposto para o caso de
CMCA, tomando como base o seguinte diagnóstico, à luz dos preceitos estabelecidos pela Teoria de
Dorothea Orem:
Mobilidade física prejudicada relacionada à
força, prejuízos neuromusculares; caracterizada por
amplitude limitada de movimentos, dificuldade
para virar-se, lentidão e mudança no padrão da
marcha.
Prescrição de Enfermagem: Aprazamento:
Constante
Oferecer apoio físico à cliente, para que ela se
levante ao invés de levantá-la;
Oferecer calçados confortáveis com solados
anti-derrapantes para facilitar a deambulação;
Incentivar a mudança de decúbito enquanto a
cliente estiver acordada;
Incentivar pequenas tarefas domésticas para
trabalhar a musculatura esquelética.
Avaliação:
Os resultados foram positivos pois CMCA
apesar de apresentar lentidão, possui amplitude de
movimentos satisfatória. Note-se que neste diagnóstico, a prescrição é enfocada na participação direta da
cliente nos cuidados, o que não seria possível, sem a
utilização da Teoria de Dorothea Orem. É importante observar, que a implementação dos cuidados será
validada pela participação da cliente no autocuidado,
pois se houver uma recusa dela na implementação
da prescrição, os cuidados de enfermagem não serão
possíveis. Isto demonstra a importância e necessidade
do constante incentivo desses clientes para o autocuidado por parte da enfermagem.
Em uma visão cognitiva, podemos observar que
CMCA não perdeu a percepção de atentar para os
fatos da atualidade, pois consegue dar notícias do que
acontece no Brasil e no mundo através do noticiário
da TV, acompanha novelas, guarda os nomes dos
personagens e conta os episódios diários, sabendo
assim identificar os horários e dias da semana, voltou
também a desenvolver sua capacidade para escrever.
Podemos concluir que apesar das limitações
que CMCA vive todos os dias, ela consegue administrá-las com humor, tendo conquistado uma boa
qualidade de vida.
Dados obtidos do depoimento da cliente
A entrevista foi realizada de maneira informal,
de modo a deixar a cliente à vontade para se expres165
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sar, observando-se durante o processo, a técnica de
comunicação terapêutica, que ressalta dentre outras
características, a importância do ouvir atento, manter a cronologia e a lógica do diálogo, clarificando as
idéias expressas pela cliente, ajudando-a a verbalizar
seus sentimentos. Procurou-se captar a linguagem
não verbal, que no entender de Cianciarullo [11]:
“São gestos importantes no ato de se comunicar, geralmente faciais, posturais ou manuais, e servem para
enfatizar ou demonstrar sentimentos positivos ou
negativos subjacentes”.
Sentada em uma poltrona confortável, CMCA
acabara de sair do banho, se encontrava bem vestida
com uma calça preta, camisa estampada em cores
de tom vermelho, calçava uma sapatilha e tinha os
cabelos penteados; colocou as mãos entre as pernas
demonstrando timidez.
Ao se tocar no assunto de sua patologia de forma direta, relatou que não saberia dizer nada sobre
a situação, porém, quando a conversa tornou-se
informal, aos poucos foi relatando o que sentia e o
que pensava sobre suas dificuldades e condição:
“Me sinto mais lerda do que antes... esqueço das coisas que vou falar. Eu antes,
trabalhava em casa e ajudava meu marido, fazia de tudo, e a tarde, ainda fazia
caminhada...”
As alterações na auto-imagem, na auto-estima
e no desempenho das atividades sociais, foram percebidas através da seguinte fala:
”Eu gosto de sair, só que sinto vergonha das
pessoas me olhando, porque eu ando feio e
elas não entendem o que eu falo...”.
Observou-se que sua maior facilidade está em
lavar, enxugar louças e trocar de roupas, mas quanto
a isso, a cliente deixou claro que:
“O difícil é abotoar os botões da camisa”.
Foi questionado o que CMCA mais gosta de
fazer e ela respondeu:
“Gostaria de poder andar a cavalo para
melhorar o meu equilíbrio e de fazer
fisioterapia na água... já ouvi falar que
é bom”.
Expressou seus sentimentos de forma clara,
emocionando-se ao referir-se aos cuidados recebidos
pela família, demonstrando o valor da fé e do amor
estabelecidos nesta relação:
“Meus filhos cuidam de mim muito bem e
eu não tenho nada que reclamar deles, só
a fé e o amor dos filhos é que nos dão força
para lutar...”.
Conclusão
A convivência com CMCA durante a assistência prestada no constante processo de reabilitação do
AVE, trouxe muitas reflexões e indagações sobre as
implicações dessa doença crônica no cotidiano dos
clientes e de seus familiares. Sentimentos de vergonha, impotência e incerteza diante da possibilidade
da morte foram observados, em contrapartida, a
força de vontade e a motivação familiar e o incentivo
ao autocuidado, foram elementos importantes para
que CMCA evoluísse bem, dentro de seu quadro.
Observou-se que embora a família não tivesse
recebido dos profissionais de saúde orientação e
suporte adequados, houve um esforço conjunto no
sentido de superação do pragmatismo e do empirismo. Esta preocupação os impulsionou para a busca
de conhecimentos e fez com que CMCA despertasse
para o autocuidado.
Pode-se perceber neste estudo, a importância
da implementação da Sistematização da Assistência
de Enfermagem, conforme ressalta Lacerda [12],
para que se possa identificar as reais necessidades do
cliente acometido por AVE, possibilitando trabalhar
com a família os pontos a serem estimulados para
o autocuidado. Nessa perspectiva, acredita-se que a
prática do estímulo ao autocuidado, só será possível quando se possuir um serviço de enfermagem
organizado, com profissionais motivados para o
exercício dessa prática.
Segundo Leopardi [13], nos dias atuais, a
identidade do enfermeiro está confusa e limitada a
atendimentos burocráticos de enfermagem, distanciando-o de seu papel de educador e facilitador do
processo de autocuidado dos seus clientes. Quanto
a isso, a recente Portaria nº 1161, de 7 de julho de
2005 [14], vem acrescentar novos rumos à reabilitação de clientes acometidos por AVE, por instituir
uma Política Nacional de Atenção ao Portador de
Doença Neurológica, a ser implantada em todas as
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unidades federadas. A observância a esta portaria
evitará a quebra do elo do atendimento de enfermagem na alta do cliente, considerando a necessidade
de ações educativas e preventivas e visando a diminuição de traumas e seqüelas.
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Revisão
Considerações gerais sobre
o envelhecimento brasileiro
Teresa Cristina Prochet, M.Sc.*, Tânia Ruiz D.Sc.**, Ione Correia, D.Sc.***
*Enfermeira do Núcleo de Epidemiologia e do Ambulatório do Hospital Regional de Assis e Docente do Centro Paula Souza
- Unidade Assis, **Médica do Departamento de Saúde Pública da Faculdade de Medicina de Botucatu, ***Enfermeira, Profª do
Departamento de Enfermagem da Faculdade de Medicina de Botucatu
Resumo
A população brasileira vem envelhecendo de forma rápida nas últimas décadas, estreitando progressivamente a base da pirâmide
populacional. Este crescimento refletiu nos serviços de saúde, trazendo novas demandas gerenciais e assistenciais para o idoso
e para sua família, bem como para a equipe de enfermagem que presta o atendimento. Os objetivos principais desta revisão
foram explicitar como que o processo de envelhecimento aconteceu e tecer algumas considerações sobre a política voltada
ao idoso. Conclui-se que a terceira idade possui características específicas no âmbito de saúde, isso faz com que todos sejam
sujeitos e agentes de saúde. Essa visão abre espaços e possibilidades para o desenvolvimento de novas experiências, no caso o
cuidado com o idoso. Considerar o envelhecimento com múltiplas dimensões que abrangem questões de ordem social, política,
psicológica, biológica, espiritual, cultural e econômica constituem verdadeiras balizas para que a equipe de enfermagem possa
proporcionar uma assistência humanizada e que respeita a integralidade do processo de cuidar.
Palavras-chave: idoso, envelhecimento, estatuto do idoso, gerontologia.
Abstract
General consideration about Brazilian aging
Brazilian population has been aging in a fast way in the last decades, narrowing gradually the base of the populational
pyramid. This growth has been reflected in the health services, bringing new managerial and assistance demands for the elder
and his/her family, as well for the nursing team that assists him/her. The main objectives of this revision have been to explain
how the aging process has happened and to bring up same considerations over the policies directed to the elder. It comes to
the conclusion that the elders possess specific characteristics within the health scope, making all citizens agents of heath. This
vision opens spaces and possibilities for the development of new experiences, in the case of the care with the aged one. To
consider the aging as having multiple dimensions that enclose questions of social political, psychological, biological, spiritual,
cultural and economical orders constitute true foundations for the nursing team to be able to provide a humanized assistance
that respects the completeness of the process of taking care of and giving assistance.
Key-words: elderly, aging, statute of elderly, gerontology.
Artigo recebido em 19 de setembro de 2005; aceito em 10 de maio de 2006.
Endereço para correspondência: Teresa Cristina Prochet, R. Sebastião da Silva Leite
243,19814-370 Assis SP, Tel.(018) 3322-6721, E-mail: [email protected]
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Resumen
Consideraciones generales sobre la vejez brasileña
La población brasileña viene envejeciendo de forma rápida en las últimas décadas, estrechando progresivamente la base de la
pirámide poblacional. Este crecimiento reflejó en los servicios de salud, trayendo nuevas demandas gerenciales y asistenciales
para la persona de edad y para su familia, bien como para el equipo que les presta atención de enfermería. Los objetivos
principales de esta revisión fueron explicitar cómo que el proceso de vejez ocurrió y tejer algunas consideraciones sobre la
política relacionada a la persona de edad. Se concluye que la tercera edad posee características específicas en el ámbito de salud,
eso hace con que todos sean sujetos y agentes de salud. Esa visión abre espacios y posibilidades para el desenvolvimiento de
nuevas experiencias, en el caso el cuidado con los mayores. Considerar la vejez con múltiplas dimensiones que comprenden
cuestiones de orden social, política, psicológica, biológica, espiritual, cultural y económica constituyen verdaderas balizas
para que el equipo de enfermería pueda proporcionar una asistencia humanizada y que respecta la integración del proceso
de cuidar.
Palabras-clave: anciano, vejez, estatuto del anciano, gerontología.
Introdução
As questões relacionadas ao envelhecimento
humano sempre foram alvo de preocupações, fomentando vários estudos a respeito da temática.
O aumento expressivo da longevidade, obtido no
século passado, sem dúvida pode ser visto como um
importante indicador de sucesso da humanidade,
e também como um grande desafio para a nossa
sociedade [1].
A melhoria do padrão de saúde de um povo
não é a medida apenas pelo aumento da longevidade
das pessoas. O padrão de saúde eleva-se na medida
em que a longevidade é acompanhada por ausência
de doenças e de sofrimentos evitáveis, por conforto
e por autonomia.
No Brasil, as políticas de saúde pública desencadeadas a partir das primeiras décadas do século
XX, resultaram no aumento da expectativa de vida
da população brasileira, mas isto não significa dizer
que houve melhoria na qualidade de vida dos idosos [2]. Até porque o Brasil possui um contexto de
acentuadas desigualdades regionais e sociais, o que
interfere diretamente no alcance da tão esperada
qualidade de vida.
Infelizmente os idosos ainda não encontram
amparo adequado no sistema público de saúde e
previdência e acabam por acumular seqüelas de
doenças, desenvolvendo incapacidades, perdendo
autonomia e comprometendo a própria qualidade
de vida [3].
Lê-se e fala-se muito sobre o envelhecimento como fato, porém muitos de nós
desconhecemos os verdadeiros motivos pelos
quais esse acontecimento se deu e, o mais
lamentável é saber que os serviços de saúde,
por inúmeros motivos não se prepararam
adequadamente para essa realidade [1].
O propósito desse artigo é apresentar uma breve revisão sobre a dinâmica da transição demográfica
e epidemiológica do envelhecimento ocorrido no
Brasil e divulgar uma das maiores conquistas políticas, o Estatuto do Idoso.
Reflexões sobre o envelhecimento brasileiro
A população brasileira vem envelhecendo de
forma rápida desde o início da década de 1960.
Fatores como a redução da mortalidade geral e, em
especial, a mortalidade infantil, a diminuição do
índice da fecundidade e o aumento da expectativa
de vida estreitaram progressivamente a base da
pirâmide populacional, fazendo aumentar a população idosa brasileira. Esse crescimento ocorreu de
forma acelerada e possui características diferentes da
experimentada pelos países desenvolvidos. Políticas
públicas foram afetadas, trazendo novas demandas
para o Estado, à sociedade e à família [3-5].
O último censo realizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística revelou
que o número de pessoas com sessenta anos ou de
mais idade se aproxima de 14 milhões [6]. Atribuise esta população como conseqüência da transição
demográfica e da transição epidemiológica. A primeira foi determinada inicialmente pela redução da
taxa de mortalidade e posteriormente pela taxa de
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fecundidade e a segunda, ocorrida graças às alterações nos padrões de saúde-doença e nas interações
desses padrões com seus determinantes de ordem
demográfica, epidemiológica, econômica e sociológica [5,7,8].
Transição demográfica
A questão demográfica é bastante complexa no
Brasil. Constata-se que os fatores demográficos, que
denotam a incidência cada vez mais representativa
do contingente de idosos no Brasil, referem-se à
queda nos índices de natalidade e fecundidade nos
últimos anos. Tem relação nítida também com o
aumento da expectativa de vida, decorrente, dentre
outros fatores, dos avanços registrados na área do
saneamento e na saúde.
Pode-se afirmar que no Brasil, o declínio da
mortalidade, que deu início à transição demográfica,
foi determinado mais pela ação médico-sanitária do
Estado do que por transformações estruturais que
pudessem se traduzir em melhoria da qualidade de
vida da população [7]. Essas transformações, nas
primeiras décadas do século XX, foram promovidas por políticas urbanas de saúde pública como
vacinação, higiene pública e outras campanhas sanitárias e, a partir da década de 40, pela ampliação
e desenvolvimento tecnológico da atenção médica
na rede pública.
Infelizmente os ganhos com as ações sanitárias
implementadas, no Brasil, não interferiram na desigualdade da distribuição de renda e de serviços.
Verifica-se então, que nos grandes centros urbanos
das regiões sudeste e sul e nas camadas mais altas
de renda, as oportunidades de enfrentar o envelhecimento com saúde, conforto, dignidade são
ilimitadamente maiores do que nos lugares mais
afastados e sem infra-estrutura.
Em decorrência das carências nutricionais,
sanitárias, educacionais, habitacionais, provocadas
pelos desequilíbrios sociais e regionais do desenvolvimento brasileiro, depara-se com um problema sério
e lamentável: o envelhecimento desamparado.
É ele que faz com que, cronologicamente, o
prolongamento da vida se expanda nas camadas
sociais elevadas, chegando à esperança de vida de
70 a 80 anos em média, enquanto se mantém em
patamares críticos, de 40 a 50 anos, nas camadas e
regiões de baixa renda [6].
Uma outra questão que merece destaque é
que o aumento biológico do percurso de vida da
população tem se dado não por conquistas sociais,
políticas, econômicas ou culturais como se gostaria,
mas, sim pela difusão dos benefícios farmacêuticos,
médicos e sanitários. Isso não está ao alcance fácil de
todos, somente de alguns, os idosos privilegiados,
que acabam por obter essa condição [9].
De um modo geral, a autonomia biológica
tende a encontrar maiores e melhores meios de
preservação e exercício nas camadas médias e altas.
Já na camada social e economicamente mais baixa
a autonomia biológica se reduz drasticamente, em
virtude da ausência de cuidados médico-sociais e
em conseqüência de uma vida de privações, que não
permite a conservação da saúde [10].
Transição epidemiológica
Além das transformações demográficas descritas anteriormente, o Brasil tem experimentado uma
transição epidemiológica. Transição epidemiológica
é o conceito que se refere às modificações, ao longo
prazo, dos padrões de morbidade, invalidez e morte
que caracterizam uma determinada população. Em
1950, o quadro de morbimortalidade por doenças
infecto-contagiosas representava 40% das mortes
registradas no País, hoje são responsáveis por menos
de 10% [11,12]. O oposto ocorreu em relação às
doenças cardiovasculares: em 1950, eram responsáveis por 12% das mortes e, atualmente, representam
mais de 40%. Portanto, em menos de 40 anos, o
Brasil passou de um perfil de morbimortalidade típico de uma população jovem, para um caracterizado
por enfermidades crônicas, próprias das faixas etárias
mais avançadas, com custos diretos e indiretos mais
elevados [12].
Essa mudança no perfil epidemiológico acarreta grandes despesas com tratamentos médicos e
hospitalares, ao mesmo tempo que se configura num
desafio para as autoridades sanitárias, em especial
no que tange à implantação de novos modelos e
métodos para o enfrentamento do problema. O
idoso consome mais serviços de saúde, as internações hospitalares são mais freqüentes e o tempo
de ocupação do leito é maior do que o de outras
faixas etárias. Em geral, as doenças dos idosos são
crônicas e múltiplas, perduram por vários anos e
exigem acompanhamento médico e de equipes
multidisciplinares permanentes e intervenções
contínuas [9,12].
A maioria das doenças crônicas que acometem o indivíduo idoso tem, na própria idade, seu
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principal fator de risco. Envelhecer sem nenhuma
doença crônica é mais exceção do que regra. No
entanto, a presença de uma doença crônica não
significa que o idoso não possa gerir sua própria vida
e encaminhar o seu dia-a-dia de forma totalmente
independente [9].
No Brasil a transição epidemiológica tem características próprias quando comparada ao modelo
experimentado pela maioria dos países industrializados e mesmo pelos vizinhos latino-americanos
como Chile, Cuba e Costa Rica. As características
do modelo brasileiro se desenvolvem em quatro
etapas distintas, assim explicadas por Camargo &
Yasaki [13]:
“a) não há transição e sim superposição entre
as etapas onde predominam as doenças transmissíveis
e crônico-degenerativas; b) a reintrodução de doenças
como dengue e cólera, ou o recrudescimento de outras
como a malária, hanseníase e leishmanioses indicam
uma natureza não unidirecional denominada contratransição; c) o processo não se resolve de maneira clara,
criando uma situação em que a morbi-mortalidade
persiste elevada por ambos os padrões, caracterizando
uma transição prolongada; d) as situações epidemiológicas de diferentes regiões em um mesmo país
tornam-se contrastantes podendo ser chamadas de
polarização epidemiológica” [15].
Processo de envelhecimento e a promoção do
envelhecimento saudável
O envelhecimento não pode ser considerado
uma etapa da vida e sim um processo permanente
a partir de um determinado momento da vida das
pessoas. O envelhecimento é um processo amplo,
podendo ser definido de maneiras diferentes, dependendo do campo da pesquisa e do objeto de
interesse [16].
O envelhecimento é um fenômeno comum
a todos os animais e se caracteriza não apenas pela
redução da capacidade de adaptação homeostática,
perante situações de sobrecarga funcional do organismo, mas também pelas condições de vida e saúde.
Portanto, o envelhecimento é um processo extremamente complexo que acarreta várias modificações
profundas e significativas. Possui uma dimensão
existencial como todas as situações humanas, modifica a relação do homem com o tempo, com o
mundo e com a própria história [15].
Desde o 1º Congresso Internacional sobre a
Promoção da Saúde, realizado em Ottawa no ano
1986, e do qual resultou o documento conhecido
como Carta de Ottawa, a Organização Mundial da
Saúde (OMS), impulsionada por inúmeros estudos
referentes à promoção de saúde, tem colocado as
estratégias de promoção da saúde como um meio
capaz de unir forças das organizações governamentais e voluntárias para a conquista da Saúde para
todos [16].
No Brasil, o tema “Promoção da Saúde” vem
ganhando força a partir das mudanças na política de
saúde nos anos 80, que culminaram na Lei Orgânica
da Saúde (1990) e na concepção do Sistema Único de
Saúde (SUS). Fundado em princípios como integralidade da atenção e participação popular, o modelo
assistencial preconizado no SUS, tem como referência o conceito ampliado de saúde e busca reverter
a predominância do enfoque curativo e hospitalocêntrico da política de saúde do país, valorizando a
prevenção e a promoção da saúde [9,10].
A promoção do envelhecimento saudável e a
manutenção da máxima capacidade funcional do
indivíduo que envelhece, pelo maior tempo possível
– foco central desta Política – significa a valorização
da autonomia ou autodeterminação e a preservação
da independência física e mental do idoso. Tanto
as doenças físicas quanto as mentais podem levar
à dependência e, conseqüentemente, à perda da
capacidade funcional [17].
Na análise da questão relativa à reabilitação da
capacidade funcional, é importante reiterar que a
grande maioria dos idosos desenvolve, ao longo da
vida, algum tipo de doença crônica decorrente da
perda continuada da função de órgãos e aparelhos
biológicos. Essa perda de função pode ou não levar a
limitações funcionais que, por sua vez, podem gerar
incapacidades, conduzindo, em última instância, à
dependência da ajuda de outrem ou de equipamentos específicos para a realização de tarefas essenciais
à sobrevivência no dia-a- dia [9].
Nos últimos vinte anos, o conceito de promoção da saúde vem sendo apontado como marco
para as políticas de saúde em nível mundial. A idéia
expressa no conceito é relativamente antiga e origina-se do reconhecimento de que para a obtenção e
manutenção da saúde é necessário oferecer à população boas condições de vida, de trabalho, educação,
cultura, condições físicas, lazer e descanso [18].
A promoção da saúde surgiu da Educação para
a Saúde, em um processo que evoluiu de acordo
com a ênfase dada a determinadas ações ao longo
da história da saúde pública. Atualmente a perspec171
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tiva baseia-se em uma visão integrada e ecológica da
saúde pública, na qual não há separação do indivíduo e o meio, considerados um todo. Reforça-se a
necessidade de “marcar metas para la acción política
y no solo para el comportamiento individual” [19].
O objetivo é a criação de um clima favorável à
saúde, viabilizado por meio do restabelecimento dos
laços existentes entre saúde e bem-estar social, entre
a qualidade de vida coletiva e individual.
Promover o envelhecimento saudável é uma
tarefa complexa que envolve a conquista de uma boa
qualidade de vida e o amplo acesso aos serviços que
possibilitem lidar bem com as questões do envelhecimento, com base no conhecimento hoje disponível.
É vital, também, ampliar a consciência sobre a saúde
e o processo de envelhecimento, ao mesmo tempo
fortalecendo e instrumentalizando a população em
suas lutas por cidadania e justiça social [9,10,16].
Política voltada ao idoso: uma conquista para
todos
Neste contexto, é oportuno ressaltar que em
1988, durante a VIII Conferência Nacional de
Saúde, foi apresentado o Programa sobre Política de
Envelhecimento. Em 1992, o Ministério da Saúde
criou o Programa de Atenção à Saúde do Idoso e,
alguns Estados, por meio de suas Secretarias de
Saúde, não só implantaram como implementaram
o referido programa. Tais ações foram importantes,
porém, havia ainda a necessidade de uma legislação
específica para o idoso. Em 1994, houve a aprovação
da Lei nº 8.842, elaborada com base nos princípios
e diretrizes da Constituição Federal, a fim de direcionar ações nas áreas de saúde, educação, trabalho,
previdência social, habitação, urbanismo, justiça,
cultura, esporte e lazer. Essa lei foi regulamentada
pelo Decreto nº 1.948, de 03 de julho de 1996, que
dispõe sobre a Política Nacional do Idoso (P.N.I.)
e cria o Conselho Nacional do Idoso, com objetivo
de assegurar os direitos sociais às pessoas maiores
de sessenta anos, criando condições para promover
sua autonomia, integração e participação efetiva na
sociedade [12,20].
Em 1996, tal política passa a integrar o Programa Nacional de Direitos Humanos, cujo princípio
valorizado é o fato de que o envelhecimento diz
respeito à sociedade como um todo, e que reforça
a importância de se garantir direitos de cidadania
e de proteger os idosos de quaisquer formas de
discriminação [12].
Em meados de 1997, o Ministro da Previdência e Assistência Social consolidou parcerias com
organizações de idosos para editar o Plano Integrado
de Ação Governamental. Em dezembro de 1999,
pelos esforços do Grupo de Atenção Integral à Saúde
do Idoso, do Ministério da Saúde, publicou-se a
Portaria nº 1.395, que aprovou o Desenvolvimento
da Política Nacional do Idoso (PAG–PNI), determinando que os órgãos e entidades ligadas àquele
Ministério teriam que promover e elaborar ou mesmo adaptar planos, programas e projetos voltados à
saúde do idoso, fortalecendo assim a P.N.I.
O Programa Nacional de Saúde do Idoso é um
detalhamento da P.N.I. e tem como objetivo promover
a saúde do idoso, possibilitando, ao máximo, sua expectativa de vida ativa na comunidade, junto à família, e
com níveis altos de função e autonomia [21,22].
A P.N.I é regida por vários princípios, e dentre
eles, o de que a família, a sociedade e o Estado possuem o dever de assegurar ao idoso todos os direitos
da cidadania, de que o processo de envelhecimento
diz respeito à sociedade em geral e, ainda, de que
o idoso não deve sofrer discriminação de qualquer
natureza [22].
Vale ressaltar que a P.N.I. confere especial
destaque ao papel da família no cuidado e na manutenção da autonomia do idoso bem como reconhece
a importância da parceria entre os profissionais de
saúde e as pessoas que cuidam dos idosos. Aponta
ainda que esta parceria possibilita a sistematização
das tarefas a serem realizadas no próprio domicílio,
privilegiando aquelas relacionadas à promoção da
saúde, à prevenção de incapacidades e à manutenção da capacidade funcional do idoso dependente
e de seu cuidador. Defende que essa atitude evita,
na medida do possível, a hospitalização ou outras
formas de isolamento [9,23].
Para que a família possa oferecer um elo entre
o idoso e a sociedade ela precisa obter informações
sobre o processo de envelhecimento, inclusive saber
que este não é um processo homogêneo, e assim ser
preparada para realmente poder entender e cuidar
do seu idoso [2,9,24].
Mas é no ano 2004 que temos uma conquista
ainda maior - O Estatuto do Idoso. Ele assegura
a todas as pessoas, com idade igual ou superior a
sessenta anos, oportunidades e facilidades para a
preservação de sua saúde (física e mental), em condições de liberdade e dignidade. Fica determinado
que é obrigação da família, comunidade e do poder
público a garantia desses direitos [25].
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O Estatuto do Idoso assegura os seguintes
direitos: fundamentais, de medidas de proteção,
da política de atendimento ao idoso, do acesso à
justiça.
Nos direitos fundamentais são contemplados:
o direito à vida, à liberdade, ao respeito e à dignidade, ao alimento, à saúde, à educação, à cultura,
ao esporte e lazer; à profissionalização e trabalho; à
previdência e assistência social; à habitação e ainda
ao transporte.
No item do direito à saúde, dentre outras
conquistas, ficam explícitas:
• A garantia à saúde integral por intermédio do
SUS, com acesso universal e igualitário para a
prevenção, promoção, proteção e recuperação da
saúde;
• O fornecimento gratuito pelo poder público de
medicamentos de uso continuado, assim como
órteses e próteses e outros necessários ao tratamento, habilitação ou reabilitação são assegurados;
• O atendimento especializado aos portadores de
deficiência ou de limitações incapacitantes;
• A garantia de acompanhado integral e oferecimento de condições adequadas de permanência
[25].
Conclusões
O Brasil hoje desponta como um país cuja população encontra-se em rápido e inoxerável processo
de envelhecimento. O processo de envelhecimento
que sofre a população do terceiro Mundo, inclusive
o Brasil, distingue-se daquele dos países mais desenvolvidos. Pode-se afirmar que o rápido crescimento
de idosos no Brasil causa um impacto em toda a
sociedade, principalmente nos sistemas de saúde.
A infra-estrutura necessária para responder às demandas deste grupo etário em termos de instalações,
programas específicos e mesmo recursos humanos
adequados, quanti e qualitativamente ainda é, de
certo modo, precária.
Existem idosos que são saudáveis, independentes e capazes de gerir sua própria vida. Ainda assim,
por serem idosos, eles têm maior susceptibilidade
para adoecer do que adultos jovens. Daí a importância de conhecer, divulgar e desenvolver atividades
que promovam o envelhecimento saudável, modelo
este preconizado pela OMS e reafirmado pela Política Nacional do Idoso e pelo próprio Estatuto
do Idoso.
Diante disso torna-se imprescindível que os
serviços e programas de saúde estabeleçam políticas
eficientes em saúde a fim de oferecer a essa clientela (idoso e sua família) um suporte que garanta
a assistência integrada, satisfatória e de qualidade
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Relato de caso
O enfermeiro especialista no cenário de uma
unidade coronariana: um relato de experiência
Rafael Celestino da Silva*, Deyse Conceição Santoro, D.Sc.**
*Enfermeiro, Especialista em Cardiologia pela Escola de Enfermagem Anna Nery, Residente em Enfermagem Clínico-Cirúrgica
pelo Curso de Pós-Graduação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UNIRIO), Enfermeiro assistencial da Unidade
Coronariana do Hospital Servidores do Estado do Rio de Janeiro, ** Professora adjunta do Departamento de Enfermagem
Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem Anna Nery- Universidade Federal do Rio de Janeiro
Resumo
As Unidades Coronarianas se constituíram como um recurso fundamental das instituições de saúde, para atendimento a clientes
cardiopatas. Porém, esta assistência de alta complexidade requer uma equipe de enfermagem extremamente qualificada, capaz
de reconhecer as necessidades do cliente, e implantar intervenções que dêem conta de atendê-las com posterior avaliação das
mesmas. Trata-se de um relato de experiência acerca da percepção de um enfermeiro recém egresso de um Curso de Especialização
de Enfermagem em Cardiologia sobre a assistência prestada pelos profissionais de enfermagem aos clientes internados em uma
Unidade Coronariana. Durante experiência prática, percebi que os profissionais de enfermagem, com múltiplas atividades de
estudo e trabalho, apresentam dificuldades assistenciais, necessitando de um aperfeiçoamento técnico científico, visto que a
formação acadêmica não proporciona embasamento suficiente. O enfermeiro especialista precisa de maior reconhecimento
frente às chefias, quanto as suas qualificações e como membro capacitado para atuação em uma Unidade Coronariana.
Palavras-chave: especialização, cardiologia, enfermagem, percepção.
Abstract
The nurse specialist in the scene of a coronary care unit: an experience report
The Coronary Care Units are created as a basic resource for health institutions, to provide care to cardiac patients. However,
these units which provide high quality care require a qualified nursing team, capable of recognizing patients’ needs, and
to implant interventions that can be carried out and afterwards to make an evaluation of them. This paper consists of an
experience report based on a nurse, who recently concluded a Nursing Specialization Course in Cardiology about care given
by nursing professionals to patients admitted to a Coronary Care Unit. During practical experience, I understood that nursing
professionals, with multiple activities of study and work, have difficulty in supporting procedures, needing technical and
scientifical improvement, since student formation does not provide enough foundation. The nurse specialist needs recognition
in regards to his/her qualifications and as a member capable of providing care in a Coronary Care Unit.
Key-words: specialization, cardiology, nursing, perception.
Artigo recebido em 18 de janeiro de 2006; aceito em 27 de junho de 2006.
Endereço para correspondência: Rafael Celestino da Silva, Avenida Nossa Senhora de
Copacabana, 1181, 504, 22070-012 Rio de Janeiro RJ, E-mail: [email protected]
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Resumen
El enfermero especialista en el escenario de una Unidad Coronaria: un relato de
experiencia
Las unidades de Coronarias se constituyen como recurso básico de las instituciones de salud, para la atención a los pacientes
cardiópatas. No obstante, esta atención de alta complejidad requiere un equipo de enfermería altamente cualificado, entrenado
para reconocer las necesidades del paciente, e implantar intervenciones que puedan ser realizadas y con posterior evaluación.
Se trata de un relato de experiencia acerca de la percepción de un enfermaren recién egreso de un Curso de Especialización
de Enfermería en Cardiología sobre la atención prestada por los profesionales de enfermería a los pacientes ingresados en una
Unidad Coronaria. Durante experiencia práctica, percibí que los profesionales de enfermería, con múltiples actividades de
estudio y de trabajo, presentan dificultades asistenciales, necesitando de un perfeccionamiento técnico y científico, puesto
que la formación académica no proporciona un fundamento suficiente. El enfermero especialista necesita de un mayor
reconocimiento por parte de sus superiores, con respecto a sus cualificaciones profesionales y como miembro capacitado para
actuación en una Unidad Coronaria.
Palabras-clave: especialización, cardiología, enfermería, percepción.
Introdução
A Unidade Coronariana surgiu na década de
1980, fundamentalmente com o intuito de servir
como uma área especializada no atendimento a
pacientes portadores de Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) [1], posto que nela estaria assegurado o
pronto atendimento às arritmias fatais, em especial
a fibrilação ventricular, freqüente na fase aguda do
infarto e grande causa de morte até então.
De fato a criação desta unidade foi um marco
no tratamento do infarto, pois com o maior controle
das arritmias fatais houve uma redução significativa da mortalidade dos pacientes na fase aguda do
evento. A evolução tecnológica no que se refere a
equipamentos, esquemas terapêuticos guiado por
uma monitorização hemodinâmica mais refinada,
advento da terapia trombolítica, utilização do balão
intra-aórtico, entre outros, tem acentuado a importância da Unidade Coronariana. A centralização
destes recursos em uma determinada unidade resulta
na utilização mais eficiente por uma equipe treinada,
além de maior acesso a setores críticos, como laboratório de hemodinâmica e Centro Cirúrgico.
Neste contexto, no qual estão reunidos pacientes graves, complexidade tecnológica e necessidade
de utilização de uma racionalidade que vise o melhor
atendimento, no tempo adequado, com eficiência e
eficácia, o enfermeiro tem diante de si uma grande
responsabilidade. Por certo, o papel do enfermeiro
nas Unidades Coronarianas sempre foi ressaltado,
sendo destacada a importância do seu conhecimento
técnico científico, sua habilidade no relacionamento
interpessoal, que lhe conferem grande autonomia
para o desempenho de suas ações.
A Unidade Coronariana é uma unidade hospitalar especialmente desenhada, equipada, operada
por pessoal altamente qualificado e destinada a
proporcionar um ótimo cuidado para pacientes
com suspeita ou com Infarto Agudo do Miocárdio
confirmado [2]. Muitas instituições expandiram
a função da Unidade Coronariana, admitindo
também pacientes com edema agudo do pulmão,
arritmias não relacionadas com o Infarto Agudo do
Miocárdio e os que requerem marcapasso. Os principais objetivos no sistema de tratamento coronariano
são o de preservar vidas, evitar complicações e devolver aos pacientes a máxima capacidade funcional
cardiovascular, tanto na dimensão física quanto na
dimensão emocional.
O sucesso de uma Unidade Coronariana
depende, sobretudo, da competência da equipe de
enfermagem. Para o funcionamento eficiente de
uma Unidade Coronariana a proporção deve ser
de uma enfermeira para cada 2 ou no máximo 3
pacientes. Esta alta proporção de enfermeiros pode
ser inalcançável em muitos hospitais. Em tais casos,
enfermeiros sem treinos específicos podem ser empregados para assumirem as tarefas mais simples,
entretanto, é fundamental que pelo menos um
enfermeiro especialmente treinado esteja presente
todo o tempo na Unidade Coronariana [2]. Nesse
sentido, a legislação recente estabeleceu a exigência
do título de especialista na área para os enfermeiros
que lideram os serviços de unidades cardiológicas
[3].
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Graduado em enfermagem à aproximadamente
dois anos e meio, fui em busca da especialização em
Cardiologia há dois anos, porque acredito, que o triplo movimento criado para a especialização em área
profissional, que é a de trabalhar se especializando,
especializar-se pesquisando e produzir conhecimento realizando ações concretas na realidade, produz
grande impacto na formação e no trabalho em saúde
[4]. Essa reflexão que parte da realidade, encontra
respaldo teórico no discurso de filósofos, cientistas,
antropólogos e sociólogos, como Alvim Tofler, Edgar
Morin, Michel Maffesoli, Félix Gattari, Michel de
Certeau e Arthur Klarke [5-9], dentre outros. Esses
estudiosos afirmam, de diferentes modos, que é
preciso estar sempre em qualificação/atualização para
entender as mudanças e encontrar saídas. Além disso,
dizem que uma única especialização, em uma única
área do conhecimento, não assegura um profissional
bem preparado, nem um trabalho de qualidade e
nem competência diante da realidade; não faz dos
profissionais atores criativos e agentes críticos das
mudanças que o mundo hoje nos sugere.
Este estudo trata, portanto, de um relato de
experiência cujo objetivo é descrever a percepção
de um enfermeiro recém egresso de um Curso de
Especialização em Enfermagem em Cardiologia
acerca da assistência de enfermagem prestada por
estes profissionais ao cliente internado em uma
Unidade Coronariana.
O relato
Atuar no cenário de uma Unidade Coronariana
exige de nós enfermeiros, além de um conhecimento
generalizado sobre aspectos biopsicosociais, que é
inerente a nossa profissão e formação, um saber
específico, no que diz respeito à atuação e uma
série de competências do enfermeiro cardiológico.
Neste ambiente, lidamos com clientes portadores de
doenças de tratamento clínico como Insuficiência
Cardíaca, Infarto do Miocárdio, e outras cirúrgicas
como defeitos valvares, cirurgias de revascularização,
dentre outras. Esses grupos nosológicos requerem
uma assistência diferenciada, integral, e, sobretudo
de qualidade, necessitando assim de um profissional
qualificado, possuidor de competências teórico-práticas e que busque incorporar novos conhecimentos
a sua prática profissional através de pesquisas e
discussões clínicas.
Egresso de um Curso de Especialização de
Enfermagem em Cardiologia há 1 ano, e atuando
em uma Unidade Coronariana, percebo a dificuldade de alguns profissionais de enfermagem
no desempenho da prática, sem o saber técnico
científico específico necessário para a assistência
a esta clientela, a qual requer um cuidado de alta
complexidade, sobretudo, em virtude do amplo
aparato tecnológico que é utilizado como suporte
diagnóstico e terapêutico, e de monitorização das
condições hemodinâmicas, sendo, sem dúvidas,
fundamental entender este processo como parte
integrante do cuidado, desde a avaliação diagnóstica
até a intervenção de enfermagem. Portanto, uma
vez que a prática de enfermagem em uma Unidade
Coronariana requer habilidade, conhecimentos e
julgamentos, além do que pode ser adquirido no
curso básico de enfermagem, conseqüentemente, é
necessário um treinamento adicional para se prepararem enfermeiros, mesmo aqueles com uma vasta
experiência geral, paras as tarefas especializadas de
uma Unidade Coronariana [2].
Os enfermeiros podem planejar para prevenir
a ocorrência de isquemia, identificar sintomas precoces da doença, intervir para preservar o miocárdio
em risco e avaliar a efetividade das intervenções para
modificação futura [10]. Assim, o entendimento da
fisiopatologia isquêmica contribui para o cuidado
de enfermagem em cada passo do processo. Esse
conhecimento, portanto, pode melhorar o cuidado
de enfermagem prestado ao paciente e promover resultados e respostas positivos à isquemia cardíaca.
Reconhecer traçados eletrocardiográficos, identificar fatores agravantes, e compreender aspectos
fisiopatológicos que norteiam a prática são fatores
primordiais que precisam ser observados rigorosamente durante um processo seletivo admissional
para as equipes de enfermagem, bem como fazer
parte dos cursos de treinamento e aperfeiçoamento
técnico das equipes, pois evidencio que este é um
aspecto de carência entres os profissionais durante
o seu exercício profissional. Os enfermeiros de uma
Unidade Coronariana devem ser deliberadamente
selecionados para tal tarefa, ao invés de serem aceitos
por mera disponibilidade ou porque tem vontade
de trabalhar na Unidade Coronariana. O principal
objetivo do processo de seleção é o de assegurar
que todos os membros da equipe de enfermagem
sejam pessoas qualificadas e capazes de trabalhar
em conjunto, proporcionando um tratamento de
ótima qualidade [2].
A graduação fornece conhecimento básico
sobre os vários sistemas dando condições para uma
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formação generalista do enfermeiro, conforme
estabelece a Resolução nº 133 da Lei de Diretrizes
e Bases Curriculares do Ministério da Educação,
gerando o compromisso profissional do aprimoramento necessário ao enfermeiro para atuar no mercado de acordo com área na qual se insere já como
enfermeiro. A especialização em área profissional
hoje se impõe e se difunde em todos os países como
a conseqüência natural do extraordinário aprofundamento do saber em todos os setores, confirmando
que se torna impossível proporcionar habilitação
completa e adequada para muitas carreiras nos
limites dos cursos de graduação [4].
Nos dias atuais, em que a população brasileira
está em processo de envelhecimento, as doenças
cardiovasculares assumem grande importância no
contexto da saúde, e, repensar na formação destes
profissionais é estar alerta para uma demanda cuja
tendência é o crescimento. Segundo as projeções
estatísticas da Organização Mundial da Saúde, entre
1950 e 2025, a população de idosos no Brasil crescerá 16 vezes contra 5 vezes da população total, o
que nos colocará em termos absolutos como a sexta
população de idosos no mundo, isto é, com mais de
32 milhões de pessoas com 60 anos ou mais. E, nesse
contexto, tem-se desenvolvido uma rápida transição
nos perfis de saúde em nosso país que se caracteriza,
em primeiro lugar, pelo predomínio das enfermidades crônicas não transmissíveis e, em segundo lugar,
pela importância crescente de diversos fatores de
risco para a saúde e que requerem, complexamente,
ações preventivas em diversos níveis. As doenças infecto-contagiosas que, em 1950, representavam 40%
das mortes ocorridas no país, hoje são responsáveis
por menos de 10%, enquanto que com as doenças
cardiovasculares ocorreu o oposto: em 1950 eram
responsáveis por 12% das mortes e hoje representam
mais de 40% das mortes em nosso país [11].
É importante ressaltar também que as chefias de setores precisam adaptar-se para atender a
esta clientela, de forma a promover a capacitação
técnico-científica destes profissionais, bem como o
envolvimento destes para um debate que incorpora
novas tecnologias ao cuidar, sobretudo a tecnologia
do conhecimento. No entanto, isto me parece deficitário visto que tais chefias muitas vezes remanejadas
de outros setores, trazidas por questões políticas e
administrativas, não estão integradas ao contexto
da cardiologia, não contribuindo substancialmente
com a assistência específica desta especialidade.
A Unidade Coronariana é um sistema de
enfermagem especializada. Na realidade, o número
de vidas salvas é diretamente proporcional à competência da equipe de enfermagem, nenhum elemento
é tão importante para o ótimo funcionamento dos
sistemas [2].
O “olhar” de um enfermeiro especialista diferencia-se dos demais na medida que além do saber
técnico-científico adquirido e aperfeiçoado durante
o curso de Pós-Graduação, constroem-se e reconstroem-se novos saberes, além de discutir outros
rumos inerentes a Cardiologia, que interfere diretamente no cuidado. Há que se reconhecer que muitos destes cursos ainda se concentram nas grandes
metrópoles, gerando a necessidade de deslocamento
de enfermeiros do nordeste, norte e centro-oeste do
país em busca de sua especialização.
Ao entrar em uma Unidade Coronariana
deparo-me com profissionais de Enfermagem nas
mais variadas qualificações: aquele que a Unidade
Coronariana é o seu primeiro emprego, aquele que
encontra-se na Unidade Coronariana há mais de 10
anos, adquirindo a mais vasta experiência prática
na área; temos ainda o técnico de enfermagem que
trabalha e estuda para tornar-se enfermeiro; o enfermeiro que não sentiu-se realizado com a profissão
e estuda para mudar de área, enfim, uma “gama”
de profissionais que fazem parte da Cardiologia
de maneira diversificada. E, neste contexto insere-se o enfermeiro especialista com todas as suas
especificidades e capacitação que o destaca como
o profissional que está legalmente qualificado para
atender a este público. Contudo, o mesmo ainda se
depara com uma desvalorização profissional que vai
ao encontro das condições do mercado financeiro
profissional atual, quando na verdade, este deveria
ser visto e respeitado como de papel relevante em
uma Unidade Coronariana, sobretudo como líder
de uma equipe, e no estabelecimento de normas e
rotinas embasados em consensos dos mais variados
grupos conceituados de estudiosos.
Conclusão
Após estas considerações, acredito que investir
na formação dos futuros profissionais de Enfermagem integrando ao currículo mínimo aspectos
fundamentais na área da Cardiologia, torna-se de
grande relevância na mudança do atual panorama
das Unidades Coronarianas. Além disso, repensar
novas formas de estímulo que proporcionem um
maior investimento por parte das equipes em sua
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capacitação e qualificação também é um aspecto de
grande importância.
O enfermeiro especialista ainda enfrenta uma
série de dificuldades para exercer sua prática, apesar
do vasto campo de atuação. Isto tem origem na
história da Enfermagem, na formação atual do enfermeiro, nos mecanismos de poder institucional e na
imagem do enfermeiro vigente na sociedade atual.
A escolha da especialidade profissional caracteriza-se
como importante momento de transformação pessoal e social impregnada de simbolismos e significações
individuais e coletivas não constituindo, portanto,
uma opção tão simples e fácil como pode parecer.
É multidimensional, complexa e plurideterminada
por inúmeros fatores pessoais, sociais, filosóficos,
políticos, econômicos, entre outros [12].
Entretanto, o exercício da autonomia e autodeterminação do enfermeiro, se dá quando ele
domina o conhecimento de um campo, quando ele
cria conhecimento sobre a prática e quando ele usa
o conhecimento de maneira apropriada no cuidado
de saúde. Possuidor de um conhecimento teórico
e experimental exercerá o poder de decisão que
lhe serão requisitados, libertando-o da subjugação
profissional e pessoal historicamente impregnada na
Enfermagem. Assim, deverá fazer parte das metas
de todo profissional tornar-se experte em sua área
de atuação [13].
No que diz respeito ao título de especialista
em enfermagem cardiovascular, este, deve ser reconhecido e valorizado primeiramente pelo próprio
enfermeiro, como um compromisso profissional
a mais para tornar-se capaz de assumir cargos de
chefia e gerências de Unidades Cardiointensivas,
assumindo um compromisso ético e científico com
a assistência qualificada aos pacientes com distúrbios
cardiovasculares.
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5. Tofler A. Empresa flexível. Rio de Janeiro: Vozes;
1985.
6. Morin E. Sociologia: a sociologia do micro ao macro
planetário. Portugal: Publicações Europa-América;
1998.
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8. Guattari F. Coosmose - um novo paradigma estético.
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11. Ministério da Saúde. Programa de saúde do idoso;
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12. Cruz EMTN. Especialidade. As complexidades da
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Relato de caso
As diversas maneiras de executar a avaliação
através da pedagogia problematizadora:um
relato de experiência
Giseli Santos*, Maíra Melissa Meira**
*Enfermeira Supervisora do Programa de Saúde da Família; Docente do Curso de Qualificação Profissional Técnico em
Enfermagem do Projeto PROFAE da Escola de Formação em Saúde; Discente da Especialização Formação Pedagógica em
Educação Profissional na Área de Saúde UNIVALI/FIOCRUZ, ** Enfermeira Docente substituta do Departamento de
Enfermagem/UFSC e Docente do Curso de Qualificação Profissional Técnico de Enfermagem do Projeto PROFAE, da Escola de
Formação em Saúde; Discente da Especialização Formação Pedagógica em Educação Profissional na Área da Saúde UNISUL/
FIOCRUZ
Resumo
Os métodos de avaliação têm sua importância confirmada quando se necessita analisar o desenvolvimento do aluno perante
a temática estudada. Porém, é uma atividade que ocupa grande parte do tempo e esforço de alunos e professores. Importante
salientar que aquilo que é valorizado e avaliado na escola vai influenciar não só os resultados escolares do aluno, mas também
a sua motivação, o autoconceito, os hábitos de estudo e estilos de aprendizagem, além do modo de atuação desse futuro
profissional. Com o intuito de realizar uma avaliação mais honesta, a Pedagogia problematizadora nos subsidia com parâmetros
avaliativos que fizeram nossa prática avaliativa mais ampla, possibilitando o conhecimento integral do aluno.
Palavras-chave: avaliação educacional, educação em enfermagem.
Abstract
Different ways to carry out the evaluation through the problematization pedagogy:
an experience report
The evaluation methods have confirmed their importance when we need to analyze the student development based on the
studied themes. However, it is an activity that occupies most of the time and effort of students and teachers. It is very important
to point out that what is valued and evaluated in the school will influence not only the student school results, but also its
motivation, self-concept, study habits and learning style, and also the way of performance of this future professional. Aiming
at carrying out a more honest evaluation, the problematization pedagogy subsidize with evaluation parameters, which help
us to make our evaluation practice more ample, making possible to know the integral knowledge of the student.
Key-words: education measurement, nursing education.
Artigo recebido em 8 de setembro de 2005; aceito em 31 de março de 2006.
Endereço para correspondência: Maíra Melissa Meira, Rua Julio Moura, 74,Centro,
88020-150 Florianópolis SC, E-mail: [email protected]
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Resumen
Las diversas maneras de ejecutar la evaluación a través da la pedagogía
problematizadora: un relato de experiencia
Los métodos de evaluación tienen su importancia confirmada cuando necesitamos analizar el desarrollo del alumno ante la
temática estudiada. Sin embargo, es una actividad que ocupa una gran parte de tiempo y esfuerzo de alumnos y profesores.
Es importante resaltar que aquello que es valorado y evaluado en la escuela va influenciar no solo en los resultados escolares
de los alumnos, sino también su motivación, autoconcepto, hábitos de estudios y estilos de aprendizaje, además del modo
de actuar de ese futuro profesional. Con la finalidad de realizar una evaluación más honesta, la pedagogía problematizadora
nos subsidia con parámetros evaluativos que hicieran nuestra práctica evaluativa más amplia, posibilitando el conocimiento
integral del alumno.
Palabras-clave: evaluación educacional, educación en enfermería.
Introdução
Grandes movimentos pedagógicos referem
diferentes modos de ensinar/instruir. O modelo
de avaliação não é diferente, pois configura o que
se pode designar por avaliação sumativa, isto é,
um balanço verificador da quantidade de saberes
residuais, em face de um discurso de saberes enunciado pelo próprio professor. Este tipo de avaliação
aparece como qualquer coisa externa à racionalidade
pedagógica, como um processo que tenta medir o
diferencial entre o nível do aluno e o nível da turma, ou o nível que se esperava que o aluno pudesse
atingir. Estas informações não têm por função a
melhoria do processo ensino/aprendizagem, mas,
antes, revelar quem são os melhores ou os piores,
isto é, construir hierarquias de excelência [1].
Na relação “formar” aparece a idéia de avaliação
formativa. Neste quadro, as informações recolhidas
em termos de avaliação podem servir para ajudar
o professor a tomar decisões pedagógicas. É esta,
a primeira idéia de avaliação formativa, que está
diretamente associada à idéia de ajudar o professor
a tomar decisões [1].
No eixo da relação “aprender” em que hoje nos
situamos e em que perspectivamos o ensino centrado nas competências, emerge um tipo de avaliação
que não é completamente diferente da avaliação
formativa, mas que também não se confunde com
a idéia anterior. Trata-se de um salto qualitativo
denominado por alguns autores como avaliação
formadora. A sua principal diferença com relação
à avaliação formativa é que esta, não só ajuda o
professor na gestão do seu programa, mas também
está centrada na compreensão das dificuldades de
aprendizagem do aluno. Esta forma de perspectivar
a avaliação toma-a como um instrumento indispensável para o professor e também para o próprio
aluno. Isto significa, ainda, a possibilidade de o
aluno regular os próprios processos de aprendizagem, compreender-se melhor enquanto aprende
e procurar as ajudas mais profícuas para as suas
necessidades [1].
No modelo pedagógico centrado na aprendizagem o aluno aparece como o protagonista principal das suas próprias aprendizagens. Em segundo
lugar aparece o professor, não como o detentor do
saber, mas mais como um maestro, um organizador, um gestor de relações, enfim, como alguém
com mais experiência e saber, um recurso, suporte
e apoio às aprendizagens das pessoas que com ele
trabalham [2].
É importante proporcionar aos alunos vários
momentos de avaliação, principalmente por meio
da multiplicação de oportunidades de aprendizagem
e da diversificação dos métodos utilizados, pois,
desse modo, se permite que os alunos apliquem os
conhecimentos que vão adquirindo, assim como
exercitem e controlem, eles próprios, as aprendizagens e as competências a desenvolver. Entrementes,
é mister que recebam feedbacks freqüentes sobre as
dificuldades e os progressos alcançados [2].
Na Pedagogia tradicional, sumativa, as muitas atividades que os alunos realizam ao longo
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do seu percurso não são objeto de avaliação,
embora muitas delas pudessem (e devessem)
ser, sem demasiado esforço, desde que fossem
utilizados métodos de avaliação diversificados e
adequados.
Materiais e métodos
A Pedagogia problematizadora, idealizada por
Paulo Freire, é adotada pelo Curso de Qualificação
Profissional Técnico de Enfermagem do Projeto de
Profissionalização dos Trabalhadores da Área de
Enfermagem (PROFAE), da Escola de Formação
em Saúde, da qual somos facilitadoras há aproximadamente dois anos.
O PROFAE expressa a política do Ministério
da Saúde, através da Secretaria de Gestão de Investimentos em Saúde (SIS), que objetiva, entre suas
diversas ações, desenvolver a formação dos recursos
humanos na área da saúde, no sentido de prestar
um efetivo atendimento à população brasileira [3].
Referido projeto atende também à necessidade
atual de competência técnica, humana e interativa
exigida pelo mercado de trabalho cuja finalidade é
a de cumprir os preceitos constitucionais no que
tange aos direitos dos cidadãos e ao dever do Estado
brasileiro.
Para a consecução de seus objetivos o PROFAE
mobiliza um contingente de doze mil enfermeiros,
os quais atuam como professores nos cursos de
Auxiliares e Técnicos de Enfermagem promovidos
em todo o Brasil, enfrentando o desafio de ampliar
e contextualizar a formação para a docência em
Educação Profissional legalmente exigida.
O período de dois anos em que lecionamos
para aproximadamente quarenta alunos nos proporcionou uma experiência rica e muito satisfatória,
sobretudo, no que se refere ao processo de desenvolvimento da aprendizagem e à relação professoraluno.
Com efeito, tivemos a oportunidade de ver
como se podem articular atividades e situações de
aprendizagem, competências a desenvolver e métodos de avaliação, sem a preocupação de enunciar
todas as atividades/tarefas de aprendizagem que os
alunos realizam. Entre tais tarefas elencamos:
a) leitura e interpretação de textos;
b) discussão e debate de temas e/ou problemas;
c) atividades de pesquisa (consulta a enciclopédias
e obras de vários tipos e em vários suportes, coleta de informação junto a pessoas e entidades,
pesquisas na Internet e outras fontes);
d) trabalhos escritos (fichas, testes, relatórios, produção de textos criativos, projetos, respostas a
questionários, entre outros);
e) jogos (jogos funcionais, jogos de regras, dramatizações etc.);
f ) utilização das tecnologias de informação e comunicação e de vários outros recursos materiais,
como meio de comunicação;
g) trabalhos práticos (de aplicação, laboratoriais,
manuais e outros);
h) atividades físicas, de expressão plástica e musical
etc.
Muitas destas atividades podem ser realizadas
em grupo, em duplas, ou individual. Algumas podem ser facilmente avaliadas por meio dos trabalhos
escritos produzidos; outras, por exemplo, como a
realização de atividades físicas, são avaliadas através
da observação.
A realização de pequenos trabalhos práticos
com fins formativos pode ser uma forma privilegiada de intervenção na aprendizagem do aluno. É
de fundamental importância para a definição das
estratégias de reorientação e de reforço, quer pelos
efeitos positivos que advêm do uso de feedback corretivo, quer pela multiplicação de oportunidades de
aprendizagem proporcionadas, ou ainda por outros
tipos de interação que ocorrem durante o processo
de ensino-aprendizagem.
A escolha dos métodos e instrumentos de
avaliação depende de vários fatores: das finalidades
e objetivos pretendidos, do que vai ser objeto de
avaliação, da área disciplinar e nível de escolaridade
a que se aplicam, do tipo de atividade em que o desempenho se manifesta, do contexto e dos próprios
avaliadores.
A partir do tema selecionado propõe-se um
conjunto de atividades/situações de aprendizagem
que poderão ser motivadoras para os alunos, assim
como proporcionar aos facilitadores maiores momentos avaliativos, conforme demonstramos no
Quadro 1 – Competências, atividades e métodos
de avaliação, a seguir apresentado.
182
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Enfermagem Brasil
Maio / Junho 2006;5(3)
Quadro 1 - Competências, atividades e métodos de avaliação.
Competências específicas
Atividades / Situações de
aprendizagem
Construção e aplicação de um peConhecimento de vocabulário preciso;
queno questionário;
Capacidade de selecionar a inforOrganização das respostas;
mação necessária a um determinado
Discussão/debate sobre a influência
objetivo;
da publicidade nos hábitos de situaCompreensão de determinados conção saúde/doença que se relacionam
teúdos;
com a temática da aula;
Participação em atividades de grupo,
Filme ou documentário a respeito do
respeitando as normas e critérios de
conteúdo abordado;
atuação definidos;
Folders trazidos pelos alunos/profesDesenvolvimento de atitudes inerensor com discussão;
tes à proteção da saúde e bem-estar
Visita a instituições de saúde;
físico do paciente;
Apresentação de palestrante convidaExperimentação de diferentes técnicas
do com posterior debate de vivência;
de criação e comunicação.
Proposta de outras atividades sugeridas pelo grupo.
Em regra, são utilizados diferentes métodos
para avaliar um determinado tipo de competências. A diversidade dos métodos de avaliação pode
suscitar a necessidade de reunir os trabalhos mais
representativos e as evidências das aprendizagens
efetuadas do aluno, que funcionarão como um
organizador das aprendizagens realizadas, podendo
ainda constituir uma forma pessoal de reflexão [4]
sobre o percurso efetuado, se o aluno colaborar na
sua organização.
Conclusões
A percepção de que o indivíduo é o principal
construtor da sua própria aprendizagem; que os
saberes não se esgotam em si próprios, mas adquirem sentido na medida que se é capaz de utilizá-los
para a resolução de situações complexas, faz com
que o nosso papel, enquanto facilitadoras, tenha
um outro valor nascido da consciência de que o
Métodos de avaliação
Questões orais;
Produção escrita (elaboração das
questões);
Observação informal;
Observação estruturada das intervenções dos alunos (correção lingüística,
adequação, clareza, organização de
idéias etc.);
Produção escrita (elaboração da
proposta);
Observação do funcionamento do
grupo;
Produção de textos criativos;
Discussão em turma;
Produção de cartazes;
Avaliação escrita.
Auto-avaliação
profissional que estamos formando deve apresentar grande parte das competências que a sociedade
brasileira espera.
Referências
1. Pinto J. A avaliação pedagógica numa organização curricular centrada no desenvolvimento de competências.
[citado 2005 Abr 14]. Disponível em: URL:http://
www.deb.min-edu.pt/revista/revista4/avaliacaopedagogica/avalipedagogica.htm
2. Ministério da Saúde. Secretaria de gestão de investimentos e saúde. Mercado de trabalho em Enfermagem no
Brasil: Programa de Formação de Trabalhadores na área
de Enfermagem. Brasília: Ministério da Saúde; 1998.
3. PROFAE. Educação à distância. [citado 2005 Jan 03].
Disponível em: URL:htpp:www.eean.ufrj.br/educação_distancia/carta.htm
4. Sá-Chaves. Novas abordagens metodológicas: os portfólios no processo de desenvolvimento profissional e
pessoal dos professores. In: Estrela A, Ferreira J. (Org.).
Investigação em Educação: métodos e técnicas. Lisboa:
Educa; 2001. p. 181-87.
183
Enfermagem_v5n3.indb 183
12/7/2006 16:38:04
Normas de publicação Enfermagem Brasil
A revista Enfermagem Brasil é uma publicação com periodicidade bimestral e está aberta para a publicação e divulgação
de artigos científicos das áreas relacionadas à Enfermagem.
Os artigos publicados em Enfermagem Brasil poderão
também ser publicados na versão eletrônica da revista (Internet)
assim como em outros meios eletrônicos (CD-ROM) ou outros
que surjam no futuro, sendo que pela publicação na revista os
autores já aceitem estas condições.
A revista Enfermagem Brasil assume o “estilo Vancouver”
(Uniform requirements for manuscripts submitted to biomedical
journals, N Engl J Med. 1997;336(4):309-315) preconizado pelo
Comitê Internacional de Diretores de Revistas Médicas, com as
especificações que são resumidas a seguir. Ver o texto completo
em inglês desses Requisitos Uniformes no site do International
Committee of Medical Journal Editors (ICMJE), http://www.
icmje.org, na versão atualizada de outubro de 2001.
Os autores que desejarem colaborar em alguma das
seções da revista podem enviar sua contribuição (em arquivo
eletrônico/e-mail) para nossa redação, sendo que fica entendido que isto não implica na aceitação do mesmo, o que será
notificado ao autor.
O Comitê Editorial poderá devolver, sugerir trocas ou retorno de acordo com a circunstância, realizar modificações nos
textos recebidos; neste último caso não se alterará o conteúdo
científico, limitando-se unicamente ao estilo literário.
1. Editorial
Trabalhos escritos por sugestão do Comitê Científico, ou
por um de seus membros.
Extensão: Não devem ultrapassar três páginas formato
A4 em corpo 12 com a fonte Times New Roman com todas as
formatações de texto, tais como negrito, itálico, sobrescrito, etc;
a bibliografia não deve conter mais que dez referências.
2. Artigos originais
São trabalhos resultantes de pesquisa científica apresentando dados originais de descobertas com relaçaõ a aspectos
experimentais ou observacionais, e inclui análise descritiva e/ou
inferências de dados próprios. Sua estrutura é a convencional
que traz os seguintes itens: Introdução, Métodos, Resultados,
Discussão e Conclusão.
Texto: Recomendamos que não seja superior a 12 páginas,
formato A4, fonte English Times (Times Roman) tamanho 12,
om todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobre-escrito, etc. O total de caracteres não deve ultrapassar
25.000/30.000 caracteres, inclusos espaçamentos.
Tabelas: Considerar no máximo seis tabelas, no formato
Excel/Word.
Figuras: Considerar no máximo 8 figuras, digitalizadas
(formato .tif ou .gif ) ou que possam ser editados em PowerPoint, Excel, etc.
Bibliografia: É aconselhável no máximo 50 referências
bibliográficas.
Os critérios que valorizarão a aceitação dos trabalhos
serão o de rigor metodológico científico, novidade, interesse
profissional, concisão da exposição, assim como a qualidade
literária do texto.
3. Revisão
São trabalhos que versem sobre alguma das áreas relacionadas à Enfermagem, que têm por objeto resumir, analisar,
avaliar ou sintetizar trabalhos de investigação já publicados em
revistas científicas. Quanto aos limites do trabalho, aconselha-se
o mesmo dos artigos originais.
4. Atualização
São trabalhos que relatam informações geralmente atuais
sobre tema de interesse dos profissionais de Enfermagem (novas
técnicas, legislação, por exemplo) e que têm características
distintas de um artigo de revisão.
5. Relato de caso
São artigos dados descritivos de um ou mais casos explorando um método ou problema através de exemplo. Apresenta
as características do indivíduo estudado, com indicação de sexo,
idade e pode ser realizado em humano ou animal.
6. Comunicação breve
Esta seção permitirá a publicação de artigos curtos, com
maior rapidez. Isto facilita que os autores apresentem observações, resultados iniciais de estudos em curso, e inclusive realizar
comentários a trabalhos já editados na revista, com condições de
argumentação mais extensa que na seção de cartas do leitor.
Texto: Recomendamos que não seja superior a três páginas, formato A4, fonte Times New Roman, tamanho 12,
com todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobre-escrito, etc.
Tabelas e figuras: No máximo quatro tabelas em Excel
e figuras digitalizadas (formato .tif ou .gif) ou que possam
ser editados em Power Point, Excel, etc
Bibliografia: São aconselháveis no máximo 15 referências
bibliográficas.
7. Resumos
Nesta seção serão publicados resumos de trabalhos e
artigos inéditos ou já publicados em outras revistas, ao cargo
do Comitê Científico, inclusive traduções de trabalhos de
outros idiomas.
8.Correspondência
Esta seção publicará correspondência recebida, sem que
necessariamente haja relação com artigos publicados, porém
relacionados à linha editorial da revista. Caso estejam relacionados a artigos anteriormente publicados, será enviada ao autor
do artigo ou trabalho antes de se publicar a carta.
Texto: Com no máximo duas páginas A4, com as especificações anteriores, bibliografia incluída, sem tabelas ou
figuras.
PREPARAÇÃO DO ORIGINAL
1.1 Os artigos enviados deverão estar digitados em processador de texto (Word), em página de formato A4, formatado
da seguinte maneira: fonte Times New Roman, tamanho 12,
com todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobrescrito, etc.
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Enfermagem_v5n3.indb 184
12/7/2006 16:38:05
1.2 Numere as tabelas em romano, com as legendas para
cada tabela junto à mesma.
1.3 Numere as figuras em arábico, e envie de acordo com
as especificações anteriores.
As imagens devem estar em tons de cinza, jamais coloridas,
e com qualidade ótima (qualidade gráfica – 300 dpi). Fotos e
desenhos devem estar digitalizados e nos formatos .tif ou .gif.
1.4 As seções dos artigos originais são estas: resumo, introdução, material e métodos, resultados, discussão, conclusão
e bibliografia. O autor deve ser o responsável pela tradução
do resumo para o inglês e o espanhol e também das palavraschave (key-words). O envio deve ser efetuado em arquivo, por
meio de disquete, zip-drive, CD-ROM ou e-mail. Para os
artigos enviados por correio em mídia magnética (disquetes,
etc) anexar uma cópia impressa e identificar com etiqueta no
disquete ou CD-ROM o nome do artigo, data e autor, incluir
informação dos arquivos, tais como o processador de texto
utilizado e outros programas e sistemas.
2. Página de apresentação
A primeira página do artigo apresentará as seguintes
informações:
- Título em português, inglês e espanhol.
- Nome completo dos autores, com a qualificação curricular e títulos acadêmicos.
- Local de trabalho dos autores.
- Autor que se responsabiliza pela correspondência, com
o respectivo endereço, telefone e E-mail.
- Título abreviado do artigo, com não mais de 40 toques,
para paginação.
- As fontes de contribuição ao artigo, tais como equipe,
aparelhos, etc.
3.Autoria
Todas as pessoas consignadas como autores devem ter
participado do trabalho o suficiente para assumir a responsabilidade pública do seu conteúdo.
O crédito como autor se baseará unicamente nas contribuições essenciais que são: a) a concepção e desenvolvimento,
a análise e interpretação dos dados; b) a redação do artigo ou
a revisão crítica de uma parte importante de seu conteúdo
intelectual; c) a aprovação definitiva da versão que será publicada. Deverão ser cumpridas simultaneamente as condições
a), b) e c). A participação exclusivamente na obtenção de
recursos ou na coleta de dados não justifica a participação
como autor. A supervisão geral do grupo de pesquisa também
não é suficiente.
4. Resumo e palavras-chave
Na segunda página deverá conter um resumo (com no
máximo 150 palavras para resumos não estruturados e 200 palavras
para os estruturados), seguido da versão em inglês e espanhol.
O conteúdo do resumo deve conter as seguintes informações:
- Objetivos do estudo.
- Procedimentos básicos empregados (amostragem,
metodologia, análise).
- Descobertas principais do estudo (dados concretos e
estatísticos).
- Conclusão do estudo, destacando os aspectos de maior
novidade.
Em seguida os autores deverão indicar quatro palavraschave para facilitar a indexação do artigo. Para tanto deverão
utilizar os termos utilizados na lista dos DeCS (Descritores
em Ciências da Saúde) da Biblioteca Virtual da Saúde, que se
encontra no endereço internet seguinte: http://decs.bvs.br. Na
medida do possível, é melhor usar os descritores existentes.
5. Agradecimentos
Os agradecimentos de pessoas, colaboradores, auxílio
financeiro e material, incluindo auxílio governamental e/ou
de laboratórios farmacêuticos devem ser inseridos no final do
artigo, antes as referências, em uma secção especial.
6. Referências
As referências bibliográficas devem seguir o estilo Vancouver definido nos Requisitos Uniformes. As referências
bibliográficas devem ser numeradas por numerais arábicos
entre parênteses e relacionadas em ordem na qual aparecem
no texto, seguindo as seguintes normas:
Livros - Número de ordem, sobrenome do autor, letras
iniciais de seu nome, ponto, título do capítulo, ponto, In: autor
do livro (se diferente do capítulo), ponto, título do livro, ponto,
local da edição, dois pontos, editora, ponto e vírgula, ano da
impressão, ponto, páginas inicial e final, ponto.
Exemplos:
Livro:
May M. The facial nerve. New-York: Thieme; 1986
Capítulo ou parte de livro:
Phillips SJ. Hypertension and Stroke. In: Laragh JH, editor.
Hypertension: pathophysiology, diagnosis and management. 2nd
ed. New-York: Raven Press; 1995. p.465-78.
Artigos – Número de ordem, sobrenome do(s) autor(es),
letras iniciais de seus nomes (sem pontos nem espaço), ponto.
Título do trabalha, ponto. Título da revista ano de publicação
seguido de ponto e vírgula, número do volume seguido de dois
pontos, páginas inicial e final, ponto. Não utilizar maiúsculas
ou itálicos. Os títulos das revistas são abreviados de acordo
com o Index Medicus, na publicação List of Journals Indexed in
Index Medicus ou com a lista das revistas nacionais, disponível
no site da Biblioteca Virtual de Saúde (http://www.bireme.br).
Devem ser citados todos os autores até 6 autores. Quando mais
de 6, colocar a abreviação latina et al.
Exemplo:
Yamamoto M, Sawaya R, Mohanam S. Expression and
localization of urokinase-type plasminogen activator receptor
in human gliomas. Cancer Res 1994;54:5016-20.
Os artigos, cartas e resumos devem ser enviados para:
Jean-Louis Peytavin
Atlantica Editora
Rua da Lapa, 180/1103 - Lapa
20021-180 Rio de Janeiro RJ
Tel: (21) 2221 4164
E-mail: [email protected]
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Calendário de eventos
2006
Agosto
16 a 17 de agosto
Simpósio - O Cuidar em Saúde e Enfermagem
- ENFCUIDAR
Faculdade de Enfermagem / UERJ
Rio de Janeiro, RJ
Informações: [email protected]
Setembro
12 a 15 de setembro
XVI Congreso Nacional de Medicina Física y
Rehabilitación
Primer Encuentro Internacional de Medicina de Rehabilitación
Guayaquil, Ecuador
Informações: Hotel Oro Verde – (593) 42327999
21 de setembro
Encontro de pesquisadores de enfermagem
Hospital Geral de Vila Cachoeirinha
São Paulo, SP
Informações: (11) 3859-3799
22 a 23 de setembro
I Congresso Brasileiro de Enfermagem em
Genética - 2º Simpósio Nacional de Genética
Clínica e Enfermagem
UNIFESP – São Paulo, SP
Informações: (11) 5571-1720
24 a 28 de setembro
9 º Congresso Brasileiro dos Conselhos de
Enfermagem
Porto Seguro, BA
Informações: 0800-2822507
Outubro
7 a 11 de outubro
XIII Congresso Brasileiro de Enfermagem em
Nefrologia
Expo Gramado, RS
Informação: (11) 3289-8347
Enfermagem_v5n3.indb 186
8 a 10 de outubro
III Seminário Internacional de Filosofia e
Saúde
30 anos do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC
Hotel Castelmar
Florianópolis, SC
Informações: [email protected]
21 a 25 de outubro
VIII Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva
Riocentro – Rio de Janeiro, RJ
Informações: [email protected]
23 a 28 de outubro
XII Congreso de la Sociedad Cubana de
Enfermería
Sociedad Cubana de Enfermería (SOCUENF).
Santiago de Cuba, Cuba
Informações: [email protected]
Novembro
5 a 9 de novembro
58º. Congresso Brasileiro de Enfermagem
Salvador, Bahia
Informações: [email protected]
Dezembro
05 a 8 de dezembro
V Forúm Mineiro de Enfermagem
Novas Perspectivas no cuidado da Saúde da Família e
da Comunidade
Universidade Federal de Uberlândia
Uberlândia – MG
Informações: (34) 3218-2387
2007
Abril
27 de abril a 1 de maio
II Congresso Brasileiro de Enfermagem
Pediátrica e Neonatal
Teresópolis, RJ
Informações: [email protected]
12/7/2006 16:38:06
Enfermagem Brasil
Julho / Agosto 2006;5(4)
Índice
Volume 5 número 4 - Julho / Agosto de 2006
EDITORIAL
Quanto custa o cuidado de enfermagem?,
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento ................................................................... 191
ARTIGOS ORIGINAIS
Autonomia de intervenção do enfermeiro diante das alterações
dos parâmetros da monitorização hemodinâmica, Graciele Oroski Paes de Lima,
Dalmo Valério Machado de Lima, Deyse Conceição Santoro, Enirtes Caetano Prates Melo ............... 193
O valor da consulta de enfermagem, como etapa do processo de assistência,
à saúde da comunidade para o enfermeiro, Sandra Maria Oliveira Caixeiro ................................ 200
Sistematização da assistência de enfermagem: análise do registro do enfermeiro,
Cristina Spena Braga, Miriam Marinho Chrizostimo ............................................................. 207
Orientação para equipe de enfermagem em relação ao cuidado do paciente,
Maria do Carmo Lisboa, Karina Silveira de Almeida Hammerschmidt, Roberta Serpe de Lima ........... 213
O banho no leito no pós-operatório de artroplastia total de quadril (uma tecnologia
de enfermagem), Fábio Assis de Souza Moreira, Maria Aparecida de Luca Nascimento,
Marisa Peter, Ana Paula Costa Alves, Rubens Ghidini Junior .................................................... 219
REVISÃO
As repercussões da reforma do serviço público federal na Escola Profissional
da Assistência a Psicopatas do Distrito Federal, 1936/1938,
Wellington Mendonça de Amorim, Ieda de Alencar Barreira .................................................... 225
Assistência de enfermagem aos pacientes com disfunções músculo-esqueléticas:
reflexão sob um olhar acadêmico, Aldaiza Ferreira Antunes Fortes,
Ana Maria Nassar Cintra Soane, Maria Rita Ferraz de Azevedo Vieira, Sarah Rocha,
Tatiana de Oliveira Silva, Waneska Beatriz da Silva ................................................................ 232
RELATO DE CASO
Reeducação vesicointestinal: A pessoa com lesão medular
e o reaprendizado em reabilitação, Wiliam César Alves Machado ............................................ 237
NORMAS DE PUBLICAÇÃO .............................................................................. 247
CALENDÁRIO DE EVENTOS .............................................................................. 249
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Enfermagem Brasil
Julho / Agosto 2006;5(4)
EDITOR CIENTÍFICO – PRESIDENTE DO CONSELHO CIENTÍFICO
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento (UniRio – Rio de Janeiro)
CONSELHO CIENTÍFICO
Profa. Dra. Almerinda Moreira (Escola de Enfermagem Alfredo Pinto – UniRio – Rio de Janeiro)
Prof. Dr. Carlos Bezerra de Lima (UFPB – Paraíba)
Profa. Dra. Márcia Maria Fontão Zago (USP – Ribeirão Preto)
Profa. Dra. Margarethe Maria Santiago Rêgo (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Maria da Graça Piva (ULBRA – RS)
Profa. Dra. Maria Helena da Silva Nery (UFRGS – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Marialda Moreira Christoffel (UERJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Nebia Maria Almeida de Figueiredo (UniRio – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Rita Batista Santos (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Rita de Cássia Tapié Martins (USP – São Paulo)
Prof. Dr. Sérgio Ribeiro dos Santos (UFPB – Paraíba)
Profa. Dra. Silvia Helena de Bortoli Cassiani (USP – Ribeirão Preto)
Profa. Dra. Taka Oguisso (USP – São Paulo)
Profa. Dra. Valéria Lerch Lunardi (FURG – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Vera Regina Salles Sobral (UFF – Rio de Janeiro)
Prof. Dr. Wiliam César Alves Machado (UNIPAC – Minas Gerais)
Prof. Dr. Wilson D. Lunardi Filho (FURG – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Zaida Aurora Sperli Geraldes Soler (FAMERP – São José do Rio Preto – São Paulo)
GRUPO DE ASSESSORES
Profa Ms. Andréia Saccol Lourenço (Escola Técnica de Enfermagem São Francisco – Rio Grande do Sul)
Profa Ms. Dóris Maria Volquind (Clínica de Florais de RAFF – Rio Grande do Sul)
Profa Ms. Dulce Dirclair Huf (UFMS – Mato Grosso do Sul)
Profa Ms. Gisele Cristina Tertuliano (Rio Grande do Sul)
a
Prof Ms. Sonia Maria Ponciano dos Santos (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Prof. Ms. Dalmo Valério Machado de Lima (UFF – Rio de Janeiro)
Profª. Ms. Maria Filomena Vancellote Almeida (UniRio – Rio de Janeiro)
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14/9/2006 14:19:51
Enfermagem Brasil
Julho / Agosto 2006;5(4)
Editorial
Quanto custa o cuidado de enfermagem?
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento
No mundo capitalista, tudo tem seu preço,
e por que o cuidado de enfermagem não teria?
Essa pergunta nos acompanha ao longo da nossa
caminhada profissional, sempre lançada em pequenos grupos, como se falar em preço pudesse
conspurcar a beleza do ato de cuidar.
Não é bem assim, no mundo corporativo, a
sociedade julga o justo e real valor de uma atividade profissional a partir da sua necessidade e do
resultado do seu trabalho.
Objetivamente, podemos apontar as conseqüências da falta do cuidado de enfermagem
ou a deficiência dele. Por outro lado, podemos
reconhecer quando ele é ministrado com bases
científicas, e revestido, subjetivamente, de atenção,
empatia e desvelo.
Cuidar de um ser humano, em especial em
situações de desequilíbrio, não é tarefa das mais
fáceis. Pelo contrário, exige de quem o pratica,
responsabilidade, eficiência, destreza e habilidade. Estes atributos, que fazem parte do perfil
profissional do enfermeiro, são aperfeiçoados ao
longo do tempo, pois na Universidade o tempo
de formação é exíguo, e muitos são os aspectos
técnicos que precisam ser repassados ao futuro
profissional.
Lembro ainda, apesar do lapso de tempo,
da minha angústia de recém formada, sempre a
julgar que a Universidade não havia me dado o
conhecimento necessário para sentir-me segura
diante dos múltiplos aspectos que tinha que enfrentar, profissionalmente, em um hospital geral
de grande porte.
Porém, ainda hoje, ouço relatos idênticos
àqueles que fazia há décadas atrás. O que de
comum há entre eles? Acredito que seja a multiplicidade de situações observadas no cotidiano da
prática de cuidar, que são totalmente diferentes
entre si, e que em nenhuma hipótese, podem ser
previstos, ou até mesmo simulados em laboratório.
Como prever nosso comportamento profissional diante da angústia de uma mãe que
acompanha a doença de um filho? Como simular
o nosso comportamento profissional diante da dor
da perda de um ente querido? Como conviver com
os sentimentos relativos à dor e à morte? Como ensinar esses aspectos subjetivos na Universidade?
Em conseqüência desses acontecimentos,
algumas estratégias são adotadas por alguns profissionais, no sentido de não se envolverem com
os seus pacientes e/ou familiares, e inúmeras vezes,
tive a oportunidade de ouvir que o distanciamento
do profissional era devido à preservação do seu
equilíbrio emocional.
Muitas vezes, um simples aperto de mão na
hora do pânico, determina o enfrentamento com
mais segurança diante de uma situação irremediá191
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14/9/2006 14:19:52
Enfermagem Brasil
Julho / Agosto 2006;5(4)
vel, como a que aconteceu com um famoso baterista
de uma banda de rock.
Segundo suas declarações à mídia, após ser
atingido gravemente por vários tiros, vítima que
fora da violência urbana da nossa cidade, de duas
coisas teve plena certeza; de que não morreria, e de
que não mais andaria. Mera intuição provinda da
consciência da gravidade do momento...
Ainda no asfalto, em pânico, enquanto aguardava a remoção, após o atendimento de urgência,
solicitou a um dos profissionais que chegara na
ambulância para atendê-lo:
- Dê-me a sua mão...
Como resposta, obteve a negação, acompanhada da justificativa de que ele, o profissional, não
estava lá para agir sob emoção. Uma vez controlada
a situação, por que não envolver-se?
Em contrapartida, lembro de uma ex-aluna,
que na sua insegurança de recém formada, deparou-se, logo no primeiro dia de plantão como
enfermeira, com a parada cárdio-respiratória de
um paciente.
Segundo ela, após tomar todas as atitudes inerentes ao caso, enquanto a equipe que o atendia, da
qual ela fazia parte, preparava-o para transferi-lo ao
CTI, percebeu que ele estava lúcido e com o olhar
aterrorizado. Ato contínuo, postou-se ao seu lado,
e na dúvida sobre o que mais poderia fazer, pegou
em sua mão e disse-lhe:
- Tenha confiança!
Uma semana depois, chegando ao plantão,
percebeu que alguns pacientes que estavam na porta
de uma enfermaria entraram quando ela despontou
no fundo do corredor.
Ao aproximar-se da enfermaria, foi solicitada a
entrar, e deitado em um dos leitos, estava o paciente
que havia retornado do CTI, que a identificou da
seguinte maneira, junto aos demais pacientes:
- Foi essa aí que salvou a minha vida!
Duas situações idênticas na hora do pânico,
porém, dois procedimentos antagônicos, e que
marcaram, diferentemente, a vida de dois seres
humanos.
Segundo Morin, o desenvolvimento da inteligência é inseparável do mundo da afetividade. Ainda
segundo o mesmo autor, a afetividade pode asfixiar
o conhecimento, mas pode também fortalecê-lo,
havendo uma estreita relação entre a inteligência
e a afetividade, sendo que o enfraquecimento da
capacidade de reagir emocionalmente, pode mesmo,
estar na raiz de comportamentos irracionais.
Desse modo, fica a pergunta, quanto custa o
cuidado de enfermagem? Apesar de acreditar que
ele não tem preço, tal como nos comerciais de um
cartão de crédito, que mostra o lado subjetivo da
cada compra, objetivamente, não me resta a menor
dúvida de que ele tem um enorme valor!
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Artigo original
Autonomia de intervenção do enfermeiro
diante das alterações dos parâmetros da
monitorização hemodinâmica
Graciele Oroski Paes de Lima*, Dalmo Valério Machado de Lima, M.Sc.**, Deyse Conceição Santoro,
D.Sc.***, Enirtes Caetano Prates Melo, D.Sc.****
*Enfermeira, Bombeiro Militar do Estado do Rio de Janeiro (CBMERJ), Professora Assistente da Universidade Veiga de Almeida
(UVA), Especialista em Cardiologia pela Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal do Rio de Janeiro (EEANUFRJ), Mestranda em Enfermagem pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), ** Enfermeiro, Professor
Assistente do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica (MEM) da Escola de Enfermagem Aurora de Afonso Costa da
Universidade Federal Fluminense (EEAAC-UFF), Especialista e Mestre em Enfermagem, Doutorando em Enfermagem do
Programa de Pós-Graduação na Saúde do Adulto e do Idoso da Universidade de São Paulo (USP), *** Enfermeira, Professora
Adjunto do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da Escola de Enfermagem Anna Nery da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (EEAN-UFRJ), Pós-Doutoranda em Enfermagem pela USP, **** Enfermeira, Professora Assistente do
Departamento de Enfermagem em Saúde Pública da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro (EEAPO-UNIRIO).
Resumo
Estudo prospectivo, de natureza descritiva e abordagem qualitativa que versa sobre o conhecimento que um grupo de 12
enfermeiros apresentava, sobre a monitorização hemodinâmica invasiva (MHI), e que foram selecionados por amostragem
de conveniência. Os cenários do estudo foram; o Centro de Tratamento Intensivo (CTI), o CTI pós-operatório e a Unidade
Coronariana (UC) de um hospital da rede privada, localizado no Município do Rio de Janeiro. O período de coleta de dados
foi entre os meses de fevereiro e março de 2004. Objetivou-se: (a) verificar o conhecimento apresentado por um grupo de
enfermeiros sobre os parâmetros diretos fornecidos pela MHI, quando inquiridos por um questionário; (b) identificar as
intervenções informadas por um grupo de enfermeiros diante de uma hipotética detecção de alterações dos parâmetros na
MHI; (c) discutir a autonomia de intervenção informada por um grupo de enfermeiros diante de alteração dos parâmetros da
MHI. Os resultados demonstram que apesar do conhecimento da maioria dos entrevistados, sua autonomia de intervenção é
limitada por motivos como: maior valorização técnica de manuseio do cateter e monitor em detrimento da avaliação clínica
do paciente e hegemonia médica institucionalizada.
Palavras-chave: cuidados de enfermagem, cateterismo de Swan-Ganz, autonomia profissional.
Artigo recebido em 8 de setembro de 2006; aceito em 11 de setembro de 2006.
Endereço para correspondência: Graciele Oroski Paes de Lima, Rua Durval Mesquita 95 /
202, Centro, 28800-000 Rio Bonito RJ, Tel.: (21) 3471-0324. E-mail: [email protected]
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Abstract
Autonomy of nurse intervention due to alterations of parameters of hemodynamic
monitoring
A prospective study of descriptive nature and qualitative approach related to the knowledge that a group of 12 nurses has
about invasive hemodynamic monitoring (IHM). They were selected by convenience sampling. The study scenery is comprised
of Intensive Care Unit (ICU), ICU-after-surgery and, Coronary Unit (CU) of a private hospital, located at the Municipal
District of Rio de Janeiro. Data collection period was between February and March 2004. It aimed at: (a) to verify the
knowledge presented by a group of nurses on the direct parameters supplied by IHM, when inquired by a questionnaire; (b)
to identify the interventions reported by a group of nurses due to hypothetical detection of alterations of the parameters in
IHM; (c) to discuss the autonomy of intervention reported by a group of nurses due to alteration of parameters of IHM. The
results demonstrate that, although the knowledge of most interviewees, their intervention autonomy is limited by reasons
such as: higher technical valorization of handling the catheter and monitor in detriment to the patient’s clinical evaluation
and institutionalized medical hegemony.
Key-words: nursing care, catheterization, Swan-Ganz, professional autonomy.
Resumen
Autonomía de intervención del enfermero delante de alteraciones de parámetros en
la monitorización hemodinámica
Estudio prospectivo de naturaleza descriptiva y abordaje cualitativo que muestra el conocimiento presentado de un grupo
de 12 enfermeros en la monitorización hemodinámica invasiva (MHI), seleccionados por muestreo de conveniencia. El
escenario se constituye del Centro de Tratamiento Intensivo (CTI ), CTI-Pos-Operatorio y Unidad Coronaria (UC) de un
hospital de la red privada, localizado en el Municipio de Rio de Janeiro. El periodo de colecta de datos fue entre los meses de
Febrero y Marzo de 2004. Se objetiva: (a) verificar el conocimiento de un grupo de enfermeros sobre los parámetros directos
propiciados por la MHI, cuando analizados por un cuestionario; (b) identificar las intervenciones informadas por un grupo de
enfermeros delante de una hipotético descubrimiento de alteraciones de los parámetros en la MHI; (c) discutir la autonomía
de intervención informada por un grupo de enfermeros delante de alteración de los parámetros de la MHI. Los resultados
demuestran que a pesar del conocimiento de la mayoría de los entrevistados su autonomía de intervención es limitada por
motivos como: mayor valorización técnica del manoseo del catéter y monitor en detrimento de evaluación clínica del paciente
y hegemonía médica institucionalizada.
Palabras-clave: atención de enfermería, cateterismo de Swan-Ganz, autonomía profesional.
Introdução
Sempre nos identificamos com as intervenções
de alta complexidade desenvolvidas pela equipe de
enfermagem nos setores como os Centros de Tratamento Intensivo (CTI). Diante da necessidade
de otimizar a assistência de enfermagem prestada a
esses clientes tão peculiares nessas unidades, e, por
conseguinte, fundamentar e propiciar um cuidado
integralizado e humanizado, diversas pesquisas vêm
sendo desenvolvidas sob essa perspectiva.
Dentre as tecnologias que se aplicam no CTI
inclui-se a monitorização hemodinâmica invasiva
(MHI). Para a realização dessa técnica torna-se
necessária à utilização de um cateter de artéria
pulmonar, o cateter de Swan-Ganz. Este tipo de
intervenção diagnóstica é consolidada pelo encunhamento da extremidade desse cateter em um dos
ramos da artéria pulmonar, onde, através de uma
série de mecanismos hidrostáticos, elétricos e eletrônicos, obtêm-se as informações acerca do status
hemodinâmico do cliente.
Os aspectos conceituais e de utilização do cateter de artéria pulmonar, as suas indicações e alusões
históricas, bem como a sua descoberta e necessidade
de eleição do cateter em doentes críticos, está bem
caracterizada na literatura nacional [1,2].
Em 1996, após publicação de um estudo retrospectivo que sugeria um aumento das taxas de
mortalidade e da utilização de recursos nos pacientes
monitorizados, o procedimento foi intensamente
questionado, levando a uma grande discussão na
comunidade de terapia intensiva [3].
Por outro lado, coexistem fatores que devem
ser analisados, a saber: inexistência, até o momento,
de estudos prospectivos, aleatórios e de populações
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bem definidas sobre a alteração do prognóstico
nos pacientes monitorizados; trabalhos clássicos
que revelam dificuldade de clínicos experientes em
estimar a função cardíaca e os valores das pressões
de enchimento dos pacientes graves; trabalhos que
evidenciam o despreparo das equipes médicas e
de enfermagem em obter e interpretar os achados
hemodinâmicos, sugerindo que são necessárias
medidas educativas de reavaliação do método e
de restrição de seu uso por grupos de pessoas com
capacidade comprovada.
O cateter de artéria pulmonar é um dispositivo
multilúmem usado à beira do leito, introduzido
por acesso venoso central, passando pelo átrio e
ventrículo direito até a artéria pulmonar, para a
obtenção direta de dados hemodinâmicos como:
debito cardíaco(DC), pressão de artéria pulmonar
(PAP), pressão de capilar pulmonar (PCAP), pressão
de átrio direito (PAD); e também, dados calculados,
como índices de resistência vascular, de função sistólica de ventrículos direito e esquerdo.
O referido cateter dispõe de um balão de
fluxo dirigido em sua extremidade, que, quando
inflado é direcionado pela corrente sanguínea por
meio das válvulas tricúspide e pulmonar alcançando a circulação pulmonar, mais precisamente na
artéria pulmonar. O conhecimento de parâmetros
fisiológicos permite o tratamento mais racional dos
estados de choque, infarto agudo do miocárdio
(IAM), insuficiência respiratória aguda, quadros
sépticos, e outras condições que ocorrem nos pacientes graves.
Atualmente existem diversas modalidades
desse cateter e de técnicas associadas que propiciam
medidas contínuas dos parâmetros dos pacientes
internados nas unidades de maior complexidade
de todo mundo.
Quanto aos critérios de elegibilidade dos clientes para utilização do referido cateter, inclui-se [1]:
(a) choque ou hipotensão, ou em situações clínicas
em que a possibilidade de ocorrência de hipotensão
é bastante alta, como em cirurgias de grande porte
com apreciável perda da volemia. Os dados hemodinâmicos são úteis tanto para o diagnóstico quanto
para a terapêutica, permitindo a detecção de hipovolemia (pressões de enchimento diminuído), vasodilatação periférica (resistência vascular diminuída)
e insuficiência cardíaca (débito cardíaco diminuído
com pressões de enchimento e resistência vascular
elevadas); (b) edema pulmonar cardiogênico ou nãocardiogênico; (c) outras indicações gerais tais como:
doentes em estado critico, para os quais se torna
desejável um controle rigoroso da ação das drogas
vasoativas ou administração de líquidos, como em
situação de sepse, crise hipertensiva, grandes queimaduras, intoxicações exógenas, IAM, insuficiência
respiratória aguda, entre outras.
Com o cateter posicionado, obtêm-se os
seguintes parâmetros hemodinâmicos medidos
diretamente: PAD, pressão sistólica e diastólica do
ventrículo direito (obtidas durante o posicionamento), pressão sistólica e diastolica de artéria pulmonar.
Já com o balonete insuflado no ramo da artéria
pulmonar obtemos a PAP e a PCAP.
O cateter serve, ainda, para a coleta de sangue
venoso misto para a análise da gasometria e oximétrica, e para a mensuração do debito cardíaco
por termodiluição ou pelo método de mensuração
contínua. Diante das pressões intracavitárias e intravasculares, podemos chegar a outros parâmetros,
estes, indiretos, como os índices de volume sistólico
(IVS), índice cardíaco (IC), dentre outros.
Neste trabalho estudaremos os parâmetros
diretos da monitorização hemodinâmica invasiva,
no qual elegemos o DC, a PAP, a PAD, a PCAP.
Nossa investigação parte da atuação do enfermeiro
diante dos parâmetros fornecidos pelo cateter de
Swan–Ganz. Por tanto, pretendemos inquirir sobre
a autonomia de assistência do enfermeiro frente a
interpretação desses parâmetros.
A assistência de enfermagem a pacientes
com MHI pode ser dividida em dois momentos:
preparo do material necessário para a realização
da monitorização e a assistência durante o referido ato [2].
Entretanto, transcendendo a visão tecnicista e
hegemônica, o enfermeiro deve não somente conhecer o material, preparo da técnica de instalação do
cateter, como também, fundamentar suas atividades
assistencialistas em seu conhecimento técnicocientífico, consolidando seu cuidado ao paciente
em conteúdos de fisiologia humana e interpretação
dos parâmetros hemodinâmicos fornecidos pelo
cateter de artéria pulmonar. Atitudes como essa,
demonstram a diferenciação entre o conhecimento
instituído e o conhecimento adquirido [4].
A discussão acerca da autonomia que ora se
apresenta, não é um fato novo na enfermagem,
pois, em meados do século XX a precursora da
enfermagem moderna, Florence Nightingale, já
apregoava que o emprego das atividades de enfermagem é privativo desta profissão, não cabendo a outro
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profissional de saúde inferir sobre o cuidado de
enfermagem. Portanto, a enfermagem desde quando
reconhecida e legitimada profissionalmente possui
um caráter emancipatório e autônomo, tais pilares
devem ser almejados e seguidos por nós enfermeiros
no cuidado prestado aos doentes que necessitem de
intervenções imediatas e precisas.
Assim sendo, o objeto de estudo trata da
autonomia de intervenção do enfermeiro diante
da interpretação dos parâmetros da MHI, identificando como o enfermeiro pode intervir nestas
situações. Os objetivos são: (a) verificar o conhecimento apresentado por um grupo de enfermeiros
sobre os parâmetros diretos fornecidos pela MHI,
quando inquiridos por um questionário; (b) identificar as intervenções informadas por um grupo
de enfermeiros diante de uma hipotética detecção
de alterações dos parâmetros na MHI; (c) discutir
a autonomia de intervenção informada por um
grupo de enfermeiros diante de alteração dos parâmetros da MHI.
Material e métodos
Estudo prospectivo, de natureza descritiva e
abordagem qualitativa [5,6,7] que versa sobre a atuação de um grupo de enfermeiros na monitorização
hemodinâmica invasiva. O cenário do estudo foi um
hospital da rede privada, localizado no Município
do Rio de Janeiro. Para tal investigação, optamos
pelos setores de pós-operatório, centro de tratamento intensivo e unidade coronariana, dependências
hospitalares onde se realiza a MHI. O período de
coleta de dados foi entre os meses de fevereiro e
março de 2004.
Foi elaborado um questionário semi-estruturado composto por perguntas abertas, fechadas e
aberto-fechadas em relação à temática da pesquisa.
O final de cada formulário foi dedicado à impressão
do entrevistador, onde foram anotados o comportamento e dificuldades dos sujeitos durante suas
respostas, visando assim enriquecer os achados.
O critério de elegibilidade dos enfermeiros
pesquisados foi que atuassem nos setores em que se
realizam a MHI. A amostragem de 12 formulários
foi obtida por conveniência e após a observância
dos preceitos ético-legais [8] referentes a pesquisa
envolvendo seres humanos. Dentre os depoentes, 02
enfermeiros optaram por não se identificar, apesar
de responderem ao instrumento de coleta de dados.
O tratamento dos dados foi realizado por processos manuais e informáticos, sendo posteriormente
submetidos à análise de discurso dos depoimentos
provenientes das respostas dos sujeitos. As categorias
de análise foram dispostas de acordo com o roteiro
do formulário.
Diante das categorias pré-estabelecidas, surgiram novas subcategorias determinadas a partir
das informações complementares dos enfermeiros.
Realizamos confrontos com outros achados e com
os teóricos adotados, de modo a produzir novas
reflexões sobre o objeto em estudo.
Resultados e discussão
Para melhor esclarecimento e entendimento
dos achados, os conteúdos descritos foram agrupados em categorias previamente estabelecidas, de
forma a facilitar o preenchimento do formulário.
Quanto aos dados de identificação:
Tabela I - Distribuição das freqüências absoluta e relativa de acordo com a faixa etária e tempo de formação dos
depoentes.
Anos de formação
<1
1a2
3a4
≥4
Total
Idade
n
fi
n
fi
n
fi
n
fi
n
fi
fac
20 ├ 25
01
0,08
02
0,16
0
0,00
00
0,00
03
0,25
0,25
25 ├ 30
01
0,08
01
0,08
02
0,16
00
0,00
04
0,33
0,58
30 ├
00
0,00
00
0,00
02
0,16
02
0,16
04
0,33
0,91
ND
00
0,00
00
0,00
00
0,00
01
0,9
01
0,9
1
TOTAL
02
03
04
03
12
Fonte: UTI, UCO, U PÓS-OP de Hospital Privado do Município do Rio de Janeiro
Legenda: n = freqüência absoluta / fi = freqüência relativa / fac = freqüência acumulada
Entre os 12 depoentes, foi observada maior
freqüência absoluta na faixa etária maior ou igual
a 25 anos de idade, com o tempo estimado de
formação de aproximadamente 3 anos. Torna-se
possível através destes resultados acreditar que os
sujeitos da pesquisa possuem ou deveriam possuir
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subsidio técnico-cientifico e experiência profissional,
legitimando achados compatíveis com a realidade
do profissional enfermeiro.
Acerca do conhecimento sobre interpretação
dos parâmetros da MHI e critérios de intervenção
do enfermeiro, dispomos no formulário de duas
categorias pré-estabelecidas: as atividades específicas
do enfermeiro e as inespecíficas.
Para melhor elucidação do conteúdo da discussão, foram criadas subcategorias para facilitar
o preenchimento do formulário pelos sujeitos, cabendo a eles, marcarem a opção que contemplasse
a pergunta proposta.
Dentre as atividades específicas consideradas
pela pesquisa temos: alterações da velocidade das
soluções, como drogas vasoativas; aminas; suspensão
de infusões; mudanças de parâmetros da ventilação;
coleta e solicitação de exames.
Com relação às atividades inespecíficas, consideramos aquelas que não tratam de intervenções
devidamente propostas durante a detecção de alterações na MHI pelo enfermeiro, como: preparo do
material e do paciente; acionamento da equipe médica; realização de curativos no sítio de inserção do
cateter; reconhecimento das pressões; interpretação
das curvas pressóricas; manutenção da permeabilidade do cateter entre outras.
Apesar desses procedimentos se caracterizarem
por atividades do enfermeiro intensivistas, elas não
tratam das intervenções a serem adotadas após a
identificação de problemas durante a monitorização
hemodinâmica invasiva, mas de técnicas e procedimentos tecnicamente cabíveis ao enfermeiro.
Para a visualização dos aspectos quantitativos
da pesquisa segue-se a Figura 1, gráfico de barras
agrupadas, com os dados estratificados.
Conforme resultados apontados pela pesquisa,
dentre os 12 depoentes, dez consideraram o preparo
do paciente como uma das intervenções cabíveis ao
enfermeiro; nove optaram também por acionar a
equipe médica, somente oito enfermeiros consideraram que a alteração da vazão de soluções trata-se
de uma atribuição de enfermagem. Para tanto,
verificamos que a maioria dos enfermeiros contribui com suas atividades, direcionando-as para a
preparação do material e do paciente. Contudo, tais
atividades constituem-se corolário de uma atividade
maior, qual seja, a integralização e diferenciação do
profissional através do conhecimento e autonomia,
para proceder intervenções diante de situações que
requeiram atuação imediata do enfermeiro.
Figura 1 - Intervenções dos enfermeiros ante alterações de parâmetros na MHI.
Conforme os depoimentos, os enfermeiros
acreditam que sua autonomia fica comprometida,
devido a, basicamente, dois fatores: o conhecimento
e o aprimoramento acerca dos procedimentos de alta
complexidade e; os protocolos e rotinas preconizados pelas instituições.
A situação exposta, é corroborada por uma
pesquisa que demonstrou através de um estudo
quase-experimental a ausência de instabilidade hemodinâmica durante o banho no leito do doente
crítico [9], contrapondo-se ao pré-conceito vigente,
quanto ao cuidado de enfermagem prestados à doen197
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tes submetidos a cateterização da artéria pulmonar.
Destarte, o estudo em apreço já sinalizava para a
autonomia de intervenção do enfermeiro durante
sua assistência aos clientes que necessitam de cuidados de alta complexidade, propondo que o banho
no leito pode ser efetuado mesmo nos pacientes em
uso do cateter de artéria pulmonar.
Pelo exposto, consideramos que o enfermeiro não
pode privar-se do conhecimento adquirido, mas, usar
deste para aprimorar e especializar o seu cuidado.
No que tange à monitorização hemodinâmica,
as atividades específicas foram citadas, contudo, com
menor freqüência. Tal observação é representada
por atividades como suspensão de infusão, coleta
e solicitação de exames e, alteração de parâmetros
ventilatórios ocupando a quinta, sexta e sétima
freqüência absoluta de respostas.
Na instituição onde foi promovida a pesquisa,
existe uma equipe multidisciplinar para a assistência
aos pacientes, contendo, dentre outros profissionais,
enfermeiros, fisioterapeutas, médicos e nutricionistas. A cada profissional são atribuídas atividades
preconizadas por sua gerência. Portanto, algumas
das intervenções representadas pelas subcategorias
mencionadas não são desenvolvidas por enfermeiros,
o que não impede o exercício profissional concomitante, considerando que o cuidado direcionado ao
doente crítico deve ser multi e interdisciplinar.
O enfermeiro na equipe possui participação
essencial, cabendo a ele prestar informação, não só,
sobre os aspectos relevantes da assistência de enfermagem, como também, sobre a reação do paciente
à terapêutica proposta. Nesse ponto, evidenciamos
a importância do conhecimento e a necessidade do
aprimoramento contínuo desse profissional.
A autonomia, muita das vezes, é limitada,
devido às rotinas e aos procedimentos, contudo, ela
não é restrita. O enfermeiro compartilha seu saber,
não estando subjugado, mas corroborando para a
melhora da condição clínica do paciente. Para tanto,
é mister que o enfermeiro transcenda ao aspecto
técnico e operacional e, lance mão de outras áreas
do conhecimento [4].
Por outro lado, tão importante quanto o
conhecimento é a legalidade para a atuação do enfermeiro. Sendo assim, esforços relevantes [10] do
órgão que delibera e fiscaliza o exercício profissional
de enfermagem vêm criando dispositivos legais que
respaldam tais ações. Cabe-nos, portanto, a busca
incessante do conhecimento científico para fazer jus
a estes mesmos dispositivos.
Conclusão
Podemos evidenciar através deste estudo que
o enfermeiro é um membro fundamental e essencial da equipe de saúde, seja em setores de menor
ou maior complexidade, como os que serviram
de cenário para desenvolvimento desta pesquisa.
Sua autonomia de intervenção pode ser limitada,
devido às condições institucionais preestabelecidas.
Entretanto, sua atuação está legalmente amparada e
fundamentada nas leis que regem nossa profissão.
Evidenciou-se que os enfermeiros de unidades
de alta complexidade possuem conhecimento acerca
dos parâmetros fornecidos pela MHI. Contudo,
consideram imprescindível o aprimoramento contínuo, pois conforme o avanço das tecnologias, o
cuidado de enfermagem torna-se mais complexo e,
portanto, requerendo profissionais mais capacitados
e atualizados.
Conforme categorias pré-estabelecidas na pesquisa, observamos que as atividades prestadas pelos
enfermeiros aos pacientes submetidos à MHI através
do cateter de Swan-Ganz, abarcam, desde o preparo
do material e do paciente, assistência durante a passagem do cateter, cuidado com o sitio de inserção
e manutenção do sistema; até a interpretação dos
parâmetros e intervenções quando necessário.
Torna-se importante referir, que em unidades
de cuidados complexos, assim como em outros setores, a assistência integralizada, bem como multi
e interdisciplinar, é de fundamental importância
para o sucesso da conduta elegida para terapêutica
do paciente.
Neste sentido, este trabalho não viceja contribuir para o trabalho individualizado do enfermeiro,
mas corroborar para demonstrar a necessidade do
cuidado de enfermagem autêntico, fundamentado
e legalmente respaldado no conhecimento técnico
e cientifico.
Este trabalho teve a pretensão de contribuir
para a elucidação de questões éticas e legais no que
tange a autonomia de intervenção do enfermeiro
na assistência prestada a doentes críticos que têm
necessidade de cuidados de alta complexidade. Nesse
sentido, acreditamos que tenhamos alcançado os
objetivos propostos.
Acreditamos que estudos como este que, reflitam a nossa prática profissional, sejam importantes,
pois demonstram que a prestação de cuidados de
enfermagem é legitima, logo devem ser estimulados
e fomentados, pois contribuem para a produção
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cientifica e divulgação do saber na área de enfermagem, participando de forma ativa de seu processo
emancipatório.
Referências
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intensiva. São Paulo: Manole; 1992.
2. Knobel E. Condutas no paciente grave. Rio de Janeiro:
Atheneu; 1994.
3. Barreto SSM, Vieira SRR, Pinheiro CTS. Rotinas em
terapia intensiva. 3a ed. Porto Alegre: Artmed; 2001.
4. Silva LD. Cuidados ao paciente crítico: fundamentos
para a enfermagem. 2a ed. Rio de Janeiro: Cultura
médica; 2003.
5. Minayo MCS. O desafio do conhecimento: pesquisa
qualitativa em saúde. 6a ed. Rio de Janeiro/São Paulo:
ABRASCO-HUCITEC; 1999.
6. Polit DF, Beck CT, Hungler BP. Fundamentos de. pesquisa em enfermagem: métodos, avaliação e utilização.
5a ed. Porto Alegre: Artmed; 2004.
7. Trivinos ANS. Introdução a pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo:
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8. Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 196/96.
Diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. Bioética 1996; 4(2 Supl):1525
9. Lima DVM. O banho no leito na unidade de terapia
intensiva: conceitos e preconceitos, a ciência subsidiando o cuidado de enfermagem [dissertação]. Rio
de Janeiro: Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da
UNIRIO; 2002.
10. BRASIL. Lei nº 7.498, de 25 de junho de 1986. Dispõe
sobre a regulamentação do exercício da Enfermagem
e dá outras providências. In: COFEN - Documentos
Básicos do COFEN, vol. II, Rio de Janeiro; 1990
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Artigo original
O valor da consulta de enfermagem,
como etapa do processo de assistência,
à saúde da comunidade para o enfermeiro
Sandra Maria Oliveira Caixeiro
Enfermeira, Escola de Enfermagem Anna Nery (UFRJ), Pós-Graduada em Docência do Ensino Superior, Docente em Saúde da
Mulher e da Criança no Curso de Graduação em Enfermagem do Centro Universitário Celso Lisboa.
Resumo
Este artigo apresentou como objetivo principal identificar o valor da consulta de enfermagem para o enfermeiro e a eficácia da
consulta de enfermagem para o ensino do autocuidado. É um estudo descritivo com abordagem quantitativa em que foram
sujeitos doze enfermeiros que trabalhavam com consulta de enfermagem. Os resultados obtidos nos levam a concluir que
o enfermeiro valoriza a consulta de enfermagem como parte integrante do processo de assistência à saúde da comunidade e
que tem importância prioritária na transformação dos hábitos de vida da clientela, no que tange ao desenvolvimento de um
autocuidado eficaz.
Palavras-chave: consulta de enfermagem, assistência de enfermagem, autocuidado.
Abstract
The importance of the nursing consultation, as integral part of the process of care,
to the community’s health
The main objective of this article is to identify the importance of the nursing consultation for the nurse and the effectiveness
of the nursing consultation for teaching self care. This is a descriptive study with a quantitative approach composed by
twelve nurses who worked with nursing consultation. The results lead us to conclude that the nurse gives importance to
nursing consultation as integral part of the process of care to the community’s health and that has priority importance in the
transformation of patients’ life habits, with respect to the development of an effective self care.
Key-words: nursing consultation, nursing care, self care.
Artigo recebido em 3 de maio de 2006; aceito em 12 de julho de 2006.
Endereço para correspondência: Sandra Maria Oliveira Caixeiro, Rua: Engenheiro
Albuquerque nº 62, Grajaú, Nova Iguaçú , 26030-700 Rio de Janeiro RJ, [email protected]
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Resumen
El valor de la consulta de enfermería, como etapa del proceso de asistencia, para la
salud de la comunidad
Este artículo presentó como objetivo principal identificar el valor de la consulta de enfermería para el enfermero y la eficacia
de la consulta de enfermería para la enseñanza del autocuidado. Es un estudio descriptivo con enfoque cuantitativo en que
fueron sujetos doce enfermeros que trabajaron con consulta de enfermería. Los resultados obtenidos nos llevan a concluir que
el enfermero valora la consulta de enfermería como parte integrante del proceso de asistencia para la salud de la comunidad
y que tiene importancia prioritaria en la transformación de los hábitos de vida de la clientela, en lo que se refiere al desarrollo
de un autocuidado eficaz.
Palabras-clave: consulta de enfermería, asistencia de enfermería, autocuidado.
Introdução
Nossa finalidade com o presente estudo é dar
subsídios ao enfermeiro acerca da importância da
assistência prestada ao usuário através da consulta
de enfermagem, visando à qualidade do cuidado
dispensado e valorizando orientações para um autocuidado eficaz. O enfermeiro é um profissional
responsável por um ato e uma ação de enfermagem
inteligente [1], que se utiliza do processo de enfermagem através da consulta para dar resolutividade à
assistência prestada ao usuário que dela se utiliza.
O incentivo para a escolha do tema foi o total
descontentamento em minha prática, com a visão
que alguns profissionais de saúde inclusive enfermeiros apresentam sobre a consulta de enfermagem,
sendo esta entendida como fase preliminar à consulta médica (pré-consulta) ou como complementar
(pós-consulta). A sistematização da consulta de
enfermagem traz à atividade um caráter profissional
e define a competência do enfermeiro, sendo que a
falta de clareza desta acaba por não fornecer objetivos próprios à consulta.
Considerando que a consulta de enfermagem
ainda não foi totalmente difundida nas Instituições
Públicas e Privadas e que ainda não foi entendida
e valorizada como uma atividade importante na
prevenção, promoção, recuperação e reabilitação
da saúde da população, trazendo assim resultados
positivos para os aspectos sociais, econômicos e
políticos do nosso país, é que objetivamos para esta
pesquisa identificar o valor da consulta de enfermagem para o enfermeiro, investigar a interpretação
sobre a metodologia utilizada no desenvolvimento
da consulta de enfermagem e a eficácia da consulta
de enfermagem para o ensino do autocuidado.
Do ponto de vista geral, a análise dos dados
evidenciará os aspectos diretamente relacionados
à importância e papel da consulta de enfermagem
atribuída pela categoria. As opiniões pessoais podem
exercer grande influência tanto no contexto interno
das Instituições em que os enfermeiros trabalham
como nas autoridades que deliberam sobre assuntos
de saúde.
A importância do presente estudo se revela tanto para o profissional enfermeiro, na qualidade do
desempenhar de suas atividades voltadas para a consulta de enfermagem, quanto para o autocuidado da
clientela em uma diretriz Nacional, visando atender
as necessidades assistenciais, principalmente, as de
saúde pública. Através destes dados, chegamos a resultados, que contribuirão para a consolidação e ampliação da consulta de enfermagem principalmente
no Sistema Único de Saúde e, subseqüentemente,
do desenvolvimento científico da profissão.
Revisão de literatura
A formação da enfermagem no Brasil teve seu
início com a Escola Profissional de Enfermeiros e
Enfermeiras em 1890 [2], através do Decreto nº
791/90, baseado no modelo Francês, ainda sem a
perspectiva moderna, já concretizada na Europa e
nos Estados Unidos.
No ano de 1922, foi consumada a criação
da Escola de Enfermeiras, pelo Departamento
Nacional de Saúde Pública (DNSP), através do
Decreto nº 15.799/22, atualmente denominada
Escola de Enfermagem Anna Nery. O currículo da
Escola de Enfermeiras do DNSP, estabelecido pelo
Decreto nº 16.300/23, foi estruturado nos padrões
nightingalianos, adaptado aos moldes brasileiros,
por ser o enfermeiro o profissional de saúde
competente para satisfazer as necessidades primeiras
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de assistência imediata à população direcionada à
Saúde Pública [3].
A primeira escola do Brasil integrada em Universidade foi a Escola de Enfermagem Anna Nery,
incluída em 1937 à Universidade do Brasil, como
Instituição de ensino complementar. As reformas do
ensino de 1961 e 1966 [4] apressam a integração
das outras escolas de enfermagem nas Universidades
Brasileiras. Este período caracteriza-se pelo fortalecimento dos serviços de enfermagem nas Instituições
de saúde e pela incorporação da enfermeira nas
equipes de planejamento de saúde em seus diferentes
níveis (Federal, Estadual e Municipal).
Na tentativa de iniciar uma mudança na formação do enfermeiro, é que foi reformulado o currículo de enfermagem pelo Parecer nº 271/62 [3],
que implantou duas alternativas para especialização.
Com o objetivo de formar o enfermeiro de saúde
pública e a enfermeira obstétrica, é que foi estabelecida, através desse mesmo Parecer, a especialização
em saúde pública e obstetrícia.
A reforma universitária ocorrida na década de
70, através do Parecer nº 163/72 e da Resolução nº
4/72 [3], estabeleceu um currículo compreendendo
a etapa pré-profissional, profissional comum e habilitações, aumentando para três as habilitações de
enfermagem: enfermagem médico-cirúrgica, enfermagem obstétrica e enfermagem de saúde pública.
A saúde nesta mesma década começou a ser
vista como o resultado do desenvolvimento ou não,
social, econômico e político do país, sendo viabilizada a participação da população nas discussões sobre
saúde, já que a mesma era atingida diretamente pelas
mudanças políticas ocorridas no país.
Finalmente, chegamos à aprovação da lei
7.498/86, que dispõe sobre o exercício da enfermagem, só sendo regulamentada um ano após sua
aprovação, através do Decreto nº 94.406/87 [5].
O artigo 11º desta lei dispõe sobre as atividades
privativas do enfermeiro em que se incluem a consulta de enfermagem e a prescrição da assistência
de enfermagem, fornecendo ao enfermeiro amparo
legal para o desenvolvimento da consulta de enfermagem. Já em 1968 [6], foi identificada a consulta
de enfermagem como atividade final e privativa do
enfermeiro e sem possibilidade de delegação. Em
1975, era palco de discussões, no que concerne a
sua incorporação definitiva à prática da enfermagem
como função exclusiva do enfermeiro. Somente em
1986, a consulta de enfermagem foi legalmente
estabelecida [7].
A consulta de enfermagem caracteriza-se por
comportar um levantamento de problemas de
observação sistemática, diagnóstico da situação,
prescrição e registro, através do qual são identificados problemas ou não de saúde-doença e prescritas
e implementadas medidas de enfermagem que
contribuam à promoção, prevenção, recuperação
ou reabilitação do cliente. De acordo com Maciel
e Araújo [8]:
A consulta de enfermagem supõe a entrevista para coleta dos dados, o exame físico,
o estabelecimento do diagnóstico de enfermagem, a prescrição, a implementação dos
cuidados e a orientação das ações relativas
aos problemas encontrados. A partir dos
diagnósticos efetivados, a enfermeira adotará condutas de resolutividade própria,
ou de encaminhamento ao profissional ou
serviço competente, no caso de a intervenção fugir ao seu âmbito de atuação.
Sua aplicação atualmente é dirigida a vários
grupos sociais, entre eles, materno-infantil, adulto
e idoso. O grupo materno-infantil alvo do atendimento é o de baixo risco e os outros grupos são
inseridos na consulta de enfermagem através dos
programas do Ministério da Saúde de hipertensão,
diabetes entre outros.
A consulta de enfermagem vem cada vez mais
se consolidando como modalidade assistencial no
campo de atuação da enfermagem e como tal constitui um avanço importantíssimo da profissão. A
assistência individualizada preconizada na consulta
de enfermagem permite o desenvolvimento de atividade educativa, levando a um autocuidado eficaz
da clientela assistida. A consulta de enfermagem representa assim, mais um componente da assistência
à saúde, no que se refere à lei 7.498/86.
Silva [9] acrescenta dizendo:
A consulta de enfermagem está contemplada, como atividade privativa do enfermeiro, na lei do exercício profissional nº
7.498/86, no seu art.11, inciso I, alínea
i, e vem sendo efetivada na prática por
enfermeiros que nela creditam.
Todavia, a consulta de enfermagem ainda não é
executada em todas as Instituições Públicas de Saúde, muito menos nas Instituições Privadas, podendo
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ainda observar que alguns enfermeiros consideram
a consulta de enfermagem como sendo, apenas,
pré e pós consulta médica, nas quais o enfermeiro
prepara o cliente para a consulta médica e/ou orienta
em relação às prescrições médicas. Esta versão da
consulta de enfermagem [8] surgiu na década de
60, onde a mesma era denominada de entrevista
pós-clínica, por se tratar de uma atividade delegada
pela medicina à enfermagem, com o objetivo de
complementar a consulta médica.
Sabemos que, para que o enfermeiro execute
com qualidade a consulta de enfermagem voltada
para os objetivos a que se destina, ou seja, promoção,
prevenção, recuperação ou reabilitação da saúde,
o mesmo deve estar capacitado para tal fim e que,
para se capacitar, depende única e exclusivamente do
desenvolvimento de suas habilidades, capacidades e
competências direcionadas ao grupo social atendido.
Para finalizar Maciel e Araújo [8] relatam:
... torna-se imprescindível que cada profissional envolvido tenha domínio da área
que está sob sua responsabilidade, não só do
ponto de vista de conhecimento científico,
mas também das suas implicações éticas,
sociais e políticas. A partir do instante
em que faz parte da equipe, a enfermeira
precisa conhecer o seu papel e estar bem
preparada para desempenhá-lo.
meiros) e em Saúde do Adulto e do Idoso (6 enfermeiros). A seguir, foi aplicado formulário elaborado
pela própria autora, o qual constava de perguntas
fechadas, procurando assim identificar a percepção
dos enfermeiros sobre a consulta de enfermagem,
numa tentativa de levar subsídios que permitam o
desenvolvimento e o avançar desta assistência, em
todas as suas fases, ao cliente em ambulatório ou em
unidade de pacientes externos.
Para trabalhar os dados obtidos analisamos e
discutimos as categorias individualmente, considerando se a consulta de enfermagem é uma atividade
importante como parte do processo de enfermagem,
capacidade do enfermeiro em realizá-la, metodologia
utilizada na consulta, importância do conhecimento científico ao executar a consulta e se a mesma
desperta no cliente o interesse para o autocuidado.
Resultados e discussão
Gráfico 1 - Distribuição quanto importância da consulta de enfermagem.
Material e métodos
Trata-se de um estudo caracterizado como
descritivo, com abordagem quantitativa, no qual utilizaremos a análise estatística para a apresentação dos
dados, com números absolutos dispostos em tabelas
para interpretações de cada variável analisada. Para
este estudo, apresentamos como sujeitos 12 enfermeiros que realizam consulta de enfermagem, em
três Instituições Federais de Saúde do Estado do Rio
de Janeiro, ligadas a uma Universidade Federal.
Através de instrumento de coleta de dados
estruturado, ou seja, um formulário, colhemos
dados dos enfermeiros que realizam a consulta de
enfermagem, após o seu aceite e assinatura do Termo
de Consentimento Livre e Esclarecido, de acordo
com a Resolução 196/96 do Conselho Nacional de
Saúde [10].
Os enfermeiros sujeitos deste estudo atuavam
efetivamente, realizando a consulta de enfermagem
nas áreas de Saúde da Mulher e da Criança (6 enfer-
Fonte: HESFA, HUCFF e IPPMG.
Em relação à importância da consulta de
enfermagem, 100% dos enfermeiros reconhecem
ser essencial como parte integrante do processo de
assistência (figura 1). Ressaltamos, afirmando que o
enfermeiro desempenha um papel de suma importância, pois objetiva uma assistência integral em prol
da melhoria do estado geral da clientela [4].
A Consulta de Enfermagem deve ser um espaço
privilegiado para que o cliente possa expressar seus
questionamentos e sinta-se seguro para discuti-los.
Para assistir adequadamente, o profissional enfermeiro deve aproximar-se de cada cliente, sendo
essencial que haja, neste caso, o processo dialógico.
Torna-se fundamental, então, que o enfermeiro disponha-se a ouvir o cliente, para que possa identificar
suas necessidades e expectativas [11].
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Neste momento, chamamos a atenção para o
cuidado diferencial que os enfermeiros vêm desempenhando, no seu cotidiano de trabalho, de substituir a consulta rápida por uma escuta mais atenta
de assuntos que provocam angústias e dúvidas,
promovendo verdadeiro bem-estar aos clientes.
Gráfico 2 - Distribuição quanto à capacidade em
realizar a consulta de enfermagem.
Quanto à capacidade de cada enfermeiro em
desenvolver a consulta de enfermagem (figura 2),
100% responderam positivamente, o que já era
esperado, visto que todos os enfermeiros realizam
a consulta de enfermagem diariamente em suas
unidades de trabalho.
A consulta de enfermagem caracteriza-se por
um encontro de pessoas que vão interagir, trocando
informações. De um lado, encontramos o enfermeiro com o seu saber técnico-científico, seu preparo
e habilidades para trabalhar com seres humanos e,
do outro lado, encontramos o cliente detentor de
necessidades básicas afetadas, procurando alívio para
suas ansiedades e encaminhamento para a resolução
de seus problemas de saúde-doença [9]. A capacitação
do profissional de enfermagem que vai realizar uma
consulta de enfermagem é de suma importância,
pois se reveste em compromisso com a orientação de
qualidade, responsabilidade no atendimento às necessidades da clientela e um papel da mais alta relevância
na promoção de mudanças significativas no processo
saúde-doença da clientela assistida [8].
Com referência à metodologia utilizada no
desenvolvimento da consulta de enfermagem (figura
3), 83% relacionaram corretamente todas as etapas
da metodologia científica, enquanto 17%, não
souberam identificar com exatidão a metodologia
necessária para o bom desenrolar da consulta de
enfermagem. Estes dados nos mostram que, apesar
desses enfermeiros realizarem consulta de enfermagem diariamente, ainda não identificam com exatidão qual a metodologia preconizada para tal fim. Os
autores consultados [8, 13] foram unânimes em citar
a metodologia preconizada que seria: levantamento
de problemas, diagnóstico, prescrição, intervenção,
registro e avaliação.
A ciência da enfermagem, assim como seu
princípio científico, está pautada em uma ampla e
concreta estrutura teórica, denominada de Processo de Enfermagem, comumente definido como o
“modelo através do qual essa estrutura é aplicada à
prática de enfermagem” [12]. Porém, se faz necessário que todo esse processo esteja embasado em uma
teoria de enfermagem, para que possa possibilitar o
norteamento da prática ministrada na consulta de
enfermagem como, também, possivelmente viabilizar e capacitar como concretos os resultados obtidos
na assistência prestada.
Gráfico 4 - Distribuição quanto à importância no
aprofundamento do conhecimento e da prática na
metodologia proposta para se executar a consulta de
enfermagem.
Fonte: HESFA, HUCFF e IPPMG.
Gráfico 3 - Distribuição quanto à metodologia utilizada no desenvolvimento da consulta de enfermagem.
No que tange a considerar importante o
aprofundamento do conhecimento e da prática na
metodologia proposta para se executar a consulta
de enfermagem (figura 4), 100% dos entrevistados
ofereceram uma resposta positiva, o que corrobora
o pensamento dos autores [8,11], que relatam com
unanimidade, a necessidade do aprimoramento e
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conseqüente capacitação do profissional, na metodologia proposta, para a eficácia da consulta de
enfermagem.
A qualidade da assistência prestada pelo enfermeiro na consulta de enfermagem está diretamente
relacionada ao estímulo no aprofundamento da
prática metodológica e conseqüente atuação positiva, eficaz e qualitativa do atendimento proposto. A
experiência pessoal, de como o enfermeiro percebe
ou vivencia outrem, também é fator importante na
qualidade da prática profissional [9]. O enfermeiro,
ao executar seu trabalho com competência, torna-se
ponto de referência frente à clientela.
Gráfico 5 - Distribuição da importância da consulta de enfermagem no despertar do interesse para o
autocuidado.
Relacionando a consulta de enfermagem com
o despertar do cliente para o autocuidado (figura
5), 75% responderam positivamente, enquanto
25% responderam negativamente. Os autores pesquisados identificam como primordial na consulta
de enfermagem a educação para a saúde, que levará
ao autocuidado eficaz do indivíduo, família e comunidade, proporcionando um nível mais elevado
de saúde comunitária, que é a base primordial da
consulta de enfermagem.
Paula apud Maciel e Araújo [8] confirmam:
Concorda-se, plenamente, com essa referência, de vez que cabe à enfermeira
desenvolver não só o atendimento direto
ao cliente, mas também estratégias que
possibilitem o ensino à comunidade, de
medidas de promoção à saúde, exercendo,
portanto, a função de educadora.
O autocuidado pode ser definido como a prática de atividades que o indivíduo inicia e executa
em seu próprio benefício, na manutenção da vida,
da saúde e do bem-estar [13].
Pode-se dizer que a capacidade que o indivíduo tem para cuidar de si mesmo é chamada de
intervenção de autocuidado, e a capacidade que o
indivíduo apresenta para prestar cuidados a outros
é denominada de intervenção de cuidados pendentes. No modelo preconizado por Orem [14],
a meta efetiva é a de ajudar o indivíduo, através de
orientações básicas e encaminhamentos direcionados, quando necessário, para que o mesmo possa
satisfazer suas próprias exigências terapêuticas de
autocuidado.
Ressaltamos que este modelo tem como premissa básica a crença de que o ser humano tem
habilidade e capacidade próprias para promover o
cuidado de si mesmo e que pode ser amplamente
beneficiado com o cuidado prestado pelo enfermeiro, quando da incapacidade de se autocuidar.
Um sistema de enfermagem bem planejado
pelo profissional enfermeiro baseia-se nas necessidades de autocuidado e na capacidade que o
cliente apresenta para a execução de atividades
de autocuidado [15]. Para que as necessidades de
autocuidado do indivíduo possam ser satisfeitas,
podemos nos guiar pelos sistemas de enfermagem:
o sistema totalmente compensatório, o sistema
parcialmente compensatório e o sistema de apoioeducação.
O primeiro é representado pelo indivíduo
incapaz de empenhar-se nas ações de autocuidado.
Através de suas ações, o profissional enfermeiro
vai centralizar suas ações nas limitações do cliente,
buscando o autocuidado do mesmo, diminuindo sua
incapacidade para as atividades rotineiras, através do
apoio e da sua proteção.
Ao se falar do Sistema de Enfermagem Parcialmente Compensatório, podemos observar que
tanto o enfermeiro quanto o cliente desempenham
ações de cuidado e que, através dessas ações, o
enfermeiro ministra algumas medidas de cuidado
pelo cliente, compensando algumas limitações de
autocuidado.
O terceiro e último Sistema de Enfermagem
denominado de apoio-educação, que é o que mais
nos interessa neste estudo, pois é o sistema que
amplamente é trabalhado pelo enfermeiro no desenvolvimento da consulta de enfermagem. Ocorre,
quando o cliente consegue executar ou pode e deve
ser orientado pelo enfermeiro a executar medidas de
autocuidado terapêutico, regulando o exercício e o
desenvolvimento de suas atividades de vida diárias
saudáveis, sendo que o papel do enfermeiro é de
extrema importância na promoção de saúde deste
indivíduo, quando o torna capacitado para desempenhar seu próprio autocuidado eficaz.
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Conclusão
A consulta de enfermagem, no país, vem a se
expandir cada vez mais, considerando, numa visão
atual, a resposta do enfermeiro ao seu compromisso
social, fortalecido e amparado pela Lei 7498/86,
artigo 8º, inciso I do Decreto nº 94.406/87, que
refere ser a consulta de enfermagem atividade privativa do enfermeiro.
A consulta de enfermagem tem importância
fundamental, no que tange à mudança dos hábitos
de vida da clientela, para o desenvolvimento de
um autocuidado eficaz. A enfermagem dispõe de
subsídios científicos suficientes na tarefa de educar,
de esclarecer o indivíduo, família e a comunidade,
reforçando a atenção da população no que concerne
à prevenção e tratamento de doenças.
Os enfermeiros têm o dever de ocupar o
espaço que lhes foi concedido, pois não há vazios
que não sejam ocupados e, se os espaços físicos que
lhes cabem deixarem de ser uma preocupação do
profissional enfermeiro, poderão transformar-se
em problemas maiores para a classe, pois outros
profissionais de saúde poderão ocupá-los.
O aprofundamento do conhecimento científico e da prática na metodologia proposta para se
executar a consulta de enfermagem é necessário e
deve ser priorizado pelo enfermeiro, pois a capacidade e a competência se fazem, quando se domina
o objeto de trabalho e, para dominá-lo, é preciso
realizar um trabalho de transformação, como objetiva a consulta de enfermagem, que consta de um
fazer que contém um saber.
Todos os profissionais de enfermagem são
primariamente capazes de realizar a consulta de
enfermagem com eficiência e eficácia comprovada,
conquanto dominem a metodologia proposta para a
sua execução. É importante o engajamento e a preocupação em assumir o seu espaço, apresentando uma
postura constantemente crítica e questionadora, na
rotina de avaliar o seu desempenho.
Conclui-se, portanto, que a consulta de enfermagem é valorizada pelo enfermeiro como parte
integrante e necessária no processo de assistência
à saúde da comunidade, possibilitando uma assistência humanizada advinda da valorização do rela-
cionamento, do diálogo e do desenvolvimento do
autocuidado da clientela assistida pelo enfermeiro.
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Artigo original
Sistematização da assistência
de enfermagem: análise do registro
do enfermeiro
Cristina Spena Braga *, Miriam Marinho Chrizostimo**
*Enfermeira Especialista em Gerência dos Serviços de Enfermagem pela Universidade Federal Fluminense, ** Professora
Assistente do Departamento de Fundamentos de Enfermagem e Administração da Escola de Enfermagem Aurora de Afonso Costa,
Universidade Federal Fluminense
Resumo
Estudo descritivo documental que utiliza abordagem quantitativa e que possui como objetivo analisar o registro do enfermeiro
no prontuário do cliente apontando as etapas do processo de enfermagem que são importantes para o cumprimento da
Sistematização da Assistência de Enfermagem segundo a Resolução COFEN 272/00. Este estudo foi realizado a partir de
informações coletadas em 30 prontuários no setor de auditoria de clientes internados no Centro de Terapia Intensiva, em um
hospital militar do Rio de Janeiro, utilizando um instrumento do tipo formulário com perguntas relacionadas à sistematização
da assistência, sendo tratados os dados por análise estatística. Observou-se que o Processo de Enfermagem inexiste de forma
completa nos registros dos enfermeiros. Sendo as etapas que mais estiveram ausentes: o diagnóstico de enfermagem e as
prescrições de enfermagem; incompletos: o histórico de enfermagem e o exame físico. Estes achados revelam que o processo
de enfermagem no CTI apresenta-se nas fases iniciais de implantação.
Palavras-chave: processos de enfermagem, registro de enfermagem, cuidados intensivos.
Abstract
Nursing Process: an analysis of nurse’s record
This theoretical study uses a quantitative approach and its goal is to analyze nurse’s record highlighting the important steps
in the nursing process according to the COFEN (Brazilian Federal Nursing Council) 272/00 Resolution. Data was collected
through records of 30 patients hospitalized in the Intensive Care Unit of a military hospital in Rio de Janeiro and these
data was statistically treated. Statistical results showed that the nursing process does not exist in its most complete form in
the nurses’ records. The most absent steps were the nursing diagnosis and the nursing prescriptions. The most incomplete
information was the anamnesis and the physical exam. These results indicate that the nursing process is in its early stages in
the Intensive Care Unit in the Hospital under analysis.
Key-words: nursing processes, nursing register, intensive care.
Artigo recebido em 31 de outubro de 2005; aceito em 30 de junho de 2006.
Endereço para correspondência: Cristina Spena Braga, Rua Dois de Fevereiro, 1321, bloco
05, apto 606, 20730-450 Rio de Janeiro RJ, Tel: 21 8874 0417, E-mail: [email protected]
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Resumen
Proceso de enfermería: análisis del registro del enfermero
Estudio descriptivo documental que utiliza abordaje cuantitativo y que tiene como objetivo analizar las anotaciones
del enfermero en el prontuario del paciente resaltando las etapas del proceso de enfermería que son importantes para el
cumplimiento de la Resolución del COFEN (Consejo Federal de Enfermería Brasilero) 272/00. Este estudio fue realizado
a partir de informaciones colectadas en 30 prontuarios de pacientes ingresados en la Unidad de Terapia Intensiva, en un
hospital militar en Rio de Janeiro y estos datos fueron tratados estadísticamente. Se observó que el proceso de enfermería no
existe de forma completa en los registros de los enfermeros. Las etapas que más estuvieron ausentes fueron: el diagnostico de
enfermería y las prescripciones de enfermería. La anamnesis y el examen físico fueron los más incompletos. Esos resultados
revelan que el proceso de enfermería en la Unidad de Terapia Intensiva está en la fase inicial de implantación.
Palabras-clave: proceso de enfermería, registro de enfermería, cuidados intensivos.
Introdução
O termo processo de enfermagem foi empregado pela primeira vez por Ida Orlando em 1961, para
explicar o cuidado de enfermagem [1]. No início dos
anos de 1970, Kristine Gebbie e Mary Ann Lavin
da Escola Universitária de Enfermagem de St. Louis
iniciaram conferências nacionais sobre a classificação
dos diagnósticos de enfermagem. “Nesta época, os
educadores de enfermagem e os enfermeiros práticos
começaram a usar regularmente, o processo de cinco
etapas” [2], sendo a primeira etapa a abordagem
inicial, a segunda o diagnóstico de enfermagem, a
terceira o planejamento, a quarta a intervenção e a
quinta e última etapa a avaliação.
No Brasil, Horta [1] definiu o processo de
enfermagem como uma “dinâmica de ações sistematizadas e inter-relacionadas, visando assistir ao ser
humano, caracterizado pelo inter-relacionamento e
dinamismo de suas fases”. Sendo composto de seis
etapas: histórico, diagnóstico, plano assistencial,
plano de cuidados ou prescrição, evolução e prognóstico de enfermagem.
O Conselho Federal de Enfermagem/COFEN
[3] dispõe sobre a Sistematização da Assistência de
Enfermagem/SAE nas instituições de Saúde Brasileiras através da resolução COFEN-272/200. A
SAE é atividade privativa do enfermeiro, onde são
utilizados métodos e estratégias para identificação
das situações do processo saúde-doença, subsidiando ações da assistência que contribuem para
promoção, prevenção, recuperação e reabilitação
da saúde do indivíduo, família e comunidade; e sua
institucionalização como prática de um processo
de trabalho do enfermeiro propicia o atendimento
às necessidades do usuário ratificando o modelo,
missão, visão, objetivo e metas do serviço de en-
fermagem, traduzindo em qualidade da assistência
de enfermagem.
A resolução da SAE deverá ser registrada no
prontuário do paciente/cliente/usuário, compondo
formalmente o processo por: histórico de enfermagem, exame físico, diagnóstico de enfermagem,
prescrição da assistência de enfermagem, evolução
da assistência de enfermagem, relatório de enfermagem.
A pesquisa se desenvolveu no primeiro semestre de dois mil e cinco, no Centro de Terapia
Intensiva/ CTI, de um hospital militar geral de
grande porte, do município do Rio de Janeiro, que
atende a clientela de demanda referenciada da rede
de serviços de saúde do Exército Brasileiro. Possui
como o objetivo analisar o registro do enfermeiro
no prontuário do cliente apontando as etapas do
processo de enfermagem que são importantes para
o cumprimento da SAE. A discussão do resultado
desta pesquisa traz a reflexão do enfermeiro sobre a
forma como o processo de enfermagem está sendo
registrado no prontuário visando aprimoramento
futuro.
Material e método
Privilegia-se a abordagem quantitativa e a
pesquisa do tipo descritivo documental com aproximação da exploratória, tendo em vista nova visão
do problema proporcionada por este estudo.
O material e o método articulam o meio e o
fim desta investigação, através dos procedimentos
ordenados logicamente, capazes de verificar a hipótese [4].
O cumprimento dos procedimentos éticos e
legais foram seguidos e houve aprovação do setor
de auditoria para realização da pesquisa. Como
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também, preservação do sigilo quanto às fontes dos
dados e os nomes dos responsáveis pelos registros.
Por isso, os prontuários passam a ser nomeados de
acordo com o alfabeto e os nomes com os algarismos,
sem correspondência com a realidade.
A amostra conta com 30 prontuários de clientes internados no CTI, do período de novembro
a dezembro de dois mil e quatro e janeiro de dois
mil e cinco.
O número total dos prontuários dos pacientes
que receberam baixas do CTI, no período pré-estabelecido, é de 100. Ficando então, 70 prontuários,
70 % fora dos critérios apresentados nesta investigação e 30%, sendo 30 aptos para ao estudo.
O critério de elegibilidade foi estabelecido que
estes devem possuir o tempo de permanência no
CTI igual/ superior a cinco dias.
O instrumento para a coleta dos dados foi o
formulário com perguntas abertas e fechadas. E o
setor utilizado para esta coleta foi o de auditoria
local que se encontram todos os prontuários dos
pacientes que recebem baixas do hospital.
A ordenação do conteúdo do material coletado possibilitou o tratamento dos dados, através da
análise estatística, o que tornou necessário à subdivisão do Processo de Enfermagem em duas partes:
o contexto geral e as etapas, sendo estas o histórico,
exame físico, diagnóstico, prescrição e evolução de
enfermagem. Cada etapa foi analisada em cada fase
do processo de internação do cliente na admissão,
no período de internação e na alta, para se chegar à
discussão e a conclusão desta investigação.
Considera-se admissão a entrada do cliente no
CTI, o período de internação as evoluções subseqüentes e a alta, a saída do cliente do CTI por óbito
ou encaminhamento para a enfermaria. Esta divisão
facilita a real interpretação dos dados. Após a distinção
das fases do processo de internação avalia-se a forma
de apresentação dos registros, isto é, se eram completos, incompletos ou ausentes. Cita-se com registro
completo aquele que apresenta todas as etapas; o
incompleto o que apresenta de um a quatro etapas e
ausente o que não apresenta nenhuma etapa.
A apresentação dos resultados demostrados
através dos gráficos criados com o programa Excel, expressam o percentual obtido na análise dos
dados.
Como fundamento para análise dos dados
utiliza-se como referencial a Resolução COFEN
272/00 que dispõe sobre a SAE onde define e descrimina seus componentes.
Resultados e discussão
A Resolução COFEN 272/2000, dispõe sobre
a Sistematização da Assistência de Enfermagem,
entretanto o que se constata é que esta tornou-se
inexistente, devido ao registro do enfermeiro ser
voltado para o cuidado prestado ao usuário e não
com a preocupação de cumprir a SAE.
Quando analisa-se os prontuários do CTI,
verifica-se que dos 100%, a admissão apresenta o
registro do Processo de Enfermagem (PE) incompleto em 13%, 04 prontuários e ausente 87%, 26
prontuários (gráfico 1). Na internação 3%, 01 prontuário, foram incompletos e 97%, 29 prontuários,
ausentes (gráfico 2). Na alta o PE foi ausente em
100%, isto é nos 30 prontuários.
Gráfico 1
Gráfico 2
Estes gráficos demonstram que o Processo de
Enfermagem que insere o histórico, exame físico,
diagnóstico e prescrição de enfermagem, evolução
da assistência, na admissão deveria constar primordialmente o histórico, exame físico, diagnóstico e
prescrição de enfermagem, por ser a fase da internação do cliente que o enfermeiro tem o primeiro
contato com o usuário.
Entretanto, observa-se que a maioria dos
prontuários (87%), o PE está ausente. O Processo
de Enfermagem não constitui uma prática recente,
apesar de a Resolução COFEN 272 ser do ano
2000. O conceito do PE foi empregado no Brasil em
1979 por Horta [1], quando considerou o PE uma
técnica capaz de melhorar os padrões de qualidade
do atendimento ao paciente.
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Feldman [5] refere que no Brasil, nos últimos
anos, como nos EUA, Europa, Canadá, observa-se
uma profunda preocupação e exigência do setor da
saúde pela qualidade de assistência à saúde oferecida
pela estrutura de serviços. Dentro desses serviços
encontra-se o de enfermagem onde a qualidade
da assistência é mensurada e avaliada através dos
componentes estruturais, das metas do processo
de enfermagem e dos resultados apresentados pelo
usuário. Para tal é “imprescindível que todas as
fases da SAE estejam registradas e arquivadas no
prontuário do cliente, para a melhora da qualidade
da assistência de enfermagem”.
Nas etapas do Processo de Enfermagem, sendo
a primeira delas o Histórico de Enfermagem, foi considerado completo aquele que descreve os hábitos
individuais e biopsicossociais visando a adaptação
do paciente à unidade de tratamento, assim como
a identificação de problemas; incompleto aquele
que apresentava apenas uma especificação; ausente
o que não era registrado o histórico.
O gráfico 3 expressa o percentual do resultado
da análise dos registros na admissão, visto que neste
setor ocorre o primeiro contato com o cliente, onde
as principais informações são registradas.
Gráfico 3
Os registros que continham o histórico de
enfermagem incompletos correspondentes a 14
prontuários (47%), apresentavam apenas a identificação de problemas, não consideravam os hábitos
individuais e biopissicossocias do cliente. Significando que a entrevista não proporciona conhecer
as percepções do cliente, ou seja, o que o cliente
deseja compartilhar.
Para Doenges, Moorhouse e Geissler [6], “a
organização e atualização dos dados da entrevista
ajudam na educação continuada sobre as necessidades de cuidado do paciente e sobre os diagnósticos
de enfermagem”
O gráfico 4 expressa o percentual da segunda
etapa do PE, Exame físico, registrado nos prontuários
durante a internação do cliente. Concebe-se, nesta
etapa, o exame físico completo aquele com inspeção, ausculta, palpação, e percussão, relacionados
à internação, efetuando o levantamento de dados
sobre o estado de saúde do paciente e anotação das
anormalidades encontradas para validar as informações obtidas no histórico; incompleto aquele
que apresentava apenas uma especificação; ausente
o que não era registrado.
Gráfico 4
Durante a análise dos prontuários observa-se
que no período de internação havia registrado o exame físico completo ou incompleto, não evidenciado
na admissão e alta.
Os registros que continham o exame físico
incompletos na internação, (70%) 21 prontuários,
apresentavam apenas a inspeção, levantamento
de dados de saúde e anormalidades encontradas,
ficando ausentes a ausculta, palpação e percussão.
Em tese, a ausência dessas fases demostra que o enfermeiro restringe seu exame físico a inspeção, isto
é, “exercita a habilidade de percepção e observação
por meio do sentido da visão” [6], não utilizando a
audição, tato e olfato.
Cabe ressaltar, que após o histórico no qual
colhe-se os dados subjetivos o exame físico apresenta
os dados objetivos do cliente.
O Diagnóstico de Enfermagem, terceira etapa do
PE, registrado no prontuário do cliente por setores,
admissão, internação e alta, pouco apareceu nos registros. Contemplou-se como diagnóstico identificar
os problemas de enfermagem, as necessidades básicas
afetadas e grau de dependência, fazendo julgamento
clínico sobre as respostas do indivíduo, da família
e comunidade, aos problemas, processos de vida
vigentes ou potenciais.
Na internação, (6%) 02 prontuários tinham
diagnóstico de enfermagem, como demostra o
gráfico 5 .
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Gráfico 5
O diagnóstico de enfermagem proporciona
uma formatação para a comunicação da etapa referente ao problema no processo de enfermagem, nele
todos os problemas de enfermagem são identificados
e registrados. Sem o diagnóstico a realização da
prescrição de enfermagem torna-se inviável.
“Diferente dos diagnósticos médicos, os
diagnósticos de enfermagem mudam conforme
o paciente progride através dos vários estágios da
doença/má adaptação à resolução do problema ou
na conclusão do distúrbio” [6].
A quarta etapa do PE, Prescrição de enfermagem,
na unidade estudada não é institucionalizada com
impresso próprio, desta forma para avaliar esta etapa
foram ponderadas as condutas de enfermagem registradas no prontuário, aquelas iniciadas com verbo
de ação e qualificadores tipo “como”, “quando”,
“onde”, “tempo/ frequência” e “quantidade”.
As condutas deveriam conter as medidas decididas pelo enfermeiro que direciona e coordena
a assistência de enfermagem ao paciente de forma
individualizada e contínua, objetivando a prevenção,
promoção, proteção, recuperação e manutenção
da saúde a fim de serem consideradas completas;
incompletas na falta de alguma medida e ausentes
quando não registradas no prontuário. Para análise
desta etapa optou-se pela representação gráfica por
setores.
O gráfico 6 expressa o percentual de condutas
de enfermagem registradas no prontuário durante a
admissão, internação e alta do cliente na unidade.
Gráfico 6
Na admissão, (84%) 25 prontuários, as condutas de enfermagem foram ausentes, refletindo que as
condutas de enfermagem prestadas ao cliente, no aspecto legal, não foram realizadas pelo enfermeiro.
As evoluções subsequentes correspondentes
ao período de internação, 33% que corresponde
a 10 prontuários, apresentavam as condutas de
enfermagem.
A alta da unidade por óbito ou encaminhamento para a enfermaria tiveram 87%, 26 prontuários, das condutas de enfermagem ausentes. Este
setor foi o mais alarmante durante a avaliação dos
registros, pois em sua totalidade as altas por óbito
eram registradas no prontuário apenas citando a
parada cardiorrespiratória (PCR), não havendo descrição do tipo de PCR, a realização da manobra, as
medicações utilizadas e o encaminhamento do corpo
ao setor responsável. Dentre os prontuários, apenas
um tinha registro do encaminhamento do corpo ao
Instituto Médico Legal com horário do mesmo. Na
alta por encaminhamento para a enfermaria, não era
registrado o horário e o encaminhamento em si.
A falta no registro do motivo da alta, principalmente por óbito, juntamente com os cuidados
prestados, refletem juridicamente que estes não
foram realizados pelo profissional, podendo este
ser acusado por negligência e omissão de socorro
conforme o Código de Ética do profissionais de
Enfermagem e o Código Civil Brasileiro.
A Evolução de Enfermagem consiste na quinta etapa do PE, analisada por setores: admissão,
internação e alta. Consiste nos problemas novos
identificados, um resumo sucinto dos resultados dos
cuidados prescritos e os problemas a serem abordados nas 24 horas subseqüentes, sendo considerada
completa; incompletas na falta de alguma medida e
ausentes quando não registradas no prontuário.
Na admissão e internação a evolução do cliente
estava presente em todos os prontuários de forma
completa 15 prontuários (50%) ou incompleta 15
prontuários (50%.)
Analisando os registros nos prontuários, observa-se que falta sequência lógica da evolução do
estado de saúde do cliente nas 24 horas do dia. Os
problemas identificados no primeiro registro do
dia não eram evoluídos nos registros subsequentes,
impossibilitando uma visão real do estado de saúde
do cliente.
Na alta, 23%/07 prontuários, não continham
registro da evolução, constituindo problema ético/
legal e comprometendo a continuidade da assis211
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tência prestada nos casos de alta para a enfermaria.
Pois, “o registro possibilita a qualquer enfermeiro
dar seguimento ao cuidado do cliente, pois terá
elementos para conhecer a situação e implementar
novas medidas de cuidados” [7].
Conclusão
O Processo de Enfermagem (PE) no Centro
de Terapia Intensiva (CTI) analisado segundo a
Resolução COFEN 272/00 caracteriza-se por cinco
etapas.
Cabe lembrar que “ a implementação da sistematização da assistência da área é uma das formas
de garantir o melhor desempenho profissional e
consolidar a excelência no atendimento ao paciente/cliente” [5].
Para Cianciarullo [9], os enfermeiros sempre
buscaram a qualidade, procurando a excelência da
tecnologia da saúde, do ensino da enfermagem,
dos métodos de pesquisas e da administração de
serviços, relegando a um segundo plano a essência
da qualidade do cuidado ao paciente. Todavia essa
qualidade só pode ser mensurada e avaliada através
do registro das ações prestadas redigidas na forma
de processo.
O estudo e a implementação da Sistematização
da Assistência de Enfermagem/ SAE e dos diagnósticos de enfermagem tem se intensificado. Pois, a
questão tecnicista do cuidado deixou de ser um fator
relevante, e sim, o conhecimento científico da assistência prestada. Isto é, se o profissional que assiste ao
cliente possui capacidade de identificar as alterações
e atender as suas necessidades biopsicossociais. Para
isto, é necessário que esses dados sejam registrados
no prontuário do cliente diariamente.
A forma como as informações sobre o cliente
estão sendo registradas pelo enfermeiro no prontuário no Centro de Terapia Intensiva (CTI), visam
anotar a realização do cuidado prestado, mais do que
o registro, objetivando o cumprimento da Sistematização da Assistência de Enfermagem.
Então, finda-se este estudo com uma reflexão
de Horta [1] sobre o processo de enfermagem no
Brasil, “ainda estamos nas fases iniciais da implantação do processo”.
Referências
1. Horta WA. Processo de enfermagem. São Paulo: EPU;
1979. 37p
2. Potter PA, Perry AG. Grande tratado de enfermagem
prática: clínica e prática hospitalar. São Paulo: Santos;
2001.101p
3. Conselho Federal de Enfermagem. Resolução COFEN272/2000: Dispõe sobre a Sistematização da Assistência
de Enfermagem nas Instituições de Saúde Brasileiras.
COFEN; 2000. [citado 2004 Agosto 12]. Disponível
em: http://www.cofen.org.br.
4. Leopardi MT el al. Metodologia da pesquisa na saúde.
Santa Maria: Palloti, 2001. p.100-240.
5. Feldman LB. Como alcançar a qualidade nas instituições de saúde: critérios de avaliações, gerenciamento
de riscos hospitalares até a certificação. São Paulo:
Martinari, 2004.131p.
6. Doenges ME, Moorhouse MF, Geissler AC. Planos de
cuidados de enfermagem. Rio de Janeiro: Guanabara
Koogan; 2003. p. 06-11.
7. Zagonel IP. Consulta de enfermagem: um modelo para
o cuidado. In: Carraro TE, Westphalen MEA. Metodologia para assistência de enfermagem: teorização,
modelos e subsídios para a prática. Goiânia: AB, 2001.
51p
8. Moorhouse MF, Doenges ME. Manual de enfermagem
clínica. Rio de Janeiro: Revinter; 1994. 48p.
9. Cianciarullo TI. Teoria e prática em auditoria de cuidados. São Paulo: Ícone. 1997. 22p.
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Artigo original
Orientação para equipe de enfermagem
em relação ao cuidado do paciente
Maria do Carmo Lisboa, M.Sc.*, Karina Silveira de Almeida Hammerschmidt**, Roberta Serpe de Lima***
*Enfermeira, Professora da PUCPR, membro do GECEG, ** Curso de Enfermagem PUCPR, bolsista IC do CNPq, membro do
grupo GEMSA e GECEG, ***Curso de Enfermagem da PUCPR
Resumo
Este trabalho é um relato de experiência de desenvolver uma dinâmica de orientação para os auxiliares de enfermagem, de um
Hospital Universitário de Curitiba, em relação ao cuidado do paciente. Realizamos observações da realidade diária da equipe
de enfermagem em todos os turnos, desenvolvemos oficinas participativas com total de 1h/aula com todos os profissionais,
identificando os conhecimentos da equipe em relação ao cuidado, e uma avaliação da oficina. Verificou-se a necessidade e a
importância das atividades educativas e as vantagens destas para o profissional, bem como para o paciente. Acredita-se que
as oficinas participativas, com dinâmicas de grupo, relacionadas à humanização despertaram, nos profissionais, a consciência
do quanto se pode melhorar o atendimento de enfermagem.
Palavras-chave: cuidado, educação em serviço, humanização, assistência.
Abstract
Nursing team orientation related to patient’s care
This work is an experience report to develop a dynamics of orientation to the nursing assistants’ of a University Hospital of
Curitiba, related to the patient care. We observed nursing daily routine during every shift and developed participation workshops
with 1 hour/class with all professionals, identifying the team knowledge regarding care, and an evaluation of the workshop
was carried out. In addition, we checked the need and importance of educational activities and advantages to professional
as well as to the patient. We believe that the participant workshops, with group dynamics, related to humanization awaked
professionals on how much you can improve nursing assistance.
Key-words: care, education in service, humanization, assistance.
Artigo recebido em 12 de julho de 2005; aceito em 16 de agosto de 2006.
Endereço para correspondência: Maria do Carmo Lisboa, Rua Arion Niepce da Silva, 120
aptº 103, Água Verde, 80610310 Curitiba PR, E-mail: [email protected]
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Resumen
Orientación al equipo de enfermería con relación al cuidado del paciente
Este trabajo es un relato de experiencia sobre el desarrollo de una dinámica de orientación para los auxiliares de enfermería,
de un Hospital Universitario de Curitiba, referente al cuidado del paciente. Realizamos observaciones de la realidad diaria
del equipo de enfermería en todos los turnos, desarrollando talleres participativos con duración de 1h/clase con todos los
profesionales, identificando los conocimientos del equipo de enfermería referente al cuidado, y una evaluación del taller. Se
verificó la necesidad y la importancia de actividades educativas y las ventajas de estas para el profesional, así como para el
paciente. Se concluye que los talleres participativos, con dinámicas de grupo, relacionadas a la humanización despiertan, en
los profesionales, la conciencia de cuanto se puede mejorar la atención de enfermería.
Palabras-clave: cuidado, educación en servicio, humanización, asistencia.
Introdução
O cuidar, como prática na enfermagem, tem
história e faz história. Uma primeira constatação,
revendo a história é que tanto a saúde quanto os cuidados com a vida e a morte correspondem, em princípio, à esfera religiosa, pois “as primeiras vocações
para o cuidado dos enfermos certamente se situam no
âmbito da religião e não da ciência e da técnica” [1]
Quanto à história, percebe-se que há uma evolução
significativa com relação ao cuidar-cuidado que passa
da esfera religiosa para profundas transformações na
organização das sociedades, ultrapassando a esfera
simbólica, passando a ocupar lugar significativo na
esfera econômica, visto que a saúde passa a ser vista
como bem e que há um consumidor, regulada pela
relação custo/benefício, que cada vez mais está ciente
de seus deveres e principalmente seus direitos [2].
Quanto às mudanças observadas na sociedade,
na comunidade, um dos fatores que sofreu um avanço considerável é a tecnologia, que até pouco tempo
era impossível imaginar, criando equipamentos que
permitem a mudança do estilo de vida, assegurando,
muitas vezes, melhor qualidade de vida para os seus
beneficiários. Estes avanços são percebidos muito
fortemente na área de saúde, em que cada vez mais
é buscado um trabalho aprofundado de prevenção
e cura das doenças, bem como da longevidade.
Contudo, um dos aspectos que surgiu com o
avanço tecnológico é o aspecto não humano. Aspecto muitas vezes frio de máquina, atingindo principalmente os hospitais, as clínicas e os laboratórios,
levando os profissionais de saúde ao distanciamento
de seus pacientes. Entendemos ser a tecnologia
uma conseqüência do desenvolvimento e que já
era esperada. Contudo, é necessário que seja vista e
entendida como uma ferramenta de trabalho e não
um fim, na busca de oferecer um melhor cuidado
ao paciente, e que só é possível com um equilíbrio
que seja capaz de dosar a tecnologia e seus modernos
equipamentos e as intervenções dos profissionais
de saúde. Por estas e outras opiniões, muito se têm
falado atualmente em humanização, em especial,
em cuidados de saúde.
Do ponto de vista denotativo, ”cuidar” apresenta-se como “tomar conta de, tratar” e humanização significa tornar-se “benigno, afável, compassivo”
[3]. Somos pessoas que cuidamos de pessoas, estão
implícitas a humanização e a comunicação, estas
designam todas as formas de relações sociais; a
enfermagem é, por si, um vetor de humanização. A
humanização dos cuidados de enfermagem em uma
unidade de internação tem a ver, principalmente,
com as atitudes de cada pessoa que os realizam. Cuidar é mais do que um ato: é uma atitude. Portanto,
abrange mais do que um momento de atenção, de
zelo e de desvelo. Representa uma atitude de ocupação, de preocupação, de responsabilização e de
desenvolvimento afetivo com o outro [4].
Segundo Boff, ao citar o poeta Horácio (65-8
aC), “o cuidado é o permanente companheiro do
ser humano”, ou seja, sempre acompanhará o ser
humano, porque ele nunca deixará de amar e se
importar com o outro, nem tampouco deixará de
se preocupar e se inquietar com quem ele cuida.
Assim, o cuidado é mais do que um ato singular ou
uma atitude é um modo de ser. É a forma como a
pessoa humana se estrutura no mundo e se realiza
com os outros. O sentido da palavra cuidado assume a forma de desvelo, que provoca preocupação,
inquietação e senso de responsabilidade [4].
Diante destas considerações, o grande desafio
está em combinar o trabalho de enfermagem com
o cuidado humanizado. O primeiro desafio está em
romper o obstáculo da relação sujeito-objeto, ou seja,
o paciente a ser cuidado não é “objeto” de nosso traba-
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lho e sim “sujeito, a relação não pode ser de domínio
do ”objeto“ e sim de convivência, de trato diário, de
ação recíproca. O segundo é otimizar a relação sujeitosujeito, ou seja, o paciente como sujeito do cuidado
é aquele que recebe e interpreta a atenção e o afeto
recebido. Quando esta forma de cuidado é trabalhada,
proporciona ao ser humano experimentar uma forma
de cuidado que respeita seus valores, crenças, ultrapassando o modo simplista de utilitarismo para a sua
real importância de onde emerge, segundo Boff [5],
“a dimensão de alteridade, de respeito, de sacralidade,
de reciprocidade e de complementaridade”.
Pensando nesses referenciais, sensibilizadas
pela questão do cuidado humanizado ao paciente
adulto hospitalizado e verificando o elevado índice
de reclamações dos pacientes em uma unidade de
clinica cirúrgica, é que procuramos trabalhar as
ações educativas com os cuidadores (auxiliares de
enfermagem) de um Hospital Universitário, visando
atingir as temáticas propostas com os mesmos.
Objetivo geral
Desenvolver uma dinâmica de orientação
relacionada ao cuidado da equipe de enfermagem
para com o paciente hospitalizado.
Objetivos específicos
1. Identificar o modo como a equipe de enfermagem
cuida.
2. Identificar o que o grupo sabe sobre o cuidado,
após a dinâmica de orientação.
3. Avaliação subjetiva das dinâmicas.
Material e métodos
O estudo desenvolveu-se por meio de pesquisa
de campo qualitativa, em um Hospital Universitário
de Curitiba, posto de clínica cirúrgica, mediante oficina participativa, utilizando dinâmicas de grupo (total
de 1h/aula), com os 21 profissionais de enfermagem.
Para o desenvolvimento das oficinas, dois funcionários
ficaram no posto com alguns colegas da graduação de
enfermagem que estavam em estágio e que assumiram
algumas atividades dos profissionais, enquanto os mesmos participavam das atividades propostas. Durante
as oficinas, foram apresentados conteúdos, enfocando
“o ser cuidado e o ser cuidador”.
Em relação a identificar o modo como a equipe
de enfermagem cuida, foram coletados dados, por
meio de observação da realidade diária da equipe de
enfermagem em todos os turnos. Observamos o aspecto físico da enfermaria, em relação à privacidade
do paciente e à postura dos membros da equipe. As
observações foram registradas graficamente em diário de campo. Após a identificação de como a equipe
de enfermagem cuida, desenvolvemos a oficina com
a implementação de três dinâmicas de grupo:
• A primeira dinâmica: Rompendo o cerco, aplicada
com o objetivo de trabalhar o relacionamento humano, constatar as dificuldades existentes, quando
queremos ultrapassar alguma dificuldade, enquanto as pessoas ao nosso redor dificultam mais ainda
ou não ajudam; observar a perseverança e resistência dos participantes, diante de uma situação de
pressão; trabalhar as formas de comunicação (com
licença, desculpe-me, por favor, obrigado(a), volte
sempre, disponha, somente um minutinho).
• A segunda dinâmica: O avestruz, esta dinâmica
foi utilizada para ilustrar formas de comunicação,
estilo autoritário ou participativo e dificuldades
existentes relacionadas à comunicação entre o
profissional de saúde x paciente/cliente.
• A terceira dinâmica: Papel Amassado, desenvolvida com o intuito de levar os participantes a
refletirem sobre o seu aprendizado e avaliarem
a experiência vivenciada: o quanto foi válido e o
quanto agregou de novo ao nível dos seus conhecimentos anteriores, e sensibilizar quanto a que as
ações desenvolvidas não podem ser simplesmente
desfeitas, daí a importância da reflexão, antes de
se tomar atitudes em todas as situações.
Ao final da oficina, foi aplicado um formulário,
contendo questões abertas, o qual foi respondido por
10 auxiliares de enfermagem da equipe, escolhidos
aleatoriamente, com o intuito de identificar o que
o grupo sabe sobre o cuidado. Após as dinâmicas
de orientação, estes formulários continham questões
relacionadas ao cuidar, cuidado, papel da equipe de
enfermagem em relação ao cuidado, importância,
para o paciente, da identificação do funcionário,
tom de voz, toque do funcionário e quais as mudanças que uma hospitalização causa no paciente.
Para a avaliação da oficina, desenvolvemos um
instrumento com desenhos esquemáticos, ilustrando
três conceitos, sendo eles – “bom, regular e ruim”.
Contemplamos os seguintes itens: aproveitamento,
relação com o grupo, quantidade de participantes,
local, dinâmicas, conteúdo e orientadores.
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Resultados
Em relação ao modo como a equipe de enfermagem cuida, observamos que:
A privacidade do paciente encontrava-se
preservada, porém não eram utilizados biombos
e, muitas vezes, o paciente ficava exposto. Houve
dois funcionários que fechavam a porta, ao realizar
os procedimentos.
Em relação ao habitat do paciente, percebemos
que algumas camas eram pequenas para eles, porém
encontravam-se arrumadas. Cada paciente possuía
um criado mudo para guardar seus pertences e
objetos pessoais, o ambiente encontrava-se limpo
e existia muito barulho nas enfermarias. Todos os
pacientes tinham identificação no leito.
Com relação à postura da equipe, verificamos
que não há identificação dos funcionários, bem
como esses não se identificam em nenhum momento
para o paciente. Abordavam o mesmo de maneira
clara e perguntando sobre o seu estado de saúde,
chamando-o pelo nome. Os funcionários acendiam
as luzes do quarto sem comunicar, o tom de voz era
baixo, delicado, educado, com clareza e animado.
O toque era feito com cuidado, porém não pediam
licença ao realizar os procedimentos e não os explicavam. Oito funcionários estavam sempre atentos
aos sinais e sensações dos pacientes: expressão facial,
fala, presença de secreções; já os outros não davam
relevância a estes sinais.
Em relação ao atendimento do paciente,
quando este solicitava, era rápido, com atenção e
respeito, porém sem explicações dos procedimentos
que estavam sendo realizados.
Após essas observações, realizamos a oficina,
utilizando dinâmicas de grupo, com os 21 funcionários do referido posto. A integração do grupo foi
excelente, porém os grupos eram pequenos, devido
à necessidade de dois funcionários permanecerem
no posto, realizando os cuidados de enfermagem,
junto aos colegas de graduação que nos auxiliaram
para o possível desenvolvimento do estudo.
Antes de iniciarmos as dinâmicas, verificamos
que os profissionais estavam indispostos a participar
das atividades, porém com o desenvolvimento das
dinâmicas, começaram a tornar-se participativos de
modo que, ao final da oficina, percebemos excelentes
resultados. Seguem as compilações das respostas dos
formulários, relacionadas ao que o grupo assimilou
sobre o cuidado, aplicado ao final das oficinas:
Em relação ao cuidar
Visar o bem estar do paciente de modo geral;
cuidados gerais emocionais e espirituais;
cuidar como um todo; cuidar emocional,
físico, psicológico, conforto, segurança; melhor atendimento com mais dedicação; estar
atento ao paciente; dar apoio psicológico ao
paciente, segurança, zelo; tratar o paciente
bem; passar confiança; cuidar é o modo
como nos preocupamos com o paciente;
identificação de suas necessidades e medos.
Segundo Waldow [6], “cuidar envolve uma
ação interativa entre o ser cuidado e o ser cuidador,
o processo de cuidar envolve entre outros aliviar,
confortar, dar, fazer, etc. A cura pode ou não acontecer, mas o cuidado é imprescindível. O processo de
cuidar é a forma como se dá o cuidado”. Observa-se
que os profissionais relacionam o cuidar de forma
ampla, visando o bem estar do paciente de modo
geral. Percebe-se também que o cuidar vai muito
além de apenas a realização de procedimentos, mas é
uma forma que denota preocupação com o paciente,
visando identificar as suas necessidades, ou seja, é
envolver-se com o paciente.
Em relação ao cuidado
Observar o paciente e realizar cuidados,
visando melhorias do paciente; cuidado
físico; cuidado: parte técnica mais aspectos
emocionais; não somente sua higiene pessoal, mas visando uma melhora significativa
em todos os aspectos mais em sua família,
seu trabalho, enfim, mostrar-lhe uma
nova fase que existe em sua vida; cuidar
dos pacientes com a preocupação de que se
recuperem, usando nossos conhecimentos
e técnicas; é todo o procedimento que será
executado no paciente.
Segundo Waldow [6], “na enfermagem, os
planos de cuidado são definidos como banho
de leito, curativo, dar suporte emocional... Essas intervenções devem ser realizadas agregadas
ao cuidado humano e não como uma forma de
cuidado”. Percebe-se que a equipe ao cuidar tem
uma preocupação com os conhecimentos técnicos,
visando um melhor cuidar, mas também se preocupam com os aspectos emocionais, envolvendo,
216
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no contexto do cuidar, a família. Verifica-se ainda
que os profissionais preocupam-se, não somente
com o presente momento de vida do paciente, mas
também com o modo do seu retorno à sociedade,
após a alta hospitalar.
O papel da equipe de enfermagem em relação
ao cuidado
Cuidar do paciente como um todo; boa
conversa com o paciente; dar condições para
que o paciente possa ter uma recuperação
digna para o paciente como um todo; bem
estar e recuperação do paciente; respeitar o
paciente como ser humano, identificando
o melhor meio de chegar até ele.
De acordo com Orlando [7], “não é só importante para a equipe de enfermagem satisfazer as
necessidades dos pacientes, mas também, ser capaz
de descobrir quais são as necessidades.” Percebe-se
a importância, para a equipe, do relacionamento
profissional – paciente, visando a melhor forma de
recuperação e maior bem-estar.
Importância para o paciente hospitalizado
demonstra nossa vontade e carinho de
ajudar o paciente.
Verifica-se a relevância dada pela equipe de
enfermagem às interpretações de determinado tom
de voz com relação ao atendimento prestado ao
paciente, visto ser a base dos relacionamentos entre
os seres humanos. Sendo assim, é o princípio de uma
interação eficaz entre equipe-enfermeiro-paciente.
Toque do funcionário
Toque com carinho e dedicação, o paciente
fica confortável e confiante; toque sutil
traz tranqüilidade, conforto; afeto; sempre
toque leve e ao tocar conversar com o paciente; o toque é uma maneira de dizer que
ele não está sozinho (“estou aqui”).
O toque é uma forma de comunicação entre profissional – paciente. Pode transmitir carinho, atenção,
“cuidado” ou, até mesmo, agressão, raiva, ódio; o corpo
possui centros de energias, os Chakras que, quando
estimulados, transmitem energias positivas à saúde do
paciente [5]. Percebe-se que a equipe de enfermagem
está atenta, em relação ao tipo de toque, durante o
atendimento do profissional de enfermagem.
Identificação do funcionário
Melhora no diálogo; significa muita coisa
para o paciente, saber que existem muitas
diferenças entre médicos, enfermeiros,
técnicos e auxiliares de enfermagem; importante para a comunicação; confiança ao
paciente; o paciente se sente mais seguro,
sabendo quem está cuidando dele; segurança e confiança.
A identificação é importantíssima, pois, além
de demonstrar as diferenciações das classes profissionais, passa segurança ao paciente. Observa-se
que os profissionais também estão preocupados em
valorizar as diversas classes e as diferenças entre eles,
passando isto para os pacientes.
Mudanças que uma hospitalização causa no paciente
Insegurança, dúvidas; tristeza, medo, solidão, carência; insegurança por ser um local
estranho; depressão; ansiedade, revolta;
sensação de inutili dade.
Para Mendes [8], “o hospital é um novo mundo
para o paciente, um local que está afastando-o, ou
isolando-o do seu mundo cotidiano”. Conforme Issac
[9], “nos ambientes hospitalares há regras que não são
semelhantes às dos pacientes, estas normas modificam a vida do cliente, interferindo em seu estado de
saúde”. Verifica-se que os profissionais percebem os
vários aspectos que influenciam uma hospitalização,
bem como o próprio atendimento hospitalar.
Tom de voz
Gráfico da avaliação oficina
Tom de voz firme e calmo deixa o paciente
seguro, confiante; o tom de voz define o
tipo de atendimento que o paciente vai
receber; carinho; educação; o tom de voz
A avaliação da oficina foi realizada com a utilização de um formulário com símbolos relacionados
à oficina, indicando “bom, regular ou ruim”.
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Gráfico I - Avaliação da equipe de enfermagem em
relação às atividades educativas em estudo realizado em
um Hospital Universitário de Curitiba, relacionado ao
cuidado da equipe de enfermagem para com o paciente.
Com relação ao local utilizado para realização
das oficinas - 2 classificaram o local como regular.
O local é dentro do pátio do HUC, porém longe do
local de trabalho dos funcionários (posto 3).
Com relação ao número de participantes nas
oficinas - 4 classificaram a quantidade de participantes regular, pois, como a oficina foi realizada
para os profissionais, em turnos diferentes, houve
alguns grupos que foram constituídos por 4 pessoas e
outros por 6 pessoas, o que foi avaliado como pouco
para o desenvolvimento adequado das dinâmicas de
grupo utilizadas.
A oficina gerou conscientização, fez com
que refletíssemos sobre alguns pontos esquecidos, como tratar os pacientes como
se fossem nossas famílias, embora algumas
vezes estejamos com problemas pessoais,
mas não devemos deixar passar isso ao
paciente, devemos tratá-los bem (D1)
Vale a pena resgatar o “cuidado humanizado”
o que, às vezes, se torna pela correria, cansaço,
sobrecarga, um pouco esquecido (D2)
Dinâmicas muito boas, curtas, diretas e
tem muito a ver com a nossa rotina, pois
exprime o que algumas vezes fazemos
inconsciente, esquecendo que trabalhamos
com saúde doença e que nosso objeto de
trabalho são pessoas (D3).
São situações que no dia-a-dia, acabamos
não dando conta da sua importância (D4)
A dinâmica foi momento de distração e
descanso (D5)
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Conclusão
Com a elaboração desse trabalho, percebemos
a importância do cuidado com o paciente adulto
hospitalizado. Realmente, as técnicas e a falta de
tempo, encobriram a essência da enfermagem, mas,
se pensarmos nos benefícios que a humanização traz
para o ser cuidado e para o ser cuidador, conseguiremos facilmente apagar essa camada encobridora
e resgatar nossos verdadeiros propósitos.
Segundo Waldow [6], “o cuidado nasce de um
interesse, de uma responsabilidade, de uma preocupação, de um afeto, em geral, implicitamente inclui
o maternar e educar que, por sua vez, implicam em
ajudar a crescer”. Verificamos que o fato de os colegas de graduação assumirem algumas das atividades
dos funcionários fez com que esses se sentissem valorizados e colaborou para o bom desenvolvimento
das oficinas, visto que os funcionários não ficaram
preocupados com as tarefas que haviam por ser realizadas em suas atividades profissionais, podendo
assim interagir e aprofundar seus conhecimentos
sobre os assuntos discutidos na oficina.
Percebemos ainda que, após as atividades
educativas, segundo a enfermeira responsável pela
unidade, as reclamações dos pacientes diminuíram
de maneira significativa, de modo a reafirmar a
importância da educação continuada em serviço,
principalmente quando relacionada ao cuidado de
enfermagem. Assim, concluímos com as palavras
de Mendes [8]: “a enfermagem deve deixar cair a
sua máscara para deixar aparecer e transparecer o
seu calor humano, que vai vivificar o seu trabalho
técnico-profissional.”
Referências
1. Pitta A. Hospital – dor e morte como oficio. São Paulo:
Hucitec;1991.
2. Leopardi MT. Entre a moral e a técnica: ambigüidades
dos cuidados da enfermagem. Serie enfermagem. Santa
Catarina: UFSC; 1994.
3. Luft CP. Minidicionário Luft. São Paulo: Ática; 2000.
4. Boff L. Saber cuidar: ética do humano – compaixão
pela terra. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1999.
5. Boff L. A águia e a galinha: Uma metáfora da condição
humana. 28a ed. Petrópolis: Vozes; 1998.
6. Waldow VR. – Cuidado humano. Porto Alegre: Sagra
Luzzatti; 1998.
7. Orlando IJ. O relacionamento dinâmico enfermeiro/
paciente. São Paulo: E.P.U; 1978.
8. Mendes IC. Enfoque humanístico à comunicação em
enfermagem. Rio de Janeiro: Sarvier; 1994.
9. Isaacs A. Saúde mental e enfermagem psiquiátrica. 2a
ed. Serie de estudos de enfermagem. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan; 1998.
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Artigo original
O banho no leito no pós-operatório
de artroplastia total de quadril
(uma tecnologia de enfermagem)
Fábio Assis de Souza Moreira*, Maria Aparecida de Luca Nascimento, D.Sc.** Marisa Peter, M.Sc.***,
Ana Paula Costa Alves****, Rubens Ghidini Junior*****
*Enfermeiro, Aluno do Curso de Especialização nos moldes de Residência da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto (EEAP) da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), Residente de Enfermagem do Instituto de Traumato Ortopedia
(INTO) – Rio de Janeiro, ** Orientadora Acadêmica da EEAP da UNIRIO, *** Enfermeira, orientadora da Unidade
INTO-MS; Coordenadora da Residência de Enfermagem do INTO, **** Acadêmica de Enfermagem da EEAP da UNIRIO,
*****Enfermeiro do Hospital dos Servidores do Estado
Resumo
Estudo exploratório observacional que tem por objetivo descrever o modo pelo qual a equipe de enfermagem realiza o
procedimento técnico do banho no leito no paciente em fase pós-operatória de artroplastia total de quadril (ATQ), com ênfase
na total imobilidade que deve ser mantida durante o referido ato. Os autores tecem comentários a respeito das adaptações
técnicas realizadas pela equipe de enfermagem no cotidiano da sua prática, e utilizam como referencial teórico, as observações
de Florence Nightingale para subsidiar a cientificidade do procedimento técnico em apreço. Os dados coletados foram extraídos
de um diário de campo utilizado pelos pesquisadores quando da observação não participante da referida técnica no campo
que serviu de base para o presente estudo, um hospital de referência para a especialidade de Traumato Ortopedia, localizado
na cidade do Rio de Janeiro. Os resultados evidenciam que o banho no leito do cliente em fase pós-operatória de artroplastia
total de quadril é uma tecnologia adaptada às especificidades dessa clientela, e que essa adaptação é de suma importância
para que a total imobilidade da articulação coxo femural seja mantida, para que o sucesso efetivo da cirurgia seja alcançado,
inclusive na perfeita relação entre o custo e o benefício deste ato.
Palavras-chave: banho no leito, enfermagem, tecnologia.
Abstract
The bed bath procedure at hip arthroplasty post surgery (A nursing technology)
The aim of this exploratory and observational study is to describe technical procedures used by nursing team to give bed bath
to patient during immediate post operative of total hip arthroplasty (THA), emphasizing total immobility which should be
kept while bathing. The authors comment on technical adaptations performed by the nursing team during day-by-day practice,
and use as theoretical reference Florence Nightingale observations in order to subsidy technical procedures scientifically. Data
was collected through a field diary used by researchers when using non participant observation of above mentioned field
Artigo recebido em 6 de setembro de 2006; aceito em 11 de setembro de 2006.
Endereço para correspondência: Maria Aparecida de Luca Nascimento, UNIRIO, Av.
Pasteur, 296, 22290-240 Rio de Janeiro RJ, E-mail: [email protected]
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technique. A referential hospital of Traumatology and Orhopedics, located at Rio de Janeiro city, was the base for this study.
The results show that to give bed bath to patient during post operative of total hip arthroplasty is an adapted technology
specifically to this kind of patients, and that adaptation is very important in order to keep coxofemoral articulation immobile,
and to achieve effective success of the surgery, including perfect relationship between cost and benefit of this procedure.
Key-words: bathing in bed, nursing, technology.
Resumen
El baño en la cama en el post operatorio de artroplastia total de cadera (Una
tecnología de enfermería)
Estudio exploratorio observacional que tiene por objetivo describir cómo el equipo de enfermería
realiza el procedimiento técnico del baño en la cama en el paciente post operatorio de artroplastia total de
cadera (ATC), con énfasis en la total inmovilidad que debe mantenerse durante dicho acto. Los autores tejen
comentarios con respecto a las adaptaciones técnicas realizadas por el equipo de enfermería en el cotidiano
de su práctica, y utilizan como referencial teórico las observaciones de Florence Nightingale para subsidiar la
cientificidad del procedimiento técnico en cuestión. Los datos fueron extraídos de un diario de campo utilizado
por los investigadores cuando fue realizada la observación no participante de la referida técnica en campo
que sirvió de base para el presente estudio, un hospital de referencia para la especialidad de Traumatología
y Ortopedia, ubicado en la ciudad de Rio de Janeiro. Los resultados evidencian que el baño en la cama del
paciente en fase post operatoria de artroplastia total de cadera es una tecnología adaptada a las especificidades
de eses pacientes, y que esa adaptación es de suma importancia para que la total movilidad de la articulación
coxo-femoral se mantenga y para que alcance el suceso efectivo de la cirugía, inclusive en la perfecta relación
entre costo y beneficio de este acto.
Palabras-clave: baño en la cama, enfermería, tecnología.
Introdução
Este estudo surgiu do interesse em pesquisar
fatos relativos ao cotidiano da prática de cuidar em
enfermagem, uma das linhas de pesquisa do Programa de Mestrado em Enfermagem da Universidade
Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO), à
qual pertence uma de suas autoras.
Porém, desde a implantação do novo currículo
do Curso de Graduação em Enfermagem da Escola
de Enfermagem Alfredo Pinto (EEAP), da referida
Universidade, em 1996, várias disciplinas foram
idealizadas com o objetivo de fomentar nos acadêmicos o interesse pela pesquisa, desde a graduação,
supondo que esta deve ser a primeira de outras etapas
do seu desenvolvimento profissional [1].
Deste modo, após a graduação, ao ingressar no
curso de pós-graduação, nos moldes da residência
em enfermagem, que tem como campo de ensino
as diversas Instituições hospitalares, um dos autores
deste estudo interessou-se em estudar o tema em
foco, relativo à área da traumato ortopedia.
O curso de especialização na área traumato
ortopédica nos moldes de residência em enfermagem
da EEAP da UNIRIO desenvolve-se no Instituto
Nacional de Traumato Ortopedia (INTO), instituição de referência nacional para o tratamento de
doenças ortopédicas.
Ao considerarmos, por um lado, a especialidade
propriamente dita, e por outro lado, a especificidade
do cuidado de enfermagem que deve ser dispensado ao paciente desta especialidade, observa-se que
as técnicas de enfermagem tendem a adaptar-se à
necessidade desta clientela.
Deste modo, os cursos de especialização,
nas mais diversas áreas, tornam-se oportunos, no
sentido de direcionar os cuidados de enfermagem
às áreas específicas de atendimento, uma vez que o
curso de graduação em enfermagem, considerando
o seu perfil generalista, não proporciona as mesmas
oportunidades de conhecimento.
A especialização na área de enfermagem abrange um conhecimento na área de atuação, além de
despertar no pós-graduando um senso crítico dife-
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renciador no exercício profissional, no cotidiano da
prática exercida, e conseqüentemente, na formação
de um profissional mais qualificado.
Desse modo, neste estudo, pretendemos enfocar o modo pelo qual os procedimentos técnicos de
enfermagem são adaptados para serem prestados à
essa clientela, mais especificamente, de que modo o
banho no leito é dispensado ao cliente em fase pós
operatória de artroplastia total de quadril (ATQ),
tendo em vista a especificidade desta clientela.
Objetivo
Descrever a tecnologia de enfermagem relativa
à adaptação do procedimento técnico do banho no
leito em clientes em fase pós-operatória de artroplastia total de quadril (ATQ), com ênfase na total
imobilidade de que deve ser revestido este ato.
A artroplastia total de quadril e sua importância
na vida de relação
A artroplastia total de quadril é um procedimento cirúrgico que começou a ser adotada durante
a década de 60 por Charnley, e que consiste, basicamente, na substituição da articulação coxo-femoral
por uma prótese metálica.
A principal causa que leva a um acometimento
de articulação coxo-femoral são as doenças osteoarticulares coxofemorais e fraturas do quadril em
clientes mais idosos.
A alta incidência de fraturas do quadril em
clientes mais idosos é observada na prática cotidiana,
quando eles são atendidos nos hospitais, vítimas de
queda da própria altura, relacionadas à inadequação
das arquiteturas, domiciliar e urbana. As referidas
fraturas, na maioria das vezes, acontecem devido às
doenças degenerativas (especialmente a osteoporose
e artrite reumatóide), que acometem os idosos. Porém, no Brasil, ainda são incipientes as estatísticas
que apontem o número do total aproximado de
pessoas portadoras desses tipos de doenças e que,
conseqüentemente, são submetidas ao tratamento
de artroplastia total de quadril.
Porém, há que se considerar ainda as causas
traumáticas, o que leva à consideração que, apesar
da clientela submetida a essa cirurgia estar alocada
nas faixas de idade mais avançadas, é possível encontrar-se clientes jovens a ela submetidos.
As afecções da articulação coxo-femural, além
de proporcionar um déficit motor acentuado, que
altera significativamente a deambulação do paciente,
ainda são responsáveis por uma grande sensação
dolorosa. Esses dois comprometimentos têm repercussões na esfera bio-psico-social do ser humano,
sendo responsáveis, inclusive, pela diminuição da
sua auto-estima.
O déficit da mobilidade ao interferir na autoestima, tem a possibilidade de comprometer a vida
de relação dos pacientes nas diversas áreas; social,
sexual, afetiva, econômica e financeira.
Desse modo, há que se considerar a cirurgia
de artroplastia total de quadril, não só, como um
recurso resolutivo que cura as afecções da articulação
coxo femural, como também, como uma resposta à
ansiedade com que é aguardada pelos pacientes que
a ela serão submetidos.
Sendo assim, observa-se que a importância da
cirurgia de ATQ é proporcional aos cuidados que
devem ser mantidos durante todas as suas fases, especialmente, a pós operatória, que é o seu momento
mais crítico, por causa da total imobilidade em que
deve ser mantida a articulação coxo femural.
Além da imobilidade supramencionada,
durante a fase pos operatória de ATQ, há que se
considerar o risco e o potencial para complicações
pós-operatórias como luxação da prótese, infecção,
e até mesmo um tromboembolismo.
Portanto, durante a fase pós-operatória da
cirurgia de ATQ, para a realização dos cuidados
de enfermagem, mais especificamente o banho no
leito, foco deste estudo, há que se considerar todos
estes aspectos, no sentido de detectar precocemente
os sinais destas complicações durante a realização
desse cuidado.
Tendo em vista as adaptações que devem ser
realizadas para a manutenção da total imobilidade da
articulação coxo femural durante o banho no leito,
que é um cuidado de enfermagem imprescindível a
ser realizado no paciente acamado, observa-se que
durante o referido procedimento técnico, surge a
possibilidade da adoção de um novo método. Estes
ajustes, que normalmente precisam ser realizados nos
procedimentos técnicos de enfermagem, podem ser
considerados como tecnologias de enfermagem [2].
O procedimento técnico do banho no leito na
fase pós-operatória de ATQ
A realização da técnica do banho no leito, pela
equipe de enfermagem em pacientes em fase de
pós-operatório de ATQ, é desenvolvida a partir de
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adaptações da técnica tradicionalmente conhecida
para esse tipo de cuidado.
Durante o banho no leito é possível posicionar
adequadamente o paciente para a sua realização,
além de ser o momento ideal para a realização do
exame físico [3].
As modificações introduzidas no procedimento
técnico em apreço têm a finalidade de garantir a
diminuição do risco de luxação da prótese recém
implantada, melhorar a visualização da área dorsal
para o exame físico e diminuir a queixa álgica durante a realização desse cuidado primordial.
Ainda segundo os mesmos autores, os objetivos
principais da artroplastia quanto à mobilidade, são:
o alívio da dor, a restauração e a melhora da função
articular.
Referencial teórico
A importância do banho na recuperação do
cliente ganhou destaque no final do século XIX com
Florence Nightingale na Europa, onde a precursora
da enfermagem moderna, no seu livro “Notas sobre
Enfermagem”, considerou-o como um cuidado
essencial. Segundo ela:
A enfermeira nunca deve protelar a assistência à
higiene pessoal do seu doente sob a alegação de que o
muito que se obtém é um pouco de alívio, que pode
perfeitamente ser oferecido mais tarde [4].
O banho, procedimento técnico referente à
profissão de enfermagem, é um cuidado em potencial, tendo a sua fundamentação nos princípios
“nightingaleanos”. Esse procedimento reflete o
compromisso, o respeito e a cientificidade, fruto da
grandiosidade de sua natureza. É um procedimento
que proporciona conforto, bem-estar, facilita e promove a circulação, e elimina odores.
São diversas as vantagens proporcionadas pelo
procedimento técnico do banho no leito. Entre
elas podemos incluir o aspecto fisiológico, que,
tendo como base os princípios da microcirculação,
possibilita a irrigação de áreas corporais menos
perfundidas, e também possibilita a remoção, com
mais rigor, dos germes que estão alojados na pele,
o que é possibilitado pela abertura dos poros que é
realizada através dos movimentos rotatórios que são
empreendidos durante esta higienização, em cada
parte do corpo [5].
Realizar a técnica do banho no leito pode ser
considerado uma atividade menor sendo, muitas
vezes, visualizada pela equipe de enfermagem com
certas restrições [6]. No entanto, ao nos referirmos
aos clientes com advertência em mobilidade, como
é o caso dos clientes em fase pós-operatória de
artroplastia total de quadril, observa-se que a esta
restrição, soma-se o temor de sua mobilização para
a realização da referida técnica.
O temor dos clientes acima referidos é relativo,
principalmente, à sua manipulação no momento
do banho, isto porque, a instabilidade mecânica
provocada por este procedimento técnico pode ser
considerada um dos fatores de risco para a perda da
cirurgia em foco.
Tendo em vista que este estudo versará sobre
um procedimento técnico de enfermagem para
promover o conforto e o alívio de um paciente
acamado através deste procedimento, encontramos
em Florence Nightingale o respaldo necessário para
sedimentá-lo teoricamente quando mencionou que
o alívio e o conforto sentidos pelo doente após sua
pele ter sido cuidadosamente lavada e enxugada, é
uma das mais comuns observações feitas pelo doente
acamado.
Material e métodos
Trata-se de um estudo exploratório observacional, que tem por finalidade realizar a análise de
uma determinada situação [7].
Os dados coletados foram extraídos de um diário de campo utilizado pelos pesquisadores quando
da observação não participante da referida técnica no
campo que serviu de base para o presente estudo.
Sendo assim, o observador toma contato com
a realidade a ser observada, mas não integra-se a
ela, não participa, porém, o pesquisador não está
simplesmente olhando o que está acontecendo, mas,
sim, observando com um olho treinado em busca
de certos acontecimentos específicos [8].
O campo de estudo foi a enfermaria cirúrgica
feminina do Instituto Nacional de Traumato Ortopedia – INTO, situado no município do Rio de Janeiro, e a população alvo foi composta de auxiliares
e técnicos de enfermagem que trabalham na unidade
do nosocômio em apreço, que foram observados
durante a sua prática ao realizarem o banho no leito
nos clientes pós-operatório de Artroplastia Total de
Quadril (ATQ).
Logo após o término da observação, adotou-se
como metodologia, para privilegiarmos o caráter
operacional de pesquisa, questionar o método utilizado na prestação desse cuidado de enfermagem.
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Essa observação se deu por três dias, em equipes
diferentes, porém no mesmo setor.
Cabe ressaltar que neste estudo foi resguardada
a total privacidade dos sujeitos que dele participaram, seguindo as diretrizes e normas de pesquisa
envolvendo seres humanos preconizados pela Resolução do Conselho Nacional de Saúde N° 196 de
10 de outubro de 1996.
Resultados
A técnica tradicional e a sua adaptação
A técnica do banho no leito descrita para
clientes da ortopedia, traz uma peculiaridade importante, qual seja, a utilização de um trapézio, cuja
finalidade é auxiliar o cliente na sua movimentação
no leito [3].
A estimulação do cliente na realização de higiene corporal nas regiões de difícil alcance deve ser
iniciada a partir do segundo dia de pós-operatório,
pois leva à movimentação ativa dos braços e demais
partes do corpo. Desse modo, a enfermeira deve
higienizar a região dorsal, posicionar a comadre, e
o próprio cliente deve executar a higiene genital e
perianal [3].
Segundo as mesmas autoras, as etapas a seguir
para realização do banho são:
Região dorsal:
•
•
•
•
Solicitar ao paciente que segure o trapézio;
Elevar o tronco expondo o dorso;
Proceder aos cuidados de higiene;
Fazer prevenção de escaras e proeminências ósseas.
Comentário - A solicitação para que o paciente
segure o trapézio para a realização da higiene na
região dorsal deve ser acompanhada de observação
apurada nos casos daqueles que tenham déficit
muscular, como nos casos dos idosos e politraumatizados.
Região perianal:
• Elevar a cama a 45°, no máximo 60°;
• Manter a perna na posição neutra ou em abdução
e extensão;
• Solicitar ao paciente que flexione a perna não
operada, apoiando o pé no leito e a seguir, que
suspenda o quadril;
• Colocar a comadre sempre do lado não operado.
Comentário - Elevar a cama a 45° para a realização dessa etapa do procedimento implica em
fazer movimentos, que por mais involuntários que
sejam, geram um potencial de dor no local cirúrgico,
devido à contração da musculatura coxo femural.
Cabe destacar que nessa forma de realização
do procedimento torna-se difícil manter o triângulo abdutor entre as pernas do cliente. O triângulo
abdutor é um dispositivo que impede a adução das
pernas, e, conseqüentemente, a movimentação da
articulação coxo femural.
Desse modo, a impossibilidade de fixar o referido artefato, poderá levar à luxação da articulação
coxo femural e conseqüente perda da cirurgia.
Para que isso não ocorra, a adaptação do referido
procedimento técnico à real necessidade desses clientes, consiste na fixação do triângulo entre as pernas
do cliente com auxílio de ataduras de crepon.
Essa fixação se faz necessária devido à forma
geométrica que o triângulo possui, dificultando a
sua permanência entre as pernas do cliente.
Na realização da higiene dorsal, a adaptação
consiste na lateralização do corpo do cliente em bloco para o lado oposto da cirurgia, essa providência
diminui consideravelmente o potencial de dor.
A lateralização do corpo do cliente em bloco
aumenta exposição do seu dorso para uma melhor
visualização no exame físico. Outro aspecto importante, é que dessa forma fica mais fácil fazer a
proteção de proeminências ósseas, o que também
facilita a substituição da roupa de cama. A manutenção do triângulo abdutor preso entre as pernas
do cliente tem a finalidade de acomodar os seus
membros inferiores.
Conclusão
O avanço científico determinou mudanças e
adaptações tecnológicas e industriais. No entanto,
as técnicas de enfermagem não evoluíram na mesma
proporção, sendo adaptadas à medida que a necessidade se apresenta.
Porém, as adaptações que são realizadas durante o ato de cuidar, na realidade, são tecnologias de
enfermagem, que devem ser difundidas e aplicadas
a cada necessidade. O que anteriormente era considerado improvisação, atualmente, pode ser considerada adaptação tecnológica, ou seja, modificações
específicas de acordo com a sua aplicabilidade.
A equipe de enfermagem, normalmente, desconsidera as adaptações que promove, em virtude
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de visualizá-las como um procedimento que remete
à falta de material e/ou de pessoal. No entanto, ao
observarmos as adaptações que são realizadas por
ela, podemos considerar que a utilização diária de
adaptações por ela promovidas, são, na realidade,
experimentações de protótipos [9].
Conclui-se que ao realizar as adaptações criteriosas da técnica do banho no leito em clientes
na fase pós-operatório de artroplastia de quadril,
a equipe de enfermagem está preservando-os de
agravos que poderiam inutilizar o referido ato, pois
cuidar, é tentar resolver, ou pelo menos minimizar
as sensações que irritam e afligem o paciente que é
o sujeito do nosso cuidado [10].
Desse modo, as adaptações realizadas, ao serem
consideradas uma tecnologia de enfermagem, demonstram, não só, a necessidade de sua divulgação
e conseqüente implementação, como também, a
possibilidade de novos estudos que enfatizem novas
adaptações, igualmente criteriosas, de outros procedimentos dispensados aos seus clientes.
Referências
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Revisão
As repercussões da reforma do serviço
público federal na Escola Profissional
da Assistência a Psicopatas do Distrito
Federal, 1936/1938
Wellington Mendonça de Amorim, D.Sc.*, Ieda de Alencar Barreira, D.Sc.**
*Professor Adjunto do Departamento de Enfermagem de Saúde Pública, da Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da UNIRIO,
** Membro fundador do Núcleo de Pesquisa de História da Enfermagem Brasileira – Nuphebras da Escola de Enfermagem Anna
Nery da UFRJ - Pesquisadora CNPq.
Resumo
O estudo tem por objetivo analisar os aspectos do reajustamento dos quadros do serviço público federal e suas implicações para
a Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras, atual Escola de Enfermagem Alfredo Pinto, em 1936. Pesquisa de natureza
histórico-social baseada no pensamento de Pierre Bourdieu e em análise documental. O reajustamento do quadro, da carreira e da
denominação dos servidores federais colocou em xeque a titulação e a inserção dos agentes de enfermagem, que não dispunham
do título de enfermeira certificado pela Escola Anna Nery, nas instituições de saúde do Ministério da Educação e Saúde. Este
fato incomodou os psiquiatras que constataram nesta reforma a desqualificação de parte do mercado de trabalho para os egressos
da Escola Profissional, especificamente, nas colônias e nos hospitais psiquiátricos no âmbito do Ministério.
Palavras-chave: história da enfermagem, educação, escolas de enfermagem.
Abstract
The repercussions of Federal Public Service reform in the “Escola Profissional da
Assistência a Psicopatas do Distrito Federal”, 1936/1938
This study aims at analyzing the aspects of readjustment of federal public service’s and their implications to the Professional
Nursing School, nowadays “Alfredo Pinto School of Nursing”, in 1936. It is a historical social research based on Pierre
Bourdieus theories and document analysis. The readjustment of the staff, profession and nomination of federal civil servants
put in doubt the nomination and insertion of nursing agents, who did not have Anna Nery certificate in nursing, in the
health institutions of the Ministry of Education and Health. This fact annoyed the psychiatrists who confirmed in this reform
Artigo recebido em 28 de março de 2006; aceito em 9 de agosto de 2006.
Endereço para correspondência: Praia do Flamengo, 98/1110, 22210-902 Rio de Janeiro
RJ, Tel (21) 22252507, E-mail [email protected]
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the disqualification of part of labor work for those who had concluded the Professional School, specifically, in colonies and
psychiatric hospitals in the Ministry’s field.
Key-words: history of nursing, education, schools of nursing.
Resumen
Las repercusiones de la reforma del servicio público federal en la “Escola
Profissional da Assistência a Psicopatas do Distrito Federal”, 1936/1938
El estudio tiene por objetivo analizar los aspectos del reajuste del servicio público federal y sus implicaciones para la Escuela
Profesional de Enfermeros y Enfermeras, actual Escuela de Enfermería Alfredo Pinto, en 1936. Investigación de naturaleza
histórico-social basada en el pensamiento de Pierre Bourdieu y en análisis documental. El reajuste del cuadro de personal,
de la carrera y de la denominación de los servidores federales puso en duda la titulación y la inserción de los agentes de
enfermería, que no disponían del título de enfermera certificado por la Escuela Anna Nery, en las instituciones de salud del
Ministerio de la Educación y Salud. Este hecho incomodó a los psiquiatras que constataron en esta reforma la descalificación
de parte del mercado de trabajo para los egresos de la Escuela Profesional, específicamente, en las colonias y en los hospitales
psiquiátricos en el ámbito del Ministerio.
Palabras-clave: historia de la enfermería, educación, escuelas de enfermería.
Introdução
Este estudo tem como objeto as repercussões da
reforma do serviço público federal na Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras da Assistência
a Psicopatas do Distrito Federal, em decorrência da
Lei 284 de 1936. Este evento constituiu o conjunto de fatos que demarcaram as circunstâncias do
processo de reconfiguração do espaço social desta
Escola, em meados do século XX.
Na pesquisa intitulada “As circunstâncias do
processo de reconfiguração da Escola Profissional”
observamos que os campos da saúde pública, da
psiquiatria e da enfermagem se estruturaram a partir
dos princípios de visão e divisão, que orientaram
as lutas, as controvérsias e as competições entre os
diversos agentes envolvidos e impuseram os limites
e as possibilidades históricas a duas escolas de enfermagem (Alfredo Pinto - 1890 e Anna Nery - 1923),
no Distrito Federal [1].
Neste estudo tivemos como objetivo: analisar
os aspectos do reajustamento dos quadros do serviço
público federal e suas implicações para a Escola Profissional de Enfermeiros e Enfermeiras (atual Escola
de Enfermagem Alfredo Pinto), a partir de 1936.
Material e métodos
Pesquisa de natureza histórico–social, baseada
em análise documental, segundo o entendimento de
que um texto é sempre portador de um discurso, não
podendo ser visto como algo neutro e transparente.
O estudo se apóia no pensamento social de Pierre
Bourdieu [2]. Evitamos as formas rígidas de análise e
priorizamos a busca dos nexos entre as idéias contidas
nos discursos, relacionando texto e contexto [3].
As fontes primárias foram escritos oficiais
como: relatórios e documentos oriundos das diversas instâncias do Ministério da Educação e Saúde
Pública – MESP; a legislação de interesse do campo
da educação e saúde. Tais fontes foram localizadas
nos seguintes acervos: Arquivo Setorial Enfermeira
Maria de Castro Pamphiro/Laboratório de Pesquisa
de História da Enfermagem (Laphe), da Escola de
Enfermagem Alfredo Pinto – UNIRIO; Biblioteca
do Ministério da Fazenda; Centro de Documentação
da Escola de Enfermagem Anna Nery - UFRJ.
As fontes secundárias foram a literatura pertinente à História do Brasil [4,5], especificamente
o Estado Novo; à política de saúde, com destaque
para a reforma do serviço público; à História da
Enfermagem Brasileira, priorizando particularmente
a trajetória da Escola Profissional de Enfermeiros e
Enfermeiras - EPEE e seus nexos com a Escola Anna
Nery - EAN. Para subsidiar a articulação das fontes
ao contexto, foi elaborado um esquema de análise
diacrônica e sincrônica de fatos e eventos pertinentes ao objeto em estudo. A análise da estrutura dos
campos [4] e dos respectivos sistemas de relações
permitiu esclarecer as circunstâncias em que ocorreram as mudanças de rumo em um determinado
momento da história da EPEE.
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O pessoal de enfermagem nas reformas do serviço
público federal
A Saúde Pública, como uma ideologia de
construção nacional, partilhada nos anos 20, por
higienistas com as elites políticas, com o início da
Era Vargas, deixou de ser um ponto central na agenda
do Estado. Assim, na ocasião da criação do MESP
[6], em 1930, os educadores conseguiram ocupar as
melhores posições, neste ministério. Não obstante, o
ministro Capanema lutou para manter o monopólio
de várias formas de poder no campo da saúde, mais
especificamente, o de designar as autoridades do campo médico e da enfermagem, inclusive na EPEE, em
alguns momentos mediados pelo DASP [1].
Sob o ideário da reconstrução nacional, lançado em 1930, o governo Constitucional de Vargas,
iniciado em 15 de julho de 1934, entendera ser
urgente à adoção de medidas para reorganizar a
máquina administrativa do Estado. A intenção de
implementar uma racionalidade administrativa federal, bem como a de melhorar as condições materiais
de existência do funcionalismo, fundamentava-se
no discurso de que o modelo vigente acarretava
enormes prejuízos à Nação [7].
No entanto, a razão profunda do reajustamento funcional dos servidores, realizado pelo governo
Vargas, fora retirar das classes políticas o poder de
indicar pessoas para ingressar no Serviço Público
Federal, o que, na barganha clientelista, correspondia à moeda de troca [7]:
“... Cumpre ainda acentuar um aspecto da
questão que se apresenta no caso atual do
nosso País. Outrora, a influência das proteções políticas intervinha pertubadoramente
nas nomeações e promoções dos servidores
do Estado... Hoje, felizmente, as cousas se
passam de modo diferente. As nomeações são
feitas por processo de seleção, o que permite
a escolha dos mais competentes...”.
Podemos afirmar, assim, que o chamado
Reajustamento preparou os alicerces das demais
reformas necessárias à centralização e ao fortalecimento do governo Vargas, que rumava em direção
ao Estado Novo.
A estratégia desenvolvida para produzir as regras da racionalização incluía a Comissão Mista de
Reforma Econômico-Financeira, e uma subcomissão a ela vinculada que estudou a situação do Serviço
Público Federal. O relatório deste grupo de trabalho
apontou a existência, na administração federal, de
520 diferentes denominações de cargos, sendo 330
na administração central e 190 na regional. Em um
mesmo ministério foram encontradas 70 categorias
de vencimentos, sem incluir os contratados. Diante desse quadro, a subcomissão apresentou uma
proposta de reajustamento dos quadros do Serviço
Público Federal, aprovada pela Lei 284 de 28 de
outubro de 1936 [8].
O relatório denominado ‘Nabuco’, em referência ao Ministro Maurício Nabuco, propôs uma
escala de vencimentos, com apenas 23 categorias, de
‘A’ (equivalente aos cargos de serventes, arrumadeira e
lavador) a ‘X’ relativo ao de Ministro de Estado. Este
foi submetido a revisões no Ministério da Fazenda, no
Palácio do Catete e na Câmara dos Deputados.
O Reajustamento estabeleceu, como princípio
geral, o agrupamento das carreiras existentes para a
formação dos quadros de funcionários, com uma escala única de vencimentos. Esta reforma se constituiu
na maior ação do Estado brasileiro, no sentido de
ordenar o conjunto de práticas e profissões, no âmbito
dos poderes executivo, judiciário e legislativo.
O Conselho Federal do Serviço Público Civil
[posteriormente denominado DASP] era ligado diretamente ao Presidente da República e tinha amplos
poderes para: estudar e opinar sobre a racionalização
dos serviços; promover os concursos de provas e
títulos (excluindo o magistério), homologar e dar
publicidade à classificação; e determinar quais os
cargos públicos que somente poderiam ser exercidos
pelos portadores de certificados de conclusão de
curso secundário e diplomas científicos. O Conselho
constituiu-se em uma estratégia de centralização de
poder, de caráter suprapartidário e de ordenamento
da organização dos trabalhadores nas repartições
públicas do governo.
O Reajustamento, ao promover a reorganização dos quadros e das denominações profissionais
no âmbito do MES, também incentivou disputas
coorporativas, pois para algumas classes de servidores, representou a extinção de seus cargos e, para
outras, sua permanência nos quadros funcionais
do Estado.
A diretriz do Governo Vargas, de acirrar o controle e a centralização das ações e serviços no âmbito
dos ministérios, teve como alvo estratégico o campo da
Educação e Saúde, que deveria aumentar sua abrangência e influência em todas as regiões do País, de modo a
consolidar o projeto de reconstrução nacional.
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Quadro I - Posicionamento das carreiras e salários de sanitaristas, enfermeiras, psiquiatras e atendentes, a partir do
reajustamento do funcionalismo federal, em 1936.
Maiores cargos, salários e as posições mais altas →
A
B
C
D
E
F
G
H
I
J
L
M
N
O P, Q, R, S, T, U, V, X e Z
Posições superadas
Sanitaristas
Posições a serem conquistadas por Sanitaristas
Posições superadas
Psiquiatras
Posições a serem conquistadas por psiquiatras
Posições superadas
Enfermeiras
Posições a serem conquistadas por enfermeiras da EAN
P. sup.
Atendentes
Posições a serem conquistadas por enfermeiros (as) egressos da EPEE
→ Memores cargos, salários e posições mais baixas
A classificação dos 32 médicos psiquiatras caberia as letras de H até L. No entanto, a carreira do
médico sanitarista foi acrescida a letra M, com apenas
uma vaga, que correspondia à posição mais elevada
no Departamento Nacional de Saúde - DNS. Assim,
os sanitaristas obtiveram uma letra a mais sobre os
demais agentes psiquiatras e clínicos, apesar de terem
seu quadro reduzido de 154 para 115 vagas.
O reajustamento promoveu a reorganização
dos quadros e das denominações profissionais no
âmbito do MES. Os agentes de enfermagem foram
reduzidos a apenas duas denominações: enfermeiros e atendentes no quadro do Serviço Público
Federal.
Ao cargo de enfermeiro corresponderam cinco
níveis de classificação, de F até J, nos quais foram
enquadradas 177 enfermeiras diplomadas, predominantemente lotadas na Divisão de Enfermagem
de Saúde Pública e na EAN, como se pode observar
no Quadro II.
Quadro II - Distribuição comparativa das enfermeiras do Ministério da Educação e Saúde Pública por repartição,
antes e depois do reajustamento do funcionalismo, 1936.
Situação Antiga
Denominação do cargo e a quantidade
existente no quadro
Dir. Divisão Enf. Saúde Pública (01)
Enfermeira (01)
Enfermeira-chefe (12)
Enfermeiro-chefe (01)
Enfermeira-chefe (06)
Instrutora (01)
Assistente da diretora (02)
Enfermeira de Saúde Pública (13)
Enfermeira de Saúde Pública (45)
Parteira (01)
Enfermeira chefe (adjunta) (06)
Enfermeira interna (25)
Enfermeira de regime dietético (01)
Enfermeira adjunta (60)
Aux. dip. (diplomada Anna Nery) (01)
As repartições
Serviço de Enfermagem
Escola Anna Nery
Serviço de Enfermagem
Hosp. Artur Bernardes
Escola Anna Nery
Escola Anna Nery
Escola Anna Nery
Serviço de Enfermagem
Serviço de Enfermagem
Dir. Prot. Mat. Infância.
Escola Anna Nery
Escola Anna Nery
Hosp. Artur Bernardes
Serviço de Enfermagem
Dir. Prot. Mat. Infância.
Situação Nova
Quantidade, denominação e linha da
carreira
(2) Enfermeiro Classe J
(12) Enfermeiro Classe I
(24) Enfermeiro Classe H
(52) Enfermeiro Classe G
(87) Enfermeiro Classe F
Fonte: Anexo da Lei 284, de 28 de outubro de 1936 – Coleções das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil
(segunda parte) – Rio de Janeiro: Imprensa Nacional; 1938.
A classe ‘J’, no plano de cargos, provavelmente
foi destinada às enfermeiras da mais alta hierarquia
na EAN e no DNS, o que as colocava a apenas uma
letra de diferença da maior classe destinada aos psi-
quiatras (L) e a duas posições dos sanitaristas (L,M)
na classificação dos salários.
O reajustamento trouxe vantagens para as
enfermeiras, como relatou a Assistente da diretora
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da EAN, Maria de Castro Pamphiro [relatório de
fevereiro de 1937]:
“A Lei 284 [...] estabeleceu um quadro
único para as enfermeiras do MES, classificando-as segundo as categorias em:
enfermeiras das Classes F, G, H, I, e J.
Obedecendo a este critério as enfermeiras
internas da Escola passaram para a classe F,
as adjuntas para a classe G, e as enfermeiras
chefes e assistentes de diretora para a classe
H. A Lei supracitada criou, para a Escola,
mais um cargo de classe ‘J’, que não estava
preenchido”[9].
Todas as outras denominações dadas ao pessoal
de enfermagem, pelos órgãos formadores e pelos
empregadores no serviço público federal foram
agrupadas sob a denominação de Atendentes, correspondendo às classificações C, D, E e F (a letra
‘F’ correspondeu apenas aos vinte funcionários
lotados na Inspetoria de Profilaxia da Tuberculose
e na Diretoria de Proteção à Maternidade e à Infância). No que se refere às instituições psiquiátricas, os profissionais de enfermagem que atuavam
no Hospital Nacional de Alienados - HNA e nas
Colônias, que possuíam menos capital cultural do
que os psiquiatras e do que as enfermeiras padrão
“ananeri”, ocuparam posições menos vantajosas no
quadro do MES.
Foram as seguintes instituições hospitalares:
hospitais Pedro II, São Francisco de Assis, São
Sebastião, Artur Bernardes; Colônia de Curupaity
e Preventório Paula Candido; Instituto Oswaldo
Cruz, Serviço de Saneamento Rural do Distrito
Federal, Inspetoria de Profilaxia da Tuberculose,
Centro de Saúde de Inhaúma e a Diretoria de
Proteção à Maternidade e à Infância. Outras Instituições Hospitalares do MES também tiveram seus
profissionais de enfermagem enquadrados na condição de Atendente. Algumas dessas denominações
eram: enfermeira de 1ª, 2ª e 3ª classes, enfermeiromor, enfermeiro auxiliar e auxiliar de enfermeira,
investigadoras de mortalidade infantil, inspetoras
e auxiliares, entre outros, que deveriam totalizar, a
partir do reajustamento, 420 servidores.
As determinações legais do reajustamento, ou
seja, o concurso público e a exigência de titulação
para ingressar no serviço público federal, foram
motivo de grandes preocupações no campo da
psiquiatria, tanto para os psiquiatras que domi-
navam o espaço social da Escola, quanto para os
formandos da EPEE. É que depois de quase meio
século de criação da Escola, os enfermeiros e enfermeiras dos hospitais e colônias da Assistência a
Psicopatas, por força do Reajustamento, passaram
a atendentes.
Os esforços do renomado psiquiatra Gustavo
Riedel e seus colaboradores em dar corpo a Seção
Feminina da Escola Profissional e denominação (Alfredo Pinto) [10], situada no Engenho de Dentro,
não foram suficientes para impedir as repercussões
do reajustamento sobre as enfermeiras que atuavam
nos hospitais federais destinados ao atendimento à
psicopatas. Pelo contrário, as medidas do reajustamento colocavam em ‘xeque’ os psiquiatras sobre o
que fazer e como fazer para atrair e preparar pessoas
com certa competência em enfermagem, mas que,
no serviço público federal, só poderiam ser reconhecidas e enquadradas como atendentes, como
demonstra o Quadro III.
A inserção da enfermeira diplomada no mercado de trabalho, com uma remuneração adequada
(capital financeiro), já era, em 1934, uma preocupação de Bertha Pullen. Esta porta-voz alertava, na
ocasião, que as 153 enfermeiras egressas e as futuras
enfermeiras, após atenderem às necessidades da Escola e do Serviço de Enfermeiras do DNSP, deveriam
ocupar outras posições no mercado de trabalho, em
hospitais, casas de saúde e escolas de enfermagem. A
questão era se, a elas, seriam oferecidas remunerações
condizentes com sua qualificação, de modo a tornar
a profissão atraente para o tipo de candidata que as
escolas gostariam de admitir.
“Se isto não se der e os salários forem deficientes, a escola terá falhado desde o seu
início, pois ninguém que se considere inteligente terá desejo de abraçar uma profissão
que não lhe possa garantir, no mínimo,
uma vida amena... Se permitirmos que os
hospitais abram escolas de enfermagem com
o objetivo de obter um processo barato de
assistência aos doentes, ou se nos permitimos trabalhar em instituições, onde pessoas
de instrução deficiente tenham remuneração equivalente, forçosamente auxiliaremos
a escravidão da profissão, a exploração
econômica, ao mesmo tempo que criamos
tal empecilho ao seu desenvolvimento...”
Bertha Pullen [11].
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Quadro III - Distribuição pessoal de enfermagem nos serviços psiquiátricos do MES, antes e após o reajustamento do
funcionalismo, em 1936.
Situação Antiga
Denominação do Cargo e quantidade
existente
Inspetora (03); Inspetor (01)
Enfa chef. Otorrinolaringol. (01)
Primeiro enfermeiro (01)
Enfermeiro (01)
Inspetora (01)
Inspetor-chefe (01)
Enfo chefe (05); Enfa chefe (01)
Primeira enfermeira (05)
Enfa chefe (01)
Enfa chefe (01)
Enfo (02); Enfermeira (01)
Primeiro enfermeiro (01)
Primeira enfermeira (02)
Segundo enfermeiro (06)
Segunda enfermeira (11)
Segunda enfermeira (05)
Monitor de higiene mental (06)
Enfermeira (08)
Segunda enfermeira (02)
Segunda enfermeira (04)
Segundo enfermeiro (02)
Guardas (139)
Situação Nova
Quantidade, denominação e
linha da carreira
Repartição
Hospital Nacional Alienados
Hospital Nacional Alienados
Manicômio Judiciário
Pavilhão de Mol. Nervosas.
Colônia Feminina
Colônia Masculina
Hospital Nacional Alienados
Hospital Nacional Alienados
Inst. Neuro Sífilis
Amb. Rivadávia Correia
Colônia Masculina
Colônia Feminina
Instituto de Psicopatologia
Hospital Nacional Alienados
Hospital Nacional Alienados
Colônia Feminina
Amb. Rivadávia Correia
Amb. Rivadávia Correia
Pavilhão de Mol. Nervosas.
Instituto de Psicopatologia
Manicômio Judiciário
Distribuídos pelas unidades acima da Assist. a Psicopatas.
(09) Atendente Classe E
(19) Atendente Classe D
(44) Atendente Classe C
(137) Atendente Classe C
Fonte: Anexo da Lei 284, de 28 de outubro de 1936 – Coleções das Leis da República dos Estados Unidos do Brasil
(segunda parte) – Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1938.
Na verdade, o nível de distinção social almejado por Bertha Pullen para as agentes diplomadas
parece ultrapassar as primeiras intenções dos sanitaristas, quando criaram uma Escola de Enfermeiras
nos anos 20. Para Pullen, portanto, a diferenciação
da enfermeira diplomada das demais agentes de
enfermagem e sua investidura nas posições e cargos
mais significativos, era condição sine que non para
o desenvolvimento da enfermagem moderna no
Brasil.
Conclusão
No período estudado, o campo da educação
e saúde e nele os da saúde pública, da psiquiatria e
da enfermagem se estruturou a partir dos princípios
de visão e divisão, que orientaram as lutas, as controvérsias e as competições entre os diversos agentes
envolvidos e impuseram os limites históricos ao
desenvolvimento de cada qual, em seu interior.
Até esse momento, a Escola Profissional de
Enfermeiros e Enfermeiras se manteve como objeto
de dominação simbólica dos médicos psiquiatras.
Estes ao lograrem produzir um discurso com efeitos
de verdade, puderam operar a naturalização do seu
poder naquele espaço social e, portanto, o reconhecimento da legitimidade de sua presença.
O reajustamento de quadro, da carreira e
da denominação dos servidores federais colocou
em xeque a titulação e a inserção dos agentes de
enfermagem, que não dispunham do título de enfermeira certificado pela EAN, nas instituições de
saúde do MES. Este fato incomodou os psiquiatras
que constataram nesta reforma a desqualificação de
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parte do mercado de trabalho para os egressos da
EPEE, especificamente, as colônias e os hospitais
psiquiátricos no âmbito do MES.
Médicos e enfermeiras conheciam e reconheciam a premência e o clamor por uma reforma do
ensino e da prática da enfermagem. E no centro
desta luta encontrava-se posicionada a EPEE, objeto
de disputa entre os vários grupos de interesse. Assim,
nos anos que sucederam a esse período, tais agentes
acirraram o jogo de forças para fazer valer suas visões
e divisões de mundo no espaço social da Escola.
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Revisão
Assistência de enfermagem aos pacientes
com disfunções músculo-esqueléticas:
reflexão sob um olhar acadêmico
Aldaiza Ferreira Antunes Fortes, M.Sc.*, Ana Maria Nassar Cintra Soane, M.Sc.**,
Maria Rita Ferraz de Azevedo Vieira***, Sarah Rocha***, Tatiana de Oliveira Silva***,
Waneska Beatriz da Silva***
* Professora do Curso de Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem Wenceslau Braz (EEWB), ** Professora do Curso
de Graduação em Enfermagem da EEWB e da Universidade do Vale do Sapucaí (UNIVAS), *** Curso de Graduação em
Enfermagem da EEWB
Resumo
Na prática hospitalar vivenciada durante o Estágio Curricular Supervisionado, notamos grande número de pacientes acometidos
por disfunções músculo-esqueléticas (DME) que requerem correção cirúrgica e tratamento específico, e que, por falta de
recursos e/ou qualificação profissional, não têm suas necessidades físicas, psicológicas e sociais atendidas ou são as mesmas
atendidas de maneira insatisfatória. Essa realidade exige do enfermeiro um cuidar humanizado, científico e individualizado;
porém observamos uma prática predominantemente rotineira, em que a humanização não constitui um aspecto relevante no
cuidado aos pacientes. Evidenciamos como objetivo geral deste artigo refletir sobre a assistência de enfermagem prestada aos
pacientes cirurgiados em decorrência de DME.
Palavras-chave: músculo esquelético, cuidado de enfermagem, prática humanizada de enfermagem.
Abstract
Nursing assistance to patients with muscle-skeletal disorders: reflection under an
academic view
In a hospital practice experimented during the Supervised Academic Traineeship, it was noted a great number of patients
affected by muscle-skeletal disorder (MSD) that require surgical intervention and specific treatment and that, due to the lack
of resources or professional qualification, patients do not have their physical, psychological and social needs satisfied or have
them partially satisfied. This reality requires from a nurse a humanized, scientific and individualized care; however, it is noted
a practice predominately routine in which the humanization does not constitute an important aspect to consider in care of
patients. The general objective of this article is therefore to discuss about nursing assistance offered to patients operated as a
result of the MSD.
Key words: skeletal-muscle, nursing care, humanized nursing practice.
Artigo recebido em 8 de setembro de 2005; aceito em 18 de agosto de 2006.
Endereço para correspondência: Ana Maria Nassar Cintra Soane, Rua Antônio
Magalhães Lisboa, 40, Bairro Medicina, 37500-000 Itajubá MG, Tel:(35)36223267, E-mail:
[email protected]
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Resumen
Asistencia de enfermería a los pacientes con disfunciones músculo-esqueléticas:
reflexión bajo una vista académica
En la práctica profesional supervisada realizada en ambiente hospitalario, notamos un gran número de pacientes acometidos
por disfunciones músculo-esqueléticas (DME) que requieren corrección quirúrgica y tratamiento específico y que, por
falta de recursos y/o calificación profesional, no tienen sus necesidades físicas, psicológicas y sociales atendidas o las tienen
atendidas de manera insatisfactoria. Esa realidad exige del enfermero cuidados humanizados, científicos y personalizados;
pero observamos una práctica predominantemente rutinaria, en que la humanización no constituye un aspecto relevante en
el cuidado a los pacientes. El objetivo general de este artículo es reflexionar sobre la asistencia de enfermería prestada a los
pacientes que pasaron por intervención quirúrgica en consecuencia de DME.
Palabras-clave: músculo-esquelético, cuidado de enfermería, práctica humanizada de enfermería.
Introdução
Durante a realização do Estágio Curricular Supervisionado (ECS) percebemos o nítido contraste
existente entre a grande incidência de pacientes
hospitalizados para tratamento cirúrgico em decorrência de disfunções músculo-esqueléticas (DME) e
o despreparo da equipe de enfermagem bem como
dos acadêmicos para prestarem cuidados adequados
a esses pacientes nos períodos pré e pós-operatório
imediato.
Notamos também a falta de valorização dos
aspectos subjetivos inerentes ao paciente cirúrgico
no que diz respeito às suas condições específicas,
em função do pré e pós-operatório imediato,
atendendo as necessidades físicas e emocionais.
Em outros termos, na referida prática hospitalar,
atribui-se como prioridade a execução de cuidados
puramente práticos (troca de curativos, cuidados
com drenos e tração, entre outros), em detrimento
à atenção às necessidades psicobiológicas e psicossociais, comprometendo a atuação humanizada
desses pacientes?
Segundo Smeltzer e Bare [1], problemas como
fraturas desestabilizadas, deformidades, doenças
articulares, tecido necrótico ou infectado e tumores são exemplo de DME que requerem correção
cirúrgica.
O portador de alguma destas patologias osteomusculares que se submeterá à intervenção cirúrgica,
independente do grau de complexidade do procedimento, é afetado em seus aspectos biopsicosociais
e físicos. Portanto, a atenção do enfermeiro deve
atender aos referidos aspectos.
O artigo elaborado evidencia como principais
objetivos: demonstrar o contraste entre o ideal e o
real na assistência de enfermagem neste contexto;
ressaltar a importância da atuação humanizada aos
pacientes submetidos à cirurgia ortopédica; e fornecer bases para que seja possível repensar a prática de
enfermagem no cotidiano hospitalar, incentivando e
permitindo ao paciente realizar o autocuidado.
Por meio do relato de experiências vivenciadas
como estagiárias em clínica cirúrgica, ancorado em
estudos de outros autores sobre esta problemática,
buscaremos fornecer bases para que seja possível
prestar uma assistência humanizada, consciente e
de qualidade, possibilitando ao profissional de enfermagem conquistar o seu espaço e mostrar o seu
valor enquanto cuidador.
Contraste entre o ideal e o real na assistência de
enfermagem ao portador de DME
No levantamento do referencial teórico verificamos o déficit de trabalhos científicos, na área de
ortopedia em enfermagem, referentes a este tema.
“A lesão de uma parte do sistema músculo-esquelético produz habitualmente uma disfunção das
estruturas adjacentes e das circundadas ou apoiadas
por elas. (...) Assim sendo, apesar de uma fratura
afetar principalmente o osso, poderá produzir também uma lesão muscular, vascular e nervosa em áreas
próximas da fratura” [2]. O olhar do cuidador deve
voltar-se a todas as estruturas prejudicadas e não
apenas à lesão primária, por exemplo, em fraturas,
devemos avaliar condições da pele (temperatura,
coloração, sensibilidade, enchimento capilar), sinais
flogísticos, edema, mobilidade articular, presença de
pulsação nas principais artérias, posicionamento do
membro fraturado, pois estes são indicadores fiéis de
possíveis complicações. Conjuntamente a estes aspectos, o principal não deve ser esquecido: a avaliação do
estado geral do paciente, de forma holística.
Algumas DME, devido a sua evolução ou
a fatores determinantes, requerem tratamentos
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cirúrgicos que trazem conseqüências não apenas
físicas, mas também psicológicas e sociais, como
por exemplo, as cirurgias de amputação. Smeltzer e
Bare [3] relatam que “a enfermeira que estabeleceu
uma relação de confiança com o paciente é mais
capaz de comunicar a este a maneira de enfrentar
uma amputação”.
Portanto, sua atuação deve ter início no
período pré–operatório, no sentido de esclarecer
ao paciente a necessidade do tratamento para sua
recuperação e oferecer suporte emocional frente à
mudança súbita na imagem corporal e no estilo de
vida. Os autores ressaltam ainda que a enfermeira
atua ajudando o cliente a lidar com necessidades
imediatas e traçando metas realistas de reabilitação,
através de uma atmosfera de aceitação e apoio, encorajando paciente e a família a expressarem seus
sentimentos.
Hood, Dincher & cols. [4] afirmam que
também é de suma importância o reconhecimento
de expressões verbais e não verbais no universo de
emoções vivenciadas frente ao medo e insegurança
do desconhecido, para que o enfermeiro possa agir
de uma maneira que venha a auxiliá-lo.
Os referidos autores destacam que outros
efeitos negativos relacionados ao procedimento cirúrgico, dos quais a enfermeira deve estar consciente,
incluem o estresse e o aumento da suscetibilidade à
infecção. Entre as complicações, a infecção, apesar
de não ser freqüente, é devastadora e leva ao fracasso
cirúrgico [5]. Na prática vivenciada, o risco para
infecção não é visto dessa forma e nem tido como
uma das principais prioridades no cuidado, o que
se traduz pela falta de adesão e utilização de técnica
asséptica na realização de curativo e no manejo da
ferida cirúrgica. Os profissionais preocupam-se mais
com o fazer do que como fazer.
Doenças reumáticas constituem, a longo
prazo, distúrbios que possivelmente requeiram
tratamento cirúrgico, pois por ação da cronicidade
podem evoluir para artrose articular. De acordo com
Moreira [6], os portadores destas moléstias “relatam longas e confusas histórias, cuja característica
principal é a dor, fenômeno subjetivo, peculiar ao
seu universo psicológico e que os torna ansiosos e
deprimidos, o que certamente trará dificuldades na
abordagem”.
A maneira com que o profissional acolhe o
paciente cirúrgico, desde o primeiro momento, é a
base para o sucesso do relacionamento terapêutico;
em que deve ser estabelecido um vínculo, por meio
da confiança, empatia e segurança na realização de
procedimentos. Este vínculo colabora efetivamente
para a adesão do paciente aos cuidados, favorecendo
sua recuperação e reabilitação, em menor espaço
de tempo possível, evitando ao máximo as complicações.
Conforme citado anteriormente, a dor é o
ponto comum presente em todos os pacientes cirurgiados em decorrência de DME. Porém, é de suma
importância salientar que ela não deve ser banalizada simplesmente pelo fato de ser um fenômeno
esperado nesses tipos de procedimento. Portanto, o
paciente deve ser encorajado a relatar a ocorrência
da dor e o enfermeiro que o assiste deve avaliar a
intensidade, julgando qual medida de alivio deve ser
implementada antes de se recorrer a medicamentos
analgésicos, devido aos seus efeitos adversos, que podem interferir no curso do tratamento. As medidas
alternativas incluem: aplicação de frio local, elevação
do membro, aspiração da incisão, e distração. Após
o cuidado prestado, deve-se avaliar a resposta da
medida terapêutica utilizada.
Quando o tratamento instituído for medicamentoso, em caso de dor intensa e constante,
é “necessário que o enfermo receba o mínimo de
informações sobre os medicamentos prescritos.
Sabe-se, por exemplo, que os efeitos terapêuticos e
colaterais dos antiinflamatórios não-hormonais são
individuais” [7].
Espera-se do enfermeiro assistencial que tenha
conhecimento farmacológico adequado das reações
e efeitos colaterais das medicações utilizadas nesta
clientela para intervir quando necessário. Além de
conhecimento acerca da farmacologia, o profissional
deve ter conhecimento sobre os diversos tipos de
DME, visto que cada uma requer um tratamento
específico.
O plano de cuidados deve ser embasado em
cada situação, incluindo cuidados individualizados,
orientações educacionais ao paciente e família, manejo correto de aparelhos ortopédicos, visando ao
menor comprometimento possível de outros sistemas corporais. Sua eficácia depende da reavaliação
periódica da condição clínica do paciente, sendo
atualizado segundo sua evolução.
Observamos que na prática inexiste uma particularidade na assistência, sendo esta prestada de
forma genérica, desprovida de análise crítica dos
achados, pouco pormenorizados e investigados, isto
é, não há uma aplicabilidade adequada da Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE).
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A informação quanto ao prognóstico deve
ser dada de forma realista, ao paciente e familiares,
sendo que as perspectivas prognósticas tornam-se
positivas quando a abordagem se faz de forma global.
O sucesso terapêutico dependerá principalmente
da participação do paciente quando a estar bem
consigo mesmo, mas para tanto torna-se necessário
conscientizá-lo de sua condição. Deverá estar ciente
da evolução da doença e das possibilidades de flutuações no quadro clínico durante seu curso [7].
Para Carpenito [8] “Os autocuidados promovem a auto-estima e reduzem o sentimento
de dependência. (...) A independência aumenta a
motivação e diminui o sentimento de desamparo”.
Quanto ao medo de alterações bruscas na saúde e
perda da independência, isso evidencia que tem
um significado importante sobre o funcionamento
psicossocial do paciente. Encorajá-lo a expressar
seus medos dá à enfermeira a oportunidade de
comprová-los e possivelmente, corrigir algum conceito errado.
A melhor forma para a prevenção das incapacidades é a realização de atividades executadas pelo
próprio paciente. Apesar de as atividades e exercícios
serem benéficos para a função músculo-articular e
alívio da dor, existe um temor por parte dos pacientes quanto à movimentação no pós-operatório de
cirurgias ortopédicas. Segundo Donahoo & Dimon
III [9], este temor deve-se a falha do profissional em
informar o cirurgiado de que sua mobilização será
feita de forma cuidadosa e que os procedimentos
realizados não influenciarão no resultado cirúrgico
ou intensificarão a lesão.
A adoção de simples recursos materiais, porém
imprescindíveis, como por exemplo o trapézio,
permite com maior facilidade a mobilização e participação do paciente no autocuidado. Atividades
comuns como mover-se na hora do banho e realizar
higiene de uma área corporal trazem sentimentos
de valorização da independência e colaboração para
seu próprio cuidado, elevando sua auto-estima. Sua
mobilização, mesmo que limitada, contribui para
a prevenção de rupturas na continuidade da pele,
como úlceras de pressão, preservação e melhora do
tônus muscular e sua função, estimulação da circulação, prevenção de complicações dos sistemas respiratório, cardiovascular, digestório e geniturinário.
Os receios do paciente não devem ser descartados,
mas sim discutidos na tentativa de eliminar conceitos errôneos, que não condizem com a situação e
condição real apresentada por ele.
Para as Associações de Enfermeiras Ortopédicas e de Enfermeiras Americanas, apud Donahoo
& Dimon III [9] “o objetivo da enfermagem ortopédica é restabelecer e manter a máxima função do
sistema neuromúsculo-esquelético”.
A reabilitação total da função osteomuscular é
indiscutivelmente uma das prioridades dos cuidados.
Mas, sendo o indivíduo portador de necessidades
biopsicossociais, não seria também necessário ter
como objetivo restabelecer sua integridade emocional? O profissional deve abolir o conceito de
dicotomia entre os aspectos psicológicos e físicos,
pois estes são partes intimamente integradas de um
todo: o ser cuidado.
Conclusões
Durante a elaboração desta reflexão, percebemos a escassez de pesquisas, artigos e investigações
referentes ao assunto estudado. Para que ocorra crescimento científico da Enfermagem, faz-se necessário
a realização de estudos mais aprofundados na área
de ortopedia, principalmente em clínica cirúrgica,
pois a enfermeira e sua equipe assistem de forma
ativa, direta e permanente, durante os períodos pré
e pós-operatório, os portadores de DME.
É imprescindível a estes profissionais, desde
sua formação acadêmica, a conscientização de
uma prática humanizada, visto que o cliente tem
necessidades não apenas físicas, mas, sobretudo,
emocionais e sociais.
A mudança desta realidade não ocorrerá de
forma súbita ou imediata; a assistência ideal esperada
dependerá de uma longa caminhada, para a qual o
primeiro passo é: o despertar para a relevância do
cuidado holístico e individualizado.
Referências
1. Smeltzer SC, Bare BG. Tratamento de pacientes com
trauma músculoesquelético. In: Smelter SC, Bare BG.
Tratado de enfermagem médico-cirúrgica. 9a ed. Rio
de Janeiro: Guanabara Koogan; 2002. p.1782-83.
2. Smeltzer SC, Bare BG. Tratamento dos pacientes com
traumatismos musculoesqueléticos. In: Smeltzer SC,
Bare BG. Tratado de enfermagem médico-cirúrgica.
7a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 1994.
p.1551.
3. Smeltzer SC, Bare BG. Modalidades de cuidados musculoesqueléticos. In: Smeltzer SC, Bare BG. Tratado de
enfermagem médico-cirúrgica. 9a ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan; 2002. p.1717.
4. Hood GH, Dincher JR & cols. Cuidados pré e pós-operatórios. In: Hood GH, Dincher JR & cols. Fundamen-
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tos e prática da enfermagem – Atendimento completo
ao paciente. 8a ed. Porto Alegre: Artes Médicas; 1995.
p.99-100.
5. Drumond SN. Quadril. In: Moreira C, Carvalho MAP.
Noções práticas de Reumatologia. Belo Horizonte:
Health; 1996. p.261.
6. Moreira C. Anamnese e exame físico. In: Moreira C,
Carvalho MAP. Noções práticas de Reumatologia. Belo
Horizonte: Health; 1996. p.67.
7. Carvalho MAP. Fundamentos do tratamento do paciente reumático. In: Moreira C, Carvalho MAP. Noções
práticas de reumatologia. Belo Horizonte: Health;
1996. p.718-19.
8. Carpenito LJ. Procedimentos cirúrgicos - fratura de
quadril e do fêmur. In: Carpenito LJ. Planos de cuidados de enfermagem e documentação - Diagnósticos
de enfermagem e problemas colaborativos. 2a ed. Porto
Alegre: Artmed; 1999. p.539.
9. Donahoo CA, Dimon III JH. Plano para assistência
de enfermagem. In: Donahoo CA, Dimon III JH.
Enfermagem em ortopedia e traumatologia. São Paulo:
EPO; 1979. p.170-71.
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Relato de caso
Reeducação vesicointestinal:
a pessoa com lesão medular e o
reaprendizado em reabilitação
Wiliam César Alves Machado, D.Sc.
Professor Titular da Faculdade de Ciências da Saúde de Juiz de Fora, Universidade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC,
Pesquisador da FUNADESP
Resumo
Abordagem indispensável ao enfermeiro no processo de orientação de clientes com lesão medular ou condições de mobilidade
reduzida, a reeducação vesicointestinal representa componente relevante na identificação de prioridades nos cuidados de
enfermagem em hospitais, programas de reabilitação e/ou nos ambientes domiciliares, além de significar melhor qualidade de
vida e inclusão social da pessoa com deficiência. Cabe ao enfermeiro assegurar que clientes em reabilitação recebam alta dos
serviços de saúde, devidamente orientados em relação às necessidades de cuidados efetivos em casa. Oferecer programas na
modalidade de orientações para o cuidado que envolva clientes, famílias e pessoas significativas, com enfoque no autocuidado,
constitui elemento determinante da boa qualidade do serviço de enfermagem.
Palavras-chave: cuidados de enfermagem, reabilitação, deficiência, promoção da saúde.
Abstract
An essential approach to the nurse during patient orientation process with medullary lesion or reduced mobility, the
vesicointestinal reeducation process represents important component to identify priorities in nursing cares in hospitals, programs
of rehabilitation and/or at home context, and also shows better life quality and social inclusion of people with disabilities. The
nurse should make sure that patients in rehabilitation after discharge from Health Services are properly guided in relation to
effective care needs at home. To offer programs related to care orientations, which involve patients, families and significant
people, with particular focus on the self-care, is a decisive element for good quality of the nursing service.
Key-words: nursing care, rehabilitation, disability, health promotion.
Artigo recebido em 16 de maio de 2006; aceito em 24 de agosto de 2006.
Endereço para correspondência: Wiliam César Alves Machado, Rua Silva Jardim, 5,
Centro, 25805-160 Três Rios RJ, E-mail: [email protected]
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Resumen
Enfoque indispensable al enfermero en el proceso de orientación al paciente con lesión medular o con movilidad reducida, la
reeducación vesicointestinal representa componente relevante en la identificación de prioridades en los cuidados de enfermería
en hospitales, programas de rehabilitación y/o en ambientes domiciliares, además de significar mejor calidad de vida y la
inclusión social de la persona con discapacidad. Cabe al enfermero asegurar que pacientes en rehabilitación reciben el alta de
los servicios de salud, debidamente orientados en relación a las necesidades de cuidados efectivos en casa. Ofrecer programas
en la modalidad de orientaciones para el cuidado que envuelvan pacientes, familias y personas significativas, con enfoque en
el autocuidado, constituye elemento determinante para brindar un servicio de enfermería de alta calidad.
Palabras-clave: atención de enfermería, rehabilitación, discapacidad, promoción de la salud.
Introdução
Nas últimas três décadas, o tratamento da bexiga e intestino neurogênicos tem recebido maior
atenção com objetivo de minimizar as complicações
que, no passado, aumentavam em escala exponencial
a morbimortalidade de pessoas com lesão medular.
Embora a mortalidade tenha diminuído, ainda é
freqüente a incidência de clientes com lesão medular
que apresentam alterações no aparelho urinário e
intestinal, que os impede de usufruir uma melhor
qualidade de vida, re-inserção social e profissional
após a lesão neurológica [1].
Conforme nos esclarece Delisa [2], a lesão
medular tem sido relatada desde a antigüidade, seu
número é crescente à medida que a sociedade se
confronta cada vez mais com índices assustadores
de violência urbana, comparáveis a estatísticas de
guerra. A medula tem papel preponderante na
manutenção de estímulos e informações aferentes
e eferentes, conectando dessa forma o comando
central e as demais estruturas corporais. Sabe-se
que a lesão medular pode causar perdas motoras
expressivas, alterações na percepção corporal além
de disfunções neurogênicas nos órgãos sexuais, na
bexiga e intestino. O tipo de anormalidade é determinado pela etiologia, pelo nível e extensão da lesão.
O traumatismo da medula causado por fraturas ou
luxações das vértebras advindos de acidentes de
automóvel, lesões por arma de fogo ou por arma
branca, além do mergulho em águas rasas estão
entre as causas mais freqüentes de lesão medular
traumática; mas algumas doenças como a esclerose
múltipla, a paraparesia tropical pelo vírus HTLV- 1,
diabetes melito e outras moléstias como tumores que
acometem a medula espinhal podem trazer anormalidades também. O indivíduo com lesão medular,
após os primeiros cuidados de manutenção da vida
e percepção/entendimento do fato ocorrido, deve
ser avaliado, orientado e inserido no contexto de
um programa de reabilitação institucionalizado. O
momento emocional em que ele se encontra é de
suma importância, pois as fases de enfrentamento do
trauma, muitas vezes o impossibilita de apreender as
orientações oferecidas no programa de reabilitação,
tanto ele quanto a família e/ou pessoas significativas
que, posteriormente exercerão função de cuidadores
domiciliares.
É como se a pessoa “virtualmente” fosse partida
ao meio, mesmo que aparentemente esteja inteira
e espiritualmente sem compreender por que já não
mais pode andar, mover-se como antes. O que
requer uma profunda introspecção para entrar em
sintonia com os planos elevados da consciência,
como meio de transcender a sensação de perda da
condição de “normal”, do ponto de vista físicofuncional do corpo para movimentos autônomos
e, de repente, ter de enfrentar a realidade de ser um
humano dependente de outrem para as múltiplas
necessidades de sobrevivência, a depender do nível
da lesão. Tendo como legado o desafio aprender
a superar o desejo e o sonho mais secreto de estar
novamente de pé (ereto, na vertical), quando sua
realidade será de aceitar da melhor forma possível a
nova performance corporal, ou seja, a de uma posição sentado na cadeira de rodas quando desperto
e em atividade laborativa ou deitado-contemplativo
nos momentos de descanso diário.
Descobrir-se com lesão medular é perder o
chão onde se pisa, é ser intimado a apagar o que
era real e chocar-se com a nova realidade. Então, a
pessoa passa a desenvolver estratégias de morte e de
vida/sobrevivência, dependendo da maneira como
foi cuidado nos momentos mais críticos do pós-le-
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são, do apoio recebido das pessoas mais próximas.
Ainda assim, viver ou morrer depende mesmo de
sua capacidade de superação, desapego, e, sobretudo,
da sintonia com sua essência existencial.
A propósito do trauma emocional que envolve
tanto a vítima de lesão medular quanto as pessoas
mais próximas como os pais, por exemplo, o relato
de Galli [3] muito bem acentua o quanto o emocional pode entrar em desequilíbrio na proporção
em que a raiva cresce quando é cultivada, podendo,
inclusive, desencadear insegurança e estado de pânico na pessoa com lesão medular em face da hipótese
de ser abandonada pelos pais, como no caso de seu
filho. Aliás, situação que não só se passa na cabeça
dos jovens após sofrer um tipo de lesão neurológica
que comprometa sua independência físico-funcional, dado que o mesmo tipo de medo encontra-se
presente no relato de outros deficientes mais maduros e com grande experiência de vida, como,
Machado, Pecci, Tormin e França [4-7]. Tudo indica
que a sensação de insegurança em forma de medo
e pânico provenha das projeções mentais, onde a
pessoa imagina as conseqüências de ser abandonado
sem ter como se cuidar sozinho. Sentimo-nos como
crianças com todas as incertezas da vida sem receber
apoio e cuidado dos pais.
A reabilitação é um conceito que deve permear
o sistema inteiro de prestação de serviços de saúde,
conforme nos chama atenção Delisa [2], devendo,
pois, ser abrangente e incluir prevenção, reconhecimento precoce, programa de assistência em nível
ambulatorial de internação e de extensão. A equipe
envolvida no programa de reabilitação deve estar
capacitada a atender as necessidades desse cliente,
por isso a variedade de profissionais se faz necessária, como enfermeiro, fisioterapeuta, nutricionista,
médico, psicólogo, professor de educação física e
professor hospitalar, professor de arte, tantos outros
que forem necessários, mas principalmente resgatando e valorizando o cliente com lesão medular como
parte ativa mais interessada nesse processo. Quanto
ao aspecto qualitativo das ações desenvolvidas pela
equipe de programas de reabilitação, Machado [4]
discorre sobre sua experiência em um contexto de
prática absolutamente desorganizado e crítico por
expor os clientes a riscos de complicações significativas do quadro neurológico, estado emocional e
toda sua complexa condição humana. Em contrapartida pode vivenciar situação oposta com serviços
de excelente qualidade e perfeita sintonia entre os
membros de outro programa de reabilitação, parti-
cularmente constatando a viabilização do imprescindível trabalho de enfermeiros que desempenhavam
suas funções voltadas para o autocuidado, através
de precisa avaliação funcional para orientação do
cliente, família e/ou pessoas significativas, devidamente qualificados para exercer o papel de prestador
de cuidados em nível domiciliário quando o cliente
recebesse alta do programa [8]. Embora seu tipo
de lesão neurológica fosse cerebral, sempre esteve
preocupado com as dificuldades e os dilemas dos
clientes com lesão medular.
Papel do enfermeiro no processo de reabilitação
do cliente adulto com lesão medular, com ênfase
na re-educação vesicointestinal
É importante ressaltar que a enfermagem
enquanto prática clínica e social voltada, essencialmente, para a promoção da saúde, prevenção de
doenças e com intervenções de cuidado e conforto
junto a seus clientes, configura-se como profissão
fundamentada em um corpo de conhecimento de
dimensão técnico-científica multirreferencial, sendo
elemento indispensável ao equânime desempenho da
equipe transdisciplinar em saúde, cujo objetivo, aqui
delimitado é promover o suprimento das necessidades de cuidados aos clientes com lesões neurológicas
do tipo medular, seja nos programas institucionalizados de reabilitação, seja nos contextos domiciliares.
Porém, ainda que existam inúmeros argumentos de
natureza operacional para explicar nossa histórica
omissão nessa área da assistência institucionalizada
ou domiciliária, por mais convincentes que possam
ser, definitivamente, não justificam nossa postura
acomodada em face de tamanha demanda social.
Aliás, os dados estatísticos indicam cerca de 10% da
população do planeta como deficiente físico, dentre
os quais muitos com lesão medular e seus problemas
de adaptação ao funcionamento distrófico da bexiga
e intestino. Conhecimento que se pressupõe ser de
domínio dos enfermeiros, inclusive com responsabilidade social de compartilhá-lo com quem de
interesse houver na comunidade.
Para nosso desalento o que vemos na realidade dos programas de formação profissional de
enfermagem em nível de graduação, com raríssimas
exceções, é a forte tendência de continuar omitindo
a abordagem de conteúdos de ensino voltados para
a reabilitação, ainda que contrariando as recentes
políticas públicas do Ministério da Saúde, que recomendam a premência da qualificação profissional
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para atender a demanda nacional. Assim, as instituições formadoras tendem a passar aos estudantes
a limitada idéia de que a reabilitação está apenas
relacionada às atividades desenvolvidas com idosos
ou dependentes químicos. O que reproduz e confirma o escasso domínio de conhecimento na área de
reabilitação por parte dos próprios docentes.
Por outro lado, é bom lembrar que na universidade, quando a temática é a atuação do enfermeiro
em nível preventivo, freqüentemente, o enfoque
tende a ficar muito restrito à alçada das práticas de
saúde pública, mais especificamente aos programas
de controle sanitário e imunização. Quando se
propõe enfocar a atenção primária no âmbito do
Programa de Saúde da Família (PSF), via de regra,
não se atribui destaque para as especificidades das
pessoas com deficiência em suas necessidades de cuidados no contexto domiciliário, embora o domicílio
seja lócus onde essas pessoas recebem cuidados de
familiares e/ou cuidadores sem qualquer avaliação
profissional de enfermagem. A propósito, uma constatação da realidade social no âmbito da reabilitação
que nós enfermeiros da área docente precisamos
extirpar, com vistas na compreensão mais ampla
da abrangência/competência de um saber/fazer que
se propõe preventivo e humanizado no âmbito do
setor saúde, onde quer que se apresentem situações
que requeiram cuidados específicos ou medidas preventivas, independente ou não de se estar atuando
na esfera da saúde pública.
Da mesma forma, constata-se certa tendência
pelo menos questionável, embora tradicional, quando se põe em discussão as diversas possibilidades de
atuação do enfermeiro na esfera hospitalar, momento em que predomina abordagem para cuidados de
pronto atendimento, serviço de emergência, tanto
clínico quanto cirúrgico, além de enfatizar as super-equipadas unidades de tratamento intensivo,
unidades coronarianas e outras tantas unidades em
suas complexidades. Sem margem para que sejam
discutidos e amadurecidos com os estudantes os
aspectos preventivos às possíveis complicações pósalta institucional dos clientes com lesão medular,
por exemplo, não obstante sejam freqüentes os
relatos de pessoas que recebem alta para casa com
graves complicações do quadro inicial e adquiridas
no período de internação hospitalar. Ademais,
percebemos que fica uma lacuna, muitas vezes questionada no silêncio imposto aos que anseiam por
mudar o status quo, seja na condição de estudantes
nos programas de graduação e pós, ou mesmo no
decurso da carreira profissional no desempenho de
atividades que envolvam cuidar dos “pacientes” que
fogem ao padrão de normalidade em nosso modelo
de cultura.
Aí, então, percebemos que faz parte do jogo
de aparências no contexto institucionalizado de
cuidar em enfermagem um tipo de política meio
camuflada voltado para mascarar a realidade, tudo
conspirado para fazer do cliente e família objeto
de especulação indo e vindo de uma para outra
instituição sem receber o atendimento em nível de
internação, porém sem deixar a menor brecha ou
espaço para que se questione o caráter desumano
que fica nas entrelinhas do processo interacional.
Quantos de nós já não questionou para onde iriam
os inúmeros clientes deficientes que passaram como
relâmpagos nos serviços de Emergência e/ou Pronto
Atendimento dos hospitais que atuamos? Se é que
paramos para pensar...
Por falar em pensar, a propósito, é importante destacar que no bojo das atividades de um
programa de reabilitação, a enfermagem norteia
suas ações junto ao cliente, informando-o sobre
autocuidado, alterações e complicações pós-lesão
medular, orientação sexual e reeducação vesicointestinal. Pelo menos no plano do discurso teórico
e em algumas raras exceções na dimensão prática
de seu imenso campo de atuação. Afinal, o que
nos falta para assumir o papel que a sociedade nos
designa? Intuímos não ser nada prudente deixar o
espaço de prática social vago por muito tempo, pois
outros domínios que outrora nos era de direito, por
muito menos já estão sendo ocupados e exercidos
por outras categorias profissionais afoitas em fincar
bandeira no que a linguagem coloquial denomina
de “terra de ninguém”.
Por que enfocar enfermagem em RVI?
Acredita-se que um organismo, um corpo
para funcionar harmoniosamente, necessita de um
intercâmbio de todos os órgãos, com função qualificada. Em lesão medular, muito se discute sobre os
novos métodos de regeneração celular, regeneração
neurológica, a fim de possibilitar a re-interligação
entre o sistema nervoso central e o corpo como
um todo indissociável, sendo peça chave desta
simbiose, a medula espinhal. Evidentemente, não
se discute a validade e necessidade destas pesquisas,
que felizmente têm mostrado boas possibilidades
de sucesso. Mas enquanto não se alcança a cura da
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lesão medular, precisamos e devemos minimizar e
prevenir as complicações da lesão medular. Talvez
isto responda o porquê enfocar enfermagem em
reeducação vesicointestinal (RVI).
É fundamental então, repensar alguns de
nossos conceitos e o primeiro deles é saúde. Não
raro, reportamos nossas experiências na qualidade
de docentes junto aos estudantes nos campos de
estágios curriculares, nos quais o lema de “salvar
vidas a qualquer custo” alimenta o sentimento de
que realmente dispomos de uma interface divina,
embora, muitas vezes ofuscada pelo racionalismo
que permeia os conteúdos de ensino de cunho científico. Dentro dessa perspectiva, mais adequado seria
conceber tal lema como “manter a vida na sua melhor plenitude e nas melhores condições possíveis”,
ainda que fosse preciso uma reformulação da idéia
de que saúde não é a inexistência da doença, tampouco que os que mesmo “não doentes”, mas com
limitações de movimento ou expressão, poderiam
ser considerados saudáveis e não inferiores por não
usufruírem da totalidade de todo funcionamento
orgânico. George et al. [9] pontuam que: “manifestar
saúde, englobando a doença e a não doença pode ser
encarado como a explicação do padrão subjacente de
pessoa-ambiente “.
Segundo ela, nosso crescimento e evolução é fruto da experiência face ao desequilíbrio e
aprendizado para se alcançar um novo sentido de
equilíbrio. Ela ainda se baseia em alguns escritos
de outros autores para evidenciar a tendência de
mudança do paradigma da visão do que é saúde.
Segundo seus estudos, atualmente há uma maior
preocupação no estabelecimento de padrões gerais
do que o tratamento dos sintomas singulares de
cada indivíduo, absolutamente na contramão de
uma nova atenção para a comunicação corporal e a
compreensão do corpo como um campo de energia
dinâmico que está coligado e é parte de um campo
maior, ao invés de uma máquina em vários estágios
de conserto ou estrago, e a visão da doença como
um processo mais do que como uma entidade. Ao
expandirmos nossos conceitos e perspectivas acerca
do que é preservação da saúde, nos tornamos mais
abertos para compreender as maneiras de melhor
intervir no contexto dos programas de reabilitação,
definindo com maior clareza os papéis que nos
cabem exercer com empenho e dedicação junto ao
nosso semelhante.
Nosso papel como enfermeiros é trabalhar ao
lado do cliente com lesão medular, mostrando-lhe
que muito se pode e deve ser feito para a garantia de
um corpo sadio, mesmo que ele – o corpo – adquira
uma nova expressão, uma nova dinâmica, seja ela
externa ou interna.
O que fazem os enfermeiros em reeducação vesicointestinal?
Antes de abordar a questão com enfoque nos
clientes com lesão medular gostaria de esclarecer
alguns aspectos acerca da minha experiência na
condição de pessoa com lesão cerebral adquirida e
de grande dimensão. No início tudo é muito difícil,
pois você que viveu até ali sem a menor preocupação
com eventuais cólicas intestinais ou, de repente,
sentir vontade de urinar em plena atividade social
e/ou profissional, até porque bastava pedir licença e
dirigir-se naturalmente ao banheiro mais próximo, e
tudo resolvido. Porém, quando se é pego de surpresa
e na maioria dos casos é assim que acontece, parece
que o caminho a seguir é similar ao aprendizado
das crianças. Isto quando se mantém preservado
controle dos esfíncteres. E foi assim que tracei
planos de como começar fazer minha reeducação
vesicointestinal. Confesso que não foi nada fácil,
mas consegui.
Todo o processo envolve grande esforço pessoal para controlar a densidade do corpo com seus
órgãos e sistemas, o mental, o emocional e o espiritual, reunindo e convergindo forças internas antes
desconhecidas. Lembro de quantas vezes tive que
condicionar o mental para a mudança de horário
da evacuação diária, em função da rotineira falta de
pessoal (auxiliares de enfermagem) escalado para banhar os clientes tetraplégicos, além de me haver sido
imposta a condição de conciliar horário de evacuar
com o de banho, já que eu tinha o que a equipe
de enfermagem denominava “mania” de evacuar
todos os dias [4]. Hoje, passados onze anos, ainda
estou dependente de ajuda para tomar banho, vestir,
calçar, entre outras coisas, e continuo aproveitando
a ocasião do banho para a evacuação diária. Tudo
para não dar mais trabalho aos meus prestadores de
cuidados de longo prazo.
No que se trata da função urinária, tive que
resistir muito para não ceder ao parecer da urodinâmica do primeiro programa de reabilitação na
ABBR para não me ver no esquema de cateterismo
de alívio de 6/6 horas, conforme rotina de serviço
na instituição. Às vezes, precisava ser contundente
ao negar acatar o parecer da urodinâmica, insistin241
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do com argumento de que estava apto a controlar
as micções, precisando apenas da ajuda de alguém
para desprezar a urina do “patim”, “marreco”, entre outras denominações. Idéia que em nada era
receptiva aos membros da equipe de enfermagem
que preferiam que os clientes mesmo fizessem o
cateterismo e desprezassem a urina, até mesmo se
expondo à contaminação do ambiente e/ou pelo
inadequado manuseio do material. Ademais, nos
dois primeiros meses quando investia pesado nos
exercícios de fisioterapia para recuperar movimento
do braço e mão esquerdos, um quadro atípico da
lesão, precisava de ajuda para colocar e retirar o patim, procedimento muitas vezes negado por alguns
auxiliares do sexo masculino. Nesses momentos,
solicitava ajuda dos colegas paraplégicos (com lesão
medular) da mesma enfermaria para que tocassem a
campainha até que alguém se apresentasse, mesmo
que de má vontade [4].
Um dos pontos iniciais da relação entre enfermeiro e o cliente com lesão medular é estabelecer
um contato que possibilite a identificação de necessidades e, a partir disso, traçar o planejamento
de cuidados e atividades que possam promover
a satisfação dessas necessidades relacionadas aos
sistemas urinário e gastrointestinal. Esse primeiro
contato determina a relação entre enfermeiro e o
cliente com lesão medular, e é fundamental centrar
a interação em uma abordagem singular, pois somos
indivíduos, individuais, complexos corpo, mente,
emoção e espírito, únicos. Sendo assim mesmo havendo um modelo de atividades a serem realizadas
individualmente ou em grupo, particularizar possibilitará atender um maior número de necessidades
que ele precisa.
Na admissão ao programa de RVI, o enfermeiro responsável e demais membros da equipe
envolvidos apresentam os objetivos do trabalho
que são: melhorar as características das eliminações
vesicointestinais; estabelecer uma regularidade nas
eliminações, considerando ainda seus hábitos prélesão medular, seu contexto social e cultural; elucidar
suas dúvidas sobre as repercussões da lesão medular
no seu corpo, mas principalmente no contexto
vesicointestinal; elaborar junto a ele, a família e/ou
pessoas significativas uma forma de minimizar e
prevenir as complicações, tornando assim as atividades a serem desenvolvidas algo em que ele se sinta
efetivo participante.
A admissão pode acontecer em dois momentos; ou no ambulatório ou na enfermaria durante a
internação. Após a admissão ele/ela é acompanhado
a fim de identificar seu perfil vesicointestinal e a necessidade de intervenção. Nota-se muitas vezes que é
necessária uma linguagem adequada a cada pessoa,
e o reforço das orientações de forma sistemática e
algumas vezes repetitiva, pois a maioria da clientela é
composta por pessoas com nível insuficiente de escolaridade. Então, adequar as terminologias de modo
que as pessoas possam compreender todo conteúdo
das informações recebidas, torna-se seminal.
Além do acompanhamento individual podem
ser feitos grupos informativos, nos quais são mostrados anatomia e fisiologia dos sistemas urinário
e gastrointestinal, complicações mais freqüentes e
formas de prevenção destas complicações. Nestas
abordagens são usados recursos audiovisuais que
possibilitam apreensão da atenção e melhor compreensão do conteúdo exposto. Algumas vezes em
função da desigualdade do perfil escolar entre os
clientes, aqueles que possuem nível de escolaridade
muito inferior ou inexistente, ou aqueles que apresentam dificuldade de compreensão pela forma de
apresentação do conteúdo, nestas situações são feitas
abordagens individuais, em que se procura utilizar
uma linguagem cada vez mais próxima de sua realidade para que permita uma melhor compreensão
do que se está propondo informar.
Como boa parte do conteúdo exposto nos
grupos informativos é rico em fatos e informações
novas, que muitas vezes se mostram assustadoras,
o enfermeiro conduz os grupos como se fosse um
bate-papo, procurando ser o mais informal possível
como estratégia para envolver o grupo e torná-lo
mais participativo. Na maioria das vezes, os próprios clientes trazem exemplos de seu cotidiano e
conseguem se mostrar como exemplos dos conteúdos expostos. O mais importante é a forma como
o enfermeiro conduz o grupo, para isso, quanto
maior seu embasamento sobre lesão medular, bexiga
e intestino neurogênicos, muito mais fácil lhe será
conversar com o grupo.
No grupo informativo mostra-se que os distúrbios da bexiga neurogênica podem ser classificados
segundo o tipo de déficits neurológicos como puramente sensitivos, puramente motores ou mistos,
quando há comprometimento motor e sensitivo.
A etiologia, nível e grau de comprometimento
medular vêem a definir comportamentos vesicais
distintos. Teoricamente estes comportamentos têm
sido devidos como oriundos de lesão do neurônio
motor superior e inferior, quando alguns autores
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colocam que a bexiga e as extremidades inferiores
respondem de forma semelhante ao traumatismo
ou à doença. Nesse ponto há uma discordância em
relação a nossa prática, pois nem sempre isso ocorre
de forma tão rígida como descrita na literatura, sendo assim é de suma importância não julgarmos um
comportamento vesical baseado nas características
apresentadas pelos membros inferiores. Isso significa
que não se pode crer que uma bexiga seja espástica
apenas porque os membros inferiores sejam espásticos, ou vice-versa.
De qualquer forma e em quaisquer circunstâncias, recomenda-se que o enfermeiro planeje,
implemente e avalie intervenções que visem a orientação para o autocuidado em nível domiciliário,
com vistas na prevenção das complicações decorrentes do inadequado manuseio de materiais para
o desempenho com segurança dos procedimentos
técnicos invasivos, inclusive com uma abrangência
na assistência pós-alta institucional [10].
Entre as complicações pós-lesão medular
apontadas por Scramin [11] destacam-se: as intestinais e as urinárias. As intestinais surgem quando o
intestino comporta-se como intestino neurogênico,
devido às alterações na inervação do aparelho gastrintestinal. As lesões resultam em perda da função
gastrintestinal reflexa durante a fase de choque
medular (íleo paralítico, ausência de peristaltismo,
distensão abdominal). A reeducação intestinal deve
iniciar-se tão logo a pessoa se alimente, através de
dieta rica em fibras e de técnicas de esvaziamento
intestinal. Uma complicação muito comum é a obstipação. No que se refere às complicações urinárias,
chama atenção para a bexiga neurogênica, ou a perda
da função normal da bexiga provocada pela lesão de
uma parte do sistema nervoso. A disfunção da bexiga
é classificada de acordo com a localização da lesão
da medula. Se for lesão do neurônio motor superior
(NMS) a bexiga é espástica (reflexa ou automática);
e se for lesão do neurônio motor inferior (NMI) a
bexiga é flácida (atônica, não reflexa ou autônoma).
A avaliação urológica deve preceder a reeducação
vesical, para que ocorra opção pelo melhor método
apropriado a cada tipo de lesão. A complicação mais
freqüente é a infecção urinária.
Hoje, a urodinâmica é um instrumento que
permite não nos precipitarmos nas avaliações. Sendo
um comportamento espástico identificado por exames neurofisiológicos e por diagnóstico de imagem
como a ultra-sonografia, uretrocistografia miccional,
uretrografia retrógrada e outros exames, podem pre-
ver ou identificar alterações como espessamento e
trabeculação do detrusor, esvaziamento incompleto
da bexiga, dissinergismo esfíncter – detrusor, refluxo
vesicoureteral, litíase no trato urinário, estenose
uretral e outras alterações que tendem a interferir
na dinâmica do trato urinário, contribuindo para
a morbimortalidade da pessoa com lesão medular.
Essas alterações segundo Smith [12], trazem as
principais complicações da bexiga neurogênica
que são a infecção do trato urinário, a hidronefrose
e a formação de cálculos. Ele ainda postula que o
tratamento de qualquer uma das formas de bexiga
neurogênica visa manter uma capacidade funcional
relativamente boa, a combater a infecção urinária de
repetição, principalmente preservar a função renal.
Tais aspectos têm sido mais valorizados nos programa de reabilitação, pois tem havido uma melhor
compreensão de que a incontinência urinária não é
somente um aspecto fisiológico alterado, mas sim
um aspecto desagradável para homens e mulheres
com lesão medular.
Na conivência diária com clientes de lesão
medular de ambos os sexos, ao longo de 18 meses
em regime de internação, pude perceber o quanto
a incontinência urinária resultante da perda de
controle dos esfíncteres compromete a auto-estima
e desencadeia reação de pessimismo, sentimento
de inferioridade, insegurança, particularmente nos
jovens com seus planos “frustrados” de namorar,
casar e constituir família, de acordo com os padrões
de normalidade. Não raro era convocado pela família dos clientes mais jovens para interceder numa e
noutra crise existencial [4].
Atualmente, a incontinência urinária do cliente
com lesão medular tem sido melhor acompanhada
e pesquisada; nos centros de reabilitação a própria
urologia tem galgado degraus mais sólidos nesse
sentido. Geralmente nos primeiros dias de sua
avaliação, seja em uma unidade intensiva ou semiintensiva, são realizados alguns procedimentos que
permitam aos profissionais uma boa avaliação do
impacto da lesão medular. A sonda vesical de demora
geralmente é utilizada, pois permite esvaziamento
contínuo do conteúdo vesical, monitoramento
do volume vesical e suas características. Há de
se enfatizar que assim que estejam restabelecidas
condições clínicas seguras, a sonda vesical de demora pode ser retirada e ser iniciada a reeducação
vesical, mesmo que a pessoa mantenha nível de
inconsciência. A sonda vesical de demora tende
com o tempo aumentar as colonizações bacterianas
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mais resistentes, favorece com maior freqüência à
litíase vesical, acelera a atrofia da parede muscular
vesical, interferindo na qualidade da elasticidade e
expansibilidade da bexiga, que posteriormente serão
de suma importância para a reeducação vesical; sem
mencionarmos os riscos de traumatismos uretrais
devido aos balonetes insuflados via intra-uretral
ou mesmo às catastróficas fístulas penoescrotais
pelo mau posicionamento das sondas em homens,
e nas mulheres o uso prolongado de sonda vesical
de demora traz a um aumento ou alargamento da
luz uretral, que contribui também posteriormente
às freqüentes perdas urinárias [12].
Não poderíamos falar de intervenções terapêuticas de enfermagem na incontinência urinária de
clientes com lesão medular, sem nos referirmos ao
cateterismo intermitente limpo (CIL) que há anos
melhorou significativamente a expectativa de vida
de muitas pessoas deficientes com lesão medular.
Em 1972, Lapides [13] e colegas introduziram pela
primeira vez, o conceito da CIL no tratamento de
numerosos tipos de disfunções de armazenagem
e esvaziamento vesical, oriundas de dismorfismos
medulares ou mielomeningocele em crianças. O
envolvimento da CIL teve também implicações no
tratamento de infecções urinárias crônicas. A princípio, o esvaziamento vesical asséptico intermitente
via cateterização estéril foi usado em instituições especializadas na reabilitação de clientes com lesão na
medula espinhal. Esta técnica requeria o uso de luvas
e a preparação e uso do cateter estéril só uma vez.
Lapides adaptou este procedimento para uso ambulatorial em uma mulher de 30 anos com esclerose
múltipla e disfunção neurogênica de esvaziamento
vesical. Ele entendia que a resistência do hospedeiro
era a principal barreira contra a infecção, mais do
que os fatores bacterianos. Portanto, seria possível
usar as mãos limpas sem luvas, e se a própria pessoa
pudesse realizar o procedimento sozinha diríamos
que foi uma a auto-cateterização e se requeresse o
auxílio de uma terceira pessoa ou executado por outro então chamamos de cateterismo assistido. Com
isso foi verificado menor índice de infecções e que
as mesmas ocorriam, mas sem sintomatologia que
exigisse terapêutica medicamentosa, é a chamada
infecção urinária ou bacteriúria assintomática.
Nesse ponto é importante ressaltar que os
sintomas da infecção urinária no cliente com lesão
medular não se evidenciam da mesma forma que em
uma pessoa que não apresente tal tipo de lesão. Não
podemos aguardar apenas hipertermia, inapetência,
disúria (se não houver sensibilidade preservada, tal
fato não ocorrerá) entre outros. A infecção urinária
nesses clientes pode sinalizar-se através de alteração
macroscópica da urina, hipertermia, inapetência,
aumento da espasticidade ou contrações involuntárias, maior intensidade da dor neuropática e
principalmente aumento do volume e freqüência
das perdas urinárias. Sendo assim precisamos estar
atentos para não sub-diagnosticar ou hiper-valorizar
alguns sinais e sintomas. A reutilização da sonda em
ambiente domiciliar traz bastante discussão, mas
alguns trabalhos e a nossa prática têm mostrado
que os índices de infecção do trato urinário são
bem menores se comparados a quem não realiza
o cateterismo. Alguns que realizam o cateterismo
com uso único do catéter apresentam índices de
ITU (infecção no trajeto urinário) semelhantes
àqueles que re-aproveitam a sonda [13]. O ponto
chave da discussão é a higiene das mãos ao iniciar a
técnica e após a higienização da genitália, a lavagem
da sonda em água corrente e posteriormente seu
acondicionamento em local limpo e seco; além do
uso de lubrificante hidrossolúvel.
Àqueles que apresentam sensibilidade preservada no canal uretral, hipo ou hiperestesia carecem
do uso de lubrificantes acrescidos de anestésicos,
para que seja minimizado o desconforto. Não se
deve usar em nenhuma circunstância produtos à
base de óleo ou vaselina, pois estes tendem a agregar resíduos urinários e com isso formar estruturas
calculogênicas no interior da bexiga, aumentando
muito mais o potencial e manutenção da infecção
urinária. A propósito, não era por acaso que eu
criticava veementemente o uso por dias e dias de
vaselina líquida “esterilizada”, toda vez que o estoque
da farmácia não dispunha de xilocaína geléia para
fornecer aos clientes com lesão medular, que, embora tivessem perdido a sensibilidade ou não sentiam
dor ao introduzir o cateter de alívio, certamente
estariam expostos a outros tipos de complicação,
momento em que os “carcereiros” se limitavam
a responder que estavam seguindo orientação da
própria urodinâmica. Como resultado, em poucos
dias os quadros de infecção urinária aumentavam
em muito, o que podia ser constatado pelo aspecto
turvo da urina nos coletores, além de os acentuados
sintomas característicos como febre, prostração,
espasticidade, dentre outros [8].
Outrossim, o cateterismo intermitente limpo
visa o esvaziamento regular da bexiga para que sejam
mantidas condições ideais para ela se manter mais
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resistente à infecção, diminuir o risco de formação
de cálculos e principalmente para que não haja o
refluxo vesicoureteral e hidronefrose, dois potentes
colaboradores para a deterioração renal; e finalmente diminuir ou impedir as perdas urinárias que
interferem substancialmente na qualidade de vida
do cliente com lesão medular e de sua família. Um
dos aspectos que mais justifica o uso do cateterismo
para prevenir infecções, segundo Lapides [13], é
que a vascularidade da mucosa vesical é otimizada
quando a bexiga é capaz de armazenar urina em
baixas pressões e sem distensão excessiva. Por isso
o esvaziamento regular da bexiga reduz a probabilidade de multiplicação bacteriana significativa e,
portanto, o risco de infecção. Desde que sugerido,
experimentado e validada sua eficácia, o cateterismo
intermitente limpo tem sido aceito e utilizado no
mundo inteiro.
Em relação ao intestino, a literatura contempla
menos o assunto, mas informa que a lesão medular
afeta a fisiologia de todos os segmentos do aparelho
gastrointestinal. Existe, portanto, um retardo no
esvaziamento gástrico, principalmente em tetraplégicos por alterações na função autonômica. Há ainda
variação no tono abdominal, que pode resultar em
ausência de ruídos hidroaéreos, por isso aumentam
as chances de atonia e íleo paralítico, que podem
causar vômitos e aspiração. O retardo na evacuação,
caracterizado pela constipação ou obstipação, se
deve a atonia pela diminuição do ritmo e intensidade
peristálticos; e grande parte dos clientes com lesão
medular, em fase de choque medular ou fase aguda,
que geralmente permeia os três primeiros meses póslesão, experimentam longos períodos no leito ou por
estarem aguardando definições quanto a mobilidade
da coluna e por lesões concomitantes com o trauma
medular, e isso aumenta muito mais o retardo da
evacuação, que é incrementado pelo ressecamento
do bolo fecal restrito à ampola retal. Parte dessa complicação é de nossa responsabilidade, pois muitos
não são estimulados a manterem a ingesta hídrica,
a dieta não é mantida exclusivamente laxante, isso
colabora sobremaneira para a constipação.
A dieta laxante, ou rica em fibras, ou balanceada deve estar livre de alimentos que tornem o
bolo fecal pesado e pobre em água. Evidentemente,
sabemos que a mudança do hábito alimentar nem
sempre é uma experiência tranqüila, principalmente
para alguém que acaba de “experimentar” a lesão
medular; com maior agravante atribuído ao fato de
que o brasileiro verdadeiramente não sabe escolher
seus alimentos de consumo, aliado ainda aos apelos
gastronômicos da mídia, tendenciosos pelo excessivo
enfoque nos produtos industrializados. Outro ponto
interessante a considerar é o duelo entre mudança de
hábito alimentar, hábitos regionais (que no Brasil são
muitos) e as crendices populares. É preciso ter muita
cautela e tato mesmo ao abordar tal assunto. Mas
alguns aspectos são de fundamental importância que
mostremos à nossa clientela que tais costumes não
tem significado prático, como não comer abacaxi
ou peixe de escamas grossas, pois acredita-se que
impedem a cicatrização de feridas, se ao mesmo
tempo ele apresenta quadro de infecção urinária e
o consumo de abacaxi poderia lhe ser bastante útil,
da mesma forma que a proteína do peixe.
A falta de orientação, acompanhamento e
avaliação do enfermeiro no que tange à ingesta e/
ou aceitação da dieta, associada ao escasso volume
de líquido ingerido nas 24 horas faz com que os
clientes com lesão medular fiquem sobremaneira
desidratados, desnutridos e mais vulneráveis aos
quadros infecciosos, viróticos, etc [14]. Aliás, situação-problema apresentada e discutida por, ao
constatar que os jovens paraplégicos (clientes com
lesão medular) internados em um “conceituado”
programa de reabilitação da cidade do Rio de Janeiro
optavam por manter o esquema de ingerir pouco
líquido e apenas comer após quarta-feira, pois como
passavam os finais de semana em casa deixavam
para se evacuar na privacidade da família. Viviam
em constante estado de ansiedade temendo passar
vergonha na frente dos companheiros e alegavam
preferir “morrer de sede e fome” do que ter que “pagar mico” nas sessões de fisioterapia. Um aviltante
quadro de falta de compromisso, respeito, seriedade,
profissionalismo e senso humanitário da equipe para
com os clientes, não obstante minhas freqüentes
tentativas de chamar a atenção dos terapeutas para
o problema [4].
George et al. [9] assinalam que o desenvolvimento dos padrões de comportamento que são
aceitáveis tanto à sociedade quanto ao indivíduo
favorecem a sua capacidade para adaptar-se às mudanças menores no ambiente. Em função destas
alterações, o acompanhamento do cliente com lesão
medular torna-se indispensável para a identificação e prevenção de alterações dos tratos urinário e
gastrointestinal. Este acompanhamento precisa ser
feito por equipe de profissionais que estabeleça um
vínculo positivo, visando maior intercâmbio entre
cliente e equipe.
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Enfermagem Brasil
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Conclusão
A reeducação vesicointestinal tem conquistado
expressivo espaço nos últimos anos, no que tange
ao conteúdo dos periódicos afins, sessões clínicas,
temas de pesquisa discutidos em seminários, palestras e congressos. O tema vem sendo abordado
nos mais recentes eventos por estudantes de graduação em enfermagem; o que nos mostra que as
futuras gerações profissionais de enfermagem estão
sendo despertadas para horizontes além da terapia
intensiva, e que após tratamentos intensivos uma
boa parte da clientela há de necessitar de cuidados
de reabilitação, sendo assim o enfermeiro precisa
estar preparado para esse contexto e demanda. Essa
constatação, por sua vez, nos estimula a promover
oficinas de sensibilização, seminários, dinâmicas
de grupo na universidade e onde quer que sejamos
convidados a discutir as questões que envolvem os
programas de reabilitação para clientes portadores
de lesão medular. Embora tenhamos de reconhecer
que a produção de conhecimento de enfermagem
na área de reabilitação ainda seja modesta, acreditamos que as coisas tendem a mudar, ainda que para
atender a demanda e as atuais políticas públicas de
humanização da assistência. Mas, sobretudo, na
sensibilidade e capacidade criativa dos enfermeiros
empenhados na construção de novos parâmetros
para o cuidar indistintamente dessa clientela.
Referências
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2. Delisa JA. Medicina de reabilitação: princípios e prática.
São Paulo: Manole; 2001.
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2001.
4. Machado WCA. Cuidados de longo prazo: Uma abertura para a prática profissional liberal de enfermagem.
Editorial. Cadernos de Pesquisa – Cuidado é Fundamental do Núcleo de Pesquisa e Experimentação em
Enfermagem do DEF. Rio de Janeiro: EEAP, UNI-RIO;
1999. p. 6-7.
5. Pecci JC. Minha profissão é andar. 2a ed. São Paulo:
Summus; 1982.
6. Tormin G. Pássaro sem asas. 3a ed. Goiânia: Kelps;
1998.
7. França ISX. (Re)socialização da pessoa com deficiência
adquirida: o processo, os personagens e as máscaras.
João Pessoa: Idéia; 2000.
8. Machado WCA. Tempo, espaço e movimento: O “(d)
eficiente” físico, a reabilitação e o desafio de sobreviver
com o corpo partido. Rio de Janeiro: Papel Virtual;
2000.
9. George JB et al. Teorias de enfermagem – Os fundamentos para a prática profissional. 4a ed. Porto Alegre:
Artmed; 2000.
10. Black JM, Matassarin-Jacobs E. Enfermagem médico-cirúrgica: uma abordagem psicofisiológica. Rio de
Janeiro: Guanabara-Koogan; 1996.
11. Scramin AP. Convivendo com a tetraplegia: da necessidade de cuidados à integralidade no cotidiano de homens com lesão medular cervical [dissertação]. Paraná:
Centro de Ciências da Saúde, Fundação Universidade
Estadual de Maringá, Maringá; 2006.129 f
12. Smith DR. Urologia geral. 10a ed. Rio de Janeiro:
Guanabara Koogan, 1999.
13. Lapides G. Cateterismo intermitente limpo [online];
2006; São Paulo. Uronews [citado 2006 abril 8]: Disponível em: URL: http: www.uronews.org.br
14. Machado, WCA, Ruffoni LDG, Mello PC, Scramin AP,
Souza MF, Araújo GL. Cuidado domiciliário e pessoa
com deficiência: a integralidade nas intervenções de
enfermagem. Enfermagem Brasil 2005;4(5):298-307.
246
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14/9/2006 14:20:23
Normas de publicação Enfermagem Brasil
A revista Enfermagem Brasil é uma publicação com periodicidade bimestral e está aberta para a publicação e divulgação
de artigos científicos das áreas relacionadas à Enfermagem.
Os artigos publicados em Enfermagem Brasil poderão
também ser publicados na versão eletrônica da revista (Internet)
assim como em outros meios eletrônicos (CD-ROM) ou outros
que surjam no futuro, sendo que pela publicação na revista os
autores já aceitem estas condições.
A revista Enfermagem Brasil assume o “estilo Vancouver”
(Uniform requirements for manuscripts submitted to biomedical
journals, N Engl J Med. 1997;336(4):309-315) preconizado pelo
Comitê Internacional de Diretores de Revistas Médicas, com as
especificações que são resumidas a seguir. Ver o texto completo
em inglês desses Requisitos Uniformes no site do International
Committee of Medical Journal Editors (ICMJE), http://www.
icmje.org, na versão atualizada de outubro de 2001.
Os autores que desejarem colaborar em alguma das
seções da revista podem enviar sua contribuição (em arquivo
eletrônico/e-mail) para nossa redação, sendo que fica entendido que isto não implica na aceitação do mesmo, o que será
notificado ao autor.
O Comitê Editorial poderá devolver, sugerir trocas ou retorno de acordo com a circunstância, realizar modificações nos
textos recebidos; neste último caso não se alterará o conteúdo
científico, limitando-se unicamente ao estilo literário.
1. Editorial
Trabalhos escritos por sugestão do Comitê Científico, ou
por um de seus membros.
Extensão: Não devem ultrapassar três páginas formato
A4 em corpo 12 com a fonte Times New Roman com todas as
formatações de texto, tais como negrito, itálico, sobrescrito, etc;
a bibliografia não deve conter mais que dez referências.
2. Artigos originais
São trabalhos resultantes de pesquisa científica apresentando dados originais de descobertas com relaçaõ a aspectos
experimentais ou observacionais, e inclui análise descritiva e/ou
inferências de dados próprios. Sua estrutura é a convencional
que traz os seguintes itens: Introdução, Métodos, Resultados,
Discussão e Conclusão.
Texto: Recomendamos que não seja superior a 12 páginas,
formato A4, fonte English Times (Times Roman) tamanho 12,
om todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobre-escrito, etc. O total de caracteres não deve ultrapassar
25.000/30.000 caracteres, inclusos espaçamentos.
Tabelas: Considerar no máximo seis tabelas, no formato
Excel/Word.
Figuras: Considerar no máximo 8 figuras, digitalizadas
(formato .tif ou .gif ) ou que possam ser editados em PowerPoint, Excel, etc.
Bibliografia: É aconselhável no máximo 50 referências
bibliográficas.
Os critérios que valorizarão a aceitação dos trabalhos
serão o de rigor metodológico científico, novidade, interesse
profissional, concisão da exposição, assim como a qualidade
literária do texto.
3. Revisão
São trabalhos que versem sobre alguma das áreas relacionadas à Enfermagem, que têm por objeto resumir, analisar,
avaliar ou sintetizar trabalhos de investigação já publicados em
revistas científicas. Quanto aos limites do trabalho, aconselha-se
o mesmo dos artigos originais.
4. Atualização
São trabalhos que relatam informações geralmente atuais
sobre tema de interesse dos profissionais de Enfermagem (novas
técnicas, legislação, por exemplo) e que têm características
distintas de um artigo de revisão.
5. Relato de caso
São artigos dados descritivos de um ou mais casos explorando um método ou problema através de exemplo. Apresenta
as características do indivíduo estudado, com indicação de sexo,
idade e pode ser realizado em humano ou animal.
6. Comunicação breve
Esta seção permitirá a publicação de artigos curtos, com
maior rapidez. Isto facilita que os autores apresentem observações, resultados iniciais de estudos em curso, e inclusive realizar
comentários a trabalhos já editados na revista, com condições de
argumentação mais extensa que na seção de cartas do leitor.
Texto: Recomendamos que não seja superior a três páginas, formato A4, fonte Times New Roman, tamanho 12,
com todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobre-escrito, etc.
Tabelas e figuras: No máximo quatro tabelas em Excel
e figuras digitalizadas (formato .tif ou .gif) ou que possam
ser editados em Power Point, Excel, etc
Bibliografia: São aconselháveis no máximo 15 referências
bibliográficas.
7. Resumos
Nesta seção serão publicados resumos de trabalhos e
artigos inéditos ou já publicados em outras revistas, ao cargo
do Comitê Científico, inclusive traduções de trabalhos de
outros idiomas.
8.Correspondência
Esta seção publicará correspondência recebida, sem que
necessariamente haja relação com artigos publicados, porém
relacionados à linha editorial da revista. Caso estejam relacionados a artigos anteriormente publicados, será enviada ao autor
do artigo ou trabalho antes de se publicar a carta.
Texto: Com no máximo duas páginas A4, com as especificações anteriores, bibliografia incluída, sem tabelas ou
figuras.
PREPARAÇÃO DO ORIGINAL
1.1 Os artigos enviados deverão estar digitados em processador de texto (Word), em página de formato A4, formatado
da seguinte maneira: fonte Times New Roman, tamanho 12,
com todas as formatações de texto, tais como negrito, itálico,
sobrescrito, etc.
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14/9/2006 14:20:23
1.2 Numere as tabelas em romano, com as legendas para
cada tabela junto à mesma.
1.3 Numere as figuras em arábico, e envie de acordo com
as especificações anteriores.
As imagens devem estar em tons de cinza, jamais coloridas,
e com qualidade ótima (qualidade gráfica – 300 dpi). Fotos e
desenhos devem estar digitalizados e nos formatos .tif ou .gif.
1.4 As seções dos artigos originais são estas: resumo, introdução, material e métodos, resultados, discussão, conclusão
e bibliografia. O autor deve ser o responsável pela tradução
do resumo para o inglês e o espanhol e também das palavraschave (key-words). O envio deve ser efetuado em arquivo, por
meio de disquete, zip-drive, CD-ROM ou e-mail. Para os
artigos enviados por correio em mídia magnética (disquetes,
etc) anexar uma cópia impressa e identificar com etiqueta no
disquete ou CD-ROM o nome do artigo, data e autor, incluir
informação dos arquivos, tais como o processador de texto
utilizado e outros programas e sistemas.
2. Página de apresentação
A primeira página do artigo apresentará as seguintes
informações:
- Título em português, inglês e espanhol.
- Nome completo dos autores, com a qualificação curricular e títulos acadêmicos.
- Local de trabalho dos autores.
- Autor que se responsabiliza pela correspondência, com
o respectivo endereço, telefone e E-mail.
- Título abreviado do artigo, com não mais de 40 toques,
para paginação.
- As fontes de contribuição ao artigo, tais como equipe,
aparelhos, etc.
3.Autoria
Todas as pessoas consignadas como autores devem ter
participado do trabalho o suficiente para assumir a responsabilidade pública do seu conteúdo.
O crédito como autor se baseará unicamente nas contribuições essenciais que são: a) a concepção e desenvolvimento,
a análise e interpretação dos dados; b) a redação do artigo ou
a revisão crítica de uma parte importante de seu conteúdo
intelectual; c) a aprovação definitiva da versão que será publicada. Deverão ser cumpridas simultaneamente as condições
a), b) e c). A participação exclusivamente na obtenção de
recursos ou na coleta de dados não justifica a participação
como autor. A supervisão geral do grupo de pesquisa também
não é suficiente.
4. Resumo e palavras-chave
Na segunda página deverá conter um resumo (com no
máximo 150 palavras para resumos não estruturados e 200 palavras
para os estruturados), seguido da versão em inglês e espanhol.
O conteúdo do resumo deve conter as seguintes informações:
- Objetivos do estudo.
- Procedimentos básicos empregados (amostragem,
metodologia, análise).
- Descobertas principais do estudo (dados concretos e
estatísticos).
Enfermagem_v5n4.indb 248
- Conclusão do estudo, destacando os aspectos de maior
novidade.
Em seguida os autores deverão indicar quatro palavraschave para facilitar a indexação do artigo. Para tanto deverão
utilizar os termos utilizados na lista dos DeCS (Descritores
em Ciências da Saúde) da Biblioteca Virtual da Saúde, que se
encontra no endereço internet seguinte: http://decs.bvs.br. Na
medida do possível, é melhor usar os descritores existentes.
5. Agradecimentos
Os agradecimentos de pessoas, colaboradores, auxílio
financeiro e material, incluindo auxílio governamental e/ou
de laboratórios farmacêuticos devem ser inseridos no final do
artigo, antes as referências, em uma secção especial.
6. Referências
As referências bibliográficas devem seguir o estilo Vancouver definido nos Requisitos Uniformes. As referências
bibliográficas devem ser numeradas por numerais arábicos
entre parênteses e relacionadas em ordem na qual aparecem
no texto, seguindo as seguintes normas:
Livros - Número de ordem, sobrenome do autor, letras
iniciais de seu nome, ponto, título do capítulo, ponto, In: autor
do livro (se diferente do capítulo), ponto, título do livro, ponto,
local da edição, dois pontos, editora, ponto e vírgula, ano da
impressão, ponto, páginas inicial e final, ponto.
Exemplos:
Livro:
May M. The facial nerve. New-York: Thieme; 1986
Capítulo ou parte de livro:
Phillips SJ. Hypertension and Stroke. In: Laragh JH, editor.
Hypertension: pathophysiology, diagnosis and management. 2nd
ed. New-York: Raven Press; 1995. p.465-78.
Artigos – Número de ordem, sobrenome do(s) autor(es),
letras iniciais de seus nomes (sem pontos nem espaço), ponto.
Título do trabalha, ponto. Título da revista ano de publicação
seguido de ponto e vírgula, número do volume seguido de dois
pontos, páginas inicial e final, ponto. Não utilizar maiúsculas
ou itálicos. Os títulos das revistas são abreviados de acordo
com o Index Medicus, na publicação List of Journals Indexed in
Index Medicus ou com a lista das revistas nacionais, disponível
no site da Biblioteca Virtual de Saúde (http://www.bireme.br).
Devem ser citados todos os autores até 6 autores. Quando mais
de 6, colocar a abreviação latina et al.
Exemplo:
Yamamoto M, Sawaya R, Mohanam S. Expression and
localization of urokinase-type plasminogen activator receptor
in human gliomas. Cancer Res 1994;54:5016-20.
Os artigos, cartas e resumos devem ser enviados para:
Jean-Louis Peytavin
Atlantica Editora
Rua da Lapa, 180/1103 - Lapa
20021-180 Rio de Janeiro RJ
Tel: (21) 2221 4164
E-mail: [email protected]
14/9/2006 14:20:24
Calendário de eventos
2006
Setembro
21 de setembro
Encontro de pesquisadores de enfermagem
Hospital Geral de Vila Cachoeirinha, São Paulo, SP
Informações: (11) 3859-3799
22 a 23 de setembro
I Congresso Brasileiro de Enfermagem em
Genética - 2º Simpósio Nacional de Genética
Clínica e Enfermagem
UNIFESP, São Paulo, SP
Informações: (11) 5571-1720
24 a 28 de setembro
9 º Congresso Brasileiro dos Conselhos de
Enfermagem
Porto Seguro, BA
Informações: 0800-2822507
Outubro
4 a 5 de outubro
I Jornada de Enfermagem em Cirurgia de
Cabeça e Pescoço
Instituto Nacional de Câncer (INCA)
Praça Cruz Vermelha, 23 - 8º andar, Rio de Janeiro, RJ
Informações: (021) 2506-6152
E-mail: [email protected]
5 a 7 de outubro
6ª. Jornada Brasileira de Enfermagem
Geriátrica e Gerontológica
Hotel Shelton I, Ribeirão Preto
Informações: www.eerp.usp.br
7 a 11 de outubro
XIII Congresso Brasileiro de Enfermagem em
Nefrologia
Expo Gramado, RS
Informações: (11) 3289-8347
8 a 10 de outubro
III Seminário Internacional de Filosofia e Saúde
30 anos do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC
Hotel Castelmar, Florianópolis, SC
Informações: [email protected]
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21 a 25 de outubro
VIII Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva
Riocentro, Rio de Janeiro, RJ
Informações: [email protected]
23 a 28 de outubro
XII Congreso de la Sociedad Cubana de
Enfermería
Sociedad Cubana de Enfermería (SOCUENF).
Santiago de Cuba, Cuba
Informações: [email protected]
Novembro
5 a 9 de novembro
58º. Congresso Brasileiro de Enfermagem
Salvador, Bahia
Informações: (071)33365644
E-mail: [email protected]
Dezembro
05 a 8 de dezembro
V Forúm Mineiro de Enfermagem
Novas Perspectivas no cuidado da Saúde da Família e
da Comunidade
Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, MG
Informações: (34) 3218-2387
www.hc.huf.br/enfermagem
2007
Abril
27 de abril a 1 de maio
II Congresso Brasileiro de Enfermagem
Pediátrica e Neonatal
Teresópolis, RJ
Informações: [email protected]
Maio
9 a 12 de maio
I Congresso Brasileiro de Feridas 2007 e II
Simpósio Home-Care em Foco
Hotel Gloria, Rio de Janeiro, RJ
Informações: Tel: (21) 2717-9408 (Nyty Eventos)
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Enfermagem Brasil
Setembro / Outubro 2006;5(5)
Índice
Volume 5 número 5 - Setembro / Outubro de 2006
EDITORIAL
Profissionalmente, você é o que faz, fala e escreve,
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento ................................................................... 251
ARTIGOS ORIGINAIS
Mulheres expressando seus sentimentos frente à cirurgia ginecológica: implicações
para o cuidado de enfermagem, Anna Maria de Oliveira Salimena,
Maria Carmen Simões Cardoso de Melo, Leciana de Oliveira Lambert ........................................ 253
As concepções de enfermeiros de hospital geral frente às questões relacionadas
ao álcool e ao alcoolismo, Daniela Maria Lucca, Divane de Vargas, Daiane de Vargas ..................... 260
A seleção das informações para o planejamento da alta hospitalar
do paciente, Marcela Ganzella, Márcia M. Fontão Zago ......................................................... 268
O ensino de ética e seus reflexos no cuidado sob a perspectiva de graduandos
de enfermagem, Wiliam César Alves Machado, Ademê de Carvalho Piuzana,
Eliane Raimunda Oliveira Tostes, Vivian Pereira Monteiro, Silvia Raquel Perez Toledo ..................... 176
Contaminação ambiental por formas infectantes de parasitos em locais
públicos da região do Vale do Aço-MG, Graziella Neves Peri,
Leisson Domingues Pinheiro, Michelle Maia Carvalho ........................................................... 285
Percepções, sentimentos e dificuldades da equipe de enfermagem no cuidado
a pacientes terminais idosos (o cuidado de enfermagem na morte do idoso),
Edison Luiz Devos Barlem, Ananda Fialho Rosa, Valéria Lerch Lunardi,
Wilson Danilo Lunardi Filho ......................................................................................... 289
REVISÃO
Cateterização pós-pilórica em neonatos e crianças: um procedimento simples?,
Aspásia Basile Gesteira Souza, Bianca A. A Caetano Silva, Daniela O. de Souza Oliveira,
Graziella M. de Souza Menezes, Juliane Lengyel ................................................................... 299
ATUALIZAÇÃO
Sensibilizando os profissionais de enfermagem para a assistência solidária
ao indivíduo soropositivo, Alexandra Nogueira Pereira,
Walter Aparecido Carvalho Cândido, Wanessa Nogueira Monteiro,
Aldaiza Ferreira Antunes Fortes, Ana Maria Nassar Cintra Soane ............................................... 305
NORMAS DE PUBLICAÇÃO .............................................................................. 310
CALENDÁRIO DE EVENTOS .............................................................................. 312
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16/10/2006 16:38:03
Enfermagem Brasil
Setembro / Outubro 2006;5(5)
EDITOR CIENTÍFICO – PRESIDENTE DO CONSELHO CIENTÍFICO
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento (UniRio – Rio de Janeiro)
CONSELHO CIENTÍFICO
Profa. Dra. Almerinda Moreira (Escola de Enfermagem Alfredo Pinto – UniRio – Rio de Janeiro)
Prof. Dr. Carlos Bezerra de Lima (UFPB – Paraíba)
Profa. Dra. Márcia Maria Fontão Zago (USP – Ribeirão Preto)
Profa. Dra. Margarethe Maria Santiago Rêgo (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Maria da Graça Piva (ULBRA – RS)
a
a
Prof . Dr . Maria Helena da Silva Nery (UFRGS – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Marialda Moreira Christoffel (UERJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Nebia Maria Almeida de Figueiredo (UniRio – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Rita Batista Santos (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Profa. Dra. Rita de Cássia Tapié Martins (USP – São Paulo)
Prof. Dr. Sérgio Ribeiro dos Santos (UFPB – Paraíba)
Profa. Dra. Silvia Helena de Bortoli Cassiani (USP – Ribeirão Preto)
Profa. Dra. Taka Oguisso (USP – São Paulo)
a
Prof . Dra. Valéria Lerch Lunardi (FURG – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Vera Regina Salles Sobral (UFF – Rio de Janeiro)
Prof. Dr. Wiliam César Alves Machado (UNIPAC – Minas Gerais)
Prof. Dr. Wilson D. Lunardi Filho (FURG – Rio Grande do Sul)
Profa. Dra. Zaida Aurora Sperli Geraldes Soler (FAMERP – São José do Rio Preto – São Paulo)
GRUPO DE ASSESSORES
Profa Ms. Andréia Saccol Lourenço (Escola Técnica de Enfermagem São Francisco – Rio Grande do Sul)
Profa Ms. Dóris Maria Volquind (Clínica de Florais de RAFF – Rio Grande do Sul)
Profa Ms. Dulce Dirclair Huf (UFMS – Mato Grosso do Sul)
Profa Ms. Gisele Cristina Tertuliano (Rio Grande do Sul)
a
Prof Ms. Sonia Maria Ponciano dos Santos (Escola Anna Nery – UFRJ – Rio de Janeiro)
Prof. Ms. Dalmo Valério Machado de Lima (UFF – Rio de Janeiro)
Profª. Ms. Maria Filomena Vancellote Almeida (UniRio – Rio de Janeiro)
Rio de Janeiro
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20021-180 – Rio de Janeiro – RJ
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Editoração e arte
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Editor executivo
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Atlântica Editora edita as revistas Fisioterapia Brasil, Neurociências, Nutrição Brasil e MN-Metabólica.
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Enfermagem, Hospital Espanhol, Rio de Janeiro.
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Enfermagem Brasil
Setembro / Outubro 2006;5(5)
Editorial
Profissionalmente, você é o que faz,
fala e escreve
Profª Drª Maria Aparecida de Luca Nascimento
Todas as profissões têm como característica
básica, o elemento técnico, e com a enfermagem
não poderia ser diferente. Socialmente, quando
se quer saber sobre qualquer perfil profissional,
ouve-se a seguinte pergunta: o que é que ele(a)
faz? Desse modo, é o fazer que nos caracteriza, ou
melhor, que caracteriza todos os profissionais.
A projeção da enfermagem a patamares
científicos foi alcançada por Florence Nightingale
através da sistematização da assistência composta
pelo elemento técnico. Entenda-se por técnica,
todo um processo, que vai do micro ao macro
ambiente, que engloba atualmente, tecnologias,
formas de proceder sistematizadas, apoiadas em
referenciais das mais diversas ciências, tendo sempre como foco, o ser humano.
Apesar disso, frequentemente ouço alguns
recém formados dizerem que seu interesse após
a formatura é o ensino, mas como ensinar o cuidado sem praticá-lo? Mesmo entendendo que a
enfermagem se processa através da assistência, do
ensino e da pesquisa, é o fazer que poderá contemplar estas três vertentes da nossa profissão.
Ao praticar o cuidado através de uma sistematização, o profissional se destaca e se impõe,
pois cada um dá de si quando atua na enfermagem,
porque o toque de uma mão, é diferente do toque
de outra, a forma de um profissional abordar um
paciente, difere de uma pessoa para outra, e cada
profissional deixa impresso, de alguma forma,
no corpo de quem foi alvo do seu cuidado, a sua
marca.
Ainda hoje, e lá se vão quase três décadas,
lembro da forma com que uma profissional de
enfermagem arrumava as crianças para irem ao
banho, dentro de uma enfermaria pediátrica. No
plantão dela, a hora do banho era uma festa, assim como a hora do café, do lanche e do almoço,
independentemente do tipo de dieta de cada um.
Como ela, lembro de muitos profissionais, cada
um a seu modo, povoam as minhas lembranças. Fico a imaginar, se os pacientes que foram
cuidados por eles também não guardam essas
lembranças...
Porém, fazer não é tudo, é preciso falar sobre
o que se faz, além disso, a enfermagem é uma profissão eminentemente social, lidamos com gente
durante todo o tempo, e não só com os pacientes,
lidamos com seus familiares e com os nossos colegas de profissão, e, sem dúvida nenhuma, somos
o elo entre todos os profissionais, porque somos
a equipe que mais tempo permanece ao lado do
paciente, e dentro dos setores.
Desse modo, se praticamos a enfermagem
com competência, se aplicamos os princípios
científicos no nosso cotidiano, mas não nos comunicamos adequadamente, deixamos a desejar
como profissionais. Ainda mais se, diante de
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Enfermagem Brasil
Setembro / Outubro 2006;5(5)
um grupo interdisciplinar, não soubermos expor
as nossas idéias, e nem soubermos expor as nossas
reivindicações. Falar socialmente é primordial, mas,
profissionalmente, falar é uma questão de sobrevivência da classe.
Contudo, há que se cuidar, não só, daquilo
que se fala, como também, da forma como se fala,
porque, profissionalmente, o que se fala tem peso
diferente daquilo que é dito coloquialmente. Assim
como o fazer, o falar também caracteriza um profissional, e as palavras também deixam as suas marcas,
para o bem, ou para o mal.
Sendo assim, de que adianta ser um profissional, tecnicamente perfeito, mas sem uma comunicabilidade razoável? No mundo corporativo e na
era da comunicação, aqueles que fazem, mas não
falam, ou falam mal, perdem terreno a cada dia, e,
na mesma proporção, aquele que fala, mas não faz,
também fica desacreditado.
Daí, a importância de tomarmos posse das
nossas idéias, e de defender o nosso ponto de vista
nas instituições, nos cargos, e nos eventos dos quais
participamos, ressaltando que o discurso terá mais
crédito, à medida que o seu expositor demonstre
capacidade técnica ao defendê-lo.
Porém, fazer e falar, não são os únicos procedimentos necessários para o delineamento da
imagem profissional, além deles, é preciso, urgente e
necessário, que se escreva. A escrita é um documento
como qualquer outro, e a forma mais expressiva de
comunicação, porque se perpetua.
No entanto, quem escreve se expõe, tal como
agora faço, mas o que seria das profissões se não
fossem os documentos que legitimam a ação dos seus
profissionais? Além do mais, o debate que advém
dos artigos e dos materiais escritos possibilitam o
crescimento profissional.
No cotidiano da nossa prática acadêmica,
observamos a quantidade de verdadeiros doutores
“honoris causa”, que detém um saber profissional
invejável, mas que afirmam que o fato de escrever
sobre a sua prática é um desafio. No entanto, escrever é uma questão de hábito, e escrever sobre o que
se faz é uma contribuição imensurável à evolução
da profissão.
Escrever é tão importante, que a prova de
redação no vestibular e a prova de português nos
concursos públicos têm características eliminatórias,
e têm sido responsáveis pela reprovação de muitos
profissionais gabaritados tecnicamente, que, ao
serem eliminados, deixam um vácuo difícil de ser
preenchido.
Assim, profissionalmente, você é aquilo que
você faz, fala e escreve, não necessariamente nessa
ordem, porque essas formas se interpenetram, e,
sem dúvida, é nesse tripé que a imagem profissional
encontra apoio. Concluindo, quem faz e não fala
sobre o que faz; quem faz, fala e não escreve sobre
o que faz; e quem escreve, fala e não faz, deixa a
desejar como profissional.
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Enfermagem Brasil
Setembro / Outubro 2006;5(5)
Artigo original
Mulheres expressando seus sentimentos
frente à cirurgia ginecológica: implicações
para o cuidado de enfermagem
Anna Maria de Oliveira Salimena*, Maria Carmen Simões Cardoso de Melo, M. Sc.**,
Leciana de Oliveira Lambert***
*Enfermeira, Universidade Federal de Juiz de Fora – FACENF/UFJF. **Programa de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem
Anna Nery/UFRJ, Professora Adjunto do Departamento Enfermagem Aplicada da FACENF/UFJF – Orientadora. Pesquisadora
do NUPESME/ EEAN/UFRJ, ***Professora Assistente do Departamento Enfermagem Aplicada da FACENF/UFJF – CoOrientadora.
Resumo
Esta pesquisa qualitativa objetivou a compreensão dos sentimentos da mulher ao se submeter a uma cirurgia ginecológica, em
razão de ser essa, parte de inquietações originadas no decurso de atividades práticas realizadas em uma instituição hospitalar de
ensino. Nesse sentido, a trajetória na abordagem fenomenológica permitiu desvelar os sentimentos da mulher em pré-operatório,
através das seguintes questões norteadoras: “Conte para mim como você se sente estando internada para ser submetida a
uma cirurgia ginecológica” e “O fato de submeter-se a uma cirurgia feminina afeta sua forma de se ver como mulher?”.
Foram realizadas doze entrevistas entre os meses de julho a setembro de 2005. A análise compreensiva dos depoimentos das
mulheres, sujeitos desta pesquisa, revelou a possibilidade de estabelecer as reflexões nas seguintes categorias de significados,
identificadas a partir dos sentimentos manifestos: Enfrentando o medo; A fé como consolo/apoio; A busca de alívio/melhora;
O significado de ser mãe. Este estudo propiciou reflexões mais detidas sobre o tema e sua importante contribuição para um
cuidar humanizado e individualizado, centrado na experiência vivenciada por esta mulher em preparo para o procedimento
cirúrgico ginecológico visando a melhoria da assistência de enfermagem a ela dispensada.
Palavras-chave: enfermagem, mulher, sentimentos, cirurgia ginecológica.
Abstract
Women expressing their feelings facing a gyneacologic surgery: implications to
nursing care
The aim of this research is to understand women’s feelings when undergoing gynaecologic surgery, since this is part of
anxieties originated during practice activities carried out at a teaching hospital institution. In that sense, the trajectory on the
phenomenological approach allowed me to unveil the women’s feelings during the time just before the surgery through these
leading questions: “Tell me what are your feelings at this moment that you are admitted at the hospital to undergo gynaecologic
Artigo recebido em 17 de julho de 2006; aceito em 15 de setembro de 2006.
Endereço para correspondência: Anna Maria de Oliveira Salimena, Rua Marechal Cordeiro
de Faria n.º 172, 36081.330 Juiz de Fora MG, E-mail: [email protected]
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surgery?” and “Submit yourself to a women’s surgery affect your way to see yourself like woman?”. The comprehensive analysis
from the interview of twelve women between July and September of 2005 exposed the possibility of fixing reflection in those
categories of meanings identified since the feelings showed: facing the fear; the faith as support/consolation; the search of
relief/ improvement; the meaning of being mother. This study gave us a chance to reflect closely about the subject in question
and its important contribution to a humanized and more individual assistance, focusing at life experience of the woman that
is in preparation for the gyneacologic-surgical procedure aiming at improving nursing care.
Key-words: nursing, woman, feelings, gynaecologic surgery.
Resumen
Mujeres expresando sus sentimientos frente a la cirugía ginecológica: implicaciones
para la atención de enfermería
Esta investigación cualitativa tuvo por objetivo la comprensión de los sentimientos de la mujer al someterse a una cirugía
ginecológica en razón de ser esa, parte de las inquietudes originadas durante las actividades prácticas de enseñanza realizadas
en un hospital. En este sentido, la trayectoria en el abordaje fenomenológico permitió desvelar los sentimientos de la mujer
en el preoperatorio, a través de las siguientes cuestiones: “Dígame, ¿cómo se siente usted, estando internada para ser sometida
a una cirugía ginecológica?” y “¿El hecho de someterse usted a una cirugía femenina afecta su forma de verse como mujer?”.
Fueron realizadas doce encuestas entre los meses de julio a septiembre de 2005. El análisis de la comprensión de las declaraciones
de las mujeres, sujetos de esta investigación, reveló la posibilidad de establecer las reflexiones en las siguientes categorías de
significados, identificadas a partir de los sentimientos manifiestos; Enfrentamiento del miedo; La fe como consolación/apoyo;
La búsqueda de alivio/mejora; El significado de ser madre. Este estudio propició reflexiones más detenidas sobre el tema y
su importante contribución a un cuidar humanizado e individualizado, centrado en la experiencia vivenciada por la mujer
en la preparación para el procedimiento quirúrgico ginecológico, proponiéndose a una mejoría de la atención de enfermería
a ella dispensada.
Palabras-clave: enfermería, mujer, sentimientos, cirugía ginecológica.
Introdução
A cirurgia é um procedimento invasivo, sendo
utilizada como recurso diagnóstico ou terapêutico
e que, na maioria das vezes, é imposta ao paciente
trazendo transformações ao seu cotidiano e uma
gama de transtornos tanto físicos quanto emocionais e sociais. Os pacientes tornam-se fragilizados,
melancólicos, preocupados e introvertidos, por
conseguinte, confusos e ansiosos [1]. Acreditamos
ser o enfermeiro capaz de, utilizando-se do relacionamento terapêutico e de sua formação profissional
humanitária, prestar uma assistência integral ao
paciente, em seus aspectos biológicos, psicológicos,
sociais e espirituais.
Pensando em ir de encontro à possibilidade
de minimizar inquietações quanto a estes aspectos
foi elaborado e tem sido desenvolvido o Projeto de
Extensão “Visita de Enfermagem Pré-Operatória:
Implementação da Assistência de Enfermagem às
pacientes da Enfermaria de Ginecologia do HUUFJF”. No decorrer das atividades propostas neste
projeto, têm sido experienciados momentos de
ansiedade, angústia e medo vivenciados por essas
clientes que, nessa condição, se tornam extremamente vulneráveis, fora de seu ambiente familiar e
privadas de suas atividades da vida diária.
A partir desta experiência, alguns questionamentos surgiram: Como estas mulheres se sentem
perante a possibilidade da retirada de um órgão ou
como se verão frente aos familiares, principalmente
ao cônjuge? Como estão enfrentando seu diagnóstico e a sua internação? Como estão se sentindo
enquanto aguardam a sua cirurgia? O que significa
para elas este momento? O motivo da escolha deste
tema para elaboração da monografia de Trabalho de
Conclusão do Curso de Graduação em Enfermagem
foi, principalmente, a observação dos acontecimentos nesta enfermaria no desenrolar das atividades
neste campo de prática e das atividades de extensão
junto a estas mulheres em pré-operatório de cirurgia
ginecológica.
A formação do profissional enfermeiro fundamenta-se no atendimento das necessidades básicas
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do ser humano para seu completo bem estar físico,
psíquico e social não podendo estas, serem relegadas, quando se opta pela totalidade e qualidade do
atendimento de Enfermagem. Merece destaque,
a importância e a responsabilidade do enfermeiro
quanto à observação e ao atendimento das necessidades psicossomáticas dos pacientes em cirurgia,
alegando que este profissional possui funções específicas na eficácia terapêutica de seus clientes [2].
Os autores ainda enfatizam que a experiência da
doença-cirurgia-prognóstico precipita sentimentos
e reações estressantes para o cliente e sua família
atribuídas ao ato anestésico-cirúrgico, ao medo do
desconhecido, às dúvidas e incertezas do processo
de recuperação.
Os pacientes e familiares têm que se adaptar
às exigências dos diferentes estágios da doença e
ao ambiente desconhecido e assustador, no qual
se sentem vulneráveis e dependentes. Neste sentido, o enfermeiro deve compreender o significado
dos sentimentos de seus clientes como também
deve tentar descobrir a sua demanda de ajuda. Por
isso torna-se necessário alertar os profissionais de
enfermagem quanto à importância da assistência
integral à clientela, e, em especial, à mulher que irá
se submeter à cirurgia ginecológica.
Desta maneira, tornou-se objeto deste estudo
os sentimentos da mulher que se submeterá a procedimento cirúrgico ginecológico, tendo como objetivos: Conhecer as necessidades psico-emocionais
e sociais buscando a compreensão dos sentimentos
das mulheres em pré-operatório de cirurgia ginecológica.
Para tanto, acredita-se que se bem orientada
e emocionalmente tranqüila, a cliente estará muito
melhor preparada e apta para contribuir positivamente nesse processo de cuidado no pré, trans e
pós-operatório. Portanto, torna-se necessário que
a enfermagem sistematize a assistência prestada
aos pacientes cirúrgicos com o objetivo de melhor promover o seu bem estar, manutenção de
sua integridade e recuperação de sua saúde. Neste
processo, torna-se extremamente valiosa a melhor
compreensão das particularidades desta clientela
específica, na busca do atendimento da totalidade
de suas necessidades.
Material e métodos
Ao surgirem situações que geram conflitos no
decurso da atividade profissional, torna-se relevante
lançar-se mão da pesquisa científica na tentativa de
conhecer a realidade circundante, pretendendo o
entendimento das experiências que dali se emanam.
Isto implica na oportunidade de se descortinar os
conceitos existentes, bem como, de se adequar à
realidade do fato motivador de inquietações no
momento.
A produção de conhecimento em Enfermagem, atualmente, desenvolve-se guardando uma
estreita relação entre o saber da área da saúde e as
contribuições de outras correntes de pensamento
como a psicologia, a sociologia, a antropologia
e até mesmo a economia e a administração. Este
enfoque atual visa à compreensão do indivíduo em
sua totalidade e não somente, à sua patologia ou às
intervenções possíveis. Neste sentido, a metodologia
qualitativa com a abordagem fenomenológica, neste
estudo, mostrou-se em sintonia com este objetivo,
pois a fenomenologia permite mostrar, descrever e
compreender os motivos presentes nos fenômenos
vividos, que se mostram e se expressam por si mesmos [3].
Para o desenvolvimento da pesquisa proposta
foi encaminhado o seu projeto ao Comitê de Ética
da Universidade Federal de Juiz de Fora - MG, para
análise e liberação do mesmo, atendendo a Resolução n. 196/96 do Ministério da Saúde [4].
Por ser um tema emergente da prática acadêmica, a Unidade de Ginecologia do Hospital
Universitário da UFJF foi o cenário deste estudo,
tendo como sujeitos as mulheres de faixa etária de
18 a 80 anos, no período pré-operatório, de cirurgias
eletivas ginecológicas. Foram realizadas 12 (doze)
entrevistas no período de julho a setembro de 2005.
A coleta foi interrompida quando se percebeu que
as falas apresentavam-se como expressão dos mesmos sentimentos, representando a ocorrência de
saturação dos dados.
Durante a coleta dos depoimentos, atentouse à expressão não-verbal, manifestada em gestos,
lágrimas, sorrisos etc, registrando-a no diário de
campo, posteriormente. Essa observação constituiuse em um somatório para a pesquisa, pois a interação
entre a pesquisadora e as mulheres, foi essencial
como complemento da entrevista, pois permitiu a
percepção direta, sem qualquer intermediação, e a
explicitação das reações e do falar das participantes.
As informações foram obtidas através de entrevistas abertas e gravadas, realizadas com as mulheres
internadas na Enfermaria de Ginecologia do HUUFJF, no período anterior à realização de cirurgia
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especificamente feminina, após o esclarecimento dos
objetivos e sua anuência.
Para melhor delimitar a aquisição dos dados,
foram utilizadas as seguintes questões norteadoras:
Conte para mim como você se sente estando internada
para ser submetida a uma cirurgia e O fato de se submeter a uma cirurgia feminina afeta a sua forma de
se ver como mulher? A cada entrevista procedeu-se à
transcrição da fita, ouvindo-a várias vezes, buscando
fidelidade à linguagem da mulher entrevistada, de
forma a garantir o registro fiel de seu pensamento
e expressão. A análise de suas falas foi realizada seguindo os passos preconizados, que definem como
proceder à análise compreensiva dos discursos.
Buscou-se, então, relacionar os dados obtidos com
o conteúdo literário consultado, traçando os pontos
centrais de forma a compreender os sentimentos
expressos pelas mulheres. Sendo assim, emergiram
então, deste exercício de organização das asserções
significativas, quatro categorias: Enfrentando o
medo; A fé como consolo/apoio; A busca de alívio/
melhora; O significado de ser mãe.
Resultados e discussão
É possível observar, portanto que, atualmente,
busca-se eliminar a dicotomia na produção do conhecimento científico. Para a utilização do ambiente
natural como fonte direta de dados e para uma boa
descrição dos achados, torna-se de grande valor a
utilização de uma metodologia qualitativa, de natureza fenomenológica e de análise compreensiva,
uma vez que o objeto deste estudo está fundado na
experiência de vida, valores pessoais e nas interações
dos sujeitos; e isto não é mensurável. Importante
é destacar que a essência dessa abordagem está na
valorização do significado que as pessoas atribuem
à vida e às coisas [5].
No desenvolvimento desta pesquisa qualitativa, ao enfocar o fenômeno sentimentos da mulher
frente a uma situação específica, buscou-se o atendimento das indagações originadas a partir da prática
profissional. Considerando o sentimento desta mulher como sendo um fenômeno existencial e social,
e tendo em vista o aprofundamento das reflexões,
buscou-se melhor compreendê-lo através do desvelar
de seu significado. Pois, são os significados que as
pessoas dão aos fenômenos vividos que importam
nesta modalidade de pesquisa qualitativa [5].
Para a fenomenologia, os fatos e os acontecimentos não existem de per si; fazem parte de
um contexto interno e externo impossível de ser
dicotomizado, separado, fragmentado, não tendo,
pois, existência própria. Através da observação, eles
são percebidos, engendrando questionamentos que
atinem a consciência. Os questionamentos pedem
respostas, uma vez que dúvidas e inquietações recusam passividade.
Além do mais, essa consciência tem um movimento de mão dupla: busca intencionalmente o
mundo e, ao mesmo tempo, volta-se para si mesma.
Ao buscar o mundo, ela emerge em meio às condições de vida biopsicossocioculturais e espirituais.
Voltando-se a si mesma, revela sua característica
pessoal, sua singularidade, suas intenções, seus
sonhos, seus desejos e suas vontades próprias e
exclusivas [6].
O hospital é visto comumente como ambiente
estranho e associado a experiências de mal-estar.
Desta forma, a hospitalização é um fator acarretador de sentimentos de insegurança e medo, passível
de desencadear reações emocionais em qualquer
ser humano, estando este envolvido ou não com
uma doença. De acordo com este raciocínio, o
estado emocional, principalmente do doente fica
vulnerável. Sem dúvida a situação de estar doente é
motivo de preocupação e angústia. A hospitalização
e a cirurgia representam uma experiência altamente
estressante e traumática como assim se evidencia “O
ato cirúrgico faz parte de uma situação que envolve
múltiplos agentes estressores, geradores de altos níveis
de tensão que se iniciam com a ida do paciente ao
hospital” [7]. As participantes do estudo expressaram
seus sentimentos e emoções em suas falas, gestos e
ações. Para manter o anonimato das mulheres, as
entrevistas foram numeradas e para maior compreensão da essência dos sentimentos cada categoria foi
analisada considerando o contexto existencial.
Enfrentando o medo: Quando as mulheres
não atribuem seu medo ao ato cirúrgico em si,
referem apreensão em relação à anestesia ou à sua
recuperação. Sendo assim: “Um paciente que apresenta dúvidas quanto à cirurgia e ao tipo de anestesia
a que será submetido, poderá apresentar um alto
nível de ansiedade, interferindo na sua recuperação
pós-operatória” [8].
Esta situação é comumente vivenciada na
Enfermaria de Ginecologia do HU - UFJF, como
evidenciado nestes depoimentos:
“...um pouquinho com medo, meio apreensiva, sabe, nervosa (risos nervosos), isso
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eu tô mesmo! Bem nervosa...” E 6 ; “Eu me
sinto muito mal, por causa da cirurgia que
vai ser feita, né.” E5 .
O medo não só é representado pelo desconhecido, mas também pela probabilidade de mutilação. O fato de uma pessoa estar enfrentando a
possibilidade da perda de um órgão ou membro
traz muitas complicações emocionais. Tal condição merece maior destaque, sobretudo, quando tal
membro ou órgão, representa simbolicamente parte
de sua feminilidade [9]. A idéia de ficar sem uma
parte importante do corpo, para a mulher precipita
frustrações e ansiedade, o que pode prejudicar até
mesmo sua recuperação. Torna-se assim, muito
relevante e imprescindível a Visita Pré-operatória
de Enfermagem, pois esta pode preparar a mulher
para a situação vivenciada, tornando-a mais forte e
apta à realização da cirurgia e suas conseqüências
emocionais, psicológicas e sociais. Este pode se tornar um momento oportuno para que esta expresse
seus sentimentos, dúvidas e inquietações as quais
poderão ser trabalhadas pelo enfermeiro. Neste
sentido, o profissional, além de implementar um
cuidar técnico, torna sua assistência mais completa
e humanizada.
A fé como consolo/apoio: Muitas pessoas precisam acreditar em algo sobrenatural para conseguir
auxílio e conviver com angústias, incertezas e com
a impotência. “A fé, o acreditar, o confiar e a esperança aparecem como um sentimento positivo, que
dá suporte ao medo e à angústia. Funcionam como
um mecanismo de defesa nos momento difíceis
vividos no contexto hospitalar, mais precisamente
nos momentos de tensão” [10].
Entende-se, então, que tanto a dor física como
a espiritual precisa de bálsamo, para que o ser humano suporte esta situação. Por isso, as pessoas sentem
que precisam amparar-se em alguém, segundo a
crença de cada um, esse alguém é quem pode mudar
a situação, buscando assim esse apoio em um Ser
Superior [10]. Neste contexto, é cabível pensar que
a fé e a crença são meios para se buscar o equilíbrio
às emoções nesses momentos, como também aliviar
os sentimentos de impotência, do sentimento de
nada poder fazer.
Se tal situação não está sob controle, o paciente busca este sentimento em um Ser Superior que
tudo pode. Pode-se dizer que, a fé e a esperança são
encontradas na busca de Deus, e a fé é sustentada
pela confiança deste ser que não abandona quem o
chama, sobretudo nos momentos difíceis, conforme
expressa esta mulher:
“...e eu tô muito confiante em Deus, e Deus
também vai estar lá comigo e então eu tô
tranqüila em relação a isso.” E2
A partir das experiências vivenciadas no cotidiano, pode-se perceber que as pessoas que possuem
uma crença religiosa enfrentam as situações mais difíceis apoiando-se em Deus e na fé, possuindo assim,
mais força para superar as dificuldades vivenciadas.
Encontramos na fé um porto seguro, enquanto se
espera pelo ato cirúrgico, pela cura definitiva e o
retorno à vida normal [10].
As falas das mulheres participantes deste estudo
apontaram que estas estavam com medo da cirurgia
proposta, mas confiavam na equipe cirúrgica que
ia operá-las e se entregavam às mãos de Deus. Demonstravam mesmo acreditar e ter segurança nessa
entrega, conforme expressa essa mulher:
“...Tô tranqüila graças a Deus.” E10
Embora a decisão de submeter-se à cirurgia
para estas mulheres seja conflituosa e coberta de
medo, elas enfrentam este momento amparando-se
em Deus e em sua fé, buscando o retorno ao mundo
familiar, a vida normal com seus parceiros e o seu
próprio bem-estar físico e espiritual.
A busca de alívio/melhora: Na fala das entrevistadas evidencia-se o relato de sua dor, medo,
ansiedade, preocupações e esperanças, mas apesar da
expressão de todos estes sentimentos, apóiam-se na
possibilidade de solução e/ou melhora do problema
que carregam. Objetivando a recuperação de sua
saúde, bravamente lutam para superar suas emoções, demonstrando em algumas vezes tendência a
minimizá-las.
Durante a entrevista, passaram a impressão de
estarem conformadas com a situação e relataram
ser a cirurgia a única solução para tudo o que têm
sofrido.
“Ah, eu tô me sentindo até bem né, porque
a única coisa que eu penso é em eliminar
esse problema e voltar a ter mais saúde,
né...eu quero fazer pra melhorar a minha
vida.” E4
“Ah... eu estou fazendo tudo, né, pra mim
sentir melhor e... que já que eu vim pra
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cá pra fazer essa cirurgia, eu quero mais é
fazer e imbora tranqüila.” E10 .
A mulher ao saber da possibilidade cirúrgica
como alternativa para superar os incômodos causados por sintomas de sua doença pode sentir a esperança da sobrevivência. Esta mesma autora ressalta
que “tal alívio está associado ao desaparecimento
das dores, sangramentos e incômodos, mas não aos
sentimentos das mulheres quanto ao significado da
perda” [11].
Percebe-se que em alguns casos a ansiedade
é tamanha, que os riscos da cirurgia, que muitas
vezes são motivos de medo/pavor, são esquecidos
em prol da cura ou da melhora de um quadro de
saúde incômodo, como ilustra esta fala:
“É... eu penso na melhora, né... na melhora
porque... é... a gente tá sentindo uma coisa,
né, então e depois... depois eu penso assim
né, eu quero que faz aquilo rápido pra mim
ficar livre, entendeu? Né...” E 7
Entretanto, ao se pensar na condição de estar
diante de seres humanos, muitos são os sentimentos
positivos e negativos. Dentre as mulheres entrevistadas, foram encontradas expressões de que a
doença ginecológica pode ser normalidade, vindo
a ser relatada como um fato tal, que já se tornou
comum nos dias de hoje, como ilustra a fala de uma
das participantes do estudo:
“porque é uma coisa que acontece, é quase
normal hoje pra mulher... então não existe
preocupação, o que existe talvez é a tranqüilidade, já foi! Pronto! Acabou!”E3
A literatura relata que as cirurgias são realizadas com vistas à melhoria das condições de saúde
relativas a problemas ginecológicos e que sendo o
“enfermeiro o profissional que tem maior interação
com a paciente, este pode esclarecer e minimizar seus
anseios mediante as concepções negativas advindas
do procedimento cirúrgico” [12].
Neste sentido, a busca por solução ou alívio
também é um dos escudos usados para que as
mulheres consigam vivenciar tal problemática e
se tornarem suficientemente fortes na procura do
retorno à normalidade de sua saúde. Assim, é pertinente acreditar que com orientações adequadas
e atendimento às necessidades psicológicas pode
haver melhor compreensão das mulheres quanto ao
seu corpo, a doença que as aflige, o procedimento
cirúrgico a ser realizado e também a sua condição
no cotidiano do pós-operatório.
O significado de ser mãe: Muitas mulheres
são criadas pela família com a idéia de que nasceram para ser mães e cuidar de suas casas e maridos.
Dependendo da cultura na qual se é formada, a
condição de ser impossibilitada no provimento da
maternidade origina em algumas delas a frustração
e o sentimento de incapacidade de se ver como uma
mulher completa. Tal condição pode até mesmo
refletir no relacionamento conjugal, no qual ela
sente medo de perder seu companheiro devido à
incapacidade de conceber um filho.
Sabe-se que historicamente a vida sexual da
mulher era voltada ao ciclo reprodutor tornando-se
mãe e dedicada a lactação. Isto pode ser percebido
através das políticas de assistência à saúde da mulher
no Brasil [13].
Percebe-se que quando o ato cirúrgico acontece
em um período da vida da mulher no qual ela já
se realizou como mãe, a situação é vivenciada mais
facilmente, tendo como única preocupação o seu
estado de saúde após o processo cirúrgico:
“...eu já me realizei, assim porque eu tenho
dois filhos maravilhosos, e eu acho que se
eu não tivesse filho, aí seria difícil encarar
essa cirurgia, mas como eu já sei como é
ser mãe, eu já fui mãe aí já me sinto uma
mulher completa...” E 2 ;
“...eu já tenho filhos né, não pretendo ter
filhos, pelo menos essa que eu vou fazer, eu
não pretendo ter filhos mais...” E 4
Tais mulheres têm como preocupações principais a sua saúde e a sua recuperação, deixando de
se preocupar com o lado maternal. Mas o contrário
também ocorre, quando a mulher, independente
da idade, já tendo filhos ou não, lamenta a impossibilidade de prover a vida. Demonstram-se muito
tristes e lamentam profundamente a impossibilidade
de tornarem-se mães. Também, o medo de perder
o companheiro por este motivo, implica em apreensão e medo do que pode acontecer com sua vida
depois do ato cirúrgico, como está representado
nesta fala:
“...a única coisa que tá me..., que eu fico
meia assim ... é porque eu não tenho filho,
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se eu tivesse filho aí eu ia me sentir normal
mas como eu não tenho, como eu falei, vai
acabar a esperança né...” E 11
A retirada total ou parcial de um órgão exclusivamente feminino implica em situações nas quais
as mulheres se encontram incapazes de se sentirem
completas por causa da função social que ela deixa de
desempenhar frente ao seu círculo de convivência.
Em contrapartida, as que não lamentam tal acontecimento, vêm-se aliviadas com a interrupção de
uma doença que poderia progredir e causar maiores
problemas em suas vidas.
Conclusão
Objetivando desvendar o conhecimento das
necessidades psico-emocionais e sociais, em busca
da compreensão dos sentimentos experienciados
pela clientela feminina no período que antecede à
cirurgia ginecológica, o estudo proposto veio propiciar o desenvolvimento de reflexões neste sentido.
Foi evidenciado que as carências destas mulheres
ultrapassam, em muito, os aspectos físicos. Os
relatos analisados e distribuídos nas unidades de
significado anteriormente detalhadas vêm corroborar tal evidência.
A compreensão dos sentimentos desta mulher
poderá propiciar aos enfermeiros, fonte de reflexões
sobre seu verdadeiro papel de cuidadores, na tentativa de contribuir para o crescimento da profissão,
resultando na melhoria da assistência como um
todo e, em especial à mulher, em suas necessidades
psicossociais.
A literatura sobre o paciente cirúrgico tem
mostrado o quanto o preparo é importante no préoperatório e o quanto será benéfico no pós-operatório. Considerando que o homem é um ser social, ele
vivencia e experiencia os fenômenos do mundo que
o cerca. Tomando como exemplo os sentimentos da
mulher, levando em consideração suas concepções e
experiências, sinaliza-se que, através da Visita Préoperatória de Enfermagem, poderá se oportunizar
momentos de escuta desta clientela, minimizando
suas dúvidas visando facilitar a sua recuperação no
processo cirúrgico. Pretende-se que os dados aqui
analisados possam ser úteis ao ensino, estimular à
realização de outras pesquisas e possibilitar o aprofundamento do conhecimento, principalmente
no que diz respeito à singularidade da mulher em
procedimento cirúrgico ginecológico.
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Artigo original
As concepções de enfermeiros de hospital
geral frente às questões relacionadas
ao álcool e ao alcoolismo
Daniela Maria Lucca, Divane de Vargas, D.Sc. **, Daiane de Vargas***
* Enfermeira da Unidade de Saúde Modelo das Faculdades Integradas Fafibe, Bebedouro-SP, Aluna do programa de
Especialização em Enfermagem Psiquiátrica da EERP-USP, ** Professor do Curso de Enfermagem das Faculdades Integradas
- Fafibe, ***Acadêmica do Curso de Enfermagem e Obstetrícia da Universidade Federal de Pelotas - UFPEL
Resumo
Estudo exploratório de abordagem quantitativa que buscou verificar as concepções de enfermeiros frente ao álcool, ao alcoolista
e ao alcoolismo. A amostra constituiu-se de dez enfermeiros de três hospitais gerais de Bebedouro - SP. Para a coleta de dados,
utilizou-se questionário contendo questões envolvendo o uso do álcool e o paciente alcoolista. Os resultados mostraram que
100% dos enfermeiros acreditam que o alcoolismo é uma doença, 50% expressam indiferença em trabalhar com alcoolistas
e 60% dos profissionais acreditam que esses indivíduos bebem para fugir dos problemas, sendo o uso moderado do álcool
menos prejudicial à saúde. No que se refere às características pessoais desses pacientes, os sujeitos vêem o alcoolista como
pessoa desobediente, solitária e que não gostam de ser como é. Porém, 12% acreditam que esses pacientes são felizes e estão
satisfeitos com sua vida. Os autores chamam a atenção para o fato da influência dos preconceitos sociais estabelecidos em
relação a tais pacientes nas concepções dos enfermeiros.
Palavras-chave: concepção, enfermeiro, alcoolismo.
Abstract
Conceptions of nurses at a general hospital on alcohol and alcoholism-related
questions
This quantitative and exploratory study aimed to verify how nurses conceive alcohol, alcoholics and alcoholism. The sample
consisted of ten nurses from three general hospitals in Bebedouro - SP, Brazil. Data were collected using a questionnaire with
questions related to alcohol use and alcoholic patients. Results showed that 100% of these nurses believe that alcoholism
is a disease, 50% express indifference towards working with alcoholics and 60% of these professionals believe that these
individuals drink to flee from their problems, while moderate alcohol use is seen as less harmful to health. As to the personal
characteristics of these patients, participants considered alcoholics as disobedient and solitary persons who do not like to be
as they are. However, 12% believed that these patients are happy and satisfied with their lives. The authors highlight the fact
that these nurses’ conceptions are influenced by socially established prejudices about these patients.
Key-words: conception, nurse, alcoholism.
Artigo recebido em 06 de abril de 2006; aceito em 18 de setembro de 2006.
Endereço para correspondência: Daniela Maria Lucca, Rua Vallim 1259, Jardim
Paraíso,14701-350 Bebedouro SP, E-mail:[email protected]
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Resumen
Las concepciones de enfermeros de hospital general ante las cuestiones
relacionadas al alcohol y al alcoholismo
Estudio exploratorio de abordaje cuantitativo con objeto de verificar las concepciones de enfermeros con relación al alcohol,
al alcohólico y al alcoholismo. La muestra se constituyó en diez enfermeros de tres hospitales generales de Bebedouro - SP,
Brasil. Para la recolecta de datos, se utilizó un cuestionario con cuestiones sobre el uso del alcohol y el paciente alcohólico. Los
resultados mostraron que el 100% de los enfermeros cree que el alcoholismo es una enfermedad, el 50% expresa indiferencia
en trabajar con alcohólicos y el 60% de los profesionales cree que estos individuos beben para huir de los problemas, siendo el
uso moderado del alcohol menos perjudicial a la salud. En cuanto a las características personales de esos pacientes, los sujetos
ven los alcohólicos como personas desobedientes, solitarias y a quienes no les gusta ser como son. Sin embargo, el 12% cree
que estos pacientes son felices y están satisfechos con su vida. Los autores destacan el hecho de la influencia de los prejuicios
sociales establecidos con relación a estos pacientes en las concepciones de esos enfermeros.
Palabras-clave: concepción, enfermero, alcoholismo.
Introdução
O termo alcoolismo foi empregado pela primeira vez em 1849 pelo médico sueco Magnus
Huss, para designar os sinais e sintomas físicos, químicos e psíquicos, surgidos pela excessiva ingestão
de bebidas alcoólicas, passando o alcoolismo a ser
inequivocamente considerado doença [1].
Apesar de sua ampla aceitação, o consumo de
álcool, quando excessivo, torna-se problema importante e acarreta altos custos para a sociedade. Os
problemas causados pelo álcool não se restringem
àqueles que geralmente são divulgados. Suas conseqüências fazem parte de um relevante problema de
saúde pública, envolvendo aspectos médicos, sociais,
familiares, psicológicos e legais [2].
Sabe-se que o consumo de bebidas alcoólicas
no Brasil é bastante elevado. Isso representa alto
índice de prejuízos sociais como, por exemplo, o
elevado número de acidentes de trânsito, invalidez
para o serviço e distúrbios sociais. Além disso, os
prejuízos pessoais no que se refere à saúde do alcoolista, que, nos casos mais avançados, ou mesmo
nos casos precoces, como nos casos de acidente de
trânsito, levam esses indivíduos ao hospital.
Pacientes que fazem uso abusivo do álcool são
internados freqüentemente em hospitais gerais,
até que sejam diagnosticados e encaminhados para
atendimento especializado. Essas internações muitas vezes são decorrentes das várias complicações
orgânicas ocasionadas pelo uso abusivo do álcool
[1,3-6].
Sendo assim, pode-se pressupor que a cada
dia aumenta a demanda de pacientes alcoolistas
internados em hospitais gerais. Pois, de acordo
com levantamentos [3,7,8], alcoolistas, hoje, ocupam número significativo de leitos nas enfermarias
de clínica médica e cirúrgica, para tratamento de
doenças físicas. Sendo assim, os profissionais de
saúde, não especializados no abuso de substâncias,
cuidam com bastante freqüência de pacientes que
abusam do álcool.
Quando se fala em paciente alcoolista, não é
difícil verificar os preconceitos da sociedade com relação a ele. São tachados de negligentes, vagabundos
e irresponsáveis. É possível que esses preconceitos
reproduzam-se também nas unidades de internação
de hospitais gerais [9].
Campos [10], em seu estudo, constatou, através dos relatos de trabalhadores de uma emergência
psiquiátrica, que a maneira de se compreender o
dependente químico, principalmente o alcoolista,
mostrou-se, na maioria das falas dos sujeitos de seus
estudos, como sendo um ser fraco, um vagabundo
um empecilho e não um doente.
Talvez isso se explique, segundo esse mesmo
autor, pelos pré-julgamentos que têm raízes profundas na sociedade e que acabam por se repetir
na assistência, a despeito dos conceitos científicos
que explicam a dependência química como doença.
Sentimentos de raiva e de revolta aparecem freqüentemente nos profissionais frente à alcoolistas, pois,
esse não é visto, sempre, como um doente, e socialmente é rotulado como um indivíduo sem força de
vontade e improdutivo para a sociedade
No Pronto-Socorro Geral (PSG), o alcoolista
não é tido, como um indivíduo a ser tratado, mas
como estorvo ao serviço, alguém que ocupa o lugar
de outro e que poderia ser mais bem aproveitado;
são vistos, ainda, como indivíduos que adentram o
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PSG para atrapalhar a dinâmica de funcionamento
do serviço [10,11].
Além disso, muitas vezes, os profissionais apresentam dificuldades em conversar abertamente com
pacientes sobre o uso do álcool. É provável que isso
mostre preconceito dos técnicos com os assuntos
álcool e alcoolismo, sentindo-os como imorais e
vergonhosos [1].
Estudos [6,9,12] mostraram que a assistência
de enfermagem, no hospital geral, à alcoolistas deixa
a desejar, sendo permeada por uma série de tabus e
preconceitos em relação a eles. Esses preconceitos são
estabelecidos socialmente e podem ser reproduzidos
na interação com paciente alcoolista internado no
hospital geral. Esse fato é preocupante principalmente quando se verifica que, dentre os profissionais
de saúde, os enfermeiros são os que mantêm contato
maior com os usuários de álcool e têm grande potencial para reconhecer os problemas relacionados
a essa questão e desenvolver ações assistenciais. No
entanto, o tipo de abordagem que o profissional
exercerá frente a essa questão, pode comprometer
as suas ações [13].
Supõe-se que a dificuldade de relacionamento
do profissional com o paciente esteja no fato de a
visão desses trabalhadores não estar centrada no
alcoolismo como doença, mas na crença da falta
de capacidade do controle do consumo da substância, ou seja, na fraqueza do indivíduo, o que
pode repercutir nas concepções dos profissionais.
Algo preocupante quando se sabe que a atitude não
julgadora passa a ser um requisito fundamental na
assistência prestada a pessoas usuárias de drogas em
especial do álcool.
Segundo Alencastre e Spricigo [13], para se
trabalhar com alcoolistas, é muito importante o
autoconhecimento do enfermeiro, buscando identificar suas próprias crenças, valores e preconceitos
em relação ao uso de drogas e aos seus usuários, isso
adquire destacada relevância, pois os preconceitos
podem estar pouco evidentes, passando despercebidos pelo profissional, mas que se manifestam através
do comportamento ou abordagens inadequadas
no momento do cuidado ou orientação ao usuário
de drogas e seus acompanhantes. Portanto, para
prestar assistência a usuários de drogas não basta o
conhecimento das várias teorias e abordagens sobre
a questão, é necessário também se conhecer.
Considerando a dimensão da problemática do
álcool e alcoolismo na atualidade, e considerando
que segundo a literatura existe significativa parcela
de indivíduos com problemas relacionados ao álcool
em hospitais gerais, o que os coloca constantemente
em contato com o profissional enfermeiro, este estudo buscou verificar as concepções de enfermeiros
trabalhadores de três hospitais gerais no que se refere
ao álcool, ao alcoolismo e ao alcoolista. Haja vista
que a literatura aponta situações que revelam dificuldades desses profissionais em aceitar e trabalhar
com tais pacientes.
Objetivo
Verificar as concepções de enfermeiros de
hospital geral a respeito do álcool, alcoolismo e do
alcoolista.
Material e método
Trata-se de estudo exploratório de caráter
quantitativo que objetivou verificar a concepção de
enfermeiros de três hospitais gerais de um município da região norte de São Paulo sobre o álcool, o
alcoolismo e o paciente alcoolista. Os dados foram
coletados junto a uma população de 23 enfermeiros
de três hospitais gerais, do município de BebedouroSP. No que se refere às instituições, uma delas era
pública e as outras duas privadas. Cabe ressaltar
que a coleta de dados foi realizada pelas autoras
da pesquisa, as quais entraram em contato com
os enfermeiros no final de cada turno de trabalho,
convidado-os a participar do estudo, sendo esclarecida a finalidade do trabalho, a voluntariedade e
a possibilidade de desistir de participar a qualquer
momento. Além disso, solicitou-se que os sujeitos
devolvessem o instrumento respondido dentro do
prazo de 24 horas.
Conforme determina a Resolução nº 196/96,
os aspectos éticos observados foram a aprovação
do projeto deste estudo pelo Comitê de Ética das
Faculdades Integradas Fafibe, e assinatura do termo
de consentimento livre e esclarecido pelos sujeitos
que se dispuseram a participar da pesquisa.
Para a coleta dos dados elaborou-se um questionário dividido em duas partes, a primeira referente aos dados sociodemográficos da população e,
a segunda, contendo questões específicas sobre as
concepções sobre as bebidas alcoólicas, o alcoolismo
e o paciente alcoolista.
Dos 23 instrumentos entregues treze (43,5%)
não foram devolvidos. Os motivos alegados pelos
sujeitos para a não devolução dos mesmos foram:
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falta de tempo, perda do instrumento e esquecimento.
Os questionários foram analisados individualmente, e, a partir das respostas dadas pelos sujeitos,
realizou-se a análise das mesmas, computando-se as
freqüências das respostas em dados percentuais.
Resultados e discussão
Características sociodemográficas da população
Participaram do estudo dez enfermeiros procedentes de três instituições hospitalares de Bebedouro, município do interior paulista. Do total de
sujeitos, 60% eram oriundos da instituição pública,
enquanto os demais (40%) provinham de instituições privadas, todos os participantes eram do sexo
feminino, com idade média de 25 anos (70%), o
tempo de formação desses enfermeiros (45%) foi em
média 2,5 anos, 40% dos sujeitos trabalhavam no
turno da manhã. Com relação à pós-graduação, 50%
dos enfermeiros eram licenciados e 30% possuíam
especialização em alguma área do conhecimento
da enfermagem, nenhum sujeito revelou possuir
especialização stricto sensu.
O consumo pessoal e as concepções sobre o
beber
No que se refere ao consumo pessoal de álcool, os dados revelaram que 70% dos profissionais
informaram não consumir álcool. O fato de não
consumirem bebidas alcoólicas pode levar esses profissionais a compararem sua opção com o padrão de
beber do paciente, o que poderia resultar em atitudes
negativas frente ao indivíduo que consome álcool
de forma descontrolada, pois, conforme Vargas [6],
existe tendência de os profissionais usarem seus próprios hábitos de beber como referência para julgar
o uso do álcool. A relação profissional-paciente que
bebe pressupõe um encontro de saberes e de culturas
que, embora possuam aspectos comuns, mantêm
suas peculiaridades, cabendo ao enfermeiro ter
consciência disso nas intervenções [14].
Além disso, parece existir dificuldade por
parte desses profissionais em revelarem seu próprio
consumo de álcool, pois, na questão referente ao
consumo pessoal, 60% dos entrevistados preferiram
não responder à questão; enquanto 40% revelaram
fazer uso social de bebidas alcoólicas. Dados semelhantes foram encontrados em estudos semelhantes
[6,15], em que os enfermeiros apresentaram atitudes
neutras no que se refere ao consumo pessoal do
álcool.
Uma outra razão para o fato de os enfermeiros
não responderem sobre seu hábito de beber, pode
estar no fato de que veriam no álcool um comportamento errado. Dessa forma, se fizessem uso, não
seriam vistos com “bons olhos”, uma vez que são
profissionais de saúde.
Ainda, de acordo com esses enfermeiros, (60%)
acreditam que o álcool usado com moderação é
menos prejudicial à saúde, seguidos de 40% de
profissionais que acreditam que o álcool, mesmo
usado nessa condição, pode prejudicar a saúde do
indivíduo. Os dados revelaram ainda que, apesar
de a maioria dos sujeitos acreditar que beber com
moderação não é prejudicial à saúde, os enfermeiros
foram unânimes (100%) em concordar com o fato
de que pessoas saudáveis podem se tornar alcoolistas, reconhecendo assim o álcool como perigoso
e nocivo à saúde, uma vez que é capaz de causar
dependência.
A presença do alcoolista no hospital geral e o
contato com o enfermeiro
Com relação à presença de pacientes com
problemas relacionados ao álcool no hospital geral
e o contato desses enfermeiros com o alcoolista no
trabalho, todos (100%) os participantes revelam
alguma experiência no atendimento a esses pacientes, sendo que esse contato é esporádico para 90%
dos enfermeiros do estudo e freqüente na opinião
de 10% dos entrevistados. Chama a atenção, no
entanto, o baixo percentual (10%) dos enfermeiros
que revelam contato freqüente com esse tipo de
paciente, principalmente quando a literatura aponta
que existe um percentual de 10 a 30% de alcoolistas internados em unidades clínicas e cirúrgicas de
hospitais gerais [3,4,7].
Talvez esse fato ocorra devido à falta de preparo do enfermeiro para reconhecer a doença do
alcoolismo e sua relação com as patologias clínicas,
e, uma vez que não reconheçam o alcoolismo como
associado a patologias clínicas, é compreensível
que esses profissionais revelem pouco contato com
alcoolistas em seu cotidiano de trabalho.
A esse respeito, Almeida e Coutinho [16] comentam que o profissional não dispõe de preparo
técnico suficiente para lidar com toda a complexidade de fatores envolvidos com o uso abusivo do
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álcool como, por exemplo, sinais e sintomas comuns
no dia-a-dia: edema de membros inferiores, astenia,
náuseas e dores abdominais. Quanto à correlação
clínica entre a sintomatologia e o álcool, quase não
se trabalha esses casos em hospitais gerais, por isso a
demanda de reincidência de internação nesses hospitais torna-se alta, pois não se percebe a presença
do alcoolismo, o que torna possível que a sintomatologia clínica seja alvo exclusivo de atenção.
Aliado a isso, os profissionais de saúde não
recebem informações suficientes ou treinamentos
adequados sobre a dependência do álcool em geral.
Fato que pode contribuir para a permanência do
preconceito social pré-instalado em lidar com pacientes alcoolistas, dificultando o reconhecimento
desse paciente quando o mesmo está internado.
Para melhorar essa situação sugere-se que a anamnese deva ser baseada na sintomatologia geral e não
somente na clínica [17].
No entanto, quando se considera o preparo
oferecido ao enfermeiro nas temáticas álcool e drogas, durante a formação, é compreensível não ser
tarefa fácil para um enfermeiro generalista reconhecer pacientes alcoolistas, pois a literatura aponta que
pouca atenção tem sido dada à temática na graduação dos profissionais de saúde, de um modo geral
[1,6,15,7,18]. Frente a isso, faz-se necessário atentar
para esta situação, pois, a qualidade da assistência
pode garantir a qualidade da recuperação do paciente, todavia, para alcançar esse objetivo, o enfermeiro,
mesmo generalista, deve incluir o paciente alcoolista
em sua concepção de doente como qualquer outro
que precisa de cuidados diferenciados, não somente
físicos, mas também psicológicos.
Nas questões que avaliaram os sentimentos dos
profissionais ao trabalharem com pacientes alcoolistas, 50% revelaram sentimentos de indiferença,
achado que corrobora com resultados de outros
estudos dessa natureza [6,15,19]. Ainda, no que
concerne ao sentimento de satisfação em trabalhar
com alcoolistas, 50% informaram satisfação em
trabalhar com o mesmo seguindo-se de um percentual de 40% que revelaram não se sentir à vontade
ao trabalhar com esses pacientes, resultado que vai
ao encontro daqueles encontrados por Vargas [19].
Para esse autor, um fator que pode influenciar a
insatisfação desse profissional em trabalhar com
pacientes alcoolistas talvez resida no fato de que esses
pacientes possuem características que, geralmente,
irritam e afastam o profissional, pois, são comuns
nesses pacientes os mecanismos de defesa como a
negação, racionalização e a projeção. Tais mecanismos podem não ser identificados pelo profissional
como característicos dessa doença, sendo que pode
resultar em distanciamento entre o enfermeiro e
o paciente, por serem os alcoolistas considerados
pacientes de difícil manejo.
Com relação ao espaço de atendimento do
alcoolista, 70% desses enfermeiros acreditam que
o paciente deve ser tratado no hospital geral como
qualquer outro paciente, porém encontra-se um
percentual de profissionais (30%) que acreditam que
o hospital não constitui espaço para o atendimento
destes pacientes.
O fato de a maioria dos profissionais conceber o hospital como espaço de atendimento desse
paciente, como qualquer outro, demonstra uma
concepção positiva. Reconhecido o alcoolismo
enquanto doença que deve ser tratada no hospital,
é possível que diminuam as concepções morais
que podem ter sobre esse paciente. Cabe ressaltar,
no entanto, que quando comparados com outros
estudos dessa mesma natureza [6,19], percebe-se
que existe percentual maior de enfermeiros que se
mostram negativistas em relação ao atendimento
do alcoolista no hospital geral do que naqueles estudos. Talvez essa concepção esteja relacionada aos
estereótipos estabelecidos socialmente em relação à
pessoa do alcoolista. Estudo realizado com pessoal de
enfermagem de um hospital geral no sul do país [9]
encontrou que, para esses profissionais, na maioria
das vezes, o paciente alcoolista não é visto como um
doente igual aos demais. A visão que se tem desse
indivíduo é a de um indivíduo aproveitador e sem
caráter, que, quando chega à emergência alcoolizado,
tem consciência dos seus atos, sendo assim, não merece ser atendido naquele espaço, além disso, pode
ser visto, como já comentado anteriormente, como
alguém que tira o espaço de um outro paciente que
“ realmente necessita do cuidado” [11] .
Segundo Allen [20], muitos enfermeiros refletem a visão dominante da sociedade, para a qual
existe a aceitação do beber social, mas rejeita-se a
pessoa que usa o álcool excessivamente. Além disso, a sociedade se reserva o direito de punir certos
comportamentos das pessoas como errados, como
parte de um castigo. E o enfermeiro, nesse contexto,
tem seu próprio papel social.
A análise dos dados relacionados às concepções
dos enfermeiros frente ao local de tratamento para o
alcoolista permitiu verificar que, para esses sujeitos,
esse paciente deve ser atendido no hospital geral
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como qualquer outro, embora tenha chamado atenção o fato de uma parcela de sujeitos ser contrária a
essa concepção. Referente ao contato com essa clientela, embora todos os sujeitos tenham informado
que mantêm contato com os mesmos, classificam-no
como pouco freqüente essa questão que, talvez se
justifique pelo fato de esses profissionais apresentarem dificuldade em associar os problemas clínicos
com os quais trabalham freqüentemente ao alcoolismo, revelando pouco preparo desses sujeitos para
atuarem frente a essa situação. Sendo assim, verificase a necessidade de ações que visem preparar esses
sujeitos para prestar assistência ao paciente de forma
integral, em que não sejam somente valorizadas as
queixas clínicas, mas que levem em consideração
também seus fatores agravantes ou predisponentes,
nesse caso o alcoolismo.
A concepção frente à etiologia do alcoolismo e a
pessoa do alcoolista
No que se refere ao conceito que têm do alcoolismo, os enfermeiros desse estudo (100%) concebem o alcoolismo enquanto doença, como causas
para o adoecimento, 60% dos sujeitos acreditam que
o alcoolista bebe para fugir dos problemas, seguidos
de 30% de profissionais que atribuem o alcoolismo
à doença psiquiátrica.
O fato de acreditarem que o alcoolista bebe
para fugir dos problemas leva a inferir que esse
indivíduo é visto pelos profissionais como indivíduo fraco, uma vez que necessita buscar no álcool
a solução para seus problemas, sendo incapaz de
enfrentá-los sem o uso da substância. Além disso, o
fato de 30% dos sujeitos considerarem o alcoolista
como um paciente psiquiátrico parece revelar falta
de conhecimento sobre a doença, pois, nem sempre
existe a co-morbidade alcoolismo e doença mental,
embora esta possa existir [21].
No que se refere às características pessoais
atribuídas ao alcoolista por esses enfermeiros, 29%
acreditam que um paciente alcoolista é desobediente, segue-se de 25% de sujeitos que acreditam que
o alcoolista não gosta de ser como é, e o percentual
de 34% que concebem-no como pessoa solitária que
duvida de sua própria capacidade.
Ainda, relacionado às características atribuídas
aos alcoolistas, os dados revelaram que 12% dos
entrevistados acreditam que o alcoolista se sente feliz
com sua situação e gosta de ser como é. Apesar do
baixo percentual de sujeitos com tais concepções,
esse dado merece comentário, pois parece revelar o
estereótipo estabelecido socialmente, reforçando a
idéia de que o alcoolista é um doente proposital à
medida que bebe porque quer. A esse respeito Vargas
[22] comenta que, apesar de existirem mudanças nas
atitudes dos enfermeiros frente ao paciente alcoolista
nas últimas décadas, ainda é possível encontrar significativa parcela de enfermeiros que permanecem
com atitudes negativas e concepções atreladas ao
modelo moral da doença.
Cabe ressaltar, o fato de que, apesar de os
profissionais serem unânimes ao reconhecerem o
alcoolismo como doença, acreditando que os alcoolistas merecem atendimento como qualquer outro
paciente, apresentando concepções favoráveis para a
prestação da assistência aos mesmos, somente 10%
dessa população apontou acreditar que o alcoolista
quer parar de beber, fato preocupante, pois pode
revelar dificuldades desses sujeitos em reconhecer
realmente o alcoolismo como uma doença que
independe da vontade, caracterizada pela perda do
controle sobre o beber.
A análise dos dados referentes à concepção
desses sujeitos sobre a etiologia do alcoolismo, bem
como sobre a pessoa do alcoolista mostrou que,
para esses enfermeiros, o álcool é utilizado como
fuga de problemas, o que levaria ao alcoolismo. Tal
concepção pode levar os profissionais a conceberem
o alcoolista como um indivíduo de caráter fraco,
incapaz de resolver seus problemas sem o álcool,
atribuindo assim a compulsão pelo álcool à própria
vontade do paciente.
Relacionado às características pessoais do alcoolista, esses enfermeiros concebem-no como um
solitário, que não gosta de ser como é, no entanto,
a característica mais marcante desse paciente, na
concepção dos sujeitos, foi à desobediência. Esse
resultado parece revelar pouca familiaridade com
os sintomas da doença do alcoolismo, dentre eles,
a negação da doença. Uma vez que esse mecanismo
é bastante presente quando se fala da assistência a
esses pacientes, o mesmo pode ser caracterizado pelo
profissional, muitas vezes, por falta de conhecimento
e dificuldade de manejo, como desobediência as
orientações do profissional. Frente a esse achado,
surge novamente a necessidade de maior atenção no
preparo para atuar com esses pacientes, pois conforme
já mencionado neste estudo, alcoolistas fazem parte
cada vez mais do cotidiano de trabalho de enfermeiros
de hospital geral, o que exige que esse profissional
esteja preparado para prestar assistência humanizada
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a esse paciente, o que pressupõe reconhecer e manejar
os sintomas específicos dessa patologia.
Conclusões
Realizou-se um estudo com dez enfermeiros
de três instituições hospitalares de um município
do interior paulista com o objetivo de verificar as
concepções desses profissionais frente ao álcool, ao
alcoolista e ao alcoolismo.
A análise dos dados revelou que parece existir dificuldade desses enfermeiros em revelar seu
próprio uso de bebidas alcoólicas, fato que pode
ser comprovado quando se verifica que 60% dos
entrevistados não responderam a questão referente
a esse aspecto, além disso, o fato de mais de 40%
dos sujeitos não ter respondido o questionário, caracterizando baixa adesão ao estudo, o que parece
demonstrar certa dificuldade dos profissionais em
falarem sobre a temática álcool e alcoolismo.
Através deste estudo verificou-se ainda que na
concepção desses enfermeiros, o beber moderado
não é prejudicial à saúde. No entanto, o álcool é
concebido como nocivo e perigoso, pois, de acordo com a maioria dos sujeitos, pessoas saudáveis
podem se tornar alcoolistas, o que de certa forma
leva a inferir que demonstram aceitação do beber
moderado e do conceito de alcoolismo enquanto
doença, embora pareça existir rejeição à pessoa que
bebe descontroladamente.
Os dados revelaram ainda que somente 10%
dos enfermeiros informaram manter contato freqüente com o alcoolista, o que leva a pressupor que
existe pouco preparo desses enfermeiros no reconhecimento da patologia, uma vez que a literatura
aponta taxas elevadas de alcoolistas ocupando leitos
de hospitais gerais.
No que se refere ao atendimento do paciente
alcoolista no hospital geral, os enfermeiros mostraram-se favoráveis, pois, os alcoolistas, na concepção
dos mesmos, são pacientes como qualquer outro e
como tais devem ser tratados. Porém, no que diz
respeito à satisfação em trabalhar com os mesmos,
os profissionais revelaram indiferença. Quanto à
etiologia para o alcoolismo, a maioria dos enfermeiros concebe que o alcoolista bebe para fugir dos
problemas e são concebidos pelos mesmos como
pessoas solitárias, desobedientes e que não gostam
de ser como são.
Os dados desse estudo permitem dizer que
esses enfermeiros revelam concepções de senso
comum sobre o álcool e alcoolista, talvez, por isso,
demonstrem indiferença no que se refere ao contato
com esse paciente, o que, de certa forma, reafirma
estereótipos e condenações sociais frente a esses
indivíduos, os quais podem ser reproduzidos pelo
profissional quando em contato com o mesmo,
revelando ainda pouco preparo acadêmico para
atuar frente às questões que envolvem o álcool e o
alcoolismo.
Sendo assim, é necessário que todo profissional que trabalha com esse paciente esporádica, ou
freqüentemente, busque identificar suas crenças,
valores e preconceitos em relação aos usuários de
álcool, pois, sem dúvida, esses irão influenciar as
concepções dos enfermeiros ao se deparar com o
indivíduo alcoolista. Concorda-se, aqui, com Luis
e Pillon [21] quando afirmam que o enfermeiro,
que pretende atuar na área de álcool e drogas, deve
adquirir conhecimentos específicos sobre as drogas
e refletir sobre essa informação identificando suas
próprias crenças, valores e preconceitos em relação
aos usuários, os quais podem passar desapercebidos
pelo enfermeiro e se manifestar através do comportamento ou abordagens inadequadas no cuidado ou
orientação ao paciente, o que repercutirá certamente
na qualidade da assistência.
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Artigo original
A seleção das informações para o
planejamento da alta hospitalar do paciente
Marcela Ganzella*, Márcia M. Fontão Zago, D.Sc.**
*Aluna do Curso de Graduação em Enfermagem da EERP-USP, Bolsista PIBIC/USP-CNPq – 2005-2006,** Enfermeira,
Associada da EERP-USP
Resumo
O estudo teve o objetivo de identificar as bases da seleção e os conteúdos tanto das informações quanto do planejamento da
alta hospitalar do paciente, apresentadas na literatura nacional e internacional, indexadas em bases de dados bibliográficos,
no período de 2000 a 2005. De um total de 54 publicações, dez compuseram a amostra. Elas foram localizadas na íntegra e
os dados foram coletados por um instrumento específico. 90% das publicações analisadas são americanas e européias e seus
autores são enfermeiros. Pelos resultados identificamos que as bases da seleção de informações e seus conteúdos são formadas
pelo levantamento das complicações comuns após a alta, considerando-se a doença, o tratamento realizado e as condições
do paciente na alta; e o levantamento das necessidades de informações expostas pelos pacientes, cuidadores e enfermeiros.
Discutimos as finalidades do processo, a importância das informações e os meios através dos quais são oferecidas.
Palavras-chave: alta do paciente, planejamento, informação, assistência de enfermagem.
Abstract
The information selection for the planning of the patient discharge
The aim of this study was to identify the bases for the information selection and the contents for the planning of the patient
discharge from the hospital, presented in the national and international literature, indexed in bibliographical databases, in
the period from 2000 to 2005. Of a population of 54 publications, ten composed the sample. These were located in the
totality and the data were collected by a specific instrument. 90% of the analyzed publications are American or European,
and the authors are nurses. By the results we concluded that the bases for information selection and for its contents are: the
common complications after the discharge, considering the disease, the treatment and patient’s conditions; and the needs
for information exposed by the patients and caretakers. We discuss the process purposes, the importance of information and
the means of offering it.
Key-words: patient discharge, planning, information, nursing care.
Artigo recebido em 20 de setembro de 2006; aceito em 29 de setembro de 2006.
Endereço para correspondência: Márcia M. Fontão Zago, Av. Bandeirantes, 3900, Campus
da USP, 14040-902 Ribeirão Preto SP. E-mail: [email protected].
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Resumen
La selección de la información para el alta del paciente
El estudio tuvo por objetivo la indentificón de las bases de la selección de información y de sus contenidos para el planeamiento
del alta hospitalar, presentadas en la literatura nacional e internacional, indexadas en bases de datos bibliográficos, en el período
de 2000 a 2005. La muestra fue compuesta de diez publicaciones, de una población total de 54, que fueron localizadas em su
totalidad, y los datos fueron colectados por un instrumento específico. El 90% de las publicaciones analizadas son americanas o
europeas, y sus autores son enfermeros. En vista de los resultados, concluímos que las bases de la selección y de sus contenidos
son las encuestas de las complicaciones comunes después del alta, considerándose la enfermedad, el tratamiento efectuado
y las condiciones del paciente en el momento del alta, así como las necessidades de información expresas por los pacientes y
los cuidadores. Discutimos las finalidades del proceso, la importância de las informaciones y los medios de las ofrecer.
Palabras-clave: alta del paciente, planificación, información, atención de enfermería.
Introdução
Objetivo
A alta hospitalar (AH) é a transferência do cuidado ao paciente do hospital para outros contextos
de saúde. Sua finalidade é prover uma transferência
segura, evitando dificuldades para o paciente, seus
cuidadores e familiares, re-internações e, conseqüentemente, contenção dos custos para o sistema
de saúde [1-2].
No hospital, o médico é o responsável legal pela
alta do paciente, mas o enfermeiro é considerado
o coordenador do seu planejamento, por atuar de
forma integral com o paciente, enquanto os demais
membros da equipe de saúde oferecem intervenções
episódicas [2].
O planejamento de alta (PA), de natureza
multidisciplinar, tem a finalidade de preparar o paciente e a família para a continuidade do cuidado.
Ele envolve vários processos integrados, como o da
comunicação efetiva entre os profissionais de saúde,
e dos profissionais com os pacientes e cuidadores.
Porém, comunicar com eficácia implica em reconhecer qual é a mensagem a ser oferecida, e qual a
melhor forma de fornecê-la.
Entendemos que a hospitalização e o tratamento de uma doença são situações de crise para os
pacientes/cuidadores, e que a AH, embora almejada,
pode ser também um momento de ansiedade e
medo. Nesse aspecto, questionamos: quais as bases
da seleção e de conteúdos de informações que devem
ser oferecidos no PA? Para responder a essa questão,
desenvolvemos este estudo.
Identificar as bases da seleção das informações
e os conteúdos necessários para fundamentar o PA
do paciente, apresentadas na literatura nacional e
internacional, indexadas em bases de dados bibliográficos, no período de 2000 a 2005.
Materiais e métodos
Para alcançarmos o objetivo proposto, realizamos uma revisão integrativa da literatura [3], por
facilitar a análise crítica do objeto de estudo sob a
ótica de resultados de pesquisas anteriores e de considerações de especialistas, ou seja, considerar o atual
estado da arte sobre o tema. Através dos resultados
obtidos, será possível refletir sobre a prática clínica,
visando à qualidade do PA para o paciente [4].
Realizamos um levantamento bibliográfico nas
bases de dados LILACS, BIREME, MEDLINE, CINAHL e Google Scholar, pelo acesso eletrônico no
SIBi (Sistema Integrado de Bibliotecas). Para a seleção das publicações utilizamos os descritores patient
discharge e alta do paciente. A seguir, identificamos
as publicações em inglês, espanhol e português, no
período de 2000 a 2005.
Para a coleta de dados usamos um instrumento
focalizando: a identificação dos autores (número,
nome e categoria profissional); a caracterização da
publicação (título, ano, volume, número, páginas,
país de origem e idioma); o objetivo da publicação;
o grupo focalizado; a amostra; a abordagem metodológica; os resultados e conclusões.
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Após localizar os artigos na íntegra, descartamos os que não focalizavam o adulto ou idoso;
cada artigo foi submetido à leitura várias vezes,
preenchemos o instrumento e sintetizamos os dados
obtidos.
Resultados e discussão
No período abrangido foram identificadas 54
publicações na íntegra, sendo que 10 focalizavam
o objeto deste estudo. As publicações e suas características são apresentadas na tabela I.
Nove publicações são apresentadas na língua
inglesa e uma na portuguesa. Cinco apresentam dois
autores e três, mais de dois. Todas as publicações foram elaboradas por enfermeiros, denotando a preocupação desse grupo profissional com o processo.
Em relação ao país de origem dos autores:
quatro são provenientes dos Estados Unidos, quatro
da Inglaterra, um da Finlândia, e um do Brasil. Esse
resultado mostra que alguns países têm uma política
pública clara sobre o PA, enquanto que em nosso
país, ele ainda é pouco ressaltado, embora as diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS) destaquem
a importância da resolubilidade dos problemas de
saúde pela integração entre a rede de serviços de
diferentes níveis de complexidade, como condição
para que os mecanismos de referência e contra-referência se tornem efetivos [5].
Quanto ao período de publicação, não houve
um período preponderante; nos anos de 2003 e
2004 foram publicados três artigos em cada; nos
outros, de um a dois.
Três das publicações referem-se a estudos que
focalizaram pacientes cirúrgicos, duas focalizaram
idosos, cinco são revisões da literatura, com diversas
abordagens; duas integraram pacientes e profissionais.
Pela análise das publicações, encontramos que
há duas bases ou fontes para a seleção de informações a serem supridas no PA: o levantamento dos
problemas do paciente após a alta e a aquisição de
habilidades necessárias para o paciente e cuidador,
para a continuidade do cuidado.
Três estudos identificaram os problemas dos
pacientes e cuidadores após a alta. O primeiro [6],
um estudo descritivo, os autores identificaram que
os problemas apresentados por 25 pacientes adultos submetidos à cirurgia de re-vascularização do
miocárdio, no primeiro mês após a alta, em ordem
decrescente de prioridade, foram: cuidado com a fe-
rida cirúrgica; terapêutica medicamentosa; alteração
do apetite; alteração de sensibilidade, motricidade,
acuidade visual e força muscular; queixas cardiovasculares; alteração no padrão do sono; alteração do
humor. Duas revisões da literatura [7-8] apresentam
os problemas comuns dos pacientes após a alta de
cirurgias ambulatoriais relacionados a: dor, ferida
cirúrgica, náusea e vômitos, insônia, retenção urinária, constipação intestinal, dificuldade em exercer
atividades físicas, febre e cefaléia.
Os resultados e considerações dos autores das
publicações nos levam a considerar que o conhecimento sobre as complicações da doença e seu
tratamento, após a alta, pelos profissionais de saúde,
delimitam uma das bases da seleção das informações
a serem supridas no PA.
A segunda fonte refere às necessidades de desenvolvimento de habilidades expostas pelo paciente
e/ou cuidador.
No estudo de Johansson, Hupli e Salanträ [9],
levantamento realizado com uma amostra de 144
pacientes cirúrgicos ortopédicos que receberam alta
em um período de uma semana, identificou que as
informações prioritárias, apontadas pelos sujeitos,
referiram-se às complicações, sintomas e medicação.
Também consideraram que as variáveis sociais dos
pacientes interferem nas suas necessidades de informação, pois, as pacientes idosas, com menor nível
de educação, aposentadas ou divorciadas são as que
solicitam maior quantidade de informações.
Anthony e Hudson-Barr [10] realizaram um
estudo descritivo, por delineamento longitudinal
com 44 pacientes cirúrgicos e 37 enfermeiros, e
descreveram que as informações prioritárias para
os pacientes de cirurgias abdominais eletivas são:
adequação da dieta e das atividades físicas, manejo
da ferida cirúrgica e da dor, a doença de base e as
complicações prováveis. Os autores chamam a atenção de que, pelos seus achados, não há congruência
entre as informações consideradas prioritárias entre
pacientes e enfermeiros. Na visão dos últimos, por
ordem decrescente, as prioritárias são: cuidado
com a ferida, as complicações esperadas e a recuperação.
Em relação ao estomizado, uma revisão da literatura não integrativa [11] descreve que a estomaterapeuta deve focalizar as seguintes informações para
o paciente: cuidado com o estoma, continuidade
do tratamento, onde obter apoio, importância da
participação do cuidador na reabilitação e possíveis
complicações.
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Na revisão integrativa de 45 publicações sobre
as necessidades de informações, os autores [12]
consideraram que elas devem ser baseadas no status
funcional, cognitivo, psicológico do paciente e cuidador, e no ambiente físico para o qual o paciente
será encaminhado. Os autores ainda descrevem que
as estratégias para assegurar a continuidade do cuidado no pós-alta são: comunicação multidisciplinar
adequada ao nível educacional e cultural do paciente/cuidador, no contexto hospitalar e comunitário;
as informações devem ser escritas e verbais e seu
oferecimento deve ser coordenado e continuamente
avaliado; o gerenciamento de caso mostra-se apropriado para o PA de alta do idoso.
O estudo de Huber e McClelland [2], um levantamento com a utilização de várias escalas, com
37 idosos do sexo masculino e 25 do feminino, deixa
claro que os pacientes e cuidadores, independente do
sexo, idade e nível educacional, querem participar
ativamente do PA, suprindo suas necessidades de
informações e de habilidades, que são diferentes
entre os sujeitos.
Por meio da abordagem metodológica qualitativa, com pacientes idosos em risco de insucesso
na alta e com profissionais de saúde, Pearson et al.
[13] revelaram que as condições fisiológicas dos
pacientes com doenças crônicas graves, em contraste
com as políticas de alta precoce e de alto fluxo dos
leitos hospitalares, interferem nas decisões sobre a
AH. Estas políticas são baseadas no controle dos
sintomas da doença e o PA é direcionado para o
encaminhamento do paciente para o domicílio, no
menor espaço de tempo possível. Assim, a decisão
de alta não considera as habilidades do paciente,
do cuidador e do ambiente domiciliar adequado
para a continuidade do cuidado, conflitando com a
diretriz do processo. Glasby, Littlechild e Pryce [14]
mostram que o principal fator para o adiamento da
alta de pacientes idosos em condições crônicas, em
21 prontuários, foi a necessidade do paciente e seu
cuidador requererem o desenvolvimento de habilidades específicas para o cuidado, e de assistência
social contínua, nem sempre obtidas.
Os artigos analisados apontam que há vários
aspectos a serem considerados para a seleção de
informações a serem fornecidas na alta do paciente. Primeiramente, o enfermeiro deve delimitar
as complicações possíveis que podem ser apresentadas pelo paciente, após a alta hospitalar. Essas
complicações devem ser consideradas em relação à
doença que o levou à hospitalização, ao tratamento
realizado, e as condições de alta do paciente, em
uma abordagem multiprofissional. Num momento
seguinte, é preciso identificar as necessidades de
informação do paciente. Essa identificação só será
possível se houver relacionamento e comunicação
empáticos entre profissionais de saúde, paciente
e cuidador.
Os estudos demonstram que há informações
que são gerais, independentes da doença e do tratamento que levaram à hospitalização. Por exemplo,
nas cirurgias, as complicações pós-operatórias
comuns referem-se à infecção da ferida, dor, dificuldades com dieta apropriada e atividades físicas.
Portanto, as informações a serem fornecidas aos
pacientes e cuidadores focalizam: o cuidado com a
ferida cirúrgica, o manejo da dor, a dieta necessária,
as atividades físicas possíveis e o conhecimento sobre
os recursos comunitários de apoio.
Continuando, é fundamental que o coordenador do PA saiba qual o local para onde o paciente
será encaminhado após a alta e tenha conhecimento
da disponibilidade dos recursos comunitários de
apoio.
Os artigos analisados, utilizando delineamentos diferentes, destacam que o PA é um processo
individualizado, reforçam a importância de adequação das informações à bagagem cultural dos
receptores e que sejam oferecidas por diferentes vias,
além da verbal.
Conclusão
A AH hospitalar precoce impõe que a continuidade do cuidado recaia no próprio paciente e
cuidador, em geral, um familiar. Nesse contexto, o
PA surgiu como um processo com as finalidades de
assegurar a continuidade do cuidado no domicílio,
favorecer a qualidade de vida do paciente no período
após a alta, evitar re-internações e reduzir os custos
dos tratamentos, para as instituições de saúde.
Os enfermeiros inseriram-se nessa proposta
como coordenadores do processo, em conjunto com
os outros profissionais de saúde, considerando a sua
atuação contínua com o paciente.
Acreditamos que o PA é essencial e exige várias
considerações para garantir a sua efetividade. Ele
caracteriza-se como um processo de relacionamento
e comunicação que gera desafios, como o da seleção de informações a serem fornecidas. Para que a
comunicação seja eficaz, há necessidade de que as
mensagens sejam significativas para os receptores,
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e haja um equilíbrio entre a sua quantidade e a sua
qualidade.
Pela análise das dez publicações, consideramos
que a seleção das informações deve ter como base:
o conhecimento das complicações possíveis após a
alta, limitadas pela doença, tratamento e condições
de alta do paciente; e as necessidades expostas pelos
pacientes e cuidadores. Assim, o PA deve ser planejado em uma visão multiprofissional, mas com foco
individualizado.
Entretanto, considerando o tratamento, é
possível delimitar informações comuns, tendo em
vista uma determinada doença e o tratamento mais
freqüentemente realizado.
As bases da seleção de informações compõem
parte fundamental no PA. Entendemos que as
necessidades de informações do paciente, quando
não identificadas, tornam-se um obstáculo para a
efetividade do PA. Para tanto, é necessário que o
coordenador do PA planeje as informações a serem
oferecidas e as estratégias a serem usadas, com base
no conhecimento obtido pela pesquisa.
O estudo possibilitou-nos questionar se o fornecimento de informações, verbais ou escritas são,
realmente, suficientes para garantir os resultados
do PA. Consideramos que o processo de ensino do
paciente é uma estratégia que favorece a apreensão
e a aplicação das informações, além da aquisição de
outras habilidades cognitivas e psicomotoras, que
possibilitariam a continuidade do cuidado pelos
pacientes e cuidadores.
Destacamos o pequeno número de publicações
brasileiras sobre o tema, embora o PA seja uma
política pública do SUS.
Finalizando, este estudo chamou a nossa
atenção para a temática, porém, consideramos que
as preferências por informações pelos pacientes e
cuidadores precisam ser aprofundadas através de
novos estudos.
Tabela I – Artigos revisados sobre as informações a serem providas no planejamento da alta do paciente
Autor(es)/Ano/
País
Objetivo(s)
Método
Amostra
Principais resultados ou considerações
Identificar os problemas
apresentados pelos pacientes submetidos à cirurgia de
revascularização do miocárEstudo descritivo
dio (RVM), no 1º. mês após
a alta.
- Problemas: 76% com a ferida cirúrgica; 28% terapêutica medicamentosa;
24% outras patologias; 20% alteração
Dantas e
25 pacientes
do humor; 16% alteração do padrão
Aguillar [6]
adultos submetido sono; 16% queixas cardiovascu- Brasil
dos a RVM
lares; 12% alteração sensibilidade,
motricidade, acuidade visual e força
muscular; 8% alteração do apetite.
IIdentificar as complicações
- Principais complicações: dor, náusea
Marley e Swan- pós-alta de cirurgia ambula- Revisão da literatura
e vômitos, insônia, retenção urinária,
Não descrita
son [7] - EUA
torial descritas na literatura (não integrativa)
constipação intestinal, febre, cefaléia,
e outras.
Descrever as necessidades
-Informações prioritárias: complicações
Estudo descritivo,
de informação dos pacientes
e sintomas, medicação.
tipo levantamento.
operados de artroplastia
População de
- Diferenças entre variáveis sociais:
Johansson,
Questionário encade quadril; identificar se as
212 pacientes
a) pacientes que requereram maiores
Hupli e Salanträ
minhado aos pavariáveis sociais afetam os
e amostra de
necessidades: mulheres (antes da alta),
[9] – Finlândia
cientes uma semana
tipos de necessidades de
144.
idade acima de 60 anos, com menor
após a alta.
aprendizagem.
nível de educação, aposentados e
divorciados.
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45 publicações
do Medline e
Pubmed
Apresentar um protocolo de
Zwicker e PicaPA para idosos.
riello [12] - EUA
Revisão integrativa
da literatura.
Huber e McClelland [2]
- EUA
- Estudo de levantamento.
- Instrumentos:
quatro escalas
(Family Preferen37 homens e
ces Assessment,
25 mulheres,
Diabetes Quality of idosos.
Life, Patient Opinion
of Nursing Care
Living with Heart
Failure.
Mitchell [8]
- Inglaterra
Investigar as preferências
dos pacientes/familiares na
participação no PA.
Identificar as necessidades
dos pacientes de cirurgia
ambulatorial após a alta.
Revisão da literatura
Não especificado
- Informações necessárias devem ser
baseadas na avaliação do(a)::
status funcional, cognitivo e psicológico; percepção da habilidade para
o autocuidado, capacidade física e
psicológica do cuidador, déficits de
conhecimento sobre as necessidades
de continuidade do cuidado, fatores
ambientais do local após-alta, necessidades de apoio formais e informais do
cuidador.
- Estratégias para assegurar a continuidade do cuidado: comunicação
multidisciplinar e adequada ao paciente/cuidador, no contexto hospitalar e
comunitário; informações devem ser
escritas e verbais; deve ser coordenado
e continuamente avaliado; o gerenciamento de caso mostra-se adequado
para o PA de alta do idoso.
- Não houve associação entre idade,
gênero e educação às preferências na
participação no PA; houve divergências
entre as preferências dos pacientes e
cuidadores.
- O PA deve focalizar as preferências
do paciente/cuidador (que são diferentes).
- Preocupações do paciente:
manejo da dor (medicações levam ao
alívio parcial; distúrbio do sono; duração da dor não esperada);
comportamento inadequado de recuperação (não seguem conselhos dos
profissionais, requerem apoio de outro
adulto como cuidador);
dificuldade em obter cuidado comunitário (onde e quem procurar).
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Anthony e Hudson-Barr [10]
- EUA
Classificar as necessidades de informação; avaliar
Estudo descritivo
a congruência entre as
com delineamento
necessidades de informação
longitudinal.
identificadas pelos enfermeiros e pacientes.
Identificar as decisões realizadas para a alta hospitalar
Pearson et al
de pacientes e seus cuida[13] - Inglaterra
dores, em risco de insucesso
após a alta.
Estudo descritivo.
Entrevista semi-estruturada e análise
de conteúdo dos
dados.
Sintetizar o conhecimento
Estudo descritivo
Glasby, Littlesobre o adiamento das altas – revisão narrativa
child e Pryce
de pacientes idosos, na
da literatura.
[14] - Inglaterra
literatura.
Readding [11]
- Inglaterra
Descrever as informações
prioritárias a serem aplicadas no PA do paciente
estomizado.
Amostra de
conveniência de
44 pacientes de
cirurgias eletivas
de colon ou abdominal, e 37
enfermeiros.
30 pacientes clínicos considerados em risco
de insucesso na
alta.
6 profissionais
engajados no
desenvolvimento
e implementação de políticas
públicas de 3
distritos (gestores de saúde
e assistentes
sociais)
21 documentos
analisados na
íntegra.
Revisão da literatura
Não especifinão integrativa e
cado
experiência pessoal.
- Informações prioritárias entre pacientes: dieta (alimentos necessários e
proibidos), atividades físicas possíveis
e proibidas, como obter recursos e cuidados com a ferida; informações sobre
a doença de base, opções terapêuticas,
trajetória da recuperação; manejo da
dor; complicações; e mudanças nos
hábitos.
- Informações prioritárias entre enfermeiros: cuidado com a ferida, complicações, a doença e a recuperação.
- Não houve congruência entre enfermeiros e pacientes; as necessidades de
informação do paciente permaneceram
estáveis entre os períodos analisados.
- O envolvimento no cuidado depende
do status físico, porém, os sujeitos não
demonstraram diminuição no desejo
de envolvimento.
- Pacientes com risco de insucesso após
alta: com doenças crônico-degenerativas (DPOC, angina, infarto, TVP, AVC),
com internação de 8 a 93 dias, com
internações anteriores.
- Temas identificados: aceitação da
doença como parte da vida; preocupação com manutenção da identidade;
recursos domiciliares e comunitários
disponíveis.
- Na admissão hospitalar dos pacientes a preocupação é com o controle
dos sintomas ou função orgânica; há
preocupação em mantê-los no domicílio; a sua qualidade de vida não é
observada.
- Fatores contribuintes para o adiamento da alta: a necessidade de maior
número de serviços de reabilitação,
fatores internos do hospital (uso
inapropriado de leitos, delonga de
resultados de exames, de obtenção de
medicações), fatores relacionados à
avaliação de necessidades de cuidados
ou de assistência social.
- O que o ostomizado precisa saber:
manejo do ostoma, os equipamentos
necessários, o seguimento, a recuperação e o futuro, onde obter ajuda e
informações, como ajudar os familiares, complicações, problemas do dia
a dia.
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Artigo original
O ensino de ética e seus reflexos
no cuidado sob a perspectiva
de graduandos de enfermagem
Wiliam César Alves Machado, D.Sc.*, Ademê de Carvalho Piuzana**, Eliane Raimunda Oliveira Tostes**,
Vivian Pereira Monteiro**, Silvia Raquel Perez Toledo**
* Ciências da Enfermagem pela UFRJ, Professor Titular da Faculdade de Ciências da Saúde de Juiz de Fora, da Universidade
Presidente Antônio Carlos (UNIPAC), Pesquisador da FUNADESP, ** Curso de Enfermagem da Faculdade de Ciências da
Saúde de Juiz de Fora, da Universidade Presidente Antônio Carlos (UNIPAC)
Resumo
Muito se discute sobre a dimensão ética no cuidado de enfermagem, sobretudo quanto à relação deste com a qualidade dos
serviços e práticas de saúde disponíveis no contexto da sociedade, face ao papel exercido pelos enfermeiros em seus ambientes
de atuação profissional, freqüentemente adversos ao preconizado nos programas de ensino, em seus vários níveis. Este estudo
tem como objetivo identificar as implicações do ensino de ética para formação profissional do enfermeiro, focalizando os
valores que devem fundamentar o conhecimento e a atitude dimensionados à prática de cuidar do outro, a partir do ponto
de vista de graduandos. Os achados revelam que os sujeitos do estudo demonstram conhecimento e capacidade de assimilar
fundamentos éticos com o cuidado, ainda que com pouco ou nenhum contato com ambientes de prática profissional de
enfermagem, mostram-se preocupados quanto à demonstração de respeito e compaixão nas ações de cuidar do outro, destacado
em 34,28% de suas respostas; da mesma forma, concebem a importância do código de ética como norteador da prática,
com 25,71%; seguido pela atuação responsável nos procedimentos de cuidar do cliente e familiares, com 22,87%; passando
por considerar tais preceitos fundamental para o cuidado de enfermagem, demarcado por 14,28% das respostas obtidas,
para, finalmente, se fazer alusão ao elemento qualidade do atendimento, destacado por 2,86% das informações coletadas no
presente estudo. Conclui-se que os graduandos devem ser estimulados a entrar cada vez mais em sintonia com as abordagens
éticas aplicadas à enfermagem, e que este tipo de estratégia representa caminho seguro para se promover atitudes harmônicas
e fraternas nas interações para cuidar no âmbito da enfermagem.
Palavras-chave: ética de enfermagem, estudantes de enfermagem, educação em enfermagem.
Artigo recebido em 16 de maio de 2006; aceito em 20 de setembro de 2006.
Endereço para correspondência: Wiliam Alves Machado, Rua Silva Jardim, 5, Centro,
25805-160 Três Rios RJ, E-mail: [email protected]
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Abstract
The teaching ethics and its reflections on care under the nursing students’
perspective
The ethical dimension on nursing care has been discussed quite a lot, especially in relation to service quality and health practices
available within the society context, taking into account tasks performed by nurses in its scope of professional practice, frequently
adverse to the teaching programs, in its several levels. This study has as objective to identify the implications of the teaching
ethics for the nurse professional development. It focuses values that should establish the attitude and knowledge, attributing
importance to the care for another person, starting from the undergraduate students’ point of view. The results reveal that
the subjects of the study demonstrate knowledge and capacity of assimilating ethical foundations with the care, although
with little or no contact with scopes of professional nursing practices, and they are worried about respect and compassion in
the actions of caring for another person, highlighted in 34.28% of the replies. They understand the importance of the ethics
code as a guide of practice (25.71%); followed by the responsible performance in the procedures of caring for patients and
family (22.87%); considering fundamental such precepts for the nursing care (4.28%), and, finally, to make reference to the
element quality of care, highlighted by 2.86% of data in the present study. We conclude that undergraduate students should
be stimulated to be in agreement with the ethical approach applied to nursing, because this kind of strategy represents security
to promote harmonic and fraternal attitudes in the interactions to care for in the nursing scope.
Key-words: ethics nursing, nursing students, nursing education.
Resumen
La enseñanza de la ética y sus reflejos en el cuidado bajo la perspectiva de los
estudiantes de graduación en enfermería
Mucho se discute sobre la dimensión ética en la atención de enfermería, en especial cuanto a la relación de esta con la calidad
de servicios y prácticas de salud disponibles en el contexto de la sociedad, referente al papel ejercido por los enfermeros en
sus ambientes de actuación profesional, frecuentemente adverso al preconizado en los programas de enseñanza, en sus varios
niveles. Este estudio tiene como objetivo identificar las implicaciones de la enseñanza de la ética para el desarrollo profesional
del enfermero, destacando los valores que deben fundamentar el conocimiento y la actitud dimensionados a la práctica de
cuidar del otro, desde el punto de vista de los graduandos. Los resultados revelan que los estudiantes del estudio demuestran
conocimiento y capacidad de asimilar fundamentos éticos con el cuidado, aunque con poco o ningún contacto con ambientes
de practica profesional en enfermería. Se muestran preocupados con relación a la demostración de respeto y compasión en las
acciones de cuidar del otro, destacado en 34,28% de sus respuestas; de la misma manera, conciben la importancia del código
de ética como orientador de la práctica, con 25,71%; seguido por la actuación responsable en los procedimientos de cuidar del
paciente y familiares, con 22,87%; considerando tales preceptos fundamentales para la atención de enfermería, determinado
por 14,28% de las respuestas obtenidas, para, finalmente, hacer alusión a la calidad del elemento de la asistencia, resaltado
por 2,86% de los datos colectados en el presente estudio. Se concluye que los graduandos deben ser estimulados a estar cada
vez más en sintonía con los abordajes éticos aplicados a la enfermería, pues este tipo de estrategia representa camino seguro
para promover actitudes armónicas y fraternales en las interacciones para cuidar en el ámbito de enfermería.
Palabras-clave: ética de enfermería, estudiantes de enfermería, educación en enfermería.
Introdução
A Disciplina Ética de Enfermagem constitui a
área de interesse onde se concentram as prerrogativas
para compreensão das características da realização
do ensino no âmbito de aspectos legais e morais
que norteiam prática social e assistencial da enfermagem. Os estudantes de graduação mostram-se
interessados em seus conteúdos, pelo fato de os
mesmos lhes apresentar visão preliminar ilustrativa
de seus futuros campos de atuação, com diferencial
vantagem de contextualizá-los a luz da legislação e
do código de ética vigentes no Brasil. Imperativo se
faz assinalar que todo conhecimento constitui, ao
mesmo tempo, uma tradução e uma reconstrução,
a partir de sinais, signos, símbolos, sob a forma de
representações, idéias, teorias, discursos [1], sobretudo no ensino da ética de enfermagem, com o
descortinar de simulações práticas cotidianas.
Discutir questões éticas nas interações das pessoas
com seus semelhantes face aos rumos da humanidade
projetada no âmbito global, planetário e cósmico, tem
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sido marca no discurso de autores das diversas áreas de
conhecimento [2-4], inclusive, servindo de referência
para que deles nos apropriemos de alguns elementos
na intenção de compor nossas reflexões teóricas, incorporando-os aos discursos e se adequando aos contextos
de prática clínica e social da enfermagem, com notório
artifício de facilitar sua compreensão em termos filosófico-conceituais. Neste estudo, o conhecimento de
ética é discutido no âmbito do que é compreendido por
estudantes de graduação em enfermagem após cursar
disciplina específica, uma vez considerarmos que os
mesmos podem se tornar reflexos indispensáveis na
conduta dos futuros profissionais, expressos através
de processos interacionais harmônicos nas atividades
de cuidar do outro.
Em uma retrospectiva histórica, constata-se
que na Grécia antiga, tanto a natureza do Universo
como a natureza do homem – em sua dupla expressão, traduzida pelo lógos, no cosmos e na pólis – finalizava-se no nível da perfeição. Essa ambição, na esfera
do indivíduo, traduzia-se na obtenção de comedida
felicidade. Segundo tal mod

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