PERCEBENDO A BOMBA POPULACIONAL
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PERCEBENDO A BOMBA POPULACIONAL
PERCEBENDO A BOMBA POPULACIONAL O dano real começou há cerca de 60 anos atrás Andrew R. B. Fergunson (WorldWatch 14:36-38, 2001) Há trinta e dois anos atrás, em 1968, Paul Ehrlich lançou um chamado, a fim de despertar o mundo, através de seu livro A Bomba Populacional. Agora que é possível ver a Bomba em uma perspectiva histórica, e até mesmo estabelecer quando ela explodiu, vamos realizar a tarefa de tomar conhecimento – com objetividade rigorosa – da explosão da Bomba e dos efeitos colaterais causados por ela. Somente nos anos 90 é que os demógrafos entenderam que a mensagem de Ehrlich estava essencialmente correta. Em 1991, Clive Pointing iniciou o prefácio de seu livro, Uma História Verde do Mundo, com as seguintes palavras: “Enquanto algumas pessoas escalam montanhas porque estas estão lá, outras escrevem livros porque as montanhas não estão lá”. Este livro foi realmente importante; antes de sua publicação, poucas pessoas puderam ter uma compreensão adequada do impacto da humanidade sobre o ambiente. Dois anos após, em 1993, o biofísico Vaclav Smil escreveu: “Nós pelo menos começamos a compreender a extensão da transformação ambiental que está colocando em risco a sobrevivência da civilização moderna”. Smil identificou um espectro de alterações críticas das condições da Terra e notou que “estas alterações podem ser ordenadas em categorias amplas: declínio da disponibilidade de recursos e serviços naturais críticos, mudança da composição da atmosfera e a perda de biodiversidade” (itálico adicionado). Pode ser impossível escalonar as três categorias de acordo com seu grau de importância. No entanto, nós podemos utilizar a “mudança da composição da atmosfera” para determinar quando a Bomba explodiu; assim sendo vamos olhar para ela em primeiro lugar. Em 1990, o mundo emitiu cerca de 4,2 toneladas de dióxido de carbono por pessoa, devido à queima de combustíveis fósseis e à produção de cimento, correspondendo a um uso de energia de cerca de 64 GJ (gigajoules) por pessoa por ano. Sessenta e quatro GJ per capita, a média de uso de energia em 1990, é um limite inferior razoável para o uso médio de energia. Vaclav Smil fornece a evidência. Ele nos mostra, graficamente, que a mortalidade infantil decai rapidamente conforme o uso de energia per capita se eleva para 50 GJ por ano. Além deste valor, um aumento adicional da queda se torna mais gradual. Logicamente, não há um ponto claro de virada, mas 64 gigajoules por ano por pessoa parece um mínimo bem ponderado. De qualquer modo, você poderia querer argumentar a favor de uma média de uso de energia inferior a 64 GJ/ano, então você teria que argumentar sobre aceitar uma mortalidade infantil superior a 15 por mil nascimentos. Países como a Grécia, o Japão e o Reino Unido, que têm taxas de mortalidade infantil menores que esta, também têm uso de energia superior a 64 GJ per capita por ano. Logicamente que uma correlação não prova uma relação causal, mas Smil também mostra que um bom acesso à educação superior (20% da população qualificada), geralmente, envolve um uso de energia per capita superior a 70 GJ por ano. Ademais, parece inerentemente plausível que uma certa disponibilidade mínima de energia é necessária para alcançar estes pontos de referência. Assumindo-se que há algum valor mínimo de emissão per capita, quanto de dióxido de carbono a Terra poderia tolerar? A fim de estabelecer a quantidade de dióxido de carbono na atmosfera, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas estimou que as emissões de dióxido de carbono a partir de combustíveis fósseis teriam que ser reduzidas em, pelo menos, 60% em relação ao nível de 1990, de 22,3 bilhões de toneladas, o que resultaria em um limite superior de 8,9 bilhões de toneladas. Assim, a população máxima que a Terra poderia acomodar, considerando-se o valor mencionado anteriormente de 4,2 toneladas por pessoa por ano, seria 8,9 / 4,2 = 2,1 bilhões de pessoas. A população mundial alcançou 2,1 bilhões de pessoas em 1940; então, foi em 1940 que a Bomba explodiu. Os efeitos colaterais vêm se acumulando continuamente desde então, sob a forma de perturbações atmosféricas e seus corolários, tais como derretimento de geleiras, secas, inundações e aumento da freqüência do fenômeno El Nino. No anos 90, a maré de seres humanos invadiu o globo apropriando-se dos ecossistemas mais produtivos para seu próprio uso1. Naquela época, segundo Smil, apenas cerca de um terço da superfície terrestre foi deixado para o uso das outras formas de vida. Sobre este remanescente, ele diz que “a maioria desta área está em ecossistemas altamente estressados e de baixa 1 No início dos anos 90, de 13.049 milhões de hectares de terra, 26% foram convertidos em pastagem para animais domesticados, 12% em terra agricultável e 1,5% em áreas construídas, incluindo estradas, estacionamentos, habitações e outras construções. produtividade. Cerca de 40% do total situam-se em comunidades de tundras circumpolares e outros 20% estão em desertos e semidesertos subtropicais, enquanto que 6% da terra não povoada em meados dos anos 80 estavam na floresta úmida tropical, e menos que 2% em florestas temperadas (úmidas e latifoliadas)”. Assim, nós não temos sido generosos com as outras espécies e Smil observa que “Há uma concordância geral entre os estudiosos de biologia da conservação que a maioria dos parques e reservas nacionais são muito pequenos para garantir a sobrevivência a longo prazo, sobretudo das espécies maiores”. Logicamente que nem todos os danos ocorreram após a explosão da Bomba, mas uma vez que o mundo adquiriu dois terços de sua população humana a partir daquela época, tornase claro que a explosão foi responsável pela maior parte daqueles danos. Além disso, desde que a taxa de danos vem indubitavelmente se acelerando, há plausibilidade na tese de que a raça humana é capaz de provocar uma extinção de espécies comparável aos cinco eventos anteriores de extinção em massa. Então, esta é a nossa percepção dos efeitos colaterais, com relação à categoria “perda de biodiversidade” de Smil. A categoria remanescente, mencionada por Smil, é o “declínio da disponibilidade de recursos e serviços naturais críticos”. A fim de estimá-la, primeiramente vamos nos remeter a Colin Campbell que estima que o mundo, atualmente utilizando cerca de quatro quilômetros cúbicos de óleo cru por ano, usou aproximadamente a metade de suas reservas de óleo convencional e gás natural. Além disso, nós aprendemos, com Richard Duncan, que os suprimentos de óleo e de energia per capita apresentaram um pico em 1979. No entanto, para a maioria dos detalhes sobre os danos colaterais relativos à esta categoria seria melhor recorrer a um artigo de David Pimentel et al., publicado em 1999. Casualmente, este artigo também propõe a necessidade de almejar uma população mundial de 2 bilhões de pessoas, embora devido a razões outras que o dióxido de carbono. A partir deste artigo podemos adicionar os seguintes itens à nossa lista (todos amplamente referenciados no original): (a) “3 bilhões de humanos mau nutridos no mundo”; (b) 40.000 crianças morrem diariamente devido à má-nutrição e outras doenças; (c) “Globalmente, a perda anual de terra devido à urbanização e à construção de estradas alcança de 10 a 35 milhões de hectares por ano, sendo que metade desta perda deve-se à agricultura”; (d) “Mundialmente, mais de 10 milhões de hectares de terras agricultáveis produtivas são severamente degradados e abandonados anualmente”; (e) “As demandas de água já excedem os suprimentos em cerca de 80 nações co mundo”; (f) Desde 1960, “aproximadamente um terço das terras agricultáveis do mundo tem sido perdido devido à urbanização, construção de estradas, erosão, salinização e encharcamento dos solos”; (g) “a produção per capita de grão começou a diminuir em 1984 e continua a declinar”; (h) “a irrigação per capita começou a declinar em 1978 e continua a cair”; (i) “a produção per capita de alimento começou a declinar em 1980 e continua a cair”; (j) “os suprimentos de fertilizantes essenciais para a produção de alimento começaram a declinar em 1989 e continuam a cair”. Esta lista abreviada, que omite a perda de solos – séria, mas difícil de mensurar – é suficiente para indicar a importância da última das três categorias de Smil, o “declínio da disponibilidade de recursos e serviços naturais críticos”. No entanto, talvez devêssemos lembrar também da perda líquida de florestas,equivalente a uma área de, pelo menos, 12 milhões de hectares por ano. Nós podemos, pelas mesmas razões oferecidas previamente, deduzir que a maioria dos danos ocorreu desde que a Bomba explodiu, em 1940. Deste modo, isto conclui nossa tentativa de tomar consciência da Bomba Populacional. Agora vamos deixar de lado os “fatos” duros e cogitar sobre assuntos mais especulativos. Como a Bomba explodiu cerca de 30 anos antes do livro de Ehrlich, nós poderíamos nos inclinar a culpá-lo e a seus colegas ecólogos por não terem soado antes o toque de despertar. No entanto, se eles tivessem feito isto, a mensagem teria caído em ouvidos surdos. Mesmo algumas das pessoas mais inteligentes poderiam não ter enxergado que havia um problema populacional, e algumas até mesmo relutariam em reconhecer que havia um problema surgindo no horizonte. Ainda hoje, há poucos para ouvir aqueles que, durante, décadas, têm trabalhado arduamente para despertar o mundo para nossa situação perigosa. Os esforços de algumas pessoas têm sido enormes. Em adição ao trabalho de Paul e Anne Ehrlich, Clive Ponting, Colin Campbell e David e Marcia Pimentel, temos contribuições importantes de Virginia Abernethy, Albert Bartlett, Lester Brown, Sandra Bukkens, Gretchen Daily, Richard Duncan, Robert Engleman, Garrett Hardin, Mario Giampietro, Norman Myers, Jack Parsons, Peter Tod, Mary White e Walter Youngquist. Embora seja difícil dizer se o curso da história foi influenciado pelas inúmeras palestras que estas pessoas têm dado (1.200 só de Al Bartlett) e pelo número igualmente enorme de excelentes artigos e livros que escreveram, o fato de que o Homo sapiens produziu tais indivíduos que enxergam longe – tentando reduzir nossa propensão profundamente arraigada para a procriação – nos dá algum motivo para admirar a raça humana, qualquer um pode refletir sobre as chances da espécie sobreviver à sua incompetência em matéria de fertilidade.i Andrew R. B. Fergunson é coordenador de pesquisa no Optimum Populational Trust, Reino Unido. Texto traduzido por Ana Lúcia Brandimarte para a disciplina Ecologia Humana.