Uni-ANHANGUERA – CENTRO UNIVERSITÁRIO DE GOIÁS

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Uni-ANHANGUERA – CENTRO UNIVERSITÁRIO DE GOIÁS
Uni-ANHANGUERA – CENTRO UNIVERSITÁRIO DE GOIÁS
CURSO DE DIREITO
O BENEFÍCIO ASSISTENCIAL E O REQUISITO DA MISERABILIDADE
SILVIA RAQUEL CARDOSO DA COSTA MENDES
GOIÂNIA
Outubro/2013
SILVIA RAQUEL CARDOSO DA COSTA MENDES
O BENEFÍCIO ASSISTENCIAL E O REQUISITO DA MISERABILIDADE
Trabalho de Conclusão de curso apresentado
ao curso de direito do Centro Universitário de
Goiás, Uni-ANHANGUERA, sob orientação
da Profª Orientadora Ms. Tereza Cristina
Ribeiro Lima, como requisito parcial para
obtenção de título de bacharel em Direito.
GOIÂNIA
Outubro/2013
FOLHA DE APROVAÇÃO
SÍLVIA RAQUEL CARDOSO DA COSTA MENDES
O BENEFÍCIO ASSISTENCIAL E O REQUISITO DA MISERABILIDADE
Trabalho de conclusão de curso apresentado à banca examinadora como requisito parcial para
obtenção do Titulo de Bacharel em Direito do Centro Universitário de Goiás – Uni
ANHANGUERA, defendido e aprovado em ____de____de______ pela banca examinadora
constituída Por:
________________________________________________
Prof. Tereza Cristina Ribeiro Lima
Orientadora
____________________________________
Prof. Erika Cristina Rodrigues
Examinadora
RESUMO
O trabalho que ora se apresenta tem por objeto uma abordagem sobre a Assistência Social,
especificamente no que diz respeito ao benefício assistencial. A Assistência Social, a Saúde e
a Previdência, consubstanciam um conjunto de ações dos poderes públicos e da sociedade,
tratadas no Título VIII da Constituição Federal, no capítulo destinado à Seguridade Social. A
pesquisa é voltada à análise do requisito da miserabilidade, exigida para o deferimento do
benefício assistencial, trazendo uma abordagem doutrinária e jurisprudencial desse tema, a
partir da utilização do método dedutivo.
PALAVRAS-CHAVE: Seguridade Social. Previdência. Saúde. Assistência Social.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
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I – SEGURIDADE SOCIAL
1.1 Conceitos
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1.2 Princípios da Seguridade Social
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1.2.1 Princípios Gerais
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1.2.2 Princípios Específicos
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1.3 Custeio da Seguridade Social
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.
II – DO DIREITO À SAUDE, PREVIDÊNCIA SOCIAL E ASSISTÊNCIA SOCIAL
2.1 A Saúde
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2.2 Previdência Social
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2.3 Assistência Social
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2.3.1 Princípios da Assistência Social
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2.3.2 Benefício Assistencial
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III – DA DIGNIDADE HUMANA FACE A CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE
3.1 Conceito de miserabilidade
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3.2 Da constitucionalidade do artigo 20, §3° da Lei n.8.742/93
26
3.3 Posição atual do Supremo Tribunal Federal
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
38
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
40
6
INTRODUÇÃO
A Seguridade Social é conceituada pela Constituição federal como um conjunto
integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar o
direito à saúde, à previdência e a assistência social. Além da Constituição, vários outros
doutrinadores também conceituaram a seguridade social como sendo uma proteção formada
pelo Estado e por particulares, no intuito de estabelecer ações adequadas no sustento de
pessoas carentes, trabalhadores em geral e seus dependentes, garantindo a estas pessoas o
mínimo existencial, para que através deste conjunto de ações se alcance o fundamento mais
importante do nosso Estado Democrático de Direito, que é a dignidade da pessoa humana.
Para se garantir essas ações, existem vários princípios que devem ser observados,
tanto os gerais como os específicos da seguridade social.
Para se concretizar essas ações descritas acima, existe uma fonte de custeio. A
Constituição Federal em seu artigo 195, dispõe que a seguridade social será financiada por
toda a sociedade, de forma direta e indireta, na forma da lei, mediante recursos da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e por contribuições sociais.
Dentre o conjunto de ações da seguridade social, está a saúde, que é um direito de
todos, independente de contribuição, condição financeira ou nacionalidade. Essa proteção
alcança a todos, pois é um direito fundamental do ser humano. No entanto, a previdência
social, não alcança a todos, pois tem caráter contributivo e de filiação obrigatória, é um
seguro que ampara os seus filiados dos riscos sociais.
A assistência social veio para complementar esse conjunto de ações, pois não
alcança a todos, e não necessita de contribuição, mas alcança pessoas mais carentes por meio
de atividades estatais e particulares, com o objetivo de proteger à família, à maternidade, à
infância, à adolescência e a velhice. E dentro dos diversos objetivos da assistência social está
a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
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idoso com 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou mais, que comprovem não possuir meios de
prover a sua própria manutenção ou tê-la promovida por sua família. Esse Beneficio
assistencial é tradicionalmente conhecido como Beneficio de Prestação Continuada, instituído
pela Lei n. 8.742/93 ( Lei Orgânica de Assistência Social – LOAS). Mas para ter direito a esse
beneficio, é necessário a comprovação do estado de miserabilidade, ou seja, incapacidade de
prover seu próprio sustento, ou de tê-lo provido por sua família. Pela Lei n. 8.742/93,
considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a
família cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ do salário mínimo. No entanto esse
quantum mínimo é objeto de acesa polêmica entre os tribunais, em relação a sua
constitucionalidade. O Supremo, quando do exame da Ação Direta de Inconstitucionalidade
n. 1.232 (ADI), julgada em 27/08/1998, decidiu pela constitucionalidade da norma. O STJ e
os Tribunais Regionais Federais vêm se orientando em sentido diverso. Para eles, ainda que a
renda per capita ultrapasse um quarto do salário mínimo, isso não impede a concessão do
benefício, na medida em que o requisito da miserabilidade passa a ser aferido no caso
concreto por outros meio de prova. Essa é também a posição da Turma de Uniformização dos
Juizados Especiais Federais. O tema foi novamente levado a apreciação do STF, tanto no que
se refere ao quesito da renda per capita caracterizadora do estado de miserabilidade (RE
567985) quanto no tocante à possibilidade de exclusão do cálculo do rendimento,
de
benefício previdenciário ou assistencial percebido por outro membro do grupo familiar, seja
ele idoso ou portador de deficiência (RE 580963). Os recursos citados foram julgados sob o
rito da repercussão geral, restando declarada a inconstitucionalidade incidental do art. 20, §
3°, da LOAS, sem determinar, no entanto, a nulidade da norma. Os acórdãos ainda não foram
publicados, o que não prejudica a compreensão sobre o posicionamento atual do Supremo
Tribunal Federal sobre esses temas, já que também examinados nos autos da Reclamação
4374, j. 18/04/2013).
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I- SEGURIDADE SOCIAL
1.1 Conceito
O artigo 194 Constituição Federal de 1988, define seguridade social como um
conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a
assegurar o direito à saúde, à previdência e à assistência social.
Segundo Zambitte, ( 2011, p. 09 )
A seguridade social pode ser conceituada como a rede protetiva formada pelo
Estado e particulares, com contribuições de todos, incluindo parte dos beneficiários
dos direitos, no sentido de estabelecer ações positivas no sustento de pessoas
carentes, trabalhadores em geral e seus dependentes, providenciando a manutenção
de um padrão mínimo de vida. A intervenção estatal, na composição da seguridade
social, é obrigatória, por meio da ação direta ou controle, a qual deve atender a toda
e qualquer demanda referente ao bem estar da pessoa humana.
É função do Estado estabelecer uma rede de políticas públicas adequadas para dar
proteção aos riscos sociais a que estão sujeitos os cidadãos excluídos e fragilizados, em razão
do estado de saúde ou da idade avançada. Este conjunto de ações é um dos instrumentos
jurídico-político mais adequados para se alcançar o fundamento mais importante do nosso
Estado Democrático de Direito, que é a dignidade da pessoa humana e que tem como
objetivo, dentre outros, o de construir uma sociedade: livre, justa, solidária e fraterna .
Na concepção de Balera, (2004, p.15 )
Para uma completa compreensão de seguridade social, é necessário vislumbrar-se a
importância e alcance dos valores do bem estar e justiça sociais, os quais são de
fato, bases do Estado brasileiro, assim como diretrizes de sua atuação. A seguridade
social é então meio para atingir-se a justiça, que é o fim da ordem social.
O bem estar social, materializado pela legislação social, traz a idéia de cooperação,
ação concreta do ideal de solidariedade, superando-se o individualismo clássico do
estado liberal. De acordo com o art. 3º da Constituição, o bem estar pode ser
também definido como a erradicação da pobreza e desigualdades, mediante a
cooperação entre os indivíduos.
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Outra definição de Seguridade Social é a dada pela Organização Internacional do
Trabalho – OIT, na Convenção 102, 1952, nos seguintes termos: “a proteção que a sociedade
oferece aos seus membros mediante uma série de medidas públicas contra as privações
econômicas e sociais que, de outra forma, derivam do desaparecimento ou em forte redução
de sua subsistência, como conseqüência de enfermidade, maternidade, acidente de trabalho ou
enfermidade profissional, desemprego, invalidez, velhice e também a proteção em forma de
assistência médica e ajuda às famílias com filhos”. A aludida Convenção foi ratificada pelo
Brasil por meio do Decreto Legislativo nº 269/08.
Segundo Santos ( 2012, p.34 ):
A seguridade social , não está fincada na noção de risco, mas, sim, na de
necessidade social, porque os benefícios não tem natureza de indenização; podem
ser voluntários, não são necessariamente proporcionais a cotização, e destinam-se a
prover os mínimos vitais.
A relação jurídica de seguridade social só se forma após a ocorrência da
contingência, isto é, da situação de fato, para reparar as conseqüências.
São partes nessa relação jurídica:
- sujeito ativo: quem dela necessitar;
- sujeito passivo: os poderes públicos (União, Estados e municípios) e a sociedade.
- objeto: contingência-necessidade.
1.2 Princípios da seguridade social
A Seguridade Social, sendo um ramo específico do direito, tem seus próprios
princípios, e antes de começar a especificar esses princípios da Seguridade Social,
è
necessário dar o conceito de princípio.
Princípio segundo o dicionário é o primeiro impulso dado a uma coisa, é o início, a
origem, o começo. Mas perante o direito, segundo ensina Reale (1997, p.299):
Princípios são verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais
admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por
motivos de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos
pelas necessidades da pesquisa e da práxis.
Os princípios podem ser divididos em gerais; pois se aplicam não só a Seguridade
Social, mas também a outras matérias; e os específicos da matéria.
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1.2.1 Princípios gerais
Não são princípios específicos da Seguridade Social, mas são aplicáveis a esta
disciplina como os da solidariedade, da igualdade, da legalidade e do direito adquirido.
O princípio da solidariedade é o objetivo fundamental da República Federativa do
Brasil (art.3º, I, da CF/88). Tem ligação com o princípio da dignidade da pessoa humana e
com o bem estar social. Para Gonçales ( 2009, p.10 ):
O princípio da solidariedade retrata a situação das pessoas mais abastadas em
relação aos mais empobrecidos; os mais capazes contribuem com parcela maior, em
favor daqueles menos capazes.
A solidariedade implica responsabilidade coletiva quanto ao financiamento do
sistema que desencadeia uma série de ações públicas e privadas dirigidas a assegurar os
direitos concernentes à previdência, a saúde e assistência social.
O princípio da igualdade, conforme o artigo 5º da Constituição Federal dispõe que
todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. É o princípio da igualdade
perante a lei.
Tanto no pagamento das contribuições quanto na concessão dos benefícios, as
pessoas que estejam nas mesmas condições, devem ser tratadas igualmente.
O princípio da legalidade, reza o artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal que
ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei .
Somente haverá a obrigação de conceder determinado benefício da Seguridade Social ou de
pagar contribuição previdenciária, se houver previsão em lei. Se não existir lei, não haverá
obrigação de contribuir, nem direito a determinado benefício.
O princípio do direito adquirido, conforme a Constituição Federal prevê no artigo 5º,
inciso XXXVI, que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa
julgada.
O conceito legal de direito adquirido está na Lei de Introdução às normas do Direito
Brasileiro, com a seguinte redação: Consideram-se adquiridos assim os direitos que seu
titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo começo de exercício tenha termo
pré-fixo, ou condição preestabelecida inalterada ao arbítrio de outrem.
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A Lei Complementar n. 109/01, no artigo 68, §1º, considera direito adquirido do
participante quando implementadas todas as condições estabelecidas no regulamento do plano
de previdência privada.
Direito adquirido, não faz parte do patrimônio econômico da pessoa, mas sim do
patrimônio jurídico, que a pessoa implementou para esse fim, podendo exercê-lo a qualquer
momento.
Na Previdência Social, o direito adquirido tem grande importância, principalmente
no que diz respeito às aposentadorias. O segurado adquire direito à aposentadoria no
momento em que reúne todos os requisitos necessários para obtê-la, sendo esta regulada pela
lei vigente. As modificações não se lhe aplicam, caso houvesse retroatividade, atingiria o
direito adquirido.
1.2.2 Princípios específicos
São princípios constitucionais da Seguridade Social: universalidade de cobertura e
atendimento, uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços entre as populações
urbanas e rurais, seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços,
irredutibilidade do valor dos benefícios, equidade na forma de participação do custeio,
diversidade da base de financiamento, caráter democrático e descentralizado da
administração.
O princípio da universalidade da cobertura e do atendimento, significa que toda
pessoa que vive no território nacional, tem o direito de ser amparada, não podendo ser
excluída da proteção social
A universalidade da cobertura ensina que todos devem estar cobertos pela proteção
social, toda pessoa que se encontre em estado de necessidade ou de risco tem direito a ser
protegida pelo Sistema de Seguridade Social.
A universalidade do atendimento é a universalidade subjetiva, pois se refere ao
sujeito da relação jurídica, seja ele o segurado ou o seu dependente, e a universalidade da
cobertura é a universalidade objetiva, pois se refere ao objeto da relação jurídica, que é a
prestação de benefícios e serviços e que deve abranger todos os riscos sociais. Este princípio
se aplica a todos os ramos da Seguridade Social.
O princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços entre as
populações urbanas e rurais é resultado de fatos históricos de que no passado o trabalhador
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rural era bastante descriminado em relação ao sistema previdenciário, pois tinha benefícios
de valor inferior ao salário mínimo, pois contribuíam com valores mínimos. Então a partir da
Constituição de 1988, os benefícios recebidos pelos rurais foram elevados ao valor do salário
mínimo.
A Constituição Federal de 1988 uniformizou os direitos das populações urbanas e
rurais.
Este princípio também foi confirmado pela Lei Orgânica da Assistência Social –
LOAS, no artigo 4º, inciso IV, Lei n. 8.742, descrito como princípio da igualdade de direitos
no acesso ao atendimento, sem discriminação de qualquer natureza, garantindo-se
equivalência às populações urbanas e rurais.
O princípio da seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços,
se desdobra em duas fases: a seleção de contingências e distribuição de proteção social.
Sobre a seletividade entende-se que as prestações dos benefícios somente serão
fornecidas aos que realmente necessitam.
Em relação a este princípio o professor Kertzman (2011, p.50). faz a seguinte
análise:
O princípio da seletividade serve de contrapeso ao princípio da universalidade da
cobertura, pois, se de um lado a previdência precisa cobrir todos os riscos sociais
existentes, por outro os recursos não são ilimitados, impondo à administração
pública a seleção dos benefícios e serviços a serem prestados. È o chamado princípio
da reserva do possível.
A distributividade é a aplicação da seletividade de forma justa e igualitária, segundo
o qual os benefícios e prestações serão levadas as pessoas da sociedade que estão em situação
de risco.
O princípio da irredutibilidade do valor dos benefícios garante ao segurado a
irredutibilidade do valor do benefício, ou seja, a sua prestação não pode sofrer redução,
devendo este suprir o mínimo necessário a sobrevivência com dignidade
O artigo 201, § 4º da Constituição Federal, também confirma que é assegurado o
reajustamento dos benefícios para preservar-lhes em caráter permanente o valor real,
conforme critérios definidos em lei.
O princípio da equidade na forma de participação do custeio é um desdobramento do
princípio da igualdade, pois igualdade é tratar de forma desigual os desiguais.
Para se explicar a participação no custeio da seguridade social, leva-se em conta a
capacidade de cada contribuinte, ou seja, deve-se cobrar mais contribuições de quem tem
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maiores condições de pagar, para que aqueles que não tem as mesmas condições possam ser
beneficiados. Este conceito de equidade está ligado a uma idéia de justiça no caso concreto.
No princípio da diversidade da base de financiamento, quer dizer diversidade de
fontes de custeio, e está ligado ao princípio da solidariedade, pois é a sociedade como um
todo que financia os benefícios entregues a população.
A Constituição no seu artigo 195, reza que, toda a sociedade, de forma direta ou
indireta, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios contribui para o sistema.
A finalidade desse ordenamento é diminuir o risco financeiro do sistema de proteção,
pois quanto maior o número de procedência de recursos, será menor o risco de perda
financeira para a seguridade.
Caráter democrático e descentralizado da administração, esse princípio tem o
objetivo de dar segurança e moralidade na administração do sistema. É uma administração
quadripartite, com a participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do
governo nos órgãos colegiados.
Para atender este princípio, se fez necessário a criação de diversos conselhos de
estrutura colegiada, como o Conselho Nacional de Previdência Social - CNPS, Conselho
Nacional de Assistência Social – CNAS, Conselho de Previdência Social – CPS, Conselho de
Gestão de Previdência Complementar – CGPC, entre outros.
Esses Conselhos tem suas atribuições restritas ao campo da formulação de políticas
públicas de seguridade e controle das ações de execução.
1.3 - Custeio da seguridade social
Fontes de custeio são os meios econômicos e, principalmente, financeiros obtidos e
destinados à concessão e manutenção das prestações da seguridade social.
O custeio da Seguridade Social é dever da sociedade. A Constituição Federal de
1988, no artigo 195, dispõe que a Seguridade Social que inclui a saúde, a previdência social e
assistência social, será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, na forma da
lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios, e pelas contribuições sociais previstas nos incisos I a IV.
Na forma direta, o financiamento é feito com o pagamento de contribuições previstas
no artigo 195, incisos I a IV da Constituição Federal, da contribuição para o Programa de
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Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público
(PASEP), artigo 239 da Constituição Federal, destinadas a financiar o programa de seguro
desemprego e o abono previsto no § 3°, pago aos empregados que recebem até dois salários
mínimos de remuneração mensal.
Na forma indireta o financiamento é feito através de recursos orçamentários da
união, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, que devem constar dos respectivos
orçamentos dos entes federativos. Esses recursos que não integram o orçamento da União.
É de se notar que o constituinte atendeu ao princípio da diversidade da base de
financiamento da seguridade social, estabelecendo diversas fontes de custeio (lucro,
faturamento, remuneração dos segurados.).
O artigo 11 da Lei n.8.212, de 20.07.1991, dispõe que no âmbito federal, o
orçamento da seguridade social é composto por receitas da União, receitas das contribuições
sociais e receitas de outras fontes.
O orçamento da seguridade social constará da lei orçamentária anual, de iniciativa do
Poder Executivo Federal, abrangendo todas as entidades e os órgãos a ela vinculados, da
administração direta ou indireta, bem como os fundos e fundações instituídos e mantidos pelo
Poder Público(Constituição Federal, artigo 165, §5º, III).
O artigo 16, parágrafo único da já citada Lei 8.212/91 dispõe que, se houver uma
eventual insuficiência financeira da seguridade social para o pagamento dos benefícios
previdenciários, a União é responsável pela cobertura dessa eventualidade.
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II – DO DIREITO À SAÙDE, À PREVIDÊNCIA SOCIAL E ASSISTÊNCIA SOCIAL.
2.1- A Saúde
A Constituição Federal em seu artigo 196, dispõe:
A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantindo mediante políticas sociais
e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao
acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação.
Como o próprio artigo diz, saúde é direito de todos, isto é, é irrestrito, inclusive para
os estrangeiros que não residem no país, e também não depende de pagamento, até mesmo as
pessoas ricas e as que tem plano de saúde, podem utilizar o serviço público de saúde, não
sendo necessário efetuar qualquer tipo de contribuição para ter direito a este atendimento,
atendendo assim ao princípio da universalidade da cobertura e do atendimento. Da cobertura
porque se dirige a todas as fases: promoção, proteção e recuperação, e do atendimento porque
garante a todas as pessoas o direito isonômico às ações e serviços de saúde. O direito à saúde
é um direito fundamental do ser humano.
A lei n. 8.080, de 19.09.1990, dispõe sobre as condições para a promoção, proteção
e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá
outras providências. O artigo 1° regula, em todo território nacional, as ações e serviços de
saúde, executados isolada ou conjuntamente, em caráter permanente ou eventual, por pessoas
naturais ou jurídicas de direito público ou privado.
Dispõe em seu artigo 2°, que o dever de garantir o direito à saúde não pertence
somente ao Estado, mas também é de responsabilidade das pessoas, da família, das empresas,
e da sociedade.
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O direito à saúde, abrange tanto a saúde física quanto a mental, pois a Constituição
Federal não fez nenhuma distinção, tanto que a Lei n. 8.080/90, em seu artigo 3°, dispõe que,
diz respeito também à saúde as ações que se destinam a garantir ás pessoas e à coletividade
condições de bem estar físico, mental e social. Essas ações são fatores condicionantes e
determinantes da saúde, como a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a
renda, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais, entre outros. As ações do
Estado devem ser direcionadas de maneira preventiva, reduzindo assim o risco de doenças e
outros agravos e garantir acesso universal e igualitário às ações e serviços da saúde, sempre
visando à promoção, proteção e recuperação.
No momento presente, a saúde tem organização completamente diferente da
previdência social, mas no passado fizeram parte da mesma estrutura. Após a extinção do
Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social – INANPS, a saúde é
administrada pelo SUS – Sistema Único de Saúde, vinculado ao Ministério da Saúde.
O Sistema Único de Saúde é financiado com recursos do orçamento da seguridade
social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes.
O artigo 6° da Lei 8.080/90, enumera as atribuições do SUS, das quais se destacam:
execução de ações de vigilância sanitária, de vigilância epidemiológica, de saúde do
trabalhador e de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica, formulação da
política de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos e outros insumos de interesse para
a saúde e a participação na sua formulação e execução da política de sangue e seus derivados.
A Constituição Federal em seu artigo 199, dispõe que a assistência à saúde é livre à
iniciativa privada. Sendo assim as instituições privadas poderão participar
de forma
complementar ao sistema único de saúde, segundo diretrizes deste, mediante contrato de
direito público ou convênio, tendo preferência as entidades filantrópicas e as sem fim
lucrativos.
E vedado, no entanto, a destinação de recursos públicos para auxílios ou subvenções
às instituições privadas com fins lucrativos, ou seja, estas empresas podem participar do
sistema único de saúde, mas não podem receber qualquer espécie de incentivo com recursos
públicos.
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2.2 - Previdência social
A previdência social é um seguro que ampara os seus filiados dos riscos sociais, tem
caráter coletivo, contributivo e de organização estatal.
Constituição Federal dispõe em seu artigo 201, que a previdência social será
organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória,
observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá:
I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte, e idade avançada;
II – proteção à maternidade, especialmente à gestante;
III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário;
IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa
renda;
V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e
dependente.
A previdência social tem como base dois princípios, o da compulsoriedade e o da
contributividade.
O princípio da compulsoriedade obriga a filiação a regime de previdência social aos
trabalhadores que estão trabalhando.
O princípio da contributividade diz que o segurado para ter direito a qualquer
benefício da previdência social, deve contribuir para a manutenção do sistema previdenciário.
A previdência social tem como objetivo a cobertura dos riscos sociais, que são as
adversidades que ocasionam a perda da capacidade para o trabalho e, conseqüentemente, para
a manutenção do sustento, como por exemplo, a idade avançada, a doença permanente, ou
temporária, a invalidez, o parto e etc.
Existem no Brasil três tipos de regimes previdenciários: Regime Geral da
Previdência Social – RGPS, regulado pela Lei 8.212/91 (Plano de Custeio da Seguridade
Social) e Lei 8.213/91 (Plano de Benefícios da Previdência Social) regulamentadas pelo
Decreto n. 3.048/99 (Regulamento da Previdência Social) ; Regimes Próprios de Previdência
Social – RPPS; Regime de Previdência Complementar.
O Regime Geral de Previdência Social divide seus segurados em dois grupos:
segurados obrigatórios e facultativos.
Os segurados obrigatórios, são os maiores de 16 anos, exceto na condição de
aprendiz (começa a trabalhar com 14 anos), que executem
qualquer tipo de atividade
remunerada lícita e com vínculo obrigatório ao sistema previdenciário. A Lei 8.212/91, artigo
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12, e a Lei 8.213, artigo 11, dispõe que são divididos em cinco categorias: empregado (que
tem relação de emprego), empregado doméstico (aquele que presta serviço de natureza
contínua a pessoa ou família, no âmbito residencial deste, em atividade sem fins lucrativos),
contribuinte individual (não tem vínculo de natureza trabalhista), trabalhador avulso (que
presta serviço a diversas empresas, sem vínculo empregatício), e o segurado especial (aquele
que exerce suas atividades em regime de economia familiar). Com essa obrigatoriedade o
legislador quis garantir que todos tivessem cobertura previdenciária, e também que todos
contribuíssem para o custeio, garantindo assim a proteção para o segurado, e desonerando o
Estado de bancar com os custos de atendimento àquele que não pode trabalhar em virtude de
ocorrência de alguma contingência prevista em lei.
O segurado facultativo é aquele que tem idade superior a 16 anos e não exerce
nenhuma atividade remunerada que o vincule obrigatoriamente ao sistema previdenciário. A
inscrição no sistema previdenciário é de sua livre escolha. Essa categoria de segurado
facultativo foi criada para atender ao preceito constitucional da universalidade na cobertura e
no atendimento. A filiação na qualidade de segurado facultativo só produz efeitos a partir da
inscrição e do primeiro recolhimento, não podendo retroagir, e não permitindo o pagamento
de contribuições relativas a competências anteriores à data da inscrição.
O Regulamento da Previdência Social, traz no seu artigo 11, exemplos de segurados
que podem filiar-se facultativamente:
a) a dona-de-casa;
b) o síndico de condomínio;
c) o estudante;
d) o brasileiro que acompanha cônjuge que presta serviço no exterior;
e) aquele que deixou de ser segurado obrigatório da previdência social;
f) o membro do conselho tutelar;
g) o bolsista e o estagiário;
h) o bolsista que dedique tempo integral a pesquisa, mestrado ou doutorado
i) o presidiário.
A natureza dos benefícios previdenciários podem ser programadas, como os que
cobrem o risco da idade avançada, ou não programada como a aposentadoria por invalidez e o
auxílio doença.
Os benefícios previdenciários são: aposentadoria por invalidez, aposentadoria por
idade, aposentadoria por tempo de contribuição, aposentadoria especial, salário-família,
salário–maternidade, auxílio doença, auxílio acidente, pensão por morte e auxílio reclusão.
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2.3 - Assistência Social
A assistência social, instituída pela Lei n. 8.742, de 7 de dezembro de 1993,
conhecida como Lei Orgânica da assistência Social – LOAS, traz a definição legal deste
segmento da seguridade social:
Artigo 1º- A assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de
Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através
de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir
o atendimento às necessidades básicas.
Para Martins, (2002, p.486), assistência social é conceituada como:
Um conjunto de princípios, de regras, e de instituições, destinado a estabelecer uma
política social aos hipossuficientes, por meio de atividades particulares e estatais,
visando a concessão de pequenos benefícios e serviços, independentemente de
contribuição por parte do próprio interessado .
A assistência social tem por objetivos a proteção à família, à maternidade, à infância,
à adolescência e à velhice; o amparo às crianças e adolescentes carentes; a promoção da
integração ao mercado de trabalho; a habilitação e a reabilitação das pessoas portadoras de
deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária e a garantia de 1 (um) salário
mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 65(sessenta e
cinco) anos ou mais, que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou
de tê-la promovida por sua família (art.2 da Lei n. 8742/93).
A Constituição Federal de 1988 também ampara aos que necessitam da assistência,
dispondo em seu artigo 203 que a assistência social será prestada a quem dela necessitar;
portanto, mesmo a pessoa não contribuindo para o sistema previdenciário ela tem o direito ao
benefício, desde que cumpra com os requisitos para o auxílio, entre eles a necessidade do
assistido. É um direito social que está previsto no artigo 6º da Constituição Federal. Assim
ensina o Prof. José Afonso da Silva, (2001, p.806), sobre o tema:
(...) podemos dizer que os direitos sociais, como dimensão dos direitos fundamentais
do homem, são prestações positivas proporcionadas pelo Estado direta ou
indiretamente, enunciadas em normas constitucionais, que possibilitam melhores
condições de vida aos mais fracos, direitos que tendem a realizar a igualisação de
situações sociais desiguais. São, portanto, direitos que se ligam ao direito de
igualdade. Valem como pressupostos do gozo dos direitos individuais na medida em
que criam condições materiais mais propícias ao auferimento da igualdade real, o
que, por sua vez, proporciona condição mais compatível com o exercício da
liberdade.
20
A assistência social é um direito fundamental, totalmente ligado a dignidade da
pessoa humana. O Estado deve realizar ações diversas que atendam às necessidades básicas
do individuo que está em situação crítica de existência humana.
Este instituto tem como propósito central preencher as lacunas deixadas pela
previdência social, já que este é um benefício somente daqueles que contribuem para o
sistema, além de seus dependentes, no entanto muitas pessoas não exercem nenhuma
atividade remunerada, não tendo assim condição alguma de contribuir com a previdência.
Portanto cabe ao Estado manter as pessoas carentes.
O artigo 2° da Lei 8.742/93, dispõe que a assistência social, se destina a combater a
pobreza, e a criar condições para atender contingências sociais e a universalização dos direitos
sociais. A participação da comunidade é feita através de entidades e organizações de
assistência social, que surgem na sociedade atendendo necessidades específicas da
comunidade carente: são as ONGs (Organizações não governamentais), sem fins lucrativos e
que prestam atendimento e assessoramento aos beneficiários da LOAS.
O artigo 5° da LOAS, dispõe sobre as diretrizes da organização da assistência social:
descentralização político administrativa, denominado Sistema Único de Assistência Social
(SUAS) pela Lei 12.435/2011; participação da população e primazia da responsabilidade do
Estado na condução da política de assistência social em cada esfera de governo.
O Sistema Único de Assistência Social (SUAS), tem forma semelhante ao Sistema
Único de Saúde (SUS), a Lei 12.435/2001 pretendeu aperfeiçoar o serviço de assistência
social, integrando os serviços públicos e privados, definindo as responsabilidades das
entidades participantes do sistema, de modo a tornar efetiva a proteção social garantida pelo
artigo 203 da Constituição Federal. A coordenação da Política Nacional de Assistência Social,
cabe ao Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
2.3.1 - Princípios da assistência social
O artigo 4º da Lei 8.742 dispõe os seguintes princípios:
I- supremacia do atendimento às necessidades sociais sobre as exigências de
rentabilidade econômica;
II- universalização dos direitos sociais a fim de tornar o destinatário da ação
assistencial alcançável pelas demais políticas públicas;
21
III- respeito a dignidade do cidadão, a sua autonomia e ao seu direito a benefícios e
serviços de qualidade, bem como a convivência familiar e comunitária, vedando-se
qualquer comprovação vexatória de necessidade;
IV- igualdade de direitos no acesso ao atendimento, sem discriminação de qualquer
natureza, garantindo-se equivalência nas populações urbanas e rurais;
V- divulgação ampla dos benefícios, serviços, programas e projetos assistenciais,
bem como dos recursos oferecidos pelo Poder Público e dos critérios para sua
concessão.
Esses princípios são regras específicas, que servem como orientação às políticas
públicas, destinadas à cobertura pela assistência social, pautadas principalmente pelo respeito
ao princípio da dignidade da pessoa humana.
2.3.2 – Benefício Assistencial
O Beneficio Assistencial é tradicionalmente conhecido como Benefício de Prestação
Continuada (BPC), instituído pela Lei 8.742/93 – LOAS – artigo 20:
O beneficio da prestação continuada é a garantia de um salário mínimomensal à
pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que
comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la
provida por sua família.
A Constituição Federal, em seu artigo 203, inciso V, também prevê este benefício,
garantindo um salário mínimo de benefício mensal à pessoa com deficiência física e ao idoso
com idade à partir de 65 anos, que comprovem não possuir meios de prover à própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei. Considera-se família,
o grupo de pessoas que vivem debaixo do mesmo teto, compreendendo assim o cônjuge, o
companheiro(a), os pais, os filhos (inclusive o enteado e o menor tutelado) e os irmãos. É
considerada família incapacitada de prover a manutenção de pessoa portadora de deficiência
ou idosa aquela cujo cálculo da renda per capita seja inferior a ¼ do salário mínimo.
Para ser beneficiário, não precisa ser contribuinte, basta comprovar a condição de
necessitado.
Em relação ao requisito de deficiência, o artigo 20, § 2º da Lei n. 8.742/93, dispõe
que pessoa portadora de deficiência física é aquela incapacitada para a vida independente e
para o trabalho, em razão de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental,
intelectual ou sensorial.
22
Tanto o deficiente físico quanto o mental podem receber o benefício desde o
nascimento, mas sendo necessário não só a incapacidade para trabalho, mas também o
impedimento para uma vida independente.
No entanto a Súmula 29 da Turma Recursal de Uniformização de Jurisprudência dos
Juizados Especiais Federais, para os efeitos do artigo 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993,
incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais
elementares da pessoa, mas também a impossibilita. Ficando assim entendido pela
jurisprudência que a falta de condições para o trabalho é suficiente para caracterizar a
deficiência para fins de concessão de benefício assistencial.
O requisito da idade para considerar a pessoa como idosa já passou por várias
mudanças, mas com a aprovação do Estatuto do Idoso, Lei n. 10.741 de 2003, a idade mínima
passou a ser de 65 anos. Melhor seria a lei manter a idade, mas ampliar as possibilidades de
obtenção do benefício assistencial.
Antes do Estatuto do Idoso, para concessão de um segundo benefício assistencial, o
valor do primeiro benefício era somado à renda familiar, mas o parágrafo único do artigo 34
da lei alterou essa disposição, o qual ordena que o benefício concedido ao idoso não será
computado para fins do cálculo da renda familiar per capita para a concessão de novos
benefícios assistenciais.
Esta alteração acabou gerando um grande problema, gerando inúmeras ações no
INSS, pois na nova redação, houve exclusão somente do idoso da média da renda familiar, no
entanto se na família houver um beneficiário deficiente, o benefício deste fará parte da renda
familiar, impossibilitando nova concessão assistencial.
O beneficio assistencial não é previdenciário, porém sua concessão e administração
são feitas pelo INSS, em virtude do princípio da eficiência administrativa, pois já possui
estrutura própria por todo o país, com condição de atender aos beneficiários, não havendo
assim necessidade de manter outra estrutura em paralelo.
O Benefício de Prestação continuada tem caráter personalíssimo, sendo no entanto,
intransferível, não gerando direito à pensão por morte, salvo o valor do resíduo não recebido
em vida pelo beneficiário.
Por não ser dependente de contribuição, o benefício não depende de cumprimento de
carência. Também não é necessária a interdição judicial de idosos ou pessoas com deficiência
para requerer o benefício.
O benefício assistencial deve ser revisto a cada dois anos, para comprovação da
continuidade das condições que lhe deram origem.
23
O impedimento da continuidade do pagamento do benefício, conforme artigo 21 da
LOAS, acontecerá quando houver:
I - superação das condições que lhe deram origem;
II – morte do beneficiário;
III – morte presumida do beneficiário, declarada em juízo;
IV – ausência declarada do beneficiário;
V – falta de comparecimento do beneficiário portador de deficiência ao exame
médico pericial, por ocasião de revisão de benefício;
VI – falta de apresentação do idoso ou pela pessoa portadora de deficiência da
declaração de composição do grupo e renda familiar, por ocasião de revisão do benefício.
O benefício será cancelado quando se constatar irregularidade na sua concessão ou
utilização.
O benefício assistencial não poderá ser cumulado com outros benefícios da
Previdência Social ou de qualquer outro Regime Previdenciário, exceto os da assistência
médica e da pensão especial de natureza indenizatória.
A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o
direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.
O benefício somente será concedido ao brasileiro, incluindo o índio, que não for
amparado por nenhum sistema previdenciário ou ao estrangeiro naturalizado e domiciliado no
Brasil, não protegido por sistema previdenciário do seu país de origem.
Existem também os benefícios eventuais definido pelo artigo 22 da LOAS, como
provisões suplementares e provisórias que integram organicamente as garantias do Sistema
Único de assistência social (SUAS) e são prestadas aos cidadãos e as famílias, podendo ser
em razão de nascimento, conhecida como auxílio natalidade; em razão de morte, conhecido
como auxílio funeral e em situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública.
Não são benefícios de prestação continuada, mas sim de caráter eventual, e são
previstos pra socorrer famílias de baixa renda, com o objetivo de atender necessidades
decorrentes de situações emergenciais e temporárias.
O artigo 22, § 3°, dispõe que a concessão e o valor dos benefícios eventuais serão
definidos pelos Estados, Distrito federal e municípios, e deverão ser previstos em suas leis
orçamentárias anuais, com base em critérios e prazos definidos pelos respectivos Conselhos
de Assistência Social.
A Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) prevê em seu artigo 23, a prestação de
serviços socioassistenciais, e os define como atividades continuadas que visem à melhoria de
24
vida da população e cujas ações, voltadas para as necessidades básicas, observem os
objetivos, princípios e diretrizes que estabelece.
A prioridade desses serviços, devem ser voltados para a infância e à adolescência em
situação de risco pessoal e social, e em situação de rua, em cumprimento ao disposto no artigo
227 da Constituição federal e na Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente).
O artigo 24 da LOAS dispõe sobre os programas de assistência social que
compreendem as ações integradas e complementares, com objetivos, tempo e área de
abrangência devem ser definidos para qualificar, incentivar e melhorar os benefícios e
serviços sociais, cabendo aos respectivos Conselhos de Assistência Social definir esses
programas, com prioridade para inserção profissional e social. Quando voltados para o idoso e
a pessoa com deficiência, devem ser articulados com o benefício de prestação continuada.
Exemplos de programas assistenciais: Programa de combate à Exploração Sexual de Crianças
e Adolescentes e Programas de atenção á Pessoa idosa. Os projetos de enfrentamento da
pobreza, são previstos nos artigos 25 e 26 e compreendem investimento econômico-social nos
grupos populares; sua finalidade é subsidiar, financeira e tecnicamente, iniciativas que
garantam meios, capacidade produtiva e de gestão para melhoria das condições gerais de
subsistência, elevação do padrão de qualidade de vida, a preservação do meio ambiente e sua
organização social, mas para realização desses projetos, deverá haver ação articulada e
participação de diferentes áreas governamentais, com a cooperação entre organismos
governamentais, não governamentais e da sociedade civil. São exemplos desses programas: o
programa bolsa Família e Fome Zero.
25
III
–
DA
DIGNIDADE
HUMANA
FACE
A
CONDIÇÃO
DE
MISERABILIDADE
3.1- Conceito de miserabilidade
Para a concessão do benefício assistencial, existe um fator determinante que é o
requisito da necessidade ou, como trata a jurisprudência, miserabilidade.
Então qual seria o conceito legal de miserabilidade ?
A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao regulamentar o art. 203, V,
da Constituição Federal, estabeleceu critérios para que o benefício mensal de um salário
mínimo fosse concedido aos portadores de deficiência e aos idosos que comprovassem não
possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
O art. 20, § 3º da Lei 8.742/1993 tem a seguinte redação: “...considera-se incapaz de
prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal
per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.”
A Constituição Federal em seu artigo 7°, inciso IV, fixa como renda mínima para o
trabalhador um salário mínimo, capaz de atender as suas necessidades vitais básicas e as de
sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e
previdência social. À partir do pressuposto de que o trabalhador tem a garantia de um salário
mínimo para viver dignamente, como será então para a família que tem como integrante um
idoso ou um portador de deficiência? Seria necessário além desse valor para garantir o
mínimo existencial para essas famílias, pois existem muitas situações em que há a
necessidade de mobilizar um membro da família em favor dos cuidados do outro, impedindo
assim de auferir renda.
26
O beneficio assistencial é a garantia do mínimo existencial para aquelas pessoas que
vivem em estado de miséria, é uma garantia fundamental ligada ao princípio da dignidade da
pessoa humana.
3.2- Da constitucionalidade do artigo 20, § 3° da Lei 8.742/93
Para Santos (2012, p.117):
O § 3° do artigo 20 é manifestamente inconstitucional. Não se pode perder de vista
que o BPC é aquela parcela de proteção social que se consubstancia em benefício.
E a CF quer que esse benefício seja a garantia da manutenção da pessoa com
deficiência ou idosa que não tenha ninguém por si. E o fixou em um salário
mínimo. O bem-estar social está qualificado e quantificado na CF: qualificado
porque se efetiva com a implementação dos direitos sociais; quantificado porque a
CF fixou em um salário mínimo a remuneração mínima e o valor dos benefícios
previdenciários, demonstrando que ninguém pode ter seu sustento provido com
valor inferior.
Ao fixar em ¼ do salário mínimo o fato discriminante para aferição da necessidade,
o legislador elegeu discriminen inconstitucional porque deu aos necessitados
conceito diferente de bem estar social, presumindo que a renda per capita superior
a ¼ do mínimo seria necessária e suficiente para a sua manutenção, ou seja, quanto
menos têm, menos precisa ter!
Quantificar o bem-estar social em valor inferior ao salário mínimo é o mesmo que
“voltar para trás” em termos de direitos sociais. A ordem jurídica constitucional e
infraconstitucional não pode “voltar para trás” em termos de direitos fundamentais,
sob pena de ofensa ao princípio do não retrocesso social.
Ocorre que o dispositivo legal em questão foi examinado pelo STF por ocasião do
julgamento da ADI 1.232-DF, em 1998, oportunidade em que os integrantes da Corte
consideraram constitucionais os critérios estabelecidos no parágrafo 3° do artigo 20 da Loas
para o pagamento do benefício, em especial, o que exige uma renda mensal per capita inferior
a ¼ do salário mínimo.
Desde então, o Superior Tribunal de Justiça passou a decidir no sentido de que a
Excelsa Corte não retirou a possibilidade de aferição da necessidade por outros meios de
prova que não a renda per capita familiar. A compreensão do Tribunal Superior caminhou no
sentido de a renda per capita familiar de ¼ do salário mínimo configuraria presunção absoluta
de miserabilidade, dispensando outros provas. Desse modo, suplantando tal limite, outros
meios de prova poderiam ser utilizados para a comprovação da condição de miserabilidade,
expressa na situação de absoluta carência de recursos para a subsistência.
Em suma, o Superior Tribunal de Justiça fixou entendimento de que esse limite de ¼
do salário mínimo não é absoluto, pois deve ser considerado como um limite mínimo, um
27
quantum objetivamente considerado insuficiente à subsistência do portador de deficiência e
do idoso, o que não impede que o julgador faça uso de outros fatores que tenham o condão de
comprovar a condição de miserabilidade do autor.
Esse tema foi enfrentado pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial n°
1.112.557 / MG, julgado sob o rito dos recursos repetitivos e assim ementado:
“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF.
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE
DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO
BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER
CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo
de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa
portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à
própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei
9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e
às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria
manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um
quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a
constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no
julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU
1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa
humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de
subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar
irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única
forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo
para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade
quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado
do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo
qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como
único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se
pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob
pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido. (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO
NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe
20/11/2009)”
Importante registrar que os benefícios assistenciais tem sua porta de entrada no
Judiciário através dos Juizados Especiais Federais – JEF’s e da Justiça Comum Estadual nas
cidades que não são sede de Vara Federal (CF, art. 109, §3°). Os recursos oriundos dos JEF’s
desembocam nas Turmas Recursais, podendo chegar, por meio de incidente, às Turmas
Regionais e Nacional de Jurisprudência e ao Superior Tribunal de Justiça (Lei n. 10.259/2001,
art. 14), e por meio de Recurso Extraordinário, no Supremo Tribunal Federal. Os feitos
28
ajuizados na Justiça Comum desembocam, por meio de apelação, nos Tribunais Regionais
Federais, podendo chegar ao Superior Tribunal de Justiça e ao Supremo pelos recursos
próprios.
Com essa consideração, não é demais averiguar como o tema do benefício
assistencial e o requisito da miserabilidade tem sido tratado, tanto pela Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) quanto pelos Tribunais Regionais
Federais, de modo a evidenciar o entendimento do Judiciário brasileiro no que respeita a esse
tema tão caro à população mais carente do nosso país.
Em recente julgado, a TNU assim se manifestou:
“PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. MENOR DEFICIENTE.
RENDA FAMILIAR PER CAPITA SUPERIOR A ¼ DO SALÁRIO-MÍNIMO.
MISERABILIDADE AFERIDA NO CASO CONCRETO. ENTENDIMENTO DO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE 576.985/MT, RE 580.963/PR E RECL
4.374/PE. INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20 DA LEI 8.742/93
E DO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 34 DO ESTATUTO DO IDOSO.
ENTENDIMENTO DO STJ EM PROCESSO REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA (RESP N. 1.112.557/MG). INCIDENTE PROVIDO.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DO PEDIDO RESTABELECIDA. 1. O autor,
ora recorrente, pretende a modificação do acórdão que, reformando os termos da
sentença, julgou improcedente o pedido de benefício assistencial, sob o fundamento
de não ter sido demonstrada a condição de miserabilidade do autor e de sua família.
Sustenta o recorrente, em suma, que a decisão combatida divergiria da
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do acórdão proferido pela 1ª
Turma Recursal de Mato Grosso. Segundo estes, o fato de a renda familiar per
capita ser superior a ¼ (um quarto) do salário-mínimo não impede a concessão do
benefício assistencial, já que outros fatores podem ser considerados para
constatação da hipossuficiência do requerente. O incidente foi admitido pelo
Presidente desta Turma. 2. Com razão o autor. A 3ª Seção do Superior Tribunal de
Justiça, no julgamento de recurso especial repetitivo (REsp 1.112.557/MG, DJ 2011-2009), uniformizou o entendimento de que é possível a aferição da condição de
hipossuficiência econômica do idoso ou do portador de deficiência, por outros
meios que não apenas a comprovação da renda familiar mensal per capita inferior a
¼ do salário mínimo. Assim, é permitido ao julgador, dada as peculiaridades de
cada caso, fazer uso de outros fatores que tenham o condão de comprovar a
hipossuficiência da parte autora e de sua família. 3. Ademais, o Supremo Tribunal
Federal, por ocasião do julgamento da Reclamação 4.374/PE e dos Recursos
Extraordinários 567.985/MT e 580.963/PR, concluído em 18-4-2013, declarou a
inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93 e do parágrafo único do art.
34 do Estatuto do Idoso. Dessa forma, não havendo mais critério legal para aferir a
incapacidade econômica do assistido, a miserabilidade deverá ser analisada em
cada caso concreto 4. No caso em exame, é de se constatar que o acórdão recorrido,
ao reformar os termos da sentença, divergiu do posicionamento adotado pelo
Superior Tribunal de Justiça, já que desconsiderou a condição de miserabilidade do
autor, negando, por conseguinte, o pagamento do benefício assistencial,
simplesmente em razão de a renda familiar ter superado o limite estabelecido no art.
20, § 3º, da Lei 8.742/93. Frisa-se que o aresto impugnado, ao contrário do que fez
a sentença monocrática, ignorou a presença de outros fatores caracterizadores da
condição de hipossuficiência. 5. Julgamento de acordo com o art. 46 da Lei
29
9.099/95. 6. Incidente conhecido e provido para reformar o acórdão recorrido,
restabelecendo a sentença de procedência da demanda. Condenação do INSS ao
pagamento de honorários advocatícios, que fixo em vinte por cento sobre o valor da
condenação, nos termos da Questão de Ordem n. 2, observada a Súmula 111 do
STJ.Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima
indicadas, decide a Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos
Juizados Especiais Federais dar provimento ao pedido de uniformização, nos
termos do voto-ementa do Relator.(PEDILEF 05023602120114058201, JUIZ
FEDERAL GLÁUCIO FERREIRA MACIEL GONÇALVES, DOU 21/06/2013
pág. 105/162.)
Não é outro o entendimento dos Tribunais Regionais Federais, senão vejamos:
Tribunal Regional da Primeira Região:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. BENEFÍCIO DE AMPARO
SOCIAL À PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA E AO IDOSO. ART. 203,
V, CF/88. LEI 8.742/93. TERMO A QUO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS
DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS.
IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. 1. Presentes os pressupostos legais para a
concessão do benefício de prestação continuada denominado amparo social à
pessoa portadora de deficiência física e ao idoso (art. 203 da CF/88 e art. 2º, V, Lei
8.742/93), pois comprovado que a parte requerente é deficiente e que não possui
meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. O fato
de a renda familiar per capita ser superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo não
impede que outros fatores sejam considerados para a avaliação das condições de
sobrevivência da parte autora e de sua família, fazendo com que a prova da
miserabilidade necessária à concessão do benefício assistencial seja mais elástica.
Precedentes. 3. Termo inicial conforme os termos do item "a" contido na
fundamentação do voto proferido pela relatora. 4. Correção monetária com base nos
índices do Manual de Cálculos da Justiça Federal, até a entrada em vigor da Lei nº
11.960/09, a partir de quando se aplica o IPCA-E. 5. Juros de mora de 1% ao mês,
observados os respectivos vencimentos, reduzindo-se a taxa para 0,5% ao mês a
partir da Lei nº 11.960/09. 6. Nos feitos processados perante a Justiça Estadual, o
INSS é isento do pagamento de custas nos Estados de Minas Gerais, Goiás,
Rondônia e Mato Grosso. 7. Prevalência da regra cunhada na Súmula 111 do STJ
para fins de fixação dos honorários advocatícios. 8. Não tendo ocorrido deferimento
de tutela antecipada, justifica-se a determinação de implantação imediata do
benefício perseguido (art. 461 do CPC), já que eventuais recursos interpostos contra
o presente julgado são desprovidos de efeito suspensivo. Precedentes do STJ. 9. Em
qualquer das hipóteses supra fica expressamente afastada a fixação prévia de multa,
sanção esta que somente é aplicável na hipótese de efetivo descumprimento do
comando relativo à implantação do benefício. 10. Apelação parcialmente provida.
(AC 200701990501079, Desembargadora Federal NEUZA MARIA ALVES DA
SILVA, TRF1 - SEGUNDA TURMA, E-DJF1 - Data::11/09/2013 - Página::269.)
Tribunal Regional da Segunda Região:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITOS DO ART. 273 DO CÓDIGO DE
PROCESSO
CIVIL.
PREENCHIMENTO.
DEFICIÊNCIA.
PROVA
INEQUÍVOCA DA INCAPACIDADE. EXISTÊNCIA. 1. O benefício de Amparo
Social é devido a portador de deficiência incapacitado para a vida independente e
para o trabalho e não possua meios para prover a subsistência própria e nem tê-la
provida por familiares, além de possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do
30
salário mínimo (Lei nº 8.742/93, art. 20). 2. Embora gere presunção absoluta de
miserabilidade, a renda familiar per capita de até ¼ (um quarto) do salário mínimo
não é critério absoluto. A renda superior a esse patamar não afasta o direito ao
benefício se a hipossuficiência econômica restar comprovada por outros meios de
prova. 3. A pessoa com deficiência é aquela que tem impedimentos de longo prazo
de natureza física, intelectual ou sensorial, não configurando a incapacidade
momentânea para a vida independente e para o trabalho no conceito previsto no art.
20, §2º, da Lei nº 8.742/93. 4. Presentes os requisitos cumulativos de existência de
prova inequívoca e de receio de dano irreparável ou de difícil reparação (CPC, art.
273), cabe o deferimento antecipado de benefício assistencial de prestação
continuada.
5.
Agravo
de
instrumento
provido.
(AG 201102010113702, Desembargador Federal MARCELLO FERREIRA DE
SOUZA GRANADO, TRF2 - SEGUNDA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R
- Data::06/08/2012 - Página::118.)
Tribunal Regional da Terceira Região:
AGRAVO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 20, DA LEI Nº 8.742/93.
REQUISITOS LEGAIS PREENCHIDOS. AGRAVO IMPROVIDO. 1. A decisão
agravada foi proferida em consonância com o entendimento jurisprudencial do C.
STJ e deste Tribunal, com supedâneo no art. 557, do CPC, inexistindo qualquer
ilegalidade ou abuso de poder. 2. Não merece reparos a decisão recorrida que,
analisando os elementos de fatos exibidos nestes autos, bem como as provas neles
produzidas, reconheceu a presença dos requisitos necessários à concessão do
benefício assistencial requerido pela parte autora. 3. A Lei nº 8.742/93, art. 20, §3º,
quis apenas definir que a renda familiar inferior a 1/4 do salário mínimo é,
objetivamente considerada, insuficiente para a subsistência do idoso ou portador de
deficiência; tal regra não afasta, no caso em concreto, outros meios de prova da
condição de miserabilidade da família do necessitado. Precedentes do C. STJ. 4.
Agravo
improvido.(AC
00242893620094039999,
DESEMBARGADOR
FEDERAL ROBERTO HADDAD, TRF3 - SÉTIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1
DATA:13/09/2013 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)
Tribunal Regional da Quarta Região:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONCESSÃO. MENOR DE
IDADE. DEFICIÊNCIA E ESTADO DE MISERABILIDADE COMPROVADOS.
SENTENÇA REFORMADA. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Inexistindo critério
numérico atual tido por constitucional pelo Supremo Tribunal Federal para aferição
da pobreza, e tendo sido indicado, no julgamento da Rcl. nº 4374, a razoabilidade
de considerar o valor de meio salário mínimo, conforme as Leis nº 10.836-04
(Bolsa Família), 10.689-03 (Programa Nacional de Acesso à Alimentação) e
10.219-01 (Bolsa Escola), tal parâmetro deve ser utilizado como balizador para
aferição do estado de miserabilidade. 2. Não há impedimento à concessão de
benefício assistencial de prestação continuada a menor de idade. 3. Tendo restado
demonstrados a deficiência e o estado de miserabilidade, é de ser reformada a
sentença para conceder à parte autora o benefício assistencial, desde a data do
requerimento administrativo. 4. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão
naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de
decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de
cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a
necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). .(AC
0082595420134049999, DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA
PINTO SILVEIRA, TRF4 - SEXTA TURMA, D.E. DATA:05/08/2013)
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Tribunal Regional da Quinta Região:
PREVIDENCIÁRIO. AMPARO SOCIAL. INEXISTÊNCIA DE PRESCRIÇÃO.
PREJUDICIAL DE MÉRITO AFASTADA. ARTIGO 203 DA CF/88. LEI Nº
8.742/93 E DECRETO Nº 6.214/2007. DEFICIENTE. COMPROVAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO.
TERMO INICIAL. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. I. A
prescrição nas ações em que se pleiteia o restabelecimento de benefícios
assistenciais ou previdenciário em razão de incapacidade, persistindo a morbidade,
não atinge o fundo de direito, mas apenas as parcelas anteriores aos cinco anos do
ajuizamento da ação, exatamente por se tratar de prestações de trato sucessivo,
conforme reiteradamente vem decidindo este egrégio Tribunal Regional Federal. II.
Para a concessão do benefício de amparo social, o requerente deverá comprovar ser
deficiente ou idoso, e não possuir meios de prover a sua própria subsistência ou de
tê-la provida por sua família, considerando-se como tal, a família que possua renda
per capita inferior a 1/4 do salário mínimo, nos termos da Lei n. 8.742/93 e Decreto
n. 1.744/93. III. A deficiência da autora restou comprovada por meio do laudo
pericial (fls. 81/82v), que concluiu ser a demandante portadora de hipertensão
arterial, diabetes mellitus com complicações e obesidade mórbida, estando inapta
para o trabalho. IV. No que se refere à condição de miserabilidade, o disposto no
parágrafo 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93, embora não fira a Constituição Federal,
conforme assinalado pelo STF, não é o único meio de comprovação da
miserabilidade do requerente, devendo a respectiva aferição ser feita, também, com
base em elementos de prova colhidos ao longo do processo, observada as
circunstâncias específicas relativas ao postulante do benefício. In casu, restou
comprovada a condição de miserabilidade da parte autora através do laudo social
realizado nos autos (fls. 132/134). V. Inocorrência de prescrição considerando que
o processo de concessão de benefício foi recebido no judiciário. Assim, sobre o
termo inicial da obrigação, deve ser considerada a data do ajuizamento da ação. VI.
A Lei nº 11.960/09, de 29/06/2009, deve ser aplicada para fins de correção
monetária e juros de mora a partir de sua publicação, havendo a incidência uma
única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e
juros aplicados à caderneta de poupança. No que tange aos valores referentes a
período anterior à entrada em vigor da Lei nº 11.960/09, a correção monetária deve
ser realizada de acordo com os índices do Manual de Orientação de Procedimentos
para os Cálculos na Justiça Federal. VII. Honorários advocatícios fixados no
percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observando-se o
disposto na Súmula nº 111 do STJ. VIII. Apelação provida. (AC
00019976020124058103,
Desembargadora
Federal
MARGARIDA
CANTARELLI, TRF5 – QUARTA TURMA , DJE - Data::08/08/2013 Página::401.)
Notamos então que a dignidade da pessoa humana está acima das normas
positivadas, podendo então o julgador fazer uso de outros fatores que comprovem a condição
de miserabilidade, pois pode acontecer da renda familiar ser superior a ¼ do salário mínimo,
mas não ser suficiente para proporcionar uma vida digna à seus membros, ainda mais se
tratando de idoso e deficiente, os quais necessitam de uma atenção especial em relação a
alimentação e medicamentos, e também precisam do acompanhamento integral de uma pessoa
da família, ficando esta impossibilitada de manter um trabalho assalariado, sendo então o
benefício assistencial a garantia para um mínimo existencial do beneficiário.
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Para entender melhor o que seria esse mínimo existencial, Barcelos (2002, p.260)
busca definir em termos mais concretos esse conceito, enumerando, com base na Constituição
Federal, os itens que o integram. Para a autora, fazem parte de conceito de mínimo existencial
a educação fundamental, à saúde básica, a assistência aos desamparados e o acesso à justiça.
A autora enumera tais parcelas como integrantes do mínimo existencial com base no princípio
da dignidade da pessoa humana, a qual a Constituição Federal, em seu artigo 1°, inciso III,
empresta a adjetivação de “princípio fundamental”. A relação entre a dignidade da pessoa
humana e as parcelas que compõem o mínimo existencial é ressaltada por Silva (2002, p.149),
que mostra o verdadeiro sentido desse princípio:
Não basta, porém, a liberdade formalmente reconhecida, pois a dignidade da pessoa
humana, como fundamento do Estado Democrático de Direito, reclama condições
mínimas de existência, existência digna conforme os ditames da justiça social,
como fim da ordem econômica. É de se lembrar que constitui um desrespeito à
dignidade da pessoa humana um sistema de profundas desigualdades, uma ordem
econômica em que inumeráveis homens e mulheres são torturados pela fome,
inúmeras crianças vivem na inanição, a ponto de milhares delas morrerem em tenra
idade. Não é concebível uma vida com dignidade entre a fome, a miséria e a
incultura, pois a liberdade humana com freqüência se debilita quando o homem cai
na extrema necessidade, a igualdade e a dignidade da pessoa exigem que se chegue
a uma situação social mais humana e mais justa. Resulta escandaloso o fato das
excessivas desigualdades econômicas e sociais que se dão entre os membros ou os
povos de uma mesma família humana. São contrárias à justiça social, à equidade, à
dignidade da pessoa humana e à paz social e internacional.
Leivas (2002, p.106), também traz um conceito bastante completo de mínimo
existencial:
O mínimo existencial é a parte do consumo corrente de cada ser humano, seja
criança ou adulto, que é necessário para conservação de uma vida digna, o que
compreende a necessidade de vida física, como a alimentação, o vestuário, moradia,
assistência de saúde, etc.(mínimo existencial físico) e a necessidade espiritualcultural, como educação, sociabilidade, etc. Compreende a definição do mínimo
existencial tanto a necessidade física como também a cultural-espiritual, então de
fala de um mínimo existencial cultural.
O objetivo do beneficio de prestação continuada, é de garantir o direito de
sobrevivência aos idosos e aos portadores de deficiência que não possuam condições de se
manterem sozinhos, e nem com o auxílio de sua família, é uma garantia fundamental, que
concede ao cidadão o mínimo existencial.
O Estatuto do Idoso (Lei n.10.341/2003), no artigo 34, parágrafo único dispõe que “o
benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será
computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere o LOAS”, ou seja,
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o valor do amparo de um idoso não é contado como renda familiar, caso outro idoso que
pertença ao mesmo grupo venha requerer o mesmo benefício. O legislador quis contemplar o
idoso, mas o mesmo não aconteceu com o portador de deficiência, ficando este em situação de
desvantagem, pois até o presente momento não existe nenhum dispositivo legal que trate o
portador de deficiência da mesma forma.
No entanto da mesma forma que o idoso necessita do auxílio de recursos financeiros,
o portador de deficiência também necessita, tanto que foram tratados na Lei n. 8.742/93 no
mesmo dispositivo legal, pois ambos possuem carências similares, desta forma não se justifica
tratar de forma desigual os iguais, pois estaria ferindo o princípio da igualdade consagrado
pela Constituição de 1988.
Uma discussão bastante atual reside na possibilidade de aplicação analógica do
disposto no parágrafo único do artigo 34, da Lei 10.741/2003, para afastar do cômputo da
renda per capita familiar o benefício previdenciário recebido por outro membro da família,
seja idoso ou deficiente.
A matéria é tema de recurso repetitivo no Superior Tribunal de Justiça (REsp nº
1.355.052 / SP), ainda não julgado, mas com a seguinte descrição:
Controvérsia estabelecida na seguinte tese: o benefício previdenciário ou
assistencial, no valor de um salário mínimo, recebido por idoso ou deficiente que
faça parte do núcleo familiar, não deve ser considerado na aferição da renda per
capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93 ante a interpretação do que
dispõe o artigo 34, parágrafo único, da Lei n. 10.741/03 (Estatuto do Idoso) .
Dada a relevância da questão e sua influência na análise dos pedidos de benefício
assistencial, a matéria foi também levada ao Supremo Tribunal Federal, e examinada no RE
580.963 / PR, sob o rito da repercussão geral. Conquanto o julgamento tenha se realizado em
abril/2013, o acórdão ainda não foi publicado, o que impede se considere como definitiva a
posição da Suprema Corte, uma vez que sujeita a recurso.
O desafio, como se vê, extrapola o simples conceito de miserabilidade e avança sobre
a efetiva fórmula de cálculo da renda per capita familiar. Se no grupo familiar já existe um
idoso ou deficiente contemplado com benefício assistencial ou previdenciário, deveria seu
rendimento integrar o cômputo da renda per capita?
Por exemplo: se em uma casa moram apenas um casal de idosos, maiores de 65 anos,
sem qualquer fonte de renda, ambos terão o direito ao benefício assistencial, já que para o
idoso, um benefício de prestação continuada não será levado em consideração no cálculo da
renda per capita. Mas a mesma situação não ocorre com um dos idosos aposentado,
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recebendo um salário mínimo, ou no caso se um for portador de deficiência, sendo menor de
65 e que tenha o beneficio, neste caso, a renda ultrapassaria o mínimo fixado na Lei Orgânica
da Assistência Social – LOAS.
Vários julgados tem concedido o beneficio assistencial através da interpretação
analógica, considerando que benefícios previdenciários cujo valor seja de um salário mínimo
não deve ser computado como renda familiar, uma vez que as rendas mensais do benefício
assistencial e o previdenciário com valor igual a um salário mínimo, possuem a mesma
expressão, não podendo a natureza do benefício servir de impedimento, se o estado de
miserabilidade tenha o mesmo caráter econômico.
Portanto, os princípios da igualdade, razoabilidade e o da dignidade humana, faz com
que seja permitido a interpretação extensiva do dispositivo para as situações de grupos
familiares que são compostos por uma pessoa portadora de deficiência e um idoso ou grupos
familiares formados por dois portadores de deficiência, sendo devido, tanto numa situação
como em outra, ainda que se compute renda bruta familiar superior a ¼ de salário mínimo per
capita. O tratamento desigual entre idosos e portadores de deficiência é discriminatória, no
sentido de que ambos estão sujeitos a situações de extrema necessidade que podem resultar na
perda da dignidade humana.
O Estatuto do idoso (Lei 10.741/2003, art. 34, parágrafo único) já permite seja
deduzido da renda total da família o benefício assistencial concedido a outro idoso. O Instituto
Nacional do Seguro Social – INSS, consoante se extrai da manifestação do Min. Gilmar
Mendes no RE 580.963 / PR, ressalta que a legislação é clara e deve, portanto, ser
interpretada restritivamente, ou seja, repele qualquer interpretação extensiva à hipótese
excepcional criada pelo legislador, sob pena de afronta aos princípios da legalidade, da
independência dos poderes (juiz não pode atuar como legislador positivo) e da reserva legal
(art. 2°, art. 44, caput, art. 48, caput, art. 59, III e art. 203, V, da Constituição Federal).
Com essa posição, o INSS sustenta ser defeso ao intérprete aferir a efetiva
necessidade do auxílio no caso concreto. Defende que a hipótese normativa contida no
Estatuto do Idoso não contempla a exclusão de benefício previdenciário, mas somente
assistencial. De igual forma, o benefício de prestação continuada auferido por deficiente não
poderia ser excluído, uma vez que inexiste previsão legal que ampare essa providência.
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3.3- Posição atual do Supremo Tribunal Federal
Como já registrado em linhas anteriores, a matéria relativa ao benefício assistencial
foi levada à Excelsa Corte, tanto no que se refere ao quesito da renda per capita
caracterizadora do estado de miserabilidade (RE 567985) quanto no tocante à possibilidade de
exclusão do cálculo do rendimento, de benefício previdenciário ou assistencial percebido por
outro membro do grupo familiar, seja ele idoso ou portador de deficiência (RE 580963). Os
recursos citados foram julgados sob o rito da repercussão geral. Ocorre que os acórdãos ainda
não foram publicados, o que não prejudica a compreensão sobre o posicionamento atual do
Supremo Tribunal Federal sobre esses temas, já que também examinados nos autos da
Reclamação 4374, assim ementada:
“Benefício assistencial de prestação continuada ao idoso e ao deficiente. Art. 203,
V, da Constituição. A Lei de Organização da Assistência Social (LOAS), ao
regulamentar o art. 203, V, da Constituição da República, estabeleceu critérios para
que o benefício mensal de um salário mínimo fosse concedido aos portadores de
deficiência e aos idosos que comprovassem não possuir meios de prover a própria
manutenção ou de tê-la provida por sua família. 2. Art. 20, § 3º da Lei 8.742/1993 e
a declaração de constitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal na
ADI 1.232. Dispõe o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 que “considera-se incapaz de
prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja
renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo”. O
requisito financeiro estabelecido pela lei teve sua constitucionalidade contestada, ao
fundamento de que permitiria que situações de patente miserabilidade social fossem
consideradas fora do alcance do benefício assistencial previsto constitucionalmente.
Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo
Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3.
Reclamação como instrumento de (re)interpretação da decisão proferida em
controle de constitucionalidade abstrato. Preliminarmente, arguido o prejuízo da
reclamação, em virtude do prévio julgamento dos recursos extraordinários 580.963
e 567.985, o Tribunal, por maioria de votos, conheceu da reclamação. O STF, no
exercício da competência geral de fiscalizar a compatibilidade formal e material de
qualquer ato normativo com a Constituição, pode declarar a inconstitucionalidade,
incidentalmente, de normas tidas como fundamento da decisão ou do ato que é
impugnado na reclamação. Isso decorre da própria competência atribuída ao STF
para exercer o denominado controle difuso da constitucionalidade das leis e dos
atos normativos. A oportunidade de reapreciação das decisões tomadas em sede de
controle abstrato de normas tende a surgir com mais naturalidade e de forma mais
recorrente no âmbito das reclamações. É no juízo hermenêutico típico da
reclamação – no “balançar de olhos” entre objeto e parâmetro da reclamação – que
surgirá com maior nitidez a oportunidade para evolução interpretativa no controle
de constitucionalidade. Com base na alegação de afronta a determinada decisão do
STF, o Tribunal poderá reapreciar e redefinir o conteúdo e o alcance de sua própria
decisão. E, inclusive, poderá ir além, superando total ou parcialmente a decisãoparâmetro da reclamação, se entender que, em virtude de evolução hermenêutica,
tal decisão não se coaduna mais com a interpretação atual da Constituição. 4.
Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de
inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do
Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à
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aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela
LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de contornar o
critério objetivo e único estipulado pela LOAS e avaliar o real estado de
miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente,
foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para concessão de
outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa
Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à
Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que
autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a municípios que
instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações
socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a
rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios
objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização
decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas
(sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como
critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado
brasileiro). 5. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de
nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 6. Reclamação constitucional julgada
improcedente
(Rcl 4374, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em
18/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-173 DIVULG 03-09-2013 PUBLIC
04-09-2013)”
Em seu voto, o relator da reclamação, ministro Gilmar Mendes, defendeu a
possibilidade de o Tribunal “exercer um novo juízo” sobre a ADI 1232, considerando que nos
dias atuais o Supremo Tribunal Federal não tomaria a mesma decisão. O ministro observou
que ao longo dos últimos anos houve uma “proliferação de leis que estabeleceram critérios
mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais”. Nesse sentido, ele citou
diversas normas, como a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que
instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; e a Lei 10.219/2001, que criou o
Bolsa Escola.
Conforme destacou o relator, essas leis abriram portas para a concessão do benefício
assistencial fora dos parâmetros objetivos fixados pelo artigo 20 da Loas, e juízes e tribunais
passaram a estabelecer o valor de meio salário mínimo como referência para aferição da renda
familiar per capita.
Prosseguindo, o ministro afirmou ser “fácil perceber que a economia brasileira
mudou completamente nos últimos 20 anos. Desde a promulgação da Constituição, foram
realizadas significativas reformas constitucionais e administrativas com repercussão no
âmbito econômico e financeiro. A inflação galopante foi controlada, o que tem permitido uma
significativa melhoria na distribuição de renda”, destacando que esse contexto proporcionou
que fossem modificados também os critérios para a concessão de benefícios previdenciários e
assistenciais se tornando “mais generosos” e apontando para meio salário mínimo o valor
padrão de renda familiar per capita.
37
Mendes sustentou que “os programas de assistência social no Brasil utilizam
atualmente o valor de meio salário mínimo como referencial econômico para a concessão dos
respectivos benefícios”. Ele ressaltou que este é um indicador bastante razoável de que o
critério de um quarto do salário mínimo utilizado pela Loas está completamente defasado e
inadequado para aferir a miserabilidade das famílias, que, de acordo com o artigo 203, inciso
V, da Constituição, possuem o direito ao benefício assistencial.
Conforme asseverou o ministro, ao longo dos vários anos desde a sua promulgação,
a norma passou por um “processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças
fáticas, políticas, econômicas, sociais e jurídicas”. Com esses argumentos, o ministro votou
pela improcedência da reclamação, consequentemente declarando a inconstitucionalidade
incidental do artigo 20, parágrafo 3º, da Loas, sem determinar, no entanto, a nulidade da
norma.
Ao final, por maioria, o Plenário julgou improcedente a reclamação, vencido o
ministro Teori Zavascki, que a julgava procedente. Os ministros Dias Toffoli, Ricardo
Lewandowski e Joaquim Barbosa votaram pelo não conhecimento da ação.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Constituição Federal de 1988 consagrou em seu texto os direitos fundamentais,
sociais, e entre eles está o direito ao beneficio assistencial, com o intuito de proteger o idoso e
a pessoa portadora de deficiência que não possuem meios de prover a sua própria
manutenção, ou de tê-la provida por sua família, garantindo-lhes o recebimento de um salário
mínimo, buscando assegurar-lhes um mínimo existencial para a garantia da dignidade da
pessoa humana. O art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 (LOAS), estabeleceu um critério objetivo
ao considerar incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a
família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo. No
entanto esse requisito vem dificultando o acesso de muitas pessoas ao amparo constitucional.
Referida fração, estabelecida em 1993, há muito deixou de fazer justiça à população mais
carente do Brasil. Em muitas situações a renda per capita ultrapassa referido quantum, mas a
situação familiar é de absoluta miserabilidade. Muitos magistrados, pelo apego à letra da lei,
deixam de conceder o benefício assistencial ao fundamento de que a renda familiar ultrapassa
o parâmetro legal, ou seja, têm por ausente o requisito da miserabilidade. Os Tribunais
Regionais Federais, a Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados
Especiais Federais, e o próprio Superior Tribunal de Justiça vêm se orientando em sentido
diverso. Para eles, ainda que a renda per capita ultrapasse um quarto do salário mínimo, isso
não impede a concessão do benefício, uma vez que o requisito da miserabilidade passa a ser
aferido no caso concreto por outros meio de prova. Examinando a ADI n. 1.232, julgada em
27/08/1998, o STF decidiu pela constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. O tema foi
novamente levado a apreciação do STF, tanto no que se refere ao quesito da renda per capita
caracterizadora do estado de miserabilidade (RE 567985) quanto no tocante à possibilidade de
exclusão do cálculo do rendimento, de benefício previdenciário ou assistencial percebido por
outro membro do grupo familiar, seja ele idoso ou portador de deficiência (RE 580963). Os
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recursos citados foram julgados sob o rito da repercussão geral, restando declarada a
inconstitucionalidade incidental do art. 20, § 3°, da LOAS, sem determinar, no entanto, a
nulidade da norma. Os acórdãos ainda não foram publicados, o que não prejudica a
compreensão sobre o posicionamento atual do Supremo Tribunal Federal sobre esses temas, já
que também examinados nos autos da Reclamação 4374, j. 18/04/2013. Com esse novo
entendimento da Suprema Corte, espera-se um maior alcance social do benefício assistencial,
uma vez que alcançará milhares de ações em trâmite nas mais longínquas comarcas
brasileiras, cometendo ao magistrado singular a tarefa de averiguar, no caso concreto, a
presença da miserabilidade a partir de um critério mais elástico de apreciação desse requisito,
sobretudo em considerando que os principais benefícios de renda mínima do Governo Federal
já partem de uma renda per capita de meio salário mínimo.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BALERA, Wagner. Noções Preliminares de Direito Previdenciário. São Paulo: Quartier
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TAVARES, Marcelo Leonardo. Previdência e assistência social. Legitimação e
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41
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