DIACONIA: AMOR EM AÇÃO

Transcrição

DIACONIA: AMOR EM AÇÃO
Ester Persike
DIACONIA: AMOR EM AÇÃO
Curitiba
* FTBP
2007
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*Faculdade Teológica Batista do Paraná
INTRODUÇÃO
A ideia de escrever sobre Diaconia veio da vontade de conhecer melhor o que
essa palavra significa e de um profundo desejo de viver de forma mais autêntica a
missão dada por Jesus aqueles que foram e seriam seus discípulos e isso inclui a
igreja de nossos dias.
O trabalho está dividido em 03 capítulos:
1 - Diaconia na Bíblia
2 - Diaconia de Jesus
3 - Diaconato feminino e a obra diaconal de Theodor Fliedner ( de onde surgiu a
inspiração para o modelo que exercemos).
Este trabalho foi escrito no ano de 2007 e já avançamos em estudos, no
conhecimento e entendimento sobre Diaconia , mas convido a todos a lerem para
que assim como eu sejam impactados pela forma como Jesus realizou sua
Diaconia.
Jesus Cristo é considerado um exemplo, por excelência, do que é o serviço de
diácono. Ele serviu a Deus em obediência, e isto incluiu sua visita até nós para
servir a humanidade, ensinando-a assim a conduta de humildade para o serviço.
Ser servo não é ser menor, pelo contrário, se observarmos os ensinamentos de
Jesus com seus discípulos, podemos ver exatamente o contrário. “Quem quiser
tornar-se importante entre vós, deverá ser servo” (Biblia, N.T. Mc 10.43). O termo
diaconia tem uma abrangência muito grande, fazendo-se necessário verificar os
vários textos que Jesus e outros autores biblícos usaram para mostrar a diaconia.
No Antigo Testamento apenas é possível observar reflexos de diaconia, pois o
termo propriamente dito não é encontrado, salientando que essa possibilidade é
viável devido ao conceito que o Novo Testamento traz sobre a diaconia.
A diaconia que Jesus realizou será tratada mais especificamente, porque Ele foi o
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maior diácono e é a partir de Jesus que estes conceitos (diaconia
e servir)
ganham um significado claro e específico, sem contar que o exemplo de Jesus
realizando diaconia é o que pode ser chamado de amor em ação. Jesus servia às
pessoas de forma abnegada, livre e não se importava se eram amigas ou
estrangeiras. Ele tinha a sensibilidade de poder detectar a necessidade das
pessoas e ajudava não só naquele momento que as pessoas se chegavam a Ele
com suas necessidades, mas conseguia levá-las à reflexão de nova possibilidade
de vida. A atitude de doar-se em favor do outro, de servir em amor, o qual era a
origem e o alvo da diaconia de Jesus deveria influenciar cada pessoa que é
discípulo de Jesus.
A obra diaconal de Theodor Fliedner será vista devido a ser um exemplo prático
de resultados efetivos de diaconia e também por ser um influenciador e renovador
do ministério das diaconisas no século XIX, tornando-se um instrumento chave de
Deus para este ministério dentro de uma fé evangélica.
Fliedner tinha uma
paixão em servir as pessoas excluídas da sociedade em sua época, por exemplo
presidiárias. As crianças também eram uma grande preocupação dele e de sua
esposa, que os levou a fundar e inspirar outros a criar instituções que pudessem
acolher e ajudar aqueles que necessitavam. Para isso apostou firmemente no
ministério de mulheres chamadas de diaconisas, as quais se sentiam chamadas
para realizar tal obra, e esta não seria tão bem sucedida sem a ajuda
coragem dessas mulheres, que
e a
na fase inicial estas atividades abrangiam a
assistência nos asilos e prisões.
1. DIACONIA NA BÍBLIA
De acordo com o Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento
(DTNT) a palavra diaconia deriva do vocábulo grego diakoneo (verbo) e diakonia
(substantivo) que por sua vez comportam os seguintes significados: servir, apoiar,
serviço, cargo, ajuda, sustento, distribuição de esmolas, assistência e também
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cargo de diácono ( DTNT, 2000, p.2341-2342).
A igreja descrita no Novo Testamento possui uma forte ligação com o início do
ministério diaconal. Ainda que o Antigo Testamento tenha o conceito do serviço e
contenha o mandamento do amor ao próximo (Lv 19.8), e que Israel conhecesse
atos de caridade, assim como no Oriente Médio antigo de modo geral, diakoneo
não se acha na LXX (GLAAB, 2005, p.42; DTNT, 2000, p. 2342). Isso indica que
não havia um ensino claro e evidente que pode ser identificado objetivamente
como diaconia no Antigo Testamento. Porém é possível encontrar menção de
atividades de diaconia em Israel antes de Jesus. Isso só é possível ser verificado
mediante o conceito de diaconia que o Novo Testamento apresenta de forma
objetiva e efetiva.
O mundo judaico, pela versão da LXX, não conhece o termo diaconia, porque o
judaísmo não via que o servir era algo importante, a não ser que servisse a
alguém de grande importância ou ao próprio Deus (GLAAB, 2005, p.42). Flavio
Josefo dá 3 sentidos à diaconia como: serviço à mesa, obedecer ou prestar
serviço sacerdotal (BEYER, Diakoneo. In. GLNT). No seu testemunho sobre os
essênios JOSEFO menciona que eles não se casavam, não tinham servos, antes
ministravam uns aos outros (JOSEFO, Antiguidades Judaicas 18,21). No
DOCUMENTO DE DAMASCO 14.12 menciona as contribuições singulares para
os necessitados, pobres e idosos como diaconia. No judaísmo da época de Jesus
as responsabilidades sociais eram levadas a efeito principalmente mediante as
esmolas, não por serviços conforme Lc 10.30-35. O serviço humilde, por exemplo,
servir à mesa, era considerado abaixo da dignidade de um homem livre de acordo
com Lc 7.36-50.
Havia no entanto cuidados organizados para os pobres onde esses recebiam
dinheiro suficiente para as refeições de uma semana a cada sexta-feira; também
os estrangeiros recebiam comida diariamente, comida esta coletada antes, de
casa em casa, dos oficiais aos pobres (JEREMIAS,1983, p.159-169). Na
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diáspora, as sinagogas frequentemente estabeleciam uma comissão de sete para
seu serviço. Este grupo era chamada de parnasim, palavra que significa
alimentar, nutrir, sustentar, governar. O parnas, ou diácono, era uma espécie de
juiz da sinagoga e de cada um deles se requeria doutrina e sabedoria, a fim de
que pudessem discernir e passar jugalmento justo, tanto nas questões sagradas
quanto civis (MARTINS, 2002, p.58), e especialmente deve ter sua referência
ligada diretamente ao serviço à mesa em geral (DTNT, 2000, p. 2342).
No Antigo Testamento, não aparece a palavra diakonia, por ser uma palavra de
origem grega. Mas partindo do conceito que diaconia é servir ao próximo, movido
pelo amor de Deus,
e que isso envolve também cuidado, envolvimento e
comprometimento é possível perceber o conceito de diaconia presente em textos
do Antigo Testamento. De certa forma, todos os profetas foram servos do Senhor,
pois estavam à serviço de Deus para o próximo, ou seja, estavam realizando
diaconia. Os levitas também eram servos: não só do templo, de Deus, mas
também das pessoas porque
cuidavam da casa de Deus e
ensinavam as
pessoas.
Mas é no Novo Testamento que esse conceito, na pessoa de Jesus, adquire
maior sentido. Como já visto, quem servia eram
os escravos, as mulheres,
pessoas que não tinham direito a nada; pessoas sem liberdade e que eram
obrigadas a prestar serviço (BORTOLINI, p. 38). Na verdade elas não serviam,
prestavam serviço, o que é diferente. Jesus inverteu essa situação, sendo o
próprio exemplo de servir por amor e voluntariedade. Quando Jesus se aproxima
das mulheres, dos pobres, dos doentes, dos excluídos, dos cobradores de
impostos, que eram considerados nada, mas que de alguma maneira precisavam
de algum auxilio, era a diaconia que falava mais alto, o amor a essas pessoas
que estavam à margem da sociedade. Jesus não somente serviu aos pobres,
mas a todos que cruzaram seu caminho e que precisavam dele. Realmente Jesus
dinamizou o conceito da diaconia, estendendo a todas as pessoas necessitadas,
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sejam quais fossem as necessidades.
Quando Jesus lava os pés dos discípulos (Jo 13 1.17), ensina uma grande lição:
“quem quiser ser o maior deve ser o menor, o que lava os pés dos outros”. Os
seus discipulos puderam ter uma grande lição de diaconia e assim levar este
conceito por onde quer que fossem. Os discípulos aprendem o sentido de servir e
ser servido que é diaconia. Após a morte de Jesus, os discípulos enviados eram
itinerantes, e foram instruídos a não levar nada, além do necessário, contavam
então com a diaconia das pessoas por onde passavam, tanto para continuar seu
trabalho como para atendê-los, como foi o caso de Dorcas que atendia às
pessoas carentes, costurando e fazendo boas obras (At 9) e Lídia que hospedou
Paulo (At 16 11-15).
Então percebe-se que a diaconia ganha uma abrangência maior do que
simplesmente servir às mesas, cada um conforme o dom que recebeu pode e
deve praticar a diaconia, umas às outras, cumprindo o mandamento do Senhor
que é amar ao próximo como a si mesmo. Os discípulos aprenderam a abrir mão
da sua ambição, a exemplo de Jesus, que nunca se fez grande, nem o maior, e
serviram (BIBLIA, N.T. Fp 2.6-8). Essa lógica de servir é contrária a do mundo; é
sinal de libertação. Se todos os seguidores de Jesus a seu exemplo servissem
como Ele, todo o quadro social seria diferente. Jesus através da diaconia libertou,
e liberou o fermento da transformação, no qual todos que cruzaram Seu caminho
foram resgatados de sua situação de miséria, seja ela qual for.
1.1 Diakoneo (verbo):
Este verbo é encontrado no Novo Testamento como significado de “servir à mesa”
em Mt 8.15, Mc 1.31, Lc 4.39; 10.40; Jo 12.2, At 6.2. Acha-se também com o
sentido de “cuidar de” em Mt 27.55, Mc 15.41, Lc 8.3 no contexto de servir a
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indivíduos, em 2 Tm 1.18; Hb 6.10; 1 Pe 4.10-11 no contexto da igreja.
No Evangelho de Lucas 10.40 o serviço doméstico, o qual era realizado para
preparar refeições aos convidados, basicamente servir as mesas era chamado de
diaconia: “Marta, porém estava ocupada com muito serviço [diakonia]. Então
aproximando-se de Jesus perguntou: Senhor, não te importas que minha irmã
tenha me deixado sózinha com o serviço [diakoneo]? Dize-lhe que me ajude”.
Diakoneo era usado para se referir ao serviço de distribuição de alimentos aos
necessitados, por exemplo o atendimento às viúvas: “Por isso os Doze reuniram
todos os discípulos e disseram: 'Não é certo negligenciarmos o ministério da
Palavra de Deus, afim de servir [diakoneo] às mesas. Irmãos, escolham entre
vocês sete homens de bom testemunho, cheio do Espírito e de sabedoria.
Passaremos a eles essa tarefa e nos dedicaremos a oração e ao ministério
[diakonia] da palavra'” (Biblia, N.T. At 6.2-4). Muitos enxergam aqui o início do
“cargo” de diáconos na igreja. Também é daqui que se conclui de que o trabalho
do diácono é essecialmente atender pessoas com necessidades físicas e
materiais.
Provavelmente [diakoneo] tem um significado mais amplo, de maneira geral,
também diz respeito ao ter cuidado por pessoas que necessitam de auxílio: “E
eles lhe perguntarão: Senhor, quando foi que te vimos com fome, com sede,
forasteiro, nu, enfermo ou preso e não te assistimos” [diakoneo]? (BIBLIA, N.T.
Mt. 25.44). Era serviço prestado aos irmãos na igreja: “Porque Deus não é injusto
para ficar esquecido do vosso trabalho e do amor que evidenciastes para com o
Meu nome, pois servistes [diakoneo] e ainda servis [diakoneo] aos santos”
(BIBLIA,N.T.Hb 6.10).
Muitas vezes quando se faz referência à pregação e ensino do Evangelho de
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Cristo o termo referente a esta atividade também é [diakoneo] em At 6.4, 1 Pe
1.12, e também como pode ser visto nas palavras de Paulo: “Estando já
manifestos como Carta de Cristo, produzida pelo nosso ministério [diakoneo]
escrita não com tinta, mas pelo Espirito do Deus vivente, não em tábuas de
pedra, mas em tábuas de carne, isto é, nos corações”. (BIBLIA, N.T. 2 Cor 3.3).
O verbo servir ganha sentido mais real na pessoa de Jesus Cristo e do Seu
Evangelho, pois Jesus foi aquele que serviu de maneira intensa, tanto ao Pai,
quanto a humanidade. Jesus usou para descrever o seu trabalho e ministério:
“Pois o Filho do Homem não veio para ser servido [diakoneo] mas para servir
[diakoneo] e dar sua vida em resgate de muitos”.(BIBLIA,N.T. Mc 10.45). Esta
declaração indica que ele não buscou seus próprios interesses, mas estava
disposto a dar sua vida pelo resgate dos seres humanos da situação de
escravidão e miséria. Teológicamente a morte é consequência da diaconia de
Jesus para com os pecadores, doentes, deficientes e toda espécie de excluídos
do sistemas romano e judaico (GLAAB, 2005, p.39-40).
O serviço de Jesus às pessoas e aos discípulos foi uma demonstração de amor, o
qual é a essência de como Deus deseja que as pessoas sejam. Jesus discursou
bem isso: “Mas vós não sois assim; pelo contrário, o maior entre vós seja como o
menor, e aquele que dirige seja como o que serve [diakoneo]. Pois qual é maior:
quem está à mesa ou quem serve [diakoneo]? Porventura, não é quem está à
mesa? Pois, no meio de vós, eu sou como quem serve [diakoneo]” (BIBLIA,N.T.
Lc 22.27; ver também Mt 20.28; Jo 13.15). Jesus serviu com a sua própria vida.
Os discípulos de Jesus entendiam que o exemplo do mestre deveria ser seguido
a ponto de uns darem a vida pelos outros: “Nisto conhecemos o que é o amor:
Jesus Cristo deu a sua vida por nós, e devemos dar a nossa vida por nossos
irmãos. Se alguém tiver recursos materiais e, vendo seu irmão em necessidade,
não se compadecer dele, como pode permanecer nele o amor de Deus?
Filhinhos, não amemos de palavras nem de boca, mas em ação e em verdade”
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(BIBLIA,N.T. 1 Jo 3.16-18).
Isso indica que o dar a vida significa que não é objetivamente morrer pelos
irmãos, mas dar de sua vida, ou seja, dispor dos seus bens, dos seus recursos
para ajudar os irmãos em necessidade. Afinal de contas seria uma incoerência
obrigar a pessoa a dar o seu bem mais precioso que é a sua vida sem que ela
antes estivesse disposta a dar de seus bens menores, como alimentos, roupas,
dinheiro, etc. Pedro usa [diakoneo] para designar serviço realizado no uso dos
dons espirituais na igreja: “Servi [diakoneo] uns aos outros, cada um conforme o
dom que recebeu, como bons despenseiros da multiforme graça de Deus”
(BIBLIA,N.T. 1 Pe 4.10).
Portanto, [diakoneo] é o amor em ação em favor das pessoas, derivado do amor
de Deus e demonstrado por Jesus de forma prática (Mc 10.45) evidenciado na
comunidade dos discípulos pelo servir uns aos outros através dos dons do
Espírito dados por Deus. Assim, alguns servem com seus bens materiais, outros
visitando
doentes
e
presos,
sendo
hospitaleiros,
enfim,
dispondo
aos
necessitados toda ajuda que têm conforme a graça concedida a cada um.
1.2 - Diakonia (substantivo)
O substantivo [diakonia], segundo o Dicionário VINE
pode referir-se ao cargo e
trabalho de um diácono. No entanto é usado cerca de 34 vezes no Novo
Testamento de diferentes maneiras, contextos e sentidos. A princípio tem um
sentido geral de serviço amoroso em 1 Cor 16.15, que pode ser expresso como o
levantamento de ofertas em At 11.29, 12.25, Rm 15.31, 2 Cor 8.4, onde a graça
de Cristo é declaradamente vista como motivo para tal. Também se usa para a
proclamação da palavra e a missão cristã em 2 Tm 4.11, At 20.24, 2 Cor 11.8;
para todo serviço na comunidade cristã em Ef 4.12; para o serviço mediante anjos
em Hb 1.14; para o cargo carismático em At 1.17, Rm 11.13, 2 Cor 3.7-8, Col
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4.17, 2 Tm 4.5. Sendo que cada serviço e cada cargo, no entanto, acha seu
significado na unidade orgânica do corpo de Cristo: “assim também em Cristo
nós, que somos muitos, formamos um corpo, e cada membro está ligado a todos
os outros. Temos diferentes dons, de acordo com a graça que nos foi dada. Se
alguém tem o dom de profetizar, use-o na proporção de sua fé. Se o seu dom é
servir, sirva; se é ensinar, ensine” (BIBLIA, N.T. Rm 12.5-7). A importância da
[diakonia] no Novo Testamento desenvolve-se a partir do reconhecimento do
sacrifício de Cristo por parte da igreja (DTNT, 2000, p.2343-2344).
Paulo denomina as funções que são exercidas dentro da igreja de “serviços”
[diakonia] 1 Corintios 12.5 – e também há diversidade nos serviços [diakonia].
Como também pode se referir a um único dom (Rm 12.7)
se é ministério
[diakonia] dediquemo-nos ao ministério. Paulo amplia mais o conceito de diaconia
quando se refere a toda obra de Cristo como sendo uma [diakonia] de Deus em
Cristo a favor dos seres humanos. No Antigo Testamento também pode-se dizer
que havia essa diaconia de Deus, mas no sentido de lei, e por isso, de morte, de
condenação em 2 Cor 3.7-9. Mas com Jesus o ministério da [diakonia] vai além;
é um ministério de reconciliação em 2 Cor 3.8-9 (BORNSCHEIN, 2005, p.10-14).
Quando Cristo se manifestou era
para que os seres humanos tivessem
comunhão com Deus e foi através da diaconia (servir) que Ele demonstrou e
realizou sua missão.
1.2.1 Diakonos (substantivo)
O termo [diakonos] deriva do substantivo [diakonia] e seu significado
primeiramente traz à mente um sentido de “servo”, que pode ser tanto o que faz
trabalhos servis, como o ajudante que presta serviços voluntários, por isso não
deve ser confundido com [doulos], que significa escravo. [Diakonos] encara o
servo com relação ao seu trabalho, enquanto [doulos], em relação ao seu mestre.
Este substantivo é usado cerca de 29 vezes no Novo Testamento, usado de
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diferentes maneiras: a) àquele que serve à mesa:Jo 2.5-9; b) aquele que serve
num sentido amplo:Mt 20.26; c) Paulo se designa como diácono da Nova Aliança
(2 Cor 3.6), diácono do Evangelho (Col 1.23), diácono de Cristo (2 Cor 11.23),
diácono da igreja (Col. 1.24-25), diácono de Deus (2 Cor 6.4), diácono junto com
Apolo (1 Cor 3.5), d) Paulo designa também seus companheiros de diáconos (Ef
6.21, Col 1.7, 1 Tess3.2); Cristo também foi chamado de diácono (Rm 15.8); as
autoridades são diáconos de Deus (Rm 13.4); cargo na igreja junto com os bispos
(presbíteros) (Fp 1.1); mulheres são chamadas de diaconisas (Rm 16.1)
(DTNT,2000, p.2343-2346).
1.3 Diaconia: encaminhamentos para uma definição
As expressões [diakoneo], [diakonia] e [diakonos] são empregadas no mundo
biblico sempre em um contexto geral de serviço, seja ele, obrigatório ou
voluntário, no que tange à sociedade em geral. Por conseguinte, tal serviço não
tem implicações teológicas práticas para a igreja. Porém no sentido teológico
verificado na maioria das vezes que os termos ocorrem na Bíblia, como serviço
da parte de Deus, de Jesus, dos anjos e dos discípulos de Jesus, oferecem uma
referência prática para o cumprimento da missão por parte da igreja cristã
contemporânea.
Diaconia desenvolveu-se na igreja do Novo Testamento desde At 6 onde era visto
como uma deliberação para resolver os problemas materiais da comunidade, até
o ponto de ser visto como um cargo especial, como relatam Fp 1.1 e 1 Tm 3.8-13.
Esta particularidade da diaconia não é via dessa pesquisa, assim todas as
demandas oriundas da instituição do cargo de diácono na igreja não serão
tratadas aqui. Para mais esclarecimentos deste tema ver trabalho introdutório de
Jaziel Guerreiro Martins em seu “Manual do Pastor e da Igreja”(MARTINS, 2002,
p.57-61). Aqui interessa o conceito estreito para o cuidado material e espiritual da
igreja para com todos aqueles que necessitam. Isto implica dizer que a diaconia
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nesse sentido não se restringe ao um grupo especial de pessoas dentro da
comunidade, mas à todos os cristãos.
Substancialmente a diaconia envolve a tarefa de servir com amor à igreja, aos
irmãos e às pessoas, seja por meio da diaconia da palavra ou da diaconia das
ações. Pedro disse: “servi [diakoneo]
uns aos outros, conforme o dom que
recebeu” (BIBLIA, N.T. 1 Pe 4.10), sendo assim diácono ou diaconisa é alguém
que serve, que ministra de acordo com o dom que recebeu. Aqueles que servem,
servem a partir do grande Diácono que é Cristo que continua a obra de diaconia,
de servir, que é a obra de Cristo. Deste modo quem serve está envolvido na obra
da salvação das pessoas. Esta preocupação com o bem das pessoas envolve o
corpo e a alma. Paulo empenha-se tanto na coleta para os irmãos pobres da
Judéia 2 Cor 8.4, como para a pregação da Palavra. Estas são inseparáveis:
pregação e ação de ajuda.
2. A DIACONIA DE JESUS
Como já visto, Jesus pode ser considerado o maior exemplo para a diaconia. Um
fator impressionante na diaconia de Jesus é que Ele servia as pessoas sem
qualquer reserva, elas podiam ser amigas ou não, israelitas, estrangeiras, de
qualquer classe social, de qualquer faixa etária, sob qualquer necessidade. O
importante para Jesus era detectar as necessidades que cada pessoa tinha e
assim servi-la. Na análise de sua diaconia como reflexo de Isaias 53 -- o servo
sofredor -- relacionando com o Evangelho de Marcos onde há várias indicações
do servir de Jesus às pessoas carentes e necessitadas constata-se que isso
gerava desconforto nas autoridades (Mc 2.1-12; 13-17; 23-28). Vale a pena
salientar que na dinâmica de Marcos a diaconia de Jesus parece conduzi-lo ao
resultado de sua morte e isso faz com que muitas vezs se confunda sofrer e
servir. Não se quer dizer que sofrer é sinônimo de servir, mas apenas no caso de
Jesus, o servir aos pobres e excluídos tornou-se uma afronta aos poderosos e
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isto trouxe sofrimento. Jesus não salvou por ter sofrido mas por ter assumido a
vida de servo (GLAAB, 2005, p.39).
Parece estranho, porque para o mundo antigo a morte não era vista com bons
olhos, e em algumas vezes era considerada fruto de pecados e mesmo assim
Jesus praticou a diaconia sabendo que poderia morrer por isso. Para os demais
“morrer” era algo passivo, para Jesus não, era ação e serviço. Jesus não apenas
beneficiou Israel, ou até somente seus discípulos, mas “os muitos” (Mc 16.15-20),
ou seja, todos foram beneficiados. Assim, os evangelhos procuram mostrar que o
morrer de Jesus não foi algo digno de comiseração, mas de coroação do seu
serviço. A morte para Jesus representa o emblema do serviço ofertado para
libertar e resgatar. Parece incoerente mas não é; por isso Evangelho é diaconia,
pois é boas novas àqueles que estavam em situação de sofrimento e miséria.
Marcos começa seu evangelho com João Batista anunciando a missão de Jesus
com uma diaconia que traz salvação. O profeta Isaias faz referência ao reino
messiânico (Is 42.1-7), que agora em Jesus se torna o reino de Deus, então
pode-se perceber que Jesus proclama o evangelho como diaconia, mas não pelo
sofrer, mas pelo servir (Mc 10.45). Com a chegada da modernidade muitas vezes
a igreja apega-se ao fato do sacrifício de Jesus pelos pecados da humanidade e
reduz sua diaconia a este único fundamento, como se Jesus não tivesse realizado
outra coisa senão isto. Tenta-se fazer uma relação entre fé e razão, na procura de
obter respostas às
questões sobre a alma, esquecendo-se do ser humano
completo que vive “no mundo”. A igreja parece ignorar que enquanto estava aqui,
Jesus curou, mudou a vida das pessoas, comeu, andou, e falou com pessoas
das quais alguns religiosos sentiriam vergonha de acompanhar.
Na ceia com seus discípulos, esse conceito de entrega fica mais evidente (Jo 13).
Quem tinha privilégios, devia abrir mão dos mesmos, se alguém possuía bens,
deveria compartilhar com quem não tinha, e quem se julgava superior tinha de
entender que deveria se igualar aos outros e assim por diante, isso era diaconia,
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entrega, que agora estava evidente na vida dos discípulos, de maneira prática. O
Evangelho de Marcos e também Mateus trabalham a diaconia como entrega de
vida, como sendo o cerne do serviço. Jesus se entrega “como prêmio do resgate
por (em lugar e em favor de) muitos (todos). Nestes textos, servir, serviço e
entrega, fornecem
um parâmetro para poder imaginar
a transformação que
estava ocorrendo na vida das pessoas e dos discípulos que agora tinham de
enfrentar uma nova situação de vida como seguidores de Jesus. Os quais
deveriam ter as características do mestre, exercer a diaconia como ele exerceu.
Enfim a dedicação ao próximo não é apenas uma força de expressão, ela está
contida na vontade e essência de Deus; é sua natureza.
É possível afirmar que quando Jesus estava ensinando sobre o servir, estivesse
discutindo sua forma de liderança, voltando-se para a liderança da comunidade.
Ambas enfatizam o fato de que os maiores, deveriam tornar-se os últimos (servir).
Marcos 9.35 mostra esse paradigma que Jesus está quebrando: criança e
servidor, eram na época os últimos na escala da pirâmide social. Esse era o
modo de Jesus liderar, servindo e não dominando as pessoas, passando assim
àqueles que se dizem seus seguidores, tendo a mesma responsabilidade de agir
conforme seu mestre. “Mas entre vós não é assim; pelo contrário, quem quiser
tornar-se grande entre vós, será esse o vosso [diakonos]; e quem quiser ser o
primeiro entre vós, sera doulos (escravo) de todos. Pois o próprio Filho do
Homem não veio para ser diaconado (diakonetênai), mas para diaconar
(diakonésai) e dar a sua vida em resgate por muitos” (BIBLIA,N.T. Mc 10.43-45).
Ched Myers percebe neste contexto que Marcos se esforça para pôr em
evidência a construção de uma nova ordem social por parte de Jesus, que é
válida para todas as áreas da relação humana, já que a prática da dominação
infectou tão profundamente as relações humanas que ela precisa ser erradicada,
sendo a diaconia um grande antítodo para essa dominação,pois a diaconia visa a
liberdade, onde cada um respeita e age como servo, não visando seus interesses,
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mas o do outro.(MYERS, 1992, p.146).
Josef Ernst tambem está convencido de que a ênfase dada pelos evangelhos e
ditos de Jesus sobre os atos de dominar e servir (Mc 10.42-45; Mateus 20.25-28.
Lucas 22.24-27) ou à renúncia a títulos autoritários (Mateus 23.8.11) significa que
pelos menos um dos empregos do conceito de diaconia no Novo Testamento se
refere à “organização interna da vida comunitária”. Contextualizando esta
constatação, o autor afirma que as reflexões sobre diaconia na comunidade
devem hoje começar “por aquelas formas e nomes de trato mútuo e onde
necessário, mudar estruturas” (ERNST, 1993, p. 93).
Jesus demonstra que nos vários segmentos da comunidade existe dominação e
tenta “desmascarar” essa forma de conviver, vivendo a diaconia. No texto de Mc
9.33-41 – quando Jesus mostra a criança e diz que todo aquele que quiser ser o
maior deve ser como uma criança, está demonstrando que apesar das crianças
representarem o ponto mais baixo na escala social, deveriam ser recebidas
no
reino de Deus. Então, ao acolher as crianças e colocando-as no centro ( no meio
deles), demonstra que a criança representa uma categoria atual de pessoas
exploradas e oprimidas e tenta desfazer essa realidade de dominação dentro da
comunidade e também dentro das famílias. A família deve entender que não se
pode dominar, mas sim servir, e a partir daí criam-se relações de amor e respeito
umas pelas outras. Em relação ao matrimônio, a diaconia, resgata o valor da
mulher, que também representava outro segmento inferior da sociedade judaica.
A esposa era propriedade do marido, podendo ele, devolver assim que não queria
mais ficar com ela. No ensinamento de Jesus aos seus discípulos sobre esse
assunto, coloca homem e mulher em condições iguais em termos de culpa pela
separação. Chedd Myers lembra que Marcos procura mostrar com clareza à sua
comunidade que ela só pode ser protegida se não for mais tratada como objeto
mas como sujeito igual, na solução de situações de conflito” (MYERS,1992,
15
p.312). Ao mesmo tempo que anuncia uma comunidade nova, que adota como
valor fundamental a igualdade de direitos, como está escrito nas palavras: “Quem
quiser tornar-se grande entre vós, será esse o vosso diakonos” (BIBLIA, N.T. Mc
10.43). Jesus propõe uma mudança radical de valores e ensina a seus discípulos
a fazerem o mesmo.
Em relação ao poder econômico, a diaconia de Jesus, também entra em ação.
Quando o jovem rico chega e de uma maneira bajulativa, chama Jesus de bom
mestre, recebe uma palavra invertida. Jesus não se rende a isso e deixa claro
que não se pode ignorar a intenção das pessoas .No decorrer do diálogo com o
jovem, Jesus pergunta se ele conhece os mandamentos da Lei, ele diz que sim e
que sempre os guardou. Jesus o confronta na sua religiosiodade: “vai, vende o
que tens e dá aos pobres e terás um tesouro nos céus” (BIBLIA,N.T. Mc 10.21).
Ele ficou triste, porque tinha muitos, bens. As suas riquezas estavam amarrando a
si mesmo. O texto parece não deixar os leitores esquecerem que quando Jesus
estava quebrando essas barreiras, estava apenas em caráter prático, quebrando
barreiras exclusivistas que existiam na sociedade, impedindo que as pessoas
tivessem uma vida digna e permitindo que a diaconia em favor dos “pequenos”
dos “últimos” fosse exercitada dentro da comunidade, alterando seus valores,
mostrando que na comunidade dos discípulos deveriam ser diferente.
Pode-se perceber que a diaconia de Jesus era voltada para pessoas que estavam
necessitadas, não somente os pobres e miseráveis, mas também aos ricos que
tinham necessidades. Isso só é possível quando se ama profundamente porque
foi amado também. Dedicar-se ao próximo – praticar diaconia – é fruto de uma
experiência de ser alcançado por Deus – de ser amado por Ele, de pertencer a
Ele de forma filial. É fruto de quem se converteu ao projeto de Deus de autoentrega e serviço em favor daqueles que são vítimas de poder dos outros: a
criança excluída, a mulher vitimizada de uma sociedade androcêntrica, o
explorador de pobres, que é desafiado a distribuir seus tesouros acumulados à
suas vítimas.
16
Um fator interessante na diaconia de Jesus é que ele não espiritualiza os
problemas, muito menos os enfrenta com discurso meramente religioso, antes
contribui efetiva e eficientemente para a resolução dos problemas que afligem o
ser humano em sua vida terrena. Jesus não projeta a esperança dos que buscam
sua ajuda somente para um tempo vindouro, mas ao contrário, materializa o
objeto da esperança e assim serve ao necessitado ao mesmo tempo que ensina
de forma prática seus discípulos a tratarem estas situações que até nos dias
atuais são um desafio para aqueles que seguem a Jesus e entendem que são as
pessoas o alvo da nossa diaconia.
Os discípulos de Jesus compreenderam que a partir da cruz de Cristo, entendese uma nova ordem na vida da comunidade das pessoas que seguem a Jesus. A
cruz mostra renúncia e entrega, mas por amor. Não tem valor quando se entrega
sem amor. Por isso quando Isaias diz que “como ovelha muda foi ao matadouro”
(BIBLIA, A.T. Is 53.7), isso não deve ser interpretado como um sofrimento sem
sentido, mas como um sofrimento por amor em benefício de todos os que
estavam aflitos e necessitados, tristes, presos ou seja , Jesus é o diácono que
cuida e ama o ser humano por inteiro. Praticar diaconia fazia parte do ser de
Jesus, de sua natureza.
Quando Jesus praticava a diaconia e quebrava barreiras entre as pessoas, estava
quebrando o isolamento social que acometia aquela sociedade. As pessoas
“diferentes” poderiam conviver entre si numa relação de respeito, através da
prática da diaconia, que leva em consideração essas diferenças e faz com que o
orgulho e ambição sejam deixados de lado. Assim, a missão da igreja e de cada
cristão não é assegurar um lugar no céu, mas ser um sinal visível da presença do
Senhor em meio aos anseios por liberdade e à luta por uma sociedade mais
humana e justa (OFTESTAD, 2006, p.25).
Todos tem direito a ter uma vida digna, e a diaconia, se praticada, principalmente
17
entre os seguidores de Jesus, com certeza pode contribuir para que a sociedade
se torne mais humana. Se a diaconia for um estilo de vida e de liderança, como
era para Jesus, pode-se suspeitar que a sociedade teria uma alternativa para
enfrentar seus problemas, sendo transformada em uma comunidade diaconal, de
ajuda recíproca e constante entre seus membros.
Esse parece ter sido jeito de Jesus ser e de liderar. Servir é o papel de quem
lidera na comunidade: o servir e não o dominar é a tarefa daquelas pessoas que
assumem responsabilidade com outros (HUNTER,2004, p.57-71; WILKES,1999,
p.21-27). Servir nunca foi para Jesus um fator de reconhecimento, mas sim um
estilo de vida e uma regra importante para se viver em sociedade: “Se alguém
quer ser o primeiro, será o ultimo e o diakonos de todos”(BIBLIA,N.T. Mc 10.43).
A diaconia que Jesus praticava era
inclusiva; ele atendia tanto a pobres e
necessitados, como a ricos (Zaqueu, Lc 19.1-10). As pessoas eram sempre o alvo
da diaconia de Jesus.
3. DIACONATO FEMININO E A OBRA DIACONAL DE THEODOR FLIEDNER
Segundo o Novo Testamento o conceito de diaconia que o próprio Jesus
conheceu era um trabalho que, quando não exigido de escravos e escravas, era
atribuído às mulheres. Nordstokke faz referência a Luise Schottroff que chama a
atenção para um dado já mencionado, mas com maior profundidade: [diakoneo],
quando não executado por escravos e escravas própriamente, é realizado por
mulheres. Isso pode ser verificado nos textos do Novo Testamento, como por
exemplo Marta (Lc 10.38-42): ela realiza aquele trabalho doméstico que se faz
necessário para a hospedagem de um visitante, que em si é o mesmo que se
exigia dos escravos e das escravas e este trabalho é designado no texto de
diakoneo . Apesar de Jesus ter colocado em igualdade homens e mulheres, a
realidade patriarcal não permitia que o homem fizesse tal serviço, o de servir as
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mesas. Essa prática foi transferida para dentro da comunidade cristã que
considerava normal que fossem as mulheres que realizassem a diaconia. Por
isso, ainda continuava, de certa forma uma discriminação contra as mulheres,
evidenciando que havia uma diferença entre a diaconia praticada pelos homens e
a diaconia praticada por mulheres (NORDSTOKKE, 2003, p.84-106).
Theodor Fliedner foi um grande instrumento de Deus na instituição do diaconato
feminino no século XIX.
Sobre seu túmulo que se encontra no cemitério da
instituição diaconal em Kaiserswerth, está escrito as seguintes palavras:
“D.Theodor Fliedner, pela graça de Deus renovador do ministério apostólico das
diaconisas”. Sua capacidade intelectual, sua praticidade, seu espírito observador,
seu temperamento impulsivo e determinante, com uma fé firme no Evangelho de
Jesus Cristo, o levaram a desenvolver esta grande obra. Todavia ele não teria
conseguido se não fosse a participação de outras pessoas, sobretudo das
mulheres, que o inspiraram com seu exemplo de vida e colocando seus dons a
serviço da causa diaconal. Elas são protagonistas nesta história, mesmo que
seus
nomes
não
apareçam,
ou
não
sejam
citados
frequentemente
(BRAKEMEIER,1998, p.13-46; NORDSTOKKE,1995, p. 56; NORDSTOKKE,2003,
p.191).
Para Fliedner o termo diaconisa, referia-se principalmente a Febe: “Recomendolhes nossa irmã Febe, serva (diaconisa) da igreja em Cencréia” (BIBLIA, N.T. Rm
16.1), o que ele adotou para designar as mulheres que juntamente com ele
realizaram o trabalho em Kaiserswerth, como veremos em seguida. Em janeiro de
1822, com 22 anos, Theodor Fliedner, chegou a Kaiserswerth, para assumir o
pastorado de uma pequena comunidade de mais ou menos 200 pessoas. Quatro
semanas após, a fábrica de veludo que foi aberta no início do século, como
alternativa de sustento para a população faliu, colocando a sobrevivência da
comunidade em risco, não tendo como sustentar o pregador. Fliedner não queria
abandonar seu trabalho por motivos financeiros e então resolveu sair em viagem
19
para angariar dinheiro. Foi bem sucedido nesta viagem, inclusive esteve na
Holanda e Inglaterra. Voltou após 14 meses de viagem, com o dinheiro e muitas
experiências espirituais. Ficou admirado com as várias instituições beneficentes
que visitara, por causa da fé viva em Cristo, como estavam sendo administradas.
Havia visitado em Londres o presídio de Newgate, que havia sido reformado e era
administrado por uma mulher, Elisabeth Fry. Fliedner ficou admirado e grato por
poder ver todas as “maravilhas de amor, provindas da fé”, mas também sentiu-se
envergonhado pelo fato de que os homens na Alemanha dedicavam-se tão pouco
ao trabalho caritativo e às prisões (BRAKEMEIER, 1998, p.13-14).
Em 1825 teve a permissão de acompanhar esipiritualmente os presos
evangélicos na Casa de Detenção de Dusseldorf. Ele ia fielmente de 14 em 14
dias, aos domingos à tarde e percorria duas horas a pé para celebrar um culto
com os detentos e atendê-los individualmente. Recebeu também licença para
visitar outras instituições carcerárias da Provincia. Fundou uma instituição para
poder melhorar as condições dos encarcerados. Uma sociedade de mulheres
também foi fundada para dar maior amparo às mulheres presas, pensando
também como seria a vida delas após serem soltas. Esta instituição daria amparo
para que pudessem ficar, afim de poder se prepararem para viver fora do
presídio. Eram preparadas para conseguirem ter um emprego. Contou com a
ajuda de sua esposa, Friederike Fliedner, que o animou a fundar esta instituição.
Quando a primeira ex-detenta chegou, Mina Enders, em 17 de setembro de 1833,
Catharina Gobel, amiga de juventude de Friederike, era a primeira diretora.
Não foi fácil manter o trabalho financeiramente, mas com o crescimento do
trabalho havia a necessidade de contratar pessoas para auxiliar. Como as exdetentas não possuíam parentes que pudessem ajudá-las
a institiuição
sobrevivia de doações. Porém o aspecto mais difícil foi o psico-pedagógico-social.
A maioria das ex-detentas foram criadas em lares muito ruins, ou não tiveram
nenhum lar e nem formação escolar. Eram desprezadas pela sociedade e não
20
havia quem desse emprego a elas. Fliedner também considerava que eram
pecadoras
e
que
deveriam
se
arrepender para
melhorarem
de
vida,
acompanhando-as na sua vida espiritual (BRAKEMEIER, 1998, p.14). Após nove
anos de experiência, Fliedner escreveu “Principios Norteadores”, que era um
documento ou relatório que descrevia seu trabalho com as ex-detentas, como
elas eram assistidas, o ingresso, a permanência e o egresso delas, porque seu
desejo era que houvessem mais instituições que prestassem esse serviço. Era
uma idéia um tanto avançada para a época e quando Catharina Gobel, por
motivos de saúde, não pode mais continuar no trabalho, a direção da instituição
foi assumida por diaconisas.
A infância abandonada era também outra grande preocupação do casal Fliedner,
que procuraram ajuda para saber como poderiam fazer algo em favor dessas
crianças. Em 1835, também em Kaiserswerh, nasceu uma Escola de tricô para
crianças pobres. A liderança foi assumida por uma mulher solteira cristã,
chamada Henriette Frickenhaus (BRAKEMEIER, 1998, p.15). Em 1836 essa
escola foi transformada em “Escola para crianças pequenas”. Fliedner dizia que
era preciso ajudar os pais na educação das crianças, tanto aqueles que
precisavam trabalhar fora, como aqueles que foram criados sem amor e que não
sabiam como ensinar e educar seus filhos em amor. Fliedner era um homem
preocupado com a educação e com a saúde das crianças. Ele escreveu grandes
relatórios também na intenção de que mais escolas fossem criadas. E assim
aconteceu. Em 1837, já haviam mais de 10 escolas, que somavam 708 crianças,
1 professor, 9 professoras e 7 auxiliares.
Fliedner apostou na qualificação das mulheres para a educação das crianças, o
que era uma novidade para a época, porque o magistério era considerado uma
profissão masculina. No entanto, Fliedner era convencido de que as mulheres
eram mais apropriadas para educar as crianças, achava que ficava mais maternal
e mais simples. Assim como o outro trabalho de Fliedner, este cresceu e ele
21
continuava a investir no preparo dessas professoras, criando cursos preparatórios
e realizando encontros para manter contato com elas. A palavra de Jesus: “estive
enfermo e preso e vocês não me visitaram” (Mt 25.43) ecoava aos ouvidos de
Fliedner e lembrava de como mulheres haviam sido corajosas cuidando dos
soldados feridos durante as Guerras de Libertação de 1813 a 1815, e o exemplo
de Elizabeth Fry o motivava a confiar no potencial feminino e talvez o que mais o
inspirava era a figura da diaconisa da Igreja primitiva sem contar que as mulheres
haviam se mostrado bem mais eficientes no trabalho de cuidado com as expresidiárias e com as crianças, fazendo com que Fliedner tivesse pressa em
reaplicar as forças femininas no serviço para o Senhor.
Fliedner achou importante fundamentar sua obra sobre uma base eclesiástica
sólida, fundando em maio de 1836, a “Sociedade de Diaconisas da RenâniaWestfália”, e a diretoria seria composta de representantes do governo e da Igreja.
Para a reunião de fundação desta Sociedade, Fliedner trouxe um anteprojeto
mostrando que o objetivo seria prestar ajuda às pessoas carentes e sofredoras,
principalmente aos doentes pobres, por intermédio de enfermeiras evangélicas,
que iriam exercer seu ministério como diaconisas, segundo a concepção
apóstólica, tanto em hospitais como nas residências das mesmas. Era mais um
projeto inovador. As enfermeiras seriam preparadas e os pacientes seriam
tratados gratuitamente. Em 11 de outubro de 1836, começa a funcionar, ainda em
condições precárias, o lugar onde as enfermeiras seriam treinadas e os pacientes
atendidos. Este trabalho, assim como os outros, cresceu e no ano de 1886, no
ano de jubileu de ouro, o número de irmãs diaconisas, como também eram
chamadas, havia crescido eram 715 e tinham 202 campos de trabalho, sendo
que 8 ficavam no exterior.
As diaconisas eram mulheres dedicadas em servir às pessoas. Faziam movidas
pela compaixão. Eram mulheres corajosas, não temiam os serviços mais difíceis
que haviam, apesar do alto risco que as vezes eram expostas. Fliedner sempre
22
oferecia os trabalhos das diaconisas quando via que a presença delas era
importante em algum lugar. Nos anos de 1845 a 1848, havia epidemais de tifo em
vários lugares e diaconisas foram enviadas para
ajudar os doentes. As
diaconisas não cuidavam dos doentes somente em hospitais. Havia albergues,
casas para doentes pobres e abrigos para empregadas domésticas. Em 1852,
em Kaiserswerth foi fundado um sanatório para mulheres depressivas e com
doenças mentais.
Fliedner tinha também um grande desejo de que as irmãs diaconisas atuassem
como servas nas igrejas evangélicas no sentido apostólico. Isso aconteceu
rapidamente e a igreja foi beneficiada, porque estas mulheres, diaconisas,
estavam dispostas a dedicar-se e tinham uma qualificação profissional para os
trabalhos diaconais na comunidade. As comunidades começaram a contratar
diaconisas para trabalhar, servindo como mulheres capazes de demonstrar o
amor cristão à comunidades, junto aos seus membros mais fracos e abadonados,
carentes do amor e cuidado maternos. As diaconisas não deveriam trabalhar
independentes, mas como irmãs das pessoas que se dedicavam também ao
cuidado dos pobres em suas comunidades, sendo esta a “coroa do trabalho da
diaconisa”.
Fliedner foi uma pessoa que acreditou no potencial feminino e que também
ajudou a mulher solteira a ter uma vida útil, rompendo barreiras tão sólidas para
as mulheres solteiras na época. Como Fliedner
achava que as diaconisas
deveriam atuar no âmbito eclesiástico, em 1856 escreveu um “Parecer sobre a
Diaconia e o Diaconato” solicitado pelo Conselho Superior Eclesiástico em Berlim,
trazendo os seguintes argumentos: “Deve o diaconato estar organicamente
inserido no estatuto da comunidade, ou deve ele, por enquanto, estar implantado
no solo da associação livre? Fliedner achava importante inserir o diaconato na
estrutura da comunidade. Ele faz um traçado da história do diaconato desde os
apóstolos até a sua época citando At 6.1-7, textos de Paulo e as atividades dos
23
diáconos na igreja antiga.
Após mencionar o ministério e as atividades de várias mulheres da igreja antiga,
Fliedner relata que o ministério das diaconisas conservou-se até o século XII na
igreja ortodoxa e na igreja romana até o século VIII, declarando que o ministério
dos diáconos “como ministério de amor e serviço” acabou mais cedo, devido ao
crescimento do poder dos bispos, tornando-se servos destes, e fazendo parte do
clero. Fliedner diz que os pastores (inclusive ele) deveriam ter a humildade de
reconhecer que estão sobrecarregados, e assim instituir a diaconia, (diáconos e
diaconisas) para auxiliá-los em assuntos pertinentes ao diaconato. Observando a
história de Fliedner e de como ele desenvolveu seu trabalho diaconal, é possível
perceber a importâcia desse ministério para a sociedade, e para a igreja, que
sempre teve dificuldades em cuidar de seus membros mais fracos e doentes, por
serem muitos e poucos os que voluntariamente se dedicam a ajudar. Fliedner
dedicou-se à expandir, valorizar e renovar o ministério das mulheres, mas aos
homens também cabe praticar a diaconia da mesma forma que as diaconisas
segundo o modelo de Kaiserswerth.
A história mostrou que este modelo, que se tornou conhecido como o modelo de
Kaiserswerth, foi muito relevante para a época, pois na virada do século XIX já
havia mais diaconisas do que pastores na Europa. Na Alemanha havia 50 casas
Matrizes de Diaconisas, 30 em outros paises da Europa e 3 nos Estados Unidos.
O modelo das diaconisas foi considerado importante durante muito tempo,
podendo-se dizer que era um modelo por excelência, mas ele não continuou
como modelo único. Apesar de que algumas mulheres não queriam adotar o
mesmo estilo de vida das diaconisas conseguiam trabalhar juntas, porém a vida
comunitária era um fato relevante para aquelas que queriam ser diaconisas
(NORDSTOKKE, 1995, p.56).
Diaconia é poder servir voluntariamente com amor ao próximo; com alegria para
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que a presença de Cristo seja lembrada através de atos de amor. De nada
adianta dizermos que amamos e nos preocupamos se não temos uma atitude a
respeito, nem que seja de somente dizer uma palavra de conforto. A igreja de
Cristo tem perdido grandes oportunidades de praticar a diaconia. Devido ao
modernismo, a tecnologia, o contato pessoal tem ficado de lado. Usa-se
computadores, telefones, deixando de ter a presença física, que é na verdade o
grande diferencial, ou seja, estar presente. Fliedner tentou, a sua maneira, dentro
da sua época, resgatar o valor e a dignidade
daqueles que eram excluídos,
através da diaconia institucional, mas ele sempre quis que a igreja abraçasse
também esse ministério. Evidentemente, nem tudo era perfeito na obra de
Fliedner, mas ele tinha em mente a essência da diaconia, do serviço cristão em
favor do próximo.
Enquanto Fliedner no século XIX através do seu trabalho de “renovação do
ministério diaconal, principalmente o feminino”, no Brasil aconteciam muitas
coisas importantes, pois foi um século decisivo na formação política, econômica,
social e cultural do Brasil, pois foi ao longo do mesmo que se delinearam as
estruturas do Brasil atual, além de preparar o surgimento de um Estado Nacional.
No Brasil as primeiras diaconisas no modelo que Fliedner idealizou, chegaram
em 1913, devido, em grande parte ao dinamismo e à visão de Wilhelm Zollner.
Ele acreditava na capacidade da mulher para o desempenho da diaconia e
quando ainda trabalhava em Kaiserserth havia recebido cartas de comunidades
brasileiras pedindo que enviassem diaconisas para auxiliar no trabalho.
Atendendo aos pedidos de socorro, que vinhas das regiões onde os alemães
estavam colonizando, a Ordem Auxiliadoras de Senhoras Evangélicas, na
Alemanha, em 1908, em sua Assembléia Anual, decidiu criar uma organização
que tinha como objetivo especifico formar diaconisas para o exterior.
As diaconisas eram preparadas para trabalhar no Brasil como educadoras,
25
obstetras e enfermeiras. Seu número chegou a 70 em 1934. Elas eram chamadas
de diaconisas e de irmãs evangélicas. Além de atuarem na educação, também
atuaram na área da saúde, onde havia a busca de ajuda de pessoas que se
dedicassem aos doentes. Observando a história e o modelo de Kaiserswerth,
vemos que diaconia é ação prática, é amor praticado por ações e a igreja pode
muito bem assumir esse papel, porque “a
missão da igreja não é somente
assegurar às pessoas um lugar no céu, mas ser um sinal visível da presença do
Senhor em meio aos anseios por liberdade e à luta por uma sociedade mais
humana e justa” (OFTESTAD, 2006, p.25).
Não só as diaconisas tiveram uma participação importante, mas também todos
aqueles que dirigiram como diretores e outros, e também aqueles que sonharam
em renovar o ministério diaconal. O que Fliedner e outros envolvidos no trabalho
de diaconia realizaram, serve para reflexão de como nos dias atuais a diaconia é
compreendida. O que se tem feito, de forma prática com os ensinamentos de
Jesus, o qual vivia e era severamente criticado por praticar o amor e a diaconia
ao próximo. Entendendo que Jesus é o diácono que cuida do ser humano de
forma integral e que voltou-se para os rejeitados, os leprosos, os paralíticos, os
doentes crônicos, os aleijados, os cegos e os surdos; também para aqueles que
não eram bem vistos pelas sociedade, quem se diz discípulo de Jesus deve
seguir o sem exemplo de amor ao próximo que não somente fazia a diferença na
vida daqueles que ajudava mas dava a oportunidade delas resgatarem sua
dignidade. Fliedner compreendeu isso e a partir daí começou a sua obra diaconal,
tentando
se
aproximar
da
concepção
que
Jesus
tinha
da
diaconia
(BRAKEMEIER,1998, p.; NORDSTOKKE, 1995, p.56).
Jesus não entrava na vida das pessoas de forma violenta, mas permitia que as
pessoas O convidassem. Ele perguntava às pessoas o que elas queriam. Jesus
não agia no lugar das pessoas, e frequentemente dizia: “a tua fé te salvou”. Havia
a reflexão que a pessoa podia e tinha a sua parte a fazer. Quando Jesus cura o
26
paralítico de Cafarnaum (Mc 2. 1-12). diz: “levante-se pegue a sua maca e vá
para casa” , nem Jesus ou seus discípulos carregaram o paralítico, mas este
pôde por si mesmo andar. Que alegria este homem deve ter sentido quando
levantou e foi ao encontro dos seus, curado, podendo trabalhar e ter uma vida
digna. Agora não precisava nem ele e nem seus familiares mendigar o pão de
cada dia. Jesus era muito criticado porque fazia com que as pessoas que eram
excluídas pudessem ter dignidade. Não somente os pobres e doentes, mas
outros, como Zaqueu (Lc 19) que também era excluído, não pelo trabalho em si,
mas porque deixou que a ganância tomasse conta. Jesus olha, ama e chama
Zaqueu. Agora sim. É possível retornar. Alguém dá o primeiro passo em direção a
e este agarra a oportunidade e muda de vida. A diaconia deve fazer isso:
estender a mão para que a própria pessoa tenha a oportunidade de poder segurar
e a partir daí começar uma nova etapa na sua vida. É importante percebermos a
diferença que a diaconia faz porque é muito fácil confundir diaconia com ação
social, caridade, ou outros. Muitos fazem caridade; assistência social. Ajudam as
pessoas, mas não permitem que as mesmas se levantem “ e vão em paz para a
sua casa”.
Assim a prática diaconal defende a dignidade e os direitos das pessoas na
sociedade e aposta na formação do seu futuro (NORDSTOKKE, 1995, p.15)
Fliedner percebeu que se as pessoas excluídas não tivessem o apoio de alguém
para poder recomeçar, não conseguiriam facilmente, podendo talvez, voltar ao
estado de antes. O que Fliedner queria era isso: que as pessoas pudessem se
sentir dignas e reintegradas à sociedade, por isso o exemplo de Fliedner pode ser
considerado importante, porque podemos ter um exemplo concreto, que deu
certo, lembrando que não era um modelo perfeito, tinha sim suas falhas, mas a
essência da diaconia estava presente na obra de Fliedner e esta sim pode ser
copiada.
A diaconia, o serviço de Deus ao próximo, tem como objetivo ser a presença de
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Deus concreta entre as pessoas. Diaconia é um sinal de Deus conosco, o
Emanuel (Is 7.14), o qual se dá através da ação. Isso é uma inversão dos valores
atuais da sociedade que a cada dia se torna mais egoísta e infelizmente a igreja
de Cristo tem se deixado envolver distanciando-se da missão de servir ao
próximo. Não se tem uma fórmula para realizar diaconia, mas é possível dentro
da realidade de cada pessoa atribuir os valores de Cristo. De um lado alguém
fazendo diaconia e do outro alguém recebendo diaconia. A fé em Cristo
transforma pessoas e a diaconia pode ser um elemento importante dentro dessa
transformação, porque transformação implica em agir, ação. Agir em nome de
Deus e isso não pode somente ficar na boa vontade, tem que acontecer algo
real.
A diaconia como agente de transformação não pode modificar os valores do
mundo inteiro, isso é impossível, mas podemos nos questionar como estamos
fazendo diaconia nos dias atuais? Jesus quando estava exercendo diaconia, se
aproximava dos leprosos, que eram excluídos do convívio, dos doentes, das
mulheres, das viúvas, dos pescadores analfabetos e todos os demais grupos que
não eram aceitos pela sociedade. É possível trazer as pessoas que estão
caminhando em trevas para a luz. A diaconia valoriza estes gestos que as vezes
são considerados tão pequenos, mas que é o necessário para salvar uma vida.
Por esse motivo nos dias atuais é preciso entender melhor o que é diaconia, que
ultrapassa o ofício de diácono ou diaconisa dentro das igrejas, mas que vai ao
encontro das pessoas necessitadas e estão esperando por um gesto (diaconia)
de amor.
Entende-se que no Novo Testamento não existe uma contradição entre amor e
liberdade. Um cria possibilidades para o outro. Então quando amamos podemos
servir ao outro de forma livre, assim como receber livremente o serviço do outro e
uma pessoa não é livre quando não pode tecer relacionamentos com os outros.
A diaconia não pode aprisionar ninguém. Se assim for não é diaconia é tirania.
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Jesus nunca aprisionou as pessoas, pelo contrário, Ele sempre dizia: Vai, e não
peques mais; vai, volta para sua casa, e assim por diante. O amor de Deus
revelado em Cristo Jesus, cria uma nova condição de liberdade ao ser humano,
mas uma liberdade que torna as pessoas “servas umas das outras, pelo amor”
(BIBLIA,N.T. Gl 5.13).
Quem quiser servir a Deus deve ser primeiramente servo Dele e também deve
servir as pessoas, em amor. O Pastor Marcos Souza Borges, da Igreja Evangélica
Ágape, no ano de 1995, repetia sempre uma expressão um tanto radical: “Quem
não vive para servir, não serve para viver”. A diaconia não deve ser praticada por
alguém entendendo que é uma tarefa que lhe foi dada por Cristo, mas sim porque
a diaconia faz parte da vida cristã e da igreja como corpo de Cristo. O grande
desafio para a diaconia atualmente é ser uma diaconia que transforma. Se a
diaconia é serviço realizado e motivado pelo amor de Deus em favor das pessoas
em seu contexto, como podemos transformar a sociedade que vivemos?
Estendendo a mão e ajudando o outro a levantar e poder lutar pelos seus direitos
exercendo cidadania, transformando o “não saber” em “saber”.
A diaconia também é limitada. Os recursos humanos são de extrema importância
para que se realize a diaconia.
Os recursos financeiros também influenciam o
desenvolvimento do trabalho diaconal. É difícil fazer diaconia sem dinheiro. Há
muitos desafios, mas a exemplo de Abrãao , que se dispôs a ir e sacrificar seu
filho sempre com a certeza de que “Deus mesmo iria prover” (BIBLIA, A.T. Gn
22.8), é necessário confiar em Deus que proverá buscar recursos e capacitará as
pessoas que desejam realizar o trabalho diaconal. Quando há o encontro do
sofrimento e do amor, aí é possível realizar diaconia.
A vida e o ensino de Jesus apontam para uma inversão de todas as relações de
poder entre as pessoas, questionando as posições de poder e de submissão da
sociedade. Jesus aponta para uma estrutura de comunidade bem distinta da que
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era modelo então, apresenta um novo critério para apreciar as relações entre os
seres humanos. Portanto, diaconia tem um sentido mais amplo do que o servir à
mesa, e descreve o relacionamento das pessoas entre si, o relacionamento de
Jesus para com as pessoas. Jesus como um grande diácono que foi conseguiu
cumprir a sua missão: ao mesmo tempo que perdoava pecados restabelecendo
seu relacionamento com Deus, também curava pessoas e restabelecia
relacionamentos entre pessoas que se sentiam excluídas, e outras que estavam
marginalizadas pela sociedade. Diaconia é o serviço que é relizado pelas pessoas
que seguem Jesus Cristo em favor das pessoas colocadas em situação de
sofrimento, por consequência de uma opressão por parte de outras pessoas ou
outros motivos. Esse serviço tem uma dimensão ampla, pois visa a transformação
de situações injustas e age em situações de necessidades materiais, físicas e
socias, apresentando alternativas viáveis, curativas e preventivas em favor da
vida, da dignidade e da liberdade que cada pessoa deseja ter. O exemplo de
Theodor Fliedner em Kaiserswerth mostra também diaconia na prática. Ele
conseguiu junto com sua esposa, com amigos e diaconisas mudar a face do
sofrimento que as pessoas tinham em sua época; sendo assim é importante nos
dias de hoje olhar para testemunho de Fliedner e para o exemplo de Jesus e
praticar diaconia, dando esperança de que pode existir “novos céus e nova terra
onde habita a justica” (BIBLIA,N.T. 2 Pe 3.13).
30
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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v.2. São Leopoldo/RS:Sinodal. 2001. 149p.
BIBLIA SAGRADA. Nova Versão Internacional. São Paulo: Ed. Vida Nova, 2001.
BOFF, L. Do Lugar do Pobre. 2 ed. Vozes. 1984. 151p.
BORNSCHEIN, F. Diaconia: Um Estilo de Vida – Ed. Evangélica Esperança. 2005. 35p.
BRAKEMEIER,R. O Surgimento de um modelo de Diaconato Feminino, sua
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