Evangelho segundo S. Lucas 18,1-8. Depois, disse
Transcrição
Evangelho segundo S. Lucas 18,1-8. Depois, disse
Evangelho segundo S. Lucas 18,1-8. Depois, disse-lhes uma parábola sobre a obrigação de orar sempre, sem desfalecer: «Em certa cidade, havia um juiz que não temia a Deus nem respeitava os homens. Naquela cidade vivia também uma viúva que ia ter com ele e lhe dizia: 'Faz-me justiça contra o meu adversário.' Durante muito tempo, o juiz recusou-se a atendê-la; mas, um dia, disse consigo: 'Embora eu não tema a Deus nem respeite os homens, contudo, já que esta viúva me incomoda, vou fazerlhe justiça, para que me deixe de vez e não volte a importunar-me.'» E o Senhor continuou: «Reparai no que diz este juiz iníquo. E Deus não fará justiça aos seus eleitos, que a Ele clamam dia e noite, e há-de fazê-los esperar? Eu vos digo que lhes vai fazer justiça prontamente. Mas, quando o Filho do Homem voltar, encontrará a fé sobre a terra?» São Basílio (c. 330-379), monge e bispo de Cesareia, na Capadócia, doutor da Igreja Homilia sobre a humildade, 5-6 «Jesus disse uma parábola sobre a necessidade de orar sempre» Não podemos limitar a oração a pedidos em palavras. Com efeito, Deus não precisa apenas que Lhe façam discursos; mesmo que nada Lhe peçamos, sabe aquilo de que precisamos. O que dizer? A oração não consiste em fórmulas; antes abarca a vida toda. «Quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra coisa, fazei tudo para glória de Deus», diz o apóstolo Paulo (1 Cor 10, 31). Estás à mesa? Reza: ao pegar no pão, agradece Àquele que to concede; ao beber o vinho, lembra-te Daquele que te proporcionou este dom, para te alegrar o coração e te consolar das tristezas. Terminada a refeição, não te esqueças de te recordar do teu benfeitor. Quanto vestes a túnica, agradece Àquele que ta deu; quanto vestes a capa, testemunha o teu afecto a Deus, que nos proporciona vestes adequadas ao inverno e ao verão, para nos proteger a vida. Terminado o dia, agradece Àquele que te deu o sol para os trabalhos da jornada e o fogo para te iluminar o escuro e prover às tuas necessidades. A noite dá-te motivos de acção de graças; olhando o céu e contemplando a beleza das estrelas, reza ao Senhor do universo, que fez todas as coisas com tal sabedoria. Quando vês a natureza adormecida, adora Aquele que, por meio do sono, nos reconforta de todas as fadigas e nos devolve, através do repouso, o vigor das forças. Deste modo, rezarás sem descanso, se a tua oração não se limitar a fórmulas, mas pelo contrário te mantiveres unido a Deus no decurso de toda a tua existência, de maneira a fazeres da vida uma oração incessante. Beata Teresa de Calcutá (1910-1997), fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade Um Simples Caminho "Rezar sempre, sem se desencorajar" Se desejais partir à procura de Deus sem saber como fazer, aprendei a rezar, limitai-vos muito simplesmente a rezar cada dia. Podeis rezar em qualquer sítio, em qualquer momento. Não há necessidade de capela ou igreja. Podeis rezar trabalhando: o trabalho não pára a oração, nem a oração o trabalho. Se sentis necessidade de ajuda, podeis pedir conselho a um padre ou a um pastor. Tentai dirigir-vos directamente a Deus. Falai-lhe, dizei-lhe tudo, espontaneamente, directamente, tal como vos vem à ideia. Ele é o Pai de todos nós. Seja qual for a nossa religião, nós fomos todos criados por Ele e somos seus filhos. Podemos ter confiança nele, amá-lo, acreditar nele, trabalhar para Ele. Quando rezamos, os nossos problemas são resolvidos na medida do que é bom para nós. Sem a oração, eu não poderia cumprir o meu trabalho, nem que fosse uma meia hora. Eu recebo a minha força de Deus pela oração. S. Siluane (1866-1938), monge ortodoxo Escritos "Rezar sempre, sem se desencorajar" Passei a minha vida rodeado pelo bem e pelos pecados e, ao longo do meu sexagésimo ano, reconheci a força que o hábito tem. A alma e a inteligência podem também adquirir hábitos. E o homem faz aquilo a que está habituado. Se está habituado ao pecado, será constantemente atraído pelo pecado e os demónios levá-lo-ão a isso; mas, se tem o hábito do bem, Deus assisti-lo-á com a sua graça. Se ganhares o hábito de rezar sem cessar, de amar o teu próximo e de chorar pelo mundo inteiro durante a tua oração, a tua alma será atraída para a oração, para as lágrimas e para o amor. E, se te habituares a dar esmolas, a ser obediente, a estar aberto aos conselhos do teu confessor, agirás constantemente desse modo e encontrarás assim a paz em Deus. Jean Cassiano (cerca de 360-435), fundador do mosteiro de Marseille Conferências, nº9 "É preciso orar sempre sem cessar" Todo o fim do monge e a perfeição de coração consistem numa perseverança ininterrupta na oração. Tanto quanto ele está sujeito à fragilidade humana, esforça-se por adquirir uma tranquilidade absoluta de alma e uma perfeita pureza de coração. Tal é a razão que nos faz empreender o trabalho corporal e buscar de todas as maneiras a verdadeira contrição de coração, com uma constância incessante. Para adquirir o fervor e a pureza necessárias, a oração reclama uma total fidelidade nos seguintes pontos: primeiramente, uma completa libertação de toda a inquietação referente à carne. Em seguida, nenhum assunto, nenhum interesse cuja preocupação não possa ser excluída. Renunciar também à maledicência, às tagarelices, a toda a palavra vã e a toda a chalaça. Acima de tudo cortar pela raiz a origem da cólera e da tristeza. Destruir, em si, a paixão de todo o desejo carnal e apego ao dinheiro. Depois desta purificação que garante a pureza e a simplicidade, é preciso lançar o alicerce duma profu nda humildade, capaz de sustentar a torre espiritual das virtudes que nos une ao céu. Enfim, para que o edifício espiritual das virtudes ganhe consistência, é preciso impedir à alma toda a dispersão em divagações e pensamentos fúteis. Nesse momento, o coração purificado e livre, começa a elevar-se pouco a pouco até à contemplação de Deus e à intuição das realidades espirituais. Santa Teresa do Menino Jesus (1873-1897), carmelita, Doutora da Igreja Ms C Rezar sempre sem desfalecer Que grande é o poder da oração! Ela é como uma rainha que tem, em todo o momento, livre acesso à presença do rei, podendo obter tudo quanto pede. Para sermos escutados, não precisamos de procurar num livro uma bela fórmula, composta para a circunstância; se assim fosse, mal de mim! À excepção do ofício divino – que não sou digna de recitar –, não tenho coragem para me dedicar à procura de belas orações nos livros, fico cheia de dores de cabeça, tantas são elas! E depois, cada uma mais bela que as outras. Não seria capaz de as recitar a todas e, não sendo capaz de escolher entre elas, faço como as crianças que não sabem ler: digo muito simplesmente a Deus o que quero dizer-Lhe, sem frases bonitas, e Ele compreende-me sempre. Para mim, a oração é um impulso do coração, um simples olhar lançado ao céu, um grito de reconhecimento e de amor, nas dores como nas alegrias; é, enfim, algo grande e sobrenatural, que me dilata a alma e me une a Jesus. Pregador do Papa: «Cristão existe para a Eucaristia e Eucaristia para o cristão» Comentário do Pe. Cantalamessa à liturgia do próximo domingo ROMA, sexta-feira, 19 de outubro de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos o comentário do Pe. Raniero Cantalamessa, ofmcap., pregador da Casa Pontifícia, sobre a liturgia do próximo domingo, XXIX do tempo comum. XXIX Domingo do tempo comum [C] Êxodo 17, 8-13a; 2 Timóteo 3, 14-4, 2; Lucas 18, 1-8 Propôs-lhes uma parábola sobre a necessidade de orar O evangelho [dominical] começa assim: «Jesus propôs-lhes uma parábola para mostrar que é necessário orar sem jamais deixar de fazê-lo». A parábola é a do juiz iníquo. À pergunta: «Quantas vezes é preciso orar?», Jesus responde: sempre! A oração, como o amor, não suporta o cálculo das vezes. Deve-se perguntar talvez quantas vezes ao dia uma mãe ama seu filho, ou um amigo a seu amigo? Pode-se amar com grandes diferenças de consciência, mas não a intervalos mais ou menos regulares. Assim também é a oração. Este ideal de oração contínua se levou a cabo, em diversas formas, tanto no Oriente como no Ocidente. A espiritualidade oriental a praticou com a chamada oração de Jesus: «Senhor Jesus Cristo, tende piedade de mim». O Ocidente formulou o princípio de uma oração contínua, mas de forma mais dúctil, tanto como para poder ser proposta a todos, não só àqueles que fazem profissão explícita de vida monástica. Santo Agostinho diz que a essência da oração é o desejo. Se o desejo é de Deus contínuo, contínua é também a oração; se faltar o desejo interior, pode-se gritar o quanto for; para Deus, estaremos mudos. Este desejo secreto de Deus, feito de lembrança, de necessidade de infinito, de nostalgia de Deus, pode permanecer vivo inclusive enquanto se está obrigado a realizar outras coisas: «Orar longamente não equivale a estar muito tempo de joelhos ou com as mãos unidas ou dizendo muitas palavras. Consiste mais em suscitar um contínuo e devoto impulso do coração para Aquele a quem invocamos». Jesus nos deu, em primeira pessoa, o exemplo da oração incessante. Dele se diz nos evangelhos que orava de dia, ao cair da tarde, pela manhã, e que passava às vezes toda a noite em oração. A oração era o tecido conectivo de toda sua vida. Mas o exemplo de Cristo nos diz também outra coisa importante. É ilusório pensar que se pode orar sempre, fazer da oração uma espécie de respiração constante da alma inclusive em meio às atividades cotidianas, se não reservamos também tempos fixos nos quais se espera pela oração, livres de qualquer outra preocupação. Aquele Jesus a quem vemos orar sempre é o mesmo que, como todo judeu de seu tempo, três vezes por dia – ao sair o sol, na tarde, durante os sacrifícios do templo, e no pôr-do-sol – parava, se orientava para o templo de Jerusalém e recitava as orações rituais, entre elas o Shema Israel, Escuta Israel. No Sábado Ele também participa, com os discípulos, do culto da sinagoga, e vários episódios evangélicos acontecem precisamente neste contexto. A Igreja igualmente fixou, pode-se dizer que desde o primeiro momento de vida, um dia especial para dedicar ao culto e à oração, o domingo. Todos sabemos em que se converteu, lamentavelmente, o domingo em nossa sociedade; o esporte, em particular o futebol, de ser um fator de entretenimento e lazer, se transformou em algo que com freqüência envenena o domingo... Devemos fazer o possível para que este dia volte a ser, como estava na intenção de Deus ao mandar o descanso festivo, uma jornada de serena alegria que consolida nossa comunhão com Deus e entre nós, na família e na sociedade. É um estímulo para nós, cristãos modernos, recordar as palavras que os mártires Saturnino e seus companheiros dirigiram, no ano 305, ao juiz romano que havia mandado prendê-los por ter participado na reunião dominical: «O cristão não pode viver sem a Eucaristia dominical. Não sabias que o cristão existe para a Eucaristia e a Eucaristia para o cristão?». [Tradução realizada por Zenit] Evangelho segundo S. Lucas 18,9-14. Disse também a seguinte parábola, a respeito de alguns que confiavam muito em si mesmos, tendo-se por justos e desprezando os demais: «Dois homens subiram ao templo para orar: um era fariseu e o outro, cobrador de impostos. O fariseu, de pé, fazia interiormente esta oração: 'Ó Deus, dou-te graças por não ser como o resto dos homens, que são ladrões, injustos, adúlteros; nem como este cobrador de impostos. Jejuo duas vezes por semana e pago o dízimo de tudo quanto possuo.' O cobrador de impostos, mantendo-se à distância, nem sequer ousava levantar os olhos ao céu; mas batia no peito, dizendo: 'Ó Deus, tem piedade de mim, que sou pecador.' Digo-vos: Este voltou justificado para sua casa, e o outro não. Porque todo aquele que se exalta será humilhado, e quem se humilha será exaltado.» S. João Clímaco (c. 575 - c. 650), monge no Monte Sinai A Escada Santa, cp. 28 "Tem piedade de mim que sou pecador" Que a vossa oração seja muito simples; uma só palavra bastou ao publicano e ao filho pródigo para obterem o perdão de Deus (Lc 15,21)... Não rebusquem as palavras da vossa oração; quantas vezes o balbuciar simples e monótono das crianças não dobrou a vontade dos seus pais?! Não se lancem, pois, em longos discursos para que o vosso espírito não se distraia na busca das palavras. Uma só palavra do publicano tocou a misericórdia de Deus; uma só palavra cheia de fé salvou o bom ladrão (Lc 23,42). O palavreado na oração enche muitas vezes o espírito de imagens e distrai-o, ao passo que uma só palavra tem, muitas vezes, o efeito de o concentrar. Sentem-se consolados, agarrados por uma palavra da vossa oração? Então, detenham-se nela porque é o vosso anjo que reza convosco. Não se convençam demais, mesmo se atingiram a pureza, mas vivam em grande humildade e então hão-de sentir grande confiança. Mesmo se já subiram a escada da perfeição, rezem para pedir o perdão dos vossos pecados; escutem o que diz S. Paulo: "Sou o primeiro dos pecadores" (1Tm 1,15)... Se estiverem revestidos de mansidão e libertos de toda a cólera, já não vos custará muito para libertarem o vosso espírito do cativeiro. Enquanto não conseguirmos uma oração verdadeira, assemelhamo-nos aos que ensinam as crianças a dar os primeiros passos. Trabalhem para elevar o vosso pensamento ou, melhor, para confiná-lo às palavras da vossa oração; se a fraqueza da infância o fizer cair, ergam-no. Porque o espírito é instável por natureza mas Aquele que pode tudo fortalecer pode estabilizar também o vosso espírito... O primeiro degrau da oração consiste, pois, em expulsar com uma palavra simples as sugestões do espírito no próprio momento em que elas se apresentam. O segundo é guardar o nosso pensamento apenas para o que dizemos e pensamos. O terceiro é a entrega da alma ao Senhor. S. Bernardo (1091-1153), monge cisterciense e doutor da Igreja 3º sermão sobre a Anunciação, 9-10 «O publicano... não ousava sequer levantar os olhos ao céu» Qual é o vaso para onde a graça se inclina de preferência? Se a confiança foi feita para receber nela a misericórdia, e a paciência para recolher a justiça, que recipiente podemos propor que esteja apto a receber a graça? Trata-se de um bálsamo muito puro e precisa de um vaso muito sólido. Ora o que há de mais puro e o que há de mais sólido que a humildade de coração? É por isso que Deus «dá a sua graça aos humildes» (Tg 4,6); foi com razão que «Ele poisou o seu olhar na humildade da sua serva» (Lc 1, 48). Com razão, porque um coração humilde não se deixa ocupar pelo mérito humano e a plenitude da graça pode expandir-se nele mais livremente... Observastes este fariseu em oração? Ele não era, nem um ladrão, nem injusto, nem adúltero. Não negligenciava a penitência. Jejuava dois dias por semana, dava o dízimo de tudo quanto possuía... Mas não estava esvaziado de si mesmo, não se despojara de si próprio (Fl 2,7), não era humilde, mas, pelo contrário, altivo. Com efeito, não se preocupou em saber o que ainda lhe faltava, mas exagerou o seu mérito; Não estava cheio, mas inchado. E foi-se embora vazio, por ter simulado a plenitude. O publicano, pelo contrário, porque se humilhou a si próprio e se preocupou em se apresentar como um vaso vazio, pôde trazer uma graça muito mais abundante. Fénelon (1651-1715), arcebispo de Cambrai Sermão “Quem se exalta será humilhado; quem se humilha será exaltado” A justiça farisaica é mais comum do que se imagina. O primeiro defeito desta justiça consistia em que o fariseu a colocava toda nas obras, apegando-se supersticiosamente ao rigor da letra da lei, para a observar ponto por ponto, sem lhe procurar o espírito. Eis precisamente o que fazem tantos cristãos. Jejuam, dão esmolas, frequentam os sacramentos, vão ao ofício à igreja, até rezam, sem amor a Deus, sem se desapegarem do mundo, sem caridade, sem humildade, sem renúncia a si próprios: estão satisfeitos, desde que tenham à sua frente um certo número de boas obras feitas regularmente. Isto é ser fariseu. Sigamos Deus pela estrada obscura da fé pura; percamos de vista tudo o que ele nos quiser esconder; caminhemos, como Abraão, sem saber para onde nos levam os nossos passos; não contemos senão com a nossa miséria e com a misericórdia de Deus. Santa Teresa do Menino Jesus (1873-1897), carmelita, Doutora da Igreja Manuscrito autobiográfico C, 36, rº-vº Pela confiança e pelo amor Eis a minha oração: peço a Jesus que me atraia para as chamas do seu amor, que me una tão estreitamente a Si, que Ele viva e aja mim. Sinto que, quanto mais o fogo do amor me abrasar o coração, quanto mais disser: “Atraí-me!”, mais as almas que se aproximarem de mim (pobre e pequeno destroço inútil de ferro, se me afastasse do braseiro divino), mais essas almas acorrerão com rapidez ao odor dos perfumes do seu Bem-Amado. […] Minha Madre querida, gostaria agora de lhe dizer o que entendo pelo odor dos perfumes do Bem-Amado. Dado que Jesus ascendeu ao céu, a única maneira de O seguir é seguir os vestígios que Ele deixou, e quão luminosos, quão odoríferos são estes vestígios! Basta-me lançar um olhar aos Santos Evangelhos, que imediatamente respiro os perfumes da vida de Jesus e sei para que lado devo correr. E não me lanço ao primeiro lugar, mas ao último; em vez de avançar com o fariseu, repito, cheia de confiança, a prece humilde do publicano. Mas, sobretudo, imito a conduta de Maria Madalena, a sua espantosa – ou melhor, a sua amorosa audácia, que encanta o coração de Jesus e seduz o meu. Sinto de facto que, mesmo que me pesassem na consciência todos os pecados que podem ser cometidos, me lançaria de coração despedaçado nos braços de Jesus, pois sei que Ele acarinha o filho pródigo que a Ele regressa. Não é pelo facto de Deus, na sua misericórdia proveniente, ter preservado a minha alma do pecado mortal que me elevo a Ele pela confiança e pelo amor. Pregador do Papa: os novos fariseus e publicanos Comentário do padre Cantalamessa à liturgia do próximo domingo ROMA, sexta-feira, 26 de outubro de 2007 (ZENIT.org).- Publicamos o comentário do padre Raniero Cantalamessa, ofmcap. – pregador da Casa Pontifícia – à liturgia do próximo domingo, XXX do tempo comum. XXX Domingo do tempo comum [C] Eclesiástico 35,15b-17.20-22a; 2 Timóteo 4, 6-8.16-18; Lucas 18, 9-14 O fariseu e o publicano O Evangelho deste domingo é a parábola do fariseu e do publicano. Quem for à igreja no domingo ouvirá um comentário mais ou menos desse tipo. O fariseu representa o conservador que se sente em ordem com Deus e com os homens e olha com desprezo para o próximo. O publicano é a pessoa que errou, mas o reconhece e pede humildemente perdão a Deus; não pensa em salvar-se por méritos próprios, mas pela misericórdia de Deus. A escolha de Jesus entre estas duas pessoas não deixa dúvidas, como indica o final da parábola: este último volta para casa justificado, isto é, perdoado, reconciliado com Deus; o fariseu volta para casa como havia saído dela: mantendo sua justiça, mas perdendo a de Deus. De tanto ouvi-la e de repeti-la, esta explicação começou a me deixar insatisfeito. Não é que esteja errada, mas já não responde aos tempos. Jesus dizia suas parábolas para as pessoas que o escutavam naquele momento. Em uma cultura carregada de fé e religiosidade como aquela da Galiléia e da Judéia, a hipocrisia consistia em ostentar a observância da lei e santidade, porque estas eram as coisas que atraíam o aplauso. Em nossa cultura secularizada e permissiva, os valores mudaram. O que se admira e abre caminho ao êxito é mais o contrário que o daquele tempo: é a rejeição das normas morais tradicionais, a independência, a liberdade do indivíduo. Para os fariseus, a senha era «observância» das normas; para muitos, hoje, a senha é «transgressão». Falar de um autor, de um livro ou de um espetáculo que é «transgressor» é torná-lo célebre. Em outras palavras, hoje devemos adaptar os termos da parábola, para salvaguardar a intenção original. Os publicanos de ontem são os novos fariseus de hoje! Atualmente é o publicano, o transgressor, quem diz a Deus: «Eu vos agradeço, Senhor, porque não sou como aqueles fariseus crentes, hipócritas e intolerantes, que se preocupam com o jejum, mas na vida são piores que nós». Parece que há quem paradoxalmente ora assim: «Eu vos dou graças, ó Deus, porque sou um ateu!». Rochefoucauld dizia que a hipocrisia é o tributo que o vício paga à virtude. Hoje é freqüentemente o tributo que a virtude paga ao vício. Tende-se, de fato, especialmente por parte dos jovens, a mostrar-se pior e mais desvirtuado do que se é, para não parecer menos que os demais. Uma conclusão prática, válida tanto na interpretação tradicional aludida no início como na desenvolvida aqui, é esta. Pouquíssimos (talvez ninguém) estão sempre do lado do fariseu ou sempre do lado do publicano, isto é, justos em tudo ou pecadores em tudo. A maioria de nós tem um pouco de um e um pouco de outro. O pior seria comportar-nos como o publicano na vida e como o fariseu no templo. Os publicanos eram pecadores, homens sem escrúpulos que colocavam o dinheiro e negócios acima de tudo; os fariseus, pelo contrário, eram, na vida prática, muito austeros e observantes da Lei. Nós nos parecemos, portanto, com o publicano na vida e com o fariseu no templo se, como o publicano, somos pecadores e, como o fariseu, nos consideramos justos. Se tivermos de resignar-nos a ser um pouco de um e de outro, então que pelo menos seja o contrário: fariseus na vida e publicanos no templo! Como o fariseu, tentemos não ser na vida ladrões e injustos, procuremos observar os mandamentos e pagar as taxas; como o publicano, reconheçamos, quando estamos na presença de Deus, que o pouco que fizemos é dom seu e imploremos, para nós e para todos, sua misericórdia. [Tradução realizada por Zenit] Paixão das Santas Felicidade e Perpétua (início do séc. III) "Aquele que se declarar por mim diante dos homens, também o Filho do Homem se declarará por ele diante de de Deus" Prenderam alguns jovens que eram catecúmebnos: Revocato e Felicidade, ambos escravos, Saturnino e Secúndulo; com eles está Víbia Perpétua. Esta era de nobre nascimento, tinha recebido uma educação primorosa e feito um bom casamento. Perpétua tinha ainda pai e mãe, dois irmãos - um deles também era catecúmeno - e um filho ainda de peito. Tinha cerca de 22 anos. Ela própria contou a história do seu martírio. Ei-la, tal como a escreveu ou a partir das suas impressões: "Estávamos ainda com os guardas e já o meu pai tentava convencer-me. Na sua ternura, esforçava-se por esboroar a minha fé. - Pai, disse-lhe eu, vês aquele vaso que está ali caído, aquela bilha ou lá o que é? - Vejo, disse o meu pai. - Pode-se dar-lhe um nome diferente daquele que tem? - Não, respondeu ele. - Pois comigo é o mesmo, não posso ter outro senão o meu verdadeiro nome: sou cristã. O meu pai ficou exasperado com esta frase e lançou-se sobre mim para me arrancar os olhos. No entanto, apenas me bateu e foi-se embora, vencido, apesar dos argumentos que o demónio lhe tinha dado. Durante alguns dias, não tornei a ver o meu pai; agradeci a Deus por isso; esta ausência era para mim um alívio. Foi precisamente durante este curto espaço de tempo que nós fomos baptizados. O Espírito Santo inspirou-me que não pedisse nada à água santa para além da força de resistir fisicamente. Alguns dias mais tarde, fomos transferidos para a prisão de Cartago. Fiquei aterrada; nunca me tinha encontrado em tais trevas... Eu reconfortava o meu irmão, recomendando-lhe o meu filho. Sofria muito por ver os meus a sofrerem por minha causa. Durante longos dias, estas inquietações atormentaram-me. Acabei por conseguir que o meu filho ficasse comigo na prisão. Imediatamente ele recuperou as forças e libertei-me da tristeza e das preocupações que ele me tinha causado. De repente, a prisão transformou-se para mim em palácio a achava-me ali melhor do que em qualquer outro lugar." Evangelho segundo S. Lucas 18,15-30: Jesus e os pequeninos. O jovem rico – cf.par. Mt 19,13-30; Mc 10,13-31. Evangelho segundo S. Lucas 18,31-34: Terceira predição da paixão ja próxima – cf.par. Mt 20,17-19; Mc 10,32-34 Evangelho segundo S. Lucas 18,35-43. – cf.par. Mt 20,29-34; Mc 10,46-52 Quando se aproximavam de Jericó, estava um cego sentado a pedir esmola à beira do caminho. Ouvindo a multidão que passava, perguntou o que era aquilo. Disseram-lhe que era Jesus de Nazaré que ia a passar. Então, bradou: «Jesus, Filho de David, tem misericórdia de mim!» Os que iam à frente repreendiam-no, para que se calasse. Mas ele gritava cada vez mais: «Filho de David, tem misericórdia de mim!» Jesus parou e mandou que lho trouxessem. Quando o cego se aproximou, perguntou-lhe: «Que queres que te faça?» Respondeu: «Senhor, que eu veja!» Jesus disse-lhe: «Vê. A tua fé te salvou.» Naquele mesmo instante, recobrou a vista e seguia-o, glorificando a Deus. E todo o povo, ao ver isto, deu louvores a Deus. Odes de Salomão (texto cristão hebraico do princípio do séc. II) § 21 «Seguia a Jesus dando glória a Deus» Ergui os braços aos céus para a graça do Senhor. Ele libertou-me das correntes, atirando-as para longe de mim; o meu protector criou-me na graça e na salvação. Despi-me das trevas e vesti-me de luz. Apercebi-me de que o meu corpo não sentia dificuldade, dor ou angústia. O pensamento do Senhor socorreu-me muito, tanto quanto a sua comunhão incorruptível. A sua luz exaltou-me, caminhei na sua presença, e aproximar-me-ei d’Ele, louvando-O e glorificando-O. O meu coração transbordou, invadiu a minha boca e jorrou-me nos lábios. A exultação do Senhor e o seu louvor alegram o meu rosto. Aleluia! S. Gregório o Grande (c. 540-640), Papa, Doutor da Igreja Sermões sobre o Evangelho, nº 2; PL 76, 1081 ( Trad. Luc comentada, DDB 1987, p139 rev.) «O homem começou a ver e seguia Jesus dando glória a Deus» O Nosso Redemptor, prevendo que os discípulos ficassem perturbados com a sua Paixão, anuncia-lhes com muita antecedência os sofrimentos da sua Paixão e a glória da sua Ressurreição (Luc 18, 31-33). Assim, vendo-o morrer como lhes anunciara, não duvidariam da sua Ressurreição. Mas, presos ainda à nossa condição carnal, os discípulos não podiam compreender estas palavras anunciando o mistério (v. 34). É então que intervém um milagre: debaixo dos seus olhos, um cego recupera a visão, para que aqueles que eram incapazes de assimilar as palavras do mistério sobrenatural fossem sustentados na sua fé à vista de um acto sobrenatural. É que devemos ter um duplo olhar sobre os milagres do nosso Salvador e Mestre: são factos que devemos aceitar como tais e são signos que remetem para outra coisa... Assim, no plano da história, não sabemos nada acerca de quem era este cego. Mas que ele é designado de forma obscura, sabemo-lo. Este cego é o género humano expulso, na pessoa do seu primeiro pai, da alegria do Paraíso, que não tem qualquer conhecimento da luz divina e está condenado a viver nas trevas. Contudo, a presença do seu Redemptor ilumina-o: ele começa a ver as alegrias da luz interior, e, desejando-as, pode pôr os pés na caminhada de vida das boas obras. S. Simão o Novo Teólogo (cerca 949-1022), monge ortodoxo Hino 18 A luz que me conduz pela mão Nós conhecemos o amor que tu nos deste, sem limite, indizível, que nada pode encerrar; ele é luz, luz inacessível, luz que age em tudo...Com efeito, o que é que esta luz não faz, e o que é que ela não é? Ela é encanto e alegria, doçura e paz, misericórdia sem medida, abismo de compaixão. Quando a possuo, não a observo mais; vejo-a apenas quando ela se vai. Precipitome para a prender, e ela foge totalmente. Não sei o que fazer e consumo-me. Aprendo a pedir e a procurar com lágrimas e em grande humildade, a não considerar como possível o que ultrapassa a natureza, nem como efeito do meu poder ou do esforço humano, aquilo que vem da compaixão de Deus e da sua misericórdia infinita... Esta luz conduz-nos pela mão, fortifica-nos, ensina-nos, mostrando-se, mas fugindo assim que temos necessidade dela. Não é quando a queremos – o que pertence aos perfeitos – mas é assim que ficamos embaraçados e completamente esgotados que ela vem em nosso socorro. Ela aparece de longe e faz-me sent i-la no meu coração. Grito até me sufocar de tanto que a quero prender, mas tudo é noite, e vazias estão as minhas pobres mãos. Esqueço tudo, sentome e choro, desesperando de a ver ainda uma outra vez. Quando chorei muito e consenti em me deter, então, vindo misteriosamente, ela toma-me a cabeça, e eu derreto-me em lágrimas sem saber quem está a iluminar o meu espírito de uma luz muito doce. São Simeão o Novo Teólogo (cerca 949-1022), monge ortodoxo Ética 5 “Filho de David, tem piedade de mim” Tu aprendeste, meu amigo, que o Reino dos céus está dentro de ti (Lc 18,21) se tu o quiseres e todos os bens eternos estão nas tuas mãos. Apressa-te então em ver, em agarrar e conseguir para ti os bens guardados em reserva… Geme; prosterna-te. Como o cego de outrora, diz agora também tu: “Tem piedade de mim, Filho de Deus, e abre os olhos da minha alma, a fim de que eu veja a Luz do mundo que és tu, ó meu Deus (Jo 8,12), e que eu também me torne filho dessa luz divina (Jo 12,36). Ó clemente, envia também o Consolador sobre mim, a fim de que ele próprio me ensine (Jo 14,26) o que a ti diz respeito, ó Deus do universo. Permanece também em mim, como disseste, a fim de que me torne pelo meu lado digno de permanecer em ti (Jo 15,4). Concede-me que eu saiba entrar em ti e saiba que te tenho em mim. Ó invisível, digna-te tomar forma em mim, a fim de que ao ver a tua beleza inacessível, eu possua a tua imagem, ó celeste, e esqueça todas as coisas visíveis. Concede-me a glória que o Pai te de u (Jo 17,22), ó misericordioso, a fim de que, semelhante a ti como todos os teus servidores, eu partilhe da tua vida divina segundo a graça e que eu esteja contigo continuamente, agora e sempre e por todos os séculos sem fim”. Santa Teresa Benedita da Cruz [Edith Stein] (1891-1942), carmelita, mártir, co-patrona da Europa "Senhor, que eu veja" Muitas vezes as forças pareciam querer abandonar-me. Mais vezes ainda, desesperava de ver a luz. Mas, no momento em que o meu coração estava amarrado pela dor, eis que uma estrela se elevou diante de mim. Ela conduziu-me e eu segui-a, primeiro com um passo hesitante, depois com confiança. Aquilo que tinha de esconder no mais profundo do meu coração, posso agora proclamá-lo alto e forte: eu creio, eu confesso. Senhor, será possível que renasça quem já viveu metade da sua vida? (Jo 3,4) Tu o disseste e isso verificou-se comigo. O fardo de uma longa vida de faltas e de sofrimentos caíu dos meus ombros. Ah! nenhum coração humano pode compreender o que Tu reservas aos que te amam. Agora que te agarrei, nunca mais te hei-de largar (Ct 3,4) Seja qual for o caminho que tome a minha vida, Tu estás comigo. Nada poderá separar-me do teu amor.