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Rebeca Fogaça Porto
A MÚSICA NA FORMAÇÃO DO MUSICOTERAPEUTA
Faculdades Metropolitanas Unidas
FMU
2007
Rebeca Fogaça Porto
A MÚSICA NA FORMAÇÃO DO MUSICOTERAPEUTA
Trabalho apresentado para a
Conclusão de Curso sob a
orientação da Profa Mestre
Maristela Pires da Cruz Smith.
Faculdades Metropolitanas Unidas
FMU
2007
Para Marili Macruz, Cláudia
Maradei Freixedas e Mara
Campos, mestras queridas,
mulheres sensacionais.
À minha madrinha, Carin
Zwilling, companheira de
todas as horas.
“Eu não quero ouvir as notas.
Quero ouvir o espírito. Ele está
dentro de vocês, não na
música”.
Arturo Toscanini (1867-1957)
AGRADECIMENTOS
Expresso meus sinceros agradecimentos à minha orientadora, Maristela Pires da Cruz
Smith.
Aos meus amigos, pela amizade e pelo carinho, mesmo quando eu não estava disponível
para estar junto com eles – eles estiveram comigo.
Aos meus pais, Maria José Fogaça e Renato Carlos Porto, que me alimentam de música
desde que vim à luz.
Ao meu tio Mario Xavier Rabello Júnior, pela ajuda na formatação desta monografia.
À minha madrinha Carin Zwilling, pela querida presença, pelo carinho e apoio
incondicional.
À Marili Macruz Ferreira da Silva, pelo alimento musical nos primeiros anos de minha
formação pianística e musical.
À Cláudia Maradei Freixedas, pelas valiosas aulas de conjunto de flauta-doce,
preparando-me para tocar em grupo e descobrir quão maravilhoso é estar conectada a mais
pessoas e a fazer um trabalho de qualidade.
À Mara Campos, pela inesquecível experiência no Coral Infanto-Juvenil, na Escola
Municipal de Música, à qual dedico o presente trabalho.
À Sabrina Sanches Martins, por seu afeto incondicional e pela presença querida.
Ao amigo João Carlos Macruz, pelo apoio e pelo carinho, me ajudando a encontrar as
músicas para um momento difícil de minha vida, durante a formação acadêmica.
Aos profissionais da área de musicoterapia que forneceram seus depoimentos,
enriquecendo, com o relato da própria experiência, o presente trabalho.
A todos os meus pacientes, de ontem, de hoje e de amanhã, por suas valiosas
contribuições no meu crescimento profissional e pessoal.
A todos os professores que contribuíram para o enriquecimento do trabalho.
A minha família, sempre presente.
Muito obrigada a todos!
RESUMO
O presente trabalho tem por objetivo enfatizar a importância da música na formação do
musicoterapeuta, uma vez que este utiliza seus elementos – som, ritmo, melodia e harmonia, para
facilitar e promover o processo de comunicação, relação, aprendizagem, mobilização, expressão,
organização e outros objetivos terapêuticos relevantes. A música é a relação entre os sons e não o
próprio som. Compreender e fazer música é, primeiro, ser dotado da faculdade de perceber
intervalos e de estabelecer intervalos entre eles. Ouvir, escutar a música não basta,
evidentemente, para despertar o senso musical. É necessário que ao menos uma vez a música e o
ato de fazê-la tenham suscitado uma forte emoção psíquica, uma tensão motora decisiva em todo
ser.E a condição necessária para tanto é precisamente fazer música. E para fazer música com seu
paciente, o musicoterapeuta necessita de conhecimentos musicais que o tornem hábil a criar, a
improvisar, a acompanhar e a interagir com ele no fazer musical.
ABSTRACT
This work has the objective to stress the importance of
music on musictheraphyst
background, now and them that he or she makes use of it’s elements – sound, rhythm, melody and
harmony, to facilitate and foment the process of communication, relationship, apprenticeship,
mobilizing, expression, organization and other relevant therapeutic objectives. Music is the
relationship between sounds, not the sound itself. Comprehending and making music is first be
endowed of faculty to perceive intervals and found intervals between them. To hear and listen
music is not enough, evidently, to arouse music sense. Its necessary that once in a while music
and making music had aroused a strong psychological emotion, a stretched motive decisive in all
of the self. And the necessary condition for that is exactly making music. And for making music
with your patient, the musictheraphyst needs music knowledge that make him able to create, to
improvise, to go along with and to join with him on making music.
LISTA DE FIGURAS
Sessão musicoterápica com paciente com Transtorno de Linguagem..............................
6
Sessão musicoterápica com pacientes portadores de Síndrome de Down........................
33
Número Correspondente de Figuras Musicais..................................................................
53
Partitura Tradicional.........................................................................................................
55
Partitura não-convencional...............................................................................................
56
Sessão musicoterápica com criança portadora de paralisia cerebral................................. 71
Setting musicoterápico......................................................................................................
77
Alunos em aula de música, na Escola Lourenço Castanho............................................... 80
ÍNDICE
PREFÁCIO...................................................................................................................................... 1
INTRODUÇÃO............................................................................................................................... 2
1.
OUVIR ATIVO: OUVINDO A MÚSICA.............................................................................. 6
2.
A MÚSICA E A MEDICINA EM DIFERENTES CONTEXTOS DA HISTÓRIA ............ 16
3.
O CONCEITO DE MÚSICA EM MUSICOTERAPIA........................................................ 19
4.
FORMAÇÃO MUSICAL DO MUSICOTERAPEUTA....................................................... 36
5.
A MÚSICA NO CONTEXTO CLÍNICO ............................................................................. 57
6.
A IMPROVISAÇÃO MUSICAL DO MUSICOTERAPEUTA ........................................... 73
CONCLUSÃO............................................................................................................................... 84
EPÍLOGO ...................................................................................................................................... 86
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................ 87
ANEXO ......................................................................................................................................... 90
PREFÁCIO
Uma vez ouvi uma história que ilustrou o poder que a música tem sobre os seres humanos
e a natureza1.
Havia um jovem indígena, que era muito feio; entretanto, tocava flauta tão lindamente,
que todas as mulheres da aldeia logo se apaixonaram por ele. Mas só uma era correspondida. O
casal apaixonado logo quis marcar a data do casamento.
Um dia, porém, o jovem saiu para caçar. Sua noiva, percebendo sua demora, começou a
ficar apreensiva, e foi em busca do amado. Encontrou-o morto, ao lado do lago – ele havia sido
mordido por uma cobra.
A moça chorou sua dor – tão grande era seu pesar, que todos os dias ela ia ao local, chorar
pelo noivo.
Vendo a grande tristeza da noiva, o jovem pediu a Tupã que fizesse algo para minorar o
sofrimento de sua amada. Tupã então criou um pássaro que, apesar de feio, tinha o mais belo
canto, - tão belo, que todos que o ouvissem ficariam apaixonados: homens, mulheres, crianças, os
animais do céu e da terra.
E foi assim que o uirapuru passou a ser a alegria de todos os seres vivos daquela aldeia.
É com essa história que eu inicio e justifico este trabalho: nós, musicoterapeutas, através
da nossa ferramenta de trabalho – a música – podemos fazer o amor florescer nos corações
daqueles que nos procuram, tornando-nos verdadeiros uirapurus, tornando mais alegre a vida
daqueles que nos procuram, ajudando-os a se tornarem pessoas mais saudáveis, autoconfiantes e
criativas.
1
Tive oportunidade de ouvir essa história em um curso que do qual participei, de 1o a quatro de maio de
2003, cujo tema era “Imaginar, criar, expressar”- desenvolvendo a arte de contar histórias”, ministrado por Mônica
Rosales e Izildinha Carvalho.
1
INTRODUÇÃO
No início era o caos e o som. Um mundo incógnito intrigava o homem, munido
de sentidos e da inteligência. Partindo da percepção decontínua, o homem
começou a criar ordenações, mitologias e rituais, que aplacassem um pouco a sua
incompreensão e desproteção frente a natureza que ora o acalentava, ora o
aterrorizava. Criando seus símbolos, pôde expressar valores e expressar a
realidade vivida (...). (MILLECCO, BRANDÃO e MILLECO FILHO, p. 3).
A música constitui ferramenta interdisciplinar necessária à construção do conhecimento.
Graças a ela a história consegue estabelecer uma relação entre Beethoven e Iluminismo, Wagner
e Schopenhauer, forma-sonata e Eisenstein, sistema tonal e racionalismo, Stravinsky e Bérgson
(tempo duração e tempo espaço), Eisler e a música ideologicamente comprometida, tornando
sedutora a descoberta de que existe música na história, na pintura, poesia, ciência, e assim por
diante. Mesmo a psicanálise encontra em certa medida um interlocutor na música em razão de
que esta favorece a constituição de uma dialética da alteridade por meio da inscrição da pulsão no
campo da cultura.
A música pode originar-se nos expressivos sons vocais, os quais são importantes na
manutenção da relação mãe-bebê e pode vir a representar uma forma não-verbal ou pré-verbal
relacionada com a infância.
Em tempos antigos, existiam nas tribos as “músicas de cura” executadas por pajés ou
xamãs para afastar os espíritos que causavam as enfermidades. Existe este procedimento ainda
hoje nas pajelanças das tribos indígenas do Brasil. Como essas músicas serviam de comunicação
com os espíritos causadores das enfermidades, também atingiam outro aspecto, o próprio
paciente, produzindo efeitos catárticos ou psicológicos que auxiliavam na cura.
Os gregos procuravam, através de um saber racional, reflexivo, conhecer a essência de
todas as coisas. Os primeiros filósofos procuravam encontrar os elementos que constituíam a
natureza do homem. A doença consistia no desequilíbrio destes elementos – como, por exemplo,
o frio e o calor – que deveriam ser reequilibrados, para o retorno da saúde do ser humano. Nesse
processo de equilíbrio, a música, por ser a ordenação e a harmonia dos sons, provocava tanto a
2
depuração catártica das emoções como a de enriquecer a mente e dominar as emoções através de
melodias que levam ao êxtase.
O poder da música para a concentração e para a manipulação das emoções humanas não
está interessando apenas os músicos e estudiosos da música – psicólogos, produtores de cinema e
políticos também se interessam por esses novos campos, como meio para atingir os seus
objetivos.
Todas as tarefas e movimentos do cotidiano têm seu ritmo – os ritmos circadianos:
levantar, tomar café, andar, correr; estes ritmos têm de estar em sintonia com nosso ritmo interno
– o metabolismo, o batimento cardíaco, a circulação. O exterior reflete o interior.
O ritmo é ação e movimento em ondas de expansão e contração – inspiração e expiração –
pontuadas no tempo (longas, curtas), que se repetem e se diferenciam, criando uma ordem e
coerência, uma continuidade e vida, tendo como guia um pulso. Dá energia ao corpo e faz vibrar
a alma de entusiasmo e alegria, que se potencializam no indivíduo e no grupo. Trabalha o
impulso volitivo, a presença de espírito, a coordenação motora, a segurança individual e a
integração social. Estabelece uma linguagem que facilita a comunicação; desperta a sensação de
união, força e liberdade.
A melodia é movimento no espaço. Os tons flutuam nas diversas alturas criando imagens
e pensamentos; reverberam nos sentimentos acordando as memórias do passado. A melodia
desperta a atividade de reflexão interior reconhecendo os tons na sua essência; promove a
expressão de gestos significativos repletos de conteúdo, que se tornam linguagem. Em cada
melodia movem-se forças que tecem fios de pensamentos, que são experimentados no próprio
movimento. Assim como o pensar é a corrente estruturadora da organização humana, o elemento
melódico é o princípio ordenador na música, pois em cada elemento da música se revelam
movimentos interiores plenos de conteúdo. Essa experiência nos é proporcionada pela audição.
A harmonia concentra os elementos melódicos em acordes, como pensamentos
condensados que se tornam emoções. Ela abarca o elemento rítmico dando-lhe sentido no seu
percurso, através das modulações. A harmonia aproxima melodia e ritmo promovendo um
diálogo entre eles, aprofundando a estrutura e o conteúdo musical, apoiando-se no sentir,
vibrando e transformando estruturas emocionais. Finalmente, a harmonia integra o ser homem
com o ser música.
3
Pretendo dissertar sobre a importância da consciência do musicoterapeuta acerca dessas
propriedades – ritmo, melodia e harmonia – consciência que deve ser desenvolvida durante sua
formação ou, se for o caso, antes mesmo desta. A música é a principal ferramenta de trabalho do
musicoterapeuta, que deve ter conhecimentos musicais suficientes para ajudar o paciente na
busca de suas questões.
A produção e introdução da música numa sessão terapêutica facilitam a terapia
considerando que ajuda o paciente a ter um foco interno, que promove estrutura e o faz crescer
emocionalmente. A música é um mecanismo que permite ao indivíduo se auto-explorar através
de meios não-verbais. Na prática, o paciente apresenta uma idéia musical que o musicoterapeuta
apóia, ajudando o paciente a desenvolvê-la e organizá-la; o terapeuta aceita o que é apresentado e
não altera ou não tenta mudar isto para que o paciente possa reconhecer a sua produção.
A Musicoterapia é o campo da medicina que estuda o complexo som-ser humano-som, para utilizar
o movimento, o som e a música, com o objetivo de abrir canais de comunicação no ser humano,
para produzir efeitos terapêuticos, psicoprofiláticos e de reabilitação no mesmo e na sociedade.
(BENENZON, 1988).
Esta definição tem logo após a definição do conceito de música, limitando-se a um mundo
de fenômenos acústicos e de movimento, que envolvem e tornam possível o fenômeno musical.
A música é arte e ciência, elementos estes que correspondem a um processo evolutivo do ser
humano.
Voltando ao conceito de Musicoterapia uma vez esclarecida a limitação da parte de
música, observa-se alguns aspectos do outro componente – a terapia.
Esta palavra vem do grego, therapéia,2 que quer dizer: “servir; parte da medicina os
preceitos e remédios para o tratamento e cura das enfermidades”. Portanto, é o momento de dizer
que a Musicoterapia, segundo a própria palavra, tem como objetivo fundamental à terapia.
Este conceito, talvez simplista, tem por objetivo valorizar o aspecto terapêutico sobre o
musical.
Se a musicoterapia é definida como um campo da medicina, conceituemos a medicina.
Medicina vem do latim e significa: “ciência e arte de precaver e de curar enfermidades”.
O objetivo da Musicoterapia, no campo da medicina, é universal, com contribuição ao
desenvolvimento do ser humano como totalidade indivisível e única.
2
Termo citado por J. C. RIBAS, Música e Medicina. EDIGRAF, São Paulo, 1957
4
O ser humano não pode ser separado por partes – corpo e mente, psique e soma, matéria e
espírito, pois ele é todo; a Musicoterapia é o campo que mais se dirige à totalidade do ser
humano.
Atualmente o campo da medicina é arado por diversos profissionais e especialistas que
são formados em medicina, mas que, sem dúvida, contribuem no sentido de treinar, reabilitar e
recuperar o indivíduo enfermo ou incapacitado. São os educadores, técnicos, psicólogos e
paramédicos, como os musicoterapeutas.
Observando as palestras de musicoterapeutas diversos, comecei a sentir falta de um
sentido para a música. Muitos recorriam aos educadores musicais para suplantar suas dúvidas, e
eu sempre me perguntava – se o musicoterapeuta não domina certas questões da área musical, por
que não aprimorar-se? Por que não reconhecer que um educador musical pode auxiliar seu
trabalho, se este encontra dificuldade para realizar determinados procedimentos musicais? Assim,
como divulgamos nossa área, nossa especificidade, querendo mostrar, por exemplo, nossa
diferença em relação ao educador musical, por que não chamar esse mesmo educador para
auxiliar-nos quando as dúvidas aparecem? Foi a partir daí que concebi a idéia do presente
trabalho.
O musicoterapeuta utiliza propriedades musicais – som, ritmo, melodia e harmonia, com
um dado objetivo, a fim de criar canais de comunicação com seu(s) paciente(s). O
musicoterapeuta fica entre a formação tradicional – erudita – para o domínio dos conceitos de
teoria musical, com a finalidade de acompanhar musicalmente o paciente, realizar o registro
musical das sessões, imprescindíveis nos relatórios, ou uma liberdade para criar a partir da sua
própria musicalidade, tão necessária para lidar com a demanda do paciente. Qual seria o ideal na
formação musical do musicoterapeuta?
Este trabalho tem por objetivo pesquisar o nível da formação dos profissionais e
estudantes de musicoterapia, levantar a bibliografia, com autores de diferentes correntes de
pensamento; fundamentar os primeiros elementos musicais, teóricos, para que o musicoterapeuta
possa dar continuidade ao processo e ser capaz de registrá-los.
O musicoterapeuta que domina os elementos musicais tem facilidade para registrar
passagens musicais de um processo facilidade para criar a partir dos seus próprios conhecimentos
musicais.
5
Pergunta-se: onde estão os limites desse campo e quem são os que os exercem? Onde está
situado o musicoterapeuta?
1. OUVIR ATIVO: OUVINDO A MÚSICA
Não é suficiente ter ouvidos para poder escutar. Colocar-se à escuta consiste em responder
a um apelo de forma deliberada.
A escuta é uma capacidade específica que se utiliza preferencialmente do ouvido a fim de
integrar, graças a ele, mensagens sonoras, entre as quais inscreve-se a música.
O homem evoluído caminha em direção à escuta. Não se trata de uma visão puramente
metafísica, mas de uma realidade concreta que dá ao ouvido sua razão de ser e à música o
sentido de sua existência. Pensando bem, o ouvido é na verdade uma antena aberta para a
comunicação, no sentido mais amplo do termo. Ele está longe de se limitar simplesmente
ao órgão anatômico, como costumamos pensar. Ele pode chegar a transformar o homem,
visto como um todo, em um ouvido (TOMATIS; JACCQUES, 1991).
O musicoterapeuta precisa estar atento às sutilezas que o som ou a música traz – seja a
música trazida pelo paciente, seja a música que escolherá para a sessão. Segundo QUEIROZ
(2002), cada tipo de ouvinte responde à música a partir de uma diferente reação, que pode ser
motora-instintiva (ou física), emocional e mental; cada uma delas podendo ocorrer de modo ativo
/ interativo, resultando seis tipos básicos de ouvintes, isto é, seis tipos básicos de reação à música:
Física: - Receptiva = Fisiológica- reações orgânicas (involuntárias, como dor, alteração
do batimento cardiaco, calor, tontura);
Interativa = Cinestésica – reação por movimentos do corpo (voluntários ou quase
reflexos, como palmas, batida de pé);
Emocional: - Receptiva = Sensitiva – reação pela exacerbação de sentimentos ou da
memória emocional;
- Interativa = Imaginativa – reação pela criação de imagens (fantasia imaginativa
pictórica ou simbólica);
6
Intelectual: - Receptiva = Associativa – reação por associação de qualidades (músicas
doces, violentas, alegres, nobres, misteriosas);
Interativa = Analítica – reação por raciocínio avaliador (o pensamento crítico, raciocínio
por comparação técnica, avaliação lógica).
O autor procura ressaltar esses três níveis – fisiológico, emocional e intelectual, pois as
três funções são atuantes em todo ser humano. Porém, é a função preponderante que define a
“reação fundamental” ou “tipo de ouvinte”. No final, os três níveis interagem de tal modo que,
sem uma avaliação acurada, parece que todas as pessoas reagem à música física, emocional e
intelectualmente, sem qualquer distinção ou ênfase entre os níveis de reação (QUEIROZ, 2002).
O receptor – seja o paciente que ouve a música ou o musicoterapeuta que escuta a
improvisação do paciente – deve estar atento às suas reações em relação à audição, para que haja
maior clareza na hora de pontuar ao paciente o que foi observado e mesmo no preenchimento do
relatório.
Fonte: SMITH, M. – Preparo do setting musicoterápico para início de sessão. Clínica de Musicoterapia da FMU,
2006. I álbum (08 foto): color; 10,0x7,5 cm.
7
Segundo os estudos de Pierre Schaeffer (1991) no Tratado dos Objetos Musicais, os
modos de escuta se dariam do seguinte modo:
Ouvir – ouvir o que é apresentado à percepção (passivo). Ouve-se o que se passa, sem se
dirigir necessariamente ao fato, apesar desse fato poder estar influenciando o indivíduo de
diversas formas;
Escutar – dar-se conta, dirigir a escuta (ativo). Há um direcionamento ao objeto, uma
busca de identificação, escutando o que é interessante;
Entender – é intencional; o que é apresentado dá-se em função da intenção de quem ouve;
Compreender – há a atribuição de significados, efetuando-se relações que podem não
estar diretamente ligadas às características do objeto (BARANOW, apud. SCHAEFFER, 2002).
O ouvir e o escutar são a realidade concreta e estão ligadas à escuta natural, na qual o som
informa sobre o acontecimento que o gerou; e o entender e compreender são valores abstratos,
ligados à escuta cultural.
A música, segundo BARANOW (2002), não é só conduzida pela escuta, em suas infinitas
interações, mas a música contemporânea orienta para uma significação e impele o indivíduo, no
mínimo, a “escutar”.
A audição está presente desde a vida intra-uterina e, segundo WROBEL (2002)3, temos a
primeira etapa do ritornello, ou seja, o caos, a escuridão: o feto no útero materno, as primeiras
sensações, os primeiros registros auditivos. Desde essa fase, passando pelo nascimento e pela
primeira infância, os sons já estão sendo registrados e armazenados na memória auditiva do
pequeno ser. A primeira etapa do ritornello corresponde à vivência do feto e do bebê, suas
impressões sonoras nesse período mergulhado na escuridão, em que as cantigas de ninar e o
balanço corporal da mãe cumprem o papel de ajudar a iluminar o caminho da vida. À medida que
o bebê cresce, começa a repetir o que ouve, ocorrendo a aprendizagem natural, espontânea,
imitativa, que caracteriza a primeira infância. Conforme relata a professora de música Berenice
Guedes Mussnich (2000), em seu artigo Vivências Musicais:
3
WROBEL, V.B. Acerca do Ritornello e Musicalização Infantil. Revista Brasileira de Musicoterapia, Ano V,
Número 6, 2002.
8
(...) Constatei e confirmei, conforme havia observado nos meus filhos, que o bebê desde que
nasce realiza naturalmente exercícios musicais que podem e devem ser estimulados pelas
pessoas que o rodeiam e que são preciosos para o desenvolvimento afetivo, da fala, bem como
os desenvolvimentos psicológico e psicomotor. A construção do seu lugar no espaço no tempo
é ligada a sua escuta, percepção do tempo e memória dos timbres e das entonações que
remontam a vida intra-uterina. Tudo para ele é música, especialmente a voz de sua mãe e das
pessoas que o rodeiam. Indiscutíveis contribuições possuem as Cantigas de Ninar,
especialmente aquelas entoadas pelas mães, sem preocupação maior do que a emoção
compartilhada. Essa emoção ( comunicação pré-verbal) permite um contato que só pode ser
veiculado pela Cantiga de Ninar que é relacionada com o espaço transicional por Winnicott e
que, segundo Alicia Fernandez, é o mesmo da aprendizagem. 4
Seria maravilhoso que todos pudessem ter essa experiência, da mãe ou do pai cantarolar
uma melodia para seu bebê. Infelizmente, nem sempre isso é possível: numa sociedade como a
que vivemos, em que o grau de ansiedade com o tempo mantém-se constantemente elevado, os
contatos básicos e intuitivos – como o de despender meia hora para cantarolar uma melodia para
um bebê – são praticas que tendem a ser alijada dia-a-dia. Muitas vezes, as mães nem sequer
dispõem de um repertório para cantarolar. O aprendizado natural de canções que passavam de
pais para filhos há muito já foi interrompido. Então, cantar o quê? Como cantar? Quais melodias
e quais letras? Mais do que isso – o que ouvir? O que foi que ouvimos? O que ouvimos no dia-adia?
O mercado de consumo não perde tempo e oferece suas respostas: CDs contendo músicas
delicadas, muitos com sons de caixinha de música que reproduzem trechos do repertório clássico
europeu, até mesmo fitas de vídeo para entreter bebês “de zero a quatro anos!” Um bebê precisa
do toque, do olhar, do cuidado de outras pessoas! Podemos observar que as palavras “cantar” e
“encantar” têm a mesma raiz – e é isso que deve acontecer quando cantamos para os bebês: um
verdadeiro ritual de encantamento.
Não só para os bebês, mas também para pacientes adultos que precisam ser embalados,
que precisam desse encantamento, precisam ouvir a voz amiga que canta e encanta, que acolhe e
que está ali junto dele.
Mas, primeiro, o que ouvimos? Como ouvimos? Como reproduzimos aquilo que
ouvimos? Como um musicoterapeuta deveria ouvir?
Acredito que a resposta está no silêncio. Buscar no silêncio o próprio encantamento, ouvir
o canto interno e reproduzí-lo. Basta ouvir e sentir.
4
MUSSNICH, B.G. Vivências Musicais, In: http://www.psicopedagogia.com.br/artigo.asp?entrID=33
9
1.1. O Silêncio
O som não existe no vácuo. Sendo onda de pressão, necessita de um meio material para
propagar-se.No entanto, a ausência de som, o silêncio, em grau absoluto, parece produzir em
qualquer indivíduo a mesma sensação que produziu em Pascal:
“O silêncio dos espaços infinitos me assusta” 5.
Na verdade, a cultura do Ocidente parece rejeitar o silêncio, atribuindo-lhe um caráter
negativo, pois, em ultima instância, “o silêncio é a morte” (VALENTE, apud. SCHAFER, 1991).
Como recurso para superar a morte, o homem constrói sua própria paisagem sonora circundante.
Para o compositor de hoje, o silêncio é primordial, porque ele está se perdendo na
paisagem sonora.Assim sendo, o silêncio é matéria-prima da música.
No tratamento de pacientes em coma, o musicoterapeuta se encontra as possibilidades e
limites musicoterápicos, coloca-se em posição de escuta da dinâmica familiar, o uso da
estimulação direta com o (a) paciente e a dinâmica de comunicação dos familiares com o
paciente.
O Porta-voz Sonoro Musical é aquele familiar ou amigo que fala sobre o paciente, que
pode ajudar nos dados sonoro-musicais e dados fundamentais, tais como a causa do coma,
tempo, acesso aos médicos para obter informações médicas. Muitas vezes ele pode falar
do silêncio, mas não pode falar com o silêncio e em silêncio. Este referencial não é
estático, e o porta-voz sonoro-musical também pode ser um comunicador. Cabe ao
musicoterapeuta uma escuta bastante atenta.
O Comunicador do Silêncio é possuidor de uma dinâmica de comunicação global – voz,
olhar, corpo, tato, escuta, percepção, som, intuição – o comunicador escuta o silêncio e se
comunica com ele, vivendo o grito do silêncio, sem se deixar ensurdecer ou emudecer.
(COELHO, 1999)6.
Já dizia um ditado: o silêncio é de ouro. O silêncio é, na verdade, um recipiente dentro do
qual é colocado um evento musical. O silêncio protege o evento musical contra o ruído. Os
eventos musicais precisam desta proteção, por serem acontecimentos sensíveis. Assim, sendo, o
silêncio é a característica mais cheia de possibilidade da música. Mesmo quando cai depois de
5
SCHAFER, M. – Apud Blaise PASCAL.
6
COELHO, L. A Escuta do Silêncio: atendimento de pacientes em coma. I Fórum Paulista de Musicoterapia, 1999.
10
um som, reverbera com o que foi esse som e essa reverberação continua até que outro som o
desaloje ou ele se perca na memória. Logo, mesmo indistintamente, o silêncio soa.
O homem gosta de fazer sons e rodear-se com eles. Silêncio é o resultado da rejeição da
personalidade humana. O homem teme a ausência de som como teme a ausência de vida.
(SCHAFER, 1991, p. 71).
Assim sendo, ouçamos o silêncio, deixemos que ele soe, para que a música possa existir
dentro de nós mesmos!
1.2. A Melodia
Uma melodia é como levar um som a um passeio. O movimento sonoro das canções que
ouvimos nos leva a algum lugar na qual, freqüentemente, já estivemos ou gostaríamos de estar.
Para obter uma melodia, é preciso movimentar o som em diferentes altitudes
(freqüências). Uma melodia pode ser qualquer combinação de sons.
O que faz uma boa melodia? Os livros teóricos trazem sempre muitas regras e quase
sempre são aplicadas. Nossos ouvidos também estão adequados a esse sistema, pois a audição
torna-se agradável. Eis as regras mais importantes:
-
Quase todas as notas da melodia deverão ser escolhidas da escala de sete notas na qual se
baseia essa melodia. Quando qualquer das cinco notas são utilizadas devem, em geral,
aparecer em posições não acentuadas, sem ênfase, de modo a não prejudicarem a
harmonia prevalecente.
-
Na maioria, as notas de uma melodia devem ser notas de uma escala adjacente.Os saltos
devem ser poucos, e os grandes saltos, raros.
-
Para fugir da monotonia, as notas individuais não deverão ser excessivamente repetidas,
sobretudo em posições enfatizadas na melodia.
-
As resoluções harmônicas, como as cadências, devem ocorrer em pontos de estresse
rítmico numa melodia.
-
Da mesma forma, as acentuações rítmicas devem realçar o contorno da melodia.
Mudanças de direção melódica devem, de modo geral, cair em articulações ritmicamente
importantes.
11
-
A melodia deve ter apenas um exemplo do seu tom mais alto e, de preferência, também
do mais baixo.
-
Os saltos devem sempre aterrissar num dos sete tons da escala, não num dos cinco tons
cromáticos. O ouvido sempre escuta um salto de forma enfatizada ( isto é – o cérebro é
mais atento aos saltos, pois eles definem as fronteiras das submelodias); então, saltar para
um tom cromático viola a regra que diz que não se deve jamais enfatizar esses tons.
-
Inversamente, uma melodia não deve nunca saltar de um tom cromático. A dissonância de
um tom cromático cria uma tensão que precisa ser resolvida. Mas os saltos aumentam a
tensão e, assim, contradizem essa necessidade.
O sistema tonal ocidental estava colonizado por todo o globo, quando alguns musicólogos
alegaram que esse mesmo sistema está esgotado. Depois de séculos de experimentação, os
compositores todas as relações úteis que nossos sistemas de escala tem para oferecer – da
Bachiana à escala de microtons.
Cabe aos musicoterapeutas estarem abertos para ouvi-las.
1.3. Sobre o Ruído
O ruído é definido como qualquer som indesejado. Esta definição, entretanto, faz de
“ruído” um termo relativo; porém nos dá a flexibilidade de que necessitamos quando os referimos
ao som. O trânsito do lado de fora da sala de concerto atrapalha a música – isto é ruído. Porém,
contextualizando o ruído à música, como fez John Cage – as portas foram escancaradas e o
público foi informado de que o trânsito fazia parte da peça – os sons deixaram de ser ruídos
(SCHAFER, p. 138).
Ao compreender o desenho da paisagem sonora como um desafio composicional que
envolve a todos, e ao aproximar ouvinte e ambiente sonoro pela escuta, o autor reforçou a
possibilidade estética, tão bem defendida pelo compositor norte-americano John Cage. Sob tal
perspectiva, as fronteiras entre música e não-música e o papel da escuta como algo que constrói e
se constrói na própria música, e vice-versa, começam a habitar uma certa “zona de
indiscernibilidade”(...). (SANTOS, p. 96).
12
Quem se dispuser a escutar o som real do mundo, hoje, e toda a série dos ruídos em série que há
nele, vai ouvir uma polifonia de simultaneidades que está perto do ininteligível e insuportável. Não
só pela quantidade de coisas que soam, pelo índice entrópico que parece acompanhar cada som
com uma partícula de tédio, como por não se saber mais qual é o registro da escuta, a relação
produtiva que a escuta estabelece com a música (WISNIK, p. 53).
Correndo por fora da tradição da música erudita, músicas populares continuaram a fazer
os seus sons, que se misturaram em democráticas mixagens e assumiram lugares singulares na
modernidade. O imã da música puxa agora de novo para o questionamento e a criação sobre o
pulso, o tempo, o ritmo. Essas músicas devem ser relidas ou escutadas em nova situação. Elas
fazem parte do processo de codificação das relações entre som, ruído e silêncio como modos de
admitir fases e defasagens, de trabalhar sobre o caráter simultaneamente rítmico e arrítmico do
mundo (grifo do autor). Ali, no pulso do pulso, pode estar se formulando uma outra coisa, para a
qual é preciso produzir uma escuta correspondente. É preciso dizer também que, em todo esse
processo, a canção (ou certa linha de canções) funciona como um verdadeiro equilibrador
ecológico: as canções são a reserva de oxigenação da música e do mundo simbólico.
A música tornou-se sincrônica, simultânea. A sincronicidade ultrapassou os campos de
produção em que ela se dividia. É preciso que a reflexão sobre música dê conta dessa
simultaneidade e seja capaz de ver situações novas.
(...) O fato de ouvirmos os ruídos ambientais dentro de um contexto musical tende a transformar
nossos hábitos de escuta em relação a esses sons, possibilitando uma escuta musical do nosso
cotidiano sonoro. Uma outra noção de música começa a se delinear, confundindo-se com a de
“paisagem sonora”.(SANTOS, p. 55).
Uma possível distinção entre música e ruído, as possibilidades diferenciadas entre
fenômeno acústico e fenômeno acústico/musical e as qualidades inerentes a cada plano,
ZUCKERKANDL (1973) ainda argumenta:
(... ) os tons transcendem a sensação auditiva de dentro do audível, uma transcendência interior.
Diferente de sons não musicais que vão para um audível além. Neste ultimo caso, o fenômeno
acústico transforma-se em música. Neste ponto, o escopo e a dimensão da própria audição
transborda, ouvir já não está mais confinado a estímulos externos, é mais do que tom e ainda tom, é
mais do que audição e ainda audição (BRABO, apud. ZUCKERKANDL, 1973).
Com esses argumentos, podem-se relacionar os modos de audição musical (sensorial e
intelectual) em dois planos: a audição sensorial, atuando como reforçador da experiência acústica
13
no plano concreto, que se mantém na superficialidade estrutural, e a audição intelectual, atuando
como fator facilitador da experiência abstrata, a partir da acústica, possibilitando uma imersão
estrutural7.
1.4. Considerações acerca da escuta musical
Quando falamos de música sempre atrelamos tal idéia a presença do som. A música dá-se
na forma de sons. A formulação é tão precisa que não questionamos nós mesmos sobre isso.
Empenhamo-nos em pesquisas musicais e sonoras, mapeando os significados dos sons ou
maravilhando-se sobre como tais significados se dão, visto que não aprendemos a música como
aprendemos nossa linguagem verbal – associando sons específicos à significados específicos.
A música é feita de sons. Que sons? Sons musicais. E o que são sons musicais? São sons
que estão presentes na música. Então a música é feita de sons presentes na música, e a roda da
tautologia gira sem fim enevoando qualquer pensamento a respeito da música que não coloque
em questão a própria noção de música (FERRAZ, 1999).
O som é um tipo de perturbação, uma vez que se pode ouvir através da imaginação ou
mesmo sonhando com um som. Ao dizer “ouço um som”, estamos apenas nos valendo de um
artifício consensual para compartilhar alguns tipos de perturbações, e mesmo este quadro de
perturbações pode ser ampliado, - ele não se dá independentemente das estruturas e histórias de
escuta de cada indivíduo.
A música é um dos espaços de escuta possíveis. E é importante lembrar que, neste caso, a
escuta musical não fala apenas daquilo que foi disparado pelo som, mas daquilo que foi disparado
pela idéia de música. É da idéia de música que passamos a falar. Podemos imaginar uma música,
podemos nos lembrar de uma música ou sonhar com uma música. Alguém poderia nos dizer algo
como – “calma, você está se referindo a um som imaginado”.Não, não estaríamos nos referindo a
um som imaginado, pois o objeto da música não é o som, mas a própria música – basta tentarmos
agora lembrar e imaginar o som do fagote, o som da voz de Elis Regina, ou o som da harpa. Ao
falar de uma escuta musical temos um território especifico de agenciamento que não se dá apenas
na forma de blocos de som e silêncio, mas na forma de blocos de pensamento e duração, e uma
7
BRABO, R. – Audição Musical e Respostas a Dilemas Morais. São Caetano do Sul, 2003.
14
série de intensidades – ora nomináveis, ora não – cujo objeto não é o som, mas qualidade da
sensação musical.
A escuta musical não é assim um terreno a priori que se delimite para solucionar questões
sonoras, mas um território que se define pelo próprio ato de escuta musical – escuta essa que não
necessariamente necessitou da presença do som, a ponto de podermos afirmar – e por que não? –
que o surdo pode ouvir (FERRAZ, p.35).
Houve um processo de configuração em que a noção de musicalidade fez-se ao mesmo
tempo em que se fez à escuta em que o sujeito distingue-se como observador. A música em si não
comunica, ela é um espaço de comunicações possíveis e, se o receptor a quiser, senão ela não
comunica nada. Ela é sempre um espaço de escutas possíveis, mesmo que alguém não a queira
ouvir.
Conforme FERRAZ (1999, p.36):
(...) Valendo por mim lembrar que potencializar a comunicabilidade da música significa
antes potencializar uma cadeia de significantes e significados que serão a princípio
compartilhados pela linguagem verbal, uma interação musical que seja experienciada
como tal por demais sujeitos a ponto de compartilharem também seus sinificados.
De um modo geral, a atitude do homem ante a música parece estar diretamente
relacionada aos sons ambientais de seu tempo e, sob essa perspectiva, não podemos deixar de
observar as mudanças radicais no pensamento musical do século XX.
15
2. A MÚSICA E A MEDICINA EM DIFERENTES CONTEXTOS DA
HISTÓRIA
Em virtude da precariedade de inibição e de maturidade propriamente intelectual, os
povos primitivos são espetacularmente vibráteis à música.8
Os povos primitivos, em face dos efeitos tão estranhos e poderosos neles desencadeados
pelos ritmos musicais, não cogitaram de explicá-los a custa de jogo prosaico e de leis
psicofisiológicas. No tempo dos povos primitivos a música era colocada sob influência de
misteriosas entidades superiores – a música não só seria de origem sobrenatural, mas poderia agir
sobre o mundo sobrenatural, constituindo uma espécie de veículo entre os homens e as potências
superiores. Daí a música a figurar freqüentemente nas cerimônias místicas dos povos primitivos
havendo mesmo nascido junto da religião.
Os povos primitivos, na ignorância das verdadeiras causas dos fenômenos e na angústia
oriunda da incapacidade de explicar racionalmente os fatos existentes, apressavam-se a atribuir
todo o ocorrido a uma intervenção das potências ocultas. Nas cerimônias religiosas presididas
pelos médicos-feiticeiros, o canto e a música instrumental rudimentar, muitas vezes associada a
dança, conseguiam que os “maus espíritos” saíssem, curando enfermos. A música exerceria uma
função de exorcismo, de purificação ou de conjuração. Na superstição do povo primitivo, as
virtudes mágicas da música seriam mesmo, transmitidas aos instrumentos produtores da música.
Entre os egípcios, as doenças continuaram a ser atribuídas a intervenções de deuses malévolos, e
suscetíveis de cura pela magia, que invocava a proteção dos deuses amigos do homem. Da
mesma maneira, entre assírios, persas, babilônios e outros povos da antiguidade oriental,
dominou o conceito sobrenatural das moléstias e, por isso, de males só curáveis pela magia,
estando a medicina, deste modo, subordinada a religião. Em meio às superstições e crenças, a
música foi se impondo como recurso de encantamento e de magia, suscetível de acarretar os
efeitos mais diversos, inclusive a cura dos transtornos do corpo e do espírito.As primeiras
referências acerca da influência da música sobre o organismo humano são provavelmente as
encontradas num papiro médico egípcio datado de 2.500 a.C.
8
Este capítulo versa sobre o livro de J. C. RIBAS, Música e Medicina. EDIGRAF, São Paulo, 1957.
16
Entre os hebreus, a música, revestida de poderes sobrenaturais, desempenhava papel de
relevo nas práticas religiosas, conforme se depreende na leitura da Bíblia. Os antigos israelitas, a
exemplo dos povos primitivos, serviam-se de cantos e de instrumentos para obterem estados de
excitação psíquica.
Na antiguidade clássica, a música continuou acolhida como uma dádiva dos deuses aos
homens. Em testemunho do prestígio atribuído à música pelas religiões antigas, a mitologia
greco-romana está superlotada de deuses, semi-deuses e heróis, que inventam instrumentos,
compõem e se recreiam com música. Anfião, com a música de sua lira, constrói miraculosamente
os baluartes de Tebas.
Nos textos mitológicos, os heróis exercem muitas vezes funções de médicos e, na cura das
doenças, recorrem à música, velha aliada da medicina. Apolo era deus da música e também da
medicina. Não só seria capaz de disseminar doenças, com as suas flechas, mas, se assim o
quisesse, de atraí-las para si, deixando os homens a salvo dos males. Em virtude desta crença, a
cidade de Tebas, quando dizimada pela peste, ou cantos fervorosos a Apolo.
Os gregos deram à música um sistema ou escala. Na civilização helênica, surgiram os
modos – dórico, frígio, lídio, mixolídio, eóleo, lócrio e jônio, sendo cada um deles associados a
determinadas qualidades.
A civilização romana, no tocante aos conhecimentos médicos e musicais, se aberberou
dos ensinamentos gregos. Asclepíapes de Bitínia, retórico e depois médico em Roma, não só
descreveu precisamente sintomas de doenças mentais e interpelou-os à luz de curiosas teorias,
mas também preconizou normas de tratamento. Na sua opinião, “a harmonia musical e um
concerto de vozes eram medidas terapêuticas muito valiosas”.
Na Idade Média, houve uma estagnação no domínio da medicina e a humanidade voltou a
mergulhar no mais intenso misticismo. As doenças, principalmente de natureza mental, tornaram
a ser consideradas decorrentes da influência de demônios.
Na Idade Média, a música, à sombra do cristianismo, nas catedrais católicas, viveu uma
época de esplendor através do cantochão, do canto ambrosiano, e no renascimento com a
polifonia católica. A música tornou-se a linguagem pela qual o crente se aproxima do céu, atinge
maior elevação espiritual, confessa os seus anseios a Deus e obtém estado de purificação. Na
missa católica, o toque da campainha favorece nos fiéis a sensação de maior proximidade com
Deus.
17
Nos primeiros tempos da Igreja os sacerdotes preconizavam o canto nos templos, sem
intervenção de instrumentos musicais. Depois, a música sacra, que vinha se servindo de salmos
extraídos da Bíblia e de cantos de culto hebraico, adquiriu caracteres mais próprios e definidos.
No século IV, em Milão, Santo Ambrósio, Pai da Hinodia Cristã, compôs o Canto Ambrosiano.
No século XVI, ao mesmo tempo que desponta a música profana e popular, irrompe outra face de
florescimento da música sacra, graças à Reforma Protestante.De todas as artes, somente a música
foi posta conscientemente a serviço da fé protestante. A música proclama Lutero, melômano,
instrumentista e compositor. É a “arte dos profetas, e a única arte, além da teologia, que tem o
poder de acalmar as agitações da alma e afugentar o demônio”. Lutero cria o Coral Protestante,
de estrutura polifônica, onde, pela primeira vez, os crentes entoam hinos na língua do povo, e não
em latim.
Na Idade Média, considerou-se a música uma linguagem não só capaz de por o crente em
comunicação com Deus, mas ainda de agir sobre o comportamento deste e de demais criaturas.
Daí se patenteou à necessidade de ser utilizada em obediência a um critério ético, a exemplo do
que aconselhava a sabedoria grega.
Na Renascença, com o florescimento das ciências, a medicina libertou-se das superstições
medievais e voltou a trilhar os rumos inerentes à verdadeira medicina.
Com o ressurgimento da medicina, voltou-se a estudar o doente mental sob critério
científico, admitindo-se que as perturbações psíquicas decorressem de alterações do próprio
indivíduo, particularmente do cérebro.
Ao lado do desenvolvimento das ciências, progrediam também as artes, inclusive a
música, que se desvencilhou da religião e se tornou profana, graças ao incremento da chamada
música popular. Desde as invasões dos bárbaros, a Europa era percorrida por músicos
ambulantes, os bardos, que se compraziam em recolher e disseminar a música popular de
diversos povos. Não demorou muito para que os próprios nobres, impelidos pelo espírito
aventureiro, se lançassem a compor músicas e vagueassem pelas aldeias e castelos, no objetivo
cavalheiresco de enaltecer com música suas damas distantes e fizessem felizes os ouvintes.
Foram os trovadores na França, os minstrels na Inglaterra e os Minnesingers na Alemanha. Nesse
tempo das cavalarias, já se constatava certamente que as melodias, com estranho poder de
encantamento e de recreação, encerravam aqueles efeitos terapêuticos, que tornariam mais tarde
um lugar-comum dizer-se que a música é um refrigério, um refúgio, um bálsamo.
18
3. O CONCEITO DE MÚSICA EM MUSICOTERAPIA
Os musicoterapeutas utilizam um amplo espectro de experiências musicais em seu
trabalho com os pacientes. Desta forma, concebem as fronteiras da música de uma forma muito
abrangente. Em Definindo Musicoterapia (2000), Bruscia cita Gertrude Orff (1974), que descreve
a musicoterapia como a utilização de “materiais musicais”, como “fala-rítmico-fonética, fala,
ritmos livres e métricos, movimento, melodias na fala no canto e no manejo do instrumento.
O desafio para os musicoterapeutas é que essas perspectivas nem sempre são relevantes
ou abrangentes o suficiente para o universo da prática clínica. Segundo BRUSCIA (2000), há
muitos fatores em ação em um contexto terapêutico que influenciam a forma como definimos e
delimitamos a música.O autor define como os mais importantes:
- as preferências, as habilidades e as aquisições musicais do cliente são sempre aceitas
sem julgamento; como resultado, os padrões estéticos e artísticos na musicoterapia são mais
amplos e mais inclusivos do que aqueles de outros profissionais da música.
- o paciente é prioridade na terapia, e não a música.
- a musicoterapia opera assumindo que a experiência musical possui significado para os
clientes, e que os clientes podem usar a música para fazer mudanças significativas em suas vidas.
-
na musicoterapia, a música é mais do que as próprias peças ou sons; cada experiência
musical envolve uma pessoa, um processo musical específico e um produto musical de
algum tipo.
-
- os aspectos multissensoriais da música são fundamentais para sua aplicação terapêutica,
mas dilatam as fronteiras da experiência musical.
- de forma semelhante, as superposições e relações entre a música e as outras artes são
muito exploradas com propósitos terapêuticos e isso também contribui para tornar as fronteiras da
experiência musical mais inclusivas. (BRUSCIA, p.100).
Se a musicoterapia envolve a utilização exaustiva de qualquer coisa que esteja contida na
música, incluindo as vibrações e as ressonâncias, como o musicoterapeuta deve atuar frente aos
conhecimentos que possui frente a essas propriedades musicais? Se possui uma formação
educação musical precária, como pretenderá seguir os seus objetivos numa dada sessão, com um
determinado paciente?
19
A investigação por observação em música descreve os acontecimentos no momento em que
ocorrem. Pode envolver a definição, o registro, a análise e as interpretações da situação presente, a
sua caracterização ou os processos dos fenômenos musicais. O enfoque está, portanto, nas
condições dominantes na música ou em situações musicais, ou no comportamento de uma pessoa
ou de um grupo numa situação musical (KEMP, p.88, 1995).
Nas áreas da educação musical e da musicoterapia, tanto músicos como investigadores se
preocupam com dois aspectos gerais do comportamento: a atenção dada a um estímulo (a música)
e a resposta ao mesmo (a interpretação, a composição, a verbalização, a utilização da música com
finalidades extramusicais).
Como constitutiva do ser humano, a musicalidade encontra-se em nossa estrutura
biológica (no sistema nervoso). Pelos estudos da Psicologia da Música, buscou-se mapear áreas
cerebrais responsáveis pela reposta à música. Estudos mais recentes de Neurociências têm
defendido a idéia de que não existem partes fixas no cérebro responsáveis pela audição musical, e
sim toda uma rede neuronal de interações que se estabelece em contato com a música.
Com base neste conceito de musicalidade e interação neuronal, para o setting
musicoterápico e para o atendimento clínico, temos um universo de incertezas com alguns pontos
previsíveis. O que fazer para compreender melhor a produção musical que surge em uma sessão
musicoterápica? Barcellos (1999), em seus estudos sobre “tecido musical”, sugere o modelo
Tripartido de Molino para atender as dimensões desta produção musical, por envolver tanto a
obra do autor (o paciente) como aquele quem a escuta (o musicoterapeuta).
Em um atendimento musicoterápico, musicoterapeuta e paciente experienciam interações
musicais. Para a melhor visualização de tais momentos musicais, o musicoterapeuta transcreve os
acontecimentos em partituras. A notação tradicional de partitura é parcialmente possível, pois
certos acontecimentos musicais, se “congelados”, nada significam para a análise musical no
contexto musicoterápico.
A descrição se dá, deste modo, na forma de texto sobre a pauta, de alguns movimentos
corporais que acompanham as sonoridades. Por outro lado, essa mesma forma de transcrição,
colocando-nos como parte de uma obra, em uma mesma grade musical, possibilita a visualização
das interações e intervenções.
Numa sessão de musicoterapia esses aspectos são claramente observados e devem ser
levados em conta, para a apresentação do caso e para realizar os relatórios.
20
3.1. O Musicoterapeuta e a Música
A questão da relação do musicoterapeuta com a música ainda gera controvérsias: se por um
lado o musicoterapeuta deve ter noções básicas de teoria musical e saber tocar um instrumento,
por outro, a exigência é menor: o musicoterapeuta não precisa ser um músico formado – como
afirma BENENZON (1985)9, como o músico erudito, com vocação para ser músico e não
terapeuta, pois o músico formado como tal tem, intrinsecamente, o pré-juízo musical estético de
sua evolução e desenvolvimento musical, pois o pré-juízo musical o impede de aceitar com
inteira liberdade ritmos “não-estéticos” ou a desafinação de um paciente. O musicoterapeuta
precisa estar livre do pré-juízo musical em relação à produção musical de seu paciente. Sendo
assim, muitas vezes os musicoterapeutas acabam deixando de aprimorar-se musicalmente,
sabendo que não precisarão ser tão “perfeitos” em sua atuação musical, empobrecendo a
qualidade de seu trabalho. O paciente não precisa saber música, não precisa saber tocar um
instrumento ou ter um canto afinado. O musicoterapeuta tem a obrigação de preocupar-se em
saber tocar um instrumento, cantar, da maneira como puder, de forma afinada, pois ele é a
referência do paciente.
Um exame de avaliação musical deveria fazer parte da classificação para todos aqueles
que aspiram à carreira de musicoterapeuta, conforme o Manual de Musicoterapia (1985): o
exame descrito no manual consiste na interpretação de uma partitura musical elegida pelo
aspirante no instrumento de seu conhecimento; improvisação e criação de canções infantis;
ditados rítmicos e melódicos, leitura à primeira vista, afinação (BENENZON, p.66-67).
Naturalmente, o aspirante não necessita de um conhecimento escolástico musical, porém a
interpretação de partitura no instrumento de seu conhecimento, ditados rítmicos e melódicos já
seriam de grande valia para aquele que deseja tornar-se musicoterapeuta.
O musicoterapeuta trabalha em equipe, e deve por isso ter a noção exata da sua atuação
musical na sessão com seu paciente, para poder expor para a equipe os objetivos, os progressos e
os retrocessos, além de trabalhar os aspectos não-verbais presentes na música. Entre as possíveis
técnicas e especialidades encontramos o psicodrama, a psicodança, a psicomotricidade, a
expressão corporal, técnicas de relaxamento, estimulação precoce, e muitas outras.
9
BENENZON, R. Teoria da Musicoterapia. São Paulo: Summus, 1988.
21
Este é um dos aspectos que dificultam a aquisição de um rol específico. Por outro lado,
freqüentemente observa-se em alguns musicoterapeutas, inclusive em alguns músicos, uma
espécie de onipotência no que diz respeito ao uso do som e da música. Este fator se faz evidente
quando o musicoterapeuta enfoca seu trabalho para uma musicoterapia passiva, usando técnicas
receptivas.
É como se o musicoterapeuta se identificasse com o poder mágico da estrutura abstrata
que o som teve para o homem primitivo desde tempos remotos. Tal atitude pode provocar
dificuldade na integração das equipes de saúde.
A musicoterapia freqüentemente promove uma autoconsciência (física, emocional, social
e intelectual); a música é um mecanismo que permite ao indivíduo se auto-explorar através de
meios não-verbais. Conforme as técnicas citadas, o cliente apresenta uma idéia musical que o
musicoterapeuta apóia, ajudando o cliente a desenvolvê-la, e possivelmente, organizá-la; o
musicoterapeuta aceita o que é apresentado e não o altera.
3.2. Murillo Brito e a Canção Desencadeante10
Para Murillo Brito, considera-se fundamental para um bom desenvolvimento do processo
musicoterápico, que o paciente se submeta a alguns estágios em seu tratamento. Dentre os
estágios já é considerado que o paciente – ou quem puder fazê-lo – respondam questões que
constam na ficha musicoterápica, a fim de que o musicoterapeuta possa recolher dados referentes
a sua história sonora e lançar mão de estímulos compatíveis com essa. Através da testificação,
visando o estabelecimento de algum tipo de diálogo sonoro e conseqüentemente o
estabelecimento da relação terapêutica.
Quando um paciente é indicado para a musicoterapia, na maioria dos casos, este chega
sem, evidentemente, conhecimentos dos dados de sua história sonora-musical, imprescindíveis
para o bom funcionamento do processo. É árdua a tarefa de realizar o levantamento de sua ficha
musicoterápica pois, segundo a experiência de Brito na área psiquiátrica – o paciente psiquiátrico
não tem condições de informar dados que possam ser importantes para o conhecimento de sua
10
BRITO, M – A canção desencadeante. Revista Brasileira de Musicoterapia, Ano IV, Número
5, 2001.
22
história sonora ou porque a família desconhece, ou por outros diferentes motivos, o
musicoterapeuta não tem acesso a estes mesmos familiares.
Segundo o autor, isso não impede que o musicoterapeuta lance mão de algum tipo de
canção que possa vir a impactar seu paciente. Brito ainda ressalta que, na área psiquiátrica, a
música popular é, dentre as várias possibilidades de expressão musical, a que o paciente mais
elege para se manifestar e extravasar, através dela, seu momento psíquico e sua história. A
música está presente em toda parte: nas ruas, nas casas, morros e praias, - lugares onde todos
possam estar. Acrescente-se isso ao fato de que, quando uma canção faz sucesso, dada a imensa
musicalidade do povo brasileiro, uma grande parte da população que tem acesso a essa música a
assimila e divulga oralmente, gerando um processo que mistura mecanismos da música popular
com a música folclórica.
Deste modo, quando um paciente psiquiátrico de baixa renda, inserido uma instituição
pública, chega para iniciar um processo musicoterápico, está impregnado de canções que
povoaram ou ainda povoam sua vida, mesmo que, em função do seu quadro clínico, não tenha
condições para lembrar-se delas ou mesmo de cantá-las.
Diante da escassez de dados sobre esse paciente, mas conhecendo a história da MPB e as
canções que foram mais representativas das décadas nas diferentes classes sociais, o
musicoterapeuta pode, com grande margem de sucesso, lançar mão de uma canção que impacte o
paciente e o estimule a começar a se expressar, desencadeando um processo ativo.
A utilização da canção desencadeante pelo musicoterapeuta não leva a riscos de haver
algum tipo de estranheza cultural e/ou musical por parte do paciente. Com o crescente
desenvolvimento de comunicação de massa, uma canção de sucesso atinge, indiscriminadamente,
todas as regiões do país e, sem considerarmos os aspectos éticos dessa questão, padroniza o perfil
musical de um determinado contingente populacional.
Logo, a canção desencadeante, por ser uma canção amplamente difundida, ao ser
introduzida num contexto musicoterápico, permite ao paciente a expressão da mesma e serve de
estímulo para que novos conteúdos e informações advenham dessa expressão, além de
possibilitar ao paciente, provavelmente, a sensação do musicoterapeuta estar em consonância
com seu universo sonoro e o posterior compartilhar de experiências musicais e sentimentos e
sensações que estas podem acarretar.
23
3.3. A Música no Contexto Terapêutico
Algumas teorias levantam questões importantes para o campo da musicoterapia, teorias
diversas que dão à música o seu significado e sobre que tipos de significações podem derivar da
música.
As três principais teorias sobre a significação na música a serem consideradas pelos
musicoterapeutas são: o formalismo absoluto, o referencialismo e o expressionismo absoluto
(BRUSCIA,2000).
a “significação” de um trabalho artístico é diferente da significação de todas as outras experiências
humanas.Os eventos estéticos, como os sons da música só significam a si próprios; o significado é
completamente sui generis e essencialmente diferente de qualquer outra coisa no mundo que não
seja musical...A experiência da arte, para o Formalismo, é uma experiência primariamente
intelectual; é o reconhecimento e a apreciação da forma por si própria.Esse reconhecimento e
apreciação, embora de caráter intelectual, são chamados pelos formalistas de “emoção” –
geralmente de “emoção estética.Mas essa assim chamada “emoção é única – ela não tem
contraparte em outra experiência emocional (BRUSCIA, pp.104-105, apud. REIMER, pp.
20-21).
Todos os significados encontrados na música são inerentes à música e somente à música,
e como tais são independentes e diferentes de todas as significações encontradas em outras artes
ou no universo fora da arte.
Para o formalismo absoluto, quando a música é utilizada na terapia, ela não pode ser
considerada uma arte porque ela não retira seu significado estritamente da apreciação intelectual
de sua beleza formal. Os formalistas absolutos são essencialmente elitistas – acreditam que a
maioria das pessoas não são capazes de alcançar uma verdadeira experiência estética da música,
contanto que tenham talento ou que tenham sido submetidos a um treinamento musical e,
portanto, para as massas a música serve fundamentalmente com treinamento (BRUSCIA, apud.
REIMER, 1970).
Os referencialistas acreditam que os significados centrais da música e da experiência
musical encontram-se fora do trabalho musical propriamente dito, nos fenômenos, idéias,
eventos, sentimentos não-artísticos ou extra-musicais comunicados através da música. A música
24
comporta significado
por referir, representar, simbolizar ou por expressar o universo (não
musical) da experiência humana. As composições, improvisações e apresentações contemplam os
ouvintes com mensagens sobre a vida, o universo, a experiência humana e os musicistas
envolvidos em criá-las; e os processos de composição, de improvisação, de execução e de escuta
nos dão oportunidades para vivenciarmos e trabalharmos os vários aspectos da condição humana.
Por essa razão, há uma relação muito próxima e direta com a música e aquele que faz a música.
Ao contrário dos formalistas, os referencialistas acreditam que a música é um reflexo dos
músicos envolvidos em sua criação e cada experiência de escutar música é um reflexo do ouvinte.
A perspectiva referencialista é coerente com os princípios básicos da musicoterapia,
principalmente no que diz respeito àquelas linhas acadêmicas que enfatizam a utilização da
música na terapia. O musicoterapeuta referencialista acredita que a música é uma linguagem
universal que os indivíduos podem usar para expressar a condição humana, assim como suas
próprias idéias, sentimentos e identidades. O valor da música é dado pelo fato dela estender para
além de si própria e para além do domínio da arte e da estética.
A terceira posição – a dos expressionistas – é uma integração do formalismo absoluto com
o referencialismo.
Os componentes estéticos em um trabalho artístico têm qualidade semelhante à qualidade inerente
a toda experiência humana.Quando alguém partilha as qualidades do conteúdo estético de um
trabalho artístico também estará partilhando as qualidades com as quais se fazem todas as
experiências humanas. A relação entre as qualidades do trabalho artístico e as qualidades da
experiência humana é percebida pelo observador do trabalho como “significativas”. A significação
da experiência – a relação entre as qualidades estéticas e as qualidades da vida – será convincente,
vital e penetrante na mesma medida com que um trabalho contém qualidades estéticas,
convincentes, vitais e penetrantes, e na mesma medida com que essas qualidades podem ser
experimentadas pelo observador. O âmago da experiência de partilhar as qualidades estéticas
significativas do trabalho artístico é o sentido mais profundo da natureza da vida humana
(BRUSCIA, pp.106-107, apud. REIMER, pp.24-25).
Portanto, é no conteúdo do trabalho artístico que se pode encontrar insights e, quanto mais
profunda a experiência das qualidades estéticas, mais profundo poderá ser o sentido da
significação obtida.
A definição básica de música em musicoterapia pode ser apresentada da seguinte maneira,
segundo BRUSCIA (p.111):
A música é uma instituição humana na qual os indivíduos criam significados e beleza através do
som, utilizando as artes da composição, da improvisação, da apresentação e da audição. A
25
significação e a beleza derivam-se das relações intrínsecas criadas entre os próprios sons e das
relações extrínsecas criadas entre os sons e outras formas de experiência humana. Como tal, a
significação e a beleza podem ser encontradas na música propriamente dita (isto é, no objeto ou
produto), no ato de criar ou experimentar a música (isto é, no processo), no músico (isto é, na
pessoa) e no universo.
A música é definida como uma instituição. Como as outras artes, possui um padrão
organizado e permanente de interação humana centrado em um conjunto de valores que são
compartilhados por uma comunidade e reciprocamente relacionados com essa comunidade com
funções, objetivos, costumes, tradições e regras específicas. Quando definida como instituição, a
música é específica da espécie e conseqüentemente universal; no entanto, os critérios pelos quais
ela é definida como uma forma de arte são culturalmente definidos.
Na musicoterapia, os elementos básicos utilizados nas várias combinações incluem: o
paciente, o terapeuta, a música (em todas as suas variações e manifestações) e, em alguns casos,
um grupo de pacientes. Também podem ser incluídas as pessoas significativas da vida do
paciente e outras formas de arte e artefatos.
Embora tais elementos possam combinar-se de diversas maneiras, o elemento-chave é a
música – determina como todos os outros elementos e compostos se combinam, interagem e
afetam entre si. É a forma com que a experiência musical do paciente foi estruturada que
determinará as reações e relações possíveis entre os outros elementos compostos.
Portanto, a interação paciente-música é o núcleo central da musicoterapia que molda as
dinâmicas com todas as outras relações.
São seis os modelos dinâmicos, que se diferenciam de acordo com o foco da experiência
do paciente, se é nas propriedades: 1) objetivas; 2) universais; 3) subjetivas; 4) coletivas; 5)
estéticas; ou 6) transpessoais da música.
3.4. A Natureza das Intervenções em Musicoterapia
O fato da música poder servir como parceira do terapeuta no processo de intervenção,
revela muito acerca da essência da natureza da musicoterapia. Se o musicoterapeuta pode
utilizar, tanto a música por si só, quanto em parceria com a sua intervenção pessoal para alcançar
os objetivos terapêuticos, deve haver muitas semelhanças entre as funções do terapeuta e as
funções da música.
26
O importante é abordar a singularidade da natureza das intervenções da musicoterapia –
onde terapeuta e música trabalham em conjunto para ajudarem o paciente. A principal questão é o
que torna as intervenções de musicoterapia diferentes de qualquer outra forma de terapia, ou
ainda as verdadeiras e singulares intervenções que pertencem ao campo da musicoterapia.
A resposta se encontra em três elementos que definem e diferenciam a musicoterapia de
outras modalidades de terapia: o som, a beleza e a criatividade.
A musicoterapia é centrada no som, portanto um bom musicoterapeuta deve ter um
ouvido, se não apurado – educado e atento o bastante para perceber a expressão de problemas
através do som, os relacionamentos gerados a partir do som, encontro de soluções e bem-estar
através do mesmo.
A musicoterapia é centrada na beleza. O contexto para a experiência sonora da
musicoterapia é sempre um contexto estético – é sempre pela busca da beleza e do sentido que a
beleza traz para a vida através da música. Escutando ou criando música, como recurso
terapêutico, o paciente experimenta a beleza e o sentido da vida e, ao longo do processo aprende
a trabalhar e a vencer problemas e desafios que fazem parte do caminhar na vida. Do mesmo
modo que a música apresenta tensões e conclusões, movendo-se no sentido da mudança para a
resolução, o ser humano trabalha para tornar-se íntegro e viver de forma mais completa. Quando
essa jornada em direção à integridade ocorre com o refinamento de uma forma artística, esta
ocorre em um contexto estético – a jornada é percorrida de forma muito mais pungente, mais
potente e mais notável (BRUSCIA,p.46).
A musicoterapia é centrada na criatividade. O meio pelo qual o som torna-se belo e
significativo consiste num processo de criatividade. Quando o paciente ouve ou cria música, isto
envolve ser criativo com os sons, explorá-los, nas diferentes formas a qual podem ser arranjados,
percebidos e interpretados. Ambos – processo criativo e processo terapêutico – envolvem a
resolução de problemas, exploração de alternativas e opções, utilizar todos os recursos
disponíveis, escolher o melhor caminho para resolver uma dada questão, selecionar qual das
opções é mais prazerosa e em seguida, organizar todas as decisões em um produto ou resultado
que seja belo e significativo.
Na musicoterapia, o processo de resolver “problemas musicais” é concebido de forma
semelhante ao processo de resolver “problemas da vida”, e acredita-se que as habilidades
adquiridas para encontrar soluções musicais se generalizam para as situações da vida.
27
Na terapia, as intervenções são baseadas em três critérios: 1) o paciente tem de necessitar
ajuda externa para alcançarem seus objetivos em termos de saúde; 2) deve ser uma intervenção
com um propósito, independentemente do resultado; e 3) a intervenção deve ser conduzida por
um terapeuta em um contexto de uma relação paciente-terapeuta.
Quando o terapeuta utiliza os sons e padrões organizados da música para influenciar
diretamente o corpo ou o comportamento do paciente de modo observável, ou ainda quando
utiliza estímulos não-musicais para induzir respostas musicais especificas do paciente, a música é
utilizada como experiência objetiva. Na condição de estímulo, as propriedades da música são
utilizadas para mediação ou reforço para induzir respostas observáveis não-musicais do paciente.
O modo como uma pessoa escuta, improvisa ou executa a música é uma manifestação
direta da singularidade da identidade da pessoa como ser humano, refletindo quem a pessoa é e a
forma como ela lida com as várias situações exemplificadas pela música. Do mesmo modo,
quando duas ou mais pessoas executam ou ouvem música juntas, a sua experiência musical
compartilhada é igualmente singular – não haverá duas outras pessoas que irão interagir,
comunicar ou se relacionar com outra da mesma maneira. Estamos falando da música como uma
experiência subjetiva (BRUSCIA, p. 148).
Na música-como-processo, é o próprio processo de fazer ou executar música que é
também o processo de mudança terapêutica.
Sempre que a música é utilizada como processo, o resultado é algum tipo de produto
musical – improvisação, composição, execução, gravação, percepção, notação , entre outros. Esse
produto musical é um reflexo de tudo o que aconteceu durante o processo – documenta tudo o
que foi externalizado, trabalhado, transformado, pelos que executavam ou ouviam música. Uma
improvisação fornece uma representação daquele que improvisa e da forma como ele se relaciona
com seu mundo, com o outro e com o objeto, do mesmo modo que uma composição ou execução
musical fornecem o mesmo tipo de representação do compositor ou do executante. Fazendo um
paralelo com essa afirmação, as respostas daquele que escuta música fornecem uma
representação do ouvinte e de como ele se relaciona com o mundo do eu, do outro e do objeto.
Na música como experiência coletiva encontramos, desde os tempos remotos, uma música
como parte integrante de rituais criados e compartilhados pela comunidade e forneceu uma
identidade compartilhada para as pessoas que pertenciam a ela, além de prover um continente e
um espelho da psique coletiva da espécie.
28
O terapeuta utiliza as experiências musicais coletivas como uma base para a terapia do
indivíduo ou da comunidade. A música pode ser utilizada de três formas : como um ritual, como
identidade coletiva ou como um arquétipo.
3.5. Música e musicalidade
A música é uma das melhores maneiras de manter a atenção de um ser humano devido a
constante mistura de estímulos novos e estímulos já conhecidos.
Entre outras coisas, a música é uma forma de som estruturado, como a linguagem, e a
musicalidade é a aptidão de reagir aos estímulos musicais e criar música. O individuo que está
ouvindo ou, através de outros sentidos, percebendo as numerosas variações daqueles sons
musicais, está criando música.
(...) Eventos musicais e físicos pertencem a ordens diferentes de existência, assim o que ocorre é
uma quebra real do mundo da percepção, todas as sensações audíveis, incluindo sensações de tom
com um evento acústico, são ou reações do ouvido a estímulos externos, ou alucinações. Ouvir
qualidades dinâmicas da audição é outra coisa. É a percepção direta de eventos não-materiais. A
dinâmica das qualidades dos tons dá ao ouvido acesso direto para tais eventos. (BRABO, apud.
ZUCKERKANDL, 1973, p. 100).
Aspectos humanos fundamentais estão contidos nos diversos meios como uma pessoa
vivencia a música, seja ela deficiente ou não. Todas as pessoas respondem a estímulos musicais,
de modo que, em maior ou menor extensão, todas as pessoas são musicais.
Mesmo entre aqueles que possuem as mais graves deficiências pode-se encontrar um ser
musical, que, através da musicoterapia, tem oportunidade de participar de alguma atividade
musical, ao invés de permanecer no isolamento devido à deficiência.
A música, numa sala de concerto, pode transformar fisionomias, captando as pessoas
musicalmente, não só entretendo o público, mas transmitindo um tipo de apelo ético aos ouvintes,
que poderiam ser expressas por: esqueçam a banalidade, a ruindade – elevem os sentimentos mais
puros e mais calorosos!
Creio que a música aciona forças morais de três formas diferentes: como mensagem, como
intérprete e como critério de valores morais. O mais difícil é falar da primeira – dizer até que ponto
a música me parece ser uma mensagem do reino do sentimento ético (WALTER, 1935).
Segundo o autor, surgiria a seguinte pergunta: quais são as forças que vivem na música,
que apelam à moralidade, além da musicalidade?
29
É importante frisar que o essencial da música continua sendo sua força e efeitos musicais.
Devemos diferenciar, porém, o que a própria música nos conta, daquilo que um compositor quer
contar-nos através da música. É próprio da música ir da dissonância para a consonância – ela
anseia pela pacificação.Isso não impede que o compositor possa contar-nos, por meio desta
linguagem, de sofrimento, inquietude e desespero. Sabemos que a matéria é dominada pela lei da
gravidade, e que isso não impede que uma estrutura pesada de metal como o aeroplano se eleve
no ar e mantenha vôo. A analogia se iguala perfeitamente a esta realidade: nos dois casos triunfa
a força humana sobre a qualidade básica de um elemento.
(...) Aqui, sendo encerrada no profundo prazer de uma grande reconciliação, está a razão principal
da felicidade que a música transmite ao ouvinte. Nossa íntima saudade, nosso profundo anseio por
harmonia – harmonia no significado supramusical transcendental da palavra – sente-se confirmada,
apaziguada no decurso da música. E, nesse sentido, a música parece-me uma mensagem – uma
mensagem ética elevada – que dos mistérios do mundo soante traz, à parte ética de nosso ser, uma
mensagem que nos faz feliz. (...) (WALTER, p.16).
O autor faz uma comparação interessante, entre o canto em uníssono e o canto a várias
vozes – no uníssono os cantores tornavam-se massa; no canto em várias vozes tornavam-se
comunidade. O poder da música, que tem como meta a comunidade harmoniosa, a sociabilização,
é uma prova superior da existência e da intensidade das forças morais, e essa comunidade não se
restringe somente aqueles que se juntaram para fazer música: a nossa arte inclui os ouvintes no
mesmo círculo mágico.
Em Audição Musical e Respostas a Dilemas Morais, BRABO (p.7, 2003) propõe o
seguinte esquema:
Audição Musical – Dilema Moral – Julgamento Moral – Tomada de Decisão.
O autor levanta a questão entre a audição musical e a interferência da mesma nas repostas
a questões morais em alunos de cursos de graduação. A Teoria da Música Pura e a Teoria dos
Afetos são seu ponto de partida. Na primeira, a música está provida de qualquer elemento
expressivo, pois a Teoria da Música Pura trata a música como a formalização de idéias musicais.
Na segunda, a música é uma expressão de emoções como raiva, alegria, inveja, compaixão.
Ambos, Platão e Aristóteles, se interessaram pelo poder da música e sua influência sobre o espírito
humano, o que os levou a sugerir aos específicos de certos tipos de música baseados nos ethos de
específicos modos gregos. (...) O poder ético e de cura da música foi promulgado em tratados de
música durante toda a Idade Média até o período Barroco. Historias bíblicas descrevendo o poder
30
da música eram adicionadas aos mitos clássicos, desta forma, misturando valores musicais cristãos
e greco-romanos. (BRABO, apud. BARTEL, 1997, p. 31).
As duas Teorias, apresentando-se como pólos, se isoladas enquanto princípios, são
contraditórias, caracterizando uma oposição categórica. Colocadas em relação dinâmica, tornamse contrárias, caracterizando uma oposição dialética.
Dentro de uma tradição musical particular, ninguém interpretaria um tema intitulado “Dor” como
se fosse alegre. Solicitados a adivinhar o significado pretendido da música, poderíamos deixar de
perceber a dor, mas sem dúvida concluiríamos que se trata de algo semelhante a dor, algo cheio
de conflito e sofrimento interno. Parece que o título não serve apenas para definir o significado de
uma composição, mas sim para defini-lo com exatidão maior. Ele nos diz que tipos de
antecipação serão recompensados pela peça e, assim, ajuda-nos a ouvi-la mas plenamente,
sobretudo na primeira audição.
As pessoas se queixam, freqüentemente, de que a música é ambígua em excesso, de que fica muito
pouco claro o que deveriam pensar ao ouvi-la, ao passo que todos entendem as palavras. Comigo, é
exatamente ao contrário...Os pensamentos expressos para mim através da música que aprecio não
são imprecisos demais para serem postos em palavras, mas sim, ao contrário, excessivamente
explícitos (JOURDAIN, apud. MENDELSSOHN, p.374).
A observação do compositor nos leva de volta à questão de como a música se relaciona
com a linguagem. Esta descreve com precisão o mundo que nos circunda. Fornece nomes para
milhares de fenômenos, que podemos observar atentamente pelos olhos e ouvidos. Mas,
conforme observou o autor – “a linguagem é extremamente tosca na descrição de nossos
sentimentos íntimos” – não somente a emoção e o estado de espírito, mas também as sensações
corporais que experimentamos ao nos movimentarmos pelo mundo. A música imita a
experiência, ao invés de simbolizá-la, como faz a linguagem. Ela reproduz cuidadosamente os
padrões temporais dos sentimentos interiores.
31
3.6. Musicalidade Clínica
Conforme a definição do Webster´s Seventh New Collegiate Dictionary, “musicalidade é
a qualidade ou estado do ser musical. A sensibilidade à, o conhecimento de, ou o talento para a
música (1967, p. 558).
Entre as capacidades mais consideradas de apreender os elementos musicais, temos:
- altura;
- intensidade
- timbre
- andamento (SHEASHORE, 1938, p.2).
Há pessoas que tem maior aptidão para perceber um determinado parâmetro, ou para
responder ao mesmo, ou ler, um determinado aspecto da música. Entretanto, essas quatro formas
de capacidade apontadas anteriormente se interrelacionam.
Pergunta-se: qual a diferença entre a musicalidade clínica e a musicalidade? Há algum
aspecto especifico para caracterizar a musicalidade na prática clínica musicoterápica?
Na musicoterapia a música pode ser vista como um meio enquanto que em outras
atividades que utilizam música esta é, geralmente, utilizada como um fim. Em musicoterapia a
música é um meio através do qual se pretende dar possibilidades para que uma outra pessoa se
desenvolva não especificamente na área musical, mas como um todo.
Segundo BARCELLOS (2004, p. 70), a questão da musicalidade clínica está dividida em
dois grandes pontos:
- escuta musical clínica e
- execução musical clínica.
A complexidade da musicalidade clínica deve considerar não somente os aspectos que
dizem respeito à escuta da produção do paciente, mas também as possibilidades de produção
musical do musicoterapeuta – isto é, a interrelação da produção e escuta musical clínica entre
paciente e terapeuta.
32
Entre os dois aspectos citados anteriormente – escuta musical clínica e execução musical
clínica – subdividem-se outros três aspectos:
1. Mobilização (Estímulo)
2. -Interação Musical Clínica
3. Intervenção Musical Clínica
Evidentemente tais aspectos estão relacionados pois a escuta musical clínica vai,
geralmente, ser seguida por uma execução musical clínica, ou ainda, o musicoterapeuta vai
executar algo ao mesmo tempo, interagindo com o paciente – a interação musical clínica. E
considerando-se a interação musical clínica como um aspecto da musicalidade clínica, não se
pode deixar de pensar nas intervenções musicais clínicas como parte integrante da musicalidade
clínica.
SMITH, M. Preparo do setting musicoterápico para início de sessão. Clínica de Musicoterapia da FMU,
2006. I álbum (08 fot.): color: 10,0x7,5cm.
33
Deve-se levar em conta a execução que visa à mobilização do paciente. Fazendo um
paralelo entre a Recepção – a escuta da produção do paciente – e a produção – a execução em
resposta à produção do paciente, temos (BARCELLOS, p. 73).
1- Perceber a etapa sonora de desenvolvimento em que se encontra o paciente.
2- Perceber a altura da produção do paciente (quando este canta ou toca).
3- Perceber as mudanças de altura que o paciente faz quando executa uma produção várias
vezes (mudança de tom).
4- Perceber o ritmo da produção do paciente.
5- Perceber as mudanças rítmicas ou de compasso da produção do paciente.
6- Perceber o compasso da produção do paciente.
7- Perceber as mudanças de compasso da produção do paciente.
8- Perceber o andamento da produção do paciente.
9- Perceber as mudanças de andamento da produção do paciente.
10- Perceber as harmonias da produção do paciente.
11- Perceber as mudanças harmônicas da produção do paciente.
Acerca da percepção:
1- Utilizar-se de aspectos musicais que sejam adequados à etapa sonora na qual se
encontra o paciente.
2- Responder adequadamente de forma melódica e / ou harmônica.
3- Transpor adequadamente o acompanhamento.
4- Responder ritmicamente de forma adequada ao ritmo executado pelo paciente.
5- Responder de forma adequada às mudanças rítmicas ou de compasso da produção do
paciente.
6- Responder adequadamente ao compasso da produção do paciente.
7- Responder adequadamente às mudanças de compasso da produção do paciente.
34
8- Responder adequadamente a esse andamento.
9- Responder adequadamente às mudanças de andamento da produção do paciente.
10- Responder adequadamente às harmonias executadas pelo paciente.
11- Responder adequadamente às mudanças harmônicas executadas pelo paciente.
Ao musicoterapeuta que não possui tais habilidades musicais: como ficaria? É importante
ressaltar sobre o fato de que a musicalidade existe nas pessoas, em diferentes graus.
A musicalidade clínica é definida como a capacidade de perceber os elementos musicais
contidos na produção ou reprodução musical de um paciente (altura, intensidade, timbre,
compasso e todos que formam o tecido musical) e a habilidade em responder, interagir, mobilizar
ou ainda intervir musicalmente na produção do paciente, de forma adequada.
Por interagir, responder, mobilizar ou intervir musicalmente de forma adequada, entendese, nesse contexto, ser a capacidade do musicoterapeuta de ter uma produção sonoro-musical que
melhor contribua para o desenvolvimento do paciente.
São muitos os atributos necessários para um musicoterapeuta e, como se pode constatar,
trata-se de uma questão extremamente complexa. No entanto, pode-se destacar dentre eles : a
formação específica; o desenvolvimento pessoal e a formação musical, compreendendo aqui o
desenvolvimento da musicalidade, no caso, direcionada para a prática clínica musicoterápica.
35
4. FORMAÇÃO MUSICAL DO MUSICOTERAPEUTA11
Embora a afirmação de que “a musicoterapia corre tanto pelas águas da terapia quanto pelas da
música”, observo que nos espaços onde se apresenta e discute a musicoterapia – supervisão de
trabalho clínico, fóruns e simpósios, - é possível se perceber que, no mínimo, o volume da água que
corre pelo leito da terapia tem um volume muito maior do que aquele que corre pelo leito da
música. (BARCELLOS, 2001, “Musicologia e Musicoterapia, p. 101).
A questão apresentada pela autora é uma realidade que, segundo sua opinião, os vários
motivos estão agrupados em um só: a maioria dos musicoterapeutas não tem formação
musical suficiente para sustentar as águas que correm pelo caminho da música, - existe a falta
de uma formação básica para isto.
Os campos da música que podem contribuir para uma melhor compreensão do paciente e
para um melhor desenvolvimento da área, segundo HESSER (BARCELLOS apud. HESSER,
2004), inclui: psicologia da música, etnomusicologia, estética, psicoacústica, história da
música e sociologia da música.
A musicoterapia passou por três fases. Na primeira, dava-se maior importância ao
efeito que a música exercia sobre as pessoas, deixando-se de lado a figura do terapeuta, ou
seja, a relação terapeuta paciente; na segunda etapa, prestou-se menos atenção à música e aos
efeitos que esta poderia causar no paciente e se passou a cuidar mais da relação terapêutica. E
na terceira se chegou a uma posição intermediária onde tanto a música quanto a relação são
igualmente importantes. Pode-se dizer que a música é utilizada, num primeiro momento, para
facilitar o estabelecimento da dessa relação que vai proporcionar o desenvolvimento do
processo depois de estabelecida essa relação.
Deste modo, à primeira fase histórica, que dá mais ênfase à música, ter-se-ia a chamada
“musicoterapia receptiva”, onde não se incluía a relação e que tem a audição musical como
principal técnica.
Já a fase que maior importância dá à relação terapêutica ou ao equilíbrio entre esta e a
música, que é a terceira fase, corresponderia à chamada “musicoterapia ativa” ou
“musicoterapia inter-ativa” como prefiro denominar o tipo de musicoterapia no qual terapeuta
e paciente estão ativos no processo de fazer música.
11
VISCONTI, M.; BIAGIONI, M.Z. – Guia para Educação Musical em Escolas. Associação Brasileira de Música
(ABEMÚSICA). 1o edição, 2002.
36
Se concordamos com a relevante afirmação de Smeijsters que considera como hipótese
fundamental da musicoterapia que “cantar, tocar e ouvir música ‘ressoa’[eu diria traduz] o interior
da pessoa que toca, canta ou ouve” e que “o musicoterapeuta deve ir ao encontro do paciente na
música”, e eu acrescentaria “ao encontro de seu mundo interno através da música”, imperioso seria
tentar ter-se uma compreensão da música que seria mais adequada para este ou aquele paciente,
quando escolhida pelo terapeuta. (BARCELLOS, apud. SMEJSTERS, 1999.)
Barcellos prossegue com perguntas que não podemos deixar de fazer a nós mesmos: como
se pode ter uma compreensão maior dessa música se a nossa formação musical é inadequada
ou insuficiente? Que caminhos devemos tomar para dar à música o papel ou a função que ela
realmente tem em musicoterapia – sem evidentemente deixar de lado os aspectos da relação
terapêutica? Na verdade, a pergunta que neste contexto mais nos interessa é: como podemos
ter uma maior compreensão da música que o paciente cria ou recria? Esta pergunta nos
levaria a uma outra: como podemos fazer o que a autora denomina “leitura musicoterápica”?
Qual o estudo de música que poderia no ajudar nesse sentido? E, que área da música nos daria
essa possibilidade?
A autora pensa na musicologia ou, mais especificamente, na análise musical. Porém, qual
análise musical ou que tipo de análise musical?
A proposta consiste não em responder a todas as perguntas, e sim tentar levantar
possibilidades que venham a facilitar ou ajudar o musicoterapeuta nessa necessidade de
compreensão do paciente.
Acerca do ensino da música, Koellreutter apontou a necessidade de criar espaços de
atividades musicais lúdicas, funcionais, voltados à formação dos estudantes que não pretendem
profissionaliza-se, mas, sim, trabalhar com a linguagem musical de modo aberto e criativo, com o
objetivo principal de desenvolver as capacidades humanas.
Um seminário de extensão e atualização para professores de educação artística e educadores que se
servem da música como meio; seria, preferencialmente, direcionado a uma atividade profissional
no interior; um curso especializado de música para o rádio, para a televisão, para o cinema, e para o
teatro, que se destinaria a compositores, arranjadores, músicos de orquestra e engenheiros de som;
um curso de música para a publicidade e propaganda, que se destinaria a compositores,
arranjadores e músicos de orquestra; um seminário de música para medicina e reabilitação social,
um curso de preparação e treinamento destinado aos musicoterapeutas e coordenadores de
programas de atividades recreativas e de terapia ocupacional; um seminário de música no campo da
recreação em geral e das atividades de lazer; um curso de especialização destinado a educadores,
animadores, compositores (...).
Cada um desses seminários consistiria em uma matéria principal e em uma série de cursos
correlatos, como, por exemplo: treinamento auditivo (atualizado e especializado), terminologia,
37
teoria da informação aplicada à música, análise, estética, sociologia da arte, improvisação
individual e coletiva. (BRITO, apud. KOELLEUTTER, 1997, p.41).
Na metodologia proposta por Koellheuter a criação ocupa lugar importante e, desta forma,
a improvisação é ferramenta fundamental, como o é para o musicoterapeuta. Sua prática
permite vivenciar e conscientizar importantes questões musicais, tais como respeito,
tolerância, capacidade de partilhar, autodisciplina, reflexão, e assim por diante. Por meio do
trabalho de improvisação, abre-se espaço para dialogar e debater com os alunos (ou
pacientes) e, assim, introduzir os conteúdos adequados. Conforme afirma o autor:
Toda improvisação dever ter uma finalidade musical e também humana, como, entre outras,
desenvolver a concentração (autodisciplina), já que o objetivo [maior] da educação musical é o ser
humano. (BRITO, p. 46, apud. KOELLEUTTER).
4.1. Educação Musical para o Musicoterapeuta
Os elementos básicos para uma boa educação começam com a noção de pulsação que,
principalmente ao musicoterapeuta, servirá como base, referência e até um holding durante a
experiência musical vivida pelo paciente.
A velocidade das pulsações vai sendo trabalhada conforme a música, que poderá ser cantada ou
tocada, rápida ou lentamente. Um bom exemplo seria o marcha soldado, com um soldado muito
cansado cantando bem devagar, depois um soldado descansado e bem disposto e ligeiro, cantando
bem rápido.
O conhecimento das parlendas e brincadeiras12 que envolvam gestos e movimentos com
as mãos, podem ser de grande valia para a introdução da percussão corporal, tão importante para
a musicoterapia e que, para um musicoterapeuta desprovido de instrumentos musicais, é sua
principal ferramenta de trabalho.
a)Pique será, será pegar
Se não pegar, arrume lá.
Me dá licença pode pegar.
12
A letra das canções e parlendas aqui mostradas podem ser encontradas no livro “Quem canta seus males espanta”,
da Editora Caramelo, São Paulo, 1998. O livro vem com um CD.
38
b) Calango tango
do calango da lacraia
A mulher do Zé Maria
Foi dançar, perdeu a saia.
c) Agá, agá, agá
a galinha quer botar
Ijê, ijê, ijê
Fui parar no Tietê.
Alô, alô,
O galo já cantou
Amarelo, amarelo
Fui parar no cemitério
Roxo, roxo
Fui parar dentro do cocho.
d) Era uma bruxa
À meia-noite
Em um castelo mal-assombrado
Com uma faca na mão
Passando manteiga no pão
Passando manteiga no pão.
Esses textos rítmicos trabalham não só a noção de andamento, mas também a fluência da
linguagem – pode ser usada para pacientes que possuem distúrbio de linguagem.
39
4.2. O Som
O som é explorado entre grave e agudo – altura; forte e fraco – intensidade; timbre – a
diferença entre os sons produzidos, onde cada um possui uma característica própria. O som deve
ser contextualizado do ponto de vista musical e não apenas como referência sonora.
O musicoterapeuta trabalha com o som e, por isso, seria necessário o desenvolvimento da
acuidade auditiva através dos seguintes processos:
1- Estimular a pesquisa de várias fontes sonoras (objetos, natureza, cotidiano e outras
formas).
2- Possibilitar a formação de vários objetos sonoros e de instrumentos musicais, para
acompanhar as canções.
3- Reconhecer e utilizar as diferentes características sonoras geradas pelo som e pelo
silêncio.
4- Classificar sons e objetos sonoros.
5- Identificar os sons pelo timbre (instrumentos).
6- Desenvolver a memória musical por meio das canções.
7- Contribuir para a socialização e respeito mútuo.
4.3. Ritmo – Elementos Teóricos
Os elementos teóricos do ritmo envolvem:
1- Pulso
2- Andamento (Velocidade das pulsações)
3- Batimentos com contagem
4- Acento – organização do pulso em partes fortes e fracas
5- Percepção auditiva dos tempos fortes e fracos
6- Improvisações rítmicas
7- Ecos rítmicos;
40
Objetivos:
1- Corporizar os elementos da música
2- Desenvolver o senso rítmico
3- Desenvolver a linguagem gestual
4- Desenvolver a motricidade
5- Despertar a consciência de si mesmo e do outro
6- Desenvolver a sensória percepção do próprio corpo
7- Desenvolver o respeito mútuo e a sociabilidade.
4.4. Pesquisando o Som e o Silêncio
1- Deve-se colocar à disposição dos alunos todos os instrumentos de percussão e pedir para
que os explorem:
a) pelo tato: é macio, áspero, frio, quentinho, pesado, leve
b) pelo olfato: que cheiro têm
c) pela visão: sua forma, seu colorido, sua estética – se é feio ou bonito;
d) pela audição: se o som é grave, agudo, forte, fraco, agradável, desagradável.
2- Pedir que estimulem os instrumentos para fazer muito barulho.
3- Dar ordem ao instrumento para que pare, tomando-se o máximo cuidado para não
deixar escapar nenhum som.
4- Permanecer em silêncio para ouvir os sons externos, podendo até fechar os olhos,
deixando apenas o ouvido alerta.
5- Pedir que os alunos relacionem os sons ouvidos e tentem reproduzi-los com os
instrumentos que estão em seu poder, com força, levemente, agudo ou grave.
41
O objetivo é fazer o futuro musicoterapeuta chegar à conclusão de que para se ouvir é
necessário o silêncio.
A dinâmica pode ser trabalhada através da idéia sonora com elementos que fazem parte da
paisagem: pássaros, cachoeiras, rio, animais, e assim por diante. Os alunos poderão
representar um grupo de cavalos – o som é fraco, mas a medida que se aproxima vai se
tornando mais forte. Essa representação pode ser feita corporalmente ou com instrumentos
musicais, graduando a intensidade dos sons.
4.5. Movimento Sonoro
O trabalho com os nomes das notas podem ser trabalhados de forma ascendente ou
descendente: DÓ-RÉ-MI-FA-SOL-LÁ-SI-DÓ; DÓ-SI-LÁ-SOL-FA-MI-RE-DÓ.
Um bom exemplo para exercitar o nome das notas é cantar uma canção com um pequeno
xilofone quando entram os nomes das notas, trabalhar uma canção com os nomes das notas e
movimentos seguindo a linha melódica, levantar ou abaixar as mãos ao ouvirem o movimento
ascendente ou descendente, ou ainda, improvisar uma canção com os nomes das notas.
O movimento sonoro é definido por aspectos da música, como pulso, intensidade, cor
timbrística, repetição, contraste, acordes e notas por graus conjuntos ou disjuntos, intervalos e
localização espacial.
O trabalho com a música deve ser norteado pela vivência dos elementos - ritmo e som –
de forma lúdica, dando a oportunidade para que o educando sinta, pense e crie, uma vez que esses
elementos possuem todo o material necessário para a aprendizagem musical.
As partituras contemporâneas podem ser ótimas aliadas no processo da percepção de
movimento sonoro, pois assim criam-se símbolos que indicam se um som é de intensidade forte
ou piano, se é longo ou curto, se o andamento é rápido ou lento, se há uma repetição ou se há
contrastes.
J. S. Bach, Prelúdio II do Cravo Bem Temperado, compasso 6.
42
43
4.6. Conteúdo: Som, Vivências
1- Experiências com o som: pesquisa, reprodução.
2- O movimento sonoro: ascendente e descendente.
3- Qualidade do som:
i. Altura................................as regiões – Grave e Agudo.
ii. Intensidade........................a força: Forte e Fraco
iii. Duração.............................o tempo: Curto e Longo
iv. Timbre...............................reconhecimento
auditivo
dos
sons
pesquisados
b) Diálogos musicais: perguntas e respostas.
c) Criações imitativas – Ecos melódicos.
Como trabalho de apoio, pode-se usar as canções – a respiração pelas frases musicais,
movimentos de locomoção, ritmos simples, marchas imitativas, o andar o correr; brinquedos
cantados – criação de movimentos; contos dramatizados com os elementos rítmicos e com os
sons pesquisados; e parlendas – os textos rítmicos, anteriormente citados.
No trabalho com a duração, é interessante realizar um trabalho de contrastes visuais, com
referências de grande-pequeno; alto-baixo; curto-longo; utilizando os materiais que estiverem
disponíveis.
Continuando com as vivências com o som, é importante experenciar sua produção,
propagação, movimento e vibração, o movimento ascendente e descendente (mesma altura),
suas qualidades (altura, timbre, intensidade, duração), ordenação das notas musicais,
reconhecimento de naipes – corda, sopro e percussão; reconhecimento auditivo dos modos
maiores e menores através das canções, improvisações melódicas e ecos melódicos.
44
4.7. Ritmos – vivências
1- Movimentos livres e com comando.
2- Movimentos organizados pelo pulso.
3- Marchas: andar, correr, saltitar, galopar.
4- Acentos de 2 em 2; de 3 em 3; de 4 em pulsações (compassos).
5- Linhas, direções e níveis
Como elementos teóricos, além das qualidades do som, temos:
- O Pentagrama – Leitura relativa.
- Elementos do Ritmo: Pulso, Andamento, e Acento.
- Proporções do tempo: Unidade de tempo – Dobro e Metade.
- Ecos rítmicos e melódicos.
- Improvisações Rítmicas.
Como trabalho de apoio podem ser utilizados canções, os batimentos com contagem,
batimentos com proporção de valores – corporal e instrumental; brinquedos cantados,
parlendas, jogos musicais, danças explorando as frases musicais.
4.8. Representação Gráfica dos Sons no Pentagrama
O pentagrama é composto por cinco linhas paralelas horizontais, e as notas podem,
inicialmente, serem representadas por figuras de forma oval, arredondadas com outra cor,
onde o educando poderá colocá-la onde o professor solicitar: por exemplo, colocar na 2º
linha, e no 4º espaço, de forma alternada.
Utilizando o pentagrama e as figuras ovais, dispor as figuras em ordem ascendente e
descendente, dando o nome da primeira e, a partir dela, dizer os nomes das outras, seguindo a
ordenação dos nomes das notas.
45
4.9. A Escala – Altura
A escala constitui-se pela ordenação das notas em graus conjuntos. A entoação e
reconhecimento de arpejos, tríades e acordes maiores e menores; a relação entre as alturas –
intervalos, graus, conjuntos e disjuntos, reconhecimento corporal e auditivo.
Dentro do trabalho com a escala pode-se explorar os ecos melódicos, repetição de
pequenas frases musicais cantadas pelo professor, da seguinte forma:
i. O aluno repete com a sílaba lá.
ii. O aluno repete com os nomes das notas e movimentos dos braços,
seguindo a linha melódica.
Em relação aos temas musicais, através do reconhecimento auditivo, pode-se proceder da
seguinte maneira:
a) Para cada tema, um movimento corporal.
b) Coreografia: para cada tema, uma direção ou nível.
c) Para cada tema, um instrumento percussivo com uma modalidade rítmica.
Em relação às canções, pode-se trabalhar:
a) Frases musicais
b) Perguntas e respostas
c) Movimento de locomoção.
d) Dinâmica e Agógica.
4.10.
Escalas, Arpejos e Acordes:
a) Entoar a escala indicando com as mãos o movimento sonoro subindo e
descendo e, no final, realizar o arpejo do acorde perfeito Maior I-III-V e VIII
graus da escala. Exemplificando, no caso de Dó Maior: DO-MI-SOL-DO; DOSOL-MI-DO.
b) Depois de dominada a melodia da escala, a partir de qualquer nota, pode-se
trabalhar a ordenação dos sons, cantando o nome das notas.
46
Os tons e semitons recaem sempre nos mesmos graus. Por essa razão, pode-se cantar
todas as escalas sem pensar nas alterações – o importante será o aluno perceber que existe uma
ordem para todas as escalas e, entoando-as, irá reconhecer auditivamente que a ordem é a mesma
– o que muda é a altura.
•
cantar a escala por tetracordes ( de 4 em 4 notas): dó-ré-mi-fá; sol-lá-si-dó.
•
falar, sem cantar a ordem das notas de todas as escalas.
•
cantar as notas do acorde perfeito Maior, com as sílabas lá, lá, lá.
•
cantar a escala, variando o ritmo.
•
cantar os intervalos da escala.
•
cantar canções com os nomes das notas e movimentos com as mãos subindo,
descendo, ou na mesma altura.
•
partindo de uma nota, falar nomes das vizinhas.
Em relação aos intervalos melódicos, com exercícios cantados ou canções:
a) Cantando: DO-RÉ, uma segunda; DO-MI, uma terça; DO-FA, uma quarta;
DO-SOL, uma quinta; DO-LÁ, uma sexta, DO-SI, uma sétima, DO-DO, uma
oitava, com ordenações: dó-ré-mi-do-mi; do-ré-mi-fá-dó-fá.
b) Cantam com a letra da canção;
c) Com lá, lá, lá e os movimentos das mãos;
d) Com os nomes das notas do primeiro intervalo.
Trabalhando os elementos do Ritmo com Instrumentos de Percussão Acompanhando uma
Música Tocada para cada modalidade é interessante usar um naipe de instrumento e um grupo de
alunos, depois realizar uma troca.
a) Marcar os tempos (pulsação);
b) Marcar os acentos dos compassos
c) Marcar a subdivisão dos tempos.
Com o movimento dos braços: reconhecer o compasso e marcar com os movimentos dos
braços.
47
Acompanhando Canções Cantadas:
•
aprender a canção;
•
dividir as frases (perguntas e respostas);
•
reconhecer o compasso;
•
determinar os instrumentos para acompanhar;
•
determinar as modalidades rítmicas para cada grupo de instrumentos.
4.11.
As Canções
A canção que tem uma melodia organizada pela altura dos sons coordenados por um
ritmo, com acompanhamento harmônico através das cadências em forma de ostinatos. Ao cantar
os alunos vivem o mundo imaginário e da fantasia ao se expressarem por meio de gestos
imitativos ou criativos, desenvolvendo-se, assim, sua capacidade de expressão e comunicação.
Em relação ao repertório, os temas deverão adequar-se às necessidades e interesses dos
alunos, podendo sempre contar com temas do nosso rico folclore, de canções populares, cívicas,
geográficas, ecológicas, esportivas, biológicas, históricas, entre outras possibilidades.
Ao ensinar uma canção, o professor:
a) Canta toda a canção e os alunos ouvem.
b) Canta uma frase e os alunos, brincando de eco, repetem.
c) Canta a 2º frase e os alunos repetem.
d) Canta as duas frases e os alunos repetem.
e) Assim sucessivamente, frase por frase, de dois em dois.
O canto, como qualquer outra expressão cultural, estabelece uma íntima relação com o
processo histórico. As canções registram aspectos de seu tempo, como crônicas sociais de época,
48
espelhando e difundindo a experiência específica e os valores culturais dos diversos segmentos
sociais.13
Dentre milhares de canções arquivadas na memória, podemos pinçar apenas uma em
determinado tempo/espaço. As canções podem se deslocar no tempo. Podem, por exemplo,
remeter-nos ao futuro, a algo que ainda está por vir. Deste modo, a canção se torna uma
expressão de sonhos e fantasias e, através do conteúdo da canção, nos informam sobre certos
desejos de transformar o presente em algo mais prazeroso.
Para o trabalho com a voz, é essencial selecionar melodias que sejam compatíveis com a
tessitura do aluno; evitar músicas com alturas muito agudas ou graves. Outros pontos no trabalho
com a voz devem ser frisados:
•
atenção para o volume: a voz cantada se assemelha a voz falada – tomar
cuidado com o som gritado.
•
cuidado com a articulação e dicção das palavras, que devem ser claras para
serem compreendidas.
•
a respiração deve ser natural, livre de tensões.
•
aquecimento vocal, podendo ser acompanhado de movimentos corporais.
•
afinação: o modelo vocal é imitado; portanto, o professor deve ser afinado e
procurar cantar na tessitura do aluno.
•
O mesmo ocorre entre o musicoterapeuta e seu paciente. O musicoterapeuta é a
referência vocal para seu paciente, portanto, seria adequado que tivesse uma
boa afinação e um bom direcionamento musical.
•
alunos com vozes roucas, estridentes, anasaladas devem ser encaminhados
para uma averiguação com um especialista.
O paciente pode, paralelamente à musicoterapia, fazer um acompanhamento com um
fonoaudiólogo, nos casos citados acima: se possuir uma voz rouca, estridente ou anasalada.
Para explorar o ritmo com as canções, utilizando os instrumentos, os objetos e / ou sons
corporais, pode-se cantar e:
13
•
bater o pulso
•
variar o movimento das pulsações
MILLECCO FILHO, L.A. _É preciso cantar – Musicoterapia, cantos e canções, p.70.
49
•
marcar o acento
•
bater o desenho rítmico
•
realizar ostinatos rítmicos.
Para cantar e realizar movimentos corporais:
a) De acordo com o texto.
b) Para cada frase um movimento.
No caso de explorar o som com as canções, cantar e:
a) Respirar no final de cada frase
b) Cantar a 1º frase, e pensar na 2º, sem cantar; cantar a 3º e pensar na 4º
(desenvolvimento da memória auditiva).
c) Um grupo canta uma frase – pergunta; e o outro grupo outra frase – a resposta.
d) Exercitar o movimento sonoro da linha melódica com os braços para cima ou
para baixo de acordo com a variação de altura da melodia.
4.12.
Improvisações
O trabalho com improvisação musical deve ser realizado em forma de jogo seguindo as
etapas evolutivas. O jogo musical deve ser livre e espontâneo com caráter sonoro-rítmicomelódico-harmônico, realizado por experiências vocal-corporal-instrumental.
4.12.1. Improvisações Rítmicas
4.12.1.1.
Improvisação de Motivos Rítmicos:
a) pede-se a um aluno que produza um motivo rítmico.
b) O grupo ouve e repete.
c) Cada aluno cria motivos rítmicos e a classe repete.
50
4.12.1.2.
Com Perguntas e Respostas:
a) O professor bate uma frase rítmica – pergunta.
b) O aluno bate outra – resposta.
4.12.1.3.
Com movimentos corporais para acompanhar as canções, danças e
narrações.
4.12.1.4.
Com sujeição de tempo:
O grupo marca as pulsações com um instrumento percussivo e um aluno improvisa dentro
dessas pulsações.
a) Com texto: o grupo marca as pulsações e escolhe uma palavra que deverá ser
encaixada dentro das batidas e falam ritmicamente. Ex: PAS-AS-RI-NHO.
b) Com quadras:
Vou batendo, vou batendo
Vou tocando sem parar
Vou batendo e tocando
Para todos alegrar.
4.12.2. Improvisações Melódicas
4.12.2.1.
Improvisação livre não sujeita ao ritmo ou ao som:
a) Pedir para o aluno inventar sons com as sílabas lá-lá-lá
b) As improvisações melódicas com pergunta e resposta ajudam no
desenvolvimento auditivo.
Ditado 1
Ditado 2
51
4.12.2.2.
Sinais de Dinâmica
Ao executarmos uma obra musical, instrumental ou vocal, temos a possibilidade de
graduar o volume em três níveis de intensidade: fraco, médio ou forte.
Na partitura essas dinâmicas são expressas por palavras em italiano e abreviadas.
Num nível crescente temos:
Bem pianníssimo..................ppp.......................pouquíssima intensidade
Pianissimo.............................pp........................pouca intensidade
Piano.....................................p..........................suave, médio
Mezzo Piano.........................mp.......................meio fraco
Mezzo forte...........................mf........................meio forte
Forte......................................f...........................forte
Fortíssimo..............................ff.........................fortíssimo
Bem Fortíssimo.....................fff........................grande intensidade, muito forte
Às vezes aparecem abreviações acrescidas de palavras de expressão, como por exemplo:
Poco p ou piú f ou quasi f entre outras.
4.13.
Conceitos Teóricos Fundamentais da Música
Fórmula de Compasso
A fórmula de compasso determina o pulso da música, e é indicada sempre por dois
números. Como por exemplo:
2 – o número acima indica a quantidade do tempo (nesse caso, de dois em dois);
4 – o número abaixo indica a unidade de tempo.
Unidade de tempo é a figura que vale um tempo. Sendo assim, na fórmula de compasso
2/4 cabem duas semínimas, que valem um tempo – a semínima representa a unidade de tempo.
Do mesmo modo, 3/4 é um compasso de três tempos, 4/4 é um compasso de quatro tempos, 5/4 é
a fórmula do compasso quinário (cinco tempos) e 7/4 a fórmula do compasso setenário (sete
tempos).
52
4.14.
Número correspondente das figuras
Antigamente costumava-se considerar a semibreve como a figura que valia um tempo, e
por essa razão esta é simbolizada pelo número 1.
A mínima é simbolizada pelo número 2, pois de acordo com a Divisão Proporcional dos
Valores (ver tabela) duas mínimas representam o valor de uma semibreve.
A semínima é simbolizada pelo número 4, pois quatro semínimas representam o valor de
uma semibreve.
A colcheia é simbolizada pelo número 8, pois oito colcheias representam o valor da
semibreve.
Seguindo esse raciocínio, conclui-se que a semicolcheia é simbolizada pelo número 16, a fusa,
pelo número 32, e a semifusa, 64 – respectivamente, 16 semicolcheias representam o valor de
uma semibreve; 32 fusas e 64 semifusas compreendem igualmente o valor da semibreve.
53
4.15.
Partitura Tradicional
Na partitura, os sons são escritos no pentagrama representado por figuras, as notas
musicais, e sua altura varia do grave ao agudo, ou o contrário, sendo facilmente visível a linha
melódica que forma a melodia, conforme a afirmação de Paul Klee: “melodia é como levar o som
a passear pelas alturas”.
Quando a melodia tem uma letra, cada silaba corresponde a uma nota musical e quando
houver elisões, juntam-se a duas vogais em uma só nota. O ritmo é regido pelos compassos,
podendo ser estes de dois, três ou quatro tempos, simples ou compostos, sendo que o primeiro
tempo é mais forte.Quando há subdivisão do tempo, o primeiro tempo continua sendo o mais
forte, onde recai a sílaba tônica das palavras.
No início do pentagrama há sempre uma clave que irá determinar os nomes e as alturas
dos sons. Nas canções infantis é a clave de sol que está presente, na 2o linha do pentagrama,
determinando a nota sol na 2o linha, e num movimento ascendente ou descendente tem-se o nome
das demais notas musicais.
Depois da clave encontramos os acidentes – sustenidos ou bemóis, que determinam a
tonalidade da canção. Os acidentes assinalados perto da clave constituem a armadura de clave,
indicando, portanto, a tonalidade em que a canção se encontra. Sustenidos e bemóis tem ordem
fixa. Sustenidos: FA-DO-SOL-RE-LA-MI-SI; bemóis, SI-MI-LA-RE-SOL-DO-FA.
A partitura tradicional, muitas vezes, indica o andamento que o compositor sugere, como
Allegro, Andante, Presto. Para aquele que executa a partitura há a indicação de andamento
conforme o metrônomo, onde a unidade de tempo pode ser uma semínima.
54
6.16.Partitura não-convencional
Os sons poderão ser representados simbolicamente por linhas retas, curvas, pontos; a
intensidade, por espessura dos desenhos, mas densas ou não; a duração, por comprimentos e
tamanhos dos desenhos, com alternâncias, simultaneidade, imitação – podendo ser usado papéis
coloridos, com diferentes texturas.
As experiências com a grafia não convencional devem ser tratadas com os alunos (ou
pacientes, no caso da partitura de uma música criada por ele) seguindo um roteiro de trabalho,
voltado às linguagens visual e musical.
A partitura de música contemporânea usa muito esses recursos, e o interessante é
interpretar o que está sendo expresso na partitura.
55
Na partitura contemporânea, o aluno pode criar suas próprias regras. Na partitura acima, por
exemplo, o aluno pode interpretar o movimento sinuoso das linhas como um legatto, ou imaginar
uma sonoridade para as raposas que estão representadas na partitura.
Este tipo de escrita deixa livre a imaginação para que o aluno possa criar sua própria
composição, e até mesmo criar uma história.
56
5. A MÚSICA NO CONTEXTO CLÍNICO
A música, desde os tempos remotos, é diferentemente definida por psicólogos físicos, filósofos e
musicistas, pois cada um deles adota uma perspectiva para definir o que é música. Para os
musicoterapeutas essas perspectivas nem sempre são relevantes ou abrangentes o suficiente para
o universo da prática clínica. Muitos fatores existentes num contexto clínico influenciam a
definição de música do musicoterapeuta, tais como:14
:
a) As preferências, as habilidades e as aquisições musicais do cliente são sempre
aceitas sem julgamento; como resultado, os padrões estéticos e artísticos na
musicoterapia são mais amplos e mais inclusivos do que aqueles de outros
profissionais da música.
b) O cliente é a principal prioridade da terapia e não a música.
c) A musicoterapia opera assumindo que a experiência musical possui significado
para os clientes, e que os clientes podem usar a música para fazer mudanças
significativas em suas vidas.
d) Na musicoterapia, a música é mais do que as próprias peças ou sons; cada
experiência musical envolve uma pessoa, um processo musica específico e um
produto musical de algum tipo.
e) Os aspectos multissensoriais da música são fundamentais para sua aplicação
terapêutica, mas dilatam as fronteiras da experiência musical.
f) De forma semelhante, as superposições e relações entre a música e as outras
artes são muito exploradas com propósitos terapêuticos e isso também contribui
para tomar as fronteiras da experiência musical mais inclusivas.
14
(BRUSCIA, K.Definindo Musicoterapia, pg. 99-100).
57
5.1. Técnicas Improvisacionais em Musicoterapia
O musicoterapeuta necessita dominar pelo menos um instrumento musical e possuir
conhecimentos musicais básicos, a fim de poder improvisar musicalmente no atendimento clínico
com o cliente.
As técnicas de improvisação variam em termos de quais aspectos da experiência de
comportamento do cliente serão o foco de observação e intervenção.
As Sessenta e Quatro Técnicas Clínicas utilizadas na musicoterapia improvisacional15 são
comumente usadas para transmitir empatia, fornecer uma estrutura musical para a improvisação
do cliente, organizar o processo de improvisação, estimular as improvisações referenciais,
explorar emoções e discutir questões terapêuticas. (BRUSCIA, 1987).
5.2. Técnicas de Empatia
Um dos aspectos mais poderosos da terapia improvisacional é o de que o musicoterapeuta
possui inúmeras formas de transmitir a empatia diretamente. Isso é efetuado indo-se ao encontro
do cliente não verbalmente, ou espelhando o que este está fazendo. As técnicas desta categoria
incluem imitar, sincronizar, incorporar, regular, refletir e exagerar.
Imitar: o musicoterapeuta ecoa ou reproduz uma resposta do cliente, após a resposta ser
apresentada. O terapeuta pode tocar a imitação em qualquer som, ritmo, intervalo, melodia,
movimento, expressão facial, e assim por diante. A imitação é utilizada para focar a atenção do
cliente a reagir ou a se comunicar, para indicar ao cliente quais aspectos de sua resposta são
relevantes à tarefa ou situação, para transmitir aceitação ao que o cliente oferece, para verificar a
intenção da mensagem do cliente, para estabelecer o paradigma interacional, para dar ao cliente a
oportunidade de liderar e ter controle sobre o terapeuta, e para modelar o comportamento
imitativo.
Sincronizar: o musicoterapeuta faz o mesmo que o cliente, a medida em que este
prossegue, regulando o tempo do processo, de modo que suas ações coincidam. A técnica de
sincronizar pode ser realizada em vários níveis de precisão. Quando sincroniza, o
musicoterapeuta pode tentar combinar vários aspectos da resposta do cliente, ou apenas certas
15
BRUSCIA, K. – Modelos de Improsisación em Musicoterapia. Tradução de Vitória-Gasteiz, Agruparte, 1999.
58
dimensões. O terapeuta pode permanecer na mesma modalidade de expressão (unimodal) ou
transferir-se para outra (transmodal). Em um contexto musical, a sincronia unimodal ocorre
quando o terapeuta combina os ritmos e melodias.
Incorporar: quando improvisa com o cliente, o musicoterapeuta toma um motivo rítmico
ou melódico apresentado pelo cliente, e faz disso um tema em sua própria improvisação.
Incorporar vai além do imitar, no sentido de que o tema do cliente pode ser modificado,
desenvolvido e exagerado. Mais adiante, o motivo é estendido em uma improvisação inteira, a
qual pode também incluir outros temas e materiais pertencentes, tanto ao terapeuta quanto ao
cliente. Essa técnica é usada para dar reforço ao cliente, na apresentação de um tema musical,
transmitir aceitação da música do cliente, modelar criatividade musical e expressão, modelar
várias formas de trabalhar através de um sentimento musical para uso em terapia.
Regular: o musicoterapeuta iguala o nível de energia do cliente, pelo uso da mesma intensidade e
velocidade de esforço que o cliente. Nesta técnica, o musicoterapeuta não executa
necessariamente as mesmas ações, na mesma modalidade, ao mesmo tempo. O foco se concentra
na quantidade e fluxo de energia, não importando o conteúdo musical ou emocional do cliente. A
técnica pode ser unimodal ou transmodal. Na primeira, o musicoterapeuta canta ou toca no
mesmo andamento e dinâmica que a música do cliente. Na técnica transmodal, o musicoterapeuta
vai ao encontro da energia do cliente, porém em uma modalidade diferente. O terapeuta pode
musicalmente combinar o peso e a velocidade dos movimentos do cliente, ou pode mover de
acordo com a velocidade e nível de dinâmica da música do cliente.
Refletir: o musicoterapeuta expressa os mesmos estados ou sentimentos que o cliente está
expressando. O terapeuta pode refletir na mesma modalidade que o cliente ou em diferente
modalidade (unimodal e transmodal, respectivamente), seja durante a auto-expressão do cliente,
ou imediatamente após esta. As modalidades principais da técnica de refletir são música, letra,
verbalização e movimento.
Exagerar: o musicoterapeuta exagera algo que seja único ou peculiar no cliente, ou no que
o cliente está fazendo. Se o cliente está improvisando, o musicoterapeuta pode exagerar um
timbre, ritmo, melodia, intervalo, contorno ou estrutura de frase que o cliente esteja usando, ou
qualquer sentimento que estiver sendo expresso. Uma vez que o cliente não está improvisando, o
musicoterapeuta pode refletir os sentimentos e estados de humor observados na conduta do
cliente, e então exagerá-los musicalmente.
59
5.3. Técnicas de Estruturação
Base rítmica: o musicoterapeuta mantém uma batida básica ou ostinato rítmico como
fundamento à improvisação do cliente. A base é usada para ajudar o cliente a organizar sua
improvisação. Fornece apoio físico e psicológico para os esforços do cliente.
Centro Tonal: o musicoterapeuta fornece um centro tonal, escala ou base harmônica para
a improvisação do cliente. Pode envolver limitar os tons que o cliente usa para uma escala em
particular, fornecendo um baixo de base, adicionando um ponto de pedal, som grave, ostinato
melódico, bordão ou acompanhamento de cordas. O centro tonal é usado para ajudar o cliente a
organizar suas melodias, garantir o êxito do cliente, estimular o pensamento musical, ajudar o
cliente a desenvolver conceitos de consonância e dissonância, (a nível musical e biográfico),
evocar emoções e estados específicos, estabilizar e conter os sentimentos expressos pelo cliente, e
fornecer a estrutura necessária para que o cliente possa resolver sentimentos dissonantes.
Dar Forma: em um contexto musical, o musicoterapeuta ajuda o cliente a definir a
extensão e forma de uma idéia musical completa. Há duas maneiras de efetivas de ajudar o
cliente a reconhecer ou estabelecer a extensão e forma de sua expressão. O musicoterapeuta pode
fazê-lo usar dois instrumentos – um para o início de um crescendo ou acelerando e outro para a
nota-clímax da cadência, e improvisar com o cliente usando as técnicas de imitar, sincronizar e
regular. Esta técnica é usada para dar forma aos impulsos do cliente.
5.4. Técnicas de Dedução
Repetir: o musicoterapeuta apresenta o mesmo ritmo ou melodia várias vezes, em
sucessão ou em breves intervalos. O ritmo ou melodia pode pertencer ao terapeuta ou ao cliente.
A técnica possui duas funções distintas: provocar uma resposta musical e estabelecer um clima,
ou estado emocional.
Modelar: o musicoterapeuta apresenta ou demonstra um comportamento-alvo, qualidade,
sentimento ou traço para o cliente tentar igualar-se. Modelar pode incluir: apresentar um motivo
musical ou movimento para o cliente imitar, demonstrar um instrumento, improvisar para o
cliente observar, exibir um comportamento em particular, e assim por diante. A técnica é
60
utilizada quando há uma resposta especifica que o cliente necessita desenvolver, e quando é
apropriado e possível o musicoterapeuta fornecer o modelo.
Criar espaços: o musicoterapeuta improvisa e fornece espaços freqüentes na estrutura da
improvisação do cliente responder ou injetar sons. Envolve criar espaços na improvisação do
terapeuta para o cliente preencher. Criar espaços é uma técnica que pode ser implementada em
música, movimento, dança ou discurso.
Inserir: o musicoterapeuta permanece silencioso e improvisa somente quando o cliente
faz pausa, dando a ele responsabilidade primária pela improvisação, enquanto também sugere
opções para continuação. Inserir é uma técnica usada para fornecer continuidade à improvisação,
transmitir atenção de uma distância segura, e indicar prontidão para fornecer apoio, além de
focalizar ou redirecionar a improvisação.
Estender: em um contexto musical, o musicoterapeuta aumenta a extensão da frase do
cliente. Pode fazê-lo por adição de sons ao fim da frase, ou por adição de uma frase coincidente à
do cliente. Esta técnica é usada para ajudar o cliente a expressar uma idéia completa ou
sentimento, de dar continuidade à improvisação. Quando a extensão coincide com a frase do
cliente, esta técnica pode também servir para sustentar o tocar do cliente.
Completar: o musicoterapeuta responde ou completa a pergunta musical apresentada peo
cliente. Esta técnica é oposta as de repetir e modelar, no sentido de que, em vez de apresentar a
frase antecedente para o cliente responder, o musicoterapeuta espera o cliente apresentar uma
frase antecedente, antes de responder com uma frase conseqüente. Completar é uma técnica usada
para construir conceitos de forma, e para promover interação com o musicoterapeuta.
5.5. Técnicas de Redireção
Introduzir Mudança: o musicoterapeuta tenta redirecionar a improvisação do cliente,
introduzindo material temático novo e iniciando uma nova seção na improvisação. Isto é
conseguido quando se descontinua o processo musical em vigor, e se fazem mudanças
perceptivas no motivo rítmico ou melódico, usados como temas. Quando introduz a mudança, o
musicoterapeuta muda figuras rítmicas e tonais. A técnica é musicalmente equivalente a mudar
de assunto no discurso verbal – alcança as mesmas coisas, possui os mesmos perigos, e é uma
tentativa de contra-atuar a ruminação, seja ela verbal ou musical.
61
Diferenciar: quando improvisa com o cliente, o musicoterapeuta distingue e separa as
duas partes pela execução de ritmos, melodias, timbres, dinâmicas, registros, configurações de
textura, e assim por diante – que são muito diferentes do que o cliente apresenta, embora
compatíveis. O objetivo da técnica é contrastar as duas identidades musicais e estabelecer
independência entre os papeis, enquanto mantendo uma relação.
Modular: quando improvisa com o cliente, o musicoterapeuta gradualmente muda metros
ou tonalidades. O propósito desta técnica é mudar de um estado de humor ou sentimento para
outro. Modular é uma técnica sempre efetuada depois que cliente e musicoterapeuta
improvisaram no mesmo metro e tonalidade.
Intensificar: quando improvisa com o cliente, o musicoterapeuta estimula a música pelo
aumento da dinâmica, andamento, tensão rítmica ou melódica (ou ambos). A tensão, em qualquer
desses elementos, pode ser sustentada, ou acumulada através de frases de clímax, que são
repetidas. A técnica é utilizada para obter atenção do cliente, exercitar e energizar a improvisação
do mesmo, propiciar prática do controle de energias e impulsos, e fornecer oportunidades para
liberar a tensão de um modo aceitável.
Acalmar: quando improvisa com o cliente, o musicoterapeuta “relaxa” a música, pela
manutenção da dinâmica e andamento, dentro de uma freqüência moderada, mantendo o ritmo e a
melodia simples e repetitivos, e formando as frases no sentido decrescente, para liberar a tensão.
Esta técnica é utilizada para induzir o relaxamento, restaurar a ordem emocional e reduzir a
ansiedade.
Intervir: o musicoterapeuta interrompe ou redireciona fixações, perseveraçoes ou
estereótipos que são manifestos na música, movimentos, ações ou verbalizações do cliente. Em
contexto musical, síncopes fortes, ritmos atravessados, atrasos de batidas ou rubattos são usados
para desestabilizar ou romper o ritmo do cliente; modulações, alterações cromáticas e atonalidade
são usadas para desestabilizar respostas tonais ou melódicas; mudanças em instrumentos e
técnicas são usadas para desestabilizar estereótipos em sua utilização.
62
5.6. Técnicas de Intimidade
Compartilhar instrumentos: o musicoterapeuta e o cliente tocam o mesmo instrumento,
seja independentemente ou interdependentemente. O cliente compartilha um instrumento com um
colega ou pessoa significativa. Esta técnica é usada para trabalhar questões de limites
interpessoais, explorar questões de controle, trazer maior intimidade no relacionamento,
desenvolver cooperação e uma relação de trabalho, e estabelecer reciprocidade. Quando partes
dos instrumentos são usadas para representar pessoas simbolicamente, esta técnica também
fornece uma riqueza de informação sobre as relações do cliente com outros significativos. A
técnica pode ser contra-indicada no caso de clientes que sejam extremamente territoriais ou
ameaçados por engolfamento.
Dar de Presente: o musicoterapeuta apresenta ao cliente um presente, como uma
execução musical, um instrumento, uma partitura, uma flor, comida, ou um pertence pessoal. O
presente pode ser espontaneamente oferecido pelo terapeuta, ou especificamente requisitado pelo
cliente. O presente transmite a mensagem de que o terapeuta se importa com o cliente enquanto
também simboliza cuidado. Na terapia improvisacional, o musicoterapeuta muito freqüentemente
executa uma improvisação ou improvisa para o prazer auditivo do cliente. Dando sua música ao
cliente, o musicoterapeuta o nutre musicalmente, enquanto se mostra a ele.
Criar Laços (Bonding): através de atividades de improvisação, o musicoterapeuta e o
cliente desenvolvem um tema musical que simboliza, ou se torna associado com a relação
terapêutica. A música expressa a natureza única de tal relação e significa muitas das coisas que
musicoterapeuta e cliente compartilharam juntos. Esta técnica é usada para estabelecer um laço
com o cliente, transmitir aceitação e cuidado, e solidificar sentimentos de confiança no cliente.
Solilóquios: o musicoterapeuta improvisa uma canção como se falasse com ele mesmo
sobre o cliente. Esta técnica é usada quando o cliente não está pronto para aceitar questões
diretas, ou comunicação acerca de um tópico em particular. As letras de um solilóquio
geralmente expressam incertezas sobre os sentimentos do cliente, ou transmitem reações que o
musicoterapeuta tenha sobre o cliente.
63
5.7. Técnicas de Procedimento
Capacitar: o musicoterapeuta dá instruções, demonstrações, assistência física ou aviso
técnico ao cliente. Esta técnica é usada para facilitar a participação do cliente na experiência
musical, ou terapêutica, estabelecer uma relação de trabalho (aliança) com o cliente, e ajudá-lo a
alcançar seus próprios objetivos musicais ou terapêuticos.
Trocar (Shifting): o musicoterapeuta troca de uma modalidade expressiva para outra
(música, movimento, drama, verbal, arte) ou de um meio para outro, dentro da modalidade (voz,
instrumentos, sons corporais). A troca é utilizada para facilitar a expressão do cliente acerca de
sentimentos difíceis, trazer maior profundidade emocional à expressão do cliente, ajudá-lo a
consolidar ou mobilizar seus sentimentos, e contra-atuar o uso que o cliente faz de uma
modalidade, ou meio, como forma de resistência.
Pausa: o musicoterapeuta faz o cliente descansar, permanecendo assim suspenso, durante
uma improvisação, até que seja sinalizado para prosseguir. Durante a pausa, o cliente tem a
oportunidade de armazenar os eventos do passado e presente, enquanto antevê o futuro. Esta
técnica é usada para promover auto-consciência, revisar objetivos, acessar o progresso, definir e
reconsiderar opções para continuação.
Recuar: após desempenhar um papel proeminente na improvisação, o musicoterapeuta
recua e permite ao cliente dirigir a improvisação. Isso pode envolver a descontinuidade de um
processo musical, ou técnica, renunciar um papel musical, esperar o cliente liderar, seguir o que
quer que o cliente faça, ou parar junto por breves períodos. O recuo é usado para dar
responsabilidade ao cliente pelo que acontecer ou permitir a ele projetar-se na música, sem ser
influenciado pelo muicoterapeuta.
Experimentar: em um contexto musical, ou do movimento, o musicoterapeuta apresenta
uma estrutura, procedimento, ou idéia para guiar a improvisação do cliente, e pede para este que
os experimente, com todas as suas possibilidades expressivas. Experimentar é uma técnica
utilizada para ajudar o cliente a identificar e testar várias alternativas ou escolhas, promover a
criatividade, remover bloqueios no pensamento do cliente, explorar os efeitos de vários tipos de
estrutura, e promover a liberdade com responsabilidade.
Conduzir: a improvisação é dirigida por uma pessoa, através de gestos expressivos,
símbolos musicais, mensagens verbais, ou outros sistemas de sinais. Aquele que conduz pode ser
o musicoterapeuta ou o cliente. Como tal, a pessoa pode determinar qualquer aspecto, ou todos,
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da improvisação, incluindo tanto os elementos musicais (ritmos, melodias, acordes) quanto os
interpessoais (quem toca, qual parte, quando). A técnica é utilizada para fornecer oportunidades
de aprendizado dos papéis de liderar e de seguir, desenvolver a auto-confiança e a coesão grupal.
Ensaiar: o musicoterapeuta faz o cliente (ou grupo) praticar uma parte, ou a totalidade de uma
improvisação. Esta técnica é utilizada para ajudar o cliente a dominar um aspecto particular do
meio ou da improvisação, ou preparar-se para demonstrar uma execução. Desenvolve o orgulho
pelo trabalho que se faz, encoraja a perseverança e a disciplina, e adquire auto-controle. Nos
grupos, ensaiar também promove a coesão e domínio do papel.
Executar: o musicoterapeuta leva o cliente a executar uma improvisação, que foi
trabalhada e ensaiada. A técnica é utilizada para objetivar o processo de improvisar, fornecer um
produto para os esforços do cliente, e fornecer oportunidades para o auto-monitoramento.
Reproduzir (Playback): o musicoterapeuta grava a improvisação do cliente (ou grupo) e a
toca de volta, imediatamente após, um tempo depois. Esta técnica é utilizada para romover
autoconsciência, estimular o desenvolvimento de uma identidade, e desenvolver habilidades na
auto-reflexão.
Relatar: esta técnica pode ser utilizada imediatamente após uma improvisação, durante ou
após o playback. O musicoterapeuta pede que o cliente relate vários aspectos da experiência de
improvisação, incluindo o que realmente teve lugar musicalmente, e quaisquer pensamentos, ou
sentimentos, que o cliente teve, em diferentes pontos, na improvisação. Esta técnica é usada para
favorecer a autoconsciência, e para coletar informações que sejam importantes para a
interpretação.
Reagir: esta técnica pode ser usada imediatamente depois de uma improvisação, durante
ou depois de um playback. O musicoterapeuta pede que o cliente reaja à improvisação em si. As
reações podem incluir o que o cliente gosta ou não, ou
como ele avalia a improvisação
esteticamente. Esta técnica é utilizada para obter informação sobre a auto-imagem do cliente,
clarificar atitudes e sentimentos em relação a quaisquer referências programáticas e estabelecer
sentimentos positivos em relação ao self.
Estabelecer Analogia: após a cliente terminar de improvisar, durante ou depois de um
playback, o musicoterapeuta pede para que ele cite uma situação da vida real que seja análoga à
improvisação. Esta técnica é utilizada para fazer conexões entre a música do cliente e sua
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experiência de vida, estimular a verbalização sobre crenças pessoais e ajudar o cliente a usar a
música como um meio de explorar e projetar idéias.
5.8. Técnicas Referenciais
Parear: o musicoterapeuta associa motivos musicais improvisados a respostas de
comportamento do cliente. Cada motivo é pareado com uma resposta particular e tocado toda vez
que o cliente emite a resposta. Esta técnica é usada para transmitir a disponibilidade do
musicoterapeuta, e vontade de acompanhar do cliente, para estabelecer um meio de interagir e se
comunicar com o cliente e obter rapport.
Simbolizar: o musicoterapeuta faz o cliente associar algo musical com algo não-musical,
ou vice-versa. Uma vez que a associação é feita, a entidade musical é usada simbolicamente em
uma improvisação para representar, sinalizar, ou se referir à entidade não-musical. Esta técnica é
utilizada para encorajar a exploração da identidade musical, explorar os sentimentos do cliente
sobre a entidade não-musical e encorajar o cliente a projetar sentimentos pessoais e experiências
na música. Também acessa material inconsciente.
Recoletar: o cliente imagina eventos ou situações, lembra de como eles soam e, então,
reproduz os sons através da improvisação. O cliente pode imaginar um jantar no feriado, em casa,
e como isso soa, e então reproduz as várias vozes e sons. Esta técnica é usada para sensibilizar o
cliente a como os sons são associados a eventos, pessoas, situações, sentimentos, e preparar o
cliente para tipos mais abstratos de improvisação referencial. Pode também ser usada para acessar
material inconsciente associado com os sons, na vida passada ou presente do cliente, e para
revelar sua história sonora.
Livre Associação: o musicoterapeuta improvisa música para evocar imagens, recordações
e associações por parte do cliente. O cliente relata verbalmente suas livres associações, seja
durante ou depois da improvisação. Ou o cliente escuta sua própria improvisação e relata o que
quer que venha à mente. Esta técnica é utilizada para preparar o cliente para improvisações
referenciais, enquanto também explora material inconsciente.
Projetar: o musicoterapeuta leva o cliente a improvisar um trecho de música que descreva
uma situação, sentimento, problema, na vida eral, que necessite de investigação terapêutica. O
musicoterapeuta ou o cliente podem selecionar o tema. Esta técnica é usada para explorar
66
aspectos inconscientes e conscientes do tema, facilitar a expressão e liberar sentimentos
problemáticos, trazer maiores percepções e insigts.
Fantasiar: o musicoterapeuta faz o cliente improvisar música para uma fantasia, sonho
estória ou mito. A improvisação do cliente serve para ancorar o mundo imaginário ao mundo da
realidade sensorial. Esta técnica é utilizada para acessar material inconsciente e externalizar o
material em formas que possam ser analisadas e compreendidas.
Contar Estória: o musicoterapeuta improvisa segmentos de música e o cliente cria uma
estória para eles. Esta técnica é utilizada para extrair material autobiográfico do cliente, encorajar
a projeção, na estória, de sentimentos recalcados, e distribuir sentimentos irracionais em uma
seqüência lógica de causa-efeito.
5.9. Técnicas de Exploração Emocional
Holding: à medida que o cliente improvisa (geralmente com um título ou emoção como
tema), o musicoterapeuta fornece um fundo musical ou acompanhamento que reverbere os
sentimentos do cliente, enquanto também oferece uma estrutura musical para conter sua
liberação. Holding é uma técnica usada para encorajar a completa expressão de sentimentos
difíceis, enquanto também assegura, ao cliente, que esses sentimentos podem ser liberados em
um modo não ameaçador. Também pode ser utilizada para transmitir o apoio e compreensão do
musicoterapeuta, enquanto desenvolvem-se insights empáticos posteriores.
Copiar Duplicando (Doubling): o musicoterapeuta expressa sentimentos que o cliente não
esteja capaz de admitir ou expressar completamente. Esta técnica pode ser unimodal ou
tranmodal. O copiar pode somente ser efetuado pelo musicoterapeuta, ou por um grupo sob a
direção do mesmo. Em um contexto musical, o musicoterapeuta pode copiar os sentimetos
latentes na música do cliente (unimodal), dramatizações (transmodal), movimentos (transmodal)
e verbalizações (transmodal). Esta técnica é usada para trazer sentimentos reprimidos
àconsciência do cliente, para estimular sua completa expressão, facilitar a liberação catártica e
ajudar o cliente a reconhecer e aceitar seus próprios sentimentos.
Contrastar: o musicoterapeuta leva o cliente a explorar qualidades ou sentimentos
contrastantes, através da improvisação musical, de movimento ou dramática. Na exploração dos
contrastes, o musicoterapeuta pode levar o cliente para dentro deles, através de sua própria
música, movimento ou papel, ou simplesmente dar as instruções verbais necessárias para
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encontrá-los. O cliente pode improvisar só ou acompanhado do musicoterapeuta. A técnica de
contrastar é utilizada para aumentar o espectro de expressão do cliente, modelar a liberdade
expressiva, separar e definir sentimentos e suas qualidades de expressão e preparar para separar
incongruências nas emoções do cliente. É útil para a construção de conceitos de forma musical.
Fazer Transições: o musicoterapeuta leva o cliente a descobrir como fazer transições
suaves ou graduais, de uma qualidade ou sentimento contrastante para outro, ou de uma idéia,
evento, ou tema, para outro.
Integrar: o musicoterapeuta integra elementos conflitivos, ou incongruentes dentro da
experiência do cliente, relacionamento terapeuta-cliente, ou grupo. A integração pode ser
efetuada através de improvisação musical, de movimento, dramática ou discussão verbal.
Geralmente envolve encontrar um denominador comum que vai unificar ou ligar, juntos, os
elementos conflituais em um todo concordante.
Seqüenciar: o musicoterapeuta ajuda o cliente a encontrar uma seqüência significativa
para as seções de improvisação, eventos de uma estória, ou informação autobiográfica. Embora
possa ser implementada não-verbalmente, é mais fácil executá-la verbalmente.esta técnica é
utilizada quando o cliente necessita experienciar continuidade ou perceber relações de causaefeito.
Cisão (Splitting): o musicoterapeuta e o cliente exploram cisões ou polaridades na
experiência de self do cliente. A cisão pode abranger idéias contraditórias sentimentos
incongruentes, tendências conflitivas, em movimento ou musicais, ou papéis incompatíveis. O
musicoterapeuta improvisa uma parte do self do cliente, enquanto este improvisa a outra. As
partes são exploradas simultaneamente, uma vez que coexistem e se conflituam, uma com a outra
no interior do cliente. A técnica é utilizada para trazer aspectos do self à consciência, promover
percepção e insight sobre como as partes conflitantes são relacionadas e não-relacionadas, e
preparar o cliente para integrar aspectos conflitantes do self.
Transferir: através de improvisação em duetos com o musicoterapeuta ou colega, o cliente
explora uma relação significativa em sua vida. A improvisação geralmente focaliza uma interação
particular, ou padrão de interação. A técnica é usada para obter informação autobiográfica, para
descobrir tendências de interação do cliente, promover percepção do papel deste na relação,
revelar projeções do cliente em outra pessoa, e explorar possíveis áreas de crescimento no
relacionamento.
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Tomada de Papel: o musicoterapeuta faz o cliente tentar diferentes papéis dentro de uma
improvisação, ou atividade musical. Esta técnica lida com papéis específicos à improvisação. Em
música, tais papéis podem incluir: figura-fundo, solo-acompanhamento, líder-seguidor, partes
instrumentais, partes vocais, soprano-baixo, personagens em uma estória. O cliente pode trocar
papéis dentro de uma improvisação, ou de uma atividade para outra. Esta técnica é utilizada para
desenvolver habilidades envolvidas em cada papel, promover flexibilidade de papéis e
desenvolver habilidades sociais.
Ancorar: quando o cliente tem uma experiência significativa em terapia, o terapeuta faz
algo para ancorar a experiência na memória do cliente. Isso pode envolver associar a experiência
com algo que seja facilmente lembrado (conectar a experiências sensório-motoras, eventos
memoráveis, sentimentos fortes), recolocar a experiência em outra modalidade ou meio (ajustar
uma improvisação de dança à música), ou colocar a experiência em uma forma ou objeto
externalizado, concreto (gravação, desenho, poema). Ancorar capacita o cliente a reter o que foi
apresentado em terapia, e generalizar para outras situações fora da terapia.
5.10.
Técnicas de Discussão
Conectar: o musicoterapeuta verbaliza, ou pede ao cliente que verbalize, como um
aspecto da discussão em vigor, acompanhado ou não de improvisação, se relaciona com outro. As
principais conexões a serem feitas, na terapia improvisacional, são: entre vários elementos na
música do cliente, entre várias afirmações do cliente (na sessão e entre sessões), entre a música
do cliente e seus sentimentos, entre vários sentimentos, entre pensamentos e sentimentos, entre o
cliente e outra pessoa, entre o cliente e a música do musicoterapeuta, entre o cliente e o
musicoterapeuta, e assim por diante. Conectar ajuda o cliente a clarificar sua própria experiência,
enquanto também ajuda o musicoterapeuta a interpretá-la. É ainda um meio muito sutil de
confrontar o cliente. Pelo fato de relatar aspectos da experiência do cliente que não tinham sido
relacionados antes, o musicoterapeuta o leva a ter uma percepção e insight próprios.
Sondar: o musicoterapeuta faz perguntas, ou faz afirmações elaboradas para extrair
informações sobre o cliente. Esta técnica deve ser usada com sensibilidade e parcimônia. O
cliente deve sentir-se confortável o suficiente para se revelar, sem muito incitamento.
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Clarificar: o musicoterapeuta faz perguntas ou afirmações elaboradas para clarificar, ou
verificar informação já fornecida pelo cliente. Uma vez que extrair nova informação é bem
diferente de clarificar o que já foi dado, esta técnica é diferente da de sondar. Porém novamente a
técnica deve ser usada com parcimônia e com sensibilidade, pois do contrário, o cliente pode
supor que o musicoterapeuta não o está ouvindo, ou é incapaz de entender o que ele tem a dizer.
A técnica de clarificar não deve tampouco interromper o fluxo de pensamentos do cliente, ou
evitá-lo de fazer suas próprias clarificações.
Resumir: o musicoterapeuta revê uma discussão, improvisação, ou sessão de terapia, e
recapitula eventos ou idéias principais. A técnica é particularmente útil quando o cliente fala
longos períodos, ou quando revelou uma grande quantidade de informação, sendo necessário um
resumo conciso para lembrar os principais pontos. Esta técnica é utilizada também para trazer
fechamento, conectar finais e consolidar a experiência.
Feedback: o musicoterapeuta verbaliza como o cliente, ou grupo parece ser, soar, ou estar
para uma terceira parte objetiva, ou observador. As interpretações não estão incluídas no
feedback. Esta técnica é usada para desenvolver a autoconsciência e a auto-reflexão.
Interpretar: o musicoterapeuta oferece explicações, ou significados possíveis, à
experiência do cliente. Esta técnica é usada para dar, ao cliente, insight sobre si próprio, modelar
a auto-análise e treinar o cliente em fazer suas próprias interpretações.
Metaprocessar: o musicoterapeuta faz o cliente mudar para um nível de consciência que o
capacite observar e reagir ao que está acontecendo. Por exemplo, enquanto o cliente está
improvisando, o musicoterapeuta pode pedir-lhe que escute ou observe o que está fazendo. Ou,
enquanto o cliente está descrevendo um sentimento, o musicoterapeuta pede que ele descreva
como é estar tendo aquele sentimento. Em um grupo, o musicoterapeuta pode perguntar: “onde
está o grupo agora?”. Em termos existenciais, esta técnica remove o cliente de um modo
espontâneo de consciência para um de reflexão.
Reforçar: o musicoterapeuta recompensa o cliente, ou retira uma recompensa, de modo a
aumentar ou diminuir um comportamento ou qualidade em particular.
Confrontar: o musicoterapeuta desafia as respostas do cliente. Em um contexto verbal,
isso pode consistir em informar o cliente sobre discrepâncias em seus comportamentos,
verbalizações, sentimentos, improvisações, ou entre eles. Em um contexto musical, isso pode
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consistir em criar dissonância, ou tensão que desafie o cliente a modificar, de algum modo, sua
resposta vigente. Esta técnica é usada para trazer insight ao cliente e para motivar mudança.
Revelar: o musicoterapeuta revela algo sobre si ao cliente ou grupo, que se relacione
diretamente a uma questão do cliente. Esta técnica é usada somente quando a auto-revelação vai
facilitar o processo terapêutico.
Além das técnicas de improvisação, o musicoterapeuta pode observar e analisar o
comportamento do paciente de acordo com os perfis de improvisação de Bruscia16, que darão
pistas de como o paciente se comporta em vários aspectos de sua vida. Neste método de análise,
as improvisações do cliente são analisadas musicalmente de acordo com seis perfis (integração,
variabilidade, tensão, congruência, saliência e autonomia) os quais cada um focaliza um processo
musical particular.
SMITH, M. – Preparo do setting musicoterápico para início de sessão. I álbum (08 fot.): color, 10,0x7,5cm.
16
In BRUSCIA, Kenneth E. Modelos de Improsisación em Musicoterapia, Vitória-Gasteiz, Agruparte, 1999.
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A análise do musicoterapeuta se concentra nos elementos musicais – fraseado, volume,
timbre, textura musical e programas (histórias, letras, imagens). Tais elementos direcionam o
olhar do musicoterapeuta para quem é aquele indivíduo e como ele se sente em relação a si
mesmo, ao Outro e ao mundo que o cerca. Cada mudança no contexto musical do paciente indica
mudanças no seu mundo interno e no modo de lidar com as circunstâncias que a vida apresenta.
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6. A IMPROVISAÇÃO MUSICAL DO MUSICOTERAPEUTA
O musicoterapeuta improvisa musicalmente em qualquer uma das técnicas anteriormente
citadas, e faz-se necessário, para que tenha êxito em suas improvisações e criações, aprimorar sua
educação artística, principalmente no que se refere ao fazer musical.
A música é um fenômeno físico, acordes, freqüências, timbres, pulsações, dinâmica,
pergunta, resposta – tudo está dentro da música.
Os fenômenos que ocorrem durante o acontecer terapêutico podem dar-se a nível musical,
conforme está descrito em Transferência, Contratransferência e Resistência, de Lia Rejane
Mendes Barcellos. A música é a terceira parte constituinte da relação terapêutica, pois a relação
transferencial se desenvolve tão logo o musicoterapeuta tenha a primeira interação musical com o
cliente.
Em musicoterapia há uma oportunidade única para o musicoterapeuta usar a sua
contratransferência musical como um espelho e como uma chave para entender a dinâmica do
inconsciente e do pré-consciente do cliente. O fato de a contratransferência do musicoterapeuta
ser audível para ambos, musicoterapeuta e cliente, no momento da criação, torna isto uma
importante ferramenta de trabalho no processo terapêutico. Quando usada positivamente, a
contratransferência musical pode nos propiciar um meio efetivo de receptividade, compreensão e
possibilidade de resposta às partes escondidas do cliente.
Intencionalmente utilizo os termos transferência e contratransferência musical porque o fenômeno
carrega uma presença e um significado diferentes do que em psicoterapia sem música. O fenômeno
torna-se vivo como uma Gestalt artística, com uma roupagem musical. Isto pode ser vivenciado,
ouvido e aceito com uma atitude diferente porque tem um componente estético audível.
(BARCELLOS p.27,1999).
A autora considera a contratransferência musical como sendo padrões sonoros que
refletem tanto as reações inconscientes e pré-conscientes do musicoterapeuta, para o cliente,
quanto à transferência do cliente.
A resistência tem duas abordagens em musicoterapia. Análogo ao conceito musical de
dissonância, pode-se considerar a resistência como uma união inadequada ou “mau
casamento”entre musicoterapeuta e cliente ao invés de pensar-se que o cliente esteja adverso às
intenções do musicoterapeuta.
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Márcia Cirigliano ilustra a contratransferência com a canção-âncora. A canção-âncora é
primariamente uma canção trazida pelo musicoterapeuta, no contexto do atendimento.
A canção surge, sem que este se aperceba conscientemente, em situações clínicas nas quais,
movido pela contratransferência, o musicoterapeuta se depara com dificuldades de interagir com
seu cliente. A canção-âncora auxilia o musicoterpeuta a sair do estado “paralisado” em que se
encontra, dando prosseguimento à sessão. Posteriormente possibilita, ao profissional, mediante
reflexão, utilizá-la como um recurso que o instrumenta buscar interação, quando exposto a
situações musicoterápicas de impasse. (CIRIGLIANO, M. – Revista Brasileira de Musicoterapia,
Ano IX, no.7, 2004).
6.1. Sonata para o Musicoterapeuta
A musicoterapia pode ser comparada a uma sonata. A sonata é uma obra com vários
movimentos para um ou mais instrumentos. É caracterizada por exposição de um tema,
desenvolvimento e re-exposição do tema. Na exposição, o compositor expõe suas idéias – há dois
temas, cada um dos quais pode ser formado de várias idéias musicais; o primeiro tema é
apresentado no tom da Tonica (I grau) e o segundo tema se desenvolve a partir de uma
modulação. No desenvolvimento o compositor explora as possibilidades musicais das idéias que
apresentou na exposição, desenvolvendo climas, conflitos, dramas. Os temas são modulados com
variação melódica e mudança no ritmo. Na re-exposição o compositor repete, de maneira
diferente, as idéias da exposição. A sonata permite uma complexa trama musical: modulações,
arpejos, escalas ascendentes e descendentes e coda. O movimento é também diversificado em
cada movimento.
Fazendo uma analogia entre a forma sonata e o movimento dos musicoterapeutas,
podemos ressaltar alguns paralelos:
Na exposição do tema categoria profissional, precisamos afirmar quem somos, o que
podemos fazer, o que sabemos e nossas especificidades: o tema da tônica.
Escuto, até hoje, jovens musicoterapeutas agoniados por terem que responder à pergunta “o que é
mesmo musicoterapia?” Incômodo suscitado em cada um, pois, ao responder, precisamos
reorganizar o que sabemos, que trabalho estamos desenvolvendo, que valores éticos temos aplicado
no nosso cotidiano profissional. (...) simultaneamente, temos a certeza de que o uso da música com
finalidades terapêuticas é o que nos distingue na equipe de trabalho, no atendimento individual, na
luta social. A modulação desse tema, o segundo tema que a sonata apresenta na exposição, é a
realidade objetiva que cada profissional impõe a esse questionamento. Ao perguntar sobre o que
faço e como realizo o que faço, também indago sobre quem sou e como estabeleço as minhas
relações nesse mundo que constituo e que me constitui. (CHAGAS; IX Fórum Estadual de
Musicoterapia – AMTRJ).
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No desenvolvimento dessa sonata, os temas são modulados com variação melódica e
mudanças tonais. O desenvolvimento em uma sonata comporta o estabelecimento de diversos
climas, conflitos e dramas. Vejamos suas variações
a) O musicoterapeuta afetando a realidade: o musicoterapeuta como um estranho. Uma
sociedade tem seus próprios mapas nos quais traça o que se encaixa em seus padrões
estéticos, cognitivos e morais. A sociedade forma pessoas de “vida ordeira e
significativa”.
Os musicoterapeutas se inserem em uma sociedade de profissionais de saúde que se
inscrevem numa clínica formatada nas práticas médicas.
A sociedade do poder médico produz estranhos dentro do seu próprio poder instituído. O
estranho musicoterapeuta, trabalhando em hospitais, clínicas, centros de saúde, quebras as
expectativas desse sistema, trazendo uma nova lógica ao seu mapa cognitivo, contribuindo com
outra estética.
Terapeuta e músico, sua própria existência questiona o sistema, trazendo à cena, para
pensar a situação clínica, canções, expressões sonoras, ruídos, silêncios terríveis. Em que se
transformará o musicoterapeuta?, em amigo? Em inimigo? Saberá lidar dentro dos limites
traçados por essa prática? Irá desorganizar, com sua todo o espaço tão duramente organizado
pelos saberes tradicionais?
O musicoterapeuta, ao quebrar as expectativas ordeiras da sociedade, causa grande mal-estar, e essa
é a mais dolorosa e menos tolerável experiência admitida nos limites da sociedade. Sermos
confundidos com outros profissionais, não sermos entendidos na nossa prática, estarmos
submetidos, sentimos a sensação de não pertencer é muito difícil. Por outro lado, só os que podem
trazer a excitante perspectiva de transgredir a ordem social. Temos todos muitas histórias de
situações quase mágicas, de comunicações de beleza e suavidade com nosso cliente, nossos colegas
e mesmo com as equipes nas quais trabalhamos, e suas músicas, que são inesquecíveis. (CHAGAS,
IX Fórum Estadual de Musicoterapia – AMTRJ).
A experiência de estranheza levada pelo musicoterapeuta aos lugares que trabalha
enriquece a todos. O musicoterapeuta afeta a realidade em que está inserido.
75
a. O musicoterapeuta é afetado pela realidade. O musicoterapeuta, um
profissional habilitado a lidar com códigos não-verbais, com o musical,
enfrenta os desafios que envolvem a sociedade contemporânea. Trabalhando a
um só tempo com parâmetros tão diversos – a emoção e a razão, a música e a
clínica, a escuta do outro, a instituição e de si mesmo – é desafiado pelas
questões epistemológicas e metodológicas que sua prática suscita.
Somos desafiados pela realidade que nos envolve. Convivemos a um só tempo com uma pobreza
aviltante e uma riqueza igualmente aviltante. A violência nos cerca encolhendo nossas ações. A
solidariedade engrandece nosso cotidiano. Podemos estar em uma clínica cheia de recursos
materiais ou em uma comunidade que nem instrumentos possa adquirir, podemos filmar todas as
sessões ou não ter tempo nem para registrar os aspectos que consideramos mais importantes da
sessão clínica. A realidade e sua exposição de participação para mudanças nos afetam. O outro, o
cliente, o colega, a família do cliente, nos afetam. Constituímos a sociedade que nos constitui. (
CHAGAS, IX Fórum de Musicoterapia – AMTRJ).
Finalizando a analogia com a sonata, chegamos à re-exposição. Nela, o compositor repete,
de maneira diferente, a idéia musical da exposição e o segundo tema tem uma pequena
modificação, voltando à tonalidade inicial. O tema é: o que é musicoterapia? A modulação do
tema: quem sou como musicoterapeuta?
Re-exposição do tema: o musicoterapeuta como um profissional que conquista espaços.
Atualmente os musicoterapeutas se empenham na regulamentação da profissão. O tema se
ampliou, o musicoterapeuta não está mais sozinho respondendo a todas as perguntas. Somos uma
categoria de profissionais. Associações brasileiras são – ou deveriam ser – o ponto de encontro
dos musicoterapeutas.
Estamos em campanha para a regulamentação profissional. Eis, portanto, a volta do nosso
tema e da sua modulação: quem é o musicoterapeuta? O que é musicoterapia?
Precisamos contar para o outro nossas histórias, nossas concepções, ações, nossa
formação. Precisamos conviver com nossas diferenças. Somos todos musicoterapeutas. As
diversas formas de pensar e fazer musicoterapia aparecem e, se quisermos, enriquecem.
Preocupados com a mudança de valores, estamos nos engajando em situações que
envolvem a saúde coletiva. As percepções da expressão criadora, a expressão artística ou mesmo
da comunicação através de símbolos musicais para podem contribuir para a análise e a
intervenção eficaz nas comunidades locais.
76
A diferença nunca esteve tão presente. Suportaremos isso? Estaremos empenhados em
conhecer outros pensamentos, formas de trabalhar, especificidades humanas? Estaremos
aprofundando nosso conhecimento conservando-nos, como categoria, abertos ao outro?
Conseguiremos nos apropriar da música e da terapia e, simultaneamente, abrir mão de certezas?
Conseguiremos nos configurar como uma grande rede feita de nós constituído de conhecimentos,
tecnologia, graduados, especialistas, clientes e outros profissionais? Nossa rede comportará essa
diversidade de nós e tramas de interligações múltiplas?
A coda é uma sessão de encerramento extra.
A minha coda, nesta interpretação da sonata, expõe a esperança de conseguirmos tolerar a
diferença. Diferença entre nós e os outros diferentes-iguais a nós, entre nós e o outro igualdiferente de nós. Recorro a Latour (1996), para quem qualquer relação de cura é uma fabricação da
subjetividade, uma dobra no tempo e no espaço subjetivo, cuja potência da metamorfose se faz com
violência e intensidade. Ser musicoterapeuta é estar permanentemente exposto a contrastes: razão e
emoção, música e terapia, o eu e o outro. Barreiras tênues entre o possível e o impossível, o trágico
e a leveza, a escolha e o destino, a vida, a morte. (CHAGAS, IX Fórum de Musicoterapia –
AMTRJ).
Conforme as palavras da musicoterapeuta Marly Chagas, assim é o ser musicoterapeuta:
as diferenças, os contrastes. Que consigamos suportá-los, para que possamos ajudar o paciente
em suas próprias contrariedades.
COVIZZI, I. – Montagem de setting musicoterápico. Clínica de Musicoterapia, 2007.
77
A Música, O Músico e O Musicoterapeuta: Convergências e Divergências
Trabalhar com música é comum em atividades profissionais diversas, tais como diretores
e produtores musicais, compositores, educadores, produtores de filmes e musicoterapeutas.
Podemos ter claro que somos musicoterapeutas e que utilizamos recursos técnicos empregados na
musicoterapia, mesmo quando estivermos trabalhando em outras situações que não comportem
uma abordagem estritamente clínica.
A música não tem a mesma significação para o músico e o musicoterapeuta. Para o
musicoterapeuta analítico, a música passa a ser um “objeto perdido” do qual se pode retornar a
lógica significante do paciente, é um objeto gerador de ressonâncias, subjetividade. Para o paciente,
a música reveste um fenômeno de projeção, às vezes, de construção, para o musicoterapeuta, um
fenômeno a escutar. (GONÇALVES, apud. PELIZZARI, 1993, p.39).
A linha proximal que há entre músico e musicoterapeuta é demasiadamente tênue, porém
a diferença está no modo com que o musicoterapeuta observa o enfermo e tenta compreendê-lo.
A preocupação do músico é executar uma obra. O músico não terá intenção que um
musicoterapeuta possui em analisar uma música, atenção para a canção que o paciente e sua
família se expõem, e alguns elementos, tais como: se houve alteração da letra original do ritmo,
da melodia; se é um canal para pedir perdão, para exprimir a angústia, para afirmar o amor.
6.2.
Música, Educação Musical e Musicoterapia: uma trajetória..
A musicoterapeuta Esther Nisenbaum, em Prática da Musicoterapia, conta como foi sua
trajetória profissional. Fascinada por música desde criança, estudou teoria e piano, e aos onze
anos já transmitia seus conhecimentos musicais a outras crianças. Formou-se em Direto, mas
sentia-se deslocada na profissão de advogada. Foi psicanalisada por cinco anos, para assumir sua
real vocação: a atividade musical. Assim, iniciaram-se os primeiros contatos com a
Musicoterapia. Entretanto, a autora afirma que a sua passagem, de educadora musical para
musicoterapeuta foi um processo difícil.
“Antes de ingressar no Curso de Formação de Musicoterapeutas do Conservatório Brasileiro de
Música, havia estudado dois anos de Musicoterapia em um Curso que fora extinto antes mesmo de
terminar..Mas venceram a persistência, a vontade e, naturalmente, a eficiência do ensino. Posso
afirmar que o Curso de Formação de Musicoterapeutas do Conservatório Brasileiro de Música foi,
78
para mim, uma grande experiência de crescimento. Quanto a minha vivência de educadora musical,
vejo na Musicoterapia uma confirmação do que já vinha fazendo há anos, assim como o acréscimo
de novos objetivos (terapêuticos) ao meu trabalho como um todo. Explicando melhor: a
Musicoterapia é uma atividade compatível com a educação musical, desde que respeitada uma série
de premissas. Por exemplo dever-se-á ter uma nova visão da pedagogia musical, que tenha por
objetivos não o perfeccionismo musical (e para tanto os métodos tradicionais são reconhecidamente
repressores e muitas vezes castradores), mas sim o desenvolvimento global da personalidade e da
qualidade de vida do ser humano. Além disso, se considerarmos as diversas atividades musicais e
suas características mais importantes podemos embasar melhor esse ponto de vista. Tomemos, a
título de ilustração, a recreação musical, aprendizagem de instrumentos, arte, dança (corpo e
movimento) e Musicoterapia. Todas utilizam música. Todas podem vir a ser terapêuticas. Uma
delas, porém tem objetivos terapêuticos – a Musicoterapia.”(Prática da Musicoterapia, pg.
16-17).
Deste modo, a formação de musicoterapeuta veio confirmar, conforme a expressão da
autora, a “educadora terapeuta” em potencial que, somente através da formação, poderia exercer
com segurança a atividade musicoterápica. Portanto, ser musicoterapeuta não implicou uma
perda, mas sim um desenvolvimento, na busca de resposta aos desafios de uma sociedade onde a
comunicação verbal se torna cada vez mais difícil.
Uma das tradições mais antigas e dignas, a aula de música tem exercido uma ação
formativa sobre a conduta criativa de crianças e jovens. Porém lições musicais no Egito eram
privilégio às damas da corte.Na primitiva era cristã a especialização musical se dividiu em duas
partes – uma formava músicos com conhecimentos gerais de arte, e outra, o cantor executante de
obras musicais.
A musicoterapia é uma forma de educação que combina ambas as especialidades, esforçando-se
para suprir as carências de um determinado grupo de pessoas. Os estudantes que um
musicoterapeuta ou um professor deve formar musicalmente pertencem a um grupo com muitas
desvantagens, conhecidos como deficientes mentais ou indivíduos com problemas emocionais
(GASTON, p. 333)
A diferença entre êxito e fracasso, seja em uma aula de música, seja em um atendimento
musicoterápico, se deve a como o professor de música ou o musicoterapeuta escutam, sua
atenção e concentração. Na relação com seu aluno ou paciente, o professor ou musicoterapeuta
contempla seu aluno ou paciente, tal qual o faria com um filho (OSTWALD, 1968).
Ser ouvido é uma das experiências mais gratificantes que um ser humano pode ter. Assim
como expressamos primeiramente nossas necessidades – alimento, aconchego, calor, proteção e
segurança – a mãe que percebe os sinais sonoros de seu filho dá ao bebê um sentimento de prazer
79
e alegria. Se os desejos são frustrados pela falha na comunicação, o bebê atemoriza-se, entristecese e vem a ansiedade. (OSTWALD, apud. SPITZ, 1965).
Tais emoções, positivas ou negativas, podem vir à tona no contexto da aula de música,
constituindo uma espécie de experiência imunizadora para um estudante que se prepara para ir
para o mundo e nele atuar. Os estudantes e pacientes de professores musicoterapeutas foram, com
muita freqüência, feridos e/ou frustrados na sua vida de relação, vindo na forma de transferência.
Jornal da Tarde, 23/11/2006, In: www.lourencocastanho.com.br (acessado em 25/09/2007).
80
6.3. Os liames entre educação e terapia
Saber curar não é sinônimo de terapia. A terapia exige um trabalho ativo, um forte
empenho em ajudar o paciente.
Um professor de música comunica a habilidade técnica de sua arte. Alguns demonstram
sua destreza com uma demonstração simples, outros sabem como se toca um instrumento e como
podem se comunicar através deste. E é desta comunicação que o musicoterapeuta parte para
entrar em contato com o paciente.
O educador educa para a saúde – física, social, mental e emocional de seu aluno; o
terapeuta cuida da saúde física, mental e/ou emocional do seu paciente, educando-o para que,
posteriormente, possa cuidar de si mesmo.
Conforme a conclusão de OTSWALD (1963):
Tratamos de comparar, com este breve ensaio, o trabalho do professor de música como aquele que
ouve, como um guia, como preceptor e como médico. Todas estas funções fazem parte da
musicoterapia, que consiste no ensino musical aos que estão emocionais ou mentalmente
perturbados. A aula de música é uma antiga e nobre forma de educação humana, um marco da
civilização. Comunica o verdadeiro impulso da tradição da expressão musical, que se encontra
entre a expressão direta da emoção e a sublimação simbólica da mesma.
Voltando à metodologia proposta por Koellreutter, o autor defende que o processo de
formação musical com base no fazer e na análise crítica, cuida de respeitar o nível de percepção e
consciência de cada aluno.Conforme afirma o referido autor, o professor não ensina nada, ele
conscientiza (grifo meu).
Sabemos que o ser humano se envolve com o mundo que observa à medida que influencia as
propriedades dos processos que analisa. É da qualidade e do grau de conscientização de cada um
que depende a nossa imagem e, principalmente, o nosso relacionamento com o espaço e o
tempo.(...) Não devemos esquecer que, na música, todos os elementos são, sem exceção, elementos
de ordem temporal: o som e sua altura, como fenômeno acústico que consiste na propagação de
ondas sonoras, produzidas por um corpo que vibra (...).(BRITO, p.48, apud.
KOELLREUTTER).
A musicoterapia procura a reintegração do indivíduo consigo próprio e com a sociedade, e
para isso o paciente deve conscientizar-se daquilo que é, daquilo que o cerca e também acerca do
seu relacionamento com o outro. A metodologia proposta por Koellreuter vai de encontro aos
objetivos de um musicoterapeuta: conscientizar seu paciente, respeitando seu nível de percepção.
81
O que Koellreutter denomina “educação musical funcional” – isto é, aquela voltada às
necessidades da sociedade, do indivíduo, em “tempo real”, atual, e não fundamentada em
objetivos, valores, princípios e conteúdos que remetem a épocas passadas – onde viviam outros
seres humanos, com características próprias – este é o trabalho do musicoterapeuta: a música
voltada para as necessidades do indivíduo em tempo real, de acordo com suas características e
necessidades. Se há algum objetivo, constitui no desenvolvimento global das capacidades
humanas.
Os liames entre musicoterapia e educação musical podem ser questionados, conforme a
afirmação de RUUD (1990):
(...) Em outras palavras: muitas atividades realizadas pelo musicoterapeuta poderiam ser exercidas
pelos pais, pelo professor ou educador musical. Isto mais uma vez significa que existe um aspecto
cultural, em vez de médico, na utilização da música , e que a própria musicoterapia poderia
promover como uma alternativa ou um acréscimo ao número crescente de musicoterapeutas
profissionais.
Sabemos que os musicoterapeutas não estão entre os primeiros a considerar a influência
benéfica da música. O conceito de uma força terapêutica contida na música tem prevalecido na
estética e educação musical desde a Grécia antiga.
Ao se criar “a ciência da musicoterapia”, junto com a “profissão de musicoterapeuta”, ocorre
uma semelhança com a questão do papel geral e o valor da música, bem como a indústria
musical.
A seguinte questão pode ser formulada por diversas vezes: qual a natureza da música que
pode propiciar tamanha variedade de préstimos?17
Com o intuito de procurar uma reposta na musicoterapia contemporânea, é preciso que nos
debrucemos sobre os diferentes modelos e métodos musicoterápicos, a fim de pesquisar seus
conceitos básicos de música.
A música como estímulo descriminativo leva em consideração a natureza daquela música,
suas características, tais como a freqüência (altura), amplitude (intensidade), complexidade
(timbre), organizados em relações temporais e espaciais.
17
RUUD,E.- Caminhos da musicoterapia, p.87.
82
Se a música for considerada como meio de comunicação, é o caráter lingüístico ou
comunicativo da música que está em evidência. Admite-se que a música contenha ou represente
emoções que são comunicadas ou transmitidas ao ouvinte.
A música como linguagem não-verbal é a que mais enquadra no campo da musicoterapia,
uma vez que a música é considerada, freqüentemente, como uma espécie de linguagem
emocional, capaz de iluminar a psique, que por motivos diversos, está obscurecida pelo medo de
comunicarmos até com nós mesmos.
Se a música é uma linguagem emocional, é isso o que o musicoterapeuta irá observar, pois é a
partir da expressão emocional do paciente, através da música, é que podemos ajudá-lo a entender
o que se passa com ele e com o mundo que o cerca.
GAINZA (1988) vê na disfunção musical a evidência da existência de problemas que
deveriam ser especialmente solucionados e não simplesmente percebidos.
Toda atividade musical é uma atividade projetiva, algo que o indivíduo faz e mediante a qual se mostra;
permite, portanto, que o observador treinado observe tanto os aspectos que funcionam bem no indivíduo,
como aqueles aspectos mais incompletos ou em conflito, seus bloqueios, suas dificuldades. Esse dado é de
fundamental importância para a educação musical porque, a partir daí, o professor poderá organizar sua
estratégia, elaborar seu plano de operações. Também é importante para a musicoterapia, sobretudo no que se
refere à personalidade e à formação do musicoterapeuta. Basta pensar nas conseqüências negativas que uma
suposta musicoterapia exercida por um profissional qual sérios problemas musicais. (...).
A atividade musical mostra ou é indicativa de algo. O observador atento detecta, através de
sua visão, os traços gerais do comportamento corporal (motricidade fina e grossa); capta, através
da audição, a quantidade e qualidade do som produzido; mediante o tato, avalia a de forma direta
as tensões e bloqueios corporais; o afeto orienta-o sobre aquilo que o emissor consegue
comunicar, e sua mente recebe e avalia o caráter e a coerência das estruturas musicais emitidas.
Sendo a música um dos instrumentos indicadores de demandas de alunos ou pacientes,
educadores musicais e musicoterapeutas podem traçar planos pedagógicos ou terapêuticos, e esse
domínio é parte comum das duas áreas de conhecimento. O que as difere são suas estratégias e
seus objetivos.
83
CONCLUSÃO
A Musicoterapia visa estabelecer uma relação de ajuda, onde a música, no mais amplo
sentido, é objeto estimulador e integrador. A musicoterapia visa ao tratamento global do sujeito,
encarando suas funções como parte de um todo não dissociado, onde o indivíduo, assim como a
música, possui elementos que constituem partes de um todo (Souza, 1997).
A música vincula a capacidade de criar e recriar do indivíduo. Fazemos música para nos
escutarmos nela (Souza, 1996). A música é o elo da superfície com a profundidade de nós
mesmos.
Desta forma, como deveria ser a formação musical do musicoterapeuta? Criação e
recriação, a fusão com o próprio instrumento musical-integrador, que faz a ponte entre o músico e
o ouvinte, entre o educador musical e seu aluno, entre o musicoterapeuta e o paciente.
O musicoterapeuta, portanto, deve fazer música, para escutar a si mesmo, para então
poder escutar e auxiliar seu paciente. Deve criar e recriar aspectos de si mesmo, através do fazer
musical, para o enriquecimento não só de sua formação profissional, como também da sua
construção como indivíduo.
O educador educa para a saúde, pode direcionar seu aluno quando vê que este precisa de
auxílio, dele ou de outro profissional. Durante o processo terapêutico, o musicoterapeuta auxilia o
paciente a encontrar seu caminho, através de erros e acertos, dificuldades e superações, criação e
recriação, superfície e profundidade, luz e sombra.
O musicoterapeuta deve entrar em contato com a música não só como educando ou
educador, mas também em um contexto clínico – como paciente, num grupo (de terapia didática
ou não), e também na supervisão, quando serão colocadas em cheque as atuações musicais do
musicoterapeuta e seu paciente. A música, num contexto clínico, abrange reações e
comportamentos, preferências, impulsos, bloqueios e desejos frente aos diferentes parâmetros e
instrumentos musicais, que devem ser percebidos e avaliados pelo musicoterapeuta em sua
supervisão.
A diferença entre a Musicoterapia e as demais atividades que utilizam música é que a
Musicoterapia possui objetivos musicoterápicos – o estabelecimento dos objetivos se faz
necessário para a escolha das estratégias terapêuticas para determinado paciente ou grupo. O
estabelecimento dos objetivos e as técnicas a serem utilizadas pelo musicoterapeuta irão
84
direcionar o atendimento, ajudando o musicoterapeuta a ter um procedimento técnico-científico.
Para alcançar os objetivos terapêuticos relevantes ao processo de individuação de cada paciente,
o musicoterapeuta faz uso de atividades musicais. Estas atividades envolvem o fato musical com
objetivo de comunicar ou despertar algum conteúdo no paciente, podendo assim o indivíduo
atualizar suas potencialidades através do fazer musical ou da comunicação com a música. Tal
processo deve ocorrer também com o próprio musicoterapeuta.
A música na formação do profissional musicoterapeuta, portanto, começa pela formação
musical propriamente dita, passa pelo contato com um determinado instrumento, e se expande
para o contexto clínico, o que torna o musicoterapeuta um profissional da saúde, que ouve e se
faz ouvir no mundo com a música que habita em cada um de nós. Desta forma, a música – o
tocar, cantar e ouvir, são requisitos principais para o musicoterapeuta compreender clinicamente
uma situação musical.
É nesta compreensão clínica da situação musical que o musicoterapeuta se difere, pois
cada mudança no contexto musical do paciente sugere que houve também uma mudança na vida
daquele paciente. A evolução musical acompanha o desenvolvimento pessoal do paciente em
questão, e fazer essa relação entre música e vida é o que coloca o musicoterapeuta sob uma égide
terapêutica.
A música, por si só, é terapêutica, mas é o musicoterapeuta que conduz a música para os
pontos que devem ser atingidos, a fim de que o paciente possa crescer e ganhar autonomia. É
através do vínculo terapêutico, juntamente com a música, que o paciente poderá desenvolver-se.
Para que isso ocorra, faz-se necessário o uso de técnicas, e para fazer um bom trabalho, a
supervisão é indispensável.
Da formação musical básica até a compreensão clínica de uma situação musical, o
musicoterapeuta terá entrado em contato com aquilo que ele mesmo observa em seus pacientes:
sua evolução musical-pessoal.
85
EPÍLOGO
Da mesma forma que iniciei este trabalho com uma história, assim terminá-lo-ei com
outra.
Com o desejo de encorajar seu jovem filho a progredir no estudo de piano, a mãe levou-o
a um concerto de Paderewsky.
Após terem se sentado, a mãe reconheceu uma amiga na audiência e caminhou em sua
direção. Aproveitando a oportunidade para explorar as maravilhas de uma sala de concertos, o
menino se levantou e foi em direção a uma porta, na qual estava escrito: “Não entre”.
Quando as luzes da sala começaram a escurecer e o concerto estava para ser iniciado, a
mãe retornou a seu assento e descobriu que seu filho havia desaparecido. De repente, as cortinas
se abriram e as luzes focalizaram, sobre o palco, o impressionante piano Steinway. Perplexa, a
mãe viu o pequeno menino sentado na frente do teclado, inocentemente, tocando algumas notas
de uma canção infantil.
Neste momento, o grande mestre do piano fez a sua aparição, e rapidamente se dirigiu ao
piano, sussurrando nos ouvidos do menino: “Não pare. Continue tocando”.
Então, inclinando-se, Paderewsky colocou a mão esquerda sobre o teclado e começou a
completar a melodia simples, com a parte do grave. em seguida, a sua mão direita, contornando o
outro lado do menino, adicionou um obbligato rápido. Juntos, o velho mestre e o jovem aprendiz
transformaram uma situação amedrontadora numa experiência criativa, magnífica. E o público
ficou encantado.
Qualquer que seja a nossa situação de vida – não importa quão apreensiva, desesperada,
aparentemente inútil – qualquer que seja a nossa “noite escura da alma”, Deus sussurra dentro de
nosso ser, dizendo:
“Não pare. Continue tocando. Você não está só. Juntos vamos transformar estes padrões
desconectados numa obra de arte do espírito criativo. Juntos, iremos encantar o mundo com a
nossa canção”.
86
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89
ANEXO
90
91
DEPOIMENTOS DE PROFISSIONAIS MUSICOTERAPEUTAS
Questões a serem levantadas
- Como foi seu primeiro contato com a música?
- Comente sua trajetória pela Musicoterapia.
- Como a sua formação musical auxilia na sua prática
profissional?
92
Comecei a estudar piano aos seis anos quando entrei no primeiro ano do Ensino
Fundamental.
Já estava aposentada como professora de música, no Estado, e trabalhando na Escola de
Música do Método Suzuki, quando fui fazer pós-graduação de Musicoterapia no Rio. Logo
comecei o estágio no Hospital Lucas da PUCRS... e não parei mais.
Nos primeiros cinco anos trabalhei como voluntária. Depois que foi comprovado o efeito
da musicoterapia com crianças em Quimioterapia, Hospitalização Prolongada e “Crianças
versus Câncer e Morte”, fui contratada.
A formação musical é fundamental. Não é só um auxiliar na prática profissional;
precisamos saber e muito, exatamente o que está acontecendo na MÚSICA para entendermos o
que o paciente está expressando ou precisando.
Por exemplo, quando numa improvisação, eu, musicoterapeuta, com uma intenção
clínica, coloco um determinado som ou acorde...esperando uma resposta. Isso é feito também
com o meu conhecimento de teoria musical, com intervalos, acordes, tonalidades, etc, etc...
Maria Helena Galicchio, musicoterapeuta, fundou a empresa “Pedro e o Lobo”, que é
contratada pelos serviços de Musicoterapia, no Hospital São Lucas.
São Paulo, 22 de setembro de 2007.
93
Meu contato com a música, pelo que me lembro, começou muito cedo; sempre tive
presenças musicais em casa, seja de músicas do rádio, que fica ligado por um bom período do
dia, e às vezes minha mãe dormia com o rádio ligado, principalmente quando meu pai viajava, e
nós (eu e meu irmão) dormíamos no quarto com ela. Meu pai era (e é) também músico. Baterista,
sempre gostou muito de vários estilos musicais. Desde pequena em casa eu escutava, pelas ondas
do rádio, os rocks dos anos 80, principalmente Kid Abelha, Titãs e Paralamas do Sucesso, e
ficava cantando essas músicas e inventando coreografias, passos de dança pela sala. Com 11/12
anos comecei a aprender a tocar teclado, depois piano e também violão e, a partir daí, não
parei mais. Sentia que queria trabalhar com música para o resto de minha vida. Desde que
comecei a tocar um instrumento, a música me moveu e me encheu de vida.
Como já tinha contato e estudos na área musical, descobri que existia musicoterapia
quando estava no primeiro ano do segundo grau (hoje Ensino Médio). Fiquei bem interessada,
corri atrás de mais informações, e de onde poderia se estudar musicoterapia no Brasil. Eu sou
gaúcha e morava no RS, então optei por ir fazer o vestibular em Curitiba, na FAP, que seria o
lugar mais próximo para mim. Direcionei-me a cursar este curso, ou seja, esta foi a minha
opção. Entrei na faculdade em 1997, e em 2000 estava no último ano. A formatura foi no início
de 2001.Comecei a trabalhar como musicoterapeuta numa clínica em Curitiba, atendendo
principalmente crianças com deficiências (DM e outras síndromes), e também tive um gripo de
musicalização e linguagem, chamado “Encantare”, em parceria com uma fonoaudióloga. A
partir de 2002 comecei a trabalhar em outro espaço, com musicoterapia, atendendo crianças e
adolescentes com dificuldade de aprendizagem e DM. No ano passado comecei a trabalhar com
adultos numa clínica musicoterápica, Mas foi em 2002/2003 que iniciei um trabalho de
musicoterapia mais voltado para crianças “normais”, ou seja, sem patologias instaladas, em
escolas de educação infantil, trabalhando com estimulação essencial (com bebês) e estimulação
e prevenção com crianças de 1 até cinco, seis anos. Hoje estudo e fundamento este trabalho nas
práticas de “Musicoterapia Centrada na Cultura” e Community Music Therapy, com orientação
teórica nos trabalhos do Dr. Brynjulf Stige e Even Ruud. Em 2004 terminei o mestrado em
Psicologia, com uma pesquisa neste viés da Musicoterapia junto à Psicologia histórico-cultural
de Vygotsky, e no ano passado, 2006, comecei o doutorado em Psicologia na UFSC, na mesma
linha teórica de fundamentação. Minhas pesquisas, tanto de mestrado, quanto de doutorado,
perfazem um caminho de discussão que aborda temáticas entre musicoterapia (Centrada na
94
Cultura), música e psicologia (histórico-cultural). Também ministrei aulas no curso de graduaão
em Musicoterapia da FAP-Curitiba, como professora colaboradora.
Estou sempre buscando me aprimorar musicalmente, pois a música é o caminho por onde
a musicoterapia acontece. Em suas diversas roupagens sonoras – rítmico, melódicas,
harmônicas e também atonais – a música permite vivenciar e experenciar atividades musicais e
fazeres musicais por onde acontece e onde acontece a prática musicoterápica.
Portanto, minha bagagem musical é fundamental para meu trabalho, articulando esta
musicalidade em serviço do outro.
Patrícia Wazlawick, musicoterapeuta clínica, doutoranda em Psicologia na UFSC.
Enviado à 26 de setembro de 2007.
95
Meu contato com a música iniciou-se quando ainda menina.
Por volta dos oito anos fui morar em frente à casa de um tio que tocava acordeon e
teclado. Todos os dias eu pedia para meu pai me levar na casa deste meu tio para vê-lo tocar e
poder explorar o teclado. Meu desejo por aqueles acordes e melodias aumentavam a cada dia e
meu entusiasmo por aprender este instrumento também. Meu pai acabou comprando um teclado
e me incentivou a iniciar as aulas.
Desde então a música fez parte da minha vida, com muito esforço e, em seis anos de
estudo, concluí a formação em teclado.
Aos quatorze anos, uma professora de história do ginásio me incentivou a fazer uma
prova no Conservatório Dr. Carlos de Campos, de Tatuí. Fui aprovada e fiz aulas de piano,
coral e percepção musical, mas a distância dificultou muito a conclusão destes cursos.
Voltei a fazer algumas aulas de piano em São Paulo, além de aulas realizadas na própria
faculdade – de percepção, expressão vocal e etc...Com o passar dos anos fiz também aulas de
violão e voz.
Meu interesse pela musicoterapia surgiu quando eu estava no primeiro colegial.eu sabia
que minha profissão teria que estar relacionada à música, mas não só música! Daí então li sobre
a musicoterapia em um Guia de Estudante e me apaixonei pela idéia de utilizar terapeuticamente
os efeitos que a música pode produzir nos seres humanos.
Até concluir o colegial, li muito sobre esta profissão e minha ansiedade só aumentava.
Aos 17 anos entrei na tão sonhada faculdade e nunca tive dúvidas de que eu estava no
caminho certo.
Hoje atuo na área da Geriatria e reconheço que minha formação musical iniciada por
volta dos oito anos tem grande valor na prática clínica. Tocar um instrumento com segurança,
ajudar o paciente a compor, recriar com ele musicalmente e saber relatar sua expressão musical
é fundamental para a evolução do processo.
Daiane Pazzini Marques, musicoterapeuta, graduada pela FMU, com extensão
universitária em Psicogerontologia (COGEAE PUC-SP) e Atualização Universitária em
Gerontologia na Faculdade de Medicina –USP.
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Como foi sua trajetória de vida até chegar na musicoterapia?
Comecei a estudar piano aos cinco anos de idade, porque aos três anos comecei a tocar “de
ouvido”. Como minha mãe era violinista, também com formação em canto lírico e professora de
harmonia, além de mais outra tia e uma prima professoras de piano, foi fácil ser encaminhada
ao estudo de música. Meu avo também tocava violão, sem ter estudado, e um tio era saxofonista,
sem nunca ter visto uma nota.
Então a música sempre esteve presente na sua vida?
Sim, a minha vida girou sempre em torno da música. Aos 16 anos fiz um concurso SulRiograndense de piano e não fiquei entre os finalistas. No entanto, a banca, que era constituída
pelas conhecidas professoras de piano do Rio de Janeiro: Lucia Branco, Nise Obino e Helena
Lorenzo Fernandez, além de Paschoal Carlos Magno. Este, me concedeu uma bolsa de estudos
para o Rio de Janeiro.
Vim imediatamente para o Rio, onde terminei meus estudos de piano na Academia de Música
Lorenzo Fernandez e onde, imediatamente, comecei a estudar composição, contraponto e fuga
com a Profa. Joaquina Araújo Campos da hoje Escola de Música da UFRJ. Depois de terminar
o curso, passei a estudar em caráter particular com o Prof. Arnaldo Estrella, um dos grandes
professores de piano da época, já que a profa. Nise Obino mudara-se para Brasília. Também fiz
uma especialização em Educação Musical no Conservatório Brasileiro de Música com Liddy
Mignone e Cecília Conde.
Este curso exigia um estágio na Sociedade Pestallozzi do Brasil, onde fiquei por quase um ano.
Mudei então para Taubaté (São Paulo), onde trabalhei por cinco anos como professora depiano
e harmonia na Escola de Música da cidade. Também trabalhei com música numa Escola
Especial para Deficientes Mentais. Voltando ao Rio, voltei a estudar piano com o professor
Arnaldo Estrella, que dava aulas numa sala cedida pela Mesbla, no andar dos instrumentos.
E a Musicoterapia?
97
Bem, eu ainda estudei três anos com o Prof. Estrella, até que num dos dias de aula vi, no salão
de instrumentos da Mesbla, a divulgação do Curso de Musicoterapia. Fui ao CBM ver “do que
se tratava”, e lá estou até hoje!
E da graduação em diante, como foi esse caminho?
Paralelamente fiz outros cursos: um mestrado em Musicologia, uma formação no Método Bonny
de Imagens Guiadas e Música nos Estados Unidos, com Kenneth Bruscia (por finalizar) e hoje
sou doutoranda do Programa de Pós-graduação de Música na UNIRIO.
Como musicoterapeuta, trabalhei durante 7 anos ABBR e, depois disto, num consultório
particular, onde atendi a diversos tipos de pacientes.
E sua atuação junto às entidades de classe?
Fui presidente da Associação Brasileira de Musicoterapia (hoje Associação de Musicoterapia do
Estado do Rio de Janeiro) por dois mandatos, da Diretoria da Federaçao Mundial de
Musicoterapia. Nestes dois mandatos fui coordenadora da Comissão de Prática Clínica. No
primeiro deles esta comissão, integrada por membros dos cinco continentes e pelo prof. Marco
Antonio Carvalho Santos, do Brasil, elaborou-se a definição de musicoterapia, adotada
oficialmente por essa federação. No segundo mandato, também a comissão era constituída por
musicoterapeutas dos cinco continentes, e pela musicoterapeuta brasileira Paula Carvalho, e foi
feito um levantamento mundial sobre a prática clínica da musicoterapia, em 24 países.
E como veio se desenvolvendo a sua carreira acadêmica?
Paralelo ao trabalho de musicoterapeuta clínica e do exercício de alguns cargos em instituições
profissionais, desenvolvi uma carreira acadêmica que tem como centro o trabalho no CBM onde
fui coordenadora da Graduação em Musicoterapia, professora das disciplinas de musicoterapia
nos quatro anos do curso e coordenadora da pós-graduação criada em 1993. também fui
professora convidada da Universidade Federal de Pelotas e hoje ainda sou professora
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convidada da Universidade Federal do Espírito Santo; da Universidade Federal do Piauí e da
Universidade de Ribeirão Preto – UNAERP.
Sou editora da América do Sul do Jornal Virtual de Musicoterapia: http://www.voices.no onde
publiquei oito artigos e onde vários musicoterapeutas brasileiros tem também veiculado a sua
produção.
Tenho artigos publicados no Brasil, Argentina, França, Espanha, Alemanha, Noruega e Estados
Unidos. No Brasil, além de artigos, tenho 4 Cadernos de Musicoterapia e dois livros, todos
editados ela Enelivros.
Em todos esses anos, como você vê o processo de regulamentação profissional? Quais os
principais entraves?
Tenho acompanhado todos os processos que foram apresentados e, um deles, durante a minha
gestão como presidente da Associação, chegou à votação final.
Penso que várias são as
dificuldades e muitos os entraves que têm impedido essa regulamentação. Quando os primeiros
processos foram apresentados havia uam diferença muito grande por são se ter a Internet, que
possibilita um acompanhamento mais rápido. Por outro lado, não se tinha dinheiro – o que
continua acontecendo – para viagens à Brasília para fazer o lobby necessário e para estar
presente nas votações.
Mas, além do acompanhamento, é extremamente necessário, para se intervir nos momentos
certos, (apresentando apensados e estando disponível para dar as informações que as equipes
dos deputados precisam) existem outros aspectos que julgo absolutamente importantes. E, citaria
como fundamental, o investimento que cada um de nós, musicoterapeuta brasileiro, faz nesse
sentido.
E aqui não falo mais de se ter dinheiro para as viagens e para as despesas decorrentes do
acompanhamento de um processo desse tipo. Falo do investimento que cada um faz na profissão,
na sua associação, naquilo que é pedido pelas pessoas que estão à frente da UBAM, enfim, pela
“presença”de cada um de nós nesse investimento.
Então, isso seria uma falta de mobilização da categoria?
99
Sinto que tudo é delegado àqueles que representam a instituição maior que é a UBAM, e que
muito pouco se ajuda essas pessoas. Ainda tivemos que enfrentar profissionais de outras áreas
que, ameaçados, fizeram o que podiam para impedir a nossa regulamentação.
Assim, identifico problemas que são difíceis de serem enfrentados mas que não se poderia dizer
que são intransponíveis. Mas, há que se investir; é necessário que nos juntemos e que,
principalmente, tenhamos uma consciência de classe.
Na sua opinião, o que um estudante deve ter em mente quando escolhe essa carreira? Quais são
os requisitos básicos, a seu ver, para a formação de um bom profissional musicoterapeuta?
Pela experiência que tenho, há exatamente 30 anos como professora do curso de graduação de
musicoterapia do CBM, identifico três tipos de aluno de musicoterapia: aqueles que querem ser
terapeutas e utilizar a música como ferramenta de trabalho; os que pensam que o curso é uma
terapia pessoal através da música e os que vêem o curso como uma forma de desenvolvimento da
sensibilidade para exercerem melhor as suas carreiras, seja de músico executante, de
compositor, etc.
Penso ser difícil dizer o que um estudante deve ter em mente quando procura um curso desse
tipo. Vários seriam os aspectos a serem levantados: que, como em toda a formação, deve haver
um investimento grande de tempo, de dinheiro e emocional. Que eles estarão a serviço do outro,
porque trabalharão com pessoas. Que utilizarão a sua arte não como um fim mas como um meio
para exercer a ajuda às pessoas. E, por isto, que deverão investir no estudo não só das
patologias, mas também da música, especificidade da musicoterapia. Enfim, que haverá um
comprometimento emocional grande e, por isto, deverão passar por um processo de
autoconhecimento, ou terapia pessoal, para poderem enfrentar as questões que terão pela frente.
Enfim, como é difícil se pensar em algo que muitas vezes não se conhece ou se conhece pouco,
essas questões são levantadas dentro do curso para que haja uma conscientização maior desses
aspectos, tão importantes na formação de um musicoterapeuta.
Entrevista concedida à Ricardo Paes, em maio de 2006. Enviado via e-mail por Lia Rejane M.
Barcellos em outubro de 2007.
100
Sou de uma família onde, desde minhas avós, estudava-se piano. Assim, aos quatro anos de
idade, iniciei minha trajetória musical.
Concluí o curso de piano, fiz a complementação de Educação Musical e parti para o trabalho de
professora de Educação Musical em escolas. Fiz formação e especialização em Pedagogia;
também fiz cursos de complementação em Música – Regência Coral, Flauta Doce, Impostação
de Voz, entre outros, todos no CBM.
Quando já trabalhando, tomei conhecimento da Musicoterapia, através de um aluno de nove
anos, hiperativo, filho de médicos, que havia feito um tratamento na França de três meses e
voltado outro. Achei maravilhoso, mas no Brasil não tínhamos nada ainda.
Quando soube do início do curso no CBM, corri para inscrever-me.
Daí para frente...tornei-me musicoterapeuta.
Quanto à minha trajetória pela Musicoterapia, nos formamos em dezembro de 1975 e, em
fevereiro comecei a trabalhar, já como musicoterapeuta, sem, no entanto abandonar minha
carreira de professora. Creio que as duas vertentes na música se complementam.
Especializei-me
em
atendimento
de
reabilitação,
tendo
trabalhado
na
ABBR
por
aproximadamente oito anos, e em escola especial por dez anos. Atualmente sou professora da
disciplina de Musicoterapia em Reabilitação do CBM e continuo a fazer atendimentos
particulares em Reabilitação e Geriatria. Fiz cursos também na área de Reabilitação,
Neurociências, Geriatria e Gerontologia.
Quanto à formação musical...Creio que para ser musicoterapeuta há de se ter uma formação
musical de base, com conhecimentos de Harmonia e Análise. Há momentos, onde a análise
musical é fundamental para esclarecimento dos efeitos da música sobre o outro.
Para se fazer uma avaliação de nosso trabalho terapêutico através da utilização da música, é
necessário sermos verdadeiros conhecedores de música. Tocar um instrumento é fundamental,
mas saber o que estamos tocando, o que estamos construindo musicalmente, e como essa
construção penetra no outro, transformando-o, é a base de todo nosso trabalho.
Sem conhecimento e prática musical tenho certeza de que fica muito complicado ser
musicoterapeuta. Em todos estes anos de trabalho, tenho vivenciado esta verdade, através de
meus estagiários.
Eneida Ribeiro Soares, musicoterapeuta clínica e professora do CBM. 22 de outubbro de
2007
101
Desde criança o meu contato [com a música] foi muito grande. Minha mãe sempre cantou
canções de ninar para os filhos. Ela sempre gostou muito de música. Tinha uma bela voz e
durante muitos anos trabalhou regendo corais na Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos
Dias, além de trabalhar como secretária bilíngüe Português-Inglês. Seu pai, que era alemão,
também gostava muito de cantar e tocava vários instrumentos. Infelizmente não conheci meu
avô, que faleceu quando minha mãe ainda era criança.
Todos na família sempre gostaram de música e meu tio, irmão de meu pai, tocava piano.
Nascido no interior de São Paulo, na cidade de Bebedouro, ele tocava tanto na Rádio da Cidade
como em bailes, fazendo parte de um conjunto musical. Eu gostava muito de ouvir os chorinhos
brasileiros tocados por ele ao piano.
Aos domingos, depois do almoço, eu costumava ficar com meu pai ouvindo música
erudita. Ouvíamos obras de compositores como Beethoven, Tchaikovsky, Chopin, Schumann,
Schubert, Liszt e outros grandes nomes. Ouvíamos também música popular.
Aos oito anos comecei a estudar piano com meu tio. Mas, como eu ainda não tinha o meu
instrumento, fiquei um pouco desanimada. Somente aos quinze anos ganhei o meu primeiro
piano. Desde então comecei a estudar e segui adiante. Concluí meu curso de Piano no
Conservatório de Música e Artes de São Paulo. Cursei a Faculdade de Educação Artística, com
Habilitação Plena em Música, no Instituto Musical de São Paulo.
Lecionei em escolas particulares, estaduais e da prefeitura. Dei também aulas
particulares e me dediquei à Iniciação Musical de crianças ensinando flauta doce e piano.
Posteriormente também estudei órgão, dedicando-me a ensinar música popular. Dei aulas em
domicilio e também em minha casa. Meus alunos participavam de audições no final de ano.
Cantei em corais e organizei e dirigi um coral de crianças em atividade na Igreja, ao órgão,
para cantar os hinos religiosos.
Meu irmão mais novo seguiu carreira como pianista, dando concertos inclusive na
Alemanha. Tocava órgão, tendo participado ativamente também das apresentações dos corais da
Igreja como organista.
Ouvi falar sobre Musicoterapia pela primeira vez nos anos 70, quando estava cursando a
Faculdade de Educação Artística. O assunto me interessou muito e fiquei encantada com as
amplas possibilidades de utilização no campo da saúde, como profilaxia, assim como na
educação. Na época o curso de Musicoterapia estava sendo ministrado no Rio de Janeiro, sob a
102
direção do Dr. Rolando Benenzon. Eu era jovem e meus pais não concordaram com a idéia de
que eu me ausentasse de casa para cursar a faculdade. Posteriormente fiquei sabendo que o
curso foi ministrado em outros locais aqui em São Paulo, mas eu não tive possibilidade de
concretizar esse desejo.
Somente muitos anos depois, exatamente no ano 2000, que eu tomei conhecimento do
Curso de Especialização em Musicoterapia na FPA, com a duração de dois anos. Freqüentei a
faculdade por seis meses e, quando fiquei sabendo do Curso de Graduação na UniFMU, fiz
minha opção.
Em 2001 estava matriculada no 1o ano de Musicoterapia. Fiz parte da primeira tirma de
formandos de 2004. Entreguei meu TCC em 2005, que trata do Processo de Envelhecimento.
Além do meu estágio no CIAI – Centro Integrado de Atendimento ao Idoso, que me inspirou para
o TCC, e também na Clínica da FMU.
Depois que me formei fiz uma palestra sobre Musicoterapia incluindo uma vivência para
as consultoras da Natura em Santana, , para o controle do stress e manutenção da auto-estima,
com remuneração; atendi uma paciente de 15 anos com DM leve, e tenho orientado colegas da
Musicoterapia em seus TCCs.
A formação musical auxilia muito numa improvisação musical. Ela nos dá condições e
possibilidades de observar com critério as gradações e níveis de Intensidade, Andamento, de
grafar ritmos, melodias, observando suas subdivisões e acentuações. Proporciona condições de
verificar como o cliente fornece mais atenção a uns elementos que outros, como se sente em
relação a emissão do próprio som e do outro, como é sua emissão vocal – enfim, favorece uma
observação cuidadosa de sua produção sonoro-musical. Por outro lado, corre-se o risco de
voltar muito nossa atenção somente para isso, perdendo detalhes importantes de sua expressão
corporal e verbal. É preciso não esquecer do todo, considerando-se o fator figura-fundo.
Hilde Kreutzer Castanho de Almeida, formada em Educação Artística. Musicoterapeuta, formada
pela FMU, 2004.
Depoimento enviado a 25 de outubro de 2007.
103
Iniciei meus estudos musicais em 1986, com o piano erudito e popular.
Três anos depois eu já tinha alguns alunos, e segui dando aulas de piano por longos
dezessete anos (hoje dou ainda algumas aulas, mas esporadicamente – não é mais meu foco e
nem o meu interesse).
Durante esses anos todos eu aprendi violão, flauta doce e formei-me em piano técnico
pelo Conservatório Musical Beethoven (SP).
No ano de 2001 iniciei meus estudos no CLAM (música popular) e também meu trabalho
com educação musical infantil (nesta mesma escola e em outras escolas infantis). Fiz muitos
cursos, dei muitas aulas, estudei vários educadores musicais como Willems, Dalcroze, Kodály,
Orff, Gainza, etc. Desta experiência com educação infantil, onde aprendi a trabalhar com
música de forma mais ampla, pelos sentidos, sensações, impressões e pensando sempre no
desenvolvimento da criança de forma global (físico, psíquico, neuronal e emocional), é que me
interessei pelo assunto, [ Musicoterapia] mas intuitivamente, pois não sabia que existia uma área
da saúde chamada Musicoterapia. Só sabia que queria entender mais da relação entre psiquismo
e o musical.
Procurando graduações em Música e também em Psicologia, acabei encontrando a
Musicoterapia. Não hesitei, era a oportunidade de unir minhas duas grandes paixões para
trabalhar: a música e a saúde.
Escolha acertada, desde que entrei na graduação fui substituindo os alunos pelos
pacientes, tamanho foi meu encanto pela área.
No segundo ano de graduação já havia decidido que abraçaria a profissão com muita
garra. Comecei a pensar em montar uma clínica coletiva, com muitos sócios-musicoterapeutas.
Proposta exposta, muitos colegas em princípio gostaram da idéia, mas ao longo dos meses foram
deixando de lado o ideal. Assim ficamos eu e meu atual sócio, Wanderley A. Júnior, com o firme
propósito de montar a clínica.
No ano seguinte, o terceiro da graduação, tivemos contato direto com o Prof. Benenzon,
cujo modelo nos encantou. A partir daí a idéia de ter uma clínica própria só se fortaleceu.
No primeiro bimestre do ultimo ano da graduação começamos a fazer as prospecções
financeiro-administrativas da clínica de musicoterapia, onde queríamos como supervisor
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Rolando Benenzon; e foi então que partiu dele a proposta de transformar a simples clínica em
um Centro Benenzon.
Depois de muita reflexão decidi encarar o desafio, em prol do meu desenvolvimento
profissional e em prol da profissão em si, pois acredito que precisamos sair da informalidade
que paira sobre nossa classe para termos o reconhecimento devido.
Hoje sou sócio-fundadora, coordenadora e musicoterapeuta do Centro de Musicoterapia
Benenzon – Brasil, em São Paulo.
Sinto que o conhecimento musical que tenho me dá bastante segurança na atuação, pois
me permite sempre “estar junto” do meu paciente, interagindo e dando o continente necessário
para sua expressão e sua criatividade. Apesar de toda minha bagagem musical – que não é
pouca por todos estes anos, ainda acho que ela é insuficiente para a musicoterapia. Continuo
meus estudos no piano, no violão, e pretendo me aprofundar mais, talvez através da graduação
em Música, pois acredito que o musicoterapeuta precisa ter, além de outros aspectos não menos
importantes, muito conhecimento, sensibilidade e desenvoltura em relação à música, para lidar
com a produção sonoro-musical e comunicar-se satisfatoriamente com seu paciente em um
contexto não-verbal.
Luisiana B. França Passarini, musicoterapeuta clínica, formada pela FMU-2005. Sóciofundadora do Centro Benenzon-Brasil.
Depoimento enviado à 27 de outubro de 2007.
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