relatório do desenvolvimento das atividades da oficina

Transcrição

relatório do desenvolvimento das atividades da oficina
CENTRO BRASILEIRO DE REFERÊNCIA EM
TECNOLOGIA SOCIAL
TECNOLOGIA SOCIAL
E
AGRICULTURA FAMILIAR:
SEMEANDO DIFERENTES SABERES
19 a 21 de outubro de 2004
Brasília – DF
ÍNDICE
Apresentação............................................................................................ 3
Relatório do desenvolvimento das atividades da oficina tecnologia social e
agricultura familiar..................................................................................... 5
I. Introdução: AgriCultura e Tecnologia Social..................................... 5
II. A oficina................................................................................. 12
Trocando experiências................................................................... 21
A mesa de abertura – “Tecnologia social: conhecimento e sociedade”... 22
Práticas solidárias: o papel das instituições articuladoras.................... 25
Pedagogia
da
alternância:
instrumento
para
promoção
de
desenvolvimento da agricultura familiar........................................... 36
Inovações nas tradições da agricultura familiar: O enfoque da
agroecologia................................................................................. 40
III. Quem ensina e quem aprende? Aprendizados e desafios da
assistência técnica e da extensão rural............................................. 45
Referências Bibliográficas............................................................... 51
Anexo I.................................................................................................. 52
Anexo 2.................................................................................................. 67
Anexo 3.................................................................................................. 72
Anexo 4.................................................................................................. 75
Anexo 5.................................................................................................. 76
2
APRESENTAÇÃO
Este relatório é resultado da oficina “Tecnologia Social e Agricultura
Familiar: semeando diferentes saberes”, promovida nos dias 19, 20 e 21 de
outubro de 2004, em Brasília-DF, pelo Instituto de Tecnologia Social (ITS), por
meio de seu projeto Centro Brasileiro de Referência em Tecnologia Social
(CBRTS), em parceria com as Secretarias de Ciência e Tecnologia para Inclusão
Social – Ministério da Ciência e Tecnologia e de Agricultura Familiar – Ministério
do Desenvolvimento Agrário. A oficina fez parte ainda das diversas atividades
que compuseram a I Semana Nacional de Ciência e Tecnologia. A Semana foi
instituída por meio de um decreto presidencial1 e tem como objetivo a
mobilização
da
população
em
torno
de
temas
e
atividades
científicas,
valorizando a criatividade, contribuindo para que esta possa conhecer e discutir
os resultados, a relevância e o impacto das pesquisas científicas e tecnológicas e
suas aplicações.
O presente relatório é o quarto fruto2 que se colhe da parceria firmada
entre o ITS e o Ministério da Ciência e Tecnologia, através de sua Secretaria
para a Inclusão Social, registrada sob o Termo de Parceria nº 13.0002.00/03.
O seminário contou com a participação de 26 representantes de entidades
não-governamentais, associações comunitárias, poder público, universidades e
institutos de pesquisa, todos eles interessados em conhecer e debater as três
experiências de Agricultura Familiar, portadoras/usuárias de Tecnologia Social,
que foram apresentadas e debatidas durante o evento. Foram elas: assessoria e
apoio à formação de empreendimentos coletivos, conduzida pela Confederação
das Cooperativas da Reforma Agrária do Brasil – CONCRAB; uso da Pedagogia
da Alternância em Casas Familiares Rurais e Escolas Famílias Agrícolas,
conduzidas pela Associação das Casas Familiares Rurais – ARCAFAR/Pará e pela
União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas – UNEFAB e, finalmente, a
experiências
de
apoio
aos
agricultores-experimentadores,
conduzida
pela
Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa, AS-PTA.
Feita a pesquisa inicial sobre as experiências citadas, num segundo
momento, o debate e a partilha das informações e dos conhecimentos no espaço
da oficina permitiram fortalecer o diálogo entre diversos atores da sociedade,
A Semana Nacional de Ciência e Tecnologia ocorrerá em outubro de cada Ana, sob coordenação do
Ministério da Ciência e Tecnologia.
2
O primeiro foi o relatório “Tecnologia Social: Desenvolvimento Local, Participativo e Sustentável
nos Municípios”; o segundo foi o relatório “Tecnologia Social e Educação: para além dos muros da
escola” e o terceiro foi o Caderno de Debates – Tecnologia Social no Brasil. Todos os documentos
estão disponíveis em formato eletrônico na página eletrônica do Instituto de Tecnologia Social,
http://www.itsbrasil.org.br .
1
3
tendo em vista a construção do conceito de Tecnologia Social, a partir das
questões que o tema Agricultura Familiar veio nos oferecer. Este terceiro tema, a
exemplo do segundo, foi escolhido a partir da reflexão feita após o primeiro
encontro de que seria analiticamente importante refletir em dois momentos
distintos acerca dos elementos de TS mais relacionados ao universo das ciências
humanas3 e, em seguida, ao universo das chamadas “ciências duras”.
A metodologia de trabalho adotada reflete o que entendemos por
tecnologia social. Falar em tecnologia, atribuindo a ela o adjetivo social significa,
a um só tempo, postular a ampliação do que se compreende como Ciência e
Tecnologia, e reconhecer a necessidade de pensá-la a partir de critérios como
democracia, justiça social e desenvolvimento humano. Importante, ainda, é
sublinhar que tais critérios, que são, sobretudo, princípios e valores, não devem
aparecer apenas nas discussões. Justamente por isso, a criação de fóruns,
ambientes de discussão e grupos de trabalho torna-se meio favorável não só
para elaborar o conceito de Tecnologia Social de maneira participativa, como
também para consolidar uma cultura de Ciência Tecnologia e Inovação voltada
ao desenvolvimento social.
Entre as Linhas de Ação que dão corpo ao projeto CBRTS, duas delas visam
o desenvolvimento do conceito de TS. Primeiramente, a Linha de Ação chamada
Mapeamento Nacional de Tecnologias Sociais Produzidas e/ou Utilizadas por
ONGs consiste na pesquisa dos usos institucionais do termo, a partir de
literatura
científica
e
da
caracterização
qualitativa
de
experiências
de
organizações não-governamentais “mapeadas” que usam Tecnologias Sociais. Já
a Linha de Ação chamada Encontros para Discussão e Sistematização de
Conhecimentos sobre Tecnologia Social estabelece espaços para discutir e
aprofundar estas experiências concretas que contém elementos de Tecnologia
Social, produzindo, ao final desse processo, relatórios que organizam as
reflexões realizadas durante os encontros. A oficina “Tecnologia Social e
Agricultura Familiar: semeando diferentes saberes” faz parte destas atividades.
Após a realização do encontro, iniciou-se o trabalho para sistematizar essa
produção coletiva. O produto desta trajetória afina-se, assim, com o objetivo
geral do CBRTS, que é identificar, conhecer, sistematizar e disseminar práticas
de Tecnologia Social (TS), reunindo e organizando os conhecimentos produzidos
em publicações como esta, que o ITS aqui apresenta. Estes documentos visam
multiplicar os significados dos encontros e subsidiar a desejada continuidade do
debate. O presente relatório foi criado para atender a estas expectativas.
O que foi feito durante a oficina “Tecnologia Social e Educação: para além dos muros da escola”,
realizada em São Paulo, entre 9 e 11 de agosto de 2004.
3
4
RELATÓRIO
DO DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES DA OFICINA TECNOLOGIA SOCIAL E
AGRICULTURA FAMILIAR
Relatora: Cyra Malta Olegário da Costa
I. Introdução: AgriCultura e Tecnologia Social
“Moreover, all progress in capitalist agriculture
is a progress in the art, not only of robbing the
worker, but of robbing the soil; all progress in
increasing the fertility of the soil for a given
time is a progress towards ruining the more
long lasting sources of fertility. The more a
country proceeds from large scale industry as
the background of its development, as in the
case of the United States, the more rapid is
this process of destruction.”4 (Marx)
A atividade agrícola pode ser vista como uma das mais antigas na organização
da sociedade. Das atividades desenvolvidas pela humanidade é a que melhor
permite visualizar o caráter co-evolutivo entre os seres humanos, o meio
ambiente e sua organização social. A riqueza desta co-evolução pode ser
percebida nas diferentes manifestações culturais que ocorrem em torno da
agricultura, como as festas antes da semeadura e as comemorações de colheitas
fartas.
A complexidade do fazer agricultura reside em conhecer o solo, o clima, as
plantas e os animais tornando a observação e a prática fundamentais para a
produção de inovações e tecnologias de domínio popular. Não há tecnologia no
campo da agricultura que não tenha se consolidado a partir da experimentação
dos agricultores através dos tempos, sendo a resultante de um complexo
processo sócio-econômico. Há um aprimoramento constante nos sistemas
agrícolas e o fazer agricultura exige o desenvolvimento de saberes sobre as
plantas e sobre o meio ambiente propiciando o desenvolvimento de tecnologias
apropriadas ao local.
Cyra Malta é doutoranda em Engenharia Agrícola na área de concentração de Planejamento e
Desenvolvimento Rural Sustentável, UNICAMP.
4
“Além disso, todo progresso na agricultura capitalista é um progresso não apenas na arte de
expropriar o trabalhador mas na expropriação do solo; todo progresso em aumentar a fertilidade do
solo durante um determinado período de tempo é um progresso em direção à destruição das fontes
de fertilidade mais duradouras. Quanto mais um território deriva da indústria de grande escala as
bases de seu desenvolvimento, como é o caso dos Estados Unidos, mais rápido é este processo de
destruição”. As traduções feitas ao longo do relatório são livres, sendo de responsabilidade dos
autores.

5
Compreendido deste modo, o fazer agricultura contrasta, fortemente, com o
modo de produção do AgroNegócio. Esta distensão histórica entre os interesses
do AgroNegócio e da AgriCultura é bem retratada por José Eli da Veiga nos
parágrafos que se seguem:
Em quase todos os países do chamado “Primeiro Mundo”, os
intensos choques socioculturais dos anos 60 deram forte impulso a
movimentos que vinham contestando a ciência agronômica normal
desde o final do século passado. Nos Estados Unidos, como uma
espécie de subproduto do fenômeno contracultural, surgiram novos
adeptos dos métodos orgânico, biodinâmico, biológico, e natural.
Quando começaram a ter alguma visibilidade, foram alvo de uma
intensa campanha de descrédito, lançada por uma coalizão de
interesses do agribusiness e do sistema de pesquisa agropecuária.
Em
ambientes
‘arejados’,
os
chamados
‘alternativos’
eram
considerados apenas ‘folclóricos’. Mas em entidades mais fechadas
de educação, extensão e pesquisa, profissionais com dúvidas sobre
os programas dominantes sofreram uma verdadeira ‘caça as
bruxas’. E só agora, meados dos anos 90, algumas dessas vítimas
sentem segurança suficiente para vir a público revelar como
conseguiram escapar dessas perseguições e denunciar empresas e
instituições que ainda permanecem nessa linha.
Na verdade, a mesma coalizão que promoveu o escárnio dos
‘alternativos’ durante os anos 70, agora admite, com certo
embaraço, que a agricultura precisa mesmo ser mais sustentável".
(1997:128)
Esta perseguição, longe de estar superada, pode ser vivenciada por qualquer
estudante ou profissional de agronomia ainda nos dias de hoje. Talvez o
preconceito seja expresso com menos intensidade, mas ainda existe. As
discussões mundiais5 acumuladas até o momento deram visibilidade aos
impactos ambientais causados pela agricultura de cunho industrial. Este
processo explicita o quanto os sistemas de pensamento atravessam os tempos e
justificam ações e práticas; além disso, deixa claro que mudanças, quaisquer
que sejam, são processos.
Como as conferências de Estocolmo’72 e Rio’92 que ajudaram na construção da agenda 21.
5
6
Um bom exemplo é o pensamento malthusiano6 que ainda serve de base para
justificar o modelo produtivista defendido pelo agronegócio. Para o grupo que se
apóia nas teorias de Malthus, a fome está diretamente relacionada com a
capacidade produtiva e não com a possibilidade de acesso da população à
produção agrícola. O problema, portanto, não estaria na desigualdade social
gerada pela forma como organizamos nossa sociedade e, sendo assim, para que
resolvêssemos o problema social da “fome” bastaria produzir mais e em maior
escala7.
A sociedade se organiza por meio de processos, cujas variáveis e direções estão
longe de ser conhecidos pelos estudiosos das Ciências Sociais e Humanas. Em
conseqüência disto, imensa é a dificuldade de reconhecer em quais termos se dá
a relação entre Economia e Sociedade: é muito difícil definir se a economia de
uma sociedade se deve às relações que nela estão presentes ou se, ao contrário,
é a organização econômica de uma sociedade que acaba definindo suas relações
sociais. Depois de Marx, os termos desta equação se complicaram ainda mais. A
despeito desta dificuldade de compreensão, parece-nos importante compreender
os princípios da reciprocidade e da distribuição e qual o papel que cumprem nas
diferentes sociedades, mesmo nas que apresentam as formas mais avançadas do
capitalismo, pois tais princípios também estão ali presentes.
Karl Polanyi, que buscou compreender os significados da “grande transformação”
provocada pelo advento do modo capitalista de produção, quando apresenta a
idéia de Aristóteles sobre o princípio de uso e o princípio de ganho aponta para o
fato da produção voltada para o lucro não ser natural, levando a um
desequilíbrio por conta da ruptura entre a motivação econômica e as relações
sociais: por não ter limites, sendo orientada apenas pela racionalidade do lucro,
a motivação puramente econômica não leva em conta as relações sociais nas
quais está inserida, geralmente conduzindo a graves desigualdades econômicas
e sociais.
O historiador Edward Thompson (1998), ao tratar da formação da classe
trabalhadora na Inglaterra, tece todo um conjunto de argumentações sobre a
economia moral, com base nos motins do Reino Unido do século passado, e
apresenta uma série de evidências de que a ação coletiva que levou ao motim
não se deu única e exclusivamente em razão da economia de mercado e da
Aquela idéia de que a população cresce em progressão geométrica enquanto a produção de
alimentos cresceria em progressão aritmética, levando à necessidade de controle da natalidade e de
aumento da capacidade de produção da agricultura. Caso ambas as medidas não fossem adotadas,
correr-se-ia o risco de uma crise mundial de abastecimento.
7
Para a compreensão da complexidade deste problema, ver Amartya Sen (2000), especialmente o
livro
Desenvolvimento como liberdade, São Paulo: C ia. das letras.
6
7
fome. Sua análise revela que outros aspectos contribuíram para levar ao motim,
tais como os interesses de cunho político e social e o potencial de ação coletiva
da época.
Esta discussão sobre a “grande transformação” faz sentido, no contexto deste
texto, pois a agricultura familiar tal como a conhecemos hoje é o resultado do
processo como se organiza a sociedade capitalista e, nesta perspectiva, o jeito
de fazer agricultura destes agricultores familiares tem sido identificado como
uma forma de resistência (ou mesmo de resiliência) à ordem estabelecida. Os
assentados, por sua vez, são ex-trabalhadores rurais ou arrendatários que
também têm a idéia de economia moral muito presente. Na perspectiva de uma
economia moral, a terra é de trabalho e não uma mercadoria; também está
presente o princípio da reciprocidade. Os assentados são herdeiros dessa
tradição e a recriam (WOORTMANN, 1990).
No desenvolvimento das sociedades a atividade agropecuária tem um lugar
central pois é atividade primária e fundamental tanto para a segurança
alimentar como para a produção de insumos básicos a serem transformados por
outros setores produtivos. A contraposição entre AgriCultura e AgroNegócio nos
dá a dimensão da problemática atual. De um lado temos a possibilidade de
trazer para um lugar mais central na sociedade contingentes da população que
na atualidade estão marginais dentro do sistema econômico e, já no campo do
AgroNegócio a tendência é jogar para um lugar mais periférico maiores
contingentes populacionais.
Vale lembrar que uma pesquisa inédita no país revela que, em 2003, a
agricultura familiar respondeu por 10,1% do Produto Interno Bruto (PIB) - a
soma de todas as riquezas do Brasil. O levantamento encomendado a Fundação
Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) pelo Ministério do Desenvolvimento
Agrário (MDA) revela que o PIB do setor cresceu R$ 13,4 bilhões no ano
passado, um incremento de 9,37% em relação a 2002. Esta foi a primeira vez
que o governo federal mediu o impacto econômico da atividade praticada
exclusivamente por agricultores familiares. A agricultura é estratégica para o
desenvolvimento do país, seja pela oportunidade de gerar emprego e renda, seja
pela sua importância na oferta de alimentos. A agricultura familiar responde hoje
por 84% da mandioca, 67% do feijão, 58% dos suínos e frangos, 49% do milho
e 31% do arroz produzidos no Brasil e por 32% das exportações de soja, 25%
de café e 49% de milho8.
8
Boletim eletrônico “Em questão” Nº 266 - Brasília, 20 de dezembro de 2004.
8
O modelo de desenvolvimento agrícola adotado por uma sociedade está
relacionado com a base dos conhecimentos que são referência para a construção
da política pública que coordenará os rumos do processo. A experiência cubana
recente serve para ilustrar a complexidade de temas como tecnologia social,
tecnologias apropriadas, segurança alimentar e suas interfaces e por esta razão
a descreveremos brevemente nos parágrafos seguintes.
Nos últimos quinze anos, Cuba passou por mudanças profundas em função do
colapso
do
bloco
soviético
e
a
dissolução
do
COMECON9.
Nos
anos
compreendidos entre o ‘triunfo da revolução’ (1959) e a ‘queda do muro de
Berlin’ (1989) várias políticas foram desenvolvidas visando o desenvolvimento
do setor agrário cubano. Podemos dizer que o caminho adotado levou ao
desenvolvimento de uma espécie de agronegócio com um viés socialista. A
reforma agrária deste período privilegiou a empresa agropecuária em detrimento
da
agricultura
camponesa,
baseada
no
ideário
marxista-leninista
dos
idealizadores da revolução cubana, responsáveis pelo processo que identificamos
como ‘descampenização’.
O setor agrícola nunca deixou de ser fundamental para a economia cubana, que
manteve seu caráter agroexportador. As tecnologias desenvolvidas a partir do
‘pacote tecnológico russo’ são muito parecidas com o que conhecemos como
‘pacote tecnológico da revolução verde’, pois apresentam a mesma base de
conhecimento cientifico tecnológico, mesma base conceitual e trazem consigo a
dependência por insumos, máquinas e sementes.
Muito do abastecimento da ilha se fazia com base na importação de alimentos,
não havia auto-suficiência. Quando ocorre o colapso do bloco socialista, uma
série de medidas são adotadas para evitar o colapso econômico e de
abastecimento alimentar: este momento é conhecido como ‘período especial’. É
neste momento que ocorre a valorização das ‘tecnologias alternativas’ de
domínio camponês10 e nasce a perspectiva de que o desenvolvimento da
agricultura de base agroecológica pode se tornar uma realidade concreta.
O camponês sempre sofreu pressão para aderir à empresa estatal ou a
cooperativas e isso se fez através das políticas públicas que privilegiavam as
empresas estatais e as cooperativas coletivas. Este seguimento, apesar de ser
menos valorizado pela revolução por seu caráter individual, é justamente aquele
que conserva as práticas agrícolas tradicionais e de baixa dependencia a
Conselho para Assistência Econômica Mutua que foi a organização de comércio do bloco soviético.
Para aprofundar este tema consultar autores como Peter rosset, Miguel Altieri, Richard Levins,
Niurka Perez Rojas, Carmem Diana Deere, Equipe de estudos rurais (Cuba).
9
10
9
insumos modernos. É preciso dizer que mesmo antes do ‘período especial’ já
havia setores do núcleo de poder cubano que percebiam a necessidade de
mudanças na conduta do regime para evitar a crise econômica que se anunciava
e que, infelizmente, foi agudizada pela crise do bloco soviético em 1989.
Em conseqüência, houve uma mudança no cenário agrário cubano de forma a
fortalecer as alternativas possibilitadas pelo mundo da economia solidária e as
práticas de cunho agroecológico, reconhecendo-as como fundamentais para
garantir a segurança alimentar, ou seja, reconhecendo-as como um caminho
para desenvolver uma agricultura sustentável. Neste processo de reorientação
da economia cubana as empresas estatais foram divididas e transformaram-se
nas UBPC – Unidade Básica de produção Cooperativa, as CCS – Cooperativas de
Crédito e Serviço são fortalecidas e as CPA – Cooperativa de Produção
Agropecuária recebem novas orientações. Passou-se ainda a adotar uma política
denominada de ‘vinculação do homem a área’.
Estas políticas procuraram
reorientar o jeito de fazer agricultura nos campos cubanos, estimulando o
sentimento de pertencimento como forma de estimular a produtividade partindo
da idéia de que a autonomia na organização do trabalho na propriedade é um
dos componentes fundamentais para estimular a produtividade do trabalho na
agricultura.
A ‘vinculação do homem a área’ vem substituir o trabalho outrora realizado por
brigadas. A organização do trabalho em brigadas acabava por alienar os
trabalhadores da atividade agrícola, reproduzindo a lógica de organização do
trabalho na indústria. Para as práticas agroecológicas esta forma de organização
do trabalho dificulta a observação dos processos da natureza de forma sistêmica.
A ‘vinculação do homem a área’ possibilita o retorno à totalidade, já que um
agricultor está responsável por todas as atividades numa determinada área. Este
formato também possibilita melhor racionalização no uso dos recursos, pois o
rendimento da área depende do agricultor que nela trabalha e, por sua vez, este
não receberá mais um valor médio de salário como acontece com a organização
do trabalho em brigada.
O processo de transformação das empresas estatais em UBPC pode ser
identificado com a constituição de cooperativas a partir de empresas falidas no
cenário
brasileiro
(SINGER,
2002).
Na
verdade
o
que
ocorreu
foi
um
desmembramento da empresa estatal que era composta da planta industrial e
dos campos de produção. As UBPCs foram formadas a partir da divisão destes
campos de produção e passaram a adotar um processo de gestão mais
horizontal do que o das antigas empresas estatais, pois são geridas pelos
10
cooperativados. Este foi o caminho encontrado para aumentar a eficiência do
setor agroindustrial cubano, inclusive aproveitou-se este momento para fechar
as agroindústrias que operavam com ineficiência, o que impulsionou outras
políticas sociais para minimizar o impacto da crise sobre os trabalhadores. O
objetivo perseguido por estas mudanças era despertar o sentimento de
pertencimento através da ‘vinculação do homem a área’, que, como dito acima,
é identificado como motriz da produtividade.
O caso cubano nos permite refletir sobre a construção histórica dos caminhos de
desenvolvimento, seus instrumentos e referenciais teóricos-metodológicos. A
opção
em
adotar
políticas
que
promoveram
a
‘descampenização’
está
estreitamente ligada a orientação político ideológica dos dirigentes cubanos: eles
pensaram que este era o melhor caminho rumo ao desenvolvimento. A crise
política
do bloco socialista desencadeou a crise econômica e afetou o
abastecimento do país. Este momento histórico deu visibilidade a elementos da
agricultura familiar (camponesa). Pôde-se perceber o lugar da agricultura
familiar no que se refere à segurança alimentar à produção/conservação de
conhecimentos do campo da agroecologia, de modo a caminhar rumo a
agricultura sustentável. Mas isto não quer dizer que haja unanimidade entre os
cientistas cubanos quanto à eficiência da agricultura de base agroecológica. Este
é o ponto onde capitalismo e socialismo se encontram: a matriz tecnológica que
origina e dá força ao AgroNegócio.
A
experiência
cubana
ilustra
qual
lugar
da
agricultura
e
quais
suas
possibilidades, e mesmo potencialidades, quando lhe agregamos o adjetivo
familiar. É importante não perdermos a perspectiva de que há diferentes
projetos de sociedade em disputa e que há diferenças fundamentais nas relações
sociais estabelecidas em nossa sociedade classista. Portanto, quando olhamos a
produção agropecuária do AgroNegócio no Centro Oeste brasileiro podemos
visualizar toneladas de milho/ha, ou seja, a produtividade. Por outro lado,
quando nos viramos para o campo da AgriCultura o elemento que salta aos olhos
são as festas de São João com seu milho verde, curau, pamonha e pipoca.
A Agroecologia e seus conceitos são frutos das contradições geradas pelos
passos
largos
rumo
à
destruição
ambiental
promovidos
pelos
sistemas
agroindustriais. Os impactos ambientais gerados pela atividade agrícola são
antigos e temos registros históricos dos desequilíbrios causados pelo processo de
experimentação das diferentes sociedades humanas e a ascensão e queda dos
impérios (PERLIN, 1992). Trazendo esta idéia mais pra pertinho da sociedade
brasileira podemos citar o conhecimento da relação entre ciclo hidrológico e
11
floresta que levou D. Pedro II a ser o responsável pelo maior reflorestamento de
que se tem noticia no mundo de hoje, a Floresta da Tijuca no município do Rio
de Janeiro. O reflorestamento foi feito devido à necessidade de garantir o
abastecimento de água para a cidade, que havia sido comprometido pela forma
de desenvolvimento da atividade agropecuária na época.
Já na Índia, poderíamos citar a luta desenvolvida pelo movimento Chipko – que
significa abraçar na língua indi. Este movimento, organizado por mulheres, tinha
como objetivo a
proteção das
florestas
que eram importantes para
a
conservação do meio. As mulheres então se abraçavam às árvores para evitar o
corte indiscriminado, que produzia
impactos ambientais
violentos. Essas
mulheres não possuíam nenhum saber acadêmico, mas tinham o saber popular e
perceberam a relação entre as mudanças que estavam ocorrendo no meio
ambiente e o corte das árvores (SHIVA, 1991).
Os saberes têm seu tempo e seu lugar na sociedade, assim como a ciência e as
inovações tecnológicas. Os aspectos trabalhados na oficina “Tecnologia Social e
Agricultura Familiar: semeando diferentes saberes” mostram os caminhos das
diversas experiências na construção de algo novo. A teoria nos dá uma
perspectiva, um horizonte; já o fazer nos mostra as possibilidades reais. A partir
das experiências concretas relacionadas com a agricultura familiar, esta oficina
buscou
identificar
os
elementos
relacionados
com
a
tecnologia
social,
representando mais um passo na construção deste conceito.
II. A oficina
“Que se fortalezcan las áreas de docencia e
investigación orientadas al medio rural y que los
estudios que realizamos, nos permitan encontrar
soluciones viables para el agudo problema rural
latinoamericano”11 (Dra. Blanca Rubio, presidente
de ALASRU).
É com grande prazer que enfrentamos o desafio de fazer o relatório da oficina
"Tecnologia social e Agricultura familiar: semeando diferentes saberes”. Trata-se
de um desafio, uma vez que ambos os temas são instigantes e pensar sobre o
possível encontro a partir de uma abordagem reflexiva é tarefa difícil.
Chegamos ao Centro Cultural de Brasília na manhã de terça-feira, 19/10/2004.
O local era muito agradável e dispunha de uma estrutura que se mostrou
“Que se fortaleçam as áreas de docência e investigação orientadas para o meio rural e que os
estudos que realizamos nos permitam encontrar soluções viáveis para o problema rural latinoamericano”.
11
12
adequada à realização da oficina. O evento foi aberto com uma atividade de
introdução ao processo de construção do conceito de TS12, dividida em duas
apresentações. A apresentação esclareceu, logo de início, que durante a oficina o
centro da discussão não seria a agricultura familiar e sim a tecnologia social.
Procurou-se, então, apresentar as razões que levaram à organização do evento.
Esta idéia seguramente promoveu certo estranhamento entre os participantes
que, majoritariamente, eram mais afeitos ao tema da agricultura familiar do que
ao da tecnologia social. Este momento foi importante para democratizar e
apresentar as referências e formulações sobre Tecnologia Social acumulados
pelo ITS até o momento da oficina, possibilitando aos participantes conhecerem
o ITS e sua proposta.
Primeiramente, Fabiana Jardim iniciou sua apresentação pela história do Centro
Brasileiro de Referência em Tecnologia Social (CBRTS), que tem como objetivo
final a melhoria da qualidade de vida da população. A questão que a discussão
sobre Tecnologia Social procura esclarecer é: como se faz isso? Esta questão a
experiência das ONGs pode ajudar a responder, na medida em que se percebe
que elas propiciam espaços promotores de inovação tecnológica, mesmo que não
sejam reconhecidos como tal pelos órgãos financiadores e produtores de CT&I. O
projeto CBRTS13 visa conhecer e difundir práticas de ação e intervenção
geradoras de mudanças principalmente no universo em que as ONGs estão
inseridas.
Entre os objetivos do Centro está a difusão de conhecimentos e Tecnologias
Sociais que são definidas como um “conjunto de técnicas e metodologias
transformadoras, desenvolvidas e/ou aplicadas na interação com a população e
apropriada por ela, que representam soluções para inclusão social e melhoria
das condições de vida”14. Trata-se, portanto, de processos coletivos que possuem
certos elementos que os tornam eficazes para transformação social.
É ainda neste primeiro momento da oficina que se explicita o papel da relatoria
cujo objetivo é estabelecer o diálogo entre o trabalho que o ITS vem
desenvolvendo e a área temática específica. A oficina “TS e Agricultura Familiar”
foi a terceira realizada em 2004, precedida por dois eventos similares, sobre os
temas Desenvolvimento Local e Educação. Esta oficina procurou refletir sobre o
A programação pode ser visualizada nos anexos.
O projeto CBRTS é fruto de uma parceria entre o Instituto de Tecnologia Social e a Secretaria de
Ciência e Tecnologia para Inclusão Social, do Ministério da Ciência e Tecnologia. O projeto tem
duração de 4 anos, sendo que o primeiro ano (2004) foi dedicado às atividades tidas como
necessárias à implantação, tais como instalação física, mapeamento de organizações nãogovernamentais que produzem e/ou utilizam Tecnologia Social, promoção de encontros temáticos,
desenvolvimento conceitual, elaboração de uma páginas eletrônica, entre outras.
14
Instituto de Tecnologia Social, 2004, p.26.
12
13
13
diálogo de saberes presente no universo da agricultura familiar, esclarecendo,
deste modo, alguns aspectos do jeito de fazer específico que caracteriza a TS. É
reconhecida a necessidade de estabelecer diálogos entre os diferentes saberes
(acadêmico e popular), construindo “pontes” entre eles, e a oficina buscou
recolher elementos para qualificar como são as “pontes” já existentes.
Um exemplo interessante de diálogo é o trabalho desenvolvido pelo Instituto
Sócio Ambiental – ISA junto aos indígenas da Amazônia, para repovoamento dos
rios: a Piracema de laboratório. Neste projeto um grupo de indígenas recebeu
treinamento em técnicas reprodutivas de piscicultura na Faculdade de zootecnia
da USP. Nesta parceria entre comunidade e ISA foram aliados conhecimentos
tradicionais a técnicas modernas gerando esta nova forma de fazer a Piracema, e
assim, possibilitando o repovoamento dos rios da região a partir da irradiação
deste processo para as demais tribos da reserva. Este é um exemplo de como é
possível articular de forma sinérgica os diferentes saberes (popular e científico),
para resolver problemas e demandas sócio-ambientais.
O conceito de TS procura ressaltar certos aspectos das experiências estudadas;
não é qualquer intervenção sobre a realidade que se caracteriza como TS e
percebeu-se que a experiências de ONGs na produção de conhecimento se
constituía
num
“objeto”
privilegiado
para
a
coleta
de
informações
e
aprendizagens sobre TS. E é no esforço de garimpar tais elementos que se chega
a esta terceira oficina. Enquanto a primeira oficina trabalhou um tema bastante
amplo, qual seja o desenvolvimento local, a segunda abordou um tema mais
ligado ao universo das ciências humanas. A proposta com esta terceira oficina
era trabalhar um tema que tivesse uma interface mais clara com o que se
identifica com as ciências “duras”15. O primeiro momento de exposição da
metodologia e do conceito de TS gerou/possibilitou uma discussão bastante
interessante, durante a qual os participantes puderam contribuir com suas
diferentes perspectivas; o debate que se sucedeu à exposição deixou clara a
importância e a necessidade de promoção de tais espaços, na medida em que
não há consenso sobre a questão de como devem ser as relações entre Ciência,
Tecnologia e Sociedade, especialmente no meio rural, no qual tais relações têm
se
dado
historicamente
de
modo
conflituoso
e
pouco
democrático.
Provavelmente, a fecundidade das questões levantadas se deve ao fato da
Esta “dureza” atribuída às ciências exatas se relaciona com a idéia de que a ciência cartesiana,
positivista acaba por gerar uma certa “dureza”, significando a falta de humanidade nas tecnologias
geradas, (tais como maquinários pesados, técnicas sofisticadas que se tornam incompreensíveis a
não ser para os cientistas etc.).Tal “dureza” identificada a estas ciências visa, portanto, fazer a
crítica da ausência de participação humana, tanto na formulação de problemas científicos, quanto
em seu desenvolvimento ou utilização. A distinção, entretanto, é simplesmente analítica, visando
distinguir campos diferentes de geração do conhecimento.
15
14
agronomia ser uma “ciência de fronteiras”, ou seja, possui interfaces com várias
outras ciências, pois se utiliza do conhecimento gerado por outras ciências na
base de sua formulação – o que possibilita o trânsito entre as ciências humanas,
exatas e biológicas.
A escolha do tema da agricultura familiar possibilita vislumbrar novos elementos
de TS a partir do olhar sobre as experiências apresentadas, em função da
riqueza de elementos presentes nelas. O objetivo era conhecer mais o processo,
qualificando-o. Trata-se de um objetivo fundamental, pois o resultado das
intervenções não carrega em si os elementos TS: para identificá-los é preciso
um olhar atento para o processo.
A análise das experiências mostra que a realidade concreta é mais rica e plural
do que a reflexão que permanece apenas no campo das idéias. Portanto para
atingir os objetivos específicos da oficina, que visavam vislumbrar o processo de
geração e introdução de tecnologias na agricultura familiar, bem como as formas
encontradas para o diálogo destes processos, buscaram-se experiências que
estivessem em funcionamento há pelo menos 8 anos e que, na medida do
possível, fossem representativas das diferentes regiões do país e permitissem a
coleta de características de atuações locais, regionais e nacionais.
Foram selecionadas as experiências de assessoria e apoio à formação de
empreendimentos coletivos, conduzida pela Confederação de Cooperativas da
Reforma Agrária do Brasil – CONCRAB; utilização da pedagogia da alternância
em Casas Familiares Rurais e Escolas Famílias Agrícolas, conduzidas pela
Associação das Casas Familiares Rurais – Arcafar/PA e União Nacional das
Escolas Famílias Agrícolas do Brasil – UNEFAB, respectivamente e a experiência
de formação de agricultores-experimentadores, conduzida pela Assessoria e
Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa, AS-PTA. Além disso, houve duas
exposições durante a oficina, a primeira sobre as relações entre Pesquisa e
Assistência Técnica e Extensão Rural – ATER e a segunda sobre Princípios de
Agroecologia. Estes foram os temas que serviram de base para a constituição
das mesas de debate no decorrer do evento.
É importante conhecer melhor estes três aspectos da agricultura familiar que
foram debatidos na oficina, ou seja, a formação/educação, o fazer agricultura
(tecnologias
alternativas
de
cunho
agroecológico)
e
a
organização
dos
agricultores e sua relação com Tecnologia social. Falou-se sobre a importância
do debate e sobre as parcerias entre ministérios (MDA e MCT) e secretárias
15
(SAF, SIS, SES). Tais parcerias são impulsionadas pelas demandas e pelos
movimentos
sociais
e também por instituições envolvidas
com o tema
agricultura familiar e inclusão social que buscam melhoria da qualidade de vida
da população, mas seguramente há um outro aspecto muito importante que leva
à articulação de diferentes organismos de governo: a garimpagem de recursos
financeiros. É importante na gestão pública que as políticas não sejam
concorrentes, mas convergentes, pois não há recursos para tudo e muitas vezes
diferentes secretarias disputam um mesmo recurso para um mesmo fim, então a
parceria otimiza e dinamiza o uso do recurso, desde que se consiga focar
(superar) o processo de gestão pública para além dos interesses de poder, que é
particular de cada secretaria e de seus dirigentes.
A apresentação de Martina Otero teve como objetivo o aprofundamento da
discussão conceitual. Ela procurou explicitar qual é a marca do Instituto de
Tecnologia Social na construção do conceito de TS, sublinhando que para além
da pesquisa bibliográfica, procurou-se mapear as experiências existentes de
modo a construir um conceito pautado por experiências concretas. Este
momento de apresentação do “desenvolvimento conceitual: tecnologia social até
agora” suscitou vários questionamentos, o que estendeu a apresentação e
acabou prejudicando o momento de troca de experiências entre os participantes,
previsto no programa. Apesar da proposta de encontrar um outro momento para
que as trocas de experiência ocorressem, isto não aconteceu. A ausência deste
momento específico pode ter contribuído para a referência constante que cada
um fazia à suas experiências, quando das intervenções no debate. De qualquer
forma, “nos bastidores” foi possível conhecer um pouco mais das experiências
presentes a partir de contatos individualizados nos intervalos entre atividades e
durante café da manhã, almoço e janta.
Durante
o
debate
que
se
seguiu
à
exposição
conceitual,
houve
um
questionamento a respeito da pertinência de se debruçar sobre aspectos
epistemológicos da constituição do saber, procurando compreender mais
cuidadosamente a distinção entre ciência, tecnologia e técnica, como estratégia
para lançar luz sobre o adjetivo social que vem acompanhando a tecnologia.
Levantou-se uma questão quanto ao caráter indutivista da metodologia adotada
pelo ITS e sua suscetibilidade a críticas na construção do conceito. Para esta
questão procurou-se recordar a base do trabalho do ITS, que tem origem na
demanda concreta de ONGs que produzem CT&I. À medida que estas entidades
sistematizam suas experiências conseguem dar mais visibilidade a suas
experiências, mas que não são reconhecidas pelos organismos oficiais de
16
pesquisa e, portanto não conseguem obter financiamento dos órgãos oficiais dos
sistema de CT&I.
Para além da origem da formulação das questões que circulam em torno do
tema da Tecnologia Social, outra parte da resposta consistiu em sublinhar que
os instrumentos de conhecimento sobre os sistema C&T existentes são
insuficientes para compreender e mensurar a produção de saber dentro das
ONGs; neste sentido, a opção por uma metodologia
indutivista
esteve
relacionada com a necessidade de formular novas perguntas e construir um novo
olhar sobre C&T, capaz de identificar e caracterizar as especificidades do saber
produzido pelas ONGs.
No processo desenvolvido até aquele momento da oficina chegou-se aos
seguintes princípios, que compõem o conceito de TS:
a) Participação e aprendizagem caminham juntas;
b) Transformação da sociedade – compreensão sistêmica da realidade;
c) Identidade local respeitada e transformação local;
d) Todo indivíduo é capaz de gerar conhecimento.
Durante a exposição houve polêmica sobre o que é “transformação social”, ou
seja, transformar em que sentido e se há neutralidade científica? Esses
questionamentos
servem
de
referência
do
quão
é
essencial
a
base
epistemológica do saber. Para o público presente na oficina era importante a
interlocução com o ITS no sentido de conhecer qual era o entendimento da
equipe organizadora do evento, principalmente para balizar o pensamento dos
participantes com a equipe e parece que houve um consenso de que a
transformação social era no sentido da melhoria da qualidade de vida da
população no geral e que a neutralidade cientifica não existe.
Em seguida, apresentou-se alguns parâmetros do conceito de TS. Os parâmetros
são
algumas
características
das
intervenções,
que
visam,
futuramente,
possibilitar o desenvolvimento de indicadores que permitam identificar as
intervenções sociais ao universo das tecnologias sociais. Os parâmetros
identificados até agora se referem a diferentes dimensões das intervenções:
-
Quanto a sua razão de ser: TS visa à solução de demandas sociais
concretas, vividas e identificadas pela população.
17
-
Em relação aos processos de tomada de decisão: Formas democráticas
de tomada de decisão, a partir de estratégias especialmente dirigidas à
mobilização e à participação da população.
-
Quanto
ao
papel
da
população:
Há
participação,
apropriação
e
aprendizagem por parte da população e de outros atores envolvidos.
-
Em relação à sistemática: Há planejamento, aplicação ou sistematização
de conhecimento de forma organizada.
-
Em relação à construção de conhecimentos: Há produção de novos
conhecimentos a partir da prática.
-
Quanto a sustentabilidade: Visa a sustentabilidade econômica, social e
ambiental.
-
Em relação à ampliação de escala: Gera aprendizagens que servem de
referência
para
novas
experiências.
Gera,
permanentemente,
as
condições favoráveis que deram origem às soluções, de forma a
aperfeiçoá-las e multiplicá-las (ITS, 2004: 28-30).
No universo das ONGs, percebe-se que há dificuldade em organizar seus
conhecimentos e sistematizar experiências: pela própria natureza dessas
organizações – geralmente pequenas ou circunscritas a ações locais, tais
organizações não dispõem de tempo ou de quadros suficientes que tornariam
possível a sistematização de suas práticas.
Ainda assim, muitas experiências desenvolvidas possuem alto grau de inovação
tanto no campo tecnológico como na apropriação e gestão do saber. E há por
parte da academia uma desvalorização dessas experiências pela ausência do
“rigor científico”, e até mesmo de “mérito científico”. Aqui cabe a discussão
sobre método e metodologias, pois nem sempre é possível isolar todos os fatores
e realizar repetições à exaustão no mundo real, para além dos muros do
laboratório. É este o grande gargalo para que efetivamente seja possível o
diálogo entre os diferentes saberes, pois há uma hierarquização das áreas de
conhecimentos: o saber popular ocupa posição inferior ao saber científico na
sociedade contemporânea.
O que se observou e se reconhece como ganho até o momento é o fato de que
tecnologia social está relacionada com a apropriação do saber e o diálogo dos
saberes na comunidade.
18
No
momento
desta
apresentação,
várias
foram
as
manifestações
dos
participantes que questionaram sobre aspectos que estão relacionados com a
produção de conhecimento, mas talvez não tão diretamente com a Tecnologia
Social, afinal experiências geram referências que propiciam condições para
pensar e criar soluções, o que permite a reprodução continuada e a ampliação
dos saberes.
Dentre os assuntos abordados, a propriedade intelectual é um “tema quente” no
âmbito do conhecimento popular, englobando conhecimentos sobre manejo da
biodiversidade, como por exemplo, o uso e cultivo tradicional plantas medicinais.
O tema da biodiversidade também se apresentou como valioso aos participantes
da oficina, inclusive com forte ênfase a importância do banco de sementes. A
parceria entre a EMBRAPA e a comunidade indígena dos Craôs foi um exemplo
citado que mostra que há diálogo possível entre saber tradicional e o saber
científico, e demonstra o quanto estrategicamente a sinergia e colaboração entre
eles é fundamental para o país. O exemplo acima se refere ao fato de que os
Craôs de uma determinada tribo perderam suas sementes e através do banco de
sementes da EMBRAPA foi possível o resgate e devolução da biodiversidade de
sementes de abóboras a comunidade.
A agroecologia, a agricultura orgânica e o agronegócio expressam o “como”
fazemos
a
agricultura
e,
conseqüentemente,
desenvolvimento para a sociedade. Isto,
os
possíveis
caminhos
de
aliado ao debate sobre a escala de
reprodução local e a capacidade de replicação de experiências dá um “bom
caldo”, pois este assuntos permitem visualizar com força a questão da
territorialidade que muitas vezes caracteriza a agricultura. Há saberes que são
possíveis por características específicas do local como recursos ambientais,
econômicos e sociais.
A questão sobre o quanto a estratégia produtiva da unidade está ligada ou não á
reprodução familiar e, em conseqüência, influenciando o tipo de tecnologia e as
formas de adoção tecnológica, são temas que expressam os interesses e a
essência da agricultura familiar. A lógica que permeia o processo produtivo da
unidade familiar não é ditada somente pela eficiência econômica, pois a há
fatores que são desconhecidos pelos agrônomos, mas que fazem parte do saber
do agricultor e que são levados em consideração antes da adoção de novas
tecnologias. Podemos imaginar que o agricultor familiar é parecido com os
antigos indígenas norte-americanos que, para tomar uma decisão, procuravam
projetar qual seria seu impacto até a sétima geração vindoura.
19
Entre os exemplos apresentados na oficina que expressam de alguma forma esta
territorialidade sobre a produção de inovação tecnológica e que reforçam a idéia
de que experiências geram referenciais, encontramos o da Articulação do Semiárido (ASA), que encabeçou o programa de transformação das cisternas em uma
política pública. Neste processo de consolidação da ASA houve valorização do
conhecimento local e se percebeu a importância dos encontros para promover a
troca de conhecimentos entre os agricultores como um caminho rumo a uma
sociedade sustentável.
Um dos elementos identificados que dificulta a valorização destas experiências
“alternativas” é o fato delas estarem fora do mundo reconhecido pela ciência.
Ainda não se inventou uma metodologia de avaliação que leve em conta fatores
sociais, ambientais e econômicos juntos: o que temos são metodologias
fragmentadas. Houve inclusive uma sugestão, durante o debate, de que o
conceito de TS supere a referência das ONGs porque há muitas experiências que
acontecem dentro das instituições de C&T ou de pesquisa agropecuária que
também não são reconhecidas e, portanto, são “desperdiçadas”. Neste sentido,
deveria-se incorporar mais as experiências da instituição pública, pois há muitos
profissionais que estão marginais ao processo científico de suas instituições e
que não são reconhecidos nem por quem esta dentro e nem por quem esta de
fora das instituições, sendo duplamente discriminado.
O trabalho apresentado pela Profa. France Maria Contijo Coelho16 é muito
interessante, pois desvenda o conhecimento dos agricultores sobre homeopatia
animal e agrícola socialmente apropriada e inovada a partir da experimentação e
os processos de difusão entre os agricultores. Este trabalho, que envolve
pesquisa, ensino e extensão, consegue ser duplamente discriminado tanto pela
forma como pelo conteúdo. Pela forma, porque a proposta se desenvolve com
base no diálogo de saberes entre a comunidade de agricultores e a comunidade
da Universidade Federal de Viçosa, e pelo conteúdo porque a homeopatia dentro
da academia enfrenta preconceitos históricos em função do descrédito construído
socialmente (em grande parte sob influência da indústria farmacêutica).
Neste momento de discussão sobre o conceito de TS também surgiram várias
intervenções sobre questões ligadas à formação e foram feitas sugestões de
criação de oficinas de nivelamento da assistência técnica. A idéia é formar um
A Professora France Maria Contijo Coelho da Universidade Federal de Viçosa fez a distribuição de
uma “cartilha de homeopatia” fruto de parceria desenvolvida entre associação de produtores
orgânicos da região da Vertente do Caparaó/MG, alunos e professores da UFV. Na Cartilha em
questão encontramos a seguinte referência ”O Prêmio Fundação Banco do Brasil de Tecnologia
Social edição 2003 certifica, que ‘Uso da Homeopatia na Agricultura’ implementado pela
Universidade de Viçosa é uma tecnologia social efetiva(...)”. Banco de Tecnologias sociais, localizado
no site http://cidadania-e.com.br (p.4).
16
20
profissional com um perfil que responda a um novo tipo de ATER, uma
assistência que construa junto com o agricultor, que saiba articular os saberes.
Neste processo de ‘chuva de idéias’ se questionou a política de elaboração de
PDA (Plano de desenvolvimento de Assentamento), que abriu espaço para o
surgimento do “gigolô da Reforma agrária”
- o técnico que produz o PDA
descolado da realidade concreta, descaracterizando-o em relação à sua função
de instrumento para planejamento de ações no assentamento de reforma
agrária. Parece que há diferenças na gestão pública a serem superadas pelo MDA
e pelo INCRA, que talvez auxiliassem na implementação de programas que
fossem no sentido da formação do corpo técnico para executar uma ATER com
base em outra linha pedagógica e tecnológica.
O Diagnóstico Rápido Participativo (DRP), que é um dos instrumentos utilizados
por várias ONGs, recebeu duras críticas e se questionou sua verdadeira
finalidade, qual seja, um instrumento para apreender um momento de uma dada
realidade e conhecê-la melhor contribuindo com o planejamento de ações. A
crítica foi a de que, algumas vezes, o DRP acaba sendo utilizado como um
instrumento para preencher relatórios a fontes financiadoras nacionais ou
internacionais. Este é um tema importante, pois o DRP é um instrumento de
grande utilidade e pode desvendar muitas coisas tanto no âmbito das relações
sociais locais quanto sobre o uso dos recursos naturais. Durante a realização de
um DRP junto a uma comunidade no sertão mineiro encontrou-se uma planta
que era muito coletado pelos agricultores e ao se estudar a cadeia produtiva
desta planta descobriu-se que seu princípio ativo era muito apreciado pela
indústria farmacêutica que pagava bom preço pelo produto. Os intermediários
adquiriam o produto junto a comunidade, que realizava a coleta e secagem da
planta, em troca de café e açúcar. Esta experiência tornou-se a dissertação de
mestrado de Laura Jane Gomes. Este exemplo mostra que o acesso ao
conhecimento amplia as possibilidades de mudança social.
Trocando experiências
A proposta deste momento consistia na apresentação dos participantes e das
experiências que trouxeram para serem compartilhadas. Infelizmente, conforme
já mencionado, este momento foi prejudicado pelo andamento da programação
da oficina. Esta atividade ficou espremida entre a apresentação conceitual e a
mesa de abertura composta por representantes de instituições importantes
relacionadas com o tema da oficina.
21
Solicitou-se às pessoas que trouxessem sistematizadas suas experiências, de
modo a facilitar o processo de apresentação e inclusive possibilitando a
exposição em painéis, no entanto, apesar deste pedido ter sido enviado com
antecedência aos participantes, com orientações quanto ao teor das informações
necessárias17, quase ninguém havia preparado esta apresentação. Então, cada
um procurou fazer seu relato considerando esses itens. A maioria dos
participantes estavam ligados a programas desenvolvidos em instituições
públicas e talvez este tenha sido o motivo da forte tônica dada a questões
referentes a gestão pública durante a oficina.
A mesa de abertura – “Tecnologia social: conhecimento e sociedade”
Este foi um momento importante, pois os participantes puderam ter contato com
a visão multivariada dos representantes do poder público sobre o tema da
oficina. De um modo geral, percebe-se que há necessidade de aumentar o
diálogo entre ministérios, secretarias e órgãos públicos como um grande desafio
a ser enfrentado na gestão pública.
A mesa, coordenada pela Gerente Executiva do Instituto de Tecnologia Social,
Irma Passoni, contou com a participação do Secretário de Ciência e Tecnologia
para Inclusão Social/MCT, Rodrigo Rollemberg; do
Secretário da Agricultura
Familiar/MDA, Valter Bianchini; da Secretária-adjunta da Secretaria Nacional de
Economia Solidária/MTE, Sônia Kruppa; de Francisco Hercílio
Matos, da
Secretaria da Ciência e Tecnologia para Inclusão Social/MCT; do Deputado
Estadual César Medeiros (PT/MG); do Diretor de Programas Setoriais do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq, Manuel
Barral Neto; do
Presidente da EMBRAPA, Clayton Campanhola; de Aliomar
Arapiraca, representando a Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira,
CEPLAC e de Paulo Egler, representante da Academia Brasileira de Ciência –
ABC.
A mesa de abertura teve um caráter bastante solene e, como é possível notar
acima, contou com a presença de um grande número de participantes, cada um
deles
representando
instituições
tradicionalmente
ligadas
à
pesquisa,
à
Universidade ou à Extensão Rural.
O primeiro a falar foi o Deputado César Medeiros. Ele destacou a importância da
promoção de espaços para a discussão da Agricultura Familiar e tratou,
especificamente, das Casas Familiares Rurais e Escolas Famílias Agrícolas.
Segundo
o
deputado,
tem
havido
um
movimento
do
Estado
para
o
O formulário que foi enviado aos participantes pode ser encontrado no anexo 4, ao final do
relatório.
17
22
reconhecimento da eficácia da Pedagogia da Alternância, transformando-a num
modelo de Educação Rural. O diferencial deste modelo está na articulação entre
teoria e prática, que permite a interação entre os indivíduos, sua família e o
corpo de conhecimentos “universais”. O deputado encerrou sua fala chamando a
atenção para a necessidade de investimentos, a fim de ampliar o alcance das
iniciativas das Casas e das EFAs; investimento que está plenamente justificado
pelo fato de que a Pedagogia da Alternância é um instrumento de melhoria da
educação, estímulo à agricultura familiar e ao desenvolvimento sustentável.
Em seguida, passou-se a palavra ao Secretario Rodrigo Rollemberg, que falou da
mudança de paradigma instaurada pelo governo Lula, pondo no centro das
preocupações a inclusão social. Neste sentido, afirmou o Secretario, a definição
do conceito de TS pode ser um instrumento de construção de clareza para as
ações do MCT, pois ajudaria a identificar os projetos que visam, realmente, a
inclusão social, não apenas em seus produtos, mas já desde sua concepção. O
Secretário afirmou ainda a importância estratégica da extensão universitária
como a grande executora da mudança de postura da Sociedade em relação à
C&T: por meio da extensão (nem messiânica, nem assistencialista), construirse-iam novas bases de diálogo entre diferentes atores. Deste modo, ganharia a
população, que teria acesso a conhecimentos produzidos nas Universidades, e
ganharia a Universidade, que assumiria sua missão pública e ampliaria o
conjunto de questões com as quais as pesquisas devem lidar. Finalmente,
Rodrigo sublinhou que estas mudanças na lógica do Estado, ainda que
pequenas, representam passos para a transformação do país, em direção à
redução de desigualdades e desenvolvimento sócio-econômico e ambiental.
O Secretario Valter Bianchini falou sobre alguns dos desafios que estão postos
para o desenvolvimento da agricultura familiar. Ele tomou alguns dados do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, que permitiam entrever uma
correlação entre a ausência de escolas e de assistência técnica e extensão rural
e níveis de pobreza: nos locais em que não existiam escolas e onde as políticas
de ATER não chegavam, a pobreza era bem maior. Este dado, frisou o
Secretário, evidencia a necessidade de se pensar as relações entre inclusão
social e o acesso ao conhecimento e ao saber. É neste sentido que as escolas
que utilizam a Pedagogia da Alternância, as extensões universitárias, a educação
formal e a formação profissional desempenham importante papel. No entanto,
ele ressaltou, é preciso repensar a formação profissional oferecida, por exemplo,
pelas instituições que compõem o chamado sistema “S”, que privilegiam
unicamente um modo de organização da agricultura: o agronegócio. O
23
desenvolvimento deve ser multifuncional e multi-setorial, e não pode estar
restrito a um ou outro modelo de organização econômica.
Foi seguindo este tema da diversidade que Clayton Campanhola iniciou sua fala,
dizendo da importância de se reconhecer que há várias agriculturas familiares,
de acordo com as realidades locais onde estão inseridas. Como presidente da
EMBRAPA, Clayton abordou o desafio de enfrentar a cultura institucional, que
tem tratado de modo dissociado Pesquisa e ATER. Ele sublinhou ainda que
Tecnologia e Ciência não são socialmente neutras e, deste modo, é preciso ter
clareza de para que se está trabalhando; além disso, o desejável seria que os
pesquisadores lograssem trabalhar com a sociedade. Este trabalho com a
sociedade significa, entre outras coisas, ampliar o controle dos impactos sociais
e ambientais de tecnologias, definir quais os temas que merecem ser
pesquisados, participar do desenvolvimento das pesquisas etc. Finalmente,
Clayton sublinhou que uma nova abordagem requer a construção de massa
crítica e fica posto o desafio, portanto, de possibilitar que a EMBRAPA seja tão
plural quanto o meio rural. Francisco Hercílio Matos, em sua fala, reforçou a
pluralidade e a multifuncionalidade do espaço rural, sublinhando que menos do
que um modo de organização da produção, a agricultura familiar envolve
também uma certa concepção das relações sociais.
Manuel Barral, presidente do CNPq, falou sobre as iniciativas de editais
conjuntos, entre MCT e MDA, que visam estimular a preocupação com a inclusão
social e incluir a população na construção de soluções. Ele observou que muitos
dos projetos recebidos, apesar de apresentarem propostas interessantes, não
conseguiram atingir os requisitos do edital, pois deixavam entrever uma postura
intelectual da Universidade “Toda Poderosa” que vai até às comunidades levar
conhecimentos. A idéia dos editais é que se pense a extensão como uma
atividade de troca e aprendizagem conjunta. Em seguida, Aliomar Arapiraca, da
CEPLAC, começou sua fala remetendo à necessária articulação entre utopia e
pés no chão. Arapiraca endossou a necessidade de mudanças identificadas nas
falas dos que o precederam e formulou mais um desafio: o de fazer convergir o
trabalho das diversas instituições para a comunidade sem grandes modificações
estruturais.
Paulo Egler também pôs em cena uma discussão importante sobre o que define
o mérito científico. Lembrando a experiência de um projeto que foi recusado pela
falta de mérito cientifico, pois as tecnologias empregadas eram simples e
baratas, Paulo Egler pôs em questão uma concepção de mérito científico que não
leva em conta impactos sociais ou ambientais. Apresenta-se assim o desafio de
construir novas medidas para o que seria o mérito científico. Egler comentou
24
ainda o princípio de TS de que aprendizagem e participação são processos que
caminham juntos, destacando que isso é verdade desde que haja organização da
população: se a população local conhece suas necessidades e demandas, se há
clareza dos objetivos e das expectativas, a participação e uma efetiva troca de
conhecimentos pode acontecer.
Finalmente, Sônia Kruppa encerrou a mesa comentando as falas anteriores da
perspectiva de que elas evidenciam que o modelo de gestão pública vertical está
esgotado na medida em que políticas setoriais estanques não dão conta das
complexidades dos problemas. É preciso, então, pensar como operacionalizar
políticas
transversais,
pensadas
por
um
conjunto
de
ministérios
e
complementares entre si. A sugestão provocadora de Sônia Kruppa foi de que é
preciso
pensar
a
Administração
Pública
como
uma
Tecnologia
Social,
aproveitando este momento de abertura, em que a exclusão passa a ser um
termo que adquire visibilidade e o espaço para o diálogo parece existir.
Práticas solidárias: o papel das instituições articuladoras
O eixo para reflexão do tema proposto foi a experiência acumulada até o
momento pela Confederação de Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil –
CONCRAB.
Pedro Christoffoli primeiramente apresentou a leitura que o Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra faz sobre agricultura familiar e sobre tecnologia,
deixando claro o pressuposto da leitura marxista de mundo. Dois elementos são
importantes na leitura do MST/CONCRAB sobre a agricultura familiar: a
organização social e a tecnologia como processo organizativo e produtivo. Ele
apresentou a importância do apoio do poder público, da burguesia agrária para o
processo de modernização da agricultura brasileira que conduziu ao que hoje
conhecemos como agronegócio. Este apoio se expressa nos programas e
políticas de crédito, pesquisa e difusão tecnológica.
Pedro chamou a atenção para o fato de que não existe uma linha especifica de
pesquisa voltada para a agricultura familiar na EMBRAPA. Ele apontou que há
diferenças na forma de gerar conhecimento voltado para o grande ou para o
pequeno agricultor, pois há diferenças no sistema de manejo da unidade.
Enquanto a pesquisa desenvolvida para o agronegócio está pautada pelo cultivo,
as unidades familiares possuem um outro tipo de demanda no que se refere à
pesquisa,
pois
a
unidade
produtiva
não
está baseada
no monocultivo,
apresentando uma agrobiodiversidade maior. Isto torna a agricultura familiar
mais complexa, pois as relações estabelecidas dentro do sistema exigem uma
25
metodologia de pesquisa que extrapole a pesquisa por cultivo, prática muito
adotada pelos centros de pesquisa.
Nos assentamentos de reforma agrária encontramos todas as contradições
geradas pela sociedade brasileira. Sabe-se que as experiências vividas pelos
assentados serão referenciais para a organização do assentamento e para o
estabelecimento
dos
sistemas
de
produção.
Neste
momento,
quando
o
assentamento se inicia, é importante haja acesso a práticas que incrementem a
experiência
vivida,
inclusive
a
possibilidade
de
articulação
em
cooperativas/associações como forma de superar os problemas econômicos, que
quando enfrentados coletivamente podem obter melhores resultados18.
Neste sentido, Pedro afirmou, entende-se que o agronegócio e agricultura
familiar se excluem mutuamente: não há possibilidade de coexistência dos dois
modelos. Os referenciais agroecológicos existentes no Brasil foram construídos
principalmente pelos agricultores familiares e é importante reconhecer e
batalhar para que a EMBRAPA e a Universidade, junto com os trabalhadores,
tenham programas para desenvolver a agroecologia.
Neste momento da discussão, Pedro defendeu que a TS deveria marcar uma
posição, dizer para onde quer ir. Isto porque o que está em discussão é o
modelo de agricultura. O “agronegócio verde”19 também existe e não muda os
impactos ambientais e sociais. A dimensão do tempo na agricultura é importante
porque o modelo agrícola adotado permitirá a exploração por mais ou menos
tempo em função dos impactos ambientais que promovem escassez de recursos,
ou seja, há uma forte relação entre a capacidade de recuperação do meio
ambiente e a forma de exploração: é preciso levar em conta, portanto, a
resiliência do sistema agroecológico. Até onde se pode ir com esse jeito de
explorar o meio ambiente é a grande pergunta que a sociedade deve fazer para
compreender a urgência de rediscutir a base científico-tecnológica do modelo
agrícola hegemônico e qual sua sustentabilidade econômica, ambiental e social.
A proposta de um novo modelo, um novo jeito de fazer agricultura, que se
contraponha ao modelo convencional que gerou o agronegócio, deve trabalhar
com a diversidade em oposição ao atual modelo que adota a homogeneização, a
simplificação do sistema agrícola como base de seu desenvolvimento. No modelo
alternativo, além da agrobiodiversidade, o local adquire importância, pois é
necessário resgatar o conhecimento perdido, esquecido e/ou re-elaborado. Para
Por exemplo, na compra coletiva de insumos ou na comercialização dos produtos.
Esta é uma referência a agricultura que substitui os insumos químicos por orgânicos, mas
mantém a lógica do agronegácio.
18
19
26
resgatar este conhecimento
é necessário
trabalhar
junto às
populações
tradicionais, valorizando o conhecimento popular.
Para o palestrante, a TS está relacionada aos processos que conduzem a
mobilizações para exigir resposta a demandas sociais. Pedro apresentou a idéia
desenvolvida por Roseli Caldart de que o MST é uma escola - é no fazer que se
aprende.
Pedro comentou ainda a necessidade de não perder, de modo algum, a
organicidade, a unidade na luta. A perda da organicidade é um risco presente à
medida que o movimento vai ampliando o número de participantes – o aumento
das instâncias de participação e decisão traz consigo o desafio de encontrar
maneiras de conciliar unidade e diversidade. É importante, então, dialogar nos
diferentes níveis e construir caminhos que respondam a questões internacionais
e nacionais, bem como a questões mais locais, criando identidade entre as
diferentes instâncias. Organizar os coletivos, coordenações e os setores conduz a
geração de conhecimento e tecnologia (social). É esta uma das razões pelas
quais o MST prioriza as formas coletivas/associativas de produção, por entender
que tais formas propiciam uma experiência do coletivo que é, ela mesma,
educativa.
O Movimento dos Sem Terra é uma escola em si mesmo (Caldart, 1997). Não há
seleção prévia para participar. Procura-se a participação dos “excluídos” e não
dos “escolhidos”. É no processo, da ocupação ao assentamento, que se dá a
formação e a seleção de quem permanecerá. No processo todos devem ter as
condições
para se destacarem de forma a evitar um único líder. As ações no
assentamento devem propiciar a organização de modo a garantir a convivência
coletiva e a cooperação, pois é no coletivo que nos educamos e podemos
desenvolver nossa consciência crítica. Este é um dos motivos que leva o MST a
estimular as formas associativas nas áreas de acampamento e assentamento.
Durante estes 20 anos de história o MST aprendeu muito com a organização de
formas associativas e sabe que os processos são lentos.
Percebemos que há possibilidades distintas para as comunidades de agricultores
“tradicionais” (incluídas aqui as comunidades indígenas e os quilombolas) e
assentamentos de reforma agrária ou de atingidos por barragens. Enquanto os
primeiros estão territorializados, os segundos estão desterritorializados e este
fator abre uma brecha, uma predisposição para experimentar o novo.
27
Reconhece-se que a organização é um fator importante e deve ser estimulada
desde o momento do acampamento. Esta força da organização será muito
importante para o processo de inovação e adoção de tecnologias. Isto não
significa supor que, necessariamente, a comunidade assentada utilizará práticas
de cunho agroecológico, principalmente se em seu entorno as experiências
produtivas são desenvolvidas com base no modelo tecnológico convencional
(pacote verde). Isto significa apenas reconhecer que a des-instalação resultante
da luta pela reforma agrária abre espaço para modificações nos modos de
produzir e fazer agricultura.
O MST tem realizado várias ações para construir este caminho buscando um
modelo alternativo. Tais ações procuram envolver o maior número possível de
participantes do movimento, promovendo diálogos na sua base. Um dos
caminhos encontrados foi a constituição da Rede de Pesquisas Tecnológicas em
Agroecologia do MST, uma rica experiência de troca de informações entre
pequenos agricultores que praticam a agroecologia. Há ainda um programa em
desenvolvimento que procura inserir um programa de educação ambiental na
escola, a discussão da importância e da necessidade dos bancos de sementes, a
proposta de desindustrialização da agricultura a partir da redução no uso de
insumos industrializados, a internalização da pesquisa como forma de responder
as necessidades dos assentados e a construção de parcerias com o objetivo de
promover a agricultura de base agroecológica.
Enquanto organização, o MST, adota as seguintes estratégias que contribuem
com a formulação e geração de pesquisa:

Técnicos “pés no chão”: jovens que passam pela educação do campo
(escola no campo/ escola do campo) nos assentamentos. Já há
experiência acumulada no nível médio, o que leva a demanda por cursos
de agronomia com ênfase em agroecologia ao nível superior. A idéia é
que a combinação do técnico de pé-no-chão com uma cabeça criativa
possibilite a construção de um novo mundo.

Formação de uma rede de pesquisa agroecológica com o objetivo
de desenvolver uma nova concepção de pesquisa: para isto é
importante que a pauta de pesquisa seja participativa e de construção
coletiva. Entende-se que a pesquisa em centros são importante, mas que
a pesquisa/investigação de campo, pautada pela realidade concreta
deveria ser priorizada. A idéia é popularizar o conhecimento e constituir
grupos de agricultores pesquisadores.
28

No campo das políticas públicas: “balançar a árvore” e dar visibilidade
às demandas sociais no campo de Assistência Técnica e Extensão rural –
ATER e produção de conhecimentos agroecológicos ao Estado. Onde o
povo
está
organizado
há
perspectiva
de mudança.
É importante
estruturar convênios com governo para financiamento de ATER, mas
compreende-se a necessidade de desconstrução do técnico, para que este
atue em novas bases cientifico - tecnológicas.

Residência agrária: instrumento na formação de estudantes, de forma
que este tenha a possibilidade de aprender os elementos a partir da
realidade concreta.
Dialogar sobre os limites do modelo hegemônico de agricultura e construir um
novo modelo, alternativo, dentro das condições concretas dos assentamentos
não é tarefa fácil. Os assentados têm como referência o modelo hegemônico,
que através de programas como o “Globo Rural” reforça a viabilidade da
agricultura convencional. Boa parte das cooperativas/associações ligadas a
CONCRAB tem a tendência de seguir o modelo hegemônico de desenvolvimento.
A questão toda é a disputa desleal entre o modelo acabado e o modelo
inacabado, pois exige que as pessoas escolham entre “algo que conhecem” e
uma “possibilidade sem garantias”.
Nos assentamentos um dos elementos muito explorado é a “mística da
superação”, que procura trabalhar o emocional ao lado do racional, construindo
a identidade do grupo na luta pela reforma agrária. É neste processo que se
organizam e se constroem as bases das relações sociais que darão a “liga” no
tempo de acampamento e, posteriormente, no tempo de assentamento, quando
as forças terão que novamente se reordenar.
Percebe-se que os processos de participação ocorrem com mais força onde há
organização social. O processo de transformação é lento, tem seu tempo e ritmo
próprios, pois passa pela validação da comunidade e, posteriormente, da
sociedade.
No universo do enfrentamento entre ideologias e formas de pensar a sociedade,
os movimentos sociais cumprem um papel muito importante pois carregam em
si o germe da mudança – fruto das contradições e diferenças dentro da
sociedade. Neste sentido, é muito importante que o enfrentamento se realize
ancorado por bons fundamentos.
29
Pedro citou o Prof. Florestan Fernandes que dizia que o movimento social não
pode ser cooptado ou esmagado e precisa ter vitórias e conquistas. As vitórias e
conquistas para os movimentos sociais são valiosas, pois têm o efeito de deixar
a chama acesa e são a injeção de ânimo que os participantes necessitam para
continuar sua caminhada reivindicatória.
Os fracassos desestimulam a caminhada, mas fazem parte do processo criativo.
No universo das tecnologias sociais este é um elemento a ser considerado, pois
no campo da agricultura os acertos estimulam a validação das inovações e o
desenvolvimento de tecnologias que poderão ser apropriadas socialmente. A
cooptação do movimento social, por sua vez, é um indicador que este não mais
caminhará rumo a transformação, mas passará a fazer parte do status quo
vigente, e isto contribuíra para a extinção de sua razão de ser.
No campo da transformação social a capacidade crítica aliada à capacidade
organizativa e de mobilização são elementos-chave, pois através da constante
avaliação das experiências vividas se ganha elementos para mobilizar atores no
caminho da mudança.
A mudança é mais fácil no campo das idéias do que na arena do cotidiano social.
A despeito disso, existe uma aposta grande na agricultura familiar como base de
um outro modelo de desenvolvimento da sociedade, na busca da sociedade
sustentável. Esta tem em sua base os ideais de sustentabilidade social,
econômica e ambiental, que são identificados por muitos como de difícil
equalização.
Muitas organizações imbuídas deste ideário da sustentabilidade desenvolveram
estratégias com o objetivo de contribuir na construção de possíveis caminhos.
Para isto apostam na pluralidade metodológica. Este é o caso, por exemplo, das
escolas que adotam a pedagogia da alternância, cuja metodologia supõe três
passos distintos e constantemente percorridos: observar, refletir e experimentar.
Nestas escolas, a formação é dada pela família, pelos professores e pelas
associações de agricultores. São as interfaces das histórias de vida dos alunos,
pais, professores, técnicos e camponeses que dão a tônica e compõem o
repertório dos atores envolvidos nesse processo de ensino aprendizagem.
Acredita-se que a formação deve ser um projeto de construção coletiva. Desta
forma existe a possibilidade de concretizar e interrelacionar os diferentes
saberes. A base da cognição esta na compreensão do processo que se apreende.
Os alunos não são apenas depósitos de conhecimentos, mas têm a possibilidade
30
de refletir sobre a teoria e a prática, o que é fundamental para o processo de
produção de conhecimento e inovação tecnológica. A capacidade criativa é
infinita quando desenvolvemos a habilidade de pensar criticamente.
Não é fácil seduzir as pessoas para o novo com um discurso tipo: “Sei que não
sei fazer, mas sei que pode ser diferente” ou “vamos trocar a roda da bicicleta
em movimento”. Existem aspectos que dificultam a mudança social e o
“desconhecimento” é um deles. A decisão de adotar ou não inovações numa
unidade de agricultura familiar pode ser um bom exemplo de como são vários os
fatores que interferem nesta decisão. A
decisão não é arbitrária: leva em
consideração aspectos sociais, técnicos, ambientais, políticos e econômicos.
Na construção de um outro caminho possível de organização da sociedade, os
movimentos sociais cumprem um papel importante. A ação coletiva explicita as
contradições e possibilita pensar e propor alternativas. Neste caso, alguns
elementos são sempre lembrados como é o caso das relações de gênero e de
geração. Na agricultura familiar as mulheres e os homens têm seu lugar bem
definido, assim como pais e filhos(as), e também há uma territorialidade. Por
exemplo, a responsabilidade por retirar o leite pode ser masculina, feminina ou
dos filhos(as) conforme o local. Há comunidades que definiram em seu processo
de organização social que a agricultura é uma atividade feminina: em outras
comunidades, esta é uma atividade masculina. O que percebemos é que a
questão da subordinação ou da complementação de um gênero em relação a
outro depende de diferentes fatores e é socialmente construído, assim como o
tema das gerações (Woortmann, 1992).
Pedro deixou clara sua percepção de que não serão governos transitórios que
farão a grande transformação, mas alguns elementos foram apontados de modo
a contribuir com um outro projeto de sociedade e novos caminhos na construção
do conhecimento. O crédito, os insumos e as parcerias foram identificados como
instrumentos para estimular a experimentação dos agricultores. Os diagnósticos
e análise devem ser realizados de forma continua e participativa, para terem
sentido como instrumentos de planejamento.
É necessário ainda pensar a transição das instituições. O atual modelo de
produção tecnológica hierarquiza o conhecimento científico e chega ao agricultor
por simples transferência. Adotou-se um modelo “transferencista” de tecnologia:
neste modelo a tecnologia oriunda da pesquisa chega ao agricultor através da
extensão rural de forma acrítica, pronta para ser “consumida”. Este formato de
pesquisa e extensão nega por completo o conhecimento dos agricultores. O não-
31
reconhecimento do saber do agricultor é confundido com atraso, entende-se que
resistência à adoção de inovações tecnológicas ocorre por mero conservadorismo
e medo do novo. Mas há uma outra explicação para esta resistência que é o fato
do sistema produtivo validado por este agricultor não comportar o risco da
adoção da tecnologia proposta pela extensão rural. Muitas vezes, os fatores
considerados pelo agricultor são identificados pelo técnico como “subjetivos” e,
por esta razão, sem valor.
Faz-se necessário pensar novas bases epistemológicas para um novo modelo de
conhecimento, que está por construir-se. É preciso socializar o conhecimento,
modificando o processo atual no qual temos a tecnologia totalmente baseada no
“segredo”. É preciso desconstruir o processo de formação em vigor, criar um
novo processo em outras bases, pois dificilmente conseguiremos formar novas
lideranças no processo escolar vigente.
Nestes momentos de busca de novos caminhos é possível pensar em incentivar a
transformação de determinadas estruturas conservadoras do Estado, mas talvez
o mais interessante seja desenvolver mais parcerias com organizações de
caráter público não estatal. Tal idéia faz sentido principalmente quando
pensamos na agricultura familiar e no grande número de ONGs que atua junto a
este segmento - geralmente com muita dificuldade financeira. Durante a oficina,
conhecemos o exemplo de muitas escolas que aplicam a pedagogia da
alternância e que estão com dificuldades financeira; tais escolas poderiam contar
com apoio do Estado.
São tantos os interesses da agricultura que é muito difícil atender a demanda. A
universidade, caso se aproprie deste novo projeto de sociedade, terá muito com
que contribuir. Um novo tipo de agricultura exige um novo tipo de tecnologia
social, um novo jeito de trabalhar a extensão e assistência técnica. Na
atualidade a extensão rural tem dificuldade no diálogo entre agricultores
familiares e técnicos tradicionais, pois estes têm uma visão parcial da realidade
rural, o que impede uma boa relação entre as partes. Além disso, atuar
simplesmente difundindo pacotes tecnológicos não é a melhor forma de
trabalhar o desenho das unidades produtivas, principalmente se pensamos na
agricultura sustentável.
O que é reiterado no discurso de Pedro é que o discurso da “ciência neutra” é
uma falácia, funcionando apenas para obscurecer a idéia de que a produção de
conhecimento não responde a interesses. A questão é muito séria e deve ser
analisada com cautela. No campo da agricultura temos vários exemplos de que
32
não há neutralidade na produção de conhecimento. O processo de modernização
da agricultura brasileira nos fornece um exemplo eloqüente, pois se adotou o
caminho da adaptação e difusão de tecnologias que ao final privilegiou um
segmento de agricultores. É muito comum a associação de pesquisadores ao
agronegócio e a grandes empresas que financiam parte das pesquisas com o
objetivo de validar seus produtos. Dentro de nosso atual sistema de C&T, estes
são os pesquisadores valorizados, os que apresentam resultados.
Os pesquisadores que trabalham com conhecimento popular normalmente são
desvalorizados, pois a pesquisa que desenvolvem não está ligada a nenhuma
grande corporação e seus resultados são sempre duvidosos, pois são localizados,
pequenos e de difícil replicação. Assim, podemos observar claramente que existe
a produção de conhecimento que recebe apoio financeiro e os que não recebem.
Claramente, isto está relacionado com a concepção de CT&I do pesquisador e
das instituições financiadoras, que são balizadas pelo ideário hegemônico sobre
o assunto.
Poderíamos nos remeter a exemplos como o prêmio Nobel concedido ao inventor
do DDT seguido das denúncias de sua toxicidade 50 anos depois; a liberação de
CFC na atmosfera e as posteriores descobertas de sua relação com a destruição
da camada de Ozônio; a talidomida e seus efeitos nocivos; as doenças
negligenciadas pela indústria farmacêutica como o Mal de Chagas e a
Leishmaniose...São muitos os exemplos que ilustram que a produção científica
não é neutra, principalmente quando olhamos para o universo das questões
ambientais que estão na agenda mundial.
Um novo modelo de conhecimento deveria levar em conta que há diversos
modos de conhecer o mundo e intervir sobre ele; assim, deveríamos dizer não
ao desperdício das experiências. Afinal, porque não vejo ou compreendo, não
quer dizer que não exista: o reconhecimento da pluralidade amplia o que é tido
como possível.
O desafio apresentado é o de efetivar uma nova matriz tecnológica onde a
pesquisa, a extensão e a sociedade caminhem juntas. Para isso, é necessário
lidar com a questão da escala de produção: existe uma pressão grande para que
as técnicas gerem aumento na escala de produção. Para ilustrar esta questão
talvez seja interessante utilizar o exemplo apresentado durante o seminário
sobre a comercialização de sementes produzidas por agricultores do semi-árido
brasileiro e que, com o uso de tecnologias apropriadas, tiveram seu potencial de
germinação maior do que as sementes certificadas pela instituição de pesquisa.
33
As tecnologias ligadas ao aumento de escala nem sempre consideram aspectos
sociais e ambientais. Estes fatores , quando considerados conjuntamente, podem
colocar em xeque a idéia de que
importa somente o aumento imediato da
produção.
A questão colocada por Pedro é como seria feito este trabalho com nova cara, se
seria possível com a mesma estrutura de CT&I e ATER de que dispomos fazê-la
convergir para o trabalho com a comunidade. A questão fundamental é a
mudança de mentalidade; mudar a estrutura por decreto não muda a
mentalidade. Portanto criar uma nova estrutura não necessariamente é uma
solução – afinal, novas estruturas carecem de tempo para se enraizarem e
adquirir capilaridade. Além disso, as estruturas institucionais mais antigas já
estão estabelecidas quanto a recursos econômicos, técnicos e humanos.
A principal crítica que foi feita se ampara na observação de que as ONGs são
muito mais ágeis para de adequar a mudanças de demandas do que as
estruturas do Estado. Ora, as estruturas do Estado dificilmente terão a mesma
dinâmica de uma ONG, pois são essencialmente diferentes. O que pode ser feito,
até como estratégia para dinamizar as instituições estatais é construir e reforçar
canais de diálogo entre estas e a sociedade. As instituições de pesquisa, ensino e
extensão necessitam ter mais diálogo com a sociedade, devem se reformular e
sair do pedestal em que se encontram. As mudanças na extensão universitária
podem aproximar a agricultura familiar da universidade e este caminho deve ser
construído coletivamente a partir de metodologias participativas.
Neste processo de mudança nas relações entre governo e sociedade, qual seria
o papel da sociedade em relação ao governo? Um termo muito utilizado foi o de
que é necessário “balançar a árvore”, cobrar do Estado políticas públicas que
realmente atendam às demandas sociais. A questão que ficou sem resposta é
como se reconhece qual o momento de cooperar com o governo e qual o
momento de enfrentá-lo. O que ficou nítido no processo é que o “ritmo” do
movimento social – MS é diferente do governo. O governo procurou fazer o
mapeamento da economia solidária com a intenção de trabalhar a contradição
entre o apoiar e o cooptar. Para que a mudança institucional ocorra “por dentro”
é necessário conquistar técnicos, pesquisadores e professores para que estes
coloquem suas competências a favor da construção de um outro modelo de
desenvolvimento.
Compreende-se que a construção do modelo de desenvolvimento é uma decisão
política, foi assim com o processo de modernização da agricultura durante os
34
anos 70 e é assim com a expansão agrícola nos dias de hoje. É importante que
se modifique o orçamento da EMBRAPA, pois hoje a pesquisa privilegia o
agronegócio e não a agricultura familiar, este também é um aspecto político.
Concluindo sua intervenção, Pedro afirmou que as intervenções neste campo não
devem ser pontuais, devem ocorrer de forma sistêmica de modo a desenvolver a
agricultura familiar. A promoção do processo de transição a agricultura de base
agroecológica deve ser animada pelo Estado.
Sônia Kruppa, iniciando sua reflexão, resumiu as falas da mesa de abertura e a
exposição de Pedro numa sentença: “eu sei que não sei como fazer, mas sei que
pode ser diferente”. Sônia puxou a discussão para o desafio que o governo Lula
está enfrentando, para a criação de novas formas de gestão, e tratou
especialmente da atuação da Secretaria Nacional de Economia Solidária.
Ela retomou a discussão sobre os modelos que estão em disputa, sublinhando
que um deles já está estabelecido – havendo, portanto, instituições, políticas
públicas e acúmulo de reflexão dedicado a ele – e o novo movimento que nem
sequer está desenhado como modelo. O desafio, segundo Sônia, é desenvolver
ferramentas que modifiquem o modelo existente, mas sem pretender fazer isto a
partir da criação de novas instituições que “magicamente” operassem segundo
outra lógica: é necessário modificar o existente participando do existente.
Ainda que tais mudanças sejam lentas, Sônia chamou a atenção para o papel
desempenhado pelas entidades da sociedade civil organizada e pela população
em geral: balançar constantemente a árvore. Trata-se de uma referência à
exposição de Pedro, que disse que o esforço constante para transformar as
instituições significa balançar a árvore e acrescentou que a lentidão das
transformações se deve à arraigada cultura institucional, que faz com que as
pessoas se agarrem fortemente à árvore, temendo cair. Ainda brincando com
esta idéia, Sônia alertou quanto à força com que balançamos a árvore, pois os
bons frutos podem cair também. Ainda em relação ao papel da sociedade civil
organizada, Sônia Kruppa chamou a atenção para a dificuldade de interlocução
com os desorganizados, ou seja, aqueles indivíduos que se encontram
pulverizados em suas ações e estratégias.
Outro papel atribuído à sociedade civil organizada foi o de apoio ao Estado.
Segundo Sônia, a novidade das ações formuladas por este novo governo,
associada à ausência de instituições que possam implementá-las, torna
necessário o estabelecimento de parcerias. Tais parcerias visam, sobretudo,
utilizar as redes das ONGs, conferindo capilaridade às novas políticas. Todavia,
ela afirmou que tais relações entre sociedade civil organizada e Estado não se
35
dão de modo tranqüilo. Chamando ao diálogo a sociedade civil, o Estado acaba
tendo que enfrentar o “fio da navalha” entre cooptar os movimentos sociais e
“esmagá-los”. Caberia, do nosso ponto de vista, apenas um questionamento
sobre a necessária distinção entre sociedade civil organizada, empreendimentos
solidários e movimentos sociais.
Finalmente, Sônia Kruppa fez um comentário sobre TS que vale a pena
recuperar, por estar tão vinculado ao conceito desenvolvido neste ano de
trabalho. Ela disse que a noção de TS põe em questão a ciência e o próprio
modelo de conhecimento de que dispomos. Falar em TS não significa apenas
falar dos objetivos da tecnologia, mas questionar o próprio processo de produção
de conhecimento.
Pedagogia da alternância: instrumento para promoção de
desenvolvimento da agricultura familiar
É interessante notar que, para este momento, tivemos dois expositores que
optaram por caminhos bem diferentes em suas apresentações. A primeira foi
mais pautada pela questão da pedagogia da alternância e a escola, esclarecendo
como que se opera o processo de ensino aprendizagem neste contexto e como
os atores envolvidos se relacionam. Já a segunda exposição apresentou mais
elementos político-ideológicos e de críticas à sociedade.
A primeira exposição foi feita por Cida, professora do curso de Pedagogia na
Universidade Católica de Brasília e, na mesa, representante da União Nacional
das Escolas Famílias Agrícolas do Brasil – UNEFAB. A professora apresentou as
linhas gerais do trabalho das Escolas Famílias Agrícolas, definindo as EFAs como
“uma associação de famílias, pessoas e instituições que se unem para promover
um desenvolvimento sustentável e solidário no campo”.
A Profa. Cida iniciou sua fala com a leitura de uma carta redigida de próprio
punho, que expressa o significado da vivência numa EFA e sintetiza a visão de
uma estudante que vivenciou a pedagogia da alternância. Em sua leitura,
percebe-se a força do conhecimento construído a partir da realidade concreta.
Este adquire um outro significado, mais ainda quando tem como objetivo a
formação integral e passa a fazer parte do projeto de vida pessoal contribuindo
com o desenvolvimento do meio social, econômico, humano, político.
O processo de aprendizagem não está restrito à sala de aula e a aprendizagem
transita por todas as ciências, independente de seu caráter humano, exato ou
biológico,
permitindo
a
articulação
de
conhecimentos
e
despertando
a
criatividade. Este processo é possível a partir da observação, reflexão e
36
experimentação proposta no método: ao observar estou pesquisando de forma
participativa a realidade; ao refletir estou analisando a realidade e ao
experimentar encontro novas interrogações e possibilidades de pesquisa.
Tudo isto é possível devido à transversalidade que há no processo. Alguns dos
instrumentos pedagógicos citados – como o plano de estudo, os cadernos da
realidade empresa agrícola, caderno da experimentação, cadernos de atividades
gerais – são fortes instrumentos pedagógicos e posteriormente servirão de
material base para a monografia de conclusão de curso. Também ocorrem as
visitas de estudo e é o momento no qual ocorre uma maior interação entre o
professor, o aluno(a) e pais, pois o professor visita a propriedade dos pais,
conhecendo a realidade concreta em que está inserido o aluno. A articulação
entre
conhecimento
teórico
e
prático
é
fundamental
no
processo
de
aprendizagem - esta é a grande diferença da escola convencional que trabalha
os conhecimentos de forma fragmentada e compartimentada, dificultando a
capacidade de interligar e descobrir que há um “todo” e não somente “partes”.
Esta proposta da pedagogia da alternância foi desenvolvida na França em 1935,
e tinha como finalidade a formação de lideranças que pudessem alavancar o
desenvolvimento rural. No Brasil a adoção da pedagogia da alternância e
constituição das Escolas Familiares Rurais e Casas Família Agrícola está
relacionada com a demanda por um ensino de qualidade no campo, que possa
contribuir com o desenvolvimento local sustentável. As Casas Familiares Rurais e
Escolas Família Agrícola assumem o desafio de formar cidadãos e construir
lideranças sociais no meio rural. Este formato de escola permite que o agricultor
não perca a mão de obra do filho e ainda tenha um técnico visitando sua
propriedade com freqüência; esses são fortes motivadores para a implementação
deste tipo de escola. Quando comparamos a experiência brasileira com a
francesa devemos considerar o fato de haver uma tradição do envolvimento dos
agricultores com associação e/ou cooperativa e que este envolvimento é um
fator histórico que está menos presente na tradição dos agricultores brasileiros.
A Pedagogia da Alternância é uma das possibilidades de utilização da educação
como um instrumento de organização. Tanto a proposta da ARCAFAR quanto da
UNEFAB pressupõem a organização dos trabalhadores, já que as escolas são
formadas pelas organizações de trabalhadores. Toda esta experiência permite a
construção de novos referenciais de como a sociedade pode se organizar. São
fortes contribuições para gerar mudança e isto se confirma nestes dados sobre a
importância dessas escolas para que os jovens tenham a opção de permanecer
37
no meio rural: 65% dos egressos permanecem em meios rurais e 35% migram
para meios urbanos20.
O internato, por exemplo, permite experimentar outras possibilidades; ele
possibilita a convivência e a experiência da construção coletiva, à medida que
põe o educando em contato com uma pluralidade de referenciais. Cada aluno
traz consigo as regras e o conjunto de códigos da sua família, que podem ou não
comungar com os de seus colegas. Além disso, cada professor também traz
consigo suas referências e códigos sociais, o que irá oferecer aos alunos um
mosaico de referências que extrapolam a sua individualidade. Este momento
representa conflito, ganhos, perdas e possibilidade de mudança social. O jovem
muda a partir deste diálogo constante entre os atores envolvidos no processo de
aprendizagem,
o
diálogo
das
experiências
da
família/monitor
/
comunidade/escola.
Podemos enxergar o desafio que é para a pedagogia da alternância contribuir
para a construção dos conhecimentos necessários a uma nova extensão rural; a
idéia é fazer acontecer o processo pedagógico em alternância modificando a
participação
do
agricultor
que
passa
a
protagonista
no
processo
de
“comunicação” .
21
Vale a pena pensar nesta questão apresentada pelo Prof. João Batista Queiroz
sobre a necessidade de trabalhar a formação dos educadores para utilização dos
instrumentos pedagógicos. Segundo ele, as “EFAS/ES são muito escola, pouco
família e pouco agrícola”. É fundamental consolidar a experiência das Escolas
Família Agrícola e para isso é preciso integração entre escolaridade e formação
profissional, afinal o trabalho de monitor é muito complexo no cotidiano e exige
um processo constante de formação, pois o monitor não é apenas professor,
passa a fazer parte da vida dos jovens, partilhando de seus problemas. Um outro
gargalo das escolas é garantir a sustentabilidade econômica. Um caminho tanto
para
conseguir
uma
formação
de
qualidade
como
para
construir
a
sustentabilidade das escolas é a ampliação de parcerias com universidades e
centros de pesquisa.
As escolas que utilizam a pedagogia da alternância são apaixonantes, pois
simbolizam a busca de solução pelos trabalhadores. Como é possível fazer uma
extensão
rural
diferente,
que
vá
ao
encontro
das
necessidades
destes
agricultores e dos jovens que vivem no meio rural? O espaço para pensar um
Estes dados foram apresentados pelo Professor João Batista Queiroz, em sua exposição nesta
oficina.
21
Referência ao livro Extensão ou comunicação? de Paulo Freire.
20
38
outro jeito de fazer agricultura existe. A forma como se desenvolveu a ciência
agronômica, fragmentada, fez com que perdêssemos a capacidade de gerar
conhecimento para a agricultura de forma integral, pensando as unidades
produtivas como agroecossistemas. Esta pedagogia possibilita resgatar a
capacidade de produzir conhecimento para a agricultura de modo a produzir
conservando o meio ambiente, desenvolvendo uma agricultura sustentável.
Durante o debate surgiu uma provocação: A Educação tem respeito pela
pedagogia da alternância? Porque a pedagogia da alternância não é adotada
apesar do êxito reconhecido? A questão é que apesar do consenso que existe
quanto à eficácia da pedagogia da alternância, desta refletir a construção de
uma educação libertadora, nem todo mundo quer arregaçar as mangas, assumir
e construir. O compromisso é difícil de ser assumido. Outro elemento é a
necessidade de reconhecimento do currículo da EFA que, além de ter os
elementos do currículo da escola fundamental, apresenta as especificidades por
trabalhar dentro do calendário e da realidade agrícola.
Nem tudo são maravilhas, há complicações no processo. Por exemplo, o plano
experimental e de estudo da visibilidade aos conflitos quanto ao caráter familiar
da propriedade, nem todo pai está aberto as experiências do filho. A questão da
sexualidade é trabalhada a partir da conscientização através do diálogo, onde
psicólogos ou casais levam sua experiência aos jovens.
Como já foi dito, nem tudo são flores na pedagogia da alternância, pois os
conflitos são muitos e estão diretamente relacionados com o envolvimento e
participação de todos. O ambiente de respeito para os pais é muito importante e
estes sentirão confiança e permitirão a participação do filho(a). Este filho(a) por
sua vez dará visibilidade ao real caráter familiar da propriedade quando o pai
não permitir que este desenvolva campo demonstrativo ou queira fazer alguma
alteração no sistema desenvolvido pelo pai, ou mesmo quando for solicitada por
parte da escola um maior envolvimento dos pais. Os processos participativos
tendem a dar visibilidade as relações sociais historicamente constituídas e já
incorporadas ao jeito de ser de cada um e, conseqüentemente, aos conflitos
fruto do questionamento e potencialidades de processos de mudança ou
permanência.
A Escola Família Agrícola valoriza a cultura local e isso colabora com a
permanência do agricultor no campo e abre a perspectiva de profissionalização
dos seus filhos. Nesse processo da pedagogia da alternância ou do agricultorpesquisador
a
apropriação
da
metodologia
científica
torna-se
possível,
39
aproximando o universo do conhecimento e do saber do agricultor. Este processo
torna visível que o acesso ao conhecimento e a possibilidade de sair da
marginalidade caminham lado a lado.
Neste mesmo sentido da pedagogia da alternância, o Movimento dos Sem Terra
busca apropriar-se do processo tecnológico com propostas como a formação de
técnicos “pés no chão”
e formação de rede de pesquisa tecnológica
participativa. Desta forma se reconhece a produção de conhecimento não
científico, ou seja, aquilo que não está encerrado no universo da academia e dos
centros de pesquisa. Como já foi dito, temos que apostar na pluralidade
metodológica
pra
gerar
conhecimento
e
produzir
inovações
que
sejam
apropriadas socialmente e que nos aproximem, novamente, de processos coevolutivos.
Este
foi
o
rumo
tomado
pelo
movimento
de
agricultores
experimentadores como forma de resolver suas demandas específicas e viabilizar
seus sistemas agrícolas, com base em sua realidade concreta.
Este formato de ensino-aprendizagem baseado na realidade concreta e buscando
responder
a
demandas,
permite
uma
reflexão
crítica
da
realidade
e,
conseqüentemente, a busca consciente de alternativas. No caso da Amazônia
permite pensar a construção de alternativas como a produção de mel e de
peixes, que são mais rentáveis/ha e menos impactantes ao meio ambiente que a
criação de boi, tão difundida para a região desde a década de 70, ou mesmo a
ampliação da fronteira da soja, que tem também em sua base o desmatamento,
com conseqüente perda da biodiversidade. Este processo desencadeado pelas
Casas Familiares Rurais e Escola Família Agrícola abre caminho para a formação
de jovens comprometidos com sua comunidade, dando-lhe mais opções para
permanecer e não migrar.
Inovações nas tradições da agricultura familiar: O enfoque da
agroecologia
A proposta deste momento desenvolveu-se a partir de três exposições. A
primeira que focou mais o processo histórico de Assistência técnica e extensão
rural (ATER) no Brasil e a necessidade de construção e implementação de uma
nova ATER, realizada pelo Prof. Eros Mussoi. A segunda apresentação, feita pelo
Prof. José Antonio Costabeber procurou apresentar a construção do conceito de
agroecologia e as possibilidades de construção de uma agricultura sustentável.
E, por fim, a terceira que tratou da experiência da AS-PTA com tecnologia
alternativa e o agricultor familiar, apresentada por Paulo Petersen.
40
A exposição de Eros procurou, justamente, traçar um breve histórico das
relações entre Pesquisa e ATER. Em diversos momentos, durante a oficina,
apontou-se para a dissociação que existe entre a Pesquisa e o trabalho de ATER;
uma dissociação que revela muito sobre o modelo “difusionista” que tem
caracterizado a assistência técnica e a extensão rural.
Ao contrário da idéia de que não há políticas de ATER ou que elas não chegam a
quem precisa, Eros mostrou que a ATER teve um papel fundamental para a
condução de um processo de modernização do campo. No entanto, tal
modernização foi conservadora, pois não alterou a estrutura fundiária do país.
Seu objetivo foi apenas introduzir inovações na agricultura de modo a contribuir
para a consolidação de um modelo de desenvolvimento urbano-industrial. Deste
modo, em nenhum momento esta modernização se preocupou em construir
instrumentos que permitissem ao pequeno agricultor permanecer no campo
melhorando suas condições de vida: o modelo de produção privilegiado foi o do
grande negócio, da produção dependente de insumos químicos e genéticos e da
mecânica. A modernização conservadora não alterou significativamente o quadro
das relações sociais no campo, apenas contribui para expulsar os pequenos
agricultores de suas propriedades, tornando-as inviáveis economicamente.
Dois pontos merecem destaque na exposição de Eros. O primeiro deles se refere
à identificação do vazio existente entre Pesquisa e ATER, vazio que tem sido
historicamente preenchido pelo trabalho de Organizações não governamentais. O
segundo ponto se refere ao processo descrito por Eros, que evidencia que a
construção de políticas públicas tem história. Embora mais ou menos óbvia, as
próprias discussões ocorridas durante a oficina mostraram que esta idéia não se
encontra enraizada nas práticas dos atores: diversas vezes se falou em construir
novas institucionalidades como resposta às faltas localizadas nas instituições
atuais, como se as instituições ou as políticas públicas, por si só, fossem capazes
de liderar alguma transformação.
A exposição de Eros, localizando os pontos de desarticulação institucionais que,
ao longo dos anos, foram criando a inquietação necessária para a constituição de
uma nova cultura, contribui para mostrar que as transformações devem ser
endógenas, e passam pela sedução e conquista dos quadros que já estão
instalados nas instituições. Aliás, muitas vezes, são estes próprios quadros,
obrigados a lidar com as contradições do fazer, que acabam dando forma às
transformações. Ao expor a nova política de ATER, recentemente lançada, Eros
pôde nos apontar como as mudanças que elas marcam em relação ao passado
estão carregadas das “angústias” e reflexões de pessoas e instituições.
41
José Antonio Costabeber nos trouxe alguns princípios de Agroecologia, exposição
que foi muito interessante, principalmente porque Costabeber procurou pôr em
diálogo sua reflexão com a idéia de Tecnologia Social. O primeiro ponto que
abordou foi o risco das apropriações dos termos – notou que a Agroecologia tem
assumido outros usos, menos sistêmicos, aparecendo mais como uma “marca”
para o consumidor do que como um modo de conceber a produção, as relações
sociais e ambientais etc.
A Agroecologia pressupõe a dependência estrutural entre homem e ambiente e
parte do diagnóstico de que os problemas que vimos enfrentando atualmente
têm múltiplas causas, necessitando por isso da adoção de múltiplas medidas.
Em outras palavras, trata-se de uma abordagem sistêmica, que tem mais
impactos sobre a produção do que a ausência de agrotóxicos, por exemplo: se
trata de sustentabilidade ambiental e social, de manutenção da diversidade e da
heterogeneidade dos sistemas ecológicos. Como bem colocou Costabeber, a
Agroecologia provoca a repensar nosso modo de compor o preço dos produtos,
na medida em que implica em inserir outras dimensões além do presente na
“conta”, tal como a sustentabilidade.
Outro ponto importante levantado por Costabeber foi que a Agroecologia
demanda a constituição de uma base renovada de conhecimentos e tecnologias.
A recusa do modelo químico-genético-mecânico não significa, no entanto, que
tais conhecimentos e tecnologias devam ser “simples”, mas sim que eles devam
estar de acordo com os princípios agroecológicos e, importante ponto de contato
com
a
discussão
sobre
Tecnologia
Social,
eles
devem
ser
socialmente
apropriados ou apropriáveis. A exemplo do que ocorreu com a Pesquisa e a ATER
nos anos 70, reconhece-se no Estado um ator fundamental para induzir o
processo de construção desta nova base de conhecimentos.
No campo da agricultura sustentável pode-se pensar o aumento da renda, fruto
da certificação por exemplo, como uma estratégia para cooptar maior número de
agricultores familiares para adoção de práticas agroecológicas, mas não como
um
fim
em
si
mesmo.
Tem
que
fazer
parte
de
uma
intervenção
multidimensional. O alimento saudável não pode estar disponível apenas a quem
tem poder aquisitivo maior, mas deve estar na mesa da população como um
todo. Portanto é fundamental para a agricultura familiar dialogar com os espaços
urbanos, com a organização urbanas como, por exemplo, com associações de
consumidores, até como forma de disputar espaço com o agronegócio.
O êxito de uma pesquisa e sua utilidade pública podem ser medidos a partir de
sua formulação, onde as propostas de pesquisa devem ser articuladas aos
42
processos locais de experimentação.
E a superação das estruturas formais,
tanto no campo da educação quanto na produção de conhecimento, é
fundamental para a formação de pessoas para atender as demandas da
agricultura familiar. É fato que o modelo tradicional de escola não colabora com
a formação dos agricultores, pois é descolada da realidade. Esta é a vantagem
das Escolas Famílias Agrícola e da Casas Familiares Rurais que nascem
justamente para preencher a lacuna que existe na educação formal, que não
atende ao interesse dos agricultores familiares. Sugere-se a reformulação do
currículo escolar de modo a valorizar aspectos regionais procurando trabalhar o
conhecimento a partir da realidade local, dando mais sentido ao processo de
aprendizagem.
Um novo jeito de fazer agricultura exige uma nova mentalidade. É um processo
de mudanças das mentalidades. A ATER – assistência técnica e extensão rural
deverá apresentar um novo perfil, o que exige um profissional com uma
formação acadêmica e institucional diferente do que se promove hoje. Esse novo
perfil deverá integrar pesquisa, ATER e sociedade. Processo bem diferente do
difusionismo adotado até hoje pela extensão rural brasileira durante todo o
período de modernização e sucateada na seqüência, pois o agronegócio não
necessita mais da extensão, na medida em que está consolidado.
Após a exposição de Eros e de Costabeber, tivemos a apresentação da
experiência da AS-PTA, feita por Paulo Petersen. A AS-PTA desenvolve um
interessante trabalho com agricultores-experimentadores, bastante rica para a
reflexão sobre TS. Paulo iniciou sua fala observando a importância da precisão
conceitual para a leitura da realidade e para a intervenção. Afinal, métodos
estão baseados em conceitos, que permitam guiar as interpretações e os
pensamentos. Assim, compreender o que se entende por Agroecologia, por TS
ou por Agricultura Familiar é essencial para compreender as práticas que se
pretende atrelar aos termos.
Reforçando algo que apareceu diversas vezes durante a oficina, Paulo definiu a
noção de tecnologia presente no modelo de ATER que tínhamos: nesta visão,
tecnologias são produtos, passíveis de difusão indiferenciada a todos os
contextos, cuja finalidade – previamente definida – é sempre o aumento da
produtividade. Neste sentido, Paulo chamou a atenção para o fato de que não é
possível dizer que os agricultores, neste modelo, são meros receptores de
conhecimento, pois a eles só se deseja transferir o produto, pronto e acabado,
sem que eles se apropriem do conhecimento que levou à construção da
tecnologia. Ora, privar os agricultores destes conhecimentos significa privá-los
43
também dos instrumentos para a inovação e reforçar uma relação distante e
dependente com pesquisadores, assistentes técnicos e extensionistas.
Quando se fala de agricultores-experimentadores, está-se falando de uma
cultura de troca e inovação. O primeiro passo é possibilitar que os agricultores
tenham referências para a interpretação da realidade – e não se trata, é
necessário sublinhar, de ensinar a eles modelos ou métodos “fechados”; ao
contrário, a aposta é na pluralidade metodológica. Até para a sistematização das
experiências, diversas linguagens são aceitas: o que importa é o trabalho de
organizar o vivido, pensado em partilhá-lo com outras pessoas. O significado
que
se
atribui
à
troca
de
conhecimentos
também
merece
destaque,
principalmente porque pode nos ajudar a pensar os desafios e os limites da
“ampliação de escala” das Tecnologias Sociais: a AS-PTA estimula a criação de
redes de troca, não para que dividam seus “modelos”, mas para provocar sua
imaginação, para dar-lhes diferentes inspirações. Mais uma vez, a exemplo da
importância da “circulação” atribuída à Pedagogia da Alternância, é o contato
com diferentes realidades que torna mais provável que inovações aconteçam: a
pluralidade amplia os limites do que é tido como possível. É neste sentido que
Paulo sugere que não se fale apenas em “crédito para produção”, mas de
“insumos para a experimentação”, conta na qual estariam incluídas viagens para
conhecer outras experiências, promoção de encontros e atividades afins.
É fundamental a promoção de intercâmbios entre os agricultores para que
possam trocar experiências. O estímulo à inovação, como idéias e inspirações,
ocorre quando a pessoa tem contato com outras realidades. Um bom exemplo é
a contribuição ao projeto das cisternas da ASA – Articulação do Semi-Árido,
onde uma inovação tecnológica para as cisternas foi criada porque um agricultor
do semi-árido, que foi pedreiro no sudeste brasileiro e que trabalhou na
construção de piscinas, apropriou-se de um conhecimento que possibilitou
melhoria na construção de cisternas.
Não é difícil perceber a radicalidade da mudança nas relações com o
conhecimento que tal experiência mostra: as relações aqui são horizontais, os
conhecimentos e a experimentação são infinitos processos que visam não só a
melhoria da produção, mas também a emancipação, a realização pessoal. Esta
visão integra fazer e pensar integra homem e ambiente, desfaz o desafio da
conciliação entre igualdade de legitimidade e desigualdade de saberes, presente
nas tensas relações entre agricultores e técnicos. Nesta visão, os técnicos seriam
apoiadores de uma “experimentação metodológica”, sem oferecerem “pacotes”,
44
mas tendo muita clareza dos princípios de sua intervenção e também do modo
de produção que desejam fomentar.
Paulo fez uma sugestão para a definição da Tecnologia Social: “Tecnologia Social
seria aquela desenvolvida a partir da restauração dos processos coevolutivos,
apropriada localmente”.
Finalmente, o último ponto que gostaríamos de relevar da fala de Paulo se refere
à sua crítica ao já referido debate entre transformação endógena e criação de
novas institucionalidades – segundo ele, é importante olhar para as práticas.
Quando nos concentramos nas teorias, corre-se o risco de esbarrar nos bloqueios
institucionais e no longo tempo necessário a sua superação. De outro lado,
quando se examina práticas, examina-se maneiras já existentes de passar por
cima dos bloqueios. Chamamos a atenção para este ponto porque, de algum
modo, é este pressuposto que informa a escolha metodológica do ITS de pensar
articulando reflexão teórica e exame de experiências. As experiências afirmam
possíveis caminhos já em seu funcionamento.
III. Quem ensina e quem aprende? Aprendizados e desafios da
assistência técnica e da extensão rural
Este foi o último momento da oficina, onde se procurou sistematizar as idéias
que foram trabalhadas.
Muitos e diferentes aspectos foram levantados, o que
nos dá a dimensão da complexidade do tema agricultura familiar e das infinitas
possibilidades de explorá-lo no campo das tecnologias sociais.
A agricultura familiar nos permite fazer uma espécie de raio-x de alguns
aspectos relativos a transformação social. Por exemplo, a despeito da confiança
que quase todos os expositores depositam no processo, entendendo-o como algo
que desempenha funções educativas, também apontou-se que uma prévia
organização social é um dos elementos que distingue as possibilidades de um
grupo ou outro em um dado momento. A organização social facilita o diálogo,
organiza as necessidades, transformando-as em demandas sociais e, aspecto
fundamental, torna a participação uma possibilidade mais concreta.
É claro que com esta observação não se pretende dizer que apenas grupos já
organizados podem ser agentes de transformação. Um outro importante fator de
mudança é a motivação dos indivíduos. E deve-se sublinhar a idéia exposta
durante a oficina que as motivações individuais podem ser heterogêneas: a
“verdade”, a “mística” dos movimentos sociais e das organizações coletivas não
está dada a priori; antes, o senso comum se constrói no processo.
45
A idéia de des-instalação, que apareceu com tanta força na experiência da
Concrab, pode ser aplicada a diversas realidades. Afinal, o que se destaca da
idéia de des-instalação não é tanto o fato dos indivíduos se encontrarem desterritorializados
como
o
fato
de
se
encontrarem
num
momento
de
estranhamento em relação ao funcionamento da sociedade num dado momento.
Ou seja, é a abertura para a mudança, a percepção de que as coisas podem ser
diferentes que importa nesta des-instalação.
A análise das experiências de agricultura familiar também nos possibilita
perceber que os processos de experimentação e de transformação social são
lentos: eles se iniciam pequenos e sua propagação se dá com o tempo, num
processo de validação e adaptação por outros agricultores até que se torne uma
prática comum e de domínio popular. Há um movimento irradiador do agricultor
experimentador (AE) rumo ao movimento social de experimentação. Este
movimento pode ser visualizado no esquema abaixo.
Movimento social de
experimentação
AE
É desta forma que podemos identificar o processo de desenvolvimento da
AgriCultura.
Já
o
AgroNegócio,
em
contraposição,
se
desenvolve
nos
laboratórios, protegido por segredos industriais e patentes. O potencial de
inovação presente na AgriCultura é muito maior que aquele presente no
AgroNegócio pois temos, no primeiro caso, a necessidade de resolução de um
problema que impulsiona a inovação e, no segundo, temos o mercado e a
possibilidade de geração de lucro como motriz da inovação. Mais do que isso, a
pluralidade metodológica presente na AgriCultura amplia as possibilidades de
caminhos e, conseqüentemente, de respostas. Trata-se de um modelo de
conhecimento fundamentalmente diferente do “best way” (“melhor caminho”)
que, em geral, caracteriza a inovação tecnológica aplicada à indústria.
46
O
processo
de
geração
de
conhecimento
é
tão
importante
quanto
o
conhecimento em si. É importante olhar o processo, pois nele está contido a
possibilidade
de
apropriação
social
do
saber
produzido.
Uma
semente
transgênica contém em si um processo de produção de conhecimento altamente
concentrado e de difícil desvendamento para o agricultor ou para a pessoa
comum. É um processo muito diferente da semente da paixão ou crioula, que
reproduz o processo de domesticação adotado pelos agricultores desde os
primórdios da agricultura, sendo um processo de fácil apreensão e reprodução
por qualquer curioso – agricultor ou não.
A
democratização
e
equalização
do
acesso
ao
conhecimento
estão
intrinsecamente relacionadas à política. A visão de mundo e o projeto político
das diferentes forças que compõem o cenário da sociedade dão o tom e o ritmo
da democratização possível. Esta seguirá a perspectiva do projeto político do
grupo dominante e hegemônico na sociedade e encontrará resistência nos
movimentos sociais de contraposição ao status quo.
Vários são os atores que participam deste processo de gerar conhecimento,
(desde o agricultor até o cientista), mas ainda muito tem que ser feito para
superar a hierarquia entre estes saberes. Os desafios institucionais são grandes
e demandam uma mudança de mentalidade que aceite a pluralidade de idéias e
a diversidade metodológica. Um primeiro passo seria a construção de novos
critérios de julgamento e avaliação, que reconheça a produção de conhecimento
de ONGs, Escola Família Agrícola/Casa Família Rural, enfim, das comunidades
não-cientificas.
Parte dos desafios institucionais que estão postos para a construção de um novo
modelo de conhecimento e sua transmissão se coloca dentro dos órgãos
responsáveis pela Assessoria Técnica e Extensão Rural. Desenvolver uma nova
ATER que participe dos processos do agricultor exige um profissional com perfil
diferente. E este perfil deve ir ao encontro de um novo referencial de
desenvolvimento, menos relacionado apenas ao crescimento econômico, que
considere aspectos sociais, econômicos e ambientais, que a agricultura tenha
uma base agroecológica e a extensão se realize em bases participativas. O
técnico extensionista deve atuar, assim, como um “tecnólogo social rural”.
47
Neste quadro de construção rumo à agricultura sustentável, a elaboração de
uma estratégia para redução no uso de insumos químicos, genéticos e
mecânicos é fundamental. Há uma relação direta estabelecida entre as condições
do território e a melhoria da produção quando ocorre diálogo entre os diferentes
fatores que envolvem a produção.
Como comentado anteriormente, a forma como são avaliados e julgados os
projetos científicos foram questionados e várias foram as intervenções que
apontaram para a necessidade de construção de novos critérios de julgamento e
avaliação de projetos. Um dos elementos considerados é o fato de que existem
experiências no campo da experimentação, sistematização e produção de
conhecimento em ONGs, e mesmo por outros atores que não fazem parte da
academia, mas dificilmente são reconhecidas como produção de CT&I. Os
professores que trabalham na academia com extensão universitária também se
sentem desvalorizados pelos critérios que ora são adotados para avaliação de
produtividade acadêmica.
O desafio que se coloca para as instituições de CT&I é desenvolver indicadores e
processos de avaliação que levem em conta o processo e não somente os
resultados. No modelo atual, que reconhecemos como pouco democrático, pouca
importância se dá ao processo e muita se dá aos resultados. Esta postura se
ancora num certo modelo de produção do conhecimento, que não privilegia o
atendimento das necessidades e demandas sociais e tampouco se preocupa com
as formas de difusão deste saber ou do acesso que a população terá a ele. Este
modelo reforça a cisão entre o sistema de CT&I e Sociedade, constituindo a
conhecida “redoma de vidro” na qual os cientistas formulam suas questões e
desenvolvem suas pesquisas.
Tal concepção está longe de ser neutra. Aliás, a neutralidade científica foi
identificada ao conjunto de argumentos falaciosos, que serve tanto aos cientistas
que procuram garantir a autonomia científica quanto àqueles que buscam
esvaziar suas pesquisas de interesses privados – é como se o método científico
por si mesmo tornasse um problema relevante para toda a humanidade. É
preciso que se reconheça, portanto, que a ciência não é neutra: ela é composta
por pessoas que possuem o seu lugar, a sua posição, dentro de um campo social
e representam seus interesses; seu projeto individual convive com um projeto
de sociedade.
Na busca de caminhos para atender suas demandas, os agricultores começam a
organizar um outro modelo de Escola, uma escola que valorize a cultura local e a
48
realidade concreta. Os instrumentos pedagógicos da Alternância levam os alunos
a entenderem sua realidade; no processo de aprendizagem desencadeado nestas
escolas, a realidade vem em primeiro lugar. Os conteúdos trabalhados na escola
são fruto de pesquisa prévia feita com o aluno – valorizando-se e respeitando-se
a identidade local. O que é sempre importante sublinhar nestes processos é que,
de modo algum, o respeito à identidade local significa isolar os educandos nos
limites de seus interesses. Ao contrário, trata-se de provoca-lo a transgredir
estes limites, seja por meio de pesquisa, seja por meio do encontro com pessoas
diferentes. A ação coletiva é outro elemento muito valorizado no processo de
ensino-aprendizagem e pode ser percebido pelo vínculo de 69% dos alunos de
escolas famílias agrícola com outros tipos de associações.
A experiência desenvolvida na disseminação do conhecimento e dinâmicas de
agricultor a agricultor é um dos possíveis caminhos rumo a outro modelo de
produção de conhecimento. Além da experiência da AS-PTA, um outro exemplo
destes processos de busca de horizontalidade nas relações é o projeto
“caracoles” dos zapatistas, que busca “criar organizações que sejam ferramentas
de objetivos e valores a alcançar e que façam que a autonomia e o mandarobedecendo não fiquem no mundo dos conceitos abstratos nem das palavras
incoerentes
é
uma
das
(González, 2003), desta
participação, constrói
contribuições
mais
importantes
dos caracoles”22
forma o movimento zapatista, com criatividade e
uma
possibilidade
de autonomia
das
comunidades
indígenas e camponesas em seu território, constituindo verdadeiras redes.
A lógica da extensão rural e da produção do conhecimento deve ter um elo com
o agricultor e suas necessidades, ou seja, os técnicos, extensionistas e
pesquisadores devem ser partícipes do processo dos agricultores e não o
contrário. Se entendemos que a tecnologia é a mediação entre o ser humano e o
meio ambiente é fundamental produzir tecnologias responsáveis social e
ambientalmente e que sejam viáveis economicamente.
No desenvolvimento do conceito de agroecologia e na prática da agricultura
sustentável foram grandes as parcerias desenvolvidas com comunidades
tradicionais como forma de resgatar as práticas adotadas no fazer agricultura. As
comunidades também foram muito procuradas por seus bancos de sementes da
paixão ou crioulas. A valorização do saber camponês é um instrumental
importante no desenvolvimento da agricultura sustentável e das bases da
agroecologia. É importante reconhecer que há outro modo de pesquisar com
”crear organizaciones que sean herramientas de objetivos y valores a alcanzar y hagan que la
autonomia y el mandar- obedeciendo no se queden en el mundo de los conceptos abstractos ni de
las palabras incoherentes es uma de las aportaciones mas importantes de los caracoles”.
22
49
características próprias onde tanto a concepção quanto a pauta da pesquisa são
participativas. É importante reconhecer que é possível fazer a pesquisa tanto no
campo quanto no centro de pesquisa. As experiências expostas e debatidas
durante a oficina afirmam que não é tão difícil escapar da camisa de força
imposta pelo processo de simplificação e isolamento dos fatores. É importante,
na produção científica agroecológica, aprender a lidar com a complexidade da
pesquisa científica, buscar as pontes que relacionam o conhecimento, que
conectam diferentes campos do saber como o meio ambiente, o social e o
econômico.
Durante os trabalhos desenvolvidos na oficina apresentou-se a importância do
Estado como animador do processo transformação. Existe a necessidade de se
pensar como caminhar dentro das estruturas formais e superá-las. Um dos
caminhos apontados é o de ampliar as parcerias, como forma de superar as
dificuldades. Outro caminho pode ser a criação de programas voltados para a
agricultura familiar nas diferentes instituições. Estes podem ser possíveis
caminhos para superar as dificuldades na gestão pública.
Dentre os pontos levantados, destaca-se ainda a discussão que veio à frente da
cena durante a oficina, qual seja, a relação entre Sociedade e Estado23. Muitas
vezes se apontou a necessidade de repensar a cultura do estado em sua relação
com a sociedade, mas é importante chamar a atenção para um aspecto
levantado por Paulo Petersen: a sociedade também tem uma cultura de relação
com o Estado, que também deve ser revista. De algum modo, nos parece que as
disputas em torno de termos e conceitos, bem como em torno da direção das
mudanças que devem ocorrer são um importante indicador da possibilidade de
“democratizar a democracia”, afinal, cada um dos “campos de dissenso”
conformados
por
tais
termos
(agricultura
familiar,
tecnologia
social,
agroecologia, ATER, para ficar apenas com alguns dos que foram nomeados na
oficina) torna possível o esclarecimento de valores e princípios que, como
também lembrou Paulo, informam práticas e intervenções.
Deste modo, estes “campos de dissenso” acabam conformando espaços de
participação, e acabam tornando mais complexa a própria idéia de democracia,
distanciando-a da “representação”. É tendo em vista este contexto, mais geral,
que as angústias em relação ao significado das redefinições entre sociedade e
Estado pode ser “esvaziada” e problematizada.
Este aspecto está melhor trabalhado no anexo 2, “Políticas Públicas e Tecnologias Sociais:
reflexões a partir da oficina Tecnologia Social e Agricultura Familiar”.
23
50
A produção científica deve desobscurecer o que, o como e o porque da ciência.
Talvez nesta busca de um novo caminho devêssemos nos afastar do significado
da “cidadania” para nos aproximarmos da “florestania”. E buscar uma ciência
mais voltada para a sociedade e menos para o mercado, mais responsável
socialmente.
51
Referências Bibliográficas
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Social no Brasil: São Paulo, Instituto de Tecnologia Social
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Reconstruindo a agricultura: idéias e ideais na perspectiva de um
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WOORTMANN, Klaas (1990) “Com parente não se neguceia” O campesinato
como ordem moral. Anuário antropológico v. 87 Brasília: UnB.
WOORTMANN, Ellen F. (1992) Da complementaridade à dependência: espaço,
tempo e gênero em comunidades “pesqueiras” do nordeste. In: Revista
Brasileira de ciências sociais nº 18, ano VII, mês Fevereiro, ANPOCS Ed.
Relume:Dumará.
52
ANEXO I
Descrição das três experiências apresentadas na Oficina
Pesquisadora: Martina Rillo Otero
1. Articulação e Organização de assentados no Sistema Cooperativista
dos Assentados
[email protected]
(61) 322-5035
Informações sobre a Organização
CONCRAB - Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (MST)
Alameda Barão de Limeira, nº 1232, CEP: 01202-002 - São Paulo - SP
http://www.mst.org.br/setores/concrab/indice.html
Breve Histórico
A trajetória da CONCRAB se desenvolve na medida em que se aperfeiçoa a
organização dos assentados e o Movimento dos Sem-Terra (MST) passa a
assumir, nas suas discussões, os assentamentos como foco de suas ações.
Também tem origem no reconhecimento de um esboço de uma política
cooperativista no interior do MST (Fabrini, 2002).
Visando garantir a melhoria da produção agropecuária, iniciou-se uma profunda
avaliação de toda a política de estímulo à Cooperação Agrícola com vistas a
melhorá-la. Dessas discussões optou-se pela criação do Sistema Cooperativista
dos Assentados (SCA) que corresponde ao Setor de Produção e Comercialização
do MST, tendo como objetivo a busca de maior articulação e afinidade entre as
diversas formas de cooperação, elaboração e aplicação de políticas homogêneas
de desenvolvimento, formação de quadros organizadores da cooperação,
elaboração de programas de capacitação em todos os níveis, elevação da
produção agropecuária e melhoramento da produtividade do trabalho nos
assentamentos, a fim de atingir melhorias significativas nas condições de vida
das famílias assentadas.
O SCA articula diversos tipos de organizações dos assentados, desde Grupos
Coletivos, Associações, Cooperativas de Produção Agropecuária (CPA) e
Cooperativas de Prestação de Serviços (CPS). Ao nível estadual existem as
Cooperativas Centrais dos Assentados (CCA). E, no nível nacional, foi criada a
CONCRAB (em 15 de maio de 1992), para articular as demandas e as
potencialidades regionais otimizando esforços e recursos em vistas do
desenvolvimento sócio-econômico das famílias assentadas.
Introdução
A CONCRAB articula, dos diversos
Cooperativista dos Assentados.
atores,
componentes
do
Sistema
Para a promoção da produção agroecológica foram estruturados centros de
pesquisa em parceria com ONGs e instituições públicas, no qual grupos de
agricultores-pesquisadores e técnicos-pesquisadores puderam desenvolver
experimentos dentro dos assentamentos, acompanhados pelos agricultores sujeitos e beneficiários diretos das pesquisas.
53
Além disso, a Concrab tem implementado diversos cursos formais e não formais
voltados para os agricultores assentados e seus filhos, a fim de promover o
acesso à escola (ensino) e o estímulo à cooperação e as formas associativas de
organização da produção juntamente com a pesquisa e o estudo para a
contribuição do desenvolvimento dos assentados. (Folder da organização).
Princípios:
- Cooperação social, econômica e no trabalho entre os assentados;
- Preocupação com a estrutura física dos assentamentos (organização espacial);
- Valorização das histórias de lutas do MST mantidas através das místicas e
trabalhos coletivos;
- Exemplos de conduta e motivação para os acampados e assentados;
- Preservação da natureza (do meio ambiente);
- Desenvolvimento de novas técnicas para os produtos e processos;
- Formação e qualificação técnica para os assentados e seus familiares (filhos);
- Estimulação à cooperação e as formas associativas de organização da
produção;
- Pesquisa e estudo para a contribuição do desenvolvimento dos assentados.
Objetivos
"A Confederação (Concrab), organização das cooperativas na terceira instância,
tem a função de coordenação geral das políticas e planejamento do
desenvolvimento das atividades das cooperativas. Cabe ainda, organizar a
formação técnica (administrativa, financeira e agronômica) de caráter nacional,
desenvolver estudos e estratégicas de mercado, cuidar das relações
internacionais relacionadas às cooperativas (exportação, por exemplo) e
articulação com outras confederações" (Fabrini, 2002).
Atores Envolvidos
De modo geral, os atores envolvidos são os vários grupos organizados no
Sistema Cooperativista dos Assentados: desde os núcleos de base, os grupos
coletivos, Associações de Assentados, Cooperativas de Produção Agropecuária,
Cooperativas de Prestação de Serviços, Cooperativas de Crédito, Cooperativas
Centrais dos Assentados (nível Estadual) e, finalmente, a própria CONCRAB a
nível nacional.
Funcionamento da Experiência
Todos os assentamentos devem ir se organizando em núcleos de base. Eles são
um espaço para discutir os problemas do assentamento, a organização da
produção, a luta dos trabalhadores e o avanço da cooperação. O núcleo não deve
ser entendido apenas como uma estrutura formal. A principal razão é garantir a
gestão democrática do assentamento e da cooperativa. Na verdade, o núcleo é
um espaço de construção da democracia participativa e do poder popular: ele
analisa as demandas, elabora e aprofunda as propostas, participa na elaboração
e implementação da estratégia e elege os seus representantes para a
coordenação do assentamento e conselho da cooperativa (Página eletrônica da
organização).
54
A partir da organização de grupos de assentados nos níveis locais, novos
agrupamentos, dessa vez dos grupos menores vão formando coletivos mais
abrangentes, até chegar na CONCRAB, que promove a articulação ao nível
nacional.
Segundo Scopinho e Martins (2003):
"O SCA procura mobilizar e organizar os assentados para desenvolver a
economia com base em outros valores que não apenas a busca de lucro,
perseguindo objetivos políticos e sociais através da organização de base, da
defesa da autonomia de organização e de representação e, o mais importante,
da criação de mecanismos institucionais que possibilitem aos trabalhadores se
apropriarem dos instrumentos de produção e de gestão das cooperativas. A
formação de Núcleos de Base de Famílias (instância básica para a gestão do
assentamento) é a estratégia utilizada para implementar e desenvolver uma
proposta de organização econômica e social no território conquistado. Tal
proposta, procurando articular o campo e a cidade, deve estar fundamentada na
diversificação da produção rural, no fortalecimento dos mercados populares
locais e regionais, no desenvolvimento de uma matriz tecnológica, agroecológica
e conservacionista e na formação de valores humanos de justiça e eqüidade
social. O papel do SCA é, essencialmente, formativo e politizador, no sentido de
construir a idéia de que o mais importante não é o tipo formal de cooperativa,
mas a adesão consciente aos princípios e ao método da cooperação
autogestionária" (pp. 126 e 127).
A consecução dos princípios (ver princípios, acima) é o que busca garantir a
coesão e a passagem de um nível para o outro. A produção e a cooperação
agrícola são organizadas por meio de planos de produção, na qual são definidas
as estratégias econômicas das famílias e as formas de cooperação da produção a
serem adotadas.
Institucionalização da prática
A CONCRAB está formalizada.
Principais Dificuldades
- Há dificuldades econômicas relacionadas à ausência de políticas de crédito, de
subsídios e de comercialização para a pequena produção agropecuária (Scopinho
e Martins, 2003).
- As Cooperativas e iniciativas associativistas também têm enfrentado
dificuldades para se inserir no mercado voltado para satisfação dos interesses
ligados a exportação e as grandes empresas multinacionais voltadas para o setor
de alimentos (Página da organização).
- A implantação de cooperativas encontra dificuldades, por sua vez, devido à
cultura da população, muitas vezes não compatível com as práticas de
cooperação e de organização coletiva, dada uma história muito mais longa de
divisão do trabalho e fragmentação dos grupos de agricultores e produtores
(Fabrini, 2002, Scopinho e Martins, 2003)
Dicas estratégicas
- Organização das iniciativas associativistas a partir dos Núcleos de base, que
garantem a participação de todos na gestão e decisão das iniciativas.
55
Elementos de Tecnologia Social
A formação do Sistema Cooperativista dos Assentados busca viabilizar
empreendimentos de pequenos agricultores assentados, por meio da associação
entre les. A experiência de organização desses agricutores, primeiro em
pequenos grupos, depois em congregações amiores representa uma tecnologia
social de organização de pessoas.
Fontes de Informação:
Página Eletrônica da Organização:
http://www.mst.org.br/setores/concrab/indice.html
Fabrini, J. E. (2002). O projeto do MST de desenvolvimento territorial dos
assentamentos e campesinato. Terra Livre, 18. nº 19 p. 75-94.
Scopinho, R. A. Martins, A. F. G., (2003) "Desenvolvimento organizacional e
interpessoal em cooperativas de produção agropecuária: reflexão sobre o
método". Psicologia e Sociedade, 15 (2): 124-143.
2a.Trabalho com Pedagogia da Alternância nas Casas Familiares Rurais
[email protected]
(91) 248-7407
Informações sobre a Organização
ARCAFAR/PA - Associação Regional das Casas Familiares Rurais do Estado do
Pará
Rodovia Augusto Montenegro, 6201-km 07, Pq.Verde - CEP: 66035-110 Belém/Pa
Breve Histórico
O sistema Casa Familiar Rural, no Brasil e a rede ARCAFAR tiveram seu início no
Estado de Pernambuco, em 1984 (Martins, s/d).
Já o Sistema Familiar Rural na Amazônia Brasileira teve seu início no Estado do
Pará, em 1994.
A ARCAFAR/PA foi fundada em 2003, numa Assembléia Geral realizada na cidade
de Gurupá-PA. Sua constituição foi fruto de uma ampla discussão entre as Casas
Familiares Rurais, que sentiam a necessidade de uma Organização Estadual para
defender e representar seus interesses, promover o intercâmbio, garantir os
princípios filosóficos e metodológicos, evitar o isolamento e acompanhar o
processo de expansão das mesmas no Estado do Pará.
Desde sua existência, a ARCAFAR/PA tem desempenhado importante papel na
união e fortalecimento das Casas Familiares Rurais do Estado do Pará,
possibilitando a expansão e a boa aplicação dos princípios que norteiam a
Pedagogia da Alternância nas diferentes realidades do Estado do Pará.
Principal Financiador da Experiência/ da Organização
Apoio de ONGs, subsídios estatais e municipais e poucos recursos de empresas.
Além do trabalho "idealista" de seus participantes. (Martins, s/d).
Informações sobre a Experiência
56
Características Gerais da Experiência
- Localização: A rede ARCAFAR é constituída pela ARCAFAR/ NORTE, ARCAFAR/
PARÁ, ARCAFAR/ MARANHÃO e ARCAFAR/ AMAZONAS.
- Tempo de existência:
aproximadamente, 20 anos.
As
Casas
Familiares
Rurais
existem
há,
Princípios:
- Promoção do Desenvolvimento Local Sustentável e Solidário;
- Pedagogia da Cooperação;
- Valorização da Cultura e dos Calores do Campo;
- Promoção da Cidadania;
- Economia Solidária;
- Formação Integral do Jovem: social, profissional e pessoal.
Introdução
O Movimento das Casas Familiares Rurais nasceu na França, em 1935 a partir da
necessidade de criação de uma escola que correspondesse às necessidades reais
e aos problemas vivenciados no campo. Durante a década de 50 a experiência
começa a chamar atenção e se expande para outros países da Europa. Em 1975
foi criada a Associação Internacional dos Movimentos Familiares de Formação
por Alternância - AIMFR.
A Pedagogia da Alternância é uma alternativa para a Educação no campo, já que
o ensino nesse contexto não contempla as especificidades e as necessidades da
população que vive no meio rural. Segundo Martins (s/d) alguns problemas
educacionais encontrados nas escolas no meio rural dão origem à necessidade
de uma proposta educacional específica para o campo. Alguns problemas que
podem ser enumerados são: a escola desvinculada da realidade local, a falta de
recursos para atividades básicas do campo, a necessidade dos alunos ficarem na
propriedade com sua família para trabalhar e terem dificuldades de acompanhar
o calendário tradicional das escolas, a desvalorização da escola multiseriada e a
falta de vagas nas escolas agrotécnicas.
A formação não voltada para as especificidades do campo também se reflete em
baixos índices de produtividade pelo uso de técnicas inadequadas à realidade de
cada região.
Portanto, ainda segundo Martins (s/d):
"Pensar numa proposta Educacional em oposição à educação convencional foi
uma necessidade frente à realidade rural brasileira. Os fatores que contribuíram
para o surgimento das Casas Familiares Rurais no Brasil tiveram relação direta
com a economia agrícola baseada na produção de subsistência, a falta de
conhecimento de técnicas alternativas para a preservação ambiental, o rápido
processo de desmatamento, o uso do fogo de modo indevido, preparo adequado
do solo, uso intensivo de agrotóxicos, baixo uso de práticas conservacionistas
nas áreas de cultivos, a monocultura, êxodo rural, evasão escolar pela falta de
respostas das escolas existentes às reais necessidades dos jovens camponeses e
pela falta de escola básica do campo" (pp. 3 e 4).
Objetivos
O Modelo de Educação "Casas familiares Rurais" tem como objetivo promover
uma educação, formação e profissionalização alternativa eficaz e concreta mais
57
apropriada à realidade do campo. Visa, com isso, incentivar a permanência do
jovem na sua própria região, criando alternativas de trabalho e renda, numa
perspectiva da Economia Solidária.
A rede ARCAFAR visa o fortalecimento e expansão da formação em alternância
no Brasil. (Martins, s/d)
Atores Envolvidos
O projeto pedagógico é resultado da ação de diversos atores que devem atuar
em parceria, entre eles o monitor/ educador, o aluno, a família, a comunidade,
profissionais e instituições locais.
Funcionamento da Experiência
As Casas Familiares Rurais são um modo específico de formar e educar pessoas
que vivem no meio rural. São destacados dois eixos principais que dão base para
o projeto de formação proposto: a Pedagogia da Alternância e a Associação das
Famílias.
1) A Pedagogia da Alternância se caracteriza por alternar a formação do aluno
entre momentos no ambiente escolar e momentos no ambiente familiar/
comunitário.
A proposta é desenvolver um processo de ensino-aprendizagem contínuo em que
o aluno percorre o trajeto propriedade - escola - propriedade:
- Em um primeiro momento, na propriedade, o aluno se volta para a observação,
pesquisa e descrição da realidade sócio-profissional do contexto no qual se
encontra.
- Em um segundo momento, o aluno vai à escola, onde socializa, analisa, reflete,
sistematiza, conceitualiza e interpreta os conteúdos identificados na etapa
anterior.
- Finalmente, num terceiro momento, o aluno volta para a propriedade, dessa
vez com os conteúdos trabalhados de forma a que possa aplicar, experimentar e
transformar a realidade sócio-profissional, de modo que novos conteúdos
surgem, novas questões são colocadas, podendo ser novamente trabalhadas no
contexto escolar.
De maneira geral, a Pedagogia da Alternância trabalha com a experiência
concreta do aluno, com o conhecimento empírico e a troca de conhecimento com
atores do sistema tradicional de educação, e também, com membros da família
e da comunidade na qual vive o aluno e que podem fornecer-lhe ensinamentos
sobre aquela realidade.
Atualmente, já existe uma série de instrumentos especialmente elaborados para
trabalhar em regime de alternância, como: Plano de Estudo com temas
geradores escolhidos a partir de um diagnóstico da realidade local, o Caderno de
Pesquisa, o Caderno de Acompanhamento, entre outros.
2) A Associação das Famílias tem como função gerir a Casa Familiar Rural administrativamente, financeiramente e juridicamente. Além disso, tem como
responsabilidade participar da formação e complementá-la de modo coerente a
partir do que lhe é ensinado na escola.
Institucionalização da prática
58
As Casas Familiares Rurais são pessoas jurídicas próprias, vinculadas a
Associações formadas pelos atores envolvidos no projeto pedagógico.
Principais Dificuldades
- Falta, no nível federal, de reconhecimento e regulamentação da Pedagogia da
Alternância (Martins, s/d);
- Falta de apoio financeiro para o funcionamento do modelo;
- Ausência de Formação Acadêmica dos Monitores/ educadores especificamente
para questões da alternância;
- Instalações inadequadas;
- Falta de equipamentos e materiais didático-pedagógicos (Martins, s/d).
Dicas estratégicas
A integração entre os diversos atores envolvidos se mostra um aspecto
fundamental para o funcionamento da proposta da Pedagogia da Alternância.
Dado que a formação do aluno se dá em diversos contextos, torna-se necessário
que haja certa coerência de proposta entre eles.
Além disso, segundo Passador (2000):
"O envolvimento da comunidade é primordial para a consecução dos objetivos do
Projeto, cuja implantação só acontece a partir da demanda da própria
comunidade. A partir daí, começa a se desenvolver o senso de responsabilidade
pelas escolas, a busca por soluções para os problemas da região, a valorização
do agricultor como cidadão e como profissional. Conseqüentemente, o Projeto
acaba despertando a iniciativa e a participação comunitária, além de uma
atuação conjunta por parte dos órgãos executores e parceiros do Projeto. E
ainda, cria projetos de desenvolvimento regional oriundos das aspirações da
população local e dos ensinamentos da Casa Familiar Rural”.
“As Casas tem evoluído de acordo com a maturidade política das comunidades.
Nas cidades em que as lideranças constituídas e os agricultores compreendem
suas atribuições junto ao Projeto, este se torna a mola propulsora da agricultura
no município ou na região" (pp. 2)
Resultados
Segundo Martins (s/d) "As Casas Familiares Rurais apresentam resultados
excelentes de custo/ benefício, sendo muito favoráveis aos interesses da
administração pública, pois garantem qualidade no ensino e com um custo
menor em relação aos obtidos com a educação nas escolas tradicionais" (pp.
Outros resultados indicados pelo autor são: formação de lideranças,
diversificação da propriedade, geração de trabalho e renda no campo, inclusão
social, resgate da cidadania, qualidade de vida, vida digna e felicidade,
continuidade dos jovens no campo e um projeto profissional de vida.
Perspectivas
- Aumento de parcerias com o poder público. As Casas Familiares Rurais têm
dificuldades financeiras e, por outro lado, a proposta pedagógica realizada é tida
como de interesse público.
59
- Formação de parcerias com Universidades para criação de projetos de curso de
formação específicos para os monitores/ educadores da Alternância
O desenvolvimento da Pedagogia da Alternância representa uma Tecnologia
Social em si, pois é o desenvolvimento de um projeto pedagógico especialmente
adequado á realidade rural, formando jovens que conheçam sua realidade e
aprendam a partir dela.
Elementos de Tecnologia Social
O trabalho com a Pedagogia da Alternância também revela o potencial dos
jovens agricultores se desenvolverem como atores de produção de
conhecimento, a partir do momento que questionam sua própria realidade e
detém os instrumentos para encaminhar a investigação de tais questões de
maneira mais sistemática.
Fontes de Informação:
Informações sobre a organização: http://membres.lycos.fr/dominiquesourty/
A Notícia (1999) Projeto educacional ganha professores. Disponível em
http://www.an.com.br/1999/mar/05/0ger.htm, em 13/10/2004.
Martins, L. dos S. (s/d) Casa Familiar Rural - CFR - Formação a serviço da
vida com dignidade no campo. Texto cedido pela organização.
Passador, C. S (2000) “Projeto Escola do Campo: Casas Familiares Rurais do
Estado do Paraná”. Em Novas Experiências em Gestão Pública e Cidadania.
Marta Ferreira Santos Farah e Hélio Batista Barboza (orgs.). São Paulo: Editora
FGV.
2b. Instrumentos Pedagógicos da Alternância
[email protected]
Telefones: (61) 226-3131 (61) 226-1941 (61) 321-8985 FAX: (61) 224-2754
Informações sobre a Organização
UNEFAB - União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas do Brasil
Setor Comercial Sul Edifício Carioca - Quadra 06 nº 240 - Bloco "A'' Sala 501 5º Andar Brasília - DF, CEP: 70300-000 Caixa Postal: 10827
http://www.unefab.org.br/home/
Breve Histórico
A União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas do Brasil - UNEFAB foi criada em
1982, através de um processo de discussão e estudo realizados pelas EFAs Escolas Famílias Agrícolas, buscando ser uma instituição de representação e
assessoria à estas escolas, auxiliando no fortalecimento e divulgação da
proposta pedagógica da Alternância.O movimento das escolas rurais em regime
de alternância nasceu em 1935, a partir da iniciativa de três agricultores e de
um padre de um pequeno vilarejo da França que prestaram atenção na
insatisfação sentida pelos adolescentes, demonstrando atenção para com o meio
em que viviam, desejando promovê-lo e desenvolvê-lo.
60
Fora de estruturas escolares estabelecidas e sem referência a qualquer teoria
pedagógica, estas pessoas imaginaram um conceito de formação que permitiria
a seus filhos educarem-se, formarem-se e preparem-se para suas futuras
profissões. Eles inventaram uma escola onde seus filhos não recusariam
freqüenta-la, pois ela respondia às suas necessidades fundamentais, próprias da
fase da adolescência: agir, crescer, ser reconhecido, assumir um lugar no mundo
dos adultos, adquirir status e papéis. Eles criaram empiricamente uma estrutura
de formação que seria da responsabilidade dos pais e das forças sociais locais,
conhecimento que se encontra na escola e na vida cotidiana. Inventaram uma
nova escola, baseada na Pedagogia da Alternância, onde há partilha e integração
do poder educativo entre os atores do meio, os pais e os formadores da escola.
Principal Financiador da Experiência/ da Organização
Recursos do governo Belga, através da SIMFR - Solidariedade Internacional dos
Movimentos Familiares de Formação Rural.
Recursos da Fundação Vítae - Projeto de apoio ao Curso de Mestrado em
Ciências da Educação "Formação e Desenvolvimento Sustentável", em parceria
com a Universidade de François Rebelais de TOURS-França, Universidade Nova
de Lisboa -Portugal, SIMFR e Universidade Católica de Brasília.
Informações sobre a Experiência
Características Gerais da Experiência
Localização: a UNEFAB é uma organização com alcance nacional.
Bases conceituais/ metodológicas/ princípios: crescimento da sustentabilidade
pedagógica, intensificar e ampliar o intercâmbio com instituições parceiras,
participação na melhoria e condição de vida dos projetos aplicados.
Introdução
A metodologia da alternância permite uma prática educacional concreta e viável
a partir da realidade das famílias agrícolas inseridas no meio rural brasileiro, na
qual crianças e adolescentes têm a chance de estudar e vivenciar a realidade em
que estão inseridos. A prática da alternância nos estudos garante a permanência
do vínculo familiar, as vivências culturais e auxilia no desenvolvimento de
práticas ecologicamente viáveis na relação homem/meio ambiente.
Alguns princípios:
- Associação como princípio da participação e do envolvimento das famílias com
os problemas da formação, do futuro dos jovens e do desenvolvimento local;
associação como meio concreto de responsabilizar-se pelo Plano de Formação da
Escola e pela gestão, uma forma de garantir os princípios político-pedagógicos
específicos da EFA;
- A Alternância como princípio metodológico, uma estratégia da ação
pedagógica, mais eficaz, mais apropriada à realidade do campo e da Orientação
Profissional de jovens rurais; e
- A formação integral da pessoa humana como uma das principais metas da
ação educativa em vista do desenvolvimento rural em bases sustentáveis.
Objetivos
61
Os objetivos da UNEFAB são:
- Representar e defender os interesses das EFAs filiadas, junto aos órgãos
municipais, estaduais, federais e internacionais.
- Fomentar e promover a comunicação e intercâmbio de experiências e de
materiais educativos entre as EFAs e suas entidades mantenedoras.
- Acompanhar e assessorar o trabalho das EFAs e suas associações, visando
assegurar a qualidade das atividades e conseqüentemente uma boa formação
dos jovens.
- Manter a unicidade do Projeto Educativo das EFAs, quanto aos seus princípios
filosóficos e metodológicos.
- Articular e assessorar a organização e funcionamento das associações locais e
regionais, tendo em vista o fortalecimento institucional e político das mesmas.
- Estabelecer parcerias, convênios, acordos, etc. com Instituições nacionais e
internacionais para o desenvolvimento e fortalecimento das ações promovidas
pelas EFAs.
- Estabelecer políticas e estratégias para questões de interesse comum em nível
nacional.
- Proporcionar momentos de estudos e reflexões sobre temas relacionados ao
trabalho das EFAs e outras questões afins.
Esta experiência, em particular, visa fortalecer a proposta da Pedagogia da
Alternância em novos municípios.
Funcionamento da Experiência
Alguns Instrumentos Pedagógicos Específicos da Porposta da UNEFAB
1 - Plano de Estudo
2 - Colocação em comum
3 - Caderno da realidade
Caderno didático
4 - Viagens e visitas de estudo
As intervenções externas
Atividades retorno
5 - Experiências
Visitas às famílias
Estágio
6 - Projeto Profissional
Caderno de acompanhamento ou da Alternância
Tutoria
7 - A Avaliação
Principais Dificuldades
- Reconhecimento pelo Governo Federal da Pedagogia da Alternância como uma
alternativa de formação para meio rural.
- Recursos financeiros.
62
Elementos de Tecnologia Social
- Aproximação entre teoria e prática.
- Elaboração de uma metodologia educacional baseada na realidade rural. Isso
implica em gerar um processo educacional no qual os alunos compreendam
melhor a sua própria realidade.
- Processo que une formação e desenvolvimento, ou seja, na medida em que o
aluno aprende, também está gerando melhores condições de produção na
propriedade de sua família.
Fontes de Informação:
página da organização: www.unefab.org.br
Gimonet, J.C (1998) A alternância na formação - Método pedagógico ou
novo sistema educativo? Tradução de Thierry De Burghgrave. Disponível em
http://www.unefab.org.br/home/artig_gimonet.htm, em 20/11/2004.
Begnami, João Batista (s/d) Instrumentos Pedagógicos da Alternância.
Disponível em http://www.unefab.org.br/home/eixostema.htm, em 20/11/2004.
Chaves, A. P. P. (2004) Educação e Desenvolvimento Social - uma análise
de sua relação em três experiências de pedagogia da alternância. Tese de
Doutoramento. Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Filosofia e
Ciências, da Universidade Estadual Paulista, Marília.
Observações
Não foi detalhado para a Oficina, porque não haviam confirmado apresentação.
Com a finalidade de reunir maior força política para defender a proposta da
Pedagogia da Alternância no Brasil, promover o intercâmbio de experiências e
buscar em conjunto as soluções de problemas comuns em nível nacional, a
UNEFAB vem buscando estabelecer parcerias com outras redes que trabalham
dentro da mesma proposta pedagógica, procurando fortalecer e ampliar o
trabalho das escolas que utilizam a metodologia da alternância. Neste sentido, a
UNEFAB e a ARCAFAR, rede que congrega as Casas Familiares Rurais - CFRs,
vêm construindo um processo de aproximação e relacionamento institucional,
através de reuniões, encontros, contatos, troca de materiais, visitas, etc,
tentando buscar na diversidade das experiências os pontos que nos unem e que
nos enriquecem mutuamente, respeitando as especificidades de cada rede. O
ponto de partida desta busca de aproximação, nasceu da necessidade de
apresentar uma proposta comum das EFAs e CFRs ao governo federal para o
reconhecimento nacional da Pedagogia da Alternância.
(página da organização)
3. Agricultores na pesquisa
[email protected] , [email protected]
(21) 253-8317 / Fax: (21) 233-8363
Informações sobre a Organização
AS-PTA Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa
63
Rua da Candelária, nº 09, 6º andar, CEP: 20091-020, Rio de Janeiro - RJ
http://www.aspta.org.br/
Breve Histórico
"A AS-PTA - Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa - foi
fundada no ano de 1984 e tem por objetivo a promoção do desenvolvimento da
agricultura brasileira com base nos princípios da agroecologia e no
fortalecimento da agricultura familiar. Trabalha com dois projetos de
desenvolvimento local no nível micro, no qual articulam-se vários objetivos
através da constituição de redes sociais locais de experimentação e de
disseminação de inovações.
No nível macro, a AS-PTA integra ativamente redes regionais e nacionais de
promoção da agroecologia, como a Articulação do Semi-árido Brasileiro, as
Jornadas Paranaenses de Agroecologia e a Articulação Nacional de Agroecologia"
(Página da Organização).
Principal Financiador da Experiência/ da Organização
Financiada por uma diversidade de instituições, que vão desde o poder público
às agências de cooperação internacional.
Informações sobre a Experiência
Características Gerais da Experiência
A experiência trabalha com o tema transversal da capacidade e da formação em
pesquisa dos agricultores, os chamados "agricultores-experimentadores".
Por meio de conhecimentos empíricos e cotidianos destes agricultoresexperimentadores, são elaboradas soluções satisfatórias a partir de uma
investigação conjunta e dos resultados obtidos por uma pesquisa de campo.
Posteriormente, tal conhecimento é trabalhado junto a outros agricultores que,
conseqüentemente, trocam também suas próprias experiências.
A experiência de formação de agricultores experimentadores se caracteriza pela
inclusão de estratégias, nos projetos da AS-PTA, que englobem o conhecimento
produzido pelos agricultores, além de estratégias que favoreçam a
sistematização - pelo próprio agricultor - do processo de aperfeiçoamento do
conhecimento adquirido através de um diagnóstico participativo, que busca na
cultura e no imaginário do povo as opções técnicas e econômicas a serem
discutidas, sendo que essa metodologia é desenvolvida pela AS-PTA desde sua
fundação.
A abrangência da atuação da organização é nacional, assim como a abrangência
de aplicação da metodologia.
Princípios:
- Diagnóstico participativo;
- Experimentação participativa;
- As soluções agroecológicas são específicas para cada produtor (conforme suas
economias);
64
- O produtor é um pesquisador e difusor de seus conhecimentos, o chamado
agricultor-experimentador;
- Analisar as variadas formas que os agricultores lidam com os problemas
identificados,
avaliando
estas
alternativas
com
vistas
às
futuras
experimentações para outros agricultores
Introdução
A formação de agricultores experimentadores tem o intuito de demonstrar que o
produtor pode ser um pesquisador e difusor de seus conhecimentos. Além disso,
que a construção de soluções técnicas é um processo coletivo que envolve todos
os agricultores interessados num determinado tema, juntamente com os
técnicos de apoio.
A formação de agricultores-experimentadores é conduzida através de seis
grandes eixos centrais:
- Experimentação dos agricultores e organização gremial no âmbito nacional;
- Experimentação dos agricultores e entidades sócio-econômicas;
- Experimentação dos agricultores e comunidades;
- Experimentação dos agricultores e mercado/comercialização;
- Experimentação dos agricultores e gestão de recursos naturais;
- Experimentação dos agricultores e pesquisa do setor público.
O problema-objeto está na criação de alternativas às pesquisas geradas
convencionalmente, para promover a solução dos muitos problemas enfrentados
e identificados pelos agricultores em suas propriedades de produção.
É preciso conhecer a realidade local que circunda cada grupo de agricultores e
uma aproximação entre os atores envolvidos, a fim de que se possam
estabelecer as necessidades e as dificuldades específicas enfrentadas pelos
agricultores, com possíveis soluções ou minimizações de seus problemas.
Objetivo
Construir propostas individuais de forma coletiva e compartilhada, a fim de que
o agricultor possa desenvolver suas próprias técnicas sem a intervenção de
instituições públicas ou privadas.
Atores envolvidos
Os atores da experiência são os agricultores-experimentadores, juntamente com
os agentes comunitários, técnicos e pesquisadores da AS-PTA.
Os agricultores experimentadores aparecem como identificadores de problemas
e fatores limitantes e como detectores de soluções. Eles se mobilizam para a
mudança, a fim de se adaptarem melhor ao entorno - que se encontra em
constante mutação.
Funcionamento da Experiência
A preocupação dos agricultores experimentadores é resolver seus problemas e os
da comunidade, tentando encontrar tecnologias que possam difundir para o
maior número de agricultores possíveis, integrando seus trabalhos.
65
O problema local é a base para definição de conteúdos dos experimentos.
Portanto, são os próprios agricultores experimentadores que definem os temas a
serem investigados, assim como as prioridades de execução, avaliação e
divulgação dos resultados.
A necessidade de circular informação, comunicar seus resultados, experiências,
dificuldades e metodologias são de interesse dos agricultores-experimentadores,
de modo que há preocupação em realizar intercâmbios entre membros de
diferentes regiões com o intuito de compartilhar conhecimentos e reflexões.
Institucionalização da prática
A AS-PTA se constituiu como uma Associação sem fins lucrativos com
personalidade jurídica própria, desde 1990. A metodologia de formação de
agricultores-experimentadores é um dos eixos da organização.
Principais Dificuldades
A priorização dos critérios é umas das dificuldades enfrentadas por estes
agricultores experimentadores, pois há diferenças de interesses, como por
exemplo: os aspectos econômicos, a gestão da força de trabalho, a diversificação
de cultivos e o mercado.
A diminuição dos custos de produção dos agricultores é o mais importante
incremento da produtividade física das lavouras. Aqui está a dificuldade na
modificação da utilização de produtos agrotóxicos por naturais, para o combate
às pragas e o controle da fertilidade do solo. Essa é uma questão que mobiliza
os agricultores-experimentadores.
Parcerias estratégicas
Na manutenção de diversificadas formas para o fortalecimento da
experimentação dos agricultores, é imprescindível a adaptação do processo a
outros grupos de outras localidades; para tanto se faz parcerias com as
seguintes instituições:
- Organização de produtores;
- Universidades;
- Setores público e privado;
- Institutos de pesquisas, entre outras.
Resultados
Há uma diversidade de publicações sobre experiências e reflexões sobre a
metodologia, inclusive uma série chamada "agricultores na pesquisa".
Segundo Edwards (1993) a realização de projetos de implementação de
tecnologias em conjunto com os agricultores gera mais segurança na introdução
de novas tecnologias.
Hocdé (1999) sintetiza:
"Os A/E [agricultores-experimentadores] são melhores conhecedores do local.
Nenhuma pesquisa, por melhor que seja, poderá conhecer tão profundamente o
local. A pesquisa sobre sistemas de produção pode facilitar o resgate dos
conhecimentos. Por outro lado, ninguém pode representar e defender melhor os
interesses dos agricultores do que eles próprios. Da mesma maneira, nenhum
66
A/E pode substituir a função dos pesquisadores. As vantagens comparativas dos
diferentes atores são cada vez mais claras. O encontro entre esses dois mundos
é imprescindível. O diálogo é mais factível quando os dois conseguem se
comunicar mais facilmente. Para isso, se faz necessário dotar agricultores de
conhecimentos de tal forma que um entenda o idioma do outro, para sua própria
capacidade de experimentar" (pp.33).
Perspectivas
O reforço das capacidades dos agricultores experimentadores é apresentado por
quatro linhas complementares à experiência:
I. "Apoio ao Processo" no qual está embutida a necessidade básica do aumento
da capacidade e da dinâmica de trabalho dos agricultores experimentadores, a
fim de que compartilhem conhecimentos entre si;
II. "Aumentar a Capacidade dos agricultores experimentadores com rigor" a
partir das falhas metodológicas encontradas, tentar corrigi-las para melhorar a
qualidade dos resultados obtidos, a fim de oferecer respostas válidas para um
âmbito desejável do espaço geográfico;
III."Estimular
as
interações
entre
pesquisadores
e
agricultores
experimentadore": envolvimento dos agricultores no processo de criação e
difusão de alternativas tecnológicas para melhorar os papéis e as funções de
cada um;
IV. "Sustentabilidade": assegurar a continuidade de um processo promissor para
que o desenvolvimento agrícola seja fortalecido e reconhecido para o
desenvolvimento sustentável.
Elementos de Tecnologia Social
Semelhante à Pedagogia da Alternância, esta experiência revela metodologias
para que os próprios agricultores desenvolvam instrumentos para
encaminhamento da investigação de suas questões identificadas na interação
com sua própria realidade. Esse se revela como um processo de
"empoderamento" em relação à produção de conhecimento.
Esse aspecto também revela uma questão relacionada com a criação de uma
nova relação entre técnicos tradicionais da extensão rural e os agricultores. Aí, o
componente de Tecnologia Social é a própria construção desse outro espaço de
interlocução, no qual não há "transmissão de conhecimento", mas sim,
"construção conjunta", troca.
Finalmente, o envolvimento dos agricultores na produção de conhecimento
acerca da sua realidade, faz com que o resultado desse processo - ou seja, o
conhecimento produzido - já esteja mais próximo do que podemos chamar de
Tecnologia Social, na medida em que responde, necessariamente, à uma
demanda da realidade concreta, já nasce como um conhecimento enraizado.
Fontes de Informação:
Página eletrônica da organização: http://www.aspta.org.br
Buckles, D. (1995). Caminhos para a colaboração entre técnicos e
camponeses. Rio de Janeiro: AS-PTA.
Edwards, R. J. A. (1993). Monitoramento de sistemas agrícolas como
forma de experimentação com agricultores. Tradução de John Cunha
Comeford. Rio de janeiro: AS-PTA.
67
Friedrich, K., Gohl, B., Singogo, L. e Norman, D. (1995). Desenvolvimento de
Sistemas Agrícolas - uma abordagem participativa na assistência a
pequenos agricultores. Rio de Janeiro: AS-PTA.
HOCDÉ, Henri (1999). A Lógica dos agricultores experimentadores: o caso
da América Central. Metodologias Participativas. Rio de Janeiro: AS-PTA.
68
ANEXO 2
Políticas Públicas e Tecnologia Social: reflexões a partir da oficina
Tecnologia Social e Agricultura Familiar24
Sistematizadora: Fabiana A. A. Jardim
Este texto tem como objetivo refletir sobre as aprendizagens possibilitadas pela
oficina “Tecnologia Social e Agricultura Familiar: semeando diferentes saberes”,
ocorrida em Brasília, nos dias 19 a 21 de outubro de 200425. Para além de
organizar os aspectos de TS que foram levantados durante a oficina, este texto
também tem como preocupação refletir sobre algumas questões envolvidas na
formulação de políticas públicas de TS.
A oficina está inserida numa série de quatro encontros que foram realizados
durante 2004, como parte das atividades de implementação do Centro Brasileiro
de Referência em Tecnologia Social (parceria Instituto de Tecnologia
Social/Ministério da Ciência e Tecnologia) que visam o desenvolvimento do
conceito de Tecnologia Social. Este foi o terceiro encontro realizado e tinha como
objetivo geral compartilhar experiências de agricultura familiar para refletir
sobre o diálogo de saberes e o uso de tecnologias na unidade familiar de
produção agrícola. De fato, a oficina tinha um objetivo bastante específico,
vinculado ao momento do desenvolvimento conceitual em que nos
encontrávamos: recolher elementos que nos permitissem qualificar como se dá a
geração de novos conhecimentos na unidade familiar, como se dá a introdução
de técnicas e tecnologias na unidade familiar e, o mais importante, quais são as
formas conhecidas e desejáveis de diálogo entre agricultores e técnicos.
Ainda que tal estratégia pareça demasiadamente fundamentada numa
metodologia “indutivista”, é importante explicitar que, pelo menos no primeiro
momento do trabalho do Centro Brasileiro de Referência em Tecnologia Social,
esta metodologia fazia todo o sentido. Estávamos diante de uma forma de
conhecer e intervir sobre o mundo que não estava legitimada e,
conseqüentemente, não erar plenamente reconhecida. Em outras palavras, era
preciso aprender a olhar as experiências portadoras/usuárias de TS e, para isso,
o caminho metodológico não podia deixar de partir da realidade: afinal, é a
realidade vivida pelas populações e ONGs que põe em questão nossas estruturas
de conhecimento e não o oposto e, por isso, não é olhando tais experiências com
os “óculos” de que já dispomos que seria possível conferir visibilidade a outras
formas de conhecer e intervir sobre o mundo. Daí a necessidade de um novo
“óculos”, o da Tecnologia Social.
Durante a preparação da oficina, a fim de organizar o conjunto de questões que
estávamos interessados em discutir, definimos quatro eixos que poderiam
articular os resultados das discussões coletivas. Os dois primeiros, sobre Ciência,
Tecnologia e Sociedade, visavam a identificação dos atores da produção de
conhecimento e estratégias de difusão científica. O terceiro, sobre o papel das
assessorias26, visava identificar os parâmetros de uma assessoria entendida
Estas reflexões, notadamente o que se refere às relações entre Estado e Sociedade, devem muito
ao diálogo estabelecido com o moderador das atividades, Cassio França, o que não permite atribuir
a ele a responsabilidade por quaisquer das posições aqui apresentadas.
25
A oficina foi promovida pelo Centro Brasileiro de Referência em Tecnologia Social (parceria
ITS/MCT), pela Secretaria de Ciência e Tecnologia para a Inclusão Social/MCT e pela Secretaria de
Agricultura Familiar/MDA.
26
O tema das assessorias, bem como o das lideranças, e seu papel de indução e articulação nos é
bastante caro. Porém, em nenhum dos três encontros temáticos realizados este ano logramos trazer
à tona tais conteúdos a partir da fala dos expositores. Estes, muitas vezes, eram os assessores ou
os líderes e, ainda que tenhamos formulado questões específicas sobre o assunto, nenhum deles se
sentiu à vontade para abordar o tema. Quando se fala de processos participativos, o tema das
lideranças ou das assessorias se transforma numa espécie de tabu, como se a simples formulação
da questão já pusesse em risco o caráter participativo dos processos: o tema causa desconforto e,
deste modo, é empurrado para fora dos discursos. Outra hipótese interpretativa é reconhecer que a
liderança ou a assessoria, quando não problematizada, simplesmente opera na realidade, sendo
24
69
como diálogo. Finalmente, sobre as formas de apropriação do conhecimento,
buscava-se identificar as pontes possíveis, ou seja, buscava-se identificar nas
experiências as maneiras por meio das quais lograram pôr em diálogo saberes
diferentes.
É possível afirmar, sem risco de exagero, que a oficina de TS e Agricultura
Familiar propiciou um dos momentos de discussão mais ricos dentre os
encontros realizados este ano. Para além da fecundidade do tema, acreditamos
que a maior acuidade na formulação das questões dirigidas às experiências foi
decisiva. Dito de outro modo, se revisitássemos os conteúdos dos encontros
passados, provavelmente seríamos capazes de distinguir um conjunto maior de
aspectos que nos interessam – justamente devido a maior clareza em relação ao
conceito de Tecnologia Social, e aos aspectos da realidade que ele nos permite
destacar.
Um aspecto importante a ser sublinhado, antes de passarmos à reflexão sobre
as aprendizagens geradas na oficina, é que diferentemente dos outros encontros
nos quais se buscou garantir a heterogeneidade dos participantes, a oficina de
TS e Agricultura Familiar contou com um grande número de representantes do
Poder Público, o que certamente tem conseqüências para a compreensão dos
resultados da discussão. O tom geral das discussões ficou enviesado pelas
necessidades e angústias de quem enfrenta o desafio de construir novas políticas
públicas. Por isso, esta reflexão procurará lidar, mais cuidadosamente, como o
conjunto de questões enfeixadas sob o tema “desafios da gestão pública”.
O texto não seguirá a ordem das exposições; como já dito acima, o objetivo aqui
é sistematizar algumas aprendizagens relacionadas ao universo da Tecnologia
Social. Na medida em que se trata de um processo de desenvolvimento
conceitual, tal sistematização revela-se sempre fundamental para refinar o olhar
dirigido à realidade.
Um primeiro ponto que merece destaque é que muitos dos temas levantados nas
oficinas anteriores voltaram a aparecer neste encontro. É possível apontar pelo
menos duas explicações para que isto tenha acontecido: a primeira delas se
relaciona à já referida maior acuidade de nosso olhar, voltado para os elementos
de Tecnologia Social presentes na experiência já a partir de algumas clarezas. A
segunda explicação se refere à “saturação”: aqueles que estão acostumados à
pesquisa de campo sabem que, em determinado momento, as falas e narrativas
começam a se repetir, reiterando posições sem agregar mais nada de novo. Não
é o caso de dizer que foi isto o que aconteceu durante a oficina, pois nosso
objetivo era mesmo qualificar alguns temas que já definíramos como
importantes quando da preparação das atividades. Mas, de todo modo, o
desenvolvimento de um conceito a partir de encontros e debates demonstra que
só é uma metodologia sustentável no médio prazo quando há este constante ire-vir entre teoria e prática e as questões que se propõe para debate vão se
tornando cada vez mais complexas.
Neste encontro, as discussões se concentraram em dois principais eixos: 1)
necessidade de afirmação de outros atores de conhecimento que não apenas os
que estão inseridos no sistema de CT&I e 2) desafios de reinvenção das relações
entre Governo e Sociedade, que passam pelas inovações de arranjos
institucionais.
Mas o que sobressai de todas as discussões, principalmente porque a Agricultura
Familiar passa a fazer parte de uma certa pauta social (do mesmo modo que
Agroecologia, Desenvolvimento Local, Responsabilidade Social, entre tantos
outros termos que têm circulado), é o potencial que tais “termos em disputa”
possuem para provocar espaços de discussão. Eles possibilitam a constituição de
um “palco”, menos amplo que discussões macro-estruturais, e incitam diferentes
impossível apanhá-la em práticas discursivas. Permanece, assim, o desafio de construir estratégias
que permitam apanhar tais conteúdos.
70
atores a participar da “cena” – clareando conceitos e valores, delimitando
semelhanças e diferenças e, enfim, aprofundando o sentido da democracia em
nosso país. Deste modo, o que emerge como principal aprendizagem para o
desenvolvimento do conceito de Tecnologia Social é, novamente, a reafirmação
da importância da pluralidade e da promoção de espaços de diálogo para a
experimentação e a invenção de novas (e melhores) práticas sociais.
Há outro ponto, de certo modo relacionado ao parágrafo anterior, que se tornou
mais claro após as discussões realizadas na oficina, qual seja, o duplo caráter do
conceito de Tecnologia Social, há um só tempo analítico e estratégico. O próprio
conceito, tal como têm sido desenvolvido, confronta-se com a necessidade de
conciliar estas duas dimensões. Do ponto de vista analítico, o conceito se mostra
interessante para ressaltar alguns aspectos da realidade, principalmente no que
se refere às relações entre Ciência, Tecnologia e Sociedade. De fato, neste ponto
de processo, quando já é possível identificar alguns parâmetros de Tecnologia
Social, que nos permitem distinguir nas diversas experiências quais são as
características que as aproximam do universo das Tecnologias Sociais, pode-se
dizer que, analiticamente, já houve importantes avanços27. Por outro lado, há
um preocupação de que o conceito não seja estanque, mas que articule ao redor
de si preocupações e práticas. Deste modo, o conceito acaba assumindo também
uma dimensão estratégica, na medida em que articula diferentes atores, e
provoca à constante revisão dos termos nos quais se dão as relações entre
Ciência, Tecnologia e Sociedade – tecnologia social acaba se tornando, também,
um “termo em disputa” e, como tal, conforme ao redor de si um campo de
dissenso.
Ainda refletindo sobre sua dimensão estratégica, o conceito de tecnologia social
pode operar como provocador da efetivação de direitos ligados à CT&I. Neste
sentido, não se trataria de afirmar a tecnologia social, em si mesma, como um
direito social: o “campo de dissenso” conformado por ela é que tornaria possível
a efetivação de alguns direitos sociais, tais como o direito à escola, à
informação, ao conhecimento etc. Embora chamar a atenção para este aspecto
possa parecer preciosismo, é importante que haja clareza a este respeito uma
vez que o conceito de TS, tal como desenvolvido até aqui, afirma a importância
de um Estado que organiza e gerencia a efetivação de direitos sociais. Ademais,
durante a oficina, um dos pontos que apareceram se refere, justamente, à
necessidade de movimentos sociais bem fundamentados em suas análises e
diagnósticos – deste modo, a clareza e a precisão conceituais não devem ser
vistas como preciosismo, mas como passo necessário à construção de políticas
públicas efetivas.
Uma questão importante, surgida durante a oficina, pode ser formulada em
relação ao que já foi exposto. Ao falar da disputa entre dois diferentes modelos
de agricultura, quais sejam, a agricultura familiar e o agronegócio, Pedro
Christoffoli, da Concrab, sublinhou a desigualdade dos termos nos quais se dá a
disputa: enquanto o modelo do agronegócio (baseado nas técnicas
químicas/genéticas/mecânicas) já está consolidado e legitimado, o modelo da
agricultura familiar tem que buscar esta legitimidade por meio da ação de atores
que estão “marginalizados” em relação ao sistema econômico. Como foi
formulado por uma intervenção durante a oficina, embora constituam a maior
parte da população do campo e embora contribuam com grande parte da
produção agrícola, os agricultores não são visados por políticas públicas de
Agricultura: constituem-se numa “maioria minoritária”.
Gostaria de chamar a atenção para um dos aspectos presentes na interpretação
de Pedro, na medida em que está bastante relacionada com a própria noção de
Tecnologia Social e as transformações que ela pode provocar: de algum modo,
ao reconhecer que a desigualdade no campo de disputas acaba por dificultar
Para uma apresentação detalhada da metodologia e do conceito de TS desenvolvido pelo CBRTS,
ver Otero e Jardim (2004).
27
71
muito a construção da legitimidade de novos modelos, Pedro explicita alguns dos
limites da democracia brasileira e nos provoca a pensar se, realmente, a
existência de um campo plural de diálogo é suficiente para a construção de
medidas. Em outras palavras, a realidade que a fala de Pedro define é a da
política como um embate de estratégias cuja eficácia está condicionada pelo
poder de quem as põe em ação. Uma vez que a definição de TS enfatiza a todo o
momento a participação e um dos princípios de TS vincula estreitamente
aprendizagem, participação e transformação social, o diagnóstico de Pedro
provoca a reflexão se não seria ingênua esta confiança na pluralidade e no
espaço público. É como se a desigualdade criada pelos níveis de participação na
economia tornasse inviável a igualdade da cidadania no campo da política e
tornasse qualquer mudança praticamente impossível sem uma precedente
revolução na estrutura econômica. Fica aberta a questão: será que nossa leitura
é excessivamente otimista e ingênua ou, ao contrário, trata-se de uma postura
diante do que é a política que não deve ser abandonada?
Um último ponto que gostaria de destacar, ainda sobre políticas públicas e suas
relações com tecnologia social, refere-se ao problema da escala. Diversas vezes
nos deparamos com esta questão: falar em tecnologia social significa pensar em
organizar intervenções de modo a permitir sua re(a)plicação? Se, de um lado,
reconhecíamos a necessidade de organizar e sistematizar experiências,
principalmente com o objetivo de permitir sua difusão, de outro lado
recusávamos a idéia de que cada experiência sistematizada pudesse se
expressar em uma espécie de “pacote”, contendo os passos necessários para sua
reaplicação. De fato, no centro desta questão está a dificuldade de conciliação de
um modelo de produção de conhecimento que enfatiza os resultados, conferindo
ao processo uma posição secundária e o esforço pela criação de novos modelos,
que, olhando cuidadosamente o processo permitam aprendizagens que,
disseminadas, podem ser refletidas, apropriadas, reorganizadas e transformadas
de acordo com as necessidades de cada um dos atores que a elas tenham
acesso. As palavras chaves, portanto, menos que reaplicação, são
sistematização do vivido, difusão/comunicação, acessibilidade ao corpo de
conhecimentos gerados por cada uma das experiências e pluralidade e
experimentação metodológicas28. Tais termos se contrapõem à idéia de
reaplicação, na medida em que esta reitera uma concepção de Ciência que,
justamente, a discussão de tecnologia social procura questionar.
Seria impossível, mesmo que a tentação seja grande, tentar registrar e refletir
sobre todos os aspectos interessantes que apareceram durante a oficina; afinal,
o relatório elaborado visa, justamente, atender a esta expectativa. Deste modo,
esse texto se encerra com a apresentação de algumas questões, que podem
orientar a continuidade do desenvolvimento conceitual.
A primeira questão, que pode ser relacionada ao que aqui chamamos de
problema da escala se refere às diferenças entre um modelo de conhecimento
que organiza para depois reaplicar, e, de um certo modo, “privatiza” o
conhecimento gerado pelas experiências e um outro modelo, que não prescinde
da organização dos conhecimentos, mas está pautado por relações hierárquicas
de troca e partilha de conhecimentos. Seria importante esclarecer e precisar
quais são estas diferenças. Além disso, tais diferenças podem ser fundamentais
para a aproximação entre tecnologia social e o universo da Economia Solidária.
Uma outra questão se refere à concepção de política que está na base da idéia
de tecnologia social. Se a concepção de política for a de um embate de
estratégias, faz-se necessário rever o peso dado à organização e a ação coletiva,
que constantemente é reiterado na definição e nos parâmetros de TS29. Nesta
Durante a oficina, esta idéia de pluralidade e experimentação metodológicas apareceram,
especialmente, na fala de Paulo Petersen, que apresentou a experiência dos agricultoresexperimentadores desenvolvida pela AS-PTA.
29
Ver Instituto de Tecnologia Social, 2004.
28
72
perspectiva, também é preciso refletir sobre quanto a TS deve estar dependente
à necessidade de novos arranjos institucionais dentro do Estado, pois a
concepção de política como um embate de estratégias torna qualquer “aliança”
instável e sujeita às oscilações de poder.
De outro lado, e concluindo essas reflexões, se a concepção de política for a de
um campo de dissenso, que torna possível a construção de medidas e
referenciais comuns, a própria noção de tecnologia social aparece como,
essencialmente, vinculada à política e ao fazer político. A questão que se propõe,
então, é esclarecer qual seria a riqueza dos momentos de participação, os
momentos fundadores que, passados, correm o risco de gerarem estruturas que
simplesmente se reproduzem. Se uma das preocupações da tecnologia social é
gerar processos que continuamente se alimentem, como se produzem processos
que são eficazes para a manutenção da participação, ainda que os termos da
participação se modifiquem? Em outras palavras, se o desenvolvimento do
conceito de TS, até agora, obteve sucesso em identificar alguns termos para
caracterizar o início dos processos organizativos, quais seriam os caminhos para
que pudéssemos criar termos que caracterizassem processos sustentáveis? Esta
questão, acredito, coloca-se tanto para a tecnologia social quanto para as
aporias enfrentadas pela democracia brasileira.
Referências Bibliográficas
ARENDT, Hannah
Universitária
(1999) A condição humana: Rio
de Janeiro, Forense
INSTITUTO DE TECNOLOGIA SOCIAL (2004) Caderno de Debates – Tecnologia
Social no Brasil: São Paulo, Instituto de Tecnologia Social
OTERO, Martina R. & JARDIM, Fabiana A. A. (2004) “Reflexões sobre a
construção do conceito de Tecnologia Social”. Em: Tecnologia Social: uma
estratégia para o desenvolvimento: Brasília, Fundação Banco do Brasil
73
ANEXO 3
Programação da Oficina
Oficina “Tecnologia Social e Agricultura Familiar: Semeando Diferentes Saberes”
Brasília, 19 a 21 de outubro de 2004
Centro Cultural de Brasília, Av. L2 Norte Qd. 601-B – Brasília, DF
OBJETIVO GERAL
O objetivo geral da oficina é compartilhar experiências de agricultura familiar
para refletir sobre o diálogo de saberes e o uso de tecnologias na unidade familiar de
produção agrícola. Com isto, pretende-se compreender melhor como opera um dos
princípios de Tecnologia Social já identificados pelo Instituto de Tecnologia Social – ITS,
em nove meses de trabalho, qual seja, que “aprendizagem e participação são processos
que caminham juntos”30.
OBJETIVOS
ESPECÍFICOS
-
Caracterizar como se dá a geração de conhecimentos e tecnologias no interesse
da agricultura familiar;
-
Caracterizar como se dá a introdução de tecnologias nas unidades produtivas
familiares;
-
Identificar formas adequadas de diálogo entre agricultores e técnicos, no
interesse da agricultura familiar.
PÚBLICO-ALVO:
-
Representantes de ONGs
-
Representantes do Poder Público
-
Representantes de instituições financiadoras de CT&I
-
Representantes de Institutos de Pesquisa, Instituições de Ensino e Extensão
-
Agricultores familiares
PROGRAMAÇÃO
Apresentação, 19/10, às 14h
- “A construção do conceito de TS: os Encontros para discussão e sistematização de
conhecimentos sobre Tecnologia Social” – Fabiana Jardim, Centro Brasileiro de Referência
em Tecnologia Social/ITS
- “Desenvolvimento conceitual: Tecnologia Social até agora” – Martina Otero, Centro
Brasileiro de Referência em Tecnologia Social/ITS
Painéis, 19/10, às 15h30
Dinâmica de apresentação e momento de troca de experiências entre os participantes do
Encontro
Mesa de abertura, 19/10, às 19h30
Tema: “Tecnologia Social: conhecimento e sociedade”
30
Ver Centro Brasileiro de Referência em Tecnologia Social, “Síntese da Reflexão Conceitual até 10/08/2004”,
mimeo.
74
-
Valter Bianchini – Secretário da Agricultura Familiar/MDA
-
Rodrigo Rollemberg – Secretário da Ciência e Tecnologia para a Inclusão Social/MCT
-
Sônia M. Portella Kruppa – Secretária-adjunta da Secretaria Nacional de Economia
Solidária/MTE
-
Francisco Hercílio Matos – Secretaria da Ciência e Tecnologia para Inclusão
Social/MCT
-
Irma Passoni – Gerente Executiva do Instituto de Tecnologia Social
-
César Medeiros – Deputado Federal/MG
-
Manuel Barral Neto – Diretor de Programas Setoriais do Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico, CNPq
-
Clayton Campanhola – Presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária Embrapa
-
Aliomar Arapiraca– Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira, CEPLAC
-
Paulo Egler – Representante da Academia Brasileira de Ciência , ABC
Primeira sessão, 20/10, às 9h
Tema: Práticas solidárias: o papel das instituições articuladoras
9h – 9h15: Apresentação da pauta do dia
9h15 – 10h15: Apresentação de experiência: Pedro Christoffoli (Área de Produção da
Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil – CONCRAB)
10h15 – 10h50: Questões para o debate: Sônia M. Portella Kruppa (Secretária-adjunta,
Secretaria de Economia Solidária/MTE)
10h50 – 11h10: Pausa para o café
11h10 – 12h40: Plenária
12h40 às 14h: Horário de almoço
Segunda sessão, 20/10, às 14h
Tema: Pedagogia da Alternância: instrumento para promoção do desenvolvimento da
agricultura familiar
14h – 15h20: Apresentação de experiências: Escolas Famílias Agrícolas e Casas
Familiares Rurais – Leônidas dos Santos Martins (Presidente da Associação das Casas
Familiares Rurais – Arcafar/ PA) e (União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas do Brasil
– UNEFAB)
15h20 – 15h50: Questões para o debate: João Batista Queiroz (Universidade Católica de
Brasília)
15h50 – 16h10: Pausa para o café
16h10 – 17h30: Plenária
Terceira sessão, 21/10, às 9h
Tema: Inovações nas tradições da agricultura familiar: O enfoque da Agroecologia
9h – 9h15: Apresentação da pauta do dia
9h15 – 9h45: Exposição: Relação da Pesquisa com Assistência Técnica e Extensão Rural –
Eros Marion Mussoi (Epagri (Santa Catarina)/Univ. Federal de Santa Catarina e SAFDater/Secretaria da Agricultura Familiar – MDA)
9h45 – 10h30: Exposição: Princípios da Agroecologia – José Antonio Costabeber
(Emater/RS)
75
10h30 – 10h50: Pausa para o café
10h50 – 11h40: Apresentação de experiência: Paulo Petersen (Assessoria e Serviços a
Projetos em Agricultura Alternativa, AS-PTA)
11h40 – 12h: Questões para o debate: Cyra Malta (Universidade Estadual de Campinas,
Unicamp)
12h – 13h: Plenária
Quarta sessão, 21/10, das 14h30 às 16h30
Tema: Quem ensina, quem aprende? Aprendizagens e desafios da assistência técnica e
da extensão rural
-
Apresentação da proposta de trabalho – Moderação: Cassio França
-
Trabalhos coletivos – plenária ou grupos
-
Organização do vivido
-
Encaminhamentos
CARÁTER
Gratuito com inscrição e confirmação de presença por telefone do Centro Brasileiro de
Referência em Tecnologia Social – (11) 31516499 e (11) 31516419 ou pelo endereço
eletrônico [email protected] .
Promoção: Centro Brasileiro de Referência em Tecnologia Social – CBRTS/ITS,
Secretaria para Inclusão Social – SECIS/Ministério da Ciência e Tecnologia, Secretaria de
Agricultura Familiar – SAF/Ministério do Desenvolvimento Agrário
Apoio: Comissão Executiva do Plano de Lavoura Cacaueira - CEPLAC
Relatoria: Cyra Malta – Unicamp
76
ANEXO 4
Formulário para Apresentação nos painéis
NOME
Endereço:
DA
NOME
INSTITUIÇÃO
DO PROJETO
Informações sobre a Telefone:
instituição
Página eletrônica:
Pessoa para contato:
Contexto
Diagnóstico
Características da
intervenção
Resultados
Aspectos de
Tecnologia Social
Explicação sobre os campos:
1. Contexto: algumas informações sobre o lugar no qual a instituição atua e quando
começou a atuar (por exemplo: a instituição atua no sertão da Bahia, na zona do
semi-árido, desde 1945).
2. Diagnóstico: algumas informações sobre o problema identificado pela instituição
(por exemplo: a atuação teve início quando, após perderem a produção com a seca,
um grupo de agricultores se reuniu para constituir um fundo de pesquisa).
3. Características da intervenção: algumas informações sobre as ações da instituição
(por exemplo: capacitação, assessoria técnica, financiamento, intercâmbio...). Há
espaço para breves descrições de como se dá a intervenção.
4. Resultados: podem ser descritos por meio de dados quantitativos e/ou avaliações
gerais de mudanças provocadas pela intervenção (por exemplo: depois da
intervenção, não houve mais perda total de produção, a despeito da ocorrência de
secas e também se observou uma melhoria de 30% na renda média dos
agricultores).
5. Aspectos de Tecnologia Social: este campo é mais uma provocação, para vocês já
irem “esquentando os motores” para a oficina. Gostaríamos que vocês apontassem
alguns aspectos da experiência que vocês imaginam que têm relação com Tecnologia
Social (por exemplo: sustentabilidade ambiental e econômica, melhoria da qualidade
de vida...).
77
ANEXO 5
Lista de Participantes e Instituições
NOME
Antônio Avelar da Rosa Schmidt
Adilson Cabral
Aelson Silva de Almeida
Assis Marinho Carvalho
ENTIDADE/ASSOCIAÇÃO
MCT/SECIS/CGSAN
Instituto de Formação e Assessoria Sindical Rural
Ministério da Ciência e Tecnologia - MCT
EMBRAPA - Hortaliças
Associação do Desenvolvimento Local Integrado e
Carlos da Silva Matias
Claudia Queiroz Gorgati
Edson Guiducci Filho
Eleupéria Guerra Pacheco Mendes
Eloisa Elena Cangiane
Emanuel José da Silva
Eny Therezinha da Motta Amadeu
France Maria Gontijo Coelho
Igor Simoni Homem de Carvalho
Iracema Ribeiro Miranda
Joana D' arc Aguiar
Joana Paula Costa Cardoso e Andrade
Juliana Andréa Oliveira Batista
Maria Del Carmen Santiago Lopez
Sustentável de Poço Redondo/SE
CNPq
EMBRAPA
EMATER - DF
MCT/SECIS/CGSAN
MCT/SECIS/CGSAN
Caixa Econômica Federal
UFV
ISPN - Instituto Sociedade População e Pesquisa
ABIPTI
Instituto de Formação e Assessoria Sindical Rural
SEDUP - Serviço de Educação Popular
EMBRAPA
FINEP - Financiadora de Estudos e Projetos
Associação para o Desenvolvimento de Jussaral e
Maria Presciliana de Brito Ferreira
Paulo Gabriel Soledad Nacif
Renara Guedes Araújo
Rodrigo Almeida Noleto
Sônia Cascelli
Sônia Maria Portella Kruppa
Soraya Rashid Bruxel
Walesca Barbosa
Áreas Circunvizinhas
Escola de Agronomia da UFBA
MCT/SECIS/CGSAN
Ministério do Meio Ambiente - MMA
EMATER - DF
Secretaria Nacional de Econômia Solidária
Câmara dos Deputados
ABIPTI
78
Instituto de Tecnologia Social
Conselho Deliberativo
Uraci Cavalcante de Lima (Presidente)
Maria Lúcia Barros Arruda (Vice-presidente)
Rogério Cezar Cerqueira Leite
Moysés Aron Pluciennik
Jorge Nagle
João Eduardo de M. P. Furtado
Conselho Fiscal
Almir Roveran
Marli Aparecida de Godoy Lima
José Maria de Sousa Ventura
Suplentes do Conselho Fiscal
Antônio Lellis
Maria Aparecida de Souza
Débora de Lima Teixeira
Gerente Executiva
Irma Rossetto Passoni
Gerente de Projetos
Alcely Strutz Barroso
Consultores Técnicos
Gerson José Guimarães
Martina Rillo Otero
Fabiana Augusta Alves Jardim
Philip Hiroshi Ueno
Atendimento
Edilene Luciana Oliveira
Expediente
Coordenação da atividade:
Fabiana Augusta Alves Jardim
Relator:
Cyra Malta Olegário da Costa
Colaboração na relatoria e revisão:
Fabiana Augusta Alves Jardim
Equipe do ITS/CBRTS
Alcely Strutz Barroso, Beatriz Mecelis Rangel,
Edilene Luciana Oliveira, Fabiana Augusta Alves
Jardim,
Fabiana Cunha, Gerson José da Silva
Guimarães, Irma Rossetto Passoni, Martina Rillo
Otero, Philip Ueno
Contato
Instituto de Tecnologia Social
OSCIP nº 13.0002.00/03, publicado no
DOU em 26 de novembro de 2003.
Rua Rego Freitas, 454 – cj. 73
Centro – São Paulo/SP
CEP: 01220-010
Fone/Fax:
(011) 3151-6499 e 3151-6419
e-mail: [email protected]
Comunicação
Beatriz Mecelis Rangel
79