A multa como instrumento de disciplina no condomínio
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A multa como instrumento de disciplina no condomínio
Informativo do Schneider Advogados Associados - Ano 2 - Nº 11 - Novembro/Dezembro 2008 Vida em condomínio É muito grande o desafio de se manter a ordem em um espaço onde o domínio é comum, e a propriedade é por todos partilhada. Nem sempre há facilidade na aplicação da popular expressão “o meu direito termina onde começa o dos outros”, e a prova disto são os freqüentes conflitos envolvendo condôminos. Quando o bom senso é deixado de lado e o comportamento de um ou mais condôminos passa a perturbar ou colocar em risco o restante da sociedade comunheira, o síndico deve utilizar as normas contidas na Lei e, especialmente, na Convenção para solução dos conflitos. Um destes instrumentos passou a ter especial importância a partir do Código Civil de 2002: a aplicação de multas punitivas e de caráter disciplinatório. Síndicos com uma Convenção já atualizada a estes preceitos passaram a ter neste dispositivo importante aliado para a manutenção da paz nos condomínios. Evidente que elas não podem ser aplicadas indistintivamente nem podem servir de instrumento para privilégio de uns em detrimento de outros, e é por isso que abordaremos este tema na matéria de capa da 11a edição de nosso informe. Giovani Oliveira Gerente Geral do Schneider Advogados Associados A multa como instrumento de disciplina no condomínio Criar e manter um ambiente condominial adequado não é fácil. O Código Civil preocupou-se em conceder meios para que o próprio condomínio se defendesse de transtornos oriundos de comportamentos de seus integrantes e o síndico tem a responsabilidade de fazer uso desses instrumentos em benefício da coletividade. Mas, embora os condomínios tenham a possibilidade de punir quaisquer atos que atentem à segurança, saúde e sossego, nota-se que muitos síndicos não fazem o uso correto da multa para a manutenção da ordem interna. As transgressões mais usuais são: barulho excessivo; estacionar veículo em local incorreto; alteração das partes externas; e danos em elevadores, salão de festas e outras partes ou bens comuns. O Código Civil dispõe, genericamente, sobre três tipos de multas: (a) multa de até cinco quotas por descumprimento de deveres condominiais – se houver previsão na Convenção, e que pode ser aplicada pelo síndico. Obs.: essa é a única multa que, desde que aprovada em Assembléia por 2/3 dos condôminos, pode ser aplicada mesmo se não houver previsão na Convenção; (b) multa de até cinco quotas por descumprimento reiterado de deveres – essa multa somente pode ser aplicada se aprovada em Assembléia por ¾ do condomínio; (c) multa de 10 quotas por descumprimento reiterado de deveres que gerem incompatibilidade de convivência com os de- mais – essa multa somente pode ser aplicada se aprovada em Assembléia por ¾ do condomínio. Importante que as disposições da Convenção esclareçam todos os detalhes para a cobrança de multa, como a existência e forma de advertência prévia, eventual gradação de multas, critério de reiteração, recurso contra as multas e outros detalhes que, embora não sejam abordados pela Lei, são essenciais para que a multa não seja anulada pelo infrator. Assim como não se deve aplicar multa para tudo que acontece, constatase que é igualmente insuportável o caos que se gera por não agir oportunamente para conter condôminos que não respeitam os demais. Deve-se encontrar o meio termo, ou seja, agir com razoabilidade e no momento certo. Por fim, recomenda-se a leitura do artigo “Aplicação de multas em condomínios”, de autoria do Dr. André Luiz Junqueira, disponível no site www.schneiderassociados.com.br. Recente julgamento do STJ sobre uso exclusivo de parte comum Uso do terraço pelo apartamento de cobertura, locação de empena lateral para publicidade, locação de terraço para instalação de antenas de telefonia e outras similares são situações que corriqueiramente são enfrentadas no diaa-dia da gestão condominial, e não são raros os casos onde a questão acaba por ser direcionada ao Judiciário. Em uma destas demandas, recentemente, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Recurso Especial n° 281.290 – RJ, emitiu importante decisão sobre a utilização de parte comum de forma exclusiva por parte de um condômino. A importância da decisão está no fato de se reafirmar que não há necessidade de se exigir aprovação de todos os condôminos para ceder determinada parte comum, o que contraria o posicionamento de diversos advogados, juizes e administradoras de condomínios, que sustentam que qualquer cessão de parte comum deve ser aprovada por todos os condôminos. Todavia, a dificuldade está na quase impossibilidade de uma aprovação unânime de um condomínio. No caso julgado pelo STJ, a Assembléia Geral do condomínio aprovou, por mais de 2/3 das frações ideais, uma alteração da sua Convenção. Essa alteração, que foi registrada em Cartório de Registro de Imóveis, consistiu em ceder diversos depósitos localizados em partes comuns para os proprietários, sendo que cada um deles permaneceu com um depósito. Inconformados, dois moradores propuseram uma ação visando anular a Convenção recém alterada, 2 sob o motivo de que a Convenção anterior havia sido aprovada por unanimidade e que o art. 3° da Lei Federal n° 4.591/1964 determina que as partes comuns são insuscetíveis de utilização exclusiva por qualquer condômino. Cabe à Convenção determinar a forma de utilização das partes comuns Ao chegar ao STJ, dois fatores foram decisivos para que a ação fosse julgada improcedente. O primeiro fator foi de que cabe à Convenção determinar a forma de utilização das partes comuns, só podendo ser alterada com anuência de, pelo menos, 2/3 da totalidade do condomínio. Repetindo as palavras no Ministro Luis Felipe Salomão, relator do recurso: “... se de um lado dispõe o art. 3°, da Lei dos condomínios, na sua parte final, que as áreas comuns ‘serão insuscetíveis de utilização exclusiva por qualquer condômino’, de outro determinou que a Convenção de condomínio estabeleça o “modo de usar as coisas e serviços comuns’, art. 3°, § 3°, “c”, da mencionada Lei”. Outro fator que impediu o sucesso da ação anulatória foi o fato da ação ter sido proposta após um longo período de tempo, pois a alteração da Convenção que se pretendia anular fora realizada em 1993. Segundo o relator, a demora na adoção de providências criaram a expectativa de que a situação havia sido aceita por todos e alterar o estado atual das coisas atentaria contra o princípio da boa-fé objetiva. Essa condição é denominada pelos juristas como suppressio, e consiste no não exercício de um direito por tempo suficiente para gerar uma expectativa que não há direito ou, pelo menos, de que não há mais interesse nesse direito. O instituto da suppressio encontra seus alicerces na boa-fé objetiva. Compartilha-se desse entendimento, uma vez que não há qualquer previsão legal da exigência de aprovação unânime para esse tipo de deliberação em Assembléia, bastando aprovação por 2/3 do condomínio para se alterar a Convenção (art. 1.351, 1ª parte, do Código Civil Brasileiro). Considera-se importante a recente decisão do Superior Tribunal de Justiça pela aplicação dos princípios de Direito em benefício de uma maior autonomia para o próprio condomínio definir o modo de uso de suas partes comuns. Garantia locatícia: Fiança e a penhorabilidade do bem de família Fernando Galba* Inicialmente, devemos salientar que a Lei 8009/90, que trata da impenhorabilidade do bem de família, visa proteger o único bem da família com fins de moradia permanente, evitando que este seja alcançado por dívidas contraídas pelo casal ou entidade familiar, ressalvado algumas exceções. Originalmente, não estava prevista na referida lei, como exceção à impenhorabilidade, o único bem de família do fiador decorrente da obrigação de fiança concedida em contrato de locação. E que somente foi incluída após a criação da Lei 8245/91 - Lei do Inquilinato, cujo objetivo foi resguardar a fiança como garantia locatícia, passando o artigo 3º da Lei 8009/90 a ter o inciso VII, que trata sobre a questão. A discussão sobre o assunto surgiu a partir do momento em que houve uma alteração no artigo 6º da Constituição Federal, por meio da Emenda Constitucional (EC) n.º 26 de 2000. O citado artigo dispõe sobre os direitos sociais, e com modificação trazida pela emenda foi incluída a moradia como um dos direitos fundamentais, o que culminou com o entendimento por parte de alguns juristas de que a partir daquele momento a penhorabilidade do bem de família do fiador seria inconstitucional. O referido entendimento se dá pelo fato de que, com a inclusão da moradia como direito fundamental, a penhora do imóvel do fiador com a obrigação de fiança decorrente de contrato de locação não poderia ser realizada. Afinal, com o fato do direito à moradia ser fundamental e estar na Constituição Federal, isto estaria se sobrepondo a uma Lei Ordinária que, “hierarquicamente”, está abaixo da Carta Magna. Tal questão trouxe uma grande insegurança no mercado imobiliário, especificamente no que diz respeito à locação de imóveis urbanos, tendo vista que a fiança, uma das modalidades de garantia no contrato de locação, não teria mais eficácia diante do novo entendimento. Decisões tendem pela possibilidade de penhora do bem do fiador Com isso, a tese da inconstitucionalidade da penhora do único bem imóvel do fiador foi utilizada em um processo, e chegou até o Supremo Tribunal Federal por meio do Recurso Extraordinário (RE) n.º 407688, e após amplos debates no Plenário do Tribunal, os Ministros decidiram em maioria reconhecer a constitucionalidade e validade da penhora, no sentido de que o art. 3º, VII, da Lei 8009/90 não violaria o disposto no art. 6º da Constituição Federal, conforme transcrição de trecho do julgado: “...o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 407688/SP, considerou ser legítima a penhora do bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, ao entendimento de que o art. 3º, VII, da Lei 8009/90 não viola o disposto no art. 6º da CF/88 (redação dada pela EC 26/2000)”. (STF - RE-AgR 415626/SP, Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Julgamento: 05/09/2006, Órgão Julgador: Primeira Turma). Tal questão, diante do referido julgamento, foi pacificada no sentido de ser constitucional a penhora do único imóvel do fiador, decorrente da obrigação de fiança no contrato de locação, sendo certo que os Tribunais Estaduais estão seguindo esta tendência. Concluímos que o nosso entendimento segue o referido posicionamento, em conformidade com a fundamentação do julgamento citado, notadamente pela constitucionalidade e aplicabilidade do art. 3º, VII, da Lei 8.009/90, o que trouxe uma maior tranqüilidade no mercado imobiliário. Pois, assim, a fiança como modalidade de garantia no contrato de locação continuaria tendo a mesma eficácia, ou seja, o imóvel do fiador poderia ser alcançado por eventual dívida decorrente do contrato de locação. * Fernando Galba é advogado do Schneider Advogados Associados 3 Garagem está vinculada a apartamento, mas pode ser vendida escritório deixaram de resultar em concluiu que o propositura da ação condenação da empregadora devido à na Justiça Comum, antes da vigência prescrição bienal da ação movida pela da referida emenda, não altera a Vaga de garagem de condomínio pode trabalhadora. Ao apreciar o recurso de fluência do prazo prescricional bienal ser cedida a outro condômino. Esse é o revista da autora, a Primeira Turma do previsto Constituição Brasileira” entendimento da 3ª Turma do Superior Tribunal Superior do Trabalho adotou o (RR–1112/2005-017-15-00.0). Tribunal de Justiça, determinando entendimento predominante no TST de Fonte: Tribunal Superior do Trabalho a retificação do registro de imóvel que o prazo para reclamar indenização pertencente à C.C.A., para que dele por dano moral decorrente de relação conste a sua vaga de garagem na de emprego é de dois anos após a Direito de uso de sobrenome em negócio escritura. A C.C.A acionou o estado do extinção do contrato de trabalho, O direito de uma sociedade sobre Rio de Janeiro para retificar o registro e não o trienal da Justiça Comum, marca registrada não pode impedir imobiliário do apartamento 710, de relativo à reparação de dano civil. que membros de outra empresa sua propriedade, fazendo constar A trabalhadora recorreu ao TST, com o utilizem seus sobrenomes no a vaga de garagem anteriormente argumento de que a indenização por registro da razão social do negócio, vinculada ao apartamento 1.104. dano moral não é crédito trabalhista principalmente, se a atividade A 3ª Turma do STJ, por maioria, e sim ressarcimento, sendo aplicável, profissional exigir a identificação com entendeu que, devido à natureza no caso, o prazo do Código Civil. o uso do nome familiar. A conclusão da vaga de garagem, em regra, ser Alegou ainda que, tendo sido a ação é da Terceira Turma do Superior bem acessório vinculado à unidade ajuizada antes da vigência da Emenda Tribunal de Justiça (STJ) e foi proferida habitacional admite a separação para Constitucional 45, não se poderia falar por maioria de votos. A ministra transferência a outro apartamento em prescrição bienal, pois a Justiça do Nancy Andrighi relatou o caso. Apesar do edifício. Quanto ao registro de Trabalho nem sequer era competente de reconhecer o direito da empresa de transferência da vaga, os ministros para julgar o caso. Ao apreciar o consultoria de continuar utilizando o verificaram que, apesar da escritura de recurso de revista, o ministro Lelio sobrenome familiar de seus membros, venda e compra da unidade 710 não Bentes Corrêa, relator, com ressalvas a Terceira Turma determinou que prever a garagem, o documento foi de entendimento, mas se submetendo ela acrescente à sua razão social oportunamente retificado e registrado à jurisprudência do TST, propôs que o elementos que promovam a distinção antes da alienação da unidade 1.104, recurso não fosse conhecido. do seu nome com relação ao dos garantindo o seu direito à vaga (RESP O relator destacou que a competência outros dois escritórios. Os ministros 954.861). da Justiça do Trabalho para processar mantiveram a parte das decisões e julgar conflitos com pedidos de anteriores, que negou o pedido das Fonte: Superior Tribunal de Justiça danos materiais e morais resultantes autoras da ação de ressarcimento Assédio sexual: mulher perde por ajuizar ação três anos depois da demissão de vínculo de emprego, salvo nas de possíveis prejuízos por confusões hipóteses de danos resultantes causadas diante da semelhança dos de acidente de trabalho e doença nomes (RESP 954272). O assédio sexual e uma ação profissional, já estava definida antes Fonte: Superior Tribunal de Justiça penal sofridos por uma auxiliar de mesmo da edição da EC 45. Assim, Av. Rio Branco 125, 7º andar - Centro - RJ CEP: 20040-006 - Tel: 21 2114-9999 www.schneiderassociados.com.br [email protected] Conselho editorial: Giovani Oliveira, Gerson Ribeiro e André Junqueira. Jornalista Responsável: Cintia Laport (MTB: 21598) Diagramação: Rômulo Rosa Os autores dos artigos são advogados membros do Schneider Advogados Associados. Todas as opiniões externadas são do escritório jurídico.
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