No funeral de Zapata gritou-se "Liberdade!"

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No funeral de Zapata gritou-se "Liberdade!"
Público • Sexta-feira 26 Fevereiro 2010 • 17
Prescrição para ex-advogado de Silvio Berlusconi
Um tribunal de recurso considerou
prescrito o processo do britânico
David Mills, ex-advogado do
primeiro-ministro italiano, que
tinha sido acusado por corrupção e
condenado em primeira instância
a quatro anos e meio de prisão.
A decisão abre a porta a uma
prescrição que beneficie Silvio
Berlusconi, co-acusado no processo.
A crónica de José Diogo Quintela está ao domingo na Pública
No funeral de Zapata gritou-se “Liberdade!”
Isabel Gorjão Santos
Com a morte do dissidente
cubano que estava em greve
de fome “as relações com a UE
não deverão normalizar-se”
a O funeral do prisioneiro político
Orlando Zapata Tamayo foi acompanhado por dezenas de familiares e dissidentes, mas também por agentes da
polícia e militares. A sua morte trouxe
apelos à libertação dos presos políticos cubanos feitos pelo Nobel da Paz
Lech Walesa ou o primeiro-ministro
espanhol, Rodríguez Zapatero.
Orlando Zapata tinha 42 anos e estava em greve de fome há 85 dias para
protestar contra a falta de condições
nas prisões cubanas. Acabou por morrer quarta-feira e ontem foi sepultado
em Banes, a 840 quilómetros de Ha-
vana, perante um apertado controlo
dos militares. “Eles [os soldados] têm
uma lista com nomes de opositores e
decidem quem pode passar ou não”,
disse ao diário espanhol El Mundo Juan Oriol, amigo de Zapata.
A polícia rodeou o cemitério e 100
opositores foram detidos nas horas
que antecederam o funeral, segundo
a Comissão Cubana de Direitos Humanos, mas na cidade ouviu-se gritar “Liberdade!” e “Viva Orlando Zapata!”.
“Acabámos de o enterrar. Muitos irmãos acompanharam-me, mas fomos
reprimidos e escoltados por agentes
da Segurança do Estado até aos últimos instantes”, contou à AFP a mãe
de Zapata, Reina Luisa Tamayo, que
recusou aceitar o lamento de Raul Castro pela morte do filho. “Não admito
as condolências, isto foi um assassínio
premeditado”. O Presidente cubano
disse na véspera do funeral que la-
Sarkozy reconheceu erros
no genocídio do Ruanda
a O Presidente francês, Nicolas Sarkozy, prestou ontem homenagem às
vítimas do genocídio ruandês de 1994
e disse ter havido “um grave erro de
apreciação” por parte de Paris. Foi a
primeira visita de um chefe de Estado
de França ao Ruanda desde então.
Em Kigali, durante uma conferência de imprensa conjunta com o seu
homólogo ruandês, Paul Kagamé, o
visitante afirmou pretender “virar
uma página extremamente dolorosa”
nas relações entre os dois países.
Pressionado para pormenorizar
os erros cometidos pela França há 16
anos, respondeu que o seu país não
tinha conseguido ver “a dimensão genocidária” do regime do Presidente
Juvénal Habyarimana, cujo assassínio
deu origem a que os que os seus fiéis
tivessem desencadeado o genocídio.
Sarkozy no Memorial do Genocídio
Além disso, também se penitenciou
pelos erros da Operação Turquesa, só
lançada quando já iam decorridos dois
meses de mortandade e que não conseguiu pôr-lhe fim prontamente.
O chefe de Estado francês defendeu
que todos os responsáveis pela morte
de quase 900.000 ruandeses sejam
“encontrados e castigados”, mas evitou pedir desculpas por algum laxismo, ao contrário do que já fizeram a
Bélgica e os Estados Unidos.
Em 2006 Kigali cortara relações diplomáticas com Paris, depois de um
juiz francês ter implicado Kagamé no
atentado contra o avião de Habyarimana, a 6 de Abril de 1994. Mas essas relações foram reatadas há três meses.
Num livro de homenagem no memorial das vítimas, Sarkozy escreveu
que “a Humanidade guardará para
sempre a memória destes inocentes
e do seu sofrimento”. “Em nome do
povo de França, manifesto o meu respeito às vítimas”, sublinhou, frente
às valas onde se encontram os restos
mortais de 250.000 vítimas.
Seguidamente, o primeiro Presidente francês a deslocar-se ao país desde a
tragédia colocou uma coroa de flores
numa das valas, procurando assim ultrapassar o mal-estar que tem existido
entre Paris e o regime da Frente Patriótica Ruandesa (FPR), de Kagamé.
A FPR, que chegou ao poder depois de ter derrotado as forças responsáveis pelo genocídio, tem acusado repetidamente a França de ter
contribuído para o que se passou, por
manter estreitas relações com o regime anterior durante a presidência
de François Mitterrand.
mentava a morte do dissidente, mas
acrescentou que “não há execuções
nem tortura em Cuba” e que “isso
acontece em Guantánamo”.
Zapata tinha sido condenado a 32
anos de prisão por “desobediência civil” e foi o primeiro prisioneiro político a morrer de greve de fome em 38
anos, depois do líder estudantil Pedro
Luís Boitel, em 1972.
A sua morte dará novos argumentos
a quem defende a libertação de prisioneiros políticos em Cuba, disse ao PÚBLICO Susanne Gratius, investigadora
da Fundação para as Relações InterOrlando Zapata
estava há 85
dias em greve
de fome para
protestar
contra a falta de
condições nas
prisões de Cuba
nacionais e o Diálogo Externo (FRIDE)
em Madrid. Mas não é provável que o
regime cubano fique fragilizado. “A
situação não mudou. Cuba acaba de
estar numa reunião no México em que
foi criada uma nova organização de
que Cuba faz parte, o país está plenamente integrado na comunidade
ibero-americana.”
A mudança espanhola
No dia em que Orlando Zapata morreu
o Presidente do Brasil, Lula da Silva,
estava em Havana e encontrou-se com
o líder histórico Fidel Castro. Disse lamentar a morte do dissidente, “mas a
posição do Brasil é a de incluir todos”,
adianta Gratius. Em Washington, a secretária de Estado norte-americana,
Hillary Clinton, disse também que os
EUA “lamentam profundamente” a
morte de Orlando Zapata.
A situação poderá complicar-se no
que diz respeito às relações de Cuba
com a União Europeia. Foram adoptadas restrições diplomáticas por parte
da UE em 1996 e 2003 com base em
denúncias relacionadas com violações
de direitos humanos, mas o ministro
dos Negócios Estrangeiros espanhol,
Miguel Ángel Moratinos, defendeu
recentemente o diálogo directo com
Havana, um dos objectivos da actual
presidência espanhola da UE.
A morte de Zapata veio, no entanto,
alterar esse cenário. Espanha propunha um acordo de cooperação com
Cuba e um “diálogo exigente” sobre
direitos humanos, mas ontem o primeiro-ministro espanhol, José Luís Zapatero, exigiu a libertação dos cerca
de 200 prisioneiros políticos cubanos.
Agora, diz Susanne Gratius, a morte
de Zapata terá várias implicações, “e
uma delas é que as relações da UE com
Cuba não deverão normalizar-se”.
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