Folha da sala - Teatro Maria Matos
Transcrição
Folha da sala - Teatro Maria Matos
© NEUER TANZ / VA Wölfl © Patrícia Almeida teatro Rui Catalão Av. dos Bons Amigos Palco Sala Principal qui 21 a sáb 23 março 2013 21h30 Sessão Dia Mundial do Teatro qua 27 março 2013 21h30 Duração aproximada 60 min | M/12 Maria Matos Teatro Municipal Av. Frei Miguel Contreiras, n.º 52 1 700-21 3 Lisboa tel. 21 8 438 800 www.teatromariamatos.pt Esta peça começou a formar-se após uma série de visitas que fiz a um amigo da minha geração, que estava internado no IPO, em Lisboa. O processo de incapacitação do seu corpo fê-lo regredir até ficar com a aparência de um bebé. Essa imagem completou-se na última vez em que o vi. Usava apenas uma fralda. Erguida quando eu era ainda uma criança, a Av. dos Bons Amigos tornou-se na principal artéria da vila onde os meus pais vivem desde a infância, e onde eu nasci e cresci. Essa vila em que todas as pessoas pareciam conhecer-se e se cumprimentavam na rua tornou-se entretanto num dos dormitórios mais assustadores nos subúrbios de Lisboa e na décima maior cidade do país. Em Av. dos Bons Amigos, convido os espetadores dispostos em semi-círculo a experimentarem “uma hora psicológica” sem recorrerem ao relógio – será um tempo ligeiro, nem rápido, nem saturante. Fácil de suportar e difícil de digerir. Através de memórias e anedotas pessoais, e da história recente do país, incorro numa excursão a temas que nos são comuns, mas que nos habituámos a esconder: o isolamento, a estranheza, as inibições a que sujeitamos o corpo, a vergonha daquilo que nos menoriza perante o que identificamos como normalidade, a relação de medo com o desconhecido. Diferença, dor, doença e pânico da morte. A dificuldade em assumir a relevância pública dos nossos pavores privados. Com Av. dos Bons Amigos dou continuidade a uma série de “solos acompanhados” que iniciei com Dentro das palavras em 2010, em que exploro a autobiografia e a memória como ferramentas para construir ficções em redor dessa noção tão elementar sobre o que é preciso passar até sermos crescidos. É o equivalente cénico ao que na literatura se chama Bildungsroman (romance de formação). O termo “solo acompanhado” designa a relação com os espetadores. São os meus interlocutores. Condicionam o meu discurso, a razão de contar determinada história, assim como o modo de transmiti-la. Mas um público é feito de individualidades e o ambiente pode oscilar entre um serão animado por um contador de histórias e uma sessão de agitação política (ambas formas antiquadas de passar o tempo). Em Av. dos Bons Amigos pretendo convocar o espetador para um espaço intermédio entre o que é público e o que é privado, e aí trilhar um caminho diferente para o sentido de pertença e de responsabilidade coletiva. Gostaria de acreditar que a identidade suburbana tem a aparência de uma gorda borbulha, recheada de Staphylococcus aureus, e que bem espremida pode revelar uma cesta repleta frutos ao sol. Sendo cada um desses frutos uma personagem num momento alado da sua existência, com a sua beleza difícil, a sua alegria caprichosa, as suas promessas escondidas. Nenhuma forma de vida é desperdiçada, a partir do momento em que amadurecemos os seus testemunhos para acenar a um futuro vindouro. O teatro também pode ser um laboratório, em que observamos e ampliamos aparas das nossas vidas, sob a luz meiga que nos escapou no momento em que estavam a ser vividas. Rui Catalão a seguir... música Jon Hassell Sketches of the Mediterranean: Celebrating Gil Evans terça 26 março 22h00 15€ / Com desconto 7,50€ O trabalho cénico de Rui Catalão (n.1971, Cacém) ronda os temas da memória, do acaso, da fragilidade e da transparência, de uma relação interpelativa com o espectador e de como o ato de contar histórias altera a perceção daquilo que entendemos por espaço público e por dimensão privada. É autor e intérprete dos solos Dentro das palavras (2010) e Auto-retrato assistido de Constantin Brâncushi (2011). Em 2012, estreou Melodrama para 2 atores & um fantasma (com Cláudio da Silva e Sofia Dinger) e Manifesto de Goya (integrado no programa Noite do Manifesto), ambos no Teatro Maria Matos. Fez também as peças de grupo Elogio da classe política portuguesa (2004); Untitled, Still Life em parceria com João Galante-Ana Borralho (2009); Domados, ou não com os alunos da escola Balleteatro (Fundação Serralves, 2011); e Ester (a ser encenada por 12 companhias de teatro juvenil para o programa Panos 2013, da Culturgest). Em 20062009, viveu na Roménia, centralizando a sua atividade no Centrul National al Dansului, Bucareste. No CNDB, estreou as peças de grupo Atît de frageda, Coada Soricelului, Follow that summer; assinou a dramaturgia para peças de Madalina Dan (Iluzionistele), Mihaela Dancs e Carmen Cotofana (First steps); e as séries de improvisação Acum totsi împreuna e Rui; dirigindo ainda workshops de dramaturgia e performance em Bucareste e Cluj. Em 2009 fez uma residência artística no Teatro Cullberg (Estocolmo), e participou no festival Springdance (Utrecht), onde apresentou o seu dispositivo cénico de cinema-ao-vivo. Depois de uma experiência formativa com João Fiadeiro (1999-2003), colaborou com Miguel Pereira, Manuel Pelmus, Brynjar Bandlien e Eduard Gabia (com quem apresentou How to become invisible no Festival de Avignon, 2011). No cinema, foi coautor dos argumentos de O capacete dourado (com Carlos Mota) e Morrer como um homem (com João Pedro Rodrigues); e foi ator em A cara que mereces, de Miguel Gomes. A convite dos programadores de Artista na Cidade 2012, organizou e coordenou o livro Anne Teresa de Keersmaeker em Lisboa (a publicar). Escreve episodicamente para o suplemento Ípsilon do jornal Público, onde foi jornalista. Av. dos Bons Amigos resulta de duas residências de trabalho no Espaço do Tempo (Convento da Saudação – Montemor-o-Novo) e no espaço alkantara (Lisboa), e foi apresentado numa versão preliminar no Festival de Safira, no verão de 201 2. Estreia: 21 março 201 3, Maria Matos Teatro Municipal