Comece a ler o livro agora.

Transcrição

Comece a ler o livro agora.
Gelio Fregapani
A AMAZÔNIA
NO GRANDE JOGO
GEOPOLÍTICO
UM DESAFIO MUNDIAL
© by Gelio Fregapani – 2011
Ficha Técnica
Supervisão
Victor Tagore
Composição
Jarbas Junior da Mota
Revisão
Frederico Abbott Galvão
Diagramação
Gustavo Araújo
Arte da Capa
Thiago Sarandy
Impressão
Thesaurus Editora
www.thesaurus.com.br
______________________________
F858a Fregapani, Gelio
A Amazônia no grande jogo geopolítico: um
desafio mundial; o Brasil; o provável futuro /
Gelio Fregapani. – Brasília,: Thesaurus, 2011.
328 p.; il.
1. Geopolítica, Amazônia 2. Fronteiras, Amazônia 3. Meio Ambiente, Amazônia 4. Reservas
indígenas, Amazônia 5. Segurança nacional,
Amazônia 6. Relações internacionais I. Título
CDU 308(811.1/6)
CDD 918.1
______________________________
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pode ser reproduzida ou transmitida de qualquer forma ou por qualquer meio, incluindo fotocópoia, gravação ou
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Dedico este livro aos heróis que
conquistaram e mantiveram a
Amazônia para nós, e a Soraya,
Jordana, Samantha, Diego, Ana
Carolina, Giovana e Giselle,
meus netos, e principalmente a
Amanda, bisneta recém chegada
para os quais sonho que continuem
a receber o legado de seus
antepassados como o que eu próprio
recebi. Um País tão grande quanto
o que recebi dos meus pais.
Agradecimento
À minha querida esposa Léa Maria, pelo
incentivo e solidariedade em todas as horas
Nota do Autor
Este livro é a atualização e ampliação do livro “Amazonia – A grande
cobiça internacional”.
Sumário
Situação Geopolítica............................................................... 15
O Brasil em face das Pan-Regiões e do Mundo Unipolar......15
A Pax Americana.........................................................................20
Um fato novo – da Origem da crise econômica à possível
ordem mundial no século XXI..................................................22
A Desabitada Amazônia no Contexto Mundial......................25
O Meio-ambiente.................................................................... 27
A Floresta – O Ambiente natural..............................................27
Pressões Ambientais Geradoras de Conflitos..........................31
A Verdade sobre o Aquecimento Global..................................33
Diagnóstico Sucinto da Economia........................................ 37
Extrativismo Vegetal e Silvicultura...........................................37
Agropecuária...............................................................................41
Biodiesel – Um Fato Novo Portador de Mudanças................46
Potencial Hidrelétrico e Mineração..........................................49
Propositadamente deixamos o nióbio para o final.................55
O Desafio do Petróleo.................................................................56
A Dança da Fronteira.............................................................. 61
A Formação..................................................................................61
A Belém – Brasília e o Avanço dos Anos Cinquenta..............62
As Ameaças Atuais......................................................................68
Eis o que tem acontecido:...........................................................71
A Ocupação – Políticas e Estratégias Tentadas.......................78
Conclusão Parcial........................................................................83
A “Evolução” da Ordem Mundial......................................... 87
As Principais Modificações........................................................87
O Controle de Mercados e a Dependência..............................89
A Organização das Nações Unidas...........................................92
Os Blocos Regionais e os “não regionais”................................94
EUA: os limites da hegemonia...................................................98
Um Ensaio de Futurologia.........................................................100
A Amazônia, o Brasil e o Mundo.......................................... 107
A Questão Nuclear e a Amazônia.............................................107
A Questão da Dívida e a Amazônia..........................................110
A Incógnita do Sivam.................................................................115
Aspectos Militares.......................................................................117
O Problema Indigenista e Missionário................................. 123
O Mito e a Realidade..................................................................123
Origem do Problema..................................................................124
Situação Atual..............................................................................126
A Farsa Ianomâmi – Um livro profético..................................133
As profecias de Rondon e de Villas Boas.................................136
Conclusão Parcial........................................................................138
Riscos Para a Integridade do Patrimônio Nacional............ 141
Considerações Gerais.................................................................141
A Opinião Pública Mundial.......................................................142
A Principal das Variáveis Relevantes........................................144
Hipótese Otimista.......................................................................145
Hipótese Pessimista....................................................................145
Como a Oligarquia Inglesa Criou a Reserva Ianomâmi........148
Surge a Survival International...................................................150
A Ofensiva de 1990.....................................................................155
A Traição na Raposa-Serra do Sol......................................... 163
A Batalha Final............................................................................163
Motivos e ações............................................................................165
O Laudo antropológico fraudulento: Pretexto para conseguir a homologação.....................................................................167
A Questão do Pirara e suas Consequências.............................168
Cronologia do crime de Lesa-pátria.........................................171
Conclusão Parcial:.......................................................................175
Conclusões............................................................................... 177
Política Indicada..........................................................................177
Estratégias possíveis....................................................................179
Campo Político............................................................................180
Campo Econômico.....................................................................181
Campo Psicossocial.....................................................................182
Campo Militar.............................................................................183
A Possível Defesa Militar...........................................................185
Anexo 1 – Diretrizes do Conselho Mundial das Igrejas
Cristãs....................................................................................... 193
(Anexo D ao estudo 001/1ªSC/89) – tradução juramentada.193
Anexo 2 – Documento do Congresso Norte-Americano
solicitando ao Presidente Bush que exigisse do Presidente
Collor a demarcação da área Ianomâmi............................... 203
Anexo 3 – Documento do Congresso Norte-Americano solicitando ao Presidente Fernando Henrique Cardoso que garantisse a
demarcação contínua da Área da Raposa-Serra do Sol................205
Anexo 4 – “Economia e dominação”................................209
4.1 – (Até agora – Um monopólio ignomioso).......................209
4.2 (De agora em diante...).........................................................211
Anexo 5 – A Idade Glacial Vindoura – A verdadeira História
do Aquecimento Global.......................................................... 215
Indagações e constatações..........................................................215
Anexo 6 – Resumo do Relatório de Equipe na Expedição
Multidisciplinar ao Pico da Neblina e Morro dos Seis Lagos em 1990.............................................................................. 223
Anexo 7 – O Exército que temos e o Exército que Precisamos............................................................................................ 245
O Exército que temos. Como está?...........................................248
Muito bem, e daí? – Qual o próximo passo?...........................251
O Exército que precisamos........................................................254
1 – Alterações no Dispositivo....................................................255
2 – Alterações no recrutamento e formação............................256
3 – Alterações na Organização..................................................258
4 – Alterações nos Armamentos e Equipamentos..................260
5 – Alterações nos Procedimentos de Combate......................262
Anexo 8 – O Brasil e as Guianas............................................ 265
1 -República da Guiana (ex-Inglesa)........................................265
2- Guiana Francesa.....................................................................267
3 – Suriname................................................................................269
4- Fatores Geográficos e Geopolíticos......................................271
5- Conclusões..............................................................................273
6 – A presença militar dos Estados Unidos na Guiana..........274
6.2 O Objetivo Pretendido.........................................................278
6.3 Solução...................................................................................281
Anexo 9 – Demais Países da Fronteira Norte...................... 283
1 – Generalidades........................................................................283
2 – Colômbia................................................................................283
3 – Venezuela...............................................................................285
4 – Peru.........................................................................................288
5 – Bolívia.....................................................................................289
6 – Comentários..........................................................................293
Anexo 10 – Declaração dos Direitos dos Povos Indígenas295
Comentário de Edvaldo Tavares...............................................313
Governo e diplomacia brasileira dão uma de “otários”..........315
Agora estamos numa enrascada................................................316
Brasil tem que ser firme em assuntos de soberania................317
É preciso denunciar ao povo brasileiro antes que ele seja
despejado......................................................................................318
Juntemos os trapos – congresso nacional pode falhar mais
uma vez.........................................................................................320
VOCABULÁRIO..................................................................... 323
Capítulo I
Situação Geopolítica
O Brasil em face das Pan-Regiões e do Mundo Unipolar
Nas primeiras décadas do século, cientistas políticos
pesquisando as interações do meio-ambiente com as vontades e características nacionais, criaram as bases de uma ciência que estudou as relações da Política com a Geografia,
que se chamou de Geopolítica. Dentre as diversas expressões
desta ciência nova, a mais célebre certamente é a teoria das
Pan-Regiões, criada na Alemanha pelo general Haushoffer
O autor dividia o mundo em áreas de influência: a
Pan-América liderada pelos Estados Unidos; a Pan-Eslávia
pela Rússia e a Pan-Germânia que abrangeria a Europa e
a África e seria liderada pelos nórdicos. Haushoffer visava
orientar a política externa alemã, mas, naturalmente, cada
nação tinha seus objetivos próprios, que às vezes se complementavam, mas quase sempre se chocavam com os objetivos alemães, alterando significativamente as possibilidades
e situações previstas pelo genial geopolítico. O Japão, contra
todas as expectativas, forçou a criação de uma “Esfera de
Co-prosperidade Oriental” e apoiou a Alemanha.
Para evitar a realização de uma Pan-Germânia que se
esboçava e de uma Esfera de Co-prosperidade Oriental que
não lhes convinha, uniram-se a Pan-América e a Pan Es15
G elio F regapani
lávia e as destruíram, ficando, por algum tempo, o mundo
dividido em apenas duas áreas de influência.
Nós brasileiros fomos envolvidos naquele conflito pelos imperativos geográficos e culturais do ideal Pan-Americano, mas a vitória do nosso lado não nos trouxe as vantagens esperadas. Enquanto os Estados Unidos e a Alemanha
estavam disputando a amizade (e as matérias-primas) do
nosso País, o nosso campo de ação era bem mais vasto.
Ficando o mundo dividido entre a liderança americana e soviética, o nosso alinhamento quase incondicional
com os Estados Unidos impediu que fizéssemos o nosso
jogo próprio, tirando partido da disputa, mas todos sabíamos que quando uma das duas superpotências desistisse
ou fosse superada, o mundo inteiro ficaria à mercê do vencedor. Este cenário, que ocorreu durante curto espaço de
tempo, foi chamado, com alguma impropriedade, de PAX
AMERICANA.
Apesar da incontestável supremacia militar dos Estados Unidos, a ideia das Pan-Regiões parece persistir. A PanEslávia encolheu, mas conservou sua grande potencialidade militar e reagiu. A Europa (Pan-Germânia) iniciou uma
união, agora voluntária, somando um grande poder econômico a um razoável potencial militar, inclusive nuclear, e
conservou grande influência sobre algumas das antigas colônias na África. O Japão ressurgiu com tal produtividade que
chegou a abalar, por um momento, os alicerces da economia
da potência hegemônica. Uma longa estagnação, provocada
por fatores de que não estiveram ausentes manobras norte-americanas podem ter significado um novo golpe no objetivo daquele país, mas apesar de sua situação estrategicamente
frágil, ele continua cuidando de melhorar a capacidade bélica e ensaia, timidamente, alguma política independente.
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A AMAZÔNIA O GRANDE JOGO GEOPOLÍTICO
Alguns novos centros ensaiaram atitudes de autonomia com variável grau de sucesso: A China, a Índia, Israel
e o Paquistão, com capacidade nuclear, tornaram-se peças
importantes no tabuleiro; o mundo árabe, ainda que desunido, por vezes, jogou com o petróleo; o Brasil e a Argentina tentaram formar uma pequena Pan-Região no Cone
Sul; a África, embora sem sucesso, sonha agir em conjunto
e surgiram novos pequenos jogadores com política própria
como a Coreia do Norte, o Irã, a Sérvia e o Iraque.
Nós brasileiros nos enquadramos voluntariamente na
Pan-América logo após a Proclamação da República. Poderia, então, ser uma estratégia correta para contrabalançar a
influência da Inglaterra, potência hegemônica de então que
nos arrebatou em Roraima um território quase do tamanho
da Escócia. Isso visou nossa despovoada possessão amazônica, mas para decepção nossa, o líder que escolhêramos
agia como um explorador, tentando apenas manter ou ampliar suas vantagens.
Ao nosso alinhamento automático com os Estados
Unidos não houve contrapartida. Pelo contrário, ao longo
do tempo houve, frequentemente, a preocupação de prejudicar o nosso desenvolvimento para garantir o suprimento
de matérias-primas, manter seu mercado e evitar um concorrente. À medida que fomos compreendendo, e procurando uma política independente, as pressões aumentaram
até se tornarem dominantes, e quando tentávamos formar
um bloco com os outros povos da América Latina, um bem
sucedido jogo de intrigas conseguia nos antagonizar e nos
separar, inviabilizando as possíveis alianças.
Há um século que o nosso País tem gravitado na órbita do pan-americanismo, mas já sabemos que essa não é
uma boa aliança, pois os Estados Unidos se portaram mais
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G elio F regapani
como um possível rival do que como um aliado confiável.
Os fatos, principalmente a guerra das Malvinas, pareciam
dar razão a uma polêmica declaração de Peron: “...o ano
2000 nos encontrará unidos ou dominados”.
Poderíamos resumir a história dos interesses norte-americanos na Amazônia com os seguintes episódios:
Quando se concluía a epopeia da fronteira, em 1848, o expansionismo norte-americano tendia a prosseguir para o
Oriente e para o Sul, continuando o movimento da fronteira como que impulsionado por um “destino manifesto”.
Segundo a literatura da época, os objetivos ao Sul seriam
Cuba, Panamá e Amazônia; esta representando uma saída
para a crise da economia, com o translado de colonos e escravos que se dedicariam à produção de borracha e algodão.
A principal campanha visando a ocupação pura e simples era liderada, desde 1850, por um oficial da marinha chamado Matthew Maury, cujos artigos na imprensa e o livro
(The Amazon and the Atlantic Slopes of South America) editado em 1853, tiveram enorme repercussão na opinião pública,
nos meios empresariais e no próprio governo norte-americano, o qual passou a pressionar o Brasil para a abertura do rio
Amazonas, condição indispensável para o êxito da empreitada. Nesse ínterim os Estados Unidos já tinham conseguido
o apoio dos outros países do continente, e no nosso país já
havia uma corrente nos meios políticos disposta à abertura do
Amazonas em nome da ciência, do progresso e da civilização,
indo-se ao extremo de apoiar a ocupação consentida da Amazônia “para não ter de cedê-la à força” Salvou-nos naquela
ocasião uma política firme do Império e a Guerra de Secessão.
Ao final da guerra da Secessão, diversos sulistas inconformados com a derrota transferiram-se para a Amazônia;
deles não restam traços, não sabemos bem porque. Houve
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A AMAZÔNIA O GRANDE JOGO GEOPOLÍTICO
também alguma cogitação de criar lá uma “Libéria” para os
negros então libertos, mas indesejados em seu país. O episódio
seguinte, que, talvez, pudesse ter piores consequências, foi o
caso do “Bolivian Syndicate”, que conduziu à questão Acreana.
Seguiu-se o ensaio do cultivo de seringueiras em Fordlândia e
Belterra, episódio de alto interesse para ambos os países e que
demonstra haver campo para a cooperação. Não deu certo,
mas desta vez houve boa vontade em lugar das decididas sonegações e bloqueios que haveria no futuro. Devemos ainda considerar as persistentes notícias de estudos para a utilização da
área em caso de guerra nuclear, pois a Amazônia, em tese, não
seria atingida pela radiação, e por último (certamente não por
fim) uma campanha para evitar a nossa ocupação através de
uma feroz defesa do meio-ambiente, da cultura primitiva, do
“pulmão do mundo”, da demarcação e ampliação das reservas
indígenas e de tudo que possa inibir a ocupação, o desenvolvimento e a utilização dos recursos hídricos e minerais.
Em síntese, a partir da República passamos por longa fase tentando ser o “Júnior Partner” dos Estados Unidos,
pensando que um alinhamento servil nos facilitaria a consecução das aspirações nacionais de desenvolvimento. Aos
poucos fomos evoluindo, embora com recaídas nos tempos
de Dutra, Castello e Collor, mas dia a dia constatamos que
as possibilidades de desenvolvimento nos tem sido bloqueadas deliberadamente, dificultando a construção de um espaço brasileiro. Em nossas tentativas de desenvolvimento
fizemos o papel de intruso indesejado. A eles, naturalmente,
não pode interessar um concorrente e chegaram a declarar
que não admitiriam um novo Japão ao sul do Equador. Uma
vez sem opositores à sua altura, puderam prestar maior
atenção aos seus objetivos mundiais, entre eles o de evitar
o surgimento de competidores, impedindo-nos de crescer;
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G elio F regapani
garantir o suprimento dos recursos naturais que lhes faltem,
e manter a hegemonia econômica na Pan-América. Para isto
usam diversos pretextos como defesa do meio-ambiente,
dos direitos humanos e da cultura indígena, normalmente
envolvendo a Amazônia.
Se é verdade que os Estados Unidos oficialmente nunca tentaram tomar uma parte da área, como o fizeram a Inglaterra, a Holanda e a França, também é verdade que enquanto estiverem sem opositores no mundo não precisam
da nossa amizade. Nesta situação tem muito mais possibilidades e menos inibições.
Nosso alinhamento com os Estados Unidos no âmbito da Pan-América teve motivos históricos, geográficos e
ideológicos, mas não trouxe o resultado esperado e por momentos veio a ser um perigo.
A Pax Americana
Desde o desmanche da União Soviética, os Estados Unidos reinaram sem opositores à sua altura. Justiça seja feita, seu
poder foi empregado mais suavemente do que o da Inglaterra
durante a Pax Britânica, e, certamente, muito mais suave do
que teria sido uma Pax Soviética se ela tivesse ocorrido, mas
os objetivos gerais permaneceram idênticos: a garantia de sua
própria segurança e a manutenção das vantagens econômicas1.
O clímax da “Pax Americana” foi o controle das ambições de Saddam Hussein, no início dos anos 90. O caudi1
O “poder suave” (soft power) também chamado de “guerra de Quarta Geração”, é o espectro de medidas políticas, econômicas, culturais e de inteligência, ajuda
ao desenvolvimento e o trabalho de ONGs apoiadas pelo Estado – para conseguir,
sem operações militares, uma capacidade efetiva de alcançar os objetivos na política
externa. Entretanto, por mais brilhantemente que seja empregado, só é bem sucedido
se ancorado na superioridade militar-estratégica e financeira dos EUA.
20
A AMAZÔNIA O GRANDE JOGO GEOPOLÍTICO
lho iraquiano, sunita mais para leigo do que religioso, fora
aproveitado pelos anglo-americanos para conter a perigosa
revolução xiita dos aitolás do Irã. Com apoio americano e
dinheiro do petróleo, desenvolveu razoável poderio militar,
sendo um bom cliente do armamento brasileiro. Acontece
que, mesmo tachado de tirano sanguinário, Hussein era melhor para seu povo do que as dinastias árabes, subservientes
aos EUA, e seu exemplo abalava as corruptas monarquias do
Oriente Médio. Era ambicioso e sua liderança ampliava-se
assustadoramente. Tinha que ser contido, antes que reunisse
os árabes em torno de si, dominando a maior parte do petróleo do mundo. O pretexto foi a tentativa de reunificação,
absorvendo o Kuait, província separada com o apoio inglês.
Não foi difícil aos EUA, com o beneplácito da ONU
e auxílio de umas quantas nações interessadas no petróleo,
destruir a força militar do Iraque. Neste momento estava evidenciado que tinham os Estados Unidos total liberdade de
ação, que nada poderia resistir a seu formidável exército. Saltaria aos olhos de quem estudasse o assunto que ensaiavam o
domínio, ainda que indireto, das fontes de matérias-primas,
não só no Oriente Médio como também na Amazônia.
Na ocasião não interessava derrubar Hussein. Apenas
contê-lo com zonas de exclusão e embargos, para que não
mais inspirasse revoltas contra as dinastias amigas. O objetivo foi alcançado; ao Iraque, vencido, foi imposto embargo da venda de petróleo e zonas de exclusão, de forma que
nunca mais pudesse prejudicar as dinastias amigas. Esta foi
a primeira “Guerra do Golfo”
A fonte real da supremacia estadunidense transcende
a força militar; mas esta é o suporte ao domínio econômico.
Desde o final da Segunda Guerra Mundial havia sido convencionado que o dólar seria o padrão monetário mundial,
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G elio F regapani
substituindo o ouro. Imprimindo-o descontroladamente os
EUA acumularam imenso déficit, coberto por novas impressões. Este sistema se manteria funcionando enquanto
todos necessitassem de dólares para comprar no mercado
internacional, e muitos procurassem entesourá-lo como reserva de divisas. Quem ameaçasse o sistema haveria de sentir que “dentro da luva de pelica existia um punho de ferro”
Um fato novo – da Origem da crise econômica à possível
ordem mundial no século XXI
A nacionalização do petróleo venezuelano causou fortes
reações dos antigos beneficiados, associados a norte-americanos. Os prejudicados organizaram uma greve que interrompeu
a produção por dois meses. Em consequência, faltaram 15% do
petróleo necessário ao consumo norte-americano. Ainda que
os Estados Unidos dispusessem de imensa reserva estratégica,
procurou suprir-se no mercado internacional. O preço não importaria. Era só imprimir dólares mais um pouco.
Por azar, nenhum dos fornecedores poderia aumentar
a produção em tempo hábil; somente o Iraque, cuja venda
de petróleo estava sob embargo. Consultado, Saddam Hussein respondeu, para fazer desaforo, que só venderia em Euros. Pagou o desatino com a própria vida e destruiu seu país.
Forjando um pretexto de evitar a proliferação nuclear, os
Estados Unidos invadiram novamente o depauperado Iraque. Desta vez, a comunidade internacional não os acompanhou, mas não conseguiu evitar que, à revelia da ONU, os
EUA vencessem e ocupassem aquele país.
A recusa iraquiana de aceitar dólares, seguida da mesma atitude pelo Irã, mostraram ao mundo que seria possível a
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A AMAZÔNIA O GRANDE JOGO GEOPOLÍTICO
compra de bens, inclusive petróleo, em outra moeda. Não mais
sendo indispensável, não seria mais necessário entesourá-la, e
a imensa quantidade existente, superior a soma de bens mundiais, fatalmente a faria perder o seu valor de cotação.
O domínio econômico norte-americano, pela primeira vez, estava realmente ameaçado. Uma brutal perda
de valor do dólar corresponderia a um calote em quem o
entesourou, e dificilmente outro país o aceitaria novamente.
Timidamente surgem debates sobre temas como “A perda de poder do Ocidente”; “O mundo pós-americano” e outros.
A crise econômico-financeira global tem tudo a ver
com essa discussão sobre as mudanças na ordem de poder
político mundial. E essa crise é americana, mas ninguém sairá ileso. Uma nova ordem mundial pode não ser desejada,
mas cada país tem que perseguir os seus próprios objetivos
e interesses nas transformações que se afiguram inevitáveis.
A queda do Muro de Berlim assinalara o enterro da ordem bipolar do pós-guerra. O subsequente mundo unipolar
não durou nem duas décadas. O “Projeto para um Novo Século Americano” comprometeu-se no fiasco do Iraque e na bancarrota do banco Lehman Brothers. O presidente Barack Obama ainda fala sobre a “liderança mundial estadunidense”, mas
a congregação de fieis crentes no “excepcionalismo americano”
está se dissolvendo, não apenas no exterior, mas também nos
próprios EUA. Evidentemente, os EUA são e continuarão sendo uma potência mundial, mas não mais “a potência absoluta”2
Alguns países de grande extensão territorial, antes pe2
O exercício do hegemônico “poder suave” tende a ser substituído por uma política de
“poder inteligente” na estratégia estadunidense num mundo multipolar. O enfoque, adotado
oficialmente pelo Governo Obama, tem como objetivo ainda preservar a “preponderância” estadunidense no mundo. A concepção seria a seguinte: os EUA devem “dosar”a ascensão das
potências do segundo grupo – China, Rússia, Índia, UE e Brasil -, enquanto, simultaneamente,
“equilibram” as potências do terceiro e do quarto grupos contra as do segundo.
23
G elio F regapani
riféricos, vão crescendo de importância; uns como a China e
a Índia, pela mão-de-obra barata e operosidade de seu povo,
outros como o Brasil, pela abundância de recursos naturais.
Os felizes possuidores de artefatos nucleares sabem que não
serão pressionados demasiadamente, nem mesmo por uma
potência muito mais forte. Pequenos países com coragem
para enfrentar as pressões, como o Irã e a Coreia do Norte,
ensaiam a produção da bomba. Se conseguirem, nada evitará a proliferação e a hegemonia atual perderá o sentido.
Que o mundo esteja se tornando multipolar deveria
ser óbvio. Mas é igualmente claro que o moribundo sistema
mundial unipolar ainda não evoluiu para uma ordem mundial multipolar. Nas recentes cúpulas internacionais, em
função da crise, os EUA e seus parceiros do G-7 tiveram que
ceder espaço à China, Índia, Brasil e outros estados política
e economicamente ascendentes, mas quais daqueles estados
realmente se qualificam para o escalão superior da política
mundial? Cada um tem seus problemas e suas vantagens,
mas o fator decisivo, provavelmente, será a força, ainda mais
do que a economia.
Em termos simples: o peso e a influência dos estados
estão sendo determinados por uma multiplicidade de capacidades diferenciadas – a econômica, a tecnológica, a de
controlar os recursos naturais e, principalmente, a de força
militar para respaldar seus objetivos. As relações entre os
estados irão variar fortemente em diferentes campos, o que
gera uma ordem complexa e relações multifacetadas e variáveis. Em outras palavras, uma arquitetura global não estática. Até mesmo países menores, “do terceiro grupo” na hierarquia de poder, que possuam capacidades especializadas
e “nichos” altamente avançados, podem desempenhar um
papel importante nos grandes assuntos da política mundial.
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A AMAZÔNIA O GRANDE JOGO GEOPOLÍTICO
Devido aos nossos recursos naturais seria até possível imaginar a nossa inclusão num “concerto de potências”,
envolvendo os EUA, China, Rússia, Índia, Brasil e a União
Europeia, se o Brasil desenvolvesse capacidade militar, inclusive nuclear, acompanhada de alguma forma de “vontade
política de poder” para promover os seus interesses no cenário internacional. Entretanto, nossos sucessivos governos
têm, sem contrapartida, amarrado as próprias mãos, renunciando, unilateralmente, ao desenvolvimento das armas, cedendo sempre às pressões estrangeiras.
Nossos sonhos de grandeza desarmada só serão factíveis se houver paz. Entretanto, riquezas atraem ambições.
Falta de força militar mais reforça as cobiças. Somados a ausência de vontade nacional, é são um verdadeiro convite a
todas as desgraças.
(ver anexo 4)
A Desabitada Amazônia no Contexto Mundial
Examinando qualquer mapa demográfico mundial,
percebemos regiões super-povoadas e regiões despovoadas.
Entre elas destacam-se o SAARA, a ANTÁRTIDA, as vastidões geladas da SIBÉRIA, o CANADÁ e o ALASCA, e as alturas nevadas do TIBÉT e de outros maciços, e a AMAZÔNIA.
Quase todas são regiões inabitáveis, exceto a AMAZÔNIA.
Levando em conta a atual explosão demográfica mundial, uma terra desabitada, mas habitável, seria um convite a
ocupação, independentemente de consentimentos ou tratados. A mais elementar lei da ecologia forçará a disputa por
esta terra, principalmente sendo a única área habitável ainda desabitada no planeta.
25
G elio F regapani
Apenas estas realidades explicariam as pressões dominantes, gerando uma nova concepção de que acima das
fronteiras estão os interesses da humanidade. Na nossa
Amazônia, as potencialidades minerais, ainda inexploradas,
agravam a preocupação, acrescendo a cobiça econômica à
necessidade de novos espaços para a sobrevivência, numa
ocasião em que os recursos naturais começam a escassear. É
certo que haverá ambições, e, em um quadro peculiar onde
podem ser indispensáveis para a sobrevivência de nações,
que não mais possam comprar, mas tenham força para tomar. A paz se configura como uma utopia. Apenas a ocupação e o desenvolvimento podem dar a expectativa de posse
definitiva. A capacidade militar não pode ser esquecida,
mas só a ocupação por nacionais garante o domínio.
Quando, ingenuamente, se aceita demarcar uma região para exclusividade de uma etnia diferenciada e se torna
essa região cada vez mais autônoma, se trilha o caminho da
secessão, dando asas ao separatismo. Quando se evidencia o
interesse estrangeiro em dividir o País, só um grande esforço com muita sabedoria pode conseguir mantê-lo intacto.
Podemos considerar juridicamente as fronteiras estabelecidas, mas não é o que mostra a História. Há quem considere que na atualidade as fronteiras são sagradas, mas não
foram traçadas por Deus; foram resultado de pressões; pressões militares, demográficas, econômicas e culturais, sendo
as pressões demográficas as mais decisivas. Eis o porquê da
necessidade de ocupação efetiva. E ocupação por quem se
considere brasileiro. Ocupação por índios ainda em estado
selvagem, que nem sabem que são brasileiros, não é garantia.
Pior ainda quando cooptados pelas ONGs.
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