Relatório - PDBFF - Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos
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Relatório - PDBFF - Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos
A diversidade beta de formigas é maior em copas de árvores do que no folhiço da floresta Felipe Cito Nettesheim pode ser relacionada a uma menor Introdução A diversidade ser capacidade de suporte do ambiente. atributos Também se espera menor diversidade amplamente trabalhados na ecologia: beta nestes ambientes, pois poucas abundância e riqueza de espécies, sendo espécies são adaptadas as condições a riqueza (número total de espécies) limitantes, o que implica em ampla uma medida usual de diversidade por distribuição sua simplicidade (Magurran 1983, Kent mudança na composição de espécies & Coker 1992). A forma como a (Magurran 1983). desmembrada em pode dois riqueza varia em relação à área pode ser categoricamente classificada em geográfica e pouca As formigas representam um grupo importante e diverso de insetos diversidade alfa (local), representada nas pela riqueza pontual; beta (regional), encontradas utilizando vários tipos de expressa pela diferença de riqueza entre recursos alimentares em todos dois pontos; e gama (global ou geral), ambientes da floresta, elas podem ser representando a riqueza de diversos considerados pontos (Whittaker trabalhar com as diferentes categorias 1972, Loreau 2000). A heterogeneidade da diversidade (Gunadi & Verhoef ambiental é uma fonte de variação que 1993, Bruhl et al. 1998). O folhiço e o influencia na manutenção, aumento ou dossel florestal são habitados pelas diminuição formigas, simultaneamente (Münzbergová da diversidade 2004). A florestas tropicais. bons porém possuem Como modelos estes diferenças são os para ambientes estruturais heterogeneidade na disponibilidade de marcantes (Yanoviak & Kaspari 2000). recursos, por exemplo, pode influenciar O dossel da floresta é um ambiente os padrões de diversidade alfa e beta. exposto ao vento e a altas taxas de Locais com limitação de recursos, ou luminosidade, baixa produção energética, geralmente reduzida e alta relação carbono (C) : apresentam menor diversidade alfa, que nitrogênio (N). O nitrogênio é um 1 com conectividade recurso essencial para as formigas, a diversidade de espécies em uma porém ocorre de forma limitada e mesma área (Kaspari 2000). previsível nas copas das árvores Mazzochini et al. (2009) (Davidson 1997, Kaspari & Yanoviak encontraram que a diversidade alfa é 2001). No folhiço, o ambiente é maior no folhiço do que no dossel contínuo, úmido, sem vento, com pouca florestal, concluindo que a escassez de luz e baixa relação C : N, sendo assim, recursos rico em recursos (nitrogênio) que estão formigas arborícolas podem limitar a distribuídos densidade homogeneamente no e a territorialidade de espécies em das uma espaço (Yanoviak & Kaspari 2000). determinada Essas diferenças físicas e ambientais sugeriram que, em escalas maiores, implicam em estratégias distintas para esses explorar os recursos, influenciando o substituição de espécies entre copas de comportamento, distribuição e riqueza árvores (diversidade beta) maior que das entre formigas que habitam estes ambientes (Hölldobler & Wilson 1990). No dossel florestal, a restrição área. fatores Estes podem áreas de autores tornar folhiço. Sob a esta perspectiva, o objetivo deste trabalho foi testar a hipótese de que a de recursos, o espaço limitado e a diversidade beta é maior no dossel do facilidade de defesa têm sido apontados que no folhiço. A previsão foi de que a como fatores que contribuíram para a mudança na composição de espécies territorialidade das formigas, sendo entre dois locais seria maior no dossel, comum encontrar uma ou poucas uma vez que as formigas arborícolas espécies (Davidson sobre 1997, a mesma árvore habitam um ambiente com menos Davidson 1998, recursos e são mais territorialistas. Kaspari & Yanoviak 2001). No folhiço, como os recursos são mais abundantes Métodos Este trabalho foi realizado na os territórios podem ser menores e também mais flexíveis, e por isso as formigas que ocorrem nesse ambiente são menos territorialistas. Assim, no folhiço a sobreposição de territórios das espécies é mais comum, o que aumenta Reserva do Km 41 (02°24’ S, 59°44’ O), área pertencente ao Projeto Dinâmica Biológica de Fragmentos Florestais, localizada a aproximadamente 80 km ao norte de Manaus. Foram percorridas trilhas da 2 grade de pesquisa instalada na Reserva, área ao longo das quais foram selecionadas substituição de espécies (diversidade árvores com altura entre 4 e 10 m, beta) foi calculada entre 20 pares distanciadas no mínimo 20 m entre si. aleatórios de unidades amostrais da Foram amostradas 20 árvores e o copa e do folhiço. Para isso o número folhiço sob a copa destas árvores. Em de espécies diferentes em um dado par cada árvore foram colocadas entre três e de unidades amostrais foi dividido pelo cinco iscas de sardinha com farinha de número total de espécies existentes nas trigo (cerca de ¼ de colher de sopa) duas unidades amostrais em questão. O sobre um pedaço de papel higiênico de valor obtido foi então multiplicado por 10 x 8 cm, obedecendo a razão de uma 100, isca para cada 1 m de diâmetro de copa porcentagem. O resultado deste cálculo da árvore. O mesmo número de iscas foi chamado de razão de troca de utilizado nas copas das árvores foi espécies e usado como medida da usado no folhiço, sendo espalhadas de diversidade beta na copa e no folhiço. forma eqüidistante nos dois locais. Para Para testar se houve diferença entre a maximizar espécies razão de troca de espécies de formigas amostradas, depois de instaladas, as na copa e no folhiço, foi realizado um iscas foram checadas aos 10 min, 20 teste t. a riqueza de de folhiço para ser sob a copa. transformado A em min, 40 min e 60 min, sendo que cada checagem consistia de coleta de um indivíduo de cada espécie presente. As três primeiras checagens (10 min, 20 min e 40 min) foram feitas em duas iscas de cada ambiente (copa e folhiço) e aos 60 min, todas as iscas foram checadas e posteriormente removidas. As formigas coletadas foram identificadas até o menor nível taxonômico possível. Foi definida como unidade amostral o conjunto de iscas em cada ambiente: copa da árvore e Resultados No total foram coletadas 61 espécies de formigas, sendo 52 espécies no folhiço e 20 nas copas das árvores. Nas copas das árvores, 60 % das espécies ocorreram apenas uma vez (12 espécies), enquanto que no folhiço 44 % (23 espécies) foram coletadas somente uma vez. A razão de troca de espécies foi maior entre as copas do que entre o folhiço, sendo em média 12 % maior nas copas (t = 3,453, g.l. = 38, p = 0,001, Figura 3). 3 104 102 Razão de troca de espécies (%) 100 98 96 94 92 90 88 86 84 82 80 78 Copa Folhiço Ambientes amostrados Figura 1. Razão de troca de espécies de formigas (expressa em porcentagem) entre áreas de copas de árvores (n = 20) e folhiço (n = 20). O ponto central da caixa representa a média da razão de troca de espécies, as caixas representam o erro padrão e as barras horizontais representam um intervalo de confiança de 95%. antagônicos destes trabalhos indiquem Discussão Apesar da diversidade alfa de que os padrões de riqueza local formigas encontrada no folhiço ter sido (diversidade alfa) podem variar entre maior do que nas copas da floresta, a diferentes regiões e ambientes, estes maior razão de troca de espécies autores (diversidade beta) foi registrada entre as diversidade beta copas. Yanoviak & Kaspari (2000), na Geralmente, quando floresta da Ilha de Barro Colorado, diferentes possuem diversidade alfa encontraram maior diversidade alfa no elevada, espera-se que a diversidade dossel, enquanto Bruhl et al. (1998) beta também seja alta, uma vez que o encontraram em número de espécies que pode mudar de Borneo uma maior diversidade alfa no um ambiente para o outro é maior folhiço. (Magurran 1983). Porém, estas métricas em Embora uma os floresta resultados não mencionam se dois como a comporta. lugares 4 não estão necessariamente acopladas, já formiga em uma mesma copa de árvore, que dois lugares diferentes, com elevada ou diversidade diferentes. alfa, podem apresentar a mesma espécie em copas baixa diversidade beta caso não haja As diversidades alfa e beta de troca expressiva de espécies entre as comunidades de formigas podem ser áreas. influenciadas pela heterogeneidade na Nesse estudo, a menor disponibilidade de recursos entre diversidade alfa e a maior diversidade ambientes de uma mesma floresta. A beta encontrada nas copas podem ser maior razão de troca de espécies nas explicadas por variações morfológicas e copas das árvores sugere que em uma arquiteturais de ampla escala geográfica possa haver uma maior diversidade gama de formigas no heterogeneidade estrutural em larga dossel da floresta em relação ao folhiço, escala no dossel (Yavoniak & Kaspari sendo 2000). Algumas conseqüências destas interessante a ser abordada em estudos variações são a área descontínua para futuros. árvores, entre o as espécies que gera esta uma problemática forrageio, pontos de acesso restritos a recursos previsíveis e facilidade de Agradecimentos defender o território devido à estrutura Agradeço a todos que direta ou de vias retilíneas formada pelos ramos indiretamente me proporcionaram esta das vivência árvores. Estas características, única. Um agradecimento aliadas à baixa disponibilidade de especial ao Bonitão pela ajuda de recursos, sido campo para este trabalho, a Mari por determinantes para a evolução do ceder altruistamente a escada que trouxe territorialismo das formigas arborícolas para usar no trabalho dela, ao Fabrício (Davidson 1998). O comportamento locomia e ao Dé pela revisão deste territorialista trabalho. Gostaria de registrar meu parecem implica ter na menor sobreposição de territórios de formigas muito arborícolas (Yanoviak & Kaspari 2000, Paulinho, Glaucólise, Zé e Flávia pelos Kaspari e, conselhos, conversas e oportunidade de conseqüentemente, não é freqüente participar desta edição do curso de encontrarmos mais de uma espécie de Ecologia da Floresta Amazônica 2009 e & Yanoviak 2001) obrigado aos coordenadores 5 compartilhar experiências e intimidade galera (caminho sem volta) com pessoas tão presença nos momentos indispensáveis diferentes e de paixões convergentes. para clarear as idéias e dar boas Obrigado gargalhadas, também professores que a todos participaram os companheira, nos que marcou Igarafests. Valeu desta galera que fez desse EFA 2009 um edição do curso e compartilharam momento inesquecível para mim de conosco críticas, troca de vivência e exposição de pontos experiências e sugestões, vista, de vista divergentes, porém todos com contribuindo para nosso crescimento um objetivo comum. Espero ainda ver e pessoal e acadêmico. Valeu em especial esbarrar com todos esses novos e aos monitores Lelê e Fabrício pelas eternos amigos por ai fazendo muito histórias, gargalhadas e cumplicidade sucesso em suas carreiras!! Valeu por com os alunos. A rapaziada do IBAMA esse momento que, como diamantes, pela prestatividade e hospitalidade em são raros, mas duradouros... Anavilhanas. A ponto dona de Eduarda e Eduardo pelo “rango” e mil facetas do Referências frango e carne na panela, ao Júnior pela Brühl, C.A., G.U. Gunsalam & K.E. troca de histórias e companheirismo, e a Linsenmair. 1998. Stratification of tripulação do barco na faze hidráulica ants (Hymenoptera, Formicidae) in do a primary rain forest in Sabah, curso pelo acolhimento e empréstimo da voadeira. Agradeço a Borneo. galera toda da turma EFA 2009, “Du”, Ecology, 14: 285-297. “Musgo”, “Marienta”, “Paulinha Journal of Tropical Davidson, D.W. 1997. The role of marromena”, “Papito Cruz Credo”, resource “Zézinho Lid Cana Fuleragem”, “Tico”, evolutionary ecology of tropical “Liana”, “Ridícula Pão com Ovo”, arboreal ants. Biological Journal of “Ruiva”, the Linnean Society, 61:153-181. “Bonitão”, “Mari”, “Bebê “Odonata-Men”, “Pati Wild”, Misericórdia”, “Tosh”, “Carol”, Davidson, imbalances D.W. discovery 1998. versus in the Resource resource “Claudíssima” e “Take on me”. Um domination in ants: a functional abraço especial ao Zézinho que abriu a mechanism for breaking the trade- temporada de cana na Dimona e a 6 off. Ecological Entomology, 23: practical 484-490. Belhaven. Gunadi, B. & H.A. Verhoef. 1993. 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