Revista Ciências da Saúde - Universidade Federal de Santa Catarina

Transcrição

Revista Ciências da Saúde - Universidade Federal de Santa Catarina
Revista
Ciências
da Saúde
Editora Secco
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
Reitor: Alvaro Toubes Prata
Vice-Reitor: Carlos Alberto Justo da Silva
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
Diretora: Kenya Schmidt Reibnitz
Editoração eletrônica
FreeGraf - Editora e Gráfica (41) 3286-8876
Capa
Paulo Roberto da Silva
Revisão
Rodrigo Brasil
Secretário
Luiz Vicente Vieira
Revista
Ciências
da Saúde
ISSN 0101 - 9546
Revista Ciências da Saúde
Florianópolis
V. 28, Nº 2
P. 1-60
2009
Revista Ciências da Saúde é uma revista semestral editada pelo Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Santa Catarina.
Comissão Editorial: Tânia Sílvia Fröde (Editora-chefe - UFSC), Roberto Henrique Heinish (Clínica
Médica - UFSC), Inês Beatriz da Silva Rath (Estomatologia - UFSC), Liliane Janete Grando (Patologia
- UFSC), Elisabeth Wazlawik (Nutrição - UFSC), Maria Itayra Coelho de Souza Padilha (Enfermagem
- UFSC), Patrícia Hass (Análises Clínicas - UFSC), Ruth Meri Lucinda da Silva (Farmácia-Univali),
Rosane Nitschke (Enfermagem – UFSC), Cláudia Penna (Enfermagem – UFMG), Paulo Kechele (Medicina – UFSC), Cleusa Martins (Enfermagem – UFSC), Darlene Tavares (Enfermagem – UF Triângulo
Mineiro), Liliete Canes (Farmácia/bioquímica – UFSC), Michel Otuki (Farmácia – Furb),César Augusto da Silva (Bioquímica – Univasf).
Comissão Consultiva: Liliete Canes (UFSC), Darlene Tavares (UF TRIÂNGULO MINEIRO), Paulo
Kechele (UFSC), Patrícia Haass (UFSC), Cleusa Rios Martins (UFSC), César Augusto da Silva
(UNIVASF)
(Catalogação na fonte pela Biblioteca Universitária da
Universidade Federal de Santa Catarina)
Revista Ciências da Saúde / Universidade Federal de Santa Catarina. Centro e Ciências da Saúde.
-- V.1, n. 1 (1982)- , - Florianópolis: Impresa Universitária, 1982.
V.: 27cm
Semestral
ISSN 0101-9546
1. Ciências Médicas. 2. Saúde-pesquisa. I. Universidade Federal de Santa Catarina. II Centro
de Ciências da Saúde
Indexada na Base de Dados LILACS
Endereço:
Revista Ciências da Saúde - Secretaria do Centro de Ciências da Saúde da UFSC
Capus Universitário - Trindade
Caixa Postal 476
88040 970 - Florianópolis - SC
Telefone (0XX) 48 3721 9525 / 3721 9783 (0XX) 48 3721 9712 ramal 211
SUMÁRIO
Editorial....................................................... 6
ACHADOS
DIAGNÓSTICOS
NO
ATENDIMENTO EMERGENCIAL DO
AMBULATÓRIO DE OFTALMOLOGIA
DO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA
CATARINA, NOS ANOS DE 2000 A 2005.
[Diagnostic findings in ophthalmology
clinic emergency attendance of the
University Hospital of Federal University
of Santa Catarina in the years 2000 to
2005]. Jeremias Mozachi Sandri; Augusto
Adam Netto; Oswaldo Petermann Neto;
Kleber Eidi Shimono; Cleyton Takaiti
Shimono . ............................................... 7
MIASTENIA GRAVIS: PERFIL CLÍNICO DE
UMA SÉRIE DE 20 CASOS [Myasthenia
gravis: Clinical profile of a series of 20
cases]. Fernando Martins Braga; Augusto
Adam Netto; Kleber Eidi Shimono; Cleyton
Takaiti Shimono; Oswaldo Petermann
Neto ............................................................ 35
PAPEL DOS NEUTRÓFILOS NA SAÚDE
E NA DOENÇA. [The role of neutrophils
in health and disease]. Iris Mattos Santos,
Christiane Souza Maia Neves, Tânia Silvia
Frode .......................................................... 45
REPENSANDO
O
USO
DE
MEDICAMENTOS:
IMPACTO
DAS
ATIVIDADES
DE
EDUCAÇÃO
E
AVALIAÇÃO
DAS
TÉCNICAS
DE
INFORMAÇÃO EM SAÚDE JUNTO A
ANTISSEPSIA BACTERIANA DO CONE
UMA ESCOLA DE EDUCAÇÃO BÁSICA
DE APLANAÇÃO DOS TONÔMETROS
E A COMUNICADORES DE RÁDIO
DE
GOLDMANN
EM
USO
EM
(NA CIDADE DE FLORIANÓPOLIS –
CONSULTÓRIOS E HOSPITAIS DA
BRASIL) [Rethinking the use of drugs:
GRANDE FLORIANÓPOLIS [Technical
impact of the activities of education and
evaluation of bacterial antisepsis of
health information with a basic school and
applanation cone of Goldmann’s tonometry
broadcasters (in Florianopolis city - Brazil].
in use in clinics and hospitals of great
Alexandra Morais de Alexandri; Aline
Florianópolis]. Carolina Rottili Daguano;
Aparecida Foppa; Ana Carolina Welter;
Augusto Adam Netto; Oswaldo Petermann
Célia Maria Teixeira De Campos; Heloisa
Neto; Kleber Eidi Shimono; Cleyton Takaiti
Shimono ..................................................... 17 Pamplona Cunha; Maria Leonor Santana
Scherer; Marina Raijche Mattozo Rover &
Marlene Zannin .......................................... 51
CARACTERIZAÇÃO
QUANTO
AOS
ASPECTOS
DE
CONTROLE
AO
NORMAS EDITORIAIS DA REVISTA
TABAGISMO EM UMA POPULAÇÃO COM
CIÊNCIAS DA SAÚDE................................ 56
DISLIPIDEMIA [Characterization on the
issues of control of smoking in a population
with dyslipidemia.]. Manoela Bagestãn,
Elizabeth Martins Hermes, Cláudia de
Souza Marques da Silva, Rodrigo Schütz,
Geny Aparecida Cantos ............................. 27
Revista Ciências da Saúde
Editorial
Prezado leitor
Nós temos a honra e a alegria de informar que a Revista Ciências da Saúde do CCS da Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC) está galgando degraus cada vez mais altos, já sendo classificada atualmente no ranking da Qualis, da CAPES, como B4/B5, o que
é motivo de grande satisfação para todos nós e de agradecimentos a
todos vocês que lêem e/ou ajudaram na construção da revista.
Nós queremos expressar aqui a nossa gratidão pelas leituras,
pelos artigos e, principalmente, pelas contribuições enviadas ao longo
de todos estes anos de trabalho. É graças a cada um de vocês que,
neste momento, está lendo este texto, que alcançamos esta melhoria
e, ainda assim, procuramos sempre aprimorar nosso trabalho, pesquisando, avaliando e abordando os mais diversos temas na área da
saúde com interesse, dedicação e, sobretudo, amor, pois amamos o
que fazemos - o que é imprescindível em todas as profissões.
Num mundo onde as pessoas muitas vezes esquecem dos valores mais importantes em prol de ilusões, somos felizes por trabalharmos com a saúde, com o conhecimento do corpo e (por que não?) da
mente, da alma.
Nós gostaríamos, assim, prezado (a) leitor (a), de lhe convidar
a continuar apreciando à nossa revista e, por fim, de lhe lembrar para
que nunca esqueça de palavras como consciência, ética, verdade,
generosidade, coragem, amizade, amor, enfim...Pois são estas algumas das palavras e dos valores mais importantes do mundo e do universo. E são elas que nos movem, nos enriquecem, nos fazem seres
humanos mais dignos e mais belos. Aliás, de nada adianta termos
toda a saúde do mundo quando não as conhecemos. Por isso, viva a
vida com inteligência, cultivando o que há de melhor em você e nos
outros, aprendendo com as velhas e novas experiências e, acima de
tudo, com respeito e dignidade para podermos atingir a mais plena e
real felicidade!
Muito obrigado!
Leandro Rodrigues
Acadêmico da UFSC, secretário da Revista Ciências da Saúde e
editor do site Escritores do Sul (http://www.escritoresdosul.com.br)
Sandri J.M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 7-16, julh/dez, 2009
ACHADOS DIAGNÓSTICOS NO ATENDIMENTO EMERGENCIAL DO AMBULATÓRIO DE OFTALMOLOGIA DO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, NOS ANOS DE 2000 A 2005. [Diagnostic findings
in ophthalmology clinic emergency attendance of the University Hospital of Federal University of Santa Catarina in the years 2000 to 2005]
Jeremias Mozachi Sandri1; Augusto Adam Netto2; Oswaldo Petermann Neto3; Kleber Eidi Shimono4;
Cleyton Takaiti Shimono5
Resumo: Há uma carência de estudos sobre diagnósticos emergenciais oftalmológicos em nosso meio. Este trabalho teve
como objetivo verificar os diagnósticos mais freqüentes nos pacientes atendidos emergencialmente pelo ambulatório do serviço de oftalmologia do HU/UFSC através de um estudo observacional, do tipo descritivo, transversal, retrospectivo e não
intervencionista, com dados referentes a 1.848 consultas, entre o período de janeiro de 2000 até dezembro de 2005. A maioria
dos pacientes procedeu de Florianópolis, a distribuição dos pacientes segundo sexo foi homogênea. As conjuntivites foram o
principal diagnóstico encontrado entre todos os atendimentos, com 24,9%, seguidas pelo corpo estranho corneal, com 16,2%.
A uveíte posterior predominou entre os diagnósticos do grupo das doenças emergenciais do segmento posterior. Houve um
excesso de risco para doenças da córnea e da úvea anterior, no sexo masculino, e para doenças da conjuntiva e pálpebras, no
feminino.
Palavras-chave: conjuntivites, corpo estranho corneal, uveíte.
Abstract: There is a lack of studies on diagnostic ophthalmic emergency in our country. This study aimed to determine the
most frequent diagnoses among patients attended at the HU/UFSC ophthalmic emergency department through an observational, descriptive, transversal, retrospective and non-interventional analysis of data from 1.848 attendances, from January 2000
to December 2005. Most of the attended patients were from Florianópolis (82,0%). The patient distribution according to gender was homogeneous. Conjunctivitis was the main diagnosis found among all diseases (24,9%), followed by corneal foreign
bodies (16,2%). Posterior uveitis was the main diagnosis among the posterior segment diseases. There was an excess of risk
for diseases of the cornea and anterior uvea among males, as well as for conjuntival and palpebrae diseases among females.
Keywords: conjunctivitis, corneal foreign body, uveitis.
Introdução
O ambulatório do serviço de oftalmologia
do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina (HU/UFSC) foi instituído em
1982, e desde então presta atendimento gratuito a
pacientes com queixas oculares da região da Grande Florianópolis, do restante do Eestado de Santa
Catarina e do País.
Inicialmente constituído por dois médicos
oftalmologistas, o setor hoje conta com cinco especialistas em oftalmologia que atendem diariamente em regime ambulatorial, no período matutino das 8:00 às 12:00 horas e vespertino das 13:00
às 17:00 horas.
São beneficiados pelo serviço os pacientes
encaminhados a partir dos centros de saúde de
Florianópolis, bem como aqueles que necessitam
de atendimento imediato provenientes de outros
Médico graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina
Professor titular da disciplina de oftalmologia do departamento de cirurgia do CCS/UFSC. Professor coordenador da
disciplina de oftalmologia do módulo de sistemas sensoriais da UNISUL. Chefe do serviço de oftalmologia do HU/UFSC.
E-mail: [email protected]
3
Médico graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected]
4
Aluno do 12º período de graduação em Medicina da Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected]
5
Aluno do 7º perído de graduação em Medicina da Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected]
7
1
2
Sandri J.M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 7-16, julh/dez, 2009
setores do hospital.
As queixas oculares resultam em um grande
número de atendimentos hospitalares, pois traduzem dificuldades na visão, que é um dos sentidos
fundamentais do corpo humano. Assim, cabe ao
oftalmologista o tratamento das inúmeras enfermidades que atingem os olhos e seus anexos.
As afecções oculares podem ser distinguidas
didaticamente de acordo com a anatomia do bulbo
ocular. Desta maneira, as doenças dos olhos podem ser diferenciadas em afecções da córnea, trato uveal, esclera, cristalino, retina, humor vítreo e
aquoso, e anexos do olho como pálpebras, conjuntiva, músculos extra-oculares, aparelho lacrimal e
órbita. Deve-se lembrar que existem enfermidades
que atingem várias regiões anatômicas simultaneamente, não cabendo aqui este tipo de classificação.
A conjuntiva é uma membrana mucosa que
reveste a esclerótica e a superfície interna das pálpebras.1 A inflamação da mesma, denominada conjuntivite, é caracterizada pela presença de sintomas
como sensação de corpo estranho, prurido, ardor e
fotofobia. Hiperemia, lacrimejamento e exsudação
são sinais típicos da enfermidade.2
A conjuntivite normalmente tem causa exógena, porém pode ser endógena.2 De acordo com
a sua apresentação, pode ser classificada em hiperaguda, aguda, crônica ou recorrente; conforme a
origem, em infecciosa e não-infecciosa.3 A presença de alguns sinais ou sintomas específicos pode
auxiliar na elucidação da etiologia.
A conjuntivite alérgica está mais relacionada
com a presença de prurido severo, principalmente
bilateral, recorrente, com história familiar de rinite alérgica, asma ou dermatite atópica.4 Na conjuntivite viral é comum a presença de adenopatia
pré-auricular e exsudação mucóide mínima. Na
bacteriana, normalmente há presença de exsudação purulenta abundante ou mucopurulenta, com
dificuldade para abertura ocular ao amanhecer.2,5
Para Lima et al.6, a etiologia viral é a mais
freqüente entre as conjuntivites. Para Tasman et
8
al.7 a conjuntivite bacteriana é a forma mais comum de infecção ocular. Independente da causa, a
inflamação da conjuntiva é o problema ocular mais
comum2,4,8 e a causa mais freqüente de “olho vermelho” visto pelos médicos da atenção primária.
Entre as doenças degenerativas da conjuntiva, uma condição extremamente comum entre
adultos2 é a pinguécula. Trata-se de uma excrescência triangular sobre a conjuntiva, que se desenvolve ao nível da fenda palpebral, com o vértice
do triângulo afastado da córnea, que atinge ambos
os lados da mesma (mais comumente no lado nasal). É de cor amarela devido à infiltração hialina e degeneração elástica do tecido submucoso.9
A inflação destes nódulos elásticos, fato também
comum,2 caracteriza a pingueculite.
O pterígio é uma lesão triangular semelhante à pinguécula que invade a córnea, normalmente
no lado nasal, bilateralmente. É conhecido por ser
um fenômeno irritativo devido à luz ultravioleta,
ressecamento e vento, desde que é comum em pessoas que se expõem ao sol, poeira, areia e vento.
Na córnea, existe substituição da camada de Bowman por tecido elástico hialino.3 Quase sempre,
são precedidos de pinguéculas.3
Constituindo o grupo dos tumores conjuntivais está o granuloma conjuntival, que é um tumor
benigno primário que ocorre em torno de corpos
estranhos, material sebáceo extravasado no calázio
e em associação a doenças como sarcoidose, sífilis, doença da arranhadura de gato e, raramente,
coccidiodomicose.2
Outro exemplo é a melanose conjuntival, que
é uma pigmentação pré-cancerosa que se dissemina amplamente pela conjuntiva e que raramente é
observada em pessoas idosas; pode ocorrer também na pele das pálpebras e na face.9
A hemorragia subconjuntival é uma desordem da conjuntiva causada pela ruptura de
um vaso conjuntival. É uma doença comum,
que pode ocorrer espontaneamente, algumas vezes precedido por um período de tosse e espirro.
Sandri J.M. et al.
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Normalmente é unilateral e acomete qualquer grupo etário.2 Pacientes com conjuntivite viral podem
ocasionalmente vir a apresentar hemorragia conjuntival.4
A córnea faz parte da camada externa ou
túnica fibrosa do olho.1 É um tecido transparente,
localizado no sexto anterior da camada externa, inserida na esclerótica ao nível do limbo córneo-escleral, com rica inervação sensitiva. Possui cinco
camadas distintas, é nutrida pelos vasos do limbo
córneo-escleral, humor aquoso e lágrima, e sua superfície consegue a maioria do oxigênio a partir da
atmosfera.2
A inflamação do estroma da córnea que está
sob um epitélio corneano intacto chama-se ceratite
estromal, e a inflamação do estroma com ausência
do epitélio sobrejacente denomina-se úlcera.10 Geralmente se manifestam por dor, fotofobia e hiperemia ocular.3 Podem ser de etiologia bacteriana,
viral, fúngica, alérgica, traumática, medicamentosa e nutricional. Dentre estas, a ceratite viral por
herpes simples é a causa mais comum de ulceração
corneana e causa corneana mais comum de cegueira nos EUA. A cicatrização causada pela ulceração
corneana é a maior causa de cegueira e prejuízo da
visão de todo o mundo.2
A córnea, sendo uma estrutura pouco protegida, torna-se mais suscetível a traumatismos e
erosões.11 A atividade desenvolvida essencialmente por indivíduos do sexo masculino na metalurgia,
serralheria e mecânica, é a principal causa do trauma, sendo ferro e outros metais os mais freqüentes corpos estranhos encontrados. Destes, cerca de
80% apresentam localização corneana.12 Além disso, o trauma ocular é a etiologia mais comum de
cegueira unilateral em crianças e jovens.2
A região que abrange os cinco sextos posteriores da túnica fibrosa é denominada de esclera, formada por tecido conjuntivo rico em fibras
colágenas que se entrecruzam e seguem, de modo
geral, direções paralelas à superfície do olho.1 Sua
grande resistência no adulto faz com que suporte
pressões intra-oculares muito elevadas, sem sofrer
distensões.11 As doenças mais freqüentes da esclera são de caráter inflamatório.13
A inflamação envolvendo a fina camada de
tecido vascular elástico que recobre a esclera (chamada episclera) é denominada episclerite. É relativamente comum, acomete igualmente ambos os
sexos e tem causa desconhecida, provavelmente
relacionada com reação de hipersensibilidade. Sua
principal associação é com hiperuricemia e gota,
e é uma condição benigna. Os principais sintomas
são: vermelhidão, dor, fotofobia, edema e lacrimejamento.
Esclerite é a inflamação da esclera propriamente dita, é uma degeneração granulomatosa
crônica caracterizada por destruição do colágeno,
infiltrado celular e alterações variáveis de vasculite. É uma doença incomum, que pode ser causada
por doença auto-imune, granulomatosa, desordens
metabólicas, infecções ou ter causa desconhecida.
Manifesta-se com dor intensa, diminuição da acuidade visual, edema peri-orbitário, proptose e diminuição dos movimentos oculares.2
A úvea é um revestimento vascular que
abrange a coróide, corpo ciliar e íris. A uveíte
abrange um grupo grande e heterogêneo de distúrbios que têm em comum inflamação de uma ou
mais partes do trato uveal,10 normalmente são unilaterais, e são comuns principalmente em jovens e
pessoas de meia idade. A forma mais freqüente é a
uveíte anterior aguda (irite ou iridociclite), caracterizada por dor, fotofobia, embaçamento da visão
e pupila pequena e irregular. Na uveíte posterior
(coriorretinite) a retina é quase sempre afetada secundariamente.
A estrutura biconvexa, avascular, incolor,
suspensa atrás da íris pela zônula que se conecta
com o corpo ciliar é denominada cristalino. Sua
função primária é de focar os raios de luz sobre
a retina, através da sua interação fisiológica entre
corpo ciliar e zônula, denominada acomodação.2
Esta estrutura divide anatomicamente o bulbo
9
Sandri J.M. et al.
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ocular em duas partes: segmento anterior e segmento posterior. O segmento anterior é formado
pelas estruturas localizadas anteriormente à cápsula posterior do cristalino: pálpebras, córnea, corpo
ciliar, íris, esclera, conjuntiva e o próprio cristalino. Localizado posteriormente a tal estrutura
encontra-se o segmento posterior, formado humor
vítreo, retina, coróide e epitélio segmentar.
Opacidades do cristalino são chamadas cataratas, causas importantes de cegueira e perda visual no mundo inteiro. Dentre suas muitas causas,
figuram doenças metabólicas, agentes físicos, doenças oculares, vírus, doenças cutâneas, drogas e
o envelhecimento. O tipo mais comum é o idiopático e desenvolve-se em indivíduos de mais idade,
sendo chamadas de cataratas senis.10
Revestindo a porção interna de dois terços
da parede posterior do bulbo ocular encontra-se
a retina, uma lâmina fina de tecido neural, semitransparente, com múltiplas camadas. Formada
por tecido complexo, tem a função de transformar
o estímulo luminoso em impulso nervoso.
A separação da retina sensorial do epitélio
pigmentar retiniano é denominada descolamento
de retina. Há três tipos principais: o descolamento
regmatogênico é uma rotura compreendendo toda
a espessura da retina sensorial, geralmente associado à miopia, afacia e trauma ocular; o descolamento tracional, ocorre mais comumente por
retinopatia diabética proliferativa, retinopatia da
prematuridade e trauma ocular; o descolamento
hemorrágico, por sua vez, é resultado de coleção
de fluido abaixo da retina sensorial, causado por
doenças do epitélio retiniano pigmentar e coróide.2
A retina pode ter alterações relacionadas
com doenças sistêmicas, dentre elas cita-se a hipertensão arterial. As alterações da hipertensão arterial nos vasos retinianos fornecem indícios úteis
do prognóstico para o médico.10 Na retinopatia hipertensiva, pode haver atenuação do reflexo luminoso, exsudatos algodonosos, exsudação grave e
alterações microvasculares extensas.2
10
Protegendo a parte anterior do bulbo ocular
encontram-se as pálpebras, que são anexos oculares sustentados pelo tarso rígido, fibroso,2 e nas
suas margens livres se abrem glândulas complexas sebáceas de Meibomius.11 Os folículos pilosos
dos cílios possuem glândulas anexas sebáceas (de
Zeis). Situadas entre eles estão as glândulas sudoríparas recodificadas de Moll.11
A infecção das glândulas das pálpebras chama-se hordéolo. Dor, vermelhidão e edema são os
principais sintomas. A maioria é causada por infecções estafilocócicas.2
O calázio é uma inflamação granulomatosa
crônica estéril idiopática da glândula meiboniana,
caracterizada por edema indolor. Pode começar
com uma ligeira inflamação, e pode ser diferenciado do hordéolo pela ausência de sinais inflamatórios agudos.2
Blefarite é a inflamação crônica bilateral das
margens palpebrais. Existem dois tipos principais:
estafilocócica e seborréica. Ambos estão frequentemente presentes, e causam irritação, prurido e
ardor nas margens das pálpebras, bem como o acúmulo de granulações entre os cílios.2
A triquíase é o toque dos cílios sobre a córnea e pode ser devido ao entrópio, epibléfaro ou
simplesmente pelo crescimento desordenado. A
triquíase causa irritação corneana e evolui com
ulcerações. Doenças inflamatórias crônicas das
pálpebras, como a blefarite, podem causar cicatrização dos folículos ciliares e consequentemente
crescimento desordenado dos cílios.2 Origina sintomas como ardor, sensação de corpo estranho, lacrimejamento e fotofobia.14
A pálpebra também pode ser acometida pelo
herpes zoster oftálmico, resultante da reativação
do vírus varicela-zoster. Os sintomas prodrômicos
incluem cefaléia, mal-estar, hiperestesia cutânea e
hiperemia do dermátomo correspondente. A erupção cutânea manifesta-se por vesículas na região
frontal e hemiface, respeitando a linha média.
Pode haver envolvimento da pálpebra ipsilateral,
Sandri J.M. et al.
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acompanhada de hiperemia conjuntival e decréscimo de sensibilidade.2
Outro anexo ocular é o aparelho lacrimal,
formado pela glândula lacrimal (com uma porção
orbital e uma palpebral), glândulas lacrimais acessórias (de Krause e Wolfring) e pelos canalículos
lacrimais e saco lacrimal (localizado na fossa lacrimal). O ducto nasolacrimal também faz parte do
complexo, conecta o saco lacrimal ao meato inferior da cavidade nasal, e abre-se espontaneamente
após o primeiro mês de vida. Na porção distal do
ducto, encontra-se a válvula de Hasner, que evita
o fluxo retrógrado de ar e de lágrimas. A falha na
canalização desta estrutura causa a dacriocistoestenose congênita da válvula de Hasner, que atinge
de 4 a 7% dos recém-nascidos.2
O defeito óptico que impede os raios de luz de
serem trazidos para um único foco na retina é denominado de erro refrativo ou ametropia.2 Como condições em que há vício de refração, citam-se a miopia, hipermetropia, o astigmatismo e a presbiopia.
O glaucoma é caracterizado pela pressão
intra-ocular alterada associada à perda do campo
visual e aumento da escavação do disco óptico.
Estima-se que dois milhões de norte-americanos
tenham glaucoma, sendo a principal causa de cegueira prevenível naquele país. Pode ter etiologia
primária, secundária ou congênita. O glaucoma
primário de ângulo aberto, a forma mais comum,
causa perda visual bilateral progressiva assintomática. Outras formas da doença são responsáveis
por morbidade visual grave em indivíduos em todas as idades.2
A realização desta pesquisa foi impulsionada
pela carência de estudos abordando os diagnósticos emergenciais em oftalmologia em nosso meio.
Métodos
Trata-se de um estudo observacional, do tipo
descritivo, transversal, retrospectivo e não intervencionista.
Foram analisados dados referentes a 1.848
consultas de caráter emergencial no ambulatório
do serviço de oftalmologia do HU/UFSC, no período de janeiro de 2000 até dezembro de 2005.
Neste estudo foram incluídos todos os pacientes atendidos emergencialmente pelo serviço
supracitado, e foram excluídos aqueles cujos dados do prontuário eram incompletos.
Os dados foram obtidos mensalmente por
meio da análise das agendas de consultas referentes aos atendimentos emergenciais diários, arquivadas no Serviço de Prontuários do Paciente do
HU/UFSC (SPP-HU/UFSC).
O protocolo elaborado foi estabelecido com
as seguintes variáveis: diagnóstico único, sexo, cidade de procedência e idade (divididas de acordo
com a faixa etária: 0-10; 11-20; 21-30; 31-40; 4150; 51-60; 61-70; acima de 70).
As doenças oculares diagnosticadas foram
organizadas utilizando-se o critério anatômico,
divididas em doenças do segmento anterior, doenças do segmento posterior e outras. As doenças
do segmento anterior foram subdivididas também
utilizando o critério anatômico, em doenças da
conjuntiva, córnea, úvea anterior, pálpebras e outras. No grupo das doenças do segmento posterior
incluíram-se as doenças da coróide, da retina, do
epitélio pigmentar e outras.
Os dados coletados foram submetidos à análise estatística através do programa Epi-Info® versão 6.04 e os gráficos e tabelas foram confeccionados com o uso do programa Microsoft Excel®.
Resultados e discussão
Apesar de se observar que a grande maioria
dos pacientes atendidos era procedente do Município de Florianópolis (Gráfico 1), pode-se considerar o HU/UFSC como referência regional no
atendimento de emergências oftalmológicas, tendo em vista o número de pacientes procedentes de
11
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Sandri J.M. et al.
municípios vizinhos. Os eventuais casos cujos pacientes procederam de municípios distantes ou de
outros estados pode ser explicado pelo acaso, ou
pelo fato de Florianópolis ser reconhecido como
um pólo turístico em evidência.
1425
82%
Florianópolis
São José
Palhoça
Biguaçú
Gov. Celso Ramos
59
3%
68
4%
Outras
159
9%
26
1%
17
1%
Gráfico 1: Distribuição dos pacientes segundo a
procedência.
O declínio do número de atendimentos em
relação aos anos (Gráfico 2) pode ser explicado
pela abertura de novos serviços hospitalares com
atendimento emergencial de pacientes com queixas oculares na região. Outra hipótese otimista
seria a de se considerar uma melhor eficiência no
atendimento a nível primário, o que evitaria a realização de encaminhamentos desnecessários ao
atendimento hospitalar de emergência.
500
450
450
400
400
350
350
300
300
250
250
200
200
150
150
100
100
50
0
cia do sexo masculino entre os traumatismos oculares superarem, em número absoluto, o predomínio do sexo feminino nas doenças não relacionadas
ao trauma ocular. Esta diferença também poderia
ser conseqüência do mero acaso. Schellini et al15 e
Sanchez et al16 obtiveram o padrão homogêneo em
sua amostra, onde 52,6% e 53,0% dos pacientes
eram do sexo feminino, respectivamente. Em contrapartida, nos estudos de Layaun et al17 e Araújo
et al18 houve diferença significativa, com 70,9% e
72,0% dos casos, respectivamente, correspondendo ao sexo masculino. Outros autores encontraram
uma proporção de 2 para 1, com predominância
do sexo masculino.19,20 Isto poderia ser explicado
por um maior número de atendimentos relacionados a traumatismos oculares, uma situação mais
freqüente em homens.12,17,18
A faixa etária preponderante entre os pacientes atendidos foi entre os 21 e 40 anos, com 46%
dos pacientes (Gráfico 3). Este dado encontra-se
de acordo com a literatura, já que Layaun et al17
observaram 58,8% dos pacientes entre os 15 e 45
anos, Girard et al20 encontraram 43,0% na faixa
etária dos 18 aos 40 anos e Sanchez et al16 referiram 36,4% dos atendimentos em pacientes entre
os 21 e 50 anos.
50
2000
2001
2002
2003
2004
2005
0
0 a 10
11 a 20
21 a 30
31 a 40
41 a 50
51 a 60
61 a 70
acima 70
Gráfico 2: Distribuição das consultas emergenciais segundo os anos avaliados.
Gráfico 3: Distribuição dos pacientes segundo a
faixa etária em anos.
A distribuição quanto ao sexo apresentou
discreta predominância do sexo masculino. Tal
fato poderia ser explicado devido à preponderân-
A análise dos casos agrupados conforme a
distribuição anatômica do segmento anterior (Gráfico 4) mostrou o predomínio das doenças con-
12
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 7-16, julh/dez, 2009
Sandri J.M. et al.
do por Schellini et al15 houve uma inversão destas
posições, ficando as enfermidades da córnea no
segundo lugar (28,3%) e as das pálpebras em terceiro (25,8%).
Entre as doenças conjuntivais, a conjuntivite
representou a maioria absoluta dos casos, acometendo 79,0% dos pacientes deste grupo (Gráfico
5). Tal fato pode explicar a predominância do sexo
feminino nos pacientes com enfermidades conjuntivais (Tabela 1), já que o uso de maquiagem
e lentes de contato com suas soluções oftálmicas
pode estar relacionado a um excesso de risco para
a doença.
juntivais (35,0%), seguidas pelas enfermidades da
córnea e das pálpebras. Este percentual é semelhante ao obtido por Schellini et al15, onde as afecções da conjuntiva apareceram em primeiro lugar
com 40,26% dos casos.
463
26%
623
35%
Conjuntiva
Pálpebra
Córnea
Outros
10
1%
402
23%
256
15%
Úvea Anterior
Gráfico 4: Distribuição das doenças emergenciais
do segmento anterior do bulbo ocular segundo a
localização anatômica.
137
22%
211
34%
83
13%
Conjuntivite bacteriana
Conjuntivite alérgica
Conjuntivite viral
Pterígeo
Como visto anteriormente, as enfermidades das pálpebras ocuparam o segundo lugar nos
atendimentos emergenciais por doenças oculares
externas no HU/UFSC (26,0%), seguidos pelas
doenças da córnea com 23,0%. No estudo realiza-
Hemorragia subconjuntival
6
1%
7
1%
46
7%
60
10%
73
12%
Pingueculite
Conjuntivite inespecífica
Outras
Gráfico 5: Distribuição das doenças emergenciais
da conjuntiva.
Tabela 1: Distribuição dos diagnósticos de acordo com as subdivisões anatômicas do segmento anterior
e sua relação com o sexo dos pacientes.
sexo
Subdivisão Anatômica
Conjuntiva
Córnea
Úvea Anterior
Pálpebras
Total
n
279
275
7
204
765
masc.
%
44,8%
68,4%
70,0%
44,1%
51,1%
n
344
127
3
259
733
As conjuntivites também corresponderam
a 24,9% de todos os atendimentos emergenciais,
discordando dos dados obtidos por Sanchez et al16,
que observaram somente 11,3% casos da doença
entre todos os atendimentos. Schellini et al15, entretanto, encontraram este diagnóstico em 26,9%
dos pacientes, fato que está de acordo com inúmeros outros estudos.19-22 O número de casos classificados quanto à etiologia da conjuntivite também
fem.
%
55,2%
31,6%
30,0%
55,9%
48,9%
total
623
402
10
463
1498
OR (IC)
fem. 1,47 (1,21 - 1,81)
masc. 2,56 (2,01 - 3,26)
masc. 2,52 (0,52 - 10,99)
fem. 1,46 (1,17 - 1,82)
se contrapõe à literatura, que apresenta as causas
bacterianas e virais como mais comuns.4 Neste trabalho as conjuntivites bacterianas (34,0%) e alérgicas (22%) foram as mais encontradas.
Contemplando ainda o grupo das doenças
da conjuntiva, a percentagem encontrada para os
casos de pterígeo (12,0%) difere muito do encontrada no trabalho de Schellini et al15, que relata
45,20% dos casos da enfermidade. Por outro lado,
13
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 7-16, julh/dez, 2009
Sandri J.M. et al.
os dados deste trabalho vão ao encontro dos de
Schellini et al15 quando se analisa a percentagem
dos casos de hemorragia subconjuntival (10,0% e
6,70%, respectivamente).
O corpo estranho corneal foi o segundo diagnóstico mais encontrado em todos os atendimentos
oftalmológicos de emergência (16,2%). Araújo et
al18 e Layaun et al17 referiram este diagnóstico em
31,1% e 26,8% dos casos, respectivamente. Outros autores detectaram valores semelhantes.20,21
Foi também a causa mais freqüente de acometimento da córnea (71,0%). Tais dados são discordantes dos encontrados por outros trabalhos, já que
Schellini et al15 e Layaun et al17 referem 37,8% e
30,7% dos casos entre as enfermidades corneanas.
Este predomínio do corpo estranho corneal justifica o excesso de risco para doenças desta
estrutura ocular no sexo masculino em relação ao
feminino (Tabela 1). Também pode ser associada
a este dado a preponderância da faixa etária entre
os 21 e 40 anos nas enfermidades da córnea (Tabela 2), já que há uma maior incidência do trauma ocupacional em homens jovens, atribuída ao
fato destes exercerem em maior número atividades
de risco e serem menos cuidadosos. Outros autores12,18,21,22 também encontraram maior incidência
de traumas oculares em indivíduos jovens do sexo
masculino.
Tabela 2: Relação entre as faixas etárias dos pacientes e as doenças oculares emergenciais, segundo a
subdivisão anatômica do segmento anterior.
Idade (anos)
0 a 10
11 a 20
21 a 30
31 a 40
41 a 50
51 a 60
61 a 70
Acima 70
Total
Conjuntiva
n
%
43
6,9%
83
13,3%
165
26,5%
123
19,7%
106
17,0%
56
9,0%
29
4,7%
18
2,9%
623
100,0%
Córnea
n
%
11
2,7%
48
11,9%
103
25,6%
120
29,9%
63
15,7%
43
10,7%
7
1,7%
7
1,7%
402
100,0%
Ainda entre as enfermidades da córnea, observa-se que a ceratite foi o segundo diagnóstico
mais comum, com 27% dos casos, número próximo do encontrado por Schellini et al15, que relata
em 28% dos diagnósticos. Sanchez et al16, por sua
vez, refere o predomínio das ceratites no grupo das
doenças de córnea, com 67,2% dos casos. Tal discrepância pode ser atribuída não pelo grande número de pacientes com o diagnóstico de ceratite,
mas pelo pequeno número de casos de corpo estranho corneal referidos por este autor.
14
Úvea Anterior
n
%
0
0,0%
2
20,0%
4
40,0%
2
20,0%
2
20,0%
0
0,0%
0
0,0%
0
0,0%
10
100,0%
Pálpebras
n
%
34
7,3%
78
16,8%
121
26,1%
91
19,7%
64
13,8%
34
7,3%
29
6,3%
12
2,6%
463
100,0%
Total
88
211
393
336
235
133
65
37
1498
Com relação ao grupo das doenças emergenciais das pálpebras (Gráfico 6), o diagnóstico
mais freqüentemente encontrado foi a blefarite
(30,0%), seguido pelo hordéolo (31,0%) e o calázio (16,0%). Tais dados são semelhantes aos
relatados por Schellini et al15, cujos diagnósticos
mais freqüentes foram blefarite (17,3%), hordéolo (15,0%) e triquíase (8,9%), respectivamente.
A maior incidência das enfermidades das pálpebras no sexo feminino (Tabela 1) poderia ser assim justificada, já que alguns tipos de blefarites se
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 7-16, julh/dez, 2009
Sandri J.M. et al.
apresentam mais comumente em mulheres, de
acordo com a literatura.23
142
31%
191
40%
Blefarite
Hordéolo
Calázio
Corpo estranho subtarsal
13
3%
18
4%
27
6%
72
16%
Triquíase
Outras
Gráfico 6: Distribuição das doenças emergenciais
das pálpebras.
Se considerados os casos relativos ao trato
uveal, somando-se o número de casos de uveíte
anterior e posterior, observa-se 33 atendimentos,
ou seja, 1,9% de todas as consultas oftalmológicas de emergência. Estes dados diferem aos relatados por Sanchez et al16 (6,4%) e Schellini et al15
(3,8%), mas se equivalem aos obtidos por Layaun
et al17, com 2,3% dos casos.
A percentagem dos diagnósticos do grupo de
doenças de outras doenças do bulbo ocular (Tabela
2), foi menor se comparada aos dados da literatura.15,16 Isto pode ser explicado pelo maior número de casos de outras enfermidades, se comparadas
a estas, ou devido ao mero acaso. Uma exceção a
este fato é a percentagem dos casos de glaucoma,
que correspondem a 1,9% de todas as consultas oftalmológicas de emergência, número semelhante
ao encontrado por Sanchez et al16 (2,4%).
outubro de 2003 e novembro de 2000 tiveram o
menor (8) e o maior (58) número de atendimentos, respectivamente; 4. A distribuição segundo o
sexo é homogênea; 5. A maior parcela dos pacientes atendidos apresenta idade entre 21 e 30 anos
(25,0%); 6. O segmento anterior do bulbo ocular é
o mais acometido, com 85,0% dos casos; 7. Dentre
as subdivisões anatômicas do segmento anterior,
as doenças da conjuntiva são as mais freqüentes
(35%), seguidas pelas enfermidades das pálpebras
(26%); 8. Houve um excesso de risco para doenças
da córnea e da úvea anterior, no sexo masculino, e
para doenças da conjuntiva e pálpebras, no sexo
feminino; 9. Isoladamente, a conjuntivite é o diagnóstico mais freqüente (24,9%), sendo a etiologia
bacteriana a mais encontrada; 10. Corpo estranho
corneal é o segundo diagnóstico mais freqüente,
com 16,2% dos atendimentos.
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Conclusões
A partir das avaliações dos diagnósticos
emergenciais oftalmológicos realizados junto à
população estudada, podemos destacar como pontos conclusivos do presente estudo os seguintes
tópicos: 1. A maioria dos pacientes é proveniente de Florianópolis (82%); 2. No ano de 2000 foi
registrado o maior número de consultas (386),
ao passo que em 2004 o número de atendimentos foi o menor (235); 3. Considerando cada mês,
15
Sandri J.M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 7-16, julh/dez, 2009
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Daguano, C. R. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 17-26, julh/dez, 2009
AVALIAÇÃO DAS TÉCNICAS DE ANTISSEPSIA BACTERIANA DO CONE DE APLANAÇÃO DOS TONÔMETROS DE GOLDMANN EM USO EM CONSULTÓRIOS E
HOSPITAIS DA GRANDE FLORIANÓPOLIS [Technical evaluation of bacterial antisepsis of applanation cone of Goldmann’s tonometry in use in clinics and hospitals of great
Florianópolis]
Carolina Rottili Daguano1; Augusto Adam Netto2; Oswaldo Petermann Neto3; Kleber Eidi Shimono4;
Cleyton Takaiti Shimono5
Resumo: O cone do tonômetro de aplanação de Goldmann pode ser contaminado por diversos microorganismos. Este trabalho teve como objetivo avaliar a eficácia das técnicas de antissepsia bacteriana do cone de aplanação dos tonômetros de Goldmann em uso em consultórios e hospitais da Grande Florianópolis. Foram realizadas duas coletas em cada um dos 11 cones
de aplanação dos tonômetros de Goldmann. Após a semeadura, os meios de cultura foram incubados para identificação dos
germes. Foi aplicado um questionário sobre a realização ou não de desinfecção do cone e sobre qual o método de antissepsia
utilizado. Cinco cones de aplanação apresentaram contaminação bacteriana proveniente da flora ocular normal. As técnicas
de antissepsia utilizadas nestes cones foram gaze embebida em álcool isopropílico 70%, com duas amostras contaminadas;
imersão em solução para lentes de contato, lavação com água corrente e sabão e limpeza com gaze seca, cada uma apresentando uma amostra contaminada. A imersão em peróxido de hidrogênio a 3% não apresentou contaminação bacteriana.
Palavras-chave: cone de aplanação, tonômetro de Goldmann, antissepsia.
Abstract: Goldmann´s applanation tonometer prism can be contaminated by diverse microorganisms. This study aimed to evaluate the efficacy of bacterial disinfection techiniques of Goldmann´s applanation tonometer prisms in use at
ophthalmology´s offices and hospitals of the Great Florianopolis. Two collections in each one of the eleven Goldmann´s
tonometer prisms were realized. After the sowing, the cultures were incubated for identification of the microorganisms. A
questionary about the realization of disinfection in the prism and which technique is used was performed. Five prisms have
shown bacterial contamination proceeding from normal ocular flora. The disinfection techniques used were 70% isopropyl
alcohol wipes, with two samples contaminated; soak in products for cleaning contact lenses, water and soap wash and dry
gauze, each one of these techniques have shown contamination in one sample. The soak in hidrogen peroxide 3% have not
presented bacterial contamination.
Keywords: applanation cone, Goldmann’s tonometer, antisepsis.
Introdução
A pressão intra-ocular no ser humano depende, fundamentalmente, da hidrodinâmica do humor
aquoso, e a resistência ao fluxo de saída do humor
aquoso do bulbo ocular é o mecanismo que mais
comumente leva à elevação da pressão intra-ocular.1
A pressão intra-ocular elevada é o principal fator de risco para o surgimento da neuropatia
óptica conhecida como glaucoma. O aumento da
pressão intra-ocular, de forma intensa e permanente, o suficiente para causar danos às fibras nervosas da retina, ao nervo óptico e ao campo visual, é
um dos principais sinais do glaucoma.2 Assim sendo, a avaliação da pressão intra-ocular é de suma
Médica graduada pela Universidade Federal de Santa Catarina
Professor titular da disciplina de oftalmologia do departamento de cirurgia do CCS/UFSC. Professor coordenador da
disciplina de oftalmologia do módulo de sistemas sensoriais da UNISUL. Chefe do serviço de oftalmologia do HU/UFSC.
E-mail: [email protected]
3
Médico graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected]
4
Aluno do 12º período de graduação em Medicina da Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected]
5
Aluno do 7º perído de graduação em Medicina da Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected]
17
1
2
Daguano, C. R. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 17-26, julh/dez, 2009
importância e faz parte da consulta oftalmológica
de rotina.
A tonometria ou oftalmotonometria é o método de mensuração da pressão intra-ocular, usando equipamentos que aplanam ou indentam o ápice corneano. Ela é baseada na Lei de Imbert-Fick,
a qual afirma que a pressão aplicada por uma superfície plana a uma superfície esférica cheia de
líquido e perfeitamente elástica é sustentada pela
contrapressão do interior da esfera.1
Os tonômetros podem ser divididos em dois
grandes grupos: os de indentação, representados
pelo tonômetro de Schiötz, e os de aplanação. Nos
dois métodos, a córnea dos pacientes é tocada pelos aparelhos, havendo necessidade, assim, do uso
de anestésico tópico e de desinfecção da ponta do
tonômetro antes do uso.3
O valor da pressão intra-ocular obtido com
os tonômetros de indentação é menos preciso do
que aquele obtido com os tonômetros de aplanação, por isso o uso dos primeiros foi sendo abandonado pelos oftalmologistas ao longo dos anos.1
Há vários tipos de tonômetros de aplanação;
dentre eles, estão os de Goldmann, Perkins, Draeger, Mackay-Marg, Tono-Pen, pneumotonômetro
e de não contato.1 Entretanto a tonometria de aplanação de Goldmann é, atualmente, o método mais
utilizado e preciso, sendo preferido pelos oftalmologistas,1,3 e é realizada na maioria dos pacientes que
são examinados nos consultórios oftalmológicos.4
O consultório oftalmológico é um ambiente com importante potencial para a transmissão
de infecções, sendo os patógenos regularmente
introduzidos no mesmo através de pacientes com
infecções, tanto sistêmicas como oculares.4 Além
de pacientes infectados, há muitas outras fontes de
contaminação do consultório que passam freqüentemente despercebidas, as quais incluem as mãos
dos profissionais de saúde, frascos de colírios,
soluções para lentes de contato e todo equipamento diagnóstico, tais como lâmpadas de fenda,
18
cones dos tonômetros de aplanação e lentes de
contato para testes.4-6
Quando Goldmann apresentou pela primeira
vez seu tonômetro de aplanação, em 1954, enfatizou que a infecção transmitida através do contato
da córnea pelo cone de aplanação do tonômetro
poderia ocorrer e sugeriu que métodos apropriados
de desinfecção deveriam ser pesquisados e aplicados.7 Além disso, a técnica original da tonometria
de aplanação, descrita por Goldmann e Schmidt
em 1957, recomenda o uso de fluoresceína, aumentando ainda mais o risco de contaminação do
cone, já que estudos demonstraram que as soluções de fluoresceína podem estar contaminadas
por P. aeruginosa.8
A preocupação tornou-se ainda maior após
o descobrimento do vírus HIV em lágrimas, conjuntivas e córneas de humanos soropositivos assintomáticos do ponto de vista oftalmológico,4,9,10
tornando o cone de aplanação do tonômetro um
provável local de contaminação pelo HIV. Além
do HIV, os cones de aplanação dos tonômetros podem ser contaminados por outros agentes infecciosos presentes nos fluidos corporais e superfícies,
como o vírus da hepatite B, o vírus da hepatite C,
herpes vírus, adenovírus, Acanthamoeba e bactérias da flora normal ocular.6,11 A flora bacteriana
conjuntival é formada principalmente por bactérias gram-positivas e cocos coagulase negativos,
os quais não oferecem risco de infecção aos olhos
com córneas sadias. Contudo, em córneas com algum tipo de lesão ou até mesmo durante a medida
da pressão intra-ocular, a possibilidade de contaminação aumenta.6
Estudos mais recentes vêm apontando a presença de células epiteliais corneanas nos cones de
aplanação como um risco para a transmissão do
príon, o agente causador da doença de CreutzfeldtJakob.5 A córnea é considerada um potencial sítio
de transmissão da doença de Creutzfeldt-Jakob,
desde que quatro casos de transmissão da doença
foram relatados após transplantes de córnea.5
Daguano, C. R. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 17-26, julh/dez, 2009
Quanto aos equipamentos oftalmológicos,
alguns relatos de infecções transmitidas pelos
mesmos foram descritos na literatura até o momento.6,12,13 Em 1968, Nagington et al. investigaram um surto de infecção pelo vírus herpes simples, transmitida através do cone de aplanação do
tonômetro de Goldmann.12 Surtos de infecção pelo
adenovírus 8 ocorreram em 1971 e 1979, os quais
envolveram pacientes que haviam sido submetidos à tonometria de aplanação de Goldmann.12 A
ceratoconjuntivite epidêmica pelo adenovírus 8,
ocorrida nos Estados Unidos nos anos de 1987 a
1988, foi relacionada a dois fatores de risco epidemiologicamente identificáveis: a exposição aos
pneumotonômetros utilizados para a medida da
pressão intra-ocular e o contato com o profissional
que efetuou essas medidas.13 A identificação desses dois fatores de risco sugere alguns mecanismos
de transmissão viral durante a epidemia, incluindo
a lavação inadequada das mãos pelos profissionais
de saúde no intervalo do contato entre os pacientes
e a desinfecção incorreta do pneumotonômetro entre as utilizações nos olhos dos pacientes.13
Contudo a real prevalência de pacientes infectados pelos cones dos tonômetros de aplanação em
clínicas e hospitais é desconhecida. Apenas quando
um número suficientemente grande de casos ocorre é que a atenção recai sobre as possíveis causas
desse surto e ações são tomadas. Os episódios de
infecção através da tonometria documentados na
literatura trazem a conclusão de que muitos casos
isolados ou em grupos passam despercebidos.12
As recomendações atuais para a prevenção
de infecções nos consultórios oftalmológicos sugerem que todos os profissionais que realizam
exames oftalmológicos ou outros procedimentos
envolvendo contato com a lágrima devem lavar as
mãos após um procedimento e após o atendimento
a cada paciente.9,14 Outra importante medida para
prevenir a transmissão de infecções oculares é
evitar o contato entre profissionais da saúde com
ceratoconjuntivite e pacientes sem a doença. Essa
medida deve ser mantida por até 14 dias após o
diagnóstico de ceratoconjuntivite no profissional.13
Desinfecção significa o uso de um processo
químico que elimina virtualmente todos os microorganismos reconhecidamente patogênicos, mas
não necessariamente todas as formas microbianas
em objetos inanimados. Há três níveis de desinfecção: alto, intermediário e baixo. A desinfecção de
alto nível elimina todos os microorganismos, exceto bactérias esporuladas de alta resistência; enquanto a desinfecção de nível intermediário elimina micobactérias, a maioria dos vírus e bactérias; e
a desinfecção de baixo nível elimina alguns vírus
e bactérias.15 Dispositivos médicos que entram em
contato direto com mucosas humanas intactas devem receber desinfecção de alto nível, se a esterilização não for possível, como é o caso dos cones
dos tonômetros de aplanação.14,15
Existem vários tipos de soluções desinfetantes sendo usadas por oftalmologistas em consultórios e hospitais para a antissepsia dos cones
de aplanação dos tonômetros de Goldmann. Entre
elas, as mais freqüentemente utilizadas são álcool isopropílico a 70%, hipoclorito de sódio a 1%,
peróxido de hidrogênio a 3%, solução para lentes
de contato, colírio antibiótico, clorexidine, Pantasept® e Soapex®.16,17 Alguns profissionais utilizam água corrente e sabão ou soro fisiológico para
a limpeza, e há ainda aqueles que fazem uso apenas de gaze seca ou água corrente.17 Diante desses
fatos, percebemos que há uma falta de consenso
entre os oftalmologistas sobre os métodos de antissepsia e a eficácia dos mesmos.
As recomendações quanto à melhor técnica
de antissepsia dos cones de aplanação encontradas
na literatura muitas vezes não são baseadas em estudos confiáveis, atuais e com real aplicabilidade
in vivo, e a técnica de antissepsia ideal recomendada em alguns estudos freqüentemente se baseia
em sua ação desinfetante para apenas determinados microorganismos. Além disso, os profissionais
de saúde não podem confiar nas recomendações
19
Daguano, C. R. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 17-26, julh/dez, 2009
de antissepsia encontradas no manual de instrução
feito pelo fabricante do tonômetro, pois as bases
exatas dessas recomendações são desconhecidas.13
Assim, não se encontra uma padronização quanto
à técnica de escolha.
Devido a essas questões, decidimos, neste
estudo, avaliar a contaminação bacteriana em cones de aplanação de tonômetros de Goldmann em
uso em consultórios e hospitais da Grande Florianópolis, correlacionando-a com a técnica de antissepsia utilizada.
responsável pelo consultório ou pelo serviço de
oftalmologia do hospital participante do estudo, o
qual indagava sobre a realização ou não de desinfecção do cone de aplanação do tonômetro de Goldmann e, se positivo, qual o método de antissepsia
utilizado (vide Apêndice).
Para o armazenamento dos dados, usou-se o
programa Microsoft Word® versão para Windows
XP. A análise estatística foi realizada utilizando-se
o programa EpiInfo® versão 6.04 e o teste exato
de Fisher.
Métodos
Resultados e discussão
Trata-se de um estudo descritivo transversal,
no qual foram estudadas a contaminação bacteriana dos cones dos tonômetros de Goldmann em uso
em consultórios e hospitais da Grande Florianópolis e a sua respectiva técnica de antissepsia.
Realizaram-se duas coletas em cada um dos
11 cones dos tonômetros de aplanação selecionados em consultórios e hospitais da Grande Florianópolis, durante o período de agosto de 2005 a fevereiro de 2006.
As amostras foram coletadas com “swabs”
estéreis e introduzidas em caldo de enriquecimento de tioglicolato, precedidas de flambagem, para
evitar contaminação aérea do meio de cultura.
Após a semeadura em ágar-sangue, os meios
de cultura foram incubados a 35ºC por 24 a 48 horas, para posterior identificação dos germes, procedimento realizado no laboratório de Microbiologia
do Hospital Universitário da Universidade Federal
de Santa Catarina (HU/UFSC).
Foi aplicado, também, um questionário ao
A tonometria de aplanação de Goldmann é
realizada na maioria dos pacientes que são examinados nos consultórios oftalmológicos, tornando o
cone de aplanação do tonômetro de Goldmann um
veículo para infecções cruzadas, particularmente
as infecções virais.4
No presente estudo, avaliou-se apenas a contaminação bacteriana dos cones de aplanação, apesar de os vírus serem os agentes mais implicados no
risco de infecção através dos mesmos. Essa análise
teve como finalidade avaliar se a antissepsia desses cones de aplanação está sendo suficientemente
adequada para eliminar os microorganismos que
comumente podem contaminar o cone. Os resultados encontrados foram de contaminação bacteriana por organismos pertencentes apenas à flora
ocular normal (tabela 1), mas que podem eventualmente causar doenças, principalmente em olhos
não-sadios. Norn et al. observaram que o cone de
aplanação é geralmente contaminado por bactérias, algumas delas muitas vezes patogênicas.6
20
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 17-26, julh/dez, 2009
Daguano, C. R. et al.
Tabela 1: Resultado da análise microbiológica dos 11 cones de aplanação dos tonômetros de Goldmann.
Nº do cone
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
1ª coleta
Negativa
Positiva
Negativa
Negativa
Negativa
Negativa
Negativa
Positiva
Negativa
Negativa
Positiva
2ªcoleta
Negativa
Negativa
Positiva
Negativa
Negativa
Negativa
Negativa
Negativa
Negativa
Positiva
Negativa
Bactérias identificadas
__________
Staphylococcus sp coagulase neg.
Bacilos Gram – e Gram +
__________
__________
__________
__________
Staphylococcus sp coagulase neg.
__________
Staphylococcus sp
Staphylococcus sp coagulase neg.
Os instrumentos diagnósticos e terapêuticos
utilizados em oftalmologia são caros, complexos
em seu design e susceptíveis a danos, seja pelo
manuseio ou pelo uso inadequado de desinfetantes.16 Assim sendo, o método de antissepsia de
escolha deve unir uma boa eficácia desinfetante
contra os organismos potencialmente patogênicos
e uma menor capacidade de provocar danos ao instrumento.
Muitas técnicas de antissepsia para o cone
de aplanação do tonômetro de Goldmann estão
descritas na literatura. O fato de essas muitas técnicas variarem de uma rápida limpeza com um desinfetante de nível intermediário, até uma imersão
por 10 minutos em um desinfetante de alto nível,
reflete a falta de informações sobre a eficácia de
desinfetantes nesse contexto.18
As recomendações do Centro de Controle de
Doenças (Centers for Disease Control - CDC), de
Atlanta-EUA, para a antissepsia do cone de aplanação do tonômetro de Goldmann datam de 1985
e são baseadas na capacidade do regime desinfetante de destruir adenovírus, um vírus com envelope não-lipídico, e o HIV, o qual possui envelope
lipídico. As recomendações são as seguintes: friccionar com gaze ou algodão o cone do tonômetro
até a limpeza de resíduos macroscópicos e, então,
desinfetá-lo com imersão por 5 minutos em solução de hipoclorito de sódio 500 ppm (partes por
milhão) de cloro, peróxido de hidrogênio a 3% ou
álcool isopropílico a 70%.4,14 Também a Academia Americana de Oftalmologia adotou essas
medidas, acrescentando a opção de simplesmente
friccionar o cone com algodão embebido em álcool isopropílico a 70%.4,18
Em nosso estudo, os métodos de antissepsia utilizados pelos consultórios e pelos hospitais
participantes foram: limpeza com gaze ou algodão
embebido em álcool isopropílico a 70%, imersão
em solução para lentes de contato, imersão em peróxido de hidrogênio a 3%, limpeza com gaze seca
e lavação com água e sabão (tabela 2). Gonçalves
percebeu, em seu estudo com 61 oftalmologistas,
que os métodos mais utilizados por eles eram água
e sabão, algodão seco, algodão com álcool e soro,
água corrente, algodão com colírio antibiótico, Soapex® e raio ultravioleta.17 Em sua pesquisa com
oito hospitais ingleses, Dart et al. verificaram que
a antissepsia dos cones de aplanação era realizada
com um dos seguintes métodos: imersão em peróxido de hidrogênio a 3%, imersão em solução de
hipoclorito de sódio, Pantasept® (uma solução de
aldeído) e acetato de clorexidine 0,02%.16
21
Daguano, C. R. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 17-26, julh/dez, 2009
Tabela 2: Técnica de antissepsia dos 11 cones de aplanação dos tonômetros de Goldmann.
Técnica de antissepsia
Número de cones
Gaze + álcool isopropílico a 70%
3
Solução para lente de contato
3
Peróxido de hidrogênio a 3%
2
Gaze seca
2
Água corrente e sabão
1
A limpeza com gaze ou algodão embebido
em álcool isopropílico a 70%, por ser um método
recomendado pela Academia Americana de Oftalmologia, já foi testada em muitos estudos. Segal
et al., em sua análise na desinfecção do cone de
aplanação contaminado com o vírus da hepatite C,
observaram que esse método se mostrou ineficaz
para remover o vírus dos cones de aplanação.19 O
vírus da hepatite B também não é eliminado por
esse tipo de desinfecção, apesar de os estudos pesquisarem apenas a presença de partículas de DNA
desse vírus, não significando, então, que eles ainda
estejam vivos e com potencial para causar infecção.20 Entretanto estudos prévios demonstraram
que esse método foi efetivo na desinfecção dos cones de aplanação contra o adenovírus 8,10,18 o HIV
tipo 110 e o vírus herpes simples.21 No presente
estudo, essa técnica foi utilizada em três cones de
aplanação, e encontrou-se contaminação bacteriana em dois deles, corroborando o que dizem os estudos, demonstrando sua ineficácia.
O uso de solução para lentes de contato na
desinfecção do cone de aplanação é um método
pouco estudado, mas usado por muitos oftalmologistas,17 como foi constatado também em nosso estudo, no qual esse método foi utilizado em
três cones de aplanação. As soluções para lentes
de contatos são sistemas formados por substâncias
químicas desinfetantes, lubrificantes e conservantes.8 O agente desinfetante geralmente usado nesses sistemas é uma biguanida ou um quaternário,
os quais têm uma capacidade variável em erradicar
certas bactérias patogênicas, como Pseudomonas
22
aeruginosa, Serratia marcescens e Staphylococcus
aureus.4 Além disso, esses desinfetantes químicos
também não são satisfatórios na eliminação de
fungos e variam na sua efetividade contra Acanthamoeba.4 Maimone et al. testaram o uso de uma
solução para lentes de contato na desinfecção do
cone do tonômetro de aplanação e encontraram
uma boa eficácia in vivo desse produto contra fungos e bactérias aeróbias e anaeróbias. Já os estudos
in vitro demonstraram que o produto não foi efetivo contra os microorganismos S. aureus, E. coli,
P. aeruginosa, C. albicans e A. niger.8 A eficácia
desse método contra os vírus ainda não foi testada
até o momento. No presente estudo, foi encontrada
contaminação em uma amostra na qual o método
de antissepsia utilizado era a imersão em solução
para lentes de contato. A utilização desse método
para a antissepsia do cone do tonômetro de aplanação requer mais estudos e observações.
A imersão em solução de peróxido de hidrogênio a 3% por 5 minutos é um método de antissepsia do cone de aplanação recomendado pelo
CDC e tem se mostrado capaz de eliminar uma
grande variedade de microorganismos.4 Bactérias
como Staphylococcus, Streptococcus, Pseudomonas e Serratia podem ser erradicadas através desse método.4 Apesar de a recomendação para o uso
de peróxido de hidrogênio a 3% ser a imersão por
5 minutos, essa substância foi eficaz para eliminar o HIV e os herpes vírus 1 e 2 dos cones de
aplanação apenas através da limpeza com gaze ou
algodão embebido na solução.10 Threlkeld et al.
demonstraram que essa técnica também é capaz de
Daguano, C. R. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 17-26, julh/dez, 2009
erradicar o adenovírus 8 dos cones de aplanação,
como também a técnica através da imersão.18 Em
seu estudo com o vírus da hepatite C, Segal et al.
encontraram que a imersão por 5 minutos no peróxido de hidrogênio a 3%, seguido de lavação com
água corrente fria, foi o método que melhor eliminou resíduos de RNA desse vírus, assim como
a imersão por 5 minutos em álcool isopropílico a
70%.19 Em nosso estudo, a imersão em peróxido
de hidrogênio a 3% foi utilizada em dois cones de
aplanação, nos quais não foi encontrada contaminação bacteriana.
Apesar de ser uma prática comum, a limpeza
do cone de aplanação apenas com gaze ou algodão
estéril seco é um método ineficaz e potencialmente
perigoso. Além de não eliminar os microorganismos patogênicos, como o HIV,10 os herpes vírus
1 e 2,10,21 o adenovírus 818 e o vírus da hepatite
C,19 há também o risco de que esses microorganismos infecciosos sejam transferidos às mãos do
examinador, o que poderia resultar numa autoinoculação ou infecção de outros pacientes, se não
houver uma lavação adequada das mãos.21 Os resultados do nosso estudo, embora não corroborem
totalmente as informações encontradas na literatura, mostraram a contaminação bacteriana em uma
amostra, dentre as quatro que receberam esse tipo
de antissepsia.
A última técnica de antissepsia relacionada
no presente estudo foi a lavação com água e sabão,
a qual foi empregada em apenas um cone de aplanação. Essa técnica também se mostrou ineficaz, já
que houve contaminação do cone de aplanação em
uma coleta. A utilização dessa técnica de antissepsia é pouco descrita na literatura. Gonçalves observou que esta era a técnica mais freqüentemente
utilizada pelos oftalmologistas que participaram de
seu estudo e demonstrou que ela é completamente ineficaz para eliminar Pseudomonas do cone de
aplanação.17 Su et al., entretanto, notaram que a lavação com água e sabão foi o único método capaz
de eliminar todas as partículas de DNA do vírus da
hepatite B do cone de aplanação e recomendaram
que esse método seja sempre utilizado, mesmo
quando outro método de antissepsia também for
empregado.20
Alguns estudos testam a eficácia de usar
apenas água corrente fria na limpeza dos cones,
como o estudo envolvendo o vírus da hepatite C
de Segal et al., no qual se demonstrou que a água
corrente fria eliminou cerca de 99% das partículas
virais previamente inoculadas no cone de aplanação, mas não foi tão eficiente quanto a imersão em
peróxido de hidrogênio a 3% ou em álcool isopropílico a 70%.19 Threlkeld et al. testaram a eficácia
de usar água corrente fria e imersão em água pura
para a limpeza dos cones de aplanação e observaram que essas técnicas não são eficazes para eliminar adenovírus 8 dos cones.18
Muitas outras técnicas de antissepsia do
cone do tonômetro de Goldmann são utilizadas, e
sua capacidade de eliminar os microorganismos do
cone de aplanação é constantemente testada. Uma
técnica também recomendada pelo CDC e pela
Academia Americana de Oftalmologia e que não
foi encontrada em nossa amostra é a imersão por
5 a 10 minutos em solução de hipoclorito de sódio com 500 ppm de cloro, ou seja, uma diluição
de 1:10 de água sanitária.4,14 É um método eficaz
para eliminar Pseudomonas,17 adenovírus 812,18 e
herpes vírus 1 e 2.12,21 Além disso, foi parcialmente
eficaz para erradicar todas as partículas do vírus da
hepatite B do cone de aplanação.20
Apesar de os métodos de antissepsia empregados atualmente variarem tanto no uso ou não de
substâncias químicas quanto no tipo de substância
usada, aqueles recomendados pelos principais centros de pesquisa e cuja eficácia foi melhor comprovada são os métodos que se utilizam de desinfetantes químicos. A desinfecção química do cone
de aplanação possui algumas possíveis desvantagens, como uma incompleta antissepsia, o contato
da córnea com as soluções e o dano ao cone de
aplanação.22
23
Daguano, C. R. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 17-26, julh/dez, 2009
O cone do tonômetro de aplanação de Goldmann não é uma única peça, ele é formado por
múltiplas partes de polimetilmetacrilato unidas.
Devido a essa construção, é possível que o cone
de aplanação, quando exposto às soluções desinfetantes, seja danificado, e qualquer irregularidade
ou aspereza pode influenciar a pressão intra-ocular
obtida no exame ou causar trauma corneal.23 Além
disso, cones de aplanação danificados podem alojar agentes patogênicos e tornar ainda mais difícil
a eliminação dos mesmos.7
O uso do álcool isopropílico a 70%, tanto na forma de limpeza com gaze embebida pela
solução quanto na forma de imersão, é o método
de antissepsia que causa maiores danos ao cone
de aplanação.7,23 A imersão em solução diluída de
água sanitária a 10% ou em solução de peróxido
de hidrogênio a 3% também causa danos ao cone
de aplanação, porém em menores proporções.23
Entretanto a antissepsia realizada com peróxido
de hidrogênio a 3% é a técnica que proporciona
melhor qualidade de imagem durante a aferição da
pressão intra-ocular, mesmo depois de repetidas
limpezas com essa solução.23
Diante desses fatos e preocupações, o uso de
revestimentos protetores descartáveis para os cones de aplanação tem sido aventado.5,11,24 Contudo,
para que essa prática seja definitivamente empregada na tonometria de aplanação de Goldmann,
é necessário que mais estudos sejam realizados
para determinar se não há distorções nos valores
da pressão intra-ocular obtida através desse método.11 Além disso, esses revestimentos ainda não
são produzidos em nosso país, elevando o custo
de cada exame e tornando essa alternativa, muitas
vezes, inviável para os oftalmologistas.
Como as publicações sobre esse complexo
tema diferem muito, não é surpreendente que cada
local adote sua própria rotina para a antissepsia do
cone de aplanação. Essa realidade leva à conclusão de que recomendações oficiais são necessárias.16 Em nosso estudo, apesar da pequena amos24
tra de cones de aplanação avaliados, foi possível
observar que apenas aqueles em que o método de
antissepsia utilizado foi a imersão em peróxido de
hidrogênio a 3% não apresentaram contaminação
bacteriana. Esse fato, juntamente com a revisão
das pesquisas publicadas até o presente momento,
mostra que a melhor técnica para a antissepsia do
cone do tonômetro de aplanação de Goldmann é a
imersão por 5 minutos em solução de peróxido de
hidrogênio a 3%, seguida de enxágüe com água
corrente e secagem do cone.
Conclusões
A partir das avaliações das técnicas de antissepsia bacteriana do cone de aplanação dos tonômetros de Goldmann podemos destacar como pontos conclusivos do presente estudo os seguintes
tópicos: 1. Observa-se contaminação bacteriana
em cinco dentre os onze cones de aplanação avaliados; 2. As bactérias encontradas são Staphylococcus sp coagulase negativo, Staphylococcus sp
e bacilos gram-negativos e gram-positivos, todas
estas pertencentes à flora bacteriana ocular normal; 3. A contaminação bacteriana é mais prevalente nos consultórios (n=3) do que nos hospitais
(n=2), mas essa diferença não é estatisticamente
significativa; 4. Apresentam contaminação bacteriana duas amostras desinfetadas com gaze embebida em álcool isopropílico a 70%, uma amostra
cuja antissepsia é realizada com gaze seca, uma
amostra imersa em solução para lentes de contato e uma lavada com água e sabão. Os dois cones
(quatro amostras) que são imersos em solução de
peróxido de hidrogênio a 3% não apresentam contaminação bacteriana; 5. Apesar do pequeno tamanho da amostra, a técnica utilizando imersão em
peróxido de hidrogênio a 3% é a única que não
apresenta contaminação bacteriana em seus cones
de aplanação.
Daguano, C. R. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 17-26, julh/dez, 2009
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Bagestãn, M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 27-34, julh/dez, 2009
CARACTERIZAÇÃO QUANTO AOS ASPECTOS DE CONTROLE AO TABAGISMO
EM UMA POPULAÇÃO COM DISLIPIDEMIA [Characterization on the issues of control
of smoking in a population with dyslipidemia.]
Manoela Bagestãn1, Elizabeth Martins Hermes2, Cláudia de Souza Marques da Silva3, Rodrigo Schütz4,
Geny Aparecida Cantos5
Resumo: No ano 2006, em parceria com a Secretaria de Saúde do Estado de Santa Catarina foi aplicado um questionário
para 46 indivíduos com dislipidemia que participavam de um programa de prevenção para doenças cardiovasculares com o
objetivo de relatar as características destes indivíduos em relação ao tabagismo. Os resultados desta pesquisa mostraram que
48% nunca fumaram e 46% eram ex-fumantes e 6% era tabagista. Os ex-fumantes abandonaram o vício do cigarro por mais
de 1 ano. Este estudo mostrou que a dinâmica utilizada pelos profissionais de saúde deste programa no controle ao tabagismo
tem contribuído na cessação ao fumo.
Palavras-chave: Tabagismo. Dislipidemia. Prevenção.
Abstract: In 2006, in partnership with the Department of Health of the State of Santa Catarina it was applied a questionnaire
to 46 subjects with dyslipidemia who participated in a prevention program for cardiovascular diseases with the objective of
report the characteristics of individuals in relation to smoking. The results of this research had shown that 48% never had
smoked and 46% were former-smokers and 6% was smoker. Former smokers had abandoned the habit of smoking for more
than 1 year. This study showed that the dynamics of smoking control used by health professionals of this program of smoking
control has contributed to smoking cessation.
Keywords: Smoking. Dyslipidemia. Prevention.
Introdução
O tabagismo é uma doença crônica gerada
pela dependência da nicotina, estando por isso inserido na Classificação Internacional de Doenças
(CID10) da Organização Mundial da Saúde. Também é considerada uma doença pediátrica, pois
90% dos fumantes começam a fumar antes dos 19
anos e a idade média de iniciação é 15 anos1.
O tabagismo, com enfoque na saúde pública tem sido analisado como um importante fator
de risco para doença arterial coronariana (DAC)2,
pois a nicotina desencadeia aceleração da freqüência cardíaca e vaso constrição, elevando a pressão
arterial, diminuindo as lipoproteínas de alta densidade (HDL) e ao mesmo tempo aumentando as
1
2
3
4
5
lipoproteínas de baixa densidade (LDL)3. Tabagismo é também o mais importante fator de risco
isolado para doenças graves e fatais como: câncer,
doenças cardiovasculares, enfisema e outras1.
Sob esta ótica, o controle do tabagismo se
volta para os aspectos ligados à prevenção e ao tratamento para DAC, uma vez que as principais manifestações deletérias no sistema cardiovascular
por efeito do tabagismo são observadas: nas coronárias, nas arteríolas intramiocárdicas exteriorizadas pelo infarto do miocárdio, na angina pectoris,
nos acidentes vasculares cerebrais, nos aneurismas
e na tromboangeíte obliterante2.
Define-se tabagismo passivo como a inalação da fumaça de derivados do tabaco (cigarro,
charuto, cigarrilhas, cachimbo e outros produtores de fumaça) por indivíduos não-fumantes, que
Acadêmica do curso de Farmácia UFSC.
Farmacêutica Bioquímica do Hospital Universitário UFSC.
Cardiologista do Hospital Universitário UFSC.
Aluno de mestrado de Farmácia UFSC.
Coordenadora. Dr (a) Prof (a) do Departamento de Análises Clínicas UFSC. E-mail: [email protected]
27
Bagestãn, M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 27-34, julh/dez, 2009
convivem com fumantes em ambientes fechados1.
O tabagismo passivo aumenta entre não fumantes,
o risco de câncer, infarto, infecções respiratórias
dentre outros agravos, sendo por isso considerado
também um risco ocupacional quando ocorre nos
ambientes de trabalho1.
No Brasil, a primeira ação nacional voltada ao controle do tabagismo foi à criação da Lei
nº 7.488, de 11 de junho de 1986, que instituiu o
Dia Nacional de Combate ao Fumo. O objetivo
principal foi de alertar à população em geral sobre
os malefícios advindos com o uso do fumo e, por
conseqüência, a necessidade urgente de controlar
o tabagismo no país, através do estímulo à criação
de Comissões Interinstitucionais de Combate ao
Fumo, nas Secretarias Estaduais de Saúde4.
A Região Sul do Brasil e, especialmente o
Estado de Santa Catarina, se voltou para os aspectos ligados à prevenção e ao tratamento do tabagismo, e os profissionais de saúde, principalmente
a classe médica, para a realização de um efetivo
controle. A necessidade de proteção aos fumantes passivos gerou a criação de leis restritivas ao
uso dos derivados do tabaco. A partir daí, o Estado de Santa Catarina, constituiu uma comissão
formada por representantes de várias áreas afins,
com o intuito de organizar uma ação efetiva, visando à conscientização da população para o problema4. No âmbito municipal, o desenvolvimento
das ações de controle do tabagismo passou a ter
um maior alcance. Esforços foram direcionados à
orientação de programas locais que vão ao encontro do atendimento dos anseios da população, tendo como foco as áreas de prevenção e tratamento
do fumante. 5
Nesse sentido, o Programa de Controle do
Tabagismo está inserido nos parâmetros da Norma Operacional Básica de Saúde6, aferindo ganhos significativos à população. A implantação de
tal programa tem como propósito a prevenção de
doenças e a recuperação da saúde na perspectiva
de articular um processo social, político, cultural,
28
econômico, de forma a interferir positivamente na
qualidade de vida do indivíduo.
Este trabalho teve como propósito relatar as
características em relação ao tabagismo de um grupo de indivíduos que participaram de um programa
de prevenção para doenças cardiovasculares, utilizando como principal ferramenta um questionário
elaborado pela Secretaria de Saúde do Estado de
Santa Catarina. Ao mesmo tempo promover a discussão sobre o tema controle ao tabagismo para
melhor compreensão deste fenômeno.
Métodos
A casuística foi formada por 46 pacientes, 31
mulheres e 15 homens, integrantes do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa Extensão e Atendimento
a Dislipidemia do Hospital Universitário da Universidade Federal de Santa Catarina (NIPEADHU-UFSC), na cidade de Florianópolis-SC, entre
março a dezembro de 2006. Neste trabalho a população foi selecionada em função de apresentar
características que possibilitavam a associação do
tabagismo com outros fatores de risco para doença
arterial coronariana.
A coleta de dados foi realizada através de
questionário estruturado composto da secção A e
B. A seção “A” referia-se à identificação dos indivíduos e era composta por 4 questões. A seção
“B” referia-se ao tabagismo e era composta de 17
questões subdivididas em subseções. O questionário aplicado foi elaborado pela Secretaria do Estado de Santa Catarina em conjunto com o INCA
(Instituto Nacional de Combate ao Câncer) e continha as seguintes variáveis e suas categorias para
a análise:
a) Fumantes: uso de cigarros por algum indivíduo que fumou alguma vez ao longo de
sua vida, fumantes que consumiram mais de
100 cigarros durante a vida inteira;
Bagestãn, M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 27-34, julh/dez, 2009
b) Fumantes atuais: tipo de cigarro, número
de cigarros consumidos diariamente, tempo
de fumante, número de vezes em que tentou
parar de fumar, abandono do tabagismo por
pelo menos um dia nos últimos 12 meses, intenção em parar de fumar;
c)
Ex-fumantes: período que fumou seu último
cigarro, durante quantos anos foi fumante;
d) Ex-fumantes e nunca fumantes: atitude
diante de alguém que estivesse fumando em
um local público fechado;
e) Todos entrevistados: opinião sobre as áreas
de trabalho que as pessoas poderiam fumar,
sobre a importância da Instituição de Trabalho em ajudar as pessoas que pretendem parar
de fumar e sobre a percepção sobre o local
onde se observa maior número de fumantes.
O questionário foi auto-respondido em locais previamente estabelecidos entre o entrevistador e os pacientes, sendo que antes do preenchimento do mesmo, os pacientes recebiam um termo
de consentimento que esclarecia sobre a finalidade do trabalho e ressaltava o caráter voluntário da
participação e da identificação. Além deste documento, o entrevistador enfatizou a importância do
preenchimento e estava apto a esclarecer as dúvidas, sendo que todos os pacientes assinaram o
consentimento escrito após esclarecimento (projeto aprovado pelo Comitê de Ética da UFSC sob o
parecer nº323/06). A análise de dados foi realizada
por estatística descritiva.
Resultados e Discussão
As políticas públicas, executadas pelo Ministério da Saúde do Brasil, em consonância com
os Estados e Municípios, demonstram a importância do papel das organizações no desenvolvimento
de metodologias específicas para enfrentar o tabagismo, tanto no aspecto da saúde pública, quanto
no contexto sócio-econômico, educativo e político.. Constata-se a relevância para a saúde pública e às organizações, no que se refere à adoção
de metodologias que visem influenciar mudanças
comportamentais, aferindo ganhos individuais e
coletivos7, 8.
As universidades devem criar mecanismos
educativos e servir de exemplo para as suas comunidades, tomando a frente numa campanha de
redução do tabagismo, apoiando a legislação9.
Dentro deste contexto os profissionais integrantes do NIPEAD-HU/UFSC que têm como escopo
a prevenção e promoção da saúde tiveram como
proposta participar do Programa de Controle ao
Tabagismo promovido pela Secretaria Estadual da
Saúde de Santa Catarina. Esta participação objetivou conhecer a situação com relação ao tabagismo
de uma população específica de forma a analisar
alguns desafios existentes no âmbito do controle ao tabagismo, de forma a contribuir para com
aqueles que se tornaram dependentes pararem de
fumar e se mantenham abstinentes.
A Organização Mundial da Saúde considera
que o alvo prioritário da ação antifumo em países
subdesenvolvidos deve ser centrado nos profissionais de saúde10. O conhecimento da prevalência do
tabagismo é necessário para a realização de programas institucionais adequados que visem à diminuição do número de fumantes5, 7. Estudos de
base populacional são da maior importância para
fornecer dados de prevalência e de tendência secular sobre esse hábito, permitindo o planejamento e
a avaliação de campanhas preventivas 11,12.
Assim, a oportunidade em atuar junto ao
projeto da Secretaria Estadual de Saúde no combate ao tabagismo abriu espaço para buscar novas
formas de atuação da equipe multiprofissional e
permitiu avaliar os benefícios obtidos pelo tipo de
intervenção até então oferecida aos seus integrantes. As orientações realizadas tinham como objetivo aumentar o nível de conscientização por meio
de palestras e ser agente na mudança de atitudes
em relação ao tabagismo. O contato com equipe
29
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 27-34, julh/dez, 2009
Bagestãn, M. et al.
interdisciplinar e multiprofissional teve influência
positiva no cotidiano dos pacientes entrevistados.
No grupo de pacientes entrevistados a distribuição por faixa etária foi menor na faixa de 30 a
40 anos (2) e foi homogênea nas faixas de 40-50
anos (14), de 50-60 anos (15) e acima de 60 anos
(15). (Figura 1)
4%
33%
30%
30-40
40-50
50-60
Acima de 60
33%
Figura 1 Distribuição por faixa etária
Quanto à profissão 65 % (30) dos entrevistados eram servidores públicos em atividade, 6% (3)
eram professores, 24% (11) eram servidores públicos aposentados e 4% (2) eram acadêmicos. A
renda familiar variou de 2 até 30 salários mínimos.
Verificou-se que 48% (22) nunca fumaram e que
52% (24) eram ex-tabagista ou fumantes de cigarros, charutos, cachimbos ou cigarrilhas em algum
momento na vida.
a)
Fumantes:
Por meio das entrevistas realizadas pode-se
notar que 6% (3) dos pacientes com dislipidemia
que participaram desta pesquisa ainda eram fumantes e destes 67% (2) eram do sexo masculino e
33% (1) era do sexo feminino comprovando dados
encontrados na pesquisa realizada pelo INCA em
20034 onde a percentagem de homens fumantes foi
30% maior do que nas mulheres.
Os dados obtidos mostraram que os fumantes variaram quanto ao número de vezes que tentaram parar de fumar. Nos últimos 12 meses que
antecederam ao início da pesquisa, março de 2006,
somente 33% dos entrevistados fumantes tentou
parar de fumar, ao menos por um dia, mas mesmo
assim relataram que não sabiam se pretendiam parar de fumar.
Uma das razões para se entender melhor a
30
dificuldade de abandonar o vício do cigarro foi
considerar o tempo de hábito tabágico. Observouse que 67% fumavam a mais de 30 anos e 33%
fumavam por mais de 10 anos. O consumo de cigarros industrializados foi de 100%. Os fumantes
relataram que no início não se consideravam viciados e acreditavam que podiam parar de fumar.
Em graus variados eles reconheceram que o fumar
prejudicava a saúde, mas apesar disto, após algum
tempo, já não buscavam mais explicações e motivos para se manter fumando. Consideravam-se
dependentes da nicótica e sem intenções de parar
de fumar. Para alguns autores a dependência de nicotina é comum já com 100 cigarros fumados13.
Dos pacientes que fumavam ou já haviam fumado
constatou-se que 88% consumiram mais de 100 cigarros durante a vida inteira.
b) Ex-fumantes:
Algumas investigações mostram que 90%
dos fumantes que interrompem o tabagismo o fazem por determinação pessoal, sem nenhuma forma de apoio. Trabalhos também demonstram que
dos indivíduos que se propõem a parar de fumar
por conta própria, no intervalo de 10 anos, somente
10% têm sucesso permanente, com média de quatro
a cinco tentativas prévias14. Por outro lado, sabese o que leva a maioria dos países desenvolvidos a
criar programas comunitários ou nas empresas, buscando a redução de fatores de risco para doenças
cardiovasculares, é principalmente a possibilidade
de reverter, tanto a prevalência dos mesmos, como
a morbi-mortalidade a eles associada5, 15.
Pode–se constatar que 90 % (19) dos participantes ex-fumantes, integrantes do NIPEAD_HUUFSC, deixaram de fumar seu último cigarro há
mais de 3 anos, 5 % (1) entre 2 e 3 anos e 5% (1)
entre 1 e 2 anos.
Em relação ao número de anos que foram tabagistas a maioria 33% (7) fumaram por um período de 0 a 5 anos e 29% (6) fumaram por mais de
25 anos (Figura 2).
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 27-34, julh/dez, 2009
Bagestãn, M. et al.
29%
4%
33%
00-05 ano
05-10 anos
10-15 anos
26%
40%
Permitido
15-20 anos
14%
5%
5%
20-25 anos
Fumódromos
Mais de 25 anos
Áreas Separadas
Não Permitido
14%
Figura 2: Tempo de tabagismo entre os ex-fumantes.
c) Ex-fumantes e nunca fumantes
Analisou-se a atitude dos entrevistados diante de alguém que está fumando, caso ele estivesse
em um local público fechado como: cinema, sala
de aula, corredores da universidade, bar ou ônibus.
Os resultados estão apresentados graficamente em
percentagem das respostas obtidas na Figura 3.
Para 59% (27) dos pacientes entrevistados a
atitude seria passiva apesar de se sentirem incomodados com o fumo. As respostas obtidas por 27
entrevistados foram não sei (2%), se incomodaria,
mas não reagiria (21%) e daria sinais de estar incomodado (40%) demonstrando o constrangimento
das pessoas ao fumo.
2%
7%
9%
5%
Não se incomodaria.
21%
16%
Se incomodaria, mas não reagiria.
Daria sinais de estar incomodado.
Pediria que o fumante apagasse
o cigarro.
Pediria ajuda à autoridade.
Não sabe.
Outra.
40%
Figura 3 Atitude de não fumantes na presença de
pessoa fumando em local público
d) Todos os entrevistados (fumantes e não
fumantes)
Todos os indivíduos responderam a quatro
perguntas que finalizaram o questionário. As respostas obtidas da pergunta referente à permissão
do ato de fumar, na percepção dos entrevistados,
em áreas onde as pessoas trabalham juntas podem
ser observadas na Figura 4.
30%
Figura 4 Permissão do ato de fumar nas áreas
onde as pessoas trabalham juntas
Dentre as opções defendidas percebe-se que
a maioria 40% (18) não concorda com a presença
do cigarro nas áreas de trabalho, por considerarem
que a exposição às substâncias carcinogênicas da
fumaça dentro de um mesmo espaço aéreo, diminuiu, mas não elimina o maior risco de câncer;
31% (12) consideram a importância de um fumódromo, sobretudo por considerarem a dependência
do cigarro das pessoas que passam a maior parte
do dia em seu trabalho. De fato, estudos de metanálise mostram que o risco de desenvolver câncer
de pulmão é 30% maior em fumantes expostos de
forma crônica à poluição tabagística do que entre
os não-fumantes não expostos16, 17.
A segunda pergunta foi em relação à participação da instituição UFSC no auxílio às pessoas
que querem parar de fumar. Observou-se que 91%
(42) reconhecem a importância em ajudar as pessoas que desejam parar de fumar, sendo que muitos
citaram como foi importante a atuação do núcleo
NIPEAD-HU-UFSC na cessação do tabagismo.
A terceira pergunta referiu-se a opinião dos
entrevistados sobre a permissão do ato de fumar
em todas as áreas, em algumas áreas ou em nenhuma área nos seguintes locais: restaurantes, instituição de saúde, ambiente de trabalho fechados e
centro de alimentação. O maior número de respostas dos entrevistados foi para a opção de que fumar
não deveria ser permitido em nenhuma das áreas
dos locais citados como pode ser observado nas
percentagens das respostas da Tabela 1.
31
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 27-34, julh/dez, 2009
Bagestãn, M. et al.
Tabela 1 Percentagem de respostas para a permissão do ato de fumar nas áreas dos diversos locais
Locais
Restaurantes
Instituição de Saúde
Ambiente de trabalho fechado
Centro de alimentação
Todas as áreas
4%
2%
2%
2%
A última pergunta foi a respeito dos locais em que se podiam observar mais freqüentemente as pessoas fumando. Os locais mais
citados na percepção dos entrevistados foram:
banheiros, corredores, pátios e outros. A opção
Algumas áreas
22%
4%
13%
11%
Nenhuma área
74%
93%
85%
87%
“outros” incluía: sala de jogos, bares, ponto de
ônibus, ruas, lanchonetes, cinema e ambientes noturnos. As percentagens das respostas dadas sobre
os locais de incidência de pessoas fumando estão
detalhadas na Figura 5.
60%
50%
40%
30%
20%
Figura 5 Percentagem das respostas acerca dos locais de incidência do tabagismo na percepção dos
entrevistados
No Brasil a prevalência de fumantes, segundo IBGE em 198916 foi de 32,6%, chegando a 40%
na Região Sul. No estudo de 2002 a 200512 em 17
capitais brasileiras observou-se que a prevalência
de fumantes passivos, não fumantes expostos à
poluição tabagística ambiental, em Florianópolis
variou de 12,5% a 21,2%. Neste mesmo estudo a
percentagem de fumantes regulares de 15 anos ou
mais, em Florianópolis, variou de 17,9% a 24,9%.
Por meio das entrevistas realizadas com os
integrantes do NIPEAD-HU-UFSC, pode-se constatar que apenas 6% (3) dos pacientes entrevistados apresentaram grau de dependência nicotínica.
32
Outros*
Escritórios,
coordenações,
secretarias
Clínicas e/ou
laboratórios
Sala dos
professores
Biblioteca
Centro de
convivência
Banheiros
Pátio
Corredores
Sala de aula,
mas não durante
as aulas
0%
Sala de aula
durante as
aulas
10%
A baixa proporção de fumantes da população entrevistada se deve a contribuição do atendimento
interdisciplinar e multiprofissional oferecido a
esses pacientes, mesmo porque a maioria dos indivíduos fumou por um período longo e todos os
indivíduos que deixaram de fumar o fizeram por
um período superior a 3 anos.
Restrições ao fumo nos domicílios, nas escolas e em lugares públicos vêm sendo apontadas
pela literatura como uma das medidas eficazes na
redução do tabagismo. A maioria das empresas de
países desenvolvidos criou legislação específica
proibindo ou restringindo o uso de cigarros em locais coletivos18, 19, 20,21.
Neste estudo a preocupação com o fumo
passivo foi expressa na maioria dos entrevistados.
Foram apontados, entre outros, os seguintes locais,
Bagestãn, M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n.2, p. 27-34, julh/dez, 2009
onde mais se pode observar o uso do cigarro: banheiros corredores, pátios, centro de convivência,
sala de aula, sendo que apenas 9% (4) dos não fumantes não se incomodariam do uso de cigarro em
lugar público fechado. Soma-se a isto que somente
2 % das respostas consideraram permitido o uso de
cigarro em todas as áreas no ambiente de trabalho
e ao fato de que a maioria concorda que não deveria ser permitido o uso do cigarro em restaurantes,
instituições de saúde, ambientes de trabalho fechados e centro de alimentação. Por outro lado, 91%
(42) dos entrevistados acharam que a UFSC deveria auxiliar as pessoas que querem parar de fumar.
Percebe-se que o alcance da cessação do
fumo e de sua total erradicação não é uma tarefa
individual, mas deve estar inserido em um contexto no qual cada um participe dentro dos seus
limites, como por exemplo, abolindo totalmente o
fumo entre os profissionais da saúde, impedindo a
propaganda do fumo nos meios de comunicação e
divulgando com maior ênfase os malefícios causados pelo fumo.
Considerações Finais
A caracterização da população em estudo
quanto aos aspectos de tabagismo foi obtida a partir
de um questionário aplicado e servirá de orientação
à coordenação do programa e a preparação para intervenções posteriores. Verificou-se a necessidade
de mudança de uma linguagem técnica para uma
linguagem mais coloquial, mais próxima ao universo do grupo que participava das intervenções.
Embora este estudo tenha sido limitado, devido ao fato de se trabalhar com uma população
específica, o mesmo mostrou a necessidade de ser
oferecido um suporte aos indivíduos que manifestam vontade de largar o tabaco, bem como reforçar a necessidade de evitar que o hábito seja readquirido. Por outro lado, a prevenção para DAC
abordando o combate ao tabagismo no grupo ob-
servado, tem mostrado resultados satisfatórios que
podem ser verificados pelo baixo índice de fumantes. Consideramos que programas educacionais de
cessação do tabagismo em nível institucional são
necessários e devem ser realizados para que as leis
de restrição do fumo dentro da instituição sejam
efetivamente cumpridas o que deve propiciar uma
redução na morbi-mortalidade por doença cardiovascular. Ações que visem investir em ações de
conscientização de toda a população, em ações
para prevenir a iniciação, para ajudar os fumantes
a deixarem de fumar e para reprimir as estratégias
das companhias de tabaco na expansão o consumo
de seus produtos.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à colaboração da Bióloga, Mara Brognoli Hack, da Secretaria de Saúde de Florianópolis pelo questionário fornecido, e
a toda equipe do NIPEAD-HU-UFSC.
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MIASTENIA GRAVIS: PERFIL CLÍNICO DE UMA SÉRIE DE 20 CASOS [Myasthenia
gravis: Clinical profile of a series of 20 cases]
Fernando Martins Braga1; Augusto Adam Netto2; Kleber Eidi Shimono3; Cleyton Takaiti Shimono4;
Oswaldo Petermann Neto5
Resumo: A miastenia gravis (MG) é uma doença da junção neuromuscular que se apresenta clinicamente por fraqueza flutuante e fadiga precoce dos músculos esqueléticos. A doença pode permanecer restrita à musculatura ocular ou generalizar-se
para outros grupos musculares. Existem poucos estudos brasileiros envolvendo pacientes com MG. Todos os pacientes foram
tratados com anticolinesterásicos; 95% receberam prednisona e 70%, azatioprina. A timectomia foi realizada em 60%. Algum
grau de melhora após o tratamento foi observado em 15 pacientes (75%), porém, apenas 6 (30%) alcançaram uma remissão
completa dos sintomas. Não houve óbitos nesta amostra.
Palavras-chave: doenças neuromusculares, doenças da junção neuromuscular, miastenia gravis.
Abstract: Myasthenia gravis (MG) is a disease of the neuromuscular junction that presents clinically by fluctuating weakness and
early fatigue of skeletal muscles. The disease may remain restricted to eye muscles or generalize it to other muscle groups. There
are few Brazilian studies involving patients with MG. All patients were treated with anticholinesterasic, 95% and 70% received
prednisone, azathioprine. The thymectomies was performed in 60%. Some degree of improvement after treatment was observed
in 15 patients (75%), however, only 6 (30%) achieved a complete remission of symptoms. There were no deaths in this sample.
Keywords: neuromuscular diseases, neuromuscular junction diseases, myasthenia gravis.
Introdução
A miastenia gravis (MG) é uma doença que
apresenta múltiplas etiologias. Pode ser congênita,
neonatal transitória (causada pela aquisição transplacentária de anticorpos maternos)1, adquirida
auto-imune ou medicamentosa (induzida por drogas como a dpenicilamina). 2
A forma mais comum da MG é a auto-imune, que surge pelo ataque mediado por linfócitos
T a estruturas pós-sinápticas da junção neuromuscular. A doença é, desse modo, o resultado de um
bloqueio que leva a uma transmissão neuromuscular anormal e à conseqüente falha na ativação
muscular.2-5 Porém, os fatores que desencadeiam
e mantêm a resposta autoimune ainda não foram
elucidados.2,6 A MG congênita, por outro lado, não
é decorrente desse componente auto-imune.6
Clinicamente, a MG costuma apresentar-se
por episódios de fraqueza flutuante de músculos
esqueléticos e fadiga precoce, que piora com o
exercício e melhora com o repouso.4,6-10 São manifestações clínicas características da doença os
achados de paresia ocular ou generalizada. A paresia ocular acomete a musculatura ocular; a generalizada atinge também outros grupos musculares. A
maioria dos casos de MG evolui para um acometimento generalizado. Nesses casos, as musculaturas predominantemente afetadas são a ocular, a
bulbar e a de extremidades.6,7,8
As manifestações oculares mais típicas são a
ptose palpebral – por acometimento dos músculos
elevadores das pálpebras – e a diplopia – quando
a doença afeta os músculos extraoculares.3,7,9 As
Médico graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina.
Professor titular da disciplina de oftalmologia do departamento de cirurgia do CCS/UFSC. Professor coordenador da disciplina de oftalmologia do módulo de sistemas sensoriais da UNISUL. Chefe do serviço de oftalmologia do HU/UFSC.
E-mail: [email protected]
3,4
Alunos da graduação em Medicina da Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected]
5
Médico graduado pela Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected]
1
2
35
Braga, F. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 35-44, julh/dez, 2009
manifestações bulbares resultam, por exemplo, em
uma face “sem expressão”, fala anasalada (rinolalia), diminuição da tonalidade vocal (disfonia)
e dificuldade para mastigar (claudicação mandibular) ou deglutir (disfagia).6,9,10 A fraqueza de
extremidades manifesta-se, por exemplo, quando
o paciente penteia os cabelos (membros superiores) ou através de quedas freqüentes ao deambular
(membros inferiores).6
O início do quadro pode ser insidioso4 ou repentino6 e pode ser exacerbado, por exemplo, por
infecções, no período pré-menstrual, durante gestações4 ou no pós-parto.1,9
Existem algumas condições associadas à
miastenia gravis freqüentemente observadas em
estudos sobre a doença. As principais são as anormalidades que acometem o timo (hiperplasia ou
timoma) ou a tireóide (como, por exemplo, o hiper
ou o hipotireoidismo).2
Há diversas formas de classificar a MG
quanto às suas manifestações clínicas. Embora não
haja um consenso entre os autores, utiliza-se classicamente a escala de Osserman.
A crise miastênica é uma das complicações
mais importantes da MG. Um quadro de crise
miastênica pode cursar com comprometimento rápido e progressivo dos músculos respiratórios, culminando em insuficiência respiratória e morte.11
O diagnóstico da miastenia gravis pode ser
feito através de uma clínica típica – história, exame
físico e testes para avaliar a função neuromuscular
– associada a uma boa resposta ao teste terapêutico
com anticolinesterásicos. A confirmação pode ser
feita por testes farmacológicos, imunológicos, eletrofisiológicos ou bióspia muscular, entre outros.6
Os principais testes farmacológicos utilizados são o teste do cloreto de edrofônio (Tensilon®)
ou o uso de drogas que bloqueiam a transmissão
neuromuscular. Entre os testes imunológicos,
destacam-se a dosagem sérica do anticorpo antireceptor de acetilcolina (anti- AChR) ou de anticorpos contra a tirosina quinase músculo-especí36
fica (anti-MuSK). A avaliação eletrofisiológica
costuma ser feita por estimulação repetitiva de
nervos periféricos ou eletroneuromiografia de fibra simples (ENMG).2,5,6,12
Não existe um tratamento específico definitivo para a MG6. As opções terapêuticas utilizadas
atualmente incluem: inibidores de acetilcolinesterase (anticolinesterásicos), corticosteróides, imunomoduladores, plasmaferese, imunoglobulina
endovenosa e timectomia.2,4
Os anticolinesterásicos inibem a acetilcolinesterase (AChE), enzima que degrada a acetilcolina, o
que aumenta a disponibilidade e prolonga a ação da
acetilcolina na junção neuromuscular, permitindo
que esta aja por mais tempo sobre os seus receptores específicos na membrana pós-sináptica. Os
corticosteróides (como a prednisona) atuam através
de múltiplos mecanismos, como a redução da proliferação e diferenciação de linfócitos, diminuindo
assim a resposta imune, o que tende a preservar a
transmissão neuromuscular. Os imunomoduladores (como a azatioprina) também interferem com a
proliferação de linfócitos e, portanto, servem como
“agentes poupadores de esteróides”. A plasmaferese remove do sangue os anticorpos circulantes. A
imunoglobulina endovenosa tem um mecanismo de
ação desconhecido, mas mostra-se efetiva no tratamento da MG, sendo utilizada em casos graves e
crises miastênicas. A timectomia tem duas funções
na MG. A primeira é a remoção de tumores tímicos
– tumores localmente invasivos que acometem cerca de 10% dos pacientes com a doença. A segunda
é o tratamento da MG propriamente dita, pois existem fortes evidências de que a timectomia tenda a
melhorar o prognóstico desses pacientes.2,4,6
A MG costumava ser uma doença muito
grave e potencialmente fatal. Nos últimos anos,
contudo, com o desenvolvimento da imunoterapia, houve grande melhora no prognóstico desses
pacientes;2 em alguns casos, entretanto, a doença mostra-se resistente às diversas possibilidades
terapêuticas.6
Braga, F. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 35-44, julh/dez, 2009
Apesar de ser a doença mais comum da
junção neuromuscular, a MG é rara.6,11 Estima-se
que a incidência anual seja de 2 a 20 casos por
milhão de habitantes, enquanto que a prevalência
na população geral é de cerca de 5 a 200 casos
por milhão.11,13-15 Embora esses valores sejam extremamente variáveis,6,14,16 existem evidências de
que a prevalência de MG venha aumentando nas
últimas décadas, seja por melhorias na acuidade
dos métodos diagnósticos ou pela diversidade de
opções terapêuticas disponíveis, que aumentam a
sobrevida dos pacientes com a doença.14
São afetados pela doença indivíduos de
qualquer idade e de ambos os sexos, porém, há um
padrão bimodal de incidência, que se caracteriza
por um pico na terceira década de vida, com predomínio no sexo feminino, e outro a partir da quinta ou sexta década, com um predomínio variável
conforme a população estudada.2,8,17-20
A maioria dos estudos sobre MG foram realizados em populações da Europa, América do Norte e Ásia.14 Estima-se que existam mais de 15.000
pessoas com MG no Brasil,11 porém, na presente
revisão de literatura, encontraram-se poucos estudos com pacientes brasileiros. Nenhum estudo baseado em uma amostra catarinense foi encontrado,
o que nos motivou a realizar esta pesquisa.
Métodos
1.
Desenho do estudo
O presente trabalho é um estudo retrospectivo, longitudinal e descritivo.
2.
Local do estudo
Os dados foram obtidos a partir de prontuários médicos arquivados pelo Serviço de Prontuários de Pacientes (SPP) do HU-UFSC, envolvendo
pacientes atendidos nesta instituição.
3.
Seleção da amostra
Foram escolhidos para participar da pesquisa todos os pacientes com diagnóstico de miastenia gravis atendidos no HU-UFSC entre janeiro de
1996 e dezembro de 2007.
O diagnóstico de miastenia gravis foi definido através da história típica, do exame neurológico
e de mais um dos seguintes critérios: (1) resposta positiva a anticolinesterásicos, (2) eletroneuromiografia com estimulação nervosa repetitiva
compatível com MG e/ou (3) exames laboratoriais
evidenciando a presença de anticorpos séricos específicos anti-AChR ou anti-MuSK.
A idade, o sexo, a etnia ou a presença de
co-morbidades associadas não foram critérios de
exclusão. Foram excluídos da amostra apenas os
pacientes que não se enquadraram nos critérios
diagnósticos acima citados ou cujos prontuários
não puderam ser localizados.
4.
Procedimentos
Com base no registro de pacientes do SPP,
procuraram-se os pacientes com o Código Internacional de Doenças (CID) G70.0 (miastenia gravis) atendidos no HU-UFSC de 1996 a 2007. Os
prontuários encontrados foram revisados e analisados pelo pesquisador principal, excluindo-se
aqueles que não se enquadraram nos critérios de
seleção da amostra. Dos prontuários restantes,
extraíram-se as informações de interesse clínico e
epidemiológico.
As variáveis estudadas foram distribuídas
em três categorias: (1) perfil sócio-demográfico
dos pacientes, (2) quadro inicial da doença e (3)
evolução clínica durante o acompanhamento.
Em relação ao perfil sócio-demográfico, os
dados avaliados foram: data de nascimento, sexo,
etnia, naturalidade, procedência, profissão e história de consumo de álcool e tabagismo.
37
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 35-44, julh/dez, 2009
Braga, F. M. et al.
O quadro inicial da doença foi caracterizado conforme a idade de surgimento dos primeiros
sintomas e sinais, idade do paciente quando do
diagnóstico de MG e manifestações iniciais da
doença. Foram consideradas “manifestações iniciais” aquelas que os pacientes relataram como
sendo prévias ao diagnóstico de MG ou aquelas
identificadas objetivamente antes da confirmação
diagnóstica e do início do tratamento. Os pacientes foram estratificados de acordo com as manifestações iniciais da doença segundo a escala de
Osserman.
Por fim, a evolução clínica da MG foi caracterizada pelos achados durante o acompanhamento
no HU-UFSC.
Foi construído um banco de dados com as
informações coletadas através dos programas Microsoft Office Excel® versão 2007 e Epidata®
versão 3.1. Posteriormente, essas informações
foram cruzadas por meio do programa Epidata
Analysis® versão 1.1. Utilizaram-se as variáveis
descritivas de porcentagem, média e mediana.
O projeto que originou este estudo for submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres
Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina (CEPSH-UFSC), tendo sido aprovado sob
o parecer número 055/08 em 28 de abril de 2008.
Resultados e discussão
1.
Perfil sócio-demográfico
O predomínio do sexo feminino neste estudo
seguiu um padrão semelhante ao encontrado por
outros autores, conforme demonstrado na tabela 1.
Tabela 1: Prevalência de miastenia gravis no sexo feminino em estudos diversos.
Autor
Este estudo
Ööpik21
Rastenytẻ19
Cunha7
Kanazawa25
Robertson22
Holtsema21
Kawaguchi27
Acosta28
Beekman29
Perlo30
Tola24
Guidetti31
Farrugia31
Ano
País
Amostra
Sexo feminino (%)
2008
1996
2002
1999
2007
1998
2000
2004
2004
1997
1966
1998
1998
2002
Brasil
Estônia
Lituânia
Brasil
Japão
Inglaterra
Holanda (Antilhas)
Japão
Cuba
Holanda
Estados Unidos
Itália
Itália
Escócia
20
162
83
153
142
100
21
470
50
100
1355
86
50
44
70,0
69,8
69,5
68,0
67,6
67,0
66,7
65,1
64,0
62,0
59,2
54,7
54,0
40,1
Heckmann et al.30 apontam para a existência de diferenças fenotípicas na presentação da
MG entre diferentes grupos raciais. No presente
estudo, apenas uma paciente foi declarada de etnia
negra. Essa paciente encontrava-se no grau IV de
38
Osserman (miastenia generalizada grave) quando
iniciou o acompanhamento e, mesmo após a timectomia, não obteve melhora significativa do quadro.
Isso difere da conclusão de Heckmann et al.30, que
afirmam que pacientes de etnia negra com MG
Braga, F. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 35-44, julh/dez, 2009
generalizada respondem melhor à terapia, porém,
não é possível estabelecer uma associação, visto o
tamanho reduzido da presente amostra.
Outro dado que chama a atenção neste estudo é a proporção de pacientes que não exerceram
atividades profissionais durante todo o acompanhamento ou parte dele. É possível que isso tenha
ocorrido, em parte, devido à morbidade causada
pela doença.
A porcentagem de pacientes que declararam
um consumo alcoólico excessivo ou patológico
(n=3) (17,6%) está de acordo com outros trabalhos
sul brasileiros, como os de Castanheira et al.29 e
de Costa et al.30, que encontraram prevalências de
24,5% e 14,3%, respectivamente, na população
geral desta região.
A porcentagem de pacientes que se declararam tabagistas (n=3) (17,6%) no momento da
avaliação também é semelhante às prevalências
encontradas por outros autores na população geral
sul brasileira, como nos trabalhos de Barros et al.38
e de Costa et al.30, que relataram prevalências de
20,6% e 14,3%, respectivamente.
2.
Quadro inicial da doença
A média geral de idade de início dos sintomas foi de 30,3 anos. Esse resultado foi compatível com os outros estudos brasileiros analisados
– 32,1 anos para Cunha et al.7 e 26,7 anos para
De Assis6. O estudo de Holtsema et al.21, nas Antilhas Holandesas, e o de Mantegazza et al.16, na
Itália, também apresentaram médias semelhantes
(31 e 32,6 anos, respectivamente). Estudos efetuados em outros países revelaram médias mais altas:
41,1 anos no Japão27, 46,5 anos na Grécia23 e 62,5
anos na Escócia32. Isso reforça a idéia da existência de particularidades regionais no padrão de acometimento da doença.
Não houve discordância entre os autores revisados no que diz respeito ao padrão bimodal de
incidência da MG.16,19,25,31 As faixas etárias mais
acometidas, no entanto, variaram consideravel-
mente nos diversos estudos. A maioria dos autores
consultados relata que o primeiro pico de incidência acomete mulheres abaixo dos 40 anos e o segundo pico inicia-se após os 40 anos, acometendo
predominantemente homens ou sem predomínio
de sexo.2,3,17,19,20,26,31 Neste estudo, houve predomínio de mulheres nas faixas etárias mais jovens,
sem predomínio de sexo após os 40 anos de idade.
Surpreendeu-nos a baixa incidência da doença na
terceira década ou a partir da sexta década de vida.
Isso pode ser o resultado de uma casuística pequena ou refletir uma característica própria da amostra
estudada.
Neste estudo, a idade média de início dos
sintomas segundo o sexo foi de 29 anos para o
sexo feminino e de 33,3 anos para o masculino.
Resultados semelhantes foram relatados por De
Assis6, que avaliou uma amostra brasileira de 372
pacientes e obteve médias de 23 anos para o sexo
feminino e de 30 anos para o masculino.
A maioria dos pacientes (60%) recebeu o
diagnóstico de MG ainda no primeiro ano após
o início das manifestações clínicas. Esse resultado foi semelhante ao observado por Beekman et
al.24 na Holanda (57%), porém, encontra-se abaixo
dos valores obtidos por Hotsema et al.21 nas Antilhas Holandesas (76,2%), Rastenyt19 na Lituânia
(90,1%) ou Robertson et al. 18 na Inglaterra (94%).
Isso pode decorrer de um atraso no encaminhamento dos pacientes das unidades locais de saúde
para serviços especializados ou de um baixo índice
de suspeição para MG.
O tempo médio entre o início das manifestações clínicas e o diagnóstico de MG nesta amostra
foi de 3,7 anos. Alguns estudos relatam que o intervalo médio para o diagnóstico costuma ser mais
curto no sexo masculino19,24. Em nosso estudo,
porém, o diagnóstico foi mais tardio para os homens (média: 4,6 anos) do que para as mulheres
(média: 3,4 anos). Deve-se ressaltar, contudo, que,
excepcionalmente, um dos pacientes do sexo masculino recebeu o diagnóstico apenas após 20 anos
39
Braga, F. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 35-44, julh/dez, 2009
do início dos sintomas. Excluindo-se esse paciente
da amostra, o intervalo médio cai para 1,5 anos
entre os homens.
Segundo Turner39, a fraqueza na MG costuma seguir um sentido crânio caudal, iniciando-se
na musculatura ocular e progredindo para fraqueza
facial/bulbar, de tronco e de extremidades.
No período que antecedeu o diagnóstico de
MG, a maioria dos pacientes apresentava história
de manifestações bulbares (n=15) (75%). As manifestações de extremidades estavam presentes em
65% dos pacientes (n=13) e achados oculares foram encontrados em 55% (n=11).
Para os pacientes estudados por Mantegazza
16
et al. , o quadro inicial foi aparentemente mais
brando. Manifestações bulbares foram descritas
em apenas 31,3% dos pacientes e houve envolvimento ocular em apenas 29,3% dos casos. Na
amostra de Ööpik et al.17, o envolvimento bulbar
foi ainda mais restrito, acometendo inicialmente
apenas 6% dos pacientes.
O envolvimento inicial generalizado da presente amostra (95%) também foi superior ao encontrado por outros autores. Para Ööpik et al.17 e
Mantegazza et al.16, o quadro inicial generalizado
foi observado em 37% e 28%, respectivamente.
Essas diferenças podem ter ocorrido por
Mantegazza et al.16 e Ööpik et al.17 terem considerado como manifestações iniciais apenas os sinais
observados no exame físico da primeira consulta
de acompanhamento. No presente estudo, incluímos as queixas referidas na história pregressa
dos pacientes e, em alguns casos, o período de
acompanhamento no HUUFSC necessário para
que se firmasse o diagnóstico de MG. Além disso, em alguns casos, houve um atraso de mais de
10 anos entre o início dos sintomas e o diagnóstico de MG. Por essa razão, alguns pacientes já se
encontravam em um quadro relativamente avançado da doença quando receberam a confirmação
diagnóstica, ou seja, ao término do período de
“manifestações iniciais”.
40
Onze pacientes (55%) iniciaram o quadro
miastênico com manifestações oculares. Esse valor aproxima-se do encontrado por Ööpik et al.17
(59%), Robertson et al.18 (52%) e Hotsema et al.21
(48%), embora apenas 1 paciente de nossa amostra
apresentasse envolvimento exclusivamente ocular.
Conforme Ööpik et al.17, o envolvimento inicial
foi exclusivamente ocular em 28%. Os achados
oculares mais freqüentes foram a ptose palpebral
(n=8)(40%) e a diplopia (n=6)(30%). Segundo
Robertson et al.18, na apresentação inicial da MG,
tanto a ptose palpebral quanto a diplopia acometeram 64% dos pacientes cada.
3.
Evolução clínica
Durante o período de acompanhamento dos
pacientes no HU-UFSC, as manifestações clínicas
mais freqüentes foram as respiratórias, que ocorreram em todos os casos. Dezenove pacientes (95%)
apresentaram dispnéia e 17 (85%) apresentaram
tosse. A maioria dos autores consultados, contudo,
não discriminou a existência de manifestações respiratórias durante a evolução da doença4,18,21,23. De
acordo com Mantegazza et al. 16, por outro lado,
os sintomas respiratórios estiveram presentes em
64,9% das mulheres e 35,1% dos homens.
A paresia de extremidades também foi uma
manifestação freqüente da MG nesta amostra, havendo predomínio proximal, o que está de acordo
com o descrito por outros autores.6,7
A crise miastênica acometeu 4 pacientes
(20%). Esse valor é comparável com o relatado
por Holtsema et al.21 (28,6%).
A maioria dos autores consultados não apontou hipo ou hiperreflexia em pacientes miastênicos. Nesta amostra, 75% dos casos apresentaram
alterações de reflexos, com considerável predomínio da hiporreflexia. Esse fenômeno também foi
observado por Cunha et al.,7 embora com menor
freqüência.
Manifestações constitucionais foram observadas em grande parte dos pacientes. A principal
Braga, F. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 35-44, julh/dez, 2009
humor depressivo foi observado em um quarto dos
pacientes.
Dentre os pacientes avaliados, foram encontradas anormalidades tímicas (hiperplasia ou
timoma) em 35% dos casos (n=7). Kawaguchi et
al. 22 estudaram uma amostra de 470 pacientes, em
44,5% dos quais houve diagnóstico de hiperplasia
ou timoma. Em nossa amostra, o timoma foi diagnosticado em 2 pacientes (10%). Esse é o valor
estimado por Turner39 e por De Assis6 para ocorrência de timoma em pacientes com MG.
Das alterações na tireóide, ressalta-se a presença de hipotireoidismo em 2 pacientes (10%).
Em um estudo de De Assis6 com 372 pacientes,
apenas um caso da doença foi encontrado.
Sabe-se que a piridostigmina (utilizada por
100% dos pacientes incluídos neste estudo) pode
causar inúmeros efeitos colaterais (tabela 2). Embora a maioria desses efeitos sejam pouco específicos, é possível manifestações como, por exemplo,
a urgência urinária, a incontinência miccional, o
desconforto abdominal ou a diarréia, apresentados
por vários pacientes (tabela 2), possam ter sido
causados pela hiperatividade da musculatura das
paredes da bexiga e dos intestinos provocada pela
medicação.27,28
foi o emagrecimento (65%). Segundo De Assis6,
existe forte associação entre manifestações bulbares e emagrecimento. Na presente amostra, 92%
dos casos de emagrecimento ocorreram em pacientes que apresentavam também manifestações
bulbares.
O envolvimento ocular acometeu 95% dos
pacientes (n=19) até o término do período de
acompanhamento. De acordo com Thanvi et al.2,
90% dos casos de MG cursam com envolvimento ocular. Para Mantegazza et al.16, no entanto,
as manifestações oculares foram encontradas em
apenas 48% das mulheres e 51,9% dos homens. As
manifestações oculares mais freqüentes na presente
amostra foram a diplopia (90%) e a ptose palpebral
(65%), o que foi comparável com outros autores.2,6,7
Thanvi et al.2 mencionam a associação de
MG com queixas emocionais, porém, não encontramos nenhum estudo particularmente focado
nesse aspecto. Alguns autores afirmam que pacientes miastênicos podem exibir uma aparência facial
depressiva ou sem expressão, o que se justifica
nos casos em que há paresia facial2,3. Na presente
amostra, no entanto, houve também grande ocorrência de queixas emocionais. A principal delas foi
a ansiedade, presente em três quartos dos casos. O
Tabela 2 – Sinais e sintomas atribuíveis ao uso de piridostigmina entre os pacientes atendidos no
hospital universitário da Universidade Federal de Santa Catarina entre os anos de 1996 e 2007.
Sinal ou sintoma
Ansiedade
Palidez
Desconforto abdominal
Diarréia
Prurido
Sudorese
Borramento visual
Sialorréia
Vômitos
Lacrimejamento
Bradicardia
N
15
12
12
10
10
8
7
6
6
4
3
%
75
60
60
50
50
40
35
30
30
20
15
41
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 35-44, julh/dez, 2009
Braga, F. M. et al.
Incontinência urinária
Urgência miccional
3
2
Do total de 20 pacientes, 12 (60%) foram
submetidos à timectomia. Dos pacientes timectomizados, 83% apresentaram melhora ou remissão
do quadro ao final do período de acompanhamento, enquanto que a porcentagem de melhora ou remissão entre os não timectomizados foi de 60%.
15
10
Outros autores25,22 também observaram melhor
prognóstico em pacientes timectomizados quando
comparados com os não timectomizados.
Na tabela 3, comparam-se os resultados da
evolução clínica neste estudo com os resultados
informados por outros autores.
Tabela 3: Comparação dos resultados do acompanhamento de pacientes com mistenia gravis.
Referência
Período
Pacientes (n)
Acompanhamento
(anos)
Remissão (%)
Óbitos (%)
Timectomia (%)
Prednisona (%)
Azatioprina (%)
Mantegazza
[40]
Donaldson
[41]
Öösterhuis
[42]
Beekman
[24]
Rastenytẻ
[19]
Este Estudo
?
1152
4,9
1975-1988
165
8
1965-1984
374
12
1985-1989
100
9,6
1992-2001
82
3,6
1996-2007
20
6,5
35
4
72
54
18
50
0
65
84
24
37
5
46
28
43
0
56
49
28
41,5
7,3
65,9
80,5
1,2
30
0
60
95
70
A análise da tabela 3 permite inferir que houve maiores taxas de uso de prednisona e
azatioprina na presente amostra em comparação com os demais estudos. A timectomia foi
realizada numa proporção semelhante à relatada
pelos outros autores. Embora nenhum óbito tenha
sido observado nesta amostra, a taxa de remissão
dos sintomas foi menor nestes pacientes do que
ocorreu nos pacientes estudados pelos demais autores. Apesar disso, a análise da figura 8 permite
constatar que, de maneira geral, houve melhora na
situação dos pacientes nos diferentes graus da escala de Osserman.
Algumas limitações foram encontradas na
realização desse estudo. A principal delas foi o
pequeno tamanho da amostra, uma vez que a MG
é uma doença pouco prevalente e pouco incidente na população geral. Isso também dificulta a
42
realização de estudos prospectivos sobre a doença.
Outro fator limitante foi o período de acompanhamento muito variado entre os pacientes. Como os
sintomas da MG apresentam um caráter flutuante,
os pacientes que foram avaliados por um período
curto de tempo tiveram menos chances de ter as
suas manifestações relatadas durante a evolução
do quadro. Por ser um estudo retrospectivo, houve
dificuldades para coletar e padronizar os dados encontrados nos prontuários, principalmente porque
os pacientes foram atendidos por diferentes profissionais ao longo do acompanhamento e, em alguns
casos, os dados foram preenchidos de maneira inadequada. Por fim, a inexistência de um consenso
sobre a maneira mais adequada de classificar pacientes com MG limitou as possibilidades de comparação dos resultados com os de outros autores.
Braga, F. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 35-44, julh/dez, 2009
Conclusões
Os pacientes com MG atendidos no HUUFSC são predominantemente do sexo feminino
(2,3:1), de etnia branca, naturais e procedentes do
estado de Santa Catarina. A idade média de início
das manifestações clínicas é de 30,3 anos. Antes
dos 40 anos, há predomínio do sexo feminino; a
partir dos 40 anos, a doença afeta homens e mulheres na mesma proporção. O diagnóstico é feito
no primeiro ano a partir do início dos sintomas na
maioria dos pacientes (60%). De maneira geral, o
diagnóstico é mais precoce no sexo masculino.
Em relação às manifestações clínicas, a paresia de extremidades é a queixa mais referida pelos
pacientes no início do quadro (60%). Ao longo da
evolução, a manifestação mais freqüente é a dispnéia (95%). Os achados oculares mais freqüentes
tanto antes quanto depois do início do tratamento
são a ptose palpebral (90%) e a diplopia (65%).
As intervenções mais utilizadas em pacientes com MG são o uso de piridostigmina (100%),
prednisona (95%) e azatioprina (70%). A timectomia é realizada em 60% dos pacientes, dos quais
83% apresentam melhora do quadro ou remissão
completa dos sintomas. Algum grau de melhora do
quadro é observado em 75% dos pacientes após o
tratamento. Em apenas 30% dos casos há remissão
completa dos sintomas.
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PAPEL DOS NEUTRÓFILOS NA SAÚDE E NA DOENÇA. [The role of neutrophils in
health and disease].
Iris Mattos Santos1, Christiane Souza Maia Neves2, Tânia Silvia Frode3.
Resumo: Esta revisão aborda as principais funções dos neutrófilos e seu importante papel na resposta imune inata. Esta célula
é a primeira linha de defesa do organismo, pois é capaz de fagocitar, digerir e destruir o agente invasor e, para isso, uma série
de eventos estão envolvidos, como o burst respiratório e a degranulação celular. Distúrbios funcionais desencadeiam doenças
que devem ser precocemente diagnosticadas para que possam ser tratadas adequadamente.
Palavras-chave: neutrófilos, saúde, doenças
Abstract: This revision covers the main functions of neutrophils and its important role in the innate immune response. This
cell is the first line defense of the organism, since it is able to phagocyte, digest and destroy the invading agents. Therefore,
many events are involved, such as respiratory burst and cell degranulation. Functional neutrophil disorders lead to conditions
that must be diagnosed early in order to be properly treated.
Key words: neutrophil, health, diseases
Introdução
Os neutrófilos, assim como outras células
da circulação, originam-se de células-tronco pluripotentes na medula óssea sob influência do microambiente medular e de fatores de crescimento.
São as células mais numerosas entre os leucócitos e participam da defesa primária do organismo
contra microorganismos patogênicos através da
resposta imune inata ao migrar rapidamente para
o local da lesão e ativar mecanismos microbicidas
por meio da liberação de espécies reativas de oxigênio, fenômeno denominado “burst” respiratório.
Contribuem também na resposta inflamatória liberando citocinas, eicosanóides e outras substâncias
envolvidas na inflamação1.
O neutrófilo é uma célula diferenciada que
contém grânulos em seu interior cujos conteúdos
contribuem para sua função microbicida. Os grânulos citoplasmáticos são divididos em: 1) grânulos azurófilos ou primários que contêm proteases
como catepsina G, elastase, glucuronidase, liso-
zima e proteinase 3, além da mieloperoxidase; 2)
grânulos específicos ou secundários compostos
de lactoferrina, lisozima e proteinase 3 e 3) grãos
de gelatinase que contêm lisozima e proteinase 3
e receptores para a adesividade celular, como por
exemplo as moléculas de adesão CD11/CD18. Os
neutrófilos também possuem um receptor para o
componente C3b do complemento denominado
CR12.
Estudos demonstraram que a destruição do
agente invasor pelo neutrófilo deve-se à formação
de espécies reativas de oxigênio e à liberação da
mieloperoxidase, no entanto, mais recentemente foi sugerido que a capacidade microbicida dos
neutrófilos provém principalmente da bomba de
elétrons localizada no interior do vacúolo fagocitário que induz uma alteração no potencial elétrico
da célula que necessita de compensação permitindo assim a digestão ou destruição dos agentes através de enzimas liberadas no vacúolo pelas granulações citoplasmáticas3. Sendo assim, a composição
química dos grânulos citoplasmáticos é muito im-
Aluna do Curso de Especialização em Citologia Cervicovaginal e Citologia de Líquidos Corporais do Departamento de
Análises Clínicas, CCS, UFSC. [email protected]
2
Aluna do Curso de Especialização em Citologia Cervicovaginal e Citologia de Líquidos Corporais do Departamento de
Análises Clínicas, CCS, UFSC. [email protected]
3
Prof.(a) Dr.(a) do Departamento de Análises Clínicas da Universidade Federal de Santa Catarina – ACL-UFSC.
[email protected]
45
1
Santos, I. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 45-50, julh/dez, 2009
portante no processo de fagocitose4.
Na presença de um estímulo infeccioso ou
inflamatório, ocorre a expressão de receptores na
membrana dos neutrófilos. Esses receptores (Toll
Like Receptors – TLRs) são responsáveis pelo
reconhecimento do microorganismo invasor na
resposta imune inata. A estimulação destas células
por uma variedade de ligantes de TLRs resulta em
fagocitose, “burst” respiratório e liberação de IL8, sugerindo que o sinal proveniente dos TLRs seja
um fator muito importante para a função celular5.
Além disso, moléculas de adesão do tipo integrinas expressas nos neutrófilos, CD11b/CD18 (Mac1) e CD11c/CD18 (p150), reconhecem e ligam-se
a certos microorganismos como Leishmania spp.,
Bordetella spp., Candida spp., e Histoplasma capsulatum. Os microorganismos são opsonizados e
os receptores da membrana dos neutrófilos podem
reconhecer outros produtos de ativação do sistema
complemento e facilitar a fagocitose6.
O neutrófilo precisa migrar para o local da
inflamação para realizar a fagocitose. Essa migração ocorre pela interação com proteínas de baixa
avidez e representadas pelas moléculas de adesão,
que incluem a L-selectina, E-selectina e P-selectina. Subsequentemente a este processo, interações
de alta afinidade ocorrem através da expressão de
moléculas de adesão intracelular como ICAM-1 E
ICAM-27.
Após o estímulo para a fagocitose ocorre o
burst respiratório, que corresponde ao aumento no
consumo de glicose e de O2 através da ativação do
sistema respiratório nas células, seguido da produção de superóxidos nos fagócitos que é mediada pelo complexo NADPH-oxidase, um sistema
multiprotéico complexo6. Esse sistema está inativo na célula em repouso e, quando ativado, permite a redução do O2 em superóxido (O2-), que se
acumula no interior do vacúolo fagocítico. Ocorre
então, uma reação de desmutação que resulta na
produção de peróxido de hidrogênio (H2O2) e, em
presença do pH ácido no interior do fagossoma, o
46
superóxido gera o que se denomina oxigênio singleto4.
O citocromo b558 é um heterodímero composto por uma molécula p22phox e uma gp91phox que
compõe a NADPH-oxidase e localiza-se entre a
membrana plasmática e a membrana dos grânulos
específicos sendo capaz de incorporar-se na parede do vacúolo fagocítico, onde forma um canal de
passagem para que os elétrons atravessem o citosol para o interior do vacúolo. Para que este transporte ocorra, algumas proteínas citosólicas como a
67phox, p47phox e p40phox devem migrar para a memp
brana do fagossoma a fim de translocá-la. Através
da atividade da NADPH-oxidase, a membrana é
despolarizada e, para que haja uma compensação
neste sistema, elétrons são transportados através
da membrana vacuolar. Após, o O2- é desmutado a
O22-, sendo em seguida protonado formando H20 e
H2O2, que irão consumir prótons e elevar o pH no
vacúolo, facilitando a entrada dos elementos que
constituem os grânulos. Este processo só ocorre se
parte desta troca for compensada com outros prótons como o K+. O transporte de elétrons através
do citocromo b558 consome os prótons presentes
no vacúolo, elevando o pH para que as proteases
neutras, sejam também ativadas pelo fluxo de K+.
O aumento de K+ no fagossoma permite a solubilização de proteases catiônicas dos grânulos e peptídeos. A exigência de um ambiente hipertônico e
alcalino restringe a toxicidade dessas proteínas ao
compartimento vacuolar, evitando danos para os
tecidos normais3.
Estudos mostram que os metabólitos gerados
a partir do oxigênio molecular, H2O2 e superóxido,
compõem um sistema antimicrobiano ativo que
atua em conjunto com as enzimas que degranulam
no interior do fagossoma8. Além disso, a queda
no pH devido ao acúmulo de íons H+ leva à ativação de hidrolases ácidas contidas nos lisossomas
e à ativação da mieloperoxidase (MPO). A MPO
penetra no fagossoma juntamente com o H2O2
gerado durante a fagocitose e forma substâncias
Santos, I. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 45-50, julh/dez, 2009
como HOCl e HIO3-, o superóxido e o H2O2 que
são fortemente microbicidas9. Outras reações bioquímicas liberam o ânion peroxinitrito e cloreto de
nitrila, que também contribuem para a atividade
microbicida6.
Através da compreensão da função e utilidade desta célula, pode-se perceber que distúrbios
funcionais ou quantitativos neste tipo celular podem ser de grande importância para a saúde do indivíduo. Ao contrário dos distúrbios quantitativos,
os funcionais muitas vezes passam despercebidos
devido à sua raridade e à dificuldade no diagnóstico devido à instabilidade desta célula e, podem
vir acompanhados de sintomas inespecíficos como
abcessos recorrentes, infecções por fungos ou bactérias incomuns e ulcerações graves em mucosas.
Estes transtornos são identificados geralmente na
infância e apresentam como uma causa comum a
diabetes mellitus, geralmente quando esta não está
controlada, ou em casos de uremia ou queimaduras severas2.
Disfunção dos neutrófilos
As desordens funcionais dos neutrófilos podem caracterizar-se por infecções recorrentes que,
em alguns casos, são leves e outras requerem tratamento6. Dentre as principais doenças relacionadas a distúrbios na função dos neutrófilos pode-se
citar:
1.
Síndrome de Chédiak-Higashi
É uma doença que ocorre devido a mutações,
conhecidas como CHS1/LYST, nos genes que codificam proteínas citoplasmáticas envolvidas na
formação do vacúolo fagocítico e no transporte
de outras proteínas10. Nesta doença os neutrófilos
apresentam inclusões gigantes formadas devido
à fusão dos grânulos azurófilos e específicos em
todas as células que contenham lisossomas. Estas
inclusões impedem a fusão com o vacúolo e ocorre
um defeito na fagocitose. Além disso, a quimiotaxia é deficiente devido à alteração nos microtúbulos e, por razões ainda desconhecidas, ocorre ainda
aumento das concentrações de catepsina G e elastase nestas células. O quadro clínico desta doença
é grave – principalmente na forma homozigótica11.
O diagnóstico é realizado por meio da visualização das inclusões em todos os tipos de células por
meio do método da imunoflorescência. Trata-se de
uma doença rara que apresentou menos de 500 casos nos últimos 20 anos10.
2.
Anomalia de Pelger-Huet
É um distúrbio raro que pode ser herdado
ou adquirido, caracterizado por uma alteração na
morfologia nuclear chamada anomalia de PelgerHuet. As células granulócitos, linfócitos, monócitos e basófilos apresentam núcleos hipolobulados,
cromatina grosseiramente condensada, e maturação citoplasmática normal12. Estudos na função
celular têm demonstrado quimiotaxia diminuída,
burst respiratório reduzido e deficiência na atividade bactericida. Os neutrófilos ainda apresentam
conteúdos reduzidos de defensina, gelatinase, colagenase, proteína de ligação a vitamina B12 e lactoferrina13. O diagnóstico baseia-se no achado de
células com anormalidades nucleares e ausência
de grânulos utilizando métodos de coloração específicos para enzimas neutrofílicas2.
3.
Deficiência da adesão leucocitária (Deficiência de LAD-1, LAD-2, LAD-3 e Rac-2)
Doença autossômica recessiva que ocorre
devido à deficiência da molécula de adesão do
tipo integrinas (CD11/CD18) ou pela ausência
da proteína sialyl-Lewis X (molécula que se liga
às selectinas presentes nas células endoteliais). O
diagnóstico depende do quadro clínico do paciente
e pode ser confirmado por análise em citômetro de
fluxo da expressão de marcadores de membrana
em LAD-1 e LAD-214.
4. Febre Familiar do Mediterrâneo
47
Santos, I. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 45-50, julh/dez, 2009
É uma doença hereditária do tipo inflamatória mais freqüente entre pessoas do Oriente Médio.
É causada por mutações no gene MEFV que codifica a pirina. A pirina tem papel importante na resposta inflamatória, pois é capaz de interagir com
os TLRs e estimular a apoptose de leucócitos, a
produção de interleucina-1 e a ativação do fator de
transcrição nuclear (NF-KB). Mutações neste gene
resultam em uma atividade pró-inflamatória. Neste
processo ocorre uma inflamação aguda específica
e o diagnóstico baseia-se nos achados clínicos e na
anamnese do paciente15.
5.
Síndrome de hiperimunoglobulina E
É uma síndrome rara que pode ser autossômica dominante ou recessiva, sendo esta última
mais severa. Estudos recentes demonstram que
nesta doença ocorrem mutações na proteína que
atua na via de transdução de sinais para a expressão receptores de citocinas (STAT3). Isto leva a
um comprometimento na quimiotaxia e o paciente
apresenta infecções recorrentes na pele e pulmões,
eczema, eosinofilia, além de elevadas concentrações da imunoglobulina E16.
6.
Doença Granulomatosa Crônica
É considerada o protótipo de doença relacionada a disfunção neutrofílica6. Esta doença
pode ser autossômica recessiva ou ligada ao sexo,
em conseqüência de mutações em qualquer um
dos quatro genes estruturais da NAPH-oxidase,
91-phox, p22-phox, p47-phox e p67-phox. Na maioria dos
gp
casos, ocorre mutação do gene gp91-phox (específico
de células fagocitárias), localizado no cromossomo X. Esta mutação diminui o “burst” respiratório
e aumenta a suscetibilidade a infecções17. Nessa
doença, é comum que ocorram infecções por microorganismos principalmente por aqueles catalase-positivos6. O diagnóstico geralmente é baseado
na avaliação da produção de superóxido, redução
de ferritcitocromo c, quimioluminescência, redução de nitroazul tetrazólio (NBT) e oxidação de di48
hidrorodamina (DHR). O teste de DHR é útil para
distinguir se o defeito está em um cromossomo
ligado ao X ou nos cromossomos autossômicos
recessivos, no entanto, pode caracterizar uma doença granulomatosa crônica ligada ao X em caso
de deficiência de mieloperoxidase. Neste caso, os
testes de nitroazul tetrazólio (NBT) e ferricitocromo c apresentam-se normais. No teste NBT, o corante tetrazólio hidrossolúvel amarelo é reduzido a
azul insolúvel devido à presença do O2- produzido
pelos neutrófilos normais. Indivíduos com mutação no gp91-phox tem duas populações de neutrófilos: uma que produz superóxido e outra que não,
atribuindo a estes uma característica de mosaico
visível no teste de oxidação. A mutação pode ser
determinada no período pré-natal por meio de testes moleculares18.
7.
Deficiência de glicose-6-fosfato
desidrogenase
Assim como na CGD, essa deficiência relaciona-se também à diminuição do burst respiratório, mas, neste caso, ocorre também anemia
hemolítica, já que esta enzima está presente nos
eritrócitos. A deficiência é ligada ao cromossomo
X (Xq28) e é caracterizada quando se tem menos
de 5% da atividade da G6PD. Pode ser diagnosticada por meio da quantificação desta enzima ou de
testes que detectam o “burst” oxidativo19.
8.
Deficiência de mieloperoxidase
A mieloperoxidase é uma hemoproteína encontrada nos grânulos azurófilos dos neutrófilos
capaz de converter H2O2 e Cl- em HOCl, e contribui para a atividade microbicida do neutrófilo19. A
deficiência desta enzima é resultante de uma mutação no gene da MPO, tornando a célula incapaz
de produzir HOCl, liberar o ânion de produzir superóxido e H2O2. A falta de HOCl no fagossoma
promove deficiência na atividade microbicida dos
neutrófilos, mas a morte efetiva ocorre. Geralmente é assintomática e o diagnostico é realizado atra-
Santos, I. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 45-50, julh/dez, 2009
vés de técnica de coloração com peroxidase em
lâmina de sangue periférico, podendo ser relacionada ao teste de DHR6.
9.
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Síndrome de Papillon-Lefèvre
Síndrome rara causada por uma mutação no
gene que codifica a catepsina G que se localiza
11q14 e influencia na quimiotaxia do neutrófilo,
podendo causar quadros de periodontite severa20.
Considerações finais
Os neutrófilos desempenham importante papel na resposta imune inata sendo a primeira fonte
de defesa do organismo contra patógenos invasores. Recentemente sabe-se que o estudo da função
desta célula pode auxiliar na compreensão dos
mecanismos que controlam sua ação auxiliando
na elucidação dos processos pelos quais o organismo responde a uma inflamação. Algumas patologias são causadas por uma perda ou diminuição
da função deste tipo de célula acarretando em problemas no processo inflamatório. Assim, o estudo
específico da função celular pode contribuir para o
conhecimento de algumas destas doenças, além de
revelar novas técnicas para diagnóstico e estratégias
terapêuticas para o tratamento destas patologias.
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REPENSANDO O USO DE MEDICAMENTOS: IMPACTO DAS ATIVIDADES DE
EDUCAÇÃO E INFORMAÇÃO EM SAÚDE JUNTO A UMA ESCOLA DE EDUCAÇÃO
BÁSICA E A COMUNICADORES DE RÁDIO (NA CIDADE DE FLORIANÓPOLIS –
BRASIL) [Rethinking the use of drugs: impact of the activities of education and health
information with a basic school and broadcasters in Florianopolis city - Brazil]
Alexandra Morais de Alexandri1; Aline Aparecida Foppa2; Ana Carolina Welter1; Célia Maria Teixeira De
Campos3*; Heloisa Pamplona Cunha1; Maria Leonor Santana Scherer4; Marina Raijche Mattozo Rover2
& Marlene Zannin5
Resumo: As ações de educação em saúde foram desenvolvidas numa Escola de Educação Básica em Florianópolis – SC.
Trabalhou-se com crianças e pais o uso inapropriado de medicamentos e com adolescentes o uso de drogas e sexualidade.
Houve interesse e participação efetiva dos envolvidos, tendo grande relevância para a transformação da sociedade. Paralelamente foi desenvolvido um trabalho de informação e discussão sobre propaganda de produtos sujeitos à vigilância sanitária
para comunicadores de rádio e acadêmicos. Radialistas locais e alunos da comunidade universitária foram convidados para
uma webconferencia e um minicurso. Foram positivas as discussões acerca da temática, porém com baixa participação.
Palavras-chave: educação, promoção de saúde, uso racional, propaganda de medicamentos, radialistas.
Abstract: Actions of health education were developed at a Basic School in Florianópolis - SC. Was worked with children
and parents the inappropriate use of drugs; with adolescents was work about drugs use and sexuality. There was interest and
active participation of those involved, with great relevance to the societies transformation. Also was developed a project to
promote information and discussion about the advertisement of products subject to sanitary surveillance for broadcasters
and academics. Local broadcasters and students from the university were invited to a webconference and a minicourse. The
discussions about this theme was positive but it had low participation.
Key words: education, health promotion, rational use, drugs advertinsing, broadcasters.
Introdução
A educação em saúde é um recurso que engloba conhecimentos e ações que visam a prevenção de doenças e promoção de saúde. Esse recurso
é promovido por profissionais da área da saúde
que oferecem subsídios para uma mudança nas
condutas de saúde afim de promover uma melhora
na qualidade de vida1,2.
O ambiente escolar é um local onde práticas
de educação em saúde devem ser estimuladas, pois
é nas escolas onde as crianças e adolescentes passam a maior parte do tempo e é nesse período em
que são desenvolvidos seus hábitos de vida. Evidencia-se no cotidiano escolar a necessidade de
aprender a conviver democrática e solidariamente
com as diferenças, tomando-as como aspectos indispensáveis ao permanente processo individual e
coletivo de produção de conhecimentos3.
Acadêmica de Farmácia, Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Ciências
Farmacêuticas, Florianópolis, SC, Brasil.
2
Farmacêutica da Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Ciências Farmacêuticas, Florianópolis, SC, Brasil.
3
Professora Doutora, Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Ciências
Farmacêuticas, Florianópolis, SC, Brasil.
4
Acadêmica de Letras Português, Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Comunicação e Expressão, Departamento de Letras e Literaturas Vernáculas, Florianópolis, SC, Brasil.
5
Professora Doutora, Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Toxicologia,
Florianópolis, SC, Brasil.
*
Email do autor correspondente (Célia Maria Teixeira de Campos): [email protected]
51
1
Alexandri, A. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 51-55, julh/dez, 2009
No Brasil, a escola pública tem se caracterizado por ser constituída predominantemente por
crianças, jovens e adultos das classes populares.
Observa-se também uma ampliação de professores
oriundos dos segmentos menos favorecidos da população3. Práticas pedagógicas favoráveis ao contexto das escolas públicas devem ser criadas a fim
de promover uma maior inclusão desses alunos na
sociedade.
Além da escola, a mídia também tem fundamental importância na educação em saúde. Observa-se um fácil acesso aos aparelhos de rádio nas
residências, bem como em ambientes públicos e
privados. Com isso, além de informar, a mídia é
capaz de influenciar a opinião das pessoas e, portanto auxiliar nos processos educativos. Assim,
ações que visem a conscientização dos profissionais comunicadores de rádio a cerca dos riscos à
saúde relacionados com as propagandas irregulares de medicamentos, são de extrema relevância
nos processos de educação em saúde4.
As propagandas são estratégias de marketing, no caso dos medicamentos, seu principal
objetivo é induzir a prescrição, dispensação, e
aquisição dos mesmos. Em geral, as propagandas
divulgam somente os benefícios do medicamento
em questão, deixando de divulgar informações importantes para a segurança do paciente. Isso leva
à automedicação que muitas vezes traz como conseqüência intoxicações medicamentosas que podem ser graves5,6,7. Elas ocupam o primeiro lugar
no ranking de intoxicações no Brasil. Em 2006, o
Sistema Nacional de Informações Tóxico Farmacológicas (SINITOX) consolidou a ocorrência de
aproximadamente 113 mil casos de intoxicação
humana, destes 30,7% causados por medicamentos8.
Com o intuito de estimular e apoiar ações
estratégicas de educação em saúde com a comunidade escolar e promover discussões sobre a propaganda e uso racional de medicamentos, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) com a
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participação das Vigilâncias Sanitárias do Estado
de Santa Catarina e Secretarias Estadual e de Educação, vem desenvolvendo o Projeto de Educação
e Informação da Gerência-Geral de Monitoramento e Fiscalização de Propaganda (GPROP), de Publicidade, de Promoção e de Informação de Produtos Sujeitos à Vigilância Sanitária (Fase III).
Materiais e Métodos
Considera-se a escola pública um espaço importante que amplia sua qualidade ao incorporar
em seu cotidiano, o trabalho coletivo, as relações
solidárias, os diferentes saberes e a participação das
diferentes pessoas3. Neste sentido, ações de educação em saúde foram desenvolvidas na Escola de
Educação Básica José Boiteux, Florianópolis – SC.
Foram programadas atividades específicas
para cada faixa etária dos alunos e para aos pais,
procurou-se dar ênfase ao uso racional de medicamentos. Ações educativas sobre o uso racional de
medicamentos não podem ser improvisadas. Exigem planejamento e entendimento do contexto,
para que proporcionem a melhoria das condições
de vida9.
Os alunos foram agrupados de acordo com
a idade, e os temas abordados foram correspondentes à maturidade para o seu entendimento. Os
estudantes na faixa etária dos 6 aos 13 anos contaram com atividades lúdicas para elucidação dos temas escovação de dentes e uso indiscriminado de
medicamentos. Estas atividades incluíram um teatro de fantoches com os personagens do folguedo
“Boi de Mamão”, pinturas, desenhos para colorir e
completar. Os adolescentes, na faixa dos 13 aos 15
anos de idade, foram envolvidos em trabalhos de
dinâmicas simples, com estimulação a indagaremse sobre as atitudes no dia-a-dia e suas consequências. As dinâmicas também abordaram dúvidas
comuns da idade, como o tema da sexualidade.
Para os pais foi elaborada uma palestra abordando
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medicamentos naturais, antibióticos e medicamentos controlados, com reforço em relação ao Uso
Racional de Medicamentos (URM). Folders foram
distribuídos entre os pais, com informações sobre
medicamentos e sua utilização.
Visando manter os princípios éticos, durante o decorrer do projeto, as imagens produzidas e
divulgadas posteriormente, com finalidade estritamente educativa, foram feitas com a autorização
dos respectivos responsáveis, bem como os nomes
dos envolvidos foram preservados. As atividades
tiveram o intuito de despertar a curiosidade e o
interesse dos alunos, sem a intenção de intimidálos ou causar situações constrangedoras, apenas as
dúvidas apresentadas espontaneamente foram discutidas, de modo que nenhum aluno foi forçado a
participar quando não se sentia a vontade.
Para o desenvolvimento do tema propaganda
de medicamentos, foram convidados a participar
de uma web conferência intitulada “Propaganda
de medicamentos: um desafio para todas as profissões”, comunicadores de rádio da grande Florianópolis e profissionais da saúde. Esta se deu com a
participação de professores da Universidade Federal de Santa Catarina, apresentando a influência da
indústria na prescrição e no uso dos medicamentos, as consequências e também as estatísticas do
uso indiscriminado de medicamentos. A presença
de um representante da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) foi vital, visto que
elucidou a legislação que regulamenta a divulgação ou promoção comercial de produtos sujeitos
a Vigilância Sanitária. Uma cartilha informativa
foi elaborada e distribuída entre os participantes
da conferência, com orientações e critérios sobre
a propaganda de medicamentos. Esta foi enviada
para as principais rádios de Florianópolis juntamente com um DVD com o conteúdo da web conferência.
A experiência foi levada ao III Congresso
Brasileiro sobre Uso Racional de Medicamentos,
na forma de apresentação de um poster.
Visando aumentar a disseminação de informações acerca da propaganda de medicamentos,
ministrou-se um minicurso na VIII Semana de
Pesquisa e Extensão da UFSC (SEPEX) com o título: “Informação sobre propaganda e uso racional
de medicamentos”. O interesse de divulgação do
minicurso foi maior para alunos de graduação de
farmácia, medicina, jornalismo e direito, levando
em consideração suas áreas de atuação profissional. Abordou-se principalmente o impacto social e
econômico e a análise frente à legislação vigente
da propaganda de medicamentos, os riscos e perigos da propaganda, e o uso racional de medicamentos.
Resultados e Discussão
A educação em saúde nas séries iniciais é
recomendada pois é desde de a infância que se
desenvolve atitudes favoráveis ou desfavoráveis
à saúde, através da observação de valores que a
criança faz em seu ambiente escolar, em casa e na
sociedade em geral. Deste modo, a escola é ambiente importante para a valorização da saúde e
para a construção de hábitos saudáveis, a medida
que a idade e o desenvolvimento cognitivo contribuem para o nível de saúde da população9.
Com as atividades realizadas na escola, espera-se que tenha ocorrido uma conscientização
por parte das crianças e seus responsáveis em relação às conseqüências que o uso inadequado de
medicamentos pode acarretar.
O interesse dos estudantes adolescentes foi
evidente em relação ao tema sexualidade, apresentando muitas dúvidas referentes ao tema, com
consequênte aumento da sua participação nas atividades. Verifica-se que o diálogo é ferramenta importante no aprendizado, e a capacitação de professores para contribuir com a elucidação do tema
é necessária, visto que são profissionais formadores de opinião.
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A adolescência é considerada uma fase de
mudanças que afeta os aspectos físicos, sexuais,
cognitivos e emocionais10. A Organização Mundial
da Saúde subdivide a adolescência em pré-adolescência, dos 10 aos 14 anos, e adolescência propriamente dita, que corresponde ao período dos 15 aos
19 anos de idade. O meio social é determinante
desta etapa, envolvendo aspectos como história do
indivíduo, família, escola, amigos e cultura11.
Os pais também demonstraram grande interesse com relação ao tema uso racional de medicamentos, visto que ao término da palestra, alguns
procuraram a equipe para esclarecimentos com
relação aos medicamentos de uso contínuo. Todos levaram os materiais informativos para casa e
espera-se que compartilhem as informações recebidas com os filhos, parentes, vizinhos e amigos.
Apesar de terem demonstrado interesse através de correspondências, verificou-se uma participação pouco expressiva dos comunicadores de rádio. Apesar disso, buscou-se através de atividades
educativas, contribuir para a redução do número
de inconformidades nos anúncios de produtos sob
vigilância sanitária veiculados nas rádios locais e
conscientizar os comunicadores da importância de
ter um senso crítico antes de anunciar uma propaganda relacionada a medicamentos. Sabe-se que
este é um trabalho de longo prazo e ações como
essas devem ser executadas, mesmo diante da dificuldade vivenciada, de trazer os comunicadores
para um diálogo a cerca da temática.
Conclusão
As atividades realizadas na escola foram
muito gratificantes, pois colocaram os acadêmicos
do curso de Farmácia da UFSC em contato direto
com a comunidade, vivenciando as dificuldades de
se promover educação em saúde. Também buscou-
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se trazer para o ambiente escolar uma maior conscientização do corpo docente, pais e alunos do ensino fundamental sobre a temática do uso racional
de medicamentos, bem como sobre a importância
do profissional farmacêutico. Sabe-se que o farmacêutico possui um importante papel do na promoção da saúde e na vida cotidiana da população,
pois é um profissional de fácil acesso. De forma
mais específica, com as crianças buscou-se demonstrar as conseqüências do uso inapropriado de
medicamentos. A atividade com os adolescentes
promoveu uma maior conscientização das atitudes
em relação ao uso de drogas, esclarecimentos de
dúvidas em relação à sexualidade e uso de anticoncepcionais. No caso dos pais, o que se tentou e se
efetivou foi despertar o interesse pelo uso racional
dos medicamentos controlados bem como o uso de
antibióticos e fitoterápicos.
Para a continuidade do trabalho, deve-se
estender as atividades realizadas na escola em
questão para outras, para que outros alunos, pais e
professores tenham contato com esta temática tão
importante no meio social da atualidade. Acreditase que a maneira mais fácil de atingir esse objetivo é a formação de multiplicadores para trabalhar
com educação em saúde com a disponibilização
dos materiais elaborados.
Sobre a participação dos comunicadores de
rádio nos eventos, verificou-se uma participação
pouco expressiva. Acredita-se que o motivo seja
o desinteresse das empresas de comunicação em
conhecer os benefícios da propaganda realizada de
forma ética e em acordo com a legislação. Sabe-se
que a indústria da propaganda movimenta grande
parte do lucro das empresas de comunicação e por
isso não há interesse em modificá-la ou adequá-la
ao padrão exigido pela ANVISA. Por isso, sugerese a proibição de propaganda de medicamentos,
pois as atividades desenvolvidas foram paliativas.
Alexandri, A. M. et al.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 51-55, julh/dez, 2009
Referências
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7. Arrais PSD, Coelho HLL, Batista MCDS, et
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scielo.php?script=sci_arttext&pid=S141381232009000300030&lng=pt.
55
Normas de Publicação
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 56-60, julh/dez, 2009
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8.1. FORMATO: O trabalho deverá ser encaminhado em 02 (duas) vias. Na digitação deverá ser utilizado espaço 1,5; com margem
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o artigo. Para determinação das palavraschave consultar a lista de “Descritores em
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• Abstract: tradução do resumo em inglês,
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1.
Artigo padrão de revista:
As referências (Normas de Vancouver) no
texto deverão ser numeradas consecutivamente de forma crescente e na ordem que
aparecem no texto pela primeira vez, identificando assim os autores SOMENTE POR
NÚMEROS. A numeração, no texto, portanto deve ser em ORDEM CRESCENTE
e SOBRESCRITO. NÃO LISTAR OS
NOMES DOS AUTORES NO TEXTO.
Shen HM, Zhang QF. Risk assessment of nickel
carcinogenicity and occupational lung
cancer. Environ Health Perspect 1994;102
Suppl 1:275-82.
Listar os primeiros seis autores seguido por
et al. Vega KJ, Pina I, Krevsky B. Heart
transplantation is associated with an
increased risk for pancreatobiliary disease.
Ann Intern Med 1996;124:980-3.
Mais do que seis autores:
Parkin DM, Clayton D, Black RJ, Masuyer E,
Friedl HP, Ivanov E, et al. Childhood-leukaemia in Europe after Chernobyl: 5 year
follow-up. Br J Cancer 1996;73:1006-12.
2.
Organização como autor:
The Cardiac Society of Australia and New
Zealand. Clinical exercise stress testing.
Safety and performance guidelines. Med J
Aust 1996;164:282-4.
3.
Sem menção de autor:
Cancer in South Africa [editorial]. S Afr Med J
1994;84:15.
4.
Volume com suplemento:
5. Número com suplemento:
Payne DK, Sullivan MD, Massie MJ. Women’s
psychological reactions to breast cancer.
Semin Oncol 1996;23(1 Suppl 2):89-97.
6.
Volume com parte:
No setor de referências: (Normas de Vancouver) A listagem de referências deverá seguir
a mesma ORDEM NUMÉRICA CRESCENTE do texto. NÃO COLOCAR OS
AUTORES EM ORDEM ALFABÉTICA.
• EXEMPLOS DE REFERÊNCIAS
7.
A)
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Poole GH, Mills SM. One hundred consecutive cases
of flap lacerations of the leg in ageing patients.
N Z Med J 1994;107(986 Pt 1):377-8.
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sialic acid in non-insulin dependent diabetes
mellitus. Ann Clin Biochem 1995;32(Pt
3):303-6.
Número com parte:
57
Normas de Publicação
8.
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 56-60, julh/dez, 2009
Número sem menção de volume:
Turan I, Wredmark T, Fellander-Tsai L. Arthroscopic
ankle arthrodesis in rheumatoid arthritis.
Clin Orthop 1995;(320):110-4.
9. Sem menção de número nem de volume:
Browell DA, Lennard TW. Immunologic status of
the cancer patient and the effects of blood
transfusion on antitumor responses. Curr
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10. Paginação em numeração romana:
Fisher GA, Sikic BI. Drug resistance in clinical
oncology and hematology. Introduction.
Hematol Oncol Clin North Am 1995
Apr;9(2):xi-xii.
11. Indicação do tipo de artigo, se necessário:
Enzensberger W, Fischer PA. Metronome
in Parkinson’s disease [carta]. Lancet
1996;347:1337. Clement J, De Bock R.
Hematological complications of hantavirus
nephropathy (HVN) [resumo]. Kidney Int
1992;42:1285.
12. Artigo contendo retratação:
Garey CE, Schwarzman AL, Rise ML, Seyfried
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with epilepsy in EL mice [retractação de
Garey CE, Schwarzman AL, Rise ML,
Seyfried TN. In: Nat Genet 1994;6:426-31].
Nat Genet 1995;11:104.
13. Artigo retratado:
Liou GI, Wang M, Matragoon S. Precocious IRBP
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[retractado em Invest Ophthalmol Vis Sci
1994;35:3127] . Invest Ophthalmol Vis Sci
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14. Artigo com erratum publicado:
Hamlin JA, Kahn AM. Herniography in
symptomatic patients following inguinal
hernia repair [erratum publicado encontra-se
58
em West J Med 1995;162:278]. West J Med
1995;162:28-31.
B - Livros e outras monografias
1.
Autor(es) individual:
Ringsven MK, Bond D. Gerontology and
leadership skills for nurses. 2nd ed. Albany
(NY): Delmar Publishers; 1996.
2.
Editor(es), compilador, como autor:
Norman IJ, Redfern SJ, editors. Mental health
care for elderly people. New York: Churchill
Livingstone; 1996.
3.
Organização como autor e editor:
Institute of Medicine (US). Looking at the future
of the Medicaid program. Washington: The
Institute; 1992.
4.
Capítulo de um livro:
Phillips SJ, Whisnant JP. Hypertension and
stroke. In: Laragh JH, Brenner BM, editors.
Hypertension: pathophysiology, diagnosis,
and management. 2nd ed. New York: Raven
Press; 1995. p. 465-78.
5.
Livro de atos de conferência, congresso,
encontro:
Kimura J, Shibasaki H, editors. Recent advances
in clinical neurophysiology. Proceedings of
the 10th International Congress of EMG and
Clinical Neurophysiology; 1995 Oct 15-19;
Kyoto, Japan. Amsterdam: Elsevier; 1996.
6. Comunicação em conferência:
Bengtsson S, Solheim BG. Enforcement of data
protection, privacy and security in medical
informatics. In: Lun KC, Degoulet P,
Piemme TE, Rienhoff O, editors. MEDINFO
92. Proceedings of the 7th World Congress
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Geneva, Switzerland. Amsterdam: NorthHolland; 1992. p. 1561-5.
Normas de Publicação
7. Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 56-60, julh/dez, 2009
Relatório técnico ou científico:
Publicado pela entidade financiadora ou
patrocinadora: Smith P, Golladay K.
Payment for durable medical equipment
billed during skilled nursing facility stays.
Final report. Dallas (TX): Dept. of Health and
Human Services (US), Office of Evaluation
and Inspections; 1994 Oct. Report No.:
HHSIGOEI69200860.
Publicado
pela
entidade executora: Field MJ, Tranquada
RE, Feasley JC, editors. Health services
research: work force and educational issues.
Washington: National Academy Press;
1995. Contract No.: AHCPR282942008.
Sponsored by the Agency for Health Care
Policy and Research.
8.
Dissertação:
Kaplan SJ. Post-hospital home health care: the
elderly’s access and utilization [dissertação].
St. Louis (MO): Washington Univ.; 1995.
9.
Patente:
Legislação
publicada
Preventive
Health
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107 Stat. 2226 (Dec. 14, 1993). Legislação
não
promulgada:
Medical
Records
Confidentiality Act of 1995, S. 1360, 104th
Cong., 1st Sess. (1995). Code of Federal
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Drug Abuse: the Impact on the Nation’s
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Aguardando publicação:
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59
Normas de Publicação
Revista Ciências da Saúde, Florianópolis, v.28, n. 2, p. 56-60, julh/dez, 2009
Material electrónico
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Revista em formato eletrônico:
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Orlando (FL): Computerized Educational Systems; 1993.
10. O(s) autor(es) deverão encaminhar o artigo para análise acompanhado de uma carta com os
seguintes dizeres:
(Cidade, data)
À Comissão Editorial
Revista de Ciências da Saúde
Os autores abaixo assinados transferem com exclusividade, os direitos de publicação, na Revista de Ciências da Saúde do artigo intitulado: (escrever título do artigo) e garantem que o artigo é
inédito e não está sendo avaliado ou foi publicado por outro periódico.
(incluir nome completo de todos os autores, endereço postal, telefone, email fax e assinaturas
respectivas).
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