PARÁ - BRASIL (1669 - 1800)
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PARÁ - BRASIL (1669 - 1800)
ÉCOLE DES HAUTES ÉTUDES EN SCIENCES SOCIALES PARIS - FRANÇA FORMAÇÁO DOUTORAL EM HISTÓRIA E CIVILIZAÇÁO DIPLOMA DE ESTUDOS APROFUNDADOS (DEA) HISTÓRIA SOCIAL DOS SISTEMAS AGRÁRIOS DO VALE DO TOCANTINS PARÁ - BRASIL (1669 - 1800) -rupturas e estabilidades- Mémoire de: Maria de Nazaré ANGELO MENEZES Orientador : M. Juan-Carlos GARAVAGLIA Paris, Setembro de 1994 1 SUMÁRIO APRESENTAÇÁO 1 - INTRODUÇÃO 1 2 -A CONQUISTA DO TERRITÓRIO BRASILEIRO NO SÉCULO XVII e XVIII 4 3 - OS ÍNDIOS QUE OS EUROPEUS ENCONTRARAM NO BRASIL 10 PROBLEMÁTICA 14 I - ANÁLISE DO LIVRO TESOURO DESCOBERTO NO RIO AMAZONAS DO PADRE JESUÍTA JOÃO DANIEL 15 1 - Apresentação do autor 16 2 - Da leitura da obra 18 3 - Visão de conteúdo 20 4 - O Vale do Amazonas 23 4.1. O delta do Amazonas 24 4.2. O Médio Amazonas 24 4.3. O Baixo Amazonas 25 5 - Nacões Indígenas/ Diversidade de Culturas no Vale Amazônico 25 2 II - O Sujeito: A História Social dos Sistemas Agrários no Vale do Tocantins baseada na obra do Padre João Daniel 31 1 - A ocupação colonial do vale do Tocantins 31 2 - Os navegadores do vale do Tocantins 31 3 - Povoação colonial: mudança na paisagem humana do vale do Tocantins 34 4 - Sistemas agrários do vale do Tocantins 41 5 - Aquisições agrícolas e novos sistemas agrários no vale Amazônico 50 5.1 - Os cultivos: agricultura para consumo e para exportação 60 5.2 - Métodos de plantio/Produtos 61 6 - CONCLUSÃO 67 7 - BIBLIOGRAFIA 70 ANEXOS 1 Glossário 78 Cronologia 83 Lista de siglas 88 Lista da fauna e flora do padre João Daniel 89 ANEXOS 2 Quadros complementares 97 3 Lista dos quadros T1 População indígena americana 11 T2 População do Brasil em 1776 35 T3 População do Brasil entre 1797-1810 36 T4 População do vale do Tocantins, 1823 38 T5 Populaçã do vale do Tocantins segundo os registros da igreja, 1765 39 Estado do Pará e Estado do Maranhão: número de militares e de índios em serviço, 1775-1777 39 O cacau como parte das exportações do Pará, 1776-1822 (em réis) 44 T8 Produção de baunilha no Pará, 1759 45 T9 Produção de salsaparrilha no Pará, 1759-1842 45 T10 Produção de anil no Pará, 1775-1779 46 T11 Produção de cravo fino no Pará, 1758-1848 47 T12 Produção de cravo grosso no Pará, 1758-1788 48 T13 Rendimento do cacau na Caixa do Comércio dos Índios, 1764 49 T14 Produção de açúcar no Pará, 1758-1785 98 T15 Produção de aguardente no Pará, 1771-1784 98 T16 Produção de algodão limpo no Pará, 1761-1763 99 T6 T7 4 T17 Produção de algodão bruto no Pará, 1759-1819 T18 Produção de arroz no Pará, 1773-1852 100 T19 Produção de borracha no Pará, 1785 100 T20 Produção de café no Pará, 1758-1848 101 T21 Produção de óleo de copaíba no Pará, 1759-1792 102 T22 Síntese dos sistemas agrários na Amazônia colonial 99 52 5 Lista dos Mapas 1 Amazônia continental 1A 2 O Brasil no século XVII 3 O Brasil na América do Sul/ localização da pesquisa 2A 4 A conquista da Amazônia 105 5 Expedição do capitão Pedro Teixeira,1637-1639 106 6 A conquista de Sergipe d'El Rei, do Nordeste e ` 104 Grão-Pará 107 7 O Brasil no fim do século XVI 8A 8 Expansão das missões Jesuítas no norte do Brasil nos séculos XVII e XVIII 108 9 Principais rios do Amazonas 109 10 Delta do Amazonas 24A 11 Médio Amazonas 24A 12 Baixo Amazonas 25 13 República Federal do Brasil - Estado do Pará 39A 6 APRESENTAÇÃO É objetivo do presente Memoire, apresentado como requesito acadêmico do Curso de Doutourado na área de História e Civilização, da École des Hautes Etudes en Sciences Sociales, estudar a História Social dos Sistemas Agrários do Vale do Tocantins, Região da Amazônia Oriental, Brasil. Este abrangerá o espaço histórico-social do período colonial, correspondente aos anos de 1669 a 1800, aproximadamente. Com este projeto, espera-se contribuir sob uma forma de história-problema, para o conhecimento sobre os diversos sistemas agrários, suas mudanças e fragilidades sobretudo quando pressionados ou subordinados aos rítmos de exploração e uso ditados pelo capital mercantil. Este trabalho baseia-se na obra do padre jesuita João Daniel, autor do "Tesouro Descoberto no Rio Amazonas"1 escrito entre os anos 1757 e 1776. Seu livro descreve o cenario da Amazônia traçando o perfil da região oriental nos séculos XVII e XVIII. Na primeira parte deste Memoire utilizamos suas referências para demonstrar a paisagem humana produzida pela colonização portuguesa no delta do Amazonas e vale do Tocantins, combinações de sistemas agrários e o perfil de algumas nações indígenas na Amazônia. Na segunda parte tratamos da história social desses sistemas agrários do vale do Tocantins aproveitando elementos descritos pelo padre naturalista que elucidam, historicamente, as transformações dos ecossistemas e a existência de diferentes sistemas agrários no vale do Tocantins. Esta obra central para as reflexões sobre os sistemas agrários organizados no período colonial foi completada com a consulta de fontes primária 2 e secundárias. Trata-se dos escritos de historiadores naturalistas, religiosos de diferentes épocas e perspectivas3 que ampliaram nosso campo de interpretação. 1 Daniel, J., " Tesouro Descoberto no Rio Amazonas,I e II , ABNR, Rio de Jneiro, 1976. 2 Recenseamento de 1783 e 1797. 3 Esta bibliografia é disponível em várias bibliotecas de Paris (IHEAL; Fundação Caloustre Gulbenkian, IEDES, Muséé de l'Homme). 7 Essa noção de sistemas agrários deverá ser elaborada na perspectiva de sistematizar os conhecimentos sobre relações homens e meio ambiente como singularidades da história do vale do Tocantins. 8 1 - Introdução A atualidade do debate sobre a destruição da floresta Tropical Úmida, que corresponde na sua maior extensão à Amazônia brasileira, apela por estudos de maior abrangência histórica sobre as transformações sucessivas ocorridas nesse meio. Quatro séculos de dominação da cultura ocidental no vale amazônico mudaram os diversos ecossistemas4. A grande ilha de Marajó, de território dos índios Nhengaibas foi transformada em terras de cultivo de canade-açúcar e arroz. Os missionários ou jesuitas organizaram criatórios de gado vacum e em 1759, mais de 170.000 cabeças, um enorme patrimônio, foi redistribuído entre um grupo social privilegiado e com poder político no governo colonial. Os pastos naturais facilitaram essa pecuária extensiva que domina a economia da ilha. Os rebanhos de búfalos introduziram-se desde 1970 e atualmente os ecossistemas da ilha estão modificados profundamente. A história social regional tem dado pouca atenção a esse tipo de estudos. As transformações do ambiente e das relações homem e meio são percebidas em curto espaço de tempo, de maneira, por exemplo, a identificar as consequências desastrosas das políticas de desenvolvimento agro-pastoril de 1984, e exploração madeireira ou mineral em execução aos planos econômicos de 1966 com suas marcas visíveis e muito evidentes pela rápida depredação dos ecossistemas da Amazônia. As lacunas provenientes de não se encarar numa perspectiva de longo prazo as estabilidades, rupturas e adaptações nos vários ecossistemas do vale amazônico conduzem a afirmações simplificadoras das relações recíprocas homem e meio biótico, à maneira das visões antagônicas sobre a Amazônia: "inferno verde" ou "celeiro do mundo"5. O estudo sobre a "História Social dos Sistemas Agrários no Vale do Tocantins rupturas e estabilidade " objetiva reconstruir as mudanças ocorridas nesta região da Amazônia Oriental durante quase 150 anos. Parte-se das incursões portuguesas desde 1669. Esta data é indicada como de início da exploração 4 Garavaglia apresenta idéias sugestivas sobre ecossistema, definindo-o como "comunidades de seres viventes fundadas en una serie de intercambios recíprocos -cadenas tróficas o alimentarias- que están enmarcadas por un medio abiótico y que a su vez, modifican activamente ese medio", GARAVAGLIA, J.C., Las relaciones entre el medio y las sociedades humanas en su perspectiva histórica, in, Anuário de IEHS, VII, Tandil, 1992, p.42. 5 SUDAM. Seminário sobre a "Realidade Amazônica", Belém, 1973, p.20. 9 da canela6, embora possa anteceder de vários anos a intromissão para extrair as denominadas "drogas do sertão" no vale. Por volta de 1800 ocorreu a queda da produção do cacau7, produto que dominou durante várias décadas as exportações paraenses e para as quais as plantações da região do Tocantins contribuiram consideravelmente. Nesse intervalo temos uma diversificação dos sistemas agrários: do domínio da extração de canela, cravo nativo, passou-se ao cultivo de cana-de-açúcar. Os plantios de cana de açucar cederam o lugar aos cacauais de cultivo e aos sistemas familiares de produção de algodão, arroz e mandioca. A caça, a pesca e a extração de madeiras combinaram-se, em todos esses tempos, com a atividade dominante. É este modelo de combinações de recursos explorados e de savoir faire de manejo dos recursos que se revela importante, vis-a-vis os objetivos e rítmos determinados pelas atividades econômicas, organizadas em função do mercado. O vale do Tocantins foi o mais povoado da Amazônia colonial, em especial no círculo próximo de Belém. Essa incursão nos estudos históricos regionais parece-me relativamente nova e portanto um desafio. Primeiro, considerando a montagem das peças documentais (relatórios de viajantes, missionários, mapas, correspondências, recenseamentos), que necessitarão fazer apelo a um duro trabalho de rastreamento de fontes e, segundo, pelos limites da teorização sobre história social de sistemas agrários que provêm do encontro de ciências sociais (História, Economia, Antropologia) e das ciências naturais (Botânica, Biologia, Zoologia) e mesmo os conhecimentos de Agronomia. Recorremos à seguinte estratégia para abordar esse tema: primeiro, recompor os elementos descritivos do vale do Tocantins. Preliminarmente, isto foi possível a partir da leitura da "bíblia ecológica" do Padre João Daniel 8. Nesta obra encontramos elementos sugestivos para indagar outros documentos. Como era o vale do Tocantins? Que transformações ocorreram? 6 Segundo Baena "Em 12 de abril de 1685 o Governador manda comprir a Provisão Régia de dous de Setembro de 1684, a qual determina que se plante nas abas das Povoções arvores de canella e cravo da mesma qualidade descoberta em 1669 no rio Tocantins", BAENA, A.L.M., Compêndio das Eras da Provincia do Pará, UFPa, Belém, 1969, p.114 7 Segundo Alden "a informação estatística relacionada com a produção de cacau na Amazônia é mais diversificada e abundante para os anos de 1778-1822, onde evidencia-se que o nível das exportações permaneceu regularmente estável, ao longo do final da década dos anos 1770 e dos anos 1780; entretanto o papel de Lisboa permaneceu como centro redistribuidor do cacau brasileiro, durante os anos de 1775-1822", in, ALDEN, F., O significado da produção de cacau na região amazônica no fim do período colonial: um ensaio de história econômica comparada, UFPa, Brasil, 1974. p.40 8 Daniel, J., op. cit. 10 Que visões existiram sobre o meio e das relações do homem nele? Segundo: realizar uma espécie de balanço das transformações econômicas, demográficas e ecológicas. A idéia é de ordenar os eventos, as marcas das rupturas, inventariar o que permaneceu. Dois exemplos: a canela desapareceu das matas, restando apenas nos quintais das casas, enquanto o cacau é inexpressivo na economia do vale. Significa vir a dimensionar o que mudou no plano dos ambientes: como foram transformados e quais foram as práticas dos homens? No final, o que explicaria essa orientação? Aqui, entrase na discussão sobre as formas e as forças da economia, sendo aqui o motor do comércio, para tornar exclusivos as atividades e produtos rentáveis, com o agravante sobre a frágil estabilidade dos ecossistemas tropicais. Esse é o quadro para considerar os fenomenos demográficos, como ocorre o povoamento indigena? O que foi o povoamento colonial? A realidade demográfica de maiorias a minorias, como aponta-se no caso dos índios, pode ser vista para grupos socio-étnicos: interagiram nesse meio. livres e escravos que interviram e 11 2 - A CONQUISTA DO TERRITORIO BRASILEIRO NO SECULO XVII E XVIII A incorporação do extremo-norte do Brasil ao império lusitano constitui um dos episódios distintos na história da formação brasileira. Em consequência do ajuste de Tordesilhas, assinado em 1494, a Amazônia foi conquistada por sertanistas, militares, funcionários do Estado, religiosos e colonos, como parte de um programa imperial que o governo português planejou e realizou com perseverância. Portugal, para apossar-se da região, precisou vencer os obstáculos físicos e humanos que existiam. As peculiaridades que distinguem a Amazônia levaramnos a uma operação de envergadura a fim de iniciar o conhecimento daquele espaço territorial; constituía uma necessidade da política de expansão e de incorporação política, defendendo-a dos concorrentes do reino ibérico e das potências européias do norte. Fazia parte do empreendimento político-cultural português9 iniciado desde a conquista das terras desconhecidas da Africa e do Oriente. No fim do século XVII e início do XVIII (1656-1706), observam-se dois fatos importantes que repercutiram no Brasil: as medidas relativas à paz com a Holanda e Espanha, pondo fim às invasões e conflitos que se estenderam por todo o período de união das coroas ibéricas, e a questão da expansão territorial brasileira. D. Afonso VI (1656/1667) e D.Pedro II (1667/1706) incentivaram bandeirantes vicentinos à procura das minas, constituindo recurso oficial à iniciativa privada. A exploração intensiva do pau brasil antecede à corrida pelas riquezas auríferas. Deste momento em diante organizaram-se as bandeiras responsáveis pelas entradas no sertão do Brasil10, iniciando o cíclo do ouro, enquanto os holandeses haviam começado desde o século XVI a organização da próspera economia açucareira do nordeste. Desses 60 anos de domínio espanhol sobre Portugal, advindo da união entre as duas coroas, o Brasil continuou a sofrer as consequências internacionais e 9 10 VIianna, H. História do Brasil -período colonial, I, Brasil, 1965, p.79. Idem, p.263. 12 econômicas sendo frequentemente atacado pelos inimigos da Espanha; os franceses no Maranhão, os ingleses na foz do Amazonas e, afinal, pela tentativa de holandeses na Bahia e por todo o nordeste, tendo como centro de operações Pernambuco, onde se mantiveram até à expulsão em 1654. A questão econômica desse período é agravada pela guerra do açúcar11, quando Recife era capital do Brasil Holandês12 . Desde 1621, a Companhia das Indias Ocidentais, que teve, por 24 anos, o monopólio do comércio com as Américas e parte da Àfrica, havia deixado de fora Pernambuco, um dos focos mais dinâmicos da economia açucareira. No período que antecede a restauração da Coroa portuguesa, Portugal havia tido sucessos na ocupação do nordeste e as duas potências ibéricas encontraram a forma da ligação dos Andes-Atlântico utilizando a rede fluvial amazônica. Os portugueses esperavam ter melhores resultados, com a criação do Estado autônomo do Maranhão e Grão-Pará separado do Estado do Brasil. Durante todo o primeiro século após a descoberta, praticamente não há movimento dos portugueses em relação ao norte. Ao contrário, o fracasso das expedições iniciais desencorajou qualquer iniciativa. Ingleses e holandeses realizavam explorações na foz do Amazonas e no rio Xingu; enquanto os franceses tinham interesse no rio Tocantins, buscando estabelecer uma ligação entre o Pará e a sua colônia no Maranhão. Quando, em 1594, os franceses fundam uma colônia no Maranhão, os portugueses tomaram medidas em relação à região. A conquista das regiões costeiras do Estado do Norte e da Amazônia teve como fatores prepulsores a preocupação dos Governadores-Gerais récem instalados e os temores dos portugueses devido a ação crescente e a ameaça à sua florescente economia açucareira em expansão no nordeste. Portugueses inciaram a conquista da Paraíba em 1583, continuaram com a tomada do Maranhão, derrotando os franceses em 1615 e fundaram próximo ao delta do Amazonas uma fortaleza, origem da cidade de Belém. 11 Segundo Vianna "denominava-se guerra do açúcar pelos danos e perdas de navios mercantes e assaltos a povoações e engenhos litorâneos", in, VIANNA, H. op. cit., p.262 12 Mauro, F. Nova História da Expansão Portuguesa - O Império Luso-Brasileiro (1620-1750), Portugal, 1991, p.109. 13 Neste continente Brasil, onde outras potências se afirmavam ao rítmo de uma crescente ocupação, os portugueses encontraram motivos para avançar na exploração interna do país. A noção de Ilha-Brasil13 pode aproximar-se das questões e desafios da interiorização. Da ocupação costeira passou-se ao progressivo e lento domínio do hinterland14. A conquista da Amazônia teve inicio em 1613, com uma bandeira organizada pelo Governador Luis de Souza que passou dos afluentes do alto Paraná aos do rio Tocantins, seguindo o rio Araguaia, antes de voltar para o Sul, a São Paulo. Anos mais tarde, um bandeirante paulista, que conseguira escapar ao naufrágio de sua expedição no sertão, chegara até Belém, seguindo o curso dos afluentes do rio Tocantins até a sua foz. Este rio que Pedro da Costa Favela subira a partir de Belém, em 1627, passara a ser a segunda "frente" desta conquista interior que delimitava a Ilha-Brasil15. A entrada amazônica de Pedro Teixeira revelou-se como o primeiro elemento de uma estratégia nova de conquista do interior do continente, que devia conduzir os lusitanos à captura de uma imensa parte do Novo Mundo atribuida à Espanha pelo Tratado assinado em 7 de junho de 1494 16. Pelo rio-mar17, em 28 de outubro de 1637 Pedro Teixeira viaja até Quito, retornando à Belém em 1639 pelo rio Tocantins. Com isto, Portugal se apodera de Capitanias que, oficialmente, estavam em terras espanholas. Conforme o Tratado de Tordesilhas, Cametá, à margem esquerda do rio Tocantins, foi concedida a Feliciano Coelho de Souza e a Capitania de Marajó, a Antônio de Souza Macedo, prolongando a conquista de Macapá. Foram aproximadamente quarenta léguas de litoral, entre o Cabo do Norte e o Oiapoque, que passaram ao domínio de Portugal. Em 1637, a fim de 13 Idem, pp: 123-124. 14 Expressão utilizada para designar o interior do Estado do Pará ou da Amazônia: "hinterland paraense", "hinterland amazônico". 15 Mauro, F. op.cit.., 129. 16 Tratado de Tprdesilhas, in FERREIRA, A.C., Aspectos económicos da dominação portuguesa na Amazônia. in: Ocidente, Revista Portuguesa Mensal, Portugal, 1961, p.128 17 Idem, p.123. 14 completar a conquista da região ocidental do delta, a Coroa atribuiu a Bento Maciel Parente a Capitania de Cabo Norte. Com a reunificação da colônia americana, a expulsão dos franceses do Maranhão e a fundação do Grão-Pará, ampliaram-se os objetivos do governo do Brasil fazendo surgir um Regimento datado de 31 de agosto de 1612 18, pelo qual se deveria reger o Governador-Geral. Este documento normatizava sobre povoamentos e fortificações; sobre os indígenas e as leis que lhes diziam respeito, quanto à sua catequese e as terras que lhe seriam atribuidas; e da economia, fixando preços, do cultivo das terras, da conservação das matas, do pau-brasil, dos salitres, da pesca de baleias e sobre a proibição de comércio com estrangeiros. O mito do ouro desenvolvido pelos navegadores espanhóis foi substituido pelas expedições que adentraram ao longo da rede hidrográfica da bacia amazônica com finalidade de exploração, apresamento de índios e de coleta das drogas do sertão. Nesse inicio do século XVII, a administração colonial do Brasil era 19 20 representada por Capitanias reais e Capitanias hereditárias . A Capitania do Maranhão e Grão- Pará foi elevada a Estado com autonomia do Estado do Brasil e comunicava-se diretamente com Portugal. Sua localização na costa atlântica sem dúvida constituía um privilégio. Em 1652, Lisboa concede autonomia à capitania do Grão-Pará em relação à do Maranhão, revogada dois anos depois. Porém, a partir do ano de 1673, a cidade de Belém foi considerada por Portugal sede do Estado do Grão-Pará, oficializada no século XVIII. Desde então, a ocupação lusitana foi taxativa na maior parte da bacia amazônica. Santa Maria de Belém do Grão-Pará aparece como o verdadeiro ponto de partida da conquista amazônica. 18 Mauro, F., op. cit. p.263. 19 As Capitanias eram seis no Estado do Brasil (Bahia, Rio de Janeiro, Paraiba, Rio Grande, Pernambuco e Colônia do Sacramento) e três no Estado do Maranhão (Ceará, Maranhão propriamento dito, e Grão-Parã) in, Vianna, H. op. cit., I . p.267. 20 Durante o século XVI foram criadas dezoito capitanias hereditárias; entretanto por circunstâncias diversas, inclusive abandono e desinterêsse dos donatários, apenas onze passaram ao século XVII, sendo 5 no Estado do Brasil (Rio Grande, Campos dos Goitacases, Nossa Senhora da Conceição de Itanhaém, Ilha de Santa Catarina e Rio da Prata) e seis no Estado do Maranhão (Cumá,Cumã ou Tapuitapera, Caeté ou Gurupi, Cametá ou Camutá, Cabo do Norte, Ilha Grande Joanes ou Marajó e Xingu); in, Vianna, op. cit., I, pp.267-268. 15 Entre 1627 e 1632 a população pioneira de Belém atingia entre 200 a 300 habitantes sendo colonos e soldados. Encontrava-se ligada com São Luis não só por terra: as comunicações fluviais realizavam-se a montante do rio Pindaré e do rio Capim21. Com a restauração do Reino de Portugal, em 1640, o interesse pelo Brasil é retomado por D.João IV e explicita-se no 22 estabelecimento do Conselho Ultramarino de 1642 , fato da maior transcendência para toda a vida colonial que viria. A rápida expansão do Brasil pelo rio Amazonas, alcançando o rio Javari, no Mato Grosso, até o rio Guaporé e descendo o rio da Prata, ao sul, recolocou a questão dos limites entre as possessões portuguesas e espanholas, e findou na assinatura do tratado de Madri em 13 de janeiro de 1750 23. Ambas as partes reconheciam haver violado o Tratado de Tordesilhas, pondo fim a uma longa fase de facto - não de jure - do domínio português muito para oeste da linha estabelecida em 1494; e, portanto, o reconhecimento internacional de uma configuração que já era quase os limites do atual Brasil. Os acertos posteriores, de 1761, assinam novo acordo que anulou o Tratado de Madri e o Tratado de Santo Ildefonso, de 1777, mas que não mudaram a situação básica definida em 175024. Quanto aos limites com a França, sabe-se que essa potência, objetivando estar o mais próximo do rio Amazonas, logrou este feito durante o periodo da Revolução Francesa e do Império. O tratado de Paris, de 23 Thermidor V, traçou o limite pelo rio Calçoene até suas cabeceiras e destas por uma reta até o rio Branco. Essa linha foi modificada pelo Tratado de Badajoz, de 6 de junho de 1801, que alterou o limite para o rio Araguari, desde a foz mais apartada do Cabo do Norte até a cabeceira e dai até o rio Branco. Mas anulou-se posteriormente, com a assinatura do acordo de Madri, em 29 de setembro do mesmo ano, que fixou os limites em Carapanatuba, ou seja, desde a foz até as cabeceiras próximas do rio Branco. O fecho aconteceu em 11 de abril de 1763 com a assinatura do tratado de Utrecht 25, onde Luis XIV 21 22 Idem, p.113. Ibdem, p.263. 23 Abreu, C. Capítulos de História Colonial (1500-1800) & E os caminhos antigos e o povoamento do Brasil, UFBr., Brasil, 1963, p.196. 24 Cardoso, C.F.S., A crise do colonialismo luso na América Portuguesa-1750/1822.p.89. 25 Mauro, F., op. cit., p.121. 16 reconheceu as duas margens, setentrional e meridional, como de propriedade, domínio e soberania de Portugal. Esta sucessão de Tratados reflete as concepções geo-políticas e o estabelecimento de hegemonias frequentemente contestadas. Na segunda metade do século XVIII viveu-se quase simultaneamente o auge e o início do declínio da produção aurífera brasileira. Este século, além de ser marcado pela busca do ouro, também o foi pela concorrência do açúcar antilhano. A crise de preços e o declínio da produção açucareira fizeram com que os plantadores vendessem parte de sua escravatura aos mineradores dispostos a pagar preços muito altos. Tudo isto contribuiu para a decadência da agricultura colonial costeira. Paradoxalmente, as exportações legais de ouro sempre estiveram abaixo dos valores exportados de açucar; apesar das minas, em seu apogeu, garantirem um lucro muito maior por cabeça de escravo empregado. Mais tarde pensaram os portugueses transformar a Amazônia numa unidade política, integrante da monarquia portuguesa, sem qualquer aproximação com o império que D.Pedro estava fundando no sul. No norte, a sociedade colonial entra em rítmo de estruturação. A Amazônia constituiu-se como uma unidade política distante do Estado do Brasil, além de representar um quadro social marcado pela miscigenação intensiva, que se processara sob incentivos do poder público. Era uma população que vivia distante das determinações centrais com suas funções públicas específicas 26. 26 Reis, A.C. A empresa colonial portuguesa na revelação da Amazônia, Rio de Janeiro. p.174. 17 3 - OS ÍNDIOS QUE OS EUROPEUS ENCONTRARAM NO BRASIL Qunado os europeus chegaram para colonizar o Brasil, encontraram uma população ameríndia bastante homogênea em termos culturais e linguísticos, distribuída ao longo de toda a costa e na bacia Paraná-Paraguai. Foram identificados pelos portugueses em dois grandes blocos. A população ao sul, composta pelos Guarani que ocupavam a bacia Paraná-Paraguaia e o litoral, desde a Lagoa dos Patos até Cananéia, no atual Estado de São Paulo; e os Tupi, que dominavam a faixa litorânea desde Iguapé, pelo menos, até a costa do Ceará. Nesta costa, onde se localizavam os Tupi-Guarani, existiam pontos dominados pelos Tapuia localizados no estuário do Prata, como os Charua; na foz do rio Paraíba os Goitacá; no sul da Bahia e norte do Espirito Santo, os Aymoré e os Tremembé na faixa entre Ceará e Maranhão27. A estimativa de população aborígene, no momento da conquista, oscila entre as cifras extremas de 1 a 8,5 milhões de habitantes para as terras baixas da América do Sul28. Os números da população aborígene da Amazônia, Brasil Central e Costa Nordeste apresentam amplitudes que variam de 500 mil até 6,8 milhões, com densidade de 14,6 habitantes / km 2 na área da várzea amazônica, e apenas 0,2 habitantes / km 2 para o interflúvio. Existem avaliações29 demonstrando que de 1492 a 1650 a América perdeu um quarto da sua população. Os autores afirmam que a depopulação foi de 95% 30. Fazendo-se um paralelo, vê-se a Europa que em 1500, tinha, do Atlântico aos Urais, de 60 a 80 milhões de habitantes31; ou seja, na ocasião do descobrimento, a densidade da Europa era de 17 habitantes / km2 32, não muito superior à da América. Tem-se, com a colonização do Brasil, um 27 Cunha, M., História dos indios no Brasil. São Paulo, 1992. p. 382. 28 Segundo Rosenblat (1954), "a população era de 1 milhão para o Brasil como um todo"; Moran (1974) diz que era "uns 500 mil para a Amazônia" enquanto que Denevan (1976) avalia em "6,8 milhões a população aborígene da Amazônia, Brasil Central e Costa Nordeste com densidade de 14,6 habitantes/km2 na área da várzea amazônica e apenas 0,2 habitantes/km2 para o interfluvio" in: Cunha, M. op. cit., p.14. 29 Rosenblat, in: Cunha, M. op. cit., p.14. 30 Dobyus, in: Cunha, M. op. cit., p.14. 31 Borah apud Denevan, 1976, in: Cunha, M. op. cit., 18. 32 Braudel, 1979, in: Cunha, M. op. cit., p. 42. 18 despovoamento radical num território anteriormente muito habitado. Os colonos europeus trazidos em ínfimas quantidades fizeram do povoamento um processo lento. Quadro 1: Cifras da População Indígena Americana NUMERO (em milhões) TERRAS BAIXAS AM. DO SUL TOTAL AMERICANO Sapper (1924) 3 a 5 Kroeber (1939) 37 a 48,5 1 8,4 2,03 13,38 2,90 (1,1 no Brasil) 15,49 -- 100 Dobyus (1966) 9 a 11,25 90,04 a 112,55 Chaunu (1969) -- 90 a 100 Denevan (1976) 8,5 (5,1 na Amazônia) 57,300 Rosenblat (1954) Steward (1949) Borah (1964) Fonte: Cunha, M. História dos Indios do Brasil, São Paulo, 1992. (Tableau a partir de Denevan (1976) e Steward (1949) ), p.14. Ressalte-se que estas estimativas retratam avaliações diferentes do impacto da depopulação indígena. É importante observar que os dados demográficos que procuram determinar a população ameríndia pré-conquista tem uma base empírica frágil, pois são apoiados em pressupostos particulares de cada autor e correntes de pensamento33. A Arqueologia busca confirmar e reformular cálculos e hipóteses sobre o povoamento americano 34. As crônicas da época deixam claro que tratava-se de populações expressivas, muito maiores do que as hoje encontradas na Amazônia, constatando-se que o nível de depopulação durante o primeiro século da colonização foi brutal 35. Cronistas discorrem que no início do século XVII, ao encontrarem os Tupinambá no Maranhão, no Pará, na Ilha Tupinambarana, e no médio Amazonas, as aldeias Tupinambá eram compostas por malocas, em geral 33 Segundo Steward, havia "189 mil Tupinambá no final do século XVI ou 0,6 hab./Km2 (1949); por outro lado, Denevan sugere uma "densidade de 9,5 hab/Km2 nas Costas ao Sul do Amazonas, ou cerca de 1 milhão de índios pré-contato (1976)", in: Cunha. M., op. cit., pp:382383. 34 Roosevelt, in: Cunha, M. op.cit., p.54. 35 Cunha, M. op. cit., p.383. 19 variando de 4 a 8 unidades, população composta de 2 a 3 mil índios 36. Os Tupinambá eram muitos e suas aldeias eram grandes quando comparadas com o padrão amazônico atual. Sobre a migração desta nação não se encontram sítios ou lugares atribuídos aos Tupinambá, entre a foz do Amazonas e o Rio Grande do Norte. Isto originou a narrativa dos cronistas que falam de uma ocupação tardia pelos Tupi do Pará e Maranhão, realizada por índios provenientes do Nordeste que fugiam da opressão colonial37. O fenômeno demográfico e cultural que acompanha os primeiros duzentos anos da ocupação européia reflete-se, em meados do século XVIII, numa realidade etnográfica bastante diferente da observada pelos primeiros exploradores no século XVI. Este fato é consequência do desaparecimento das nações que viviam ao longo do rio Amazonas e da sua substituição por novos contingentes indígenas que foram trazidos dos afluentes para a calha amazônica pelos agentes da colonização. Estas transferências ocasionaram o desaparecimento dos padrões adaptativos (demográficos, organizacionais e ergológicos) da população original. Em meados do seculo XVI, a várzea amazônica apresentava um padrão de assentamento contínuo ao longo de quilometros de margens fluviais e baseado numa economia ligada aos recursos aquáticos e da várzea inundável. Entretanto, nada disso resistiu ao avanço dos missionários espanhóis, e, especialmente, dos coletores das drogas do sertão38, dos cabos de tropas, e de missionários portugueses que saindo de Belém do Pará alcançaram os rios Tapajós, em 1626, o Negro em 1656, e o alto Solimões antes de 169039. À medida que as margens do Amazonas ficavam despovoadas dos seus antigos habitantes, novas forças tendentes ao restabelecimento do equilíbrio demográfico entravam em ação através dos movimentos espontâneos de 36 Cunha, M. op. cit. p.385. 37 Soares de Souza e Abbeville, in: Cunha, M. op. cit., pp:382-383. 38 Drogas do Sertão eram a salsaparrilha, o sassafraz, o cacau, a canafístula, a pita, o urucu, a canela, o algodão, a carajuru, o cravo fino e grosso, a baunilha, a quina, o puxuri, a casca preciosa, as sementes oleaginosas e as madeiras. 39 Soares de Souza, in: Cunha, M. op.cit. p.176. 20 acomodação e o da ação forçada de descimento40. Na época colonial os efeitos das perturbações biológicas, demográficas, econômicas, culturais e políticas acarretados pela conquista européia sobre as sociedades indígenas significaram também rupturas das relações homem/meio anteriormente existentes. O repovoamento é marcado pelo desenraizamento e pela aculturação intertribal e interétnica, originando uma população neo-indígena41, que assimila uma série de técnicas (moradia, navegação, manejo da fauna e flora) essenciais ao ecossistema fluvial, surgindo a cultura do Tapuio ou Caboclo amazonense, da qual irão participar, também, outros grupos socio-étnicos42. Desse processo histórico de desagregação e mudanças, as sociedades emergentes, têm, em última instância, as mesmas virtudes e fragilidades do ecossistema amazônico, a saber, a especialização adaptativa às condições do meio ambiente e as limitações e resistência quando expostas a elementos perturbadores do seu equilibrio. 40 Descimento era o transporte, para o litoral, de índios aprisionados no sertão, no período colonial. 41 Cunha, M. op. cit., p.175 42 idem. p.176. 21 PROBLEMÁTICA 22 I - O Tesouro Descoberto no Rio Amazonas do Padre João Daniel Durante o largo período das viagens de descoberta, enquanto os portugueses bordejavam os continentes, em busca do enriquecimento do reino, os espanhóis² penetravam nas terras para ver o que tinham. Desde México até o Chile, Cortes, Pizarro, Orellana, Palacios, Mendoza, tinham o intuito de encontrar o Eldorado. A lenda se espalhara na Ibéria, pela voz de Orellana, propalando a existência de riquezas fabulosas nesta parte do Novo Mundo, o que alvoroçou os espíritos já propensos a fantasia e inspirou as novas aventuras. Parte desta história foi contada por frades Jesuítas, dando apreciável contribuição. A bem dizer, existe uma crônica sociográfica na forma de tombamento de fatos do temporal e do espiritual. Os religiosos da Companhia de Jesus43 tiveram bastante zelo de anotar inúmeras observações em que a natureza se avantaja à custa de uma narrativa sobre as prodigalidades tropicais. Período pré-cientifico que com seus registros e visões ajudam a escrever a história. O mito de Eldorado migrou para terras brasileiras, recriado com as descrições medievais do Éden e imprimiu sabor especial à prosa desses primeiros reveladores de nossa natureza. Ela foi louvada como se fosse uma Nossa Senhora Ecológica, tomando forma de um culto panteísta pelo primeiro cronista, Capitão Simão Estácio da Silveira . O súdito português apresentava a natureza em termos grandiosos por seus ares salubérrimos, um infinito de fontes, numa terra golfeira e mui criançola ou ainda terra boníssima, formada de belíssimas ilhas e ribeirões e fresquíssimos arvoredos, cujos madeiros sobem aos céus e são infinitos 44. Vimos utilizar-se o mesmo vocabulário impregnado das imagens edênicas para revelação da Amazônia ao longo dos séculos XVII ao XVIII. 43 No Brasil encontram-se várias obras de missionários com estas características podendo ser citados como principiais a dos padres Manuel da Nobrega e Antonio Vieira, seguidos pelo Padre Joao Daniel . 44 Vianna, H., op. cit., p.61. 23 Entretanto, esta marca edênica se exclui no livro do Padre João Daniel 45. Sua história dramática de beirão amazonotropicalizado fêz-se na sorte ou azar que teve a Companhia de Jesus, expulsa do Brasil pelo Marquês de Pombal 46. Expulso e preso em Portugal, nada foi apurado contra João Daniel para causar-lhe tantos sofrimentos e importunações. Serafim Leite 47 escreveu que o padre deu provas de fortaleza e ânimo, como beirão que era. A sua profissão solene de quatro votos, nas margens do rio Moju, fê-la depois de ter sido notificado do seu próximo desterro. Encerrado nos cárceres e privado de liberdade, escreveu o Tesouro do Rio Amazonas como forma de dar continuidade à sua missão no Grão-Pará. Pelo que se conhece e se chegou a esclarecer, através de devotada pesquisa de Serafim Leite, não havia provas contra o sacerdote. Sua obra missionária, desvêlo no terreno da cultura e dos serviços prestados ao Brasil. Ela revela facetas importantes desta descoberta do vale do Amazonas. Dele extraímos as lições sobre as relações homem e natureza. 1 - Apresentação do Autor Talvez a ordem religiosa que teve papel mais importante na fase colonial do Estado do Grão-Pará e Maranhão tenha sido a Congregação da Companhia de Jesus. Estes padres receberam a margem direita do rio Amazonas e fundaram, desde sua chegada em 1669, até 1759, data da sua expulsão, oitenta e sete aldeias48. Posicionaram-se sobre questões da escravidão indígena, elaboraram uma estratégia de catequese e de ocupação territorial. O seu papel foi importante na articulação da vida política e econômica da colônia com a metrópole. Tiveram assim pápeis multiplos que implicava percorrer espaços culturais e sociais geograficamente distintos49. 45 Daniel, J., op. cit. 46 Daniel, J. op.cit. p. 79. 47 SERAFIM LEITE, in: Daniel, J., op. cit., p.16. 48 Mauro, F., op. cit., pp.138-139. 49 Baeta, L.F.N.F., Imaginação social jesuítica e instituição pedagógica -Maranhão e GrãoPará- século XVII. UFRJ, Brasil, 1984, V.III, p.198. 24 Entre os vários membros destacados da Ordem, encabeça a lista o Padre Antonio Vieira (1605 -1697 ) por ter marcado, através de seus escritos, sua passagem pela Amazônia. Sem dúvida é seguido pelo Padre João Daniel, que viveu e escreveu sobre a região no século XVIII, e teve o mesmo destino trágico de ter sido expulso do Brasil, preso e condenado no seu país natal. Nascido a 24 de julho de 1722, em Travaços, diocese de Viseu, em Portugal, sede de bispado, João Daniel definiu que seu destino estava ligado à Companhia de Jesus. Leandro Tocantins50 supôs que o fato de ele ser da região da Beira51 já o definia preparado para viver coisas maiores. Em 17 de dezembro de 1739, com 17 anos de idade, determinou seu rumo. Anônimo, chegou ao Estado do Maranhão e Grão-Pará em 1741. Havia seguido estudos de Humanidades, Filosofia, Física e Teologia. Provavelmente ordenou-se em 1750, pois em 1751 já se apresentava como padre, entregue aos ministérios da religião, sobretudo no Pará, onde percorreu muitas das aldeias e fazendas. Esteve na Amazônia durante 16 anos (1741-1757). Seu trabalho era pautado nas viagens missionárias como forma de permanente expansão, como preconizava a ordem. Pode-se acreditar que possuia um temperamento elevado e dirigido à ação, excluída a rotina, como ele próprio nos conta, através das crônicas de convento. Na sua obra, a Amazônia transparece sobre múltiplas vivências e ricas atuações humanas, portanto retrato do estado d'alma de uma época. A geografia reflete diversas paisagens, mas também lêem-se seus registros psicológicos, ditos em muitas palavras partidas do íntimo. Uma espécie de proclamação de emoções, de alegrias, de tristezas, de desapontamentos ou reconhecimentos ante o vivido. A emotividade criou, assim, através da fisiografia, uma técnica que é bem o consórcio do panorama da região e da moral do autor. A propósito da visão monótona sobre a planície amazônica, que é inúmeras vezes repetida para aqueles que não atentam sobre os detalhes de sua paisagem,a narrativa do Padre João Daniel demonstra o contrário. Trata-se de um exame em detalhe, observações minuciosas da natureza. Estas transportam o leitor por um espaço móvel, mutante. Os olhares e os gestos do 50 51 Prefácio, in: Daniel, J., op. cit., pp.10-11. CF. Tocantins, L., assim se refere à região da Beira pelas influências arquitetônicas e sociais espanholas dos que nasceram nestas fronteiras entre Portugal e Espanha. 25 escritor passavam da contemplação ao êxtase. O seu leitor é levado a imaginar o rio, as plantas, os animais e a pororoca 52. Da mesma forma que as cenas do trabalho ou o conjunto de forças dinâmicas do meio. Traz sua narrativa toda uma atmosfera em movimento, onde as silhuetas humanas agitam-se nos contornos e exuberâncias da Amazônia. 2 - Da leitura da obra O Tesouro Descoberto no Rio Amazonas53 é obra de prisão. Impressionantemente prolixa, nela desfilam a natureza e o homem através de uma narrativa despretensiosa mas emocionante na sobriedade de conduzir os olhos do leitor através dos sítios e do tempo. Escreveu Serafim Leite54, que o Tesouro Descoberto do Padre João Daniel, respeitadas as distâncias do tempo histórico-social, se apresenta como excelente referencial histórico, sociológico, antropológico e etnográfico. O caráter combativo indica um esforço por causa menos religiosa (no sentido rigoroso da doutrina de Inácio de Loyola), em outras palavras mais temporal, o que a diferencia dos frades que escreviam sobre o mundo para indicar os caminhos para os Jardins do Céu. A narrativa do Padre João Daniel é afirmação, experiência, adequação ao real e testemunho existencial. Serafim Leite considerou-a como Tratado de Economia Agrícola e Indústria Hidráulica55 pelas inúmeras referências a procedimentos para trabalhar a terra e suas riquezas. Contém, segundo Serafim Leite, um campo de instruções para a agricultura amazônica, ao tratar da indústria hidráulica aplicada, da utilização dos ventos, das marés. Obra etnográfica, antropológica e sociológica quando trata sobre as inúmeras tribos indígenas, transmite as crendices populares (sobre os homens marinhos ou bôtos). Penetra nas relações sociais, na ciumeira dos maridos e nos cultos. 52 Ondas de alguns metros de altura com grande efeito destruidor e forte estrondo, que ocorrem próximo à foz do Amazonas. 53 Prefácio, in: Daniel, J., op. cit., p.16-17. 54 Idem, p.18. 55 Ibdem, p.19. 26 Singularmente, pelo volume de indicações locais, geográficas e históricas, e as narrativas sobre diversos fatos de seu tempo constitui-se a obra em fonte genuína para a história geral do Grande Rio. A Antropologia e a Etnologia fizeram a descoberta da narrativa como gênero descritivo da literatura e é esta a demarche que nos oferece a obra de Todorov56. Ensaiamos construção desse gênero na obra deste padre naturalista. Padre João Daniel foi um afeiçoado ao mundo amazônico tropical, curioso das farsas e das realidades da natureza, seguro de que, às custas destas indagações, também prestava serviço à religião e à humanidade. Para Leandro Tocantins, é uma obra muito mais de inquérito-participação e dinamismo-concreto do que ideal místico de exercício espiritual. No seu juízo, ela se aproxima no ortodoxismo jesuíta, do pecador de Deus. Por toda sua descoberta, permeia a fraternidade com o Universo. Para este prefaciador do Tesouro Descoberto, a obra pode ser lida sem descumprir nem desobedecer os mandamentos de uma possível Sociologia histórica, pensada em termos empíricos, com as reservas da época de sua elaboração. A Biblia Ecológica da Amazônia, como a definiu Leandro Tocantins, reflete-se baconiana, nos moldes de uma ciência compreendida, ainda, em seus primeiros anteprojetos de esclarecer a inteligência humana e de habilitá-la a conquistar a natureza. Em 1976, a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro publicou a obra completa incluindo as partes 5a. e 6a. pertencentes à Biblioteca e Arquivo de Évora. Com uma anterioridade de cem anos, haviam sido impressas as 2 a (T.2,1840; T.3,1841) e a 6a (1878 - T 41) partes na Revista do Instituto Histórico do Rio de Janeiro57. A primeira edição completa do Tesouro do Padre João Daniel, na sua versão manuscrita, estava composta de 766 páginas no formato de 15,5 x 20,7. A existencia de duas quintas partes, uma no Rio de Janeiro (códice BN, n°116 de 1881), e outra em Évora, apresentam-se em versões diferentes, embora a letra do redator seja a mesma. Joaquim Rivara diz que a 5 a. parte pertencente a Évora, publicada no Rio em 1820, deve-se ao Bispo D. Joaquim de Azeredo Coutinho e que a 6a. parte teria sido remetida, pelo autor, ao Frei Gregório 56 Todorov, T., Poétique de la prose, choisy, suivi de nouvelles recherches sur le récit., Paris, 1971. 57 Revista do Instituto Histórico do Rio de Janeiro, 1840,1841,1878. in: Daniel, J. op. cit., p.5. 27 José Viegas, seu irmão, que a havia presenteado a D. Frei Manoel do Cenáculo Vilas Boas (1724-1814). Este, por sua vez, teria doado a 6 a. parte a Biblioteca de Évora58. O códice pertencente à Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro integrava o acervo da Real Biblioteca, tendo passado ao Brasil, em 1808, juntamente com a família real. Incorporou-se ao fundo de manuscritos desta instituição em 1810, data de sua fundação, dirigida naquele tempo por Frei Gregório José Viegas (1753-1840) e pelo Padre Joaquim Dâmaso (1777-1833). Desde 1810, salvo as partes 5a. e 6a. , esta peça integra o valioso acervo de manuscritos da Bibioteca Nacional do Rio de Janeiro. Em 1820, no segundo volume saiu dos prelos da Impressão Régia do Rio de Janeiro, o texto da 5 a. parte, a partir do original existente em Évora59. 3 - Visão de conteúdo A obra pode ser visualizada primeiro como uma síntese de questões marcadas por seu tempo, mas que se projetam além da sua datação. João Daniel escreve entre 1757-1776 e introduziu como primeira interrogação a descoberta do rio Amazonas. Buscava responder às reflexões que envolviam a polêmica dos descobridores deste rio. A história contemporânea tem a herança dessa questão e diversos artigos foram escritos para apoiar uma ou outra hipótese sobre os primeiros a navegar por suas águas 60. Gonçalo Pizarro, Pinzon, Orellana buscavam o Lago Dourado61 e ajudaram a criar outros mitos. São parte das discussões sobre o encontro do Novo Mundo, dos Novos Climas, dos Grandes Rios62 como também da sugestiva e fértil polêmica sobre o impacto sofrido pelo homem europeu nos trópicos. Realidade e visão mítica são construções mentais e João Daniel penetra nesses domínios para escrever sobre a origem do nome do Rio. As Guerreiras Amazonas são descritas como um exército de mulheres que habitavam entre 58 Idem, p-6. 59 Revista do Instituto Histórico do Rio de Janeiro, 1840,1841,1878. in, Daniel, J. op. cit., p.7. 60 Vianna, H., op. cit., pp.49-50. 61 ver Glossaire. 62 Daniel, J., op. cit., pp.29-32. 28 os rios Negro e Trombetas, e que, utilizando canoinhas feitas de casca de árvores, arcos e flechas, sabiam lutar com ânimo varonil. João Daniel também retoma o mito da fertilidade das terras amazônicas, mas ele tem uma matriz realista, indicando os limites naturais e quanto a inventiva humana teria capacidade para romper as barreiras, daí envestir-se em conselheiro sobre as possíveis soluções técnicas para problemas reais de cada ambiente. Apenas dois exemplos: 1) ao escrever sobre a ilha de Marajó, cujas campinas são sujeitas a inundações, recomendou a construção de sistemas de canais; 2) ao tratar sobre o cultivo do arroz, opinou sobre a diversificação de espécies63. Pedagogicamente cita nomes de rios, indica localizações, acidentes, mostrando domínio pouco comum de Geografia. Desta perspectiva, é uma obra de alguém que observou diretamente, porque viajou, sistematizou suas anotações ou suas informações de campo, mas também porque fez leitura, inquiriu além da sua presença física sobre os lugares. Talvez este seja o fato mais interessante. Se o Padre João Daniel elaborou uma síntese - O Tesouro Descoberto no Rio Amazonas - esta resulta de intrincados e complexos pontos de vista desse empirista perspicaz. Ele escreve a partir de materiais de primeira mão. Essa vivência completa-se com novas observações e leituras de outras fontes para realizar o seu inquérito sobre o mundo amazônico. É difícil estabelecer todos os lugares que conheceu. Enquanto missionário e visitador deve ter percorrido as missões jesuítas. O Padre João Daniel referese à grande bacia do rio Amazonas e dos seus afluentes principais, aos lugares ermos e às vilas mais povoadas. Para esta gigantesca bacia dedicou referências específicas a vários ecossistemas. Invariavelmente indica referências especiais da geografia, da fauna e flora e dos habitantes. Podemos recompor o conteúdo deste manuscrito escrito em um tempo que consumiu 19 longos anos, entre 1757 e 1776, com 776 páginas na versão recente editada. Para fins de uma primeira apresentação da obra, podemos apresentar sua estrutura formada por três partes. A primeira fica bem retratada com o título O Rio Amazonas divide o Novo Mundo. Trata-se da descrição geral: 63 Idem, pp.64-72. 29 "O Rio Amazonas localiza-se 315° de latitude do Rio Purus e 305° de latitude do Rio Pongo e com suas 1200 a 1800 legoas divide esse novo mundo em duas penínsulas; cortando de oeste a este e que entre suas fontes e o Pacífico tem o estreito do Panamá dividindo a América em Meridional e Setentrional. Transforma-se no rio Solimões a partir dos afluentes do rio Negro e Madeira. Para os espanhões, é chamado Rio Orelhana dando nome a seu descobridor. Tambem é conhecido pelos mesmos espanhões como Maranhão devido ao emaranhado de outros rios que o formam, os afluentes"64 Uma série de informações acumuladas e tratadas que lhe permitiram estabelecer com rigor observações delimitantes do seu universo, começando por idéias gerais que circulavam sobre a descoberta do rio-mar, sobre os mitos, mostra a diversidade de ambientes e não parece revelar fortes preocupações com as fronteiras coloniais, embora seja fiel ao reconhecimento dos espaços da ocupação portuguesa. A segunda parte revela-se sinteticamente como o tratado dos Índios, de algumas Nações dos Naturaes do Amazonas. Vai realizar demostração e reconhecimento da diversidade de culturas, comentando as línguas, as práticas de uma dúzia de nações indígenas. Apresenta as situações de conflitos e os sistemas de escravização dos índios. A Terceira Parte sugere fortemente aquilo que podemos denominar Sistemas Agrários do Vale do Amazonas. Parece incansável na denominação de espécies. São citados diferentes tipos de frutas em sua lista. Nomeia as searas e legumes indicando os tipos de consórcio ( maniba x milho; milho x algodão; tabaco x arroz; abacaxi x maniba x hortas - de quiabo, amendoim, repolho, espinafre). Fala dos gêneros extrativistas. Não deixa de citar várias dúzias de tipos de madeira e assinala a rica fauna ictiológica com a mesma prolixidade com que nomeia os animais de caça 65. Ensaiamos conferir parte do inventário da fauna e flora mencionadas pelo Padre João Daniel, levantando o nome científico e família. Este tipo de artesantato intelectual permite avançar o que seria o balanço de 64 Daniel, J. op.cit. pp.27-29. 65 Daniel, J. op. cit., pp.99-109. 30 transformação comparado, por exemplo, com as descrições do século dezenove. João Daniel oferece sob a perspectiva de macro-ecossistemas ou extensões maiores do rio, três segmentos deste universo. Vejamos primeiro o conjunto do vale do rio Amazonas. 31 4 - O Vale do Amazonas Suas observações sobre o vale amazônico oscilam entre a opulência das florestas e o labirinto dos rios. Insinuam-se, mais além, em campinas aquáticas, verdadeiros lençóis de verdura a cobrir lagoas e paranás, escondendo, sob a gama da folhagem miúda, os mururés floridos e a soberba Victória Régia, ou a grande massa líquida quase imóvel do rio Amazonas. Em grande parte, a planície amazônica, é constituida por uma espessa camada aluvial, composta de areia finíssima, que se desagrega facilmente ao sabor do movimento das águas, sobretudo ao tempo das enchentes do Amazonas e seus afluentes. Os fenômenos das enchentes e vazantes têm o inverno e o verão como elementos explicadores. As descargas pluviais, caminhando no sentido sulnorte, gastam 6 meses, desde os manadeiros dos rios Madeira, Purus e Juruá, até os Japurá, Negro e Trombetas. Também, o fato não ocorre, ao mesmo tempo em toda a planície do vale do Amazonas. Enquanto os afluentes da margem direita, nos seus cursos superiores, enchem, os da esquerda, nos cursos inferiores, vazam. No entanto, na planície de várzeas, ao centro das grandes calhas, a subida da água é mais lenta que a descida, normalmente se processando em 4 meses, enquanto que nos afluentes o tempo varia de 7 a 8 meses. Á topografia e à estrutura dessa camada meio plutônica, assim como à evapotranspiração, deve-se o mecanismo desse vai-e-vem alternado, nos dois períodos do fluxo e refluxo. Dessa alternância, o desbarranqueamento nas margens dos rios do vale amazônico é muito frequente, originando o fenômeno das terras caídas66, provocado pela retenção das águas e falta de drenagem interior. Constituem a exuberância das 1200 a 1800 léguas de um rio que corta o Novo Mundo em duas partes ao passar pelo Equinocial. Outro corte para ver o rio permite 66 "terras caídas" é o fenômeno de desbarranqueamento das margens dos rios do estuário amazônico. 32 descobrir as várzeas67, as florestas, as planícies. A floresta com sua biodiversidade notabilizou o rio Amazonas entre os europeus pela variedade de espécies tais como cacau, cravo, salsaparrilha e a canela. Sem a preocupação de fronteiras entre várzea e terra firme mostra a variedade dos ecossistemas deste rio que tem suas nascentes ao sul, na serra da Mantiqueira, e ao norte, nas cordilheiras dos Andes. Podemos seccionar as três zonas do vale, descritas pelo Padre João Daniel, mais a título de introdução sintética. 4.1 - Delta do Amazonas Complexo formado na parte mais setentrional com a região de Macapá e na parte meridional próximo à cidade de Belém do Pará, tem sua verdadeira entrada para o rio Amazonas na parte setentrional por ser o caminho mais curto para as povoações do interior do Vale, e mais favorável à navegação. A Ilha do Marajó é zona muito especial neste delta, pois faz frente ao mar num lugar chamado Barreiras, onde o rio Amazonas está em constante luta com o oceano Atlântico pela preservação de seu espaço natural. A Ilha é também destaque do autor, por ter servido de morada para os primeiros portugueses que chegaram ao vale e se instalaram no rio Arari, um dos principais entre os rios que banham o arquipélago de Marajó. Dentre os rios localizados na parte Meridional está o Tocantins que deságua na embocadura das baias de Marapatá e Limoeiro; além do rio Acara, Capim e Guamá. O rio Tocantins é o maior afluente do rio Amazonas, afirma o missionário, que oferece, sinteticamente, informações sobre esse meio 4.2 - Médio Amazonas O rio Nhamundá pode ser considerado o limite desta segunda divisão do Grande Rio. Em 1758 serviu de baliza para a demarcação dos limites das Capitanias de São José do Rio Negro e Grão-Pará68. Outros rios que pertencem ao Médio Amazonas vindos do Norte são os rios Negro, Branco, Trombetas, Jamundá, Surubuí, Purus, Parú, Yapoc, Napo e Santiago; vindos 67 Várzea é a planície fértil e cultivada de um vale. 68 DIAS, M.N. A Companhia Geral do Grão Pará e Maranhão (1755-1778), Brasil, 1970. p.43. 33 da parte Sul, são afluentes do Amazonas os rios Ucaiale, Javari, Tefé, Coari, Japurá, Purus, Madeira, Mamoré, Guaporé, Tapajós, Coroá, Xingu. 4.3 - Baixo Amazonas A foz do rio Javari delimita esta terceira divisão onde se localiza o início dos rios Madeira e Solimões e as fronteiras das terras castelhanas e portuguesas. Não foi esse espaço o que recebeu maior atenção do autor, o que permite deduzir que esteve fora de suas visitas missionárias. 5 - Nacões Indígenas/ Diversidade de Culturas no Vale Amazônico João Daniel, no capítulo 15°. da primeira parte, faz uma introdução sobre o povoamento indígena e o que foi o choque demográfico. Escreve, retomando afirmações do Padre Vieira, que nas 1.500 léguas do rio Amazonas haviam índios. Enfatiza a grande fecundidade dos índios e indica que no rio Urubú foram dizimadas 700 aldeias, enquanto no Rio Negro haviam sido escravizados 300.000 índios. Tomando dados do seu antecessor, dizia que em cada missão o número era superior a 5.000 arcos. No intervalo de 1615 a 1652, foram dizimados dois milhões de índios 69. Os estudos arquelógicos70 têm portado novas evidências que confirmam as bases do crescimento e a depopulação como já mencionamos. As regiões de várzea, plenamente ocupadas no período pré-colombiano permitiram por seus recursos naturais, tipos de solos (aluvionais) e pela quantidade de biomassa, um crescimento contínuo da população. A expansão de grupos Arawak foi realizada por migrações milenárias em direção ao Caribe, entre os séculos VIII e XII71. A invenção da agricultura intensiva com adoção do método de defrichesbrules contribuiu para o adensamento dessas populações. Estes dados servem de contra-argumento à Teoria sobre a Pobreza Ambiental, que avaliou o ambiente tropical como limitante e responsável por sequências curtas e 69 Daniel, J., op. cit., pp.257-259. 70 Roosevelt, in: Cunha.M., pp:53-86. 71 d'ANS, André-Marcel. Haiti: Paysage et Société, Paris, 1987, pp.6-51. 34 simples de expansão, consideradas ainda como fortemente influênciadas 72 pelas culturas andinas . As sociedades indígenas amazônicas, com diferenças entre elas, teriam realizado a transição da caça e coleta para a agricultura intensiva. Para o sistema extrativo, estabelece-se uma relação de 3 habitantes por km 2. para áreas de fauna pobre. A várzea e a floresta de terra firme tinham capacidade de alimentar uma população maior, elevando-se pelo menos a 10 pessoas por Km2. Considerando a extensão somente do rio Amazonas, chega-se aproximar a 1.500.000.000 habitantes (1,5 milhões), a populaçao. Outro dado dígno de mencionar, para ilustrar a violência do processo depopulativo descrito pelo religioso, é sobre a mortalidade dos índios. No ano 1749 morreram 30.000 índios nas missões vítimas da epidemia de sarampo aliada com lombrigas (parasitos intestinais)73. Esse quadro de destruição é muito forte. O balanco de perdas de vida e de culturas esta lúcidamente apontado. Escreve João Daniel que no rio Amazonas falavam-se 62 línguas diferentes74. Nesta segunda parte, João Daniel fez inúmeras anotações sobre suas descobertas junto às sociedades indígenas amazônicas, o mundo cultural, que o europeu colocou em um nível de inferioridade. O autor, etnologicamente, os descreve como homens de epiderme e feições variadas e altura média como os demais homens, sendo pessoas engajadas numa hierarquia de respeito aos mais velhos, guerreiras e superticiosas. Dos seus costumes relata as festas de casamentos e nascimento dos filhos onde, durante dias, tocam seus torés, pau-que-ronca, bebendo mocororó . O vício de bebidas e o canibalismo são praticados com luxúria e suas ingratidões ressaltam na descrição do Padre. Seu nomadismo era total. Homens, mulheres, crianças saíam sobre enormes distâncias levando todos seus pertences: cabaça de jequitáia ou malagueta para os guisados; panela e ralador que eram carregados na gutura75 pela mulher. Os homens carregavam seus arcos e flechas. Seus destinos foram modificados apesar da resistência, durante 20 anos, que fizeram aos 72 73 74 75 Cunha, M.C., op. cit. pp.53-87. Daniel, J., op. cit., pp: 279-283. I dem, pp: 259-262. gutura: tipo de cesto feminino utilizado pelas indias. 35 colonizadores; suas armas eram arcos e flechas envenenados de bororé76. A cada batalha prestavam homenagens ao sol, lua e estrelas, através de seus ritos gentis. Das manifestações da natureza pensavam corresponder a forças ocultas, com poderes inexplicáveis; um panteísmo evidente, que preside e regula toda ordem de fenômenos naturais. Nada acontece independente da vontade de um Deus particular, que a crendice invoca para solicitar felicidade ou clemência, nos momentos da cólera divina. A ficção é o ponto de partida de tudo que o aborígene procura investigar e cuja verdade escapa à sua percepção. Nas suas buscas, em demanda do infinito, esses mitos, que afinal satisfazem a sua ingênua curiosidade, se refletem nos gênios do bem e do mal e que se encontram em todos os lugares. Cumpre dizer, entretanto, que estes e outros mitos indígenas não são inspirados no sentimento religioso. Fantasias das suas mentes, não lhe atribuem um poder divino, se bem que sobrenatural. Dentre as mais populares criações animistas77 do índio amazônico, encontramos o Curupira, do qual falava o padre Anchieta, Maregravius e diversos autores do tempo colonial. O Padre João Daniel conta-nos que o Curupira era um habitante da floresta que não pratica somente o mal, mas muitas vezes o bem. Para os indígenas e caboclos da Amazônia, os estrondos que se ouvem na mata, de uma árvore que desaba, do pica-pau que broca um tronco, em procura de alimento, é atribuído a essa entidade singular, a esse pequeno caboclo, de grande cabeleira e calcanhares para a frente. O Anhangá é a alma errante que torna mal-assombradas certas localidades, onde o indígena não pode permanecer. É incorpóreo. O Uirapuru é um pequeno pássaro que dá felicidade a quem pode apanhá-lo. O Bôto, sempre disfarçado em lindo rapaz, vive fazendo seus galanteios nas sombras da roça, sendo tantas vezes responsável pelo estado interessante (gravidez) das cunhãs78. O Jurupary é o espirito diabólico, que mora nos lugares tenebrosos. O índio acredita que os infortúnios do homem são maldade desse demônio. É invisível e manifesta-se pelos naufrágios, incêndios e quedas. 76 bororé: mistura feita com ervas para envenenamento das flechas. 77 Ver glossário. 78 Cunhã é a denominação de mulher na lingua indigena. 36 A Yara é o anjo das águas, radiante de beleza, a seduzir o pescador ingênuo que viaja na igara pelos rios, lagos e igapós da Amazônas. É uma bonita ficção que saiu do pensamento indígena. Finalmente, um dos mitos mais modernos dentre as lendas do Amazonas retrata um senhor das florestas que desorienta os homens e nunca se deixa surpreender: o Mapinguary. Estas Nações Tupi79, tinham os rios como habitat natural. No Baixo Amazonas, localizados no rio Tocantins ficavam os canoeiros extratores do cravo, canela e salsaparrilha. Na ilha do Marajó ficavam os Nheengaíbas e seus aliados, os Mamainases, habitantes da baia de Paraú até o estreito de Tajupuru. No médio Amazonas, na margem esquerda, localizados no rio Nhamundá, ficavam os índios Icamiábas, Cunaris e Uabas. Na margem direita, nos rios Mamurú, Amana e Paranari estavam os Tupinambás, Sapupês, Maués e os Mundurucus. Na parte mais ocidental do Grão Pará estava a aldeia Taucuéra que reunia os índios Cunuris, Chereunas, Paracoianás, Paracuatás e os Uabois. No Alto Amazonas, nos rios Madeira e Solimões, localizavam-se os índios Muras80 conhecidos tradicionalmente pelas suas correrias no Amazonas. Constituída de uma enorme população, essa Nação provavelmente reunia trânsfugas de outras etnias. A base alimentar de grande parte dos índios amazônicos era a farinha de mandioca preparada de formas variadas. Com água fria (chibé), quente (mingau), feito beiju (bolo no forno)81. O extermínio de cerca de dois milhões de índios, no período de 1615 a 1652, foi superior à sua fecundidade. Ao ser extinta, em 1757, a lei de Redempção de Cativeiros82, que objetivava trocar os cativos, prisioneiros feitos nas guerras, deixou como saldo uma população indígena que havia sido dizimada 79 Cunha, M.op. cit.,p.382 e Daniel,J. op.cit. pp:259-262. 80 Muitas das sociedades indígenas ditas isoladas são descendentes de refratários, foragidos de missões ou do serviço de colonos que se retribalizaram ou aderiram a grupos independentes, como os Muras,in, Cunha, M. op. cit.,p.12. 81 82 ver glossário. Daniel, J., op. cit., pp: 229-233. 37 neste processo de comercialização de índios escravos. A outra parte da 83 população ficou à mercê da Lei de Repartição dos Indios como mão-de-obra livre para os colonizadores. Na obra há uma separação clara entre a cultura indígena e a organização social que estava se formando. Haviam transcorridos pouco mais de cem anos de estabelecimento dos portugueses no vale Amazônico, com a fundação da cidade de Belém do Grão Pará (1616)84, e precisamente a partir deste evento é que se irradiava a penetração no vale. No delta Amazônico, em frente a cidade do Pará, ficava a maior população portuguesa onde as riquezas de plantas nativas como cacau, baunilha, salsaparrilha, cravo, canela, algodão e mandioca, aliadas à extração do âmbar, bálsamo de umeri, eram responsáveis pela economia. E assim, durante anos, os luso-brasileiros, por temerem as cachoeiras dos rios Tocantins e Trombetas, permaneceram ali mesmo. Outras missões na calha do rio Amazonas eram Gurupatuba, emancipada como vila de Monte Alegre, com grandes campos naturais; Tapajós, emancipada como vila de Santarém; e Ibirari, emancipada como vila Alter do Chão. A entrada na terceira parte é um rápido inventário das riquezas do vale. Nas suas minas, nos seus muitos e preciosos haveres...e na muita fertilidade das suas margens85. O Padre João Daniel é um entusiasta da região Amazônica, onde concebe o reino da agricultura. Nos primeiros capítulos relata, opina, aconselha e projeta o bom sucesso do cultivo da terra. O entusiasmo levou-o a citar searas e legumes, frutas, sem deixar de produzir nos domínios da etnobotânica, as variedades, as qualidades e as práticas de colheita e cultivo do cacau, arroz, madeiras e plantas e em especial as palmeiras completam a narrativa sobre o reino vegetal. 83 Esta Lei apregoava a liberdade dos índios de qualquer jugo; fosse das missões ou de pessoas. 84 85 Vianna, H., op. cit., p.145. Daniel, J., op. cit., pp: 284-296. 38 Diferente dos livros de viajantes, não se trata de um diário de viagem que amarra a geografia e vida social aos seus flashes. Não se trata de uma obra, como a de Alexandre Rodrigues Ferreira86, muito mais próxima no interesse de classificar. A obra termina pelo misterioso Tesouro Descoberto do rio Amazonas - os gêneros de especiarias ou dos haveres das terras do Amazonas. É uma lista fascinante de espécies extrativas, como se intencionalmente cedesse ante a evidência de uma riqueza aguardando ser explorada. Desses gêneros haviam desaparecido em áreas inteiras a canela, o cravo, ou eram menores as colheitas, como a salsaparrilha. O discurso reflete aquilo que Costa analisou como a ideologia extrativo agrícola. Rejeitou-se o extrativismo, e coloca-se no seu lugar a agricultura, pois ela disciplinara o trabalho dos homens, sobretudo da força do trabalho indígena; mas, na prática, o ideal agrícola sucumbe ante a força econômica que impulsiona o extrativismo87. Procedeu-se leitura e releitura da obra. Na primeira, fez-se uma leitura corrente para entendê-la, familiarizar-se com os estilos e as denominações. Na segunda, efetuou-se um fichamento analítco seguindo a composição do trabalho. 86 Braun apresenta idéias sobre as primeiras missões científicas realizadas na Amazônia, como a de Alexandre Rodrigues Ferreira, iniciada em 18 de Setembro de 1781, e que apresenta informações sobre a viagem onde "durante 10 anos o cientista e naturalista percorreu o Vale do Amazonas, tendo iniciando a viagem com a expedição do Roteiro Geográfico de Marinho de Souza e Albuquerque, Governador e Capitão General do Estado do Brasil", in, Braun, J.V.M. de., Roteiro Corographico in, Revista Trimestral de História e Geographia, Brasil, 1849. pp:289-305. 87 Costa, F.A. Valor e preço, exploração e lucro da produção camponesa na Amazônia: críticas à noção de funcionalidade da produção familiar na fronteira agrícola, Belém-Pará, 1991, pp:177-206. 39 II - O Sujeito: A História Social dos Sistemas Agrários no Vale do Tocantins baseada na obra do Padre João Daniel 1 - A ocupação colonial do vale do Tocantins A cartografia do século XVII destacou o rio Pará, depois chamado Tocantins, que batizou a grande extensão colonial portuguesa no norte com o nome de Estado do Grão-Pará. Este corresponde a referência mais forte da dominação portuguesa. Essa via é a segunda em tamanho depois da artéria central ou rio Amazonas. É o seu maior afluente, situado à margem direita. O rio Tocantins, entretanto, foi a via encontrada por Pedro Teixeira para tomar posse e fundar a vila de Belém do Pará 88. Esse rio tem sua foz no delta Amazônico, na embocadura das baias do Limoeiro e Marapatá, geograficamente localizado na Amazônia Oriental a 1° 72' 60" de Belém. Ele atravessa os Estados do Pará, Maranhão, Goiás e o Estado que levou seu nome89. Na época colonial não encontravam-se povoações em 15 dias de viagens vale adentro. Porém, à jusante, ou Baixo Tocantins, a ocupação se deu de forma rápida. A partir de 1750, com a transformação das missões em vilas, pode-se observar este fenômeno. A vila de Cabi-Colares foi emancipada em 1757 e logo em seguida, na ilha de Marajó, fundaram a vila de Santa Ana. Daí em diante se instalaram no rio Moju 40 moradores portugueses e no rio Acará foram implantados seis sítios. Foram fundadas as vilas de Cametá, Oeiras e Melgaço.90 2 - Os Navegadores do Vale do Tocantins Durante todo o primeiro século após a descoberta do Brasil, somente os franceses, ingleses e holandeses estiveram na região. Em 1610 os franceses estabeleceram uma Feitoria na foz do Tocantins 91, provavelmente para manter 88 Vianna, H., op. cit., pp: 166-167. 89 O rio Tocantins com aproximadamente 2.400 quilometros de extensão corta 10% do território brasileiro ao atravessar desde o Planalto Central até o estuário amazônico, in, Pinto, L.F. Jornal Pessoal, n°120, março de 1994. 90 Velho, O.G., Frentes de Expansão e Estrutura Agrária, Rio de Janeiro, 1972, p.18. 91 Idem, p.19. 40 uma ligação entre o Pará e sua colônia no Maranhão. Com isto, La Blanjartier penetra no rio Tocantins e o explora até a cachoeira de Itaboca, a qual era o grande obstáculo e divisor do curso inferior do Tocantins, facilmente navegável, e o seu curso médio. Em 1613 Daniel La Touche penetra novamente no rio Tocantins, e alcança a confluência com o rio Araguaia92. A colonização portuguesa na Amazônia se restringia à área em torno do delta do Amazonas, onde se praticava alguma agricultura, especialmente de canade-açúcar. As expedições eram organizadas com a finalidade de exploração, apresamento de índios e de coleta das drogas do sertão. O retardamento do povoamento do vale do Tocantins, no seu curso médio reflete, em parte, o desinteresse dos portugueses pela colonização do norte brasileiro. Com a desorganização do mercado de açúcar no século XVII, e a perda do mercado das especiarias no Oriente, iniciaram-se periódicas ao longo dos rios. Com isto, na segunda acelerou-se a infiltração no vale do Amazonas. portuguesa ao rio Tocantins data de 1625, feita Lisboa, indo até a cachoeira de Itaboca. as primeiras incursões metade do século XVII A primeira expedição pelo Frei Cristovão de Em 1653, o Padre Antonio Vieira esteve no Tacanhonha (atual rio Itacaiunas) principal afluente da margem esquerda do rio Tocantins. Porém, a exploração de maior importância neste rio aconteceu em 1721, qundo foi percorrido desde a cachoeira de Itaboca à foz do rio Araguaia. Outros navegadores a alcançarem a foz do Araguaia em 1669, foram Gonçalo Paes e Manuel Brandão93. Finalmente, em 1724 Bartolomeu Bueno da Silva Filho percorreu todo o rio Tocantins, vindo de Goiás à Belém. Apesar da importância marítima do rio Tocantins para a navegação no vale amazônico, em 1737 o Conselho Ultramarino proibe nele a navegação de curso. A Coroa, temendo o desvio dos metais preciosos do norte através da navegação desse rio, somente em 1781, com a decadência da atividade mineradora, reabriu-o à navegação. Estas medidas atingiram diretamente as atividades de comércio e de resgate do ouro de Goiás e de Cuiabá, e foram 92 Velho sistematizou os fatos da conquista do vale do Tocantins, Velho. O.G., op. cit., pp.1820. 93 Velho, O., op.cit. p.21 41 adotadas com maior rigor pelo governador e Capitão General do Grão-Pará e rio Negro, José de Nápoles Tello de Menezes, no período de 1780 a 1783. Estas medidas buscavam evitar o contrabando de ouro e de mantimentos, assim como de escravos da região de Cametá para as Capitanias vizinhas. Neste período de interdição, o governo do Grão-Pará e Maranhão concebeu projetos de vigilância e proteção das comunicações com as Capitanias de Goiás e Cuiabá, culminando com organizações de nucleamentos abaixo da cidade de Cametá, localizada sobre o rio Tocantins94. No rio Tocantins, à margem esquerda superior e na primeira cachoeira de nome Tapaiunacoara fundou-se o lugar de Alcobaça, com povoadores indígenas, onde estabeleceu-se o forte de Fachina, com o nome de Nossa Senhora de Nazaré95. Com este ponto de fiscalização, os indígenas Timbiras, Carajás, Apinagés, Gaviões, habitantes d'aquellas margens ficaram igualmente sob controle, evitando-se as tentativas de agressão às canoas destinadas ao comércio do governo e de particulares. No baixo Tocantins, os Jesuítas haviam organizado as aldeias de Minas da Natividade e Arraial Grande; Arraial e Minas do Carmo, Minas e Arraia de Portugal; Corixas, Minas e Arraial Grande, Rio Corixas e Arraial e Minas de Amaro Leite96. No entanto, nesta área tentava-se organizar os negócios, e aos comerciantes lhes foi atribuído o papel de promotores de intercâmbios com os moradores das terras mineiras. Para este fim, empreendeu-se a busca de canais e de facilidades de navegação, que permitissem aumentar o trato mercantil. Do ano de 1797, data a fundação do povoado de São João do Araguaia97. No final do século XVII, o rio Tocantins havia sido todo percorrido. A vila de Cametá foi fundada, em 1635, na foz do rio Tocantins, próximo ao delta do rio Amazonas, abundante em cravo, canela, salsaparrilha e, sobretudo, 94 Baena, A.L.M., op. cit., p.231. 95 Idem, p.200. 96 Daniel, J., op. cit., pp:41-49. 97 Baena, A.L.M., op. cit., p.231. 42 cacau que já era cultivado pelos colonos. E, em 1694, começava a surgir acima de Cametá, um aglomerado da atual cidade de Baião 98. 3 - Povoação Colonial: Tocantins mudança na paisagem humana do Vale do Depois do colapso demográfico, a região veio recompor seus quadros de população a partir da metade do século XVIII, em parte com a introdução de escravos da Àfrica, com participação especial da Companhia de Comércio99. A força de trabalho escravo passou a ser o elemento da ocupação econômica de novas terras tropicais do Atlântico brasileiro. A tabela 2 permite visualisar a população da colônia brasileira. A Capitania do Pará, onde localiza-se a região de estudo, representava 3,5% e que, somando com a do Rio Negro totalizava 4,1%. O povoamento colonial mostra situações contrastantes. A maioria das Capitanias regula um tamanho de população semelhante as duas do norte, onde o forte foi encontrar populações abaixo de 60 mil habitantes. No extremo estavam as Capitanias populosas com mais de 215.000 habitantes. Bahia tinha o maior número de habitantes. São Paulo é a única que contava com um tamanho intermediário (116.975 habitantes). Significa que a situação do Pará não era excepicional e reafírmam-se as dificuldades para o repovoamento e a condução desse processo a rítmo lento. Algumas alterações observam-se na passagem para o século XIX (Tableau 3), entretanto, o Pará não registrou alterações enquanto outras Capitanias experimentaram um salto demográfico. Minas Gerais ocupou o primeiro lugar, seguida por Pernambuco em efetivos populacionais. 98 99 Velho, O.G., op. cit., p.19. Dias, M.N., op. cit., pp: 58-60. 43 Quadro 2: Distribuição da população do Brasil, 1776 LOCAL TOTAL PERCENTAGEM Rio Negro 10.386 0,6 Pará 55.315 3,5 Maranhão 47.410 3,0 Piauí 26.410 1,7 239.713 15,4 Paraíba 52,468 3,4 Rio Grande do Norte 23.812 1,5 Ceará 61.408 3,9 Baía 288.848 18,5 Rio de Janeiro 215.678 13,8 Santa Catarina 10.000 0,6 Rio Grande São Pedro 20.309 1,3 São Paulo 116.975 7,5 Minas Gerais 319.769 20,5 Goiás 55.514 3,5 Mato Grosso 20.966 1,3 1.555.200 100,0 Pernambuco TOTAL Fonte: Alden, D., "The population of Brasil in The late eighteenth century: a preliminary survey" Hispanic American Historical Review (HAHR), 43,2 (mayo 1963), pp.173-205 in: Leslie Bethell ed. História de America Latina. 44 Quadro 3 - Distribuição da população do Brasil entre 1797 - 1810 CAPITANIA ANO DE INFORMAÇÂO NUMERO DE % POPULAÇÂO HABITANTES TOTAL FONTE RIO NEGRO/PARÀ 1801 80.000 3,8 A MARANHÂO 1798 78.860 3,8 A PIAUÍ 1799 51.721 2,5 B PERNAMBUCO 1810 391.986 19,0 C PARAÍBA 1810 79.424 3,8 C RIO GRANDE NORTE 1810 49.391 2,4 C CEARÁ 1808 125.764 6,1 D BAHIA 1799 247.000 11,9 E 1803/1810 249.883 12,1 F SANTA CATARINA 1797 23.865 1,2 G RIO GRANDE SUL 1802 38.418 1,8 H SÂO PAULO 1797 158.450 7,5 I MINAS GERAIS 1805 407.004 19,7 J GOIÀS 1804 52.076 2,5 K MATO GROSSO 1800 27.690 1,3 L 2.061.657 99,4 RIO DE JANEIRO TOTAIS Fonte: A. Colin M. MacLahlan, "African slave trade and economic development in Amazonia, 1700-1800", en R. B. Toplin, ed., Slavery and race relations in Latin America, Westport, 1974, p.136. B. F. A. Pereira da Costa, Chronologia histórica do Estado do Piauhy desde os seus primitivos tempos até...1889, Recife, 1909, p.109. C. Carta de lord Strangford al marqués de Wellesley, Rio de Janeiro, 20 de mayo de 1810, PRO, FO 63, 84, ERD, 2.255 (cópia facilitada por el Dr. F. W. O. Morton). D. Luiz Barba Alardo de Menezes, "Memória sobre a capitania do Ceará" (1808), Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (RIHGB), 34 (1871), p.276, cuadro 3. E. Luiz dos Santos Vilhena, Recompilação de noticias soteropolitanas e brasílicas...em XX cartas, ed. Braz do Amaral, 3 vols., Bahía, 1921, vol. II, p.481. F. Los datos para la ciudad de Rio de Janeiro han sido sacados de un censo de 1803, en Strangford a Wellesley, véase C anterior. También está incluida la capitania subordinada de Espirito Santo, pero yo he deducido los datos para Santa Catarina. G. João Alberto de Miranda Ribeira, "Dados estadísticos sôbre...Santa Catarina, 1797", Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro (BNRJ), II-35, 30,3. El censo de 1810 (C) da 31.911. H. "Mappa de todos os habitantes da capitania do Rio Grande de São Pedro do Sul...1802", Arquivo Histórico Ultramarinho (Lisboa), documentos sueltos (miscelánea de documentos) (AHU, PA), Rio Grande do Sul, caja I. Yo he anãdido al total existente 1.697 ninõs menores de un anõ no contabilizados. I. "Mappa geral dos habitantes da capitania de São Paulo no anno de 1797", Arquivo do Estado de São Paulo (DI), Publicação 45 oficial de documentos interessantes para a história e costumes de São Paulo (DI), 31 (1901), pp.151-155, 157. J. A. J. R. Russell-Wood. "Colonial Brazil", en David W. Cohen y Jack P. Greene, eds., Neither Slave nor Free, Baltimore, 1972, p.97. K. Luis Antonio da Silva e Souza, "Memória...de Goiás" (1812), RIHGB, 12 (2a.ed.), 1874, pp.482-494. L. Caetano Pinto de Miranda Monte Negro al vizconde de Anadia, 17 de abril de 1802, RIHGB, 28,1, (1865), pp.125127. in: Leslie Bethell ed. História de America Latina, p.309. 46 A colonização do extremo-norte do Brasil refletiu na entrada do século XIX com os efeitos da política mercantilista executada pelo ministério Pombalino. A mudança do sistema de colonização, que se seguiu à liberdade dos índios e à expulsão dos Jesuítas, tem seu coroamento na lei de 6 de junho de 1755 100. Os centros mais importantes de povoamento situaram-se às margens do rio Tocantins e no delta do rio Amazonas. De antigas aldeias indígenas transformaram-se, no decorrer do século XVIII em Freguezias ou Lugares de Índios101. O vale do Tocantins, de forma segmentada e concentrada, viu aumentar sua população. Batizando as antigas aldeias missionárias com nomes portugueses em substituição aos indígenas, Mendonça Furtado 102 eleva 46 aglomerados humanos à categoria de vilas. Dentre elas, destacam-se no vale do Tocantins as vilas de Acará (1758), Abaetetuba (1758) e Baião (1769)103. A apresentação dos dados censitários do vale do Tocantins permitem avançar várias hipóteses sobre o povoamento. 1) O povoamento avança sobre a superfície incorporada a sistemas agrários diversificados: plantation ( cana-de-açúcar em Igarapé-Miri e cacau em Cametá). Quadro 4: População do Vale do Tocantins, 1823 Localisation Esclaves Indiens Total 1.382 ---- 9.450 Baião 450 ---- 1.950 Acará 1.437 ---- 2.976 Moju 1.728 ---- 3.157 Igarapé-Miri 1.839 ---- 3.573 Abaetetuba 1.639 ---- 4.064 Barcarena 365 ---- 837 Conde ---- 271 400 Beja ---- 886 886 Cametá 100 Daniel, J. op. cit. 101 ver glossário. 102 DIAS, M.N., op. cit., p.77. 103 Idem, pp.79-81. 47 Fonte: BAENA, A.L.M., Ensaio Corográfico sobre a Provincia do Pará, 1829. pp: 282-371. 2) Houve perdas de populações indígenas, seja por descaracterização censitária, seja pelas observações dos índios localizados nos denominados Lugares de Índios para as Freguezias. No período 1765-1769 pode-se diferenciar dois tipos de sistemas agrários integrados ou não ao mercado. As unidades camponesas tinham dois tipos de inserção. As vilas de Mojú e Acará representam forma integrada ao mercado, ao contrário das vilas de Beja e Irituia que se apresentam menos integradas. A agricultura indígena, encontrada nos Lugares de Índios, apresenta-se com tendências a dominação do mercado. Quadro 5 - Mapa da população do Vale do Tocantins segundo os "Roes dos Confessados" em 1765 IGREJAS, PAROQUIAS, FREGUEZIAS E POVOAÇÕES NUMERO DE HABITANTES Adultos - Menores Acará 352 200 Moju 204 4 Igarapé- Miri 108 - Abaetetuba 191 12 4.180 551 Beja 157 62 Conde 317 60 ..................... ..................... Cametá Total da População do Gão-Pará 24.150 3.986 Fonte: A.H.V - C.P.n.27 (1765); A.P.P. - CM.códice n° 954. Estatística da População (1765 1769). Quadro 6 - Estado do Pará e Maranhão: número de Oficiais e índios em serviço (1775 - 1777) FREGUEZIAS TOTAL 1°/07/1775 oficiais 1°/07/1776 TOTAL oficiais indios indios 1°/07/1777 oficiais indios TOTAL Conde 77 4 73 75 6 69 62 7 58 Beja 24 7 17 77 6 71 59 7 52 Barcarena -- - -- 15 2 13 13 2 11 Bayão -- - -- 9 1 8 24 1 23 .... ..... ..... ... .... ...... ................. ..... ..... ...... 48 Total Grão-Pará 3.020 122 2.898 2.618 124 2.494 3.069 150 Fonte: A.P.P. - C.M. Códice n. 956. Estatisticas da População (1775, 1776 e 1777). Vários desses povoados têm a definição de Lugar de Índio, que constituíam resquícios dos antigos aldeamentos. As Freguezias de brancos indicam a concentração dos colonos, descendentes, inclusive escravos e índios sob sua dominação. Os quatro Lugares de Índios do vale do Tocantins experimentaram perda de população conforme depreende-se dos dados da tabela 6. Essa oscilação ocorria pelas transformações mas, em geral, os Lugares de Índios decrescem até o final do Diretório do Índio em 1758. 2.919 49 4 - Sistemas Agrários do Vale do Tocantins A sinalização da ruptura provocada pela colonização fez das terras do vale do Tocantins zonas de extração intensiva com a busca da canela, utilizando os indígenas submetidos ao regime escravista ou de aldeamento. A economia extrativa experimenta uma certa transição para a agricultura. O vale desponta como as terras para os ensaios de agricultura do cacau, em substituição à destinação de extensões em cana de açucar. A produção agrícola de exportação com base no cacau convive com a agricultura de elementos que mantiveram posições oscilantes, entre expansão e retraimento, sobretudo na segunda metade do século XVIII e início do XIX (quadros pp:8185). Após a queda do cacau, recompõe-se uma agricultura familiar estacionáaria. Da fase do cacau retem-se o aumento da população escrava de origem africana, como observou-se em Cametá, e do seu declínio, a estagnação desse crescimento no século XIX. O curso do rio Tocantins foi reconhecido como o reino da canella e do cravo explorados de forma intensiva desde os fins do século XVII. Em 1684 recomendava-se o plantio nas abas das povoações árvores de canella e cravo da mesma qualidade descoberta neste afluente em 1969, esgotada em 104 algumas dezenas de anos pelo tipo de corte . Em documento de 24 de novembro de 1686 pedia-se diligência para a sua existência no Tocantins105. O que aconteceu com a canela revela a pressão do mercado e os efeitos depredadores da exploração. Debates sobre esta espécie, datados de 1587 106 e 1696107, refletem as dificuldades que remontam à origem da canela expressas em documentos opostos, tais como: e dá outras árvores que dão canella, se for à terra quem a saiba beneficiar será como a de Ceilão", ao mesmo tempo que o francês Labat reflete na possibilidade de aclimatração da 104 Baena, A.L.M., op. cit., p.105. 105 Rodrigues Ferreira, A., Viagem Filosófica no Rio Negro. MPEG:CNPq, Belém, 1971, p.113. 106 "Os Portugueses do Século XVI e a História Natural do Brasil", in: 1926, op. cit., p.114. 107 Idem, p.115. Revista de História, 50 canela: " on sait que les portugais ont un grand nombre de caneliers au Brésil, soit qu'ils en ayent apporté l'espèce avec eux quand ils furent obligez d'abandonner l'Isle de Ceylan. O desconhecimento da existência de espécies diferentes da caneleira gerou esse tipo de discussão. No Brasil, desde a primeira metade do século XVI, a canela já era conhecida, enquanto no Ceilão só foi identificada no período de 1765- 1770108. Encontra-se em Carta de Padre Vieira escrita em 27 de dezembro de 1672 109, um enorme preâmbulo para justificar os interesses concorrentes entre portugueses e holandeses, para Duarte Ribeiro de Macedo sobre as Relações Diplomáticas de Portugal com a França: mais depressa nos darão os Hollandezes uma das melhores praças de Hollanda, que Ceilão, e muito menos Ceilão e Cochim, que vem a ser dar-nos a pimenta e canela que são as principais drogas do seu comércio. As drogas do sertão passaram a ser a fonte de poder do Reino Português. Rodrigues Ferreira explicitava esse sustentáculo econômico de Portugal: as drogas do certão são para o Estado do Pará, o mesmo que as minas tem sido para Portugal, ao mesmo tempo, em que desencadeia a discussão da necessidade da racionalidade no processo da exploração dos produtos extrativos. O naturalista narra a falta de cuidados com a extração da salsa que era tirada ficando a mamaiapoca110 disposta na terra sem condições de reprodução, ao mesmo tempo em que o cravo era arrancado das árvores sem maturação impedindo a sua multiplicação. O exemplo da comercialização do cravo, serve, também, para desestimular o extrativismo em 1769: 9$60 réis se vendera o cravo de uma feitoria de seis meses que só não fez o negocio que projectava, mais ainda em cima, ajustadas as contas das despezas, que fizeram no espaço de 6 a 7 meses, a dízima, a quinta do cabo, a sexta do diretor, não veio a caber a cada índio o 108 Ibdem, p.116. 109 Fondation Caloustre Goulbenkian, Quadro Elementar das Relações Políticas e Diplomáticas de Portugal com as diversas Potências do Mundo, T. IV, Parte II, Pariz, MDCCCXLIV, p.102. 110 ver Glossário. 51 importe de 1$200 réis por mês...Ainda que tarde, entenderão finalmente estas máximas os moradores das villas de Cametá e de Óbidos111. Em seguida a várias argumentações desta natureza, foi elaborado alvará em 22 de março de 1688 onde o rei, através do Governador e Capitão General do Estado, Sr. Gomes Freire de Andrade, proibia a extração da casca do pau cravo por 10 anos nas imediações dos rios Capim e Tocantins112. A colheita de 85.000 arrobas de cacau de cultivo vendida ao preço de 1$500 réis a arroba113 em 1783, reforça a discussão da agricultura das drogas do sertão. O sucesso de um fazendeiro de cacau 114 de Cametá incentivou o plantio e a regulamentação desse tipo de agricultura. O efeito demonstrativo é assim utilizado: tivessem posto em practica, estarião hoje as povoações na opulência, em que esta a villa de Cametá, colhendo na sua mesma casa aquelle abundante genero, que tanto aproveita aos seus lavradores, e que tanto custa aos pobres índios, que os vão buscar ao certão com tanto deterimento das suas famílias, e as vezes com muito pouco lucro da sua negociação115. Parte desse incentivo, que resultou em plantio de cacau, e parte da coleta do sertão contribuiem para uma fase próspera do Pará. Ferreira fez a trajetoria dos primeiros anos, escreveu: tirou-o o Estado no ano de 1784, vindos a acontecer n'elle um phenomeno, que se não póde explicar de outro modo. Porque tendo sido insignificante a colheita do cacao do certão, foi por outra parte significantissima a sua exportação, subindo ella ao mappas da exportação desde seis anno de 1730 por diante. O mais que se tinha feito desde então até agora sabem todos, que forão 85.000 arrobas no anno de 111 Rodrigues Ferreira, A., op. cit., p. 128. 112 Idem. p.127. 113 Vergolino-Henry, A. & Figueredo, A.N.. A presença Africana na Amazônia Colonial: Uma notícia histórica, Pará, 1990, p:93. 114 Idem, p: 94. 115 Rodrigues Ferreira, A., op. cit., p.122. 52 1747. Os preços foram caindo 4$800, 4$200, 4$000, 3$600, 2$500, 2$400, 1$600, 1$500, 1$300, 1$200, 1$000 e 960 réis 116. Dauril117 estudou a economia do cacau e elaborou as curvas do produto, situando a queda do preço e da produção às vésperas da Independência. 116 Idem, p. 122. 117 Alden, D., O Significado da Produção de Cacau na Região Amazônica. Belém. UFPa. 1974. 53 Quadro 7: O Cacau como uma percentagem das exportações totais do Pará no período de 1776 - 1822 (em réis) Exportações Ano Totais 1776 156.231.475 1777 131.061.955 1796 330.464.055 1797 255.506.350 1798 381.320.280 1799 565.109.863 1800 598.504.930 1801 279.056.983 1802 417.127.689 1804 478.378.124 1805 623.312.420 1806 752.708.741 1822 560.499.070 Média -- Cacau 87.473.250 87.771.100 100.563.485 155.996.400 207.607.400 269.766.400 305.234.400 122.502.500 167.519.637 188.573.875 299.213.550 508.980.000 310.586.160 -- Percentagem Cacau 55 66 30 61 54 47 50 43 40 39 48 67 55 50,39 Fonte: Alden,D., O Significado da Produção de Cacau na Região Amazônica. Belém. UFPa. 1974. p.56. Daí para adiante, o fomento à agricultura das drogas do sertão foi se tornando menos rotineiro. Em carta de 20 de agosto de 1681 encarregava-se Fernando Rammes a fomentar a cultura da baunilha (tableau 8) também no rio Tocantins. A salsaparrilha, insistiam na sua colheita, cujo dízimo dos direitos já em 1709 alcançara do arremate o preço de 180$000 réis. O anil, em 21 de março de 1688, teve mandato do rei para que se organizasse uma fábrica em Cametá por haver muita herva de anil. Finalmente foi instalada uma fábrica no sítio de Simão Borges Fernandes, no rio dos Tocantins, em 1728 118 . 118 Rodrigues Ferreira, A., op. cit., p. 81. 54 Quadro 8: Produção de Baunilha no Pará no ano de 1759 Ano Arráteis Total 1759 6,5 5$780 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.235. Quadro 9: Produção de Salsaparrilha no Pará: período 1759-1842 Anos Arrobas Total 1759 100 385$414 1760 531 4.090$761 1761 3.515 21.706$936 1762 804 3.394$346 1763 773 3.757$084 1764 607 3.248$756 1770 1.786 8.801$805 1771 53 265$570 1772 1.439 7.026$425 1773 390 3.151$026 1774 1.372 10.864$324 1775 996 7.871$339 1776 1.408 10.910$380 1777 2.835 21.261$336 1778 1.469 11.571$731 1779 1.702 18.897$857 1780 790 9.060$259 1781 1.272 14.923$680 1782 475 5.418$847 1783 1.969 21.236$429 1842 1.550 19.732$062 Parcial 7.758 89.269$134 Total 25.836 207.576$367 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988, p.242. 55 Quadro 10: Produção de Anil no Pará: período 1775-1779 Anos Arrobas Arretéis Total 1775 -- 18,5 30$428 1776 -- 14,5 23$786 20 19$515 16,5 107$501 1777 -- 1778 2 1779 5 Soma 2 74,5 6$928 188$158 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.234. Em 28 de junho de 1776, Marcos Joseph Monteiro de Carvalho baixou as primeiras instruções para a agricultura no Estado do Pará, coincidindo com a suspensão da remessa de puxuri e baunilha que há tempo não tinha extração estando em decadência comercial, juntamente com o cravo fino e grosso 119. 119 Rodrigues Ferreira, A., op. cit., p. 162. 56 Quadro 11: Produção de Cravo Fino no Pará: período 1758-1848 Anos Arrobas Total 1758 103 560$401 1759 2.755 12.500$609 1760 323 2.302$555 1761 1.827 13.981$313 1762 461 3.189$756 1762 436 3.200$857 1764 143 1.157$780 1770 691 5.114$647 1771 1.411 10.610$358 1772 2.071 15.266$588 1773 1.400 11.323$973 1774 2.225 16.497$916 1775 3.839 28.413$979 1776 700 5.081$924 1777 800 3.996$740 1778 53 319$304 1779 25 210$902 1780 539 4.634$363 1781 522 4.461$402 1782 275 2.302$947 1783 450 3.516$525 1784 252 1.551$600 1848 1.245 14.141$214 ......... ........ Total 22.546 .................. 164.337$653 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.238. 57 Quadro 12: Produção de Cravo Grosso no Pará: período 1758-1788 Anos Arrobas Total 1758 3 9$600 1759 1.814 5.632$806 1760 57 523$832 1761 4.517 21.516$925 1762 1.073 4.601$964 1763 791 3.597$719 1764 769 3.849$999 1770 3.529 14.283$749 1771 337 1.337$661 1772 1.365 5.331$853 1773 870 3.505$111 1774 280 1.107$167 1775 897 3.540$918 1776 605 2.345$593 1777 105 318$487 1778 6 14$711 1779 57 234$282 1780 538 2.312$681 1781 89 381$931 1782 229 1.516$769 1783 249 1.561$923 1784 159 1.110$204 1788 110 594$008 ......... ....... Total 18.449 ............... 79.229$893 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.239. 58 Os dados até agora recolhidos nesta pesquisa não permitem distinguir as cifras da produção extrativa e agrícola do vale do Tocantins. Identificou-se uma fonte secundária indicando a participação dos índios, deste extraímos os dados sobre o rendimento do cacau registrado na Tesouraria do Comércio dos Índios, que apresentou 0,3% do total. Quadro 13: Rendimento do Cacau da Tesouraria do Comércio dos Indios(1764) Localidade Cacau Arrôba Beja 1 Conde 226 Barcarena 2 .................. ......... Total da Capitania do Grão-Pará 6.968(*) Fonte: Cf. Carta de Fernando da Costa de Ataíde Teive a Mendonça Furtado, data do Pará a 18 de abril de 1765 (A.N.R.J. - C.G.C.,1764-1765) in: Reis, p.110. Segundo Nunes, no ano seguinte, em 1765, a produção cacaueira dos índios subiu a 10.158 arrobas. A arroba era negociada a 1$500 réis proveniente não só do cacau mas, ainda, dos demais produtos agrícolas, extrativos e industriais como a salsaparrilha, a estopa do mato, o tabaco, o óleo de copaíba, o algodão, o milho, o feijão, a manteiga de tartaruga, o azeite de andiroba, telhas e louça. 59 5 - AQUISIÇÕES AGRÍCOLAS E NOVOS SISTEMAS AGRÁRIOS NO VALE AMAZÔNICO No século XIX, a divisão geral da história da agricultura, distinguia, do ponto de vista econômico, dois períodos. O primeiro da agricultura doméstica, ou das atividades para consumo e o novo período, da agricultura industrial sintetizada na busca de produtos agrícolas para vender 120. Esta segunda motivação ou objetivo estabelece bem o contexto em que se desenvolveu a agricultura concebida pelos colonizadores para as terras americanas, e que nesta fase articula o eixo da organização da economia mercantil. Integrando uma visão contemporânea do que seja a agricultura, conforme escreveu Bertrand, pode-se interpretar que a agricultura não é somente uma ruptura do ecossistema121 natural, mas ela é também uma virada da produção natural com fins exteriores ao funcionamento do ecossistema. As intervenções nos ecossistemas do vale amazônico, durante os primeiros séculos da conquista, significam a implantação de tipos particulares e novos de agrossistemas122. Esta apreensão ajuda a destacar, provisoriamente, duas observações. Primeiro: considerar que nos ecossistemas naturais explorados pelos grupos indígenas realizaram-se rupturas, mas que estes desenvolvem-se conforme um cheminement circular que tenderia ao equilíbrio. Segundo, verificar e elaborar hipóteses, sobre as situações de desequilíbrio e quais seriam suas evidências por marcas na paisagem (grandes desmatamentos, erosão, sistemas de irrigação). 120 Segundo definição do Grand Dictionaire Universel du XIXéme siècle. Pierre Larousse, Tome I. p.142, Paris, 1866 121 Écosystème como "une entité ou unité naturelle que inclut les parties vivants pour produire um système stable dans lequel les échanges entre les deux parties s'inscrivent, dans des cheminements circularies (E.P.Odum, 1958); ou comme "la représentation globale et énergétique d'une parte des réseaux d'êtres vivants entre eux, d'autre part des relations entre ces êtres vivants et leur environnement matériel". in:BERTRAND. G."L'impossible tableau géographique", en Duby. G. y A. Wallon (eds.). Histoire de la França Rurale. PUB. Paris. Tomo I. p. 122 Agrosystèmes sont les écosystèmes naturels désorganisés dont la base alimentaire est essentiellement constituée par les cultures; la lutte contre les "nuisibles" est donc un aspect de la dynamique permanente de l'agrosystème. in: BERTRAND. G. op.cit. p. 60 A Arqueologia, a Etnobotânica, a Geografia e outras ciências que se interessam pelas relações de sustentabilidade do homem (CSH) 123 num ambiente, indicam que os ecossistemas da Amazônia, em especial as várzeas, foram favoráveis aos aumentos de população com equilíbrio. Dai que a noção de agrossistema e a manutenção de equilíbrio sejam importantes para avançar nessa discussão. A ruptura no ecossistema, que advêm da busca de produtos para o mercado, produziu mudanças nos ecossistemas e sobretudo gerou desequilíbrios. O interesse está em conferir quais os agrossistemas que se desenvolveram e a capacidade e as formas de desequilíbrio (ou condições de equilíbrio) que se apresentam, o que parte da interpretação de alguns elementos dos modelos de agrossistemas. Assim, afirma-se que no período da colonização os ecossistemas naturais experimentaram mudanças. Estas têm uma intensidade maior e sobretudo respondem por móveis diferentes (o comércio); que produzem rupturas, com efeitos desequilibradores, muito facilmente identificáveis. A exemplo dos efeitos predatórios sobre a flora e a fauna. Nesse ponto pode-se utilizar a noção de desorganização, que Bertrand emprega na conceitualização de agrossistema. Escreve ele que os agrossistemas são os ecossistemas naturais desorganizados nos quais a base alimentar é essencialmente constituída por cultivos . Os diversos grupos índigenas desenvolveram atividades na procura de complementos para sua base alimentícia onde foi priorizado o cultivo da mandioca. Mas a questão esta em distinguir os níveis de desorganização sobre o ecossistema produzido por essa necessidade de ampliação da base alimentícia. Como as roças dos índios afetaram os ecossistemas? A complexidade maior da implantação dos agrossistemas inicia-se na fase da colonização. O quadro 20 identifica atividades dos diferentes agrossistemas. Estes se caracterizam pela intensidade de cultivos ou atividades (extração, coleta, pecuária) e pelo impacto sobre o ecossistema natural. A maior desorganização significou maior desequilibrio, ao igual que a homogeinização 123 Fearnside estuda a capacidade de suporte humano (C.S.H) através de um modelo onde avalia e estima a capacidade de suporte em parte da área da rodovia Transamazônica. apud. in: Apontamentos para uma reflexão população emeio ambiente no contexto amazônico p.51 61 do biotipo gerou numa série de efeitos, entre eles perda de biodiversidade, empobrecimento do ecossistema, com repercurssões na população ( mudanças na dieta, dispêndio de energia). A questão é o nexo dessas mudanças nos agrossistemas coloniais com a base alimentícia. A produção de cana-de-açúcar e cacau tem outra destinação e serviu de base alimentícia para os consumidores europeus. Tableau 22 - Síntese dos agrossistemas na Amazônia colonial poliatividade dominante .agricultura organizado por indígenas "bravos"/não aldeados .pesca .caça .coleta organizado por europeu I "aldeados" (missões) grupos de indios aldeados em situação de dependência .redução da poliatividade .extrativismo .agricultura .pesca .caça organizado por europeu II agroextrativo a)plantations b)formações camponesas agroflorestal .formas camponesas pastoril .extensivo e dominante Na época colonial, a utilização da floresta foi marcada por três formas diferentes de manejo124 dos recursos naturais; a dos índios não aldeados, dos índios aldeados e dos colonos europeus. Os índios não aldeados tinham um modo particular de cultivar a terra: limpavam-na por baixo125, maceravam o mato, faziam circunferências nos 124 Anderson considera o manejo como as manipulações conscientes dos ecossistemas, que visam o aproveitamento futuro de recursos bióticos renováveis, naturais ou introduzidos, num determinado local, apud. in: Apontamentos para uma reflexão: população e meio ambiente no contexto amazônico, p.219. 125 Desbaste é a prática de limpeza dos sub-bosques, onde a vegetação é fina 62 troncos das grandes árvores para empatar a circulação da seiva bruta e elaborada, decorrendo a eliminação da árvore; esperavam secar para atear fogo. Escreve João Daniel Eles não derrubam; desbastam o mato fino, riscam as árvores para evitar a circulação das seivas vitais e esperam secar. Põem fogo e plantam. Afirma que esse sistema evita a coivara, operação demorada e trabalhosa que aumenta o tempo de trabalho no outro sistema. Quando caíam as primeiras chuvas, plantavam a mandioca 126 pelo método de estaquia127. A não utilização de instrumentos de ferro ou outras ferramentas, sendo o machado de pedras sua única ferramenta, ajudava na manutenção do equilibrio ambiental. A sua organização social transparecia nas práticas agrícolas, orientadas para o trabalho coletivo. Os índios aldeados não faziam o desbaste, derrubando toda a vegetação, que incluía árvores de grandes diâmetros. Consequentemente, a densidade causada pelos grandes troncos de ávores impedia que o material fosse todo carbonizado, levando-os à prática do encoivaramento128. Isto ressalta a diferença no calendário agrícola, dos índios aldeados ou não, levando os índios das missões a despreender até 7 meses entre as operações da derruba e do plantio. Ao contrário dos índios não aldeados, que esperavam no máximo 4 meses. Apesar dos índios do vale amazônico utilizarem-se dos gêneros da floresta na ocasião da chegada dos colonizadores, e terem uma agricultura própria, existia uma diferenciação acentuada entre a cultura alimentar e as práticas agrícolas das diferentes Nações indígenas deste vale129. As práticas agroflorestais dos índios do rio Solimões, localizados entre a boca do rio Negro até o rio Javari, limite do territorio de Castela ( Maina); e os índios do território português (Cambebas)130, retratam aspectos diferenciais em 126 ver apêndice 127 estaquia é uma forma de propagação vegetativa onde se utiliza as próprias estacas da mandioca 128 coivara é um processo de aceiro feito com parte do vegetal derrubado, não seco, que impede o alastramento do fogo 129 A sintese dessas experiências é importante para o corpo deste estudo, entretanto, é propósito no prosseguimento da pesquisa. 130 Daniel,J. op.cit.p.13 63 relação aos demais indios amazônicos. Estes não se utilizavam de roças de mandioca na mata ou de outros cultivos. Sua base alimentar estava nas frutas e raízes que comiam assadas, cozidas ou cruas. As mais apreciadas eram as pacovãs (banana da terra), batatas e jeticas (casta de batatas vermelhas) e a macaxeira131. Praticavam a agricultura nas margens e praias dos rios e lagos utilizando a fertilidade natural de colmatagem 132 da vazante do rio Amazonas. Armazenavam as colheitas em celeiros construídos na terra ou areia, onde as conservavam muitos meses, sendo utilizadas na medida da necessidade, quando comiam os tubérculos e raízes. Tendo como suporte maior a floresta, o sistemas agrário dos índios aldeados era norteado pelo cultivo da mandioca, modelizando, até hoje, o gênero agrícola mais expandido no vale amazônico. Plantavam em consórcios onde a mandioca era o componente agrícola juntamente com o cacau, gênero extrativo do sistema de produção. O conjunto oferecia recursos necessários para uma dieta alimentar equilibrada, complementados com as frutas 133 tropicais , a caça e a pesca. Os colonos seguiam as práticas dos índios das missões e introduziram o ferro e outros instrumentos aptos para cortar e debastar as matas. Com as foices cortavam as ramagens finas e com os machados de ferro cortavam todo o árvoredo. Usavam para o corte dos paus delgados golpes de machado; para os de maior diâmetro, tinham um método de derrubada sui generis, que praticavam a partir dos cortes das árvores mais finas, em linhas paralelas aos mais grossos, os quais fazendo pressão e peso sobre as grandes árvores, diminuiam sua resistência até o seu tombamento. Em seguida, como os demais índios, esperavam o material secar para atear o fogo pelas bordas dos roçados seguindo a orientação do vento, que fazia com que a vegetação permanecesse queimando por mais de um mês. O que não era carbonizado, encoivarava-se para nova queimada. Geralmente o material derrubado estava seco entre o segundo e o terceiro mês. 131 A macaxeira é uma variedade de mandioca de ciclo vegetativo variando entre 7 e 8 meses, pouco exigente aceitando terras úmidas e, não necessariamente, de mata. Daniel, J. op. cit. 132 colmatagem é o processo de fertilização das terras banhadas pelas águas limosas dos rios do estuário amazônico. 133 cupuaçu, bacuri, abacaxi, pacovãs (ver apêndice) 64 Desta forma, indiferentes às práticas agrícolas anteriores dos indigenas, os sistemas agrários localizados nas margens férteis dos rios foram se modificando, surgindo agrossistemas de acordo com a demanda dos produtos que fazia o grosso comércio dos portugueses134. Com as varas da maniva135 para plantio, cortadas no comprimento de 2 palmos, que proporcionavam 3 gêmulas, faziam a roça enterrando a maniva em covas rasas, cheias de cinzas do material lenhoso carbonizado. O instrumento para abrir as covas era um pau agudo utilizado pelos índios não aldeados, ou a tacira136 pelos índios aldeados e portugueses. Bastava duas a três varas por cova, de forma inclinada, a qual brotava facilmente o tubérculo confirmando o adágio planta-me no pó, e não tenhas de mim dó137. A agricultura indígena diversificou-se, embora não estivesse generalizada. João Daniel afirma que os índios Purus não praticavam nenhuma agricultura, pois alimentam-se exclusivamente de frutas, principalmente do cacau 138. A descrição da região do rio Madeira resulta da importância do cacau, então conhecido como o paiol do cacau, diferentemente das plantas encontradas no rio Solimões e seus colaterais, normalmente aneiros, causando a inquitação dos feitores, que faziam as feitorias nos rios onde existia a sazonalidade, no intuito de evitar a ferocidade dos índios Muras e os gastos de deslocamento. A preferência era a boca do Amazonas, muito perto da cidade do Pará, onde era possível fazer grandes carregamentos de cacau, abundante nas grandes ilhas do delta amazônico. A nação Mura, que também possuía uma dieta alimentar próxima dos indígenas do Purus, no entanto, praticava a caça e a pesca 139. Os demais índios do vale amazônico tinham nas roças de mandioca, para a farinha de pão, o emprego maior de sua força produtiva. 134 resinas e gomas para a indútria; tartaruga para a farmacopéia. e óleo de copaiba, azeite de andiroba, manteiga de 135 vara de maniva é o material para a propagação vegetativa 136 tacira:instrumento ponteagudo de ferro 137 Daniel, J. op.cit.p.13 138 idem 139 ibdem 65 Com a chegada dos jesuítas e a organização das missões, a coivara passou a ser uma prática dos índios aldeados, sendo um divisor entre o modo de produção antes e depois de os colonizadores se instalarem no vale. A historiografia narra que antes de 1549, os portugueses já haviam introduzido plantas e animais úteis do Velho Mundo nas Novas Terras, continuando-se esta difusão entre as colônias, nos séculos XVI e XVII. As frutas exóticas cultivadas, vindas da Europa, foram jambo, tamarindo, figo, lima, limão doce, abóbora, melancia, melão, pepino, beringela e tomate. O côco e a ata vieram da Asia. O amendoim e o feijão chegaram ao Brasil entre 1578 e 1585. As laranjeiras, que chegaram na primeira metade do seculo XVI, vieram da China; os animais como bois, vacas e cavalos vieram de Cabo Verde e as ovelhas, cabras e galinhas de Portugal140. Para 1574141, encontra-se uma descrição da flora que fala da mandioca e da macaxeira como plantas índigenas, juntamente com as sapucaias, ananases, cajueiros e batata doce142. Estas e outras espécies , somadas a gêneros como cacau, cravo, salsaparilha, canela e madeiras, compunham a flora do biotipo Amazônico quando os portugueses se voltaram para o extremo norte da colônia. Os colonizadores portugueses, que se influenciaram pelos gêneros da floresta, conhecidos como as drogas do sertão, foram os precursores da modificação dos sistemas agrários índigenas, quando propuseram uma agricultura 143 baseada no plantio dos gêneros nativos do vale e igualmente quando impuseram a coleta de gêneros extrativos de forma exaustiva. Os europeus, que possuiam recursos humanos, administraram a força de trabalho dividindo-a em dois grupos, mantendo os indios ocupados na 140 Rodrigues Ferreira, A. op.cit. pp.701-724 141 Pedro de Magalhães Gondavo,apud. in: Cezar Ferreira, A. Ocidente, Revista Portuguesa mensal,vol.LX,1961.jan/junho, p. 142 143 ver apêndice L'agriculture est non seulement une rupture de l'ecosystème naturel, mais elle aussi une détournement de la production naturelle à des fins extérieures au fonctionnement de l'écosystème. Elle met en place un écosystème de type particulier que l'on peu qualifier d'agrosystème. in:BERTRAND. G. op. cit., p. 66 agricultura ou em serviços de construção de canoas 144, de pescarias, de salgas e de colheitas dos produtos da floresta. No começo, a economia era baseada nas feitorias, operações mercantis que duravam entre 6 a 8 meses, extraindo produtos na floresta com garantia no mercado internacional. Os mais procurados eram o cacau, a canela, a salsaparrilha e o cravo. Mesmo com a alta rentabilidade das feitorias, acreditavam que ao invés de prepararem frotas de custos elevados para a extração das drogas do sertão poderiam desenvolver sistemas baseados nos produtos extrativistas, onde o custo de produção seria menor. Isto 145 corresponde a um período do calendário agro-extrativo quando preparavam provimentos de bretanhas, chapéus, panos da terra (de algodão grosso), ferramentas, farinhas, águas ardentes, somando custos a aproximadamente 300$000146. Saíam em novembro, e, algumas que pretendiam outros gêneros como manteiga de tartaruga e peixes para salga, saíam em setembro, quando começava a desova das tartarugas. Incorporam-se no século XVIII, no discurso do governo português as interrogações sobre quando? como? por que? ao reconhecer o processo que se instalara de depredação de espécies nativas. O anil e a canela, produtos que participavam e faziam frente ao comércio do Oriente 147, foram os primeiros a se extinguirem. A força de trabalho índigena representava 95% dos custos das expedições de coleta, pois eram além de remadores das canoas, coletores dos gêneros do sertão. O índio recebia duas varas de pano grosso de algodão/mês, levando por feitoria 12 varas de algodão; 2 a 3 varas de bretanha para camisas; 144 Canoas inteiriças medindo 100 palmos, proporcionais à largura e capacidade de acima de 3 mil arrobas. Construiam diferentes tipos, tendo os índios não aldeados preferência por pequenas e ligeiras, de formato de casca de noz. Fabricavam sem a utilização de equipamentos de ferro. As Ibás eram mais fortes e possantes, feitas de troncos de paus e com toda uma técnica onde o ferro estava presente e era muito utilizada pelos mineiros e pelos feitores responsáveis pelos carregamentos das "drogas do sertão". Finalmente os burgantins, preferidos pelos portugueses, que apresentavam porte variável, in, Daniel, J. op.cit. 145 Esse calendário resulta de uma combinação de produtos (extrativos, agrícolas) com a pesca e a caça. Desenvolve-se o controle do colonizador das atividades desenvolvidas ao longo do ano. 146 Daniel, J. op.cit. 147 Rodrigues Ferreira, op.cit. 67 calções de baeta; um barrete e um prato de sal com 6 agulhas em cima. Os jacumaíbas, que eram os pilotos e responsáveis pelas canoas e que possuíam uma hierarquia superior, ganhavam 3 varas de pano grosso e um corte de ruão para as saias de suas mulheres. Cada índio tinha um enxoval constituído de chapéu, barrete, remo, arco, flecha, maquira, balaio para guardar calções, novelo de linhas, agulha e uma cabacinha de jequitáia ou malagueta moída 148. Decidiram os portugueses que seria oportuno o remanejamento desta mão-deobra para os plantios, nos seus estabelecimentos. Em substituição às canoas do sertão, trabalhariam na agricultura para plantios de café, cacau, salsa, cravo, canela, baunilha e algodão. O cálculo era de que 15 índios em 15 dias preparariam 800 braças em quadras, representando custos inferiores às canoas do sertão que, com seus gastos de viagem e incertezas dos lucros, possuiam grandes inconvenientes149. Com isto, os escravos de origem africana ficariam liberados para semear produtos da Europa, como o trigo, o milho, o tabaco e o algodão. Evitar-se-ia mudar o lugar das roças, anualmente, tornando estáveis as terras. O aproveitamento da fertilidade e das matas do rio Amazonas seria assim otimizado na visão colonial. A questão da pressão da população sobre os recursos aparece em poucos momentos na historia regional. Normalmente os estudos são voltados para a compreensão da dinâmica de interrelações dos ecossistemas encontrados. Quando trata-se da agricultura itinerante desenvolvida por meio dos pousios, o enfoque é para a fraqueza dos solos, argumentação que não avança muito, restringindo-se a reconhecê-la como uma prática viável somente com baixos níveis de concentração populacional150. Os antropólogos151, que vêm estudando as culturas índigenas tem levantado uma considerável quantidade de informações sobre conhecimento que as tribos possuem, tais como os sistemas de classificação e manejo dos recursos e as estratégias de sobrevivência consolidadas e aperfeiçoadas ao longo de 148 Daniel J. op.cit. 149 idem 150 Alvim e Subart. consideram o manejo como as manipulações conscientes dos ecossistemas, que visam o aproveitamento futuro de recursos bióticos renováveis, naturais ou introduzidos, num determinado local, apud. in: Apontamentos para uma reflexão: população emeio ambiente no contexto amazônico , p.133 e p.199 151 Roosevelt, in, Cunha, M. op.cit 68 um vasto período. Quanto às informações demográficas sobre estes povos, no que se refere a análises sobre a relação população/recursos, apenas começam a ser reveladas. Na ilha do Marajó, introduziram-se animais (gado vaccum e cavalar) criados de forma extensiva. Prescindia-se de sistemas de manejo por ser dispendioso, pois o gado facilmente se criava e se reproduzia em campinas ou terras de pastagens naturais, permitindo a formação de grandes rebanhos, acima de 1000 cabeças. O maior investimento destes criatórios, na época colonial, estava na construção de, no mínimo, quatro currais por estabelecimento, utilizados para recolher o leite para consumo e aleitamento do bezerro . Esta vaquejada era feita duas vezes por semana, enquanto as ferras e castração eram feitas no verão, nos meses de julho a setembro. A expansão da pecuária na Ilha está associada ao surgimento de novos criadores, muitos dos quais antigos vaqueiros que recebiam as quartas partes do nascimento do rebanho. O sistema pastoril no Marajó, experimentado desde a época colonial, ainda gera polêmica em termos econômicos e técnicos. De sistemas de coiçara152 restaram criatórios extensivos do gado zebu e do búfalo. De habitat natural de cacau, baunhilha, bálsamo de umeri, cravo, canela, salsaparrilha, componentes florestais do sistema proposto, restam roças de mandioca. O projeto econômico português acabou comprometendo a regeneração dos recursos da floresta. Isto permite levantar a hipótese de que a introdução de práticas e métodos agrícolas, empregados à revelia dos componentes do clima e solo, aliado a um distanciamento cultural dos povos indígenas, contribuiu para o fracasso da agricultura no vale amazônico153. Os novos produtos com novos métodos tiveram por base a introdução de uma agricultura nos moldes europeus e no trabalho indígena e do africano. A formulação de sistemas de manejo dos recursos florestais da região absorveram apenas algumas práticas indígenas; entretanto, por serem 152 Coiçara era um sistema de rotação de culturas nas áreas de pastos; divisáo de pastagens, in: Daniel, J. op.cit. 153 Está suficientemente demonstrado que implementos como o arado contribuiam para a compactação dos solos da Amazônia 69 extremamente ricas, muitas acabaram não sendo assimiladas pelos novos habitantes da Amazônia. Estas modificações dos ecossistemes e sistemas agrários amazônicos apoiaram-se em relações sociais escravistas, transformando o índio em escravo, ao lado do escravo de origem africana. De extrativista que era, o índio passou a ser escravo das capoeiras. A mão-de-obra africana, acrescida à do índio, ajudou na transformação das paisagens, resultando sistemas agrários voltados para o mercado internacional em expansão. Do projeto dos colonizadores constavam novas técnicas de produção, como por exemplo, a proposta de introduzir o arado de aiveca responsável pelo aumento das colheitas na Europa. Buscava-se a substituição do extrativismo por cultivos que impulsionariam a economia mercantil, representada pelo comércio dos derivados da pecuária e dos cultivos do trigo, do milho e do algodão. Esta visão mercantil desencadeou o processo de transformação objetivando sistemas agro-mercantis voltados para a economia européia, onde a agricultura era baseada na absorção das mercadorias americanas. 5.1 - Os Cultivos: agricultura para consumo e para exportação Considerada como o segundo ciclo econômico da Amazônia, na fase colonial, a experiência agrária do Marquês de Pombal desponta como uma política de substituição das drogas do sertão, objetivando desenvolver atividades agropecuárias e industriais154. Nesta fase buscou-se substituir o ciclo extrativista, que permaneceu como interesse da coroa portuguesa desde a perda do mercado de especiarias no Oriente, prolongando-se até fins do século XVIII. O modelo desta atividade agrária envolvia as espécies alimentares, as extrativas e outros tipos agricultáveis que se estenderam à região e se importaram de outras partes do Império ou mesmo do estrangeiro. As espécies extrativas nativas foram o cacau, o cravo, a salsa. Os sistemas agrários foram 154 Cezar Ferreira, A. Ocidente, Revista Portuguesa mensal,vol.LX,1961.jan/junho, p.115. 70 modificados rumo a uma nova ordem econômica e sócio-cultural, sendo a plantation de cana-de-açúcar, o principal produto, o qual já era cultivado, desde a chegada dos primeiros colonos portugueses, por holandeses. Os ensaios agrícolas no vale Amazônico não abandonaram as roças de mandioca, sendo consorciado o milho graúdo e o algodão. Surgiram os plantios solteiros155 de cacau, de café e da cana-de-açucar, que eram desenvolvidos por colonos financeiramente estáveis, pois os investimentos iniciais eram elevados. As áreas utilizadas situavam-se onde a mandioca156 havia sido plantada, o que exigia muito trabalho. Geralmente capoeiras do terceiro ano apresentam vegetação bastante modificada 157. As principais espécies utilizadas nesta agricultura eram algodão, milho, arroz, cana-deaçucar e tabaco158. A paisagem foi modificada e no lugar dos antigos sistemas agrários surgiram plantios de cacau, de café e de plantas tropicais, delineando os contornos dos estabelecimentos rurais estabelecidos pelos colonos. A implantação do sítio seguia um modelo bastante frequente. Primeiro se fazia a determinação do lugar para a casa e balizava-se a implantação do pomar, juntamente com algum plantio de cacau. As moradas dos escravos surgiam ao redor da grande casa, formando un conjunto circular. 5.2 - Métodos de plantios/ Produtos Quando se estima a capacidade de suporte humano da floresta Amazônica (CSH) tem-se como pressupostos a tecnologia utilizada e os hábitos de consumo de um número de pessoas que podem ser sustentadas, por prazo indeterminado, em uma área e a um dado padrão de vida, sem haver degradação ambiental. 155 Plantio solteiro é quando não há consorcio entre culturas. 156 Nos sistemas de produção do europeu, a partir da mandioca escalonavam-se plantios de milho para colheita em 3 meses, sendo substituido pelo algodão. No final de 12 meses, colhiam a mandioca. 157 Lisboa fez experiências em áreas de mata virgem e de capoeira, com diferentes períodos de pousios (1, 5, 10 e 15 anos) as quais demonstraram que todas as áreas de capoeiras apresentam profundas modificações em relação à mata primaria. apud. in: Apontamentos para uma reflexão: população emeio ambiente no contexto amazônico , p.145 158 Em 1670, o índio fôrro recebia, por sete meses de duro trabalho na cultura do Tabaco, no Grão Pará, 2 varas de pano que equivaliam a 400 réis. Daniel, J. op.cit. 71 Neste contexto, podemos inferir que grande parte das dificuldades analíticas de classificação das espécies dos sistemas agrários do Novo Mundo está associada a esta afirmação, ressaltando-se dois pontos: 1°) os índios do vale amazônico utilizavam os gêneros da floresta, praticavam a agricultura de plantas e de raízes e utilizavam os campos naturais através de modos de produção onde as técnicas eram adaptadas a ecossistemas com biodiversidade produtora de qualidade de vida coerente para os que habitavam o vale amazônico; e, 2°) a caracterização do sistema agrário, realizada através de elementos do biotipo e da forma de intervenção, é dificultada pela inexistência de registros do que havia com a chegada dos colonizadores. Temse uma zona de floresta que esconde o que era flora natural e o que foi modificado no ecossistema amazônico. De maneira geral, a floresta Amazônica apresenta um valor elevado de biomassa (matéria viva presente em espaço e tempo), com cerca de 500t/ha (peso seco) e um grande potencial de matéria orgânica, 20t/ ha (material seco) por ano. A biomassa é essencialmente vegetal (principalmente árvores e plantas lenhosas), cabendo um papel restrito à animal, algumas dezenas de kg/ha para os vertebrados e algumas centenas de kg/ha para invertebrados com destaque para os insetos (ambos peso fresco)159. No entanto, o elevado potencial de produtividade primáaria na Amazônia depende basicamente de elementos até certo ponto externos aos sistemas (água, gás carbônico e energia radiante). Examinando o ecossistema160 de forma ampla, relacionados o clima, a diversidade biológica e a reciclagem de nutrientes; algumas pesquisas 161 concluem que: 1) o clima quente e úmido oferece condições ótimas para a produtividade biológica, ao mesmo tempo que promove a lixiviação dos solos e o desenvolvimento acentuado de insetos e fungos (disseminação de doenças e 159 Shubart, apud.in, Apontamentos para uma reflexão: população e meio ambiente no contexto amazônico p.129 160 Écosystème como une entité ou unité naturelle que inclut les parties vivants pour produire um système stable dans lequel les échanges entre les deux parties s'inscrivent, dans des cheminements circularies (E.P.Odum, 1958); ou comme "la représentation globale et énergétique d'une parte des réseaux d'êtres vivants entre eux, d'autre part des relations entre ces êtres vivants et leur environnement matériel. in:BERTRAND. G. op.cit. p. 161 Shubart,Fearnsider et al. apud.in: Apontamentos para uma reflexão população emeio ambiente no contexto amazônico 72 pragas), ambos limitando em parte a produtividade biológica; que 2) a diversidade biológica pode ser entendida como: a) resultante dos solos lixiviados. Nenhuma planta consegue crescer com suficiente rapidez capaz de exterminar as demais, ocasionando a coexistência de grande número de espécies; b) como um mecanismo de escape às pragas e doenças (coevolução das relações entre plantas e animais). Uma espécie monoespecífica seria muito vulnerável aos predadores e fungos patogênicos; e que c) sinal de um grau elevado de interrelações, garantindo um aproveitamento máximo dos recursos disponíveis, expresso na reciclagem de nutrientes (limitadores da lixiviação dos solos e promovedores da produtividade biológica). Portanto, isto sugere que a grande heterogeneidade, incluindo flora e fauna, está em equilíbrio dinâmico, que ocorre ajuste constante às modificações do ambiente. As adaptações são fisiológicas e comportamentais. As interrelações permitem que indivíduos e/ou populações tenham aumentado suas chances de sobrevivência e reprodução. Como os herbívoros e seus predadores têm uma importância qualitativa sobre o ecossistema, quer pela polinização cruzada, quer pela dispersão de sementes, quer ainda pela predação, possibilitando o surgimento de novas espécies em torno da matriz. A dinâmica florestal é, portanto essencial e temporal e a sua estabiilidade deve ser entendida no que se refere à biomassa pelas áreas foliar e basal e a produtividade, e não somente em termos taxonômicos. As questões práticas da agricultura no século XVIII 162 indicam diversos elementos que podem ser considerados e sistematizados numa linguagem técnica. Ressaltamos a caracterização da agricultura feita nas várzeas, que não anula a possibilidade de haver o cultivo em terras não alagadas. Considerando a localização dos estabelecimentos rurais nas margens dos rios, supõe-se que era uma agricultura feitas nas várzeas alta, média e baixa 163. A facilidade de fazer agricultura no vale pode ser explicada pelas propriedades edáficas dos solos que possuem forte estrutura orgânica, colmatagem das águas limosas do estuário amazônico. 162 163 decorrente da Daniel,J. op.cit Esta divisão é utilizada segundo o processo de lavagem das terras do Amazonas, o que faz com que a fertilização seja mais ou menos intensa. As várzeas altas recebem maior colmategem, seguida pelas médias e baixas. 73 A forma de cultivo dos europeus obedecia a algumas técnicas de espaçamento, facilitando o consórcio de culturas de ciclo curto, que eram semeadas entre as ruas das culturas de ciclo longo, e os tratos culturais como a capina, o desbaste e os tratamentos fitossanitários. Os tratos culturais eram feitos pelas mulheres índias e negras 164. Dependendo do estágio florístico, se eram mata virgem ou capoeiras de primeiro, segundo ou terceiro ciclo; executavam-se um número de capinas recomendadas. Outra atividade onde existia a participação feminina era na semeadura do arroz, feita por escravos organizados em duas fileiras, onde os homens iam picando a terra com a tacira e as mulheres semeando e tapando as covas com os pés Os plantios de cana-de-açúcar para produção dos engenhos e engenhocas eram feitos diretamente em terras alagadas. Este sistema de cultivo no vale do Amazonas diferia do restante do Brasil e o açúcar e as aguardentes eram feitos por temporadas. Uma explicação é que o cultivo dos canaviais era praticado nas margens dos rios, permitindo a colheita somente no tempo das vazantes. A duração média dos canaviais, entre 5 a 7 anos, tinha em contrapartida, os custos de produção reduzidos. O transporte do produto, considerado um dos ítens que mais onerava a produção, permitia que os barcos chegassem próximos dos plantios, sendo a cana colhida e depositada diretamente no transporte, dispensando carregá-la até os engenhos. Os engenhos de açúcar e as engenhocas para fabricação de aguardente eram as atividades preferidas dos que tinham recursos e mão-de-obra, devido serem as atividades de maior rendimento. O cacau manso ou cultivado demandava menor investimento, pois era plantado em terras alagadas, e com plantas oriundas das sementeiras feitas nas roças de mandioca, entre os tocos, após a colheita das raízes. No sombreamento do cacau utilizavam as pacoveiras (bananeiras nativas) plantadas nas várzeas e normalmente em áreas onde o arroz produzia naturalmente. Estas várzeas, onde o arroz amazônico brotava naturalmente, foram substituidas por pacoveiras (banana da terra) para sombrear o plantio de cacau, sem considerar o equilíbrio entre a economia e a ecologia, desestruturando o ecossistema de arroz. Rodrigues Ferreira e João Daniel se 164 Daniel,J. op.cit. 74 referem ao arroz branco do Amazonas, que nascia em lagos, campinas, alagadiços, em terra firme e sementeiras, diferenciando-o do arroz da Europa, que era miúdo e limpo. Classificado como Orysa nutica, tinha origem brasileira, enquanto que o Oriza sativa é originário da Ásia, o qual começou a ser cultivado antes de 1587, mas teve sua produção estimulada em meados do século XVII, dentro do programa agrário do Marques de Pombal. Finalmente, em 1763 o arroz vermelho (Oryza nutica) foi banido Os tratos culturais do cacaual exigiam algumas capinas, enquanto as copas não se fechavam. Outra preocupação dos cacauicultores era o controle fitossanitário das árvores, combatendo a erva de passarinho e o lagartão. Os cafezais eram cultivados da mesma forma que o cacau. Entretanto, por serem mais exigentes em solos, eram implantados em terra firme. Frutificavam no segundo ano, se fossem plantios com plantas tenras; ao fim do primeiro ano brotavam espontaneamente onde havia suas árvores, assim quando eram plantios com ramos ou varas que enterravam. As práticas comuns, para que ficassem viçosos e copados, eram a capinação e poda. Utilizavam-se também as várzeas para o milho e legumes que eram semeados diretamente na terra, a lanço, e sem necessidade de práticas para o preparo de área. O tabaco, por ser exigente em solos, era plantado em solos de mata. Era exigente em muitas capinas, assim como, amiudamente, a decotação ou capação, para que suas folhas pudessem crescer lateralmente, produzindo bastante material verde. Para o plantio das hortaliças utilizavam covas adubadas com esterco e renovadas a cada seis meses. Dificilmente usavam sementes, salvo a primeira vez. Os plantios eram por mudas. Os cultivos mais fáceis eram os pomares que surgiam no segundo ano, quando a mandioca era colhida; seu cultivo era pouco exigente. Assim, quando ela foi descrita como a farinha de pão dessa América cultivada em roças de maniba-meri165, antecipava-se o papel que ela representaria para o povo do 165 denominação indígena para a mandioca, in: Daniel, J. op.cit. 75 vale Amazônico. Pode ser mandioca preta, branca ou amarela, que é sempre apreciada. Dessa planta aproveita-se, além da raiz para as farinhas, a folha para a maniçoba e o sumo para o tucupi166, que são pratos típicos da culinaria do Pará. A mandioca continuou a ser cultivada e, quando acabavam as matas para as roças, os colonos compravam a farinha que não podiam produzir, até conseguirem novas datarias167. Ao conseguirem as terras solicitadas, reiniciavam o sistema de cultivo da mandioca reproduzindo o mesmo sistema de produção, que era baseado no sistema de itinerância e pousio. Na época colonial eram concedidas datarias de três léguas aos moradores que tinham escravatura, sendo a terra subdividida entre os escravos, ficando os senhores livres da obrigação de lhes dar provimento, por vezes garantindo a produção dos escravos, adquirida a baixo custo, como a farinha. Os colonos tinham a preocupação de fazer seus escravos plantarem suas próprias roças no intervalo dos grandes plantios, o que lhes desobrigava da alimentação. Na região amazônica, a alimentação, tendo a mandioca como base, é um traço cultural indígena reproduzido até hoje. Consumida em forma de farinha d'água ou seca, faz parte da alimentação cotidiana das populações ribeirinhas, as quais complementam sua dieta alimentar com peixes frescos e salgados, caças e frutos . A população urbana a utiliza misturada ao feijão, às carnes, e nos alimentos que compõem a sua alimentação. Os que possuiam grandes roçados de mandioca colhiam toda a produção na época da maturação. Normalmente eram grandes produtores com estruturas de tipitis168, fornos e implementos que permitiam a transformação de toda a produção da mandioca em farinhas (d'agua, carimã, tapioca), aguardentes e beijus. 166 tucupi: sumo extraído da raiz da mandioca, com alto teor de ácido cianídrico mas que, ao ser fervido, perde o poder venenoso, transformando-se em condimento líquido para o preparo de pratos da região, como o pato-no-tucupi. 167 dataria era a denominação para as terras concedidas aos colonos que possuiam escravos, in: Daniel, J. op.cit.. 168 Tipiti: utensilio indígena feito de palha trançada, próprio para receber a massa da mandioca de onde é extraido o tucupi. 76 6 - CONCLUSÃO As mudanças ocorridas nos dois séculos de colonização podem ser observadas pelas transformações decorrentes da introdução de novos métodos e técnicas de produção, em síntese, a implantação de agrossistemas diversos. Nestas novas terras, os recursos naturais disponíveis impulsionavam a cobiça dos colonizadores. Reavivou-se o ímpeto predatório e mercantil que levou à aceleração econômica de Portugal em termos de uma acumulação de riqueza em geral rápida e plena de consequências promissoras para o sistema de trocas internacional169. A devastação ecológica e populacional acompanhou as marchas colonizadoras do Brasil, indo da zona canavieira ao sertão bandeirante, deixando como rastro as queimadas, a morte ou a predação dos nativos. No vale do Tocantins, a extinção das drogas do sertão, principalmente a canela, o cravo a salsaparrilha e, sobretudo o cacau, testemunham a depredação do ecossitema amazônico, a partir da segunda metade do século XVIII quando expedições foram organizadas, dirigindo-se ao interior, ao longo da rede hidrográfica. A história social da Amazônia, e mais especificamente do vale do Tocantins, apresenta na sua paisagem agrária atual, a reatualização do que foram as incursões militares e econômicas dos tempos coloniais. Analisando-se o sistema colonial como uma totalidade articulada objetivamente, detectam-se acontecimentos exteriores à sociedade tribal do século do descobrimento; as epidemias, os genocídios e a colonização propriamente dita, que efetivou-se com a mudança de uma população indígena para uma de colonos170. Estes elementos são, entre outros, responsáveis pela desorganização social e descaracterização da atividade produtiva. A paisagem social foi modificada e dos ecossistemas naturais surgiram agrossistemas onde, raramente, a escolha levava em conta a floresta como elemento essencial de equilíbrio. Uma agricultura baseada nos modelos de 169 BOSI, Alfredo. Dialética da Colonização.São Paulo.Companhia das Letras.1992.p19. 170 Idem, p.26 77 plantations é o concreto que se instalou naquela época. No Pará, na embocadura das baías do Limoeiro e Ajuru, onde desagua o rio Tocantins, dáse um lento crescimento da população na primeira metade do século XVIII, com um certo incremento das atividades agrícolas assim como a criação de gado na ilha de Marajó. Relembrando a política colonial de Portugal, que submeteu a costa brasileira à uma intensa produção agrícola por razões puramente econômicas, observa-se que a colonização foi direcionada para a especialização de produções agrícolas, fazendo com que a conquista em marcha dos territórios no continente Brasil não tivesse a preocupação da poliatividade nem com a preservação das populações ameríndias que faziam o cultivo diferente do modelo da Europa. Os colonos europeus, apoiados no escravo africano, instalaram a monocultura açucareira. Feita nas margens férteis dos rios, a agricultura dos colonizadores no vale amazônico era praticada ao lado da produção extrativista, misturando-se nas matas onde estavam os produtos que participavam do comércio de produtos como o azeite de andiroba, manteiga de tartaruga, salga de peixe, parte das carnes, farinha, feijão, arroz, algodão, açúcar e aguardente. A produção natural dos frutos do abacaxi, ananás, pacovã, cupuaçu e bacuri, ao lado do cultivo do arroz, do feijão, dos melões e outros legumes, foram cultivados como produtos secundários, pois as roças eram preparadas para a mandioca. Explorou-se sistematicamente o outro componente natural dos sistemas agrários, que eram as madeiras, preciosidades do vale, úteis nas construções de embarcações, produção de tintas extraídas do pau-Brasil, anil e caapiranga, das resinas, óleos e gomas com utilidades que vão da indústria a farmacopéia, sendo o óleo da copaiba antibiotico natural da cura de infecções das populações amazônicas. As estações homogêneas, aliadas à fertilidade das terras, fizeram que os colonizadores imaginassem produções de searas como na Europa. Esse projeto chocou-se com a realidade dos mercados, hábitos de consumo e com as condições de aclimatação das espécies. A inexistência de mercados públicos e feiras nas cidades e vilas, assim como a falta de barcos públicos, originou a escassez de produtos, apesar da produção 78 existente. O mercado interno era extremamente frágil para absorver esses produtos, em alguns casos acessíveis nos locais de extração. A ausência de pesquisas e geração de tecnologias adaptadas aos ecossistemas amazônico levou a uma reprodução da pequena produção nos moldes coloniais, onde a mandioca persiste como produto básico alimentar e de comercialização171. Da época da colônia até hoje, a mandioca polariza as pesquisas agronômicas. Como planta que se desenvolve melhor em terras de mata, a cada ano é responsável por parte do desmatamento da Amazônia, restando, após sua colheita, grandes capoeiras. A continuidade de uma pesquisa histórica sobre os sistemas agrários do vale do Tocantins abrangerá a sistematização, descrição e interpretação dos materiais e as peças documentais que apoiem a compreensão dos modelos de agrossistemas, perfazendo a discussão dos métodos e das técnicas que medearam as relações entre os homens e esses ambientes. 171 Farinha de mandioca 79 7 - BIBLIOGRAFIA 1 - O BRASIL E O VALE DO AMAZONAS ABREU, Capistrano. Capítulos de História Colonial (1500-1800) & os caminhos antigos e o povoamento do Brasil , 5a. edição, Universidade Federal de Brasilia, 1963. ALDEN, Dauril. O significado da produção de cacau na região amazônica, UFPa, Belém, 1974, 90p. ANDERSON, A. Reflorestamento indígena. apud in: Syndenstricker Neto, J.M. 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ANIMISTA Adepto do animismo. ANHANGÁ Alma errante que torna mal-assombrada certas localidades onde o índigena não pode permanecer . BAÍA Pequeno golfo, de boca estreita, que se alarga para o interior. BORORÉ Poção feita com ervas para envenamento das flechas. BÔTO Mamífero cetáceo da famímia dos Delfinídeos, pertencente aos gêneros Delphinus, Steno e outros (marinhos) e da família dos "platanistídeos" (de água doce). BEIJU Bolo de massa de tapioca ou de mandioca. BRASÍLICA Referente ao Brasil. CABAÇA Fruto do cabaçeiro; vaso feito com esse fruto. 88 CANOA Barco de popa fina, com popa de escaler, movido geralmente a remos; piroga; qualquer embarcação pequena. CAPOEIRA Mato que cresce naturalmente e se desenvolve em terreno outrora cultivado; mata talhadiça que se roça ou derruba para lenha, a fim de cultivar a terra ou para qualquer outro fim. CURUPIRA Ente fantástico, tapuio com os pés às avessas, isto é, com os calcanhares para a frente e os dedos para trás, o qual habita as matas (do Tupi: curupir = o chegado). CUNHÃ Mulher na linguagem indígena. CHIBÉ Refresco feito com água e açúcar; jacuba. CACHOEIRA Queda de água. CONFLUENCIA Lugar onde se juntam dois ou mais rios. CAPITANIA Comando; chefia. DELTA Foz que tem ilhas de aluvião, geralmente de feitio triangular. DESCIMENTO Transporte, para o litoral, de índios aprisionados no sertão, no período colonial. ESTUÁRIO Tipo de foz em que o curso de água se abre mais ou menos, largamente. EMBOCADURA Foz de um rio. 89 ESTAQUEAR Reduzir a tacos; tirar pedacinhos de; estraçalhar; rasgar; esfrangalhar. ESTAQUIA Referente a estaquear; propagação vegetativa de espécies. ESPECIARIAS Qualquer droga aromática - cravo, canela, noz moscada, etc - para condimentar iguarias. FROTA Conjunto de navios comerciais no período dos descobrimentos. FEITORIA Entreposto estabelecido pelos portugueses no período colonial para o escambo das drogas do sertão. FOZ Ponto onde um rio, ou outro curso fluvial, deságua, no mar, num lago ou noutro rio. FREGUESIA Povoação sobre o aspecto eclesiástico. GUERREIRAS DO AMAZONAS Exército de mulheres que habitavam entre os rios Negro e Trombetas no vale amazônico. GUTURA Cesto feminino utilizado pelas índias HAVERES Bens, riquezas. HOMEM-MARINHO Ver bôto. IGARA Pequena canoa feita de uma só tora de madeira (do tupi). IGAPÓ É a mata permanentemente inundada 90 IRAPURU Pequeno pássaro que traz felicidade a quem consegue apanhá-lo. JEQUITAIA Pimenta malagueta. LUGAR DE ÍNDIO Resquícios de antigos aldeamentos indígenas. LAGO DOURADO Mito criado pelos espanhóis sobre a existência de um lago de ouro na Amazônia. MAMAIAPOCA Sistema radicular da salsaparrilha MOCORORÓ Bebida fermentada feita de mandioca. MINGAU Iguaria de consistência pastosa feita em geral de leite açucarado e farinha de mandioca. MANIBA Mandioca na linguagem indígena. MAPINGUARY Entidade; senhor das florestas que tem o hábito de desorientar os homens. MISSÂO Instituição ou instalação de missionários para pregação da fé cristã. NAÇÕES Povoamentos indígenas. PANTEÍSMO Sistema filosófico que identifica a divindade com as várias forças e agentes da natureza; crença e adoração de todos os deuses. PARANÁS Braço de rio, separado deste por uma ilha. 91 PAU-QUE-RONCA Instrumento musical indígena semelhante ao tamborim; percurssão. ROÇA Terreno de pequena lavoura. SEARAS Extensão de terra semeada; campos de cereais. SERTÃO Zona pouco povoada do interior do Pais. TORÉ Instrumento musical indígena semelhante à flauta; instrumento de sopro. TERRAS-CAÍDAS Fenômeno de desbarranquemeanto das terras no vale do estuário amazônico. JURUPARY Entidade; espírito diabólico que mora nos lugares tenebrosos e causa os infortúnios dos homens. VALE Planice à margem de um rio. VILA õovoação de categoria superior à de aldeia ou arraial e inferior à cidade. VÁRZEA Áreas inundáveis em regimes periódicos ou permanentes. VITÓRIA RÉGIA Planta aquática ninfeácea. 92 9 - Cronologia 1614-1742 Ficam estabelecidas as comunicações entre os grandes afluentes da bacia do Amazonas e da Platina, que viriam a servir de limites ocidentais ao Brasil. 1638 Pedro Teixeira chega a Quito. 1652 Os jesuitas obtêm o direito de evangelizar, desencadeando os conflitos com as entradas dos missionários e dos sertanistas por causa do controle da mãode-obra índia fornecedora das drogas do sertão. 1655-1670 O curso médio do Amazonas foi percorrido por missionários e "sertanistas" e os principais foros de evangelização, como os fortins, foram estabelecidos na foz do rio Negro e Madeira. 1687-1714 Surgem as "cartas régias", delimitando os locais para as diferentes ordens religiosas; para os Franciscanos, o Cabo Norte, Marajó e afluentes do norte do Amazonas; para os jesuitas, o Tocantins, Xingu, Tapajos e Madeira; para os Carmelitas, os rios Negro, Branco, Solimões; para os Capuchinhos, o Baixo Amazonas, a partir de Gurupá; e para os Mercedários, a artéria do Amazonas até o rio Urubu, no médio Amazonas. 1669 Descoberta da canela no Vale do Tocantins. 1697 Morre o Padre Antônio Vieira, em Salvador. 1707-1709 Empresas privadas abriram o eixo norte-sul de penetração. 1733 Proibição da comunicação entre o Madeira e Mato Grosso; a coroa pretendia evitar confrontos junto as bandeiras paulistas que aspiravam a descoberta de ouro e diamante no Mato Grosso; portanto, indo de encontro ao monopólio da coroa que controlava as Minas Gerais. 1742 Apesar da proibição, Manuel Félix de Lima estabelece ligação entre Cuiabá e Belém do Pará, percorrendo os rios Sararé, Guaporé, Madeira e Amazonas. 93 1747 O paulista João de Souza de Azevedo descobre a via fluvial entre Mato Grosso e Pará, através dos rios Paraguai, Sipotuba, Sumidouro, Arinos e Tapajós. 1750-1777 Governo do Conde de Oeiras, depois Marquês de Pombal, Sebastião José de Carvalho de Melo, sob o rei José de Portugal. 1750 13 de janeiro: Tratado de Limites assinado em Madri entre Portugal e a Espanha. 1750 América Portuguesa herda antigos territórios espanhóis através de conquista territorial. 1754-1756 Guerra luso-espanhola contra as missões de Santo Angelo, São Borja, São João, São Luis Gonzaga, São Lourenço, São Miguel e São Nicolau, rebeladas contra o cumprimento do Tratado de Madri de 1750. 1755 7 de junho: Decreto real institui a Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará e Maranhão. 1755 Liberdade dos índios. 1755 Autorização do casamento com as mulheres da terra. 1758 Instituição do Directório dos índios. 1759 Expulsão dos jesuitas. 1759 Extinção do sistema de capitanias hereditárias. criação da Companhia do Comércio de Pernambuco e Paraíba. 3 de setembro: E decidida a expulsão dos jesuitas de Portugal e de seus domínios. 1760 Criação da Capitania do Rio Grande de São Pedro, subordinada à do Rio de Janeiro. 1761 Tratado de Limites do Pardo, anulando o Tratado de Madri de 1750. 94 1762 A colônia do Sacramento é tomada pela quarta vez pelos espanhóis, em função da Guerra dos Sete Anos. 1763-1776 Em função da Guerra dos Sete Anos, os espanhois ocupam uma parte do Rio Grande de São Pedro. 1763 A sede dos vice-reis do Brasil passa de Salvador, na Bahia, para a cidade do Rio de Janeiro. 1765 Decidida a derrama (cobrança forçada do quinto do ouro)em Minas Gerais. 1769-1779 Governo do mais famoso dos vice-reis com sede no Rio de Janeiro: Luis de Almeida Silva Mascarenhas, segundo Marquês do Lavradio. 1774 O Maranhão e o Piaui são desmembrados do Grão-Pará. 1777 Ataques espanhóis no sul e no oeste do Brasil: ocupação definitiva da Colônia do Sacramento e passageira de Santa Catarina e de um forte no Mato Grosso. Tratado de Limites de Santo Ildefonso entre a Espanha e Portugal. 1778 Extinção da Companhia do Comércio do Grão-Pará e Maranhão. 1779 Interrompe-se o funcionamento da Companhia do Comércio de Pernambuco e Paraíba. 1783-1788 Governo, em Minas Gerais, de Luis da Cunha e Meneses, malvisto localmente e tido como uma das causas da "Inconfidência Mineira". 1783-1792 Viagem científica do naturalista Alexandre Rodrigues Ferreira na Amazônia portuguesa. 1785 5 de janeiro: Alvará que proibiu a instalação de fábricas e manufaturas no Brasil, excetuando-se as de panos grosseiros. 1789 Conspiração incipiente em Vila Rica, Minas Gerais, por ocasião das instruções para a derrama na capitania, logo reprimida, conhecida como "inconfidência 95 mineira" e com frequência considerada como movimento precursor da independência do Brasil. 1792 21 de abril: Enforcado no Rio de Janeiro o alferes Francisco José da Silva Xavier, o Tiradentes, participante da "inconfidência mineira". 1798 Conspiração logo reprimida, conhecida como "Revolta dos Alfaiates", na Bahia, tida como movimento precursor da independência do Brasil. 1799 Maranhão e Grão-Pará tornaram-se unidades administrativas separadas das capitanias do Ceará e da Paraiba. 1799 8 de novembro: Enforcamento de quatro dos envolvidos na "Revolta dos Alfaiates" na Bahia. 1800 Crise do cacau. 1801 Hostilidades de fronteira, na Banda Oriental e nos Sete Povos das Missões (Uruguai) e no Rio Grande de São Pedro, em função da Guerra Peninsular entre Espanha e Portugal. Em consequência destes conflitos, os portugueses ocuparam definitivamente os Sete Povos das Missões, que o Tratado de Santo Ildefonso (1777) entregara à Espanha. 1807 A capitania subalterna do Rio Grande de São Pedro se torna Capitania Geral de São Pedro do Rio Grande do Sul. 1807 9 de novembro: Sob ameaça de invasão franco-espanhola de Portugal, uma esquadra deixa Lisboa sob proteção inglesa com destino ao Brasil, levando o príncipe regente João e a corte lusa. 1808 22 de janeiro: Chegada do príncipe regente à Bahia. 1808 28 de janeiro: Em Salvador, o príncipe regente decreta a abertura dos portos do Brasil às nações amigas. 1808 7 de março: Chegada do príncipe regente João ao Rio de Janeiro. 96 1808 11 de março: Nomeação, pelo príncipe regente no Rio, do primeiro grupo de ministros a funcionar no Brasil. 1808 1° de abril: Derrogação do alvará de 1785 que proibia o estabelecimento de fabricas e manufaturas no Brasil. 1808 Diversas medidas de cunho intelectual, como a criação da Escola Médicocirúrgica da Bahia, primeira instituição de ensino superior no Brasil; a fundação da Impressão Régia no Rio de Janeiro, primeira gráfica brasileira que publicou também o primeiro jornal (Gazeta do Rio de Janeiro); criação no Rio de Janeiro da Biblioteca Real. 1808-1809 Medidas de privilégio e isenção fiscal a favor das manufaturas que fossem instaladas no Brasil. 1809-1817 Depois de conquista efetuada por expedição anglo-portuguesa, Portugal administra, do Rio de Janeiro, a Guiana Francesa. 1810 Tratados de aliança e amizade e de comércio e navegação firmados entre a Grã-Bretanha e Portugal. 1811 Inicia-se a longa série de intervenções militares portuguesas (e depois brasileiras) na Banda Oriental (Uruguai). 1812 17 de dezembro: efetua-se pela primeira vez no Brasil a fusão do ferro, em Minas Gerais, sob a direção do Barão Guilherme Von Eschwege. 1815 16 de dezembro: elevação do Brasil a Reino Unido ao de Portugal e Algarves. 1816 Chega ao Brasil uma missão artística francesa. 1817 Ocorre, em Pernambuco e capitanias vizinhas, uma revolução logo reprimida, incluida ordinariamente entre os chamados movimentos precursores da independência do Brasil. 1818 Criação de uma fábrica de ferro gusa em Sorocaba (São Paulo). 97 1820 Fundação, no Rio de Janeiro, da Academia Real de Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil. 24 de agosto: início da revolução constitucionalista do Porto, em Portugal. 1821 26 de abril: Volta do rei João VI a Portugal, ficando no Rio de Janeiro o príncipe herdeiro Pedro como regente do Brasil. 98 10 - LISTA DE SIGLAS A.H.U Arquivo Ultramarino A.P.P Arquivo Público do Pará U.F.R.J Universidade Federal do Rio de Janeiro U.F.Pa. Universidade Federal do Pará B.N.R.J Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro A.N.R.J Arquivo Nacional do Rio de Janeiro 99 LISTA DA FAUNA E FLORA DESCRITA POR JOÂO DANIEL NO LIVRO "TESOURO DESCOBERTO NO RIO AMAZONAS" Quadro A: Da caça altÍlia do rio Amazonas NOME VULGAR NOME CIENÍFICO FAMÍLIA Ema Rhea maericana Reidaeo Gavião-canguera Leucopternis schistrace Acipitrireo Jaburu Mycteria americana Ciconideo Maguari Ardea cocoi Ardeideo Anhuma-caiantau Anhuma cornuta Anhimideo Urubu Coragyps atratus foetens Catartideo Pato Anseriformes sp A,atideo Marreco Anas platyrhynchos Anatideo Mutum Crax globulosa Cracideo Jacu Penélope Mer. Cracideo Quadro A1: Da caça altÍlia do rio Amazonas NOME VULGAR NOLE CIENTÍFICO FAMÍLIA Acaua Herpetotheres cachinhans Falconideo Guara Chrysocyon brachyurus Canideo Tucano Ramphastos sp. Ranfastideo Arara Aramacao so. Psitacideo Papagaio Amazona sp. Psitacideo Saracura Aramide manglê Ralideo Pavão Pavo cristatu Fasianida Inhambu Tinamus sp. Tinamideo Mergulhão Mergus octosetaceous Colimbideo Atins ou Atiatis Larus maculipennis Phaetusa Maçarico Charadrius sp. Caradideo Garça Philherodius pileatus Ardeideo Carão Aramus sp. Aramideo Ainum Crotophaga ani L. Cuculideae Andorinha Streptoproene zonaris Microlodideae Japiin Cacicus cela Icterideae 100 Picaflor Rhamphodon naevius Troquilideae Quadro B: Divertimento de caça no rio Amazonas NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Anta Tapirus terrestre Tapirídeo Onça Panthera onça Felídeo Maracajá Jaguarius pardalis Javali Sus Scrofa Suidae Tatu Priodontes giganteus Dasipodídeo Capivara Hidrochoerus Cauídeo hidrochoerus Paca Cuniculus paca Cuniculideo Lobo-cochiné Chrysocyon brachyurius Canidae Viado Ozotzcerus bezoarticus Cervídeo Tamanduá Myrmecophaga tridactyla Mirmecofagídeo Raposa Vulpes vulpes Canídeo Preguiça Bradypus tridactilus Bradipodideo Cotia Dasyprocta sp. Dasiproctídeo Maritaca Aratinga aurea Macaco-guariba Alovata sp. Cabídeo Quadro C: Das pragas especiais do Amazonas NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Mucuin Tetranychus molestissimus Trombididas Tombura-bicho pé Tunga penetrans Hectopsilídeo Berne Dermatobia hominis Destrídeo Barata Leucophaea maderea Pancloríneo QUADRO D: Da praga volátil do Amazonas NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Mosca Musa domestica Muscídeo Varejeira Cochliomya hominivorax Mutuca Tabanus sp. Tabanídeo Caba Polistes canadensis Vespídeo 101 Tatu-caba Syndeca cyanea Borboleta Leucocasi niadaedalus Abelha Apis melífera Vespídeo Apídeo Quadro E: Das sevandijas do Amazonas NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Carrapato Amblyomima casannense Ixodideo Aranha Grammostola sp. Terafosideo Lagarta-osga Hemidactylus mabovia Giconideo Sapo Bufo marinus Bufonídeo Quadro F: De outras pragas do Amazonas NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Formiga Solenopsis sp. Formicideo Sauba Atta sp. Formicideo Turu Teredo sp. Teredinideo Lombriga Ascaris lumbricoide Ascarideo Impigen Tinea sp. Cobrero Larvas migrans cutanea Quadro G: Das cobras do Amazonas NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Coral Micrurus sp. Elapideo Jararaca Brothorps sp. Crotalideo Cascavel Crotalus durissus Crotalideo Capelo Leimadophis poecilogyrus Columbrideo Jiboia Constrictor constrictor Boideo Surucucu Lachesis muta Crotalideo das águas Helicopa sp. Columbrideo 102 Quadro H: Da farinha de pão da América NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Maniba-haste Manihot sculenta Euphorbiáceae Maniçoba-folha Manihot sculenta Euphorbiáceae Mandioca-raiz Manihot sculenta crantz Euphorbiáceae Quadro I: De outros produtos da América NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Milho Zea mays Gramineae Arroz Oryza sativa Gramineae Tabaco Nicotina tabacum Solanceae Algodão Gossypium hirisutum Feijão Phaseolus vulgaris Leguminosae Feijão verde Vigna unguiculata Leguminosae Melão Cucumis meo L. Cucurbitaceae Melancia Citrillus vulgaris Cucurbitaceae Abóbora Cucurbita pepovar Cucurbitaceae Couve Brassica oleracea Brassicaceae Alface Lactuca sativa Chicoriaceae Quiabo Abelmoschus esculentus Malvaceae Amendoim Arachis hypofeae L. Leguminosae Caruru Hibiscus sardarifa Malvaceae Repolho Brassica sp. Brassicaceae 103 Quadro J: Dos mais excelentes frutos amazônicos NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Abacaxi-Ananas Anans comosus L. Bromeliáceae Pacovã Musa paradisiaca Musaceae Manga Mangífera indica L. Anacardiáceae Jaca Artocarpus heterophyllus Moraceae Mangaba Hancornia speciosa Apocináceae Abil Pouteria caimito Sapotaceae Ata Annona squamosa L. Anonaceae Araticu Annonamontana maci Anonaceae Beribá Rollinia mucosa Anonaceae Tituribá-cutitoriba Ponteria caimito Sapotaceae Mamão Cacarica papaya L. Caricáceae Acuju Anacardium giganteum Anacardiaceae Abacate Persea americana Lauráceae Goiaba Psidium guajava L. Mirtáceae Jotai Hymenaea courbaril L. Cesalpinioideae Quadro J1: Dos mais excelentes frutos aAmazônicos NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Bacuri Platonia insignis Gutífera Cupu Theobroma grandiflorum Esterculiáceae Cumã Dipteryx odorata Leguminoseae Ingá Inga edulis Leguminoseae Guandu Cajanus cajan Leguminoseae Ginja Eugênia uniflora Mirtaceae Pitomba Talisia esculenta Sapindaceae Maracaujá Passiflora eduli Passifloraceae Castanha do Brasil Bertholletia excelsa Lecitidaceae Sapucaia Lecythispisonis usitata Lecitidaceae Jenipapo Genipa americana Rubiaceae Laranja Citrus sinensis Rutaceae Toranja Citrus decumana Rutaceae Lima Citrus aurantifolia Rutaceae Açai Eutherpe oleraceae Arecaceae Ibacaba Denocarpus circuntextus Arecaceae Cuia Crescentia cujete Bignoniaceae 104 Quadro K: Dos mais preciosos paus do rio Amazonas NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Cotiara Johannesia princips Euforbiaceae Violeta Peltogyne catingae Leguminoseae Paricá Piptadenia peregrina Leguminoseae Goma Vochysia thyrsoidea Voquisiaceae Pau Santo Zollernia paraensis Cesalpiniaceae Ébano Diospyros tessezaria Ebenaceae Pau-Brasil Caesalpiniaechinata Cesalpiniaceae Arueira Astronium lecointei Muiracatiaceae Pau amarelo Euxylophora paraensis Rutaceae Guautaiba Balfourorendron riedelianum Rutaceae Pau roxo Peltogyne catingae Leguminoseae Pau preto Cenostigma tocantins Rubiaceae Jacarandá Jacaranda mimosaefolia Bignoniaceae Jotai Hymenaea parviolia Caesalpinoideae Quadro K1: Dos mais preciosos paus do rio Amazonas Casca preciosa Aniba canelilla Laureaceae Pau rosa Aniba duckei Laureaceae Angelim Dinizia excelsa Leguminoseae Pau ferro - itaita Caesalpinia ferrea Leguminoseae Maçaranduba Manilkara huberi Sapotaceae Cumaru Dipteryx odorata Leguminoseae Piquia Caryocar vullosum Caryocaraceae Pau d'arco - ipê Tabebuia serratifolia Bignoniaceae Acapu Vouacapoua americana Leguminoseae Sucupira Diplotropis purpurea Leguminoseae Bacuri Platonia insignis Gutifereae Copaiba Copaifera multijuga Leguminoseae Cedro vermelho Cedrela odorata Meliaceae Cedro branco Protium altissimum Burseraceae Cedro pardacento Cedrelinga catenaeformis Leguminoseae 105 Quadro K 2: Dos mais preciosos paus do rio Amazonas Pau louro Ocotea guianensis Laureaceae Sacuzeiro Hura crepitans Euphorbiaceae Aninga Rhizophora mangue Rhizophoraceae Andiroba Carapa guianensis Meliaceae Gergelim Sesamum indicum Pedaliaceae Jenipapo Genipa americana Rubiaceae Ambaíba Cecropia sp. Moraceae Samaumeira Ceiba pentandra Bombacaceae Taboca Bambusa arundinaceae Poaceae Cana de açucar Saccharum officinarum Gramineae Angélica Archangelica officinalis Umbelifereae Esponjeira Parkia ulei Mimosaceae Jasmineiro Jasminum sp. Oleraceae Jasmim de caiana Melia azedarach Meliaceae Cazajeira Spondiaslotea Anacarreaceae Timbó Dennis guianensis Leguminoseae Cipó Combretum leprosum Combretaceae Tajá Caladium bicolor Araceae Malvisco Coleus barbatus Labiateae Figueira do inferno Opuntia ficus Cactaceae Quadro L: De algumas ervas mais notáveis (medicinais) NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Erva do Paraguaia Ilex paraguayensis Iricineae Fava de Santo Ignácio Carapa guianenses Meliaceae Padu Erythroxylum cataractum Eritroxilaceae Mastruço Chenopodium ambrosioides Quenopodiacea Fedegoso Cassia occidentalis Caesalpinoideae Matapasto Cassia tora L. Caesalpinoideae Flor de Caiana Plumeria alba Apocynacea 106 Quadro M: Das palmeiras da América NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA coqueiro Cocos nucifera) Arecaceae moroti-buriti Mauritia flexuosa Arecaceae Muatá-mucajá Acrocomia sclerocarpa Arecaceae Palmito-açai Eutherpe oleracea Arecaceae Ambacalata-sagu Metroxylon sp. Arecaceae Pupunheiro Guilielma speciosa Arecaceae Tucumã Astrocaryum vulgare Mart. Arecaceae Quadro N: Gêneros e Especiarias NOME VULGAR NOME CIENTÍFICO FAMÍLIA Anil Indigofera timetoria Leguminosae Salsaparrilha Smilax papivácea Liliáceae Café Coffea arabica Rubiaceae Caju Anacardium occidentale Ancardiaceae Algodão Gossypium herbaceum Malvaceae Abutua Chondodendron platyphyllum Minispermaceae Azeite Olea europeae L Oleaceae Bacaba Oenocarpus bacaba Arecaceae Gerzelim Sesamum indicum Pediliaceae Andiroba Carapa guianensis Meliaceae Cabriuva Hyrocarpus fastigiatus Papilonaceae Humeri Humiria floribunda Huminaceae Copaiba Copaifera multijuga Leguminosae Cravo Gypsophila paniculata Cariofilaceae Tabaco Nicotina tzbacum Solonaceae Comaru Dipterix odorata Leguminosae Baunilha Vanilla planifolia Orquidaceae Ibicuiba Myristica bicuhyba Miristaceae Canela Cinnamomum zeylanicum Lauraceae Breu Protium sp. Burseraceae Mutamba Guazuma ulmifolia Sterculiaceae 107 ANEXOS 2 108 Estes quadros correspondem as informações da página 41. Quadro A: Produção de Açucar no Pará: periodo 1758-1785 Anos Arrobas Total 1758 557 666$500 1759 327 297$000 1785 3.568 8.980$259 Soma 4.452 9.943$759 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.232. Quadro B: Produção de Aguardente no Pará: período 1771-1784 Anos Canadas Total 1771 438 732$405 1772 3.314 5.388$913 1773 1.519 2.553$773 1774 355 589$006 1775 539 3.777$211 1776 9 5.032$411 1777 8 2.099$451 1778 1.980 4.082$360 1779 8 1.273$100 1781 -- 1782 902$763 5 1784 -- ......... ...... Total 8.175 987$334 946$664 ......... 28.365$391 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.233. 109 Quadro C: Produção de Algodão Fiado ou Urdido no Pará: período 17611763 Anos Arrobas Total 1761 17 191$835 1763 -- 15$180 Soma 17 207$015 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.233. Quadro D: Produção de Algodão em Rama no Pará: período 1759-1819 Anos Arrobas Total 1759 49 206$124 1761 10 66$945 1771 7 48$712 1777 366 2.194$190 1778 178 1.121$939 Soma 610 3.637$910 1779 335 2.936$634 1780 1.181 8.585$504 1781 1.068 9.491$634 1782 288 3.099$377 1783 114 1.484$894 1784 308 2.498$037 1819 787 6.784$080 Soma 4.081 34.880$160 Total 4.691 38.518$070 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.2. 110 Quadro E: Produção de Arroz Descacado no Pará: período 1773-1852 Anos 1773 Arrobas 241 Total 314$408 1774 4.946 4.075$154 1775 18.181 14.952$907 1776 3.116 2.512$743 1777 38.121 23.807$854 1778 12.831 8.410$902 1781 420 524$001 1782 15.527 16.218$025 1783 15.596 15.503$424 1852 19.369 39.281$859 ........ ......... .......... Total 128.348 125.601$277 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.234. Quadro F: Produção de Borracha (Seringa) no Pará no ano de 1785 Ano Arrobas Total 1785 233 2.862$551 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.235. 111 Quadro G: Produção de Café no Pará: período 1758-1848 Anos Arrobas Total 1758 107 302$465 1759 3.702 9.574$171 1760 2.037 7.789$873 1761 11.625 47.381$319 1762 3.731 13.752$913 1763 2.603 10.117$313 1764 973 4.168$960 1770 1.736 6.851$747 1771 3.040 12.203$000 1772 4.807 15.034$775 1773 1.880 7.597$765 1774 1.200 4.756$695 1775 2.612 10.322$798 1776 2.200 8.520$764 1777 3.450 10.356$184 1778 1.690 5.331$038 1779 3.222 13.549$254 1780 1.585 6.816$935 1781 2.116 9.035$783 1782 472 2.298$046 1783 100 661$486 1848 2.067 12.868$910 ......... ........ ............ Total 56.955 219.292$194 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.237. 112 Quadro H: Produção de Óleo de Copaíba no Pará: período 1759-1792 Anos Canadas Total 1759 1.255 2.124$853 1760 86 233$774 1761 2.806 5.518$174 1762 2.051 5.223$277 1763 1.207 3.332$477 1764 497 1.511$383 1770 330 543$315 1772 55 89$422 1778 142 334$989 1779 232 783$757 1780 228 816$746 1781 296 1.054$035 1785 -- 1792 428 ........ ........ .......... Total 9.613 23.009$560 -1.1143$358 Fonte: Carreira, A. A Companhia Geral do Grão-Pará e Maranhão. São Paulo. Editora Nacional, 1988. p.240.