Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual

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Artigos de Reviso para Abril 2006, Neuroatual
NeuroAtual
Volume 3, número 6, 2007
NEUROLOGIA GERAL
Dr. Osvaldo M. Takayanagui
Essential tremor, deceptively simple... Nahab FB et al. Practical Neurol, 7: 222, 2007.
O tremor essencial é um distúrbio de movimento muito freqüente. É
caracterizado por abalos rítmicos dos braços em 95% dos casos, mas pode também
envolver tremor da cabeça (34%), língua e membros inferiores (30%), voz (12%) e face
(5%). Embora descrita como quadro benigno, cerca de ¾ dos pacientes apresentam
importante incapacidade e comprometimento da qualidade de vida.
Critérios diagnósticos
Critérios Essenciais
- Tremor bilateral das mãos e braços (mas não de repouso)
- Ausência de outros sinais neurológicos, com exceção do fenômeno de roda denteada
- Pode haver tremor de cabeça mas sem qualquer sinal de distonia
Critérios Secundários (presentes em >50% dos pacientes, esses critérios reforçam mas
não são necessários para o diagnóstico)
- Longa duração (>3 anos)
- História familiar positiva
- Responde ao álcool
Red flags (Cuidado !!!)
- Tremor unilateral, tremor nas pernas, rigidez, bradicinesia, tremor de repouso
- Distúrbio de marcha
- Tremor focal
- Tremor isolado de cabeça com postura anormal (balanço de cabeça)
- Início súbito ou rápido
- Estar tomando medicamento que possa causar ou exacerbar tremor
Os autores apresentam uma lista de medicamentos que podem causar tremor.
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Diagnóstico Diferencial
- Tremor fisiológico exacerbado
- Doença de Parkinson
- Tremor cerebelar
- Distonia
- Tremor psicogênico
- Tremor ortostático
- Doença de Wilson – menores de 40 anos
- Tremor (rubral) de Holmes
- Tremor neuropático
Os autores apresentam uma tabela descrevendo as características dos diferentes
tipos, freqüência e distribuição do tremor que podem auxiliar no diagnóstico diferencial.
Tratamento
O tratamento deve ser ajustado a cada paciente, de acordo com o nível de
incapacidade. Deve-se ressaltar que muitos pacientes procuram o atendimento médico
basicamente pela preocupação de terem uma doença neurodegenerativa, tal como a
doença de Parkinson. Para aqueles em que o tremor é leve e que não seja embaraçoso ou
limitante de suas atividades diárias, pequenas modificações, como a redução de cafeína
ou de nicotina, são suficientes. Para alguns que necessitam apenas esporadicamente,
especialmente em ocasiões especiais, uma pequena quantidade de álcool pode se
altamente eficaz, embora o efeito seja de breve duração (30-60 minutos). O propranolol
é também eficaz em situações em que o uso de álcool é inadequado ou contra-indicado.
Para os indivíduos com tremor moderado ou acentuado, existe uma variedade de
tratamentos, até mesmo procedimentos cirúrgicos.
Os medicamentos de primeira escolha são o propranolol e a primidona, sendo o
primeiro preferível por ser dose única diária e com menos reação colateral. O
propranolol, no entanto, não é recomendável aos pacientes com depressão, asma ou
diabete mellitus.
Aos que não respondem às drogas de primeira escolha, há um considerável
número de alternativas: gabapentina, topiramato, benzodiazepínicos (alprazolan,
clonazepan), nimodipina e até toxina botulínica. Nos casos incapacitantes e rebeldes à
medicação, a estimulação cerebral profunda do núcleo talâmico Vim tem se mostrado
eficaz e segura.
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Incidental findings on brain MRI in the general population. Vernooij MW et al. N
Engl J Med, 357: 1821, 2007.
A ressonância magnética do encéfalo tem sido cada vez mais utilizada tanto na
pesquisa como na prática clínica, com um contínuo desenvolvimento de seus recursos,
resultando numa maior freqüência de achados fortuitos. Estas anormalidades são
alterações previamente desconhecidas, de potencial relevância clínica, e detectadas de
forma inesperada e não relacionada aos propósitos do exame. A detecção de achados
incidentais apresenta várias implicações práticas e éticas, particularmente se os
participantes do estudo forem voluntários sadios. A importância clínica e a história
natural desses achados inesperados em indivíduos assintomáticos são desconhecidas e
podem
diferir
significativamente
das
anormalidades
similares
em
pacientes
sintomáticos. Há, até o momento, apenas um estudo populacional sobre a ocorrência de
achados fortuitos, cuja prevalência foi de 1,7%. Entretanto, as anormalidades vasculares
subclínicas não são geralmente classificadas como achados incidentais e sua prevalência
pode ser elevada na população idosa e ter um incremento com a idade. Os pesquisadores
objetivaram o estudo populacional da prevalência de anormalidades incidentais na
neuroimagem, incluindo alterações vasculares subclínicas, num estudo populacional
envolvendo 2000 participantes.
Este estudo prospectivo foi realizado em Rotterdam, Holanda, incluindo 2000
indivíduos com idade igual ou superior a 45 anos. Aqueles que aceitaram participar
assinaram um termo de consentimento que incluía um parágrafo sobre os achados
fortuitos da RM, com a opção de não ser informado sobre eventual resultado anormal.
No entanto, todos haviam concordado previamente que na presença de alguma alteração
que exigisse uma investigação mais acurada ou um tratamento seriam encaminhados
para especialistas apropriados.
A idade média da população estudada foi de 63,3 anos (45,7 a 96,7) e 52,4% do
sexo feminino.
Os achados fortuitos mais freqüentes foram infartos cerebrais assintomáticos em
7,2% dos indivíduos, aneurismas cerebrais em 1,8% e tumores primários benignos em
1,6%, entre os quais o meningeoma (0,9%), microadenoma pituitário (0,3%) e
schwanoma vestibular (0,2%). Houve a detecção de um possível tumor primário
maligno (glioma de baixo grau que não foi confirmado histologicamente) e outro de
múltiplas metástases num paciente que havia sido tratado de câncer pulmonar. O caso
5
que exigiu uma conduta mais urgente foi o de hematoma subdural crônico, de grande
dimensão, num indivíduo assintomático com antecedentes de traumatismo craniano leve
4 semanas antes da RM.
A prevalência de infartos cerebrais assintomáticos ascendeu com o aumento da
idade. A de meningeoma subiu de 0,5% entre 45 e 59 anos para 1,6% nos indivíduos
maiores de 75 anos. A prevalência de aneurisma não se modificou com a idade.
Lesões de substância branca tiveram seu volume aumentado com a idade mais
avançada (mediana de 1,8ml entre 45 e59 anos, 3,05ml entre 60 e 74 anos e de 7,74ml
entre 75 e 97 anos) e de forma mais dispersa.
Concluem os autores que os achados fortuitos na RM do crânio na população
geral são comuns, sendo os mais freqüentes os infartos cerebrais, aneurismas e tumores
primários benignos.
Computed tomography. An increasing source of radiation exposure. Brenner DJ et
al. N Engl J Med, 357: 2277, 2007.
Estima-se que nos Estados Unidos da América sejam realizados mais de 62
milhões/ano de tomografia computadorizada (TC), incluindo pelo menos 4 milhões em
crianças. Por sua natureza, a TC envolve maior dose de irradiação que os exames
convencionais de RX. Os autores analisam o número crescente de TC, tanto para fins
diagnósticos mas também no screening de indivíduos assintomáticos, as doses
associadas de irradiação e o potencial risco de desenvolvimento de câncer em adultos e
principalmente em crianças. Embora os riscos para um indivíduo isoladamente possam
não ser grandes, a crescente exposição da população à radiação pode se tornar um
problema de saúde publica no futuro.
Chama ainda a atenção que cerca de 1/3 dos exames de TC é realizado sem
necessidade de ordem médica. Assim, provavelmente 20 milhões de adultos e mais de 1
milhão de crianças têm sido irradiados desnecessariamente nos Estados Unidos,
anualmente.
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Corticosteroids for acute bacterial meningitis. Greenwood BM. N Engl J Med, 357:
2507, 2007.
A morte e seqüelas duradouras são conseqüências freqüentes na meningite
bacteriana aguda, especialmente nos países em desenvolvimento, mesmo com a
administração de potentes antibióticos. Desta forma, a procura por uma melhor
evolução clínica não depende do desenvolvimento de novos medicamentos mas sim das
medidas que atenuem a agressão causada antes da morte da bactéria. Algumas dessas
lesões são causadas pelas toxinas bacterianas, mas os dados experimentais mostram que
a resposta inflamatória do hospedeiro, induzida por produtos bacterianos, está também
envolvida. Assim, há forte embasamento teórico para a idéia de que as drogas
antiinflamatórias devam melhorar a evolução da meningite bacteriana. Entretanto, até o
momento não está totalmente claro que esta conduta seja estabelecida.
Há atualmente um consenso, baseado mais nos resultados de meta-análise que
em ensaios individualizados e definitivos, de que, nos países industrializados, a
administração de dexametasona a crianças com meningite por Haemophilus influenzae
do tipo b antes do início da antibioticoterapia reduz a incidência de seqüelas,
especialmente de surdez. O efeito da dexametasona em meningites de outras bactérias é
mais incerto. De qualquer modo, a administração de dexametasona é agora amplamente
aceita como prática usual nas crianças dos países industrializados. Há evidências,
fundamentalmente de um estudo multicêntrico europeu, de que a dexametasona melhora
também a evolução em adultos de países industrializados. Essas conclusões seriam
também válidas nos países em desenvolvimento, onde a meningite bacteriana é muitas
vezes mais prevalente que naqueles mais ricos?
Corticosteroids for bacterial meningitis in adults in sub-Saharan Africa.
Scarborough M et al. N Engl J Med, 357: 2441, 2007.
Este estudo randomizado, duplo-cego, controlado com placebo envolveu 465 pacientes
maiores de 16 anos de idade, 90% deles infectados pelo HIV, sendo que além de
ceftriaxona, 233 receberam dexametasona e 232 placebo. A taxa de letalidade geral após
40 dias foi elevada (54%) e não diferiu significativamente nos pacientes que receberam
dexametasona (56%) em relação aos do grupo placebo (53%). Das mesma forma, a taxa
de incapacidade ou de óbito ou de perda auditiva após 1 mês, ou de morte após 6 meses
não foi diferente nos dois grupos.
Dexamethasone in Vietnamese adolescents and adults with bacterial meningitis.
Mai NTH et al. N Engl J Med, 357: 2431, 2007.
7
Esta pesquisa randomizada, duplo-cega, controlada com placebo, envolvendo 435
pacientes maiores de 14 anos de idade realizada em Ho Chi Minh, Vietnan, revelou que,
no geral, não houve diferença significativa na evolução dos pacientes recebendo ou não
dexametasona, embora tenha havido uma tendência a favor daqueles que receberam o
corticosteróide. Um mês após, a mortalidade foi de 10% no grupo tratado com
dexametasona e de 12% no controle. Entretanto, quando a análise foi restrita aos casos
com infecção bacteriana comprovada, foram observadas diferenças na mortalidade nos
grupos após 1 mês de tratamento e na taxa de incapacidade ou morte após 6 meses. A
surdez foi significativamente reduzida no grupo tratado com dexametasona.
Como explicar as conclusões divergentes entre esses 2 trabalhos? Seria pela
elevada prevalência de infecção pelo HIV no estudo africano? Quais são as conclusões
práticas dos resultados desses 2 trabalhos? Parece não haver forte justificativa para o
uso de corticosteróide na África. No Vietnan, há agora boa evidência de que, como na
Europa, a dexametasona seja útil no tratamento de adultos com meningite bacteriana
comprovada e esta conclusão seria também aplicável aos demais países do sudeste
asiático. Nos demais países em desenvolvimento, tal como na Índia, há insuficiência de
dados para fundamentar uma decisão. Na América do Sul, os resultados de um estudo
multicêntrico recente (Adjuvant glycerol and/or dexamethasone to improve the
outcome of childhood bacterial meningitis: a prospective, randomized, doubleblind, placebo-controlled trial. Peltola H et al. Clin Infect Dis, 45: 1277, 2007)
sugerem que a dexametasona é ineficaz em crianças com meningite bacteriana aguda e
que o glicerol, administrado isoladamente ou com dexametasona, protege contra graves
seqüelas neurológicas.
O debate sobre o benefício de corticosteróides na meningite bacteriana
prosseguirá. Entretanto, é provável que nos países em desenvolvimento, o uso de
corticosteróides ou de outros medicamentos adjuvantes desempenhará apenas um papel
marginal na sobrevivência. O objetivo deve ser a prevenção das infecções mais
devastadoras, associadas com elevada morbidade, através da utilização mais ampla de
vacinas conjugadas.
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Epilepsy. Accuracy of patient seizure counts. Hoppe C et al. Arch Neurol, 64: 1595,
2007.
O tratamento da epilepsia visa o controle de crises e os pacientes são solicitados
a manter um diário das crises. Assim, a moderna epileptologia depende, em larga escala,
da suposição de que as informações fornecidas pelo paciente sejam válidas e confiáveis.
Dois estudos prévios confirmaram a consistências das informações dos pacientes.
Entretanto, a contagem das crises não é uma medida subjetiva e deve ser comparada aos
dados objetivos obtidos do monitoramento de EEG. Alguns estudos anteriores
mostraram que a maioria dos pacientes não documenta cerca da metade de suas crises.
Esta pesquisa teve o objetivo de avaliar o impacto do tipo de crise, estado de
alerta, lado e local da lesão ou atividade focal no EEG, medicação antiepiléptica e
desempenho cognitivo na falha das informações dos pacientes a respeito das crises.
É um estudo prospectivo envolvendo 91 pacientes consecutivos, internados na
Unidade de Monitoramento de Video-EEG.
De um total de 582 crises registradas, houve falha de constatação pelos pacientes
de 55,5% dos episódios, sendo 73,2% de crises parciais complexas, 26,2% parciais
simples, 41,7% tônico-clônicas secundariamente generalizadas, 85,8% das crises
ocorrendo durante o sono e 32% durante a vigília. O lado esquerdo do foco
eletrencefalográfico ou da lesão, mas não o local (frontal ou temporal), contribuiu para a
falha documental.
Concluem os autores que a contagem de crises pelos pacientes não é plenamente
válida. O relato de estar totalmente livre de crises pode necessitar uma avaliação
objetiva (por exemplo, para a condução de veículos). O número subestimado de crises é
resultante mais do distúrbio pós-ictal de consciência que do descuido do paciente.
Non-infectious fever in the neurological intensive care unit: incidence, causes and
predictors. Rabinstein AA et al. J Neurol Neurosurg Psychiatry, 78: 1278, 2007.
De 25% a 50% dos pacientes admitidos em Unidades de Terapia Intensiva
Neurológica (UTIN) desenvolvem febre. As infecções representam a causa mais
freqüente de febre, mas são comprovadas em apenas metade dos casos. A febre de
origem central, relacionada à perda da regulação fisiológica da temperatura corporal
pelo hipotálamo, é considerada uma possível causa de febre persistente nos pacientes
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neurológicos sem qualquer evidência de infecção. Não há, no momento, meios de
confirmar o diagnóstico de febre de origem central.
O estudo envolveu todos os pacientes admitidos por mais de 48 horas na UTIN
do Hospital Jackson Memorial, em Miami, de Junho de 2004 a Abril de 2005. Do total
de 93 pacientes que apresentaram febre, 31 pacientes (33%) não tinham infecção
associada. Em 4 destes, as prováveis causas de febre não infecciosa foram abstinência
etílica e intoxicação por fenitoína. Assim, no total, 27 pacientes (29%) foram
considerados como tendo febre inexplicada, não infecciosa.
Os pacientes com traumatismo crânio-encefálico tendiam a apresentar mais
freqüentemente febre infecciosa (52% vs. 36%; p = 0,06), enquanto a febre não
infecciosa predominou naqueles com hemorragia subaracnóide (HSA) (48% vs. 18; p =
0,01).
A febre teve início mais precocemente nos pacientes sem evidência de infecção
(média 2,6 dias vs. 4 dias; p = 0,007). De fato, o início da febre nas primeiras 72 horas
de admissão na UTIN esteve associado com resultados negativos na investigação de
possível infecção (p = 0,02). A análise multivariada confirmou que a HSA e o início da
febre nas primeiras 72 horas estiveram fortemente associados com febre não infecciosa.
Como a febre agrava a evolução clinica da HSA, os autores recomendam a
instituição precoce e agressiva de medidas de resfriamento (procedimentos de
hipotermia superficial ou intravascular).
Randomized trial of IV dexamethasone for acute migraine in the emergency
department. Friedman BW et al. Neurology, 69: 2038, 2007.
Não está ainda claro se os corticosteroides são úteis no tratamento da enxaqueca.
Os autores investigaram a eficácia de 10 mg de dexametasona EV como tratamento
adjuvante no atendimento de pacientes com enxaqueca aguda num serviço de
emergência.
Através de um estudo multicêntrico, randomizado, duplo-cego, controlado com
placebo, os autores analisaram 205 pacientes que receberam metoclopramida EV, com
ou sem dexametasona 10 mg EV, distribuídos ao acaso.
O desfecho de alívio persistente da dor foi observado em 25% dos pacientes que
receberam dexametasona e em 19% daqueles do grupo placebo (p = 0,34). Ausência de
10
comprometimento pós-alta ocorreu em 67% dos que receberam dexametasona e 59% do
grupo placebo (p = 0,20). No subgrupo de pacientes com dor persistente por mais de 72
horas, 38% dos que receberam dexametasona apresentaram melhora duradoura, contra
13% daqueles do grupo controle (p = 0,06).
Concluem os autores que a dexametasona não deve ser administrada
rotineiramente nos serviços de emergência no tratamento de enxaqueca aguda, embora
possa ser útil naqueles pacientes com dor persistente por mais de 72 horas.
Endovascular treatment of acute ischaemic stroke. Janjua N et al. Lancet Neurol, 6:
1086, 2007.
A ênfase do tratamento do acidente vascular cerebral (AVC) agudo nas duas
últimas décadas tem sido dirigida na revascularização. O tratamento endovascular é uma
alternativa muito promissora para os pacientes inelegíveis para a terapia trombolítica
intravenosa; entretanto, seu emprego é limitado pela existência de poucos ensaios
randomizados e pelo número restrito de neurointervencionistas preparados. Embora os
dados estejam ainda sendo coletados, tem havido enorme progresso. Esta é uma
excelente revisão dos principais trabalhos sobre o tratamento endovascular, mostrando
ser este uma opção válida para os pacientes não elegíveis para a terapia trombolítica.
Adicionalmente, the American Heart Association (AHA) incluiu em 2007 a trombólise
intra-arterial local como uma opção terapêutica para pacientes com oclusão da artéria
cerebral média por menos de 6 horas (evidência classe I) em centros com
intervencionistas habilitados e treinados neste tipo de procedimento. A AHA também
lista o método como uma opção para aqueles não elegíveis ao tratamento trombolítico
endovenoso (evidência classe II).
Os autores propõem um excelente algoritmo para triagem de pacientes com
AVC para tratamento endovascular.
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Diagnosis of tuberculous meningitis: clinical and laboratory parameters. Bhigjee
AI et al. Int J Infect Dis, 11: 348, 2007.
A confirmação do diagnóstico de meningite tuberculosa (MT) tem sido
problemática. Embora a positividade do esfregaço e da cultura seja diagnóstica, estes
testes apresentam baixa sensibilidade. Os estudos com PCR têm fornecido resultados
divergentes.
Na tentativa de melhorar o diagnóstico de MT os autores avaliaram
prospectivamente as características clínicas, os métodos de coleta de amostras e uma
variedade de técnicas laboratoriais em pacientes com suspeita de MT: a- aumentando o
volume de LCR; b- testando amostras de LCR representativas das regiões lombar,
cérvico-torácica e base do crânio; c- emprego de diferentes primers para o PCR; drealizando o PCR em tempo-real.
Pacientes suspeitos de MT foram submetidos a punção do LCR com retirada de
3 amostras para esfregaço, cultura, PCR convencional e PCR em tempo-real. Foram
empregados 3 primers – IS6110, MPB64 e PT8/9. Os 68 pacientes do estudo foram
classificados retrospectivamente em 4 categorias de diagnóstico: “definitivo” (cultura
positiva) – 20 casos, “provável” (clínica e outros testes sugestivos de TB) – 24 casos,
“não TB” - 17 casos e “diagnóstico incerto” – 7 casos.
Quarenta e oito dos 57 (84,2%) submetidos ao teste de HIV apresentaram reação
positiva. O PCR IS6110 foi positivo em 27 pacientes que incluíam 18/20 casos com
cultura positiva, 6 no grupo provável, e 3 no não TB. Resultados semelhantes foram
obtidos com os primers MPB64 e PT8/9. O PCR em tempo-real foi positivo em 7 casos
adicionais. Combinando os resultados definitivos e prováveis de MT, a sensibilidade
dos ensaios de PCR foi de 70,5% (31/44) e a especificidade de 87,5% (21/24).
Concluem os autores que apesar do PCR em tempo-real ser mais sensível que o
PCR convencional, todos os métodos laboratoriais atualmente existentes apresentam
ainda sensibilidade demasiadamente baixa para exclusão fidedigna do diagnóstico
laboratorial de MT.
Clinicoradiological features of tuberculous meningitis in patients over 50 years of
age. Srikanth SG et al. J Neurol Neurosurg Psychiatry, 78: 536, 2007.
12
A população idosa está crescendo globalmente por causa da maior longevidade.
Estima-se que a incidência de tuberculose seja maior na população idosa que entre os
jovens. O diagnóstico é baseado nos achados clínicos, radiológicos e laboratoriais. As
clássicas alterações na tomografia computadorizada (TC) – reforço da base,
hidrocefalia, infartos e granulomas – são mais frequentemente observados nos pacientes
jovens. O objetivo do estudo foi analisar as características de TC nos adultos com idade
superior a 50 anos com meningite tuberculosa.
Foram analisados 53 pacientes da 6ª a 8ª décadas de vida com diagnóstico
clínico e laboratorial de meningite tuberculosa.
Os achados de TC foram conspícuos pela ausência das clássicas anormalidades.
O reforço meníngeo da base foi observado em apenas 2 pacientes; a hidrocefalia em 23
casos (leve em 16, moderada em 6 e acentuada em 1); a hipodensidade periventricular
em 7, com dilatação ventricular moderada ou acentuada; hipodensidade sem reforço por
infarto em apenas 2 casos (gânglios da base e lobo frontal, respectivamente) e lesões
com reforço, sugestivas de granulomas, em 4.
As anormalidades tomográficas da meningite tuberculosa na população idosa são
infreqüentes, atípicas e pouco contribuem para o diagnóstico.
Frequency of seizures and epilepsy in neurological HIV-infected patients.
Kellinghaus C et al. Seizure, 17: 27, 2008.
Crises e epilepsia não são raras nos pacientes infectados pelo HIV. O objetivo do
estudo é a investigação da freqüência de crises agudas e de epilepsia nos diferentes
estádios da infecção pelo HIV.
Dos 831 pacientes infectados pelo HIV atendidos num hospital da Alemanha, 51
(6,1%) apresentaram crises ou epilepsia. Três deles (6%) haviam sido diagnosticados
como tendo crises ou epilepsia antes da infecção pelo HIV. Quatorze outros (27%)
tiveram crises provocadas na instalação aguda de processos cerebrais agudos (4 casos),
abstinência de drogas ou de sono (2 casos) ou de origem indeterminada (4 casos). Trinta
e quatro pacientes (67%) desenvolveram epilepsia na evolução da infecção retroviral.
As causas mais freqüentes foram toxoplasmose (7 casos), leucoencefalopatia multifocal
progressiva (7 casos) e outras infecções agudas ou subagudas do SNC (5 casos).
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Concluem os autores que as crises são manifestações neurológicas importantes
da infecção pelo HIV e a maioria dos que apresentam crises desenvolve epilepsia,
requerendo tratamento medicamentoso específico.
The pupil. Wilhelm H. Curr Opin Neurol, 21: 36, 2008.
É um excelente artigo de revisão sobre a pupila como indicador da função visual ou
autonômica e de reações patológica. Abrange os seguintes tópicos: 1- células
ganglionares não atuantes na visão mas contribuindo para o reflexo pupilar; 2- avaliação
da sonolência por pupilografia; 3- diagnóstico e manejo da síndrome de Horner; 4causas autoimunes da pupila tônica.
14
CEFALÉIA
Drª. Célia Aparecida de Paula Roesler
Paroxysmal hemicrania-tic and Chiari I malformation: an unusual association.
Monzillo P. et al. Cephalalgia 27:1408, 2007.
A associação de hemicrania paroxística (HP) com neuralgia trigeminal (NT) foi
recentemente descrita e chamada de síndrome de hemicrania-tic paroxística. O estudo
de caso a seguir relata a associação da HP-tic e da malformação Chiari I.
Estudo de caso:
Uma mulher de 54 anos com história de severa dor orbital e temporo-parietal esquerda
há 3 anos relata episódios dolorosos de 2 a 20 minutos. A freqüência dos ataques era de
5 a 12 vezes por dia e os episódios eram acompanhados de ativação autonômica
ipsilateral moderada.
Seis meses após o aparecimento desses episódios, a paciente passou a apresentar um
outro tipo de dor, descrita como pontadas com duração de 1 a 2 segundos, afetando
somente as áreas do segundo e do terceiro pares do nervo trigêmeo.
Imagens de ressonância magnética cervical e do crânio revelaram uma extensa
siringomegalia cervical com seus limites superiores em C2 incluindo os núcleos da
espinha trigeminal. Não havia hidrocefalia, mas as tonsilas cerebelares haviam descido
até o canal espinal vertebral.
A paciente foi tratada inicialmente com carbamazepina e então gabapentina, mas os
sintomas só desapareceram com o uso de 250mg/dia de indometacina associado a
1000mg/dia de carbamazepina. Como a paciente respondeu ao tratamento usual tanto
para HP-tic e Chiari I, fica difícil dizer se há um mecanismo que realmente engloba
ambas as doenças ou se a associação ocorre meramente por acaso. Sua condição é ainda
15
acompanhada e espera-se que os achados desse estudo de caso contribuam para o
entendimento da HP-tic.
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NEUROLOGIA INFANTIL
Dra. Umbertina Conti Reed
Benign infantile convulsions associated with mild gastroenteritis: A retrospective
study of 39 cases including virological tests and efficacy of anticonvulsants.
Kawano G et al. Brain Dev 29:617, 2007.
Apesar de a literatura mostrar claramente que esta situação amplamente conhecida no
Oriente é rara nos países ocidentais, não existe nenhuma explicação concreta para isso.
Assim, devido à freqüência com que nos últimos anos têm-se diagnosticado infecções
por rotavirus em nosso meio, achei interessante alertar o pediatra e o neurologista para a
possibilidade de ocorrerem nestas circunstâncias crises não febris de caráter benigno.
Os autores analisam durante o período de seis anos 62 casos de crianças com média de
idade=19.7 meses que apresentaram crises afebris durante processo infeccioso
gastrintestinal, excluindo os pacientes que manifestaram sinais encefalíticos e
encefalopáticas ou que tinham história de epilepsia. A sorologia foi positiva para
rotavirus em 30 casos, norovirus em 9, sapovirus em 2, adenovirus em 2, coxackievirus
A4 em um, não foi investigada em 16 e não foi conclusiva em 4. Em relação às crianças
com rotavirus as crises ocorreram em média entre o segundo e o quarto dia de doença
manifesta, mostraram um índice de freqüência de crises ou de surtos de crises de
2.8 ± 1.3 e uma duração da manifestação convulsiva de 4.9 ± 5.7 horas em média. Em
todos os pacientes o EEG interictal e a neuroimagem foram normais. Dos 26 pacientes
com rotavirus que puderam ser avaliados quanto à eficácia da terapêutica observou-se
que 7 não tiveram novas crises após o episódio inicial e dos 19 em que as crises se
repetiram, a droga que mostrou-se mais eficaz foi a carbamazepina (CBZ), seguida por
fenobarbital e, finalmente hidantoinatos. A maioria dos pacientes apresentou crises
tônico-clônicas ou tônicas generalizadas que ocorreram em surtos com duração de
vários minutos, sendo difícil precisar se as crises foram generalizadas primárias ou
parciais que generalizaram. Embora se trate evidentemente de crises sintomáticas
benignas a literatura oriental mostra ser comum a refratariedade ao tratamento. O
emprego de CBZ parece ser a melhor opção e alguns autores especulam se o fato de a
droga agir como bloqueador do influxo neuronal de sódio não sugeriria que possa existir
17
uma predisposição genética semelhante à observada em alguns pacientes com quadros
convulsivos familiares benignos durante a infância, associados aos quais já foram
identificadas alterações dos canais de sódio.
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DOENÇAS DO NEURÔNIO MOTOR/ELA
Dr. Mário Emílio Dourado Jr.
O diagnóstico precoce da ELA é difícil e retardado devido ao inicio focal e
gradual dos sintomas e a ausência de um único teste laboratorial específico para a
confirmação. Entretanto, a cada ano que passa vem se tornando cada vez mais
importante o diagnóstico correto e precoce da doença. Espera-se uma melhor resposta
ao tratamento com a utilização de drogas neuroprotetoras na presença de um grande
número de neurônios ainda sobreviventes, ou seja, numa fase bem precoce.
O diagnóstico de ELA requer a demonstração da presença de sinais de
envolvimento do neurônio motor superior ao lado de sinais de comprometimento do
neurônio motor inferior, de caráter progressivo e que envolva as quatro regiões
anatômicas do corpo: crânio-bulbar, cervical, torácica e lombo-sacra.
O critério revisado de El Escorial, também chamado de Critério de Airlie House,
é dividido em quatro graus de certeza (tabela 1).
O exame eletroneuromiográfico assume grande importância quando é capaz de
demonstrar a presença do envolvimento do neurônio motor inferior (NMI) em regiões
clinicamente comprometidas ou em regiões clinicamente não comprometidas.
Tabela 1: Critérios El Escorial Revisado
ELA clinicamente definida
• Sinais NMS e NMI em três regiões
ELA clinicamente definida – apoiada por laboratório
• Sinais NMS e⁄ou NMI em uma região e o paciente é portador de mutação
genética
ELA clinicamente provável
• Sinais NMS e NMI em duas regiões com sinas NMS rostral aos sinais NMI
ELA clinicamente provável com apoio laboratório
• Sinais NMS em uma ou mais região e sinais NMI definido por EMG em ao
menos duas regiões
ELA clinicamente possível
• Sinais de NMS e NMI em uma região
• Sinais de NMS em duas regiões
• Sinais NMS e NMI em duas regiões com NMS não rostral ao NMI
19
NMI: neurônio motor inferior; NMS: neurônio motor superior.
Baseado no critério El Escorial o estudo eletroneuromiográfico torna-se limitado
para o diagnóstico da ELA na medida em que solicita demonstrar num determinado
músculo a presença de sinais agudos de desnervação (fibrilação e/ou onda positiva),
mais sinais crônicos de desnervação/reinervação (potenciais de unidades motoras de
duração aumentada, instáveis e com padrão interferencial rarefeito). Não é raro
encontrarmos, na nossa prática diária, pacientes com ELA que não apresentam sinais
agudos de desnervação.
Electrodiagnostic criteria for diagnosis of ALS. Carvalho M et al. Clinical
Neurophysiology xxx (2007) xxx–xxx.
Um grupo de neurofisiologistas clínicos, incluindo Mamede Carvalho, Jun
Kimura, Michael Swas entre outros, reuniram-se em Awaji-Shima, Japão, em dezembro
de 2006, num simpósio internacional patrocinado pela Federação Internacional de
Neurofisiologia Clínica para estabelecer um consenso sobre a eletroneuromiografia no
diagnóstico da ELA. O objetivo era determinar como a neurofisiologia seria utilizada
eficazmente para facilitar o diagnóstico precoce da ELA.
O grupo de Awaji considera que as alterações eletrofisiológicas encontradas
num determinado músculo tem o mesmo valor dos sinais clínicos de envolvimento do
neurônio motor inferior. Sendo assim, numa mesma extremidade, as anormalidades
necessárias para o diagnóstico de ELA podem ser detectadas tanto pela clínica como
pelo estudo eletroneuromiográfico. Com essa interpretação torna-se redundante a
categoria de ELA provável com apoio de laboratório. No consenso, se reafirma os
princípios gerais do critério de quanto às recomendações para o diagnóstico da ELA. O
estudo eletroneuromiográfico, condução nervosa e EMG com agulha, é fundamental
para excluir doenças que mimetizem a ELA.
Os autores sugerem que a presença de fasciculação, complexa e instável, num
músculo com sinais neurógenos crônicos tem a mesma importância para o diagnóstico
da ELA do que a presença ondas positivas e fibrilação (desnervação aguda).
Os autores enumeram os critérios de alterações neurógenas através da EMG com
agulha para o diagnóstico de ELA: 1) alterações crônicas: a) potencias de unidades
motoras (P.U.M.) com aumento da amplitude e da duração, habitualmente polifásicos;
20
b) redução do recrutamento de unidades motoras, definido como um disparo rápido de
poucas unidades motoras (num músculo com envolvimento predominante do neurônio
motor superior isso pode não ser observado); c) P.U.M. instáveis e complexos (filtros de
500Hz a 5KHz); 2) na ELA fibrilação e onda positiva são encontrados normalmente em
músculos fortes e não atróficos; 3) na presença de alterações crônicas na ELA, as
fasciculações, preferencialmente de morfologia complexa, são equivalentes as
fibrilações e ondas positivas em seu significado clínico.
No trabalho os autores citam a importância de examinar através da agulha
músculos não comumente estudados (reto abdominal, paravertebral torácico,
mastigatórios, língua, facial) para demonstrar o envolvimento adicional de outra região.
Quanto ao estudo de condução nervosa, os autores recomendam como critério de
presença de bloqueio da condução motora a redução da área proximal X distal de <50%
quando a amplitude distal for > 1mV; a duração proximal for <30% da distal também
sugere BC; na ELA a latência distal motora e a duração devem ser <150% do normal.
Com a aplicação dessas recomendações as categorias diagnósticas seriam: ELA
definida clinicamente, ELA clinicamente provável e ELA clinicamente possível (tabela
2).
Tabela 2: Recomendações do grupo Awaji. Categorias para o diagnóstico.
ELA clinicamente definida
•
Evidência clínica ou eletrofisiológica de envolvimento do NMI e NMS em
região bulbar e ao menos dois segmentos espinhais; ou presença sinais de
envolvimento do NMS e NMI em três regiões espinhais.
ELA clinicamente provável
•
Evidência clinica ou eletrofisiológica de envolvimento do NMI e NMS em pelo
menos duas regiões com envolvimento do NMS acima do NMI.
ELA clinicamente possível
•
Evidência clínica ou eletrofisiológica de envolvimento do NMS e NMI em uma
região; ou sinais NMS em duas ou mais regiões; ou sinais NMI são detectados
acima do NMS. Exclusão de outros diagnósticos através de estudos de
neuroimagem e de laboratório.
21
Em resumo, as duas principais recomendações foram a incorporação dos sinais
eletrofisiológicos de disfunção do NMI de igual valor aos sinais clínicos nas categorias
diagnósticas e, a outra, a presença de fasciculação como equivalente aos sinais de
desnervação aguda (fibrilação e onda positiva). Espera-se com essas sugestões,
aumentar a sensibilidade para o diagnóstico sem comprometer a especificidade.
22
NEUROIMUNOLOGIA
Dr. Marcos Moreira
Optic neuritis and multiple sclerosis. Plant GT. Curr Opin Neurol, 21:16, 2008.
O autor enfatiza que a abordagem da neurite óptica (NO) sofreu grande avanço nos
últimos anos. A descoberta do anticorpo da neuromielite óptica (NMO) em 2004
auxiliou no reconhecimento de casos de NO não associados a esclerose múltipla (EM).
Mais precocemente, na década de 70, a descoberta da latência prolongada do potencial
evocado visual (PEV) possibilitou que a NO seja utilizada como modelo para os efeitos
da desmielinização na EM. Mais recentemente, a quantificação da diminuição da
espessura da camada de fibras nervosas da retina através da tomografia de coerência
óptica possibilitou que a neurite óptica se tornasse um modelo de perda axonal na
esclerose múltipla.
Somente cerca de 5% dos pacientes com neurite óptica terão um comprometimento
visual mais grave. Uma análise dos dados coletados do Optic Neuritis Treatment Trial
(ONTT) tem considerado a possibilidade de pacientes com um prognóstico visual
desfavorável serem selecionados na apresentação inicial dos sintomas ou precocemente
no curso da doença. As medidas de sensibilidade ao contraste, acuidade visual e de
campimetria visual na linha de base foram fracos preditores do desfecho visual após seis
meses (os resultados obtidos após um mês do início dos sintomas foram mais úteis). O
autor conclui, então, que a função visual pode ser bastante afetada nos primeiros dias do
início dos sintomas evoluindo com boa recuperação, mas se a recuperação não é
verificada dentro de um mês o prognóstico para o desfecho visual não será muito bom.
A questão do risco de EM em pacientes adultos com NO bilateral simultânea tem sido
analisada. Em um estudo que analisou 11 pacientes houve um bom prognóstico para
recuperação visual e nenhum evento neurológico após um ano de seguimento.
O autor acredita que há formas de NO recorrentes isoladas que não estão associadas
com a NMO nem com a EM, o que possibilitará o aparecimento de outros auto-
23
anticorpos. Ele enfatiza que todo futuro estudo terapêutico em esclerose múltipla deverá
incluir a quantificação da diminuição da espessura da camada de fibras nervosas da
retina através da tomografia de coerência óptica (TCO) como uma medida de desfecho.
Azathioprine. Safety profile in multiple sclerosis patients. La Mantia L et al. Neurol
Sci, 28:299, 2007.
A azatioprina (Aza) tem sido utilizada no tratamento da esclerose múltipla (EM) desde
1971 e continua a ser prescrita em muitos centros de referência em EM, tornando-se a
droga imunossupressora mais frequentemente prescrita após o mitoxantrone (62 vs.
71%). Dados recentes sugerem que a Aza é eficaz na redução da carga lesional na
imagem pela ressonância magnética (IRM) e em pacientes com EM refratários ao
tratamento com interferon. Além disso, uma recente revisão sistemática de estudos
clínicos randomizados avaliando a eficácia da Aza na EM mostrou que o tratamento
reduz atividade clínica da doença por 1 a 3 anos. O índice terapêutico da Aza sobre
outros imunossupressores é geralmente considerado favorável, mas algumas
preocupações sobre um possível risco de malignidade têm limitado seu uso.
Estudos clínicos controlados e observacionais publicados entre 1971 e 2007 foram
incluídos nesta revisão. Queixas gastrointestinais e leucopenia são os mais freqüentes
eventos adversos do tratamento com Aza na EM, ocorrendo em mais de 10% dos
pacientes. Infecções, alergias, anemia, trombocitopenia e pancitopenia são comuns (>
1% - < 10%). Pancreatite não é comum (> 0,1% - < 1%). A maioria destes eventos
adversos é facilmente corrigida com ajuste da dosagem ou interrupção do tratamento.
Os dados de literatura são sugestivos para uma relação tempo-dose entre Aza e risco de
câncer. Lhermitte et al., em 1984, ressaltou uma alta incidência de epiteliomas em
pacientes com EM após cinco anos de tratamento com Aza (10/131 tratados vs. 4/131
não tratados); estudos subseqüentes mostraram nenhum risco após 3-4 anos de
tratamento. Confavreux e cols encontraram um aumento no risco de câncer após cinco e
10 anos de tratamento contínuo e doses cumulativas > 600g. Tumores sólidos são mais
comumente observados. Nos últimos quatro anos, cinco casos de ocorrência tardia de
24
síndrome mielodisplásica e subseqüente transformação leucêmica foram descritos sendo
possivelmente relacionados com a dose cumulativa e duração do tratamento.
Nenhum dado sobre toxicidade reprodutiva em esclerose múltipla foi encontrado na
literatura. Contudo, em outras doenças não neurológicas, Aza não parece afetar
adversamente a fertilidade.
Os autores concluem que o perfil de segurança da Aza é aceitável se estratégias de
manuseio de eventos adversos são adotadas. Estes dados suportam a utilização da Aza
como terapia de segunda linha na esclerose múltipla.
25
MOLÉSTIAS INFECCIOSAS
Dr. Marcus Tulius T. Silva
Longitudinally preserved psychomotor performance in long-term asyptomatic
HIV-infected individuals. Cole MA et al. Neurology 69:2213, 2007.
Neste estudo longitudinal de uma das coortes de indivíduos infectados pelo HIV
mais bem estudadas no mundo (MACS – Multicenter AIDS Cohort Study), Cole e
colaboradores mostraram que o desempenho cognitivo de indivíduos assintomáticos
portadores do HIV não declina ao longo do tempo, desde que estes se mantenham com
supressão viral.
Sabe-se, desde o início da epidemia, que a demência pelo HIV acomete um
subgrupo de pacientes com AIDS avançada, fato este muito marcante na era pré-terapia
antiretroviral combinada. Há especulações sobre a possibilidade de lesões cerebrais
resultando em déficit cognitivo naqueles indivíduos com infecção crônica pelo HIV – e
conseqüentemente exposição perene no SNC de antígenos virais, citocinas inflamatórias
ou macrófagos ativados – mas com supressão viral no sangue periférico. Estes autores
mostraram que em 5 anos de avaliação neuropsicológica periódica com dois testes de
rastreio sensíveis para déficits cognitivos mínimos (teste de trilhas e teste de
substituição de símbolos por dígitos) não houve declínio em nenhum dos três grupos de
assintomáticos estudados em comparação a uma população negativa para o HIV (N
237). Estes três grupos foram compostos por indivíduos em uso de terapia antiretroviral
com doença pelo HIV de longo curso e não-progressiva (N 29), indivíduos em uso de
terapia antiretroviral e carga viral indetectável por longo tempo (N 83) e indivíduos que
nunca tiveram doença pelo HIV ou CD4 abaixo de 200 cels/mm3 (N 233).
Conforme dito anteriormente, além de não ter havido diferença inicial em
relação aos controles negativo, não houve declínio da função cognitiva avaliada ao
longo do tempo. Estes achados têm implicação clínica, pois mostram que um
diagnóstico de infecção pelo HIV não necessariamente infere déficit cognitivo
inevitável no futuro. Os indivíduos assintomáticos que por ventura desenvolvem
declínio cognitivo são, na opinião dos autores, uma minoria não representativa da
população de infectados.
26
Embora bem estruturado este estudo apresenta algumas peculiaridades que
impedem, pelo menos teoricamente, sua extrapolação. A primeira consideração é que a
coorte MACS é composta exclusivamente por homens homossexuais. Neste estudo, a
escolaridade mínima dos participantes era de 12 anos, bem além da realidade de muitos
países, e quase todos os pacientes avaliados eram brancos. Estes fatores podem ter
influenciado positivamente na performance dos testes, sobretudo por terem utilizado
uma bateria extremamente breve que não avaliou outros domínios, tais como memória
de trabalho, memória verbal, etc... Fica, no entanto, o reforço da idéia de que pacientes
infectados pelo HIV com boa adesão ao tratamento podem conviver por longos anos
com a infecção sem desenvolver declínio cognitivo.
27
NEUROGENÉTICA
Dr. Renato Puppi Munhoz
Clinicopathological study of a SNCA gene duplication patient with Parkinson’s
disease and dementia Obi T et al. Neurology 70: 238, 2008.
Já não é novidade que mutações em ponto e multiplicações gênicas no gene da
alfa sinucleína (SCNA) têm um papel importante na formação de corpos de Lewy
(CLs). Estes por sua vez podem levar, por mecanismos ainda discutidos e não bem
claros, à neurodegeneração. A identificação de multiplicações da SCNA em famílias
com parkinsonismo sugere que a dosagem gênica de SCNA pode ter um papel na
doença de Parkinson (DP). O mecanismo responsável por estas alterações gênicas
parece estar relacionado a uma área frágil que inclui o lócus SNCA-MMRN1.
Do ponto de vista clínico, a maioria dos pacientes com triplicação de SNCA
descritos até o momento desenvolve disfunção cognitiva e autonômica em estágios
precoces da doença. Por outro lado, pacientes com duplicação de SCNA tendem a ter
um fenótipo menos agressivo que aqueles com triplicação. A idade de início ocorre em
média 15 anos mais tardiamente sugerindo que o número de cópias do gene pode
influenciar estas diferenças fenotípicas. Neste estudo os autores descrevem os achados
patológicos e clínicos num paciente com duplicação de SCNA. Estes mesmos autores
recentemente descreveram 2 famílias com esta alteração gênica (duplicação e 3 cópias
do lócus SNCA-MMRN1), incluindo no pedigree indivíduos com parkinsonismo de
difícil controle e demência. Um destes indivíduos foi levado à autópsia que mostrou
atrofia frontal discreta e despigmentação importante da substância nigra e lócus
ceruleus. À microscopia ficou demonstrado perda importante de neurônios melanínicos
e gliose da pars compacta da substância nigra. Outras áreas com gliose importante
foram o locus ceruleus, núcleo dorsal motor do vago, amigdala e núcleo basal de
Meynert. Havia ainda perda moderada de neurônios no hipocampo e CLs na substância
nigra, locus ceruleus, núcleo basal de Meynert, neurônios dos núcleos oculomotores, e
do núcleo dorsal motor do vago.
Este padrão de patologia é semelhante ao já descrito em pacientes com triplicação de
SCNA e os autores enfatizam ainda que a distribuição encontrada neste caso preenche
critérios patológicos para demência por corpos de Lewy. O ganho tóxico de função do
28
gene SCNA levando a expressão aumentada de alfa sinucleína pode explicar a presença
de CLs em várias áreas, não restritas à substância nigra.
Este estudo abre portas adicionais para o estudo da neurodegeneração na DP e sua
relação com sinais não motores como a demência e a disautonomia.
Fragile X-associated tremor/ataxia syndrome: clinical features, genetics, and
testing guidelines. Berry-Kravis E et al. Mov Disord. 22: 2018, 2007.
A síndrome do tremor-ataxia relacionada à premutação do X frágil (FXTAS) é uma
doença neurodegenerativa que se manifesta com a presença de tremor de ação, ataxia de
marcha e ocasionalmente parkinsonismo, disfunção cognitiva executiva, demência,
neuropatia e disfunção autonômica, geralmente com início tardio (>45 anos) e uma
alteração típica de neuroimagem por ressonância magnética: hipersinal em T2 no
pedúnculo cerebelar médio. FXTAS é causada por expansões intermediárias (55-200
repetições, premutação) do trinucleotídeo CGG no gene FMR1, o mesmo que causa a
síndrome do X frágil quando o número de repetições de CGG excede 200. A doença é
mais comum em homens, mas já foi descrita em diversas pacientes do sexo feminino. A
premutação em mulheres é uma causa já bem descrita de falência ovariana precoce.
Esta síndrome é provavelmente subdiagnosticada e esta revisão propõe orientações e
recomendações quanto á indicação do teste genético e seu aconselhamento, uma vez
diagnosticado.
De forma direta os autores indicam a testagem para:
1. Pacientes com ataxia idiopática de início tardio;
2. Tremor de ação idiopático associado a parkinsonismo ou déficit cognitivo;
3. Diagnóstico prévio da forma cerebelar de atrofia de múltiplos sistemas
4. Achado de alteração de neuroimagem típica no pedúnculo cerebelar médio em
paciente com os sinais clínicos de FXTAS;
5. História familiar de mutações no FMR1 em indivíduo com chance de apresentar
a mutação de acordo com o pedigree, se existirem sinais clínicos de FXTAS;
29
6. História familiar ou pessoal de infertilidade ou menopausa precoce em paciente
com sinais de FXTAS.
O aconselhamento genético por sua vez deve levar em consideração alguns pontos:
1. Todas as mulheres com a premutação têm risco de ter filhos com síndrome do X
frágil ou a mesma premutação, uma vez que a transmissão materna é instável e
pode ocorrer expansão;
2. Todas as filhas de pais com a premutação serão portadoras de premutação, uma
vez que a transmissão de pai para filha não tem o risco de expansão. Estas filhas
correm o risco de apresentarem futuramente falência ovariana precoce e de
terem filhos com síndrome do X frágil ou premutação. Esta é uma observação
importante uma vez que estas mulheres, sabendo ou não de sua premutação,
podem ter interesse em submeter-se a tratamentos caros e invasivos para
fertilização com risco de geração de filhos afetados.
3. Quando um homem com a premutação é identificado, é óbvio que sua mãe
também tem a premutação, logo vários outros familiares do paciente e de sua
mãe podem ter tanto a mutação completa quanto a premutação.
30
EPILEPSIA
Dr. Luiz Eduardo Betting
Dr. Fernando Cendes
Quantifying the response to antiepileptic drugs: Effect of past treatment history.
Schiller Y et al. Neurology, 70: 54, 2008.
Introdução: Aproximadamente dois terços dos pacientes com epilepsia apresentam
remissão das crises com o uso de drogas antiepilépticas (DAEs). É de grande interesse
para o tratamento clínico de pacientes com epilepsia predizer a resposta a introdução de
novas DAEs e prontamente identificar epilepsias farmacoresistentes. Neste estudo, os
autores tentam apresentar algumas respostas a estas questões.
Objetivos: Quantificar a resposta ao tratamento com DAEs em função da história
pregressa de tratamento. Com isso, os autores tentam identificar fatores prognósticos
adicionais com o objetivo de predizer a resposta a novos tratamentos medicamentosos.
Métodos: Neste estudo prospectivo, foram incluídos 429 pacientes (maiores de 12
anos) durante um período de 6 anos. 630 DAEs foram introduzidas. O tempo de
seguimento variou de 1,5 a 7,5 anos. Pacientes com suspeita de crises não epilépticas
(n=35) e que perderam o seguimento (n=14) foram excluídos. Dos 429 pacientes, 20%
estavam recebendo DAE pela primeira vez, 7% realizaram tratamento prévio que foi
interrompido devido a efeitos adversos, 22% não obtiveram resposta adequada no
primeiro e único tratamento realizado e 50% foram submetidos a dois ou mais
tratamentos prévios sem sucesso. Os pacientes foram classificados em: 37% epilepsia
parcial sintomática, 36% epilepsia parcial criptogênica, 18% epilepsia generalizada
idiopática, 8% classificação indeterminada ou epilepsia generalizada sintomática.
Resultados: A resposta a novas DAE administradas foi altamente dependente da
história pregressa de tratamento. As taxas de indivíduos livres de crises decresceram de
61% da primeira DAE para 41%, 16% e 0% após um, dois a cinco e seis a sete
tratamentos prévios ineficientes. Esta curva de resposta correspondeu a uma função
mono-exponencial. Os autores identificaram também, três fatores prognósticos
adicionais e independentes: tipo de epilepsia, duração da epilepsia e o número de crises
nos três meses antecedentes ao início da DAE.
31
Conclusões: Os autores concluem que a resistência às medicações é um processo
gradual
que
segue
um
curso
mono-exponencial.
Apesar
das
epilepsias
farmacoresistentes poderem ser diagnosticadas após o uso de duas DAE,
farmacoresistência absoluta requer a falha de até seis DAE uma vez que uma minoria de
pacientes (16%) pode ficar livre de crises com a adição de uma nova medicação mesmo
após a falha de duas a seis DAE prévias.
Progressive bone deficit in epilepsy. Sheth et al, Neurology 70: 170, 2008.
Introdução: Fraturas são 2-6 vezes mais freqüentes em pacientes com epilepsia quando
comparado com a população em geral. Entre os fatores envolvidos destaca-se a redução
da densidade mineral óssea relacionada às drogas antiepilépticas (DAEs). Este efeito é
mais notório em indivíduos com mais de 50 anos. O tratamento crônico com DAEs
pode estar associado a um aumento de duas a seis vezes a taxa de fraturas em pacientes
com epilepsia.
Objetivo: O objetivo deste estudo foi investigar a relação entre duração da epilepsia e
densidade óssea em crianças em tratamento com DAEs.
Métodos: Nesta avaliação foram estudadas 82 crianças com idade entre 6 e 18 anos
com duração de epilepsia estimada em: a) menos de um ano; b) de 1 a 5 anos e; c) com
mais de 6 anos. Os resultados dos pacientes foram comparados com 32 indivíduos
controle com idade média de 13 anos. A densitometria óssea corrigida para idade e sexo
foi medida em todos os indivíduos.
Resultados: Os valores da densitometria óssea total em crianças com epilepsia foi
menor do que os controles. A maior duração da epilepsia (acima de um ano) foi
associada com redução progressiva da densidade óssea em comparação com controles.
Conclusões: Crianças com tratamento para epilepsia apresentam déficit na densidade
óssea em comparação com controles. Esta diferença existe durante os primeiros 1-5
anos de tratamento e piora progressivamente. Esta redução da densidade óssea constitui
um fator adicional para o elevado risco de fraturas observado em pacientes com
epilepsia. Além disso, esta redução pode acelerar o processo de osteoporose relacionado
à idade. Contudo, permanecem em andamento estudos que tentaram responder quando
realizar a investigação nestes pacientes, bem como quais as melhores medidas
preventivas.