ha – texto – gombrich – introdução à história da arte

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ha – texto – gombrich – introdução à história da arte
FACULDADE DE ENGENHARIA E ARQUITETURA
CURSO DE ARQUITETURA
Disciplina: História da Arte
Profª Esp.Laile Almeria de Miranda
Texto Sonia Leni Chamon
INTRODUÇÃO À HISTÓRIA DA ARTE
PRIMÓRDIOS DO TEMPO
A Arte nasce com o Homem como instrumento de preservação e identidade.
Segmento estético da Cultura, a Arte surge impregnada da magia dos primeiros rituaismagia que permanece, resistindo ao tempo e à tecnologia ou, talvez, intensificando-se
com esta. Ao estudarmos a produção artística dos primeiros Homo Sapiens cai por
terra qualquer conceito de evolução nas artes – elas apenas se modificam, adequandose a novos contextos ou ajudando a criá-los. Veremos, nestes primeiros textos,
questões ligadas aos conceitos fundamentais da Arte, suas origens pré-históricas, suas
características intrínsecas, suas modificações ao longo do tempo. Esse Tempo
ambíguo, sinuoso, e surpreendente, o qual nos convida a viagens milenares; eterniza
momentos e pessoas e ainda evoca o Futuro, estabelecendo a nossa identidade – como
os primeiros Homo Sapiens.
O Tempo e a Arte
Ao optarmos por uma análise cronológica da História da Arte fazemos uma escolha
difícil – muitas vezes a Arte não cabe neste Tempo linear estabelecido por teóricos,
não respeita medidas padrão, esnoba movimentos e períodos específicos. No decorrer
deste curso teremos diversas demonstrações da autonomia da arte em relação às
normas históricas. O Renascimento, por exemplo, cuja data marco é 1453 (ano da
tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos) inicia-se para as artes em 1401,
com o concurso para as portas do Batistério de
Florença, ou ainda, 1416, ano em que
Brunelleschi realiza o projeto do zimbório da
Catedral de Santa Maria dell Fiore,
estabelecendo um novo método construtivo. Ou
a Pré-História, a qual deveria findar-se em
3.500 a.C. porém persiste bravamente no
decorrer dos séculos pelos povos não detentores
de escrita. Estas divergências temporais podem
parecer um problema – principalmente se
tentamos memorizar datas como marcos
estanques da História – mas na realidade nos
possibilita uma abrangência reflexiva. É muito
instigante quando percebemos que datas,
séculos e períodos são apenas facilitadores que
nos situam no espaço temporal, esta entidade
tão abstrata. Ou nem tanto assim...
Zimbório da Catedral de Florença( St. Maria del
Fiore). Brunelleschi
1
Os gregos antigos chamavam de Khrónos o Tempo e de Krónos o Titã, Saturno, para
os romanos. Apesar de a etimologia distinguir os dois termos, ambos ligam-se à
personificação mítica do tempo. Filho do Céu e da Terra, Krónos com uma foice
mutilou o pai, tomando o poder entre os deuses. Desposando Cibele, sua irmã, passou a
devorar cada filho gerado, por medo de ter seu poder usurpado. O último bebê, Zeus, foi
escondido pela mãe e ficou aos cuidados das ninfas da floresta até que, adulto, enfrentou
o próprio pai tornando-se o soberano dos deuses (FRANCHINI, 2007)
Goya: Saturno devorando o filho. 1819-1823. Museu do
Prado (Madri)
Quando Goya pinta o seu Saturno devorando o filho remete simbolicamente à
loucura humana responsável pela opressão e guerras em seus país, porém, no
contexto deste texto, é o lembrete de nossa condição humana, filha do Tempo, que
ininterrupta e impiedosamente é devorada por seu mentor. Sem perda de tempo,
vamos ao próximo tópico!
A Arte no Tempo: Quadro Cronológico da Arte Ocidental
A noção de História como registro de fatos marcantes é relativamente recente
(BAZIN,1989). A Antiguidade nos legou poucos relatos históricos. Heródoto, autor
grego, teria sido o iniciador da História, sendo seguido por outros até o final da Roma
antiga. O homem medieval não se considerava agente da história, esta estaria nas mãos
de Deus. Mesmo no renascimento carolíngio temos cronistas, não historiadores. Será
com Vasari, no Maneirismo (séc. XVI) que temos o início efetivo da História da Arte,
com o seu Vite (compêndio sobre as principais personalidades artísticas de seu
tempo). E sabemos o quanto este autor utilizou-se de criações, liberdades, bairrismos
e exageros para a formulação de seu livro. Será no Iluminismo, no século XVIII, que a
História da Arte é revista com método e conceituações, dando origem à Crítica de
Arte. Termos que foram cunhados nesta época mesmo com forte tendenciosidade, ou
mesmo preconceito, continuam a ser empregados hoje em dia e tornaram-se lugarescomuns.
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Levando-se em conta as ressalvas já feitas sobre as limitações impostas pela análise
cronológica da Arte, vale a pena conhecermos as divisões clássicas da História da
Arte, subdivididas em Idades e estabelecidas por datas-marco.
Eis um Quadro Cronológico simplificado da Arte Ocidental:
c. 3.500 a. C.
476 d. C.
1453
1789
PréHistória
Idade Antiga
Idade
Média
Idade
Moderna
Idade
Contemporânea
*Paleolítico
*Neolítico
*Idade dos
Metais
*Mesopotâmia
*Egito
*Grécia
*Roma
*Arte
*Paleocristã
*Arte dos
Bárbaros
*Arte
Bizantina
*Arte
Carolíngia
*Arte
Românica
*Arte
Gótica
*Renascimento
*Maneirismo
*Barroco
*Rococó
*Neoclassicismo
*Romantismo
*Realismo
*Impressionismo
*Pós
Impressionismo
*Arte Moderna1
*Arte
Contemporânea2
Invenção da
escrita
Queda do
Império
Romano
Tomada de
Constantinopla
Revolução
Francesa
A mera observação deste quadro, suas datas e movimentos artísticos já nos possibilita
muitas interpretações e análises. Podemos observar, por exemplo, a duração das
Idades e, em consequência, dos movimentos: a multimilenar Pré-História detém
apenas três estilos (neste caso, coincide o estilo como a nomenclatura das fases
civilizatórias do homem pré-histórico) – a manutenção das características estilísticas
é longa e permanece, fora do período, entre muitos povos sem escrita; já os breves
duzentos e poucos anos da Idade Contemporânea detém intermináveis ismos,
vanguardas, tendências, linguagens e afins, sobrepostos no tempo e no espaço, num
amálgama de nomes, conceitos e formas que corresponde de forma exata ao nosso
tempo
de
informações
velozes
e
mercados
vorazes.
Um tempo para a Arte – conceitos fundamentais
Para entendermos as modificações artísticas ao longo da História e apreciarmos cada
obra de arte é preciso conhecer os seus elementos formadores, seus suportes e
linguagens tornando-a legível em sua visualidade.
1
Entenda-se os movimentos artísticos: Art Nouveau, Expressionismo, Expressionismo Alemão,
Fauvismo, Cubismo, Futurismo, Suprematismo, Construtivismo, De Stijl, Bauhaus (escola e diretriz),
Escola de Paris, Dadaísmo, Surrealismo, entre outros.
2
Entenda-se os movimentos artísticos: Expressionismo Abstrato, Pop Art, Hiperrealismo, Op Art, Arte
Cinética, Arte Povera,, Arte Conceitual, Earth Art, Transvanguarda, Minimalismo, Body Art, entre
outros. Entenda-se, também, novas linguagens artísticas: instalação, intervenção, assemblage, objeto,
performance, multimídias.
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O conceito de forma aproxima-se da essência do ser, ligando-se ao conceito de techne
– capacidade de construção e manifestação de conhecimento inerente da coisa em si
(READ, 1981). Nas Artes Plásticas (noção de techne) os elementos formadores da
visualidade são: Ponto, Linha, Textura, Volume, Espaço, Cor. Com estes elementos
o artista cria a sua Composição Visual. A História da Arte pode ser vista como a
história das modificações visuais ocorridas nas obras de arte. Os teóricos que seguem
esta linha são chamados de Formalistas.
Matisse. Le joie de vivre. Fundação barnes,
Merion. 1906
Ênfase na linha e na cor
Kiefer: Terra entre dois rios,
(1995) Guggenheim Bilbao
Museoa, Bilbao
Ênfase no espaço e textura
Ao conjunto de assuntos que o artista utiliza para formular sua obra, ou ainda, à
narrativa visual, sobre a qual a obra de arte discorre dá-se o nome de tema.. Podemos
citar:
 Tema Histórico ou Heróico – O mais valorizado dos temas entre os séculos
XVIII e XIX, é considerado a somatória de todos os temas (retrato, paisagem
etc). Considerando o tema como algo genérico e assunto como o motivo
singular, podemos exemplificar O Grito do Ipiranga, de Pedro Américo como
tema Histórico ( e Heróico por suas características românticas – mas isto
iremos analisar mais para frente) e o ato da independência brasileira como
assunto.
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Pedro Américo. Independência
ou Morte , 1888
óleo sobre tela,
415 x 760 cm
Acervo do Museu Paulista (São
Paulo, SP)

Tema Bíblico ou Religioso – Cenas extraídas das narrativas bíblicas ou com
referência à imagens religiosas (cristãs ou não).
Os três homens na fornalha ardente
(Provavelmente séc. III d.C.) . Afresco da
catacumba de Priscila, Roma.

Tema Mitológico - Normalmente está ligado à mitologia clássica grecoromana, suas narrativas, divindades e referências.
Botticelli: O nascimento de
Vênus (1485). Uffizi, Florença.
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
Retrato – Reporta-se a alguém que existiu, mesmo que idealizado. Os retratos
anônimos ou “de” anônimos também são utilizados – porém têm forte carga
simbólica, fazendo referência a uma classe ou tipo de indivíduos.
Reynolds: Retrato de Miss Bowles com seu cão .(
1775) Wallace Collection, Londres.

Paisagem – normalmente representa os grandes ambientes externos. A palavra
inglesa landscape nos dá a noção do panorama, a qual liga-se a paisagem.
Cézanne: O Monte Saint Victoire (
1898-90). Ermitage (Former
Collection of Bernhard Koehler) St.
Petersburg, Russia

Natureza Morta – Refere-se às coisas inanimadas. Tem, na tradição pictórica,
o costume de ser objetos, frutas, flores ou animais, compostos sobre um apoio
(mesas, parapeitos, ou outros) em um local fechado.
Agostinho da Motta
Mamão e Melancia , s.d.
óleo sobre tela,
53,4 x 65 cm
Museu Nacional de Belas Artes
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
Pintura de Gênero – Cena do cotidiano, normalmente enfatizando uma ação
comum. Um dos grandes mestres da pintura de gênero é o barroco Vermeer.
Vermeer: A Leiteira. (c. 1660).
Rijkmuseum, Amsterdã

Abstração – Não necessariamente visto como um tema em seu sentido
narrativo, mas visualidade que não busca a representação do mundo real, é
extremamente antigo ( como as imagens estilizadas do Neolítico) e atual ( a
partir da Der Blauer Reiter, alemã). Pode ser geométrico ( linearidade retilínea
e formas extraídas da geometria) ou informal (apresenta a gestualidade do
artista, de forma expressiva).
Pollock: Olhos no calor (1946),
Coleção Peggy Guggenheim,
Veneza
Vamos finalizar este tópico abordando rapidamente as principais linguagens artísticas
que serão abordadas ao longo deste curso. Primeiramente, temos as Artes Plásticas,
que como foi citado, liga-se ao conceito grego de techne. É a forma visual que
responde por si própria, compreende várias linguagens em si, como desenho,
pintura, gravura, colagem relevo, entalhe, escultura; e as novas linguagens
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contemporâneas, como objeto, múltiplos, instalação, intervenção, assemblages,
performance, multimídias etc. Estes últimos, analisaremos melhor na última
unidade. Estudaremos, também, um pouco de Arquitetura que acompanha as Artes
Plásticas estilo por estilo, muitas vezes antecipando-as. Este curso ficaria realmente
interessante (e imenso!) se abordasse todas as linguagens artísticas, como Dança,
Teatro, Música, Literatura e Cinema. Na impossibilidade de tal empreendimento,
ficarão algumas dicas e inserções para dimensionarmos a grandeza e o gigantismo da
Arte, durante as nossas aulas.
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