o oráculo do presente do passado e do futuro bento serrano

Transcrição

o oráculo do presente do passado e do futuro bento serrano
O ORÁCULO DO
PASSADO, DO PRESENTE E DO FUTURO
OU O
Verdadeiro modo de aprender no passado a prevenir o presente e a
adivinhar o futuro
POR
BENTO SERRANO
ASTRÓLOGO DA SERRA DA ESTRELLA,
Onde reside há perto de trinta anos, sendo a sua habitação uma estreita
gruta que lhe serve de gabinete dos seus assíduos estudos astronômicos
OBRA DIVIDIDA EM SETE PARTES, CONTENDO CADA UMA O
SEGUINTE:
Parte primeira – O ORÁCULO DA NOITE
Parte Segunda – O ORÁCULO DAS SALAS
Parte Terceira – O ORÁCULO DOS SEGREDOS
Parte Quarta – O ORÁCULO DAS FLORES
Parte Quinta – O ORÁCULO DAS SINAS
Parte Sexta – O ORÁCULO DA MÁGICA
Parte Sétima – O ORÁCULO DOS ASTROS
PORTO
LIVRARIA PORTUGUEZA – EDITORA
55, Largo dos Loios, 56
1883
O ORÁCULO DO PRESENTE
DO PASSADO E DO FUTURO
BENTO SERRANO
Atualização e Revisão: L P Baçan
Londrina, agosto de 2014.
www.acasadomagodasletras.net
2012
PARTE PRIMEIRA
EXPLICAÇÃO
Para mais facilmente se compreender a definição dos sonhos
A explicação dos sonhos existe desde a mais remota antiguidade, existirá
mais ou menos desvairada enquanto o gênero humano não desaparecer da face
da terra, ou não for reduzido à condição dos animais irracionais.
É certo, porém, que o valor da significação dos sonhos vai desaparecendo
à medida que a ilustração esclarece o espírito dos povos e lhes mostra
claramente que as excitações nervosas, que todos sofremos, mais ou menos,
são a causa do cérebro produzir sonhos alegres ou tristes, segundo as
disposições físicas ou morais da pessoa que sonha.
Sonhos, sempre os houve e há de haver; notando-se, porém, que só os
povos rudes ou os ignorantes é que fazem caso da significação que os antigos
lhes atribuíram. As pessoas instruídas e de juízo sabem perfeitamente que as
venturas ou desgraças, que sucedem ao gênero humano, são predicados
inerentes à sua condição, não influindo nada para isso os sonhos ou fantasias
de ninguém.
O nosso intuito, publicando este Livro dos Sonhos, é unicamente mostrar
ao leitor o desvario da razão humana, e o que ele produz para induzir em erro
as pessoas nimiamente crédulas.
É possível que haja quem não pense como nós a respeito da significação
dos sonhos; para esses, que não pensam como nós, vamos aqui transcrever o
que outros têm dito acerca da classificação dos sonhos e seu valor; eis o que
eles dizem:
Há quatro espécies de sonhos, e, segundo a qualidade de cada um, se
denominam de diverso modo: – a primeira é o Sonho propriamente dito; a
segunda, a Visão; a terceira, o Pesadelo; a quarta, a Aparição.
O Sonho é aquele que, debaixo de certas figuras, nos apresenta a verdade
– como quando José interpretou a Faraó o sonho, que este tivera com sete
vacas gordas e outras sete magras.
A Visão é uma espécie de revelação, que, durante o sono, nos é feita por
algum espírito divino – como aconteceu a José, esposo da Virgem, e aos
Magos, quando escaparam à perseguição de Herodes.
O Pesadelo: é causado por afecções veementes, que atacam o cérebro,
quando dormimos, e encontram o espírito vigilante. Então o que nos
aconteceu durante o dia ocupa-nos igualmente de noite: quem se receia de
algum mau encontro, sonha que ele se verifica; o que teve alguma questão
acalorada questiona ainda dormindo; o avarento sonha com o seu tesouro; e o
que ceou regaladamente, sonha com os prazeres da mesa.
A Aparição não é mais do que um fantasma, criado pela imaginação dos
velhos e das crianças, que se afigura aos espíritos fracos.
Já se vê, pois, que destas quatro espécies de sonhos, só as duas primeiras
é que têm aparências de verdade; as outras duas são inteiramente falsas.
Cumpre advertir que os sonhos, de que não conservamos lembrança
alguma, nenhum valor têm; e quanto àqueles de que nos recordamos, para se
tomarem em consideração, devem ter lugar próximo ao dia, ou, ao menos,
depois da meia noite – porque, até essa hora, todos os sentidos e virtudes
corporais estão ocupados com a digestão.
A propósito dos sonhos e dos pesadelos eis o que se lê no Dicionário de
Medicina Popular de Chernoviz:
Sonho. – O cérebro nem sempre está em repouso completo durante o
sono. Muitas vezes, enquanto se dorme, produzem-se certos atos intelectuais
que se chamam sonhos. Estes sonhos, por muito tempo considerados como
atos sobrenaturais, avisos celestes ou anúncios do futuro, são o produto do
trabalho irregular do cérebro; e se as mais das vezes são estranhos, é porque,
tendo o sono feito cessar toda a vontade, as diversas ideias que se formam são
associadas como por acaso e com extraordinárias incoerências.
Ordinariamente os sonhos são relativos aos trabalhos, às paixões que ocupam
o individuo durante as vigílias, e que deixaram uma impressão no cérebro; o
sábio sonha com os seus estudos, o amante com o objeto da sua inclinação.
Mas podem também ser o resultado da imaginação ou da memória; uma
impressão apenas percebida pode ocasioná-los. Algumas vezes os sonhos
limitam-se à produção de ideias; mas outras vezes também são acompanhados
da ação que teria seguido naturalmente estas ideias; um move-se, fala; outro,
queixa-se; outro canta... Não é fácil impedir os sonhos.
O Pesadelo não compreende os sonhos penosos de toda a espécie;
designa-se mais particularmente por esta palavra um estado em que a pessoa
adormecida, julgando-se na iminência de um perigo, sente-se privada do uso
do movimento e da voz, quer para fugir ou repelir o ataque, quer para chamar
socorro. Estas sensações ilusórias são mui variadas: tais são uma queda num
abismo, a vizinhança de um incêndio, o ameaço de um assassínio, etc. Às
vezes o homem julga ver no seu sonho um monstro, um peso que lhe oprime o
peito e lhe tolhe a respiração. Logo que se pode fazer algum movimento, o
sonho desaparece e, ás vezes, ao despertar-se, existem palpitações e uma
fadiga geral.
As crianças, as mulheres e as pessoas idosas são mais sujeitas ao
pesadelo do que os adultos e os homens. Uma grande sensibilidade predispõe
para este incomodo. As histórias com que se amedrontam as crianças, os
terrores religiosos, pesares profundos e os excessos na comida, são causas
frequentes do pesadelo. Muitas vezes é ele produzido pela plenitude do
estômago.
Os meios para fazer cessar esta afecção dimanam naturalmente do
conhecimento das causas. Banir o medo, dissipar os terrores, procurar distrairse, usar de banhos, passeios, observar sobriedade, diminuir ou suprimir
totalmente a comida da noite, deitar-se do lado direito e com a cabeça elevada,
manter a liberdade de ventre: tais são os meios mais convenientes. Todas as
vezes que se puder, convém despertar a pessoa quando a perturbação da
respiração, a ansiedade do rosto, o suor do corpo, anunciarem que o pesadelo
se declara.
O que desejamos é que o leitor tenha sempre boas digestões, e, depois
delas, os sonhos que mais gratos lhe sejam à fantasia.
EXPLICAÇÃO DOS SONHOS
Segundo os cabalistas mais notáveis da antiguidade
A
Abandonado de um protetor: indica devassidão.
Abandonar seu estado: indica perda por má fé.
Abade. Veja-se Cura, Frade e Padre.
Abadessa de um convento: orgulho, malícia de que alguém será vitima.
Abelhas, para o cultivador: ganho e proveito. – Para as pessoas ricas:
desassossego, inquietação e cuidado. Se põem o mel em algum lugar da casa:
eloquência, dignidade, bom sucesso; mas perda para os inimigos da mesma
casa. – Tomá-las: ganho notório. – Matá-las: perda, ruína.
Abertura: alvor de esperança.
Abraçar parentes ou amigos: traição.
Abrigo, buscar um contra a chuva: pena secreta. – Durante a tempestade:
bons pressentimentos. – Achá-lo: miséria, desespero. – Contra inimigos. V.
Inimigos.
Absinto, bebê-lo: pena diminuta seguida de alegria extrema.
Abundancia: falsa segurança.
Abutre: doença longa, perigosa, e algumas vezes mortal.
Academia de sábios: aborrecimento, tristeza. – De jogo: engodo, engano.
Acesso em casa de um fidalgo: honra, proveito.
Aclamação. V. Regozijo.
Acusar alguém de um crime: tormento, inquietação.
Ator, Atriz. V. Comédia, Tragédia.
Adão e Eva: reconhecimento de criança, adoção.
Adoção de meninos: penas, contrariedades.
Adorar a Deus, seu pai e sua mãe: alegria, satisfação.
Adultério: escândalo, contendas futuras.
Afogado, ver um: triunfo de inimigos.
Agonia: perda de sucessão.
Agraço: justa segurança.
Água, vê-la bem clara: bom presságio para todo o dia. – Turva:
dignidade. – Bebê-la quente: perigo entre os inimigos. – Bebê-la fria: cuidado,
aflição.
Aguadeiro: tédio, fadiga.
Aguardente: sofrimentos, grande dores.
Águia, gerar uma: grandeza, prosperidade, fama para a criança que Há de
nascer. – Adejando no ar: bom sucesso nos projetos que cada um forma, e
especialmente no estado militar. – Voando sobre quem sonha: honras,
dignidades. – Montá-la, atravessar nela os ares: perigo iminente de morte para
a pessoa que a montou. – Morta: ruína de um fidalgo, fortuna de um plebeu. –
Caindo com a cabeça para baixo: morte do sonhador ou de algum seu parente.
Agulhas, tê-las alguém: inquietação. – Ser picado delas: desgraça
imprevista.
Alambique: inquietação, tormentos.
Aldeão, Aldeã: alegria, falta de cuidado.
Aldeia, perda de dignidades.
Alecrim: boa nomeada.
Alfaiate: infidelidade.
Alfinete, vê-lo: contradição.
Algemas: livramento, desembaraço.
Alho, sonhar alguém que vê alhos ou quaisquer ervas que cheiram mal:
contendas e revelações de coisas ocultas.
Almanaque: urgência de um proceder mais regular.
Alteração: sede ardente, V. Sede.
Amazona: mulher ambiciosa e pérfida.
Amêndoa, Amendoeira, ver amêndoas: significa riqueza. Comer-lhe o
fruto; denota dificuldade.
Amigos, rir com os seus: próxima ruptura.
Amoras, comê-las: desgosto, sofrimento, feridas.
Amoreira, ver uma ou muitas: fertilidade, abundância de bens e filhos.
Anão: ataque de inimigos fracos e ridículos.
Anchovas: boa fortuna.
Ancora de navio: probabilidade em suas esperanças.
Andorinha: honestidade da esposa ou noiva. – Vê-la entrar em casa;
notícias de amigos.
Animais, morrerem: fortuna. – Falar-lhes. V. Bestas. Falar.
Anjo ou santo, ver um: aviso de viver bem uma pessoa e arrepender-se;
aumento de honras e dignidades. – Voando para sua casa: consolação, alegria,
felizes novas.
Anel, dar um a alguém; significa dano, – Recebê-lo: denota segurança em
seus negócios.
Anzol: engano, abuso de confiança.
Apaziguar os gritos de um ente sofredor: violência, cólera próxima.
Aposento, sonhar que mora nele o tédio: tristeza.
Aqueduto: fortuna patrimonial.
Ar puro e sereno: amizade e estima de todos, reconciliação com inimigos,
descobrimento de furto ou casa perdida, vitoria sobre invejosos, ganho de
demanda, viagem feliz a empreender, numa palavra, todo o gênero de
prosperidades e triunfos. – Turvo, nebuloso, sombrio: tristeza, doença,
obstáculos, em suma, tudo ao contrário do sonho precedente. – Suave e
embalsamado pelas flores da primavera: vida pacífica, costumes brandos,
sociedades honestas e agradáveis, bom sucesso nos negócios, ou nas viagens.
Aranha: soma de dinheiro proporcional a sua gordura. – Tocá-la:
beneficio. – Matá-la: perda.
Areia: dúvidas, incerteza.
Arcebispo: aviso de morte.
Arco, atirá-lo destramente: consolação, honra.
Arco-íris da parte oriental: comodidade, riqueza, restabelecimento de
saúde. – Da parte ocidental: feliz presságio para os ricos, mau para os pobres.
– Sobre a cabeça de alguém ou perto de si: mudança de fortuna, perigo de
vida, ruína na família.
Arlequim, ver um: desgosto brevemente dissipado, malícia, travessura.
Armas, ter alguém um monte delas: honras que receberá.
Arranhadura: aflição.
Arroz, comê-lo: abundância excessiva, indigestão.
Armênio: curiosidade acerca do futuro.
Arsenal: boatos de guerra.
Árvores verdes ou floridas: esquecimento de passados desgostos, alegria,
receio inesperado. – Derribadas, queimadas, feridas do raio: aborrecimento,
receio, dor, desespero. – Sem flores: expedição de negócios. – Secas: perda
inesperada, abuso de confiança. – Com flores: alegria, e doce satisfação. –
Carregadas de frutos: riquezas. – Derrubar uma: mal cruel e perdas. – Estar
alguém sobre uma grande arvore: poder e dignidades, boas novas. – Cair dela:
perda de emprego ou da proteção dos grandes, em proporção contraria do mal
que alguma pessoa tiver sofrido. – Colher a fruta de uma velha arvore: –
herança de pessoas idosas. – Ser mudado em arvore: doença.
Assado, vê-lo: alvor de esperança. – Comê-lo: ganho, segurança.
Assassinos. V. Cabeça cortada.
Assobio: perigo pessoal, maledicência.
Astrólogo. V. Horóscopo.
Atirador: religião, surpresa.
Audiência de um ministro ou de um empregado: luto.
Ausência de um pai afastado de sua família: tempestade horrível, grande
prejuízo, e algumas vezes, incêndio.
Auto de fé, ver queimar um homem em publico: doença ou perda de
fazenda.
Autômato: incapacidade.
Avelãs. V. Nozes.
Avental: servidão.
Azeite derramado: perda infalível. – Sobre si: lucro. – Colhê-lo: grande
proveito.
Azeitonas na arvore: liberdade, potência, amizade, paz, concórdia, bom
sucesso em amores. – No chão: trabalho e pena sem proveito. – Colhê-las:
ganho.
B
Bacia de mãos, ter uma cheia de água, sem dela fazer uso: morte na
família.
Baile, achar-se alguém nele, ou assistir a uma representação: alegria,
prazer, recreio, sucessão.
Bainha: perda de tesouros, divulgação de segredo.
Baixela de estanho: boa comodidade.
Balança: recurso à justiça.
Balão: elevação de pouca dura.
Baleia: grande perigo.
Bananeira: casamento vantajoso, ganho de sentença, herança.
Bancarrota: expedição de negócios.
Banco: oferecimentos enganosos de serviços.
Banhar em água límpida: bom sucesso, perfeita saúde. – Em água turva:
perda de um amigo.
Banho, preparar um: notícia de pessoa que nos interessa, prosperidade.
Banquete, gozá-lo só: avareza, pobreza. – Em companhia: dissipação,
prodigalidade.
Barba, tê-la grande e bela: persuasão, perspicácia, resultado completo em
todas as empresas. – Negra: perda e cuidados. – Russa: erro próximo. –
Arrancada ou feita: perda de bens, de honras ou parentes, para a pessoa que
assim a tem. – Não a ter naturalmente: riqueza. – Ter muito trabalho em
arrancá-la: empresa ruinosa, aumento de miséria para o sujeito a quem a
arrancaram. – Em uma rapariga: casamento pronto e vantajoso. – Numa
mulher casada: morte do marido, ou abandono próximo, que a obrigará a
dirigir só os trabalhos domésticos. – Em uma mulher pejada: nascimento de
um filho. – Lavá-la: tristeza. – Vê-la seca: alegria. – Vê-la fazer a outrem mau
sinal.
Barbear-se: perda de bens, de honras, ou saúde.
Barras (jogo das): concorrência para um emprego, ou no comercio.
Barrete de dormir: instante de deixar os negócios.
Barris e Toneis: abundancia.
Batalha. V. Combate.
Batel, passear alguém sobre a água dentro de um batel: alegria,
prosperidade, segurança nas empresas, se o tempo estiver sereno e o mar
manso. – Se houver tempestade e ondas encapeladas: indica o contrario.
Beijar a terra: humilhação e pesar – As mãos a alguém: amizade, boa
fortuna. – O rosto: temeridade seguida de bom sucesso.
Bela (achar-se com a sua): tentação.
Bem, fazê-lo: nímia satisfação, – Aos mortos: proveito certo. – Ter
grandes bens; motivos de tristeza.
Berço de criança: fecundidade. – De verdura: pesar, cuidado.
Bestas, vê-las alguém correr: penas amargas. – Ser delas perseguido:
ofensa da parte dos inimigos. – Ouvi-las ornear: tristeza; – Falar-lhes: mal
próximo. – Lutar com elas: sofrimento, enfermidades. – Sonhar matá-las:
prazer e saúde.
Bexiga: falsa gloria, orgulho.
Biblioteca: sábio, ou letrado a consultar.
Bicho da seda: amigos caridosos e benfeitores.
Bigodes compridos: aumento de fortuna.
Bilha: perda por incúria pessoal, ou de outrem.
Bilhar: negócio arriscado, ganho incerto.
Bilhete de loteria, se alguém lhe vir os números: bom sucesso. Se os não
vir: despesa inútil, prodigalidade.
Biscoito de embarque, comê-lo alguém: proveito, saúde.
Bispo: grande personagem.
Boa ventura. V. Horóscopo.
Boca, tê-la fechada sem poder abri-la: perigo de morte. – Tê-la infecta:
desprezo público, traição de criados. – Maior do que deve ser: aumento de
honras e opulência em sua casa.
Bodas: pequena satisfação.
Bófe, ser nele ferido: perigo iminente, desejos frustrados.
Boi: criado fiel e muito útil, paz interior.
Bois, vê-los gordíssimos: bom tempo, felicidade próxima. – Magros:
carestia de grãos, fome. – Olhá-los quando sobem: mal e fadigas. – Brancos,
que saltam: honra, proveito, dignidades. – Pretos: perigo iminente. –
Avermelhados: risco de vida. – Lavrando: vantagem inestimável. – Sem
pontas: inimigos desarmados. – Que combatem uns com os outros: origem de
inimizade. – Quando vão beber: mau sinal. – Quando descansam: serviço
feito. – Furiosos: tormento.
Bola, jogar a bola: boa fortuna. – Vê-la rolar diante de si: demora de
fortuna.
Bolsa cheia: desgostos, pena, miséria, avareza. – Vazia: comodidade,
contentamento de espírito.
Borboletas: inconstância.
Bordadura, ver bordar: ambição.
Botas, tê-las, ou calçá-las novas: bom sucesso e ganho.
Botelhas: alegria. – Quebradas: tristeza.
Boticário: sofrer usura, receber injurias.
Braço, tê-lo cortado: morte de um parente ou criado, se for o braço
direito; de mulher, se for o esquerdo. – Ambos os braços cortados: cativeiro
ou doença. – Quebrados ou magros, de um simples particular: aflição, doença,
miséria na família; de um militar em posto elevado: desastre público; v. g.:
exército derrotado, fome ou peste; de uma mulher casada: viuvez, ou
separação. – Sujos: penúria. – Inchados: riquezas para irmão ou parente
querido. – Fortes e robustos: felicidade, cura, livramento. – Ágeis e bem
constituídos: graças para receber. – Maiores e mais nervosos que os
ordinários: alegria e lucro. – Pertencentes a um filho ou irmão: riqueza
inesperada. – Se foi mulher que teve este sonho: aumento de fortuna, ou poder
para seu marido. – Cabeludos: aquisição de novas riquezas. – Cobertos de
sarna ou ulceras. V. Ulceras.
Branco, estar vestido de branco. V. Vestido.
Burro: pessoa inepta ou ignorante; criado fiel ou zeloso, segundo as
circunstâncias relativas ao sonho. – Assentado sobre o traseiro: trabalho. – Ver
correr um: desgraça próxima. – Ouvi-lo zurrar: cansaço, dano. – Olhá-lo no
posto: tormento. – Ver-lhe as orelhas: morte dum parente.
C
Cabala no teatro: bacharelice, ditos malédicos.
Cabanas nos bosques: trabalho penoso.
Cabeça, ver uma sem corpo: lucro. – Lavar a sua; afastamento de perigo.
– Cortar a de um frango: alegria e gosto.
Cabeça de javali, recebê-la: triunfo sobre um inimigo poderoso. –
Oferecê-la: contrariedade, humilhação.
Cabeleireiro: perigo próximo.
Cabelos mal penteados: amizade, fim de maus negócios. – Embaraçados:
tédio, dores, ultrajes, contendas. – Caídos: perda de amigos. – Não os poder
desembaraçar: demandas e grandes trabalhos. – Tê-los compridos como uma
mulher: moleza e engano da parte de uma pessoa do sexo. – Tê-los mais
longos e negros que de costume: medrar em honras e riquezas. – Tê-los mais
finos que os usuais: aflição e pobreza. – Vê-los encanecer: aniquilação de
fortuna. – Olhar uma mulher sem cabelos: fome, pobreza, doença. – Homem
sem cabelos: abundância, riqueza, saúde. – Vê-los arrancar da sua própria
cabeça: disputa com os seus melhores amigos.
Cabras brancas: lucro. – Pretas: infortúnio. – Tê-las alguém suas: feliz
mediocridade.
Caça: acusação de gatunice.
Cachimbo: guerra, ou combate singular.
Cadáver. V. Morto.
Cadeias: melancolia. – Quebrá-las: tormento.
Cadeira: distinção.
Cães: precaução, valhacouto.
Café, vê-lo queimar: pena e tribulação.
Cair na água, se o sonhador acorda sobressaltado: ciladas de inimigos.
Caixinhas, tê-las ou tomá-las novas: sucesso e ganho.
Cajus: gosto, saúde. – Comê-los: notícias. – Azedos: lagrimas.
Calçada: mau recolhimento.
Calções: segurança.
Calhandra: elevação rápida.
Camará. V. Aposento.
Camelo: riqueza.
Caminho, seguir um direito e fácil: alegria, prosperidade, bom sucesso. –
Escabroso e fatigante: absolutamente o contrario.
Camisa: prosperidade vindoura. – Tirar alguém a sua: esperança baldada;
– Tê-la rota: boa fortuna.
Campainha, agitar uma: dissensão caseira.
Campanário: fortuna, poder, elevação. – Derribado: perda de emprego.
Campo: V. Trigo, Milho. – Estar num campo: manifesta perseguição da
parte de inimigos. – Ir alguém a ele divertir-se: perigo de perder seus bens. –
Fazer lá bem os seus negócios: alegria, lucro, saúde. – Voltar dele: aflição,
perda de seus haveres.
Canal navegável: grande lucro. – Vê-lo alguém seco: perda de grande
parte de seus cabedais.
Canário: viagem longínqua.
Canhão, ouvi-lo disparar: ruína próxima. – Vê-lo: surpresa danosa.
Canivete: inconstância, infidelidade conjugal.
Cantar, ouvir cantar mulher ou rapariga: aflição e lagrimas. – Homens:
esperança.
Cão, brincar com um cão: dano. – Com muitos: avareza. – Branco:
ventura próxima. – Negro: traição de amigos. – Danado: receios fundados. – E
gato: disputa, contrariedade. – E cadela: libertinagem. Se ele pertence ao
sonhador: serviço da parte de um amigo fiel, animoso, infatigável, um bom
criado. – Se for alheio: inimigos devassos, infames. – Se ele rasga o fato:
maledicência da parte de um ente vil, que intenta arruinar a pessoa, cujo
vestuário foi roto. – Se morde: desgostos suscitados por inimigos. – Pensar
nele: fidelidade. – Velo dormir: sossego. – Vê-lo correr ou ouvi-lo ladrar: bom
aviso. – Quando late após alguém: calunia de inimigo. – Lutando com outros:
enredos temíveis.
Cantor ou Cantora: gemidos.
Cânticos, entoá-los: fraqueza, enfermidade.
Canto, dos pássaros: amor, alegria, prazer. – Sem a pessoa os ver:
contendas.
Capão que canta: tristeza, aborrecimento.
Capela. V. Igreja.
Capucho: reconciliação, esquecimento de faltas.
Cárcere, Fortaleza: resistência imprevista.
Cardeal: aumento na profissão que alguém exerce.
Cardos, cortá-los: preguiça. – Picasse neles: insulto ou desavença de
amigos.
Carnificina: perda de filhos ou de fortuna.
Carro elegante: elevação imerecida. – Apear alguém dele: perda de
postos ou dignidades.
Cartas ou Dados, jogá-las ou jogá-los: embuste, perda de haveres por
calúnias pérfidas.
Cartas, escrevê-las a amigos ou deles recebê-las: boas novas.
Cartazes, pregá-los: desonra. – Lê-los: trabalho infrutuoso.
Carteira: mistério.
Carvões, comê-los: prejuízo. – Vê-los acesos e ardentes: precauções que
alguém deve tomar contra seus inimigos, vergonha e repreensão. – Apagados:
morte ou expedição de negócios; conforme os ditos carvões estiverem mais ou
menos vermelhos.
Casa, edificar uma: consolação.
Casamento, contraí-lo: tempo feliz.
Castanhas: V. Nozes;
Castelo: bom sinal. – Entrar nele: esperança lisonjeira. – Incendiado e
consumido: dano, doença ou morte do proprietário.
Cava, adega: doença próxima. – Baixar alguém a ela: moléstia perigosa.
– Subir-lhe a escada: alegria.
Cavaleiro derribado do cavalo: perda. – Se alguém monta em seu lugar:
bom sucesso.
Cavalaria numerosa: grande cuidado.
Cavalo: feliz agouro. – Tomar, montar um: bom sucesso seguro. – Negro:
esposa rica e má, perda e dano – Branco: esposa bela e virtuosa, bens a
granjear. – Que manqueja: embaraço ou oposição ás empresas que alguém
forma – Ver correr um: bom tempo, desejos perto de cumprir-se. – Montá-lo e
domá-lo: adiantamento rápido. – Ir a cavalo em companhia de mulheres:
infortúnio e traição. – Vê-los de cores varias: falsa acusação. – Ver alguém o
seu montado por outrem: infidelidade conjugal.
Cavernas. V. Subterrâneo.
Cegonha ou Grou no ar: chegada de inimigos ou ladrões. – Se for no
inverno: tempo desastroso.
Ceifeiros: prosperidade comercial.
Cemitério: prosperidade próxima.
Céu, ver-se nele um fogo moderado, puro e luzente: perigo que corre
algum príncipe ou grande. – Vê-lo todo abrasado: ataque de inimigos,
pobreza, fome, desolação. – Sombrio e nebuloso: fortuna medíocre. – Sereno:
dia feliz. – Claro e sem nuvens: união próxima. Semeado de flores: descoberta
da verdade. – Subir ao céu: grande honra.
Cérebro, tê-lo são: sabedoria e bom sucesso em tudo quanto alguém
empreende. – Doente e carregado de humores: mau sucesso, perigos.
Cervos ou Gamos, vê-los: ganho. – Matá-los: herança, vitória.
Cevada, tocá-la ou passá-la pelas mãos: alegria, lucro. – Comer pão de
cevada: satisfação e saúde.
Chá: acumulação de negócios.
Chaminé: alegria, especialmente tendo fogo aceso. – Se lhe pegou fogo:
traição. – Subi-la: muita confiança e bons negócios.
Chapéu de sol: mediocridade, vida branda e obscura.
Chapéu roto ou sujo: dano, desonra.
Charrua puxada: desespero.
Chave: próximo acesso de cólera, mormente se alguém a perde.
Cheiros, pô-los na cabeça: orgulho, presunção, jactância.
Chocolate, tomado; alegria e saúde: – Amargo: satisfação.
Chorar: alegria, consolação.
Chumbo: acusação, severidade.
Chouriços, fazê-los: paixão. – Comê-los: namoro, para os mancebos;
para pessoas idosas, saúde.
Chuva, estar dela molhado: aflição; tédio.
Cidade incendiada e consumida: fome, guerra ou peste.
Cidra, bebê-la: disputa, animosidade.
Cifras, menos de 90: incerteza. – Mais de 90: bom sucesso.
Cigarras, Gafanhotos, Besouros, Grilos: faladores insuportáveis,
péssimos músicos, perda de colheita, por via de roubo, etc., mau êxito de
doença.
Círio. V. Vela.
Cisterna, cair nela: calunia.
Clister: negócios enredados.
Codornizes: ciladas, questões, furtos. – Vê-las: ter notícias de alguém ou
de alguma casa.
Coelho: fraqueza. – Matar um: engano, perda. – Comê-lo; saúde. –
Branco: amizade, bom sucesso. – Negro: desgostos.
Cofre cheio: abundancia. – Vazio: miséria.
Colchetes: trabalho de imaginação.
Cólera: remate de um negócio muito tempo indeciso.
Colar: honra, cerimônia.
Colégio, Estudos: alegria duradoura.
Colosso: ruína próxima.
Coluna, sua queda: sinal de morte próxima.
Combate: risco de perseguição. – Ter um; ruído e tumulto em casa do
sonhador.
Comédia, vê-la representar: sucesso seguro. – Lê-la: pena secreta do
coração. – Fazer nela um papel: notícia desagradável.
Cometa, vê-lo: discórdia e pena. – Vê-lo cair: guerra ou fome.
Comerciar em lã: lucro. – Em ferro: desgraça e perda. – Em pano, seda,
cetim, veludo ou outros estofos: alegria e proveito.
Comércio, empregar-se no seu: favor próximo.
Comungar: segurança em negócios.
Companhia (conversar em): perigo de morte.
Compras, fazer compras: ganho.
Concerto. V. Música.
Concha vazia: perda de tempo ou credito. – Cheia: esperança de bom
sucesso.
Condenados, nas chamas e cruelmente atormentados: tristeza,
arrependimento, tédio, melancolia, doença.
Confessor: dar ordem aos seus negócios.
Conselhos, dá-los: perda de amigos.
Contratador de bestas: impostura, velhacaria.
Convulsões: bancarrota fraudulenta de um devedor.
Copo de água, receber um: pronto matrimonio, ou nascimento de criança.
Cordas ou Cordões: embaraço, fadiga.
Cordeiros, crescidos ou dormindo: temor súbito. – Tê-los: consolação. –
Levá-los à cabeça: prosperidade futura. – Matá-los: tormento. – Ser afagado
por alguns: esperança lisonjeira.
Coroa de outro sobre a cabeça: favor do príncipe, ou proteção de um
grande, respeito da parte dos inferiores, presentes, demandas, tentação. – De
flores: prazeres sem remorsos. – De ossos de finados: perda de vida, ou ao
menos, cruel doença. – De prata: boa saúde. – De verdura: dignidade.
Correr: fortuna, presságio, dita. – Assustado: segurança. – Após seu
inimigo: vitoria, lucro, – Nu: perfídia de parentes. – Olhar pessoas correndo
umas atrás de outras: contendas, desordens. – Se forem rapazes: alegria, bom
tempo. – Se tiveram paus ou outras armas: guerra próxima, dissensão.
Cortar a barba, o pescoço, a cabeça a alguém. V. Barba, Pescoço,
Cabeça.
Coruja: desastre ou desgraça – Voando: perigo de morte para pessoa a
quem se dirige. – Grasnando: tristeza.
Costa, subir uma: padecimento nervoso. – Descê-la: nova agradável.
Coxas mais grossas e fortes que as naturais: parentes com elevadas
dignidades, o que redundará em proveito de quem as tem. – Se for mulher que
tenha o sonho: satisfação da parte de seus filhos.
Credor, receber-lhe a visita: segurança nos negócios, misturada com
algum susto.
Criada: suspeitas.
Criminosos, ver alguns: morte de varias pessoas conhecidas.
Crueldade, praticar uma: tristeza, descontentamento.
Cuco, vê-lo ou ouvi-lo cantar: prazer, boa saúde.
Cruz: salvação, honra, perigos que se evitaram. – Vê-la em alguém:
tristeza.
Cura ou Padre: mau presságio, especialmente para doentes e criminosos.
Cipreste: morte, aflição, ou demora em negócios.
Cisnes: riquezas e poder. – Negros: desavença entre casados. – Cantando:
morte.
D
Dados, jogar os dados: estar em risco de perder seus bens. – Ganhar
nesse jogo: herança de algum parente.
Damas, ver muitas: bacharelice. – De jogo: incerteza, cálculos longos e
penosos.
Damasco ou outros frutos, vê-los ou comê-los: prazer, contentamento. –
Fóra da estação: mau sucesso. – Secos: desgostos.
Dançar o sonhador: doença próxima. – Ver dançar os outros: bom
sucesso.
Dançarina. V. Comédia.
Data, comemorar alguma: negócios concluídos.
Dedal: busca vã de trabalho.
Dedos, queimá-los: inveja e pecado. – Cortados: perda de amigos ou
criados.
Deitar-se a mulher com o seu marido, quando ele está ausente: más
novas, tristeza próxima. – O esposo com sua esposa; alegria, lucro. – A mãe
com a filha: consolação, ou antes resignação necessária.
Dentes, sentir cair um: perda de uma amiga. – Dianteiros: filhos. – Os
superiores: machos. – Os inferiores: fêmeas. – Queixas: parentes ou amigos
mais estimados. – Podres: doença, aflição. – Abalados: doença ou aflição de
amigos. – Fazê-los arrancar: morte de alguém. – Tê-los belíssimos:
prosperidade e amizade.
Dentista: mentira, engano.
Desenhar: amizade permanente.
Desenho: proposta que se deve recusar.
Desenterrar um morto: impiedade.
Desertor: notícias de um ausente.
Desmaio: doce voluptuosidade.
Despejado: ditos injuriosos contra a pessoa que sonha.
Deus, vê-lo face a face: consolação e alegria. – Falar-lhe: jubilo e
felicidade pura. – Se ele estende os braços para o sonhador: benção, graças
divinas, prosperidades.
Diabo com pontas, unhas, cauda e forcado: desespero, tormento. –
Conversar com ele: tentação próxima, desesperação, perda de bens ou de vida.
– Ser por ele arrebatado: presságio de grandíssimo desastre. – Combatê-lo:
triunfar de inimigos, gloria, satisfação.
Diamantes: falsa aparência de fortuna. – Apanhá-los: perda, desgostos. –
Comê-los: grande ganho, fortuna, recompensa.
Diarreia: doença, perda, desgostos.
Difamar alguém em sonho: enfermidade, dores.
Dilúvio: perda de colheita, de vindima.
Dinheiro, contá-lo: ganho considerável. – Vê-lo somente: cólera. –
Gastá-lo: perdas próximas. – Achá-lo: fortuna vindoura.
Disciplina, dá-la a si mesmo ou recebê-la: penitência para fazer, castigo a
temer. – Dá-la a outrem: imprudência, temeridade.
Docel (dossel): tesouro oculto.
Doces, comê-los: engano.
Doente, vê-lo: tristeza, prisão.
Dores: prova de que o sonhador sairá bem.
Dormir: tranquilidade enganosa.
Duradoura: ganho e felicidade.
Dragão: riquezas, tesouros, visita a um superior, a um togado, a um
grande.
Dragona: dignidades, especialmente em toga.
Duelo: desavença entre casados ou entre amigos, rivalidade perigosa.
E
Eclipse do sol: perda notável. – Da lua: dano medíocre.
Égua, bela, vigorosa: esposa rica, moça formosa.
Elefante: receio e perigo de morte. – Dar-lhe de comer e beber: amizade
entre parentes. – Vê-lo ou possuí-lo: amizade e fim de tormento.
Embaraço, achar-se nalgum: quanto maior ele for, mais fácil será o
negócio projetado.
Emboscada, armar uma: precauções a tomar. – Caír nela: empresa segura.
Embriagado, estar embriagado: aumento de fortuna, volta de saúde.
Emagrecer: desgostos, pleito, perda de bens, perigo de doença.
Encanto, formar um: audácia e malefício. – Ser dele o objeto: perda no
comercio.
Enfaixar uma criança: bom sucesso insignificante.
Enfermo, ver algum enfermo: aflição. – Estar enfermo: ausência de todos
os males.
Enterrado, sê-lo vivo: risco de infortúnio para o resto da vida.
Enxofre: pureza, justificação.
Ervas cruas: dores, embaraços nos negócios. – Comê-las: pobreza,
doença.
Ervilhas, comê-las bem cozidas: segurança em negócios, e pronta
expedição.
Escada, subi-la: glória pouco sólida. – Descê-la: tormentos e penas.
Escalar, uma casa, um sitio escarpado: vitoria, bom sucesso.
Escarlate, vestidos dessa cor: dignidade, poder, grande autoridade.
Escola, Escolares: travessura, malícia.
Escorpião: ciladas e infortúnios.
Escrever uma carta: notícia. – Uma memória: acusação.
Esmola, dá-la: privação, mediocridade. – Recebê-la: tristeza, desespero.
Espada: vitoria e segurança em empresas. – Receber um golpe dela:
desolação, temor. – Ter uma: poder confiado. – Ver uma: traição.
Espáduas inchadas: riqueza para a mulher do sonhador. – Inchadas,
pisadas, etc.: aborrecimento da parte da família.
Espargos a prumo: bom sucesso de empresa. – Comê-los: confiança
inspirada.
Espelho: traição.
Espiar: serviços vergonhosos.
Espingarda, dar um tiro de espingarda: proveito enganoso, tédio, cólera.
Espinhos, vê-los: maus vizinhos. – Ser deles picado: perigo na fortuna ou
emprego do sonhador.
Espirrar de noite: longa vida.
Esponja: avareza, má fé.
Esposar, sonhar alguém que esposa: doença, melancolia.
Estalagem: descanso. – Alojar alguém nela: repouso misturado com
inquietaçao fundada.
Estalo: hospitalidade, acolhimento favorável.
Estandarte, vê-lo flutuar: perigo, temores fundados. – Empunhá-lo:
honra.
Estante do coro: jovialidade fina e delicada.
Estátua, vê-la: pena, tristeza.
Esterco: vergonha e proceder devasso.
Estojo: descoberta de objetos roubados.
Estômago, ter dores nele: dissipação de fortuna.
Estorninho: prazer insignificante.
Estrangeiro. V. Incógnito.
Estreias, recebê-las: miséria, pesar, tédio.
Estrelas, claras e brilhantes: prosperidade, lucro, em jornada, boa nova,
sucesso prospero e cabal. – Sombrias e pálidas: desgraça extrema. – Brilhantes
na casa: perigo de morte para o chefe da família. – Caindo do céu: ruína de
uma casa grande. – Caindo através do telhado: doença, abandono de morada,
incêndio.
Estribos: viagem próxima.
Estudante. V. Escola.
Estudar, sonhar alguém que estuda: alegria e contentamento de espírito.
Exéquias, de um parente, de um amigo, de um grande: felicidade,
riqueza, sucessão, casamento vantajoso. – De um incógnito, de uma pessoa
pouco importante: maledicência, enredos ocultos.
Exílio, ver ir alguém para o exílio: lágrimas, ultrajes. – Ir o sonhador para
ele: grande sucesso, a despeito da inveja.
F
Facada, receber uma facada na garganta: injurias ou violências.
Facas, vê-las: injurias, contendas. – Em cruz: briga, morte.
Face, tê-la bela: honras, longa vida.
Faces, gordas e vermelhas: prosperidade interrompida. – Magras,
chupadas ou amarelas: adversidade súbita.
Falcão, ter um em punho: honra.
Falar com animais: mal e sofrimento.
Fanal, Farol, Lanterna: bom sucesso, honra, lucro.
Fantasma ou espírito trajado de branco, e belo de rosto: consolação e
alegria: – Negro e horrível: tentação, engano. – Ver muitos fantasmas: estado
angustioso.
Farinha: morte na vizinhança. – Queimá-la: ruína súbita.
Favas, comê-las: contendas, dissensões, doença.
Febre: desejos ambiciosos, extravagantes.
Fechadura: roubo e perda de roupa.
Feijões: critica e maledicência da parte de um subalterno.
Feira: tormento, desassossego, precisão.
Fel: derramado no corpo: cólera contra os criados, contenda domestica,
perda no jogo, ataque de ladrões.
Feno, ver bom feno: acidentes molestos.
Ferida, receber uma de um lobo: inimigos pérfidos. – Curá-la: exaltação,
ostentação. – Curar uma: serviços que serão pagos com ingratidão.
Ferrar, ver ferrar um cavalo: estorvos, penas.
Ferro, pensar nele: mau sinal.
Ferrolho: pena secreta.
Festa. V. Regozijos.
Festim: alegria de pouca dura, ruína de temperamento.
Fiar: pesares, tédio.
Figos, tê-los na estação própria: prazer e ventura. – Fora da estação:
desgosto e infortúnio. – Comê-los: dissipação de bens. – Secos: decadência de
fortuna.
Fio: mistério, intriga secreta. – Dobrá-lo; descoberta de um segredo. –
Embaraçá-lo: necessidade de ocultar um segredo a todos os olhos. – De ouro:
bom êxito, à força de intrigas. – De prata: intriga frustrada.
Fitas: comodidade, satisfação.
Flauta, tocá-la: contenda, dissensão futura.
Flores de lis: grandeza, poder.
Flores, colhê-las: benefício considerável. – Vê-las, tê-las, ou cheirá-las na
estação própria: consolação, prazer e alegria. – Fora da estação: obstáculos e
maus sucessos. – Se forem brancas; tênues dificuldades; se amarelas: pena
extrema; e as mais das vezes, morte, sendo vermelhas.
Floresta, estar numa floresta ou prado: vergonha e prejuízo para os ricos;
para os pobres, proveito.
Fogo, vê-lo: cólera, perigo. – Na chaminé, sem fumo nem faísca: sinal de
abundancia. – Apagado: indigência, necessidade, falta de dinheiro.
Foguete: triunfo momentâneo.
Folhas, vê-las cair: doença perigosa.
Fole: mexericos falsos.
Fonte de água clara: abundancia, saúde. – Vê-la rebentar em sua casa:
honra e lucro.
Forca, sentir-se pendurado nela: dignidade, elevação.
Formiga: tentação.
Forno: facilidade, riqueza. – Aceso: abundancia. – Muito ardente:
mudança de lugar.
Fortuna (sobre a sua roda): perigo próximo.
Fosso, cair nele: cilada, traição.
Frade: traição de um falso amigo.
Fricassê, fazê-lo ou vê-lo: loquacidade de mulheres.
Frieiras: desejos indiscretos.
Frutos, comê-los: engano de mulher. – Vê-los bons: prazer, fraqueza de
espírito.
Fumo: falsa gloria.
Fúrias: tribulações suscitadas pela inveja, por odio mortal.
G
Galanteria, galantear as damas: satisfação, boa saúde.
Galeote: audácia, animo, força. – Fugindo: desgraça.
Gato: traição de parente chegado. – Deitado, ou dormindo: ataque
próximo. – Furioso: ataque de ladrões.
Gavião, tomar um: lucro.
Gelo, olhá-lo ou caminhar sobre ele: inimigos coléricos.
Gigante: grande sucesso, triunfo certo.
Girafa, vê-la caminhar: grandeza, elevação.
Gladiador: agonia.
Gota, se a pessoa é moça: terror pânico; perigo pessoal. – Se for velha,
languidez e miséria.
Grandes, ser abandonado deles: alegria, consolação, bom sucesso. – Ser
por eles visitado: honra.
Guardar dentes: saúde, segurança.
Goela, cortá-la a alguém: dano involuntário. – Dar-lhe um golpe, e não
morrer: esperança e bom sucesso.
Guitarra: prazeres pouco dispendiosos.
H
Harpa: cura de loucura.
Hera: amizade.
Herança: ruína, miséria, desespero.
Herpes, Sarna, Úlceras: riquezas em proporção da grandeza desses males.
Homem, de bela figura: satisfação, alegria, saúde; sendo a mulher a que
sonha. – Questões violentas: ciladas a temer, se for homem. – Trajado de
branco: bens futuros. – De negro: perda considerável.
Homicida, sonhar com ele: segurança.
Horóscopo: engano.
Hospital: miséria, privações.
Hidropsia: precisão, prenhes misteriosa.
I
Idolatria: maus negócios.
Icterícia: riqueza, fortuna imprevista.
Idolatra: maus negócios.
Igreja, edificar uma: amor divino, prosperidade. – Entrar nela: proceder
honroso.
Ilha: tédio, solidão.
Iluminação: lagrimas.
Imagens: desgostos, injurias, sendo bem feitas. – Prazer: alegria,
transportes, sendo grosseiras.
Imundícia: benevolência de que o sonhador será vitima.
Imperador, ver um e conversar com ele: projeto de evasão, fuga,
inquietações.
Imperatriz: perda de postos, de dignidade, de reputação.
Impotência: fortuna imprevista, ilustração.
Incêndio, vê-lo: perigo. – Apagá-lo: fortuna.
Incenso: lisonjeiros, parasitas, traição.
Incógnito, ver um incógnito: alegria, honra, bom sucesso e expedição de
negócios.
Incude: trabalho, segurança.
Inferno, escapar-lhe: desgraça, se for o sonhador rico e poderoso; se for
pobre e doente: consolação, alivio.
Inimigos, conversar com os seus: desconfiança saudável. – Jogar com
eles: desvantagem. – Ser tomado por eles: embaraço, negligência, preguiça.
Injurias: sinais de amizade, favor.
Inquisidor, inquisição: inocência perseguida e triunfante.
Instrumentos, ouvi-los: cura de achaques. – Tocá-los ou vê-los tocar:
exéquias.
Intumescimento: trabalho, fadiga.
Inundação: ruína imprevista, acidentes graves.
Inventário: bancarrota, na qual o sonhador será parte.
Irmãos e irmãs: proveito e júbilo. – Falar-lhes: enfado. – Longa vida: se o
sonhador os viu mortos.
J
Janela, pôr-se a ela: demanda que redundará em proveito do sonhador. –
Descer por ela: quebra de um parente próximo, humilhação.
Jardim, cultivá-lo, admirá-lo: prosperidade próxima.
Javali, persegui-lo e impossibilitá-lo de fazer mal: vitoria, satisfação.
Jejum: temores mal fundados.
Jesus Cristo, falar-lhe: consolação.
Joelhos, ver alguém de joelhos: demora em suas empresas.
Jogo, ganhar ao jogo: perda de amigos. – Perder: alivio. – Jogos
inocentes: alegria, saúde, prazer, prosperidade, união de famílias.
Judeu: engano, roubo, direto ou indireto. – Se ele fizer algum serviço:
felicidade inesperada, bons sucessos.
Juízes: malícia e crueldade. – Se o sonhador tem alguma casa a
exprobrar-se: desculpa. – Exercer-lhe as funções: tédio.
Jurar, ou ouvir jurar: tristeza e muito má notícia.
Justiça, ser por ela castigado: amores, infidelidades.
Justificar, justificar-se de uma acusação: mérito raro.
L
Lábios, tê-los vermelhos: saúde dos amigos e conhecidos, de que o
sonhador não tem notícia.
Laboratório: perigo de doença.
Labirinto: segredo descoberto.
Lacaios: inimigos ocultos.
Laços: achar-se preso neles: embaraço, trabalho em sair de algum
negócio.
Ladrão, entrando furtivamente em casa do sonhador: segurança dos
negócios.
Lagoa, ver uma pequena: bagatela, miséria, apesar do trabalho.
Lagosta: dor, desunião.
Lâmpada: afastamento de negócios. – Acesa: paixão e penas.
Lampião, aceso: alegria, felicidade. – Apagado: miséria, loucura.
Laranjas, vê-las ou comê-las: feridas, dores, ou grandes desgostos.
Laranjeiras: lágrimas, aborrecimento.
Leão, comer-lhe a carne: riquezas, honra, poder, vindos do príncipe. –
Lutar com ele: contenda, questão perigosíssima. – Vencê-lo: bom sucesso
cabal.
Lebre: amizade. – Ver muitas lebres: lucro. – Poucas: perda.
Legumes, vê-los na terra: aflição, trabalho.
Leite, beber leite: amizade de mulher. – Entorná-lo: perda no comercio.
Lentilhas, comê-las: ocupação.
Leoa e Leõesinhos: felicidade domestica.
Lepra: proveito, riqueza com infâmia.
Leque: rivalidade, pequena perfídia.
Ler comedias, etc. com gosto: consolação e alegria. – Livros sérios:
sabedoria, virtude. – Escrituras: boa fortuna.
Licores: gostos falsos.
Ligas: doença.
Lírio, fora do tempo: esperança enganosa.
Lobo, vê-lo: avareza. – Ser dele mordido: inclinação baldada.
Loteria, vê-la tirar: ganho no jogo.
Lunetas: desgraça, melancolia.
Lustre cheio de velas acesas: aquisição.
Luvas nas mãos: honra.
Luzes, ver muitas: lucro.
M
Macaco: inimigo malicioso, mas fraco, estranho ou incógnito.
Macarrão: guloso, parasita.
Machado: perigo de morte.
Macho, vê-lo: malícia, capricho louco.
Macieira, ver uma e comer-lhe o fruto maduro: contendas, cólera contra
amigos.
Madeiramento: operações ruinosas.
Mágico: acontecimentos imprevistos, surpresa.
Manhã, levantar-se pela: lucro, vantagem.
Mãos, lavá-las: trabalho, inquietação. – Olhá-las: doença. – Cabeludas:
cativeiro, tédio.
Marcha rápida: negócio urgente.
Marchar com passo firme: instrução de que o sonhador tirará proveito.
Margem: ventura, tranquilidade.
Marinheiros: perigo na viagem.
Mariola: assistência de amigos, ou parentes. – Carregado: ajuda;
solicitada e recusada.
Mármore: desavença, frieza.
Marmota: pobreza, preguiça.
Martelo: opressão.
Martírio, sofrê-lo pela fé: honras e venerações publicas.
Mascarada: astúcia, engano.
Mofar alguém, e acordar sobressaltado: tranquilidade de espírito, paz de
coração.
Mechas: riquezas, tesouros.
Medico, sê-lo: gracejo.
Mealheiro dos pobres: penúria. – Roubá-lo: fortuna.
Meirinho: ciladas, acusação de falsos amigos.
Mel, comê-lo: bom sucesso em negócios, segurança em jornada.
Melro: maledicência, suspeitas.
Memória, compor uma: acusação.
Mendigo: desgostos domésticos.
Mesa, ver uma: alegria. – Pôr-lhe a toalha: abundancia.
Metamorfose: viagens, mudança de sítio.
Menino com sua ama: doença perigosa.
Milho, campo de milho: grandes riquezas adquiridas sem dificuldade. –
Comê-lo: penúria absoluta.
Missa, ir ouvi-la: satisfação interior. – Cantada: alegria ruidosa.
Mocidade, ver-se moço: felicidade, bom tempo a passar.
Moeda, cunhá-la: lucro, ditoso porvir. – Fabricá-la falsa: vergonha e
exprobração. – Introduzi-la no comercio: destreza e perigo. – Tê-la de ouro:
angustia. – De prata: mediocridade. – De cobre: fortuna brilhante.
Moer trigo: riqueza. – Pimenta: espera incerta ou prolongada, melancolia.
Moinho: riqueza e bom sucesso, em proporção de sua rapidez.
Molhos: mentiras, falsas novas.
Montanha, subi-la: pena ou jornada no fim de certo tempo. – Descê-la:
sucesso pouco importante.
Montepio: fortuna, empregos, honra.
Morangos: lucro inesperado.
Morcegos brancos: meio-sucesso. – Pretos: aflição.
Mordidela, temê-la no pé, dada por cobra, etc.: inveja. – Senti-la: ciúme.
Morto, beijar algum: longa vida. – Ver algum no esquife: indigestão. –
Ver morta alguma pessoa, que tem saúde e vida: tédio, desgosto, perda de
sentença. – Estar morto: favor de um grande, riqueza, longa vida perturbada
por invejosos.
Móvel: riqueza, fortuna.
Mocho: enterro.
Mula, ter uma: aumento de negócios. – Carregada: embaraço.
Mulher, ver uma: doença. – Trigueira: doença perigosa. – Clara:
livramento. – Pejada: nova agradável. – Ouvi-la ralhar: grande tormento.
Multidão: importunidade.
Música, ouvir cantar e tocar instrumentos: alegria. – Melhoras para a
pessoa que está doente.
Mirto: declaração amorosa.
N
Nabos, vê-los ou comê-los: esperanças mal fundadas.
Nadar: prazer, comodidade, voluptuosidade.
Nariz, vê-lo mais grosso que o usual: riqueza e poder. – Perdê-lo:
adultério. – Tê-lo monstruoso: abundancia. – Ver dois: discórdia e contendas.
Nascimento, nascer: boa fortuna.
Navio, no mar: feliz presságio para o que o sonhador deseja. – À vela:
boa nova. – Ricamente carregado: volta do bom tempo. – Impelido pelas
ondas: perigo.
Negro: ver um nu: tristeza, desgosto, dano.
Neve, brincar com a neve: colheita abundante.
Ninho, achar um: lucro. – De cobras, etc.: inquietação grande.
Nível: juízes incorruptíveis.
Nó: embaraço. – Fazer um: enleio, perturbação. – Desatá-lo: desenredar
os seus negócios e os dos outros.
Nozes, Avelãs, Castanhas, etc.: perturbações, dificuldades seguidas de
riquezas e satisfação. – Achá-las quando escondidas: descoberta de um
tesouro.
Nu, estar nu: doença, pobreza, afronta, fadiga. – Correr nu: parentes
pérfidos. – Ver sua mulher nua: engano. – Seu marido nu: segurança e
felicidade nas empresas. – Seu amigo ou criados nus: discórdia, contenda. –
Um homem nu: motivo de horror. – Uma mulher nua: honra e alegria. – Sendo
velha, etc.: arrependimento, vergonha, má fortuna.
Número, contar o das pessoas presentes: dignidade, poder, ambição
satisfeita.
Nuvens: vê-las precipitar umas sobre outras: discordia na família.
O
Obras rudes ou grosseiras: escravidão.
Obreiros, vê-los trabalhar: repreensões e queixas que alguém sofrerá. –
Empregá-los: lucro. – Pagá-los: amor do povo. – Despedi-los: perigo para o
vizinho.
Oculista: falta a reconhecer, reparação a fazer.
Oferta e votos à Divindade: volta à ventura, amor divino.
Olho, perder um: morte de ascendentes.
Olhos, doentes: perda de filhos ou amigos. – Chorosos ou remelosos:
bom senso, discernimento, juízo profundo.
Oliveira, cheirá-la: casamento próximo.
Órgão: morte de parentes. – Ouvi-lo: alegria, herança.
Órgãos doentes: vergonha, infâmia iminente.
Ornatos de igreja: tranquilidade de espírito.
Ossos de morto: penas e obstáculos.
Ostras: amizade, alegria.
Ouro, fazê-lo: tempo perdido. – Maneá-lo: cólera. – Achá-lo: lucro. –
Juntá-lo: engano e perda. – Falso: riqueza, grandeza.
Ovos, em pequeno número: ganho e lucro. – Em grande quantidade:
perda de demanda. – Brancos: pequena vantagem. – De cor ou duros: grande
desgosto. – Quebrados: pena, bacharelice.
P
Pá: trabalhos ingratos.
Pato com o diabo: bom sucesso por meios ilicitos.
Pai, ver o seu: alegria.
Padre. V. Cura.
Palácio, ver um: inveja. – Habitá-lo: favor dos grandes. – Destruí-lo:
poder usurpado.
Palácio real: intriga, complicação de negócios.
Palha, espalhada aqui e ali: miséria, aperto.
Paliçada: estorvo repentino. – Transpô-la: segurança, fortuna, triunfo.
Palito: mau sinal.
Palio: esperança de cura para um amigo doente.
Palmas: gloria e homenagem.
Pão trigo, comê-lo: lucro. – Quente: acusação. – Amassado: grande
prazer próximo.
Papa: felicidade na outra vida.
Papagaio: descoberta de um segredo.
Paraíso: infortúnio, miséria, desgostos caseiros.
Paralisa, Paralitico: miséria, doença.
Parentes: erro, perfídia.
Pássaros, apanhá-los: gosto e lucro. – Matá-los: dano. – Atirar-lhes:
ataque surdo da parte de inimigos. – Juntos: bacharelice, demanda. – Vê-los
lutar: tentação. – Voar sobre o sonhador: perda. – Ouvi-los chilrar: bom
sucesso. – Mudar-se em pássaro: mutação de bens.
Passeio, dar sozinho um passeio: segurança. – Para dois amantes:
felicidade passageira.
Pastelaria ou Doces, fazê-los: alegria e ganho.
Patos, vê-los: honra e favor da parte do soberano. – Grasnando: lucro e
segurança em negócios.
Paus, jogá-los: pesar, desgraça. – Vê-los cair: ruína de um grande ou de
um negociante.
Pavão, ver um empavesando-se: riqueza.
Peça (de artilharia). V. Canhão.
Pedras, caminhar alguém sobre elas: pena e sofrimento.
Pedreiro: tédio, fadiga, gastos loucos.
Peito belo e são: saúde e alegria. Cabeludo: lucro ao homem. – Na
mulher: perda do marido. – Largo: vida longa e afortunada, em anos maduros.
Peixeira: gosto seguido de pesares.
Peixes, pescá-los grandes: alegria e lucro. – Pequenos: desgosto e ruína.
Pela, jogá-la: trabalho e pena em adquirir haveres, contendas, injurias.
Penúria: perda próxima.
Pepinos ou Melões, comê-los: falsa esperança, cura pronta, se o sonhador
está doente.
Pequeninos, ver os pés aos seus: alegria, lucro, saúde, prazer, consolação.
Perdão: saudades, desgosto, luto.
Perdiz: trato com mulheres ingratas, falsas, maliciosas.
Perfumes, compô-los ou distribuí-los a seus amigos: notícias agradáveis
para eles e para si mesmo. – Recebê-los de presente: ganho, lucro, honra,
glória.
Peregrino, Peregrina: feliz presságio. – Sê-lo: impenitência.
Pergaminho: firmeza, tenacidade.
Pernas, vê-las sãs: alegria, ventura. – Inchadas ou cortadas: perda, dano.
Perolas: miséria, tristeza. – Pescá-las: penúria, fome. – Enfiá-las: tédio,
solidão.
Peru: amigos ou parentes a ponto de endoidecerem.
Pés, ter dores neles: alivio próximo. – Beijar os de outrem:
arrependimento, mudança de proceder. – Lavá-los: gulodice. – Sujos:
tribulações, doença vergonhosa.
Pescar à linha: paciência, esquecimento de injurias.
Pescoço: honra, herança. – Inchado por tumor: enfermidade próxima.
Peste, ser acometido por ela: fortuna divulgada, que alguém quer tirar ao
sonhador.
Pimenta: birra, teima.
Planície vasta e extensa: alegria, bom sucesso.
Plantas, comê-las: fim de desgosto, expedição de negócios.
Poço, tirar-lhe água clara: casamento vantajoso. – Turva: doença,
himeneu funesto.
Poltrona: lugar eminente.
Pombo branco: consolação, devoção, feliz êxito em negócios.
Pomba: alegria, beneficio, surpresa.
Pontas, de um animal: queda num fosso.
Ponte, passar uma: trabalho. – Vê-la rubra ou quebrada: justo medo. –
Cair dela: desarranjo no cérebro.
Porco: pessoa ociosa, preguiçosa, avara.
Porco espinho: negócio delicado, escabroso.
Porta, arrombá-la: prisão muito próxima. – Queimada: morte do dono da
casa.
Porto (de mar), ver um: alegria, lucro, boa nova.
Prado, achar-se nele: gosto e saúde. – Vê-lo tosar: bom sinal.
Prata: penúria. – Vendê-la: melhora em negócios.
Prateleira: acontecimento notável.
Precipício: cair nele: grandes ultrajes e riscos.
Presentes, oferecê-los: ruína, decadência. – Recebê-los: lucro em casa.
Presunto: salário, recompensa. – Comê-lo: aumento de família ou
fortuna.
Príncipes, habitar com eles: favor precário.
Prisão, entrá-la: salvação. – Viver nela: consolação.
Processo: amizade considerável.
Procissão: felicidade, alegria.
Profanação: infortúnio, miséria.
Provisão: dinheiro ou fato roubado.
Pulgas: aborrecimento, dissabor, incomodo.
Punhal: ferir com ele alguém: desgostos superados, inimigos vencidos. –
Receber uma punhalada: notícia de morte.
Punhos de camisa: honras, empregos. – Rotos: perda de emprego.
Pústulas, tê-las no corpo: riquezas em bens territoriais ou em dinheiro.
Pirâmides: grandeza e riqueza. – Estar sobre as suas pontas: boas
aquisições.
Q
Quarentena, fazê-la: desleixo, loucura.
Queijo: contrariedade. – Comê-lo: ganho, lucro.
Queijos: riquezas para algum parente ou amigo.
Querela: constância em amizade. – De homens: inveja. – De mulheres:
grande tormento. – Dos dois sexos: amor quase a nascer.
R
Rábanos, comê-los: doença de um parente ou amigo intimo.
Raio, vê-lo cair junto a si: exílio ou fugida.
Raízes, comê-las: discórdia.
Raposa: surpresa por ladrões. – Fazê-la fugir: inimigo cauteloso e
maligno.
Rato: pedido de casamento.
Rato: inimigo oculto e perigoso.
Ratoeira: precaução que deve tomar-se contra a maledicência.
Rebeca: boa harmonia entre casados.
Rebique: traição, falsidade.
Recibo: esquecimento de injurias, perdão, absolvição.
Rede para pescar: chuva, ou antes mudança de tempo.
Regato de água clara: presságio de emprego honroso e lucrativo. – De
água turva: perda e dano da parte dos inimigos, incêndio, e demanda.
Regozijos públicos: miséria pessoal.
Rei, ver um rodeado de sua corte: engano, ciladas, lisonjas. – Só:
clemência, perdão de injurias.
Relâmpagos ou Sinal no céu: discórdia, guerra.
Relíquia: tesouro em perigo.
Remédio, tomá-lo a custo: penúria. – Alegremente: desleixo.
Relógio: emprego de tempo.
Repouso, tomá-lo: perseguição.
Repuxo: falsa alegria.
Retrato: longa vida à pessoa que ele representa. – Receber um ou dá-lo:
traição.
Ricos, estar ou conversar com pessoas ricas: ódio sem lucro, triunfo
sobre seus inimigos.
Rir, ouvir rir a bandeiras despregadas: contrariedade para o sonhador.
Rival, rivalidade: empresa desgraçada.
Rochedo: trabalho e pena. – Subi-lo a custo: bom sucesso tardio. –
Descê-lo: perda de parentes ou amigos.
Roda: arranjo de negócios difíceis.
Roda da fortuna: perigo.
Rodas, vê-las: doença.
Rola: fidelidade, bom consorcio.
Rosas, vê-las na estação própria: bom sinal. Fora da estação: mau sinal.
Rosto, magro e pálido: tédio, pobreza, carestia de viveres.
Roubar roupas: queda e ruína próxima.
Roubo de fato, dinheiro, comestíveis: morte ao sonhador ou a algum de
seus parentes ou amigos.
Rua: acolhimento favorável.
Ruínas: fortuna, bom sucesso, triunfo.
S
Sabão: negócios desenredados, assistência de amigos ou parentes ricos.
Sábios, conversar com eles: engano, ilusão.
Saca-rolhas: fortuna imprevista.
Sagração de um rei ou soberano: felicidade, bom sucesso, triunfo
momentâneo.
Sal, Saleiro: sapiência.
Salmão fresco: triste presságio, desunião nas famílias. – Salgado: união
perfeita.
Sanfona, ouvi-la: acontecimento desagradável. – Tocá-la: desgostos
retardados.
Sangrar pelo nariz: vergonha, geral desprezo.
Sangue, perder o seu: dores de cabeça, enxaqueca. – Em quantidade:
fortuna.
Sanguessuga: avareza, usura.
Sapateiro: entrega de algum dinheiro.
Sapatos: pobreza, tédio, pesar.
Sapo: desavença entre amigos.
Sarau, Baile: mexericos, enredos, invejas.
Sardinhas: azedume, contenda domestica.
Saúde: mau presságio para doentes.
Seda: riqueza, grandeza.
Sede ardente: tristeza. – De água turva, corrupta, etc.: aflições e doenças,
que durarão toda vida.
Seio de mulher cheio de leite: casamento próximo.
Seio de mulher arranhado, ensanguentado: esterilidade. – Murcho ou
enrugado: doença de menino.
Semeadora: riqueza, alegria, saúde.
Seminário: falsidade, traição.
Senado: borrascas políticas.
Sentinela: desconfiança, segurança.
Sereia: traição, melancolia durável.
Seringa. V. Clister.
Serpente: sedução próxima. – Que se enrosca: ódio, doença, prisão,
perigos. – Matar uma: vitória sobre seus inimigos ou invejosos. – Com varias
cabeças: sedução próxima, pecado.
Serra: expedição de negócios, bom sucesso, satisfação.
Serralheiro: flexibilidade, esquecimento de si mesmo.
Sobrancelhas e Pálpebras, mais compridas que as naturais: bom sucesso
em amor, boa fortuna.
Sol, vê-lo: expedição de negócio ás claras. – Quando se põe: nascimento
de uma filha.
Soldados: cansaço, tédio.
Soldo: pobreza.
Sonâmbulo: descanso interrompido, agitação, tumulto.
Sortilégio: engano, falsidade.
Subterrâneo: viagem.
Suicídio: desgraça que o sonhador motivará a si mesmo.
Suplício, sofrer um: honras, respeitos por algum tempo.
T
Tabaco, tomá-lo: prazer sensual. – Espalhá-lo: despeito.
Tafetá: riqueza brevemente desbaratada.
Tambor: perda insignificante.
Tamborete: dignidade puramente honorífica.
Tartaruga: inimigo secreto. – Comê-la: pequeno sucesso, obtido por
longas fadigas.
Teto: comando, dignidade.
Tempo (belo): segurança enganosa.
Tenazes: tormento, perseguição.
Tendas: guerras ou contendas próximas.
Terra, vê-la negra: tristeza, melancolia, hipocondria.
Testa larga e alta: espírito e juízo.
Tetas cheias de leite: ganho.
Tez, pálida, amarela ou chumbada: doença próxima, febre longa e
perigosa.
Termômetro: trama, ataque oculto à reputação.
Tigre: inimigo invejoso, furioso, irreconciliável.
Tinta: reconciliação. – Derramada: desavença prolongada.
Tio, ver o seu ou sua tia: contendas caseiras.
Torrente: caminhar em sua água: desgostos, adversidades.
Tosse: indiscrição.
Toupeira: cegueira moral.
Touro: personagem do qual o sonhador receberá bem ou mal, segundo o
vir grande ou mediano em seu vulto.
Tragédia, ver representar uma: perda de amigos e de bens, tristeza.
Tremor de terra: perigo para a vida do sonhador.
Triângulo: objeto de respeito e duração.
Trigo: riqueza. – Levá-lo: enfermidade.
Túmulo, estar dentro dele: perigo e trabalho.
U
Úlceras ou Sarna, nas pernas: cuidados, desgostos. – Nos braços: perda
de tempo, dores.
Umbigo: más novas de pai ou mãe; perigo de sua morte.
Unguento, fazê-lo: alegria. – Usá-lo: grande lucro.
Unhas, mais compridas que as usuais: grande proveito. – Mais curtas:
perda e desgosto.
Uniforme, trazer um: gloria, valor, celebridade.
Urso, vê-lo: inimigo rico, poderoso, audaz, cruel mas inábil. – Ser
atacado por algum: perseguições, das quais o sonhador sairá bem.
Urtigas ou Cardos: traição. – Ser por elas picado: prosperidade.
Uvas, comê-las em sua madureza: alegria, ganho, gozo, volúpia. –
Verdes: pequena contrariedade seguida de grande lucro. – Secas: perda,
cuidado, amargura. – Pisá-las: vitoria sobre seus inimigos. – Vermelhas:
exprobração. – Brancas: inocência.
V
Vacas, possuí-las: contrariedade.
Vaso, ver um junto a uma fonte: trabalho.
Veias: desgostos.
Vela: fazê-la: alegria, satisfação. – Acesa demora nos negócios.
Velha: sabedoria.
Veludo: honra, riqueza.
Vencer sua mulher: desordem e devassidão. – Seu marido: desonra
próxima.
Veneno: peste, contágio.
Vento: perigo de fortuna, agonia.
Ventoinha: favor de um grande.
Ventre esgalgado: desembaraço de um mau negócio.
Véu de mulher: modéstia, boa qualidade na pessoa amada.
Verdura: diversão no campo.
Veste, ver uma, ou tê-la sobre o corpo: miséria não merecida. – Bordada:
fortuna.
Vestido branco: jubilo para quem o traz. – Sujo, roto ou grosseiro: tédio,
tristeza futura, pecado, vitupério, desprezo geral. – Coberto de ouro ou
bordado: júbilo, respeito, honra. – Trazê-lo de cores várias: desgostos. – Preto:
alegria.
Viajar a pé: trabalho, demora. – Em companhia: bacharelice. – Em
coche: fortuna segura.
Vianda: alegria. – Comê-la: jubilo agudo por saudades, dano. – Negra ou
dura: perdas, desgostos.
Víbora: inimizade irreconciliável.
Vitória: lágrimas.
Vidro: situação precária.
Vinagre vermelho: afronta pessoal. – Branco: insulto feito a outrem. –
Bebê-lo: contrariedades domésticas.
Vindima: prazer, saúde, alegria, riquezas proporcionadas à quantidade da
uva.
Vingança: demanda longa e ruinosa.
Vinho turvo: riqueza. – Bebê-lo puro: força, vigor, saúde. – Aguado:
debilidade de saúde.
Violeta, na estação própria: bom sucesso. – Fora da estação: demanda,
perda de amigos.
Vizinho, Vizinha: discursos mais ou menos perigosos.
Visita do médico: lucro. – Recebê-la: lágrimas. – Fazê-la: contenda
injusta.
Vista, tê-la longa e aguda: felicidade e bom sucesso em todas as
empresas.
Viuvez: satisfação, júbilo.
Vivandeiro, Vivandeira: recurso para o instante último.
Z
Zebra: amizade mal empregada, ingratidão.
Zéfiro: inquietação insignificante.
Zero: poder, fortuna.
Zodíaco (ver um signo do): fortuna para a loteria.
TABELLA
dos dias de felicidade e infelicidade em todos os meses do ano, segundo a
opinião de alguns visionários
Meses
Janeiro
Fevereiro
Março
Abril
Maio
Junho
Julho
Agosto
Setembro
Outubro
Novembro
Dezembro
Dias felizes
4, 19, 27, 31
7, 8, 18
3, 9, 12, 14, 16
5, 27
1, 2, 4, 6, 9, 14
3, 5, 7, 9, 12, 23
2, 6, 10, 23, 30
5, 7, 10, 14, 19
6, 10, 15, 18, 30
13, 16, 23, 31
3, 13, 23, 30
10, 20, 29
Dias infelizes
13, 23
2, 10, 17, 22
13, 19, 23, 28
10, 20, 29, 30
10, 17, 20
4, 20
5, 13, 27
2, 14, 27, 31
13, 16, 22, 24
3, 9, 27
6, 25
15, 28, 31
TABELLA
Do grau de veracidade ou falsidade dos sonhos, segundo a influência que
neles exerce a idade da lua
Dias da lua Grau de veracidade ou falsidade dos sonhos
1
O sonho neste dia é precursor de felicidade.
2
Inteiramente falso.
3
Não terá efeito algum.
4
Anuncia felicidade, que, sem dúvida, se realizará.
5
Sem utilidade.
6
Havendo discrição, anuncia bom resultado.
7
Deve tomar-se em consideração, porque se realisará.
8
Também é realizável.
9
Terá efeito antes do fim do dia.
10
Realiza-se com proveito.
11
Verifica-se dentro em quatro dias.
12
Verifica-se justamente o contrario do que se sonhou.
13
Realizável.
14
Tardará muito a verificar-se.
15
Se for de números, entrai na loteria.
16
Verdadeiro.
17
Não se deve contar antes de passar o terceiro dia.
18
Efeito demorado.
19
Dará alegria.
20
Terá efeito dentro de quatro dias.
21
Não merece atenção.
22
Dentro de alguns dias terá efeito.
23
Realiza-se em três dias.
24
Verifica-se completamente.
25
Terá efeito demorado.
26
Merece atenção, porque será util.
27
É verídico.
28
O mesmo.
29
Anuncia fortuna.
30
É mentiroso; acontecerá o contrário.
FIM DA PRIMEIRA PARTE
PARTE SEGUNDA
ADVERTÊNCIA INDISPENSÁVEL
ÀS DAMAS E CAVALHEIROS
O melhor meio de usar destas perguntas e respostas, é extrair de todas
(ou daquelas coleções que se quiser) uma cópia em bilhetes de papel grosso,
entregando os que contiverem as perguntas aos cavalheiros, e os das respostas
às senhoras, e depois de bem baralhados se irão lendo aqueles que a sorte
conduzir à vista, e as senhoras respondem no mesmo gosto; porque nenhuma
graça poderiam ter se se estivessem escolhendo como eu já tenho visto
praticar.
A divisão dos bilhetes deve ser feita na proporção dos homens e senhoras
que se queiram entregar a este divertimento, de sorte que não excedam os
perguntadores às respondentes, nem estas àqueles.
1.ª COLEÇÃO
PERGUNTA 1.ª
Poderei em vosso peito,
O meu amor depositar?
RESPOSTA 1.ª
O vosso amor em meu peito
Já ocupa distinto lugar.
P. 2.ª
Longe da minha vista,
Podereis lenitivo encontrar?
R. 2.ª
Ausente da vossa companhia,
Bem mal poderei respirar.
P. 3.ª
Com o vosso puro amor,
Posso eternamente contar?
R. 3.ª
Eu vos amo por simpatia,
Hei de as leis do amor respeitar.
P. 4.ª
Pode vosso cândido peito,
Meu sincero amor desprezar?
R. 4.ª
Jurei ser a mais constante,
Protestei sempre amar.
P. 5.ª
Um amor puro e sincero,
Podeis em mim acreditar?
R. 5.ª
Ser ingrata é impróprio
De quem sabe adorar.
P. 6.ª
No intimo do vosso peito,
Posso meu amor eternizar?
R. 6.ª
O conceito que de vós formei,
Não é possível expressar.
P. 7.ª
Alguma ideia de lealdade,
Podeis de mim formar?
R. 7.ª
Certa da vossa fidelidade,
Não vos posso mais deixar.
P. 8.ª
Desprezareis os grilhões,
Com que amor nos quer ligar?
R. 8.ª
Vossa ternura me inspira,
Um amor mui singular.
P. 9.ª
Sabeis a quem amor puro,
Sempre se deve consagrar?
R. 9.ª
Esse manancial de doçuras,
Será para quem o estimar.
P. 10.ª
Posso em vosso coração,
Extremoso amor firmar?
R. 10.ª
A violência de meus males,
Só vós podereis mitigar.
P. 11.ª
Não vos compadecereis,
De me ver desesperar?
R. 11ª
Adquiro um triunfo,
Quando vos vejo penar.
P. 12.ª
Sereis sempre indiferente,
A quem não cessa de vos idolatrar?
R. 12.ª
Estou vendo em vosso rosto,
Vivos desejos de enganar.
P. 13.ª
Ah! Senhora, dizei-me,
Podeis minha dor suavizar?
R. 13.ª
Não, jamais, só a morte
Vos poderá aliviar.
P. 14.ª
Quereis ver continuamente,
Minhas dores aumentar?
R. 14.ª
Se outra causa vossas dores,
Só a ela deveis culpar.
P. 15.ª
Podereis acaso um dia,
Com ternura em mim pensar?
R. 15.ª
Se desprezo o vosso amor,
Para que haveis de teimar?
P. 16.ª
As chaves de Cupido de vosso
Coração posso alcançar?
R. 16.ª
Acabai vossas perguntas,
Tanto já não posso aturar.
P. 17.ª
Consentireis que em vosso
Peito, vá meu amor ocultar?
R. 17.ª
Não queirais em lagrimas,
Meu coração sepultar.
P. 18.ª
Em que dia o constante
Amor vos há de dominar?
R. 18.ª
Quando em vosso coração,
A pérfida ingratidão cessar.
P. 19.ª
Não verei a ingratidão,
Em vosso peito abrandar?
R. 19.ª
Sim, quando as angústias
Vosso rosto desfigurar.
P. 20.ª
Não vos compadecereis,
De me ver sempre suspirar?
R. 20.ª
Compassiva me vereis,
Deixando vós de adular.
P. 21.ª
Jurastes à negra morte,
Meu coração sacrificar?
R. 21.ª
A vossa falsa constância,
Protestei sempre imitar.
P. 22.ª
O possuidor de vosso coração,
Não me haveis de indicar?
R. 22.ª
Jurei guardar segredo,
Não quero juramento violar.
P. 23.ª
Conheceis em minha alma,
O dom natural de adorar?
R. 23.ª
A vossas perguntas não respondo,
Escusais de vos cansar.
P. 24.ª
Entreguei-vos meu coração,
Que mais vos resta a desejar?
R. 24.ª
Vosso desejo é lograr-me,
Tal não podereis realisar.
P. 25.ª
Terei eu assas forças, para
Vosso coração cativar?
R. 25.ª
Vossas súplicas são inúteis,
Nunca me poderão encantar.
P. 26.ª
Quando irei em vosso peito,
Minha cabeça reclinar?
R. 26.ª
Quando as sombras da morte,
Vosso rosto matizar.
P. 27.ª
Nunca a crueldade há de
Em vosso peito terminar?
R. 27.ª
Só quando vosso modo
Enganador finalizar.
P. 28.ª
Se vos pedir uma entrevista,
Sereis pronta em aceitar?
R. 28.ª
Não vos enfadeis, senhor,
Pois não sei abjurar.
P. 29.ª
Prometeis o implacável
Ódio, para sempre detestar?
R. 29.ª
Assim que vós perdereis
O costume de ludibriar.
P. 30.ª
Dizem que sois eminente
Na arte de namorar?
R. 30.ª
Nada disso em mim vereis,
O que me apraz é ver penar.
P. 31.ª
Meu amor e sinceridade,
Não merece um terno olhar?
R. 31.ª
Queria responder-vos,
Mas não me posso explicar.
P. 32.ª
Prometeis-me algum dia,
Meus suspiros escutar?
R. 32.ª
Sim, no momento em que
Por verdadeiro vos acreditar.
P. 33.ª
Longe da minha vista,
Pode vosso coração sossegar?
R. 33.ª
A inconstância do vosso caráter,
Eu vou fazer decantar.
P. 34.ª
Na mais triste solidão,
Quereis minha alma despenhar?
R. 34.ª
Nas promessas do vosso amor,
Eu já não posso confiar.
P. 35.ª
Os sofrimentos dum amor
Sincero, não haveis de evitar?
R. 35.ª
A vossas penas darei fim,
Quando com a morte me abraçar.
P. 36.ª
Sabeis aonde uma paixão,
Verdadeira nos pode arrastar?
R. 36.ª
Vítima da ingratidão,
Em nada posso combinar.
P. 37.ª
Esse gênio indiferente,
Não haveis de desterrar?
R. 37.ª
Se visse o coração dos homens,
Poder-me-ia deliberar.
P. 38.ª
Se vos aparecer às horas,
Dar-me-eis do vosso jantar?
R. 38.ª
Não posso responder-vos,
De meu Pai licença vou solicitar.
P. 39.ª
De vossos gentis encantos,
Posso o gosto saborear?
R. 39.ª
Não direi que não, quando
De vingança me saciar.
P. 40.ª
Desejareis sempre ver,
Meus males continuar?
R. 40.ª
Deixai de ser ingrato,
Vereis meu ódio abrandar.
2.ª COLEÇÃO
PERGUNTA 1.ª
Um verdadeiro amante,
Merecerá vosso coração?
RESPOSTA 1.ª
Tenho deveres a cumprir,
Falai para o S. João.
P. 2.ª
Se vos pedir um beijo,
Tereis nisso satisfação?
R. 2.ª
Sim, senhor, se de joelhos
Me pedireis perdão.
P. 3.ª
Se me vireis perecer,
Tereis de mim compaixão?
R. 3.ª
Oh! Sim, certamente,
Morrerei de aflição.
P. 4.ª
Estarei condenado,
A sofrer vossa ingratidão?
R. 4.ª
Não digo que sim senhor,
Nem é da minha aprovação.
P. 5.ª
As algemas do vosso amor,
Serão de eterna duração?
R. 5.ª
Estou cansada de tanto,
É muita satisfação.
P. 6.ª
De ser por vós amada,
Posso ter presunção?
R. 6.ª
Respostas desta sorte,
Jamais a ninguém se dão.
P. 7.ª
De ser minha amada,
Tereis gosto e devoção?
R. 7.ª
É verdade que vos amei,
Porém mudei de opinião.
P. 8.ª
Nos doces laços de amor,
Fareis comigo união?
R. 8.ª
Não posso dizer que sim,
Eis a minha consternação.
P. 9.ª
Se vos falar em amor,
Gostareis da conversação?
R. 9.ª
Amo-vos com sinceridade,
E adoro-vos por inclinação.
P. 10.ª
De minha fiel amante,
Aceitareis a eleição?
R. 10.ª
Não estou resolvida,
A prestar-vos atenção.
P. 11.ª
Para ser de vós amado,
Deverei pôr tudo em ação?
R. 11.ª
Podeis fazê-lo, senhor,
Porém será indiscrição.
P. 12.ª
A minhas expressões de amor,
Dareis consideração?
R. 12.ª
Sou firme no que prometo,
Já não mudo de resolução.
P. 13.ª
De todos os vossos amantes,
Sentis por mim alguma afeição?
R. 13.ª
Não posso já responder,
De amor preciso lição.
P. 14.ª
Se vos escolher por amante,
Fareis disso estimação?
R. 14.ª
Não tenho tais ideias,
No entanto ainda virão.
P. 15.ª
De amor gostareis,
Longa e rígida prisão?
R. 15.ª
Oh! Quereis-me no laço,
Bem sei que sois espertalhão.
P. 16.ª
Das leis de Cupido,
Seguireis a Religião?
R. 16.ª
Sois bem importuno!...
Já vos dei a decisão.
P. 17.ª
Um verdadeiro amante,
Merece vossa proteção?
R. 17.ª
De verdadeiro nada tendes,
Tudo é pura ficção.
P. 18.ª
Da vossa sinceridade,
Posso ter a confirmação?
R. 18.ª
Na verdade, é muito exigir,
Já tendes a minha confissão.
P. 19.ª
Se vos falar de himeneu,
Aceitareis a petição?
R. 19.ª
Falareis outro dia,
Hoje não é ocasião.
P. 20.ª
Dos amantes que tendes,
Eu terei a predileção?
R. 20.ª
O vosso amor em meu peito,
Tem segura habitação.
P. 21.ª
De meus puros sentimentos,
Fareis especial menção?
R. 21.ª
Já é tempo de me deixar,
Parece-me isto mangação!
P. 22.ª
Em corresponder-me,
Hei de achar obstinação?
R. 22.ª
Se quereis uma resposta,
Tendes a dar um tostão.
P. 23.ª
Se vos ofertar meu amor,
Poreis alguma objeção?
R. 23.ª
Para dizer-vos o que sinto,
Não tenho obrigação.
P. 24.ª
Dentre os que vos adoram,
Escolhereis com retidão?
R. 24.ª
Serei em tudo minuciosa,
Ficai certo da remuneração.
P. 25.ª
Meus ternos sentimentos,
Serão a vossa admiração?
R. 25.ª
Se quereis que vos responda,
Rezai uma oração.
P. 26.ª
Hoje ouvi dizer que sois
O símbolo da mansidão?
R. 26.ª
Essa pergunta não parece,
De quem tem educação.
P. 27.ª
A indiferença comigo,
Nasce da vossa disposição?
R. 27.ª
Meus puros sentimentos,
Não sofrem diminuição.
P. 28.ª
Acreditais que vos amo,
Por íntima convicção?
R. 28.ª
Desejava responder-vos,
Fora desta reunião.
P. 29.ª
Do amor que vos consagro,
Fareis boa estimação?
R. 29.ª
Os vossos ternos afetos,
Podem ter compensação.
P. 30.ª
Das culpas que tenho de amor,
Concedeis-me o perdão?
R. 30.ª
Estais sempre perdoado,
Ide com a Virgem Conceição.
3.ª COLEÇÃO
PERGUNTA 1.ª
Reconheceis em mim,
O mais sincero amor?
RESPOSTA 1.ª
Recebo vossa declaração,
Como seguro penhor.
P. 2.ª
Aceitais minha confissão,
De ser verdadeiro amador?
R. 2.ª
Não aceito essa confissão,
De meus males sois autor.
P. 3.ª
De vossas belas qualidades,
Conheceis-me admirador?
R. 3.ª
Os laços que a vós me ligam,
Não precisam de fiador.
P. 4.ª
De vosso amável peito,
Sou o único diretor?
R. 4.ª
O que sinto em meu peito.
Não merece se não louvor.
P. 5.ª
Em amar-vos com pureza,
Serei grande pecador?
R. 5.ª
Sois de meu coração,
O maior usurpador.
P. 6.ª
Da vossa sinceridade,
Acreditais-me defensor?
R. 6.ª
Vossas virtudes me encantam,
Amo-vos com fervor.
P. 7.ª
Serei de vossa alma,
O único possuidor?
R. 7.ª
Não andais na moda,
Sois pouco tentador.
P. 8.ª
No íntimo de vossa alma,
Só eu sou imperador?
R. 8.ª
Não quero responder,
Se o faço, é por favor.
P. 9.ª
Gostais muito de namorar?
Quem é o vosso encantador?
R. 9.ª
Quisera falar verdade,
Sois grande criticador.
P. 10.ª
Dizem que muito gostais,
De cavalheiro adulador?
R. 10.ª
Responder-vos é ocioso,
Sei o que sinto no interior.
P. 11.ª
Poderei eu acreditar,
Que não tenho competidor?
R. 11.ª
Não quero responder,
A semelhante lisonjeador.
P. 12.ª
Em vossos grandes namoros,
Haveis, sofrido dissabor?
R. 12.ª
Oh! Deus e eu o sabemos,
Qual tem sido minha dor.
P. 13.ª
Quem foi de vosso coração,
O primeiro roubador?
R. 13.ª
Vós certamente que não,
Sois um vil traidor.
P. 14.ª
Serei das leis de Cupido,
O mais fiel observador?
R. 14.ª
Dizem todos que sois
O maior namorador...
P. 15.ª
Tantos namorados que tendes,
Quem vos ama com mais vigor?
R. 15.ª
Vós certamente não,
Sois um grande impostor.
P. 16.ª
Quem de vossas qualidades,
É mais que eu respeitador?
R. 16.ª
Deixai-me importuno!
Sois um enganador.
P. 17.ª
Que mal vos tenho feito,
Para tanto desamor?
R. 17.ª
Do mais puro afeto,
Sois o maior transgressor.
P. 18.ª
Das sagradas leis de amor,
Eu sou o mais apreciador?
R. 18.ª
Sim senhor, sem dúvida,
Tendes nota de corruptor.
P. 19.ª
Poderei de vosso coração,
Ser um dia habitador?
R. 19.ª
Falai-me a esse respeito,
Quando eu rainha for.
P. 20.ª
Pode alguém amar-vos,
Com mais pureza e calor?
R. 20.ª
Não posso hoje responder,
Procurai o melhor Doutor.
P. 21.ª
Dos amorosos sentimentos
De vossa alma serei consolador?
R. 21.ª
Essa pergunta é louca,
Nisto estais atrasador?
P. 22.ª
Dos amores de vossa alma,
Serei eu o edificador?
R. 22.ª
Era um belo serviço,
Servindo-me de libertador.
P. 23.ª
Sereis dentre as belas,
A mais mimosa flor?
R. 23.ª
O que sinto não se diz,
Não tenho o preciso valor.
P. 24.ª
Vossa constante firmeza
São efeitos do criador?
R. 24.ª
De meus puros sentimentos,
Deveis estar conhecedor.
P. 25.ª
Concordais que sou vosso,
Mais puro estimador?
R. 25.ª
Sei que sois o maior
E mais vil contraditor.
P. 26.ª
De todos vossos namoros,
Fui o primeiro descobridor?
R. 26.ª
De discreto nada tendes,
Sois um indigno delator.
P. 27.ª
Devo ir em vosso peito
Minha fidelidade depor?
R. 27.ª
Aceitar vossa declaração,
É sofrer um ditador.
P. 28.ª
Posso esperar de vós,
Um afeto conservador?
R. 28.ª
Desisti de tais ideias,
Não quero mais amargor.
P. 29.ª
Reconheceis em mim,
Um sincero amador?
R. 29.ª
De meu peito estai certo,
Sois nele o dominador.
P. 30.ª
Acreditais que vos amo,
Com indizível primor?
R. 30.ª
Adeus, basta de tormentos,
Sois um consumidor.
4.ª COLEÇÃO
PERGUNTA 1.ª
Pode um fiel amante,
Confiar na vossa amizade?
RESPOSTA 1.ª
Meus sentimentos são puros,
Meu coração ama a verdade.
P. 2.ª
Se vos ofertar meu peito,
Recebê-lo-eis com vontade?
R. 2.ª
Amar a todos em geral,
É próprio da mocidade.
P. 3.ª
É certo que vosso coração,
Só encerra verdade?
R. 3.ª
Gozo dessa opinião,
Na alta sociedade.
P. 4.ª
De vos ofertar meu coração,
Concedeis-me a liberdade?
R. 4.ª
Aceito a bela oferta,
E gosto dessa habilidade.
P. 5.ª
Seu morrer em vossos braços,
Iremos para a Eternidade?
R. 5.ª
Iremos se Deus quiser,
Mas não desejo a dignidade.
P. 6.ª
Para ser vosso amante,
Terei capacidade?
R. 6.ª
Não costumo preterir,
Sigo a antiguidade.
P. 7.ª
Se vos tributar meu amor,
Dispensais formalidade?
R. 7.ª
Cerimônias são de igreja,
E só próprio de abade.
P. 8.ª
Se vos ofertar meu peito,
Direis que já é tarde?
R 8.ª
Não vos canseis comigo,
Isso é uma temeridade.
P. 9.ª
O amor que sinto por vós,
Será tido por vaidade?
R. 9.ª
Não: Acredito-vos sincero,
Não falto a tal qualidade.
P. 10.ª
Se vos disser que amo outra,
Julgareis realidade?
R. 10.ª
Acreditarei sim, tudo,
Como grande falsidade.
P. 11.ª
Se morrer longe de vós,
Não tereis de mim saudade?
R. 11.ª
Talvez fosse dia de prazer,
Sabendo tal novidade.
P. 12.ª
Dizem que em namoros,
Tendes grande felicidade?
R. 12.ª
Para realisar esses desejos,
Ha impossibilidade.
P. 13.ª
É verdade que escarneceis,
Do meu amor com impiedade?
R. 13.ª
Não: Sou firme e constante,
Sabeis minha sinceridade.
P. 14.ª
Tratareis vosso amante,
Com rigor e severidade?
R. 14.ª
Gosto meu é ser austera,
Mas tratarei com igualdade.
P. 15.ª
De amor haveis sofrido,
Grande enfermidade?
R. 15.ª
Tenho tido em demasia,
Porque vivo na Cidade.
P. 16.ª
Será verdade que em namoro,
Procedeis com leviandade?
R. 16.ª
Sei o que me cumpre fazer,
Em objeto de gravidade.
P. 17.ª
É certo que tratais vossos
Amantes sem piedade?
R. 17.ª
A culpa não é minha,
Que tenham mais sagacidade.
P. 18.ª
Duvidais que vos amo
Com toda a assiduidade?
R. 18.ª
Não duvido do que dizeis,
Conheço a vossa lealdade.
P. 19.ª
De vosso terno coração,
Quem é propriedade?
R. 19.ª
Essa pergunta delicada,
Precisa profundidade.
P. 20.ª
Toda a vida sofrerei
A vossa crueldade?
R. 20.ª
Vós assim o quereis,
Não faço isso por maldade.
P. 21.ª
Para que me tratareis,
Com tanta inimizade?
R 21.ª
Aborreço-vos de coração,
Falo com ingenuidade.
P. 22.ª
Desprezais quem vos ama
Com tanta afabilidade?
R. 22.ª
Se quereis que vos estime,
Tende mais agilidade.
P. 23.ª
Existirá sempre entre nós,
Simpatia e fraternidade?
R. 23.ª
Em vossas mãos, entrego
Minha fidelidade.
P. 24.ª
Vosso amor será confiado,
Á minha generosidade?
R. 24.ª
Nunca: Só consentirei,
Na ultima extremidade.
P. 25.ª
Concedeis-me afeto
Com muita brevidade?
R. 25.ª
É de noite, não respondo,
Gosto de tudo com claridade.
P. 26.ª
Nas lidas de Cupido
Encontrais suavidade?
R. 26.ª
É um divertimento,
Que dou por caridade.
P. 27.ª
Tantos namorados que tendes
Algum é da minha idade?
R. 27.ª
Com toda a certeza não sei,
Mas perguntarei ao Padre.
P. 28.ª
Os namoros verdadeiros,
Produzem debilidade?
R. 28.ª
Não me incomodeis,
Com essa singularidade.
P. 29.ª
Males de amor devo sofrer
Na última extremidade?
R. 29.ª
É vosso gosto predileto,
Sofrei com perpetuidade.
P. 30.ª
Apreciais meu afeto,
E minha fidelidade?
R. 30.ª
Amo-vos muito, muito;
Mas gosto de tranquilidade.
5.ª COLEÇÃO
PERGUNTA 1.ª
Entendeis, senhora,
Nosso amor conveniente?
RESPOSTA 1.ª
Fujo de suas algemas,
Quero viver inocente.
P. 2.ª
No amor que vos dedico,
Acreditais firmemente?
R. 2.ª
Creio em vossos extremos,
Quero ser condescendente.
P. 3.ª
Se vos declarar meu amor,
Ficareis muito contente?
R. 3.ª
Amo por divertimento,
De lágrimas serei ausente.
P. 4.ª
Em vosso terno coração,
Terei fiel correspondente?
R. 4.ª
Não respondo neste objeto,
A quem é tão sapiente.
P. 5.ª
Não vos compadecereis,
De me ver sempre doente?
R. 5.ª
Não merece compaixão
Quem se ufana de valente.
P. 6.ª
Nos combates do vosso amor,
Serei o maior padecente?
R. 6.ª
Se padecer é gosto vosso,
A isso sou indiferente.
P. 7.ª
Sabeis que em namoros,
Vos tornais mui saliente?
R. 7.ª
Para falar a meu respeito,
Julgo-vos incompetente.
P. 8.ª
É certo que em namoros,
Sois mui inteligente?
R. 8.ª
Não vos acredito, só creio
Num Deus Onipotente.
P. 9.ª
Do vosso amor, ficarei
Na incerteza permanente?
R. 9.ª
Estou sujeita, senhor,
E a meu Pai obediente.
P. 10.ª
Hei de sofrer por vosso amor
Sempre uma dor pungente?
R. 10.ª
Vossa dor não tem limite,
Assim o diz o assistente.
P. 11.ª
Se vos falar em amor,
Sereis comigo indulgente?
R. 11.ª
É meu gosto ver penar,
Sereis por isso penitente.
P. 12.ª
Se vos ofertar meu amor,
Serei julgado delinquente?
R. 12.ª
Não posso aceitar a oferta,
Vosso amor é transparente.
P. 13.ª
Na lista de vossos amantes,
Eu sou o mais prudente?
R. 13.ª
Dos amantes que possuo,
Sois o mais impertinente.
P. 14.ª
De que sou por vós amado,
Dareis prova evidente?
R. 14.ª
Pago amor, com amor,
De ser fiel ficai ciente.
P. 15.ª
Sabeis que vos consagro
Verdadeiro amor ingente?
R. 15.ª
No que dizeis não creio,
Vosso amor é aparente.
P. 16.ª
Dos amantes que tendes,
Eu sou o presidente?
R. 16.ª
Não posso responder hoje,
Que estou de má mente.
P. 17.ª
Ao gozo do vosso amor,
Sou o maior pretendente?
R. 17.ª
Eu com vossas lembranças,
Não estou coerente.
P. 18.ª
É certo, que vosso amante
É do lado do ocidente?
R. 18.ª
Amo virtudes onde estão
E detesto o prepotente.
P. 19.ª
Dentre vossos amantes,
Sou escolhido previamente?
R. 19.ª
Não posso dizer que sim,
Julgo-vos negligente.
P. 20.ª
Dos votos dum terno amor,
Acreditais-me profitente?
R. 20.ª
Creio em vossas expressões,
Meu coração tem fé vivente.
P. 21.ª
Qual de vossos amantes,
É o mais frequente?
R. 21.ª
À pergunta não respondo
E vos reputo insolente.
P. 22.ª
Encontro em vosso peito,
Um puro amor nascente?
R. 22.ª
Não vos canseis, senhor,
Para vós sou inclemente.
P. 23.ª
Dos segredos de vossa alma,
Quem é ditoso confidente?
R. 23.ª
É coisa que não digo,
Nem mesmo a um parente.
P. 24.ª
Os extremos de vosso peito,
São de amor descendente?
R. 24.ª
Reparai em meus olhos,
Resposta tereis presente.
P. 25.ª
O vosso terno amor,
É ao meu equivalente?
R. 25.ª
Sinceramente vos amo,
Nessa ideia ficai crente.
P. 26.ª
De todos vossos amantes,
Sou o mais reverente?
R. 26.ª
Eu vos dedico puro amor,
A minhas forças excedente.
P. 27.ª
Em vosso terno peito,
É puro o amor existente?
R. 27.ª
Não vos calareis, palrador?
Sois um omnisciente.
P. 28.ª
É certo o vosso amante,
Ser aspirante a tenente?
R. 28.ª
Não tem resposta a pergunta,
Podeis marchar em frente.
P. 29.ª
Aceitais a declaração
De meu amor ardente?
R. 29.ª
Não posso responder-vos,
Gozais fama de mal querente.
P. 30.ª
Pode alguém amar-vos,
Como eu tão veemente?
R. 30.ª
Oh! Falador, deixai-me,
Eu não posso ser acedente.
JOGOS
DE
Mãos com cartas muito curiosas, os quais são de muito divertimento,
podendo qualquer pessoa aprendê-los com facilidade, porque são feitos
com o baralho de quarenta cartas.
Modo de compor o baralho para fazer alguns jogos
Compõe-se o baralho, dando às cartas um valor diverso, isto é, o três terá
o valor de 3, o seis também terá o valor de 6, a sota de 9, o dois de 12, o cinco
de 15, o valete de 18, o ás de 21, o quatro de 24, o sete de 27, e o rei de 30;
darás também um certo valor aos naipes por graduação, isto é, o primeiro grau
às espadas, 2.º aos paus, 3.º aos ouros, e 4.º às copas; agora para se compor o
baralho, estenderás todas as cartas em cima da mesa cara acima, e em 4
fileiras, por graduação, e começarás pelo primeiro grau, que são as espadas a
levantar; suponhamos levantas o três de espadas, e juntando-lhe 3 de memória
fás 6, levantarás o 6 do segundo grau que é paus, e o porás em cima do 3 boca
abaixo, e dirás seis de paus, com três de memória fás nove, levantarás a sota
do 3.º grau que é ouros, e com os 3 de memória fás 12, levantarás o dois de
copas que é o ultimo grau, e ao 2 junta 3 de memória fás 15, levantarás o 5 de
espadas com 3 fás 18, levantarás o valete de paus, com os 3 fás 21, levantarás
o ás de ouros, com os 3 fás 24, levantarás o 4 de copas, com os 3 fás 27,
levantarás o sete de espadas, e com os 3 fás 30, levantarás o rei de paus, e
adverte que chegando aos reis, os quais têm o valor de 30, não se lhe juntam
os 3 de memória, e torna-se a começar no três do mesmo naipe daquele rei,
por isso levantarás o 3 de paus, e com os 3 de memória fás 6, levantarás o 6 de
ouros, e juntando-lhe os 3 de memória fás 9, levantarás a sota de copas, e
prosseguirás assim até levantar todo o baralho, juntando sempre os 3 de
memória, exceto aos reis; e porás as cartas sempre umas detrás das outras, e
depois do baralho assim composto (sem que o saibam) poderás fazer os jogos
seguintes.
Jogo para adivinhar todas as cartas do baralho, estando repartidas pelos
circunstantes
Tomarás o baralho composto e o embaralharás, mas de tal sorte que
nunca hás de meter cartas entre meio, mas sim tirar de baixo e pôr em cima,
depois mandarás partir, começarás a dar uma porção de cartas a cada pessoa
deixando ficar na mão a ultima carta de baixo, ou entregá-lo, mas observar,
que carta é para por ela pedir todas as outras, começando por onde acabaste de
entregar; suponhamos que a ultima carta era um valete de paus, dirás dezoito
(que é o valor do valete) e 3 de memória fás 21, pedirás o ás de ouros; e
prosseguirás assim até concluir, guardando a regra antecedente; e as cartas que
fores pedindo as irás pondo na mesa boca abaixo umas em cima das outras
para ficarem sempre compostas para fazeres os jogos seguintes.
Jogo para adivinhar todas as cartas pelo tacto
Depois de baralhar e partir o baralho como no jogo antecedente,
observarás a ultima carta, sem que o percebam, e com o baralho na mão
esquerda, boca abaixo, e fazendo que apalpas com os dedos, suponhamos que
a carta que observaste por baixo é um rei de paus, dirás: esta pelo tacto
conheço que é um rei de paus, o qual mostrarás, e posto em cima da mesa
boca abaixo puxarás outro e como aos reis não se junta nada, dirás: esta é um
3 de paus o qual mostrarás, e porás em cima do rei, e juntando ao 3 mais 3 de
memória que fás 6, dirás: este é o 6 de ouros, e juntando-lhe os 3 fás 9,
precisamente a que se segue será a sota de copas, e prosseguindo assim até
final verás como se acertam todas, observando sempre a regra de juntar os 3
de memória a cada carta, exceto aos reis, e também seguir a graduação dos
naipes.
Jogo para adivinhar repentinamente uma carta que outro tenha
escondido
Com o baralho composto como acima, o estenderás a modo de um leque
na mão esquerda boca abaixo, que se não vejam as suas pintas, e dirás a um
dos circunstantes, que tire uma carta qual quiser, e que a esconda logo, partirás
o baralho em dois montes pelo sitio onde o sujeito tirou a carta e observarás a
carta que está por cima do monte de baixo (com dissimulo que o não
percebam), v. g. era um sete de espadas, ao qual juntarás os 3 de memória e
fás 30, por isso dirás que a carta escondida é o rei de paus, o qual porás no
sitio donde foi tirado, e o monte por onde partiste por cima para ficar sempre o
baralho composto.
Jogo para adivinhar e mostrar as cartas que te pedirem
Depois de baralhar e partir pelo modo que acima fica dito, observarás a
carta de baixo e começarás por ela a fazer quatro carreiras de cartas boca
abaixo, contendo 10 cartas cada uma, de modo que fiquem todas em linha reta,
tanto do alto como ao través; Suponhamos que a carta que viste por baixo era
um quatro de paus, logo as outras 3 que lhe estão em linha no cimo das
fileiras, são os outros 3 quatros, v. g. suponhamos que te pedem o rei de copas,
contarás sobre a carta da primeira fileira dizendo 4 de paus com 3 de memória
fás sete, e com mais 3 fás 30; logo entenderás que nas terceiras cartas de cada
fileira estão os reis e para saberes o seu naipe dirás a primeira paus, a segunda
ouros, e a terceira copas, que é exatamente o dito rei de copas; e se te
houvessem pedido o rei de paus, bastaria seguir a graduação pelos 4 reis, pois
sendo o rei de copas da primeira fileira, o da 2.ª deve ser o de espadas, o da 3.ª
de paus, e o da 4.ª ouros, e adverte que depois de haveres mostrado as cartas
que te pedirem as irás pondo no mesmo sitio, e depois que todos hajam
pedido, levantarás as cartas ao través, isto é, primeiro os quatro quatros, que
são as primeiras cartas de cada fileira e assim até final, de modo que não
vejam que vão juntos deste modo, para fazeres o jogo seguinte.
Jogo para fazer sair os reis, as sotas, os valetes e todas as mais cartas
todas juntas
Depois de baralhar e partir como te tenho ensinado, observarás a ultima
carta de baixo, suponhamos que é um valete, logo dirás aos circunstantes, vou
agora fazer sair os 4 valetes juntos, e adverte que nestas 4 primeiras cartas
pode suceder não saírem certas, e faltar alguma, mas sucedendo isto, dirás que
te fugiram é as tirarás por cima, que lá estarão, e tirados os 4 valetes lhe
juntarás ao seu valor de 18, os 3 de memória que fás 21, por isso dirás agora
vou a tirar os 4 ases, depois junta a 21 os 3 de memória fás 24, dirás agora vou
tirar os quatros, e por esta forma tirarás todas as outras, e com este jogo ficará
o baralho desarranjado.
Jogo para dividir os quatro valetes pelo baralho e fazer com que
apareçam juntos
Mostrarás os quatro valetes por baixo, mas de modo que antes do ultimo
de baixo tenhas metido 3 cartas de tal modo justas ao valete que se não
percebam, puxando os outros 3 algum tanto fora para que vejam que estão
todos no fundo do baralho, depois com o baralho boca abaixo, puxarás pelo
primeiro valete e o porás por cima, e depois irás tirando as 3 cartas e as porás
pelo meio do baralho uma em cada sitio, e julgando os circunstantes que tens
metido os valetes, mandarás a um que parta, e depois puxarás as cartas e verás
como saem juntos.
Jogo para adivinhar as cartas que um sujeito tem na mão
Mandarás a um sujeito, que tome do baralho as cartas que quiser, e que
lhe junte outras tantas, depois dá-lhe tu por tua mão mais um certo número
delas, mandarás depois que tire metade de todas as que tiver, e também as que
primeiro tomou do baralho; feito isto, saberás que lhe ficaram na mão só
metade das que lhe tu deste por tua mão, para o que é preciso que lhe dês
sempre número par.
Jogo para adivinhar quem tomou na tua ausência dois objetos que tiveres
deixado em cima da mesa
Darás a um sujeito 3 cartas, e a outro 9, depois porás em cima da mesa 2
cartas, ou 2 objetos; suponhamos que puseste um rei e um ás; e sendo preciso
dar aos 2 objetos valores diferentes, darás ao rei o valor superior, e ao ás
inferior, e retirando-te para que cada um dos sujeitos a quem deste as cartas
tome a sua carta, lhe dirás depois que o sujeito que tomou o rei, multiplique o
número de cartas que lhe deste por 2, e o que tomou o ás por 12, e que somem
as multiplicações, cuja soma diminuam de 156, e que digam depois o que
ficou, cuja quantia partirás por 11 (sem que o percebam) e se te vierem 9 ao
quociente saberás que o sujeito a quem deste as 9 cartas tem o objeto de maior
valor que é o rei, e se te vier 3 ao quociente, o sujeito a quem deste as 3 cartas
terá o dito rei, ou o objeto de maior valor, e por conseguinte o outro o de
menos valor que é o ás, se fizeres o jogo com objetos darás sempre o valor
superior a um, e inferior ao outro, e em lugar de cartas usarás grãos, ou outra
cousa semelhante.
Jogo para adivinhar os tentos de três cartas
Neste jogo contam-se os tentos das cartas pelas suas pintas, exceto as
figuras que terão o valor de 10 tentos cada uma, assim como no jogo do
chincalhão; agora a pessoa que quiser adivinhar os tentos de 3 cartas mandarás
que na sua ausência façam 3 montes de cartas, contando sobre os tentos da
primeira até 15, v. g. a primeira carta é um rei, ponha-se na mesa boca abaixo,
e conte-se por 10, e ponha-se outra em cima e diga-se 11, e logo outra 12 (sem
as ver) e irás pondo cartas até chegar à conta de 15, cujo monte ficará
concluído com 6 cartas, depois faça-se outro, e suponhamos que a carta a
seguir é um sete, darás principio ao 2.º monte com ela contando-a por sete, e
logo porás em cima dizendo 8, e assim até concluir a conta de 15, depois
proceda-se ao terceiro monte, e suponhamos que a sua carta primeira é um ás,
dirás 1, e à que lhe puseres em cima 2, até chegar a 15; e feitos os montes,
dirás à pessoa ausente que te adivinhe os tentos que contêm as 3 primeiras
cartas dos montes, este te perguntará quantas cartas sobejaram, v. g. sobejaram
10 cartas, ao que só lhe basta juntar a este número 8 de memória, (sem que
ninguém o saiba), ao que dirás que as 3 cartas contém 18 tentos, porque o rei
vale 10, com o sete 17, e com o ás que vale 1, são os 18.
Jogo para fazer sair dois ases juntos; tendo-se metido um em cada
sítio
Tomem-se os 2 ases pretos, ou os vermelhos, meta-se um no meio do
baralho, mas que fique mais de meio para baixo, e o outro também no meio
mas mais do meio para cima, e sem que o percebam observarás a carta que
fica próxima por baixo deste segundo ás, a qual podes mesmo mostrar aos
circunstantes dizendo-lhe que a vejam e que não pensem que é algum outro ás;
depois mandarás partir ou partirás tu mesmo, mas de modo, que a partição seja
feita entre os dois ases ficando o de cima por baixo e o debaixo por cima com
a partição; feito isto puxarás as cartas uma a uma, reparando quando sai, a
carta que ficou próxima ao ás, e quando ela sair com a ponta do dedo afastarás
o dito ás para a palma da mão não o tirando até que apareça o outro, e
aparecendo se tiram juntos.
Jogo para adivinhar uma carta com os olhos vendados
Para fazeres este jogo é preciso ter observado a carta de baixo, sem que o
percebam, depois dirás aos circunstantes, que com os olhos vendados com um
lenço vais baralhar as cartas, e adivinhar uma que lhes mostrarás; feito isto,
pegarás no baralho, e baralhando sem mover a carta de baixo, a mostrarás
junta com o baralho, depois tornarás a baralhar naturalmente, e mandarás
partir em quanto tiras o lenço dos olhos, e depois passarás as cartas até dar
com a dita carta que antes tinhas visto e a mostrarás.
Jogo para adivinhar as cartas pelo tacto com o baralho posto ao alto
em cima da cabeça
Para fazeres este jogo é preciso haver terceira pessoa, a quem tenhas
dado conta do segredo, a qual te avisará tocando-te no pé, ou dando-te o sinal
pelos dedos etc., v. gr. mandam-te adivinhar as figuras, posto o baralho na
cabeça de modo que todos vejam as suas pintas, irás tirando cartas, e quando
se descobrir alguma figura, a pessoa que tens prevenida te dará o sinal, e tu
então apalpando com os dedos dirás: este é uma figura porque a conheço pelo
tacto e este agora não é etc., também se pode fazer este jogo com o baralho em
cima da mesa boca acima e com os olhos vendados, fazendo que as conheces
pelo cheiro e se se descobrir o segredo de haver quem te dê as senhas, ou te
pedirem que adivinhes as cartas pelas pintas e pelos naipes, então fazendo que
apostas irás disfarçado compor o baralho pelo modo que te ensinei no primeiro
jogo, e depois sabendo a primeira carta saberás todas as outras aumentandolhe os 3 de memória e observando a graduação dos naipes.
Jogo para fazer com que um navio carregado com 15 cavalos brancos e 15
pretos por sorte sejam os pretos todos lançados ao mar
Tomarás 30 cartas, e porás 15 de cara abaixo, representando os cavalos
pretos e as outras 15 de cara acima representando os cavalos brancos,
formarás com elas um circulo a modo de um navio do modo seguinte – 4
brancos, 5 pretos, 2 brancos, 1 preto, 3 brancos, 1 preto, 1 branco, 2 pretos, 2
brancos, 3 pretos, 1 branco, 2 pretos, 2 brancos, e 1 preto; isto é 4. 5. 2. 1. 3. 1.
1. 2. 2. 3. 1. 2. 2. 1; agora sendo preciso deitar metade da carga ao mar por
causa de um temporal que pôs o navio em perigo, os dois donos dos cavalos
disputavam quais haviam de ir sem que nenhum deles consentisse, porém o
capitão vendo o perigo e a necessidade disse que fossem por sorte, e que
contassem, até 9, e onde caísse o número 9, fossem todos ao mar, e sendo
aceite a proposta começaram com as sortes e começando a contar pelo
primeiro dos 4 brancos, e depois do número 9 por diante até concluir a conta
de 15, se verificou irem os pretos todos ao mar.
Jogo para adivinhar as cartas que um tem na mão direita
Mandarás a um sujeito, que tome cartas iguais em cada mão, que tire
depois certo número delas da esquerda para a direita, e que dobre as da
esquerda com as da direita; feito isto, saberás que tem na mão direita o dobro
das que lhe mandaste tirar da esquerda. Exemplo – suponhamos que o sujeito
tomou 6 cartas em cada mão, e que lhe mandaste tirar da esquerda para a
direita 2 cartas, e que lhe mandaste dobrar as da esquerda com as da direita, o
resto será o dobro das que lhe mandaste tirar da esquerda para a direita, que
são 4.
Jogo para adivinhar, em que mão ha par ou impar de cartas
Mandarás a um sujeito tomar em cada mão as cartas que quiser, isto é,
em uma mão par, e em outra impar, mandarás que multiplique as da direita por
3, e as da esquerda por 2, que some depois as duas multiplicações, e que te
diga o seu importe, o qual sendo par tal estará na mão direita, e se for pernão
tal estará na mão direita, e o par na esquerda. Exemplo suponhamos que o
sujeito em nossa ausência tomou 5 cartas na mão direita e 2 na esquerda, e
multiplicando as da mão direita por 3 – faz 15, e as da esquerda por 2, fás 4 –
a soma das duas multiplicações é 19, e por ser número ímpar direi que o
sujeito tem impar na mão direita e par na esquerda.
Jogo para adivinhar uma carta que outro tenha no sentido
Tomarás 21 cartas e as porás em cima da mesa em 3 fileiras cara acima, e
mandarás a um sujeito que deite o sentido à carta que quiser, e que tenha conta
em qual das fileiras está e que te diga, logo apanharás as cartas de cada fileira:
pondo as da fileira que ele te marcou no meio, e fazendo isto, outra vez
começando sempre a fazer as fileiras todas juntas de cima para baixo,
perguntarás outra vez em qual fileira está, a qual porás sempre no meio,
apanhando as fileiras uma por cada vez de alto abaixo, e a terceira vez deitarás
as cartas de cara abaixo, e lhe dirás que te diga em qual fileira está, e como to
não saiba dizer, lhe mostrarás a undécima carta, ou a 4.ª carta da fileira do
meio; também poderás fazer este jogo escolhendo um número impar do qual
se possam tirar 3 partes cabais, assim como 9, 15, 21, 27, etc., e fazendo as
operações das 3 fileiras, isto é, 3 fileiras, e 3 repartições delas, incluindo
sempre a fileira em que se acha a carta no meio das outras 2, o que executado
irás pondo as cartas à 3.ª vez de cara abaixo até que contes a que fás o meio
delas todas, que em 9, é a quinta carta, em 15 será a 8.ª em 21 a 11, e em 27, a
14, e em as mais a sua correspondente, a qual mostrarás.
Jogo para adivinhar uma carta que se tenha tirado do baralho
Mandarás tirar uma carta do baralho, e no sitio onde a tirarem observarás
a carta que lhe fica próxima por cima, e mandarás que depois de a verem, que
a ponham no mesmo sitio, depois puxarás as cartas por cima esperando que
saia a que tu viste, e a que se lhe seguir será a que eles viram.
Jogo para adivinhar uma carta que tenham tirado do baralho
Tomarás o baralho, e o baralharás e com ligeireza, verás a carta debaixo
qual é depois baralharás outra vez sem mover a dita carta de baixo, e porás
todo o baralho estendido em forma de um leque na mão, cara abaixo; dirás a
um dos assistentes que tire uma qual quiser, e depois de a ver que a ponha em
cima de todo o baralho, e lhe dirás que parta, e porás o monte debaixo em
cima do outro, lho dirás ainda que parta as vezes que quiser, depois passarás
todas as cartas, e a carta que estiver era cima da 1.ª que havias visto antes, será
a que eles viram.
Jogo de riso para adivinhar uma carta que outro tenha pensado
Darás o baralho a um dos circunstantes, e lhe dirás que o baralhe bem, e
que o ponha em cima da mesa em dois montes, e que ponha o sentido em uma
carta, e que te diga que carta é, e havendo-te dito, lhe dirás que a tire daquele
monte, (mostrando-lhe, por exemplo, o que tiver mais cartas,) e encontrando-a
no dito monte ficarão maravilhados, pensando que o tens adivinhado, e se não
encontram, lhe dirás muito sério – pois então estará no outro monte, o que os
fará rir, por tal habilidade.
Jogo de entretimento e de pôr 9 cartas em 3 fileiras e fazer que por todos
os lados façam o número de 15
Tomarás todos os ouros, isto é, desde o ás até o 9, e se não tiveres cartas
que tenham os oitos e noves, cortarás 9 quadrados pequenos de papel, e lhe
escreverás em cada um seu algarismo de 1 até 9, e os porás do modo seguinte
–
1
2
3
4
5
6
7
8
9
e dirás aos circunstantes, que para se entreterem, quer ver se haverá
algum que se atreva a por este quadro mágico de modo que ao alto, ao través,
e ao encruzado, ao mesmo tempo contenha o número de 15, e depois que já
estejam cansados, e o não saibam fazer, o farás do modo seguinte:
2
7
6
9
5
1
4
3
8
e depois que todos tenham examinado o desmancharás outra vez para que
o façam, e se houver alguém que o faça, mostrando-se esperto, tirarás o
número 1, e porás outro que contenha o número 10 em seu lugar, e lhe dirás
que faça o dito quadro mágico, contendo para todos os lados, ou direções a
soma de 18, e se não houver quem o faça, o que sucede se o não souberem em
antes, o farás deste modo:
5
10
3
4
6
8
9
2
7
e ainda lhe farás outro se quiseres, tirando o número dois pondo em seu
lugar o número 11, dizendo-lhe que o façam de modo que para, todos os lados
e direções, some o número de 21, e se o não souberem fazer o farás deste
modo –
6
11
4
5
7
9
10
3
8
e ainda lhe farás outro para os divertir mais, tirando o número 3, e pondo
em seu lugar o número 12, dizendo-lhe que façam o dito quadro mágico de
modo que para todos os lados e direções somem o número de 24, e se o não
souberem fazer, o farás de modo seguinte –
7
12
5
6
8
10
11
4
9
Jogo para adivinhar 3 cartas (ou 3 objetos) e entre 3 sujeitos, qual tomou
cada uma
Porás em cima da mesa 3 cartas, ou 3 objetos, suponhamos um rei, um
valete e uma sota; darás o valor superior ao rei, inferior ao valete, o ínfimo à
sota; repartirás depois 6 cartas entre 3 sujeitos; isto é, 3 a um, 2 a outro, e 1 a
outro; porás mais 18 cartas em cima da mesa retirando as outras, sem que
faças caso delas para este jogo, e retirando-te para dar lugar a que cada um dos
sujeitos a quem deste as 6 cartas, tome a sua carta ou objeto, lhe mandarás ao
que tiver o rei, ou objeto de maior valor, que tome tantas cartas como as que
lhe tiveres dado; isto é, que se tiver uma, que tome outra, se tiver duas que
tome mais 2, e se tiver três mais 3; ao que tiver o valete ou objeto de valor
inferior que tome duas vezes tantas cartas como tiver; isto é, que se tiver uma
tome 2, se tiver duas tome 4, e se tiver três tome 6, o que tiver a sota ou objeto
de ínfimo valor tome 4 vezes tantas cartas como tiver; isto é, que tendo uma
tome 4, se tiver 2 tome 8, e se tiver 3 tome 12; depois te aproximarás, e só te
resta contar as cartas que sobejar das 18 que lá deixaste; advertindo que para
cada número de cartas que sobejar haverá uma dicção; isto é, sobejando uma
carta lhe pertence a primeira dicção – Aderi – se sobejarem 2, lhe pertence a
2.ª dicção – Redari – se sobejarem 3, lhe pertence a 3.ª dicção – Camiré – se
sobejarem 4.ª dicção – Nada – porque nunca podem sobejar 4 cartas; se
sobejarem 5 a dicção – Ermina – se sobejarem 6 a dicção – Filaré – e se
sobejarem 7 a dicção – Gibéla – ; cujas dicções servem para declarar quem
tomou os objetos, o que se sabe pela posição das letras vogais de cada dicção,
advertindo que a letra vogal – a – tem o valor de um, indicando o sujeito a
quem deste uma carta, a letra vogal – e – o valor de 2 indicando o sujeito a
quem deste 2 cartas, e a letra vogal – i – o valor de 3 indicando o sujeito a
quem deste as 3 cartas. Exemplo: suponhamos que sobejaram 2 cartas das 18 –
, observarás a dicção que lhe corresponde, que é a 3.ª dicção – Camiré – e
como a vogal – a – está em primeiro lugar, pedirás ao sujeito a quem deste
uma carta o rei, ou o objeto de maior valor, e como a vogal – i – está em
segundo lugar, pedirás ao sujeito a quem deste as 3 cartas o valete ou o objeto
de inferior valor; e finalmente como a vogal – e – está em terceiro lugar,
pedirás ao sujeito a quem deste 2 cartas, a sota ou o objeto de ínfimo valor, e
por este modo farás ou praticarás em todas as mais cartas que sobejarem,
observando a dicção que lhe corresponde, e a posição das letras vogais de cada
dicção, e o seu valor.
Jogo para adivinhar entre dois sujeitos, quantas cartas tomou cada um de
12 que deixaste em cima da mesa
Porás em cima da mesa 12 cartas, e ausentando-te para que dois sujeitos
as tomem; depois mandarás a um deles, que multiplique as suas por 2 e ao
outro por 12; depois que somem as duas multiplicações, cuja soma diminuam
de 156, e que te digam o que ficou, cuja quantia repartirás por 11, e o que te
vier ao quociente será o número de cartas que tomou o sujeito a quem
mandaste multiplicar por 2, e o resto da partição indicará o número de cartas
que tomou o sujeito a quem mandaste multiplicar por 12. Exemplo:
suponhamos mandaste multiplicar a João por 2, e que este tinha 4 cartas, cuja
multiplicação fez 8, e que mandaste a José multiplicar por 12, e tendo este 8
cartas e multiplicando-as por 12 fez 96, agora mandaste somar duas
multiplicações fez 104 cuja quantia mandaste diminuir de 156, cujo resto te
dirão que é – 52, – agora partindo tu estes – 25 – por 11, (sem que o
percebam) te sairão 4 no quociente, e 8 no resto, por isso dirás que João (a
quem mandaste multiplicar por 2) tem 4 cartas das 12, e José as outras que são
8; adverte-se que se vierem 2 ao quociente sem sobejar nada se ha de entender
que o sujeito a quem mandaste multiplicar por 2, terá uma só carta e o outra
11.
Jogo para adivinhar em todo o baralho a carta em que um sujeito puser o
dedo
Estenderás o baralho pela latitude da mesa, e dirás a um sujeito, que
ponha o dedo na carta que quiser, e que deite sentido a quantas cartas está
contando da primeira donde começaste a estender o baralho, depois te
aproximarás, e lhe mandarás dobrar esse número que contou de cartas até à
que pôs o dedo, e que junte mais 5 e depois que multiplique tudo por 5, e que
te diga o seu importe, o qual diminuirás de 25 e tantas dezenas como ficarem,
tantas são as cartas até a que se pôs o dedo. Exemplo: suponhamos que pôs o
dedo em a 13 carta, mandarás que dobre esse número e fará 26, que lhe junte
5, fará 31, que multiplique por 5 e fará 155, dos quais tirarás – 25 – (sem que
o percebam, pois feitas as 3 operações, lhe pedirás o seu importe) cujo resto
são 130, em cuja quantia ha 13 dezenas, e logo levantarás a carta aonde cair o
número 13, contando da primeira donde começaste a estender o baralho.
Jogo para adivinhar todas as cartas que quiseres
Depois de teres observado a carta que está por baixo tomarás o baralho e
o baralharás sem mover a carta que está por baixo, depois farás tantos montes,
quantas pessoas houver, tendo conta no monte em que está a carta que tiveres
visto, suponhamos fosse um sete de copas, dirás a um dos assistentes, de qual
monte quer que tire o sete de copas e do monte que te mandar tirarás uma
carta, e observando qual é, suponhamos fosse o 2 de espadas, logo dirás a
outro, de qual monte quer que tire o 2 de espadas e do monte que te mandar o
levarás e tirarás todas as outras que te mandarem umas pelas outras, e depois
não havendo mais quem queira dirás: eu também quero tirar uma, e tirarás
então o dito sete de copas do dito monte em que reparaste que ficou; depois
dirás ao primeiro de qual monte terá mandado tirar o sete da copas, e logo
porás o dito sete de copas descoberto em cima do monte que te disserem,
depois farás as mesmas perguntas com os outros pondo-lhe a carta descoberta
em cima dos montes que te apontarem.
Jogo de adivinhar 3 cartas antes de as tirar do baralho
Depois de observar a carta de baixo, baralharás bem, mas sem movê-la
dando depois o baralho a um dos circunstantes, lhe dirás que te dê por cima a
carta que tiveres visto por baixo; que te dê do meio a que ele te deu por cima;
e que te dê por baixo a que te tiver dado do meio, e adverte que pela carta que
lhe fores pedindo lhe podes pedir todas as mais que quiseres, deixando a
debaixo que tenhas visto para o resto de todas.
Jogo para fazer desaparecer uma carta do baralho e adivinhá-la
Mandarás que partam o baralho, e pegando tu no monte de cima, dirás
que vejam a carta que está por cima do monte de baixo, e que a ponham no
mesmo sitio, e dando tu uma volta pela casa molharás um pouco as costas da
mão direita com saliva da boca ou coisa semelhante, e com o outro monte na
dita mão porás as costas da mão em cima da dita carta carregando para que se
pegue, e perguntando aos circunstantes se será aquela que tens à vista na
palma da mão e dizendo-te que não, levantarás a mão de sorte que se não veja
a que trazes pegada nas costas, e deixando depois o monte de cima em cima
do de baixo lhe dirás que a procurem, e tendo já visto a carta que trouxeste
pegada lhe dirás que carta é, e vendo que a não encontram a juntarás ao
baralho sem que o percebam e fazendo que a procuras lha mostrarás.
Jogo para adivinhar a carta que um tenha tocado com o dedo
Para fazeres este jogo, é preciso haver terceira pessoa a quem tenhas
dado conta do segredo, para te dar as senhas precisas: depois estenderás todo o
baralho em cima da mesa boca acima em 4 fileiras, dando a primeira o nome
de dias, à segunda de semanas, à terceira de meses, e à quarta danos; e estando
tu ausente, a pessoa prevenida observará a carta que tocaram e em que fileira
está; depois te aproximarás à mesa, v. g. tenham tocado a sétima carta da
primeira fileira, a senha que te ha de dar a pessoa prevenida é a seguinte:
senhores, é impossível adivinhar ainda que esteja sete dias contínuos; depois
bastará contares as cartas da primeira fileira começando de alto a baixo até a
sétima, a qual levantarás e mostrarás: adverte que as senhas podem ser mais
dissimuladas para que o não percebam, fazendo que apostas, etc. etc.
Jogo enigmático
Tomarás os reis, os valetes, as sotas e os ases do baralho, e porás os 4 reis
em uma fileira ao lado uns dos outros e um pouco divididos; depois porás um
valete em cima de cada rei, de modo que estes se vejam; depois porás as sotas
pelo mesmo modo que puseste os valetes; depois os ases pelo mesmo modo:
mandarás depois aos circunstantes que vejam como estão em cada fileira um
rei, um valete, uma sota e um ás, e que depois de os baralhar bem farás que
apareçam os 4 reis divididos, os valetes, as sotas e os ases cada um em sua
fileira; logo levantarás uma fileira, isto é, um rei, um valete, uma sota e um ás,
e as mais da mesma forma, depois baralharás bem pondo as cartas de baixo
em cima, sem que metas nenhuma por entre meio, e mandarás partir, depois
pegando nelas as puxarás cobertas, e por baixo e as irás pondo pelo mesmo
modo que puseste da primeira vez em 4 fileiras e umas ao lado das outras;
depois as descobrirás, e verão como estão os 4 reis em uma fileira e os valetes
e mostra as sotas em outra e os ases em outra.
Jogo de pôr 3 valetes e uma sota divididos pelo baralho e fazê-los
aparecer juntos
Tomarás 3 valetes e uma sota, e os porás em cima da mesa; dirás depois
aos circunstantes: estes 3 sujeitos têm-se aqui divertido na taberna, e feito tão
grande despesa que se veem obrigados a fugir sem pagarem à vendeira, pois
não têm um real de seu; para cujo efeito assentaram que mandar a vendeira,
(que é a sota) buscar mais vinho e fugir, entretanto, e virando tu a sota para
baixo tomarás os valetes, e os farás desaparecer pondo um no cimo, outro no
fundo, e outro no meio do baralho; mas adverte que antes de tudo é preciso
que tenhas posto (sem que o percebam) o 4.º valete no fundo, depois tomarás a
sota e a farás correr atrás dos caloteiros pondo-a por cima do baralho, e
mandando partir, puxarás as cartas até encontrares os 3 valetes e a sota.
Jogo para fazer um relógio e adivinhar as horas a que um sujeito costuma
jantar, cear ou dormir
Tomarás 12 cartas dum naipe, com as duas falsas o oito, e o nove, e darás
o valor à sota de 10, ao valete de 11, e ao rei de 12, depois formarás um
circulo a modo dum mostrador de relógio, começando do ás até o rei, e todas
de cara a baixo; mas deves ter sentido onde fica a 1.ª que é o ás; depois
sabendo tu as horas em que qualquer sujeito costuma jantar, cear, ou dormir,
farás o jogo por um de 2 modos; o primeiro é mandar contar desde a uma
inclusive ao revés, isto é, da uma que passe às 12, depois às 11 etc., e sobre a
hora que elegerem em segredo até 14; e pelo segundo, mandarás contar sobre
a hora que levar em o seu pensamento, até certo número; isto é, que para a
uma hora mandarás contar sobre ela inclusive até 14; para as 2, sobre as 2 até
15; para as 3, sobre as 3 até 16 etc. Exemplo: Quando quiseres que te caia a
hora, por saberes que a esta hora costuma um sujeito jantar, mandarás que
conte da uma hora ao revés sobre a hora que leva no seu pensamento até 14, e
tendo o dito sujeito elegido a uma hora contará na carta que tu lhe propuseste
(que é a uma) e dirá nela 2, nas 12 dirá 3, nas 11 dirá 4 e contando assim até
14, essa levantará e verá que é à uma hora; se for as 2, contará da uma até 14,
sobre as 2 que leva no pensamento; isto é começando a contar na 1 hora com
3, até 14, ao revés; e assim por diante contando sempre até 14, e começando
sempre na uma hora a contar sobre as que levar no pensamento. Exemplo do
segundo modo: Sendo a hora elegida a uma, mandarás contar sobre ela até 14,
sendo às 2 mandarás contar das mesmas 2 até 15; sendo às 3 mandarás contar
das 3 até 16; às 4 que conte delas até 17, e assim por diante, mas advirta-se
que sempre se começa a contar, sobre as que se levam no pensamento.
Suponhamos que para as 4, mandarás começar no dito 4 na qual dirá 5 no 3, 6,
no 2, 7, no ás 8, nas 12 – 9, nas 11 – 10 – assim até 17, cuja carta dos 17
levantará, e verão que é o 4, significando as 4 horas.
Outros muitos jogos aqui podia ensinar, o que deixo de fazer por serem
muito difíceis e custosos de fazer.
O SUSPIRO
Vai, terno Suspiro meu,
Ligeiro fendendo o ar,
Nos lábios da minha amada
Saudosamente expirar.
Mas primeiro, o meu suspiro,
Brando gira ante o meu seio,
E podes alguns momentos
Ali pousar sem receio.
Nesse lugar delicioso
Espreita a mais leve ação:
Indaga atento por quem
Suspira o seu coração.
Se um só ai do peito amante
Lhe escapar e me pertença,
Então, então não expires,
Vem trazer-mo sem detença.
Mas se aleivosa comigo
A outrem seu ai mandar,
Então nos lábios da ingrata
Tu deves logo expirar.
Nada mais lenho a dizer-te,
Corre, voa onde te ordeno,
Brandos zéfiros te guiem,
Conserve-se o ar sereno.
ENIGMAS
Princípio do mundo sou
O meu ser é um, e é trino
Não sou deus, nem o imagino
E em todas as partes estou.
No mundo faço a principal figura
Entre os homens me vês e não me sentes
Se dizes sou ar, água ou fogo mentes;
Mas em todas as partes me procura.
Sou o primeiro a morrer sem ser gerado,
Estou com o demônio no inferno
E no meio do tempo sem ser passado.
(A letra – M.)
Sou fêmea e sou triste
Mui secreta e repousada,
De corpo e alma privada,
E só traje negro me assiste
Sendo de muitos estimada.
(A noite.)
Em as mãos das damas
Quase sempre estou metido
Umas vezes estirado
E outras vezes encolhido.
(O leque.)
Quem será um velho ligeiro
Que tem quatro movimentos,
E doze repartimentos,
Que a qualquer passageiro,
Dá mais penas que contentos?
(O ano.)
Há um filho de um velho
Que tem mais onze irmãos
Sem cabeças, pés, nem mãos,
Que nos causa a diferença
De estarmos doentes ou sãos.
(O mês.)
Dou o sangue às veias
E também por meus amores
Me transformo em mil flores,
Misturadas com as açucenas
E rosas de todas as cores.
(A primavera.)
Todos dizem que sou navio,
Chamando-me tardo, e ligeiro,
Que ao pobre, e cavaleiro
Roubo como grande corsário,
Sendo um velho passageiro.
(O tempo.)
Quem é um grande senhor,
Que foi nascido da terra,
E tem armas de pás, e guerra,
E que a uns dá grande valor
E a outros sua ausência enterra?
(O dinheiro.)
O meu principio foi de ervas
Depois me pintaram de cores
E costumo a dar dissabores,
E mortes tenho causado acerbas.
E a pobreza a muitos senhores.
(As cartas de jogar)
Qual é a coisa que Deus nunca viu
Nem terá de ver?
Resposta – Outro igual a ele.
Qual é a coisa que em tudo pousa?
Resposta – É o nome.
FIM DA SEGUNDA PARTE
PARTE TERCEIRA
O ORÁCULO DOS SEGREDOS
OU
Coleção de muitos segredos úteis a todas as pessoas e para a cura radical
de muitas moléstias conhecidas e desconhecidas
ADVERTÊNCIA
É preciso que o leitor tenha sempre em mente que o livro foi
escrito/publicado em 1883. Muita superstição e pouca ciência ainda
caracterizavam a mentalidade das pessoas. As hoje conhecidas Simpatias
Populares nada mais eram que uma tosca tentativa de descrever e prescrever
práticas que, hoje, estão totalmente desacreditadas.
O misticismo, a magia e o ocultismo ainda fascinavam as pessoas da
época, que viam neles verdades absolutas. Práticas que hoje nos parecem
tolices eram encaradas seriamente. Charlatões se aproveitavam da
credulidade popular e se arvoravam de entendidos e intermediários entre os
mundos natural e sobrenatural.
Ao escritor daquele tempo, restou registrar o que era considerado
verdade. A nós, cabe o bom senso de discernir entre o que é o real e o que é o
imaginário.
Alguns “Segredos” revelados têm sua lógica, quando se valem de
receitas caseiras que utilizam ervas e elementos naturais, hoje reconhecidos
por suas propriedades terapêuticas. Outros, são apenas o registro da
mentalidade da época. Não se recomenda o uso nem a prática desses
“Segredos”, aqui apresentados pela sua curiosidade histórica e cultural.
Na atualização dos textos, verteram-se para a moderna ortografia os
termos em grafia antiga, restando preservado o estilo e as construções
originais do autor.
L P Baçan
O ORÁCULO DOS SEGREDOS
Segredo 1º
Tirado do livro de S. Cipriano (o feiticeiro) para fazer subir um homem
ao ar e andar nas alturas 30 minutos, sem lhe acontecer mal algum
Deita-se um homem estendido no chão, depois ponham-se dois homens
aos pés e outros dois à cabeceira. Feito isto, digam as palavras seguintes,
principiando por um e acabando por outros:
1º homem—Aqui cheira a corpo morto.
2º — Pesado como um chumbo.
3º — Leve como uma pena.
4º — Levanta-te na hora de Deus.
No fim de ditas as palavras acima mencionadas, apontai-lhe com os
dedos, que ele logo sobe ao ar, tal qual como um pássaro; no fim de 30
minutos, cai ao chão sem lhe acontecer mal algum.
Este segredo foi descoberto por Lúcifer, o príncipe do Inferno.
Segredo 2º
Para um homem conhecer se a mulher lhe é infiel ou não
A qualquer hora da noite, quando observarem que a mulher está
dormindo e sonhando, põe-se-lhe devagarinho uma mão sobre o coração, que
dessa maneira conhecem logo se é sonho; se o for ela por sua própria boca vos
começará a descobrir tudo o que for de verdade, e o homem vai observando o
que ela lhe diz e vai tirando a mão de pouco a pouco por que esta operação
não pode durar mais que 10 minutos, para não acontecer que a mulher acorde
e observe o que se está fazendo.
Sendo assim tudo descobrirão, e ela nada fica sabendo do que disse.
Depois de feito isto devem guardar segredo para evitar questões.
Segredo 3º
Efeitos do vinagre e da urina
Logo que uma pessoa dê qualquer cortadela e queira ver-se sã em 8
horas, botem-lhe em cima vinagre ou urina. Este remédio é aprovado, assim o
tenho experimentado e sempre com bom resultado.
Segredo 4º
Para tirar as dores de cabeça
Se alguns dos meus leitores tiverem dores de cabeça e se em pouco
tempo as quiserem aliviar, façam o remédio seguinte: uma cabeça de alhos,
tirar as cascas aos dentes, botá-los em um almofariz e moê-los bem moídos,
pegar em um bocadinho de massa e esfregar a testa e fontes bem esfregadas
que, depois, em pouco tempo passará a dita dor.
Se no fim da esfregação o paciente se puder deitar, melhor será que
depois de se levantar nada há de sentir.
Segredo 5º
Para quem quiser beber o vinho simples sem água
Para tirar a água do vinho, se fará uma vasilha de pau de hera, lançando o
vinho nela; se tiver água, todo o vinho se irá coando, e ficará só a água na
mesma vasilha; e se não tiver água ficará a vasilha escorrida de todo o vinho.
Segredo 6º
Para que uma pessoa indo pela rua em noite escura leve luz adiante de si
que alumie toda a rua sem se conhecer que qualidade de luz é
Quebre-se uma noz em duas, de modo que fiquem os miolos inteiros;
estes metidos sem os quebrar na ponta de uma verga de arame, que tenha uma
vara que seja grossa, pondo o lume no miolo das nozes, tendo a outra ponta de
arame na mão, farão tanto lume como uma tocha, sem se ver mais que o
mesmo lume.
Segredo 7º
Para fazer que a comida pareça estar cheia de bichos
Secretamente partiremos duas cordas de viola uma grossa outra delgada
em bocadinhos, se for assado sendo galinha se lhe meterão pela abertura;
sendo outra coisa se lhe dará um golpe em que se lhe metem; sendo cozido se
botarão na panela ao tirar do lume e assim virão pegados na carne com a
quentura que em si levam, e com a fresquidão do ar que lhes dá se encolherão
e estenderão como bichos, e quem estiver comendo fica enganado.
Segredo 8º
Para aqueles que caminham não sentirem a calma, nem o cansaço do
caminho
Saindo eu de Alcoy para S. Thiago, à porta de uma aldeia, encontrei três
peregrinos, com os quais acompanhei até ao meu destino, e segundo o que
neles observei deviam ser virtuosos, e aos mesmos vi que levavam pendurado
no cinto, um pequeno raminho de bela-luz. Perguntei-lhe o que aquilo
representava, e tive de resposta: Pois vós ainda não sabeis o segredo? Tiraram
do seio cada um sua mancheia de artemísia, dizendo-me que com aquilo
pouco se sentia a calma e o cansaço do caminho. Dai por diante me aproveitei
disso e achei ser verdade, o segredo que me ensinaram.
Segredo 9º
Para não criar pulgas e para evitar percevejos
Tomem quatro folhas de erva-santa, um ramo de arreçã com flor, outro
de erva sedagoza partes iguais frigam-se em azeite simples, misture-se três
onças de cera amarela, untando três dias sucessivos não somente os mata, mas
também a pessoa que com isto se untar nunca mais os criará. E para evitar
pulgas bote-se pela casa mentastros e folhas de amieiro, estas ervas tem
virtude para as matar e não criarem outras. E qualquer delas fará o mesmo
efeito, botando com abundância pela casa.
Segredo 10º
Para fazer letras nas costas da mão com cinza de papel
Se quiserem fazer com que os assistentes, fiquem admirados sem
saberem de que modo veio essa letra, secretamente, com a própria urina e a
ponta de um pausinho, escrevem as letras que quiserem que apareçam, e
depois se deixará secar, e se mostra a quem quiser ver a mão limpa; queimem
um papel tendo escrito as mesmas letras (isto com tinta, preta) que se
escreveram na mão, e com o mesmo papel queimado, se esfregará a parte onde
se fizeram as letras com a urina, que conforme foram feitas assim sairão
pintadas de preto, por isso quem não souber o segredo se admirará.
Segredo 11º
Para crianças que têm lombrigas e tosse
Provável remédio para quem tem crianças com essa doença. Se for tosse
lancem-lhe uma esponja ao pescoço, que logo lhes abrandará. E se forem
lombrigas, botem uma pequena mancheia de farinha centeia, em uma pouca de
água, que fique tingida como soro de leite, assim dada a beber em jejum, todas
as manhãs, mata as lombrigas.
Segredo 12º
Segredo para os cabelos nunca caírem e conservarem-se pretos
Tomarão folhas de azinheiro, e cascas de pepino secas, depois de
misturado em partes iguais, bem pisado e espremido, botar-se-á o sumo em
meio quartilho de água-ardente canforada, e bem mexida, se porá ao orvalho
da noite, por espaço de 8 dias. Com esta mistura lavarão a cabeça pelo menos
de três em três anos, que o cabelo não cairá.
Segredo 13º
Segredo para quando forem tirar o mel das colmeias não serem mordidos
pelas abelhas
Tomem o malvisco, e untem bem as mãos e rosto com o sumo desta
planta, depois untem-se com azeite que tenha servido já nas candeias, com que
se alumiam, que indo bem untado podem fazer o serviço sem receio, que elas
não farão mal algum. E se por acaso te picar alguma vespa, unta bem a parte
com azeite liquido, que brevemente está são.
Segredo 14º
Para evitar formigas, mosquitos e percevejos
Aquela parte onde quisermos que não entrem nela formigas, cercaremos
com um risco de carvão grosso, ou com cinza, ou com salmoura, ou com sal
molhado, que não passarão este limite para dentro. E se puserem estas coisas
todas misturadas melhor será.
E para mosquitos não virem de noite à cama dependurarão à cabeceira
uns poucos de pregos, que não chegarão ali. E para percevejos, tome-se uma
pouca de palha estrangeira, cozida num tacho, e botem-lhe uma quarta de
pedra ume, e em fervendo tudo depois da água estar fria lavem a barra da
cama; ou a qualidade que lhe pertença com a dita água. Na cama, ou casa onde
se criarem percevejos, tomando um pimento em um fogareiro que se queime,
posto debaixo da cama todos os percevejos que houver aonde chegar o fumo
do braseiro morrerão.
Segredo 15º
Para se conhecer a sarna e o meio de a curar
Para se conhecer a doença da sarna, basta ver entre os dedos das mãos
umas bolhinhas, que estão quase constantemente em comichões; mas com este
Segredo, cura-se facilmente, dentro em pouco tempo: basta deitar sobre a
parte doente, umas pingas de óleo de petróleo. Mas não se deve esfregar.
Deixe-se o óleo na parte durante uma hora. Continua-se no dia seguinte e
mesmo nos outros enquanto não sarar. Este remédio que está ao alcance de
todos, é muito aprovado, e seu emprego tem sido adotado em imensos casos.
Outro consiste em lavar com licor concentrado de alcatrão, por que
produz muito bom efeito.
Segredo 16º
Para os que costumam enjoar
Um verdadeiro serviço, que com este Segredo presto aos viajantes,
principalmente aos embarcadiços. Dou-lhes a saber este
Segredo que de tanto lhe pode servir: logo que o mal se começa a sentir,
e quando a cabeça anda à roda e o estomago enfraquecido deve-se tomar 2 até
5 pérolas de clorofórmio, que o mal desaparece logo. E não havendo as ditas
pérolas, tomarão pérolas de éter, que fazem o mesmo efeito. Tanto umas,
como as outras vendem-se em quase todas as farmácias, e o viajante se munirá
delas antes de embarcar, porque o enjoo é um mal que causa sempre bem à
criatura que vai no mar.
Segredo 17º
Para curar os catarros que nos costumam apoquentar
Tenho observado já muitas vezes que este
Segredo dá sempre bom resultado, nesta doença tão massadora, e custosa
de sofrer. Para essa cura tomem: essência de terebintina, que dá bom
resultado; com um gosto detestável é impossível o poder tomá-la pura, ou em
mistura. Mas tomai em forma de pérolas. As pérolas de terebintina tomam-se
de 6 até 12 na ocasião das comidas. Dentro em pouco tempo, os catarros,
mesmo os antigos, melhoram-se e curam-se. Por muito que explique, nunca
são muitas as explicações, dignas do elogio deste Segredo.
Segredo 18º
Para os enganos que há em pesos e medidas
Antes de outra coisa se note, que o gado vacum quanto mais está depois
de morto mais pesa, pelo contrário o gado miúdo, assim também para dar o
seu a seu dono assim no peso da carne, como de outro qualquer há de se pôr
primeiro o peso, depois a carne, ou o que for, por que se a carne se põe em a
mesma parte, requer muita força de peso para outra parte para se endireitar.
E assim também nas medidas de vara, ou côvado para se medir seda, ou
linho, ou pano de cor, se há de medir sobre a mesa, ou caixa, não nas mãos,
porque estira, e se faz mais copia de varas, ou côvados, do que são.
Quanto à medida do vinho, ou azeite que se mede em armazéns e lojas
baixas leva mais que nas altas, a razão é por que toda a coisa se pretende
igualar, com o globo da terra, assim nas partes baixas faz o azeite, ou vinho,
cobri-lo para cima, nas altas não; tanto é assim, que para prova disto ponham
um vaso que leve meia canada, ou mais sobre uma mesa, este cheio de vinho
ou água, ou azeite, da mesa posto no chão, lhe podem botar um vintém em
moedas, moeda mansamente, todas levará sem derramar gota pelo motivo que
temos dito.
Segredo 19º
Remédio para percevejos, piolhos e pulgas
Para percevejos, tomem-se umas poucas de brasas em um testo, bota-selhe dois ou três pimentos vermelhos; posto o testo no meio da casa onde os
houver, ou morrerão ou se ausentarão.
Para piolhos, basta o sumo da erva santa, untar com elas três noites a
parte onde se eles criarem, que desaparecerão.
E para pulgas, na casa onde andarem se botará uma pouca de hortelã pela
casa, logo morrerão ou se ausentarão.
Segredo 20º
Como se devem curtir as azeitonas de conserva para durarem
Devem ser as azeitonas mais sobre o verde, que sobre o maduro, é
preciso serem colhidas à mão da oliveira, nem varejadas, nem encorrilhadas,
deitadas na vasilha, se lhe botará água simples, de modo que fiquem todas
cobertas; aos três dias tira-se-lhe essa água e deita-se-lhe outra; assim
continuando todos os três dias na outra água, se lhe botará pouco sal, orégãos,
cascas de limão sem amargo algum, porque o amargo corrompe; ao tirar delas
será com colher, não com a mão, e assim se sustentarão por largo tempo.{15}
Segredo 21º
De varias qualidades que há no ovo
A primeira propriedade que tem, é ser a gema fresca e substancial, a clara
cálida, e reimosa; cura humores viscosos.
O ovo é neutral, porque se o comer uma pessoa estando colérica e
agastada converte-se-lhe em outra tanta cólera; se a pessoa está alegre,
converte-se em outra tanta alegria; e tanto é assim, que escreve um autor
grave, que se um furioso continuar dois meses pela manhã, e à noite, comendo
duas gemas de ovos crus, tornará ao seu juízo; a razão é porque o furioso é tão
contente de si que imagina que tudo é seu.
Para mais, o ovo que é cozido, de modo que fique duro ou forte, é cálido;
em cru é frio, tão frio, que bebendo-o pela manhã, no verão, vai contra a
calma, e contra a enfermidade do fígado.
Segredo 22º
Para fazer com que a água do mar não seja salgada e poder beber-se
Tenho observado que para fazer a água do mar doce, a pontos de se poder
beber, farão uma vasilha de cera branca bem tapada, e a meterão no mar, que
fique toda coberta, e a que for entrando para dentro da vasilha, perde o sal e
fica doce, e o mesmo acontece se meterem uma vasilha nova de barro, mas
que tenha a boca bem tapada; com a mesma será, porque a água tanto dá que
de pouco em pouco, lá vai entrando para a vasilha até estar cheia.
Segredo 23º
Para em pouco tempo se curar a diarreia e disenteria
Contra esta terrível doença, tenho um Segredo que vou dizer aos meus
leitores: ás pessoas que depois de serem apoquentadas por este mal, fazem
remédios que de nada valem, por isso, se quiserem ver esse mal fora do corpo,
existe um meio de o fazer que é aprovado: é o carvão do doutor Beloc; tomar
cada dia de três a seis colheres de sopa deste carvão, que em pouco tempo
estarão livres do mal que os apoquentava.
Ao principio, parece impossível que o carvão possa curar a diarreia, mas
por muitos está experimentado, e sempre com bom efeito, por isso vos
recomendo este Segredo.
Segredo 24º
De nossos concebimentos, da causa e porque os nascidos do oitavo mês
não vivem
O primeiro planeta chamado Saturno é de sua natureza frio, seco,
melancólico, terreno; por isso os Astrônomos o chamam infortuna maior,
porque a qualidade frio, e seco, é contraria à criação de todas as coisas,
suposto que seja por esta razão inimigo da natureza humana enquanto terreno;
acharam os filósofos o primeiro mês de nossos concebimentos ser do domínio
de Saturno, o qual não prejudica o geral, porque ainda a matéria não tem vida
a qual, nos possa empecer.
O segundo mês é dedicado a Júpiter, o qual por ser de compleição
sanguínea e cria quente e úmido, o qual sendo bom, e que convém à criação
das coisas, chamaram-lhe os Astrônomos fortuna maior; assim em seu mês a
matéria se une, incorpora, e orna de espíritos vitais.
O terceiro mês é dedicado a Marte, que é de compleição colérica, quente,
e seco; porque como a quentura é conveniente à criação das coisas, e por outra
parte a secura a impedia, chamaram-lhe os Astrônomos infortuna; assim no
terceiro mês a mãe sempre padece achaques porque a criatura os padece.
O quarto mês é dedicado ao Sol, que suposto que seja cálido, e seco,
contudo é luminária maior; enquanto luminária, cria, aumenta e corrobora.
O quinto mês é dedicado a Vênus, que suposto seja de per si úmida,
fleumática, e fria, tem de certa participação de quentura, com a qual favorece a
umidade; por isso os Astrônomos a chamaram fortuna menor; porque ainda
que não seja tão favorável como Júpiter, é contudo ajudadora da criação de
todas as coisas, por isso em seu mês, a mãe e a criança estão livres de
achaques.
O sexto mês é dedicado a Mercúrio, que é planeta natural, participante de
todas as compleições, pelo qual em seu mês suposto que a criatura está
perfeita, capaz de vida, contudo se neste mês nascer, morrerá logo, porque
como Mercúrio seja neutral acomoda-se ao primeiro principio que é Saturno
assim—mata.
O sétimo mês é dedicado à Lua, que suposto que seja planeta frio, úmido,
fleumático, e aquático, contudo enquanto luminária é conveniente à criação de
todas as coisas, assim vemos que os nascidos de sete meses vivem.
O oitavo mês torna a dominar Saturno o qual como temos dito é contrário
à natureza humana; assim não temos visto até hoje que o nascido, até ao
oitavo mês resista.
Ao nono mês torna a entrar Júpiter, o qual como temos dito é bom
planeta, em geral todos os que nascem neste mês vivem.{19}
Segredo 25º
Para sabermos dos meninos pequenos, a estatura que virão a ter depois de
grandes
O Sol divide os outros seis planetas em duas partes: três acima, três
abaixo; os três de cima chamam-se tardos, por serem mais vagarosos em seu
movimento, assim também são chamados masculinos. Os três de baixo são
chamados femininos velozes, porque em seu movimento são mais ligeiros,
suposto que Mercúrio, que está abaixo por ser masculino, planeta natural e
aplicar-se com quem se acha, por ficar entre a Lua, e Vênus que são planetas
femininos, se conte também feminino como eles; assim pois a Lua, Mercúrio,
Vênus, que estão abaixo do Sol, por serem velozes, representam os três anos
primeiros de nossa vida, também Marte, Júpiter e Saturno, por serem
masculino-tardos, e estarem acima do Sol, representam o resto da nossa vida,
pelo que quem quiser saber a estatura, que qualquer criança virá a ter depois
de grande, na idade de três anos perfeitos, tomem-lhe a medida com uma fita
estando a criança com o corpo direito, o comprimento da fita que tiver da
ponta da cabeça, até aos pés dobra-se, o que se achar, que faz a dita fita
dobrada, será a estatura que a tal criança virá a ter depois de grande.{20}
Segredo 26º
Para deitar fogo a uma pouca de estopa e não se queimar
Peguem na estopa, deitem-lhe um pouco de espírito de vinho, e ao
mesmo tempo deitem-lhe o fogo, que começa a arder e acabando-se o espírito
se apagará, e a estopa ficará sem se queimar. Mas devem ter cautela antes do
espírito arder todo, por causa de se não inflamar à estopa, que é mais
verdadeiro.
Segredo 27º
Para fazer estalar por baixo — divertimento de travessos
Tomarão folhas de espirradeira, cascas de castanhas, tudo muito
queimado e desfeito em pó lhe juntarão pimentos que estivessem de calda de
vinagre, isto tudo em vinho branco: quem o beber não poderá estar
calado.{21}
Segredo 28º
Também de entretenimento e travessura
Se os leitores se quiserem rir e entreter, os que estiverem presentes farão
o Segredo seguinte: Agarrarão um rato vivo, e secretamente (para ninguém
lhes ver) deitarão aguarás sobre o lombo e por todo esse bicho menos nas
pernas e cabeça; depois aparecerão diante de quem quiserem e pondo o rato no
chão agarrado pelo rabo, se lhe lançará o fogo com um lume e o deixarão que
começará a correr todo cheio de lume, e quem não souber este
Segredo se admirará por ver uma pouca de lavareda a fugir de umas
partes para outras.
Depois de a aguarrás se gastar, acabará também a vida do rato.
Segredo 29º
Como se podem conhecer as enfermidades pelas urinas
Todos os que na medicina tem escrito, fazem mais duvida em saber
conhecer doenças, do que em aplicar os remédios, e a razão é que mal se pode
aplicar medicamento salutífero à doença que não é conhecida. É porque nem
todos os médicos, sabem este grande fundamento. Dos mesmos autores de
Vila-Nova tiramos a receita seguinte, que é tão boa como nela se verá, a qual é
a seguinte:
A urina de cor rosada demonstra saúde, estado do corpo são, e boa
digestão.
Se a urina for menos rosada, suposto que demonstre saúde, com tudo isto
não é tão perfeito como se propriamente fora rosada.
A urina de cor de cidra, quando o circulo dela é da mesma cor, é boa.
Também o é, ainda que não seja de todo cor de cidra.
A urina de cor vermelha significa febre simples que dura 24 horas; salvo
se o doente cuja tal urina for urinar a miúdo que é sinal de febre continuada.
A urina acesa de cor de sangue demonstra sangue sobejo; logo é bom
sangrar-se, salvo se estiver a lua em signo Feminis, que domina nos braços,
pois será prejudicial a sangria.
A urina de cor verde quando sai depois de vermelha, demonstra
inflamação; é perigosa e quase mortal.
A urina de cor vermelha escura demonstra declinação na doença.
A urina vermelha misturada com algum pouco de negro, demonstra
esfalfamento e outros vícios do fígado.
A urina de cor amarela, demonstra fraqueza do estomago, impedimento
de segunda indigestão.
A urina branca de cor da água da fonte, demonstra aos sãos, ter humores
crus; nas febres agudas é sinal de morte.
A urina cor de leite com a substância espessa, se for de mulher não é tão
perigosa como a do homem pela indisposição da madre. E se acontecer em
febres agudas é sinal de morte.{23}
A urina de cor de leite, escura em cima e clara debaixo da região do
meio, demonstra hidropisia.
A urina no hidrópico, rosada, ou meio rosada, é sinal de morte.
A urina de cor azulada demonstra multidão de humores corruptos no
fleumático e hidrópico.
A urina negra pode acontecer algumas vezes que a natureza é gastada ao
doente, o calor natural neste caso é mortal, em outra maneira pode acontecer
expulsão de matéria venenosa que sai pelas veias urinais.
A urina que traz luz como lanterna, denota indisposição no baço, boa
disposição no que tiver quartans.
A urina cor de açafrão, quando está espessa, meio negra, que tem mau
cheiro e alguma espuma, demonstra icterícia.
A urina rosada, ou meio rosada, que na região inferior traz umas
resoluções redondas, brancas em cima, e um tanto grossas, é sinal de febre
héctica.
A urina clara no fundo do urinol até ao meio dela, e a de cima mais
espessa, demonstra dor e inchação nos peitos.
A urina espumosa clara, quase meio vermelha, demonstra maior dor da
parte direita, do que da esquerda. Porém se a urina for espumosa branca,
demonstra maior dor na parte esquerda que na direita.
Se o circulo da urina não bolindo com ela, parecer que bole de si mesmo,
demonstra decurso de fleuma, noutros humores da cabeça pelo pescoço,
noutros nos membros.
A urina delgada, amarelo-clara, demonstra humor fleumático e grosso.
A urina espessa de cor de chumbo, negra da região do meio, demonstra
paralisia.
A urina espessa de cor de leite, pouca em quantidade, grossa com
algumas espumas na parte inferior do urinol demonstra dor de pedra, se for
sem espumas espessas de cor de leite podre demonstra ventosidade.
A urina espessa de cor de leite, em muita quantidade, demonstra gota nas
partes inferiores.
A urina amarela na parte inferior, demonstra nos homens dor de rins, e
nas mulheres dor de madre.
Na urina em que aparecerem alguns pedaços de leite, se for pouco
turbada, demonstra rotura de veia junto aos rins da bexiga.
A urina que no fundo do urinol mostra sangue podre, demonstra podridão
dos rins e bexiga; se juntamente toda a urina estiver tal, demonstra podridão
de todo o corpo.
A urina onde se veem pedaços estreito-compridos, demonstra
desolamento de bexiga.
A urina que sai devagar, cheia de argueiros como faz o sol, demonstra
pedra nos rins.
A urina branca sem febre, demonstra nos homens dor de rins, nas
mulheres estarem prenhas.
A urina de mulher prenha de um mês até três deve ser mui clara, branca;
se for de quatro meses há de ser parda, branca e grossa no fundo.
A urina espumosa nas mulheres demonstra ventosidade no estomago,
ardor no ventre até à garganta.
E devem entender que as significações das águas, são mais válidas
tomadas, vistas logo, do que depois que arrefecem, porque mudam a
substancia, mormente no tempo do inverno, que com o frio se colham.{25}
Segredo 30º
Das virtudes e efeitos da genebra
A genebra tem muitas virtudes, mas especialmente para quem se costuma
a agoniar do estomago, e nas indigestões. Logo que qualquer pessoa se ache
incomodada com qualquer destas doenças, tomem meio quarteirão de genebra,
mas para melhor efeito será da holandesa, porque é mais aprovada, e com isso
logo ficarão livres dessa aflição, porque além de vos parecer que não tiram
resultado, vos afianço que é engano; porque eu que vos descubro este Segredo,
em diversas ocasiões tenho feito uso dessa bebida e sempre com bom
resultado,
Segredo este que nunca me esquecerá porque me tem valido à minha
vida, e as suas virtudes, para todos são proveitosas, por isso todos os elogios
são poucos para remédio tão eficaz.
Segredo 31º
Os efeitos do alecrim da Índia
Estou informado de um Segredo muito prestável, para quem padece dores
de cabeça que é remédio que dou por aprovado e muito econômico.
Em um testo botarão umas poucas de brasas acesas, e depois pegarão em
umas poucas de folhas de alecrim da Índia, e botarão as folhas em cima das
brasas; depois de elas botarem bastante fumo lhes deitarão uma onça de
açúcar; põe-se a cabeça do paciente a tomar aquele fumo, isto é dois palmos
acima das brasas para evitar da muita quentura, que fazendo isto oito noites ao
deitar da cama, se acharão melhor, porque assim como eu fiz e achei bom
resultado, também me parece que o meu semelhante que padecer da mesma
doença também o achará se isto fizer como explico.
Segredo 32º
Para que o vinho estragado torne ao seu ser
Pegarão em uma dúzia de laranjas maduras, darão em cada uma três ou
quatro golpes como quem retalha azeitonas, assim as botarão pelo batoque da
pipa, botá-las-ão em pedaços, e daí por oito dias botarão uma canada de
aguardente fina, e depois disto feito em passando 15 dias vão prová-lo que
estará bom vinho; mas advirto que a pipa deverá estar em sitio fresco, porque
os vinhos para se conservarem não querem lugares abafados.{27}
Segredo 33º
Para tirar o mau cheiro ás vasilhas de madeira e dar cheiro ao vinho que
nelas botarem
Tira-se um tampo à vasilha e mete-se dentro um testo cheio de brasas e
depois bota-se-lhe nas brasas um vintém de cravo da Índia, dez reis de canela
e um bocado de pês, abafa-se a vasilha com o tampo para que este fumo se
entranhe na madeira, e sair-lhe-á o mau cheiro, e a vasilha ficará cheirando
sempre bem.
E para que o vinho que se recolher nestas vasilhas seja bom de cheiro, ao
tempo que quiserem recolher o vinho coserão uma pouca de palha de cevada
em uma caldeira de água, e assim fervendo se bota somente a água na vasilha,
enxuga-se-lhe, tapa-se com o batoque para que tome esse suadouro, que
depois o vinho que nessa vasilha se recolher terá bom cheiro.
Segredo 34º
Para fazer o vinagre forte
Faz-se um molhinho de hortelã, que pese uma quarta, atado com um
cordel mete-se pela boca da pipa que tiver o vinagre de modo que a hortelã
fique metida dentro no vinagre ficando o cordel de fora, e daí a sete ou oito
dias tirem-lhe a hortelã e ficará o vinagre fortíssimo.
Se ainda não tiver a fortaleza que queriam, tornarão a fazer igual
operação, que ao fim dos segundos oito dias estará mais forte.
Segredo 35º
Para fazer velas de sebo que não cheirem a ele
Para as velas de sebo não cheirarem a ele e parecerem de cera e que
durem mais, ao fazê-las se terá uma pouca de cal virgem bem peneirada, cada
camada de sebo que se botar na fôrma se lhe botará duas mãos ou um punhado
de cal acesa por toda a forma; as velas que assim se fizerem parecerão de cera,
sem terem cheiro de sebo, e durarão muito mais porque a cal tem a virtude de
lhe dar a cor como a de cera, e conservar o sebo a arder sem se desfazer tão
facilmente.
Segredo 36º
Para o vinho não fazer mal ao homem
Este Segredo vos vou descobrir, mas será bom que vos não seja preciso,
porque o entendimento da criatura bastará para o evitar. Porém se acontecer
essa bebida a fazer-vos mal à cabeça será bom comer os boxes assados de uma
ovelha, antes de comerem mais coisa alguma. Se quiserem antes de beber o
vinho que ele lhe não faça mal comerão berças com vinagre, que assim não
lhe fará mal, mas eu entendo que será bom não seja preciso estas coisas; e
quando se beber o vinho não se bebe demasiado, para não arruinar a saúde, um
dos bens que o vivente tem nesta vida. Se há quem diga que bebem vinho
porque não podem deixar de o fazer, porque é um vicio, aí vai um Segredo
também para perder esse vicio: Metam duas enguias vivas dentro de uma
canada de vinho, e tapem a vasilha e quando estiverem mortas tirem-nas, e os
que costumam tomar-se da pinga bebam deste vinho que depois o aborrecerão
completamente. Também serve para este efeito a bretonica feita em pó e
bebida em vinho.
Segredo 37º
Para que um cavalo pareça manco sendo são
Secretamente arrancar-lhe-ão uma seda do rabo dobrada atá-la-ão entre o
casco e os cabelos aonde chamam os machinhos, ficando metida entre a seda e
os machinhos um grão ou dois de cevada estando bem apertada, farão andar o
cavalo que ele irá a mancar de um pé ou de uma mão, porque o grão de cevada
causa-lhe incomodo nas juntas das pernas e o animal mancará porque o não
pode deixar de fazer. Depois deste Segredo assim feito, tirarão o grão da
cevada que o cavalo tem, que ficará andando direito e causará admiração a
quem o viu manco e em pouco tempo andar são.
Segredo 38º
Para refinar a pólvora
Muitos costumam refinar a pólvora com limão e outras coisas, mas em
vez de a refinar quase que a estragam; porque a prova disto, tenho visto fazer
uso de pólvora ordinária; o melhor
Segredo para a refinar é, tanto de verão como de inverno, borrifá-la com
aguardente muito fina, secando-a depois, que este espírito dá-lhe toda a força
precisa para que ela produza bom efeito. Sei isto por a experimentar e tirar
bom resultado.
Segredo 39º
Para quando uma mulher parir se conhecer se o parto seguinte, se o
houver, é macho ou fêmea
Quando uma mulher parir, se quiserem saber o que a mesma mulher
parirá no parto seguinte, pela criança que teve o podem conhecer; nada mais é
preciso do que ver a coroa do nascido; se o redemoinho que trazemos de
cabelos estiver bem no meio da cabeça, sendo um só redemoinho o parto que
se seguir será macho, e sendo dois os redemoinhos, ou sendo um só e declinar
para qualquer dos lados, o parto que se seguir será fêmea.
Segredo 40º
Para se saber das virtudes da ortemija
A ortemija é uma erva, que quem fizer um molhinho dela e a trouxer ao
pescoço, junto ao coração, terá mais animo e maiores forças. E esta erva,
moída e bem desfeita, deitada em um pouco de vinho e bebida, para a pessoa
que estiver cansada dá-lhe logo muito mais forças por ser uma bebida muito
mais substancial; qualquer caminhante que fizer uma jornada a levará também
consigo porque tem a virtude de se não cansar tanto e andar mais caminho,
que essa virtude é um dos astros que a concede a esta erva, assim como
também serve para espantar as moscas de qualquer casa, se a cozerem com
leite de cabras, e depois de bem cozida untarão as paredes com esse leite, que
elas por causa do cheiro fugirão.{32}
Segredo 41º
Da monstruosidade da natureza
A monstruosidade da natureza é de duas maneiras: uma delas é aquela
que se deixa logo ver em nascendo a criatura, e a outra a que se descobre por
tempo. A que se deixa logo ver, é quando a criatura vem com mais ou menos
abundancia de membros dos ordinários, ou trazendo dos ordinários, é algum
deles semelhante ao de algum animal irracional; aqueles que trazem mais ou
menos membros, de ordinário pode acontecer pela geração ser feita no
bicorporeo, como são Gêmeos, Virgem, Sagitário, Peixes, assim também aos
faltos de membros pode acontecer, por falta de matéria, ou pelos signos
moveis estarem infortunados, os quais são: Áries, Câncer, Libra, Capricórnio;
os que trazem de algum animal também pode ser de duas maneiras ou de
ajuntamento com o mesmo, ou no tempo do concebimento concorrer a mãe
com o pensamento em algum animal.
Da monstruosidade que a natureza descobre com o tempo, se há de
entender daqueles que são demasiadamente grandes do corpo, ou
demasiadamente pequenos, fora da proporção que adiante se dirá, ou tendo
grande corpo tem disforme a cabeça de pequena, ou sendo pequeno tem a
cabeça demasiadamente grande, ou sendo demasiadamente grande do corpo,
demasiadamente pequeno com demasiada grossura, porque destas
monstruosidades se pode conhecer a diferença que há dos compostos em
proporção perfeita; da natureza temos a seguinte:{33}
Três coisas há por onde isto se conhece; a primeira é, que a verdadeira
proporção do homem tem na estatura sete palmos e meio de vicio da natureza,
o mais que se dá são sete palmos a maior, o menor seis palmos, que a estatura
do maior de nove palmos, e o menor de seis se tem por monstruosidade.
A segunda coisa por onde se conhece a verdadeira proporção é, que posto
um compasso com uma ponta entre as sobrancelhas e outra na ponta do nariz
tornando o compasso para baixo chegará à superfície da testa na raiz do
cabelo, com o mesmo compasso sem mais fechar nem abrir, posta uma ponta
no nariz por baixo das sobrancelhas tornando-o a uma e outra parte chegará
aos lacrimais dos olhos de cada um deles, dando volta chegará à orelha,
advertindo que os dois compassos dos lacrimais ás orelhas, da ponta do nariz à
ponta da barba, estes três são iguais, mas são maiores do que os outros de que
temos tratado, que é de entre as sobrancelhas à raiz do cabelo, à ponta do nariz
destes há de haver em todo o corpo desde a raiz do cabelo até aos pés vinte e
sete compassos dando ao rosto três, e ao demais corpo vinte e quatro; esta é a
regra que guardam os imaginários que é dar a um corpo quantidade de nove
rostos, contando inclusive o mesmo.
A terceira é: que em ausência da mesma pessoa se lhe possa fazer todo o
gênero de vestidos, calçado, tão justo como se estivesse presente, o qual se
fará desta maneira: ver-se-á uma luva, que a pessoa calce justa com uma fita
se tomará a grossura do dedo polegar pela raiz do dito dedo, a qual medida
dobrada fará o bocal da manga do casaco ou roupa, a medida do bocal da
manga será dobrada, a medida do cabeção dobrado, faz a medida da cintura; a
da cintura{34} dobrada em três terços, um terço até ao comprimento de um
quarto do casaco, o outro terço com uma mão atravessada da mesma luva, faz
o comprimento da manga; o mesmo terço com a mesma mão através, faz o
comprimento da calça, o ultimo terço faz todo o comprimento da bota, cujo pé
será de um palmo da mesma luva, juntando-lhe mais o que houver do dito
dedo polegar da luva, da junta do meio até à extremidade, isto do pé; dois
terços dos ditos pés fazem capa até ao joelho, os mesmos dois terços, sendo
mulher lhe faz a casaquinha e os três terços lhe fazem a saia, os mesmos três
terços com mais três palmos de luva lhe fazem manto e casaquinha, manga e
corpinho, e o mesmo que acima temos dito. A pessoa que com estas medidas
lhe fizerem a roupa que venha conforme e justo, poderá dizer que é conforme
a proporção da natureza, sem que falte coisa alguma, sendo a proporção de sua
estatura o que temos dito; resta pois que suas obras sejam tais, quais convém
para ser mais perfeito. Os que carecem desta composição lhes convêm
fazerem tais obras, que com a perfeição delas fique satisfeito, à proporção do
corpo.
Segredo 42º
Bons efeitos do alecrim
O alecrim tem uma natureza que é quente, seco e cheiroso, e por isso
fortalece todas as partes e membros de dentro e de fora do corpo, alegra e
fortalece os sentidos, consome as umidades, frialdades, e todos os males
contagiosos.
O alecrim não consente melancolias, tremores nem desmaios no coração,
cujas raízes, ramos, cascas e flores dessa excelente erva tem todas as virtudes,
as quais diremos com ajuda de Nosso Senhor Jesus Cristo e proveito da
humanidade.
Os olhinhos mais tenros do alecrim, comidos pela manhã, com pão e sal,
fortalece a cabeça, conserva a vista clara, aguda e forte.
A flor e folhas da mesma erva feitas em pó e trazida no seio, afugenta os
três inimigos do corpo, que tanto afligem o coração, que são eles: as pulgas,
piolhos e percevejos.
Os mesmos pós no seio do lado esquerdo, espantam a melancolia e ao
coração fazem-lhe muita alegria.
As folhas da mesma erva bem mastigadas e postas sobre uma chaga
fresca, a curam, e fecha maravilhosamente.
A flor da mesma, comida pela manhã com mel da mesma flor e um
bocado de pão quente, faz muito bem à saúde: nem deixa gerar sangue podre,
nem o mal da gota; e se alguém tiver mal, essa erva lho tirará.
O alecrim serve para afugentar todo o animal venenoso, e o seu fumo
serve contra todo o mal e pestes.
Os ramos do mesmo, também servem para depois de queimados e feitos
em pó, fortalecer dentes e não lhe deixar criar bicho, nem constipações.
Toda a mulher que tenha uso de comer a flor do alecrim em jejum com
pão de centeio, não padecerá mal da madre, porque lhe reprime os maus
humores, gasta as umidades, e cura os achaques a todas as pessoas que assim
usarem.
A flor da mesma erva, metida em qualquer sitio onde estiver roupa, não
deixa entrar a traça na mesma, e dá-lhe muito bom cheiro.
Se lavarem o corpo com a água, devem cozer muito bem o alecrim e se
conservarão com boa saúde.
As casas que são escuras e muito úmidas, se as defumarem com alecrim a
miúdo, conservar-se-ão enxutas.
Um Segredo para as quebraduras, já experimentado, são as alfarrobas
verdes, pisadas e aplicadas sobre as quebraduras, que as curam e soldam.
Se tiverem dores nas juntas por causa de algum resfriado e as lavarem
com água onde se cozesse alecrim, lhe tirará a dor.
No tempo da peste é muito proveitoso queimar alecrim pelas casas e nas
ruas, por que afina o ar e faz fugir a peste.
Estas virtudes do alecrim, acabarei de ser tão extenso como pede este
bem para a natureza e tudo deixarei dito da maneira seguinte:
Mel virgem de alecrim serve, tira névoas dos olhos.
O sumo do alecrim lançado nos ouvidos, tira a dor.
O sumo do mesmo tomado pelos narizes, tira o mau cheiro e sana todos
os males que dentro deles estiver.
Um Segredo provado e experimentado, a água do alecrim pôr-se ao sol,
será para os olhos que tem belidas, cataratas, ou que estão enevoados. Faz-se
esta água da maneira seguinte: um bom molho de alecrim verde e colhido de
fresco, põe-se dentro de um urinol novo de vidro com as pontas para baixo,
não devem chegar ao fundo, tapa-se com um pano de linho dobrado, e em
cima deste pano põe-se um bocado de fermento que tome toda a boca do
urinol, e em cima do formento põe-se outro pano dobrado, e ata-se muito para
que não saia bafo algum, põe-se o urinol ao sol em tempo de calor 6 até 8 dias
e dali se fará uma água muito importante para os olhos. Quando essa água
estiver pronta, deve-se lançar em uma vasilha pequena e se terá ao sol e ao
sereno outros tantos dias, que depois a água que era branca, torna-se amarela e
grossa, na qual se desfará um pouco de açúcar de pedra e desta água se
lançarão nos olhos três pingas, em cada um uma vez pela manhã, outras ao
meio dia, e outra à noite, e por favor de Deus sararão.
Mulher que tiver pouco leite, não pode criar os filhos com as folhas e
flores de alecrim, que lhe causará abundância de leite bom, porque purifica o
sangue.
O sumo do alecrim misturado com açúcar e tomado de manhã e ao deitar
da cama faz bem ás aflições do peito, ajuda a digestão e mitiga o apetite de
comer.
A flor e as folhas em pós servem para a dor do baço e do fígado
tomando-as em vinho e mel.
As folhas e flores da mesma erva fervidas em vinho tinto e bebido faz
muito bem à dor de tripas, tira a cobiça e a disenteria.
Também servem os mesmos pós bebidos no mesmo vinho para quem
padecer defluxo da urina, por debilitação ou fraqueza, isto é aprovado mas
devem ser cozidas as folhas e flores em vinho do mais velho que for
encontrado.
Para quem não tiver apetite de comer, tome pela manhã duas ou três
colheres de sopa, de vinho fervido com alecrim, que lhe abrirá a vontade de
comer e lhe fará fortaleza no estomago.
Alguns autores são de opinião, que a triaga é o remédio da peçonha; mas
o alecrim cozido lhe faz o mesmo efeito.
Finalmente o alecrim cozido em água tem todas estas virtudes que se
seguem tomando bastantes banhos dessa água, chama-se o banho da vida,
porque tira a dor das juntas e de todas as mais partes do corpo, é remédio para
a canseira, para a sufocação do coração, dá alento e vigor à velhice, conserva a
mocidade, fortalece os membros e aviva os sentidos.
Aqui deixo por isso escrito aos meus leitores, em estas poucas linhas
todas as virtudes desta planta chamada alecrim, que tão bom proveito tenho
tirado dela e estou por certo que quem dela fizer uso como eu o tirará e se
conservará limpo, de tantos achaques que afligem o corpo humano.
Segredo 43º
Para a azia
A azia, além de ser uma moléstia pouco impertinente quando ataca a
criatura causa-lhe um pouco de desarranjo na garganta, e é o que basta para
nos incomodar, e como não há quem goste de incômodos, temos um
Segredo pelo qual em um instante fiquemos aliviados da garganta, é
Segredo econômico, barato, pois se algum de vós tiver azia é só pegar em
uma cebola: tem poder para a fazer sair. Se houver quem não goste deste
objeto dou-lhe também por aprovado:{39} comerão amêndoas amargosas que
também ficam livres desse mal.
Assim tenho feito sempre e encontrei bom resultado, por isso destes dois
segredos o que primeiro me aparece, é desse que eu faço uso.
Segredo 44º
Para os meninos pequenos se criarem, de modo que sejam mais
encorpados e de mais forças
Muitos homens ficam pequenos de corpo e de poucas forças, porque as
mães e amas lhes tiram os braços de fora antes do tempo, e assim como são
tenros, bolindo com os braços se relaxam os membros e assim ficam mais
fracos e debilitados, por isso quem quiser criar a criança, de modo que fique
largo das espáduas e com muita força nos braços não lhos deve tirar fora,
quero dizer vestidos, senão de três meses por diante, assim ficarão sendo mais
corpulentos e forçosos, porque se vão criando com todas as forças da sua
natureza, cujas forças não lhe abrandam tanto, como se forem criados como
acima disse.{40}
Segredo 45º
Para conhecermos se qualquer homem nasceu de dia, ou de noite, ou no
crepúsculo
A pessoa que tiver as orelhas despegadas da cabeça pela extremidade de
baixo, fazendo as pontas rombas, despegadas ou levantando os olhos
direitamente, se levantar mais o olho esquerdo que o direito, diremos que
nasceu de dia; se as orelhas pela parte debaixo forem pontiagudas sempre
pegadas no casco da cabeça ou levantando os olhos direitamente, e se levantar
mais o direito que o esquerdo, assim diremos que nasceu de noite.
Se um destes sinais mostrar que nasceu de dia, outro que nasceu de noite,
o tal diremos que nasceu no crepúsculo: chamamos crepúsculo de pela manhã
tanto que vem rompendo a alva, e dura até que nasce o sol, o crepúsculo da
noite conta-se desde que se põe o sol, até que se cerra a noite.
Segredo 46º
Da etimologia dos dedos das mãos
O dedo mais curto e grosso da mão chama-se polex, de que se deriva
poder, porque sem ele não se pode apertar coisa alguma na mão, que firme
fique, neste costumam os mercadores trazerem os anéis, dando a entender o
muito que podem valer com seus reales.
O dedo logo seguido se chama índex, que quer dizer amostrador, porque
nos serve de mostrarmos aquilo que queremos; neste costumam os médicos
trazer os anéis, dando-nos a entender que eles são índex, pelos quais nossa
saúde se governa.
O terceiro dedo se chama médio, ou maior, pelo ser, médio por estar no
meio de todos, nestes costumam os soldados trazer os anéis, significando
fortaleza e esforço.
O quarto dedo se chama anular ou dedo do coração, porque ele vem a ter
uma veia que passa pelo coração. Como o ouro é metal agradável à vista de
todas as pessoas, em geral é costume pôr os anéis neste dedo para evitar a
melancolia e outras paixões que acodem ao coração. Muitas pessoas
costumam usar de anéis, mais pela tradição antiga, que pela razão atrás escrita.
Quem trouxer neste dedo um anel com uma pedra de Jacinto fina, que a toque
na carne, não é tão somente bom para a melancolia, pois também tem outras
propriedades boas.
O quinto dedo se chama mínimo ou auricular: mínimo, pelo ser,
auricular, porque com ele costumamos limpar as orelhas. Neste dedo
costumam trazer os anéis as pessoas ilustres, dando assim a entender quem
são, e não pela valia do ouro.{42}
Segredo 47º
Da causa das nossas enfermidades, e com a ajuda de Nosso Senhor as
podemos remediar
As quatro compleições de que fomos formados conosco, assim como
uma mesa com quatro pés, que sendo todos iguais e direitos, em plano, está
quieta e segura, porém se algum deles se levanta ou quebra e é mais comprido,
isto só é bastante para que os outros três com a mesa venham ao chão, da
mesma maneira a cólera, sangue, fleuma, e melancolia, cujas quatro
compleições de que somos compostos estão iguais conforme a saúde no corpo,
porém tanto, que alguma delas se altera ou sobrepuja ás outras, causa no corpo
a doença conforme sua qualidade. Porque da cólera se causam tabardilhos,
frenesis, febres malignas, e outras enfermidades semelhantes.
E do sangue se geram dores de costas, de cabeça, pontadas e outras
semelhantes da fleuma, dores de tripas, umidades no estomago, dores de
madre, cólicas, apostemas, e outras semelhantes. E da melancolia se geram
tristezas, humores viscosos, trêmulos, gota e outros semelhantes.
E suposto que segundo nossa santa fé aos sonhos não se pode dar credito,
por não terem razão nem fundamento algum, são somente fantasmas que se
representam no entendimento, estando uma pessoa dormindo.
Todavia se alguma das quatro compleições se altera do corpo, causa que
os tais fantasmas tenham alguma correspondência, a qualidade da dita
compleição, assim sabendo que seja se pode remediar com defensivos, que a
tal compleição alterada aplicam.
Pelo que se a pessoa sonhar com o fogo ou arma e outras coisas que
incitam a cólera, é sinal que a cólera predomina, segundo ela se lhe pode dar
remédio.
E se o sonho for de pescarias ou embarcações, coisas que pertençam à
água predomina a fleuma.
E se sonhar com prisões, mortes, ou outras coisas que incitem tristezas,
predomina melancolia conforme a ela se lhe aplicará remédio.
Segredo 48º
Para o fogo não queimar
Pegarão em 20 reis de alteia e depois de a fazer em pó a botarão com
uma clara de ovo em uma tigela e com essa mistura untarão as mãos ou outra
qualquer parte que quiserem, que depois disto feito não se queimarão.
Segredo 49º
Do tempo que é salutífero cada um dormir segundo a compleição que
tiver
Temos a notar que as compleições atrás declaradas têm aqueles efeitos
em quanto distintas, mas pela mistura delas formam outras quatro
compleições, que são as do temperamento, colérica, sanguínea, fleumática,
melancólica. Da do temperamento não trataremos, porque não é possível havêla, que onde há temperamento não há alteração e não pode haver doença.
Assim também se há de notar, que o dormir é parte mui essencial para o
cozimento do estomago: porém convém a cada um para sua saúde tomar o
sono conforme a qualidade da sua compleição. Porque os puramente coléricos
pela muita quentura que tem, basta-lhes dormir cinco a seis horas: os coléricos
sanguíneos bastam-lhes cinco e meia a seis e meia; os puramente sanguíneos
bastam-lhes seis a sete; os fleumáticos bastam-lhe seis e meia a sete; os
puramente fleumáticos, bastam-lhe sete a oito, os fleumáticos melancólicos
bastam-lhe sete e meia a oito e meia; os puramente melancólicos bastam-lhe
oito a nove.
E tudo o que passa desta regra é prejudicial à saúde, porque tanto se
perde por carta de menos, porque assim como não dormir inquieta o corpo, o
mói e debilita, assim o dormir muito causa gota e outras enfermidades. Notese também que os coléricos, pela muita quentura que têm, lhes é prejudicial à
saúde sofrer fome; mais ou menos, comer é melhor.
Segredo 50º
Para fazer levantar um ovo ao ar diante de gente
No mês de maio colherão em uma horta uma ambula de orvalho, guardase em parte onde lhe não dê o sol, e quando quisermos fazer o que acima fica
dito, com um alfinete grosso fura-se um ovo e chupando-o pelo mesmo
buraco, o encherão de orvalho, e taparão o dito buraco com um bocadinho de
cera branca, colocando-se o dito ovo à vista de todos em parte onde lhe dê o
sol, e assim como o ovo for aquecendo se irá levantando e subindo até
desaparecer. Quem quiser que este mesmo ovo lhe sirva para mais vezes, ate-o
a um cordel na ponta de uma lança, e que seja o cordel tão comprido como ela,
ficando a lança no chão. Com uma linha atarão o ovo no cordel, posto ao pé da
banca em parte onde lhe dê o sol, e quando aquecer subirá pela lança acima e
assim estará no ar, até o tirarem, enquanto estiver quente, porque quando o sol
daquele sitio for desaparecendo, o ovo vai arrefecendo, e conforme for
arrefecendo assim vai caindo para o chão; por isso lhe devem acudir a tempo
para se não quebrar.{46}
Segredo 51º
Para queimar um lenço e ficar são
Secretamente molharemos um lenço em aguardente de cabeça; trazendoo diante dos circunstantes mandaremos vir uma candeia acesa e tomando o
lenço por duas pontas para ficar estendido lhe mandaremos deitar fogo, e
como for inflamando andaremos com ele ao redor por espaço de um minuto à
vista dos circunstantes e logo o sacudiremos e apertaremos entre as mãos para
que se apague o lume; tornando-o a estender o mostraremos aos circunstantes
tão são como era antes de se lhe botar fogo.
Segredo 52º
Para que as mulheres sem postura pareçam melhor e tenham melhor cara
com menos custo
Entre outras coisas que entre nós há mal feitas são duas, as quais nos dão
notável prejuízo à saúde: a primeira é quererem os homens mostrar que
calçam pequeno pé, mandando fazer menor sapato, do que pede o pé, assim
continuando vem a ser gotosos; por conseguinte as mulheres que usam
posturas perdem os dentes, mais depressa se arusgam e outras muitas
desgraças se seguem daqui.
Segredo 53º
Para mostrar aos circunstantes um braço atravessado com uma faca sem
prejuízo algum
Faz-se uma faca de duas metades ligadas uma à outra com uma mola e
será feita de tempera branda, que se alargue e aparte o que a pessoa quiser;
esta mola metida pelo braço acima por baixo do casaco ou camisa, apertada a
manga junto à faca, e feito isto secretamente sair aos circunstantes, mostrarlha, parecerá o braço estar passado pelo colo da mão.
Adverte-se que a feitoria da mola desta faca é necessário seja de modo
que se aperte e alargue.
Segredo 54º
Para fazer tinta de qualquer cor com facilidade, e as letras que estão em
papel quase safadas se acharem a ponto de se lerem
Deve haver tinteiro separado para cada tinta, para que uma não corrompa
a outra.
Para fazer tinta vermelha, pisam flores de papoula, espremidas, o sumo
que deitarem, coado, posto um pouco ao sol, para que engrosse e não corra
tanto, se faz tinta vermelha bastantemente.
Para fazer tinta verde, faz-se a mesma operação com os conceleiros que
nascem pelas paredes, e da mesma maneira ficará tinta verde.
Para a tinta roxa, do mesmo modo se fará da flor do lírio.
Para tinta amarela, igualmente se faz com flor do pampiro.
E assim para qualquer outra tinta que quisermos fazer, buscaremos a erva
da cor da tinta que quisermos fazer, e do mesmo modo que fica dito se fará.
E para fazer que as letras que estão em papel que mal se enxerguem por
estarem gastas pelo tempo se possam ler, se molhará um pano de baeta em
urina fresca, levemente se esfregam as letras com ele, que depois se poderão
ler.
Segredo 55º
Para tirar nodoas de azeite e pingos de cera de toda a qualidade de panos
Para tirar nodoas de azeite amassarão um bocado de barro vermelho, que
não fique muito espesso, e da parte do avesso que quiserem tirar as nodoas,
cubra-se toda a nódoa com este barro, e da parte direita se ponha sobre a
nódoa uma folha de papel alinhavada, de modo que se chegue o papel ao pano,
e posto a enxugar até o barro estar bem seco, logo se esfrega, e tirando-se-lhe
o papel ficará a nodoa fora. Este remédio é bom principalmente para pano de
cor; é bom lavar em água de pescada.
E também para tirar a nodoa do pano se cobrirá a nodoa com sabão e por
cima do sabão botar um pouco de sal, pondo ao sol por espaço de um quarto
de hora e lavando a nodoa, logo se tirará.
Para tirar pingos de cera, estando em seda, tosta-se uma fatia de pão
trigo, e assim quente se põe em cima da cera que a atrairá a si.
Se for em pano de cor, bota-se um testinho no lume, e estando bem
quente se tira, embrulha-se em um papel, esfrega-se com ele no lugar onde
está a cera, e assim logo sairá e o pano ficará limpo.{50}
Segredo 56º
Do modo mais fácil de fazer doce a água do mar
Se quiserem fazer uma canada em pouco tempo, de água do mar para
ficar doce, tome-se um pote novo, meta-se-lhe dentro uma pedra que pese
quatro ou cinco arrateis, tapa-se-lhe a boca com uma rolha de cortiça, bem
justa, atando o pote por um cordel, se botará o dito pote no mar, mansamente,
para que a pedra não quebre, e daí a três ou quatro horas o tirarão, tirando a
rolha ao pote, acharão dentro dele uma canada de água doce como a da fonte;
a razão por que a pedra se mete é para que o pote vá ao fundo do mar, para a
água tomar a virtude que se pretende.
Segredo 57º
Das regiões do ar e da terra
Como no Segredo adiante havemos de tratar das qualidades da água
doce, necessariamente é tratarmos primeiro da terra, por cuja razão se faz
doce, e do ar a que ela sobe.
Os matemáticos que tenham observado cometas, os quais se fazem entre
a região do fogo e do ar, acham ter este corpo aéreo, trinta e quatro léguas,
dois terços, estes se repartem em três regiões; a primeira que é esta que
gozamos temperada por razão dos raios do sol que dão na terra, reverberando
para cima aquentam, temperam até duas léguas e meia para cima, esta região é
mais palpável, porque nela andam as aves, e nela respiram todos os animais
terrestres, racionais e irracionais. A segunda região é sumamente fria mais
pura que a primeira, em tanto que as aves subindo a ela não se poderão ter
nem respirar no principio desta região, estão em deposito as águas que
chovem, que sobem do mar vapores da terra, águas sobem, até ao meio da dita
região, congelam-se em neve, e se mais acima forem, congelam-se em pedra,
assim como esta primeira e segunda região ocupam para o alto oito léguas e
meia, as mais que faltam para trinta e quatro léguas, dois terços ocupa a
terceira região, a qual pela parte próxima a segunda é fria, e pela parte de cima
por estar à região do fogo é calidosíssima; nesta se fazem todos os trovões,
raios e cometas. Assim também a terra se parte em três regiões, para que não
pareça desordem brotaremos o gosto dela, prová-lo-emos por regras
gramaticais, as quais são pela circunferência ou superfície de um globo, saberse a grossura dele, quero dizer seu diâmetro, ou peso diâmetro de uma coisa,
vir em conhecimento da superfície dela guardando a regra seguinte.
Que sabido o diâmetro de qualquer circulo, este multiplicando partes, um
sétimo; o que tudo somado terá de circunferência a superfície, por conseguinte
sabendo a circunferência, esta, partida por três um sétimo, o que vier à
partição fará o diâmetro, assim, vinte e dois palmos de diâmetro, nos dão sete
palmos de circunferência, pois temos sabido assim pelas dimensões
geométricas, como das experiências de homens do mar ter a terra em
redondeza, seis mil e trezentas léguas; iremos à regra de três, dizendo se vinte
e duas léguas de circunferência nos dão sete de diâmetro, seis mil e trezentas
de circunferência da terra quantas nos darão de diâmetro, virá a partição de
duas mil e quatro léguas e meia, assim diremos ter a terra de grosso, duas mil
quatro léguas e meia que partidas pelo meio vem duas mil duas léguas e um
quarto de légua, tanto há da superfície ao centro da terra, que é o meio de toda
a grossura.
Estas mil duas léguas e um quarto se repartem em três regiões, a primeira
das quais a da superfície para o centro duas léguas e um quarto, ou posto que a
terra em si seja sumamente fria, seca e pesada, esta primeira região é
temperada pela razão que temos dado da impressão que fazem os raios do sol
nela, nesta região se criam as exalações que com a força do sol chamadas para
cima se acertam de cair por terra, pela resistência que lhe põem ao cair, causa
para ela tremer que é haver em algumas ilhas e outras partes tanta calidade na
terra que no verão com a força do sol abrem grandes concavidades, as quais
vindo o inverno, pela razão que acima dissemos, se tornam a fechar.
A segunda região que é de duas léguas e um quarto, seis léguas para
baixo nesta região, a superfície dela é o principio da criação do ouro e mais
metais minerais, daí vem botando para cima por veias canos a modo de
arvores, assim a raiz do ouro principia nele e na segunda região.
A terceira região é de oito léguas e um quarto, que ocupam a primeira e
segunda região para baixo até ao centro, esta ultima região, é sumamente
pesada, fria e seca; é incapaz de criar coisa alguma,{53} no intimo interior da
qual está o inferno de que Deus nos livre.
Segredo 58º
De dois medicamentos que se usam entre os rústicos
Quando alguma pessoa do campo se sente com qualquer mal que seja,
cose um bocado de carqueja e bebem aquela água, e deitados na cama se
abafam para suar, e com isto lhe faz Deus algumas vezes de lhe abrandar o
mal.
O segundo é que para maleitas dizem ao enfermo que dê a urina para
mostrar ao medico, com ela dão uma volta fingindo que vão buscar um xarope
e em lugar dele lhe dão a beber a mesma urina e com este remédio continuam
oito dias, e é com este mesmo remédio que se lhe vão embora as maleitas.
Segredo 59º
Para fazer acreditar aos presentes que conhecemos as cartas de jogar pelo
cheiro
Há de vir a terceira pessoa, a quem tenhamos dado conta disto, logo
faremos pôr a mesa e diremos que nos tapem os olhos, e nos sentaremos, e
defronte de nós a pessoa em que nos fiamos, e logo pediremos cartas,
perguntando que é o que querem que dali se tire, se a primeira de quatro ou o
que quiserem, logo indo tirando carta por carta, e cheirando cada uma delas
pelas costas de modo que o que há de avisar veja que cartas são, assim
tirando-as iremos pondo uma por uma na mesa em tanto que nos venha
alguma das que nos tem pedido a pessoa a que temos comunicado o
Segredo, porá o pé sobre o nosso, assim poremos aquela carta de parte e
iremos continuando até tirar todas as pedidas, da mesma sorte que acima fica
dito e quem estiver fazendo este
Segredo acautelar-se-á para os assistentes não darem fé do que se está
fazendo por baixo da mesa.
Segredo 60º
Virtudes do jacinto
O jacinto é de muitas cores, porém o verde ou roxo mui brilhante é o
melhor, o qual feito em pó e tomado pela boca, é cordial, e serve contra as
febres malignas: defende a quem o traz dos raios e temporais.
Trazendo o jacinto consigo, que toque ao corpo, conforta o coração, e
aviva o engenho.
Defende o jacinto, a quem o trouxer consigo, de venenos e ares
corruptos.
Tem virtude o jacinto de refrear a loucura, e evitar a melancolia; e não
sofre representações de fantasmas, nem visões.{55}
Meia légua de Toledo junto a um mosteiro de Bernardos, há uma fonte
pegada à ribeira do rio Tejo que chamam dos jacintos, porque ali há tantos,
que sai a água e corre por cima deles.
Segredo 61º
Virtudes das pedras da andorinha
Diz o experimentador Alberto, e ainda outros, que na cabeça da
andorinha se acham duas pedrinhas mui pequenas, e que uma é branca, e outra
vermelha, cujas virtudes são as seguintes.
Dizem que quem trouxer consigo a pedra branca da andorinha, não será
molestado de sede, e que se a tiver na boca, sempre a terá fresca.
Dizem mais, que se alguém tiver fluxo de sangue e trouxer a mesma
pedrinha branca ao pescoço, logo se lhe estancará o sangue.
Também dizem que tem virtude para ajudar as mulheres no parto, como a
pedra da águia.
Dizem mais, que lançada a mesma pedrinha branca em uma vasilha de
água por espaço de uma noite, e bebida a água, provoca a cursos, e tira o mal
da gota, e ainda a febre se a tiver.
Também dizem que quem trouxer consigo a pedra vermelha da andorinha
se livrará de muitas doenças.{56}
Segredo 62º
Virtudes da pele que a cobra costuma despir
A pele da cobra queimada, e posta em cima de alguma ferida, a deixa sã;
e se houver bico, ou ferro metido dentro na carne costuma atrai-lo a si, até o
tirar fora.
Notem uma e outra vez, advirtam, que quem trouxer consigo os pós desta
pele de cobra será preservado de lepra, e de qualquer peçonha. E saibam, que
os ditos pós tem grandes virtudes, e muitas propriedades: porém, há de se
queimar a dita pele, estando o sol no signo de Áries, que é de 12 de março até
26 de abril.
Segredo 63º
Para tornar doce a água do mar, que se possa beber
Diz Aristóteles, que para fazer a água do mar doce que se possa beber,
façam uma vasilha de cera bem tapada, e a metam no mar, que fique coberta
de água, e toda a que for entrando pelos poros da cera perderá o sal e ficará
doce. O mesmo sucederá, se meterem no mar uma vasilha nova de barro com
tanto que tenha a boca bem tapada.
Segredo 64º
Para conservar a castidade, e reprimir os estímulos da carne
Escreve Macêncio, que o sumo da erva chamada sagunta, bebido em
jejum reprime os estímulos da carne, e as suas folhas postas sobre os genitais,
diz, que tem virtude de aplacar os incentivos da luxuria.
Avicena escreve, que a arruda comida, mitiga os ardores da carne no
homem; e na mulher pelo contrário, porque os aviva com excesso.
O mestre João diz, que o orjavão tem mui grande virtude, e eficácia para
reprimir a luxuria, porque aplicado aos lombos mitiga, e aplaca grandemente
os estímulos da carne. Diz mais o mesmo autor, que o sumo do orjavão bebido
causa impotência, a quem o toma, por espaço de sete dias. Escreve
Dioscorides, que a fruta, que produz o cedro, pisada, ou o sumo de suas folhas
posto nos genitais, desterra a apetência de atos venéreos. Michael Escoto diz
com muito fundamento que todas as coisas agras, frias e azedas se acomodam
bem com a castidade, conservando-a: e pelo contrário as coisas doces, quentes
e odoríferas, a destroem, e estragam de todo. Porém falando espiritual e
catolicamente, o que mais conserva, e defende a castidade é o jejum, a
disciplina e a oração frequente e com muita devoção.
Segredo 65º
Para conservar as camas sem percevejos, os aposentos sem pulgas, as
casas sem moscas, e ainda sem mosquitos nem ratos
Tomarão cola feita de retalhos de couro, e desfeita em água ao fogo, que
fique bem clara e rala, lhe misturem azeite, e assim quente, molharão e
esfregarão as taboas e pés do leito, de sorte que toda a madeira fique lavada
com este cozimento, e resultarão dois efeitos muito bons. O primeiro será que
o leito todo parecerá de nogueira. E o segundo, que não se criarão nele
percevejos, como tenho bem experimentado.
Segredo 66º
Contra pulgas
Ponham uma panela de água ao lume, e lançar-lhe-ão dois vinténs de
solimão, e deixando-a ferver bem, borrifarão o aposento depois de bem
varrido, e tenham por certo que morrerão, e se não criarão outras. Mas isto se
há de fazer duas vezes na semana.{59}
Segredo 67º
Contra moscas
Tomem um pouco de mel e farinha, mexida com uma pouca de água
clara, lhe lancem arsênico ou rosalgar, e ponham esta mistura em caqueiros,
aonde cheguem as moscas, e ver-se-á quantas vão caindo, porque em
provando ficam mortas. O mesmo efeito faz o ouro e pimenta moída, e
desfeito em água e posto em algumas vasilhas pela casa; mas vigiem que não
chegue cão ou galinha a provar, porque ficarão mortos.
Segredo 68º
Contra mosquitos
Queimarão cominhos rústicos no aposento aonde houver mosquitos, e
logo cairão mortos ou se irão; também quem molhar o rosto com água, na qual
estivessem cominhos rústicos de infusão, não lhe hão de chegar os mosquitos
ao rosto. Em outro lugar se dirão outros segredos mais acerca disto; mui
notáveis e dificultosos de crer, e por tanto cito ali os autores que o dizem.{60}
Segredo 69º
Contra ratos
Façam por apanhar um rato vivo, já grande ou mediano, e façam uma de
duas coisas. Ou lhe esfolem a cabeça e lhe ponham na abertura da pele um
pouco de sal moído e deixem-no vivo, que ele com o ardor e raiva afugentará
os outros: ou façam outra coisa, se lhes parecer mais fácil, e é atar ao pescoço
do rato um cascavel pequeno, que tenha o tenido mui vivo, com o que fará
fugir os outros; e assim ficarão livres destes inimigos caseiros, poupando
gastos e moléstias. Outro
Segredo melhor e mais fácil. Tomarão gesso novo, e passado por peneira
o misturarão com queijo ralado subtilmente, e misturado tudo o ponham em
diversas partes da casa, e será coisa entretida ver os ratos que comerem da
iguaria andarem inchados por casa, e se tiverem água que beber, morrerão
mais depressa; porque o gesso tanto que chega à água ou coisa úmida, logo se
torna em massa, e é
Segredo sem perigo.
Segredo 70º
Para fazer durar o azeite da candeia
Tomarão giesta da mais pequena e de folhas mais miúdas; (porque há
duas castas delas) queimá-la-ão, e da cinza farão decoada; e pondo esta a
cozer, se converterá em sal, o qual lançado nas candeias, conservará e fará
durar o azeite mais do terço. A pedra ume de rosa e o sal comum, que serve
para o comer, tem a mesma propriedade, porém não tanto como o sal da
giesta.
Segredo 71º
Para fazer aumentar o azeite das candeias
Tomarão uma canada de azeite e pôr-se-há ao fogo, e logo lançarão
quatro onças de pez grego e um vintém de pedra ume de rosa; tudo bem moído
primeiro, e mexendo-o muito bem, até que esteja de todo misturado, logo se
poderão servir dele nas candeias, poder-se-á fazer mais ou menos seguindo a
mesma ordem com proporção dos materiais.
Segredo 72º
Para fazer vinagre bom e forte multiplicando-o com pouco custo
No tempo da vindima tomarão um pé de bagaço no patamal do lagar,
depois de espremido e estendido lhe lançarão cem potes de água e quatro
arrateis de perrexil verde, dois de flor de sabugo verde, e um bom cântaro de
vinagre do melhor e mais forte, e deixá-lo estar vinte ou trinta dias, e no fim se
esprema tudo, e recolherão vinagre mui forte e odorífero; e proporcionando os
materiais, podem fazer mais ou menos.
Segredo 73º
Para multiplicar a cera
Tomarão uma arroba de sebo de bode e uma dúzia de ovos de adem, só
as gemas, meio cozidas, desfeitas e bem batidas, se lancem no sebo com outra
arroba de cera, e tudo posto ao fogo se mexerá, até que fique derretido e bem
misturado; e ficará tudo convertido em cera mui amarela, para se fazer dela
toda a obra que quiserem.
Segredo 74º
Para saber se o vinho tem água ou não
Diz Creponte, que para saber se o vinho tem água, lhe lançarão umas
talhadas de pera brava aparada, e se nadarem em cima, sinal que está o vinho
puro; mas se forem ao fundo, se conhecerá que o vinho está aguado.{63}
Outra advertência. Tomarão um junco ou uma palha de avêa bem lisa, e
untada com sebo a meterão na vasilha do vinho; e se este tiver água, sairão
pegadas umas pingas mui subtis de água. Outra. Encherão de vinho uma
panela nova, e deixando-a estar dois dias, se sumirá toda a água, se a tiver.
Outra. Tomarão uma pedrinha de cal virgem, e molhando-a com ele, vinho, se
tiver água logo se desfará a cal; e se estiver puro, se apertará mais. Outra.
Lançarão um pouco de vinho em azeite que esteja bem quente, e se tiver água,
espirrará e saltará, o que não ha de acontecer se for puro.
Segredo 75º
Para se não embebedar
Diz Filonio, que para se não embebedar são bons os bofes de ovelhas
assados, e comidos antes de jantar, ou que, antes que bebam vinho, comam
verças com vinagre, e deste modo lhe não fará mal o vinho, posto que bebam
mais do ordinário. Porém o melhor remédio para se não embebedar é o que eu
uso há sessenta e três anos que hoje faço de idade, e nunca bebi vinho, e acho
tanto regalo na água, que é para mim a melhor iguaria que vejo na mais
esplêndida mesa: e oxalá se praticara isto que digo, que o vinho se havia de
vender na botica e usar por medicina. Se alguém reconhecer o descrédito, que
causa o vicio de destemperança no beber, e quiser livrar-se de se embebedar e
aborrecê-lo de todo, note o que escreve Plínio, e é que metam duas enguias
vivas e grossas dentro em um cântaro de vinho, e que depois de estarem
afogadas, deem este vinho aos que se costumam embebedar, e virão a
aborrecer o vinho de todo; porque causa um raro tédio e aversão. Para o
mesmo serve a bretonica feita em pó e bebida.
Segredo 76º
Para tirar a água do vinho
Escreve Catão e Plínio, que para tirar a água do vinho, se fará uma
vasilha de páo de hera, lançando o vinho nela, se tiver água, todo o vinho se
irá coando e ficará só a água na mesma vasilha: e se não tiver água, ficará a
vasilha completamente vazia.
Segredo 77º
Uma redoma que estando cheia de água, e posta com a boca destapada
para baixo, se não entorne
Ponham uma redoma ou garrafa cheia de água ou vinho dentro em um
cubosinho ou balde de madeira ou de cobre que é melhor, e lançarão sobre a
garrafa ou redoma, e por baixo quantidade de neve bem desfeita, e por cima da
neve se deitarão bastante sal moído e pouco a pouco irão virando a garrafa, até
que de todo esteja a neve desfeita, e escorrerão a água da neve e lançar-lhe-ão
outra tanta neve desfeita com sal moído; e assim se deixará estar até que de
todo se desfaça, sem mover a garrafa: e farão o mesmo terceira vez, e tirará a
água congelada ou o vinho que estiver na garrafa. E isto se pode fazer na força
do verão, e parecerá coisa impossível, sendo tão fácil; e pondo a garrafa com a
boca destapada para baixo, é certo que se não entornará. Como experimentou
o duque de Gandia, D. Francisco de Borja, que mandou uma cheia de água
congelada no verão, ao patriarca D. João de Ribeira, arcebispo de Valença, o
qual em retorno de tão curioso
Segredo, lhe mandou outra garrafa cheia de vinho congelado, que foi
maior maravilha.
Segredo 78º
Para tornar uma rosa e um cravo de vermelho em branco
Defumarão o cravo e a rosa em enxofre, e logo se tornarão brancos de
encarnados; e podem fazer todo o craveiro branco, de vermelho, como eu fiz a
experiência em uma ocasião, tornando brancos mais de vinte cravos
encarnados, com admiração do dono do craveiro, por não saber a causa.{66}
Segredo 79º
Curioso e de entretenimento
Recolherão uma pequena porção de azougue em um canudinho de pena e
muito bem tapado, o meterão dentro em um pedaço de pão quente, e ver-se-á,
tanto que o azougue aquecer, que começará o pão a dar saltos pela mesa. O
mesmo verão que fará uma avelã, se a encheram de azougue, e bem tapada
com um torno que atoche bem, lançada em água quente, porque tanto que o
azougue aquecer, fará saltar a avelã.
Segredo 80º
Garrafa ou redoma
Se quiserem fazer subir a água por uma redoma vazia ou garrafa,
aquentar-se-á muito bem e por-se-á com a boca para baixo na água, e verão
subir a água pela redoma acima enquanto esta estiver quente, e para que o
esteja, irão queimando papel sobre o fundo da mesma vasilha, e não há de
parar até que encha de todo, e é provado.{67}
Segredo 81º
Do ovo e da sanguesuga
Se quiseres que um ovo ande pela casa, tomarão um ovo vazio, de sorte
que fique a casca quase inteira, e pelo buraco por onde o vazarem, lhe metam
uma sanguessuga viva, e tapar-se-á o buraco com cera, e tomarão uma tigela
de água e a irão movendo junto ao ovo, e como a sanguessuga do instinto
natural conhece e sente o rumor da água, vai seguindo aquele rumor, e o ovo
rebolando, a quem não sabe o
Segredo fica confuso, e é provado, e nota que a sanguessuga há de ser de
paul e de umas que há mui negras e grossas.
Segredo 82º
Raro do ovo e da linha
Atarão uma linha ao redor de um ovo, e pondo-o a assar no meio do
borralho que esteja bem coberto do lume mais vivo, e ver-se-á que o ovo se
assa e não se queima a linha nem se quebra, e é provado.{68}
Segredo 83º
Incrível para quem o não viu nem provou
Se quiserem frigir peixe ou ovos em papel em lugar de certã, tomem um
pedaço de papel feito a modo de barrete de quatro cantos, e deitar-lhe-ão
azeite, e pondo-o sobre uma vela ou candeia acesa, irá fervendo o azeite sem
que o papel se queime e frigindo o peixe ou ovos, é provado.
Segredo 84º
De duas caras pintadas na parede que apaguem e acendam uma vela
Pintarão na parede duas caras grandes, e no meio das bocas lhe farão
duas covinhas; em uma ponham salitre moído bem enxuto, e na outra enxofre
em pó; e se chegarem o lume da vela à boca ou covinha do salitre, se há de
apagar, e no mesmo instante chegarão o pavio da vela que fica fumegando, à
outra boca do enxofre, se acenderá e é provado; mas hão de tocar o pavio no
salitre e no enxofre.
Segredo 85º
Para que um frangão, estando vivo, pareça morto e assado na mesa, e
para o fazer saltar e fugir
Tomarão sumo de aipo e misturem-no com aguardente refinada, e
deitarão de molho umas migalhas de pão nesta água misturada com sumo do
aipo, e darão de comer ao frangão em jejum destas migalhas, e dali a pouco
cairá o mesmo frangão no chão amortecido, e no mesmo instante tirar-lhe toda
a pena e untá-lo com mel branco, misturado com açafrão, de sorte que fique
bem corado, e pondo o frangão em um prato, na mesa, parecerá assado. E
quando o quiserem fazer tornar em si e saltar fora da mesa, molhar-lhe-ão o
bico com um pouco de vinagre forte, de sorte que lhe chegue à garganta, e de
repente se levantará e fugirá da mesa, e é provado.
Segredo 86º
Maravilha rara
Escrevem S. Basílio e S. Ambrosio, de uma ave que se chama Alcião, da
forma do maçarico, a qual cria junto ao mar na área e no inverno; a qual em 14
dias se tira e cria, até poderem voar. E dizem estes Santos Doutores, que em
todos estes 14 dias, que esta ave gasta em criar seus filhos, nunca o mar se
altera, pouco nem muito, antes se conserva mui sereno e sossegado. Esta
maravilha e prodígio tem bem observado os marinheiros, e chamam a estes
dias alciônicos; e estão mui certos que em todos estes 14 dias não há tormenta
no mar.
Segredo 87º
Do olho do cão
Batista Aranda, escreve em um livro de seus conceitos, que quem trouxer
consigo um olho de cão negro, não lhe ladrarão os outros cães; por que diz que
o dito olho lança de si tão grande fartum e cheiro, que os cães o sentem logo
pelo grande faro que têm; e não só se não atrevem a ladrar, mas ainda nem a
bolir consigo.
Segredo 88º
Importante para a memória
Se quiserem aumentar a memória, tomarão a banha do urso e cera branca,
e derreterão a cera com a banha, sendo esta dois tantos de cera; tomarão a erva
que se chama Valeriana, e outra que se chama Eufrágia, frescas ou secas, e
pisadas muito bem, as misturem com a banha e cera derretida, e tornando ao
fogo, deixarão ferver até que fique grosso, mexendo com um pau, e com este
unguento untarão o toutiço e testa, de quando em quando, e se aumentará
notavelmente a memória, e é provado.
Segredo 89º
Dos dois casados que não tem filhos
Para saber, de dois casados que não tem filhos, em qual dos dois está o
defeito natural, tomem a urina de ambos, marido e mulher, cada uma em sua
vasilha, e em cada qual delas lançarão uns poucos de farelos de trigo, e
naquela urina em que se criarem bichos, está o defeito natural de não poder
procriar ou conceber.
Segredo 90º
Para ter boa voz e clara
Tomarão a flor do sabugueiro, e secando-a ao sol, moída, lançarão os pós
em vinho branco e os tomarão em jejum, e causará boa voz e clara.
O sumo do aipo e orjavão, bebidos, aclara muito a voz; mas advirtam,
que o sumo do orjavão resfria os genitais.
Segredo 91º
Para que se não coza a carne na panela posta ao lume em todo o dia
Tomem uma pasta de chumbo delgada, e pondo-a no fundo da panela,
não se cozerá a carne por mais fogo que tenha em todo o dia, e é provado.
Segredo 92º
Provado contra o mal dos queixos
Tomem duas dúzias de folhas de hera, outras tantas de sabugo e outros
tantos grãos de pimenta, e ponham tudo a ferver em vinho bem tinto e velho
com um pouco de sal, e depois de ferver bem, tirado do fogo, tomarão
bochechos de vinho quente, fazendo-se três ou quatro vezes, se tirará a dor
sem falta.{73}
Segredo 93º
Para fazer espirrar por baixo e por cima a quantos estiverem em uma casa
Tomarão três ou quatro pimentos ou malaguetas, e as porão em um
braseiro, cobertas de cinza, de sorte que as brasas não cheguem aos pimentos,
porém que haja muitas brasas em cima e ao redor da cinza, e tanto que forem
aquecendo os pimentos, pouco a pouco sairá um fumo tão subtil e delgado,
que se não sente, até causar o sobredito efeito, com tanto que a casa esteja
bem fechada, e é provado.
Segredo 94º
Provado para que não nasçam nem cresçam cabelos
Raparão mui bem com uma navalha os cabelos que quiserem, e untarão
aquele lugar com goma-arábica, desfeita com o sumo de erva molerinha ou
sangue de morcego, que é melhor, e não lhe crescerão mais. O mesmo efeito
fará o esterco de gato desfeito com vinagre.{74}
Segredo 95º
Para que a barba e cabelos sempre se conservem negros
Mandarão fazer um pente de chumbo mui basto, com o qual pentearão a
barba e cabelos a miúdo e sempre se conservarão negros.
Segredo 96º
Para conservar a barba e cabelos loiros
Tomarão folhas de nogueira e cascas de romã, destilado tudo por
alambique de vidro, e com esta água lavarão mui bem, por quinze dias, a
barba e cabelos, e conservar-se-ão loiros.
Segredo 97º
Para que a barba e cabelos de brancos se tornem negros
Tomem folhas de figueira negra bem secas, e feitas em pó as misturarão
com azeite de macela galega, e com isto untarão os cabelos e barba muitas
vezes, e se farão negros.
Segredo 98º
Para que as unhas e cabelos cresçam pouco
Cortarão as unhas e cabelos em minguante da lua, com tanto que se ache
a lua no signo de Câncer, Peixes ou Escorpião, e crescerão mui pouco.
Segredo 99º
Para que as unhas e cabelos cresçam depressa
Cortarão as unhas e cabelo em crescente de lua no signo de Touro,
Virgem ou Libra, e verão como tornam a crescer depressa.
Segredo 100º
Aviso importante e proveitoso para os lavradores
Para que as sementeiras saiam boas, e a colheita melhor, observará o
lavrador, quando semear, que seja em lua nova, e que se ache no Signo de
Touro, Câncer, Virgem, Libra ou Capricórnio, e achará uma grande e rara
diferença na seara e na colheita.
Segredo 101º
Para ferir fogo sem pederneira nem isca
Tomarão um páo de louro seco, e outro de amoreira, ou de hera, que é
melhor, e roçando rijamente um contra outro, aquecerão tanto que sé acenderá
fogo como pólvora, ou mecha. Deste Segredo usavam as espias no campo de
Cesar, por não serem sentidas dos inimigos.
Segredo 102º
Para secar o leite dos peitos das mulheres
Notem este Segredo: as mulheres para se lhes secar o leite dos peitos, por
mais cheios e duros que os tenham, tomarão as folhas do sabugueiro e as
ponham estendidas e enxutas sobre os peitos, e logo se irão abrandando e
secando; e é provado muitas vezes. Outro
Segredo mui importante para o mesmo, e é que tomem uma erva que se
chama melcoraje, e pondo-a ao fogo em uma tigela com um pouco de azeite
rosado, assim que estiver quente a ponham aos peitos, cobrindo-os bem com
panos em cima, e aos três dias não sentirão leite nem moléstia alguma; e
também é provado e experimentado muitas vezes.
Segredo 103º
Para saber antecipadamente se há de haver abundancia de vinho
Escreve Missaldo, se a poupa (que é uma ave pintada como um periquito
na cabeça) cantar antes que as vinhas rebentem, é sinal mui certo que haverá
abundancia de vinho naquele ano.{78}
Segredo 104º
Para que os novilhos sigam a um homem
Diz Aristóteles, livro de Animalibus, que se puserem uns pedacinhos de
cera benta nas pontas do novilho, há de seguir a quem lhos puser.
Segredo 105º
Para que as bestas tornem para casa de seus donos
Escreve Santo Alberto Magno, que untem a testa da besta com sumo de
cebola alvarrã, e não temam que se perca se a não furtarem.
Segredo 106º
Para fazer que uma besta não possa comer
Untar-lhe-ão a língua toda com sebo, e antes se deixará estalar que comer
coisa alguma, se lhe não tirarem o sebo com sal e vinagre, lavando-lhe muito
bem a língua.
Segredo 107º
Para não poderem passar por uma rua cavalos nem outro gado
Escreve Santo Alberto Magno, que façam uma cordinha de tripa de lobo,
e pondo-a atravessada na rua, coberta de areia ou pó, verão que não passará
por ela cavalo ou gado, ainda que os matem ás pancadas; e dizem que fez a
experiência S. Thomaz de Aquino, discípulo de Santo Alberto Magno.
Segredo 108º
Para descanso das bestas que caminham
Escreve Plínio, que tomem os dentes maiores dos lobos e que os atem ao
pescoço das cavalgaduras, e não se molestarão nem cansarão muito no
caminho.
FIM DA TERCEIRA PARTE
PARTE QUARTA
O ORÁCULO DAS FLORES
OU
O verdadeiro modo de adivinhar o futuro, pela inocente significação e
definição da verdadeira linguagem das flores, plantas e árvores, em forma
de dicionário, ao alcance de todas as pessoas.
PLANTAS E ÁRVORES
Abeto, Elevação.
Aboboreira, Esperanças vãs.
Abrolhos, Trabalhos.
Abrotea, A minha dor vos seguirá à sepultura.
Absinto, Separação, ausência, amargura.
Acácia amarela, Nobreza.
Acácia branca, Amor platônico.
Acanto, Nós indissolúveis.
Açafrão, não abuseis.
Acer, Reserva.
Achilleia (Aquileia), Guerra.
Acônito, Vingança.
Açucena, Pureza.
Adônis, Dolorosas recordações.
Agapânio (Agapano, Agapanto), Orgulho.
Agárico, Venço todas as dificuldades.
Agnoscato, Frieza viver sem amar.
Agrimônia, Reconhecimento.
Aipo, Pranto.
Álamo, Gemidos.
Álamo-negro, Coragem, valor.
Alecrim, amo-vos.
Triste imagem da minha alma,
Pobre ramo de alecrim,
Para dar-te a uma ingrata,
Vou roubar-te ao teu jardim.
Alecrim d'Hamburgo, Modéstia.
Alecrim do Norte, Franqueza.
Alecrim seco, Saudade.
Alface, Esmorecimento.
Alfazema, Desconfiança.
Alfazema murcha, Vaidade.
Alfeneiro d'Alemanha, Defesa.
Alfinete branco, Quero e não posso.
Alfinete cor de rosa, Tende valor.
Alho, Fogo de amor.
Almeirão, Impaciência.
Aloé, Aflição, pesar.
Amaranto, Imortalidade.
Amarílis, Inconstância.
Ameixieira, Cumpri vossas promessas.
Ameixieira brava, Independência.
Amendoeira, Travessura.
Amoreira branca, Jactância.
Amoreira preta, Eu não vos sobrevirei.
Amor de hortelão, Aspereza.
Amor perfeito, Existo para ti só.
Amor perfeito amarelo, Esquecimento.
Amor perfeito roxo, Lembrança expressiva.
Ananás, Quanto sois perfeito.
Anêmona, Esquivança.
Com dor a terra bebe reunidas
Ondas de sangue, lágrimas sentidas,
Da terra, sem tardar, brota uma rosa,
Louca anêmona ao pé s'ergue formosa.
Anêmona dos prados, Doença.
Angélica, Êxtases.
Angélica amarela, Indiferença.
Angélica branca, Pureza.
Angélica dobrada, Sem amor não ha ventura.
Antirrino (Boca-de-leão), Presunção.
Aquilegia, Extravagância.
Argentina, Altivez.
Arruda, Castidade.
Artemísia dobrada, Paixão violenta.
Artemísia singela, Espanto.
Árvore, Vida humana.
Azinheiro, Tristeza.
Assembleias, Igualdade.
Aveleira, Reconciliação.
Avenca, Discrição.
Azares, um abraço.
Azedas, Gloria.
Azereiro, Prazer tardio.
Azevinho, Providência.
Balsamina, Acaso.
Bálsamo, Misericórdia.
Bálsamo da Judeia, Restabelecimento.
Banana, Moleza.
Bardana, Importunidade.
Batata, Beneficência.
Baunilha, Amor violento. Eu vos amo.
Beijos brancos, Atrativos.
Beijos escarlates, Não desesperes.
Beijos rajados, Bem te entendo.
Beijos roxos, Se quisésseis?
Bem-me-quer, Desconfiança, pesar, aflição.
Bem-me-quer junto com cipreste, Desesperação.
Boas noites encarnadas, Timidez.
Boas noites amarelas, Acanhamento.
Bonina, Tristeza e timidez.
Bons dias, Infidelidade.
Borragem, Galanteio.
Botão de cravo branco, Espero resposta.
Botão de cravo encarnado, Atrativo.
Botão de cravo rosa, União.
Botão de cravo roxo, Amor infeliz.
Botão d'ouro, Amor constante e satisfeito.
Botão lindo acetinado,
Que sorri com a inocência,
Contém suco empeçonhado
Com que fere a imprudência.
Botão de prata, Calúnia.
Botão de rosa amarela, Desdém.
Botão de rosa branca, Coração que não conhece o amor.
Botão de rosa cravo, Ciúme.
Botão de rosa com folhas, Virgindade.
Botão de rosa encarnada, Reciprocidade.
Botão de rosa de Jericó, Não posso.
Botão de rosa de musgo, Esperança receosa.
Bulgosa, Mentira, ilusão.
Buxo, Inocência.
Catos, Triste vida.
Quando em ti ponho os meus olhos,
E te contemplo admirada,
Sempre teu fado lastimo,
Mimosa flor engraçada.
Camará do Brasil, Rigor.
Camélias, Amor sempre constante.
Eu de ti tenho ciúmes,
Linda camélia engraçada;
Pois ornas o branco seio,
D'Elisa a minha amada.
Campainha, Indiscrição.
Campainha azul, Declaração.
Canas (floriferas), Inconstância.
Capraria, Razão.
Cardo, Tormento.
Cardo penteador, Misantropia.
Cárpea, Enfeite.
Carvalho, Fortaleza.
Casca de Romã, Modéstia.
Castanheiro, Fazei-me justiça.
Castanheiro da Índia, Luxo.
Cedro, Grandeza, excelência.
Cenouras, É tudo falso.
Centaurea, Felicidade.
Cerejeira, Boa educação.
Chagas, Crueldade.
Chagas amarelas, Não vão lá.
Chagas encarnadas, Discrição.
Chicória, Frugalidade.
Chorão, Melancolia.
Sim, de todos os males da vida
É a ausência o mais doloroso.
Eis porque o chorão desditoso
É a árvore valida.
Choupo, Tempo.
Cidreira, Mágoa.
Cipro, Caridade.
Circeia (Erva das feiticeiras), Bruxaria.
Clandestina, Amor oculto.
Clematites, Artifício.
Coentro, Posso ir?
Cogumelo, Suspeita.
Colutea, Entretenimento frívolo.
Cominhos, Pragas, maldições.
Congossa, Doces recordações.
Consolida-real, Leviandade.
Convolvulus-noturno, Noite.
Coroa imperial, Altivez excessiva.
Coroa de rosas, Recompensa da virtude
Coroa de Venus, Triunfo d'amor.
Coronilha, Duração.
Couve, Proveito.
Cravina branca rajada, Veio tarde.
Cravina encarnada, Só a ti quero.
Cravo, Estimação.
Teu aroma, cravo amável,
Nossos sentidos domina,
Tu esparges na campina
Um perfume inigualável.
Cravo almirante, Fogo d'amor.
Cravo amarelo, Desprezo.
Cravo branco, Inclinação.
Cravo branco rajado, Suspirar.
Cravo cor de rosa rajado, Alento.
Cravo de defunto, Morte.
Cravo da Índia, Portador seguro.
Cravo encarnado, Muito correspondido.
Cravo rosa, Fidelidade, Amor constante.
Cravo rosa rajado, Volte logo.
Cravo roxo, Sentimento.
Cuscuta, Baixeza.
Cipreste, Luto, aflição.
Dália, Amo-vos mais que a própria vida.
Datura (erva moura), Atrativos falazes.
Dictamo de Creta, Nascença.
Dormideira, Incerteza, desconfiança.
Ébano, Negridão.
Endro, Ingratidão.
Ephemerina (Efemerina) da Virgínia, Felicidade momentânea.
Ervilhas, Apareça.
Ervilha de cheiro, Prazer delicado.
Ervilha azul, Expressão d'amor.
Escovilha, delicadeza.
Espelho de Venus, Lisonja.
Espigas de trigo, Fartura.
Espinha, Dor.
Espinheiro, Dificuldades.
Espinheiro alvar, Prudência e sinceridade.
Espinhos, Riquezas.
Espirradeira, Serei ditoso.
Esponja, Desassossego.
Esporas, Velocidade.
Esporas brancas, Apresse-se.
Esporas azuis, Timidez.
Esporas cor de rosa, Simpatia.
Espora singela azul, Consentimento.
Espora singela branca, Muito gosto.
Evônimo, Existis em meu coração.
Faia, Prosperidade.
Favas, Demandas.
Fecoide (Ficoide) glacial, O vosso fogo me faz gelar.
Fel da terra, Fiel.
Feno, Gloria do mundo.
Feto (fêmea), Sinceridade.
Feto aquático, Frenesi.
Figos, Doçura.
Figos verdes, Inutilidade.
Figueira brava, Temperança.
Flor do cacto especiosíssimo, O vosso amor não é constante.
Flor de laranjeira, Castidade.
Flor de batateira, Preferência.
Flor de limoeiro, Vítima do ciúme.
Flor de lis, Poder.
Flor de macieira, Aprovação.
Flor de maracujá, Voluptuosidade.
Flor de pessegueiro, Prazeres amorosos.
Flor de romeira, Generosidade.
Flor de sabugo, Irritação.
Flores de tomates, Não quero.
Flores, Esperanças.
Flores do campo, Divertimento.
Flores murchas, Ingratidão.
Folhas, Palavras.
Folhas de cipreste, Separação forçada.
Folhas de figueira, Penitencia.
Folhas de laranjeira, Raiva.
Folhas de limoeiro, Mexericos.
Folhas de louro, Premiar.
Folhas secas, Melancolia.
Folhas de tomates, Não quero.
Folhas de vinha, Esperanças perdidas.
Frachinella, Fogo amoroso.
Freixo, Grandeza.
Funcho, Sofrimento.
Gazão, Utilidade.
Gerânio almíscar, Estima.
Gerânio limão, Capricho.
Gerânio rosa, Languidez.
Gerânio-triste, Espírito melancólico.
Giesta (fêmea), Esperança enganadora.
Giesta odorífera, Esperança quase extinta.
Girassol, Intriga.
Glacial, Indiferença.
Goivos amarelos, Preferência.
Goivos brancos, Simplicidade.
Goivos encarnados, Desdém.
Goivos roxos, Solidão.
Golfão branco, Eloquência.
Grãos, Conserva-te.
Grãos de mostarda, Fé.
Grinalda de flores, Cadeia de amor.
Hepática, Confiança.
Hera, ambição.
Herva (Erva) cidreira, Chocarrice.
Herva (Erva) doce, Mudança.
Herva (Erva) moleirinha, Fel, ódio, rancor.
Herva (Erva) ruiva, Calúnia.
Herva (Erva) de Santa Maria, Horror.
Hissopo, Limpeza.
Hortelã, Amor exaltado, consolação.
Hortênsia, Frieza.
Hortigas (Urtigas), Crueldade.
Ibéria da Pérsia, Indiferença.
Iris, Mensagem.
Jacinto, Dor, pesar, sentimento.
Jasmim, Paixão, perigo.
Jasmim amarelo, Vergonha.
Jasmim do cabo, Pretensão.
Jasmim encarnado, Serei vosso até morrer.
Jasmim d'Itália, Zelos.
Jasmim miúdo, Paixão.
Jasmim da Virginia, Separação.
Jarro, Ardor.
Joio, Vicio.
Junco, Docilidade.
Junquilho, Desejo.
Junquilho dobrado, Namoro.
Laranjeira, A fiabilidade.
Lariço, Audácia.
Lentilhas, Esconderijo.
Lilás, Primeira comoção de amor.
Lilás branco, Mocidade.
Limoeiro, Desejo de ser correspondido.
Língua de vaca, Mentira.
Linho, Saudade.
Lírio branco, Ardor.
Lírio? filho do sol, soberba flor,
Que altivo afrontas o paterno ardor,
Ao astro alçando a fronte majestosa,
Rei és das flores, e rainha é rosa.
Lírio dos vales, Leviandade, indiferença.
Lírio escarlate, Já não posso mais.
Lírio roxo, Confiança.
Lírio verde, Os meus dias felizes já passaram.
Lisymachia, Pretensão.
Liz, Majestade.
Lodão, Harmonia.
Loios (de jardim), Doçura.
Losna, Amargura, separação, ausência.
Loureiro, Triunfo, gloria.
Daphne foi sensível bela,
Apollo belo e sensível,
Sobre ambos despede amor
Uma faísca terrível.
Loureiro amêndoa, Perfídia.
Loureiro rosa, Beleza.
Lúpulo, Injustiça.
Luzerna, Vida.
Macela, Brandura.
Macieira, Amor.
Madragora (Mandrágora), Raridade.
Madressilva, Laços d'amor.
Mal-me-quer, Pena, tormento.
Mal-me-quer sem folhas, Amor oculto.
Mal-me-quer dobrado, Perdeis o tempo.
Mal-me-quer inglês, Cautela.
Mal-me-quer, no peito, Cruéis tormentos.
Mal-me-quer, no cabelo, Não digo o que sinto.
Mal-me-quer singelo, Tristes lembranças.
Quantas vezes a pastora
Longe do jovem amante
Diz consigo: É-me fiel?
Voltará ele constante?
Malvaisco rajado, Se souberas!
Malvaisco vermelho, Chama de amor.
Malvaisco amarelo, Quem pudesse!
Malvas, Acautela-te.
Malvas cheirosas, Aviso.
Manjericão miúdo, Indigência.
Manjericão largo, Desespero.
Manjericão roxo, Interprete d'amor.
Mangerona, Sempre feliz.
Mangerona murcha, Adeus que me ausento.
Maracujá, Tomara eu já.
Maravilhas, Brevidade.
Margarida singela, Inocêncio.
Margarida dobrada, Estou de acordo com os vossos sentimentos.
Martírio, Paixão, religião.
Mata-cão, acabaram meus dias felizes.
Meimendro, Defeitos.
Melindres, Melindre.
Meniantho, Calma, tranquilidade.
Mil folhas, Guerra.
Milho, Multidão.
Mirro, Mortificação.
Mirto, egoísmo.
Morangueiro, Presságio.
Morangos, Bondade perfeita.
Morrião, Entrevista amorosa.
Mostarda, Furor.
Murta, Amor, sentimento.
Sua verdura imortal
É do universo a beleza,
Nem murchar-lhe o verde ornato
Pode do inverno a crueza.
Murtinho, Traição.
Musgo, Amor maternal.
Mirabolano, Privação.
Não-me-deixes branco, Amor constante.
Não-me-deixes cor de rosa, Juramento.
Não-me-deixes roxo, Ausência.
Não-me-deixes rajado, Desgosto.
Narciso, Amor próprio, egoísmo.
Nardo, Devoção.
Nogueira, Virtude.
Noz metella, Fingimento.
Olaia, Elegância.
Oliveira, Paz.
Ononio, Obstáculo.
Ophyrio (Ofírio) de três folhas, Erro.
Orelha de rato. Não te esqueças de mim.
Das amantes entre as mãos,
Já do brilho amortecida,
Recomenda — amor constante,
Lembrança por toda a vida.
Orelha de urso, Sedução.
Orvalho, Gelam-me vossos fogos.
Palha (uma) inteira, União.
Palha (uma) quebrada, Rompimento.
Palma, Castidade.
Papoula branca, Desconfiança, incerteza.
Papoula cor de rosa, Feliz encontro.
Papoula encarnada, Orgulho.
Papoula rajada, Não divides.
Papoula silvestre, Reconhecimento.
Papoula singela, Suplício.
Pessegueiro, Guerra.
Pentafilo, Minha querida.
Pereira, Ira.
Perpetua amarela, Constância eterna.
Linda florinha amarela,
Símbolo d'amor eterno;
Ornas os nossos jardins
Quer de verão, ou quer d'inverno.
Perpetua branca, Mistério.
Perpetua roxa, Amor constante.
Pervinca, Doces recordações.
Pilriteiro, Esperanças.
Pimenta malagueta, Estou ardendo.
Pimentão, Ofensa.
Pinheiro, Morte.
Pionia (Pêonia), Vergonha.
Pirâmide azul, Constancia.
Piteira, Aflição, pesar.
Plátano, Alteza.
Primavera, Desejo d'amar.
Pulsatilla, Não sois pretensiosa.
Rainha-Margarida, Grandeza, esplendor.
Rainunculo (Ranúnculo), Impaciência.
Rainunculo asiático, Sois linda como um anjo.
Raízes, Segredos.
Ramo, Desejo.
Raquel, União.
Relva, Utilidade.
Resedá, Vossas qualidades excedem vossos encantos.
A não ser teu belo aroma,
Minha florinha querida,
Viverias ainda hoje
No campo desconhecida.
Rilha-boi, Obstáculo.
Romã, Ambição.
Romeira, Fatuidade.
Roquetta, Morro por vós.
Rosa amarela, Infidelidade.
Rosa almiscarada, Beleza caprichosa.
Rosa amélia, Murmuração.
Rosa aveludada, Gentileza.
Rosa branca, Silencio, afeição.
Rosa branca e encarnada, Fogo do coração.
Rosa de cem folhas, Graças e beleza.
Rosa de cheiro, encarnada, Sou assaz feliz.
Rosa dobrada, Esplendor.
Rosa da Índia, Estimação.
Rosa do Japão, Amor constante.
Por gozar um só momento.
Uma ventura tão querida,
Gostosamente daria
O resto da minha vida.
Rosa de Jericó, Graças, beleza.
Rosa de musgo, Amor, voluptuosidade.
Rosa das quatro estações, Formosura inalterável.
Logo que a hástea começa
A rosa a desabrochar,
Zéfiro e a borboleta
Vem em torno esvoaçar.
Rosa de todo o ano, Continua e vencerás.
Rosa de toucar, Sois o meu único amor.
Rosa (uma folha de), Nunca sou importuno.
Roseira brava, Poesia.
Rosmaninho, Vossa presença me reanima.
Sainfoin ou esparceto, Agitação.
Salgueiro, É inútil.
Salgueirinho, Tristeza, lealdade, lagrimas.
Salsa, Gosto, não desanimes.
Salva, Estima.
Sardônia, Ironia.
Saudade, Saudade.
Vem repousar no meu peito
Modesta, engraçada flor;
Tu tens de saudade o nome,
De saudade eu tenho a dor.
Saudade branca, Sinceridade.
Saudade cor de rosa, Amizade.
Saudade roxa, Melancolia.
Scabiosa, Abandono cruel.
Sempre viva, Hei de amar-te até morrer.
Sene, Duração.
Sensitiva, Pejo, sensibilidade.
Sepa, Bebedice.
Silva, Inveja.
Sisão, Segurança.
Sorveira, Prudência.
Suspiros, Até quando?
Tâmaras, Dá-me um beijo.
Tamarindos, Feliz momento.
Tangerina, Desdém.
Tangerina (folha de), Avia-te antes que venha alguém.
Teixo, Tristeza.
Til, amor conjugal.
Tojo, Solidão.
Tomates, Querer.
Tomilho, Atividade.
Trepadeiras, Pela janela.
Trevo, Andar subtil.
Trigo, Riqueza,
Trovisco, Gloria.
Tubaras, Surpresa.
Tulipa, Declaração d'amor.
Urze, Solidão.
Unha de cavalo, Far-vos-ão justiça.
Valeriana rubra, Facilidade.
Valverde, Declaro-vos guerra.
Verbena, Encanto.
Verônica, Fidelidade.
Videira, Alegria.
Viola branca, Ingenuidade.
Viola roxo-azulada, Modéstia.
Violetas, Quero ficar solteira.
Pura, modesta violeta sim,
Bela, gentil flor do prado,
Sempre estarei a teu lado,
Sempre estarás junto a mim.
Zimbro, Pecado.
Modo de marcar as horas por meio de plantas
1 hora — Rosas de cem folhas e buxo.
2 horas — Baunilha e buxo.
3 horas — Rosas brancas e buxo.
4 horas — Cravos encarnados e buxo.
5 horas — Resedá e buxo.
6 horas — Cravos rajados e buxo.
7 horas — Dálias e buxo.
8 horas — Flor de laranja e buxo:
9 horas — Rosas amarelas e buxo.
10 horas — Mal-me-queres e buxo.
11 horas — Violetas e buxo.
12 horas — Amores perfeitos e buxo.
N. B. — Sendo as horas à noite, o buxo deverá ser substituído por louro.
Emblema das cores
Amarelo, Desesperação.
Azul, Elevação d'espírito, pureza de sentimentos, circunspecção.
Azul e amarelo, Arrependimento.
Azul claro e branco, Beleza, agrado.
Azul claro, Firmeza, fidelidade.
Azul e encarnado, Majestade, amor constante.
Branca, Boa fé, candura, pureza, inocência.
Cor d'azeitona, afabilidade.
Cor de cana, Sinceridade.
Cor de laranja, Ciúme, amor ofendido.
Cor de pinhão, Indiferença, dissimulação.
Cor de pombo, Modéstia.
Cor de rosa, Juventude, amor, ternura.
Carmesim, Poder supremo.
Encarnado, Pejo, amor, desejos.
Preto, Tristeza, luto.
Roxo, paixão d'amor.
Verde, Esperança.
Verde e amarelo, Esperança perdida.
Verde monte, Simplicidade.
Vermelho e branco, Brandura, delicadeza.
Vermelho e amarelo, Fogo d'amor.
Vermelho e verde, Esperança segura.
Modo de marcar as horas por meio das cores
1 hora — Encarnado e branco.
2 horas — Verde e branco.
3 horas — Cor de laranja e branco.
4 horas — Azul claro e branco.
5 horas — Carmesim e branco.
6 Horas — Cor de castanha e branco.
7 horas — Amarelo e branco.
8 horas — Cor de rosa e branco.
9 horas — Roxo e branco.
10 horas — Cinzento e branco.
11 horas — Azul escuro e branco.
12 horas — Encarnado, verde e branco.
N. B. — Sendo as horas à noite, o branco será substituído por preto.
APÊNDICE
Sempre nos traz uma flor
Um suave pensamento,
Uma lembrança de amor,
Um saudoso sentimento.
Na que é rainha das flores,
Na linda engraçada rosa,
Vejo eu os meus amores,
A minha amada formosa.
São as flores a expressão
Do que sentimos no peito;
Falam sempre ao coração
Um idioma perfeito.
Quantas vezes uma flor
Mostra ao amante extremoso
Receios, ternura, amor
D'um coração amoroso.
Muitos segredos revela,
Encanta muito uma flor,
Nada ha que como Ela
Encerre tanto primor.
FINEZAS DAS FLORES
Escolhem-se vinte flores diversas; com essas vinte flores podem entrar
quarenta pessoas no mesmo jogo, devendo ser tantos cavalheiros como
senhoras; mas se porém, o numero de pessoas for menor ao que apontamos,
igualmente deve ser menor o numero das flores; pois, que tantas devem ser
elas, quantos forem os pares que entrarem no jogo.
Podem-se escolher as flores que mais fáceis estejam da aquisição; porém,
apontamos as seguintes:
1 Açucena.
2 Anêmona.
3 Amor perfeito.
4 Alfazema.
5 Botão de rosa.
6 Cravo Branco.
7 Cravo encarnado.
8 Campainhas.
9 Girassol.
10 Junquilho.
11 Jasmim.
12 Lírio roxo.
13 Lírio branco.
14 Martírio.
15 Malmequer.
16 Rainunculo.
17 Rosa branca.
18 Rosa encarnada
19 Saudade.
20 Tulipa.
Estas flores serão lançadas em uma boceta, e em outra boceta se lançará
igual numero de quadrados de papel, numerados de 1 até 20.
Preparados os jogadores, e sentados em roda, virá um menino com uma
boceta onde trará as flores escolhidas para o jogo, as quais começará a
distribuir pelas senhoras destinadas a fazer parte no jogo.
Logo, virá uma menina com a outra boceta onde trará quadrados de papel
numerados que distribuirá pelos cavalheiros.
Feita a distribuição, colocar-se-à sobre uma mesa duas urnas, onde se
lançarão em uma as flores, e em outra, os quadrados de papel, ficando em
memória dos cavalheiros, o numero que lhe foi dado; e em memória das
senhoras a flor que receberam.
Tampam-se as urnas e remexem-se, para que as flores se envolvam umas
entre as outras, bem como os quadrados de papel; em seguida destapam-se as
urnas e os mesmos dois inocentes começam a extração, tirando a menina, as
flores, e o menino, os quadros de papel; as flores são entregues aos
cavalheiros, e os quadrados de papel são entregues ás senhoras.
Na ocasião em que se tira uma flor, tira-se também um quadrado de papel
que se entregará à dama a quem pertencia à flor saída, e a flor entregar-se-à ao
cavalheiro a quem pertencia o quadrado de papel, tomando estes
imediatamente assento em duas cadeiras unidas, onde se devem conservar até
ao fim da extração, que será igual para todos.
Finda a extração, os cavalheiros procurarão ofertar uma fineza à senhora
a quem pertencia à flor que receberam, escrevendo-lhe essa fineza no quadro
de papel, ficando d'este modo mimoseados durante todo o tempo os
circunstantes de qualquer reunião; os cavalheiros com uma flor e as senhoras
com uma fineza.
Para não ser tão difícil aos cavalheiros ofertarem a fineza ás senhoras,
apresentamos as seguintes que, segundo a flor que cada um tenha em seu
poder, assim deverá procurar a fineza.
Quadro de finezas do jogo das flores
Açucena
O teu amor tão puro e firme seja,
Que eu de gozá-lo sirva aos mais de inveja.
Anêmona
Assim como é durável uma estrela,
Assim terei amor contigo, oh bela!
Amor perfeito
Propicia flor, do fado alto conceito,
É geral dentro d'alma amor perfeito.
Alfazema do norte
Gravarei em meu peito agudo ferro,
Se de amor tu não dás comigo um berro.
Botão de rosa
Seja um botão fechado e bem unido,
O amor que te dedico no sentido.
Cravo branco
O sol não alumie mais meus passos,
Se eu constante não for a dar-te abraços.
Cravo encarnado
Ditosa condição, ditosa fama,
Se tu chegas a ser a minha dama.
Campainha
Tocando andava sempre a campainha,
Para ver se encontrava essa carinha.
Girassol
Gira o sol entre as flores, dá-lhes vida;
Tu giras em minha alma em grande lida.
Junquilho
Posto que a qualquer dama eu seja terno,
Se a ti eu for falso, me trague o inferno.
Jasmim
Inda é mais que o jasmim teu níveo rosto,
Tu tens da perfeição o melhor gosto.
Lírio branco
Libarei com louvor ao deus vendado,
De repetir comigo o teu agrado.
Lírio roxo
Se o coração pudesse aqui mostra-te,
Melhor prenda não tinha que ofertar-te.
Martírio
Reparar para ti, ver teu aspecto,
É de amor abismar-se em terno afeto.
Malmequer
Malmequer, eu suponho, oh! céus ouvir-te...
Juro, porem, de não saber trair-te.
Rainunculo
Cantarei por tal dita, tais louvores,
Que as expressões serão somente amores.
Rosa branca
Tu és tão linda, tão formosa e bela,
Que do meu coração já tens tutela.
Rosa rubra
É lei obedecer-te, a sorte manda,
Cede a meus rogos, teu rigor abranda.
Saudade
Respirem nossos peitos amizade,
E não sintam jamais cruel saudade.
Tulipa
Em frenesi, em ódio eu sempre exista,
Quando tente ocultar-me à tua vista.
LOTERIA DAS FLORES
OU
NOVO DIVERTIMENTO PARA SENHORAS
N'este jogo deve entrar sempre numero par, não devendo exceder nunca o
numero de 10 pessoas.
Haverá um baralho de 40 cartas, e igualmente haverá 40 cartões, cada um
com seu dizer; sendo 20 cartões com os dizeres seguintes:
Martírios
TORMENTOS
Az de Espadas.
Cravos
RECREIOS
Às de Paus
Amor perfeito
ZÊLOS
Dois de Espadas
Racheis
SOFFRIMENTO
Dois de Paus
Angélicas
GLORIAS
Três de Espadas
Junquilhos
IMPACIENCIAS
Três de Paus
Perpetuas
DESESPERAÇÃO
Quatro de Espadas
Narcisos
DESFARCES
Quatro de Paus
Não me deixes
PAIXÕES
Cinco de Espadas
Melindres
VARIEDADES
Cinco de Paus
Giestas
LEMBRANÇAS
Seis de Espadas
Jasmins
PERIGOS
Seis de Paus
Goivos
PENSAMENTOS
Sete de Espadas
Violetas
FINEZAS
Sete de Paus
Lírios
VERDADE
Dama de Espadas
Açucenas
PUREZA
Dama de Paus
Jacintos
SABEDORIA
Valete de Espadas
Rosas
VINGANÇA
Valete de Paus
Malmequeres
DESASSOCEGO
Rei de Espadas
Chagas
PACIENCIA
Rei de Paus
Os outros vinte cartões devem ser pelo teor seguinte:
DESESPERAÇÃO
Perpetuas
Az de Copas
IMPACIÊNCIAS
Junquilhos
Az de Ouros
GLÓRIAS
Angélicas
Dois de Copas
SOFFRIMENTO
Racheis
Dois de Ouros
PENSAMENTOS
Goivos
Três de Copas
ZELOS
Amores perfeitos
Três de Ouros
VINGANÇA
Rosas
Quatro de Copas
PUREZA
Açucenas
Quatro de Ouros
DISFARCES
Narcisos
Cinco de Copas
RECEIOS
Cravos
Cinco de Ouros
PAIXÕES
Não-me-deixes
Seis de Copas
FINEZAS
Violetas
Seis de Ouros
DESASSOSSEGO
Malmequeres
Sete de Copas
VARIEDADES
Melindres
Sete de Ouros
LEMBRANÇAS
Giestas
Dama de Copas
SABEDORIA
Jacintos
Dama de Ouros
PACIÊNCIA
Chagas
Valete de Copas
PERIGOS
Jasmins
Valete de Ouros
VERDADES
Lírios
Rei de copas
TORMENTOS
Martírios
Rei de Ouros
MARCHA DO JOGO
A este jogo pode-se estabelecer o preço que cada um quiser, por cada
pinta que tiver cada carta.
Sorteiam-se com o baralho os parceiros, e aquele onde for o rei de ouros,
é quem deve distribuir as cartas, as quais, depois de baralhadas novamente,
serão distribuídas duas a duas, até se repartirem todas pelos parceiros, e por
quem as dá. Os bilhetes ou cartões, devem estar no meio da mesa baralhados e
com as letras para baixo.
Feito isto, o que for mão tirará um bilhete ou cartão, e pedirá a carta que
ele embaixo acusar; e quem a tiver a entregará, metendo logo no cofre tantos
tentos, ou dinheiro, quantas forem as pintas da carta que entregou, e aquele
que a receber, colocá-la-á ao pé de si, sem a misturar com as que tem na mão,
e do mesmo modo procederá com os cartões que tirar.
Tirado do monte o primeiro cartão ou bilhete, logo o parceiro imediato
deve tirar o segundo, fazendo o mesmo que fez o que foi mão; e o mesmo
farão os outros parceiros; correndo este giro até ficar alguém sem carta
alguma, e o primeiro que ficar sem Ela, fica sendo provedor ou provedora;
chamará para junto de si o cofre do fundo da loteria, continuando o mesmo
giro, até se extinguirem do monte todos os bilhetes ou cartões, e o mesmo
provedor continuará a tirar bilhete como os outros jogadores.
Advirta-se, porém, que as figuras não pagam nada, a quem tiver na mão a
carta que pede, igualmente nada paga; apenas coloca ao pé de si as cartas e
cartões que for tirando.
Extintos os bilhetes do monte, o provedor ou provedora, tirará para si dez
por cento de toda a loteria, e fará da metade do que ficar o prêmio grande,
dividindo a outra metade em dois prêmios iguais ou desigual.
Isto feito, arrumam-se, as cartas, porque já não são precisas para o jogo.
Agora cada parceiro pega nos cartões, que tiver junto de si, e para fazer
andar a roda, diz o provedor, lendo um dos seus bilhetes, por exemplo:
Saudades, lágrimas. Aquele que tiver outro cartão que diga Lágrimas,
saudades, entrega-o logo, continuando o provedor a pedir os cartões, enquanto
ele tiver algum que principie pelo nome de flor, recebendo dos outros os
cartões que tenham em cima a significação da flor que ele pede, e que pode
suceder tê-lo ele mesmo.
Logo que o provedor não tenha cartão algum, cuja primeira palavra seja o
nome da flor, segue-se o seu imediato a pedir pela forma que fica explicado; e
acabando este, seguem-se os mais, de forma que o primeiro que ficar sem
bilhete algum nas mãos, é quem recebe o premio grande: o segundo a quem
suceder o mesmo, recebe o segundo prêmio, e o terceiro que ficar também
sem bilhete, recebe o terceiro e último prêmio.
ORÁCULO DAS FLORES
Escolhem-se varias flores e a cada uma se lhe dá uma significação; v. g.
Rosa branca
Amor oculto.
Cravo
Amor fiel.
Liz
Amor virtuoso.
Mirto
Amor capaz de sacrifícios.
Jasmim
Amor sensível.
Violeta
Amor calado.
Madressilva
Amor inconstante.
Reseda
Amor interessado.
Balsamina
Amor ambicioso.
Manjericão
Amor vicioso.
Campainha
Amor meditado.
Amaranto
Amor puro.
Jacinto
Amor delirante.
Rainunculo
Amor leviano.
Flor de laranjeira
Amor faceiro.
Girassol
Amor indeciso.
Serpão
Amor audaz.
Junquilho
Amor cobarde.
Malmequer
Amor queixoso.
Perpetua
Amor alegre.
Papoula
Amor submisso.
Malva
Amor avaro.
Lírio
Amor orgulhoso.
Rosa encarnada
Amor fogoso
Alecrim
Amor ciumento
Logo virá uma pessoa estranha ao que se procede, e se lhe mandará
escolher uma flor de entre àquelas que estiverem apartadas, e a significação da
flor que for escolhida, é fiel revelação do oráculo das flores; podendo a pessoa
interessada ficar certa de que o seu prognostico foi verdadeiro, se acaso não
lhe falhar.
Do mesmo modo se pode adivinhar o estado do futuro esposo ou esposa,
imaginando-se v. g. debaixo de um
Alecrim
Rosa
Um artista
Um negociante
Uma modista.
Uma florista.
Jasmim
Cravo
Violetas
Joios
Jacinto
Balsamina
Perpetua
Malva
Madressilva
Um escrevente
Um bacharel
Um professor
Um musico
Um poeta
Um militar
Um fidalgo
Um medico
Um lavrador
Uma atriz.
Uma viúva rica.
Uma professora.
Uma cantora.
Uma literata.
Uma criada.
Dama nobre.
Uma parteira.
Uma camponesa
Manda-se escolher uma d'estas flores à pessoa que não esteja elucidada
do que se trata, e logo se saberá qual o estado do futuro consorte, da pessoa
que se interessa em sabê-lo, salvo se houver qualquer engano.
A LOTERIA DE AMOR
Tenha-se um saquinho no qual haja tantos bilhetes quantos forem os
jogadores, uns brancos e outros que digam: — «Vale um favor; ou diferentes
favores. Vale uma confidencia ou três varas de amor. Eu que subscrevo
confesso dever uma canção; uma, duas ou mais prendas. Vale para porteiro,
peregrino, mendigo, navegante. Vale um beijo em cada jogador, vale um
sacrifício, vale um elogio, vale uma dádiva aos jogadores, vale um recitativo,
vale aperto de mão, vale sete pinchos ao ar, vale um ditinho engraçado, vale
uma declaração amorosa, vale uma conquista, etc.»
Uma pessoa de sociedade, administrando o jogo, toma o saco em que
estão os bilhetes enrolados, mexe-os e apresenta-os à pessoa que estiver à sua
direita; esta mete a mão no saquinho, tira um bilhete, desenrola-o e declara em
voz alta o que lhe indica o papel que tirou. O dono da administração faz girar
o saquinho até ao ultimo jogador do circulo, e cada um é obrigado a fazer o
que lhe ditar o bilhete que tiver tirado, menos os que tiverem a sorte de tirá-lo
branco, os quais não farão nada.
Quando a loteria de amor for dupla ou tripla, isto é, quando haja uma ou
duas vezes, mais bilhetes que jogadores, tire-se uma ou duas vezes antes que
se ponha em execução os sacrifícios que cada qual tenha a fazer; pois acontece
que, para muitas pessoas, a segunda extração anula a primeira. Com efeito, um
bilhete em branco, tirado na segunda sorte, isenta o obedecer à primeira; e
assim este ultimo modo de verificar o jogo, torna-o divertidíssimo.
MORREU A MINHA POMBINHA
Pombinha, morrestes!
Oh! meu portador!
Que os ternos recados
Levavas a meu amor.
Do pombal que tanto amava
Uma pombinha eu tirei,
E logo em breve tempo
A pomba domestiquei.
Que carinhos lhe fazia!
E beijinhos que eu lhe dava
Quando seu tenro corpinho
Junto a mim repousava!
Querendo experimentar
Esta singela avesinha,
Lancei-lhe ao colosinho
Muito pequena cartinha.
Esperei que ao longe
Visse a companheira,
Que a conduzisse
Em esta carreira.
Já solto girava
O ente voador,
Eis que dirigir-se
Vejo vai ao amor.
Qual soldado que no posto
Observa com cuidado,
Assim eu observava
Se levava o meu recado.
De repente eis que assoma
E retorna mui ligeira
A cortar veloz os ares
Esta alada mensageira.
Que gozo, ah! eu não tive
Ao ver-lhe no pescocinho,
D'esta alada portadora
Pendente novo escriptinho!
Beijei-o, li-o e reli-o
Esses caracteres amados,
Que vieram dissipar
Os meus pungentes cuidados.
Porém não tardou a mudança
D'este meu contentamento.
Que passou em continente
Para o maior sofrimento.
O caso é: N'um telhado
À mira e de emboscada,
Um furioso bichano
Pilhou a pomba estimada.
Para seu amo a levou,
Sem falta; com evidencia.
Ele veio a conhecer
A minha correspondência.
Guardou da ação o segredo,
Posto não ser homem bom,
Pois que foi procurador
E hoje é escrivão.
Que a caçar passarolas
Ele tinha ensinado,
Linguinhas más anunciam
Que ao gato no seu telhado.
O caso seja qual for,
Remédio ele não tem.
A pombinha que levava
Minhas noticias tão bem.
Ó menina só terás
Em o meu peito morada,
Que, servindo-te d'abrigo,
Em ele estarás guardada.
Quando triste te não vejo,
Existência amargurada,
Passo eu; sem companhia
O meu coração é nada.
A florinha que me destes
Em meu peito deu entrada,
Nunca vi coisa mais linda,
Mais perfeita e delicada.
Adeus, amorzinho meu
De mim que és tão amada,
Não te esqueças de falar-me
Cedinho, de madrugada.
AVISO AOS LAVRADORES E JARDINEIRO
Janeiro
Concerta os instrumentos da lavoura, salga porcos e faze estacas para as
vinhas. Esterca as árvores que estiverem débeis, e enxerta as temporãs. Lavra
as terras leves, corta as madeiras para as latadas, cava a terra em redor dos
medronheiros, cobre as hastes das flores que não querem frio, e abriga das
chuvas fortes as anêmonas e plantas novas semeadas em caixões. Semeia
centeio, trigo e legumes. Enxerta árvores de espinho. Planta cebolo, e alface
para temporão. Mete estacas de roseiras, craveiros e alfazema.
Semeia mostarda em terras cálidas, centeio, cevada, favas, ervilhas,
alhos, meimendro, plantas medicinais, batatas, e grãos de bico; planta
hortaliças, romeiras; dispõe morangos; mete na terra estacas de árvores, que
rebentam cedo; mergulha vides; poda; limpa colmeias; prepara terras para
plantas de bacelo; limpa os pomares; lavra as terras para as sementeiras de
março; e corta madeira, canas e vimes.
Fevereiro
Se o permitir a temperatura, semeia pepinos, aipo, salsa, couves, e acelga,
e em tabuleiros quentes semeia rábanos e cenouras. Transplanta árvores, e se
não fizer muito frio, poda as que foram transplantadas no outono. Esterca os
prados, semeia aveia, lentilhas e cânhamo. Limpa o pombal e os cortiços, e
compra avelhas. Semeia couves de Saboia, couve vermelha, espinafres,
chicória. Em terra móvel e quente podes semear três semanas mais cedo do
que em terras frias e úmidas. Mais vale demorar as sementeiras até abril do
que semear debalde. — Enxerta as árvores de caroço e pevide. Transplanta
alecrim, buxo e alfazema, e semeia em abrigos, gerânios, e amarantos.
Semeia espinafres, bredos, repolho, pimpinela, couve murciana,
cominhos, morangos, rábanos, chicória, acelgas, alface alemã, caroços de
pêssegos, damascos, alperches, e ciprestes; planta bacelo, estacas de oliveira,
romeiras, e figueiras; transplanta laranjeiras, amoreiras, e cidreiras; poda
vinhas em terras úmidas, e mergulha vides.
Março
Se os frios passarem e a terra estiver seca, cuida da terra do teu jardim.
Semeia salsa e aipo, couves temporãs, rábanos, couve-flor para poder
transplantar no principio de maio. Planta ervilhas temporãs em regos feitos ao
cordel; semeia todas as qualidades de raízes e legumes em terra cheia; acelgas,
cenouras, azedas, nabos da primavera, rábanos e espinafres. Mas se cair neve é
preciso reservar estes trabalhos para o fim do mês. Limpa árvores e cava a
terra em redor d'elas antes que lancem flor. N'este mês deve acabar a poda das
árvores, exceto das macieiras que pode ser até ao fim de abril. O florista deve
semear cravos, amarantos, cobrir as tulipas para não apanharem o orvalho da
noite, e tornar a plantar no meio do mês as violetas de março, jacintos,
tuberosas e margaridas. Semeia papoulas, girassóis e goivos. Planta álamos,
semeia feijão carrapato, alface, painço, alpiste, trevo, luzerna, beterraba e
esparceto.
Semeia linho cânhamo, feijão carrapato, milho, abobora, pevides de
melão, melancia, pepinos, aipo, salsa, lentilhas, malaguetas, tomates, açafrão,
beldroegas, milho painço e alpiste; planta hortaliça, alamos, e outros arbustos;
transplanta vimes; enxerta árvores que rebentam tarde; escava as vinhas;
monda os trigos; e trasfega os vinhos em dia claro.
Abril
Semeia repolhos, alcachofras, cebolas de inverno, aboboras, feijão, grão
de bico, batatas, melão e feijão de trepar, pepinos e cabaças. Continua a
semear salsa, alface e toda a qualidade de hortaliças. Torna a plantar cenouras
e couve-flor para semente. Rega as árvores plantadas de novo. Sacha os
viveiros, descasca os sobreiros e carvalhos. Transplanta alecrim, alfazema,
cominho, morangos. Dispõe valverdes e manjericões. Tosquia ovelhas,
trasfega os vinhos e cresta colmeias. Rega de manhã depois de nascer o sol.
Semeia melões e melancias, até ao quarto crescente, pevides de cabaça,
pepinos, alface, milho, feijão, aipo, azedas, bredos, e alcaparras; planta
amoreiras, e árvores que não abrolham; enxerta de escudo; tosquia os gados
lanígeros; cresta colmeias, e vigia-lhe os bichos.
Maio
Lavra as terras de alqueive, castra os bezerros, tosquia ovelhas. No
principio do mês planta feijões de cor e couve-flor, nabos, alface, aipo,
ervilhas, favas, alcachofras, melancias e melões. Semeia chicória que há de ser
boa no fim de julho, se for bem regada durante todo o mês. Semeia milho e
feijão nas terras úmidas. Enxerta as árvores de espinho e tira as folhas secas
ou doentes. Livra as pereiras dos gomos inúteis. Planta tomateiros. Semeia
diversos grãos de plantas para teres flores no estio. Transplanta as tulipas
temporãs, mergulha os goivos amarelos, semeia cravos para os teres dobrados
nos 5, 6 e 7 da lua. Do meio d'este mês até setembro convém regar de tarde.
Sacha o viveiro das plantas que hás de transplantar. Cobre a terra de redor das
árvores novas com folhas secas para conservar umidade. Tosquia a murta e
buxo.
Semeia melões e melancias, que já não é cedo, salsa, coentro, pimpinela,
azedas, pevides de berinjela, feijão em terras úmidas, milho, e melões de
cheiro; planta hortaliças, segurelha, hortelã, tomateiros, malaguetas, ciprestes,
e sobreiros; monda os trigos; limpa as vinhas do pulgão; apanha os linhos
maduros; capa os pepinos; cava as vinhas, e semeia-lhe mostarda e milho;
enxerta as árvores de espinho, capa os melões e melancias, que é tempo;
tosquia as ovelhas, e atesta os vinhos.
Junho
Ata as vinhas a tira-lhes os gomos inúteis. Dá a segunda lavra ás terras de
alqueive, limpa os cortiços, sega os prados, estende o feno para secar. Semeia
milho nas terras regadias. Sacha a horta depois da chuva, se a houver, e antes
que tenham florido as ervas más. Ceifa a aveia e a cevada. Apanha as frutas
temporãs, põe estacas ao feijão de trepar, semeia brócolos e ata os tomateiros.
Continua a semear chicória para a teres no fim do verão. Recolhe os grãos de
cerefólio, favas, espinafres, rábanos, ervilhas e de outros legumes que
estiverem secos. Descobre as cebolas, limpa as árvores e plantas das lagartas,
remexe a terra de redor das árvores e cobre-a de folhas secas. Enxerta de
escudo os frutos de caroço, e os jasmins, laranjeiras e roseiras, escolhendo
para isto um tempo encoberto. Guarda as sementes das flores da primavera.
Semeia couves, borragens, beldroegas, espinafres, e favas de regadio; semeia
nas terras serôdias; enxerta de escudo as árvores de casca grossa; sacha os
milhos, e ceifa o feno; recolhe alhos, cebolas, favas, e todos os legumes, que
estiverem secos, as plantas medicinais, assim como também as frutas; enresta
os alhos para guardar; tira a cera dos cortiços; castra os carneiros, que é bom
signo: tosquia as ovelhas, e tem cuidado no terraço das eiras.
Julho
É o tempo de vender e comprar gado nas feiras e de limpar as granjas
para ceifar. Não poupes a rega. Lavra as terras de trigo, em quanto tiverem
alguma umidade. Arranca as ervas más dos canteiros, e banha o gado. Apanha
as cebolas, planta feijões para o outono, e couves para o fim do outono e
principio do inverno. Semeia alface, acelga e cebolo para o mesmo tempo, e
chicória para o inverno. Levanta as plantas bulbosas para as transplantar logo.
Castra carneiros.
Semeia espinafres, bredos, e mostarda; recolhe cevada, cebola de
regadio, amêndoas, avelãs, e sementes maduras de hortaliças; principia a
ceifa; amassa a rama ás cenouras, rega os pomares, e limpa-os das folhas
secas; arranca a grama; rega os pimentões, tomateiros, e melões que não são
de vargem; prepara e areja os ceifeiros para recolher as novidades; queima as
raízes nocivas, e recolhe os trigos que estiverem prontos.
Agosto
Carreia o esterco para as terras, arranca o linho, queima os espinhos e
ervas más das terras de ervagem, e bate o centeio para a sementeira. Logo que
colhas as novidades lavra as terras. Livra as uvas do sol e colhe as cenouras e
batatas. Prepara os buracos para as árvores que hás de plantar, e recolhe folhas
de árvores para o gado. Semeia rábanos para o outono, cerefólio para o
inverno, e espinafres que é preciso regar a miúdo. Planta chicórias a palmo e
meio umas das outras. Nos jardins planta as anêmonas singelas para teres
flores no outono e inverno. No fim do mês mete na terra os jacintos,
anêmonas, ranúnculos e junquilhos. Tira a cera dos cortiços.
Semeia tremoços, rábanos, cenouras, arruda, rosmaninho, cebola para
semente, nabo, nabiça em terras de regadio, cevada, e aveia; planta couve
tardia; apanha macela; recolhe o resto das searas; limpa a cevada para melhor
se conservar; recolhe amêndoas e avelãs; arranca as ervas nocivas; espreita as
colmeias; prepara vasilhas, e estruma as terras.
Setembro
N'este mês semeia centeio, lavra os alqueives, recolhe o milho e estruma
as terras. Semeia em terras quentes cevada e aveia, e recolhe feijão e legumes.
Cresta as colmeias. Compra porcos para cevar. Continua a semear espinafres,
salsa, cebola, chicória, cenouras, favas e nabos. Durante este mês deixa de
regar de tarde, começa a regar pela manhã. Colhe os frutos maduros, mas que
não estejam molhados. Enxerta árvores de caroço e planta as de espinho.
Semeia caroços de damascos e pêssegos, e linho cânhamo. Semeia ranúnculos,
lírios tulipas, papoulas e outras plantas anuais. Alporca craveiros e planta
raízes temporãs.
Semeia favas, nas primeiras águas, trigo nos altos, cevada e centeio em
terras quentes; semeia nabos, tremoços, dormideiras, linho cânhamo, orégãos,
arruda, e trevo; planta cidreiras, limoeiros, e árvores de espinho: enxerta as
ditas árvores; cresta colmeias; apanha nozes, amêndoas e avelãs; recolhe
mostarda, milho, legumes, e faz passas de uvas; vindima a tempo, e depois
lavra as terras.
Outubro
Semeia tremoços, ervilhas trepadeiras, favas, cevada, nabos, cenouras,
espinafres para maio, e o ultimo cerefolio para nascer antes das geadas fortes.
No fim do mês semeia alface para janeiro. Vindima em tempo bom. A uva
doente deve ser lavada n'uma tina, e depois limpa-se cacho a cacho com uma
brocha macia, e estende-se por algum tempo antes de se lançar no lagar.
Transplanta as árvores novas, depois de caídas as folhas, para covas feitas
algumas semanas antes. Planta amendoeiras e aveleiras e enxerta árvores de
espinho. No meio do mês planta as cebolas de tulipas e outras, e ajunta para
estrume as folhas que vão caindo das árvores.
Semeia trigo, cevada, nabos, rábanos, rabanetes, cenouras, tremoços,
chicharros, grãos de bico, favas, salsa, coentro, aipo, pimpinela, ervilhas
genovesas, e cebolo; planta nogueiras, aveleiras, amendoeiras e cidreiras;
recolhe mel e cera; apanha castanhas; abre covas para meter árvores de
sombra, e lavra o resto das terras. N'este mês são muito bons os taralhões e os
labercos.
Novembro
Cuida nas provisões para forragens do gado. Planta e mergulha vides,
corta salgueiros e poda as árvores. Apanha a azeitona à mão, e poda e limpa as
oliveiras. Prepara e carreia o esterco seco para o espalhar prontamente sobre
os legumes que precisarem d'ele. Planta serpentina menor, azedas e espargo.
Planta roseiras, lilases e outros arbustos que o frio não prejudica. Corta vimes.
Planta amoreiras, castanheiros, loureiros, carvalhos e ciprestes. Mete
castanhas era área para se conservarem verdes.
Semeia erva doce, ervilha anã, acelgas, espinafres, couves, alfaces,
repolhos, brócolos, e favas; planta carvalhos, castanheiros, oliveiras, couve,
alface, chicória, repolho, hortelã, e segurelha; corta no minguante as madeiras
que estiverem sazonadas, canas, vimes, e salgueiros; e prepara a salgadeira
para a sardinha.
Dezembro
Estruma as terras e aduba-as com marga. Sacha as hortas em tempo seco.
Semeia favas e trigo, rega as laranjeiras antes de nascer o sol, e semeia
pinheiros. Planta choupos, azinheiros, castanheiros e carvalhos, e abre as
covas para plantar árvores na primavera. Mata e salga os porcos.
Semeia pinheiros, castanheiros, azinheiros, caroços de pêssegos,
alcachofras, espinafres, bredos, aipo, pimpinela, semente de couve, alface,
rábanos, rabanetes, nabos e grãos; planta choupos, sobreiros, e sabugueiros,
antes que rebentem; enxerta de espinho as árvores do cedo; dá descanso ás
terras, e prepara a salgadeira para o toucinho.
FIM DA QUARTA PARTE
PARTE QUINTA
O ORÁCULO DAS SINAS
OU
Verdadeira arte de adivinhar o futuro, por meio da interpretação da sina
de qualquer pessoa, explicado de um modo claro e fácil, ao alcance de
todas as inteligências.
ARTE
DE CADA PESSOA CONHECER A SUA SINA
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Aquário, que começa a 22 de
Janeiro, e acaba a 21 de fevereiro.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo será de mediana estatura,
cortes, secreto e venturoso. Denota que receberá algum golpe de ferro e perigo
de água, denota mais que será rico e próspero, e deve-se guardar muito de
tomar paixão, por que lhe começará em demasia. Terá a sua vida em grande
risco e se escapar, promete conforme a sua natureza 68 anos de vida.
SINA DA MULHER
Se for mulher será muito amiga do seu parecer, e corre grande perigo em
perder tudo quanto com a sua industria tiver alcançado. Também mostra ter
perigo de água, e que da mediana idade em diante passará melhor, ainda que
antes de 38 anos terá algumas enfermidades, e conforme o seu temperamento
poderá chegar aos 82 anos de idade.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Peixes, que começa a 22 de fevereiro, e
acaba a 21 de março.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo, será amigo de ver terras,
deleitar-se-á de andar por mar: e será mui comilão, o que será causa de ele ser
enfermo. Será homem de poucas palavras e inclinado a largar a sua pátria.
Terá uma grande enfermidade aos 15 anos, outra aos 30, e outra aos 38: d'esta
se escapar, conforme a sua natureza poderá viver 67 anos.
SINA DA MULHER
Se for mulher padecerá achaques nos olhos, será muito honesta e piedosa.
Deve-se guardar do fogo, por que lhe denota grandes danos. Terá uma
enfermidade aos 12 anos, outra aos 20, outra os 21, e outra aos 30, conforme a
sua natureza poderá viver até 79 anos.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Áries, que começa a 22 de março, e
acaba a 21 de abril.
SINA DO HOMEM
O homem, que nascer debaixo da subida d'este signo, será engenhoso,
prudente, e de nobre animo, ainda que muito falador: com facilidade se
apaixonará, porém com brevidade lhe passará. Andará falando só consigo; não
será muito rico, nem muito pobre, e guardará fidelidade aos seus amigos. Terá
heranças. Denota-lhe um sinal notável no corpo, e dano por algum animal
quadrúpede, e golpe de ferro: e padecerá alguns infortúnios e trabalhos. Terá
uma grande enfermidade antes dos 22 anos, da qual se escapar, viverá
conforme a sua natureza 75 anos. Denota mais, que casará até 22 anos.
SINA DA MULHER
Se for mulher será iracunda, e mui esperta em suas ações, de bom parecer e
desenvolta. Casará e ficará viúva. Virá a grande pobreza, porém depois
recuperará o perdido, e terá uma perigosa enfermidade na cabeça ou nos
joelhos desde os 7 anos até aos 12, e conforme a sua natureza poderá viver 96
anos.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Touro, que começa a 22 de abril, e
acaba a 21 de maio.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo, será atrevido, presumido,
e altivo de coração: inclinado a deixar a sua pátria, e ir para terras estranhas,
aonde terá mais fortuna. Se casar virá a ter cargo, e cabedal pela mulher.
Denota que há de ser mordido de algum cão; e se for tratante, será venturoso
no trato de comprar e vender. Mostra que lhe sucederá perigo de água mais de
uma vez, se se não souber acautelar; e terá infortúnio, por causa de mulheres,
e uma enfermidade aos 11 anos, outra aos 30, e outra aos 40, da qual se se
livrar, viverá conforme a sua natureza 64 anos.
SINA DA MULHER
Se for mulher será solicita, cuidadosa, determinada, e será inclinada à ir ver
terras estranhas. Será fecunda, e casará mais de uma vez e terá muitos filhos.
Denota que cairá, de alto, e terá uma enfermidade aos 16 anos, outra aos 30, e
outra aos 33. Conforme a sua natureza poderá viver 66 anos.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Gêmeos, que começa a 22 de maio, e
acaba a 21 de junho.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo, será de boas entranhas, e
liberal. Denota que a sua natureza o inclinará a não viver em sua pátria, e
andará muitos caminhos. Será pessoa de muito credito; e virá a ter muitas
fazendas. Será homem diligente em suas coisas, e se verá em perigo de água.
Guarde-se do cão danado, que lhe prognostica ser ferido d'eles, padecerá 4
enfermidades até aos 30 anos, e depois viverá são, e lhe promete, conforme a
sua natureza, 68 anos de vida.
SINA DA MULHER
Se for mulher será de grande constância, estimada, e tida em muita conta, e
encimada ao Santo Matrimonio. Receberá grande pesar de coisas mal feitas,
padecerá algumas enfermidades; e conforme a sua natureza viverá 62 anos.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Câncer, que começa a 22 de junho, e
acaba a 31 de julho.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo, será de boa estatura,
secreto, humilde, e alegre. Padecerá alguns trabalhos por demandas, defenderá
causas alheias, será inclinado a requerentes, e será grande gastador. Terá
perigo de água, fogo e ferro, será arrogante, e de muita reputação. Terá
algumas enfermidades, porém pequenas e lhe promete 73 anos de idade.
SINA DA MULHER
Sendo mulher será diligente, cuidadosa, pronta ao pesar, e com brevidade lhe
passará, e será mui agradecida. Padecerá algumas inquietações por causa de
filhos, e corre perigo de cair de alto, e achará algumas coisas escondidas,
ainda que de pouco preço. Viverá sã, e conforme a sua natureza viverá 70
anos.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Leão, que começa a 22 de julho, e
acaba a 21 de agosto.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo será bem disposto, de boa
presença, altivo e de grande animo. Será atrevido, arrogante, eloquente, e será
muito sábio se se aplicar ás letras. Alcançará algumas dignidades, ou cargo, e
verá muitas terras. Se casar terá com que passar, por ter heranças por parte de
sua mulher. Denota que terá um perigoso golpe de ferro, e padecerá alguns
perigos no mar, e será venturoso nos negócios, e achará dinheiro escondido.
Terá 6 enfermidades por todo o curso da sua vida, e aos 40 anos uma mui
perigosa, da qual se se livrar lhe promete este signo 71 anos de vida.
SINA DA MULHER
Se for mulher será formosa, e forte. Será molestada de dores de estomago, e
mui amante da honra, e virá a possuir muita fazenda. Será piedosa, e caritativa
para com os pobres, e está em perigo de padecer fluxo de sangue. Denota
algumas enfermidades pelo demasiado sangue que sempre terá, e que viverá
conforme a sua natureza 71 anos.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Virgo, que começa a 22 de agosto, e
acaba, a 21 de setembro.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo, será honrado, casto, e de
nobre condição. Solicito, e cuidadoso em suas coisas, e virá a ter alguns
cargos, e governo. Será homem vergonhoso, e variável e possuirá riquezas;
mas virá a cair em grande pobreza, por se não saber governar. Terá algumas
enfermidades até 30 anos, e conforme a sua natureza lhe promete o signo 84
anos de vida.
SINA DA MULHER
Se for mulher será vergonhosa, diligente, e mui devota. Denota que cairá de
alto, e que viverá algum tempo enferma. Terá grande alegria de viver com
limpeza, e castidade, suposto padecerá trabalhos. Desde os 30 anos até aos 36
terá uma grande enfermidade, e poderá esperar 77 anos de vida.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Libra, que começa a 22 de setembro, e
acaba a 21 de outubro.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo, será honrado, venturoso
no que empreender, e cuidadoso em servir aos seus amigos. Será inclinado a ir
a terras estranhas, aonde lhe irá melhor que na sua pátria, e será homem de
bom entendimento. Terá com que passar a vida, suposto padecerá alguns
infortúnios, e trabalhos. Terá uma enfermidade aos 6 anos, outra aos 8 e outra
aos 35, da qual se escapar poderá viver até 77 anos.
SINA DA MULHER
Se for mulher será alegre e mui afável, e terá alguma queimadura nos pés.
Será inclinada a peregrinar e andar pelo mundo. Padecerá algumas
enfermidades e poderá viver 66 anos.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Escorpião, que começa A 22 de
outubro, e acaba a 21 de novembro.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo, será de maus costumes,
enganador, e teimoso, e pouco liso nos seus negócios, e inclinado a furtar! será
grave, e amigável, e de boas entranhas, porem falsas. Se se aplicar à
Astrologia será sábio. Padecerá dores no estomago, e terá perigo de golpe de
pedra, e de ferro, e inclinado a andar por diversas terras; e será tão subtil e
astuto em seus ditos e efeitos, que ninguém o entenderá. Não será muito rico,
nem demasiadamente pobre. Ainda que pequenas, terá algumas enfermidades,
e conforme a sua natureza poderá viver 71 anos.
SINA DA MULHER
Se for mulher será forte e terrível, e terá feridas pelas quais estará em grande
perigo de vida, e viverá enferma e lhe promete o seu signo 72 anos de vida.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Sagitário, que começa a 22 de
novembro, e acaba a 21 de dezembro.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo, será vergonhoso, afável,
honesto, inconstante e venturoso. Será inclinado a navegar, por onde adquirirá
fazenda, e padecerá dano por animal quadrúpede, e terá algumas
enfermidades, a primeira aos 7 anos, outra aos 18, e outra aos 28, e viverá 67
anos.
SINA DA MULHER
Se for mulher será imaginativa, temerosa e vergonhosa: alcançará riquezas, e
será de grande governo. Será inconstante, mudável, ainda que misericordiosa,
e de boa constância. Terá uma enfermidade aos 4 anos, outra aos 23, e outra
aos 30. Promete-lhe conforme a sua natureza 107 anos.
Dos efeitos, e prognóstico do signo de Capricórnio, que começa a 22 de
dezembro e acaba a 21 de janeiro.
SINA DO HOMEM
O homem que nascer debaixo da subida d'este signo, será iracundo, vão e
mentiroso: Andará muitas vezes falando só consigo, e será algum tanto
melancólico, animoso, inclinado à guerra. Folgará com bens alheios, e será
inclinado a guardar gado, e padecerá alguns trabalhos por causa de mulheres,
viverá enfermo, e conforme a sua natureza poderá viver 97 anos.
SINA DA MULHER
Se for mulher terá condição perversa, correrá perigo de se perder, se se lhe não
atalharem as suas leviandades. Denota que será mordida de animal
quadrúpede, e corre perigo de cair de alto. Padecerá algumas enfermidades,
ainda que pequenas, a qual conforme a sua natureza, poderá viver 69 anos.
ANIMAIS AGOUREIROS
ERROS ACERCA DE ALGUNS ANIMAIS
Amigo:
Fiquei, na minha carta passada, de te falar dos erros inveterados no povo,
a respeito d'alguns animais; e que só podem trazer males, como erros que são.
Sabido é de ti, por certo, que a superstição chega a crer que a entrada
d'uma borboleta branca pela porta ou pela janela dentro, é sinal de ter o dono
ou dona da casa de receber uma boa nova; mas se a borboleta é parda ou
escura, maldita seja ela que anuncia desgraça.
Se uma aranha, vermelha e pequena, passeia pelo vestido de qualquer
pessoa, é certo que tem essa pessoa de receber dinheiro; em prata se é branca,
em ouro se é amarela, e em cobre se é negra. Quando a mosca vareja entra em
casa, traz visita inesperada; e que fortuna não é para a casa onde canta o grilo
branco!
Isto, que parece somente ridículo, é mais do que isso; porque tanto se
alegra quem tem bom agouro, como se entristece e apoquenta quem teve a
infelicidade de o receber mão.
A coruja das torres, que toda a gente conhece pelo nome, mas que ainda
muita outra a não conhece por a ter visto, inspira horror, susto, desprezo, raiva
e ódio, pelas crenças de mão agouro, ás mulheres, que isto mesmo transmitem
ás crianças, e ainda aos homens, fracos pela ignorância, que veem almas do
outro mundo, consultam os agouros, as feiticeiras e os adivinhos!
A coruja das torres é a mais bela das três espécies que temos, pela sua
leveza, pelo bem pintado de amarelo e cinzento sobre o mais belo branco
d'algodão, e pelo delicado folho de penas encrespadas que lhe circunda a
cabeça; mas como ave noturna, para que os raios do sol lhe não ferirão os
olhos, de dia se esconde; e procura para isso as torres e os campanários das
igrejas, os telhados e ainda algumas paredes velhas, aonde encontre buracos,
para passar o dia; d'onde sai pelo crepúsculo, quando a luz a não incomoda já.
Supõe o povo que ela mora nas torres e telhados das igrejas, para roubar
e beber o azeite das lâmpadas, ao passo que ela procura aqueles lugares, onde
os ratos, sempre daninhos, vivendo à vontade e multiplicando-se, lhe possam
servir de sustento.
Se, pousando sobre o telhado de uma casa, deixa ouvir o seu grito
rouquenho ou o sopro seguido, que se assemelha ao resonar d'uma pessoa com
a boca aberta, entende o povo que ela chama alguém à sepultura; e com a ideia
da noite e vizinhanças dos cemitérios, olha a coruja como ave fúnebre e
mensageira da morte; declarando-lhe a guerra mais atroz, sem compaixão nem
indulgencia, em lugar da benevolência e gratidão, que devia prestar-lhe,
poupando-lhe sempre a vida, pelos bons serviços que esta ave presta à
agricultura. De todas as aves noturnas, nenhuma lhe é mais proveitosa, por ser
um criado e guarda fiel, que em quanto dorme o senhor, espreita e dá caça a
muitos roedores nocivos, como o rato domestico ou rato comum, o rato
campestre, etc., os quais roubam de noite, roendo os frutos, os grãos e as
sementes.
Um outro animal, cuja perseguição é de morte, e a quem atribuem
crassos erros, é a cobra, conhecida nas aldeias pelo nome geral de bicha.
Talvez concorra também para esta aversão, que o povo lhe tem, a magnífica
pintura que no Gênesis faz Moisés, corporizando o pecado ou antes, a tentação
na figura d'uma serpente, a que dá o nome de demônio. A cobra é destituída de
pálpebras; conservando os olhos abertos, a sua vista, por isso, é fixa, e parece
olhar em todas as direções! Não ha fugir de vista semelhante! Para qualquer
lado que se caminhe, a vista da serpente está fixa em nós!
Assim é a tentação! Só lhe pode escapar quem, apoiado na virtude,
resoluto lhe volta as costas. Escorregadia, como a serpente e como ela capaz
de enroscar-se, só se pode evitar, não a deixando enlear, para não tomar posse,
porque depois de apertar, cada vez nos cinge mais. Se a serpente levanta, por
algum tempo, a cabeça, é para a abaixar logo; e só caminha de rastos, sempre,
vista com repugnância, como a tentação e o crime, que será sempre rasteiro,
vil e abjeto; e que para se não apresentar horripilante, ou há de viver
enroscado sobre si mesmo, como a serpente, ou, como ela, escondido por entre
o mato.
O que é certo é que o olhar d'estes reptis, com a posição da cabeça,
cingindo-se ao chão ou elevando-se e estendendo-se, o que faz parecer que
uma cobra caminha, sem contudo sair do mesmo lugar, assusta de tal modo os
pequenos e tímidos animais, que procurando fugir-lhe, para qualquer lado que
se dirigem, encontrão sempre os olhos do seu pequeno inimigo, o qual parece
persegui-los; até que cansados, trêmulos e atordoados pelo medo, aproximamse, mão grado seu, do inimigo que os espera e que lhes dá a morte! Isto tem
feito atribuir ás serpentes a faculdade de magnetizar com a vista. Nós mesmos
sentimos muitas vezes uma impressão, que quase nos incomoda, com o olhar
de certas pessoas que têm os olhos grandes, saídos, e a vista um pouco fixa; e
como fascinados também, tentamos desviar delas os nossos olhos; mas, apesar
da impressão um tanto desagradável, lá se vão sempre encontrar com os
outros.
Porém, o erro, mais comum acerca das cobras, é o de elas procurarem as
mulheres, as vacas e as cabras para mamarem! Que inteligência lhe concede o
vulgo, quando afiança que a cobra para enganar a criança, enquanto mama na
mãe que dorme, mete a ponta da cauda na boca do filho, para ele chupar,
supondo assim ser o bico do peito pela forma cilindro-cônica! Como afiança
ter encontrado nos currais cobras debaixo das vacas, sugando-lhes o leite!
A cobra, se mamasse, pertenceria aos mamíferos; daria à luz os filhos
vivos, e não poria ovos; teria tetas próprias para alimentação dos filhos, e a
sua organização seria muito diferente. Mas ainda mesmo, apesar de tudo isto,
se a cobra, por uma espécie de lambarice, tentasse mamar, enganando a mãe e
o filho com a sua inteligência, não o poderia fazer em razão da disposição
anatômica da sua língua e falta de beiços, para poder fazer preza no mamilão e
chupar. É verdade que se encontrão algumas vezes nos aidos; mas aí vão elas
buscar mais elevada temperatura, que o calor do gado fornece àqueles lugares.
Não sei como algumas historias, ás quais não acho fundamento algum,
não foram desmentidas logo no seu principio; e puderam correr de boca em
boca, de lugar para lugar, enchendo o país inteiro, e passando até de nação
para nação.
Tal é o que contam do ouriço cacheiro. Diz o povo que este pequeno
animal se sustenta de frutos, e que para os colher sobe acima das árvores
fruteiras, chega aos ramos carregados, abana com eles, deita a fruta ao chão,
desce depois e vem rolar-se sobre ela, até ficar coberto, espetando-a nos
espinhos que lhe revestem o corpo; e que assim carregado, caminha para o seu
buraco, chiando de contente e fazendo tal bulha, como um carro das aldeias,
bem carregado, ao qual de propósito fazem chiar o eixo, dizendo que os bois
se entusiasmam com aquela infernal chieira.
Ora o ouriço cacheiro não faz cova na terra para habitar, mas dorme
debaixo de ervas que ajunta, ou debaixo de raízes junto dos pés das árvores,
ou serve-se d'algum buraco já feito ao pé dos muros ou debaixo de algum
montão de pedras.
Come frutos, é verdade, e mesmo algumas raízes, quando não tem para
comer os insetos, que são o seu verdadeiro sustento; assim como a carne dos
animais que encontra mortos: e uma coisa que tem sido notada por alguns
naturalistas, e poder ele comer com grande vontade, sem experimentar
incômodo algum, as cantáridas aos centos, quando nos outros animais são
veneno tão forte, que basta uma para causar tormentos horríveis num cão ou
num gato, e três ou quatro serão suficientes para darem a morte ao homem.
Quer o povo que este animal suba, e vá abanar a fruta das árvores. Mas,
como há de ele trepar, se não pode?
Nem tem a flexibilidade e agilidade para isso, nem os membros
conformados de tal modo, que o possa fazer, nem unhas para se poder segurar.
É tão fraco trepador, que, para subir a uma pequena pedra, emprega todos
os esforços, firmando a cabeça, sem ás vezes o poder conseguir.
Lembra-me dizer aqui, que os espinhos da pele d'este animal são
proveitosos para as preparações de historia natural, que têm de estar em
álcool; servindo em lugar de alfinetes, por se não estragarem, oxidando-se,
nem estragarem as preparações; assim como também podem servir, pela
mesma razão, para segurarem os insetos nos quadros.
Porém, nada mais grosseiro e vergonhoso do que a metamorfose do
cabelo em cobra! Um cabelo deitado em água transforma-se numa cobra
muito fina: diz o pensar mais rude!
Este absurdo é de tal grandeza, que não gastarei palavras para o mostrar;
mas direi somente que a pretendida cobra é uma espécie de filaria; animal
filiforme, comum nos regatos e nas águas pouco correntes, chegando a um
metro e ás vezes a três e quatro de comprido, negro ou acastanhado; e como se
tem encontrado algumas vezes nas águas, aonde o gado costuma ir beber, e
deixa muitas vezes os cabelos, coçando-se, o povo ao ver estes helmintos
juntos com os cabelos, decidiu logo a metamorfose d'estes nos animais, aos
quais por serem finos e compridos, lhes chamaram cobras!
Estes animais costumam dar voltas sobre si, metendo as extremidades por
entre elas, como as pontas d'um nó, e quando morrem, parece terem dado um
nó perfeito.
Também terás ouvido dizer que as andorinhas vão à beira do mar
procurar e escolher uma pedrinha, conhecida pela pedra das andorinhas; e vem
com ela no bico para abrir no ninho os olhos aos filhos, que sem esta operação
os não abrem! E como é procurada a tal pedrinha e estimada por algumas
pessoas, para, pela sua virtude, tirarem os argueiros dos olhos! E de certo
precisão bem d'ela, pois devem andar com eles bem cobertos de poeira! A tal
pedrinha é um seixo chato e bem polido pelo mar, ou mesmo um bocado de
uma concha preta, que o mar tenha tornado bem lisa e macia! Que graça! as
andorinhas feitas operadoras da catarata dos próprios filhos!
Muito mais teria que dize-te sobre estes grosseiros prejuízos, como da
amizade que as cobras têm aos homens; da simpatia que os sardões têm para
com as mulheres; e d'outras muitas baboseiras e erros prejudiciais, mas hoje
ficarei por aqui.
Adeus até outra ocasião.
Teu amigo - A. Luso.
(Augusto Luso)
CONTINUAÇÃO DOS ERROS ACERCA DE ALGUNS ANIMAIS
Os erros acerca dos animais são tão variados, tão extravagantes e tantos,
que ainda hoje te falarei de mais alguns; e quantos haverá de que não tenho
conhecimento?
Hoje é bem conhecida a utilidade dos sapos na agricultura, pelo devaste
que fazem nos insetos, nas lagartas, nos caracóis, etc., chegando a ser
procurados para as estufas, como remédio contra aqueles animais, que
devoram e estragam as plantas. Porém é tal a aversão que o povo lhes tem,
talvez pela sua forma e vista, pouco agradável, como em geral é a de quase
todos os reptis, que chega mesmo a dizer que se deve cuspir três vezes fora,
todas as vezes que se falar em sapo, para que não nação sapinhos na boca! É
tal o ódio que lhes tem, atribuindo-lhes o perigo de veneno ou peçonha, como
vulgarmente dizem, que se não satisfazem só com os matar, mas somente em
lhes dar uma morte cruel, espetando-os e atormentando-os, deixando-os
morrer lentamente; quando estes inocentes animais, além do bem que nos
fazem, como já disse, não podem fazer mal a ninguém, pois não têm armas de
que se possam servir para isso; apenas, em sendo muito apoquentados e
atormentados, expelem pelo anus um liquido um tanto acre, mas que nem ele,
nem a baba, como dizem, são venenosos. Reproduzem-se com tanta facilidade
e em tanta abundancia, e desenvolvem-se tanto com o calor e umidade, que, ás
vezes, com as primeiras chuvas de maio, são tantos, que por isso e pelos saltos
e pulos que dão, coincidindo com a queda das gotas da chuva, em muitas
partes dizem que chovem sapos!
A respeito do pretendido veneno ou peçonha, deves saber que são poucos
os animais, excetuando os mamíferos, as aves e os peixes, aos quais o nosso
povo não atribua veneno, a ponto de julgar passagem de bicho que deixara
rasto venenoso ou peçonhento, a quaisquer feridas que aparecem no corpo das
crianças, persuadindo-se que matando o bicho, desaparece a peçonha e logo o
mal. Mas, como não sabem qual fora o gênero, nem a espécie do bicho que
por ali passara, aplicam logo um remédio geral para toda a sorte de bicho,
dizendo:
Eu te talho, bicho, bichão;
Sapo, sapão;
Aranha, aranhão;
Bicho de toda a nação:
Em louvor de S. Silvestre,
Quanto faço tudo preste,
E de nosso Senhor,
Que é o verdadeiro Mestre.
E fazendo passar ao mesmo tempo, em cruz, uma faca por cima das
feridas, talhão e retalhão d'esta sorte qualquer bicho que por ali passasse!
Nada mais difícil do que a medicina, nada mais dificultoso do que ser
medico, nada mais melindroso do que receitar, nada mais delicado do que ser
boticário; e todos sabem curar, todos são médicos, todos receitam e todos são
boticários, porque todos fazem remédios!
E quanto mais extravagante, misterioso e miraculoso e sobrenatural
parecer o remédio, mais importância e mais fé lhe dá o povo, pela tendência
que tem para admirar e acreditar sempre aquilo que menos entende. É de
grande fé também, que um frango preto é proveitoso para servir de remédio
contra as lombrigas que atacam frequentemente as crianças. Por meio d'um
pequeno golpe dado superficialmente no pescoço do frango, extraem-lhe um
pouco de sangue, com o qual dão uma fricção forte nas costas da criança
doente, até que apareçam algumas borbulhasinhas! A mais grosseira
ignorância quer ver n'estas borbulhas as cabeças das lombrigas que acudirão
ali ao cheiro do sangue; e com uma navalha de barba, bem afiada, corta então
as bolhasitas, dizendo que talhará assim as bichas, de uma vez para sempre; e
que este é o único remédio infalível!
Já que falamos em frango, vem a propósito aqui o preconceito mais
grosseiro, que revela a maior ignorância e a mais crassa pequice!
Diz o povo que o galo aos sete anos põe um ovo, do qual nasce uma
cobra! E isto mesmo tenho eu ouvido dizer a algumas pessoas que se querem
apartar do povo pelo seu vestuário e pelos seus costumes, e ficam a par da
mais grosseira plebe, pelo seu modo de pensar e pelas suas crenças!
Acontece que uma galinha nova, ainda franga, pouco robusta, põe ás
vezes um ovo pequeno, sem gema, constando só da clara e casca, que quase
sempre é áspera e rugosa; outras vezes uma galinha já casada, e cansada por
uma longa postura, põe um ovo semelhante, como fazendo um ultimo esforço;
e achados estes ovos nas capoeiras ou poleiros, como são diferentes dos
outros, por serem mais pequenos e pela falta de gema, são do galo e não das
galinhas! Porém o erro sobe de ponto ao dizerem que d'aquele ovo sairia uma
serpente! Um galo feito mãe! e feito mãe de serpente!!
Em que ovário se desenvolveria aquele ovo? em que oviduto tomaria a
clara ou albúmen? Aonde formaria ele a casca ou essa crusta calcária?
Certamente nas tripas!
A gema ou vitelos, para que a esfera germinativa, que é o ponto branco
que se vê no meio, fique sempre voltada para cima, em qualquer posição que o
ovo tome, para receber o calor imediato da galinha no choco, é ligada de cada
lado ás duas extremidades do ovo por uma espécie de cordão torcido da
mesma matéria da clara, a que se dá o nome de chalases. Ora, estes pequenos
ovos abortados, apesar de não conterem a gema, contem a clara e conservam
os chalases; e são eles a terrível serpente que mais tarde tinha de se
desenvolver! Haverá coisa mais grosseira? Ignorância maior?!
O lobo, animal bem comum entre nós, é tido por muitas pessoas, como
tendo a boca de um lado escachada até o ouvido; e que agarrando nos
cordeiros os lança ás costas, fugindo com eles.
O lobo tem a boca regular d'ambos os lados, não põe os cordeiros ás
costas, mas muitas vezes, vendo-se perseguido, não querendo deixar a preza,
segura-a pelo lado do pescoço e foge com ela, correndo ambos, como uma
parelha de cavalos.
Quando isto se dá com os nossos animais, a respeito dos quais o exagero,
passando de boca em boca, tem dado causa também a muitos erros, o que será
a respeito dos animais estranhos, cujas descrições são feitas por viajantes,
quase sempre propensos à mentira, a aumentarem e a exagerarem as coisas!
Muitas vezes os próprios naturais de um país, pela mesma razão,
informando mal os curiosos, os fizeram acreditar em falsas narrações e contos
extravagantes.
Hoje, porém, graças ao desenvolvimento do estudo da Historia natural, à
sua reconhecida utilidade, à proteção dada aos museus e aos jardins
d'aclimatação, estes erros têm-se emendado, e vão-se conhecendo as coisas à
luz da verdade. Só entre nós, aqui no Porto, parece desnecessário um museu;
pelo menos não vejo ligar-lhe a mais pequena importância! E para que!
Aqui já todos são sábios.
Que importa o estudo dos bichos e das ervas?
Dá ele dinheiro? Não dá? Pouco importa dizer tolices; não é coisa de
utilidade publica.
As ridículas historias de alguns macacos, como os gorilos, os chimpanzés
e os orangos, raptarem as raparigas e fugirem com elas para os bosques, que
tão acreditadas foram, e faziam que as mulheres tivessem tanto medo dos
macacos, são hoje desmentidas.
A hiena foi tida como um monstro; fizeram-n'a até hermafrodita! Deramlhe os instintos mais sanguinários e a maior ferocidade; disseram que ia aos
cemitérios desenterrar os cadáveres, para neles cevar a sua ferocidade! A
hiena é um animal pouco sanguinário, preferindo a carne morta e de dias, à
carne viva e com sangue; cobarde, poucas vezes ataca, e se ataca são os
animais pequenos, matando a fome muitas vezes com os cadáveres dos
animais que desenterra, quando se acham mal cobertos.
O condor, que passou como ave cruel e temível, é cobarde como em geral
todos os abutres, que mal merecem o nome de aves de rapina; e estão no caso
das hienas. Sustentando-se de carne morta, não atacam os outros animais; mas
lançam-se sobre os que encontrão mortos ou sobre aqueles que encontrão
morrendo; ou espreitando as cabras, as vacas, etc., na ocasião em que dão à
luz o filho, lançam-se sobre o recém-nascido, sem sequer atacarem a mãe,
apesar de doente; uma criança armada d'um pão basta para os fazer fugir.
O veneno da tarântula, aranha bem comum na Itália, Espanha e Portugal,
foi tido como causa de efeitos terríveis, deixando atarantados ou em
convulsões horríveis os mordidos por ela, e receitando-se até como remédio a
musica. Mas hoje, dizem que é bem sabido, que o veneno d'estas aranhas não
é perigoso senão para os insetos que lhes servem de sustento.
Hás de ter visto os nossos pescadores andarem pelas ruas vendendo
alguns polipeiros petrosos, a que chamam árvores do mar. Não estranho que
eles lhes chamem árvores do mar. Porém estranho que pessoas de instrução,
dadas ás letras, nada queiram saber da ciência e se contentem com a lição do
pobre pescador, repetindo o mesmo, e até ensinando, que as madréporas,
ástreas, fungias, etc., são tortulhos e árvores do mar, sem fazerem ideia, já se
vê, do que é uma árvore, nem dos pobres animais que caíram nas suas mãos e
debaixo das suas vistas, que tão mal os olharão; porém para maior
esclarecimento e maior disparate acrescentam os que já não precisão de
estudar— são árvores do mar petrificadas.
Poderia continuar a falar-te de mais alguns d'estes erros, mas receio
enfadar-te, e por isso fico por aqui. Enquanto aos curiosos animais que
habitam a nossa costa da Foz, da Granja, Matosinhos e Leça, terei talvez ainda
ocasião de te falar d'eles em particular; pois são uma distração nos solitários
passeios à beira-mar, amenizando o que parecia monótono, e tornando
habitado o que parecia deserto, achando nós companhia aonde nos julgávamos
sós.
Adeus até outra ocasião.
Teu amigo - A. Luso.
O NOIVADO DO SEPULCHRO
(BALADA)
Vai alta a lua! na mansão da morte
Já meia noite, com vagar soou;
Que paz tranquila! dos vaivens da sorte,
Só tem descanso quem ali baixou.
Que paz tranquila!... mas ao longe, ao longe
Funérea campa com fragor rangeu:
Branco fantasma, semelhando um monge,
D'entre os sepulcros a cabeça ergueu.
Ergueu-se ergueu-se!... na amplidão celeste
Campeia a lua com sinistra luz;
O vento geme no feral cipreste,
O mocho pia na marmórea cruz.
Ergueu-se, ergueu-se, com sombrio espanto,
Olhou em roda... não achou ninguém...
Por entre as campas, arrastando o manto,
Com lentos passos caminhou além.
Chegando perto d'uma cruz alçada,
Que entre os ciprestes alvejava ao fim,
Parou, sentou-se, e com voz magoada
Os ecos tristes acordou assim:
«Mulher formosa, que adorei na vida,
E que na tumba não cessei d'amar;
Porque atraiçoas desleal, mentida,
O amor eterno que te ouvi jurar?
«Amor! engano, que a campa finda,
Que a morte despe d'ilusão falaz;
Quem d'entre os vivos se lembrará ainda
Do pobre morto que na terra jaz?
«Abandonado n'este chão repousa;
Ha já três dias, e não vens aqui...
Ai! quão pesada me tem sido a lousa
Sobre este peito que bateu por ti!
«Ai! quão pesada me tem sido!» e em meio,
A fronte exausta lhe pendeu na mão,
E entre soluços arrancou do seio
Fundo suspiro de cruel paixão.
«Talvez que rindo dos protestos nossos,
Gozes com outro d'infernal prazer;
E o olvido cobrirá meus ossos
Na fria terra, sem vingança ter!
— «Oh! nunca, nunca!» de saudade infinda
Responde um eco - suspirando além...
«Oh! nunca, nunca!» repetiu ainda
Formosa virgem que em seus braços tem.
Cobrem-lhe as formas divinais, airosas,
Longas roupagens de nevada cor;
Singela c'rôa de virgíneas rosas,
Lhe cerca a fronte d'um mortal palor.
«Não, não perdeste meu amor jurado;
Vês este peito! reina a morte aqui...
E já sem forças, ai de mim, gelado,
Mas ainda pulsa com amor por ti.
«Feliz que pude acompanhar-te ao fundo
Da sepultura, sucumbindo à dor;
Deixei a vida... que importava o mundo,
O mundo em trevas sem a luz do amor?
«Saudosa ao longe vês no céu a lua?
— Oh! vejo, sim... recordação fatal!
— Foi à luz d'ela que jurei ser tua,
— Durante a vida, e na mansão final.
«Oh! vem! se nunca te cingi ao peito,
Hoje o sepulcro nos reúne enfim...
Quero o repouso do teu frio leito,
Quero-te unido para sempre a mim!»
E ao som dos pios do cantor funéreo,
E à luz da lua de sinistro alvor,
Junto ao cruzeiro, sepulcral mistério,
Foi celebrado, d'infeliz amor.
Quando risonho despontava o dia,
Já d'esse drama nada havia então,
Mais que uma tumba funeral vazia,
Quebrada lousa por ignara mão.
Porem, mais tarde, quando foi volvido
Das sepulturas o gelado pó,
Dois esqueletos um ao outro unido,
Foram achados n'um sepulcro só.
AO MEU GATO
Ai! meu pobre animal únicos restos
do meu viver de então;
Companheiro nos dias tão funestos
e d'esta solidão.
Ficaste ainda assim ao meu abrigo
para me acompanhar,
Tu agora, talvez único amigo
que sabe o meu penar.
Tua dona morreu: Já não existe
quem te afagava enfim;
Hoje pobre animal, tu hoje triste
só me possuis a mim.
Como tudo mudou, como perdida
nos foi a nossa luz;
e cada qual de nós em sua lida
tem hoje a sua cruz.
Hoje é tudo deserto, o lar sem lume
para te conchegar
que foi-se-nos da vida esse perfume
o conforto do lar
Ai! meu pobre animal tão resignado,
me vens agradecer
não me olvidar, embora fatigado
de dar-te de comer.
Mas tu também não comes, também sente
teu seio cruel dor,
porque ás vezes me fitas de repente
com bem triste amargor.
Que fazemos nós ambos sem conforto
n'este deserto assim!
Oh! vamo-nos embora d'este horto
partamos já enfim.
Nem eu, nem tu já temos alegria,
tudo vimos morrer;
que fazemos aqui de noite e dia?
apenas só gemer.
Oh! vamo-nos embora e bem depressa
que já não pode mais o coração,
acabe-se o tormento que não cessa,
fujamos d'esta triste solidão.
Agosto— 1870
Costa Goodolphim.
SINAIS FISIONÔMICOS
(Em muitos manuais astrológicos no final do século XIX e começo do século
XX são encontradas essas referências fisionômicas, psicológicas e até de
caráter, marcadas principalmente pelo exagero. Não há nenhum estudo sério,
pelo menos conhecido, que respalde essas afirmações ou dê algum valor
científico à existência desses sinais ou desse tipo de interpretação.)
SATURNO
Os homens que nascem debaixo do domínio de Saturno, são d'estatura
grossa, avultada, nervosa, e com alguma imperfeição, o rosto grande e de cor
pálida, a fronte larga e cheia de lineamentos tortuosos, a cabeça imperfeita, os
cabelos pretos, úmidos e crespos nas pontas; os olhos pretos e centralmente
disposto um maior que o outro, e ás vezes uma macula ou albugem em um
d'eles; as sobrancelhas grandes, e unidas uma com outra até à raiz superior do
nariz; a boca larga; o beiço superior mais contraído e o inferior mais grosso;
os dentes superiores grandes e os inferiores agudos, curtos e desiguais; o
pescoço magro, comprido e algum tanto inclinado para diante, cheio de
músculos, veias e artérias que se manifestam com boa distinção; os ombros
largos e levantados; o peito apertado; as costas largas; a cútis áspera e bem
povoada de cabelos; os braços compridos e robustos; as pernas delgadas,
compridas e tortas; os pés cheios de veias superficialmente dispostas e pela
maior parte sujeitos aos calos.
JÚPITER
Os homens nascidos debaixo do domínio de Júpiter, são de boa estatura,
bem dispostos e temperados; têm o rosto grande mas em boa conformidade de
cor rosada; a fronte bem formada e descoberta; a cabeça esférica; os cabelos
densos e pouco crespos, inclinando a louros; os olhos formosos, grandes e
saídos; as sobrancelhas agudas e bem povoadas de cabelos; o nariz comprido e
no meio com alguma eminência; a boca rasgada; o lábio superior maior que o
inferior, ambos vistosos e corados; os dentes superiores compridos e largos,
especialmente os dois médios, os inferiores mais miúdos, mas uns e outros
firmes e bem colocados; a barba saída de cor castanha com uma cova no meio;
o pescoço elegante e bem proporcionado, com algumas veias musculosas, e
artérias bem distintas e engraçadas; os ombros largos, carnosos e bem
compostos; o peito entre largo e apertado, pouco povoado de cabelos; os
braços e pés medianamente crassos e robustos, povoados de cabelos tênues e
compridos, com algumas veias cerúleas e manifestas.
MARTE
Os homens que nascem sob a influencia de Marte, são de estatura
avultada, fornida, e varonil; o rosto comprido, feio e de cor acesa; a fronte
redonda e cheia de rugas; a cabeça grande e aguda; os cabelos densos de cor
castanha ou ruiva; os olhos claros, secos, e centralmente dispostos, a vista
aguda, seca e espantada; as sobrancelhas estendidas e mal povoadas: o nariz
agudo, apertado e curvo; a boca grande; os beiços delgados e tênues; os dentes
pequenos e agudos, mas dispostos por boa ordem; a barba aguda e bem
povoada de cabelos, com uma cova na ponta; o pescoço comprido, magro e
cheio de músculos, e veias patentes; os ombros magros e robustos; o peito
estreito; as costelas vigorosas; a cútis povoada; os braços e pés magros, duros
e robustos, com músculos, veias, e artérias proeminentes e bem superficiais.
SOL
Os homens que nascem sob a influencia do Sol, têm a estatura do corpo
bem formada e proporcionada; são alvos e de muitas carnes; a cabeça redonda
e não muito grande; os cabelos louros breves e pouco densos; os olhos
formosos, claros e castanhos; as sobrancelhas bem dispostas, delgadas e pouco
povoadas de cabelos; o nariz direito e extenso; a boca pequena; os beiços
redondos e carnosos; os dentes raros, agudos e firmes; a barba quase redonda e
largamente povoada de cabelos, com uma cova profunda no meio; o pescoço
breve e robusto, musculoso e pouco patentes as artérias e as veias; os ombros
grandes, largos, carnosos e robustos; o peito grande saído e bem formado; as
costelas largas e robustas; os braços, pernas e pés robustos, crassos e bem
proporcionados, e o corpo direito, bem formado e forte.
VENUS
Os homens que Venus vê nascer são elegantes, de estatura pequena,
mimosa e engraçada; o rosto entre redondo e comprido, bem proporcionado e
corado; a fronte engraçada, aonde se distingue a linha venera; a cabeça
medíocre na grandeza e redonda na forma; os olhos alegres, claros, pretos,
grandes e resplandecentes; as sobrancelhas formosas, grandes, bem povoadas
e unidas; o nariz plano, medíocre e proeminente; a boca pequena e engraçada;
os dentes miúdos, bastos, brancos e firmes; a barba abreviada, e cheia; o
pescoço comprido, carnoso e bem formado; os ombros largos e robustos; o
peito carnoso; as costelas robustas; os braços e pés carnosos e bem formados.
MERCÚRIO
Os homens que nascem sob a influencia de Mercúrio, são de estatura
medíocre, mas bem formada; o rosto entre comprido e redondo de poucas
carnes e de cor morena; a fronte regular com profundas lineações
fisionômicas, e com mais distinção a linha mercurial, que é a segunda em
ordem, contando da raiz superior das sobrancelhas; a cabeça grande e redonda;
os cabelos poucos, densos e delgados; os olhos profundos, pequenos e
formosos, não de todo pretos; as sobrancelhas pequenas, pouco arqueadas e
unidas ás pálpebras; o nariz pequeno, plano, igual e um pouco afilado; a boca
rasgada; os beiços carnosos e rubicundos; os dentes superiores desiguais e
raros, os inferiores compostos e unidos; a barba redonda, assinalada no meio e
os cabelos pretos; o pescoço mediocremente comprido; os ombros largos e
robustos; o peito plano, igual e pouco povoado de cabelos; os braços e dedos
das mãos compridos, bem feitos do corpo e dos pés, são fortes rapazes.
LUA
Os homens que nascem na influencia da Lua a sua estatura é comprida e
descomposta; o rosto grande, largo, carnoso e de cor trigueira; a cabeça grande
e algum tanto esférica; os olhos grandes bem dispostos, redondos e
superficiais, e algumas vezes um maior que o outro; as sobrancelhas grandes
arqueadas e unidas; o nariz grande, redondo ou rombo; a boca rasgada não
muito grande; os beiços grossos e carnosos; os dentes largos, grandes e mal
dispostos; a barba redonda, abreviada e pouco povoada de cabelos; o pescoço
breve, robusto e carnoso; os ombros grandes e mal dispostos; o peito grande e
largo com muitas carnes; os braços e pés robustos, grossos, com poucos pelos
e muitas veias distintas.
ORAÇÃO DO JUSTO JUIZ
Justo Juiz de Nazareth, filho da Virgem Maria, que em Belém fostes
nascido entre as idolatrias, eu vos peço, Senhor, pelo vosso sexto dia, que meu
corpo não seja preso, nem ferido, nem morto, nem nas mãos da justiça
envolto, Pax Tecum, Pax Tecum, Pax Tecum. Cristo assim o disse aos seus
Discípulos, se os meus inimigos vierem para me prender, terão olhos não me
verão, terão ouvidos não me ouvirão, terão boca não me falarão, com as armas
de S. Jorge serei armado, com a espada de Abrahão serei coberto, com o leite
da Virgem Maria serei borrifado, com o sangue de meu Senhor Jesus Cristo
serei Batizado, na Arca de Noé serei arrecadado, com as chaves de S. Pedro
serei fechado, aonde me não possam ver, nem ferir, nem matar, nem sangue de
meu corpo tirar; também vos peço Senhor, por aqueles três Cálices bentos, por
aqueles três Padres revestidos, por aquelas três Hóstias consagradas, que
consagradas ao Terceiro dia me deis aquela doce companhia que deste à
Virgem desde as portas de Belém até Jerusalém, que com prazer e alegria eu
seja tão bem guardado de noite como de dia, assim como andou Jesus Cristo
no ventre da Virgem Maria, Deus diante, paz na guia, Deus me dê a
companhia que Deus deu à virgem Maria; desde a casa Santa de Belém até
Jerusalém.
Deus é meu Pai, a Virgem Santa Maria é minha Mãe? com as armas de S.
Jorge serei armado, com a espada de S. Thiago serei guardado para sempre.
Amém.
ORAÇÃO
A Jesus Cristo, como a dizia S. Cipriano
Meu Senhor Jesus Cristo, lembrai-vos de mim pecador. Virgem
Santíssima, rogai por mim sempre sereis louvada, bendita; rogai por este
pecador ao vosso amado filho, preciosa formosura dos anjos, flor dos arcanjos,
profetas e Patriarcas, coroa dos Mártires Apóstolos e confessores, gloria dos
Serafins, coroa das Virgens, livrai-me de aquela espantosa figura quando
minha alma do meu corpo sair, ó Santíssima fonte de piedade, formosura de
Jesus Cristo, alegria da gloria, consolação no céu, remédio nos trabalhos,
convosco ó Virgem prudentíssima se alegram os Anjos, encomendai minha
alma a todos os fieis cristãos e conduz-me ao eterno Paraíso aonde viveis e
reinais para sempre e eu para vos louvar. Amém.
ORAÇÃO
Ao Anjo Custodio, como a dizia S. Cipriano
Anjo Custodio quereis ser Santo pela graça de Deus? Quero.
Das treze palavras que sabeis dizei-me a uma.
(Assim se deve dizer em todas as palavras).
1.ª Uma entre o sol e a lua. Padre, Filho, Espírito Santo.
2.ª São as duas taboinhas de Moisés.
3.ª São os três Patriarcas Jarco Jarcó.
4.ª São os quatro Evangelistas.
5.ª São as 5 Chagas de Nosso Senhor Jesus Cristo.
6.ª São os seis círios bentos que apareceram em Jerusalém para alumiar a
Nosso Senhor Jesus Cristo para todo o sempre. Amém.
7.ª São as sete salvas da Senhora.
8.ª São os oito coros d'Anjos.
9.ª São os Nove Corpos Santos.
10.ª São os Dez Mandamentos.
11.ª São as 11 Mil Virgens.
12.ª São os Doze Apóstolos.
13.ª São os 13 raios do Sol que arrebente o Demônio do mais pequeno até o
maior.
N. B. Esta oração deve ser principiada e acabada, porque do contrario, o Santo
fica de joelhos até que a pessoa que a principiou a acabe.
RECEITAS CURIOSAS
Contra a picada da víbora
Dissolva-se em água clorureto de cal até que fique em uma massa mole, e
se põe sobre a picada.
Contra o envenenamento produzido pelo verdete
Bata-se uma clara d'ovo, e depois de bem batida misture com água e dê
ao doente, repetindo o mesmo até acalmar as cólicas, tomando depois bebidas
temperantes.
Contra a mordedura de cães danados
O que se deve logo fazer é espremer bem a ferida para expelir o sangue e
a baba, e depois lavar a ferida com a dissolução de pedra caustica (álcali) em
água, ou a cauterização de ferro em brasa pondo depois panos e enchumaços
molhados na dissolução para dilatar a ferida, pode ajuizar-se se é de cão
danado molhando um bocado de pão no sangue da ferida e deitá-lo a uma
galinha e se for danado morre a galinha; se se deitar a outro cão não o quererá
comer e até fugirá do pão.
Contra as queimaduras
Meta-se imediatamente a parte queimada em água de cal ou envolva-se
em algodão em rama.
Contra escaldaduras d'água a ferver
Esfregue-se a parte ofendida com farinha triga e depois cubra-se com
bastante farinha e panos de linho.
Contra os ataques de gota
Esprema-se um limão na boca da pessoa atacada que logo cessam os
acidentes.
Para estancar sangue de veia ou outro qualquer vaso cortado
Magistério d'ópio um escrúpulo, cabelos de lebre cortados miúdos e clara
d'ovo q. b. para fazer uma massa a qual se põe na parte com ataduras.
Para os surdos
Toma-se do fel de galinha, águia, corvo e lebre (todos ou partes d'eles)
uma porção suficiente e cozam-se em panela nova, com vinho branco, bem
tapada, até ficar em consistência d'óleo, do qual se deita todos os dias nos
ouvidos algumas gotas tépidas.
Para estancar o sangue do nariz
Esfregue-se a testa com o mesmo sangue, ou levantem os braços para o
ar até passar.
Para não cair o cabelo
Lava-se a cabeça com óleo rosado em o qual se tenha fervido a semente
de murta, galha, e mirabolanos, o sumo das cebolas também serve para o
mesmo.
Contra a embriaguez
Tome seis a oito gotas d'amoníaco liquido (álcali volátil) dissolvidas
n'um copo d'água.
Para enjoar o vinho
Tome-se o chora das videiras misturado em vinho.
Contra o defluxo
Esfregue o nariz e entre os olhos ao deitar na cama com pomada
canforada, e em jejum tome algumas colheres de mel.
Contra a dor de dentes
Sulfato d'alumina em pó uma oitava; éter nítrico uma dita, faça uma pasta
mole, e cubra o dente dorido.
Outra para o mesmo
Éter sulfúrico uma oitava, laudam 30 gotas, misture e ponha no dente por
meio do algodão em rama.
Outra
Mel rosado meia onça, alcanfora, espírito de mirra, e dito de sal comum
de cada um 30 gotas; misture e ponha no dente por meio do algodão em rama.
Contra o azedume do estomago
Serve para a azia comer salsa crua e também se recomenda para dores de
garganta.
Para as vespas não picarem
Lavam-se as mãos e cara com água de colônia, ou de alfazema, vinagre
ou água ardente.
Para as moscas não morderem no gado
Esfreguem o gado com folhas verdes de nogueira.
Contra picadas das vespas
Esfregue-se a parte dorida com uma mosca.
Contra os calos
Ponha-se sobre eles uma pasta de adzivo morno, até se desfazerem; ou
cubram-se com algodão em rama para mitigar as dores.
Contra as formigas
Deite-se nos formigueiros ou lugares aonde elas causam prejuízo folhas
de tomates, ou sal, pó de carvão ou cinza.
Contra o gorgulho
Deitem-se alguns punhados de linho cânhamo com a semente e fresco
por toda a superfície dos grãos enceleirados.
Para tirar nodoas de tinta
Molhe-se o pano no lugar da nodoa, cobre-se esta com uma pitada de sal
d'azedas (acido oxálico), molha-se outra vez com água e põe-se ao pé do lume.
À medida que a água se evapora, molha-se de novo o pano, e se é preciso
cobre-se outra vez de pó, logo que tem desaparecido a nodoa, lava-se o pano
para que a dissolução ácida o não altere.
Para evitar os espirros
Quando nos vierem os espirros, esfreguem-se logo os olhos, e eles se irão
sem efeito.
Para a boa criação das galinhas
Deverá votar-se as galinhas ou patos na Lua Cheia de Janeiro ou
Fevereiro, os ovos mais redondos são machos e os mais compridos são
fêmeas.
Conhecimento das complexões pelos sonhos
Quando sonharmos com fogos, guerras, armas ou coisa semelhante, é
sinal de complexão colérica; quando sonharmos com árvoredos, flores, festas,
banquetes etc., é sinal de complexão sanguínea; quando sonharmos com
chuvas, pescarias, embarcações ou coisas d'água, é sinal de complexão
flegmática; quando sonharmos com prisões, mortes ou desgraças que causem
tristeza, é sinal de complexão melancólica e conforme a estas complexões se
aplicará o remédio.
FIM DA QUINTA PARTE
O ORÁCULO DA MÁGICA
OU
O ESPELHO MÁGICO DO ANÃO
SEGUIDO DA INTERESSANTE DESCRIÇÃO DE UM
CASTELO ENCANTADO
OU O
MONTE DO CASTELO DAS FADAS
O ESPELHO MÁGICO DO ANÃO
Tomé e Joaninha viviam quase sós na sua pequena casinha, fora do
bosque, tão sós como nunca tinham vivido. O pai era couteiro e guarda-matas,
e por isso, ou o tempo estivesse bom ou mau, passava muitos dias sem ir a
casa, a guardar as florestas e a matar a caça silvestre que era para a mesa do
senhor das terras. A mãe tinha morrido, e na choupana ninguém estava com os
meninos senão a avó, que já via mal e ouvia pouco. A avó passava todo o dia
assentada ao lar, menos quando andava coxeando pela cozinha para preparar a
pobre comida para os pequenos, ou quando dormia. De dois em dois ou de três
em três dias vinha Luiza, que morava na aldeia, trazer o leite, o pão e o que
era mais necessário; mas passavam-se semanas sem entrar um homem na
choupana.
No verão pouco cuidado dava isso aos pequenos, porque iam todos os
dias à escola da aldeia, e era isso para eles um divertimento. Os pássaros
faziam-lhes companhia cantando alegres; no caminho encontravam lírios ou
morangos, que colhiam para venderem na aldeia ou para levarem ao mestre.
Passadas as horas de aula, corriam à floresta, por onde andavam de um para
outro lado com o pai, e espreitavam esquilos e cabritinhos monteses, e já uma
vez tinham visto de longe um belo veado. E assim, lendo nos seus livros na
escola ou colhendo avelãs nas matas, não sabiam o que era aborrecimento em
todo o verão.
Mas no inverno era verdadeiramente triste, porque não podiam entrar na
floresta, e tinham de estar em casa como dois ratinhos no seu buraco. O pai
era obrigado a andar por fora e levava consigo Fiel, bonito perdigueiro, que
era o companheiro único dos pequenos. Também, se o pai estava em casa era
raro que dissesse alguma coisa; assentado à lareira, dormia ou limpava armas
de caça. Em outro tempo contava a avó muitas histórias bonitas, mas então já
não contava nada, e se falava era a meia voz e só consigo. Joaninha assentavase ao pé da avó com uma roca pequena e fiava; mas era um trabalho
aborrecido por não haver quem conversasse. Tomé talhava em bocados de pau
figuras de cães e de lebres; mas saiam-lhe sempre mal feitas, e tantas vezes
dava golpes nos dedos que perdia a paciência e deixava a obra. O que mais o
divertia era fazer casinhas com pedras e bocados de pau que ajuntava; mas as
casas caiam com grande barulho, e a avó dizia-lhe que não tinha jeito nenhum
para aquilo. Então dizia às vezes Tomé com mau humor:
— Ora, porque não havemos nós de ser como os filhos dos ricos, como o
filho de um fidalgo que uma vez passou na aldeia, ou como os do balio, que
podem comer tudo que quiserem, ou como os filhos dos ciganos que andam
por onde querem?
Em uma tarde, perto do Natal, tudo estava calado e triste. O azeite no
candeeiro estava quase acabado, e o caminho para a aldeia estava tão cheio de
neve que Luiza não tinha podido aparecer com as coisas precisas. Não havia
com que fazer arder o candeeiro. Por fortuna o luar era claro como o dia; mas
os pequenos tinham medo das sombras esquisitas que o luar fazia.
Joaninha chegava-se muito para a avó, e Tomé fez o mesmo e disse à
velha avó em voz alta:
— Avozinha, conte-nos hoje uma história, ainda que seja pequenina:
ainda há de saber alguma.
— Não sei nenhuma, rapaz, resmungou a velha, mesmo nenhuma.
Esqueceram-me todas.
— Só uma, avozinha; conte do anão da pedreira.
— Da pedreira, ah, sim, rapaz, espera; deixa ver se me lembra. Onde está
a grande pedreira, em baixo no barranco era em outro tempo uma rocha forte e
a prumo como um muro, d'onde nunca tinha saído nenhuma pedra, e defronte
da rocha havia um pedaço de terreno coberto de viçosa verdura: por debaixo
moravam os anões; descia-se por degraus ao pequenino castelo da rainha dos
anões, e debaixo da terra era uma cidade muito bonita. Na floresta não
entravam caçadores nem cortadores de lenha nem montantes, e nos dias de sol
subiam todos os anões e assoalhavam-se no musgo verde, e faziam banquetes
e dançavam com muita alegria. Um dia começaram os homens de fora a
levantar casas na planície, e entraram na floresta e cortaram árvores, e
acarretaram grandes pedras para fora. Ficou tudo cheio de entulho de redor do
belo rochedo que ficava defronte do terreno cheio de verdura, e de redor da
cidade dos anões. Para que os homens não pudessem cortar mais pedras,
foram os anões de noite todos juntos à floresta e cortaram pedras muito
grandes e levaram-nas de rodo com toda a força até à entrada da mata. Os
homens descontentes foram à rocha e fizeram saltar as pedras em pedaços, e
elas caiam com grande estrondo no prado. Assim ficou toda arruinada a bonita
cidade dos anões, e houve muitas lagrimas e sentimento: Os anões que não
tinham sido mortos, escavaram um subterrâneo fora do bosque. Lá vivem
agora, e se edificaram outra cidade é coisa que não se sabe. Desde então tem
rodado para fora muitas pedras de noite; mas estão sempre a cair outras lá
dentro, e todos os anos na noite de S. Tomé, saem eles para verem se ainda há
muitas pedras no terreno, e a quem de lá tirar n'essa noite três pedras, não
negam os anões coisa nenhuma que lhes seja pedida.
Assim contou a avó. Havia muito tempo que ela não tinha falado tanto, e
estava cansada. Joaninha estava cheia de medo e chegava-se muito para ela,
mas Tomé, com as faces ardentes e olhos brilhantes, pensava na história e bem
quisera saber se os anões ainda apareciam.
Então Fiel ladrou fora, e entrou o pai, cansado, carrancudo e gelado;
mesmo às escuras procurou alguma coasa que pudesse comer; mas a velha
esquecia-se d'ele muitas vezes, e ele teve de deitar-se com fome. No inverno
dormia a avó na alcova e Joaninha com ela, e o pai com Tomé na salinha
próxima. O pai, depois de pegar a dormir, roncava toda a noite, e não havia
nada n'este mundo que o acordasse, só se fosse algum tiro dado na mata.
N'essa noite Tomé não podia dormir. Não era a primeira vez que ele
ouvia contar a história dos anões; mas nunca tinha sabido que estavam tão
perto e que ainda apareciam. Batia-lhe o coração com desejos ansiosos,
pensando que podia com as riquezas dos anões alegrar aquela miserável
solidão dos bosques. E faltavam só dois dias para o S. Tomé!
Não pôde calar-se que não dissesse na manhã seguinte ao ouvido de
Joaninha:
— Joaninha, depois de amanhã, é o dia de S. Tomé; vamos tirar pedras
do território dos anões.
Mas Joaninha olhou para ele com olhos espantados, e disse:
— Ora essa! Tu não vês que é só uma história do que já passou há mais
de cem anos? E demais, eu morreria de medo se saísse de noite.
Tomé ficou entendendo que nada faria com aquela maricas, apesar de
Joaninha ser mais velha, e calou-se com o seu projeto.
Na noite de S. Tomé foi o pai cedo para casa, e antes de ter a avó
apagado o candeeiro já ele dormia como uma pedra. Tomé esperou que
Joaninha também adormecesse; a avó sabia ele que não o ouviria ainda que
estivesse acordada. Não tardou muito que tudo fosse silencio: ele não se tinha
despido, puxou o barrete de peles para as orelhas e saiu. Fiel não estava
acostumado a ver sair Tomé sozinho; e ficou muito espantado e resmungou
quando Tomé lhe pôs a mão pela cabeça.
A lua ainda brilhava clara, e no bosque havia um silencio de cemitério
que assustava Tomé; mas tomou animo, e meteu-se com passos ligeiros e
firmes ao bem conhecido caminho da grande pedreira. Não se ouvia o mais
leve murmúrio quando ele entrou no barranco, e então estremeceu vendo a
rocha escavada em que mal entrava um raio da lua. Com passos trêmulos foi
andando até ao lugar onde tinha sido o território dos anões, e onde só havia
então uma grande quantidade de pedras grandes e pequenas. Com as mãos a
tremer, agarrou nas maiores que pôde levantar, e levou-as para fora.
— Quem está aí? perguntou uma voz fina, quando ele deitava fora a
última.
No único lugar que a lua alumiava no barranco estava um homem muito
pequeno vestido de verde, que era o que perguntava a Tomé:
— Quem está aí?
— Sou o Tomé do guarda-matas, disse ele muito embaraçado, e tirando
com todo o respeito o barrete.
— Que queres daqui?
— Só queria tirar pedras para que os senhores pudessem viver aqui
debaixo.
— Pouco podes fazer, disse o anão com tristeza, mas é uma boa obra que
deve ser recompensada. O que é que desejas mais?
Tomé já tinha pensado em muitas coisas, mas n'aquela ocasião não lhe
lembrava quase nada. Lembrou-se de um cavalo em que ele pudesse ir à
escola, de uma pipa cheia de azeite para que sempre houvesse que arder no
candeeiro, e de um saco cheio de maçãs e de nozes; mas nada d'isso valia o
que ele tinha feito. Por fim disse gaguejando:
— Uma saca de dinheiro.
O anão perguntou-lhe:
— Então já sabes o que isso é? Que queres fazer com o dinheiro?
Tomé respondeu um pouco animado:
— Em lugar da nossa choupana, fazia uma casa grande, muito grande,
ainda maior que é na aldeia a casa do monteiro; e uma cavalariça cheia de
belos cavalos em que eu pudesse correr, quando tudo estivesse cheio de neve;
e comprava à Joaninha um vestido novo, e um barril de azeite para não
estarmos às escuras.
— E que mais? disse o anão sorrindo; hás de fazer uma casa, mas não
n'este escuro bosque; andarás por fora da tua terra, mas para isso não precisas
de cavalo; Joaninha poderá ter o vestido novo sem ser dado por ti, e quando
quiseres ter azeite bastante, vai com a tua cestinha à pedreira onde acharás
com que faças azeite suficiente para arder no candeeiro em dois anos. Entendo
que a saca de dinheiro não te serve de nada; ainda és muito pequeno.
— Ah, disse Tomé desanimado, a nossa vida não seria tão miserável e
tão aborrecida nas grandes noites de inverno, se tivéssemos algum bonito livro
de estampas.
— Lá isso, disse o anão, é coisa que pode ter bom remédio; vai
descansado que depois da noite do Natal irei ter contigo e cuidarei no modo de
nunca mais te parecerem longas as noites de inverno. Alegra-te, os anões
sabem pagar o bem que lhes fazem.
O anão desapareceu, Tomé ficou a tremer, e foi-se embora muito mais
inquieto do que tinha saído. Sem que ninguém ouvisse, levantou a aldrava de
pau, entrou em casa, foi ao seu quarto, deitou-se, e toda a noite sonhou com o
anão. Não quis dizer nada a Joaninha, porque ele mesmo não sabia bem o que
o anão faria, apesar de esperar com ansiedade a chegada do Natal.
Chegou a noite de Natal, e não faltava alegria na cabaninha da floresta. O
pai tinha trazido da aldeia grande quantidade de maçãs e de nozes, a avó tinha
dado aos pequenos duas bonitas estampas que ainda achou na sua Bíblia, e na
manhã do dia de festa, chegou a criada da senhora do monteiro, que era
madrinha de Tomé e de Joaninha, e trouxe dois bonitos corações de pão doce,
um lindo gibão novo para Joaninha, e uma jaqueta bem forrada e quente para
Tomé. O pai não saiu de casa e cozinhou uma lebre. Havia muito tempo que
eles não tinham vivido tão bem; mas Tomé não estava tão contente como nos
outros anos, porque não sabia se o melhor ainda havia de vir.
Veio a noite e todos adormeceram, menos Tomé que se assentou na cama
vestido, e pensava no que poderia trazer-lhe o seu novo amigo para passar o
tempo enfadonho do sombrio inverno, quando ouviu bater de leve à porta de
casa. Com algum susto e temor, mas a toda a pressa saltou da cama, e abriu ao
homem pequenino vestido de verde, que não levava nada consigo senão um
vidro redondo, muito brilhante e de muitas cores.
— Leva-me ao teu quarto, disse o anão, entrando e andando mais ligeiro
do que Tomé.
Foram ao quarto de dormir em que se via tudo claramente com a luz que
o vidro dava. O que lá se via era um leito velho, uma mesa manca com três
pés, e duas cadeiras. O traste maior era uma alta e larga caixa, metida na
parede, enegrecida pelo tempo, e que muitas vezes tinha sido um bom lugar
para o jogo das escondidas. Nas costas da caixa havia um grande buraco
redondo por onde Joaninha tinha medo de espreitar porque via tudo escuro.
Esta caixa foi o que deu mais nos olhos ao anão, que entrou n'ela pela
tampa meio aberta e esteve a trabalhar e a bater lá dentro algum, tempo.
— Agora, disse ele, depois que saiu, já não haveis de passar o tempo com
aborrecimento; quando as horas parecerem muito compridas, olhem pelo
buraco redondo que está na caixa, seja de manhã ou seja de tarde, quando
estejam sós. Adeus, rapaz; Deus te dê da sua graça.
— E antes de Tomé saber o que havia de novo, já o anão tinha saído.
Tomé não entendeu bem o que tudo aquilo queria dizer, e não se atreveu a ir
logo ver à caixa. Foi deitar-se ao pé de seu pai, e pensando e cismando se o
anão falaria seriamente ou a gracejar, adormeceu.
Na manhã seguinte o pai saiu cedo, e Tomé não pôde calar-se, e ao pé da
surda avó contou baixinho à irmã toda a sua aventura, de que ela se riu sem
lhe dar credito, mas tremendo de susto. Por fim resolveu-a a ir de tarde com
ele fazer a primeira visita à caixa, e como esperavam alguma coisa, não
souberam nesse dia o que era aborrecimento.
À noite, ainda o pai não tinha entrado e a avó cabeceava com sono,
quando ambos se meteram na caixa cheios de ansiedade. Tomé, que era mais
animoso, foi o primeiro que olhou pelo buraco onde brilhava o vidro do anão.
Ah! que resplendor lhe veio bater nos olhos! Puxou logo Joaninha para si,
porque a abertura era bastante larga para poderem ver ambos ao mesmo
tempo. Eram maravilhas o que eles viam, e mal se podiam conter para não
darem altos gritos de espanto. Viam uma grande sala, muito grande, alumiada
de um modo majestoso por lustres dourados, com muitos centos de velas de
cores. E uma mesa estava carregada com as coisas mais maravilhosas:
soldados, de pé e de cavalo, regimentos inteiros com peças e armas, e uma
cavalariça cheia de cavalos pequenos de todas as raças, e livros com ricas
pinturas, e uma grande quantidade de objetos de brinquedo, que eles nunca
tinham visto, e pequenas esporas de prata, e uma espingarda e espada, e um
soberbo vestuário de veludo bordado a ouro. Todas estas coisas magníficas
estavam dispostas sobre a mesa na melhor ordem, e ao pé havia açafatinhos e
pratos com os doces mais finos.
— Ah, de quem será isto! disseram os dois irmãos suspirando.
A porta abriu-se, e entrou um rapaz esguio e pálido, que teria dez anos, e
atrás d'ele muitas senhoras e homens da nobreza vistosamente vestidos. Tomé
e Joaninha pensavam que aquelas riquezas deviam pertencer a muitos
meninos, e olhavam para todos os que iam entrando na sala; mas não havia
outro menino senão o que entrou primeiro, e que passou por todas aquelas
coisas tão ricas sem fazer muito caso d'elas, em quanto que Tomé e Joaninha
pregavam no vidro os olhos afogueados e parecia que queriam devorar todas
aquelas maravilhas.
— Rapazes, onde estais vós? gritou fora a voz da avó.
Voltaram a cabeça assustados, e viram tudo às escuras, como era nos
outros dias, e a velha caixa estava sem luz como se nada tivesse acontecido.
Aos dois irmãos ainda parecia tudo um sonho quando se assentaram ao pé do
candeeiro no quarto velho e defumado. N'essa noite chegaram a sentir quase
alegria por a avó ser surda, porque podiam falar à vontade nas maravilhas que
viram, e a cada um lembrava alguma coisa muito bonita em que o outro não
tinha reparado.
— Ai, diziam eles suspirando, que boas coisas tem aquele menino
fidalgo! Se nós também tivéssemos coisas assim!
E ainda diziam o mesmo quando o sono lhes fechou os olhos, para ainda
lhes mostrar em sonho tanta grandeza.
Antes de ser bem dia, foi Joaninha à sala da caixa. O pai não estava em
casa, e por isso podiam à vontade ir olhar pelo vidro maravilhoso. Como eles
desejavam ver ainda uma vez a bela sala de ontem! Agora era à luz clara do
dia, mas, era quase tão bonito como com os centos de luzes de cor: ainda
havia todas as coisas ricas de ontem, mas não estavam em tão boa ordem, o
menino que tinham visto estava vestido de seda deitado sobre o sofá, com
alguns dos bonitos livros espalhados de redor d'ele, e parecia estar muito
aborrecido.
Quando Tomé e Joaninha se mostravam admirados de que pudesse haver
alguém que não estivesse contente com tão maravilhosas coisas, abriu-se uma
porta da sala, e entrou um senhor de idade. Os meninos ouviram falar como
muito ao longe, mas entendiam bem o que se dizia. O velho perguntou:
— Já está enfastiado, meu caro príncipe, de tantas coisas que fariam
felizes outros meninos?
— Outros meninos! disse o príncipe; os outros meninos não estão sós, e
eu já vi todas as minhas coisas que me deram.
— Mas vossa alteza bem sabe que se lhe dá companhia quando a quer
ter.
— Que companhia! Vem um, e diz: «Bons dias, príncipe»; e diz outro:
«Que tem príncipe?»; e brincam com o que eu tenho e conversam e riem uns
com os outros; e quando lhes chega o aborrecimento, vão-se embora e eu fico
só. Quem me dera sair como saem os outros meninos!
— Mas se vossa alteza quer, pode ir passear ou viajar.
— Ah, sim, ir passear na sua companhia, ou andar em carro ou a cavalo
acompanhado por camaristas. Que grande alegria! o que quisera era ir só e
para onde me parecesse. Antes queria ser filho de ciganos do que príncipe.
Antes que Tomé e Joaninha pudessem ouvir mais nada, chamou por eles
a avó. Saíram da caixa e o buraco ficou às escuras.
Muito tinham os dois irmãos que dizer um ao outro! O que eles não
podiam entender era porque estava o príncipe tão impertinente.
— Ah, como nós estaríamos contentes com aquelas coisas tão bonitas!
dizia Tomé suspirando.
— Sim, mas nós não estamos sós, dizia Joaninha.
— É verdade que os meninos ricos quando não estão sós, também estão
contentes, dizia Tomé para si.
— Havemos de ver, dizia Joaninha, se o príncipe ainda lá está hoje à
noite.
Com grande alegria passaram eles todo o dia a conversar, e a ansiedade
não podia ser maior quando outra vez olharam pelo vidro.
Já não era a sala, mas sim um bosque, quase como aquele em que eles
moravam, e havia no bosque um grande pedaço de terreno sem árvores onde
ardia uma fogueira; em que estava estendida uma bela peça de caça brava, e
de redor da fogueira muita gente esfarrapada e enfarruscada, e alguns
tocadores de instrumentos que tocavam uma musica alegre, e uma multidão de
crianças que dançavam e saltavam com uma alegria de selvagens.
— Ah, isto é muito divertido, dizia Tomé.
Mas Joaninha abanava a cabeça porque não lhe agradava o que via. Um
rapaz d'aqueles ciganos chegou com um grande saco cheio de frutas secas, e
todos os pequenos o receberam com gritos de alegria, e ele despejou o saco no
chão. Todos se atiraram às frutas secas como quem tinha fome e comeram a
bom comer. Depois começaram outra vez a saltar e a cantar desentoados, e
Tomé começava a sentir desejos de também ir saltar com eles, quando o pai
que chegava de fora os chamou para o quarto.
Toda a noite teve Tomé os ciganos na imaginação, de maneira que deu
cuidado a Joaninha que pensava que Tomé podia muito bem sair de casa de
noite e fugir para os ciganos. Mesmo a dormir cantava Tomé o que tinha
ouvido tocar aos ciganos.
Muito cedo, antes de acordar o pai, foi Tomé olhar pelo vidro, sem
esperar por Joaninha, que só passado algum tempo é que foi ter com ele. O
que viram era ainda o verde prado do bosque, mas já não havia festa. Era de
manhã, a fogueira estava apagada, e os ciganos corriam para todos os lados
muito aflitos e desvairados. Chegaram soldados e todo aquele barulho e
desordem acabou pela prisão dos ciganos que eram acusados de roubos. Com
agudos gritos viram os pequenos dos ciganos que os soldados levavam à força
seus pais e suas mães, e que outros soldados os levavam a eles para outra
parte. Tomé e Joaninha não tiveram animo para ver mais e desviaram os olhos
do vidro. Joaninha disse depois a Tomé:
— Ainda querias ser filho de cigano para ter aquela vida livre que eles
têm?
— É verdade, disse Tomé desanimado, quem rouba não pode ter uma
vida livre.
— Os meninos ricos, tornou Joaninha, de certo passariam melhor vida, se
não vivessem tão sozinhos como o príncipe.
À noite não puderam ir para a caixa das vistas maravilhosas porque a avó
nunca lhes deu tempo de saírem da cozinha, e o pai foi para casa muito cedo.
Por isso ainda mais desejavam que chegasse a ocasião de poderem lá tornar.
Quando essa ocasião chegou, viram um quarto muito bonito, não tão
admirável como a sala do príncipe, mas muito mais bonito do que o quarto da
madrinha, com alcatifas de varias cores e belos quadros nas paredes. O quarto
estava cheio de lindas coisas para brincarem meninos e meninas. Um bonito
quarto de bonecas, com senhoras e senhores muito bem vestidos, com sofás,
cadeiras e caminhas pequenas, e uma cozinha cheia de louças brancas, panelas
e pratos, muito mais do que havia na cozinha da avó; bonecas pequenas e
grandes, quase da altura de Joaninha, berços e cadeirinhas; e de outro lado um
castelo com soldados, e uma loja muito enfeitada com uvas secas, amêndoas,
confeitos e figos, e um carro com baús e sacos, e lindos livros de estampas;
em uma palavra, eram quase tantas coisas como tinha o príncipe. Tomé e
Joaninha não cabiam em si de contentamento e admiração.
Então entraram no quarto os donos de todas aquelas riquezas, que eram
duas meninas e um menino. Parecia que vinham de passear. As meninas
correram para as bonecas e o menino para a loja. Uma foi com um dinheiro
pequenino e brilhante comprar doces ao irmão, a outra começou a vestir as
suas bonecas de uma caixinha cheia de ricos vestidos e chapelinhos.
Ah, como ficaram tristes Tomé e Joaninha quando a avó os chamou para
a ceia, e como sonhavam, a dormir e acordados, com aquelas bonitas coisas, e
como correram na manhã seguinte à caixa para continuarem a ver como eram
felizes os três irmãos!
Mas já não era tudo tão bonito no quarto; as bonecas estavam no chão, e
uma das meninas estava a chorar e a gritar; tinha deixado de noite as bonecas
no chão e a porta do quarto aberta; a gata tinha entrado, tinha brincado com a
boneca, e rasgou-lhe os vestidos de seda e estragou-lhe as cores.
— A culpa é tua, gritou um dos meninos, porque não puseste as coisas
em ordem.
— Eu é que não tive culpa nenhuma, gritou a outra.
E nisto correram aos empurrões para a loja, e entraram em desordem por
causa de um pão de açúcar que as meninas queriam ter na sua cozinha e o
irmão não queria que se tirasse da loja. A questionar e a gritar entraram as
meninas na loja, e muitos dos vidros do doce foram deitados ao chão: o
menino cheio de cólera correu à cozinha e deitou tudo ao chão, e quebrou a
bonita louça que lá havia. Então foram tantos os gritos e queixas que Tomé e
Joaninha não quiseram ver mais.
Tardou muito tempo que eles pudessem tornar a ver pelo vidro. Quando
chegou a ocasião, o que viram foi um lindo quarto e uma mesa com
quinquilharias, bolos doces, uma bela torta, confeitos e pasteis. Estavam lá
duas meninas, e parecia que era o dia dos anos de uma, que era a que tinha
recebido todas aquelas coisas. Não ralhavam nem se zangavam uma com a
outra como tinham feito os outros meninos, mas também não se podia dizer
que tinham boa saúde e que estavam satisfeitas. Dizia uma:
— Que te parece, Ema, vamos comer um bocadinho da tua torta?
— Eu não, Sofia; antes queria maçãs.
— Maçãs! pois tu não sabes que o senhor doutor proibiu que
comêssemos fruta?
— Ah! também a torta me faz mal, e a avó foi que m'a mandou; e os
doces fazem-me doer os dentes e foram mandados pela tia.
— Então vamos brincar para o jardim, tornou Sofia.
— Pois sim, vamos; e levo o meu chapéu novo. Iam para sair quando
apareceu a mãe e perguntou:
— As meninas onde querem ir?
— Vamos só um bocadinho para o jardim, mamã.
— Deus nos livre d'isso: no jardim está um vento muito frio e a terra
muito úmida. Nada, nada. Ema viria de lá com dores de dentes e Sofia com a
tosse. Deixem-se estar aqui. Eu vou levar d'aqui para fora todas estas coisas,
porque já comeram muito, e Sofia devia agora tomar o seu remédio.
A menina Sofia fez uma careta de enjoo quando ouviu falar no remédio.
Joaninha não quis esperar até que ele chegasse e deixaram tristes o vidro e a
caixa.
Não faltava a Tomé e a Joaninha que dizer e em que pensar a respeito do
que tinham visto.
— Diz-me cá, Tomé, perguntou Joaninha, parece-te que são infelizes
todos os meninos que vivem no mundo?
— Não, acudiu logo Tomé, eu acho que não pode ser. Se o príncipe não
vivesse tão só...
— Isso sim; e se os filhos dos ciganos tivessem bons pais; e se os três
irmãos não tivessem tão mau gênio; e se as meninas não fossem doentes...
Olha, quem é bom e de bom gênio e tem saúde, vive contente.
— Mas quem é pobre e só como nós? perguntou Tomé.
E Joaninha não soube o que havia de responder-lhe.
À noite a avó adormeceu cedo, mas eles mal se atreviam a ir ao vidro
receando que acabasse por coisas tristes. Contudo sempre foram. D'esta vez
chegaram a gritar ambos ao mesmo tempo em voz um pouco alta: Isto é o
nosso quarto e nós nele!
E na verdade assim era, mas o quarto era mais alumiado e mais alegre,
estava com mais ordem e mais asseio e limpeza, as vidraças sujas estavam
bem lavadas, na janela havia em vasos um par de plantasinhas da floresta,
como Joaninha as conhecia bem, de umas que nasciam mesmo com a neve;
em uma gaiola de vimes, como Tomé já tinha visto fazer aos rapazes da
aldeia, saltava um passarinho, que parecia estar melhor naquele quarto
agasalhado do que estaria livre ao ar frio, porque cantava e trinava que era um
gosto ouvi-lo. E a avó assentou-se à roda de fiar e Joaninha ao pé d'ela e Tomé
a pequena distancia e não estavam aborrecidos e tristes como era d'antes; e
cantavam uma bonita canção que já tinham aprendido na escola e que nunca
se tinham lembrado de cantar em casa. Cantavam tão suavemente que a avó,
que percebia alguma coisa, piscava os olhos de contentamento. Por fim
quando acabaram de cantar, o Tomé que eles viam lá dentro pegou em um
grande livro que já há muito tempo estava cheio de pó no sobrecéu da cama da
avó, desde que ela nem com as lunetas podia ler. Tomé e Joaninha olhavam
espantados, porque era verdade que sabiam ler, mas ler em casa era coisa em
que nunca tinham pensado. O Tomé do vidro começou a ler em voz alta de
maneira que a avó o ouvia; ao principio não foi tão correntemente como o
verdadeiro Tomé teria lido, mas não tardou que fosse melhor. Era a história de
S. José, que os meninos já tinham ouvido, mas já há muito tempo, e agora
parecia-lhe tão cheia de novidade e de beleza que ao Tomé do vidro
escutavam com toda a atenção, até que se ouviu um latido de cão. Era também
exatamente como o latir do Fiel.
E a Joaninha que se via lá dentro levantou-se, pôs um par de sapatos
velhos ao calor do lume e dependurou também ao calor do lar uma jaqueta
velha do pai, e quando o pai entrou com Fiel, tirou-lhe Tomé a jaqueta
molhada e pegou-lhe na espingarda, e Joaninha deu-lhe os sapatos quentes e a
jaqueta bem enxuta.
Tomé e Joaninha olhavam pasmados para aqueles cuidados com que
trabalhavam as suas imagens dentro do vidro. Até então tinham visto o pai
entrar e sair sem ao menos pensarem em cuidar d'ele. O pai que eles viam pelo
vidro estava muito admirado d'aqueles cuidados de seus filhos e mostrava-se
muito mais meigo do que o verdadeiro pai costumava ser. Ele assentou-se à
mesa, e Joaninha tinha uma ceia bem quente no lar, coisa que nunca lhe tinha
lembrado, porque também a avó nunca pensava nisso, e o pai batia-lhes no
ombro, o que ele nunca tinha feito, e começou a falar da mãe que Deus tinha
levado para si, e que também cuidava muito d'ele; e tudo isso encantava tanto
Joaninha e Tomé que não tinham vontade de tirar os olhos do vidro: mas a avó
chamou por eles para se deitarem.
Na manhã seguinte começaram Tomé e Joaninha a viver uma vida muito
diferente. Joaninha limpava e espanava, punha tudo em ordem e lavava a
janela, de maneira que a avó, a quem aquilo parecia um sonho, perguntava:
Então isto agora é uma igreja? — Como ainda não era tempo de flores, Tomé
levou do bosque alguns ramos verdes de faia, com os quais adornou muito
bem a sala. Depois ajudaram de boa vontade a avó a fazer o almoço, coisa que
nunca tinham feito, e quando o comeram soube-lhes melhor do que nos outros
dias. Depois assentou-se Joaninha com a roca ao pé da avó, e Tomé subiu a
uma cadeira e abriu a Bíblia, que estava cheia de pó como a que viram pelo
vidro, e começou a soletrar. A avó escutou com muita atenção, e quando ele
começou a ler correntemente e ela ouviu pela primeira vez da boca de seu neto
a palavra de Deus, o seu coração cheio de anos sentiu-se mais novo, e ela
ergueu as mãos ao céu, e não tirava de Tomé os seus olhos arrasados de
lagrimas de alegria. Tomé ficou muito contente vendo o efeito da sua leitura e
lia cada vez com mais fogo, e Joaninha escutava e fiava e não reparava como a
manhã se passava depressa, até que a avó, que tinha o relógio na cabeça, se
levantou para cozer as batatas. Então levantou-se Tomé e disse: Espere,
avozinha, que eu ajudo-a.
Foram ambos os netos tirar água ao poço e a avó não cabia em si de
alegria. Nunca tinham comido tão boas batatas. De tarde lembrou-lhes cantar,
e começaram baixinho, e depois foram subindo a voz, e a avó escutava ao
principio como se sonhasse, e sorria com um contentamento como há muitos
anos não tinha tido.
Como passaram satisfeitos até que o pai chegou! E como ele se mostrou
admirado d'aqueles cuidados que via nos filhos e que nunca mais vira desde
que sua mulher fora para a sepultura. Aqueceu-se com o fato que eles lhe
deram, e encantado com aquelas meiguices dos meninos começou a contar
muitas coisas da sua querida Margarida que estava no céu. A avó escutava
com grande alegria e de tempos a tempos dizia alguma coisa. Antes de irem
deitar-se disse ela ao pai: Tu deves ver como Tomé lê bem.
E foi buscar o seu velho livro de orações da noite. O pai, que já há muitos
anos não se lembrava de orações, escutou com viva alegria, e a voz de Tomé
levava-lhe as santas palavras ao coração, que se abria para Deus. Quando
Tomé fechou o livro, ergueu o pai as mãos ao céu e rezou.
Tomé e Joaninha nunca dormiram um sono tão doce como n'essa noite.
Depois a mocidade foi passando, mas as boas obras davam alegria ao
coração, o bom anjo da oração tinha entrado em casa, e fazia d'aquela
sossegada choupaninha um templo da paz e do amor.
Os meninos não tinham desejos de tornar a olhar para o espelho do anão,
porque entendiam que não lhes podia mostrar coisas melhores do que aquela
sua vida caseira, principalmente quando veio a branda primavera, e eles
pensaram como haviam de dar alegria à sua casinha no próximo inverno.
Disseram-me que Tomé, passados anos, quando o pai e a avó já eram
mortos, tinham corrido algumas terras, e veio a ser um hábil e robusto
carpinteiro que ajudou a construir muito bonitas casas e fez para si uma
casinha muito aprazível. Joaninha tinha ido para casa do padrinho, e veio a ser
uma menina muito prendada e depois uma esperta aldeã e boa mãe de filhos
saudáveis.
Os dois irmãos viveram sempre contentes com a sorte que Deus lhes deu,
e quando viam de longe casas ricas, ou ricos vestidos ou custosas gulodices,
diziam consigo: Aquilo talvez seja de um pobre príncipe, ou de algum menino
de mau gênio ou de alguma Ema doente.
O CASTELO ENCANTADO
OU
O MONTE DO CASTELO DAS FADAS
TRADIÇÃO PRUSSIANA
Ao pé do rio Memer, e não longe da cidade de Tilsit, levanta-se um
monte alto e redondo que se chama o monte do castelo. Há muitos e muitos
anos houve ali um grande castelo, como ainda hoje se pode ver pelas ruínas
das paredes, e por um fosso muito fundo e duas linhas de muralhas que estão
de redor. A quem pertence e quem agora lá mora, é coisa de que ninguém sabe
dar noticia, mas corre na terra uma tradição que reza que ele se aluiu de
repente, e ainda hoje se mostra no cume do monte, mesmo no meio d'ele, um
largo e escuro boqueirão, cujo fundo ainda ninguém pôde achar com cordas:
diz-se que deve ter sido a chaminé do antigo castelo. Nesses muros derribados
reza a mesma tradição que é guardado um Tesouro imenso por um porteiro,
velhinho de cabelos brancos, que já tem sido visto muitas vezes pelos
viajantes que sobem ao monte, e que ninguém até hoje tem podido ir
aproveitar-se d'ele.
Um dia andavam muitos rapazes de uma aldeia próxima de Tilsit a
pastorear gado no monte do castelo. O dia ia em mais de meio, o sol queimava
e os rapazes deitaram-se à sombra de um rosal bravo e puseram-se a contar
histórias. Entre outras coisas falaram no muito ouro que estava no monte por
debaixo d'eles, e mostraram desejos de que lhes aparecesse o porteiro do
castelo para irem atrás d'ele e deitarem mão ao Tesouro. Mas mostravam esse
animo por ser dia claro, porque nenhum d'eles era capaz de se deixar ficar só
no monte do castelo depois de escurecer.
— Sim, dizia o mais novo, fazia-me boa conta o ouro, e ainda mais a
minha mãe que está velha, corcovada e trôpega e ainda se assenta à roda de
fiar, ganhando assim com muito trabalho mas honestamente o escasso pão de
cada dia; que alegria não seria a d'ela se eu pudesse levar-lhe para casa uma
boa mão cheia de dinheiro! Mas eu não quero nada com o tal fantasma do
homem pequenino.
— Tolo! disseram os outros, ele não faz mal a ninguém; provavelmente
descansaria e não lhe seria preciso andar a vaguear pelo monte, se alguém
achasse o Tesouro, porque então não teria mais que guardar.
Assim palravam eles até que um se lembrou de irem todos ao boqueirão e
atirarem pedras para baixo. Mas por maiores que fossem as pedras que
arrastassem até ao buraco e lançassem dentro, não ouviam cair nenhuma no
fundo.
— Se houvesse uma corda bem comprida, disse Fernando que era o mais
velho, e rapaz forte e animoso, poderia um de nós descer um bom pedaço, e
ver se acharia alguma porta ou coisa semelhante que fosse dar onde está o
ouro.
— Em casa de meu amo, disse outro, há um poço, e está uma corda no
guindaste que com certeza é duas vezes tão comprida como este monte.
Querem que a vá buscar? Em casa não está agora ninguém porque meu amo e
minha ama saíram para longe para um batizado.
A proposta foi bem recebida por todos, menos pelo pequeno Teófilo.
— Nós, disse Fernando com os olhos afogueados, podemos talvez ser
ricos com pouco custo, não precisando mais de guardar gado pelo ardor do
sol; podemos mesmo comprar casa e campos e ter moços para o gado, se
enchermos bem os bolsos lá em baixo. Vai buscar a corda, depois tiraremos à
sorte quem há de descer à cova; os outros ficarão a segurar a corda em cima, e
o que descer será içado logo que dê sinal puxando por ela.
Todos estavam muito contentes, menos o pequeno Teófilo, que como
medroso se opunha àquela resolução, mas foi escarnecido pelos camaradas.
Quando chegou a corda e foram lançadas as sortes, a quem tocou a vez foi
justamente ao timorato Teófilo, que bem fugiria d'ali para longe se os
camaradas não o segurassem e não o atassem à força com a corda. Gritando e
bracejando, com grandes risadas dos companheiros foi lançado no boqueirão
redondo e descido devagar. A ponta da corda foi atada com muita segurança
ao tronco de uma árvore, e pouco a pouco foram os rapazes deixando ir cada
vez mais para o fundo o seu pequeno camarada. Passados alguns minutos
curvaram-se na borda do buraco e disseram: «Que vês lá embaixo, Teófilo?»
Mas Teófilo só pedia que o puxassem para fora.
A final já não se entendia o que ele dizia: a corda, que era mais comprida
do que a altura da torre da igreja de Tilsit, estava já a chegar ao fim, e ainda se
sentia retesada e pesada, sinal certo de que Teófilo ainda não tinha chegado ao
fundo. Mas de repente viu-se que estava bamba. Os moços do gado deram
gritos de alegria, vendo que por fim estava Teófilo em terra firme: estenderam
meio corpo por sobre a borda do boqueirão; chamaram e puseram-se a escutar,
mas o silencio era de mortos. Assim esperaram muito tempo, uma hora e ainda
mais; agora, diziam eles, já Teófilo tem tido tempo de ver tudo e de encher os
bolsos com ouro e prata. Puxaram a corda para cima, mas a corda não trazia
nada. Como esperassem ainda uma hora e outra hora sem que a corda
trouxesse alguma coisa acima, começaram a afligir-se e a inquietar-se. Depois
correram muito pesarosos à aldeia, e com medo de castigo disseram à velha
mãe doente do seu camarada perdido que Teófilo tinha trepado sozinho às
ruínas do monte do castelo e de repente tinha desaparecido.
Foi grande a angustia da pobre mãe do rapaz, cuja alegria única era o seu
Teófilo. Chorou e gemeu toda a noite, não houve sono que lhe fechasse os
olhos, e bem quisera ela morrer para ir ter com seu filho ao céu, porque ele de
certo tinha caído no fundo do boqueirão do monte do castelo, e lá estava
despedaçado e morto.
Quando na manhã seguinte Fernando e os outros moços do gado levavam
outra vez os rebanhos para o pasto da véspera, ainda aflitos pelo que tinha
acontecido, correu Teófilo ao encontro d'eles na raiz do monte. Todos os seus
bolsos, e o barrete, e mesmo as mãos, estavam cheias de ouro, e ele com
grande alegria contou aos camaradas como tudo lhe tinha corrido bem. Disse
ele:
— Logo que me senti em chão firme e que me desatei da corda, vi uma
porta diante de mim e por ela entrei em uma cozinha muito grande. Ardia no
lar uma grande fogueira que não fazia fumo nenhum, e em toda a parte não se
via senão coisas de ouro e de prata. De repente veio direito a mim um
velhinho pequeno, pegou-me na mão com muito bons modos e me disse que
não tivesse medo porque me assegurava que não havia ali ninguém que me
fizesse mal. Então perdi o medo, e atravessei com o bom velho muitas salas
cada vez mais bonitas, onde havia montes de ouro. Então deu-me o castelão
diferentes iguarias muito boas para comer, e mostrou-me uma cama em que eu
podia dormir. O vinho muito doce que bebi pesou-me na cabeça, e eu dormi
como um morto até que o mesmo velho pequenino me foi acordar. Então
encheu-me de ouro o barrete e os bolsos tanto quanto podiam levar, e disseme: «Guarda isto em lembrança do porteiro do castelo e trata de tua velha
mãe.» E pegando-me em uma mão, abriu uma porta pequena, e quando pus os
pés fora, vi o céu azul e o sol da manhã, e ouvi o sino da aldeia que tocava às
ave-marias. Ele não saiu, disse-me adeus com a mão, e desapareceu. A porta
por onde tinha saído não a tornei a ver. Graças a Deus, tudo foi bem até ao
fim. Como minha mãe vai ficar contente!
E Teófilo correu logo à aldeia, sem dar mais ouvidos aos seus camaradas
que bem queriam ouvir contar mais alguma coisa.
— Agora, disseram eles uns para os outros quando viram as grandes
riquezas com que Teófilo apareceu, devemos ir também ao bom porteiro velho
e trazer alguma coisa do seu Tesouro. Vamos ver a quem por sorte caberá a
vez de ir lá abaixo.
— Para que há de ser à sorte? disse Fernando; eu sou o mais velho de
todos, e hei de ser o primeiro a descer. A quem não estiver pelo que digo,
provarei que está do meu lado o direito do mais forte.
Os camaradas resmungaram, mas não se atreveram a resistir ao robusto
rapaz, e por isso foi Fernando descido ao boqueirão, depois de ter primeiro
tirado o seu pão da sacola pastoril, para ter onde deitar muito ouro que
esperava receber do porteiro do arruinado castelo. De novo se mostrou a corda
retesada quase até ao fim, e os outros a colheram sem que trouxesse nada, mas
não esperaram que o camarada saísse para fora n'aquele mesmo dia, porque
sabiam que ele tinha lá em baixo boas coisas para comer e uma cama bem fofa
para passar a noite, e que lhes apareceria de manhã muito alegre, como o
pequeno Teófilo, ao pé do monte. A ausência de Fernando foi pouco notada na
aldeia; os companheiros levaram-lhe a casa o gado, e ele não tinha uma mãe
que o chorasse.
Na manhã seguinte todos os outros cheios de impaciência saíram com o
gado mais cedo do que costumavam, mas não encontraram Fernando.
Esperaram um pouco, depois correram ao alto do monte, deitaram a corda ao
boqueirão, e inquietos chamaram o camarada pelo nome. Mas não houve
resposta. Depois ninguém tornou a ver Fernando, nem apareceu ninguém que
tivesse animo para descer ao fundo do monte do castelo, e apanhar o Tesouro
que lá está enterrado.
GRATIDÃO DE UM FILHO
E
INGRATIDÃO DE OUTRO
(Hebel)
Quem reparar um pouco, há de ver muitas vezes que o homem na velhice
é tratado por seus filhos exatamente do mesmo modo, como ele havia tratado
seus pais, quando eram velhos e já sem forças. E isto compreende-se bem. Os
filhos aprendem com os pais; não veem nem ouvem mais ninguém, e por isso
seguem o seu exemplo. Assim se verifica naturalmente o que tantas vezes se
diz, e está escrito: «a bênção e a maldição dos pais vem cair sobre os filhos.»
Ouçamos agora duas histórias que se contam a propósito d'isto: a
primeira é digna de imitação; a segunda merece ser muito meditada.
Uma vez um certo príncipe foi dar um passeio a cavalo, encontrou-se
com um camponês diligente e alegre, que andava a trabalhar em um campo, e
pôs-se a conversar com ele.
Dali a alguns dias soube o príncipe que o campo não era propriedade
d'aquele homem, o qual não passava d'um jornaleiro que pela módica quantia
de três tostões por dia cuidava do seu amanho. O príncipe, que para os pesados
encargos do governo precisava de enormíssimas somas, não podia
compreender como três tostões diários eram meios bastantes para o nosso
homem viver, e de mais a mais de rosto tão alegre. Este porém respondeu-lhe:
«Nada me faltaria, se eu pudesse dispor de todo esse dinheiro: a terça parte
chega-me bem; com um terço pago as minhas dividas e a terça parte restante
pertence às minhas economias.» O bom do príncipe ficou ainda mais
admirado. Mas o camponês continuou: «O que tenho, reparto-o com meus
pais, que são velhos e já não podem trabalhar, e com meus filhos, que andam
por ora a aprender; àqueles pago-lhes o amor com que me tratarão na minha
infância, e d'estes espero que não me abandonarão também na minha cansada
velhice.» Não é verdade que tudo isto foi muito bem dito, é ainda melhor
pensado, e ainda muito melhor executado? O príncipe recompensou aquele
homem de bem, olhou com desvelo pelos filhos, e a benção que os pais lhe
lançaram ao morrer, foi-lhe retribuída pelos filhos agradecidos com amor e
amparo.
Havia porém outro homem que tratava tão mal seu pai, a quem a idade e
as doenças tinham na verdade tornado impertinente, que o velhinho mostrou
desejos de entrar em um hospital de pobres, que havia na mesma aldeia. Ali
esperava ele, apesar do pouco afeto, pelo menos ver-se livre das repreensões
que em casa lhe amarguravam os últimos dias da vida. O filho ingrato saltou
de contente apenas soube dos desejos do pobre velho, e ainda antes de o sol se
esconder por detrás das montanhas visinhas, já eles estavam satisfeitos. Mas
no hospital não encontrou ele tudo quanto desejava, e passado algum tempo
pediu ao filho, como último favor, que lhe mandasse dois lençóis, para não ter
de dormir toda a noite na palha estreme. Procurou este os piores que tinha, e
chamando seu filho, crianças de dez anos, ordenou-lhe que os levasse ao
hospital.
Ficou porém admirado ao ver que o pequeno escondia a um canto um dos
lençóis e só levava ao avô o outro; e apenas ele veio, perguntou-lhe porque
tinha feito aquilo. O filho respondeu friamente que tinha guardado um dos
lençóis para o dar ao pai, quando mais tarde o mandasse para o hospital.
Que lição tiramos d'aqui? Honra teu pai e tua mãe, para que sejas feliz.
O CHAPELINHO VERMELHO
OU
A FADA E O LOBO
Era uma vez uma rapariguinha da aldeia, a mais bonita que podia haver:
sua mãe adorava-a, e sua avó, que era a Fada dos jasmins, ainda mais. Esta
boa mulher deu-lhe de presente um chapelinho vermelho, que lhe ficava tão
bem, que a chamaram o Chapelinho Vermelho.
Um dia sua mãe, tendo feito alguns bolos, disse-lhe: — Vae ver como
está tua avó, pois que me disseram que ela estava doente; leva-lhe este bolo e
este pote de manteiga. O Chapelinho Vermelho partiu logo para casa de sua
avó, que morava n'outra aldeia. Passando n'um bosque, encontrou um lobo
com cara de gente, que tinha boa vontade de a comer; mas não ousou fazê-lo,
por temor de alguns carvoeiros que estavam na floresta. Perguntou-lhe onde
ela ia; e a pobre pequena, que não sabia que era perigoso dar atenção a um
lobo, respondeu: — Vou ver minha avó, e levar-lhe um bolo com um pote de
manteiga, que minha mãe lhe manda. — Ela mora muito longe? perguntou o
lobo. — Não, senhor, respondeu o Chapelinho, é além d'aquele moinho, que
você vê lá ao longe, na primeira casa da aldeia. — Pois bem, disse o lobo, eu
também quero ir vê-la, vou por este caminho, tu irás por aquele, e veremos
quem chega lá primeiro. O lobo pôs-se a correr a toda a pressa pelo caminho
mais curto; e a pequenina foi pelo caminho mais comprido, divertindo-se a
colher avelãs, a correr atrás das borboletas, e a fazer ramalhetes das flores que
via. O lobo não tardou muito a chegar a casa da avó, e bateu à porta: truz, truz,
mas ninguém respondeu, porque a Fada dos jasmins, sabendo quem era, quis
fazê-lo persuadir que não havia gente em casa.
Tendo o lobo batido mais duas vezes, sem que lhe respondessem, supôs
que a avó do Chapelinho Vermelho havia saído, e resolveu entrar na casa, para
esperar as duas e comê-las. Assim resolvido, levantou a aldrava, e abrindo-se
a porta, entrou na casa, onde não viu ninguém; porque a Fada se havia
escondido em um armário, que estava à cabeceira da cama, d'onde via e
observava tudo. O lobo deu duas voltas pela casa, e, vendo-a sozinha, fechou a
porta com a aldrava e foi deitar-se na cama da avó, à espera da primeira que
aparecesse. Pouco tempo depois chegou o Chapelinho Vermelho, que bateu à
porta: truz, truz, — Quem está aí? — O Chapelinho Vermelho, que ouviu a
voz grossa do lobo, teve medo ao principio; mas pensando que sua avó estava
rouca, respondeu: — É sua neta Chapelinho Vermelho, que lhe traz um bolo e
um potesinho de manteiga, que minha mãe lhe manda. O lobo gritou-lhe,
amaciando a voz: — Levanta a aldrava. A pequenina levantou a aldrava, e a
porta abriu-se. O lobo, vendo-a entrar, lhe disse, escondendo a cabeça debaixo
dos lençóis: — Põe o bolo e o potesinho de manteiga em cima da mesa, e
vem-te deitar comigo. O Chapelinho Vermelho foi-se meter na cama; mas
ficou muito admirada de ver sua avó despida. A pequenina lhe disse: — Ó
minha avó! como os seus braços são compridos! — É para melhor te abraçar,
minha neta. — Ó minha avó! como as suas pernas são grandes! — É para
correr melhor, minha neta. — Minha avó! as suas orelhas são bem compridas!
— É para escutar melhor, minha neta. — Minha avó! que olhos tem tão
grandes! — É para ver melhor, minha neta. — Minha avó! para que tem
dentes tamanhos!? — É para te comer. E dizendo estas palavras, este mau
lobo lançou-se sobre Chapelinho Vermelho para comê-la; mas estacou de
repente, ficando sem movimento, porque a Fada, saindo do esconderijo, lhe
tocou com a sua varinha de condão. O Chapelinho Vermelho deu um grito de
alegria ao ver sua avó, que tirou a netinha de ao pé do lobo, mais morta que
viva, pelo susto que tivera. Então disse a Fada para a netinha: — Que castigo
se há de dar àquele malvado lobo, que te queria devorar? — Dê-lhe, minha
avozinha, o castigo que quiser, respondeu o Chapelinho Vermelho. — Pois
então vae para a janela, que verás o que nunca viste. Estando o Chapelinho
Vermelho à janela, viu sair de casa o lobo, todo coberto de busca-pés (é d'este
tempo que data o descobrimento da pólvora) desde a ponta do rabo até à do
focinho, e ouviu dizer a sua avó: — Vae, malvado, correndo por aí fora até
que vás apagar o fogo no poço do moinho, onde morrerás afogado. Isto dito,
começaram os busca-pés a arder, dando tiros tão medonhos, que o lobo fugiu
espavorido, e julgando apagar o fogo com água, foi lançar-se ao rio, que corria
perto, afogando-se justamente no poço do moinho, que desde então ficou
sendo o poço do lobo.
Depois d'isto disse a Fada para o Chapelinho Vermelho: — hás de
prometer-me que de hoje em diante, quando tua mãe te mandar a algum
recado, não te hás de demorar pelo caminho, nem conversar com quem não
conheces, dizendo-lhe o que vais fazer; e se assim o fizeres, dou-te por dom
que serás mui formosa e casarás com um grande fidalgo.
E assim foi: pois crescendo o Chapelinho Vermelho, fez-se tão discreta e
tão formosa, que foi pedida em casamento por um grande fidalgo da
vizinhança, com o qual casou e viveu muito feliz.
O FATO NOVO DO REI
(Anderson)
Era uma vez um rei que gostava tanto de roupas novas, que empregava
em se vestir todo o dinheiro que tinha.
Se passava revista aos seus soldados, se aparecia nos espetáculos ou
passeios públicos, não tinha outro fim em vista que não fosse mostrar como ia
vestido. Era um fato para cada hora do dia; de maneira que assim como é
costume dizer-se de qualquer rei: «Sua majestade está em conselho de
ministros», a respeito d'este dizia-se: «Sua majestade está no seu guardaroupa».
A capital em que ele vivia, era uma cidade alegre, principalmente pelo
grande numero de estrangeiros que ali concorriam. Um dia chegaram àquela
cidade dois impostores que se anunciaram como tecelões, dizendo que sabiam
tecer um pano como nunca se vira. Era um estofo notável, não só pela beleza
das cores e do desenho, mas sobretudo porque tinha a maravilhosa qualidade
de se tornar invisível para quem não exercesse, como devia, o seu emprego, ou
fosse demasiadamente estúpido.
— Uma roupa d'esse pano deve ser impagável — disse consigo o rei; —
por meio d'ela chegarei a conhecer quais são os homens incapazes do meu
reino, e poderei distinguir os inteligentes dos estúpidos. Um fato assim é uma
coisa indispensável. — Em seguida mandou adiantar aos homens muito
dinheiro para poderem desde logo dar começo à obra.
Os aventureiros armaram efetivamente dois teares e puseram-se a fingir
que trabalhavam, embora nas lançadeiras não houvesse nem sombra de fiado.
A cada passo estavam a pedir seda da mais fina e ouro do melhor quilate, que
iam ensacando, sem todavia deixarem de trabalhar nos teares vazios até alta
noite.
Passado algum tempo, lembrou-se o rei de sair para ver em que altura ia
o artefato. Sentiu-se porém seriamente embaraçado, quando se recordou de
que o estofo não podia ser visto por quem fosse tolo ou não exercesse
condignamente o seu mister. Não era porque duvidasse de si; em todo o caso
julgou prudente, pelo sim, pelo não, mandar adiante alguém que examinasse o
estofo. Toda a cidade sabia da qualidade maravilhosa que ele tinha; cada um
estava ansioso por saber se o seu vizinho era idiota ou inábil.
— Vou mandar o meu velho e honrado ministro, — disse consigo o rei.
— Ninguém, como ele, para avaliar a obra, porque alem de ser um homem
fino, é irrepreensível no desempenho das suas funções.
O ministro entrou na sala onde trabalhavam os dois impostores, e
arregalando muito os olhos, disse de si para si: — Meu Deus, não vejo nada!
— Mas, nem palavra. Os dois tecelões pediram-lhe que se aproximasse, e
perguntaram que tal achava o desenho, e se as cores eram ou não magníficas.
Ao mesmo tempo apontavam-lhe para os teares, onde o velho ministro tinha
os olhos pregados, mas onde não via nada, pela simples razão de não haver lá
nada que ver.
— Pois na realidade, serei eu também um asno? — perguntava ele a si
mesmo. — É preciso que ninguém o suspeite. Serei eu incapaz de exercer o
meu cargo? Não! não darei a saber a ninguém que não vi o tecido.
— Então, que dizeis? — perguntou um dos tecelões.
— Admirável, é uma coisa surpreendente! — respondeu o ministro,
pondo os óculos — Este desenho, estas cores... vou imediatamente participar
ao rei que fiquei satisfeitíssimo.
— Isso é uma grande honra para nós, — disseram os dois tecelões, e
começarão a chamar-lhe a atenção sobre as cores e desenhos imaginários, aos
quais eles tinham o cuidado de ir dando um nome. O ministro ouviu
atentamente, para repetir diante do rei tudo quanto eles diziam.
Alguns dias depois o rei mandou outro funcionário honesto examinar o
estofo e ver se estava pronto. Aconteceu a este o que tinha acontecido já ao
ministro: por mais que olhasse, não via nada.
— Não é verdade que isto é um tecido admirável? — perguntavam os
dois impostores, e iam mostrando as cores e desenhos que não existiam.
— Pois eu não sou tolo! — pensava o homem. — Dar-se-á o caso que eu
não seja digno de exercer o meu emprego? Isso é singular; mas eu farei por o
não perder. — E em seguida elogiou muito o tecido, e louvou sobretudo a
escolha das cores e do desenho. Foi dizer ao rei que o estofo era magnífico, e
d'aí a pouco não havia ninguém que não falasse nele.
Por último quis o rei ir vê-lo pessoalmente, enquanto estava ainda no
tear, e acompanhado d'um grande séquito de pessoas escolhidas, entre as quais
se encontravam os dois funcionários honestos, dirigiu-se ao lugar onde os dois
trapaceiros continuavam a trabalhar com todo o cuidado, mas sem fio de seda
ou de ouro, nem espécie de fiado algum.
— Então não é excelente? — perguntaram os dois ministros. — O
desenho e as cores são dignas de vossa majestade. — E apontavam para os
teares vazios, como se os outros pudessem ver aí alguma coisa.
— Que é isto? — disse consigo o rei — eu não vejo nada. Acaso serei eu
imbecil?! Não serei digno de ser rei? Esta é a maior infelicidade que me podia
acontecer. — Depois exclamou de repente: — Magnífico! Declaro-me
completamente satisfeito.
Abanou a cabeça em sinal de aprovação, e contemplou o tear sem se
atrever a dizer a verdade. Todos os do séquito contemplarão também, sem
contudo nada verem, e disseram com o rei: — É magnífico! — Depois
aconselharam-no que estreasse o fato novo numa procissão que devia sair d'aí
a pouco. — É magnífico! admirável! excelente! — diziam todos a uma; e a
alegria era indescritível.
Os dois impostores foram condecorados, e receberam o título de tecelões
da casa real. Na véspera da procissão trabalharão toda a noite à luz de
dezesseis velas.
A final fingirão tirar a peça do tear; cortaram, no ar, com grandes
tesouras; coserão com agulhas desenfiadas, e depois de tudo isto disseram que
estava pronto o fato.
Veio o rei em pessoa, acompanhado dos seus ajudantes de campo, e os
dois trapaceiros com os braços levantados como se segurassem alguma coisa,
disseram: — Aqui tem vossa majestade a calça, a casaca e o manto. Tudo isto
é leve como uma teia de aranha. Há de parecer a vossa majestade que não traz
nada sobre o corpo, mas é justamente nisto que está a principal qualidade do
tecido.
— É verdade, — responderam os ajudantes de campo, mas sem verem
nada.
Em seguida os tecelões pedirão ao rei que se colocasse diante d'um
espelho, a fim de lhe provarem o fato, e depois de o despirem todo, fingirão
que lhe vestiam uma por uma as diferentes peças. O rei ia-se mirando e
remirando ao espelho.
— Que bem lhe fica! que bem talhado! — exclamavam todos os
cortesãos. — Que desenhos! E as cores? É um fato precioso!
— Está lá fora o palio, debaixo do qual vossa majestade tem de ir na
procissão, — disse o mestre de cerimônias.
— Bom, eu estou pronto — respondeu o rei; — penso que assim não vou
mal. — E viu-se ainda uma vez ao espelho, para contemplar o esplendor em
que ia.
Os caudatários apalparam o chão, como se quisessem levantar a cauda do
manto, e caminharam com os braços estendidos como se segurassem alguma
coisa, não querendo dar a entender que não viam nada.
Assim caminhava o rei debaixo do magnífico palio, e toda a gente da rua
e das janelas exclamava: — Que sumptuoso vestido! que bela cauda tem o
manto! o feitio é irrepreensível! — Ninguém queria dar a conhecer que não
via nada, para não ser taxado de estúpido ou incapaz de exercer o seu
emprego. Nunca fato algum do rei tinha dado tanto na vista.
— Mas o rei vae nu; — gritou uma criancinha.
— Meu Deus! escutai a voz da inocência — disse o pai.
Imediatamente correu por toda a multidão, que uma criança dissera que o
rei ia nu; e a final exclamaram todos a uma: — O rei vae nu!
Este sentiu-se extremamente mortificado, porque lhe parecia que tinha
razão; mas cobrou animo e disse consigo: — Seja o que for, é indispensável
que eu fique até ao fim. — Depois tomou uns ares ainda mais majestosos, e os
caudatários continuarão a segurar, com todo o respeito, a cauda que não
existia.
AS FADAS
OU
A MENINA BEM CRIADA
Era uma vez uma viúva, que tinha duas filhas; a mais velha parecia-se
tanto no gênio e na cara com a mãe, que quem via uma, via a outra. Ambas
eram tão orgulhosas e tão desagradáveis, que se não podia viver com elas. A
mais moça, que era o retrato de seu pai, pela bondade, era ao mesmo tempo
uma das mais lindas raparigas que se podiam ver. Como naturalmente se ama
o seu semelhante, esta mãe era doida por sua filha mais velha, e ao mesmo
tempo tinha uma forte aversão para a mais nova, que mandava comer na
cozinha, e trabalhar continuamente.
Entre outras coisas era preciso que esta menina fosse duas vezes por dia
buscar, a uma meia légua grande de sua casa, um grande cântaro cheio de
água. Um dia, que a infeliz criança estava n'esta fonte, chegou-se a ela uma
pobre mulher, e lhe pediu que a deixasse beber. — Pois não! minha senhora,
disse esta bela menina; e dizendo estas palavras, tomou água no melhor sítio
da fonte, e lha apresentou, sustendo o seu cântaro, para que ela pudesse beber
mais facilmente. A boa mulher, tendo bebido, lhe disse: — A menina é tão
bonita, tão boa, é tão bem criada, que não posso deixar de lhe fazer um dom.
(Era uma Fada, que tinha tomado figura de uma pobre aldeã, para ver até onde
iria a boa educação desta menina.) Eu dou-lhe por dom, continuou a fada, que
a cada palavra que disser, sair-lhe-á da boca uma flor e uma pedra preciosa.
Quando esta boa menina chegou a casa, a mãe ralhou-lhe por haver tardado
tanto tempo. — Perdoe-me, minha mãe, por ter tardado. E dizendo estas
palavras, deitou pela boca duas rosas, duas perolas, e três bons diamantes. —
Que é isto? disse a mãe, admirada. Quem te deu isto, minha filha? (Era a
primeira vez que a tratava por sua filha.) A pobre menina contou-lhe tudo o
que lhe tinha acontecido, não sem deitar pela boca uma infinidade de
diamantes. — Realmente, disse a mãe, vou mandar lá tua irmã. Vem cá,
Mariquinhas, vem ver o que sai da boca de tua irmã quando ela fala; queres tu
ter o mesmo dom? Vae buscar água à fonte, e quando uma pobre mulher te
pedir de beber, dá-lha com muita civilidade. — Pois não! respondeu a
malcriada; eu ir à fonte! — Quero que lá vás, disse a mãe, e já. Maria foi, mas
resmungando. Pegou no mais bonito jarro de prata que havia na casa, e chegou
à fonte. Viu logo sair da floresta uma dama magnificamente vestida, que lhe
pediu água para beber. Era a mesma Fada que tinha aparecido a sua irmã, mas
que tinha tomado a figura e os vestidos de uma princesa, para ver até onde iria
a má criação d'esta rapariga. Porventura eu vim cá para lhe dar de beber? disse
a malcriada orgulhosa. Era o que me faltava trazer eu um jarro de prata para
dar de beber à senhora: ora beba na fonte, se quiser. — Sois bem pouco
política! replicou a Fada, sem se encolerizar. Pois bem, já que é tão malcriada
dou-lhe por dom, que a cada palavra que disser, sair-lhe-á da boca uma
serpente e um sapo. Voltou a casa, e sua mãe gritou: — Minha filha! minha
filha! então que há? — Nada, minha mãe! respondeu ela, deitando pela boca
duas serpentes e um sapo. — Oh céus! exclamou a mãe; que vejo! É tua irmã
que tem a culpa; há de pagar-mo. E dizendo estas palavras, correu a ela para
lhe bater.
A pobre menina fugiu para a floresta visinha. O filho do rei, que voltava
da caça, encontrou-a, e vendo-a tão linda, perguntou-lhe o que ela fazia ali
sozinha, e porque chorava! — Oh! meu senhor, é porque minha mãe pôs-me
fora de casa. O filho do rei, que viu sair-lhe da boca seis perola e seis
diamantes, pediu-lhe que lhe dissesse d'onde isto vinha. Ela contou toda a sua
história. O filho do rei ficou namorado d'ela; e considerando que um tal dom
valia mais que tudo o que se podia dar em dote a uma princesa, levou-a para o
palácio de el-rei seu pai, onde casou com ela. Sua irmã fez-se aborrecer tanto,
que sua própria mãe a pôs fora de casa; e esta desgraçada, depois de ter
corrido bastante sem achar ninguém que quisesse recolhê-la, morreu no meio
de um bosque.
A RAPARIGUINHA DOS LUMES PRONTOS
(Andersen — tradução de José Joaquim Rodrigues de Freitas)
Estava horrivelmente frio, geava, e era quase noite escura, a última do
ano.
Estava assim escuro e frio, quando caminhava pela rua uma rapariguinha
com os pés nus e a cabeça descoberta. Tinha calçado chinelas ao sair de casa,
mas de que lhe servirão? Eram muito grandes, e tanto, que a mãe as tinha
usado até então; demais, a pequena perdeu-as ao atravessar à pressa uma rua,
fugindo de dois carros que rodavam com velocidade de pôr medo. Uma das
chinelas não a pôde tornar a achar; e a outra apanhou-a um rapaz, e lá foi a
correr com ela; até se lembrou que lhe serviria de berço, caso viesse a ter
filhos.
Assim caminhou a rapariguinha com os pesinhos nus e roxos de frio.
Trazia num avental velho uma porção de lumes prontos, e na mão um maço
d'eles. Ninguém lhe comprara nada todo o dia, ninguém lhe fizera presente de
cinco réis.
Imagem da miséria, a pobre pequena ia-se arrastando a tremer de frio e
fome!
Os flocos de neve cobriam-lhe o cabelo comprido e louro, que em
formosos anéis lhe caía pelo colo abaixo; mas, em verdade, n'isto pensava ela!
De todas as janelas brilhavam luzes; e vinha de lá um delicioso cheiro a
ganso assado; era a noite de S. Silvestre; e n'isto pensava ela!
A um canto formado por duas casas, uma das quais era mais saliente do
que a outra, sentou-se ela, e, como pôde, conchegou-se; meteu bem para
dentro os pesinhos, mas ainda mais lhe arrefecerão; e não ousava ir para casa
por não ter vendido fósforos, nem arranjado dinheiro.
Bem sabia que o pai lhe havia de bater, e em casa também estava frio;
cobria-a só o telhado, pelo qual o vento assobiava, ainda quando se tapavam
os buracos maiores com palha e farrapos.
O frio quase lhe não deixava mover as mãos.
Ah! um lume pronto podia fazer-lhe bem; se tirasse um do molho, se o
acendesse na parede, e se aquecesse a ele os dedos!
Tirou um. Zahs! Como cintilava, como ardia! Era uma chama quente e
brilhante, era uma luzinha; pôs sobre ela as mãos, era uma luzinha
maravilhosa. À rapariguinha pareceu que estava diante de um grande fogão de
ferro todo guarnecido de latão polido. Abençoado fogo, que tão bem aquecia!
Mas a chamasinha apaga-se, o fogão desaparece, ficaram-lhe na mão só os
restos do lume pronto que ardera.
Acendeu outro na parede, este alumiava e tornava transparentes como um
véu os lugares da parede em que os seus raios incidiam: podia assim ver para
dentro da sala.
A mesa tinha uma toalha branca de neve, sobre a qual luzia louça de
porcelana; o ganso assado, cheio de maçãs e ameixas secas, exalava deliciosos
vapores. E o que ainda era mais belo: o ganso saltava do prato abaixo,
cambaleava pelo chão adiante, e vinha até à pobre criança, trazendo no peito a
faca e o garfo.
Lá se apagou o lume pronto, e só ficou a parede, espessa, fria e úmida.
Ela acendeu ainda um fósforo. E eis que lhe pareceu estar sob a
majestosa árvore do Natal, ainda maior e mais adornada, que a outra que vira
ao través da janela da casa d'um rico negociante. Milhares de luzes ardiam nos
ramos verdes; e imagens variegadas, como numa vitrina, olhavam para a
rapariga. A pequena estendeu para elas as mãos; e eis que se apagou o lume
pronto.
As luzes do Natal subirão mais e mais; pareciam-lhe estrelas no céu; uma
d'elas caiu formando longo rasto luminoso.
Alguém que morre, disse consigo a rapariguinha; porque a avó, única que
lhe tivera amor, e que já era falecida, lhe contara que uma alma sobe para
Deus, quando uma estrela cai para a terra.
Acendeu mais outro fósforo; a luz fez-se de novo, e no meio do brilho
d'ela erguia-se a velha avó, tão resplendente e pura, tão cheia de doçura e de
amor!
Minha avó, exclamou a pequena. Oh! leva-me contigo. Eu sei que tu
desaparecerás quando o fósforo se apagar. Hás de passar como o fogão quente,
como o delicioso ganso assado, e como a grande e majestosa árvore do Natal!
E rapidamente acendeu todo o molho de fósforos, a fim de ter ali a avó
bem segura.
E os fósforos fulguraram com tal brilho, que havia luz mais viva do que
em pleno dia; a avó nunca fora tão alta nem tão formosa: tomou nos braços a
rapariguinha, e ambas voaram pelas regiões da luz e da alegria até muito alto,
muito alto; não havia lá nem frio, nem fome, nem angustia: eram perto de
Deus.
Mas encostada ao canto da parede, quando veio o frio amanhecer, estava
a pobre rapariga com as faces vermelhas e um sorriso nos lábios; matou-a o
gelo na última noite do ano velho.
E o sol do ano novo passou sobre o seu cadaverzinho.
Imóvel estava a rapariguinha: ali estava ela com os fósforos, dos quais
havia queimado um maço.
Ninguém suspeitava quanto ela vira de belo, e em que brilhante região
entrara com a avó no dia de ano novo.
FIM DA SEXTA PARTE
O ORÁCULO DOS ASTROS
OU
A verdadeira arte de conhecer os segredos dos Astros pela regular
rotação, e pelos sinais que se observam de noite e dia durante as quatro
estações do ano.
O ORÁCULO DOS ASTROS
ASTRONOMIA POPULAR
A astronomia na antiguidade
É antiquíssima esta ciência e parece que aos pastores do Himalaia se
devem as primeiras observações astronômicas, unicamente fundadas nos
movimentos aparentes dos corpos celestes, e nos fenômenos que mais
impressionavam a imaginação do homem, tais como a passagem dos planetas
através das constelações, as estrelas cadentes, os cometas, os eclipses, etc.
Como não podia deixar de ser, todas as teorias de então, fundadas em
aparências falsas, eram falsas também, tendo sido modificadas e corrigidas
gradualmente, segundo o exigia o caminhar progressivo das outras ciências. A
primeira hipótese consistia em imaginar a Terra rodeada de água por todos os
lados, hipótese que ainda existia no tempo de Homero, pois que então
acreditava-se que o Sol se apagava ao mergulhar no Oceano, reacendendo-se
no dia seguinte depois de demorado banho. Os astrônomos gregos, há dois mil
anos, julgavam que as estrelas eram chamas alimentadas pelas exalações da
Terra!
Todavia, quando se observou que o Sol, a Lua, as estrelas e os planetas,
se escondiam todos os dias no horizonte, surgindo no imediato do lado oposto,
força foi admitir que passavam sob a Terra, e daqui uma revolução imensa,
completa, na maneira de considerar o nosso planeta, que até então o homem
tinha como solidamente assente debaixo dos pés, prolongando-se até ao
infinito. Para explicar aquela passagem, inventaram-se hipóteses sobre
hipóteses, qual delas mais extraordinária, qual delas mais absurda. Um deu à
Terra a forma de mesa circular sustentada por doze colunas, outro a de uma
cúpula descansando em cima de quatro gigantescos elefantes de bronze, etc.,
etc.; mas nada disto satisfazia o espírito. Colunas e elefantes, a seu turno,
sobre que é que descansavam? Sendo impossível responder satisfatoriamente a
tal pergunta, aquelas teorias foram completamente abandonadas, admitindo-se
por fim que a Terra se mantinha livre no espaço. Era um passo para o
descobrimento da verdade, mas o erro subsistia ainda. Segundo a nova
doutrina, o nosso planeta conservar-se-ia quieto no espaço, ocupando o centro
de todos os corpos celestes, que giravam em torno dele. Isto, que só tinha de
bom explicar a rotação das estrelas chamadas fixas, deixava sem explicação os
movimentos dos planetas por entre as constelações, e foi alterado, ou antes
substituído, pelo sistema de Ptolomeu, o qual consistia em imaginar o
universo composto de globos uns dentro dos outros. O exterior era o Empíreo,
isto é, o lugar para onde iam as almas dos bem aventurados. Ao imediato
estavam presas as estrelas fixas, e a cada um dos sete seguintes, os sete
planetas então conhecidos, no número dos quais entravam (erradamente, como
veremos mais adiante) o Sol e a Lua. No centro desta máquina
complicadíssima, a Terra! Tão prodigioso edifício era construído do mais fino
cristal, para que o brilho dos corpos celestes pudesse chegar até cá. O espírito
humano, uma vez no caminho do absurdo e do maravilhoso, não para
facilmente. Assim, houve quem asseverasse com a maior seriedade que os
aerólitos eram pedaços de algumas das esferas, que, de velhas, caiam sobre a
Terra; que o movimento dos planetas era mais vagaroso quando se achavam
mais distantes do Sol, porque não viam tão bem o caminho! etc. etc.
À medida, porém, que as observações astronômicas se tornaram mais
frequentes, e que as outras ciências se foram aperfeiçoando, fornecendo novos
meios de comparação, o sistema de Ptolomeu era a cada passo alterado, para
dar a explicação de um novo fenômeno descoberto; e por fim tornou-se de tal
forma complicado, que já nem os próprios astrônomos se entendiam com ele,
o que não o impediu de encontrar defensores exaltados e de ser conservado
muito tempo nas escolas superiores.
Sistema de Copérnico
Foi nos séculos XV e XVI que se estabeleceram as verdadeiras bases da
astronomia. O espírito humano começou então a libertar-se das falsas teorias a
que um fanatismo bárbaro o trazia acorrentado, sucedendo-se uns após outros
os mais belos empreendimentos e as empresas mais arrojadas. Copérnico
lança então corajosamente por terra as falsas doutrinas de Ptolomeu e
apresenta aos olhos maravilhados do homem, tal qual é, o principio
fundamental da astronomia; quase ao mesmo tempo o nosso compatriota
Fernão de Magalhães, efetuando a primeira viagem de circunavegação, prova
praticamente, aos que ainda duvidavam, a esfericidade do planeta que
habitamos.
Uma vez conhecida a verdadeira posição da Terra em relação aos outros
planetas e ao Sol, as descobertas sucederam-se umas após outras. A Copérnico
demonstrando que todos os planetas se moviam em torno do Sol, seguiu-se
Kepler descobrindo as três leis que regem os movimentos dos corpos celestes,
— Galileu inventando o telescópio, — Haley calculando a volta de um cometa
e Newton descobrindo a força que mantém em equilíbrio todos os astros.
Atualmente a ciência pode vangloriar-se de conhecer não só a posição de
cada um dos corpos que constitui o sistema solar, mas de saber qual a
distância de uns aos outros, quais os seus volumes, e até o peso de cada um.
A relação das distâncias de uns aos outros planetas está feita na razão de
1 milímetro para 10 milhões de léguas. Não há, porém, proporção alguma no
que respeita às suas dimensões; se quiséssemos conservar à Terra o tamanho,
aliás pequeníssimo, que ali tem, haveríamos de representar o Sol por uma
esfera do tamanho aproximado de uma pequena laranja e de distanciar
proporcionalmente os planetas uns dos outros.
O caminho percorrido por cada astro, isto é, a sua orbita, acha-se
indicado por traços e os planetas e satélites por pequenos pontos.
Partindo do Sol, vemos que o primeiro planeta que lhe gira em torno é
Mercúrio, em seguida Vênus e depois a Terra. Em volta do nosso planeta,
acompanhando-o fielmente, gira um outro globo ou satélite, a Lua. Segue-se
depois Marte com dois satélites. Estes quatro primeiros planetas, Mercúrio,
Vênus, Terra e Marte, são chamados por alguns astrônomos planetas médios
em razão do seu tamanho. Segue-se depois uma infinidade de planetas de
pequenas dimensões, cuja orbita media se acha também ali indicada. São os
pequenos planetas que, segundo a hipótese mais geralmente aceita, constituem
os despojos de um grande planeta que uma causa desconhecida haja
despedaçado. Contam-se Atualmente cerca de 220 destes astros, mas é
provável que o seu número seja muito maior. Aos pequenos planetas seguemse os grandes: — primeiramente Júpiter tendo em torno quatro satélites;
depois Saturno com oito satélites; Urano com quatro, e finalmente Netuno
com um só. Além dos planetas, que giram quase circularmente em torno do
Sol, no mesmo sentido e em planos não muito diferentes uns dos outros, e dos
satélites que acompanham os planetas, — outros corpos, cuja quantidade é
impossível calcular, caminham também em volta do Sol seguindo orbitas
muito alongadas e movendo-se em todos os sentidos e em planos
variadíssimos: são os cometas.
Independentemente dos planetas, satélites e cometas, o sistema solar é
povoado ainda por miríades de outros corpos muito mais pequenos e que
viajam em diversas regiões do céu, umas vezes isolados, outras aos enxames,
voltando periodicamente ao mesmo ponto, e dos quais só temos conhecimento
quando por acaso atravessam a atmosfera terrestre, ao contato da qual se
tornam incandescentes, ou quando mesmo são atraídos pelo nosso planeta,
onde caem. São as estrelas cadentes, os aerólitos, etc.
Finalmente um imenso anel luminoso, composto provavelmente de
milhões de milhões destes pequenos corpos iluminados pelo Sol, rodeia este
astro, estendendo-se muito além da orbita da Terra. Vê-se nalgumas épocas do
ano elevar-se acima do horizonte, ao pôr ou ao nascer do Sol. É a luz zodiacal.
Reunindo, temos o sistema solar composto de: — 1.º um corpo central,
muito maior que todos os outros, e relativamente imóvel, o Sol; — 2.º
diversos corpos girando todos no mesmo sentido, e quase circularmente em
torno daquele astro (são os planetas); — 3.º vários corpos mais pequenos
caminhando em volta de alguns planetas (os satélites); — 4.º os cometas, que
têm órbita muito alongada, e caminham em todas as direções; — 5.º as estrelas
cadentes, aerólitos, etc., miríades de pequenas agregações percorrendo todos
os pontos do espaço; — 6.º a luz zodiacal (reunião em volta do Sol de
pequenos corpos, iluminados por ele).
I - Do Criador
Nós não vemos o Criador; mas sentimos, e reconhecemos o seu poder até
ao menor inseto perdido no pó. Tudo nos mostra um Deus Criador, o céu, a
terra, as águas, o homem, os animais, as plantas, e os minerais; em fim toda a
Natureza. Foi ele quem formou todas as maravilhas, que se oferecem à nossa
vista.
Meus caros meninos, escutai com atenção o seguinte: Se vós achásseis
em uma planície, uma casa bonita, de uma arquitetura regular com quartos
dispostos comodamente, e decorados com magnificência, diríeis logo: Esta
casa foi construída pelos homens; foram eles quem a mobiliou e decorou.
Foi um relojoeiro que fez este relógio, é impossível que ele se fizesse a si
mesmo, diríeis vós se da mesma maneira vísseis um relógio indicando
regularmente os minutos, e as horas. Pois assim, meus meninos, olhando para
o céu, as estrelas, o sol, que brilha com tanto resplendor, e a terra que está
coberta de prodígios, dizei vós da mesma maneira: Estas coisas não puderam
produzir-se a si mesmas, o homem não pôde fazê-las. Há pois, um ente todo
Poderoso que as criou: este ente é Deus, autor de tudo quanto existe, Deus é
um Pai terno e vigilante o qual nos não abandona, nem um só momento.
Envia-nos todos os dias a luz que nos alumia, e o pão que nos sustenta. E que
nos pede ele por tantos benefícios? Quer que o amemos. Ah! meus caros
meninos, quanto seriamos ingratos, e culpados, se não obedecêssemos aos
seus desejos, se lhe fechássemos o nosso coração! É dele que nos vem tudo o
que temos; e é a ele, a quem devemos todos os nossos sentimentos, e todo o
nosso amor.
II - O Mundo
Declara-se pelo nome de Mundo ou Universo, tudo quanto existe desde o
espaço dos Céus à Terra. Isto é, o sol, as estrelas, a terra, tudo o que a nossa
vista apercebe nas profundidades do ar, da terra e das águas, e o que está além
do que podemos alcançar com a vista. Ainda que a vossa vista é muito fraca e
ainda sois mui pequenos, meus meninos, podeis admirar uma parte deste
imenso espetáculo. O sol, ao meio desses numerosos globos que brilham em
todas as abobadas dos céus, é de todas as obras de Deus aquela, que se
apresenta com mais brilhantismo, e majestade: é um facho, como,
eternamente, posto no centro do mundo para derramar ondas de luz para todos
os lados, e a uma distância que nos não é permitido determinar: dir-se-ia que é
o rei dos astros. Comecemos pois por ele no artigo seguinte.
III - O Sol
O calor, e a luz que ele derrama no universo, nos fazem ver que a sua
matéria está continuamente inflamada, e que ele é o próprio fogo. O sol, o
qual nos parece tão pequeno por causa da sua extrema distância, é (segundo os
astrônomos) um milhão e quatrocentas vezes maior que a terra. A sua forma é
a de um globo.
Todas as manhãs o vedes aparecer no oriente, elevar-se no céu até o meio
dia, e depois descer, e desaparecer abaixo do horizonte ao ocidente. Talvez
vos persuadais que ele faz verdadeiramente esse movimento e que nasce dum
lado para ir pôr-se ao outro; mas seria um erro. Não é o sol que se volve à roda
da terra, mas a terra que se volve sobre si mesma. O sol não muda de lugar,
está sempre no centro do mundo para alumiar tudo quanto o rodeia.
Observaram-se por meio das lunetas manchas sobre este corpo tão brilhante, e
por meio destas manchas, descobriu-se que ele se volvia sobre si mesmo,
como se volveria uma bola atravessada por um prego.
Estas manchas veem-se em primeiro lugar numa extremidade deste astro;
avançam, veem-se depois na outra extremidade; e enfim desaparecem para
traz, para tornarem a aparecer, passado algum tempo. Observou-se que para
voltar ao ponto, donde tinha partido, eram-lhe necessários vinte e sete dias; e
que por consequência era necessário esse espaço para que o sol fizesse uma
volta sobre o seu eixo. Julga-se que o sol dista de nós trinta e quatro milhões
trezentas e cinquenta e sete mil quatrocentas e oitenta léguas.
IV - As Estrelas
Distinguem-se estes astros tão numerosos em «estrelas fixas,» porque se
não veem mudar de lugar, e em «planetas,» ou «estrelas errantes» porque estas
se volvem em mais ou menos tempo à roda do sol. Há por ventura coisa
magnífica, e que dê uma ideia maior de Deus do que esta multidão de estrelas
que brilham no firmamento durante as trevas da noite? Vê-las-íamos em igual
número durante o dia se o resplendor da luz as não fizesse desaparecer.
Presume-se que as estrelas fixas são globos luminosos semelhantes ao sol, os
quais alumiam outros mundos demasiadamente distantes para que a nossa
vista possa percebê-los. Se nos parecem mais pequenas do que o astro que nos
alumia é porque estão infinitamente mais distantes de nós. Julgai da sua
grandeza, e da sua imensa distância pela que está mais próxima da terra, a que
chamam «Sírio». Crê-se que esta estrela fixa está quatrocentas vezes mais
distante de nós do que o sol, e que o seu diâmetro, ou a sua largura, é de trinta
e três milhões de léguas. Isso porém, meus meninos, é superior à concepção da
vossa idade; porém com as explicações que vossos pais ou mestres tiverem a
complacência de vos dar, heis de compreender alguma cousa.
V - Os Planetas
São (fora os modernos que mais se tem descoberto há poucos anos)
Mercúrio, Vênus, Terra, Marte, Júpiter, Herschel (ao todo 7). Este último só se
conhece desde 1785; e foi descoberto por um sábio astrônomo inglês do
mesmo nome o qual também conservou.
As estrelas fixas diferem dos planetas, por quanto estes (e não aquelas) se
volvem à roda do sol, e não tem luz por si mesmos; pois aquela, com que eles
brilham lhes vem do mesmo sol. Presume-se que estes imensos globos são,
como a terra, mundos habitados.
O planeta mais pequeno é Mercúrio, e o mais vizinho do sol. Crê-se que
é quinze vezes mais pequeno que a terra. Vênus; à qual também chamam ora
«estrela da manhã» (ou da «alva»), ora «véspera» (estrela da tarde,) vem
depois, e tem uma nona parte menos que a terra. Volve-se sobre si mesma em
vinte e três horas, e vinte minutos. A terra a qual nos parece tão grande, por
que nós somos pequenos, não é (como já vos disse) mais que um planeta, ou
uma estrela errante. Se vós habitásseis Vênus ou Mercúrio, vê-la-íeis ao meio
do céu, como as outras estrelas e não vos pareceria maior que a ponta de um
dedo. Com algum detalhe, nela logo falaremos. Marte, é muito menos que a
terra; ele não tem mais que três quintos do seu diâmetro. Júpiter, é muito
maior. Os astrônomos asseguram que tem treze vezes a grossura da terra.
Volve-se sobre si mesmo em nove horas, e cinquenta e seis minutos. Tem em
torno de si quatro luas. Saturno, é quase mil vezes maior que a terra. Tem
também cinco luas ou satélites. Está, além disso, rodeado por um grande anel
de luz que se descobre por meio das lunetas. Dista do sol trezentos e vinte e
sete milhões, e setecentas mil léguas. Herschel está ainda mais distante. Parece
afastado para a extremidade do mundo. São-lhe necessários noventa anos, para
se volver à roda do sol.
VI - A Terra
A terra é redonda como uma bola. Os seus vales, e montanhas, os quais
nos parecem tão consideráveis não são nada relativamente à sua grossura;
podem-se apenas comparar com as desigualdades, que se observa sobre a
casca de uma laranja, as quais não impedem que este fruto tenha uma forma
redonda. A terra tem nove mil léguas de circunferência ou circuito. Já se disse
que ela se volve sobre si mesma, como uma bola que está atravessada por um
prego de ferro. Este movimento, a que chamam «rotação», ocasiona-lhe
alternativamente o dia, e a noite, isto é, a parte que está virada para o sol goza
da luz, em quanto a parte oposta se acha na escuridão. Ora como a terra faz
este movimento sobre si mesma em vinte e quatro horas, resulta daí que nesse
mesmo espaço tem o dia e a noite. Quereis vós ter uma ideia bem clara do que
vos digo? Pegai numa bola e volvei-a entre vossos dedos diante duma luz: a
bola será a terra, e a luz o sol. Além deste movimento quotidiano, a terra tem
outro que se executa no espaço dum ano: ela faz um circulo imenso à volta do
sol. É este ultimo movimento o que produz as diferentes estações do ano.
Porém isto é demasiadamente superior à concepção da vossa idade; para agora
vos dar a sua explicação, devo todavia fazer-vos uma fácil observação sobre
um efeito notável produzido pelo movimento da terra. Como não é nenhuma
das duas extremidades, sobre que ela se volve que se apresenta ao sol, mas sim
o meio, segue-se que esse meio recebendo em toda a circunferência os raios
do sol, perpendicularmente, sente um calor considerável, em quanto as duas
extremidades, as quais recebem os raios obliquamente (de lado) ficam em um
inverno continuo e estão sempre cobertas de gelo. Porém como a terra inclina
um pouco para o sol durante seis meses uma das suas extremidades, e durante
os outros seis meses a extremidade oposta, vê-se que cada uma delas goza
alternativamente de um verão rápido, o qual não tem tempo para derreter
aqueles enormes montões de gelo. Estas duas diferentes e sucessivas
inclinações, produzem outro efeito muito extraordinário: é darem a estas
tristes regiões dias e noites de seis meses. Chama-se «Equador» a facha do
meio, a qual se acha debaixo do sol; e «polos» as extremidades sobre as quais
se volve a terra. Há um polo do meio dia, e outro do Norte.
N. B. —Advirta-se que em tais objetos é dificultoso falar à inteligência
dos meninos; por isso dirigi-vos aos seus olhos; pegai numa bola, e numa luz;
e em um quarto de hora, há de ficar sabendo mais com essa pequena
demonstração, do que com tudo quanto poderíeis dizer num mês. Por isso
ainda quando a explicação que acabamos de dar, fosse mil vezes mais clara, e
mais extensa, nem por isso deixaria de ser muito obscura, e muito incompleta
para um menino.
VII - A Lua
Ao reparar no sol de dia, não podereis de noite deixar de atender à sua
rival a lua, que onde vedes esse magnífico astro que de noite nos dá uma luz
tão doce, e que é tão propício, credes sem duvida, que é um rival do sol, e um
globo mil vezes maior que as estrelas? Desenganai-vos mais esta vez. A lua
parece-nos maior que as estrelas somente por que está mais perto de nós. Ela
não dista da terra mais que oitenta e seis mil trezentas e vinte e quatro léguas;
e o seu volume é quase cinco meses menor que o da terra. É mui pequena
comparativamente a Saturno e a Júpiter, os quais todavia não vos parecem
maiores que a luz duma vela. A lua não faz como os outros planetas a sua
revolução à roda do sol, mas sim, à roda da terra. É a esta que se referem os
seus movimentos; acompanha-a na sua revolução anual à roda do sol; e nesse
espaço volve-se treze vezes em torno da terra. Em cada um destes círculos
gasta vinte e sete dias sete horas e quarenta e três minutos.
Ela não tem luz alguma por si mesma, posto que com tudo vos pareça
mui resplandecente de noite. Ela recebe o seu brilhantismo do sol; e por isso
nunca vemos mais que a sua parte alumiada segundo estas diferentes posições,
parece-nos uma vez meia lua, um quarto etc. A parte que não podemos ver se
acha na escuridão. Como ela esclarece a terra com a luz que recebe, da mesma
sorte a terra lhe envia a luz que lhe vem do sol, porém em muito maior
quantidade vista sua grandeza. Ora, nas luas novas, o lado da terra alumiado
está inteiramente virado para a lua, e por consequência alumia a sua parte
obscura: os habitantes da lua (se ela os tem) gozam então da terra cheia, como
nós em uma posição semelhante a esta gozamos da lua cheia. Não é preciso
que eu vos diga que a lua é redonda; já vo-lo disseram os vossos olhos. Notai
porém que não é redonda plana, mas redonda esférica, ou como uma bola.
VIII - Eclipses da Lua e do Sol
Eclipse quer dizer privação da lua por meio dum corpo intermédio. Há
circunstâncias em que a terra priva a lua da luz do sol (a que chamamos
«eclipse da lua»,) e em que a lua priva a terra da mesma luz solar, (a que
chamamos «eclipse do sol»). O eclipse da lua (em que ela se eclipsa e
desaparece aos nossos olhos) é causado pois pela passagem do corpo da terra
diretamente entre o sol e a lua. A terra intercepta então os raios do sol, e a lua
fica algum tempo na sombra da terra privada da luz. O eclipse do sol (em que
ele se eclipsa e desaparece aos nossos olhos) é da mesma sorte causado pela
passagem do corpo da lua diretamente entre o sol e a terra. A lua tira-nos
então os raios do sol, e a terra fica algum tempo na sombra da lua, privada da
luz.
Quando a lua está eclipsada, está-o geralmente para todos os povos, que a
podem ver, por que não tem luz por si mesma; porém não acontece o mesmo a
respeito do sol; a lua só o pode ocultar a certos povos, onde chega a sua
sombra, e durante este tempo os outros gozam da sua luz, sem perceberem
mudança alguma.
IV - Os Elementos
Damos a antiga divisão dos elementos, como se fez até às últimas
descobertas de química, pois é o único meio de fazer compreendê-los à
infância. Elemento, quer dizer constitutivo (ou reunião de forças, qualidades,
ou objetos) que formam qualquer coisa ou parte de um todo (animado,
inanimado, ou intelectual) os elementos, ou simples, ou compostos, em geral
reduzem-se a quatro principais elementos todas as coisas, de tudo quanto
existe com corpo; estes elementos são —«o fogo, o ar, a terra, e a água.» O
primeiro destes é unicamente simplicíssimo: os outros três restantes são
compostos doutros simplicíssimos elementos; razão porque os químicos
reduzindo todo o número dos elementos, à sua simplicidade, admitem muito
maior número de elementos (ou elementos simples.)
X - O Fogo
Meus caros meninos, vós não conheceis outro fogo, que aquele que
resplandece no fogão, ou na lareira; porém o fogo, ainda que invisível, está
derramado por toda a natureza. Feri dois seixos e do seu choque resultará uma
faísca; esfregai com força dois bocados de pão, aquentar-se-ão, e acabarão por
alumiar-se; pondo ao sol uma lente, esta reunindo, e apertando os raios, darvos-á fogo; a mesma luz é fogo (posto que tenuíssimo.) O fogo é necessário à
vida de tudo quanto existe corpóreo; e o seu primeiro manâncial parece vir do
sol. Como o calor é sempre fraco no inverno tudo languesce, tudo parece
morto, e as águas não podem correr: elas tornam-se gelo; felizmente a
primavera torna a animar tudo com um novo calor. Se pois o fogo não se
fizesse mais sentir tudo pereceria, gelar-se-ia tudo.
XI - O Ar
O ar é tão necessário à nossa existência que se nos achássemos privados
dele, morreríamos imediatamente. O ar é este fluído invisível que respiramos,
continuamente, e que sentimos à roda de nós. Quando é impelido com força,
constitui o «vento». Está derramado em torno do globo da terra, até uma certa
altura, e forma o que chamamos «atmosfera,» isto é, este espaço onde andam
as nuvens.
XII - A Água
Todos os países, onde não se acha a água, são estéreis, desertos, e não
apresentam mais que tristes planícies de areia. Levada pelo seu próprio peso
desce sempre, até ser retida nos abismos do mar. De ordinário é nos montes
que se acham as nascentes dos rios. A água cobre uma parte da terra, e circula
por todos os lados. Vemo-la sair debaixo da terra, formar ribeiras, e rios, e
encher o imenso lago dos mares. Ela umecta as terras, alimenta os vegetais,
anima as paisagens e exaltera os homens, e os animais.
XIII - As Nuvens
Uma nuvem é absolutamente semelhante aos nevoeiros, que se formam à
noite sobre as margens das ribeiras, e nos sítios pantanosos; o que a distingue
é ter-se formado no ar, e ser impelida pelos ventos até ao momento em que
torna a cair em chuva sobre a Terra. A água não corre somente sobre a Terra;
também se alevanta aos ares, e se sustem ali debaixo da forma das nuvens. O
calor do sol faz subir a água para o céu em vapores invisíveis. Os rios, os
lagos, e os mares fornecem continuamente (e mais no verão do que no
inverno) esses vapores, os quais vão reunir-se nos ares em forma de nuvens.
Pondo ao sol um pano molhado, a umidade desaparecerá, e o pano secará,
colocai uma bacia cheia de água ao ar, a água desaparecerá insensivelmente, e
não ficará nem uma só gota. Que foi feito dessa água? Reduziu-se pelo calor
em vapores, e estes elevaram-se até às nuvens, que vedes passar sobre vossas
cabeças.
Quereis ver uma prova mais clara? Examinai a água, que ferve sobre o
fogo; sai dela um fumo espesso, e o vaso diminui cada vez mais. Porque razão
diminui esse vaso? É porque a água se vai em fumo, ou (para melhor dizer)
em vapores. Ponde por um instante a vossa mão sobre esse fumo, e tirá-la-eis
toda molhada. As nuvens não andam muito alto: os cumes de diferentes
montanhas são-lhes sobranceiros. Quando se está sobre essas montanhas, vêse por baixo as nuvens esclarecidas pelo sol, o qual as faz parecer brancas,
como um montão confuso de algodão. Quando se passa pelo meio delas, crêse que se atravessa um nevoeiro, mais ou menos espesso.
XIV - A Chuva
Já sabeis como se formam as nuvens; sabeis que se compõem de
pequenas partes d’água, tão leves, que se tomariam como um pouco de pó: o
ar sustem-nas em quanto estão neste estado. Mas quando estas partes se
aproximam, e as unem, tornam-se em gotas, as quais, sendo mais pesadas que
o ar, que as sustem, começam a cair, e eis aí a chuva. Esta chuva rega os
campos, penetra nas terras, e alimenta as nascentes; estas vão para os rios, e
estes para o mar; o sol faz outra vez subir estas águas ao ar, donde são
restituídas à terra; de sorte que estão continuamente em movimento, e viajam
em todas as partes do mundo, umas vezes impelidas pelos ventos, e outras
vezes arrastadas pelo declive dos terrenos.
XV - A Neve e a Saraiva
Deve-se advertir que existe a neve, e se forma quando os vapores úmidos
que caem duma nuvem se transformam na sua queda, pelo gelo que os
penetra, em longos filamentos, os quais constituem flocos diferentemente
arranjados. Se estes vapores tiveram tempo para formar gotas, que o frio
condensa imediatamente, cai, em lugar de neve, saraiva. Esta saraiva tem, de
ordinário, a forma, e a grossura das gotas da chuva; contudo algumas caem
como grossos pedaços de gelo; mas pode-se observar, que esses pedaços, são,
neste caso, compostos de muitos grãos, que se reuniram na sua queda.
XVI - O Mar
Chamamos com este nome de «Mar» todas essas imensas qualidades de
água, que cobrem uma grande parte da Terra. Os homens chegaram a
ultrapassar (pela sua indústria) esses abismos que pareciam abertos para os
reter, construíram navios, e viajaram sobre as ondas, que podiam tragá-lo, com
mais comodidade, e mesmo com mais segurança do que sobre as terras. Não é
doce, e boa para beber a água do mar, como a das nascentes, e rios; ao
contrario é acre, amarga e tão salgada, que excita náuseas violentas. É desta
água que se tira o sal, de que se usa na cozinha. Para isso faz-se entrar a água
do mar em grandes tanques, que tem somente algumas polegadas de
profundidade; o sol faz evaporar a água, e o sal fica em seco no fundo do
tanque.
XVII - O Homem
Das criaturas mais perfeitas que Deus criou, é o Homem; ainda que vive
como todos os animais, e está sujeito às mesmas necessidades é-lhes contudo
tão superior, que não se deve estabelecer comparação alguma entre eles e o
homem. Ele é o chefe de tudo quanto abaixo de Deus, recebeu a existência, e o
dominador da Terra. E donde lhe vem a sua superioridade? Da alma; desta
inteligência celeste que Deus lhe deu. Os animais pensam somente em
satisfazerem as suas necessidades; o homem é o único que reflete, e sabe
elevar-se ao conhecimento da Divindade. Por isso chama-se Razão o
sentimento, que dirige as suas ações; e dá-se somente o nome de «Instinto» ao
que faz obrar os animais; posto que esse instinto em varias cousas se torna
superior às nossas forças, e razão, com o próprio influxo e direção das sábias
determinações que ora coartam ora dirigem as ações dos animais. Porém se o
homem recebeu uma prerrogativa tão bela, é para se conduzir livremente com
mais sabedoria; quando abusa dos seus meios, quando obra mal, sabe-o, tornase culpado para Deus, o qual lhe deu luzes gerais para o esclarecer no caminho
da vida.
Os deveres dos homens para com Deus estão consignados na verdadeira
Religião Natural ou Universal, a qual se tem dividido em três idades «Religião
Ante-Mosaica, Religião Mosaica» (ou escrita) «Religião e Cristã» (ou
Revelada). Em todas estas três idades a Religião Natural é sempre a mesma:
representando na 1.ª idade o verdadeiro culto à Divindade na esperança do
Salvador; na 2.ª a confirmação, e mais majestosa ratificação desse culto; e na
3.ª o complemento final desse culto na pessoa do mesmo verdadeiro e
esperado Messias, Nosso Senhor Jesus Cristo. Os deveres da Religião em
todas as suas idades baseia-se em três principais deveres para com Deus,
direta ou indiretamente. Deveres «diretos» (para com Deus), «e indiretos»
(para conosco, ou nossos semelhantes). Estes deveres são obrigatórios, ou
proibitivos, aos quais se opõem o crime de comissão para com os primeiros,
ou de omissão para com os segundos. Em estes deveres se contam a
celebração do Sacerdócio, e mais sacramentos da Igreja, e seus deveres; os
mandamentos do Decálogo e da Igreja.
A vida do homem divide-se em quatro épocas; a saber: —«A Infância»
até os 15 anos; «A Juventude» até os 35; «A Virilidade» (ou idade viril) até os
55; e «A Velhice» daí por diante até o muito 100 anos.
XVIII - Homens de diferentes cores
Os homens variam de cor conforme os climas, ou regiões, e terras que
diversamente habitam; por isso não são os homens todos brancos, como os
vemos na Europa. Nos países quentes são trigueiros, e mesmo pretos. É
principalmente em África que se acham povos inteiros, e numerosos, cuja pele
é tão preta como o carvão; chamamo-lhes «negros.» Os «Hotentotes,» os quais
habitam também esta parte do mundo, tem uma cor bronzeada. As diferentes
cores americanas são as de cobre, e laranja. Os homens de maior estatura são
os «Patagões,» os quais habitam a extremidade da America Meridional: tem
comumente seis pés, a seis e meio. Os «Lapônios» são ao contrário os mais
pequenos: não tem ordinariamente mais de quatro pés e meio, é esta a sua
estatura ordinária: porém são fortes e robustos. Habitam um país frio, e
coberto quase sempre de neve na extremidade septentrional da Europa.
XIX - Os Minerais
Dá-se o nome de minerais às substâncias que se tiram das minas, isto é,
das escavações que se fazem no seio da Terra. Entre estas substâncias é
necessário observar os metais, que nos são de grandíssima utilidade. Estes
metais são o ferro, cobre, estanho, chumbo, ouro, e prata. O homem não só
tornou em vantagem sua tudo quanto a Terra produz na superfície; mas até o
que ela tem oculto nas suas entranhas.
XX - O Ferro
O homem não tem necessidade senão de purificar o ouro, e a prata; e élhe necessário, para assim dizer, criar o ferro. Este metal, tal qual a natureza
no-lo dá, é mui diferente daquele de que as artes usam. Esta arte sobe à mais
remota antiguidade, e pode-se crer que o ente criador de todas as coisas o qual
o faz nascer com tanta profusão por toda a terra, sugeriu ele mesmo ao homem
os meios de o adotar às suas necessidades, e de o fazer gozar de todas as
vantagens, que ele oculta; pois que este metal tão útil apresenta-se debaixo de
mil formas diversas na natureza; e o que vós nunca pensáveis, acha-se quase
em toda a parte; acham-se partes dele na combustão de muitos vegetais, e
pretende-se mesmo que o sangue que circula nas nossas veias, lhe deve este
vermelho, que o cora. É por meio do fogo que se separa o ferro da terra com
que está misturado; e é igualmente por meio do fogo que se trabalha, e que se
fazem com ele vasos, alavancas, pregos, e mil outros instrumentos, que nos
são de grande utilidade; sem o ferro nunca existiria um número infinito de
objetos que aumentam as comodidades da vida.
O ouro, que nós procuramos com tanta avidez, é muito menos precioso,
que este metal, que nos parece tão grosseiro. O aço é um ferro refinado.
XXI - O Cobre
De todos os metais imperfeitos é o cobre o que mais se aproxima do
ouro, e da prata; se o não tivéssemos, haveria um grande vácuo nas produções
as mais interessantes das artes. Porém as suas vantagens são bem
compensadas pelas suas qualidades malfazejas: exposto ao ar, ou à
humanidade, e muitas vezes por si mesmo, cobre-se desta ferrugem conhecida
pelo nome de Verdete, a qual muitas vezes converte nos vasos da cozinha em
um veneno extremamente perigoso os alimentos que contem. A estanhadura
palía o perigo, porem não o anula inteiramente. O mais prudente é não usar
deste metal sem muito resguardo, e limpeza. O cobre derretido e purificado
chama-se Cobre vermelho. Ligando-o com o zinco que é outra substância
mineral, obtém-se o Cobre amarelo, ou o Latão; misturando-lhe uma certa
qualidade de estanho produz-se o Bronze, ou o Arame.
XXII - O Estanho
Emprega-se o estanho de mil maneiras: fazem-se com ele pratos,
colheres, e vasos, usa-se dele misturando-o com o chumbo para a estanhadura;
aplica-se por traz dos espelhos para lhes dar este brilhantismo, que lhe faz
refletir as imagens de todos os objetos.
XXIII - O Chumbo
As minas de chumbo são como as de ferro as mais comuns em a
Natureza. Ele é o menos precioso dos metais. Como é mole e fácil a derreter,
fazem-se com ele os canos para conduzir as águas, e outras obras semelhantes
a esta; fazem-se também com ele as balas de espingarda.
XXIV - A Prata
As principais minas da prata em França são as de Santa Maria nos
Vosges; as de Baigóry nos Altos Pireneus; e as de Chalanches perto de
Alemont no Delfinado. As minas da Noruega são as mais importantes; porém
as mais ricas do mundo são as que se acham no cume das cordilheiras; a
Natureza derramou aí este metal com uma verdadeira profusão; quase todos os
países da terra possuem minas deste precioso metal, porem observa-se que
quanto as minas de ouro abundam nos países quentes, tanto a prata parece
amar as regiões frias.
XXV - O Ouro
Não porque nos seja o mais útil, mas porque o fizemos, como a prata,
representativa de tudo quanto se pode comparar, eis aqui em fim o metal que
nós estimamos mais. Com tudo é o ouro o mais perfeito, por si mesmo dos
metais, é o mais pesado, o mais denso, e o mais dúctil. Podem-se-lhe dar todas
as formas, pode-se aplicar, e estender em folha sobre superfícies, cuja
grandeza comparada à pouca matéria de que se usou, admira a imaginação. O
fogo, menos que não seja excessivamente violento, não produz sobre ele
impressão alguma. As minas mais abundantes de ouro são as do México, e
Peru, ultimamente as da Califórnia na America; bem como também na
Áustria, Sibéria; e acha-se também na área de algum rio em forma de palhetas.
XXVI - Das cinco partes do Mundo
A terra a qual já dissemos que era redonda divide-se em cinco partes, a
saber: Europa, Ásia, África, America, e novamente descoberta a Oceania. A
parte do mundo que nós habitamos é a Europa; é a menos extensa, mas a mais
povoada, é aquela onde as ciências e artes são mais cultivadas. Os seus povos
são brancos. A parte meridional é temperada, e a do norte é fria. A Ásia é três
vezes maior que a Europa; mas não tem povoações proporcionais. Os seus
países meridionais sentem calores muito grandes, os do norte estão cobertos
pelo gelo do inverno nos três quartos do ano. Esta parte do mundo é a mais
rica em produções naturais, pedras preciosas, pérolas, especiarias, aromas, e
animais. A África cortada ao meio pelo Equador, isto é, achando-se
diretamente debaixo dos raios do sol oferece os climas mais quentes, e por
consequência mui desertos. Veem-se aí espaços imensos sem árvores, e sem
verdura onde cobre a terra uma areia seca. É nela onde se acham os homens
mais pretos, e os animais mais ferozes. A America é a parte maior do mundo.
A Ásia, a África, e a Europa não a conheceram durante muito tempo; os povos
antigos nem ao menos suspeitaram a sua existência. Foi somente no curso do
décimo quinto século, isto é a pouco mais de trezentos anos, que Cristovão
Colombo teve a gloria de fazer conhecer esta metade do mundo à outra. A
America produz uma quantidade infinita de metais, e minerais; o ouro que os
europeus tem tirado dela é incalculável. Há ali alguns países mui povoados,
mas há outros onde se acha mui pouca povoação. É nesta parte do mundo que
existem os maiores rios da terra; o maior de todos é o dos Amazonas, o qual
tem mil léguas de curso.
XXVII - Divisão do Tempo
Os homens sentiram a necessidade de estabelecer as divisões do tempo
para regular os seus trabalhos, recordar os acontecimentos, e combinar, e
designar os dias futuros. A própria natureza indica essas divisões. Já vos disse
que a terra se volve sobre si mesma no espaço de vinte e quatro horas, e que é
esse movimento quem nos dá alternativamente o dia, e a noite. Essas 24 horas
fazem o que se chama um dia. Este achou-se naturalmente dividido em quatro
partes: a manhã, o meio dia, a tarde e a meia noite. Inventaram-se outras
divisões, para maior comodidade: são as horas. Contam-se 24 num dia, isto é,
durante o tempo da luz, e das trevas; porém estas 24 horas estão divididas em
duas vezes doze: eis de tê-lo visto em todos os mostradores, os quais não têm
mais que esse número de horas. A hora foi subdividida em 60 minutos, e o
minuto em 60 segundos, etc.
As 4 estações são: a Primavera, em que nascem a verdura e as flores; o
Estio, em que se amadurecem os frutos da terra; o Outono, em que se fazem as
colheitas; e o Inverno tempo em o qual a terra em repouso toma novas forças
sofrendo a intempérie dos ares (pelos ventos, frios, neves, gelos, e
tempestades). Dividem-se estas estações mais simplesmente em duas partes, a
saber: Verão e Inverno, cada uma com seis meses; contando o verão desde o
meio da primavera, todo o estio, e primeira parte do Outono (isto é, meio de
Maio, a meio de Novembro,) e contando o inverno desde o meio de Novembro
e todo e inverno propriamente dito, até meio de Maio.
Além desta divisão natural divide-se o ano em doze meses. O mês é um
espaço de 30 a 31 dias (pouco mais ou menos;) o que se vê nestes versos:
Trinta dias tem Novembro;
Abril, Junho e Setembro;
Vinte e oito, ou nove, um
e os demais trinta e um.
Eles são, pois Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio, Junho, Julho,
Agosto, Setembro, Outubro, Novembro, e Dezembro.
O inverno começa a vinte e tantos de Dezembro, acabando a vinte e
tantos de Março. A primavera a vinte e tantos de Março a vinte tantos de
Junho. O Estio a vinte e tantos de Junho a vinte e tantos de Setembro. O
outono a vinte e tantos de Setembro até vinte, e tantos de Dezembro.
Os meses também se dividem em 4 semanas; as quais não o completam
porque dão somente 28 dias, e os meses tem 30 a 31; exceto fevereiro o qual
tem 28, e nos anos bissextos, isto é, de 4 em 4, 29.
A semana contém 7 dias que são: Segunda, Terça, Quarta, Quinta, Sexta,
Sábado, e Domingo. Os Cristãos começam a sua semana pela segunda feira, e
o domingo é o sétimo dia de repouso. Os Judeus tomam o Sábado por seu
sétimo dia de repouso, contando o domingo como seu primeiro dia da semana.
Os maometanos tomam o seu primeiro dia no sábado e o seu ultimo e sétimo
na sexta.
Temos dois equinócios, e 2 solstícios: Os primeiros em que as noites são
iguais aos dias em doze horas: os segundos em que os dias e as noites entre si
são ora maiores ora menores.
De 21 a 22 de Março é o equinócio da primavera.
De 23 a 24 de Setembro o equinócio do Outono.
De 23 a 24 de Junho é o solstício do estio, em que os dias são maiores do
ano (isto é, perto das 3 até às 9 da noite). De 20 a 23 de Dezembro é o
solstício de inverno, em que as noites são as maiores do ano (isto é, desde
perto das 5 da tarde até perto das 7 da manhã).
Entende-se por um século o espaço de cem anos.
Por lustre o espaço de 5. Por olimpíada o espaço de 4.
O nome, a época deste ultimo, vem das festas que os gregos celebravam
cada 4 anos junto de Olímpia na Grécia.
XXVIII - Principais povos e cidades da Ásia
A Ásia tem mil e setecentas léguas de comprido, e mil e quinhentas de
largo. Seus principais estados são: Turquia Asiática, Arábia, Pérsia, Índia,
Trataria (chinesa, independente, e russiana, na maior extensão e pouco
povoada,) a China, e o Japão.
A Turquia Asiática é considerável; e tem a Pérsia ao oriente; o
Mediterrâneo, e o Arquipélago ao ocidente; ao meio dia a Arábia, e ao norte o
Mar-negro e Pérsia. Tem magníficos fragmentos do seu antigo esplendor.
A Arábia é a maior península do mundo, de norte a sul com quinhentas
léguas, e de oriente a ocidente quatrocentas, Meca e Medina suas principais
cidades.
O grande império da Pérsia, cuja capital é Ispahan. A Índia, cujos
principais estados são o Industão, Visapor, Golonda, Bisnagar, Ava, Pegu,
Aracão, Sião, Camboje, Tunquim, Cochinchina.
O mais belo poderoso e antigo império da China, com quinhentas léguas
de oriente a ocidente; e trezentas e cinquenta de norte a sul. Tem como imensa
povoação as principais cidades de Pequim e Nanquim.
PROFECIA
De um Lavrador velho e cego, da freguesia da Maia, a qual foi achada
debaixo do travesseiro, depois do seu falecimento.
Cessem todos os estrondos
Para em bela harmonia
Ouçam todos mais atentos
Esta real profecia.
De um autêntico Soberano
Distinto e inspirado
Que além de ser Monarca
Também tem profetizado.
Cujo Soberano escreveu
A qual me mandou ler
Do que no futuro ano
Neste reino se há de ver.
Profetizou que para o ano
Tudo o que for vegetal,
Causará terror e espanto
No reino de Portugal.
Toda a terra portuguesa
Dará fruto desmarcado
Como nunca se tem visto
Desde que o mundo foi criado.
As nabiças darão grelos
Tão altos e engrumados,
Que dê mastros de navios,
E serrando-os tabuados.
Cada nabo será tal
Que se o escavar por dentro
Possa dar casa bastante
Para corte dum jumento.
Tais repolhos vereis criados
Em todos os repolhais,
Que o menor seja bastante
P'ra pesar vinte quintais.
Pois só as folhas de fora
Daqueles mais bem criados
Poderão servir de velas
Para estender nos eirados.
As couveiras criarão
Tão altos pés e grossos;
Que deles se farão bombas
Para tirar água dos poços.
Vereis cebolas como pipas
Batatas como toneis
Tomates como gigas
Alhos como canistreis.
Que só os dentes dos alhos
Tão volumosos serão,
Como que fossem quartos
De aboboras ou de melão.
As pereiras darão peras
Tão grandes e tão bastas
Que uma só pera aos pedaços
Encha bem sete canastras.
Tais limões vereis criados
Nos limoeiros azedos,
Que um limão seja bastante
P'ra carregar seis galegos.
E que nozes tão grandes
Se hão de ver pelas Nogueiras,
Que das cascas duma só
Se farão duas maceiras.
E do que tiver por dentro
Gostosos doces farão,
E muitas se hão de moer
Que não hão de dar mau pão.
Também promete abundância
De pão trigo e centeio
Porque só cada espiga
Dará alqueire e meio.
As mulheres farão fogueiras
Queimarão fusos e rocas
Por que há de nascer linho
Pronto já em maçarocas.
Pois só cada melancia
Tão grande há de ser,
Que precisem de dez homens
Com pancas para a mover.
Da tona grossa e dura
Com talos tão bem criados
Que só possam ser partidos
Com alviões ou machados.
Cada videira do Douro
Tantos cachos há de dar
Que de vinho e bagaço
Possa encher um lagar.
A cinco reis o almude
Quem quiser beberá vinho
Do melhor do Alto Douro
Nesta província do Minho.
No tempo que o vinho for
A cinco reis o almude
Muito há de haver quem diga:
«Cá vai à sua saúde.»
Velhos e velhas vereis
Dar saltinhos de contentes
Porque até terceira vez
Lhe hão de nascer novos dentes.
Até os brancos cabelos
Vereis tomar novas cores,
Iguais às daquele tempo
Em que tinham seus amores.
Os que forem corcovados
A corcova hão de perder,
Até cegos vereis com vista,
Que já não esperavam ver.
Tudo quanto tenho dito
Afianço e asseguro,
Que se nada for verdade
Há de ser mentira tudo.
Desta forma terminou
Esta real profecia,
Só a todos desejo
Vida, paz e alegria.
HORAS PLANETÁRIAS
Nomes dos Planetas Saturno, Júpiter, Marte, Sol, Vênus, Mercúrio e Lua.
Domingo
A 1.ª hora é quando nasce o Sol, e é hora Solar.
2.ª — de Vênus.
3.ª — de Mercúrio.
4.ª — de Lua.
5.ª — de Saturno.
6.ª — de Júpiter.
7.ª — de Marte.
8.ª — do Sol.
9.ª — de Vênus.
10.ª — de Mercúrio.
11.ª — de Lua.
12.ª — de Saturno.
E assim continuará, segundo os nomes dos Planetas; isto é, conforme o
que se segue pelos nomes acima indicados.
Segunda-feira
1.ª — esta primeira hora como se tem dito, é da Lua.
2.ª — de Saturno.
3.ª — de Júpiter.
4.ª — de Marte.
5.ª — do Sol.
6.ª — de Vênus.
7.ª — de Mercúrio.
8.ª — da Lua.
E assim se vai prosseguindo até pôr-se o Sol.
Terça-feira
1.ª — de Marte.
2.ª — do Sol.
3.ª — de Vênus.
4.ª — de Mercúrio.
5.ª — da Lua.
6.ª — de Saturno.
7.ª — de Júpiter.
8.ª — de Marte.
Quarta-feira
1.ª — de Mercúrio.
2.ª — da Lua.
3.ª — de Saturno.
4.ª — de Júpiter.
5.ª — de Marte.
6.ª — do Sol.
7.ª — de Vênus.
8.ª — de Mercúrio.
Quinta-feira
1.ª — de Júpiter.
2.ª — de Marte.
3.ª — do Sol.
4.ª — de Vênus.
5.ª — de Mercúrio.
6.ª — da Lua.
7.ª — de Saturno.
8.ª — de Júpiter.
Sexta-feira
1.ª — de Vênus.
2.ª — de Mercúrio.
3.ª — da Lua.
4.ª — de Saturno.
5.ª — de Júpiter.
6.ª — de Marte.
7.ª — do Sol.
8.ª — de Vênus.
Sábado
1.ª — de Saturno.
2.ª — de Júpiter.
3.ª — de Marte.
4.ª — do Sol.
5.ª — de Vênus.
6.ª — de Mercúrio.
7.ª — da Lua.
8.ª — de Saturno.
E assim vai prosseguindo, dando à hora do nascer do Sol de cada dia o
Planeta daquele dia, assim como a oitava depois de ter nascido.
CONHECIMENTOS ÚTEIS
No Crescente da Lua é que se devem fazer as sementeiras e enxertias, pôr
bacelos, transplantar árvores, e crestar colmeias, tudo em dias de bom tempo,
antes que rebentem as árvores, e o que mais se deve escolher é a ocasião da
maré cheia. As sementeiras não só devem ser feitas no Crescente de Lua, mas
é bom que sejam feitas nos dias em que a Lua anda ou faça conjunção nos
signos de Touro, Câncer, Virgo, Libra ou Capricórnio e maré cheia.
No Minguante da Lua devem cortar-se as madeiras na força do Sol,
colher frutas para guardar, cavar e podar as vinhas; o melhor corte de madeiras
é quando está a maré cheia.
Os melhores dias de caça são um dia antes e outro depois de qualquer
aspecto de Lua. Para caçar aves, lebres ou coelhos são bons os dias em que a
Lua ande ou faça conjunção nos signos de Áries, Touro, Gêmeos, Leão,
Virgem, Libra, Sagitário, Capricórnio e Aquário. Para pescar é bom o quarto
de Lua em Peixes, Câncer e Escorpião.
Nevoeiro. — São nuvens terrestres que se levantam de lugares úmidos, e
ficam espalhadas na atmosfera cuja transparência toldam.
Nuvens. — São agregados de vapores mais ou menos espessos e
encamados na atmosfera aonde se condensam formando as nuvens e as
chuvas.
Chuva. — As chuvas são nuvens grossas que se evaporam dos rios e do
mar, as quais são elevadas pelos ventos a uma distância imensa, derramando
sobre nossos campos a felicidade e a abundância, quando os regam e
alimentam as fontes.
Neve. — A neve forma-se quando os vapores que caem das nuvens se
congelam pelo frio que os surpreendem, e caem então em flocos mui alvos.
Saraiva. — Se os vapores que caem das nuvens têm tempo de formar
pingas que o frio condensa, caem então em granizos, ou pedras de água com a
mesma configuração e grossura, que haviam de ter as pingas d’água como
chuva na sua queda.
Orvalhos. — É um vapor sutil que se observa durante as noites e manhãs
da Primavera, Verão e Outono, e não é mais do que um resfriamento que a
terra experimenta quando cessa de estar exposta aos raios do Sol.
Relâmpagos. — Dá-se este nome ao clarão que precede o estampido dos
trovões, e tem lugar todas as vezes que o fluído elétrico passa dum lugar para
outro, ou que duas nuvens carregadas de eletricidade chegam a encontrar-se.
Trovão. — É o estrondo produzido pelo abalo que o ar recente no
momento em que o fluído elétrico se descarrega sobre uma nuvem ou sobre a
terra. Pode ajuizar-se da distância duma trovoada pelo espaço que há entre o
relâmpago, e o trovão ou por uma pulsação regular; porque se o pulso bate
quatro vezes entre o relâmpago e o som do trovão, é sinal de que a trovoada
está a quatro mil pés de distância, e se bate cinco vezes, está a cinco mil pés
etc.
Raio. — É o fluído elétrico espalhado na atmosfera, que sai com o
estrondo da trovoada sobre a forma de fogo da parte da atmosfera em que
estava acumulado, e derruba, mata e pulveriza aquilo em que toca ou acha
com resistência. Recomenda-se para seu defensivo a pele do lobo marinho, o
loureiro, e o agnus dei.
Terra. — A Terra é um globo achatado nos dois polos, prova-se que é
redonda por que navegando-se de E para O volta-se ao mesmo ponto. Tem a
Terra 7200 léguas de circunferência, e é 1,330,000 vezes mais pequena do que
o Sol, e tem não obstante uma superfície de terras habitadas ou habitáveis, e
águas, que compreende 24 milhões de léguas quadradas, julga-se que as águas
cobrem mais das duas terças partes da superfície da terra. Divide-se o globo
em cinco partes, a saber: Europa, Ásia, África, America e Oceania.
Mr. Letrome, segundo um calculo assaz exato, pretende que em 700
milhões de homens, pouco mais ou menos, que povoam a terra, há perto de
230 milhões de cristãos, 115 milhões de maometanos, 5 milhões de judeus, e
350 milhões de politeístas, povos que admitem mais dum Deus, e grande
número de absurdos.
Atmosfera. — Dá-se este nome à massa dar que cerca a terra até à altura
de 20 léguas pouco mais ou menos, e é aonde se formam vários fenômenos e
se reúnem os gases e exalações secas ou úmidas, e aonde se condensam e
precipitam, e é finalmente aonde se formam as chuvas, ventos, saraivas,
trovões etc.
Ano Solar. — É o tempo que decorre desde um Equinócio até outro
Equinócio, isto é, 365 dias, 5 horas e 49 minutos.
Ano Civil. — É aquele de que usam quase todas as nações, para
contarem o tempo e as idades, é de 365 dias, e os bissextos de 366 dias.
Mês Lunar. — É o espaço de tempo que decorre duma Lua Nova até
outra Lua Nova, e consta termo médio de 29 dias, 12 horas, 44 minutos e 2
segundos.
Cometas. — O número de Cometas que se têm observado é de algumas
centenas e consistem em uma massa luminosa em forma de cabeça,
acompanhada de um rasto luminoso, chamado cauda; o seu movimento é
irregular e tudo o que a respeito deles se tem calculado é puramente
hipotético, há, contudo cometas cuja aparição à nossa vista se acha calculada.
Os antigos consideravam os cometas como presságio de alguma grande
desgraça, hoje, porém, só algum ignorante poderá de tal persuadir-se.
Marés. — Há dois fluxos e dois refluxos do mar no intervalo de cada 24
horas e 49 minutos, estes 49 minutos é o que as marés tardam em subir, isto é,
24 minutos cada maré, juntando pois 24 minutos à hora de cada maré teremos
a hora da maré.
Velocidade da luz do Sol. — Gasta a luz do Sol 8', para chegar à terra,
isto é, para percorrer os 34 milhões de léguas que nos separam daquele astro.
Norte. — Para se achar a estrela do Norte, prolonga-se em linha reta as
duas estrelas a que chamam o leme e o prolongamento destas irá mostrar a
estrela do Norte.
Método fácil para observar os Eclipses do Sol. — Defuma-se em cima
duma luz um pedaço de vidro de vidraça, até que se não veja nada por ele,
faça-se-lhe depois um pequeno buraco no meio, descobrindo-lhe o fumo com
a ponta do dedo pelo qual se pode observar o Eclipse sem que faça mal à vista.
Somar:
Signos, graus e minutos
9
24
38
11
32
47
9
27
25
FIM DA SÉTIMA E ÚLTIMA PARTE

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