MALFORMAÇÕES DE GENITÁLIA MARILÉA GOMES DA

Transcrição

MALFORMAÇÕES DE GENITÁLIA MARILÉA GOMES DA
MALFORMAÇÕES DE GENITÁLIA
MARILÉA GOMES DA COSTA
São Paulo
2012
MALFORMAÇÕES DE GENITÁLIA
MARILÉA GOMES DA COSTA
Monografia apresentada como pré-requisito
para obtenção de Diploma de Conclusão de
Pós-Graduação Lato Sensu em Medicina Fetal
- Projeto Year Book 2012 - FETUS
Orientador: Prof. Dr. Eduardo Valente Isfer
São Paulo
2012
“Quando
se tem sonho grande, a vida se
expande. Sonhos grandes impulsionam,
motivam, dão energia”.
Roberto Shinyashiki
AGRADECIMENTOS
A Deus, que nos deu a vida e nos mostrou o caminho,mantendo sempre sua
luz sobre nós, permitindo a concretização desta etapa importante em nossa vida
profissional.
Aos meus pais, José e Iracema que em todos os momentos, sejam eles de
alegria ou tristeza, estiveram sempre ao meu lado e seus ensinamentos foram
fundamentais para que não me desviasse do caminho.
Ao Flávio, meu esposo, pelo incentivo e companheirismo e por ter a
capacidade de ajudar a transformar meus sonhos em realidade.
Aos meus filhos, Lucas e Marina, pela paciência e compreensão nos
momentos de ausência e por tornar cada conquista melhor ainda.
Ao Prof. Eduardo Isfer pelo conhecimento transmitido e por nos mostrar a
importância do aprimoramento profissional.
Ao Prof. Roberto Cardoso por nos mostrar que para ser um bom profissional é
necessário mais que conhecimento teórico.
A todos que direta ou indiretamente contribuíram para o término deste
trabalho.
RESUMO
Introdução: A avaliação ultrassonográfica da genitália fetal não deve ser realizada
apenas para atender à curiosidade dos pais, ela é fundamental para o diagnóstico
tardio da corionicidade nas gestações gemelares, no diagnóstico de anomalias
genéticas ligadas ao sexo bem como malformações isoladas da genitália.
Objetivo: Realizar uma revisão da literatura acerca das diversas patologias que
podem comprometer a genitália fetal, adquirindo melhor conhecimento sobre suas
etiopatogenias, riscos de anomalias cromossômicas e malformações associadas,
diagnóstico pré-natal, seguimento e prognóstico destas patologias.
Revisão da literatura: As malformações de genitália constituem um grupo de
patologias que apresentam uma incidência variável por se manifestarem de forma
isolada ou mais frequentemente associadas a malformações urinárias e esqueléticas
em função de sua origem mesodérmica. Por este motivo é necessária uma
abordagem cuidadosa na avaliação ultrassonográfica da genitália fetal. Atualmente a
sexagem fetal é um método não invasivo importante no diagnóstico do sexo fetal,
permitindo o diagnóstico de anomalias citogenéticas que no passado, só eram
identificadas no período pós-natal. As malformações de genitália constituem um
grupo de patologias que direcionam o fetólogo a buscar diagnósticos cada vez mais
específicos, aumentando assim as chances de detecção precoce destas patologias
bem como melhor aconselhamento aos familiares destes pacientes.
Palavras-chave: Malformações de genitália; Diferenciação Sexual; Genitália
ambígua.
ABSTRACT
Introduction: Fetal genitalia ultrasonography evaluation should not be performed
just to satisfy parents curiosity, it is crucial for the belated chorionic diagnosis in twin
pregnancies, in genetic abnormalities linked to sex as well as genitalia isolated
deformity.
Objective: To accomplish the literature under several diseases that can commit fetal
genitalia, acquiring better understanding of their etiopathogenesis, risk of
chromosomal anomalies and associated deformity, prenatal diagnosis, monitoring
and prognosis of these diseases.
Literature review: Genitalia deformities constitute a group of pathologies that
presents a variable incidence for manifesting in an isolated way or more often
associated to urinary and skeletal deformities due to its mesoderm origin. Therefore it
is necessary a careful approaching on the fetal sex ultrasonography. Nowadays the
fetal sexing is a non invasive test important for the fetal sex diagnosis, permitting
cytogenic abnormalities diagnosis that in the past were only identified in the postnatal
period. Genitalia deformities are a group of pathologies that orientates fetologist to
search for increasingly specific diagnosis increasing thus the chance of these
pathologies early detection as well as better counseling to these patients relatives.
Keywords: Genitalia deformities; Sexual distinction; Ambiguous genitalia.
LISTA DE ABREVIATURAS
AIS
Síndrome da Insensibilidade Androgênica
AMH
Hormônio Anti-Mulleriano
AR
Receptores Androgênicos
CAIS
Síndrome de Insensibilidade Androgênica Completa
cm
centímetro
DAF
Diâmetro Abdominal Fetal
DHT
Dihidrotestosterona
FSH
Hormônio Folículo Estimulante
GnRH Hormônio Liberador da Gonadotrofina Coriônica
HCG
Hormônio da Gonadotrofina Coriônica
HCSR Hiperplasia Congênita de Supra-Renal
Kg
quilograma
LH
Hormônio Luteinizante
mg
miligrama
mm
milímetro
PAIS
Síndrome de Insensibilidade Androgênica Parcial
PHF
Pseudo Hermafroditismo Feminino
PHM
Pseudo Hermafroditismo Masculino
US3D
Ultrassonografia Tridimensional
VIU
Vida Intra-Uterina
LISTAS DE QUADROS
Quadro 1 - Critérios de Danish para o diagnóstico de genitália ambígua ................. 17
Quadro 2 - Grau de virilização X tempo de acometimento intra-útero ...................... 24
LISTAS DE FIGURAS
Figura 1 - Esquema da ação hormonal na virilização de genitália externa
masculina .................................................................................................................. 15
Figura 2 - Esquema da ação hormonal na formação da genitália interna feminina .. 16
Figura 3 - Diferenciação da genitália externa masculina e feminina......................... 16
Figura 4 - Genitália Ambígua .................................................................................... 20
Figura 5 - Medida da distância no plano sagital entre a bexiga e o reto fetal ........... 21
Figura 6 - Prader II - Aumento do falo associado à fusão posterior das saliências
lábio-escrotais, sem seio urogenital .......................................................................... 25
Figura 7 - Prader IV - Falo de aspecto peniano com fusão completa das saliências
lábio-escrotais, presença de seio urogenital com abertura na base do falo .............. 25
Figura 8 - Prader V - Falo com aspecto peniano, fusão completa das saliências
lábio-escrotais e presença de seio urogenital com abertura no corpo do falo ........... 26
Figura 9 - Aspecto da genitoplastia feminizante com 7 meses de pós-operatório .... 26
Figura 10 - Migração testicular ................................................................................. 30
Figura 11 - Classificação e incidência das hipospádias de acordo com a posição do
meato uretral ............................................................................................................. 35
Figura 12 - Hipospádia “Sinal da tulipa”, caracterizada por pênis curto e modificação
de sua porção distal .................................................................................................. 37
Figura 13 - Aspecto pós-natal de genitália ambígua com hipospádia ...................... 37
Figura 14 - Hidrocele comunicante ........................................................................... 39
Figura 15 - Hidrometrocolpo neonatal ...................................................................... 44
Figura 16 - Ultrassom pélvico-abdominal em volumoso hidrometrocolpo neonatal .. 44
Figura 17 - Controle evolutivo pós-himenotomia e himenoplastia ............................ 45
Figura 18 - Ultrassonografia 2D e 3D em gestação de 34 semanas mostrando cisto
ovariano de 6,7 x 5,5 cm antes da aspiração ............................................................ 47
Figura 19 - Cisto ovariano medindo 2,3 x 1,7cm, 6 dias pós-aspiração ................... 49
SUMÁRIO
RESUMO ................................................................................................................... 5
ABSTRACT ............................................................................................................... 6
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 12
1.1 EMBRIOLOGIA DO SISTEMA GENITAL ..................................................... 13
2 GENITÁLIA AMBÍGUA....................................................................................... 17
2.1 DEFINIÇÃO ................................................................................................... 17
2.2 INCIDÊNCIA .................................................................................................. 18
2.3 ETIOPATOGENIA ......................................................................................... 18
2.4 CLASSIFICAÇÃO.......................................................................................... 19
2.5 ANOMALIAS ASSOCIADAS ........................................................................ 19
2.6 DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL ........................................................................ 19
2.7 CONDUTA PRÉ-NATAL E OBSTÉTRICA .................................................... 22
2.8 PROGNÓSTICO, ASSISTÊNCIA PRÉ-NATAL E PÓS-NATAL ................... 23
3 MALFORMAÇÕES DA GENITÁLIA MASCULINA......................................... 27
3.1 SÍNDROME DE INSENSIBILIDADE AOS ANDRÓGENOS .......................... 27
3.1.1 Definição ................................................................................................ 27
3.1.2 Etiopatogenia e classificação ................................................................. 27
3.1.3 Anomalias associadas ........................................................................... 28
3.1.4 Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 28
3.1.5 Conduta pré-natal e obstétrica ............................................................... 28
3.1.6 Diagnóstico pós-natal ............................................................................ 28
3.2 CRIPTORQUIDIA ........................................................................................... 29
3.2.1 Definição ................................................................................................ 29
3.2.2 Etiopatogenia ......................................................................................... 30
3.2.3 Incidência e classificação ...................................................................... 31
3.2.4 Anomalias associadas ........................................................................... 31
3.2.5 Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 32
3.2.6 Conduta pré-natal e obstétrica ............................................................... 32
3.2.7 Diagnóstico pós-natal ............................................................................ 33
3.3 HIPOSPÁDIA ................................................................................................. 34
3.3.1 Definição ................................................................................................ 34
3.3.2 Etiopatogenia ......................................................................................... 35
3.3.3 Incidência............................................................................................... 35
3.3.4 Anomalias associadas ........................................................................... 36
3.3.5 Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 36
3.3.6 Conduta pré-natal e obstétrica ............................................................... 37
3.3.7 Assistência pré-natal e prognóstico ....................................................... 38
3.4 HIDROCELE ................................................................................................... 38
3.4.1 Definição ................................................................................................ 38
3.4.2 Incidência............................................................................................... 38
3.4.3 Etiopatogenia e classificação ................................................................. 39
3.4.4 Anomalias associadas ........................................................................... 40
3.4.5 Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 40
3.4.6 Conduta pré-natal e obstétrica ............................................................... 40
3.4.7 Prognóstico ............................................................................................ 40
4 MALFORMAÇÕES DA GENITÁLIA FEMININA ............................................. 41
4.1 HIDROMETROCOLPO ................................................................................. 41
4.1.1 Definição ................................................................................................ 41
4.1.2 Incidência............................................................................................... 41
4.1.3 Etiopatogenia ......................................................................................... 42
4.1.4 Anomalias associadas ........................................................................... 42
4.1.5 Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 42
4.1.6 Diagnóstico diferencial ........................................................................... 43
4.1.7 Conduta pré-natal e obstétrica ............................................................... 43
4.1.8 Prognóstico e assistência pré-natal ....................................................... 43
4.2 CISTO OVARIANO ........................................................................................ 45
4.2.1 Definição ................................................................................................ 45
4.2.2 Incidência ............................................................................................... 46
4.2.3 Etiopatogenia ......................................................................................... 46
4.2.4 Anomalias associadas ........................................................................... 47
4.2.5 Diagnóstico pré-natal ............................................................................. 47
4.2.6 Diagnóstico diferencial ........................................................................... 48
4.2.7 Conduta pré-natal e obstétrica ............................................................... 48
4.2.8 Assistência pré-natal e prognóstico ....................................................... 50
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 51
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................... 52
12
1 INTRODUÇÃO
Dentre as várias situações que podem gerar um grau de ansiedade
importante nos pais, o diagnóstico de malformações de genitália durante o exame
ultrassonográfico, sempre foi motivo de preconceitos, dúvidas, estudos e debates.
Na atualidade, as malformações de genitálias constituem um capítulo importante em
medicina fetal e na prática clínica por sua complexidade e pela falta de consenso em
relação a critérios diagnósticos de algumas patologias bem como, do manejo
adequado das mesmas (DAMIANI et al, 2001).
A trajetória para que se chegar a um desenvolvimento sexual normal, seja
feminino ou masculino é complexa e pode está sujeito a erros em diversos
momentos, pois, não é necessário apenas que os estímulos ocorram em
determinadas estruturas embriológicas, mas que a ordem cronológica aconteça de
maneira satisfatória para que o processo se realize a contento (DAMIANI et al,
2001).
A determinação e a diferenciação sexual dependem de uma série de eventos
que se inicia com o estabelecimento do sexo cromossômico durante a fertilização e
termina com a maturação sexual na puberdade e consequente capacidade
reprodutiva na fase adulta (GRUMBACH et al, 2002).
Teoricamente podemos dividir didaticamente este processo em duas etapas:
A Determinação gonodal que é a transformação da gonodal bipotencial e
indiferenciada em testículo ou ovário, e a Diferenciação sexual que leva o indivíduo
ao seu fenótipo com a formação de ductos internos e genitália externa (DAMIANI et
al, 2001).
13
A suspeita ultrassonográfica das malformações de genitália, os critérios
diagnósticos e prognósticos que ocorrem na grande maioria das vezes no período
neonatal são de suma importância na vida destas crianças, pois se não ocorrerem
de forma criteriosa podem acarretar prejuízos irreparáveis ao bem estar psicossocial
das mesmas.
Quanto mais conhecimento tiver sobre estas patologias, tanto no que diz
respeito à sua fisiopatologia, classificação, diagnóstico ultrassonográfico e clínico,
seguimento pré-natal bem como sua história natural, melhor saberemos lidar com
esses pacientes e seus familiares e, consequentemente, com sua saúde global,
social e psicológica (DAMIANI, 1997).
1.1 EMBRIOLOGIA DO SISTEMA GENITAL
O desenvolvimento embrionário genital tanto no sexo masculino como no
sexo feminino passa por etapas comuns denominada de estágio indiferenciado do
desenvolvimento sexual (CHINEN & MORON, 2003).
Por volta da 5ª semana de vida embrionária ocorre a formação de um
espessamento mediano do mesonefro denominado de saliência genital, no período
entre a 4ª e 6ª semana, células sexuais primitivas denominadas de células
germinativas primordiais migram para a saliência genital, formando os cordões
sexuais primitivos que possuem uma região cortical e medular (CHINEN & MORON,
2003).
Nos embriões com cromossomo Y ocorrerá a regressão da porção cortical e
diferenciação da porção medular dos ductos primitivos em túbulos seminíferos,
havendo assim a formação dos testículos. Este processo ocorre devido à ação de
14
um gene indutor do fator testicular, localizado no braço curto do cromossomo Y
denominado Antígeno H-Y ou SRY, bem como genes localizados no cromossomo X
(DAX-1) e autossomos.
Nas gestações onde não existe o antígeno H-Y há diferenciação da Porção
cortical com regressão da porção medular havendo assim a formação dos ovários.
Sendo assim, após a 7ª semana é determinado o sexo gonodal. (CHINEN &
MORON, 2003).
Os embriões apresentam genitália externa indiferenciada e dois conjuntos de
ductos genitais ou sexuais denominados de Ductos mesonéfricos ou de Wolff e os
Ductos paramesonéfricos ou de Muller (DAMIANI et al, 2001).
Nos testículos as células de Leydig produziram a testosterona e as células de
Sertoli produziram o Hormônio Anti-Mulleriano (AMH) que atuará promovendo a
apoptose das células dos ductos de Muller e desenvolvimento dos Ductos de Woolf
que darão origem aos ductos deferentes, epidídimo, vesículas seminais e ductos
ejaculatórios (DAMIANI et al, 2001).
Quando ocorre o desenvolvimento ovariano, a falta na produção de AMH
permite que os ductos de Muller se desenvolvam originando fímbrias, trompas, útero
e terço proximal da vagina. Não havendo Testosterona, os ductos de Woolf não se
desenvolvem e sofrem atrofia (DAMIANI et al, 2001).
O desenvolvimento da genitália externa se inicia por volta da 9ª semana com
término por volta da 12ª semana. Na 4ª semana da embriogênese ocorre a formação
dos tubérculos genitais em ambos os sexos na extremidade cefálica da membrana
cloacal (DAMIANI et al, 2001).
Ao redor da 6ª semana embrionária ocorre o desenvolvimento do Seio
Urogenital, ladeado pelas Pregas Urogenitais. No sexo masculino, as células de
15
Leydig do testículo irão produzir testosterona que sofrerá conversão em
dihidrotestosterona (DHT) pela enzima 5-alfa redutase II que através da presença de
receptores androgênicos na nas pregas urogenitais irá promover o processo de
virilização, formando a rafe do Pênis, o Prepúcio e o Escroto e o tecido mesenquimal
do falo formará o corpo do Pênis conforme figura abaixo.
12
Figura 1 - Esquema da ação hormonal na virilização da genitália externa masculina.
Fonte: Autora.
No sexo feminino, a ausência testosterona e andrógenos determinará a
formação da genitália externa feminina, sendo assim, o seio urogenital originará as
estruturas vulvares e a porção inferior da vagina.
1
2
DHT: Dihidrotestosterona.
AMH: Hormônio Anti-Mulleriano.
16
Figura 2 - Esquema da ação hormonal na formação da genitália
interna feminina.
Fonte: Autora.
Figura 3 - Diferenciação da genitália externa masculina e feminina.
Fonte: Plusformation.com. (s.d., online).
17
2 GENITÁLIA AMBÍGUA
2.1 DEFINIÇÃO
As ambiguidades genitais são consideradas uma emergência em pediatria e a
adequada avaliação de cada caso pode evitar que o paciente seja criado num sexo
inadequado, com interferência importante na sua saúde bio-psico-social. Defini-se
genitália ambígua como a presença de genitália com características sexuais
diferente da habitual para o sexo durante o exame ultrassonográfico. No período
neonatal a literatura refere à utilização dos Critérios de Danish, definidos em 1982,
para melhor definição de ambiguidade sexual (DANISH et al, 1982).
Quadro 1 - Critério de Danish para a definição de genitália ambígua
Genitália de aspecto feminino
Diâmetro clitoriano > 6mm
Genitália de aspecto masculino
Gônadas não palpáveis
Gônada palpável em bolsa labioescrotal
Tamanho peniano abaixo de -2,5DP da média do
tamanho peniano para a idade
Fusão labial posterior
Gônadas pequenas, ou seja, maior diâmetro
inferior a 8 mm.
Massa inguinal que possa corresponder
a testículos
Presença de massas inguinal que poderá
corresponder a útero e trompas rudimentares
Hipospádia
Fonte: Autora.
18
2.2 INCIDÊNCIA
Em um amplo estudo realizado na América do Sul, no período de 1967 a
1982, foi analisado a prevalência em nosso meio das genitálias ambíguas, onde foi
concluído que ocorre 1 caso em cada 20.000 nascimentos, sendo a Hiperplasia
congênita de supra-renal (HCSR) sua principal etiologia (25% a 50% dos casos).A
genitália ambígua é uma entidade rara, com incidência de 1 por 50.000 a 1 por
70.000 nascidos vivos, constituindo uma causa de grave preocupação dos pais e
familiares, com sérias repercussões psicológicas (DAMIANI, 1997).
2.3 ETIOPATOGENIA
A etiologia da ambiguidade sexual pode ser proveniente de vários fatores
(DAMIANI et al, 2001):
• Distúrbios da determinação gonadal (Hermafroditismo). Verdadeiro,
Disgenesia gonadal mista, Disgenesia gonadal pura XY, XX. Disgenesia testicular,
Síndrome da regressão testicular e Agenesia ou Hipogenesia de células de Leydig.
• Distúrbios da função testicular (Deficiência ou anormalidade de LH ou de
síntese de testosterona (Enzimática ou Ingestão hormonal materna)).
• Distúrbios dos tecidos - alvo dependentes de Andrógenos (Deficiência
de 5 alfa redutase tipo II, Síndrome da insensibilidade Androgênica).
• Distúrbios da diferenciação sexual feminina (Hiperplasia congênita de
supra-renal, Deficiência de aromatase, Andrógenos maternos ingeridos e/ou
produzidos).
• Mosaicismo (Hermafroditismo verdadeiro e Disgenesia gonodal mista).
19
• Aneuploidias (Síndrome de Klinefelter e Síndrome de Turner).
2.4 CLASSIFICAÇÃO
Segundo a literatura, as genitálias ambíguas podem ser classificadas em
quatro grupos principais:
- Pseudo-hermafroditismo masculino (46, XY com os testículos íntegros);
- Pseudo-hermafroditismo feminino (46 XX com ovários);
- Hermafroditismo verdadeiro (com ovotestis) e Disgenesia gonodal simétrica
(RIOS et al, 2010).
2.5 ANOMALIAS ASSOCIADAS
A associação com malformações particularmente ano-retais e de coluna
lombo-sacral é comum (MORTAZAVI et al, 2007). A literatura refere que nos casos
em que coexistem criptorquidia e hipospádia, a incidência de genitália ambígua é de
27% e nos casos de hipospádias posteriores a probabilidade é ainda maior
(KAEFER et al, 1999).
2.6 DIAGNÓSTICO PRÉ-NATAL
O diagnóstico da genitália ambígua é feito durante o exame ultrassonográfico,
onde a identificação da genitália não se encontra dentro dos padrões da
normalidade. A determinação do sexo fetal é possível pela ultrassonografia a partir
20
do primeiro trimestre com uma sensibilidade de cerca de 85%, a partir do segundo
trimestre, uma revisão global dos órgãos genitais externos é possível e a abordagem
do sexo fetal tem sensibilidade de diagnóstico de 100% (BIRNHOLZ, 1983).
A
suspeita
da
presença
de
genitália
ambígua
se
dá
quando
o
ultrassonografista apresenta dificuldade na identificação da mesma durante exames
seriados, realizados no segundo e terceiro trimestre de gestação. O profissional que
realiza o exame muitas vezes é incapaz de conseguir diferenciar com clareza um
clitóris hipertrofiado de um pênis curto (VERWOERD-DIKKEBOOM et al, 2008).
Figura 4 - Genitália Ambígua.
Fonte: Machado (s.d., online).
O segundo trimestre da gestação é o período em que a maior parte das
genitálias ambíguas tem seu diagnóstico feito, devido à identificação do útero fetal
nesta fase. O desenvolvimento da ultrassonografia tridimensional (US3D) melhorou
a qualidade das imagens produzidas além de aumentar as possibilidades de
reconstrução de imagens (ROSENBLATT et al, 2006).
21
Segundo a literatura, a avaliação da medida da distância, em um plano
sagital, entre a bexiga e o reto fetal, a fim de estimar-se a presença ou não do útero
fetal, identificou corretamente os fetos do sexo feminino em 98,8% dos casos e os
do sexo masculino em 100% dos casos (ABU-RUSTUM & CHAABAN, 2009).
Figura 5 - Medida da distância no plano sagital entre a bexiga e o reto fetal.
Fonte: Abu-Rustum & Chaaban (2009).
No segundo trimestre, as distâncias medidas entre a bexiga e o reto fetal em
100% dos fetos do sexo masculino foram inferiores a 3,3mm e em 94% dos fetos do
sexo feminino foram superiores a 3,3mm. No terceiro trimestre, as medidas em 96%
dos fetos do sexo masculino foram inferiores a 4,7mm, e em 100%dos fetos do sexo
feminino foram superiores a 4,7mm (GLANC et al, 2007).
Tabela 1 - Medida das distâncias entre a bexiga e o reto fetal no 2º e 3º trimestre
MASCULINO
FEMININO
2º trimestre
2º trimestre
< 3,3mm (100%)
> 3,3mm (94%)
3º trimestre
3º trimestre
< 4,7mm (96%)
> 4,7mm (100%)
Fonte: Autora.
22
O diagnóstico ultrassonográfico de pseudo-hermafroditismo masculino foi de
100% e de Pseudo-hermafroditismo feminino foi de 46% nas idades gestacionais
médias de 26,5ª a 29ª semanas (SHAPIRO et al, 2000).
A identificação durante o exame clínico de um recém-nascido da presença ou
ausência de gônadas é de suma importância. Quando as gônadas estão presentes
nos casos de genitália ambígua temos duas prováveis categorias sindrômicas
(DAMIANI et al, 2001).
• Pseudohermafroditismo masculino (PHM): Cariótipo 46, XY com
presença de testículos e vários graus de feminização das genitálias interna e
externa. Em algumas situações os testículos encontram-se na região inguinal, no
abdômen ou nos grandes lábios.
• Pseudohermafroditismo feminino (PHF): Cariótipo 46, XX, com ovários e
graus variáveis de masculinização da genitália externa decorrente da produção
excessiva de andrógenos, cujo principal responsável é a HCSR.
2.7 CONDUTA PRÉ-NATAL E OBSTÉTRICA
A presença de genitália ambígua requer uma avaliação morfológica fetal
detalhada, em função da possibilidade de malformações associadas. Sendo assim a
presença
de
malformações
urogenitais
pode
está
associada
bem
como
anormalidades vertebrais (RAI et al, 2002).
Além disso, informações adicionais sobre a anatomia da genitália interna, isto
é, a presença ou ausência de útero fetal, podem ser consideradas relevantes para a
avaliação pré-natal de pseudo-hermafroditismo feminino. Em outros casos, nem
23
mesmo a US3D auxilia no diagnóstico, como na avaliação de hipospádia (CAFICI &
IGLESIAS, 2002).
A literatura refere que defeito no gene SOX 9 (SRY-box-related) está
relacionado à condrogênese, diferenciação gonadal e a reversão sexual em
indivíduos
com
cariótipo
46,
XY
denominado
de
Displasia
Campomélica
(Osteocondrodisplasia rara, herdada de forma autossômica dominante) (FOSTER,
1996).
2.8 PROGNÓSTICO, ASSISTÊNCIA PRÉ-NATAL E PÓS-NATAL
Na presença de genitália ambígua é de suma importância oferecer ao casal
cariótipo fetal para avaliação de anomalias cromossômicas e diagnóstico do sexo
genético. Pode-se ainda realizar estudos bioquímicos no liquido amniótico para
dosagem de 17-hidroxiprogesterona e testosterona. Nos casos de história familiar de
HCSR, pode ser realizado o tratamento prévio com dexametasona na dosagem de
20mg/Kg/dia, baseado no peso materno fetal, a partir da 6ª semana de gestação,
com a finalidade de suprimir o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, evitando assim a
virilização da genitália externa de fetos femininos (MILLER, 1999)
No período pós-natal, dados como anamnese, exame físico, avaliação
hormonal, exames de imagens assim como uma discussão multidisciplinar vão
permitir que se defina uma melhor conduta com relação ao sexo de criação de uma
criança com ambiguidade genital. Alguns critérios são importantes para a definição
do sexo de criação tais como: presença ou ausência de gônadas (localização,
tamanho e consistência das mesmas), tamanho do falo e posicionamento do meato
uretral. (DAMIANI et al, 2001).
24
A caracterização da genitália externa pode seguir os critérios de Prader que
apesar de ter sido elaborada em 1954 para HCSR, pode ser utilizada ainda nos dias
de hoje, podendo ser ampliada para outros casos de ambiguidade genital. A
classificação de Prader classifica a genitália externa de meninas com HCSR de
acordo com o grau de virilização que essas pacientes sofreram intra-útero de I a V
(DAMIANI et al, 2001).
O tratamento cirúrgico das crianças com cariótipo 46, XX com HCSR e
genitália ambígua, visa tornar a aparência da feminina, manter o esvaziamento
vesical adequado, sem incontinência ou infecção e promover condições para a
atividade sexual e reprodutiva na vida adulta (BRAGA et al, 2005).
Quadro 2 - Grau de virilização X tempo de acometimento intra-uterino.
Prader I - Aumento isolado do clitóris, indicando que a virilização tenha ocorrido após 20
semanas de vida intra-uterina (VIU).
Prader II - Aumento do clitóris associado a um intróito vaginal profundo, em forma de
funil, podendo visualizar-se aberturas uretral e vaginal distintas, indicando virilização
iniciada com 19 semanas de VIU.
Prader III - Aumento de clitóris associado a um intróito profundo, em forma de funil, com
a uretra esvaziando-se na vagina, como um pseudo seio urogenital. Há vários graus de
fusão lábio-escrotal indicando uma virilização ocorrida com 14-15 semanas de VIU.
Prader IV - Clitóris fálico com abertura urogenital em forma de fenda na base do falo,
indicando virilização ocorrida entre 12-13 semanas de VIU.
Prader V - Fusão lábio-escrotal completa e uretra peniana, indicando virilização ocorrida
com 11 semanas.
Fonte: Autora.
25
Figura 6 - Prader II - Aumento do falo, associado à fusão posterior das
saliências lábio-escrotais, sem seio urogenital.
Fonte: Braga et al (2005).
Figura 7 - Prader IV - Falo de aspecto peniano, fusão completa das
saliências lábio-escrotais, presença de seio urogenital com
abertura na base do falo.
Fonte: Braga et al (2005).
26
Figura 8 - Prader V - Falo com aspecto peniano, fusão completa das
saliências lábio-escrotais e presença de seio urogenital com abertura
no corpo do falo.
Fonte: Braga et al (2005).
Figura 9 - Aspecto da genitoplastia feminizante com 7 meses de pósoperatório.
Fonte: Braga et al (2005).
27
3. MALFORMAÇÕES DA GENITÁLIA MASCULINA
3.1 SÍNDROME DE INSENSIBILIDADE AOS ANDRÓGENOS
3.1.1 Definição
A Síndrome de Insensibilidade aos Andrógenos (AIS), é uma patologia com
herança ligada ao cromossomo X que afeta fetos com cariótipo 46 XY onde pode
ocorrer um comprometimento total ou parcial do processo de virilização intra-útero
como consequência de uma alteração nos receptores androgênicos (AR) (MELO et
al, 2005).
3.1.2 Etiopatogenia e classificação
Segundo a literatura, esta patologia decorre de uma mutação no gene do AR
localizado na genitália externa fetal fazendo com que o processo de diferenciação
sexual não ocorra de maneira satisfatória (MURONO et al, 1995).
A AIS pode ser classificada em Completa (CAIS) e parcial (PAIS) (MELO et
al, 2005).
A CAIS é relativamente rara com prevalência de 1:20.400 nascidos do sexo
masculino. Alguns pacientes são diagnosticados antes do nascimento no período
pré-natal ou logo após o nascimento devido a discordância entre o cariótipo fetal
obtido na amniocentese e a presença de genitália feminina (STEPHENS, 1984).
Nos casos de PAIS ocorre uma variabilidade na expressão clínica com formas
atípicas que podem ser desde clitoromegalia e fusão parcial dos pequenos lábios até
ambiguidade genital ao nascimento (KUPFER et al, 1992).
28
3.1.3 Anomalias associadas
Segundo a literatura, existe uma associação importante desta patologia com
anomalias cromossômicas e, portanto, malformações fetais. As malformações mais
comumente encontradas são: Hipospádia posterior, curvamento peniano, anomalias
escrotais podendo ou não estar associadas com criptorquidia (CHINEN & MORON,
2003).
3.1.4 Diagnóstico pré-natal
O diagnóstico pré-natal, na AIS é feito em 100% dos casos suspeitos,
principalmente onde se tem a confirmação do cariótipo fetal como 46XY na presença
de malformações de genitália (CHEIKHELARD et al, 2000). Nesta patologia pode
haver uma discrepância entre a sexagem fetal e o diagnóstico ultrassonográfico de
genitália de aspecto feminino (RIOS, 2010).
3.1.5 Conduta pré-natal e obstétrica
Na presença de malformações de genitália deve ser sugerido aos pais
cariótipo fetal para avaliação de anomalias cromossômicas e definição do sexo
genético. Podemos realizar ainda, estudos bioquímicos do líquido amniótico para a
dosagem de testosterona e 17-hidroxiprogesterona (CHINEN & MORON, 2003).
3.1.6 Diagnóstico pós-natal
O diagnóstico de AIS deve ser cogitado sempre em recém-nascidos ou
crianças com cariótipo 46XY que apresentem genitália ambígua ou fenótipo
29
feminino, particularmente nos casos em que a resposta da testosterona e
dihidrotestosterona ao teste de estímulo ao hormônio gonadotrofina coriônica (HCG)
forem normais para o sexo masculino e houver história familiar de herança ligada ao
X.
A confirmação diagnóstica é feita pela demonstração de ligação anormal dos
andrógenos ao AR em cultura de fibroblasto da pele da genitália externa destes
pacientes. Segundo a literatura, a apresentação clínica mais comum na infância é a
presença de hérnia inguinal bilateral, com prevalência de 1 a 2% dos casos,
naqueles indivíduos em que o diagnóstico não é feito na infância é comum
amenorréia primária e infertilidade (GRUMBACH et al, 2002).
O quadro clínico desses pacientes na forma parcial (PAIS) é altamente
variável (QUIGLEY et al, 1995).
A forma mais grave de AIS é a apresentação de fenótipo feminino, com
discreta clitoromegalia e fusão parcial dos pequenos lábios. Em alguns casos o
fenótipo é masculino, porém com micropênis, hipospádia perineal e criptorquidia
(KUPFER et al, 1992).
3.2 CRIPTORQUIDIA
3.2.1 Definição
É a ausência dos testículos na bolsa testicular como consequência da falha
da migração normal a partir de sua posição intra-abdominal, podendo ser unilateral
ou bilateral (BAKER et al, 2002).
O diagnóstico ultrassonográfico é feito pela ausência dos testículos na bolsa
testicular (SAITO et al, 1996).
30
3.2.2 Etiopatogenia
Esta patologia ocorre devido a uma falha na migração testicular que é um
processo dependente da interação entre fatores endócrinos testiculares secretados
pelas células de Leydig e fatores mecânicos e ocorre em dois estágios (ACHIRON et
al, 1998).
• Migração transabdominal (10ª a 15ª semana): mediado pelo fator
hormonal insulina-símile 3 (INSL3), secretado pelos testículos fetais na 9ª semana
de gestação.
• Migração Inguinoescrotal (24ª a 35ª semana): depende da secreção
testicular de andrógenos, do gubernáculo e do epidídimo.
Figura 10 - Migração testicular.
Fonte: Aderbal Junior (s.d., online).
A criptorquidia pode ocorrer de forma isolada ou associada a desordens
endócrinas; alterações da diferenciação sexual; síndromes malformativas ou gênicas
(RIOS et al, 2010).
31
Segundo a literatura, quando maior o tempo de permanência dos testículos
fora da bolsa testicular, maior o risco de diminuição da qualidade e do número de
espermatozóides bem como do aumento do risco de alteração histológica podendo
levar a transformação maligna (CHINEN & MORON, 2003).
3.2.3 Incidência e classificação
A ocorrência familiar é de 1,5% a 4% em fetos cujo pai foi acometido e de
6,2% do caso de acometimento de um irmão (CHINEN & MORON, 2003).
A criptorquidia isolada é a anomalia mais comum ao nascimento. Nos recémnascidos de termo a incidência é de 3,4%,enquanto que nos prematuros estes
índices chegam a 30,3%.No primeiro ano de vida a incidência de criptorquidia chega
a 0,8% (CHINEN & MORON, 2003).
Segundo a literatura, as criptorquidias podem ser classificadas em:
• Abdominal: testículo permanece na cavidade abdominal.
• Canalicular: testículos localizados entre o anel inguinal superficial e
profundo.
• Ectópico: encontra-se localizado fora da cavidade abdominal e do canal
inguinal.
• Retrátil: ocorre quando o testículo desce até o escroto, entretanto, não se
fixa, subindo novamente.
3.2.4 Anomalias associadas
As anomalias associadas mais frequentes com criptorquidia são decorrentes
de alterações na produção de gonadotrofinas ou andrógenos, síndromes gênicas e
fibrose cística.
32
As principais síndromes associadas com criptorquidia são: Síndrome de
Kallman; Síndrome de Klinefelter; Síndrome de Noonan e Síndrome de Prune-Belly
(CHINEN & MORON, 2003). A literatura refere ainda que mutações nos genes
INSL3/RXFP2, geralmente estão associadas com criptorquidia bilateral (FERLIN et
al, 2008).
Nos casos de criptorquidia bilateral, principalmente em associação com
hipospádia, há um risco de 15% a 50% de associação com genitália ambígua
(DENES et al, 2006).
3.2.5 Diagnóstico pré-natal
Aproximadamente 95% dos fetos entre 32-33 semanas apresentam os
testículos na bolsa testicular. Nos casos de criptorquidia não ocorre a visualização
dos testículos na bolsa testicular após este período em decorrência de
anormalidades anatômicas na fase inguinoescrotal da descida testicular, visto que
somente 5% dos testículos operados no período pós natal encontravam-se na
cavidade abdominal (ACHIRON et al, 1998).
3.2.6 Conduta pré-natal e obstétrica
Em casos de suspeita de criptorquidia é de boa norma fazer o
acompanhamento criterioso da descida testicular. Segundo a literatura, a partir da
26ª semana pelo menos um dos testículos já se encontra na bolsa testicular, entre
28ª e 32ª semanas cerca de 50% a 62% dos fetos apresentam os testículos na bolsa
e 93% a 95% dos fetos entre 32ª-33ª semanas já apresentam ambos os testículos
em sua posição correta (RIOS et al, 2010).
33
3.2.7 Diagnóstico pós-natal
A confirmação diagnóstica é feita pelo neonatologista, sendo que, em cerca
de 70% a 77% dos casos ocorre a descida testicular até o 3º mês de vida.
Raramente há descida testicular após o primeiro ano de vida (DENES et al, 2006).
O tratamento deve ser iniciado a partir do 6º mês e completado ao término do
2º ano de vida. Os principais objetivos do tratamento são: prevenção de lesões
histológicas testiculares, possibilidade de controle de malignidade, tratamento da
hérnia inguinal associada (frequente em 90% dos casos), recolocação testicular na
bolsa escrotal, diminuição do risco de torção e trauma testicular bem como
prevenção de problemas psicológicos (DENES et al, 2006).
A conduta terapêutica pode ser hormonal e cirúrgica. O tratamento hormonal
é feito com HCG e hormônio liberador da gonadotrofina coriônica (GnRH), ambos
atuam elevando os níveis de testosterona (SCHNECK et al, 2002).O HCG atua
estimulando diretamente as células de Leyding e o GnRH promove a produção de
LH e, consequentemente, produção testicular de Testosterona (CHINEN & MORON,
2003).
Estudos clínicos demonstram a importância da elevação dos níveis de
testosterona nos primeiros meses de vida que atuariam estimulando a descida
espontânea dos testículos para a bolsa testicular.
O tratamento hormonal está indicado nas seguintes situações:
• Testículos criptorquídicos baixos.
• Testículos retráteis.
• Afecções bilaterais.
34
A terapêutica hormonal pode ser utilizada nas semanas que antecedem a
cirurgia por promoverem uma neovascularização testicular aumentando assim, sua
resistência ao trauma cirúrgico (DENES et al, 2006).
O tratamento cirúrgico pode ser realizado junto ao tratamento hormonal ou
após a falha do mesmo. Deve ser realizado preferencialmente entre a 12º e o 18º
mês de vida.
Nos casos onde a orquipexia não é possível ou quando o paciente está no
período pré-púbere opta-se pela orquiectomia. Pacientes com criptorquidia tem um
risco maior de evoluir com torção testicular, hérnia inguinal, infertilidade e
transformação maligna (CHINEN & MORON, 2003).
Segundo a literatura, 10% dos tumores de testículos estão associados à
criptorquidia; sendo que o risco de transformação maligna é de 35 a 48 vezes maior
quando comparada aos testículos de localização tópica (CHINEN & MORON, 2003).
3.3 HIPOSPÁDIA
3.3.1 Definição
É uma malformação decorrente de uma abertura anômala do meato uretral,
onde se observa uma curvatura ventral do pênis. Considera-se como forma grave de
hipospádia quanto mais próxima for a exteriorização da uretra (Hipospádia perineal)
e forma leve quanto mais distal se localizar o meato uretral (Sulco coronal).
As hipospádias são classificadas de acordo com a posição do meato uretral
em: Anteriores (75%) - Glandulares, Coronal e Peniana anterior; Média (7,5%) Peniana média e Posteriores (17,5%) - Peniana posterior, escrotal e perineal.
35
Figura 11 - Classificação e Incidência das hipospádias de acordo com a posição
do meato uretral.
Fonte: Uroped (2005, online).
3.3.2 Etiopatogenia
A etiologia é multifatorial podendo ocorrer por fatores hereditários. A literatura
refere que 8% dos pacientes acometidos têm pai com hipospádia. Outros fatores
como baixa produção de testosterona ao estímulo do HCG, deficiência na função da
5 alfa-redutase, diminuição dos níveis de diidrotestosterona, alterações nos
receptores periféricos dos androgênios e exposição fetal a níveis elevados de
progesteronas bem como fungicida-pesticidas com ação anti-androgênicas também
são referidos (FERNANDEZ et al, 2007).
3.3.3 Incidência
A hipospádia é a anomalia de genitália externa mais frequente, com
incidência de 0,2 - 4,1: casos para 1.000 nascidos vivos (RIOS et al, 2010).
36
O risco de recorrência pode atingir 14% dos casos, no caso de um irmão
acometido e de 8% se houver comprometimento do pai (SAITO et al, 1996).
3.3.4 Anomalias associadas
A associação com anomalias é de cerca de 2% a 12% sendo mais comum às
urinárias (12% a 50%), assim como ânus imperfurado (46%), mielomeningocele
(33%), criptorquidia (9%), hérnia inguinal (9%) e Intersexo. Nos casos de
hipospádias posteriores associadas à criptorquidia a incidência de Intersexo chegou
a 27% dos casos.
As anomalias cromossômicas podem está presentes em 7% dos casos,
principalmente se houver outras malformações associadas (MACEDO & SROUGI,
1998).
3.3.5 Diagnóstico pré-natal
O diagnóstico pré-natal pode ser suspeitado nos casos em que se observa ao
exame ultrassonográfico alteração na curvatura do pênis, direcionando o mesmo
para a região caudal. Alguns autores relatam a visualização de alteração na direção
do fluxo miccional (SAITO et al, 1996).
A literatura refere ainda o “sinal da tulipa”, comum em casos de intensa
hipospádia, que corresponde ao pênis curto e encurvado entre as duas pequenas
dobras da bolsa testicular (MEIZNER, 2002).
37
Figura 12 - Hipospádia “Sinal da tulipa”, caracterizada por pênis
curto e modificação de sua porção distal.
Fonte: Machado (s.d., online).
Figura 13 - Aspecto pós-natal de genitália ambígua com
hipospádia.
Fonte: Machado (s.d., online).
3.3.6 Conduta pré-natal e obstétrica
Frente a um diagnóstico de hipospádia é importante a realização de USG
morfológico para pesquisa de outras malformações associadas. Alguns autores
38
recomendam também a pesquisa de cariótipo fetal devido a possível associação
com outras malformações.
Devido a sua associação com anomalias do trato urinário (12% a 50% dos
casos) recomenda-se monitoramento ultrassonográfico do líquido amniótico.
A via de parto preferencial é de indicação obstétrica (SAITO et al, 1996).
3.3.7 Assistência pré-natal e prognóstico
O prognóstico é na maioria das vezes favorável e depende do tipo de
hipospádia bem como de anomalias associadas. O tratamento é cirúrgico e tem
como principal objetivo o restabelecimento de uma adequada micção assim como de
uma vida reprodutiva e sexual dentro da normalidade.
O melhor momento para ser realizado o procedimento cirúrgico é entre o 1º e
5º ano de vida a fim de minimizar os efeitos psicológicos da malformação (DENES et
al, 2006).
3.4 HIDROCELE
3.4.1 Definição
A Hidrocele é o acúmulo de líquido peritonial ao redor dos testículos no
interior da túnica vaginal (STRINGER & GODBOLE, 2001).
3.4.2 Incidência
Segundo a literatura, esta patologia acomete cerca de 6% dos recémnascidos masculinos de termo sendo condição comum no 3º trimestre da gestação.
39
3.4.3 Etiopatogenia e classificação
O acúmulo de líquido na túnica vaginal ocorre devido uma alteração na
relação produção/absorção de líquido testicular ou por permanência parcial ou total
do processo vaginal que acompanha o testículo em sua migração para a bolsa
testicular.
Segundo Denes et al (2006), as hidroceles, dependendo do grau de
persistência do processo vaginal, podem ser classificadas em:
• Hidrocele Simples: ocorre devido à obliteração proximal completa do
processo vaginal.
• Hidrocele Comunicante: ocorre devido à obliteração incompleta do
Processo vaginal, responsável pela maioria das hidroceles de recém-nascidos
(prematuros) e crianças.
A resolução das hidroceles ocorre de maneira espontânea com o fechamento
fisiológico do canal inguinoescrotal que ocorre espontaneamente até o 2º ano de
vida (DENES et al, 2006).
Figura 14 - Hidrocele comunicante.
Fonte: Susaníbar (2009, online).
40
3.4.4 Anomalias associadas
A associação de hidrocele com malformações ou anomalias cromossômicas é
rara.
3.4.5 Diagnóstico pré-natal
O diagnóstico ultrassonográfico é realizado através da identificação de
Imagem anecóica e homogênea no interior da bolsa testicular que pode ser uni ou
bilateral, pode-se observar ainda deslocamentos ou achatamentos testiculares em
caso de grandes hidroceles (RIOS et al, 2010).
3.4.6 Conduta pré-natal e obstétrica
A conduta expectante é a observada no período fetal. No primeiro ano de vida
geralmente ocorre o fechamento do canal inguinal com consequente diminuição da
passagem de fluido peritonial para a bolsa testicular.
Nos casos de torção testicular no período pós-natal, a conduta é cirúrgica,
onde se realiza a orquipexia.
3.4.7 Prognóstico
Segundo a literatura o prognóstico é favorável, não havendo relatos de
alterações na fertilidade ou outras intercorrências. (DENES et al, 2006).
41
4 MALFORMAÇÕES DA GENITÁLIA FEMININA
4.1 HIDROMETROCOLPO
4.1.1 Definição
Hidrometrocolpo é o acúmulo de secreções no útero e na vagina associadas à
obstrução do trato genital, decorrente de fístula uterovaginal, levando a retenção de
fluidos na vagina ou cavidade uterina (REZENDE et al, 1996).
Quando ocorre acúmulo de sangue denomina-se hidrometrocolpo e quando
ocorre acúmulo de secreções limitadas à vagina denomina-se Hidrocolpo
(REZENDE et al, 1996).
4.1.2 Incidência
Hidrocolpos e Hidrometrocolpos representam 15% das causas de massas
abdominais em recém nascidos do sexo feminino com uma incidência de 1/16000
dos fetos do sexo feminino. Podem fazer parte de uma expressão complexa de
malformação cloacal que cursa com hidronefrose (SAXENA et al, 1993).
A malformação cloacal é rara, apresenta uma incidência de 1:50.000 a
400.000 nascimentos, decorre de uma falha no desenvolvimento do septo uroretal,
que separa o canal anorretal do trato urogenital, resultando em diferentes graus de
anormalidades (malformações urogenitais, retais, perineais e da genitália externa).
Ao nascimento observa-se uma abertura perineal única onde notam-se os tratos
urinário, genital e gastrintestinais (HUNG et al, 2008).
42
4.1.3 Etiopatogenia
Decorre de um defeito no desenvolvimento do seio urogenital ou da cloaca.
Pode estar associada a defeitos cromossômicos ou gênicos. Deste 1940, há
evidências de que hímen imperfurado é a principal causa de hidrometrocolpo, sendo
a anomalia genital mais frequente. Outras anomalias genitais tais como atresias
vaginais são geralmente acompanhadas de alterações do trato urinário, polidactilia e
ânus imperfurado (REZENDE et al, 1996).
Algumas síndromes podem estão associadas com hidrometrocolpo. A
síndrome de Mckusick-Kaufman é uma patologia autossômica recessiva em que se
observa hidrometrocolpo, polidactilia e anomalias cardíacas, quando acomete
indivíduos do sexo masculino cursa somente com polidactilia ou sindactilia pós-axial.
(SAITO et al, 1996).
4.1.4 Anomalias associadas
Nos casos em que o hidrometrocolpo resulta de hímen imperfurado, a
associação com anomalias é rara, mas se a causa for decorrente de uma atresia
vaginal ou cervical a associação com anomalias do sistema urogenital corresponde
a 30% (SAITO et al, 1996).
A literatura refere ainda a associação com anomalias esqueléticas de
membros inferiores, hipoplasia sacral e atresia de esôfago (SAITO et al,1996).
4.1.5 Diagnóstico pré-natal
A imagem ultrassonográfica que sugere hidrometrocolpo é anecóica ou mista,
em topografia retrovesical e em fetos do sexo feminino, quando houver suspeita de
43
anomalia cloacal, a ressonância magnética fetal é uma ferramenta importante no
diagnóstico (HAYASHI, 2005).
A literatura refere que o diagnóstico é feito na maioria das vezes no 3º
trimestre (CHINEN & MORON, 2003).
4.1.6 Diagnóstico diferencial
A literatura refere que os principais diagnósticos diferenciais são as
malformações cloacais, cistos ovarianos, atresia intestinal, síndrome da megabexiga
e uropatias obstrutivas (RIOS et al, 2010).
Nos casos em que a imagem apresenta ecogenicidade mista, o diagnóstico
diferencial deve ser feito também com tumores sólidos de ovário, tumores sacrais,
cistos ovarianos hemorrágicos e distensão retal (SAITO et al, 1996).
4.1.7 Conduta pré-natal e obstétrica
Nos casos de suspeita diagnóstica de hidrometrocolpo, a conduta é
expectante, com controle ultrassonográfico seriado do líquido amniótico (risco de
oligoâmnio) e realização de ultrassonografia morfológica bem como ecocardiografia
fetal para exclusão de síndromes (SANDEEP & AJAY, 2003).
4.1.8 Prognóstico e assistência pré-natal
A via de parto é de indicação obstétrica e na assistência ao recém-nascido
deve-se realizar cateterismo vaginal e vesical intermitente. O diagnóstico pós-natal é
feito pela ressonância magnética, ultrassonografia pélvica, genitografia e cistografia
(CHINEN & MORON, 2003).
44
O tratamento cirúrgico geralmente ocorre a partir do 6º mês de vida, nos
casos de hímen imperfurado, a realização de himenotomia reverte o quadro,
naquelas situações em que a causa é atresia vaginal ou cervical, a correção
cirúrgica torna-se mais complexa (SAITO et al, 1996).
Figura 15 - Hidrometrocolpo neonatal. (1.a) Hímen imperfurado
abaulando-se pelo intróito vaginal; (1.b,c) Drenagem da secreção vaginal;
(1.d) Himenoplastia com pontos cirúrgicos para hemostasia.
Fonte: Wosny et al (2009).
Figura 16 - Ultrassom pélvico-abdominal em volumoso hidrometrocolpo neonatal. (2.a)
Importante distensão vaginal por conteúdo líquido espesso alcançando o mesogástrio.(2.b.c)
Hidronefrose bilateral de etiologia compressiva pela distensão vaginal. (2.d) Útero rechaçado
cranialmente. (2.e,f) Seta indicando o orifício externo do colo uterino.
Fonte: Wosny et al (2009).
45
Figura 17 - Controle evolutivo pós-himenotomia e himenoplastia. (3.a,b,c) Distensão vaginal e
hidronefrose bilateral antes do procedimento cirúrgico. (3.e,f) Sem distensão vaginal. (3.g,h)
Resolução da hidronefrose.
Fonte: Wosny et al (2009).
O prognóstico é reservado, com taxa de mortalidade podendo chegar a 50% a
70% em decorrência de outras anomalias associadas e risco aumentado de
infecções devido às várias cirurgias reparadoras a que estas crianças são
submetidas (CHINEN & MORON, 2003).
4.2 CISTO OVARIANO
4.2.1 Definição
O cisto ovariano fetal é proveniente do acúmulo de líquido ou sangue no
interior do folículo por ação hormonal que ultrapassa a barreira placentária
(KARASAHIN et al, 2008).
46
4.2.2 Incidência
A presença de pequenos cistos foliculares é um achado frequente e normal
nos ovários neonatais. Em recém-nascidas de um dia a três meses de vida, cistos
de até 9 mm de diâmetros são encontrados em 82% dos casos e cistos acima de 9
mm (macrocistos) são identificados em 20% dos exames realizados por indicação de
cisto ovariano (CHIARAMONTE et al, 2001).
4.2.3 Etiopatogenia
Os cistos resultam da estimulação excessiva do ovário pelos hormônios
placentários, maternos e fetais. O ambiente fetal é rico em gonadotrofinas
hipofisárias representadas pelo hormônio folículo estimulante (FSH) e hormônio
luteinizante (LH), gonadotrofinas placentárias (HCG) e estrógenos feto-placentários,
hormônios estes, que estimulam os folículos fetais proporcionando a formação do
cisto ovariano (KARASAHIN et al, 2008).
Podem
ser
classificados,
com
relação
as
suas
características
ultrassonográficas, em simples ou complexos e com relação ao seu tamanho, em
grandes ou pequenos (MOREIRA et al, 2011).
Esta patologia é mais frequente nas gestantes hipertensas, diabéticas e com
aloimunização RH por aumento na produção local de HCG ou facilidade na
permeabilidade placentária do HCG, a associação de cistos ovarianos com
hipotireoidismo fetal é relatada também pela literatura (JAFRI et al, 1984).
Ao nascimento, com a diminuição dos estímulos hormonais maternos, ocorre
uma diminuição acentuada do volume com posterior regressão (RIZZO et al, 1989).
47
4.2.4 Anomalias associadas
A associação com anomalias cromossômica é rara (RIOS et al, 2010).
4.2.5 Diagnóstico pré-natal
Segundo a literatura, a 19ª semana de gestação é a idade gestacional com o
diagnóstico mais precoce, sendo a maioria dos cistos detectados no final do
segundo trimestre, mais precisamente após a 28ª semana. O diagnóstico é
basicamente ultrassonográfico onde nota-se uma ou mais estruturas císticas na
pelve fetal com conteúdo anecóico e homogêneo, com paredes finas e regulares em
fetos do sexo feminino. Nos casos em que ocorre sangramento ou torção do cisto,
comumente observamos, alterações na ecogenicidade do parênquima, ficando este,
com debris em seu interior e espessamento de parede (RIOS et al, 2010).
Figura 18 - Ultrassonografia 2D(a) e 3D(b), em
gestação de 34 semanas, mostrando cisto
ovariano de 6,7 x 5,5cm, antes da aspiração.
Fonte: Moreira et al (2011).
48
4.2.6 Diagnóstico diferencial
O diagnóstico diferencial deve ser feito com cisto mesentérico, cisto intestinal,
cisto de úraco, meningocele anterior, teratoma sacrococcígeo cístico intrapélvico,
hidrometrocolpo, pseudocisto meconial e bexigoma (KARASAHIN et al, 2008).
4.2.7 Conduta pré-natal e obstétrica
A conduta nos cistos ovarianos é expectante, devendo-se monitorar o
tamanho bem como a ecogenicidade do cisto, pois, nos casos de torção ou
sangramento do cisto é comum haver alterações em sua ecogenicidade. Quando os
cistos atingem dimensões importantes levando à compressão do trato urinário ou
digestivo podem ocorre alterações no volume do líquido amniótico (MEIZNER et al,
1991).
A abordagem pré-natal e pós-natal dos cistos ovarianos ainda é controversa,
mas tem como principal objetivo, a preservação do tecido ovariano. As medidas
conservadoras orientam à importância de um controle seriado do tamanho do cisto
ovariano excluindo sinais de torção ou outras complicações (MEIZNER et al, 1991).
A regressão espontânea ocorre em mais da metade dos casos de cistos
ovarianos fetais, no período pré-natal ou pós-natal. Nos casos em que ocorre
comprometimento das estruturas adjacentes por processo expansivo pode-se
realizar punção esvaziadora intra-útero, principalmente nos cistos com diâmetros
superiores a 40 mm, nos casos em que há aumento rápido do volume (superior a 10
mm por semana) ou desvio de estruturas abdominais adjacentes em exames
seriados (MOREIRA et al, 2011).
49
A aspiração intra-uterina é um procedimento eficaz e seguro nos cistos
simples parece reduzir os riscos de complicações, principalmente de torções, de
86% para 14% que ocorrem principalmente no período pré-natal e intra-parto. Nos
cistos complexos, a literatura refere à importância de exploração cirúrgica, sendo
sempre que possível minimamente invasiva, com o objetivo de preserva o ovário e a
futura fertilidade (MOREIRA et al, 2011).
Figura 19 - Cisto ovariano medindo 2,3 x 1,7 cm, 6 dias pós-aspiração.
Fonte: Moreira et al (2011).
O diagnóstico intra-útero de hemorragia intra-cística, torção ovariana ou cistos
bilaterais é indicação de parto prematuro depois de assegurada à maturidade
pulmonar fetal (KARASAHIN et al, 2008).
A escolha da via de parto dependerá do comprometimento do diâmetro
abdominal fetal (DAF), quando não houver comprometimento, o parto vaginal poderá
ser escolhido. Nos casos em que ocorre comprometimento do DAF, ou receio de
ruptura traumática na passagem do canal de parto pode-se optar pelo parto cesárea.
50
4.2.8 Assistência pré-natal e prognóstico
Na maioria dos casos observa-se regressão espontânea dos cistos em um
período de até 12 meses.
No período pós-natal as condutas são controversas. Em cistos com diâmetros
inferiores a 4 cm, pode-se realizar controle ultrassonográfico, pois, os riscos de
complicações são menores, nos casos em que não ocorre diminuição dos cistos,
alterações ecográficas sugestivas de torção, hemorragia ou aumento progressivo,
pode-se realizar laparotomia ou laparoscopia com exérese do cisto (MOREIRA et al,
2011).
A literatura refere que nos casos em que são abordados por uma conduta
conservadora, a regressão ocorre em um período médio de 8 meses. Quando optase por conduta cirúrgica, a laparoscopia é um bom método diagnóstico e terapêutico
e proporciona a realização de revisão do anexo contralateral e das estruturas
pélvicas (CHINEN & MORON, 2003).
51
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O nascimento de uma criança é sempre cercado por expectativas, projetos e
perspectivas, sendo um momento difícil para pais e familiares, lidarem com perdas
ou deficiências, pois embora todos tenham conhecimento que malformações fetais
podem acontecer, a grande maioria das pessoas não está preparada para lidarem
com estas situações. Todos querem filhos perfeitos.
Na presença de malformações fetais e mais especificamente, malformações
de genitália, a impossibilidade de saber de imediato o sexo, a necessidade de
exames seriados em algumas patologias e a associação das mesmas com
anomalias cromossômicas, cria uma situação que tem implicações sociais e em
algumas patologias até legais.
As malformações de genitália geram fantasias, medos e questionamentos
pessoais que podem interferir em todo o processo de diagnóstico, tratamento,
prognóstico e aceitação da patologia do paciente nas diferentes etapas de sua vida.
Na literatura médica fetal, nota-se um número crescente de trabalhos
científicos, buscando um melhor conhecimento acerca de sua fisiopatologia,
investigação diagnóstica, conduta, aspectos epidemiológico e psicológico. A
caracterização precoce de um paciente com alteração na diferenciação sexual
possibilita a descoberta de situações cruciais para a vida do paciente como, por
exemplo, nos casos de Hiperplasia Adrenal Congênita.
Apesar da grande maioria das malformações de genitália não serem
incompatíveis com a vida, se não forem abordadas de maneira satisfatória podem
trazer prejuízos importantes ao bem estar bio-psico-social destes pacientes.
52
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