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REPORTAGEM| www.backstage.com.br
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Doze anos após o fim da
banda, a Dorsal Atlântica,
uma das pioneiras do gênero
trash metal no Brasil, retorna
às atividades com o álbum de
inéditas, 2012, gravado entre
julho e setembro, no estúdio
SuperFuzz, no Rio de
Janeiro. Com lançamento
previsto para o final de
outubro, o trabalho,
financiado por fãs através da
plataforma crowdfunding,
marca a volta de Carlos
Lopes (vocais e guitarra),
Cláudio Lopes (baixo) e
Hardcore (bateria),
integrantes da formação
original que se reuniu, pela
última vez, há 22 anos.
Luiz Urjais
[email protected]
Fotos: Divulgação
Dorsal
Atlântica
ÌCONE DO METAL NOS ANOS 80 RETORNA COM NOVO CD
C
om arrecadação em cerca de R$ 50
mil, o álbum é resultado de um
‘insight’ tido por Carlos, após convite
para participar como atração principal
do festival ‘Metal Open Air’, em abril
deste ano, em São Luis, no Maranhão. “A
formação deste CD é a mesma que gravou os discos mais populares, entre 1986
e 1990 (Antes do Fim, Dividir & Conquistar e Searching for the Light). Foi uma maneira de presentear os apoiadores. Além
do mais, na realização de 2012 não de-
pendemos de ninguém, senão do público. Para termos dado início à campanha de financiamento, corremos toda
espécie de riscos, entre ônus e bônus:
descrédito, sucesso, fracasso, apoios, críticas... Quando a banda começou, imagine só, vendi uma coleção de selos para
bancar o primeiro disco, em 1984, o
Ultimatum (relançado em LP pelo selo
Hell Music). Trazer o socialismo à música é fazer história em grupo. A luta pela
arte livre é coletiva. E o crowdfunding
propõe a ideia de construir uma obra juntos, sem intermediários entre os fãs e a banda”, explica o músico carioca, cuja campanha de financiamento coletivo se desenrolou por 45 dias.
De acordo com Carlos, o trabalho é
dividido em temas que se inter-relacionam e conectam as questões
políticas e filosóficas. Cada faixa
expressaria um manifesto, seja pessoal ou coletivo, priorizando o aspecto ideológico que, para ele, é tão
importante quanto o musical. “O
título do álbum simboliza ‘um ano
de profundas transformações; o ano
do impossível’. E o que haveria de
mais ‘impossível’ que um novo disco da Dorsal Atlântica?”, satiriza.
“Música, valores espirituais e políticos coesos. Essa é a ordem que
mantém os temas unidos: morte,
guerra e conflito; valores morais e
patrióticos; de minha vida pessoal;
políticos e sobre a Ditadura”.
Ainda de acordo com Carlos, o álbum soma a tradição musical da
banda a elementos modernos, sem
descaracterizar a proposta inicial
da Dorsal Atlântica. “Uma parte
importante do processo de compo-
No no no no no
No no no no no
No no no no no
sição é a “incorporação”. Você
engravida pela ideia e as músicas e
letras surgem umas após as outras.
Não somos as mesmas pessoas que
gravaram os discos nas décadas de
80 e 90. Falando por mim, percebo
Superfuzz Vinicius Lima
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“
Conheci o Carlos
em 2008 e tive a
oportunidade de
atuar com ele,
também em 2010 e
2011, em projetos
diversos. Foi uma
grande honra ser
convidado para
gravar e mixar o
disco. Senti-me
muito grato pela
oportunidade
(Sérgio Filho)
”
No no no no no
que sou mais objetivo e só escolho o que
gosto de cara, não fico burilando, tentando consertar. A rapidez não interfere
na qualidade, apenas mostra que o foco é
maior. Quando a banda estava na ativa,
lançávamos um novo trabalho, no mais
tardar, a cada três anos. Eu compunha
com uma boa margem de tempo e testávamos as músicas ao limite, até que estivessem entranhadas. Dessa vez foi completamente diferente: teríamos “apenas” quatro meses para compor, ensaiar e
prensar. O cronograma foi cumprido,
sem afetar em nada a qualidade do trabalho”, assegura.
GRAVAÇÃO
Segundo o técnico de som de 2012, Sergio Filho, o maior desafio desta empreitada foi aliar o que os três músicos têm
de melhor ao que os conecta com os fãs.
Ele afirma que, desde o início do processo, considerou a importância da banda
para o metal nacional, bem como o fato
de ter sido um disco financiado pelo
público. “Foi o trabalho mais importante na minha carreira até o momento. Bastante singular pela característica
old school. Nunca fui especialista no
metal dos anos 80. Como laboratório,
escutei bandas daquela época”. Sergio
conta que o convite surgiu no início
deste ano, quando o esboço de retorno
da banda estava sendo feito. “Conheci o
Carlos em 2008 e tive a oportunidade de
atuar com ele, também em 2010 e 2011,
em projetos diversos. Foi uma grande
honra ser convidado para gravar e mixar
o disco. Senti-me muito grato pela
oportunidade, tendo em vista que uma
banda deste porte poderia ter convidado qualquer produtor de renome no
mercado. Trabalhar para o artista é mais
importante que tudo. Um bom disco
não é feito por disputa de egos e sim por
dedicação e trabalho em equipe”, opina.
Para o técnico, um dos motivos que o
levou a indicar o estúdio SuperFuzz foi a
presença do conversor Aurora, da Lynx.
Em sua opinião, este é o melhor conversor AD/DA, superando os originais
do Pro Tools HD. “Como a banda, e
principalmente o Carlos, prezavam
muito pela sonoridade old school, um
bom conversor se fez essencial para
manter os timbres orgânicos”, comenta.
Para a microfonação de bateria, Sergio
utilizou 01 AKG D112 dentro do bumbo, e 01 MXL 2003, fora. Neste último,
todos os agudos e médios foram cortados, para simular o efeito obtido com o
Yamaha Sub Kick. Para a caixa, 01 Shure
Setup Carlos
SM57, na pele de ataque e na esteira, e 01 MXL 603S apenas na pele
de ataque. Nos tons, foi usado 01
No no no no no
par de AKG C418 – o que ele descreve como a grande descoberta.
“É um microfone que já está fora de
Lista de equipamentos utilizados na gravação
Plataforma:
- Avid Pro Tools 9.0.6
- Interface M-Audio 2626 + conversor
Aurora Lynx 16 (total de 24 in/out
analógicos e 2 in/out digitais)
- Mesa de som Mackie 1604 VLZ3
- Diversos plug-ins
Monitoração:
- Event TR-8
- Yamaha NS10 (amp Hafler Pro2400)
- Fones AKG K-44
- Fone Vic Firth Para Bateristas
- Presonus Central Station
- Furman Headphone Amp
Periféricos:
- API 3124+ (preamp 4 canais)
- ART Dual MP (preamp valvulado 2 canais)
- Joemeek TwinQ (preamp 2 canais
com compressor e EQ)
- Joemeek ThreeQ (preamp com compressor e EQ)
- Empirical Labs EL8-X Distressor w/
British Mod (compressor)
- Empirical Labs Fatso Jr. (compressor
estéreo)
- Empirical Labs UBK Fatso (compressor estéreo)
- FMR Audio Really Nice Compressor
(compressor estéreo)
- Gravador de rolo ¼ de polegada
AKAI 4000DB
- Fita N.O.S. Agfa dos anos 70
Microfones:
- AKG C418 – condensador (2)
- AKG D112 – dinâmico
- AKG D5 – dinâmico
- Audio Technica AT3035 – condensador (2)
- Audix i5 – dinâmico
- Blue Spark – condensador
- MXL 2003 – condensador
- MXL 603S – condensador
- Rode NT-5 – condensador (2)
- Senheiser e609 – dinâmico
- Shure SM 7 – dinâmico (2)
- Shure SM 57 – dinâmico (5)
- Shure SM 98 – condensador
Amplificadores guitarra / baixo:
- JCM800 MKII 50 Watts
- Caixa Marshall 4×12 1960A
- Caixa Ampeg 4×12 angulada
- Ampeg B2R
- Hartke HA 2000
- Caixa Hartke 4×10
Pedais:
- Ibanez Tube Screamer (2)
- MXR Dyna Comp (2)
- Boss Noise Gate
- Electro Harmonix Big Muff
- Oitavador Onerr
- Dunlop Cry Baby
- Furmann Booster
Instrumentos:
- Gibson Flying V 74
- Charvel anos 80
- Fender Precision Bass 73
- Yamaha BB3000A anos 80
- Bateria Pearl Session Series 22x10x12x16
- Surdo 14 Mapex Venus Series
- Caixa Pinguim 1965
Outros:
- Radial JD-7 Injector – DI, Reamp e Splitter
- Direct Box Passiva Whirlwind (2)
No no no no no
linha, mas que tem uma equalização
própria para tons, além de ser hipercardioide, o que ajuda a minimizar os vazamentos de pratos”.
Para os dois surdos, foram 02 Shure
SM7B, com o boost de médios ligado e o corte de graves desligado. No
contratempo, 01 Shure SM98.
Nos overheads foram usados 01
par de Rode NT-5, completados
com dois Audio Technica AT3035
apontados para a porta da sala de
gravação, para obter ambiência.
“Colocamos um Blue Spark atrás
do Hardcore para, posteriormente,
ser comprimido ao extremo com o
Distressor”, afirma. “Na parte de
prés, usamos o API 3124+ para o
bumbo, caixa e overheads. Esse pré
é excelente, pois, além de possuir
bastante ganho, a ruído quase zero,
as saturações são muito musicais,
por isso não tenho medo de deixálo clipar de vez em quando. No
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“
Microfonamos a
caixa com um SM7
e gravamos o sinal
de linha do baixo.
Na ocasião, foi
usada uma
segunda caixa, 01
4x12 da Ampeg,
com sinal
distorcido por um
Tube Screamer,
microfonado por
um Sennheiser e609
(Sérgio Filho)
”
No no no no no
restante, usamos os JoeMeek TwinQ e
ThreeQ, o ART Dual MP e os prés da
mesa Mackie 1604 VLZ3. Optei por
comprimir certas peças já na gravação. O
microfone interno do bumbo e o SM57
da caixa passaram pelo Fatso UBK, uma
versão modificada do original, ambos na
configuração Splat, que gera um ataque
bem agudo e definido através de um
release rápido. Os overheads também
foram comprimidos no Fatso Jr. e o
mono room, captado pelo Blue Spark,
passou pelo Distressor”, completa.
Para a gravação dos baixos, foram usados 01 Yamaha BB3000A, dos anos 80, e
01 Fender Precision, dos anos 70; 01
cabeçote Ampeg B2R e 01 caixa 4x10
da Hartke. “Microfonamos a caixa com
um SM7 e gravamos o sinal de linha do
baixo. Na ocasião, foi usada uma segunda caixa, 01 4x12 da Ampeg, com sinal
distorcido por um Tube Screamer,
microfonado por um Sennheiser e609”.
O baixo foi comprimido na gravação,
sendo que os dois sinais microfonados
passaram pelo Fatso UBK, e o sinal de
linha, pelo Distressor. “Um fato interessante é que ambos os baixos soavam
diferentes em todas as músicas. Daí optamos por gravar todo o disco duas vezes: ora com o Yamaha, ora com o Fender. Na mix, escolhemos o que melhor
se encaixava sem equalização”.
Nas guitarras, foi usado 01 JCM800
MKII, de 50 watts, que acompanha Carlos desde o início dos anos 80. Para escolher as caixas, foi feito um shootout
(comparação) com as 03 4x12 que estavam à disposição: 01 JCM800, 01 1960A
do estúdio e 01 Ampeg. “Nós nos surpreendemos com a diferença brutal entre
cada um dos alto-falantes. Optamos pela
Ampeg e Marshall 1960A. Pusemos todos os cinco SM57 que tínhamos, e mais
algumas opções, como o SM7B e o e609, e
ouvimos cada um dos falantes, até selecionar os favoritos. Ficamos com o total de
04 canais (02 da Ampeg e 02 da Marshall). Tudo isso em nome do timbre, no
melhor estilo old school!”, justifica.
Foram usados os prés da Mackie, e nenhum sinal de guitarra foi comprimido
na gravação. Dentre os pedais diversos,
destaca-se a utilização de 02 Tube Screamer; 02 MXR Dyna Comp; 01 Noise
Gate da Boss; 01 Big Muff; 01 oitavador
da Onerr e 01 DS1 da Boss. As guitarras
usadas foram uma Charvel dos anos 80 e
uma Gibson Flying V de 74. “Ambas as
guitarras são icônicas e têm todo um passado associado à Dorsal Atlântica. Como
gostamos do som de ambas, optamos por
gravar todas as bases com a Charvel e as
dobras com a Gibson. Quase todos os solos foram gravados com a Charvel”. Na
voz, foi usado 01 SM7B, passando pelo
MIXAGEM
Sergio explana que o processo de
mixagem foi tranquilo, embora
meticuloso. “Acredito que fizemos
uma média de quatro horas por
música, o que é bastante rápido.
Foi um trabalho em conjunto com
o artista, algo que nem sempre é
possível, pois muitas vezes o próprio não se expressa bem e acaba
emitindo opiniões antes de ouvir
uma primeira mixagem. Pelo fato
do trio ser composto por músicos
muito experientes, a presença deles só ajudou, pois pudemos ser
bem objetivos”.
O técnico expõe ainda que a mix
foi dividida em subgrupos, abertos
na mesa Mackie, com o estéreo
comprimido pelo Fatso Jr. – processo denominado summing (‘soma’) analógico. “Ele se contrapõe
ao clássico bounce in-the-box do
Pro Tools, bastante criticado. Se
configura da seguinte maneira: a
mixagem é feita no Pro Tools, mas
Superfuzz
dividida em subgrupos que vão sair
da interface e entrar na mesa. A saída estéreo da mesa passa no Fatso Jr.
para uma compressão de bus e a saída
deste compressor volta, gravando
em dois canais no Pro Tools. Esse arquivo estéreo é então mandado para
“
gada da AKAI, modelo 4000DB, da
década de 70, como mais um periférico na cadeia. Sergio esclarece
que ela atuou comprimindo o sinal e amaciando os agudos, tornando tudo ‘mais musical’ e ‘vintage’. “Já há algum tempo que
“
API e comprimindo no Distressor.
Na única faixa que contém violão,
foi usado o Blue Spark, em conjunto
com o Rode NT-5, comprimindo
ambos no Fatso UBK.
Para a Dorsal, usei uma fita Agfa,
dos anos 70, ainda lacrada. O ruído que ela
produz é mínimo e não atrapalha em nada,
só acrescenta (Sérgio)
a masterização”, explica. “Esse processo adiciona profundidade e qualidade imaterial na mixagem, ao ser
comparada com a versão, 100% digital, somada no Pro Tools. Isso contribuiu e muito para a chegada naquele som ‘característico’ dos anos
80 que a banda procurava”.
FITA DE ROLO
Ao final desse processo, houve o
uso de uma máquina de ¼ de pole-
trabalho com ela, embora este
processo seja delicado, pois a máquina é antiga e necessita de restaurações constantes. Para a Dorsal, usei uma fita Agfa, dos anos 70,
ainda lacrada. O ruído que ela produz é mínimo e não atrapalha em
nada, só acrescenta”.
Para Carlos, a utilização desta máquina veio de encontro à vontade
que ele tinha de gravar tudo overall no início da produção, obtendo o mais fidedigno resultado
acústico da banda. “Cresci com
vinil, fita cassete e fita de vídeo
analógica. Compreendo as vantagens e desvantagens da gravação digital. Mas a facilidade e o
barateamento dos custos não
produziram discos e músicos melhores. Nesse caso, computador
não faz a mínima diferença. Com
verba, pode-se gravar em uma
fita de duas polegadas e editar digitalmente, mas no nosso caso, fizemos o processo inverso: timbramos os instrumentos para que
soassem “antigos”; mixamos como se mixaria um disco em 1985 e
depois passamos ao gravador de
rolo, para dar uma ‘aquecida’ no
som geral”, explica.
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