CONHECIMENTO DOS ALUNOS DO ENSINO MÉDIO DE UMA

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CONHECIMENTO DOS ALUNOS DO ENSINO MÉDIO DE UMA
EPEA 2001 - 1 de 14
FAUNA E FLORA DO CERRADO: CONHECIMENTO DOS ALUNOS DO
ENSINO MÉDIO DE UMA ESCOLA PÚBLICA DO TRIÂNGULO MINEIRO.
Marcelle Sabrina Carneiro Rodrigues Universidade Federal de Uberlândia
Ana Maria de Oliveira Cunha Universidade Federal de Uberlândia
Lúcia de Fátima Estevinho Guido Universidade Federal de Uberlândia
palavras-chave: Biodiversidade do cerrado; Conhecimentos prévios dos alunos;
Conservação e preservação do conhecimento
Resumo: Este artigo apresenta os resultados de uma pesquisa que teve como objetivo
investigar os conhecimentos prévios de alunos ingressantes no ensino médio sobre a
fauna e a flora do cerrado. Nossa metodologia consistiu de uma entrevista na qual
utilizamos cartões ilustrativos da fauna e da flora do cerrado e de outros biomas. Foram
entrevistados 28 alunos, cujas respostas denotaram pouco conhecimento sobre a
biodiversidade do cerrado, apontando para a necessidade dos currículos de ensino médio
incluírem, em suas preocupações, questões relativas ao cerrado e à sua biodiversidade,
por tratar-se do segundo bioma do Brasil em extensão territorial e, principalmente, se se
tratar do ambiente onde vivem os alunos, para que o possam melhor conhecer e
valorizar, passando, assim, a preservá-lo e conservá-lo.
THE BRAZILIAN SAVANNAH’S FAUNA AND FLORA: KNOWLEDGE OF
SECONDARY SCHOOL STUDENTS IN THE STATE OF MINAS GERAIS
keywords: biodiversity of Brazilian sava; students background knowledge; conservation
and preservation
Abstract: This article presents the results of a survey aimed at assessing 1st-year
Secondary School (British Form 4/American 9th grade) students’ background
knowledge of the fauna and flora of the Brazilian savannah. Our methodology consisted
of an interview using cards illustrating the fauna and flora of the Brazilian savannah as
well as other biomes. Twenty-eight students were interviewed. Their answers expressed
little knowledge of the biodiversity of the Brazilian savannah, thus indicating the need of
having Secondary School (British Forms 4-6/American High School) syllabi include
issues related to the Brazilian savannah and its diversity. This is so because the
savannah, known in Brazil as "cerrado," is the second largest biome in Brazil and also
the environment the students live in. Therefore, it is important that they el arn more about
the Brazilian savannah, thus giving it more importance as well as preserving and
conserving it.
Introdução
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O Cerrado abrange como área contínua os estados de Goiás, Tocantins e o Distrito
Federal, parte dos estados da Bahia, Minas Gerais, Ceará, Maranhão, Mato grosso, Mato
Grosso do Sul, Rondônia e São Paulo e também ocorre em áreas disjuntas ao norte nos
estados do Amapá, Amazonas, Pará e Roraima, e ao sul, em pequenas “ilhas” no Paraná
(Ribeiro & Walter, 1998). No Cerrado estão as nascentes e os mananciais que formam, total
ou parcialmente as três grandes bacias hidrográficas brasileiras: a Bacia do Prata, a Bacia
do São Francisco e a Bacia Amazônica (Novaes, 1995).
Depois da Amazônia, o Cerrado do Brasil Central destaca-se como o 2º bioma em
extensão territorial, constituído por uma série de formações vegetais muito ricas do ponto
de vista botânico, sendo cada uma delas responsável pela origem e diversidade da região
(Rezende, 1998). Ocupa praticamente todo o Planalto Central brasileiro, estendendo-se por
mais de dois milhões de quilômetros quadrados. Seus solos são profundos, ácidos e com
elevado nível de alumínio, associado a baixos níveis de fósforo, cálcio e magnésio. O clima
é bem característico, a temperatura se mantém estável durante o ano, variando de 20 a 25°.
Suas duas estações são bem definidas: uma chuvosa, que vai de novembro a abril, e outra,
seca, que se estende de maio a outubro (Caruso,1997).
A ocupação do Cerrado iniciou-se no século XVIII, com abertura e o assentamento
de povoados para exploração de ouro e pedras preciosas. Com a exaustão das minas, a
região passou a ser mais explorada para a criação extensiva de gado. A ocupação mais
intensiva aconteceu apenas nos anos 30, através da ligação ferroviária entre São Paulo e
Anápolis, passando pelo Triângulo Mineiro (Alho & Martins, 1995). Com a criação de
Brasília, na década de 60, os horizontes de árvores tortuosas foram destruídos para dar
espaço à urbanização e à agricultura. A partir de 1975, a ocupação dos cerrados se acelerou
e grandes tratores ocuparam os habitats dos animais, com os arados rasgando a terra
(Cerrado 1995).
Apesar de ser vizinho interativo dos demais biomas, o Cerrado apresenta
características próprias. E num sentido geral, trata-se de um complexo vegetacional, onde
se pode encontrar desde campos até florestas. Dentro desse complexo, tem-se: campo
limpo, campo sujo, campo cerrado, cerrado propriamente dito e cerradão, além das
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inclusões de mata de galeria, mata seca, veredas ou buritizais e campos rupestres (Brandão
et al., 1992).
Devido a sua grande extensão territorial, posição geográfica e heterogeinidade
vegetal, o Cerrado se destaca por sua diversidade. Sua flora é considerada a mais rica
dentre as savanas do mundo. Estima-se que possua entre 4 a 10 mil espécies de plantas
vasculares, sendo que a maioria dessas espécies são utilizadas na alimentação, medicina,
produção de cortiça, óleos e artesanato. Vivendo entre a vegetação está a fauna que, embora
não seja endêmica, encontra nesse bioma o ambiente propício para sua perpetuação.
Somente entre os vertebrados são conhecidos 400 espécies de aves, 67 gêneros de
mamíferos e 30 espécies de morcegos, e entre os invertebrados foram identificados 27
espécies de libélulas, 90 de cupins, 1000 de borboletas e 550 de abelhas e vespas (Alho &
Martins, 1995).
Destacam-se entre os representantes da Fauna do cerrado: Coruja (Speotyto
cunicularia), Tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), tamanduá -mirim (Tamandua
tetradactyla), Lobo-Guará (Chrysocyonbrachyurus), Onça-parda (Puma concolor), Onçapintada (Panthera onca), Veado-campeiro (Ozotocerus bezoarticus), Tatus: Tatu canastra
(Priodontes giganteus), Tatu bola
(Ramphastos toco),
(Tolypeutes tricinctus ) Tucanos:
Tucanuçu
Peito-branco (R. tucanus) e o Bico-verde (R. discolorus), Seriema
(Cariama cristata), Ema (Rhea americana).
Dentre os representantes da flora do Cerrado, destacam-se: Araticum (Annona
crassiflora), Pequi (Caryocar brasiliense), Ipê (Tabebuia ochracea),
vinifera), Jatobá-do-cerrado (Hymenaea stigonocarpa),
adstringens),
Pau-Santo
Quaresmeira
(Tibouchina
(Kielmeyera
granulosa),
variabilis),
Buriti (Mauritia
Barbatimão (Stryphnodendron
Pau-Terra
(Qualea
Caviúna-do-Cerrado (Dalbergia
grandiflora),
miscolobium),
Sucupira (Bowdichia virgilioides), Mangabeira (Hancornia speciosa).
Segundo Ribeiro & Walter (1998), são descritos 11 tipos fitofisionômicos gerais,
enquadrados em: formações florestais (mata ciliar, mata de galeria, mata seca e cerradão);
savânicas (cerrado sentido restrito, parque cerrado, palmeiral e vereda) e campestres
(campo sujo, campo rupestre e campo limpo).
Esses elementos propiciam ao Cerrado uma alta biodiversidade, estimada em cerca
de 1/3 da biota brasileira e 5% da fauna e flora mundiais. Apesar de possuir essa grande
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biodiversidade, o Cerrado é hoje o bioma brasileiro mais ameaçado. De toda a vegetação do
Cerrado, que significa 2 milhões de km², apenas 7% permanece ainda intacto. Em 56% da
área do Cerrado há alguma forma de manejo, mais ou menos intensa, e 37% da vegetação
do Cerrado já foi inteiramente perdida Novaes (apud Koff, 1995).
A falta de informação sobre a importância do Cerrado vem contribuindo para sua
degradação. Como conseqüência da falta de conhecimento por parte da sociedade e dos
governantes, o Cerrado corre o risco de ter toda sua área agricultável ocupada nos próximos
anos, apesar de sua área cobrir 25% do território nacional.
Daí a relevância de se trabalhar estes temas com os estudantes, futuros cidadãos
adultos e governantes, para que os mesmos possam conhecer melhor o ambiente em que
vivem e assim passem a preservá-lo e conserva-lo. Segundo Almeida (1998), grande parte
da população urbana principalmente de jovens desconhece a importância do Cerrado.
Martins & Moreira (2000) observa ainda que o Cerrado vem sendo pouco trabalhado nas
escolas, e que os livros didáticos não exploram devidamente o assunto e praticamente não
existe material referente ao comportamento dos animais e sua importância ecológica.
A preocupação em ensinar sobre aspectos específicos do cerrado não se dá no
sentido de que a
questão ecológica ou ambiental deva se restringir à preservação dos
ambientes naturais. A Educação Ambiental (EA) deve se estender ao tratamento de
questões envolvendo saneamento, saúde, cultura, decisões sobre políticas de energia, de
transportes, de educação. Necessário se faz romper com as amarras que limitam o estudo do
ambiente ao seus aspectos naturais.
A EA deve propiciar às pessoas uma compreensão crítica e global do Ambiente,
para elucidar valores e desenvolver atitudes que lhes permitam adotar uma posição
consciente e participativa a respeito das questões relacionadas com a conservação e
adequada utilização dos recursos naturais. Entretanto, conhecer e compreender de modo
integrado e sistêmico, as noções básicas relacionadas ao meio ambiente se faz necessário
para que o aluno possa identificar-se como parte integrante da natureza. Como discutido
nos Parâmetros curriculares Nacionais (PCN), a principal função do trabalho com o tema
Meio Ambiente é contribuir para a formação de cidadãos conscientes, aptos para decidirem
e atuarem na realidade sócio-ambiental de um modo comprometido com a vida, com o
bem-estar de cada um e da sociedade, local e global. Para isso é necessário que a escola se
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proponha a trabalhar com atitudes, com formação de valores, com o ensino e a
aprendizagem de habilidades e procedimentos. Esse enfoque não minimiza a necessidade
de que informações e conceitos sejam também objeto da preocupação dos educadores.
(Brasil,1998).
Os resultados da investigação sobre os conhecimentos dos alunos ingressantes no
ensino médio, sobre a fauna e a flora do Cerrado, nos fornecem elementos para repensar o
ensino de Ecologia e de Educação Ambiental no Ensino Fundamental e Médio. A partir
destes resultados, será possível planejar e desenvolver atividades significativas relacionadas
ao Cerrado e à sua preservação e conservação.
Metodologia
Para levantarmos os conhecimentos dos alunos a respeito do Cerrado, objetivo desta
pesquisa, lançamos mão além de perguntas abertas, de outras na qual utilizamos 40 cartões
contendo ilustrações referentes à flora e a fauna do Cerrado, bem como de outros biomas.
Nossa amostra constituiu-se de 28 alunos selecionados aleatoriamente, entre 14 e 17
anos de idade, cursando o 1º ano do Ensino Médio de uma escola pública no Triângulo
Mineiro.
A dinâmica das entrevistas foi a seguinte: no primeiro momento, foram feitas as
seguintes perguntas aos alunos: Como é o Cerrado para você? Onde você aprendeu
sobre o Cerrado? Onde existe Cerrado no Brasil?
No segundo momento foram apresentados cartões com ilustrações de plantas e da
vegetação em geral, pertencentes ou não ao cerrado, e diante dos cartões perguntou-se:
Quais dessas ilustrações você sabe identificar? Quais são do Cerra do?
No terceiro momento, foram apresentados cartões com ilustrações de animais
pertencentes ou não ao Cerrado, e em seguida foram feitas as seguintes perguntas: Quais
destes animais você sabe identificar? Quais destes animais são de Cerrado? Você sabe
dizer algo sobre estes animais?
As entrevistas tiveram duração aproximada de 15 minutos, tendo sido gravadas em
fita cassete e posteriormente transcritas para análise, a qual se baseou na comparação dos
conceitos elaborados pelos alunos com aqueles cientificamente aceitáveis.
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Resultados e Discussão
Após análise, as respostas foram organizadas em dados sobre fisionomia, flora e
fauna do Cerrado.
DADOS SOBRE A FISIONOMIA DO CERRADO
As respostas estimuladas pelas perguntas abertas, indicam que as idéias dos alunos
sobre o Cerrado, de maneira geral, são bastante equivocadas. Diante da pergunta: Como é o
Cerrado para você? a maioria dos entrevistados identificou o Cerrado como um lugar
seco. Acrescentam a essa idéia, outras como: “lugar de mata aberta” (9)1 ; “com árvores
secas “ (5); “com árvores tortuosas” (4); “com plantas rasteiras” (3); “lugar deserto, onde
não nasce nada” (4); “lugar feio” (2).
Essas respostas demonstraram o desconhecimento dos alunos sobre as diferentes
fitofisionomias do Cerrado e sua grande diversidade.
Quando questionados onde aprenderam sobre Cerrado, a maioria dos alunos,
afirmou ter sido na escola (9), na roça (3), nos livros (1), em casa (1), na televisão (1). Dos
28 alunos apenas 15 responderam a esta pergunta. Estes dados demonstram que a escola
aparece como fonte principal de informações sobre o Cerrado para os alunos.
Em relação a questão onde existe Cerrado no Brasil, a maioria dos entrevistados
apontou os estados de Minas Gerais (18) e Goiás (7). Citaram também as regiões, nordeste
(7), norte (6) e sul (2). Não responderam a pergunta sobre a localização do Cerrado (7) e
afirmaram que a vegetação predominante no Brasil é o Cerrado (2). Como pudemos
observar pelas suas respostas, os alunos apresentaram um conhecimento parcial sobre a
localização do Cerrado.
Quando questionados frente a um conjunto de gravuras envolvendo o Cerrado e
outros biomas, quais eram representativas de Cerrado, as respostas certas foram:
“cerrado” (23), ipê (6), flor de quaresmeira (8), buritis (7). Somente um aluno identificou o
1
- O numeral após as respostas indica o número de alunos que incluíram aquela idéia em sua resposta.
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araticum, como sendo típico do Cerrado, e cinco alunos identificaram o pequi. Algumas
gravuras representando fitofisionomias do Cerrado foram identificadas corretamente.
Assim é que uma gravura representativa de uma mata queimada de Cerrado foi identificada
por 16 alunos. A gravura representativa de um ecossistema aquático, contendo vitórias régias foi identificada pelos alunos como plantas aquáticas. Outras, como por exemplo, a
caatinga, apresentando cactos, foram ident ificadas por nove alunos como sendo Cerrado.
Dos 28 entrevistados, apenas 11 reconheceram um cupinzeiro, num campo limpo fato que
ao nosso ver demonstra uma vivência pobre dos alunos em relação ao Cerrado.
DADOS SOBRE A FLORA DO CERRADO
Frente às figuras relacionadas à vegetação, grande parte dos alunos não souberam
identificá-las corretamente. Mostraram-se desinteressados em responder a perguntas
relacionadas à vegetação. Olhavam para as figuras e não diziam nada, ao contrário do que
aconteceu quando perguntamos sobre os animais. Em relação à pergunta quais destas
gravuras você sabe identificar, alguns alunos reconheceram algumas gravuras, entre elas:
fruto do pequi (17), ipê (14). Outras foram pouco reconhecidas, como por exemplo, o
araticum (2), a florada de pequi (1). Ocorreram também muitas confusões durante a
identificação das figuras, entre elas citamos: araticum com conde (6); pequi com figo (4);
buritis com coqueiro (5); flor de pequi com flor de figo (3); flor de quaresmeira com
orquídea (3); pequi com cáqui (1). Algumas destas confusões se justificam em função da
semelhança entre essas espécies, como por exemplo o araticum e o conde, somente
diferenciáveis aos especialistas. Outras como a flor de quaresmeira e a orquídea e o pequi
com cáqui, já refletem o desconhecimento destas espécies pelos alunos, pois apresentam
poucas semelhanças.
Os dados obtidos em nossa entrevista, mostram que os alunos tem pouco
conhecimento sobre a flora do Cerrado.
DADOS SOBRE A FAUNA DO CERRADO
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Ao serem abordados sobre a fauna do Cerrado, os alunos demonstraram motivação
em responder. Entre os animais identificados de forma correta pelos alunos, citamos: coruja
(25); jacaré (24); cobra (24); tucano (24); tatu (24); elefante (22); mico-leão-dourado (20);
leão (20); tamanduá (18); lobo-guará (17); veado (16); beija-flor (15); urso-polar (15). Os
alunos tiveram dificuldade em identificar animais como o esquilo (10); a ema (10) e a
seriema (12). Animais como o caribu e a sussuarana não foram reconhecidos por nenhum
aluno. É compreensível que os alunos não reconheçam o caribu, animal que vive em
regiões frias. O mesmo não podemos dizer em relação à sussuarana encontrada no Cerrado.
Surpreendente que somente 12 alunos tenham reconhecido a seriema, animal típico do
Cerrado.
Embora, a maioria dos animais tenham sido reconhecidos corretamente, ocorreram
várias confusões, algumas justificáveis outras nem tanto. Entre as confusões justificáveis
temos: Lobo-guará com raposa (5). Esta confusão pode ser justificada, pois o lobo-guará
lembra uma raposa grande. Ema com avestruz (8) pois realmente essas aves se assemelham
a olhos leigos. Aos olhos de especialistas, segundo (Orr 1986), existem diferenças entre
elas, tais como, as emas apresentam três artelhos, coxas com penas e habitam a América do
Sul, já as avestruzes apresentam dois artelhos, coxas sem penas e habitam a África e a Ásia
Meridional.
Entre as confusões menos justificáveis temos alguns casos isolados como: ema com
pavão (1); capivara com hipopótamo (1); cobra cascavel com cobra coral (1); tamanduá
com bicho-preguiça (2). Estas confusões podem ser decorrentes da falta de conhecimento
dos alunos sobre estes animais, mas também da falta de atenção ao tentarem identificá-los.
Quando questionados, diante das figuras, quais eram os animais do Cerrado,
apenas um dos 28 alunos não soube identificar nenhum animal. Dentre os animais do
Cerrado corretamente identificados se encontram: cobra (18); tatu (17); tamanduá (13);
lobo-guará (13); coruja (12); tucano (11); seriema (9). O melhor desempenho dos alunos
nestas respostas talvez se deva ao fato de alguns destes animais, como o tamanduá-bandeira
e o lobo-guará serem evidenciados na mídia. Sabemos que o rádio, a TV e a imprensa
constituem a fonte de informações que a maioria das crianças e das famílias possuem sobre
o meio ambiente, embora estes veículos de comunicação, às vezes, abordem o assunto de
forma bastante superficial ou equivocada.
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Animais que foram reconhecidos pela maioria dos alunos são animais facilmente
observados na região como, a coruja, o tucano. Quanto a cobra, por ser um animal muito
temido é reconhecida por todos.
Foram também citados como sendo do Cerrado, alguns animais que não fazem parte
nem mesmo da fauna brasileira, como por exemplo, leão (7) e elefante (6). Embora não
tenham reconhecido o caribu, cinco alunos apontaram o mesmo como pertencente ao
Cerrado. Acreditamos que esse representante da Tundra, possa ter sido confundido com o
veado. Citaram também o mico-leão-dourado (4), como parte da fauna do Cerrado. Estes
dados refletem o desconhecimento por parte dos alunos da fauna brasileira e em particular a
do Cerrado.
Quando questionados se conheciam algo sobre os animais apresentados , apenas
um aluno afirmou não saber nada sobre eles. Entre os animais que os alunos demonstraram
ter maior conhecimento estão: a coruja, o tatu, o tamanduá e o lobo-guará.
Em relação a coruja, o conhecimento dos alunos está impregnado de crendices
populares, onde a associam ao azar e à morte. Segundo as palavras de um dos alunos, “O
povo tem superstição...quando uma coruja está em frente a sua casa e começa a cantar,
vem azar”. Ao lado dessas crendices, os alunos apontaram a coruja como animal de hábitos
noturnos, que faz tocas e se alimenta de pequenos animais como por exemplo, ratos, idéias
corretas sobre os hábitos da coruja buraqueira. Segundo Teixeira et al. (1999), a coruja
buraqueira (Speotyto cunicularia) tem hábitos noturnos e crepusculares e é encontrada em
campos, pastos e até em terrenos baldios. Possui uma dieta que ni clui insetos, aracnídeos e
roedores.
Em relação ao tatu, a maioria dos alunos o descreveram como um animal que cava
buracos, come folhas e pequenos animais, como ratos e baratas e serve de alimento para o
homem. Essas respostas demonstraram que os alunos tem certo conhecimento sobre os
hábitos desse animal, pois segundo Filho (1992), o tatu é um cavador eficiente, constrói
tocas e galerias subterrâneas, tem uma dieta onívora que inclui pequenos vertebrados,
invertebrados, raízes, fungos, frutos caídos, serrapilheira. O fato dos alunos terem
mencionado que o tatu serve de alimento, deve ser decorrente dos hábitos alimentares de
suas famílias, pois a carne do tatu é bastante apreciada na região. Pelas palavras de um
entrevistado, “...Sua carne é gostosa, mas as pessoas tem preconceito e nojo de comer”, e
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de outros depoimentos similares a esse, podemos perceber que não há preocupação com a
caça predatória do tatu, pois esta é uma prática usual na região.
Em relação ao tamanduá, alguns o descreveram como sendo um animal dócil, com
uma língua enorme, que come formigas e que para se defender agarra o inimigo com suas
unhas afiadas. Segundo as palavras de um dos alunos, “...quando ele vai agarrar um animal
ele fica de pé, faz uma bandeira com o rabo e abraça até ele morrer”. Vale ressaltar que a
foto do tamanduá representado no cartão, é de um tamanduá-mirim, entretanto, a maioria
dos alunos o identificaram como sendo o tamanduá-bandeira. Pudemos perceber que os
conhecimentos dos alunos sobre esse animal está associado a crendices
e ao
desconhecimento da diversidade das espécies. É crença popular, que o tamanduá-bandeira
ataca seu inimigo com um terrível abraço para em seguida, arranhá-lo com suas enormes
garras, mas que na realidade, o bandeira não ataca ninguém e só em último caso enfrenta
seu predador. O tamanduá é um animal dócil, solitário que alimenta-se de formigas e cupins
(Cerrado, 1995). Existem quatro espécies de tamanduás no mundo, sendo as mais
conhecidas o tamanduá-bandeira (Mymercophaga tridactyla) e o tamanduá-mirim
(Tamandua tetradactyla).
Em relação ao lobo-guará,
os alunos o apontaram como um animal carnívoro,
solitário e que está ameaçado de extinção. Apenas 2 alunos mencionaram o fato desse
animal comer frutas. Segundo as palavras de um entrevistado, “O lobo-guará está em
extinção...ele vive sozinho, mas na época da reprodução ele fica com a sua companheira”.
Estas idéias refletem um conhecimento relativo dos alunos sobre os hábitos desse animal,
porém nota-se ainda pouca informação sobre os seus hábitos alimentares. Conforme
informações veiculadas em Ecologia (2000), o lobo-guará é um animal solitário e noturno,
só andando aos pares na época do acasalamento. Alimenta-se de aves, roedores, raízes e
frutos silvestres, principalmente a fruta do lobo e está ameaçado de extinção, devido a caça
predatória e a degradação de seus habitats.
Pontuando os resultados
De maneira geral, os alunos demonstraram: mais interesse em responder sobre os
animais do que sobre a vegetação; noção sobre onde existe Cerrado no Brasil; idéia de
cerrado como um lugar feio e seco.
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O pouco conhecimento sobre a flora do Cerrado pode ser evidenciado, visto que o
araticum, típico da região, foi pouco reconhecido e os alunos confundiram flor de
quaresmeira com orquídea, pequi com figo, pequi com cáqui, típicos da região.
Um conhecimento relativo, em relação à fauna. Esse conhecimento cheio de
lacunas, de supertições demonstra um certo acesso do aluno ao assunto. A forma como se
deu este acesso, segundo os alunos foi através da escola. Outras formas de acesso como
livros, televisão, suas vivências, família, foram pouco lembrados.
Ainda que demonstrem conhecer alguns animais de Cerrado, outros que são típicos
desse bioma, como a seriema e o veado, foram pouco mencionados nas respostas às
perguntas abertas. Já outros característicos de outros biomas como leões e elefantes e ainda
o mico-leão-dourado foram citados como pertencentes ao Cerrado. Confundiram também
alguns animais como, lobo-guará com raposa; ema com avestruz; ema com pavão;
tamanduá com bicho-preguiça.
Considerações Finais
Nosso objetivo de verificar os conhecimentos dos alunos que ingressam no ensino
médio sobre a fauna e a flora do Cerrado foi atingido.
A forma de coleta de dados, mostrou-se adequada até um certo ponto, visto que em
relação à fauna, a existência de um número grande de gravuras, que por um lado foi boa,
por outro provocou certa dispersão nos alunos. Já nos cartões com representantes da flora,
teria sido necessário mais gravuras abrangendo as diversas fitofisionomias do cerrado.
As questões abertas, ao abordar aspectos isolados, impediram saber se o aluno
enxerga o meio ambiente como um todo integrado, ou não. Pelas suas respostas parece que
cada ser vivo existe de forma isolada no ambiente. Estas respostas podem ter-se dado em
conseqüência do tipo de questões formuladas e do material empregado para subsidiar estas
questões. Percebemos no final da pesquisa, que os organismos não podem ser considerados
de forma isolada. Poucas ilustrações atendem a este quesito. Embora aquelas referentes à
flora, também não contenham animais, contemplam mais o todo. Essa análise pode ajudar
outros pesquisadores que queiram levantar dados nessa área. Os resultados nos fizeram ver
que
os cartões ilustrativos deveriam apresentar uma visão mais sistêmica da natureza e
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dessa forma conter os representantes da flora e da fauna e também os elementos inanimados
do ambiente onde vivem e não apenas aspectos isolados. Embora salientemos essa falha,
ressaltamos a qualidade dos cartões, em relação à clareza das ilustrações. Em detrimento
das falhas apontadas, foi-nos possível levantar dados pertinentes e significativos, em
relação aos conhecimentos dos alunos sobre o cerrado.
Apesar do Cerrado ser o bioma predominante em Minas Gerais, os alunos
entrevistados, demonstraram desconhecer suas características. A maioria dos alunos associa
o Cerrado à um ambiente seco e feio, desconhecendo sua beleza e biodiversidade.
Os alunos se mostraram muito desinteressados em responder sobre a vegetação do
Cerrado. O desinteresse demonstrado, talvez esteja ligado a falta de conhecimento sobre a
mesma, pois tal comportamento não foi manifestado em relação às perguntas envolvendo a
fauna, para as quais os alunos demonstraram muita motivação em responder.
A escola foi indicada como fonte principal de informações sobre o Cerrado, mais as
respostas dos alunos indicaram o predomínio de seus conhecimentos pessoais.
Esperávamos um conhecimento mais sistematizado do aluno que inicia o ensino
médio, visto o mesmo já ter passado pelo ensino fundamental, portanto por 8 anos de
ensino de Ciências.
O conhecimento fragmentado, cheio de lacunas e mesmo de erros, imbuído de
superstições, demonstrado pelos alunos entrevistados, pertencentes a uma escola pública de
ensino médio, vem exigir uma reflexão sobre a forma quase ausente que se vem ensinando
sobre Cerrado.
Conforme recomendações presentes nos PCN, no que se refere à área ambiental, há
muitas informações, valores e procedimentos que são transmitidos à criança através do que
se faz e se diz em casa. Esse conhecimento deverá ser incluído nos trabalhos da escola, para
que se estabeleçam as relações entre os dois universos dos alunos. É importante que o
professor trabalhe com o objetivo de desenvolver, junto aos alunos, uma postura crítica
frente as informações e valores veiculados pela mídia e àqueles trazidos de casa. Para tanto,
o professor precisa conhecer o assunto e, em geral, buscar junto com seus alunos mais
informações em publicações ou com especialistas, para organizar situações de ensino de
forma a proporcionar oportunidades para que o aluno possa adquirir e utilizar
conhecimentos sobre o Meio Ambiente para compreender a sua realidade e atuar sobre ela.
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EPEA 2001 - 14 de 14
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