Fascínio - Axel Vervoordt

Transcrição

Fascínio - Axel Vervoordt
152 âncora
por Marilane Borges fotos Laziz Hamani
Fascínio
pela luz
O diálogo-reflexo existente entre a luz e a
água são algumas das premissas que guiam
Axel Vervoordt em seu apaixonante trabalho
de arquitetura e design de interiores
O arquiteto de interiores Axel Vervoordt,
à esquerda, decorou essa fascinante
varanda no Mediterrâneo com
cadeiras de Pierre Jeanneret, mesa de
centro de Charlotte Perriand e peças
contemporâneas de sua própria coleção
154 âncora
N
o horizonte, o mar e, no fim do dia, o espetáculo
do crepúsculo numa atmosfera serena com a visão
da dança da luz e seu reflexo nas águas. É com essa
percepção poética da vida e dos ambientes que o
belga Axel Vervoordt destila seu talento nos projetos que assina,
em que arquitetura, arte e conforto se confundem num ambiente inundado pela luminosidade, que embeleza tudo o que toca.
Compilando uma variedade impressionante de suas criações ao
redor do mundo, o livro Living With Light, lançado pela Editora
Flammarion, ilustra por meio de belas imagens, clicadas por Laziz
Hamani, os projetos de Vervoordt, deixando revelar fidedignamente as premissas que guiam esse renomado arquiteto de interiores. Editado nas versões bilíngue, inglês-francês, a publicação é
uma fonte inesgotável de inspiração para quem, assim como Axel
Vervoordt, acredita que viver bem é o princípio da longevidade.
Transformar a paisagem numa pintura com uma grande tela
de vidro que enquadra o oceano e o horizonte. Com essa capacidade surpreendente para solucionar artisticamente um impasse
arquitetural, eliminando assim os riscos de acidentes num espaço
vazio entre dois muros, Axel Vervoordt criou uma escultura quadrada em aço como uma das variáveis de um projeto para uma residência à beira-mar. Esse é seu leitmotif, criar soluções atemporais
que coloquem em evidência a contemplação luminosa e o jogo
de luz e sombras que podem se formar tanto nos espaços internos
quanto nos externos. Suas criações são como obras de arte, que
parecem contar a história dos lugares, como a sala de um castelo
que, observada como uma tela, num primeiro olhar, vê-se uma
mesa George II de ébano e mármore e sobre ela um par de tazze
de prata do século 17. O lustre de cristal, que parece flutuar no
Acima, vista da
escadaria que dá
acesso à biblioteca.
À esquerda, para
preservar a alma
dessa antiga
residência de
Picasso, apenas
móveis essenciais.
Na página ao lado,
longa mesa em
ardósia, rodeada
de cadeiras de
diversos estilos,
inclusive seis à la
Luis XIV, envolvidas
em capas de linho
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espaço, é totalmente fabricado de cristal da Boêmia, que data de
1795, e, ao fundo dessa grande sala, veem-se quatro sofás Luiz XV,
de Louis Delanois, e uma dançarina de bronze de Degas. Pronto, a
imagem de uma grande tela está formada. Fazendo arranjos internos em residências ao redor do mundo, o arquiteto de interiores
criou uma identidade elegante e, onde tudo poderia simplesmente ser ostentatório, Vervoordt impôs seu minimalismo artístico,
produzindo contrastes que iluminam e encantam o olhar.
No princípio, havia a luz, sempre a luz, e todos os seus matizes que se instalam suavemente em todos os recantos. Tal qual
a imagem de uma cadeira assinada por Pierre Jeanneret, que se
pretende uma escultura em azul-turquesa, refletindo ao seu redor a luz da alvorada e deixando entrar suavemente pela janela
os primeiros raios de sol. Esse fascínio pelo belo e pelos artistas
é uma das qualidades que tornam o trabalho de Axel Vervoordt
singular, que mistura com maestria uma palheta de cores suaves e elegantes, colocando em evidência a luminosidade natural e deixando-a entrar sem empecilhos nas residências que
decora. “Desde o início, a arte é a chave do nosso trabalho. Ela
é fundamental, nos ajuda a compreender o sentido da vida, e
descobrir o essencial influencia nossa filosofia e é esse o desafio
que nos motiva diariamente”, confessa Vervoordt. “Procuramos
nos rodear de materiais autênticos que possuam qualidades nobres, mas que repousem sobre a simplicidade de suas origens,
porque uma casa é como um refúgio num mundo que vai cada
vez mais rápido. Morar bem é a certeza de que a manhã de um
novo dia será ainda mais iluminada”, filosofa. Esse é o conceito
e a assinatura de Axel Vervoordt, que se propõe a dar vida aos
ambientes e enriquecê-los com obras de arte.
No alto, a grande
sala de jantar
tem janelas
arredondadas que
permitem assistir
o espetáculo do
mar. À direita, o
quarto de hóspedes
se inspirou na
natureza com sua
palheta de cores em
pigmentos índigo.
Na outra página,
obras de arte,
móveis e objetos
decorativos rendem
homenagem
aos séculos e
às civilizações
nesta grande sala,
onde um piano
Steinway ocupa
lugar de honra
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Interpretar, criar e incorporar uma alma aos objetos são também algumas das referências do arquiteto de interiores e uma das
características mais apreciadas pelos seus clientes, que ele chama
de amigos. Nada mais natural para uma relação de trabalho e
amizade que vem sendo desenvolvida há alguns anos. “Para desenhar o interior da residência de alguém é preciso apreender a
alma de quem vai habitá-la, é uma relação quase espiritual que se
desenvolve entre a energia pura e uma empatia sincera. De posse
dessas informações, é possível reproduzir um contexto de paz e
tranquilidade, tendo como objetivo mais importante iluminar a
alma dos moradores”, conta Axel Vervoordt. Suas propostas misturam o clássico com uma visão moderna, criando ambientes
cheios de personalidade. Mas, para atingir essa simplicidade, é
preciso estar atento ao perfil do cliente e essa é uma premissa
bem básica, fielmente ilustrada em um dos seus projetos
Erguida no século 17, essa casa em frente ao mar tem como
preceito o sentido de partilha presente em todos os detalhes.
Uma cozinha com seu teto mais alvo que a neve e os grandes espaços que caracterizam as residências das ilhas da Bretanha, onde
a mesa-balcão é o centro desse universo e testemunha das conversas e confidências trocadas em torno de um grande forno, no qual
os moradores preparam seus próprios pães e podem, ao mesmo
tempo, receber convidados. “Uma casa é, sobretudo, um lugar de
encontros e, independentemente de sua decoração, são seus moradores que devem dar vida aos ambientes. Meu trabalho é apenas o de preencher os espaços com referências atemporais, através
de mobiliário e obras de arte, mas os verdadeiros valores são as
lembranças imprimidas pelas pessoas e suas singularidades...”
Talvez por isso os ambientes criados por Axel Vervoordt exalem a atmosfera de uma luz serena, criando uma sensação de beleza, aconchego e repouso, algo indispensável numa residência.
u
www.axel-vervoordt.com
Acima, diante da
janela que domina
o mar e o jardim,
uma escultura do
torso de Vênus em
mármore confere
sensualidade
à decoração. À
direita, as capas
das edições em
inglês e francês do
livro do arquiteto.
Na outra página,
fantástica ideia de
Axel Vervoordt que
tirou partido de
um espaço vazio
para criar uma
estrutura de aço e
vidro e enquadrar
o panorama do
Mediterrâneo