CULTURE JAMMING E AS REDES SOCIAIS ON

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CULTURE JAMMING E AS REDES SOCIAIS ON
ARTIGO
ARTIGO ACADÊMICO
ACADÊMICO
CULTURE JAMMING E AS
REDES SOCIAIS ON-LINE
COMO FERRAMENTA DE
MOBILIZAÇÃO SOCIAL1.
Por Cosme Leite de Melo CORDEIRO2
Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Goiânia, GO
Marcella Landeiro CONSORTE3
Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Goiânia, GO
Luciana Hidemi S. NOMURA4
Universidade Federal de Goiás, Goiânia Goiás
RESUMO
O presente artigo tem o objetivo de compreender como se deu a mobilização social por meio do uso das
ferramentas de mídias e redes sociais on-line a partir da análise de dois casos gerados pelos protestos
“Occupy Wall Street” (criado pelo grupo Adbusters) e o movimento #vemprarua, embasados no conceito
de culture jamming.
PALAVRAS-CHAVE: Culture Jamming; Mobilização Social; Redes Sociais On-line.
O mundo das imagens-mensagem
para mobilização social
M
uito discute-se sobre como
a imagem atua como um
filtro, por meio do qual
nos reconhecemos e nos confundimos, e ainda, como a construção
do campo social deve ser reeditada constantemente, como nos conta Mitchell (2003). A publicidade e
seus efeitos colaterais, para com a
sociedade, também são amplamente debatidos, pois tais discussões
remetem a campos que são ainda
pouco são pesquisados.
Partindo dessa premissa, e observando o crescimento da produção de
imagens que contestam este sistema,
muitas vezes espalhados pelos espaços urbanos ou pela rede internet, se
faz necessária uma exploração conceitual sobre como alguns movimentos sociais se apropriam das imagens
publicitárias em prol da destruição
de um conceito hegemônico imposto
pela sociedade de consumo. É importante salientar que a imagem
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manifesta el interés existente por las diferentes formas de
opinión política y ética patentes
en las imágenes, su celebración
como vías de acceso a un nuevo
estado de consciencia, su denigración como fuerzas hegemónicas, la necesidad de vigilar y, de
este modo, concretar las diferencias habidas entre los – medios
visuales – y los demás o entre
el reino del arte y el mucho más
vasto dominio de las imágenes.
(MITCHELL, 2003, p. 33)
Neste sentido, é importante saber
que a publicidade é uma ferramenta
do marketing e que tem por objetivo
vender através de uma dada comunicação, é fato. Porém, essa visão é
truncada. Partimos do pressuposto
de que os esforços publicitários não
anseiam apenas o aumento dos dados estatísticos de vendas, mas também implicam em diálogo, alteração
e criação de valores socioculturais
imbricados na sociedade. Uma das
formas de construção de um discurso
persuasivo é o uso indiscriminado da
imagem, cujo o objetivo – frequente-
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mente - é moldar alguns padrões socioculturais. Não se trata de imagens
limitadas apenas ao campo visual,
mas também textual e imaginário,
como uma linguagem simbólica. Portanto, essa ferramenta do marketing
pode ser configurada, também, como
um fenômeno social.
A peça de comunicação publicitária
veicula uma dupla mensagem, como
conta Muniz (2001). A primeira transmite um discurso informativo que
objetiva a divulgação de um determinado produto, já a segunda impõe
um conjunto de valores, baseado em
um sistema ocidental capitalista, que
também objetiva o consumo.
Já a propaganda, segundo Sant’anna
(2002), organiza-se para influenciar
a opinião pública e direcioná-la. Isto
é, sua função anseia a formação da
maior parte das crenças e ideias das
pessoas e, conseguinte, orientar o
comportamento social. Como está
estritamente relacionada à ideologia,
podemos dizer que antipublicidade
seria uma forma de propaganda –
também ideológica - que tenta suprimir as convicções da publicidade comercial, enquanto norteadora de um
padrão social hegemônico.
Neste contexto, o termo antipublicidade será utilizado de forma tal a
se referir a uma parte do movimento de culture jamming, o qual está
ligado às ações elaboradas por grupos e/ou pessoas que têm como
pressuposto criar contramensagens
que modificam o método de comunicação de corporações. O objetivo,
neste caso, é o de enviar uma mensagem distinta daquela que as corporações pretendiam.
Partindo dessa premissa, Klein (2000)
define a culture jamming como uma
forma de expressão que “rejeita frontalmente a ideia de que o marketing
– porque compra sua entrada em
nossos espaços públicos – deve ser
aceito passivamente como um fluxo de informação unilateral”. Alguns
criadores da culture jamming – os
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adbusters – afirmam que as ruas são
espaços públicos e que os moradores
não podem comprar suas peças publicitárias, por isso, eles devem e têm o
direito de resposta a tais imagens as
quais lhes são impostas.
Para além desse raciocínio, como “os
procedimentos legislativos conhecidos hoje também não se mostram
suficientes para garantir a justiça
de leis que tentam tratar de forma
igual e homogênica o pluralismo e
o multiculturalismo das sociedades
contemporâneas” (FERES JÚNIOR;
POGREBINSCHI, 2010, p.181), alguns
grupos e artistas surgem para tentar reverter tal constatação. Um bom
exemplo é o movimento denominado
culture jamming, que por meio da
“arte cidadã” e/ou de “guerrilha” propõe iniciar uma “desobediência”, que
se dá a partir do momento em que
“as obrigações assumidas em um grupo pequeno entram em conflito com
obrigações adquiridas em um grupo
maior [...]” (FERES JÚNIOR; POGREBINSCHI, 2010, p. 184). Tal desobediência, no contexto da culture jamming vem para destruir conceitos e
construir ideologias.
Para compreendermos melhor o espaço o qual a culture jamming se funda,
é necessário voltarmos um pouco no
tempo. Em 1984, uma banda de audiocolagem chamada Negativland, de
San Francisco cunhou o termo culture jamming. Para seus criadores, uma
boa jam são “os raios X do subconsciente de uma campanha, revelando
não um significado oposto, mas a verdade profunda oculta sob as camadas
de eufemismos publicitários” (KLEIN,
2006. p.309). Porém, há outros jammers que propõem não apenas a
desocultação destas camadas, como
também a subversão dos reais significados da publicidade. Para eles,
a culture jamming são “interseções
– contramensagens que interferem
com o método de comunicação das
corporações para mandar uma mensagem completamente diferente daquela que elas pretendiam” (KLEIN,
2006. p.309).
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Por isso, no contexto do projeto, a ideia de contramensagem visual se dará
pelo norte da cultura visual, uma vez que, sem dúvida nenhuma ela “puede
ser un instrumento de domínio [...]”, sendo que “muchos de los trabajos más
interesantes en torno a la cultura visual han surgido de investigaciones con
una clara intencionalidad política” (MITCHELL, 2003, p. 33).
A cultura kitsch também é bastante evidenciada no contexto da apropriação
da linguagem e da forma, com o intuito de subvertê-la. Exemplo disso é a
imagem da bandeira estadunidense criada pelos Adbusters. Nela, as estrelas,
símbolo de cada estado do país, foram substituídas por marcas de grandes
corporações, concluindo que o que forma a grande nação estadunidense não
são seus respectivos estados, mas sim, a hegemonia das corporações. Na fotografia abaixo - disposta como um “outdoor” comercial no centro de uma
grande cidade - além da bandeira, há como complemento alguns dizeres que,
imperativamente, pedem a declaração da independência das regras corporativas. Estes são escritos por uma silhueta que se refere a, possivelmente, um
artista de guerrilha.
Bandeira criada pelos
Adbusters.
No que tange às atitudes anticorporativas, antipublicitárias e anticonsumistas, a organização não-governamental canadense, Adbusters Media
Foundation, dissipam suas mensagens - de colapso da mídia através
de suas próprias armas - por meio de
uma revista e um website5. Além, é
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claro, de suas próprias criações e intervenções. A ONG defende “a ‘ecologia mental’ contra a poluição publicitária, o consumismo desenfreado
e o trabalho sem sentido do mundo
contemporâneo” (MARSIGLIA, 2000,
p.37). Seus anúncios antipublicitários
(subvertisements), artigos e fotogra-
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fias denunciam as grandes corporações, muitas vezes com uma pitada
de senso de humor, como a Coca-Cola, Nike, McDonald`s, Calvin Klein e
Philip Morris, por serem empresas com grande capacidade de determinar
o que as pessoas devem vestir, comer, beber, viajar e até mesmo qual
mulher irão desejar.
Culture Jamming, ideologias e movimentos sociais
Com a evolução tecnológica dos meios de comunicação de massa, a publicidade se embrenhou no campo televisivo, radiofônico e, mais recentemente, no campo digital. Os jammers acompanharam tal movimento e
agora utilizam-se destes novos veículos. Atualmente, fazem uso das novas
ferramentas da web – como plataformas de redes sociais a exemplo do
twitter, facebook, youtube etc - para mobilizarem pessoas e até para
transmitir ao vivo alguns acontecimentos e realizações como no caso dos
Adbusters. O grupo promoveu um movimento global de ocupação da famosa Wall Street, um dos símbolos do capitalismo que gira em torno do
mundo publicitário. Denominada como “Occupy wall street”, iniciada em
Nova Iorque no dia 17 de setembro de 2011 e com a duração de 12 dias6,
esta ação buscou reunir o maior número de militantes para lutar pela democracia e livre expressão. O lema deste movimento é “A mídia cidadã
não é crime” (tradução nossa). Na imagem abaixo é possível notar que
mais de 422 mil pessoas, até a data de 1 de novembro de 2013, se associara à página do Occupy Wall Street no Facebook com o intuito de obter
informações a respeito do movimento.
Imagem da página do
movimento Occupy
Wall Street no dia 1 de
novembro de 2013.
Assim como a culture jamming, a contrapropaganda se efetiva por meio
da emissão de mensagens que originam reações negativas e, a arte de
guerrilha, para gerar o mesmo efeito, apropria-se da mensagem corporativista e a altera. Uma vez que “A contrapropaganda também atua sobre
o temor, mostrando que as ideias adversárias, se concretizadas, podem
causar graves prejuízos e malefícios às pessoas” (GARCIA, 1985, p.62),
estes grupos manifestam suas ideologias de “ecologia mental” resistindo
às pressões das grandes marcas e da hegemonia capitalista. Muitas vezes,
as manifestações realizadas por esses movimentos são confundidos com
vandalismo e, assim, a ideia de resistência e desobediência tomam um
corpo negativo.
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Porém, estes grupos têm o conceito
de que subversão e desobediência
são realizadas conforme o conceito
de contrapropaganda. Segundo (Garcia, 1985), a contrapropaganda busca
a neutralização e desmoralização das
ideias contrárias por meio da crítica,
conduzindo as ideias dos “adversários” à contradição e ao desacordo
com os princípios e valores enraizados e admitidos entre os receptores.
Para tanto, se utiliza de técnicas que
anseiam a redução dos impactos das
mensagens opostas, amenizando então os seus fins persuasivos; doutrina
análoga à da culture jamming.
É claro que, como jogos de poder, o
próprio poder, a resistência e a desobediência estão totalmente interligados aos conceitos de culture jamming,
cultura visual e antipublicidade. A
palavra “poder” significa “ser capaz
de”, conforme sua originária latina,
protere. Porém, ainda pode adquirir
o sentido da “capacidade ou habilidade de uma pessoa ou coisa de afetar
outra” (FERES JÚNIOR; POGREBINSCHI, 2010, p.159). Em um espectro
mais específico, sob o viés político,
se relaciona com a capacidade de indivíduos ou grupos de agir de forma
emancipadora.
Com isso, a ideia de poder, neste artigo, é empregada no sentido foucaultiano, pois este filósofo parece querer
evidenciar seu lado positivo, como
uma forma de ação emancipatória
para construção de uma hegemonia
própria e singular. Para isso, é vislumbrada a necessidade de se distanciar
ao máximo seu conceito de ideias negativas, sobretudo as que remetam à
autoridade, sujeição, e especialmente
violência e repressão, por serem conceitos com os quais “poder” é histórica e comumente associado.
Neste contexto, segundo Feres Júnior; Pogrebinschi (2010, p. 170), “o poder transparece antes em seu aspecto
positivo e produtivo; ele se encontra
na verdade irrompendo em pequenos
mecanismos positivos, produtores do
saber, multiplicadores de discursos,
indutores de prazer e geradores de
mais poder”.
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Apesar dos conceitos de resistência
e desobediência possuírem simetrias
em suas significações, em alguns
pontos elas se divergem. Feres Júnior e Pogrebinschi (2010) trazem
que a ideia de resistência, para os
modernos, é justificada pelos seus
fins. Já para os autores contemporâneos, a atenção é voltada para os
seus meios. No debate atual, contudo, vale destacar que o interesse
não mais é centrado na discussão
dos motivos da resistência, mas sim
na forma como ela é concretizada.
A desobediência, assim, é uma forma
de resistência, todavia, não violenta.
É pacífica por ser apresentada por
uma atividade coletiva e frequentemente aplicada por partes de grupos
minoritários. Além disso, a desobediência ainda é uma prática justificada
e consciente, a qual os resultados afetam uma pluralidade de indivíduos e
não apenas uma pessoa.
Vale salientar que, vários destes artistas de guerrilha ou artistas cidadãos, já foram presos, como é o caso
de Rodrigues de Gerada, um dos mais
habilidosos e criativos da culture jamming. Ele já foi preso três vezes em
ocasiões distintas e em uma dessas
abordagens, disse aos policiais que
olhassem para o que ele estava fazendo e explicou que os bairros mais
pobres possuem um número alto de
outdoors vendendo bebidas e cigarro,
quando comparado com outras partes da cidade, e que estes vendiam
ilusões como modelos velejando, jogando golfe ou esquiando às crianças
presas ao gueto e que desejam escapar dali. (Klein, 2006, p. 308).
Porém, meio a isso tudo, alguns artistas vinculados a culture jamming a
definem de formas diferenciadas. Alguns se enquadram como “artistas de
guerrilha” e outros dão preferência à
“arte do cidadão”. A primeira interfere em espaços publicitários, de forma oculta, à noite; já a segunda se
recusa à invisibilidade da militância.
Preferem manifestarem-se e construir seus discursos e diálogos à luz
do dia. Diálogos esses, que devem
ser “vistos como uma forma normal
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de discurso em uma sociedade democrática” (KLEIN, 2006, p. 308).
Com a antipublicidade, é possível
verificar a intervenção artística na
paisagem urbana, utilizando-se dos
próprios meios imagéticos de comunicação mercadológica para combater a mensagem publicitária. É como
o frequente jogo, visto na web 2.0, de
algumas indagações serem feitas por
meio de imagens e as respostas/mensagens, também virem por meio dela.
Portanto, nota-se que as imagens
constituem parte da cultura contemporânea, já que os valores, gostos, estilo e conhecimentos são mediados e
construídos por ela. São, ainda, capazes de gerar múltiplas interpretações
que vão muito além de um sentido
convencional e dogmático, como conta Toscani (1996).
Mobilização social e as redes
sociais on-line
Para se fazer uma associação de
como os processos de engajamento
por meio das redes sociais percebemos como as propostas feitas por
Fernandes (1994), de mobilização
social, são aplicáveis ao ambiente
de redes sociais on-line. O autor diz
que para mobilizar um grupo socialmente é preciso seguir algumas etapas para criar algum tipo de vínculo
com um determinado público para
que o mesmo possa engajar socialmente a causa. As etapas propostas
pelo autor são: localização espacial,
informação, julgamento, ação, coesão e corresponsabilidade.
De forma bastante simplificada, a
“localização espacial” seria o espaço
virtual onde os públicos atuam e influenciam uns aos outros. A “informação”, como já diz a própria palavra,
diz respeito ao conteúdo, aos dados,
às informações sobre um projeto de
mobilização social, podendo ter um
nível de detalhamento alto ou baixo.
O “julgamento” é a etapa em que os
públicos acabam tomando uma posição em relação às informações recebidas sobre algum processo de mobilização social, baseadas em seus
juízos de valor, ideologias e inserções
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socioculturais. A etapa subsequente,
da “ação”, a qual os públicos podem
contribuir de forma direta ou indireta para os objetivos da mobilização, é
de plena importância, uma vez que é
nesta em que o público inicia a prática das informações coletadas e julgadas nas etapas anteriores. Um fato
importante a se considerar é que: a
ação em favor do movimento social
não se resulta em um engajamento,
que é a constância da ação. O indivíduo que a agiu uma vez poderá não
repetir a ação novamente. Portanto,
para chegar ao engajamento é necessário que o público passe pela etapa
de “coesão”, a qual o público convida e distribui a informação para outros indivíduos com o intuito de obter
mais pessoas que se sintam a favor
da causa; pela “continuidade”, a qual
promove o processo continuo de participação do público para que este se
sinta “corresponsável”, etapa final em
que o indivíduo se torna autor da causa através dos sentimentos de compaixão e solidariedade.
Dessa forma, com base em dados e
informações, pautaremos a análise
das influências das redes sociais na
organização e mobilização do protesto #vemprarua, o qual mobilizou mais
de 1,4 milhão de pessoas espalhadas
por mais de 120 cidades brasileiras.
As manifestações se iniciaram na cidade de São Paulo com o intuito de
barrar o reajuste dos preços das passagens de ônibus municipais e do metrô; porém, em 20 de junho de 2013,
no auge dos protestos, os temas se
tornaram diversos como: PECs 37 e
33, “cura” gay, melhorias na educação
do país, gastos com a Copa do Mundo pelo Governo Brasileiro etc.
Em comparação às etapas proposta por Rubens Fernandes (1994), é
possível verificar que foram criados
eventos e páginas no Facebook as
quais funcionaram como “localização
espacial” para os participantes, os
quais poderiam colher informações
a respeito das causas e motivações
que estavam fazendo o fluxo de protestos nas ruas. Com a obtenção das
informações, os internautas poderiam
julgar os dados de acordo com as
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frustrações em relação ao governo
ou outras causas, para que, a partir
dessa etapa, pudessem agir, ir para
as ruas tornando o movimento maior
em número de pessoas. Além disso,
os indivíduos convidavam amigos
para os eventos, compartilhavam
informações, sendo elas texto ou
imagem, para que outras pessoas se
engajassem à causa, como é a etapa
de coesão. A partir de tal processo,
foi possível notar o sentimento de
corresponsabilidade dos cidadãos
brasileiros no movimento “Vem pra
Rua”, já que as pessoas – de fato –
foram para as ruas do Brasil expor
suas insatisfações perante as propostas do governo.
Durante os protestos foi possível notar um número considerável de cartazes cujas mensagens capturavam
a essência das identidades corporativas e/ou a própria linguagem visual das marcas, apropriando-se delas
com o intuito de expressar em poucas
palavras e imagens. Exemplo disso, é
a imagem abaixo cuja fotografia foi
muito utilizada para mostrar a quantidade de pessoas envolvida neste
movimento e ainda a mídia passou a
utilizá-la como marco histórico deste
Imagem utilizada nas
Redes Sociais na época
do movimento “Vem pra
Rua”
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acontecimento. Os dizeres impactam
diretamente sobre as marcas “Mentos” e “Coca-Cola”, mencionadas em
sua literalidade: “Jogaram Mentos na
geração Coca-Cola”. Este “banner eletrônico” se refere também a um fato
que foi amplamente divulgado na mídia internacional (no ano de 2006 e
2007) de que as pessoas poderiam
morrer se tomassem Coca-Cola com
a bala Mentos. Experimentos foram
gravados e divulgados em redes sociais on-line e no YouTube do ato de
se colocar uma bala da marca Mentos
em uma garrafa de Coca-Cola Diet,
cujo processo acabava resultando em
uma reação do refrigerante o qual
era impulsionado para fora da garrafa
pela força da com o dióxido de carbono, provocado pela bala Mentos. Dessa forma, notamos uma clara apropriação da mensagem criada pelo
movimento com o experimento com
o intuito de exprimir que a “geração
Coca-Cola”7, aquela conhecida como
geração x - nascidos na década de
80 e amplamente criticada pela alienação aos meios de comunicação em
massa - acordou para os problemas
políticos e sociais ao fazer analogia
à reação química causada pela bala
Mentos no fato supracitado.
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Para notarmos a profusão das mensagens por meio das marca trouxemos outro exemplo, mas desta vez de uma foto tirada em um dos protestos e também compartilhada nas redes sociais on-line. Desta vez é possível notar que
um jovem carrega um cartaz com os dizeres “odeio bala de borracha, joga
um HALLS” com o intuito de protestar contra a ação policial que ocorreu no
início dos protestos, a de atirar com balas de borracha contra a população.
Sendo assim, para demonstrar que o indivíduo estava ali de forma pacífica,
usou o trocadilho da bala de borracha com a bala Halls. O interessante desse
Foto capturada em uma
das manifestações
processo é pensar em como as rede sociais digitais impulsionaram essa cadeia
de protestos sucessivos até se promover a mobilização social em mais de 120
cidades do Brasil e um outro caminho parecido ocorrido com o “Occupy Wall
Street”, que começou como um protesto despretensioso em Nova York, mas
que se espalhou por várias cidades do mundo.
O início das ações se deu com base na campanha da FIAT (criada pea Agência Fiat/ AgênciaClick Isobar e Leo Burnett Tailor Made8), lançada em maio
de 2013, cuja música-tema cantada pelo Falcão9 se intitulava “Vem Pra Rua”,
“vem pra maior arquibancada do Brasil” já se referindo à Copa do Mundo
de 2014. O que não se previa era a apropriação, por parte dos movimentos
sociais, da música-tema e também da estética criada como pode ser notada
nas imagens abaixo.
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Campanha da FIAT
“Vem pra rua”
Imagem criada pelo
grupo Anonymous
Brasil no movimento
“Vem pra Rua”, baseado
na campanha da FIAT
A repercussão da apropriação se deu de tal forma que a empresa Fiat teve
que tirar de circulação sua campanha de maior investimento e que estaria
programada até o dia 22 de junho de 2014 . É fato que a hashtag “vem pra
rua” (#vemprarua) foi amplamente divulgada de forma espontânea e também
o mote da campanha, porém, não se sabe ao certo os impactos, positivos ou
negativos, que tais ações recairiam sobre a marca.
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NOTAS
1 - Trabalho apresentado no 4º Simpósio de Pesquisa em Comunicação Social PUC-Goiás em
01/11/2013. PUC-Goiás – Campus V
2 - Estudante de Graduação 6º. semestre do Curso de Publicidade e Propaganda da PUC-Goiás,
e-mail: [email protected]
3 - Estudante de Graduação 6º. semestre do Curso de Publicidade e Propaganda da PUC-Goiás,
e-mail: [email protected]
4 - Doutoranda em Arte e Cultura Visual pela FAV-UFG e professora do Curso de Publicidade e
Propaganda da PUC-Goiás, e-mail: [email protected]
5 - http://www.adbusters.org/
6 - até o momento, 28 de setembro de 2011.
7 - Geração Coca-Cola se refere à geração materialista e consumista dos anos 80 mencionada por
Renato Russo na música de próprio nome “Geração Coca-Cola” criada em 1985.
8 - ROGENSKY, Renato. “Vem pra rua”: campanha da Fiat vira “hino”de protesto. Disponível em:
<http://www.adnews.com.br/publicidade/vem-pra-rua-campanha-da-fiat-vira-hino-de-protesto>.
Acessado em: 20 nov. 2013.
9 - Vocalista da banda O Rappa.
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ed. 2006
JÚNIOR, João Feres; POGREBINSCHI, Thamy. Teoria política contemporânea. Rio de Janeiro:
Elsevier, 2010.
MARSIGLIA, Ivan. Adbusters: implodindo o consumismo. Revista Trip, p.34-39. 2000.
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