conceitual

Transcrição

conceitual
DEZEMBRO/2015
#15
CONCEITUAL
DIVIDIR PARA
MULTIPLICAR
Acquablock é perfeito para renovar a
decoração e adicionar mais estilo ao seu dia
a dia. Um tecido com a exclusividade de ser
impermeável, que protege contra a ação do
sol, repele a água e traz mais cor e vida para
os ambientes internos ou externos.
Renove-se com tecidos e estampas incríveis.
Um toque de felicidade na sua casa.
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Ou melhor: em um lugar único.
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marcas que imprimem estilo e personalidade
à sua casa, serviços que facilitam a sua vida
e eventos que celebram a cultura e a arte.
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Março 2016
São Paulo
A Fashion Week da Arquitetura
e Construção
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Apoio
Eventos Conjuntos
Organização
EDITORIAL
EXPEDIENTE
Publishers André Poli e Roberta Queiroz
Conselho Editorial Fabio Galeazzo e Renata Amaral
Edição e Arte Marcos Guinoza
Colaboradores Alvaro Tedesco, João Lourenço
Revisão Luciana Sanches
Jornalista Responsável Marcos Guinoza MTB 31683
2015 foi um ano de grandes resultados
para a ABD e seus associados
Publicidade
Comercial Rosane Gulhak | [email protected]
VELVET EDITORA LTDA.
Tel.: 11 3082-4275 | www.velveteditora.com.br
ABD Associação Brasileira de Designers de Interiores
Tel.: (11) 3064-6990 | www.abd.org.br
BOAS NOVAS
Amigos,
É com alegria que comemoro o fim deste ano
velho e a chegada do próximo. Que 2016 nos traga
boas novas.
Como bem disse Drummond no poema “Tempo”,
“quem teve a ideia de cortar o tempo em fatias, a que se
deu o nome de ano, foi um indivíduo genial”.
“Doze meses”, diz o poeta, “dão para qualquer ser
humano se cansar e entregar os pontos”. Mas, aí, entra em
cena “o milagre da renovação e tudo começa outra vez,
com outro número e outra vontade de acreditar”.
Nós, da ABD, acreditamos. E, com a esperança
sempre renovada, seguiremos firmes e fortes em nossa
missão de fazer do design de interiores uma profissão
cada vez mais respeitada e requisitada.
Esta edição de ABD Conceitual, a última de 2015,
chamamos de “Dividir Para Multiplicar” e nela falamos sobre a origem do biombo e as várias formas de dividir os
ambientes sem erguer paredes. Na seção “Vitrine”, temos
a designer Bianca Barbato. Em “Entrevista”, conversamos
com Waldick Jatobá, curador da feira Made. Temos, ainda,
as dez coisas que você precisa saber sobre o designer de
interiores Piet Boon e uma matéria sobre cortinas.
Para finalizar, volto a Drummond: “Gostaria de lhe
desejar tantas coisas. Mas nada seria suficiente... Então,
desejo apenas que você tenha muitos desejos. Desejos
grandes e que eles possam te mover a cada minuto ao
rumo da sua felicidade”.
Feliz ano novo e até 2016!
162 eventos realizados
CORPO DIRETIVO ABD
em todo o Brasil
Presidência: Renata Amaral
Vice-presidência: Marcia Kalil, Ricardo Caminada, Bianka Mugnatto,
Jéthero Miranda
2 novas regionais, totalizando
C
Conselho Deliberativo | Membros Efetivos: Carolina Szabó
(presidente), Francesca Alzati (SP), Silvana Carminati (SP), Maurício
Peres Queiroz dos Santos (SP), Alexander Jonathan Lipszyc (SP),
Renata Maria Florenzano (SP), Rosangela Larcipretti (SP), Joia
Bérgamo (SP), Lucy Amicón (SP), Carlos Alexandre Dumont (MG),
Jaqueline Miranda Frauches (MG), Paula Neder de Lima (RJ), Luiz
Saldanha Marinho Filho (RJ), Flávia Nogueira da Gama Chueire (RJ)
Conselho Deliberativo | Suplentes: Nicolau da Silva Nasser (SP),
Paula Almeida (SP)
M
10 regionais ABD
Y
CM
MY
CY
Lançamento do livro
CMY
Brasil Porta Adentro
K
Conselho Fiscal | Membros Efetivos: Maria Fernanda Pitti (SP),
Fabianne Nodari Brandalise (PR), Catia Maria Bacellar (BA),
Delma Morais Macedo (BA)
Conselho Fiscal | Suplente: Daniela Marim (SP)
Diretora Executiva: Alessandra Decourt
Sucesso em 3 comissões
Sugestões
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Os artigos assinados são de exclusiva responsabilidade
dos autores e não refletem a opinião da revista.
a favor da regulamentação profissional
Associe-se a ABD e faça parte dessas conquistas!
CAPA: ANDRÉ POLI
RENATA AMARAL, presidente da ABD
10 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
abd.org.br
LANÇAMENTO
Acreditamos que possuir coisas
belas também nos torna belos”
Deyan Sudjic, no livro Design, A Linguagem das Coisas
SUMÁRIO
BIANCA BARBATO/14
DIVIDIR PARA
MULTIPLICAR/18
A ORIGEM
DO BIOMBO /20
C
M
Y
CM
MY
O QUE OS OLHOS
NÃO VEEM /24
A BELEZA
DA MADEIRA/36
ANGELO DERENZE/34
WALDICK JATOBÁ/28
PEQUENAS GRANDES
CASAS/35
ERIN M. RILEY/40
PIET BOON/48
POR TRÁS DA CORTINA/44
SANTIAGO SALVADOR/50
ABD CONCEITUAL | #15 | EDIÇÃO DIVIDIR PARA MULTIPLICAR
12 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
CY
CMY
K
yVITRINE
MINUCIOSA E
PERFECCIONISTA
BIANCABARBATO
TEXTO MARCOS GUINOZA
14 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
DESIGNER AUTODIDATA, a paulistana Bianca
Barbato iniciou carreira no Rio de Janeiro, onde
morou durante sete anos. Foi lá que abriu seu
estúdio de design, em 2006.
De volta a São Paulo, Bianca segue
criando mobiliário e luminárias inspirados na
cultura brasileira. Os títulos das séries de peças
assinadas pela designer entregam essa brasilidade à flor da pele: Sagu, Cabaça, Renda. Esta,
composta por cadeiras, poltronas e mesas de
aço carbono, tem como referência as rendas de
bilro feitas pelas mulheres do Ceará. Cabaça,
série de luminárias pendentes de resina moldada, é inspirada nas cabaças indígenas.
Minuciosa e perfeccionista, admiradora
da geometria modernista e da face orgânica
das construções, Bianca é uma estudiosa de
matérias-primas. “Meu trabalho é experimentar materiais, no estúdio o clima é de laboratório.” Atualmente, ela tem se dedicado aos
metais: aço, latão, cobre, inox. Mas já produziu
peças de acrílico, madeira, resina e azulejo.
Brincando com a oposição entre o artesanal e o industrial, experimentando tecnologias e buscando criar peças que deixem o
espaço mais confortável e pessoal, a designer
desenvolveu uma linguagem única, de formas
nostálgicas, lúdicas e acolhedoras.
Bianca falou com ABD Conceitual.
CABAÇA Série de luminárias pendentes
feitas de resina moldada e inspiradas nas
cabaças indígenas, 2015
“Não me imagino fazendo um objeto sem
identidade, crio o que tem a ver com a
minha personalidade e com o meu estilo”
RENDA Série de poltronas, cadeiras e mesas
com desenho inspirado nas rendas brasileiras,
2015. Abaixo, TRAMAS Série de mesas feitas de
marchetaria geométrica de metal, 2015
SAGU Série de mesas de canto, apoio e centro
com tampo que possibilita a transformação da
peça depois de pronta, 2007
ca, e colocando a mão na massa. Eu me envolvo em cada
etapa do processo de produção. Estudo bem como cada
material vai se comportar naquele objeto. Ao criar, interajo com as padronagens e geometrias possíveis, como um
quebra-cabeça, por isso, elas têm um quê de lúdico. Não
me imagino fazendo um objeto sem identidade, crio o que
tem a ver com a minha personalidade e com o meu estilo.
TEM SONHOS DE CONSUMO DE PEÇAS DE OUTROS
DESIGNERS?
Tenho vários. Não só peças de design, mas de arte
como um todo e outras coisas. Gosto de colecionar.
COM QUAL MATÉRIA-PRIMA VOCÊ MAIS GOSTA DE TRABALHAR?
Meu trabalho é experimentar materiais, no estúdio
o clima é de laboratório. Atualmente, estou trabalhando bastante com metais (aço, latão, cobre, inox).
Gosto de brincar com a oposição entre artesanal e
industrial. Hoje, a máquina corta e dobra o metal
como se fosse papel, e as possibilidades que surgem são superinstigantes.
DE ONDE VEM SUA INSPIRAÇÃO?
QUAL OBJETO QUE JÁ EXISTE VOCÊ GOSTARIA DE TER CRIADO?
Não consigo pensar em um objeto que eu gostaria de ter criado,
mas tem coisas de que gosto muito e que me surpreendem pela
originalidade. Cada objeto tem sua própria história para ser contada.
Meu processo criativo varia de acordo com cada peça. Geralmente, escolho o material com que quero trabalhar e,
durante a pesquisa dos métodos de fabricação, que podem ir do artesanal ao industrial, a inspiração vem. A ideia
sempre começa de uma teimosia, e a peça se desdobra
nesse percurso.
COMO DEFINE CRIATIVIDADE?
A criatividade é uma habilidade natural, divergente
e construtiva. É uma característica da personalidade
de quem tem percepção e capacidade intuitiva ou
curiosidade intelectual. A originalidade, no design, não
pode abrir mão da função técnica a que se propõe. Ela
não caminha se não tiver uma boa equipe para executar e persistir em alcançar o objetivo.
DE TODAS AS PEÇAS QUE JÁ CRIOU, QUAL ESCOLHERIA PARA DEFINIR SEU TRABALHO?
VOCÊ TEM UM OBJETO DE ESTIMAÇÃO?
Tenho várias coisas que garimpei pela vida, algumas obras,
badulaques. Esses objetos têm valor sentimental, e eu não venderia
por valor nenhum.
VOCÊ SEGUE REGRAS NA HORA DE CRIAR?
16 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
COM QUAIS AMBIENTES SUAS PEÇAS COMBINAM MELHOR?
FOTOS DIVULGAÇÃO
Não sigo exatamente uma regra, mas a disciplina e o comprometimento com o objeto e a criação não deixam de ser uma regra. Geralmente, os materiais são os protagonistas nas experimentações. A
descoberta acontece durante o processo construtivo, com a práti-
É difícil definir meu trabalho por uma peça, penso que elas
dialogam entre si e que consegui desenvolver uma linguagem única. No caso das mesas da série Tramas, há certa
associação com o universo da joalheria e suas preciosidades. Feitas de metais nobres (latão, cobre ou inox), têm o
tampo marchetado com as peças cortadas a laser. Uso dois
tipos de acabamento na marchetaria, polido e escovado,
para que ressaltem o efeito tridimensional do tampo. Essa
característica também está presente em outras peças da
minha coleção.
Isso não sou eu quem pode dizer, mas minhas peças
são funcionais e podem se adequar a vários ambientes.
BIANCABARBATO.COM
yINSIDE
dividir para
multiplicar
TEXTO MARCOS GUINOZA
18 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
Um pode virar dois. Dois podem virar quatro. Quatro
podem virar oito. E assim por diante.
Multiplicando, somos mais fortes.
DIVIDIR é partir ou separar o todo em partes. DIVIDIR é
demarcar, estabelecer a limitação entre. DIVIDIR também
é compartilhar. E não há palavra mais necessária, hoje, no
mundo que compartilhar.
Compartilhar a água do planeta.
Compartilhar conhecimento.
Compartilhar gentileza.
Compartilhar o espaço público.
Compartilhar “o amor para multiplicar solidariedade”.
DIVIDIR, no design de interiores, é separar os ambientes,
não necessariamente levantando paredes – de preferência,
sem levantar paredes. Paredes comprometem o convívio,
impedem a passagem do vento, bloqueiam a luz.
Nos últimos anos, seja para driblar a falta de espaço
nos congestionados centros urbanos, seja para propiciar
melhor interação entre os moradores, as paredes vêm sendo
derrubadas, resultando em ambientes abertos, integrados e
multifuncionais.
Mas o que é sala, o que é cozinha e o que é quarto em
lugares onde tudo está junto e misturado? Para delimitar as
funções de cada ambiente, existem vários elementos que,
usando um pouco de imaginação, podem ocultar sutilmente
os espaços ou apenas sinalizar a mudança de usos.
Biombos, divisórias, cortinas, tapetes e móveis, mas
também o piso, o teto e a iluminação podem marcar
visualmente os ambientes, “separando” as áreas, indicando
onde começa uma e termina a outra.
Em um momento histórico, em que a palavra do futuro
é escassez, talvez seja a hora de nos perguntar: de quanto
espaço e coisas realmente precisamos para viver bem?
yBIOMBO
a origem
do biombo
20 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
Biombo japonês
MÓVEL MULTIUSO, O BIOMBO FOI INVENTADO PELOS
CHINESES, APROPRIADO PELOS JAPONESES E CHEGOU À
EUROPA NO SÉCULO 17
TEXTO ALVARO TEDESCO
ARTE NAMBAN
Biombo estilo LUIS XV
Biombo COROMANDEL
F
22 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
e conhecidas como kuancai, apareceram no fim da dinastia
Ming (1368-1644).
Por volta do século 8, o biombo atravessou o mar
e foi parar no Japão, onde recebeu o nome de byobu –
expressão que significa, literalmente, “proteção contra o
vento”, e deu origem à palavra biombo. Com o tempo, a
estrutura e o design do byobu evoluíram, novas técnicas
e materiais começaram a ser utilizados na manufatura e a
peça foi ganhando características japonesas, afastando-se
dos padrões chineses.
O biombo tradicional japonês é feito com papel
washi, madeira fina ou bambu e folhas de ouro. Pintada à
mão, a peça tem produção 100% artesanal. No Japão, é usada para diversos fins. Além de divisor de ambientes e barreira contra o vento, serve como tela de fundo para arranjos
florais (ikebana) e costuma acompanhar a cerimônia do chá.
Existem até classificações que separam o biombo de acordo
com o número de painéis e com a utilização ou tema.
O biombo com um único painel é chamado
FOTOS REPRODUÇÃO
alam que Coco Chanel possuía cerca de 32 biombos chineses. Alguns decoravam o famoso apartamento da estilista, na Rue Cambon, em Paris.
Eram biombos dos séculos 18 e 19, conhecidos
como Coromandel e feitos de madeira coberta
de laca preta e adornados com desenhos gravados à mão.
O nome é uma referência à Costa de Coromandel, faixa marítima no sudeste da Índia de onde as mercadorias chinesas
saíam para seguir em direção à Europa. Sobre esses biombos, Coco disse: “Eu quase desmaiei de alegria quando, ao
entrar em uma loja, vi um Coromandel pela primeira vez”.
Assim como o macarrão, o papel e a pólvora, o
biombo é uma invenção chinesa. Surgiu na China durante a
dinastia Han (206 a.C.-220 d.C.) e se tornou popular séculos
depois, já na dinastia Tang (618-907). Era feito de papel, seda
ou madeira e servia de tela para pintura e caligrafia. Havia
dois tipos de biombo: um conhecido como huaping (“pintura em tela dobrável”) e outro chamado shuping (“biombo
caligrafado”). As técnicas de laca, aplicadas no Coromandel
tsuitate byobu. Há os de dois painéis (nikyoku byobu), quatro (yonkyoku byobu),
seis (rokkyoku byobu) e dez. Este, o jukyoku byobu, é colocado em ambientes
grandes, como lobbies de hotel e salas de convenções.
Segundo a utilização ou tema, o biombo também recebe nomes diferentes: furosaki byobu (usado em cerimônias do chá), ga no byobu (para celebrar
a longevidade), shiro-e byobu (cerimônias de casamento e quartos de bebê) e
makura byobu (para preservar a privacidade).
Fora o uso decorativo e funcional, o biombo, no Japão, serviu de tela para
importantes artistas, como Ogata Korin (1658-1716) e Ito Jakuchu (1716-1800). O
Biombo das Ameixeiras, de Ogata, considerado tesouro nacional do Japão, integra
o acervo do Museu MOA de Belas Artes, em Atami.
Saindo da China e do Japão, o biombo chegou à Europa no século 17
e, dali, ganhou o mundo. Se, no passado, era usado principalmente para conferir
privacidade à troca de roupa e para proteger contra o vento, hoje, polivalente e
versátil, com uma grande variedade de estilos – do clássico ao moderno – o biombo desempenha diferentes funções no design de interiores. É espécie de peça
curinga, podendo ser usado para separar ou integrar ambientes, para esconder
parte de uma sala, na cabeceira de camas ou, como fazia Coco Chanel, apenas
como item decorativo.
Os portugueses desembarcaram pela primeira vez no Japão em 1543, na ilha de
Tanegashima, no sul do país. Desse encontro com os “bárbaros do sul” (namban-jin,
como eram chamados os portugueses), os
japoneses criaram a Arte Namban, produzida entre a última metade do século 16 e
a primeira metade do século 17. Além de
escultura, cerâmica, mobiliário, porcelana
e objetos lacados, fazem parte dessa manifestação artística muitas obras de pintura
em biombos, o núcleo central da Arte Namban. Essas pinturas, ligadas principalmente
à arte sacra e à evangelização (influência
dos jesuítas) são como “fotografias daquele período”, retratando cenas da chegada
dos portugueses ao Japão (naus, costumes,
vestuário etc.), e fazem parte do acervo de
importantes museus de ambos os países.
No alto, detalhe de
biombo da ARTE NAMBAN
yDIVISÓRIAS
o que os
OLHOS
não veem
TEXTO FABIO GALEAZZO
ALÉM DE SOLUÇÃO PRÁTICA utilizada para demarcar ou separar os ambientes de maneira leve e despojada, as divisórias são estruturas mágicas que despertam suspiros em
qualquer decoração.
Quem nunca exclamou um “a-ha!” ao dar de cara com um balcão separando a cozinha da sala? Biombos e aparadores aguçam a nossa curiosidade e nos fazem querer
saber o que tem do outro lado. Um simples degrau que separa os ambientes chama a
atenção dos nossos olhos, interrompendo a caminhada, forçando os pés e a mente a
refletir. Para que lado vou? O que tem atrás disso? Como chego àquele lugar? Que ideia
genial! Nossa, que legal! Eu já vim várias vezes neste lugar, mas nunca tinha reparado
neste detalhe!
Divisórias são mágicas porque tencionam a relação entre pés e olhos, um passa a
depender do outro, equilibrando os sentidos da visão e do tato, pois os pés deixam de ser
escravos dos olhos e simples condutores, já que não podem seguir em direção ao que o
olho vê. Ao caminhar em direção ao ambiente oposto, as divisórias travam a passagem, o
olho perde o ambiente de vista, deixamos de andar em linha reta e os pés passam a levar
os olhos por rotas mais circulares e indiretas, onde alternadamente o pé leva o olho e o
olho instrui o pé.
Quanto mais dissociarmos os pés dos olhos, maior será o número de experiências,
fortalecendo o vínculo afetivo com o lugar. Não é à toa que, recentemente, espaços comerciais, como lojas, hotéis e supermercados, abandonaram o layout tradicional de criar
passagens em linha reta, como se fosse uma avenida, forçando o pé a caminhar sobre
aquilo que o olho já percorreu. É cada vez mais comum visitar uma livraria e “tropeçar”
em poltronas ou móveis arrumados propositadamente no meio do caminho, obrigando-nos a escolher: sentamos para ler ou nos desviamos em busca do novo?
Quando pés e olhos agem separadamente, deixamos de fazer as coisas automaticamente e nos lembramos de como é bom ter surpresas.
24 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
ftapetes
Fazem um recorte no piso,
delimitando o espaço, sem
fechá-lo, dando uma sensação de
conforto ao marcar onde começa
e termina o ambiente.
fbiombos
Por serem móveis, podem ser mudados
facilmente de lugar. Setorizam o espaço
ao manter determinado local parcialmente
fechado ou promover mais privacidade
quando necessário. Há ainda biombos
vazados, que permitem maior integração
dos ambientes.
#teto
Usando detalhes diferentes em
cada espaço, marca visualmente
os ambientes.
faparadores
Assim como as cômodas e os
bufês, são muito usados atrás do
sofá para delimitar os espaços da
sala de estar e das salas de TV ou
de jantar, mantendo a visibilidade
entre os ambientes.
hbalcões/
bancadas
São usados, geralmente, para separar a
cozinha ou bar da sala de estar. E ainda podem
servir como mesa para refeições ou drinques.
#estantes
São ótimas opções de divisórias. Além de separar
os ambientes, são funcionais, podendo acomodar
itens como livros e objetos decorativos. Vazadas,
aumentam a sensação de amplitude, sem bloquear
totalmente a visão.
#cortinas
Em janelas, protegem contra a incidência excessiva
de luz solar. Mas também são usadas para demarcar
ambientes internos.
#piso
A mudança de piso de um
espaço para o outro pode se
dar utilizando revestimentos
diferentes ou alterando a altura
do piso.
fpainéis
vazados
Proporcionam transparência e
ventilação e separam os espaços
sem isolá-los.
26 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
yENTREVISTA
FOTO DIEGO GUERRA TEXTO JOÃO LOURENÇO
MADE
IN BRAZIL
28 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
Quando trabalhava no Banco Privado Português,
WALDICK JATOBÁ contribuiu para a formação de um
fundo de investimento em arte contemporânea no qual
as obras eram compradas com o apoio de um curador. A
instituição fechou as portas e ele resolveu se dedicar a
uma paixão antiga: o mercado de arte e design. “Desde a
adolescência, tinha o hábito de ir a museus, frequentava
galerias de arte. Era uma coisa muito natural. Coleciono
arte desde os 17 anos.”
Nascido em Salvador, formado em economia, Jatobá
transformou o hobby em projetos e iniciativas que visam alavancar o cenário do design nacional. Em 2011,
ele lançou o Salão Design São Paulo, que, em dois anos,
desdobrou-se na primeira edição do Made (Mercado Arte
Design), a primeira feira de design e arte internacional do
Brasil. “Criei o Made para ser uma plataforma não só para
trazer designers e galerias para vender produtos de edição limitada, mas também para ser um local onde haja o
lançamento de ideias.”
Realizada anualmente no Jockey Club de São Paulo,
a feira apresenta ao longo de cinco dias uma seleção do
design nacional e internacional, além de promover palestras, seminários e exposições. Jatobá já começa a planejar a próxima edição do evento. “Acredito que 2016 vai
ser um ano difícil para todo mundo e penso que, cada vez
mais, temos que utilizar nossa criatividade para criar e fazer as coisas com muito menos. Por isso, o minimalismo
é o tema principal que estou trabalhando no momento.”
Waldick Jatobá conversou com ABD Conceitual.
“VEJA OS IRMÃOS
CAMPANA. ELES
UTILIZARAM BICHOS
DE PELÚCIA EM
UMA POLTRONA. A
DIVERSIDADE CRIATIVA
E A DIVERSIDADE DE
UTILIZAR MATERIAIS
BANAIS PARA NOVOS
USOS TALVEZ SEJAM AS
CARACTERÍSTICAS MAIS
FORTES NO DESIGN
BRASILEIRO”
VOCÊ VIAJA O MUNDO EM BUSCA DO NOVO DE-
O INTERESSE POR DESIGN CRESCE NO BRASIL. POR
SIGN. QUAL A SUA MAIOR FONTE DE INSPIRAÇÃO?
QUE O JOVEM PROFISSIONAL AINDA ENFRENTA
Apesar de o mundo estar mais conectado,
mais cibernético e automático, eu ainda sou
da velha guarda. Nada melhor do que o relacionamento humano, de você interagir com
as pessoas. Vamos lá: nove entre dez coisas
bacanas estão na internet, mas uma está na
boca dos amigos. Acho que a minha maior
fonte de inspiração vem das minhas amizades. Conhecer pessoas, opiniões diferentes,
cultivar amigos e relacionamentos é algo de
grande valia. Até as revistas que assino, por
exemplo, só assino porque um amigo ou outro indicou.
TANTAS DIFICULDADES?
Trata-se de uma indústria jovem. Está crescendo, as pessoas estão prestando mais
atenção, mas o conceito de design colecionável no Brasil ainda é muito novo. O jovem, pelo próprio caráter de ser jovem, vai
encontrar todas as dificuldades imagináveis.
Essa dificuldade é por conta da falta de oportunidade que você tem dentro do país. Além
do Made, não vejo nenhuma plataforma que
fomente e abrigue esses jovens para lançar
seus produtos anualmente.
SOBRE O DESIGN COLECIONÁVEL, O QUE FAZ UMA
EM RELAÇÃO AO CONSUMO DE DESIGN E ARTE NO
PEÇA DE DESIGN SER CONSIDERADA ARTE?
BRASIL, QUAIS AS MAIORES MUDANÇAS QUE PER-
Ela tem que ter conceito e apelo estético
muito fortes. Não que seja belo, mas no
sentido estético de que venha a incomodar os olhos da pessoa que está vendo. Ela
precisa ter o conceito de criação. Ou seja, é
você criar uma peça de arte que tenha uma
função, que não seja apenas para enfeite.
O material também é muito importante
para que essa peça seja considerada arte.
A peça tem que ter um destaque para o
material, o conceito e o processo criativo. E,
CEBEU NOS ÚLTIMOS ANOS?
Sem nenhuma pretensão, acredito que o
Made tem contribuído muito para essas
mudanças. É importante ter um espaço para
que esses jovens designers possam mostrar
suas criações. Se você pegar as listas dos
200 designers mais importantes do mundo,
encontra vários brasileiros em posições de
destaque. Pessoas que estão no Brasil e que
criam aqui. Isso dá um gás para o mercado.
30 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
sobretudo, tem que ter tido a participação
das mãos do designer. Ela pode até ter um
processo semi-industrial, mas a finalização
tem que ser artesanal. Assim, você consegue valorizar a produção de uma pequena
quantidade de peças.
Imagens da feira Made
em uma poltrona. A diversidade criativa e a
diversidade de utilizar materiais banais para
novos usos talvez sejam as características
mais fortes no design brasileiro.
VOCÊ JÁ AFIRMOU QUE ARTE TAMBÉM É UM INVESTIMENTO E QUE NINGUÉM INVESTE SEM ESTAR SE-
QUAL A ESSÊNCIA DO DESIGN BRASILEIRO? COMO
GURO DO QUE ESTÁ COMPRANDO. VOCÊ PODERIA
ELE É RECONHECIDO PELO MUNDO?
FALAR UM POUCO SOBRE ISSO?
Isso é bastante relativo. Se você pensar nos
anos 1940 e 1950, por exemplo, eu diria que
a grande característica do design brasileiro
estava no uso das madeiras nobres, como
o jacarandá. Isso distinguiu muito o design
brasileiro. Era a combinação do desenho
modernista com o uso de madeiras nobres.
Hoje, não acho que existe uma característica que entrega “esse é o modelo brasileiro”.
Vejo isso mais como um conjunto de fatores. O design brasileiro é muito espontâneo,
as criações, na maioria, têm uma pegada
de humor, têm uma alegria que enriquece
o ambiente. O Brasil tem essa característica
de buscar novos usos para materiais que já
existem. Veja os irmãos Campana. Eles utilizaram bichos de pelúcia, que, geralmente,
são comprados para bebês ou para enfeitar o quarto, e transformaram esses bichos
Quando você tem vontade de fazer alguma coisa no mercado de arte, não pode
pensar em arte como um investimento.
Quem pensa em investir em arte para ganhar dinheiro não é um colecionador, mas
um investidor ou um especulador que está
testando o mercado. Acredito que a paixão
pela arte é a primeira motivação para que
você possa começar a colecionar. Agora,
óbvio que ninguém tem dinheiro para jogar pela janela. Por isso, sempre digo que a
arte é um bom investimento. Você tem que
estar atento a boas oportunidades, a bons
artistas e, principalmente, a bons galeristas,
pois são eles que lançam e acompanham
os artistas no mercado.
VOCÊ FICOU CONHECIDO POR ACOMPANHAR O
PROCESSO CRIATIVO DOS ARTISTAS QUE VOCÊ
COLECIONA E APOIA. QUAL A IMPORTÂNCIA DESSA
PROXIMIDADE?
É importante entender como o artista participa da linha de criação. Gosto de trocar
ideias e saber detalhes, entender todas as
etapas do processo. Também é importante
entender o artista como um ser humano,
para que, então, eu possa ter obras que venham a constatar aquela amizade ou interação que tive com o artista. Cerca de 90%
da minha coleção é formada por artistas que
conheço. Isso complementa a obra. Não
gosto de comprar por comprar.
EM 2013, VOCÊ LANÇOU O MADE. FALE SOBRE A
IDEIA INICIAL DO PROJETO.
Criei o Made para ser uma plataforma em
que você possa não só trazer designers e
galerias para vender produtos de edição limitada, mas também para ser um local onde
haja o lançamento dessas ideias anualmente. Óbvio que isso sozinho não se sustenta.
Então, o Made tem também a prerrogativa
de ser um espaço em que você possa discutir o design, ver o design por meio de exposições e instalações. A minha preocupação é
sempre com o compartilhamento de informação. Dou acesso para todo mundo que
entra na feira, não apenas para comprar as
peças de design, mas também para quem
está lá para ver a exposição. A proposta do
Made é ter uma plataforma para criar e falar
sobre design na mais ampla possibilidade.
QUAIS AS MAIORES DIFICULDADES QUE VOCÊ ENFRENTOU PARA LANÇAR UMA FEIRA DESSE PORTE
NO BRASIL?
No Brasil, quando você fala em fazer cultura, você tem dificuldades que vão ao infinito. Uma delas é que não tenho o apoio do
governo, nenhum tipo de incentivo. Todo
ano, procuro trazer entre seis e dez designers internacionais para o Made. Fora isso,
a feira também tem três exposições de design internacional. É um orçamento grande
para compartilhar cultura. Ou seja, ir atrás de
patrocínio é uma dificuldade constante, pois
não consigo fazer uma feira apenas com recursos de venda de espaço. Graças ao apoio
de parceiros fiéis como Bradesco, Mitsubishi,
Tok&Stok e Electrolux, consigo fazer essas
loucuras todas.
QUAL O MAIOR APRENDIZADO QUE O MADE TE
PROPORCIONOU?
Ver que que estou no caminho certo. À me-
dida que dou oportunidade a esses jovens e
os vejo felizes, podendo participar de uma
coisa em que acreditam, algo que é sério,
que tem um pensamento de continuidade.
Isso é um grande aprendizado para mim,
pois me motiva a continuar no caminho. O
Made está dando efeito pelo menos para
essa juventude que precisa se colocar e se
afirmar no mercado.
E O QUE ESPERAR NAS PRÓXIMAS EDIÇÕES?
32 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
cidade que me inspirou bastante. Desde
adolescente, tinha o hábito de ir a museus,
frequentava galerias de arte. Era uma coisa
muito natural.
O QUE PODEMOS ENCONTRAR NA SUA COLEÇÃO?
COMO SUA VISÃO FINANCEIRA INFLUENCIOU A
FORMA COMO VOCÊ TRABALHA E CONSOME ARTE
E DESIGN?
Sou economista. Essa formação me ajudou
a ser mais pragmático, direto e verdadeiro.
Como já disse, ninguém gosta de jogar dinheiro fora. Então, você tem que comprar dentro
de uma condição que você possa bancar,
dentro de uma relação de entender o mercado para ver se aquilo é justo ou não. E esse conhecimento eu levo para a minha vida pessoal
e para o meu projeto de feira de design.
VOCÊ COLECIONA ARTE DESDE OS 17 ANOS.
QUANDO O LADO CRIATIVO DESPERTOU EM VOCÊ?
Não consigo identificar o momento exato.
Nasci e fui criado em Salvador, uma cidade
que foi berço de todas as manifestações criativas do Brasil. Salvador foi a primeira cidade
a ter uma influência de origem africana, porque a grande imigração de escravos chegou
a Salvador e, logo, eles foram distribuídos
pelo Nordeste. Eles trouxeram cultos, arte,
música. Então, acho que Salvador é uma
Houve uma transição na minha coleção.
Quando comecei, estava mais focado nos
modernistas. Então, tinha um olhar voltado
para as referências regionais. Tinha Carybé,
Di Cavalcanti, artistas modernistas. Em um
determinado momento, senti a necessidade
de entender melhor o processo dos artistas,
mas aquelas pessoas não existiam mais ou já
estavam morrendo. Na virada de 2000, vendi
toda a minha coleção, com exceção de um
dos primeiros quadros que comprei. Troquei
por arte contemporânea. Isso foi um marco
muito forte na minha coleção. De 2000 para
cá, tentei concentrar primeiro em fotografia e, depois, fui pontuando com desenhos,
pinturas e vídeos. Sempre mantive um alinhamento entre a minha coleção. Hoje, ela
é constituída de obras de pequeno formato.
Não tenho nada contra trabalhos grandes,
mas o lugar deles é em galerias, em espaços
amplos e não na minha casa. Brinco que tenho pequenos formatos de grandes nomes,
como Adriana Varejão, Miguel Rio Branco e
Rosângela Rennó.
MERCADODEARTEDESIGN.COM
FOTOS JUAN GUERRA
Sempre gosto de pensar a feira por meio de
um tema. No ano que vem, o tema vai ser
sobre a necessidade de encarar este país
de outra forma. Acho que 2016 vai ser um
ano muito difícil para todo mundo e acredito que, cada vez mais, temos que utilizar
nossa criatividade para criar e fazer as coisas
com muito menos. Por isso, o minimalismo
é o tema principal que estou trabalhando
no momento, acredito que vamos precisar
aprender que o menos é mais. Isso é uma
coisa que vou explorar, seja na cenografia, no
uso das cores ou na distribuição tipográfica.
E também penso na coletividade. A partir
de 2016, vai ser necessário ver mais união
entre as pessoas, e acredito que essa união
vai gerar uma força para ajudar a vencer os
desafios. Assim, estou dando muita ênfase a
processos colaborativos, a processos em que
há várias mentes criando. Por meio do coletivo, você consegue chegar a um resultado
diferente. Então, para o próximo ano pode
esperar a união do minimalismo com o trabalho colaborativo.
“O DESIGN
BRASILEIRO É MUITO
ESPONTÂNEO, AS
CRIAÇÕES, NA
MAIORIA, TÊM UMA
PEGADA DE HUMOR,
TÊM UMA ALEGRIA
QUE ENRIQUECE
O AMBIENTE”
yAMBIENTE
CASA STELLA, em Madri, na Espanha
yPONTO DE VISTA
5 perguntas para
ANGELO
DERENZE
COMO VOCÊ VÊ A EVOLUÇÃO DO DESIGN DE INTERIORES NO
BRASIL NOS ÚLTIMOS ANOS?
O maior crescimento do Brasil foi no setor de design de
interiores. Graças aos nossos profissionais, que foram evoluindo. A gente percebe claramente que nas feiras de hoje
nossos profissionais são os que mais recebem atenção.
Então, foi uma evolução fantástica, muito maior até que
em outros países.
PEQUENAS
GRANDES
CASAS
percebo é muita mistura de cultura brasileira com design
italiano, design francês, design dinamarquês. Acho que é
mais nessa linha.
PARA SER UM BOM DESIGNER DE INTERIORES, QUAIS HABILIDADES O PROFISSIONAL PRECISA TER?
Precisa estudar muita história e viajar muito. Viajar eu acho
que é o maior investimento do profissional. E também se preocupar com sua origem.
O QUE FALTA PARA A PROFISSÃO AVANÇAR AINDA MAIS?
Acho que ainda falta ao brasileiro se conscientizar um pouquinho mais de que é importante pagar por um projeto de
criação. Nisso, ainda estamos muito atrasados em relação
aos europeus, por exemplo. Acho que ainda tem um delay
aí. Tanto em um projeto de decoração quanto em um de arquitetura, as pessoas ainda não aceitam pagar pela criação.
EXISTE UM DESIGN DE INTERIORES COM IDENTIDADE BRASILEIRA?
COMO VOCÊ VÊ O MERCADO DE TRABALHO PARA O DESIGNER
DE INTERIORES?
Eu vejo um mercado muito promissor, porque o brasileiro
cada vez mais não tem dúvida de contratar um profissional
para mexer na casa dele. Ao mesmo tempo, é uma profissão
muito solitária. O próximo passo acho que é o trabalho que a
ABD está fazendo muito bem, que é o trabalho do reconhecimento da profissão de designer de interiores.
É uma pergunta muito difícil. Eu diria que nós estamos antenados com o mundo. Acho que o nosso profissional se
abastece de diversas fontes. Eu diria que, hoje, nosso design é um design mundial aplicado aqui no Brasil. O que eu
ANGELO DERENZE é diretor-geral do shopping D&D
GRANDES CIDADES pelo mundo enfrentam um mesmo problema: a falta
de espaço para tanta gente. Para resolver essa questão, o mercado imobiliário tem construído apartamentos cada vez mais compactos. Ou, em bom
português, apertados mesmo – tão pequenos que precisam ser milimetricamente planejados para que se obtenha o máximo de conforto possível.
Pensando nisso, o estúdio espanhol PKMN, sob o slogan “cada
metro quadrado da sua casa é ouro”, criou o selo Pequeñas Grandes Casas,
desenvolvendo sistemas móveis de design aplicados à habitação.
Por enquanto, o estúdio tem três projetos realizados: Casa Stella,
Casa MJE e All I Own House, onde as paredes foram substituídas por armários deslizantes, que permitem modificar facilmente a configuração
das residências. Na Casa MJE, localizada em Astúrias, na Espanha, o apartamento de 70 m² pode se transformar em uma casa de um, dois ou
nenhum dormitório.
Para otimizar ainda mais os espaços, camas e mesas de cozinha são retráteis, “surgindo” e “desaparecendo” de acordo com a necessidade de uso. “Obtemos a máxima rentabilidade de cada centímetro
do projeto para aumentar seu valor e multiplicar as possibilidades de
utilização dos espaços.”
Acessando o link abaixo dá para ver um vídeo dos projetos e
ter uma ideia melhor de como funciona o sistema móvel criado pela
PKMN. Vai lá!
WWW.XN--PEQUEASGRANDESCASAS-Z3B.COM
34 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
yARTE + DESIGN
a beleza da
madeira
JAE-HYO LEE cria esculturas e peças de design usando
restos de madeira, folhas, pedras, aço inoxidável e grampos de metal. Nascido em Hapchen, na Coreia do Sul, formado em belas-artes na Universidade de Hongik, Lee diz que
sua intenção é expressar A BELEZA DA MADEIRA e suas
características naturais. Para criar as obras, ele utiliza diferentes técnicas, como queimar a madeira para, em seguida, polir
determinados pontos até que fiquem lisos e brilhantes.
“GOSTO DA ESFERA PORQUE É UM FORMATO
CIRCULAR SEM ÂNGULOS EXATOS. É UM FORMATO
COMPLEXO. TODOS OS MEUS TRABALHOS COMEÇAM
COM A ESFERA EM MENTE”
36 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
“COMEÇO UMA PEÇA QUANDO ENCONTRO UM
MATERIAL INTERESSANTE, O DESIGN VEM DEPOIS.
FAÇO ISSO, POIS COSTUMO TRABALHAR MELHOR COM
MATERIAIS NATURAIS. ASSIM, NÃO TEM COMO VOCÊ
RESPEITAR AS CARACTERÍSTICAS DO MATERIAL SE O
DESIGN JÁ ESTÁ PRONTO. GERALMENTE, TUDO QUE
DESENHO É PENSANDO NO MATERIAL QUE TENHO EM
MÃOS, NÃO O CONTRÁRIO”
“MINHAS INSPIRAÇÕES VÊM DA LAND ART. TAMBÉM
GOSTO MUITO DO TRABALHO DO ESCULTOR ANDY
GOLDSWORTHY”
“A MADEIRA É UM DOS MEUS MATERIAIS PREFERIDOS. É NECESSÁRIO
RESPEITAR AS PARTICULARIDADES, OS DEFEITOS DA MADEIRA
ENTÃO, ADICIONO PEQUENOS ELEMENTOS QUE ACRESCENTAM UMA
ENERGIA FORTE PARA ALGO QUE JÁ EXISTE. E, NO FINAL, ACABO COM
ESSAS PEÇAS ENORMES”
LEEART.NAME
38 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
yARTE
selfies, sexo e
INTIMIDADE no TEAR
da artista americana
ERIN M. RILEY
TEXTO JOÃO LOURENÇO
40 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
Acima, NUDES 6 (2011). Na página ao lado, NUDES 9 (2013)
NUDES 15 (2014)
MY BOYFRIEND’S BAND IS ON TOUR (2013)
42 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
ERIN M. RILEY entrou no mundo da arte por necessidade. “Era uma daquelas crianças sozinhas, meus cadernos e desenhos eram os meus amigos.” Interessada em
desenho, pintura e modelagem, ela foi parar em um curso de produção têxtil. Lá, aprendeu tecelagem, matéria
obrigatória para todos os alunos. “Nunca tinha visto um
tear antes. Sempre enxerguei a tapeçaria como aquele
tipo de arte de tom pastoral. Acreditava que era uma
técnica consumida e apreciada apenas por certa elite.
Mas nasci e fui criada em um universo punk, naquela
cultura do ‘faça você mesmo’. Então, pensei: posso tecer
o que bem entender.”
Riley aprendeu a técnica em 2004 e, desde 2007,
não passa um dia sem trabalhar em uma nova tela. Uma
imagem de porte médio pode ser tecida em até 90 horas. A última grande peça de Riley, uma tela de mais de 8
metros de altura, demorou um mês para ser finalizada.
“Os desenhos podem ser considerados modernos, mas
trata-se de um processo artesanal quase milenar. Paciência é a palavra de ordem. Às vezes, passo 12 horas por dia
em cima de uma peça.” O resultado é a série Selfie, uma
coleção de tapetes compostos por imagens de mulheres
em momentos de intimidade. Riley está interessada na
cultura de superexposição e em como a internet torna
tudo descartável. Programas de reality show e aplicativos de namoro como o Tinder também fazem parte do
universo criativo da americana. “Quero fazer parte desse
diálogo. Mandamos fotos de nosso corpo para estranhos
que conhecemos na internet, para amigos e namorados.
Não tem como fugir, isso já faz parte de nossa vida.”
No começo da carreira, Riley encontrava inspiração nas próprias fotos que guardava no celular, imagens
que ela não tinha coragem de postar nas redes sociais.
“O bom da arte é que você pode falar de assuntos tabus,
como pornografia e masturbação, sem vergonha de ser
julgado. Meus desenhos me ajudaram a lidar com problemas que eu nem sabia que tinha.”
O trabalho de Riley ganhou reconhecimento
tanto nas galerias como nas redes sociais. O resultado é
uma caixa de entrada recheada de imagens íntimas de
fãs e admiradores. “Essas imagens são mais fortes do que
aquelas que encontro de forma aleatória na internet. A
minha conexão com a peça é maior quando utilizo imagens de pessoas que me procuram. É uma experiência
de troca que eu não esperava encontrar.”
No momento, Erin M. Riley está trabalhando em
uma nova série, ainda sem título, para apresentar no ano
que vem em São Francisco, Califórnia. “É baseada em
screenshots que tenho no meu celular, imagens de pessoas na hora do orgasmo.”
ERINMRILEY.COM
yCORTINA
PEÇA DE PANO
OU DE OUTRO
MATERIAL QUE SE
PENDURA PARA
COBRIR ALGO
OU UM RECINTO
(PROTEGENDO
DA LUZ OU DO
OLHAR, OU COMO
SEPARAÇÃO,
DIVISÓRIA)
TEXTO MARCOS GUINOZA
44 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
POR TRÁS
DA CORTINA
P
ensando em cortinas, lembrei
de Psicose, de Alfred Hitchcock.
Marion está no banheiro, fecha
a porta e tira a roupa para tomar
banho. Através da cortina é possível ver a porta se abrindo e um vulto se
aproximando, sem ela perceber. Ao som
aterrorizante da trilha sonora composta
por Bernard Herrmann, Marion é esfaqueada por Norman Bates.
Lembrei também de Janela Indiscreta,
do mesmo Hitchcock. Jeff quebrou a perna e está confinado no apartamento. Sem
ter o que fazer, passa a espiar as janelas do
prédio em frente com um binóculo e logo
desconfia que um vizinho matou a mulher
e escondeu o corpo.
E o que esses dois filmes têm a ver
com cortinas? Em Psicose, a peça é item
fundamental para criar o clima de suspense. Já Janela Indiscreta lembra que cortina
aberta pode ser uma oportunidade para
olhares intrometidos.
Existe, sim, um elemento de suspense e sedução por trás das cortinas, em seu
delicioso jogo de esconde-mostra. Abertas, as cortinas revelam, expõem, deixam
à mostra. Fechadas, isolam, separam, preservam a intimidade. No dicionário dos sonhos, cortinas fechadas significam que é
bom se prevenir contra inimigos ocultos, e
cortinas abertas é certeza de vitória contra
os adversários.
Peça clássica na decoração de interiores, a cortina cumpre o papel de equilibrar ou vedar a iluminação natural. Serve
também para dar privacidade, destacar ou
esconder a vista da janela e até diminuir
ruídos externos. Mas a cortina não é uma
unanimidade. Tem gente que não gosta.
Em um blog, a moça escreve: “As cortinas
tornam o ambiente um bocadinho menos
à vista de quem passa. Os ladrões adoram
ver o que acontece na casa das pessoas.
Só por isso é que uso cortinas. Mas sou
a favor de um mundo sem cortinas. Sem
medos”. Em outro blog, outra moça desabafa: “Odeio cortinas! Pronto, falei, ufa,
que peso saiu de cima de mim. Guardava
este segredo há anos, era uma cruz que
carregava”. E outra concorda: “Eu também
não tenho cortinas na sala e sou muito feliz assim. Tenho uma janela gigante com
uma vista fabulosa. Por que eu taparia com
uma cortina?”.
Seja como for, goste-se ou não delas,
as cortinas estão por aí há séculos. Falam
que surgiram no Oriente, nas antigas civilizações da Pérsia, China e Índia. Chegaram
à Europa e adornaram castelos. À plebe,
que morava em casas de um só cômodo,
serviam para separar ambientes. Ainda
servem, na verdade. Há quem prefira cortinas a biombos ou divisórias para delimitar espaços internos. No banheiro, muitos
ainda usam cortinas no lugar do box.
Como tudo, a cortina, com o passar
do tempo, também evoluiu, ganhando
novas formas, materiais, texturas e padronagens. Hoje, escolher uma cortina não é
uma tarefa muito fácil. Além do tecido e da
cor, deve-se definir o tipo de costura, se há
necessidade de usar forro ou blackout, a
altura certa da barra etc. Coisa para designer de interior.
Ou, para simplificar, optar por persianas, que dão um efeito mais clean e são bem
mais práticas que as cortinas. O uso desses
painéis exteriores de lâminas horizontais
como proteção para janelas e batizados de
persiennes surgiu na França, no século 18, e
têm inspiração oriental, mais precisamente
da Pérsia (vem daí o nome: persiana).
Para finalizar, lembro de outro filme,
Cortinas Fechadas, do iraniano Jafar Panahi.
Em uma das cenas, a câmera está na sala,
virada para o mar. O escritor, em vez de
abrir a grade que protege a janela para ter
acesso à bela vista da praia, fecha as tais
cortinas do título.
Abrir ou fechar a cortina depende do
que você quer ou não ver.
10
yDECORAÇÃO
coisas que você
precisa
sobre
PIET BOON
saber
TEXTO JOÃO LOURENÇO
FOTOS DIVULGAÇÃO
1_
2_
3_
Holandês, Piet Boon começou a carreira como empreiteiro da construção civil. Frustrado com a falta de funcionalidade e conforto nas edificações em que trabalhava,
decidiu mudar de carreira. Assim, em 1983, abriu um
escritório de consultoria de design e arquitetura. “Comecei desenhando pequenos projetos, como cozinhas,
banheiros e móveis sob medida. A construção civil me
ajudou a falar a mesma língua das pessoas que executam o design.”
Hoje, o escritório de Piet Boon tem um imenso portfólio
de clientes privados, corporativos e comerciais espalhados por mais de 50 países, como redes de hotéis, restaurantes, resorts de luxo na Coreia do Sul, clube de golfe na
África e fazendas na Europa. Boon já criou até modelos
exclusivos de caminhonetes para a Land Rover.
A equipe de Boon atua nos segmentos de design de interiores, design de produtos, estilo e arquitetura. “Muitas
vezes me perguntam sobre o segredo do sucesso, quais
características tornam o profissional um bom designer.
Não há resposta simples. No meu caso, tive a sorte de
me rodear de pessoas altamente expressivas. Antes de
qualquer técnica, o designer precisa ser um bom ouvinte
e um ótimo comunicador de ideias.”
4_
5_
Ele define o estilo do seu design como uma “sofisticação
silenciosa”. Boon é reconhecido por uma estética clean,
formada por cores suaves e pelo uso de matérias-primas
naturais. Outro fator que o diferencia é a grande equipe
responsável pelo styling. “Isso desempenha um papel
importante no nosso sucesso, pois adiciona um toque
final muito pessoal. São esses pequenos detalhes que
tornam uma casa um lar.” A equipe de styling é dirigida
por Karin Meyn, mulher e parceira de Boon.
Recentemente, ele terminou um dos projetos mais ambiciosos da carreira: a renovação do prédio histórico Huys.
Localizado na Park Avenue, em Manhattan, Nova York, o
condomínio tem 58 apartamentos de luxo. “Em cidades
como NY, as pessoas não costumam passar muito tempo
nas residências. Não queria que esse prédio se parecesse
com um lugar sem vida. Por isso, o principal desafio foi criar
um ambiente humano, daqueles em que você se sente
acolhido e confortável.” O diferencial está nos pequenos
detalhes. Das janelas às maçanetas, tudo foi projetado por
um time de artistas e designers holandeses. “Gosto de incentivar o trabalho de novos artistas. Sempre procuro chamar alguém jovem para os meus projetos.”
6_
Após assinar produtos para marcas como Miele, Bang &
Olufsen e Moooi, Boon decidiu abrir a própria linha de
móveis e objetos. Lançada em 2003, a Piet Boon Zone
oferece um segmento completo de luminárias e mobiliário para casa.
7_
O equilíbrio entre estética e funcionalidade é uma das características mais marcantes no trabalho de Boon. Ele defende que o interior de um ambiente vá além de objetos e
espaços bonitos. “Fujo do design de interior politicamente
correto que vemos em revistas. No fim do dia, durabilidade e funcionalidade falam mais alto, afinal, no mundo real
as pessoas têm crianças e animais de estimação.”
8_
As inspirações do holandês vêm do que ele vê em viagens:
paisagens, arte, vida urbana, moda, música. “Já me compararam com designers e arquitetos japoneses. Vejo isso
como um grande elogio. Temos tanto para aprender com
o Japão... Muito se fala do minimalismo europeu, mas, para
mim, o poder da simplicidade veio dos japoneses.”
9_
Boon acredita que a qualidade é uma das coisas mais
importantes no design. “Percebi que os meus clientes,
independentemente da condição financeira, preferem
pagar mais por um material duradouro. E isso não tem
a ver com o luxo! Nem eu nem meus clientes estamos
interessados em um luxo vulgar. O bom design de luxo
não tem a ver com maçanetas de ouro, mas com um
acabamento de qualidade, com produtos que vão durar
a vida inteira.”
10_
Nesses mais de 30 anos de estrada, Piet Boon acredita
que atingiu aquilo que Frank Lloyd-Wright defendeu: “Eu
não vou criar a casa com que você sempre sonhou, eu
vou criar uma casa com que você nunca sonhou.”
PIETBOON.NL
48 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015
yGALERIA
SANTIAGO SALVADOR ASCUI
v Nascido em Santiago, no Chile.
v Formado em belas-artes na Universidade
Finis Terrae, em Santiago.
v Integra um grupo de dez artistas
plásticos, chamado Colectivo de Arte Gang
Bang, e o projeto musical e visual chileno
Onda Hal Foster.
SANTIAGOSALVADOR.CL
50 ABD CONCEITUAL DEZEMBRO/2015

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