Projeto 2013 licença-capacitação
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Projeto 2013 licença-capacitação
Universidade Federal do Espírito Santo Centro de Artes (CAR) Departamento de Teoria da Arte e Música (DTAM) Plano de estudos do aprimoramento técnico-profissional Licença-capacitação 07 de outubro de 2013 07 de janeiro de 2014 As representações artísticas dos camponeses medievais nas sequências dos Trabalhos dos meses Prof. Dr. Ricardo da Costa (UFES) Orientador: Prof. Dr. Antoni Ferrando (Universidad de València, UV) Co-orientador: Prof. Dr. Vicent Martines Peres (Universitat d’Alacant, UA) Sumário I. O campesinato na Arte em três tempos da vida .................................................... 03 I.1. A festa ................................................................................................................. 03 I.2. O trabalho .......................................................................................................... 06 I.3. O descanso ........................................................................................................ 07 II. Na Catalunha ............................................................................................................09 II.1. Ripoll ............................................................................................................... 11 II.2. Tapís de la Creació ....................................................................................... 12 II.3. Sant Cugat del Valès .................................................................................... 13 III. Metodologia ............................................................................................................ 13 IV. Universidade receptora ................................................................................. 14 V. Cronograma ............................................................................................................ 15 VI. Bibliografia citada ................................................................................................. 15 2 Título: As representações artísticas dos camponeses medievais nas sequências dos Trabalhos dos meses. Resumo: O presente projeto de licença-capacitação pretende efetuar uma análise iconográfica das imagens dos camponeses medievais, tópico imagético intitulado Os Trabalhos dos Meses muito presente tanto na Arte Medieval quanto no Proto-renascimento francoitaliano. Esse ciclo artístico, cujas primeiras manifestações ocorreram durante o Renascimento carolíngio (sécs. IX-X), foi muito importante para o posterior desenvolvimento da pintura de paisagem. Sua principal característica é a representação de uma cena de trabalho (normalmente camponesa) que simboliza a principal atividade do mês, costumeiramente associada ao signo zodiacal correspondente. Nosso recorte cronológico e geográfico restringir-se-á à Catalunha medieval, e as principais obras escolhidas, tanto por sua importância quanto por sua representatividade do românico catalão são o Tapís de la creació (Girona), o Portal de Santa Maria de Ripoll (Girona) e capitéis do mosteiro de Sant Cugat del Vallés (Barcelona). A interpretação dessas imagens de camponeses catalães será enriquecida com a análise de um capítulo do Livro da Contemplação (c. 1271-1273) de Ramon Llull (1232-1316) em que o filósofo aborda a condição camponesa de sua época. Trata-se, portanto, de uma proposta interdisciplinar de trabalho, pois pretende relacionar Arte e Filosofia. Por fim, metodologica e teoricamente, seguiremos as propostas analíticas de Alfons Puigarnau (UIC): a Estética como manifestação metafísica e sua consequente e necessária representação iconográfica tanto da História quanto da Filosofia. No caso dos textos escritos que serão confrontados com os imagéticos, a utilização dos usos do campo semântico de Jèssica Jacques Pi (UAB) serão de especial valia. Palavras-chave: Arte – Trabalho dos Meses – Filosofia – Românico catalão. *** I. O campesinato na Arte em três tempos da vida I.1. A festa No Alvorecer da Modernidade1 − ou no Outono da Idade Média2, conforme a perspectiva escolhida − Pieter Brueguel, o Velho (c. 1525-1569) criou uma série de pinturas em que o universo camponês foi representado.3 Uma festa.4 Um mundo organizado ao redor do trabalho, mas inteiramente permeado pelo conceito cristão de fraternidade. Tudo era motivo de confraternização: feriados religiosos, comemorações pelas colheitas, ritos de passagens (casamentos, velórios). De fato, o mundo da civilização ocidental, mundo rude, mundo pré-industrial, era um universo cultural de 1 2 3 4 MAGALHÃES, Joaquim Romero (coord.). História de Portugal. Terceiro Volume: No alvorecer da Modernidade (1480-1620). Lisboa: Editorial Estampa, s/d. HUIZINGA, Johan. O Outono da Idade Média. Estudos sobre as formas de vida e de pensamento dos séculos XIV e XV na França e nos Países Baixos. São Paulo: CosacNaif, 2010. HAGEN, Rose-Marie e Rainer. Pieter Bruegel, o Velho, cerca de 1525-1569. Camponeses, loucos e demônios. Colônia: Taschen, 1995. LADERO QUESADA, Miguel Ángel. Las fiestas en la cultura medieval (edición a cargo de isabel Belmonte López). Barcelona: Areté, 2004. 3 convivência de opostos a coexistir no mesmo ambiente social. Sofrimento e prazer. Labor e descanso. Inferno e Paraíso. Por exemplo, em O casamento camponês (c. 1568), o pintor flamengo retratou, de um modo quase cômico (mesmo satírico) − tanto pelo chapéu da criança em primeiro plano, muito grande para ela, quanto pelo homem no extremo da mesa (acima, à direita), enterrando a cabeça no jarro para sorver a última gota de bebida5 − uma das mais importantes reuniões sociais que perpassava todo o corpo social: o casamento.6 Imagem 1 Pieter Brueguel, o Velho (c. 1525-1569), O casamento camponês (c. 1568), pintura a óleo (114 x 164 cm), Kunsthistorisches Museum (Viena). A íntima intenção de Brueguel, a de edificar, perpassa o ambiente: todos têm um ar circunspecto, os criados transportam papas (principal alimentação dos pobres7) numa porta arrancada das dobradiças; a noiva, impassível, está sentada sob a coroa nupcial. Entretanto, trata-se de uma notável representação do universo camponês do século XVI. São pobres, mas com a mesa farta (tradição, aliás, também brasileira). Em outro quadro (imagem 2, página seguinte), a cena seguinte à refeição ofertada aos convivas da cena acima: o desvario, a sensualidade mal reprimida, a alegria incontida, o prazer do amor desregrado. A gaita de foles, por ser considerada um instrumento de poderes eróticos, é tocada na festa da noiva camponesa (abaixo, à 5 6 7 BURKE, Peter. Testemunha ocular. História e Imagem. Bauru, SP: Edusc, 2004, p. 172. BROOKE, Christopher. O casamento na Idade Média. Lisboa: Publicações Europa-América, s/d. FLANDRIN, Jean Louis; MONTANARI, Massimo (orgs.). História da alimentação. São Paulo: Estação Liberdade, 2007. 4 direita): a vitalidade e a fecundidade são celebradas no ardor da dança. Brueghel destaca a excitação dos homens. Imagem 2 Pieter Brueguel, o Velho (c. 1525-1569), A dança do casamento ao ar livre (1566), pintura a óleo (119 x 157cm), Detroit Institute of Arts (EUA). O mundo camponês tem esses rompantes de intensa alegria. A esse respeito, a conclusão do historiador Fernand Braudel (1902-1985) sobre esse período, além de ressaltar a descontinuidade dos processos históricos, confirma a colorida exuberância da arte de Brueguel: Não há dúvida que a Europa passou, entre 1350 e 1550, por um período de vida individual feliz (...) É esse o paradoxo em que temos de insistir, prevalecendo a idéia simplista de que, quanto mais recuamos para a Idade Média, mais penetramos na infelicidade. Com efeito, quando se fala do nível de vida popular, isto é, o da maioria das pessoas, é o contrário que sucede (...) antes de 15201540, no Languedoc ainda pouco povoado, camponeses e artesãos comem pão branco. A deterioração acentua-se à medida que nos afastamos do outono da Idade Média e mantém-se até o meio do século XIX (os grifos são nossos).8 8 BRAUDEL, Fernand. Civilização Material, Economia e Capitalismo. As Estruturas do Cotidiano. Séculos XV-XVIII. São Paulo: Martins Fontes, 1995, p. 254. 5 I.2. O trabalho Por volta de 1320, Isabel Capeto (1295-1358), princesa da França e rainha consorte da Inglaterra (cognominada a Loba da França), provavelmente ganhou de presente um saltério (livro ilustrado contendo os Salmos que, na Idade Média, servia como leitura devocional nos mosteiros e, nos séculos XIV-XV, da nobreza europeia). Foi denominado Saltério da Rainha Maria (Queen Mary Psalter)9 porque, em 1553, Maria I (1516-1558) o recebeu (e é o primeiro registro histórico confiável que temos). Tratase da obra de um único artista (desconhecido). São mais de oitocentas iluminuras, com vários temas. Um deles, o Trabalho dos Meses: uma cena que representa o mais paradigmático trabalho do mês relacionada à outra, em que o signo do Zodíaco está diretamente relacionado ao trabalho. O céu emana suas influências em direção à terra. Na iluminura do mês de agosto (imagem 3), um capataz, com uma bengala, comanda o trabalho e aponta qual deve ser a direção do corte do trigo. Curvados, três camponeses trabalham vigorosamente. Um deles (de azul) veste um capuz. Todos usam o foicinho. Todos são muito jovens. O mundo medieval é jovem.10 Imagem 3 Queen Mary Psalter (1310-1320), 08A London BL-Royal 2 B VII, folio 78v (August). Em todos os trabalhos representados no ciclo do Trabalho dos Meses, há uma estreita relação do esforço humano na terra, a culpa adâmica da expulsão do Paraíso, com o signo zodiacal correspondente. Para o mês de agosto desse Saltério, o signo de Virgem (imagem 4): quatro damas, de mãos dadas, com vestidos nas cores grená, azul e laranja, estão no centro da cena. Nas duas laterais, duas jovens camponesas colhem 9 10 British Library MS Royal 2 B VII. Internet, http://www.bl.uk/catalogues/illuminatedmanuscripts/record.asp?MSID=6467&CollID=16&N Start=20207. BLOCH, Marc. A Sociedade Feudal. Lisboa: Editorial Estampa, 1980. 6 flores, em uma cena bastante semelhante a outro documento imagético: o Espelho das Virgens (séc. XIII), manuscrito destinado às freiras noviças e que também mostra o trabalho no campo, realizado, em sua maior parte, pelas próprias monjas. Imagem 4 Queen Mary Psalter (1310-1320), 08B London BL- oyal 2 B VII, folio 79 (Virgo). I.3. O descanso João de Salisbury (c. 1115-1180), bispo e um dos maiores escritores de seu tempo, escreveu em 1159 o que é considerado o primeiro tratado de filosofia política do Ocidente11: Polycraticus – De nugis curialium et vestigiis philosophorum (“Policrático, sobre as frivolidades dos cortesãos e os vestígios dos filósofos”). Há uma passagem muito famosa para o tema que propomos analisar: Os agricultores se parecem aos pés, pois também se encontram continuamente no solo. Para eles é especialmente necessária a atenção da cabeça, já que tropeçam em muitas dificuldades enquanto pisam a terra com o trabalho de seu corpo, e merecem ser protegidos com tanta ou mais justa proteção para se manterem de pé, sustentarem e moverem todo o corpo. Retire de qualquer corpo essas peças dos pés que, por mais robusto que ele seja, não poderá caminhar por suas próprias forças, mas tentará se arrastar torpemente com as mãos, sem consegui-lo e com grande fadiga, ou só poderá se mover com o auxílio das bestas.12 O trecho acima ganhou notoriedade por estabelecer a metáfora do corpo para descrever a estrutura da sociedade (então vigente): a cabeça, o príncipe; os olhos, os 11 12 E isso antes do resgate de Aristóteles ocorrido no século XIII. SABINE, George H. Historia de la teoría política. México: Fondo de Cultura Económica, 1996, p. 203. JUAN DE SALISBURY. Policraticus (ed. IADERO, Miguel Angel, GARCIA, Matias e ZAMARRIEGO, Tomas). Madrid: Editora Nacional, 1984, Livro V, 2, 6. 7 ouvidos e a língua, os juízes e prefeitos; os oficiais e os soldados, as mãos; os questores e escrivães, o ventre e os intestinos; os camponeses, os pés. O bispo destaca o aparente paradoxo dos pés: em relação à cabeça são menos importantes, mas ouse retirar os pés do corpo! Por mais forte que seja, não conseguimos caminhar sem eles! Merecem os camponeses, por isso, especial atenção dos governantes.13 Essa era a admoestação da filosofia cristã que, tanto na Idade Média quanto na Antiguidade, tinha como parâmetro ético a Moral.14 Por isso, tanto espaço a arte medieval concede aos camponeses. Eles estão por toda a parte: quadros, tapeçarias, esculturas, iluminuras, capitéis. Por onde quer que olhemos, encontramos o trabalho nos campos como a inspiração artística mais recorrente.15 Imagem 5 Mês de fevereiro. Detalhe de um vitral da Catedral de Chartres (c. 1217-1220). 13 14 15 COSTA, Ricardo. “A Estética do Corpo na Filosofia e na Arte da Idade Média: texto e imagem”. In: Trans/form/ação, Marília, v. 35, p. 161-178, 2012. Internet, http://www.ricardocosta.com/artigo/estetica-do-corpo-na-filosofia-e-na-arte-da-idade-media A Filosofia tinha como base a tradição socrático-platônica, transmitida à Idade Média por várias vertentes, uma delas a estoica: “Sócrates, que reduziu toda a filosofia à ética, dizia que a suprema sabedoria consistia em distinguir o bem e o mal. “Se a minha autoridade tem para ti algum valor − dizia ele − pratica a moral para poderes ser feliz, e não te importes que fulano ou cicrano te ache estúpico. Deixa que os outros te ofendam e te injuriem; desde que possuas a virtude em nada será lesado por isso. Se queres ser feliz, se queres ser um homem de bem e digno de confiança, não te importes que os outros te desprezem! Ninguém conseguirá atingir este nível se previamente não tiver negado qualquer valor a tudo o mais, se não tiver colocado todos os bens em pé de igualdade − porque não existe bem onde não há moral, e a moral é a mesma em todas as circunstâncias”, LÚCIO ANEU SÉNECA. Cartas a Lucílio (trad., prefácio e notas de J. A. Segurado e Campos). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2007, Carta 71, 7, p. 273. PERNOUD, Régine. Luz sobre a Idade Média. Lisboa: Publicações Europa-América, s/d, p. 47-48. 8 Na Catedral de Chartres (c. 1217-1220), por exemplo, há um vitral intitulado O Zodíaco e o Trabalho e os Meses.16 Na representação do mês de fevereiro (segundo círculo de cima para baixo do vitral, ou seja, muito próximo da visão do expectador), um camponês descansa (imagem 5). Suas feições são brutas. Está em frente a uma lareira. O fogo é intenso (as labaredas saltam para fora da lareira. Sentado em um banco acolchoado, com um jarro de vinho no chão, ao seu alcance, agasalhado, ele aquece seus pés descalços e suas mãos. O tempo do descanso é crucial, pois o trabalho é incessante. A cena é muito comum nas sequências do Trabalho e os Meses: é importante se proteger do inverno inclemente europeu. A cena do descanso camponês se repete à exaustão na Arte medieval. Como em uma iluminura do Saltério de Guiluys de Boisleux (séc. XIII). A mesma posição corporal, o mesmo alívio para os pés − pés que representam seu grupo social para os poderes vigentes − o mesmo fogo acolhedor. Imagem 6 Detalhe de uma iluminura do Saltério de Guiluys de Boisleux. Arras, França (c. 1243-1246). Ms. Pierpont Morgan Library, M. 730, folio 1v. A mesma cena, no mesmo mês (Fevereiro), com o mesmo signo (Peixes).17 II. Na Catalunha Por sua vez, na extremidade oriental da Península Ibérica, a Catalunha18, o trabalho como pena, dor, foi substituído pelo Ora et labora. Opus Dei. Por isso, a região 16 17 18 Voyage au Moyen Âge à travers les vitraux de Chartres (textes de Colette et Jean-Paul Deremble. Photographies de Henri Gaud). Les Minoteries Viron, Chartres, 2007, p. 43. CORSAIR. the Online Catalog of The Pierpont Morgan Library. Internet, http://utu.morganlibrary.org/medren/single_image2.cfm?imagename=m730.001v.jpg&page=IC A000133746 BALCELLS, Albert (dir.). Història de Catalunya. Barcelona: La Esfera de los Libros, 2005. 9 é uma das mais ricas em arte românica.19 A mais rica da Espanha. Assim, o tempo foi domesticado, controlado, redirecionado. E a Arte expressou essa reordenação que, lentamente, disciplinou a sociedade.20 Imagem 7 Mapa da coroa catalã-aragonesa no século XII (domínios e regiões vassalas), incluído os territórios occitanos (Provença, Limousin, Auvergne, Gasconha, Languedoc e o Delfinado francês − em seus aspectos linguísticos e culturais, no conceito do occitano estão incluídos alguns vales alpinos italianos e o Vale de Aran catalão).21 Na Catalunha, selecionados três exemplos artísticos e paradigmáticos para análise: o Pórtico do Mosteiro de Santa Maria de Ripoll22, o Tapete da Criação23 e alguns 19 20 21 22 SUREDA, Joan. La pintura románica en Cataluña. Madrid: Alianza Editorial, 1995. “Só no período de 800 a 1300, numa região de 36.500 quilómetros quadrados, mais de 300 abadias ou priorados foram fundados, metade dos quais antes do ano Mil”. ZIMMERMANN, Michel. “As abadias da Catalunha”. In: BERLIOZ, Jacques (apr.). Monges e Religiosos na Idade Média. Lisboa: Terramar, s/d, p. 115. HOURIHANE, Colum (ed.). Time in the Medieval World − Occupations of the Months and Signs of the Zodiac in the Index of Christian Art. Penn State University Press, 2007. Site do Prof. Jordi-Carles Burillo (l’Esca. Web de la llengua i literatura catalanes). Disciplina Llengua catalana (4t d’Eso). Internet, http://www.esca.cat/index.php/Literatura-4t-ESO/literatura-4tdeso.html. LORÉS OTZET, Immaculada. “La decoración escultórica en el monasterio de Santa María de Ripoll”. In: Los grandes monasterios benedictinos hispanos de época románica (1050-1200). Ayuntamiento de Aguilar de Campoo, 2007. 10 capitéis do mosteiro de Sant Cugat del Vallés (Barcelona). Todos eles têm representações do ciclo dos Trabalhos e os Meses. O tempo e o trabalho. O tempo na Arte, nas imagens do Ocidente. II.1. Ripoll O Pórtico do Mosteiro de Santa Maria de Ripoll (Girona) por sua importância como local alavancador da ideia de catalanidade e de depositório da cultura do período. Fundado por volta de 880 pelo conde de Barcelona Wifredo I, o Peludo (830-897), o que mostra a estreita relação entre os novos poderes políticos nascidos a partir da dissolução do Império Carolíngio e a Igreja, o Mosteiro de Santa Maria, beneditino, logo se transformou em um importante centro cultural irradiador para toda a Europa. No século XII foi construído um pórtico de calcário de dimensões monumentais (11,60 de comprimento e 7,25 de altura), verdadeiro arco triunfal, para decorar a entrada principal de sua igreja. As imagens de camponeses nas arcadas do portal serão o primeiro exemplo artístico a ser analisado neste projeto. Imagem 8 Pórtico do Mosteiro de Santa Maria de Ripoll (séc. XII, Girona). Foto: Santiago Abella (www.flicr.com). 23 CASTIÑERAS, Manuel. El tapiz de la creación. Girona: Catedral de Girona, s/d; FRANCO JR., Hilário. “O poder da palavra: Adão e os animais na Tapeçaria de Gerona”. In: A Eva barbada. Ensaios de mitologia medieval. São Paulo: EDUSP, 2010, p. 105-120. 11 II.2. Tapís de la Creació Trata-se de um bordado de grandes dimensões (3,58 x 4,5 m) e tecido nos séculos XI-XII. Tem cenas do Gênesis bíblico, além do trabalho humano como consequência da expulsão de Adão e Eva do Paraíso. A proposta para estudo nesse plano de estudos é centrar nossa leitura imagética nas cenas laterais que chegaram até nós do Trabalho dos meses (meses de fevereiro, março, abril, maio e junho − à esquerda), já que já nos debruçamos nos dois círculos centrais em recente conferência.24 Imagem 9 24 COSTA, Ricardo da, e GRAU-DIECKMANN, Patricia. “El relato del Génesis en el Tapís de la Creació (siglos XI-XII): la transcendencia en la Estética Medieval”. Conferencia a ser presentada en el XIV Congreso Latinoamericano de Filosofía Medieval. Filosofía medieval: continuidad y rupturas. UNSTA, San Mihel de Tucumán, Argentina, 11 al 14 de septiembre de 2013. Internet, http://www.ricardocosta.com/artigo/el-relato-del-genesis-en-el-tapis-de-la-creacio-siglos-xi-xiila-transcendencia-en-la 12 II.3. Sant Cugat del Valès Por fim, o mosteiro de Sant Cugat del Valés (Barcelona). O deambulatório de seu claustro já foi, em suas linhas gerais, por nós analisado, especialmente as cenas de sua vida cotidiana e monástica.25 Nesse projeto, em contrapartida, é nossa intenção abordar uma cena da vida camponesa (a colheita da uva) e investigar se há mais capitéis com representações camponesas no deambulatório. Imagem 10 Camponeses na poda da uva. Capitel do Mosteiro de Sant Cugat del Vallès (Barcelona), séc. XIII. III. Metodologia Para as peculiaridades do contexto artístico catalão, tomaremos como base tanto as informações técnicas quanto as considerações teórico-metodológicas contidas 25 COSTA, Ricardo da. “O deambulatório dos anjos: o claustro do mosteiro de Sant Cugat del Vallès (Barcelona) e a vida cotidiana e monástica expressa em seus capitéis (séculos XII-XIII)”. In: MIRANDUM, n. 17, Ano X, 2006, p. 39-58. Internet, http://www.ricardocosta.com/artigo/odeambulatorio-dos-anjos-o-claustro-do-mosteiro-de-sant-cugat-del-valles-barcelona-e-vida. 13 nas obras de Alfons Puigarnau (UIC)26, Joan Sureda27, Francesc Español e Joaquín Yarza28 e Jèssica Jacques Pi29, além dos trabalhos específicos (já levantados) sobre as respectivas obras selecionadas.30 As imagens serão interpretativamente complementadas com textos de época. Trata-se de uma relação dialógica, em que o texto complementa a imagem e vice-versa. No entanto, a metodologia para análise de textos é distinta da de imagens. A melhor aproximação nesse estudo de caso específico, o da arte medieval, em que conceitos filosóficos se mesclavam aos artísticos, divide-se em duas partes: 1) o estudo do vocabulário dos textos escritos por pensadores de época que se dedicaram a conceitualizar os termos (tradicionais) especificamente estéticos (ordem, harmonia, conveniência, beleza, decoro, formosura), juntamente com os aspectos intrínsecos das imagens (sua estrutura, suporte, profundidade, superfície de inscrição e suas hierarquias espaciais, ritmo imagético, elementos figurativos, cores, relações de oposição e assimilação31); 2) a comparação do que um autor catalão escreveu sobre a condição camponesa de seu período com as respectivas obras catalãs selecionadas. Nesse caso, escolhemos o filósofo Ramon Llull (1232-1316), tanto pelo fato de ter sido um dos primeiros escritores em língua vernácula a elevá-la a um patamar filosófico, algo raro no período, como pela riqueza com que interpreta a estrutura social de seu tempo e a condição dos camponeses, em um capítulo de suas obras mais basilares: o Livro da contemplação (c. 1271-1273). Para essa parte específica de nossa proposta, utilizaremos a edição Obres Essencials, de 1960.32 IV. Universidade receptora O presente projeto de licença-capacitação foi favoravelmente acolhido no âmbito do l’Institut Superior d’Investigació Cooperativa IVITRA (ISIC-IVITRA) [Higher Cooperative Research Institute ‘International Virtual Institute of Translation’33: ISICIVITRA, Programa ISIC d’excel·lència de la Generalitat Valenciana per a la Constitució i Acreditación d’Instituts Superiors d’Investigació Cooperativa (Ref. 26 27 28 29 30 31 32 33 PUIGARNAU, Alfons. Imago Dei y Lux mundi en el siglo XII. La recepción de la Teología de la Luz en la iconografía del Pantocrátor en Catalunya. Tesis doctoral dirigida por Amador Vega. Barcelona: Institut Universitari de Cultura. Universitat Pompeu Fabra, 1999. Internet, http://www.academia.edu/365225/Imago_Dei_Y_Lux_Mundi_En_El_Siglo_XII. SUREDA, Joan. La pintura románica en Cataluña, op. cit. ESPAÑOL, Francesca, YARZA, Joaquín. El Romànic Català. Barcelona: Fundació caixaManresa/Angle Editorial, 2007. JAQUES PI, Jèssica. La estética del románico y el gótico. Madrid: A. Machado Libros, 2003. CASTIÑERAS, Manuel. El tapiz de la creación, op. cit.; LORÉS OTZET, Immaculada. “La decoración escultórica en el monasterio de Santa María de Ripoll”, op. cit. SCHMITT, Jean-Claude. O corpo das Imagens. Ensaios sobre a cultura visual na Idade Média. Bauru, SP: EDUSC, 2007, “Metodologia”, p. 33-42. RAMON LLULL. Obres Essencials (OE). Barcelona, vol, II, 1960, p. 97-1258. Site: http://www.ivitra.ua.es. 14 ISIC/2012/022), com a orientação do Prof. Dr. Antoni Ferrando (Universidad de València, UA, Espanha) e a co-orientação do Prof. Dr. Vicent Martines Peres (Universitat d’Alacant, UA, Espanha), diretor-investigador Principal de IVITRA. Portanto, a universidade receptora será a de València (UV), com a de Alicante (UA) como auxiliadora no desenvolvimento do projeto. V. Cronograma Etapa 1 – Tradução e revisão do extrato do Livro da Contemplação; Etapa 2 – Leitura e fichamento da bibliografia selecionada; Etapa 3 – Análise iconográfica das imagens; Etapa 4 – Redação do relatório final. Etapas Outubro 2013 Etapa 1 Etapa 2 Etapa 3 Etapa 4 X X Novembro 2013 X X Dezembro 2013 Jan 2014 X X X VI. Bibliografia citada BALCELLS, Albert (dir.). Història de Catalunya. Barcelona: La Esfera de los Libros, 2005. BLOCH, Marc. A Sociedade Feudal. Lisboa: Editorial Estampa, 1980. BRAUDEL, Fernand. Civilização Material, Economia e Capitalismo. As Estruturas do Cotidiano. Séculos XV-XVIII. São Paulo: Martins Fontes, 1995. BROOKE, Christopher. O casamento na Idade Média. Lisboa: Publicações Europa-América, s/d. BURKE, Peter. Testemunha ocular. História e Imagem. Bauru, SP: Edusc, 2004, p. 172. CASTIÑERAS, Manuel. El tapiz de la creación. Girona: Catedral de Girona, s/d. COSTA, Ricardo da. “O deambulatório dos anjos: o claustro do mosteiro de Sant Cugat del Vallès (Barcelona) e a vida cotidiana e monástica expressa em seus capitéis (séculos XII-XIII)”. In: MIRANDUM, n. 17, Ano X, 2006, p. 39-58. Internet, http://www.ricardocosta.com/artigo/odeambulatorio-dos-anjos-o-claustro-do-mosteiro-de-sant-cugat-del-valles-barcelona-e-vida. COSTA, Ricardo. “A Estética do Corpo na Filosofia e na Arte da Idade Média: texto e imagem”. In: Trans/form/ação, Marília, v. 35, p. 161-178, 2012. Internet, http://www.ricardocosta.com/artigo/estetica-do-corpo-na-filosofia-e-na-arte-da-idade-media COSTA, Ricardo da, e GRAU-DIECKMANN, Patricia. “El relato del Génesis en el Tapís de la Creació (siglos XI-XII): la transcendencia en la Estética Medieval”. Conferencia a ser presentada en el XIV Congreso Latinoamericano de Filosofía Medieval. Filosofía medieval: continuidad y rupturas. UNSTA, San Mihel de Tucumán, Argentina, 11 al 14 de septiembre de 2013 (texto inédito). Internet, http://www.ricardocosta.com/artigo/el-relato-del-genesis-en-el-tapis-de-la-creacio-siglos-xi-xiila-transcendencia-en-la ESPAÑOL, Francesca, YARZA, Joaquín. El Romànic Català. Barcelona: Fundació caixaManresa/Angle Editorial, 2007. FLANDRIN, Jean Louis; MONTANARI, Massimo (orgs.). História da alimentação. São Paulo: Estação Liberdade, 2007. 15 FRANCO JR., Hilário. “O poder da palavra: Adão e os animais na Tapeçaria de Gerona”. In: A Eva barbada. Ensaios de mitologia medieval. São Paulo: EDUSP, 2010, p. 105-120. HAGEN, Rose-Marie e Rainer. Pieter Bruegel, o Velho, cerca de 1525-1569. Camponeses, loucos e demônios. Colônia: Taschen, 1995. HOURIHANE, Colum (ed.). Time in the Medieval World − Occupations of the Months and Signs of the Zodiac in the Index of Christian Art. Penn State University Press, 2007. HUIZINGA, Johan. O Outono da Idade Média. Estudos sobre as formas de vida e de pensamento dos séculos XIV e XV na França e nos Países Baixos. São Paulo: CosacNaif, 2010. JAQUES PI, Jèssica. La estética del románico y el gótico. Madrid: A. Machado Libros, 2003. JUAN DE SALISBURY. Policraticus (ed. IADERO, Miguel Angel, GARCIA, Matias e ZAMARRIEGO, Tomas). Madrid: Editora Nacional, 1984. LADERO QUESADA, Miguel Ángel. Las fiestas en la cultura medieval (edición a cargo de isabel Belmonte López). Barcelona: Areté, 2004. LORÉS OTZET, Immaculada. “La decoración escultórica en el monasterio de Santa María de Ripoll”. 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